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ALFABETIZANDO COM DIVERSIDADE DE GÊNEROS TEXTUAIS: LEITORES E ESCRITORES COMPETENTES Dilma Aparecida Wider Rezende Francisca Pereira de Souza Silva Loeni Fátima Tizziani Terezinha Bazé de Lima INTRODUÇÃO A compreensão crítica do ato de escrever não se esgota na decodificação pura da palavra escrita, mas se antecipa da inteligência do mundo. (FREIRE, 2001, p.11) O presente trabalho consiste em apresentar a pesquisa realizada na E. M. Elpídio Reis, na turma de 1ª série do Ensino Fundamental, com a finalidade de comprovar a eficácia da alfabetização através do uso da diversidade de gêneros textuais, contribuindo para a qualidade do atendimento do aluno, utilizando uma metodologia diferenciada mediada pela reflexão em torno da atuação do professor na elaboração das atividades pedagógicas, construindo novas estratégias quanto ao uso da leitura e da escrita, repensando a prática pedagógica e as teorias que lhes dão sustentação, visando melhor desempenho dos alunos, na elaboração de textos coerentes e claros, nos quais a criança passará de um processo de heteronomia para autonomia da escrita. Trata-se de um estudo sobre alfabetização cujo objetivo central gira em torno das seguintes indagações: É possível alfabetizar utilizando a diversidade de gêneros textuais? Podem ser utilizadas as estratégias de leitura e escrita do programa Gestar, na alfabetização? O aluno da classe de alfabetização é capaz de produzir diversos gêneros textuais com competência lingüística? Na medida em que os estudos sobre texto ganham dimensões e este passa a ser compreendido como parte de atividades mais amplas de comunicação, começa-se a refletir na questão do gênero textual, que, hoje merece lugar de destaque, sendo considerado não apenas como instrumento de comunicação, mas como objeto de ensino aprendizagem. Considerando que o domínio da língua oral e escrita é fundamental para a participação social e efetiva, esta pesquisa tem como objetivo utilizar a diversidade de gêneros textuais no desenvolvimento do aluno e sua autonomia no processo de aquisição da prática da leitura e produção escrita. Para efetivação deste objetivo buscamos nos apoiar na metodologia do programa Gestão de Aprendizagem Escolar (Gestar), que ressalta a importância do uso do

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ALFABETIZANDO COM DIVERSIDADE DE GÊNEROS TEXTUAIS: LEITORES E

ESCRITORES COMPETENTES

Dilma Aparecida Wider Rezende Francisca Pereira de Souza Silva

Loeni Fátima Tizziani Terezinha Bazé de Lima

INTRODUÇÃO

A compreensão crítica do ato de escrever não se esgota na decodificação pura da palavra escrita, mas se antecipa da inteligência do mundo. (FREIRE, 2001, p.11)

O presente trabalho consiste em apresentar a pesquisa realizada na E. M. Elpídio Reis,

na turma de 1ª série do Ensino Fundamental, com a finalidade de comprovar a eficácia da

alfabetização através do uso da diversidade de gêneros textuais, contribuindo para a qualidade

do atendimento do aluno, utilizando uma metodologia diferenciada mediada pela reflexão em

torno da atuação do professor na elaboração das atividades pedagógicas, construindo novas

estratégias quanto ao uso da leitura e da escrita, repensando a prática pedagógica e as teorias

que lhes dão sustentação, visando melhor desempenho dos alunos, na elaboração de textos

coerentes e claros, nos quais a criança passará de um processo de heteronomia para autonomia

da escrita.

Trata-se de um estudo sobre alfabetização cujo objetivo central gira em torno

das seguintes indagações: É possível alfabetizar utilizando a diversidade de gêneros textuais?

Podem ser utilizadas as estratégias de leitura e escrita do programa Gestar, na alfabetização?

O aluno da classe de alfabetização é capaz de produzir diversos gêneros textuais com

competência lingüística? Na medida em que os estudos sobre texto ganham dimensões e este

passa a ser compreendido como parte de atividades mais amplas de comunicação, começa-se

a refletir na questão do gênero textual, que, hoje merece lugar de destaque, sendo considerado

não apenas como instrumento de comunicação, mas como objeto de ensino aprendizagem.

Considerando que o domínio da língua oral e escrita é fundamental para a participação

social e efetiva, esta pesquisa tem como objetivo utilizar a diversidade de gêneros textuais no

desenvolvimento do aluno e sua autonomia no processo de aquisição da prática da leitura e

produção escrita. Para efetivação deste objetivo buscamos nos apoiar na metodologia do

programa Gestão de Aprendizagem Escolar (Gestar), que ressalta a importância do uso do

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texto como unidade de ensino, levando em conta o seu funcionamento e o seu contexto de

produção para apropriação do conhecimento.

Os resultados desta pesquisa serão disponibilizados aos professores da escola ligados

diretamente a alfabetização, através de um plano de intervenção. Com esta pesquisa não

pretendemos impor uma nova prática pedagógica na aquisição da leitura e escrita, mas refletir

sobre novos caminhos, tendo o texto como unidade principal de ensino.

Este trabalho foi dividido em quatro capítulos. O primeiro capítulo apresenta um breve

histórico do programa Gestão de Aprendizagem Escolar (Gestar) que focaliza uma

metodologia com base na diversidade de gêneros textuais. No segundo capítulo abordamos as

fundamentações teóricas que enfatizam a importância de colocar o aluno em contato com as

diversas formas de linguagens presentes no cotidiano, pois alem das características do sistema

alfabético as crianças aprendem as características próprias da linguagem escrita que se usa em

diferentes situações com distintas finalidades e em diversos tipos de texto, favorecendo a

construção do conhecimento mediada pelo professor. Delineou-se também, os níveis de

escrita de acordo com a obra de Ferreiro e Teberosky (1985). No capítulo terceiro, abordamos

os caminhos percorridos durante a realização da pesquisa-ação, como foram desenvolvidas as

rotinas de sala de aula. Destaca-se também a análise da hipótese de escrita dos sujeitos

participantes. No capítulo quarto, apresenta-se uma discussão e análise considerando os dados

obtidos durante a pesquisa-ação e a entrevista realizada com a formadora do Gestar, a

supervisora e professoras envolvidas na pesquisa.

Em suma, apresentamos as considerações finais, que contextualizam as teorias

estudadas com as experiências vivenciadas durante a realização da pesquisa, e finalmente

elencamos às referências necessárias a fundamentação do tema.

1. METODOLOGIA DO PROGRAMA GESTÃO DE APRENDIZAGEM

ESCOLAR

Versaremos neste capítulo, pontos relevantes que compõem o Programa Gestão de

aprendizagem Escolar, como objetivos, papel do professor, formação continuada em serviço e

pressupostos da Língua Portuguesa, ou seja, como foi estruturado. Programa este oferecido

aos professores da Rede Municipal de Ensino com o intuito de provocar transformações na

prática docente e aprendizagem do aluno, por meio de diversos textos.

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Considerando que em seu cotidiano os alunos estão constantemente em contato com a

diversidade textual, é papel da escola promover situações que favoreçam aos alunos o

reconhecimento desses gêneros. Assim optamos nortear nossa pesquisa com o Programa

GESTAR, tendo em vista que sua metodologia baseia-se na diversidade de gêneros textuais.

Programa este que apresenta-se como um conjunto de ação articuladas a serem

desenvolvidas junto a professores habilitados para atuar nos quatros anos iniciais do Ensino

Fundamental, que estejam em exercícios nas escolas públicas das regiões Norte, Nordeste e

Centro-Oeste do Brasil, vinculadas ao Programa de Desenvolvimento da Escola (PDE). O

PDE visa promover a reorganização da instituição escolar e a orientá-la para o bom

atendimento ao aluno, tomando esse como foco das ações da escola. Nesse contexto, o

GESTAR tem a finalidade de contribuir para a qualidade do atendimento ao aluno, reforçando

a competência e a autonomia dos professores na sua prática pedagógica.

Nesta perspectiva as contribuições do Gestar foram sugestões para desenvolver uma

prática pedagógica centrada na leitura e produção escrita a partir do texto como unidade de

ensino.

A população-alvo do GESTAR é constituída por escolas de Ensino Fundamental

localizadas nas Zonas de Atendimento Prioritário (ZAP) das regiões mencionadas acima,

atendidas pelo Fundescola – Fundo de Fortalecimento das Escolas.

Considerando a situação concreta dos professores participantes, especialmente o fato

de já estarem em exercício, e a dispersão geográfica das escolas em que trabalham. O

Programa Gestão da Aprendizagem Escolar foi desenvolvido na modalidade de educação a

distância, com momentos presenciais voltados para o acompanhamento da prática e apoio à

aprendizagem dos professores cursistas.

Participamos do curso disponibilizado aos professores da Rede Municipal de Ensino

que atuavam nas 2ª, 3ª e 4ª séries do Ensino Fundamental com carga horária de 360 horas /

aula, sendo ministrado em períodos opcionais, vespertino e noturno, com atividades

presenciais e não presenciais. As atividades não presenciais consistiam na aplicação de

atividades sugeridas nas oficinas com a turma que o professor era regente entregávamos

relatórios do desenvolvimento dessas atividades juntamente com algumas atividades de

alunos. As oficinas aconteciam a cada quinze (15) dias e a duração era de 4 horas / aula,

distribuídas entre Língua Portuguesa e Matemática, num período de 2 anos, sob a orientação

de um formador na área de Matemática e um formador na área de Língua Portuguesa, ambos

pertencentes a Secretaria Municipal de Educação, capacitados no ano de 2000 com curso

piloto com duração de 200 horas, aula sendo estes divididos em 4 encontros em Goiânia-GO,

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um em Brasília-DF, e um em Salvador –BA . Nesses encontros os formadores pilotos

preparavam aulas com os teóricos Ana Maria Kaufman, Ingedore Villaça Koch, Roberto

Kamacho e outros, as quais ministravam para os especialistas do Ministério da Educação e

Cultura (MEC) e do Instituto Qualidade no Ensino (IQE) , sendo avaliados na aplicabilidade

dos conteúdos . (Fonte: dados das pesquisadoras e formadoras do Gestar).

Coerente com a finalidade que se propõe a qualidade do atendimento ao aluno, o

Programa GESTAR orienta a formação dos professores para atuarem na escola com alunos do

Ensino Fundamental. Assim, todos os esforços confluem para um importante alvo, a

qualidade da aprendizagem nos quatro primeiros anos da fase de escolarização, quando os

alunos adquirem importantes ferramentas para a elaboração das formas do pensamento.

A orientação para o aluno constitui a marca específica do Programa Gestão da

Aprendizagem Escolar. Como o próprio nome sugere, o GESTAR é mais do que um curso de

formação continuada, incluindo outras ações articulares de intervenção na prática cotidiana do

cursista. Compreendendo: Formação continuada em serviço; Avaliação diagnóstica dos

alunos; Apoio a aprendizagem dos alunos.

Considerando a opção pelo foco na escola e no aluno, o curso de formação Continuada

em Serviço aborda prioritariamente as áreas de Língua Portuguesa e Matemática, no currículo

dos quatros anos iniciais do Ensino Fundamental, visando não apenas à construção de

conteúdos, mas também ao desenvolvimento da linguagem escrita e da linguagem

matemática, que se prestam à necessidade de trabalhar com o pensamento lógico, as relações

simbólicas, as representações, as expressões, a interpretação e a construção de sentidos.

2. LEITURA E ESCRITA: DIALOGANDO COM OS TEÓRICOS

[...] Eis a primeira e talvez a mais importante estratégia didática para a prática de leitura: o trabalho com a diversidade textual. Sem ela, pode-se até ensinar a ler, mas certamente não se formarão leitores competentes. (PCN, 2001, p.55)

Neste capítulo apresentamos uma visão panorâmica sobre as concepções dos teóricos

ressaltando a importância de escolhermos o texto como centro das atividades de ensino

aprendizagem na alfabetização. Embora os autores comunguem os mesmos ideais de formar

leitores e escritores competentes, não se tem a pretensão de formar escritores profissionais o

que pode até chegar a acontecer e deve ser grande motivo de orgulho para educação, mas

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pretende-se sim, dar condições para uso da escrita como ferramenta necessária a vida

moderna.

A linguagem está ligada à vida humana desde os primórdios dos tempos, e ao longo da

história tornou-se de fato, objeto de estudo, estrutura, organização e relevância nas relações

sociais, colocar-se como educador na era da comunicação é conscientizar-se da importância

do seu papel, levando-se em conta que cada informação modifica algumas dimensões de

nossa inter-relação com o mundo da percepção da realidade e a interação com o tempo e

espaço.

Ao conceber que a linguagem é tecida nas relações sociais e que a criança se apropria

de conhecimentos a partir de atividades desenvolvidas no meio social, compreendemos que a

aquisição da leitura e da escrita são imprescindíveis para agir com autonomia nas sociedades

letradas. Portanto, a leitura e a escrita são desafios permanentes que implicam refletir sobre as

práticas e as concepções adotadas ao iniciar a criança no mundo letrado.

Para fundamentar esta pesquisa faremos uma reflexão sobre o que os teóricos pensam

da leitura e a escrita, pretende-se também destacar as contribuições para o sucesso da vida

escolar do aluno.

Desde o início dos tempos houve a necessidade do homem registrar seus

conhecimentos, suas emoções, sua maneira de viver o mundo. A partir do momento que se

desenvolveu a escrita, esta passou a ser a forma predominante de registro, contribuindo para

cada momento histórico na evolução da escrita de seus descendentes, porém a escrita ao ser a

transcrição gráfica da informação que se pretende transmitir terá que ser aprendida, e a escola

como instituição marcada pela organização política-pedagógica é por excelência o espaço

para desenvolver essas habilidades.

O domínio da língua, oral e escrita, é fundamental para participação social efetiva,

pois é por meio dela que o homem se comunica, tem acesso a informação, expressa e defende

pontos de vista, partilha ou constrói visões de mundo, produz conhecimento. (PCN, 1998, p.

15)

Para Paulo Freire (2001, p.11), “a compreensão crítica do ato de escrever não se

esgota na decodificação pura da palavra escrita, mas se antecipa na inteligência do mundo”.

Compreende-se então, que a aprendizagem da leitura e da escrita não acontece de forma

espontânea, ao contrário, exige uma ação deliberada do professor, conseqüentemente uma

qualificação de quem ensina, pois é o professor que deverá intermediar o processo da

aquisição da leitura e da escrita aos alunos, oportunizando para que estes estabeleçam

relações entre letras e sons e se coloquem como sujeitos produtores da sua aprendizagem.

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Vygotsky (1989), considera que o contato com a cultura produzida pela humanidade e

as relações sociais permitem a aprendizagem.

Ao estimular perspectivas diversas para promoção da leitura e da escrita e sugerir

caminhos para objetivação da compreensão destas, torna-se um ato sócio-cultural e que ganha

real significado se visto como campo aberto às diferentes formas de expressão. Sabemos que

esta dicotomia aproxima a criança do universo letrado, instiga a curiosidade pelos livros e

seus conteúdos, colaborando assim para democratização de um dos mais valiosos patrimônios

humanos, a escrita, que como objeto sócio-cultural, deve estar disponível a todos, mesmo

aqueles que ainda não aprenderam a ler convencionalmente.

Cagliari (1998) enfatiza que, a leitura é a extensão da escola na vida das pessoas e que

tudo que se ensina na escola está diretamente ligado à leitura, portanto a leitura é a realização

do objetivo da escrita. Quem escreve, escreve para ser lido.

Se a proposta é formar alunos que saibam produzir e interpretar textos de usos sociais,

isto implica colocar o aluno como sujeito no papel de leitor e escritor, compartilhando as

variadas facetas que a leitura e a escrita podem oferecer: ler para buscar informações, ler por

prazer, para se divertir, para compartilhar com o outro. Assim como se escreve para expressar

idéias, sentimentos, organizar idéias, comunicar-se. Dessa forma “A leitura é um processo no

qual o leitor realiza um trabalho ativo de construção de significado do texto” [...] (PCN,2001,

p. 53)

Já se sabe que o segredo da alfabetização é a leitura. Alfabetizar é, na sua essência, ensinar alguém a ler, ou seja, decifrar a escrita. Escrever é uma decorrência desse conhecimento, e não o inverso. Na prática escolar, parte-se sempre do pressuposto de que o aluno já sabe decifrar a escrita, por isso o termo “leitura” adquiriu outro sentido. Trata-se então da leitura para conhecer um texto escrito. Na alfabetização a leitura, é o objetivo maior a ser atingido. Os próprios textos escritos são, na maioria das vezes, pretexto para trabalhar a leitura como decifração. (CAGLIARI, 1998, p. 312)

Cagliari defende que a criança para ser alfabetizada, não precisa aprender a escrever,

mas sim “aprender a ler”, em outras palavras, a alfabetização realiza-se quando o aprendiz

descobre como o sistema de escrita funciona, isto é, quando aprende a ler, a decifrar a escrita.

Portanto a descoberta da escrita é conseqüência do domínio da leitura.

De acordo com essas premissas, é natural desejarmos que o aluno ao dominar a leitura

e a escrita se torne apto a interpretar qualquer tipo de informação, resolvendo problemas do

seu cotidiano no universo da comunicação social.

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Emilia Ferreiro (1986), também contribui com a reflexão de novos conceitos teóricos,

iniciando a instauração de um novo paradigma para interpretação de como a criança processa

a construção da língua escrita. Com a investigação evolutiva no campo da escrita, Ferreiro e

Teberosky trazem a possibilidade de melhor se entender o desenvolvimento da linguagem

escrita. Neste sentido oferece-nos um instrumental de possibilidades de observar o aluno no

seu processo de aquisição de escrita, verificando o que ele sabe e o que não sabe, e o que pode

realizar com a interferência do professor. Neste enfoque, a descrição das fases evolutivas

ultrapassa o nível diagnóstico e contribui na informação do esboço de situações de

aprendizagem.

[...] pretendemos demonstrar que a aprendizagem da leitura, entendida como questionamento a respeito da natureza, função e valor desse objeto cultural que é a escrita, inicia-se muito antes do que a escola imagina, transcorrendo por insuspeitados caminhos. Que além dos métodos, dos manuais, dos recursos didáticos, existe um sujeito que busca a aquisição do conhecimento, que se propõe problemas e trata de solucioná-los, segundo sua própria metodologia... Insistiremos sobre o que se segue: trata-se de um sujeito que procura adquirir conhecimento, e não simplesmente de um sujeito disposto ou mal disposto a adquirir uma técnica particular. (FERREIRO, 1986, p. 11)

É necessário, portanto, organizar situações de aprendizagens que possibilitem a

discussão e reflexão sobre a escrita, porém essas situações só acontecem quando o professor

conhece as concepções que os alunos possuem sobre como escrever e assim possa intervir

para ajudá-los a pensar sobre elas e avançar para além delas, oferecendo variados materiais

impressos de leitura, que sirvam como referencia e fonte de informação ao processo de

aquisição da linguagem escrita.

Para Piaget (1983), em nenhum momento o conhecimento está pronto ou acabado, mas

sempre em construção, graças às interações do indivíduo com o meio físico e social. Isso

significa que existe uma relação ativa da pessoa que aprende. Assim a exposição da criança a

atos de leitura existentes no ambiente social em que vive, cria oportunidades para que ela

reflita sobre esse objeto.

Neste sentido, Ferreiro (1985), desviou o foco de “como se ensina para o como se

aprende”, colocando assim a escrita no seu devido lugar como objeto sócio-cultural do

conhecimento, centralizando a criança como sujeito ativo na sua aprendizagem.

Vygotsky (1989), o aluno não é tão somente o sujeito da aprendizagem, mas, aquele

que aprende junto ao outro o que seu grupo social produz.

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Segundo a teoria de Emilia Ferreiro (1986), a criança elabora hipóteses na evolução da

escrita, nesse processo de construção, ela passa por quatro níveis até que seja alfabetizada:

• Pré-silábica: a criança ainda não consegue relacionar as letras com os sons da língua

falada. O que escrevem são representações de símbolos que se deparam no seu cotidiano, cada

um só pode interpretar a sua própria escrita, nesta fase consideram que a escrita é

proporcional ao tamanho do objeto, fazendo corresponder a ele um traço maior ou menor.

• Silábica: interpreta a letra à sua maneira, a criança atribui a cada letra ou marca escrita, o

registro de uma sílaba falada. Esta estratégia leva à criança a superação entre forma escrita e a

oralidade, com hipótese de que a escrita representa partes sonoras da fala. Neste momento

surge o conflito com as idéias iniciais de que necessita pelo menos de três caracteres para

escrever uma palavra e que as letras não podem ser repetidas. Esse conflito faz com que ela

avance para outro nível.

• Silábica-alfabética: caracteriza-se por um momento de transição, em que a criança sem

abandonar a hipótese anterior ensaia em alguns seguimentos a análise da escrita em termos

dos fonemas (escrita alfabética). Mistura a lógica anterior com a identificação de algumas

sílabas, ao invés da omissão anterior de letras, agora a criança agrega mais caracteres na

escrita tentando aproximar-se do princípio alfabético. “Ela então começa a perceber que

escrever é representar progressivamente as partes sonoras das palavras, ainda que não o faça

corretamente”.

• Alfabética: nesta fase a criança já venceu partes dos conflitos para compreensão da

escrita. Cada um dos caracteres da escrita corresponde a valores menores que a sílaba, analisa

o som, dos fonemas das palavras a serem escritas por ela, dominando o valor das letras e

sílabas.

A escrita numa perspectiva evolutiva dota o alfabetizador de um aparato teórico que

lhe permite olhar o erro da criança de forma construtivo. Segundo Piaget, deve se respeitar o

nível de desenvolvimento das crianças, não se pode ir além de suas capacidades, nem deixá-

las agir sozinhas.

Diante de todo esse contexto, a principal tarefa do professor é aprender a observar e

entender a evolução da criança, para que possa trabalhar a partir do nível de conceitualização

da mesma. Portanto o objetivo de Ferreiro é integrar o conhecimento espontâneo da criança ao

ensino, dando-lhe maior significado.

Vygotsky (1989), assim caracteriza a escrita:

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É uma linguagem feita apenas de pensamento e imagem, faltando-lhe as qualidades musicais, expressiva e de entonação, características da linguagem oral. Ao aprender a escrever, a criança tem de se libertar do aspecto sensorial da linguagem e substitui as palavras por imagens de palavras [...] A escrita é também um discurso sem interlocutor, dirigido a uma pessoa ausente ou imaginaria ou a ninguém em particular, situação essa que, para criança, é nova e estranha [...] Na conversação, todas as frases são impelidas por um motivo: o desejo ou a necessidade conduzem os pedidos, as perguntas arrastam consigo as respostas, o espanto leva à explicação [...] No discurso escrito somos obrigados a recriar a situação, a representá-la para nós [...] A ação de escrever exige também da parte da criança uma ação de analise deliberada. Quando fala, a criança tem uma consciência das operações mentais que executa. Quando escreve, ela tem de tomar consciência da estrutura sonora de cada palavra, tem que dissecá-la e reproduzi-la em símbolos alfabéticos, que tem de ser memorizados estudados de antemão. (VYGOTSKY, 1989, p. 131)

Segundo Vygotsky (1989), para escrever a criança executa exercícios cognitivos

complexos mobilizando todos os conhecimentos prévios que possui sobre a escrita e é

obrigada a fazer escolhas e decidir sobre a forma mais adequada de expressar aquilo que

pretende, ou seja, tomar consciência do que irá produzir, através de diferentes estratégias do

professor fazendo com que a escrita deixe de ser uma atividade mecânica e passe a ser uma

atividade desafiadora.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais (1997) explicita que: durante o Ensino

Fundamental, o aluno deverá tornar-se capaz de interpretar diferentes textos que circulam

socialmente, de assumir a palavra e, como cidadão, de produzir textos eficazes nas mais

variadas situações. Portanto, cabe ressaltar também, as considerações dos teóricos sobre a

diversidade de gêneros textuais na construção de leitores e escritores competentes.

Quanto à produção de textos, dizem os Parâmetros Curriculares de Língua Portuguesa:

O trabalho com produção de textos tem como finalidade formar escritores competentes capazes de produzir textos coerentes, coesos e eficazes. [...] um escritor competente é alguém que ao produzir um discurso, conhecendo possibilidades que estão postas culturalmente, sabe selecionar o gênero no qual seu discurso se realizará escolhendo aquele que for apropriado aos seus objetivos e a circunstancia enunciativa em questão (PCN, 1997, p. 65)

Considerando que na vida social o aluno está permanentemente em contato com os

diferentes tipos de textos e já conhece algumas características dos mesmos, é necessário,

porém, sistematizar esse conhecimento. Então é tarefa da escola promover situações que

favoreçam a criança o reconhecimento dos gêneros textuais, de modo que aprendam a

produzi-los e utilizá-los nas diversas situações de comunicação. Sabe-se que as crianças têm

ritmos e modos diferentes de aprender, por isso, mesmo que os alunos passam um longo

tempo cometendo erros antes de estabilizarem o conhecimento das convenções escritas. É

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preciso trabalhar as questões textuais muitas vezes, e de formas diferentes, até que a criança

descubra as possibilidades e convenções do sistema alfabético-ortográfico. Cabe salientar que

a escrita de textos espontâneos traz pistas sobre o que as crianças sabem, esta informação

possibilita ao professor planejar o trabalho para aprofundar o conhecimento da língua.

Focambert (1994) afirma ser o meio uma grande contribuição para compreensão do

ensino da leitura. Na fase do aprendizado, o meio deve proporcionar à criança toda ajuda para utilizar textos verdadeiros e não simplificar os textos para adaptá-los às possibilidades atuais do aprendiz. Não se aprende primeiro a ler palavras, depois frase, mais adiante textos, e, finalmente, textos dos quais se precisa. (FOCAMBERT, 1994, p. 31)

Diante do exposto uma proposta de alfabetização que contempla a diversidade textual,

deverá utilizar textos reais. O texto é o “lugar” de aprender a ler e escrever e a refletir sobre as

regularidades da escrita.

Cagliari (1998, p. 209), afirma que:

Se o professor alfabetizador deve trabalhar sempre que possível com textos, os alunos também devem estar envolvidos com a problemática da linguagem, analisando-a dentro de um contexto real de uso, ou dentro da própria linguagem, como é o caso do estudo das relações entre letras e sons. Isso faz com que os alunos passem da habilidade de produzir textos orais para a habilidade de produzir textos escritos; da habilidade de produzir textos no estilo da fala do dia-a-dia para a habilidade de produzir textos segundo as exigências escolares e culturais.

Portanto para aprender a escrever, é necessário ter acesso à diversidade de gêneros

textuais. O desenvolvimento das habilidades de leitura e escrita depende não só das

estratégias utilizadas pelo professor e aluno no exercício de compreensão de texto, como

também do acesso que esse aluno tiver aos diferentes portadores de textos presentes na vida

moderna. Compreendemos assim, que a leitura e a escrita de textos diversificados favorecem

ao aluno a capacidade de analisar criticamente os usos lingüísticos e faz com que os

momentos de aprendizagem estreitem os laços com a função social da linguagem atrelada à

sua utilização cotidiana e veiculando intenções diferentes.

Em se tratando do uso da diversidade textual, Kleiman afirma que: [...] quanto mais diversificada a experiência de leitura dos alunos, quanto mais familiaridade eles tiverem com textos narrativos, expositivos, descritivos, mais conhecida será a estrutura desse texto, e mais fácil a percepção das relações entre a informação veiculada no texto e a estrutura do mesmo. (KLEIMAN, 1993, p. 8 )

Neste contexto, o legado que a educação pode oferecer aos alunos é prepará-los para

um processo de aquisição da escrita, mergulhando-a no universo significativo de cada texto

completo, através da leitura e exploração de diferentes gêneros textuais, mostrando que ler é

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uma forma de aprender a pensar, tanto quanto é uma prazerosa maneira de desvendar o

mundo e a si mesmo.

Em suma, tendo como pressupostos os fundamentos teóricos explicitados passaremos

a expor como foram realizados os caminhos da pesquisa-ação e da nossa prática como

docente nas séries iniciais do Ensino Fundamental.

3. METODOLOGIA DA PESQUISA: O CAMINHO CONSTRUÍDO NA

MEDIAÇÃO DO PROFESSOR NO PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO

Esta pesquisa caracteriza-se pelo estudo de pesquisa-ação, que é: [...] um tipo de pesquisa com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e participantes representativos da situação ou do problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo.(THIOLLENT, 2003, p.14).

A pesquisa-ação foi realizada no sentido de contribuir com o debate acerca da

discussão da temática da diversidade textual. Na fase inicial da pesquisa a coleta de dados foi

organizada por meio de uma avaliação diagnóstica, na qual detectamos os níveis de escrita da

criança. A partir destes resultados foram elaboradas atividades específicas para cada estágio

de aprendizagem, sendo trabalhadas em grupo. Os primeiros textos utilizados foram cantigas,

quadrinhas e parlendas, pois são textos prazerosos e de fácil memorização para possibilitar a

escrita de memória, quando memorizados, a criança já dispõe da estrutura do texto permitindo

que se preocupe apenas com os códigos alfabéticos para o registro.

Utilizamos também a entrevista que:

[...] é uma técnica que permite o relacionamento estreito entre entrevistado e entrevistador, além da obtenção de respostas mais ricas e detalhadas do questionamento. As entrevistas, segundo sua forma de operacionalização podem ser classificadas em estruturadas e não estruturadas. As entrevistas são estruturadas quando possuem as questões previamente formuladas, isto é, o entrevistador estabelece um roteiro prévio de perguntas, não há liberdade de alterações dos tópicos ou para fazer inclusão de questões frente às situações. Nas entrevistas não estruturadas o pesquisador busca conseguir através da conversação, dados que possam ser utilizados em análise qualitativa, ou seja, os aspectos considerados mais relevantes da pesquisa. (BARROS, 1986, p. 10-11).

As entrevistas foram realizadas com uma formadora do Gestar, uma supervisora

escolar e duas professoras. As questões foram previamente formuladas, portanto a técnica

utilizada classifica-se como entrevista estruturada.

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Questões direcionadas a coordenadora do Programa Gestão de Aprendizagem

Escolar.

1- Em que sentido o Programa Gestar contribui para a aquisição da leitura e da escrita das

crianças?

2- Como foi realizada a proposta em sala de aula?

3- Houve acompanhamento direto dos formadores em sala de aula?

4 – Quais as contribuições reais que o programa proporcionou para o aluno?

Questões direcionadas a Supervisora Escolar da escola envolvida na pesquisa.

1- Enquanto supervisora, qual sua opinião a respeito da Formação Continuada do Gestar?

2- Qual foi a mudança observada na prática das professoras após a Formação Continuada?

3- Qual a diferença observada nos alunos dos professores que participaram desta formação

continuada e aplicaram em sala de aula?

Questões direcionadas às professoras envolvidas na pesquisa.

1 – Que contribuições a Formação Continuada do Gestar trouxe para sua prática pedagógica?

2 – Que avanços foram observados na evolução da leitura e escrita dos alunos?

3 – Vocês consideram satisfatórios os resultados atingidos ao trabalhar com esta metodologia

nas classes de alfabetização?

Como nosso objeto de estudo foi centrado na aplicabilidade das diferentes tipologias

textuais e estratégias utilizadas pelo professor, como mediador no processo de aquisição da

leitura e da escrita do aluno, em uma turma de alfabetização, elaboramos um plano de

intervenção para aplicar com as demais turmas no decorrer do próximo ano letivo.

Buscamos analisar o processo de apropriação da leitura e linguagem escrita através de

diferentes tipologias textuais utilizando a metodologia do programa Gestar, por crianças que

estavam iniciando a fase de alfabetização escolar.

A pesquisa ocorreu no ano letivo de 2006 na Escola Municipal Elpídio Reis em uma

classe de 1ª série com 28 alunos no total, sendo selecionadas para análise 10 crianças que não

eram repetentes e não haviam feito a Educação Infantil. Foi selecionado 5 meninas e cinco

meninos, sendo que ambos encontravam-se na faixa de idade entre 6 e 7 anos. Após estes

critérios de seleção, os alunos foram agrupados pelo seu nível de escrita, com base na

elaboração das hipóteses de escrita de acordo com os estudos Ferreiro e Teberosky ( 1985)

que consiste em: pré-silábico, silábico, silábico-alfabético e alfabético.

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A professora envolvida na pesquisa participou do curso Gestar em 2002 e 2003 e

contou com a colaboração da supervisora escolar e uma formadora do programa Gestar que

faziam visitas periódicas além de sugerir atividades e estratégias para a leitura e produção de

textos.

DISCUTINDO RESULTADOS

Quando se pensa em educação, especialmente em alfabetização, como é o nosso caso,

ocorre uma série de dúvidas. Vamos partilhar algumas delas com vocês e oferecer-lhes nossas

conclusões a respeito.

Acreditamos que a escrita é uma necessidade de todos aqueles que vivem em

sociedade. Ela é, portanto, um direito social. Coerente com essa premissa, nada mais justo que

desejarmos que nossos alunos, ao dominar a leitura e a escrita, se tornem aptos a ter acesso a

qualquer tipo de informação, a resolver questões do dia-a-dia e a viver no mundo de hoje, o

mundo da comunicação. Em síntese, queremos instrumentá-los para exercitar sua cidadania,

fornecendo-lhes o uso dos códigos lingüísticos de modo a garantir-lhes o acesso a uma melhor

qualidade de vida em sociedade.

A atual tendência à esquematização da linguagem e ao uso de uma forma de

comunicação mais imediata (ícones, gráficos, esquemas) requer dos leitores, ou daqueles que

se preparam para sê-lo, uma familiaridade com essa linguagem. Dessa forma, procuramos

apresentar aos alunos uma ampla e variada tipologia textual, por entender que o espaço

escolar é o local em quem os alunos aprendem a dominar os conhecimentos já adquiridos e as

informações que lhes são apresentadas, pois preparar o aluno para alfabetização é reforçar

nele o contato com a variedade de situações que se apresentam e fazer com que as

informações que ele receba sejam também as mais variadas possíveis.

Aprender a ler e a escrever é um processo cognitivo que exige não somente a

motivação e a mobilização do alfabetizando como também sua participação ativa. Esse

processo tem um sentido por vezes inesperado. Sabemos que as crianças possuem ritmos

pessoais distintos. Entretanto, independente disso, é fundamental encararmos que todas elas

merecem ser observadas sob uma nova ótica em relação ao processo de alfabetização.

Portanto, além de ajustar o ensino aos ritmos individuais, é preciso levar o aluno a

perceber que ele participa das trajetórias de mudança que a sociedade apresenta, e sua ação ou

omissão podem modificar uma situação. É necessário ressaltar que não importa o grau de

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consciência que o aluno possui sobre o processo, e sim a compreensão que ele tem da

importância de sua participação. Nesse sentido, é preciso avaliar a adequação da quantidade e

da qualidade das informações que serão oferecidas durante o processo escolar.

Importante ressaltar que o envolvimento dos alunos em atividades pedagógicas de

interação em sala de aula é fundamental, pois possibilita o envolvimento entre: professores e

alunos, ambiente de sala de aula, sustentadas em abordagens metodológicas que fortaleçam os

princípios da contextualização, da natureza reflexiva e de interação em situações de apoio

didático, como a sala de aula, o livro didático e outros portadores de texto. O professor ao

organizar o trabalho escolar proporciona ou dificulta a interação do aluno com seu objeto de

conhecimento.

De acordo com as hipóteses de escrita já citadas, no capítulo anterior os alunos

selecionados, após um ditado de palavras do mesmo campo semântico, feito pela professora,

encontravam-se no seguinte estágio:

Sujeito 1 – nível de escrita pré-silábico utilizando apenas letra.

Sujeito 2 – nível de escrita garatuja. O aluno não tinha noções de como pegar o lápis

nem como utilizar o caderno e chorava dizendo que não sabia fazer.

Sujeito 3 – nível de escrita pré-silábico utilizando letras e números.

Sujeito 4 – nível de escrita pré-silábico utilizando letras e números.

Sujeito 5 – nível de escrita silábico sem valor sonoro.

Sujeito 6 – nível de escrita pré-silábico utilizando apenas letras.

Sujeito 7 – nível de escrita silábico com valor sonoro.

Sujeito 8 – nível de escrita garatuja. Segurava com dificuldade o lápis e não tinha

noções de espaço.

Sujeito 9 – nível pré-silábico utilizando letras e números.

Sujeito 10 – nível de escrita silábico sem valor sonoro.

Como vimos no capítulo anterior, a situação inicial dos 10 alunos selecionados para a

pesquisa, de acordo com o nível de escrita era a seguinte: dois alunos encontravam-se na fase

da garatuja (escreviam utilizando o rabisco), Piaget (1983) classifica essa fase sensório-

motora e pré-operacional. Cinco alunos estavam no nível pré-silábico hipótese esta explicada

por Ferreiro e Teberosky (1985), na qual as crianças ainda não fazem relação letra /som.

Sendo que destes três escreviam letras e números e dois apenas letras, os outros três estavam

no nível silábico, para as autoras esta fase constitui um grande avanço, pois a criança trabalha

com a hipótese de que a escrita representa partes sonoras da fala; cada letra vale por uma

sílaba sendo que apenas um possuía valor sonoro em sua escrita.

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A turma era composta por 28 alunos que iniciaram o ano letivo e não houve

transferência durante o ano letivo, apenas o ingresso de mais uma aluna no 4º bimestre que

encontrava-se no nível pré-silábico e que após trabalho sistematizado seguindo os padrões da

pesquisa encerrou o ano letivo alfabetizada.

Para fazer as explorações sobre a escrita criamos diferentes situações de produções, a

seguir apresentaremos textos de 5 alunos que foram selecionados para análise. Inicialmente a

produção escrita relacionada ao primeiro dia de aula. É verdade que só será possível decifrar o

que deveria ser escrito se colocar as palavras ditadas pela professora.

Inicialmente a professora registrou na lousa a data, o espaço para escrever o nome e

em cada linha que estava traçada na lousa colocou números de 1 até 5 e pediu para quem

soubesse que copiasse e escrevesse seu nome. Na seqüência ditou palavras pertencentes a um

mesmo campo semântico.

1 – formiga

2 – cavalo

3 – pato

4 – boi

5 – elefante

Vejamos, então, a primeira tentativa de escrita produzida por eles, considerando que

quando a criança escreve tal como acredita, oferece-nos um valiosíssimo instrumento para

análise, que necessita ser interpretado para poder ser avaliado.

4.1 Análise e comparação de textos

- Primeiras tentativas de escrita:

ILUSTRAÇÃO I – Texto do Sujeito A

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Fonte: Pesquisadoras, caderno do aluno.

O texto do sujeito A demonstra que a criança está na fase da garatuja.

Segundo Piaget (1983), a garatuja faz parte da fase sensório-motora (0 a 2 anos) e

parte da pré-operacional (2 a 7 anos). A criança demonstra extremo prazer nesta fase. A

figura humana é inexistente ou pode aparecer de maneira imaginária. Esta fase é caracterizada

por rabiscos amplos e desordenados, a criança tem como hipótese que o desenho é

simplesmente uma ação sobre a superfície e ela sente prazer ao constatar os efeitos visuais

que esta ação produziu.

Textos produzidos no final da pesquisa

Analisaremos a seguir a evolução da escrita produzida pelo mesmo aluno no final da

pesquisa.

ILUSTRAÇÃO VI – Texto do Sujeito A

Fonte Pesquisadoras, caderno aluno.

Conforme podemos observar o sujeito “A” venceu os obstáculos conceituais para a

compreensão da escrita, já realiza sistematicamente uma análise sonora dos fonemas das

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palavras que irão escrever, transpondo-as da hipótese de escrita pré-silábica para a hipótese

alfabética. Apesar da escrita das crianças conterem erros ortográficos e omissões de letras a

mesma não deixa de escrever. Por isso, consideramos que, se quisermos compreender os

processos elaborados pela criança na busca de entendimento da escrita é necessário analisar a

linguagem que orienta e organiza a atividade de escrever.

Portanto, a evolução da escrita da criança só é possível quando as atividades de leitura

e escrita em língua portuguesa ocupam partes das atividades diárias propostas as crianças

intencionalmente pelo professor em situações significativas.

4.2 Interpretando através de gráficos

Os gráficos 1 e 2 representam a totalidade de alunos envolvidos na pesquisa.

O gráfico 1 representa a situação dos alunos de acordo com o nível de escrita no início

da pesquisa.

Níveis de escrita dos alunos no início da pesquisa

0

1

2

3

4

5

6

Garatuja Pré-silábico

Silábico Silábico-alfabético

Alfabético

nº de alunos

Fonte: Dados da Pesquisa

De acordo com a análise feita, dois alunos se encontravam na fase da garatuja, ou seja,

registravam apenas rabiscos amplos e desordenados. Houve a predominância do nível pré-

silábico. Conforme amostragem, cinco alunos registravam letras e números demonstrando

aparente confusão entre ambos, não relacionando as letras com os sons da língua falada. O

restante, três alunos, encontravam-se no nível silábico, sendo que dois eram silábicos com

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correspondência e um silábico sem valor sonoro. Neste nível a estratégia utilizada pela

criança é atribuir a cada letra ou marca escrita uma sílaba falada. Para Ferreiro, é este fato que

constitui a hipótese silábica.

O gráfico 2 representa a situação dos alunos de acordo com o nível de escrita no

estágio final da pesquisa.

Níveis de escrita dos alunos no final da pesquisa

0

1

2

3

4

5

6

7

8

9

Garatuja Pré-silábico

Silábico Silábico-alfabético

Alfabético

nº de alunos

Fonte: Dados da Pesquisa

Podemos constatar por meio da leitura do gráfico que a maioria das crianças

pesquisadas alcançaram o nível desejado por todos os alfabetizadores, ou seja, nível

alfabético.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao observarmos as situações de comunicação no decorrer da história humana, o

homem utilizou-se de escritas rudimentares com o propósito de registrar e comunicar-se

através do tempo e do espaço.

Atualmente para uma melhor qualidade de vida em sociedade, para falarmos e

escrevermos de forma eficiente e adequada, devemos estar em contato constante e efetivo

com os mais variados tipos de mensagem que nos cercam, reconhecendo assim, que a língua

deve ser encarada como forma de interação humana e o texto como fonte de conhecimento e

prazer.

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Nesta perspectiva, buscamos por meio desta pesquisa refletir sobre a prática

pedagógica e as teorias que lhes dão sustentação, visando melhor desempenho na elaboração

de textos coerentes e claros, nos quais a criança passará de um processo de heteronomia para a

autonomia da escrita.

Pelo Programa Gestão de Aprendizagem Escolar (Gestar) ter a finalidade de contribuir

para a melhoria da qualidade do atendimento do aluno, enfocando a diversidade textual na

aquisição da leitura e da escrita, vimos por meio deste programa, um caminho norteador para

alfabetizar de forma diferenciada, tendo em vista os resultados não satisfatórios obtidos pelo

SAEB e Avaliação Externa da Rede Municipal de Ensino (REME).

Por meio da pesquisa-ação e as experiências vivenciadas na sala de aula através da

utilização do Gestar, ficou comprovado que é possível utilizar esta metodologia também na

alfabetização, tendo em vista que a finalidade deste programa é contribuir para a melhoria da

qualidade de ensino.

É fundamental que se leve em consideração os aspectos sociais e econômicos uma vez

que são elementos constitutivos do processo histórico social, pois esses aspectos interferem

no processo de alfabetização e na qualidade da aprendizagem do aluno.

Considerando que esses fatores de ordem social e econômico geram dificuldades na

realização do nosso trabalho e o professor sendo principal agente de transformação deve

assumir o compromisso de buscar estratégias para sanar as dificuldades das crianças.

Além de ajustar o ensino aos ritmos individuais é preciso levar o aluno a perceber que

ele participa direta e indiretamente das mudanças que a sociedade apresenta, e sua ação pode

modificar uma situação.

Nesse sentido acreditamos que as tipologias textuais são instrumentos de transmissão

de informação e conhecimentos significativos para a formação de crianças leitoras e

escritoras, pois mostrar desde cedo esta multiplicidade é uma forma de estimular o convívio, o

respeito e a valorização das diferenças sócio-cultural.

Diante dos dados coletados e analisados durante a pesquisa-ação, é possível alfabetizar

com competência utilizando o texto como base de ensino, melhorando o desempenho dos

alunos na elaboração de textos claros e coerentes. Evidenciou-se também, por meio da

comparação de textos no início e final da pesquisa a competência lingüística na leitura e

escrita dos alunos.

Nesta perspectiva a função primordial do professor é aceitar e envolver-se com os

desafios da sociedade moderna, tendo em vista que homens queremos formar, provocando o

diálogo, a discussão e a argumentação tornando a sala de aula um ambiente alfabetizador.

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Portanto, a escola é o espaço privilegiado para desenvolver um trabalho pedagógico onde

todos os envolvidos possam estar em igualdade de condições, pois “[...] o professor precisa

acreditar no que diz, ter convicção em seus ensinamentos para que os alunos também

acreditem e se sintam envolvidos. Precisa de preparo para ir ao rumo certo e alcançar os

objetivos que almeja.” (CHALITA, 2001, p.168)

Comunga da mesma idéia Demo, “Um professor que não é capaz de elaborar seu

projeto pedagógico e de o reelaborar permanentemente mostra que não sabe aprender e que

por isso mesmo não tem condição mínima de fazer o aluno aprender”. ( Pedro Demo: In

Jucimara Rojas. O ser professor: metodologia e aprendizagens, 2000, p 102)

Nesse sentido, é fundamental que o professor torne-se reflexivo, pesquisador, (re)

construtor, tanto da sua prática quanto no seu aprender, para que a criança também consiga

aprender a ler, escrever e (re) elaborar o seu conhecimento de forma reflexiva. Cada

professor, deve perguntar-se o porquê e o para que das atividades que são propostas as

crianças e decidir quais as mais adequadas para a sua aprendizagem.

Esta pesquisa não tem a pretensão de desenvolver ou impor uma nova metodologia,

mas socializar e contribuir com outros profissionais da área educacional uma experiência

positiva de alfabetizar com a diversidade de gêneros textuais tendo o professor como

mediador no processo da aquisição da leitura e da escrita dos alunos de forma competente,

estabelecendo relações com a forma de pensar e o modo de ser do grupo social ao qual

pertencem.

Portanto, cabe ao professor, possibilitar e ampliar o espaço de diálogo, discussão e

argumentação fundamentais na aprendizagem da cooperação e no desenvolvimento de

atitudes de autoconfiança, de capacidade de interagir e de respeito ao outro, valorizando o

convívio entre as diferentes culturas e ensinar valores básicos para o exercício de cidadania.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei nº 9.394, 24 de dezembro de 1996. BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: Língua Portuguesa. Brasília: Mec/ SEF, 1997. CAGLIARI, Luiz Carlos. Alfabetização e lingüística. São Paulo: Scipione, 1993.

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_____. Alfabetizando sem o bá-bé-bi-bó-bú. São Paulo: Scipione, 1998. CHALITA, Gabriel. Educação: a solução está no afeto. São Paulo: Editora Gente, 2001. CHELOTTI, R.R, ALCÂNTARA E.G, COUTINHO, R. A, (org) Aprender a aprender: estudos sobre aprendizagem. Campo Grande, MS: Ed. UFMS, 2006. DEMO, Pedro. Educar pela pesquisa. São Paulo: Autores Associados, 1997. FERREIRO, Emilia, TEBEROSKY, Ana. Psicogênese da língua escrita. Porto Alegre: Artes Médicas, 1985. FERREIRO, Emilia. Alfabetização em processo. São Paulo: Cortez, 1986. FILÁRTIGA, Sônia Fenelon. O desafio de escrita na alfabetização. In. Aprender a aprender: estudos sobre aprendizagem. Campo Grande, MS: Ed. UFMS, 2006. FOCAMBERT, J. A leitura em questão. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994. FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler. São Paulo: Cortez, 2001. JOLIBERT, Josette. Formando crianças leitoras. trad. Bruno C. Magne. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994. KLEIMAN, Ângela. Oficina de leitura. Campinas: Pontes, 1993. KLEIN, Lígia R. Alfabetização: quem tem medo de ensinar? São Paulo: Cortez; Campo Grande: Editora da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, 1996. KRAMER, Sonia, OSWALD, Maria Luiza (orgs.) Didática da linguagem: Ensinar a ensinar ou ler e escrever? São Paulo: Papirus, 2001. LEITE, Sérgio Antonio da Silva (org.) et al. Alfabetização e letramento: contribuições para as práticas pedagógicas. São Paulo: Komedi, 2005. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Programa de Gestão da Aprendizagem Escolar. Gestar I – Guia Geral. Brasília, 2005. PIAGET, Jean. Psicologia da inteligência. Rio de Janeiro: Zahar, 1983. RODRIGUES, Cássio, TOMITCH, Leda Maria Braga ... [et al.] Linguagem e cérebro humano: contribuições multidisciplinares. Porto Alegre: Artmed, 2004. ROJAS, Jucimara(org). O ser Professor: metodologias e aprendizagens. Campo Grande, MS: Ed. UFMS, 2000. SOARES, Magda. Alfabetização e Letramento. São Paulo: Contexto, 2004. THIOLLENT, Michel. Metodologia da Pesquisa-ação. 12. ed. São Paulo: Cortez, 2003.

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VYGOTSKY, L.S. A formação social da Mente. São Paulo: Martins Fontes, 1989.