Discurso das mães e participação das crianças na resolução ... · que essa relação é...

22
INTRODUÇÃO Nas últimas décadas, os psicólogos do desenvolvimento têm vindo a agrupar-se em duas grandes correntes. Os neo-nativistas que defendem que a evolução dotou a espécie humana de aptidões específicas para o conhecimento em áreas específicas, incluindo a matemática, a linguagem, a biologia e a psicologia (Fodor, 1992; Leslie, 2000). Noutra corrente situam-se aqueles que se centram nos aspectos culturais do desenvolvimento, em que o contexto cultural é considerado como a única condição que permite o desenvolvimento das estruturas cognitivas do ser humano. Porém, no quadro teórico que adoptámos não encaramos o desenvolvimento como uma dicotomia entre individual e social, mas antes como a diferenciação Vygotskiana entre duas linhas de desenvolvimento, a individual (natural) e a cultural. Tal como é definida por Vygotsky (1934/1985), a linha individual de desenvol- vimento diz respeito àquilo que o organismo consegue fazer sem a interferência directa do outro, enquanto a linha cultural de desenvolvi- mento consiste naquilo que o organismo conhece mas que tem origem nas acções em que tenta ver as coisas pela perspectiva do outro (Tomasello 1999, 2000), incluindo o uso de objectos, que se tornam símbolos. Mas à medida que o desenvolvimento vai decorrendo estas duas linhas ficam interligadas de tal forma, que é difícil distinguir o que provem de uma ou de outra. Por exemplo, a primeira vez que um bebé de 6 meses tiver contacto com uma colher usá-la-á para bater ou qualquer outra actividade, que Piaget (1967) designa como reacção circular secundária, adquirindo um conhecimento individual sobre as suas propriedades, construindo classificações práticas. Usar a colher para comer, isto é, na perspectiva do outro, só é possível na relação com outros mais competentes do seu grupo cultural, através da comunicação, em que a imitação tem um papel relevante. 543 Análise Psicológica (2010), 4 (XXVIII): 543-563 Discurso das mães e participação das crianças na resolução de tarefas de seriação: Impacto do desenvolvimento cognitivo e da linguagem das crianças e escolaridade das mães ZILDA FIDALGO (*) (*) ISPA-IU, Rua Jardim do Tabaco, 34, 1149-041 Lisboa; E-mail: [email protected]

Transcript of Discurso das mães e participação das crianças na resolução ... · que essa relação é...

Page 1: Discurso das mães e participação das crianças na resolução ... · que essa relação é apenas significativa entre os 12 e os 15 meses. Mais tarde os benefícios do apoio materno

INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas, os psicólogos dodesenvolvimento têm vindo a agrupar-se emduas grandes correntes. Os neo-nativistas quedefendem que a evolução dotou a espéciehumana de aptidões específicas para oconhecimento em áreas específicas, incluindo amatemática, a linguagem, a biologia e apsicologia (Fodor, 1992; Leslie, 2000). Noutracorrente situam-se aqueles que se centram nosaspectos culturais do desenvolvimento, em que ocontexto cultural é considerado como a únicacondição que permite o desenvolvimento dasestruturas cognitivas do ser humano.

Porém, no quadro teórico que adoptámos nãoencaramos o desenvolvimento como umadicotomia entre individual e social, mas antescomo a diferenciação Vygotskiana entre duaslinhas de desenvolvimento, a individual (natural)e a cultural. Tal como é definida por Vygotsky

(1934/1985), a linha individual de desenvol-vimento diz respeito àquilo que o organismoconsegue fazer sem a interferência directa dooutro, enquanto a linha cultural de desenvolvi-mento consiste naquilo que o organismo conhecemas que tem origem nas acções em que tenta veras coisas pela perspectiva do outro (Tomasello1999, 2000), incluindo o uso de objectos, que setornam símbolos.

Mas à medida que o desenvolvimento vaidecorrendo estas duas linhas ficam interligadasde tal forma, que é difícil distinguir o queprovem de uma ou de outra. Por exemplo, aprimeira vez que um bebé de 6 meses tivercontacto com uma colher usá-la-á para bater ouqualquer outra actividade, que Piaget (1967)designa como reacção circular secundária,adquirindo um conhecimento individual sobre assuas propriedades, construindo classificaçõespráticas. Usar a colher para comer, isto é, naperspectiva do outro, só é possível na relaçãocom outros mais competentes do seu grupocultural, através da comunicação, em que aimitação tem um papel relevante.

543

Análise Psicológica (2010), 4 (XXVIII): 543-563

Discurso das mães e participação das

crianças na resolução de tarefas de

seriação: Impacto do desenvolvimento

cognitivo e da linguagem das crianças e

escolaridade das mães

ZILDA FIDALGO (*)

(*) ISPA-IU, Rua Jardim do Tabaco, 34, 1149-041Lisboa; E-mail: [email protected]

Page 2: Discurso das mães e participação das crianças na resolução ... · que essa relação é apenas significativa entre os 12 e os 15 meses. Mais tarde os benefícios do apoio materno

O desenvolvimento da linguagem na criançaestaria igualmente relacionado com o tipo deapoio (scaffolding) verbal e não verbalproporcionado pelas mães durante os jogos nosdois primeiros anos de vida (Bruner, 1983;Snow, 1972; Rome-Flanders, Cronk, & Gourde,1995), nomeadamente quanto à capacidade dacriança em inferir as regras da comunicação. Omomento de transição para a adaptação culturalhumana dar-se-ia cerca dos 9/12 meses(Tomasello, 2000), quando a criança começa aenvolver-se em jogos que implicam também umadulto e um objecto ou acontecimento externo,ao qual estão os dois intencionalmente atentos(atenção conjunta), estabelecendo níveis de“intersubjectividade” ou compreensão partilhadasobre a actividade (Rommetveit, 1971/1974). Masnem todos os estudos demonstram a existênciade uma relação significativa entre apoio maternoe o nível de aquisição da linguagem nas crianças(Rome-Flanders et al., 1995), fazendo-nos crerque essa relação é apenas significativa entre os12 e os 15 meses. Mais tarde os benefícios doapoio materno estendem-se a diferentes aspectosdo desenvolvimento, que não é possível desligarda linguagem.

Conceito de mediação cognitiva e meta-cognitiva

O conceito de mediação é usado por Vygotsky(1934/1985) para explicar que todos osprocessos especificamente humanos seriamrealizados através de instrumentos psicológicos,como a linguagem, os sinais e os símbolos,usados pelo adulto para atingir a atençãoconjunta (simultânea), apropriados pela criançadurante a actividade conjunta, posteriormenteinternalizados e usados autonomamente.

Karpov e Haywood (1998) distinguem emVygotsky, dois tipos de mediação: a mediaçãocognitiva e a mediação metacognitiva. Amediação metacognitva inclui a facilitação dedeterminados processos de auto-regulação,utilizando instrumentos semióticos, nomeada-mente a linguagem, que permitem o auto--planeamento, auto-controlo e auto-avaliaçãodas acções em função do objectivo. A mediaçãometacognitiva dos processos psicológicos temorigem na comunicação interpessoal. O uso do

discurso egocêntrico, ou privado, segundoVygotsky (1934/1985), teria essa função a nívelindividual, traduzindo a internalização da funçãoreguladora da linguagem, no início exercidapelo outro (Bruner, 1983; Cole, 1985; Rogoff,1990; Wertsch, 1985; Wood & Middleton, 1975;Wood, Bruner, & Ross, 1976).

O segundo tipo de mediação, a mediaçãocognitiva, referir-se-ia à aquisição de instru-mentos específicos necessários à resolução deproblemas num determinado domínio e está maisrelacionada com o conhecimento declarativo,verbalista, em que se incluem os conceitosdefinidos (Vygotsky 1934/1985).

Se o desenvolvimento de um conceito seinicia quando a criança aprende o termo ousignificado da palavra que designa esse mesmoconceito (Vygotsky, 1934/1997), a aquisição deinstrumentos psicológicos, incluindo osconceitos construídos ao longo da história dohomem, implica não só a aquisição de algumconhecimento verbal, mas também de procedi-mentos e estratégias relacionados com essesconceitos, isto é, de mediação cognitiva e meta-cognitiva.

Bronckart (1992, 1995) considera, por seulado, que a função ilocutória do discurso é aprimeira significação que podemos atribuir ànoção de mediação semiótica no sentido em quefalar é agir no mundo externo e sobre o outro,para obter resultados determinados, ou seja, amediação metacognitva exerce-se através deactos de linguagem. A mediação cognitiva teriaque ver com o conteúdo proposicional, outópicos dos enunciados, que podem diferir, paraum mesmo domínio de resolução de problemas,em função do conhecimento dos conceitos esignificado das tarefas. Esta seria a segundasignificação da noção de função semiótica, deacordo com o mesmo autor.

As expressões referenciais (Wertsch, 1985)utilizadas pelas mães para fazer convergir aatenção conjunta sobre um determinado objecto,constituem um indicador das características dosobjectos consideradas cognitivamente perti-nentes para a resolução da tarefa, impondo umaperspectiva e uma atitude sobre como as coisasdevem ser vistas, constituindo oportunidadespara a introdução de conceitos. Mas a criança sóconsegue compreender completamente a tarefa

544

Page 3: Discurso das mães e participação das crianças na resolução ... · que essa relação é apenas significativa entre os 12 e os 15 meses. Mais tarde os benefícios do apoio materno

quando é capaz de ver o objecto pela perspectivado adulto, sendo essa partilha de significadosigualmente conseguida através da linguagem(Callaghan & Rankin, 2002; Tomasello 1999;Wertsch, 1985).

Resolução conjunta de problemas entre pais ecrianças e área de desenvolvimento potencial(ou proximal)

Nos anos que precedem a entrada para oensino pré-escolar, e poucos meses após onascimento, a resolução conjunta de problemas,no contexto de situações experimentais, ou quaseexperimentais, tem sido cada vez mais utilizadacom o objectivo de identificar a natureza dosprocessos instrucionais dos pais, em particularda mãe, e, por outro lado, para explorar a relaçãoentre esses comportamentos e a participaçãoe/ou desempenho das crianças, na aquisição denovas estratégias e significados.

Entende-se por resolução de problemas anecessidade de atingir um objectivo (goal). Umadefinição restrita de objectivo pode ser umestado mental que representa uma situaçãodesejada no estado do mundo. Para compreendere representar a estrutura de “um comportamentodirigido a um objectivo” é necessário que acriança seja capaz de compreender as relaçõescausais entre pares de acções, ligar múltiplasacções numa estrutura coerente e organizada, efinalmente atribuir um estatuto particular a umelemento específico, que será usado como focoda representação (Travis, 1997). Para isso énecessário ultrapassar vários obstáculos, o quepode ser dificultado pelas estratégias adoptadase/ou falta de conhecimento, que impedemigualmente a avaliação do resultado do processode resolução (DeLoache, Miller, &Pierroutsakos, 1998). Assim, a resolução deproblemas inclui uma actividade, uma tarefaconcreta, e uma actividade cognitiva específica.

A apropriação de novas estratégias esignificados, dar-se-ia na zona de desenvolvi-mento proximal, constructo definido como adiferença entre o que a criança é capaz de fazersozinha e o que faz sob a orientação ou ajuda deum adulto (Vygotsky, 1934/1985). Esta área dedesenvolvimento proximal seria construída nadinâmica da própria interacção, orientada para

um objectivo determinado, normalmenteestabelecido pelo adulto, e negociado com acriança no processo interactivo. A performanceindependente da criança dependeria largamentedo tipo de orientação oferecida pelo adulto.

Vários estudos põem em evidência que osobjectivos e estratégias de scaffolding desen-cadeados pelos adultos, qualquer que seja aidade das crianças, consistem essencialmenteem aumentar o seu conhecimento, facilitar aexecução de uma tarefa difícil e manter aatenção da criança, em função da percepção quetêm das suas competências (Wood &Midddleton, 1975; Wood, Bruner, & Ross,1976). Contudo o tipo e quantidade descaffolding podem variar em função da activi-dade em causa e da cultura (Martin & Reutzel,1996). Os resultados da ajuda dada pelas mãestambém não têm sempre o mesmo efeito,dependendo também das competências dascrianças em determinados domínios, e o seuefeito pode não ser imediato.

Scaffolding e conhecimento implícito

Karmiloff-Smith (1992) propõe um modelo dedesenvolvimento, que contribuiria para explicaros efeitos não imediatos da ajuda do adulto ou deoutros mais competentes, o RepresentationalRedescription Model (RR), ou Modelo Redes-critivo Representacional, em que o processo depassagem do conhecimento implícito paraconhecimento verbalmente explícito, na suaforma declarativa, consiste num processo deauto-organização endógeno que envolve umatendência interna (internal drive) para umamelhor compreensão e controle.

O modelo RR pretende explicar como asrepresentações das crianças se tornam progressi-vamente mais flexíveis. Este modelo envolve umprocesso cíclico em que a informação existentecom uma finalidade (purpose) específica, setorna progressivamente disponível, “através deprocessos redescritivos” (Karmiloff-Smith, 1992,p. 25), para outros domínios do sistema cogni-tivo. Karmiloff-Smith distingue o conceito dedomínio do conceito de modularidade (Fodor,1992), considerando como domínios a lingua-gem, a física, a matemática e ainda microdomínios, enquanto subconjuntos dos grandes

545

Page 4: Discurso das mães e participação das crianças na resolução ... · que essa relação é apenas significativa entre os 12 e os 15 meses. Mais tarde os benefícios do apoio materno

domínios do conhecimento. O RR considera trêsfases em que o conhecimento pode ser re--representado, ou recodificado: o conhecimentoImplícito (1) e o conhecimento Explícito (2) e(3). A fase de conhecimento explícito 3 envolveo relato verbal dos processos cognitivos e entra,portanto, no domínio da metacognição. Na fase 2as crianças têm acesso consciente às represen-tações, mas ainda não fazem o relato verbal. Apassagem de uma fase para outra implica umarecodificação da informação, que é essencial-mente um processo endógeno.

No conhecimento implícito as representaçõestêm a forma de procedimentos para analisar eresponder a estímulos externos, são informaçãocodificada sob a forma procedimental, são“aglutinadas” e por isso não é possível estabele-cer ligações dentro do mesmo domínio ou entredomínios do conhecimento. Este conhecimento édifícil de transferir para tarefas semelhantes, e épouco ou nada afectado pela informação externa.Pine e Messer (1998) afirmam que, de facto,quando as crianças estão ainda ao nível doconhecimento implícito, têm dificuldade em usara informação e a ajuda externa.

Trata-se de um processo por fases (e não porestádios) que ocorrem num ciclo repetitivo(Karmiloff-Smith, 1992) em diferentesdomínios, sendo possível passar directamente dafase 1 para a fase 3. Por outro lado, os comporta-mentos da fase 1 e 3 podem ser semelhantes,sendo necessário distinguir a mudança compor-tamental da mudança representacional.

Aparentemente este modelo opor-se-ia àperspectiva sócio-constructivista, derivada dasteses de Vygotsky, e explicaria, pelo menos emparte, os resultados obtidos por Kontos (1983).Com efeito, Kontos (1983) e Kontos e Nicholas(1986), sugerem igualmente que a auto--directividade e as tentativas solitárias erepetidas para resolver um problema, teriam,pelo menos, tanta importância como o apoio emcooperação.

Na perspectiva sócio-construtivista Rogoff eGardner (1984), Freund (1990), Gauvain (1995),Elllis e Gauvain (1992), Delgado-Gaitan (1993),por exemplo, põem em evidência o papel doadulto na eficácia do ensino em cooperação naposterior realização autónoma. Estes resultadossão também confirmados por Doise e Mugny

(1997), que mostram que a interacção entrepares, tal como o scaffolding do adulto, facilitamo desenvolvimento.

Também Murphy e Messer (2000), seguindo omodelo RR, mostraram que a maioria (76%) dascrianças envolvidas numa situação descaffolding com adultos obtiveram ganhos numatarefa que não lhes era familiar, de equilíbrio//flexibilidade de pequenas varas de madeira, emparticular as crianças que se encontravam nonível de conhecimento implícito, em comparaçãocom as que trabalharam sozinhas ou com pares.O que é igualmente consistente com a aborda-gem sócio-construtivista. No entanto, no mesmoestudo, 100% das crianças que trabalharamsozinhas e se encontravam no nível 2 deAbstracção progrediram. Estes resultadosimplicam que haverá momentos e domínios dodesenvolvimento em que trabalhar sozinho serátanto, ou mesmo mais eficaz do que com a ajudade um tutor.

Tolmie, Thomson, Foot, Whelan, Morrison eMcLaren (2005) confirmam estes resultados.Constatando que a aprendizagem de cor dasregras de trânsito não contribuía para alterar oscomportamentos das crianças (5 a 8 anos),verificaram que sob a orientação do adulto,melhoraram bastante o seu comportamento, eque este progresso ainda foi superior quando ainteracção com o adulto foi complementada coma discussão entre pares. Além disso, constataramque esta melhoria era mediada pelo nível derepresentação (verbalmente explícito ou meta-cognivo), demonstrado pelas justificações dascrianças para as tomadas de decisão. Este facto éatribuído ao tipo de scaffolding dado pelo adulto:os adultos, à medida que as crianças iam dandomais respostas correctas, aumentavam o númerode explicações, aumentando assim o inputconceptual. A discussão entre pares teria afunção de desenvolver as representaçõesexplícitas adquiridas na interacção com o adulto,isto é, o efeito tutor.

Como já foi afirmado, os efeitos da mediaçãodo adulto podem não ser imediatos (Connor &Cross, 2003). Tenebaum, Snow, Roach eKurland (2005) verificaram apenas uma relaçãoentre as conversas das mães com os filhos acercade ciência e a compreensão de textos sobreciência quando as crianças tinham 9, não se

546

Page 5: Discurso das mães e participação das crianças na resolução ... · que essa relação é apenas significativa entre os 12 e os 15 meses. Mais tarde os benefícios do apoio materno

verificando esta relação com crianças de 5 anos.Estes resultados parecem confirmar que ascrianças precisam, de facto, de avançarcognitivamente num domínio de conhecimentoespecífico, para poderem beneficiar do inputconceptual.

Na mesma linha de investigação, Philips eTolmie (2007) verificaram também o impacto doscaffolding parental, em função do nível deexplicitação (completamente, parcialmente ouminimamente explícito e implícito) do usoestratégias e explicação dos princípios, naperformance e compreensão do equilíbrio dabalança, em crianças de 6 a 8 anos. Neste estudo,não é só a linguagem enquanto reguladora daacção, mas também o seu conteúdo proposicional//referencial que está em causa, considerandoque as explicações e input conceptual podem,pelo menos, acelerar e facilitar a aprendizagem eo desenvolvimento. Conclui-se que um apoioeficaz para que as crianças atinjam o nívelsuperior da Redescrição Representacional (RR)exige a combinação de operacionalizaçõesexplícitas e explicações de nível conceptualsuperior. Por outro lado, a mediação linguísticatem efeitos diferentes em função do nível deperformance anterior da criança na tarefa(Conner & Cross, 2003).

Se a interpretação dos diferentes estudos temsido objecto de controvérsia, a partir dosresultados obtidos podemos afirmar que tambémo modelo de Redescrição Representacional émediado pela linguagem, implicando igualmentea capacidade de ter em conta a perspectiva dooutro no seu próprio comportamento, capacidadeesta que é desenvolvida no diálogo entre acriança e o adulto e que é provavelmenteimplicitamente continuado internamente nastentativas e treinos solitários da criança.

Scaffolding e diferenças individuais

A importância dos contextos de educaçãoinformal, como o contexto familiar, tem sidocada vez mais posta em evidência enquantopromotora do desenvolvimento cognitivo emetacognitivo da criança, preparando-a simulta-neamente para a colaboração e auto-regulação naeducação formal. Mas os pais diferem naquantidade e tipo de scaffolding que dão aos seus

filhos (Grusec & Goodnow, 1994; Rogoff,1990). O apoio que permite a passagem paraníveis superiores de autonomia, através datransferência da regulação pelo outro para aauto-regulação, seria o resultado de diferentesvariáveis da família, reflectindo as característicaspessoais dos seus membros, objectivos e valores,partindo do princípio de que todas as mães/paisajustam constantemente o seu próprio comporta-mento às competências dos filhos e à interpre-tação que fazem das suas respostas, e das suaspróprias atitudes em relação à tarefa (Fidalgo &Pereira, 2005; Freund, 1990; Gauvain, 1995;Gauvain, de la Ossa, & Hurtado-Ortiz, 2001;Ossa & Gauvain, 2001; Rogoff, 1990; St-Laurent& Moss, 2002; Wertsch, 1985; Wertsch &Sammarco, 1985).

Por seu lado, Tolmie et al. (2005), consideramque o tipo de scaffolding exercido pelos paisdepende mais das expectativas que têm emrelação aos filhos e, por isso, é consistente aolongo do tempo, e pouco contingente em relaçãoao comportamento da criança durante a tarefa,contrariamente ao afirmado por Wood (1990),Heckhausen (1987), Connor e Cross (2003),entre outros. Com efeito, o scaffolding e asquestões metacognitivas postas pelas mães são oresultado de um conjunto complexo de interac-ções de ordem social e individual, incluindo osestados emocionais (Thompson & Williams,2006).

Outra questão em aberto, consiste ainda emperceber se o conceito de scaffolding se aplicaapenas quando as crianças já têm algumconhecimento no domínio da tarefa. O próprioWood (1990) defende que o conceito de área dedesenvolvimento proximal é o mais adequadopara explicar a mediação do adulto (ou de outroque saiba mais), quando o conhecimento e acompetência da criança estão mais afastadosdas exigências actuais, tendo este apoio queassumir formas diferentes das inicialmenteidentificadas como as mais eficazes noscaffolding (Wood, Bruner, & Ross, 1976).

O estudo de Mulvaney, McCartney, Bub eMarshall (2006), mostra também que ascaracterísticas individuais da criança e das mãesinterferem no tipo de interacção. Dentre asvariáveis da mãe destacam a intrusividade, quedeverá ser distinguida de directividade, o

547

Page 6: Discurso das mães e participação das crianças na resolução ... · que essa relação é apenas significativa entre os 12 e os 15 meses. Mais tarde os benefícios do apoio materno

conhecimento que a mãe tem do desenvolvi-mento do seu/sua filho(a), anos de escolaridadeda mãe, sentimentos de afecto em relação àcriança, o grau de estilo democrático e disponibi-lidade, e do modelo interno da relação (Moss1992). Além disso, Neitzel e Stright (2003)encontraram igualmente correlações positivas esignificativas entre os anos de escolaridade damãe e o tipo de regulação da dificuldade datarefa, disponibilidade de informação meta-cognitiva, encorajamento ou feedback positivo,enquanto a rejeição dos comportamentos dacriança (intrusividade) apresenta uma correlaçãonegativa.

No que respeita às variáveis das crianças,destacam-se o temperamento e o género. Por seulado as mães com baixa escolaridade tendem apercepcionar os filhos como mais difíceis. Aeducação das mães aparece também com umefeito moderador das relações entre tolerânciadas mães e o temperamento da criança, e oregulamento da dificuldade da tarefa, e entre otemperamento das crianças e o encorajamentopara que estas se envolvam activamente natarefa. Quando as crianças são percepcionadascom temperamento difícil, os pais com níveiseducativos superiores usam um repertório maisalargado de estratégias, acomodando-se commais facilidade às dificuldades dos filhos.

No estudo de Mulvaney et al. (2006), quer ainteligência verbal das mães quer dos filhosaparecem como preditores do tipo de apoiofornecido. Além disso, a ajuda proporcionadapelas mães, conjuntamente com o desenvolvi-mento cognitivo anterior dos filhos, aparecemcomo preditores da sua adaptação no primeiroano escolar, aumentando a receptividade dascrianças à instrução formal.

No estudo de Wertsch, Minick e Arns (1984),foram observadas díades mãe-criança (as mãessó tinham 4 anos de escolaridade formal) edíades educadora-criança. Os resultadosmostraram que as mães usam mais a regulaçãodirecta e executam mais frequentemente asacções do que as educadoras. Este facto seriadevido a uma orientação para a tarefa versusorientação para processo. Moss e Blicharski(1986) e Renshaw (1992) mostraram que asmães orientadas para o processo também são

mais elaboradas e estruturantes, dando maisfeedback metacognitivo.

Estes resultados aparecem confirmados poroutros posteriores. Sigel (1997), Palácios,Gonzalez e Moreno (1992), Mendonza (1995),Sorsby e Martlew (1991), Deleau, Gandon eTaburet (1993), que analisaram o discursoregulador das mães em termos de estratégias dedistancing (Sigel, 1997), constatando que quantomais baixo era o nível de escolaridade das mães,mais baixos eram os níveis de distancingutilizados. Verificaram também que os níveis dedistancing variavam em função da natureza datarefa. Estes dados questionam a consistênciadas estratégias dos pais, ao longo do tempo,quando analisadas independentemente dastarefas, e contrariam a persistência de um mesmotipo de scaffolding, como afirmam Tolmie et al.(2005).

Outros autores argumentam que estesresultados seriam também explicados pelo factode as famílias de classe média incluírem no seucurriculum familiar mais tarefas e estilos decomunicação próximos dos usados na educaçãoformal (Guberman & Greenfiel, 1991; Heath,1986a,b; Rogoff, Mistry, & Göncü., 1993;Tudge, Putman, & Sidden, 1994).

No entanto, um envolvimento socialresponsivo e sensível entre os pais menosescolarizados e os seus filhos, funciona como umbom prognóstico para o desenvolvimento,atenuando os efeitos de uma experiência escolarmenos vasta, podendo ser tão eficazes como osde classe média, em função da natureza dastarefas (Haden & Fivush, 1996), da dificuldadeque apresentam para as crianças e do objectivodas mesmas (Delgado-Gaitan, 1993; Elllis &Gauvain, 1992; Gauvain, 1995). Por sua vez, oscaffolding das mães de nível de escolaridadesuperior também varia em função de se trataruma tarefa doméstica ou de uma tarefa escolar.Nas tarefas domésticas (por exemplo, na cozinhaa fazer bolos) o apoio é mais variado, predomi-nando a modelagem sem palavras, sorrisos,tocar, enquanto nas tarefas escolares as mãesusam estratégias mais activas, como a reduçãode passos estratégicos, feedback acompanhadode comentários e correcções explícitas. Por suavez, as crianças (3/4 anos), nas tarefas domés-ticas respondem proporcionalmente com um

548

Page 7: Discurso das mães e participação das crianças na resolução ... · que essa relação é apenas significativa entre os 12 e os 15 meses. Mais tarde os benefícios do apoio materno

nível superior de linguagem (Kermani & Janes,1999).

Quanto ao uso de questões metacognitivas nainteracção com os filhos, Neitzel e Stright (2003)encontraram igualmente uma correlação positivaentre o nível de escolaridade das mães, atransferência de responsabilidade pela tarefapara os filhos, o conteúdo metacognitivo dosseus enunciados e o suporte emocional. Contudo,Tenenbaum et al. (2005) constataram que asmães de níveis mais baixos de escolaridadeformal são igualmente eficazes quando seenvolvem em conversas sobre questõescientíficas com os filhos.

Concluindo, entre as famílias de baixo nívelsócio-económico e baixa escolaridade podemosencontrar uma grande diversidade de técnicas descaffolding que, sendo mal conhecida, conduziua considerar-se que estas crianças estão menosexpostas a desafios conceptuais através dalinguagem, desafios esses que precedem aconsciência metacognitiva, tal como auto--monitorização, planeamento e auto-avaliação.Esta diferenciação nos resultados varia emfunção das culturas. Kermani e Brenner (2000),por exemplo, mostraram que mães iranianas declasse média alta, vivendo nos Estados Unidos,foram tão directivas como as mães de níveissociais mais baixos, mas americanas. Contudo,quando as crianças realizaram as tarefas deforma independente não mostraram diferençassignificativas. Já Huntsinger e José (1995)tinham encontrado uma relação positiva entre oestilo directivo dos pais chino americanos e aaptidão das filhas para a matemática.

O discurso de scaffolding das mães

Sendo a mediação verbal a principalcomponente do scaffolding das mães naresolução conjunta de problemas com os filhosem idade pré-escolar, o discurso nem sempre é aestratégia mais eficaz, podendo os comporta-mentos não verbais, e em particular a execuçãoda tarefa pela mãe, funcionar como comporta-mento a imitar.

O scaffolding implica sempre da parte dotutor o envolvimento numa rotina de instrução,em termos de intenções comunicativas. As mãesusam actos de linguagem (Searle, 1972/1996)

para Iniciar a interacção, como as directivas, eobter uma Resposta. Sempre que os pressupostosda directiva são conseguidos, esta é seguida deuma Avaliação (Mehan, 1998), ou de umComentário, que podem tomar a forma de actode linguagem expressivo ou assertivo, ou dosdois. Se o acto de Iniciação não obtém a respostaesperada, a mãe pode simplesmente fazer umaavaliação negativa, executar ela própria a acçãoacompanhada ou não de explicações, ou aindasimplificar e explicitar o conteúdo da directiva(Fidalgo & Pereira, 2005; Wertsch, 1985), até acriança ser capaz de lhe dar cumprimento.

Esta função ilocutória do discurso (Searle,1972/1996) constitui o primeiro significado demediação referido por Bronckart (1992, 1995), eestaria ligada à mediação metacognitiva (Karpov& Haywood, 1998), e, portanto ao fornecimentode estratégias de resolução e controle.

O conhecimento declarativo, ou informaçãoconceptual, constitui a mediação cognitiva,segundo Karpov e Haywood (1998). Estedomínio da mediação teria que ver com oconteúdo proposicional dos enunciados e é osegundo significado de mediação para Bronckart(1992, 1995), sendo certo que estes dois aspectosda mediação estão sempre presentes noscaffolding: o primeiro nas intenções comunica-tivas, e o segundo no conteúdo dos actos delinguagem, mais ou menos explícitos e sob aforma como são referidos ou descritos osobjectos sobre os quais as acções incidem, ouperspectiva referencial (Fidalgo & Pereira, 2005;Wertsch, 1985).

Objectivos e hipóteses

O presente estudo tem como objectivoaprofundar a relação entre o scaffolding dasmães e a transferência de responsabilidade paraos filhos em duas tarefas do domínio da seriação.A utilização de duas apresentações diferentes nomesmo domínio, a construção de uma seriaçãode comprimentos, justifica-se pela necessidadede pôr em evidência a mediação metacognitiva ea mediação cognitiva.

De acordo com a revisão da literatura asdiferenças nos discursos das mães, nomeada-mente quanto ao uso da linguagem na actividadeconjunta e suas consequências no desempenho

549

Page 8: Discurso das mães e participação das crianças na resolução ... · que essa relação é apenas significativa entre os 12 e os 15 meses. Mais tarde os benefícios do apoio materno

dos filhos, têm sido muitas vezes atribuídas avariáveis sociais das mães e das famílias (nívelde escolaridade, por exemplo), sem ter em contao conhecimento prévio do domínio da tarefapelas crianças e o seu nível de desenvolvimento.

O nosso objectivo consiste em mostrar arelação entre o nível de escolaridade e o discursoregulador das mães e a performance dos filhosem tarefas de seriação, mas considerandosimultaneamente as variáveis das crianças,nomeadamente idade, desenvolvimento cogni-tivo e da linguagem.

Começámos por verificar se as característicasdo discurso das mães variam, quer na mediaçãometacognitiva, na função ilocutória, quer namediação cognitiva, parcialmente operaciona-lizada na perspectiva referencial, em função dascaracterísticas das tarefas e num domínio doconhecimento que está fora das competênciasdas crianças entre os 3 e os 5 anos. Sendo odiscurso das mães diferente em função da tarefa,analisámos, para cada uma delas, a relação entreas variáveis do discurso, o tipo de regulação, aescolaridade das mães, as características dascrianças e a transferência de responsabilidade.

A nossa hipótese geral é que a escolaridadedas mães estaria correlacionada com atransferência de responsabilidade, mas seriamediada pela sua idade e nível de desenvolvi-mento dos filhos, e que uma vez controladas asvariáveis de desenvolvimento das crianças, nãose verificará qualquer relação significativa entreo nível de escolaridade das mães e a participaçãodas crianças na realização de cada uma destastarefas específicas. Contudo, quando contro-lamos a escolaridade das mães, verificar-se-áuma relação significativa entre as variáveis dedesenvolvimento e a participação das crianças natarefa.

MÉTODO

Participantes

Participaram neste estudo 50 díades mãe-criança. O número de anos de escolaridade dasmães era, em média, de 11 anos (de 4 a 19 anos,d.p. 5,6), sendo a sua média etária de 33 anos (de23 a 44 anos, d.p. 5,05), a média do número de

filhos é de 1,64 (de 1 a 3, d.p. 0,66). A média deidades das crianças era de 53,16 meses (de 36 a71 meses, d.p. 10,29), sendo igualmentedistribuídas pelos dois géneros. A origem sócio--económica das famílias era de nível baixo anível médio alto. As crianças frequentavamJardins-de-infância privados e/ou subsidiadospelo Estado, na zona central de Lisboa.

Procedimento e descrição das tarefas

Cada díade mãe-criança foi observadaenquanto realizavam três tarefas que exigiamdiferentes estratégias de resolução, emborafossem todas tarefas de seriação.

A primeira tarefa serviu como introdução etreino. Consistiu na introdução de cinco círculosda mesma cor num encaixe, por ordem dedimensões.

A segunda (ou terceira tarefa) consistiu naconstrução de uma série de comprimentos de 10réguas de madeira com duas cores alternados,com dimensões entre 20 e 1,2cm. Para aconstrução desta série, foi fornecido um modelocom uma série já construída. A instrução foidirigida à criança, pedindo-lhe para fazer igualao modelo com a ajuda da mãe. A construção dasérie com modelo teve por objectivo pôr emevidência o uso dos aspectos metacognitivos dodiscurso que integram a função do modeloenquanto mediador semiótico no processo deresolução.

A terceira tarefa também implicou aconstrução de uma série de comprimentos comréguas de madeira, com as mesmas dimensõesque a anterior, mas cada régua com uma cordiferente e sem qualquer modelo. A instrução foimais uma vez dirigida à criança: “Tens aqui ummontinho de réguas, e eu gostava que asarrumasses da maior para a mais pequena ou damais pequena para a maior, de modo a fazeruma escadinha, e a tua mãe vai ajudar-te”. Oobjectivo desta tarefa era provocar uma situaçãodidáctica, em que as mães, devido à instruçãodada pelo observador, fossem induzidas a fazerreferência às dimensões das réguas e relaçõestransitivas, e não às cores, isto é, pôr emevidência os aspectos do discurso ligados àmediação cognitiva, com a introdução de novos

550

Page 9: Discurso das mães e participação das crianças na resolução ... · que essa relação é apenas significativa entre os 12 e os 15 meses. Mais tarde os benefícios do apoio materno

conceitos. Não é de esperar que as crianças nasidades observadas dominem, ou mesmocompreendam, essas referências. Contudo, onosso objectivo é observar como as mãesintroduzem novos conceitos nas estratégias deresolução.

Estas duas tarefas de seriação foram experi-mentadas previamente em crianças de 5 anos quenão participaram este estudo. A ordem deapresentação das séries foi balanceada.

Estas tarefas foram realizadas numa únicasessão, que durou entre 6 a 8 minutos, e foigravada em vídeo.

Codificação

Os enunciados das mães e das crianças foramtranscritos dos videos, acompanhados com adescrição dos comportamentos não verbaisrelevantes, tais como apontar ou a execução daacção pela mãe ou pela criança. No entanto,apenas o discurso da mães foi codificado,verificando-se também que as crianças poucofalaram.

Discurso regulador das mães (scaffolding)

Mediação metacognitiva e função ilocutóriado discurso

O discurso das mães foi segmentado emenunciados, tendo em conta os seguintescritérios: (1) mudança de conteúdo específicoe/ou (2) pausa de, pelo menos, 2 segundos.

Seguidamente cada um enunciados foicodificado em função das suas intençõescomunicativas em (Searle, 1972/1996):

Directivas: são enunciados que induzem acriança a executar uma acção. Considerámosdirectivas de regulação geral do comportamentoda criança, de encorajamento e de interdição. Asprimeiras solicitavam a participação activa (“Vá,começa lá!”) enquanto as de interdição impedema criança de prosseguir uma acção (“Pára debrincar com isso!”).

Para codificar as directivas dirigidasespecificamente à execução das operaçõesinerentes à tarefa adoptámos o conceito de

abreviação de Wertsch (1985), por sua vezinspirado na análise do discurso interno feita porVygotsky. A abreviação, neste contexto, é umaredução de uma representação linguísticacompleta e explícita de uma situação deter-minada, em que todos os aspectos da situaçãopodem ser integralmente ou explicitamenterepresentados no discurso, ou então são apenasrepresentados apenas alguns. Codificadas(Fidalgo & Pereira, 2005; Wertsch, 1985).Codificámos assim as directivas da mãe emdirectivas abreviadas (DA) e não abreviadas(DNA), em função do nível de implicatura dasestratégias de resolução contidas nas directivas,sendo o nível de concordância entre doiscodificadores independentes de K=.82 (Cohen).

Segundo Wertsch, a abreviação é um dosmecanismos semióticos usados pelo adultos paradar ordens de carácter metacognitivo de modo aestabelecer níveis de intersubjectividade entre osadultos e as crianças, e assim favorecer atransição do funcionamento inter-individual parao intra-individual.

Quando a criança consegue responderadequadamente a uma directiva abreviada damãe, quer dizer que partilha com esta o mesmonível de intersubjectividade (Rommetveit,1971/1974; Wertsch, 1985) sobre as estratégiasde resolução, visto não precisar que estas sejamverbal e completamente explicitadas.

Expressivos: enunciados que comunicam oestado afectivo ou cognitivo (positivo ounegativo) das mães sobre a acção das crianças(“Muito bem”; “Conseguiste”; “Não é assim!”).

Assertivos: enunciados que representam oestado do mundo, dando explicações ou descre-vendo o resultado da acção (“Estão os doisiguais” – apontando para a cópia e o modelo, naseriação com modelo; “Estás a ver, é umagrande e depois a mais pequena a seguir” –apontando a série sem modelo já construída.

A combinação de dois actos de linguagem foiconsiderada quando o tópico era o mesmo e osenunciados estavam separados por menos dedois segundos.

Doze transcrições foram codificadas de formaindependente e os níveis de acordo situaram-seentre .71 e .80 (K de Cohen).

551

Page 10: Discurso das mães e participação das crianças na resolução ... · que essa relação é apenas significativa entre os 12 e os 15 meses. Mais tarde os benefícios do apoio materno

Mediação cognitiva e perspectiva referencial

A forma como o locutor identifica o referentetem que ver com a perspectiva conceptual quepretende introduzir na execução da tarefa. Asexpressões referenciais utilizadas podemminimizar ou maximizar a informação sobre oreferente. Seleccionámos expressões queapresentam três níveis diferentes de informação,que podem ser usadas isoladamente ou agregadas(Fidalgo & Pereira, 2005; Wertsch, 1985): (1)deícticos, sinais indexicais verbais ou não verbais,tais como apontar, “esta”, “aquela”, “aqui”,“ali”, que introduzem a informação mínima paraidentificar o referente tal como deve ser percep-cionada na situação discursiva; (2) expressõescomuns de referência, o nome ou categorizaçãomais comum para o objecto em questão, mas quepode ser usado noutros contextos e não apenas nocontexto específico da tarefa (Ex.: a expressão “averde”, pode ser usada para referir a régua que dadimensão seguinte na série, mas não é específicoda tarefa); e (3) as expressões específicas docontexto, que introduzem mais informação nasituação discursiva que as duas anteriores, isto é,categoriza o referente na perspectiva em que oadulto considera que deve ser considerado nasituação específica (Ex.: a expressão “o maispequeno a seguir”), em que os deícticos e asexpressões comuns de referência não dãoindicações específicas sobre a tarefa, a não ser quea criança já a domine cognitivamente, o que não émanifestamente o caso.

Estes três tipos de expressões podem serusados isoladamente ou agregados, e a partirdessa agregação estabelecemos três níveishierárquicos, de acordo com a prevalência de umafunção meramente instrumental para atingir aatenção conjunta ou, se além disso, introduzemmais informação conceptual directamente com oproblema específico (Deleau, 1989, 1990; Fidalgo& Pereira, 2005; Wertsch, 1985):

Nível 1: sinais indexicais verbais e nãoverbais (apontar, dar); expressões comuns dereferência acompanhadas de sinais indexicaisverbais ou não verbais.

Nível 2: Expressões comuns de referência:expressões comuns de referência ou sinaisindexais não verbais acompanhados deexpressões informativas do contexto.

Nível 3: Expressões informativas do contextosem qualquer outra expressão referencial.

Os níveis de concordância (K de Cohen)obtidos por duas codificações independentesforam os seguintes; sinais indexicais .98;expressões comuns de referência .87; expressõesinformativas do contexto .88. Para os 3 níveis deagregação os níveis de concordância foram osseguintes: nível 1: .90; nível 2: .79, nível 3: .86.

Regulação directa e acções executadas pelasmães

As tarefas foram divididas em episódios,considerando-se um episódio, o conjunto detodas as acções necessárias para colocarcorrectamente cada uma das réguas no localadequado. Foram identificadas, para cada tarefa,as acções executadas pela mãe, sem qualquerinterferência física da criança, mas em que estamantinha a atenção focada na acção.

As acções realizadas pelas crianças, masprecedidas por directivas não abreviadas (DNA),ou qualquer outra indicação não verbal, sãoconsideradas sob regulação directa.

Transferência de responsabilidade para acriança

Para a avaliar o nível de participação dacriança durante a resolução das tarefas foramconsideradas todas as acções da criança realizadassem qualquer interferência da mãe, isto é,autonomamente, ou sob regulação indirecta.Considera-se que uma acção é executada sobregulação indirecta quando é precedida por umadirectiva abreviada (DA). O somatório destasacções traduz o nível de transferência deresponsabilidade da tarefa para a criança.

Avaliação do desenvolvimento cognitivo e dalinguagem das crianças

A fim de controlar a relação entre odesenvolvimento das crianças e o apoio prestadopelas mães, na semana seguinte à observaçãoforam aplicados às crianças participantes asMatrizes Progressivas de Raven (versão cadernocolorido) e a Escala de Compreensão do teste delinguagem de Reynell.

552

Page 11: Discurso das mães e participação das crianças na resolução ... · que essa relação é apenas significativa entre os 12 e os 15 meses. Mais tarde os benefícios do apoio materno

RESULTADOS

O discurso das mães

Para que as crianças participem activamentena resolução da tarefa têm que representarpreviamente o seu objectivo. Enquanto represen-tações mentais os objectivos das tarefas não sãoestritamente observáveis, tendo que ser inferidos(Gattis, Beering, & Wohlschlager, 2002), nocaso presente, através do modelo, ou outromecanismo semiótico como a observação docomportamento da mãe. Na seriação sem modeloo objectivo da tarefa é inferido a partir dasacções executadas pela mãe e pela criança sobregulação directa, o que lhe permite construir//antecipar a configuração da série: as mãesordenam as primeiras réguas e a criança continua.

Mediação metacognitiva e função ilocutóriado discurso

Foram aplicados testes não paramétricos,tendo sido utilizadas proporções, para controlar

o efeito quantidade de fala em função do modode apresentação da tarefa.

Com efeito os actos de linguagem (Searle,1972/1996) emitidos pelas mães, em particular otipo de directivas dirigidas à execução da tarefavariam em função da existência ou não demodelo.

Pudemos constatar, pelo teste de Wilcoxon(Tabela 1), que se verificam diferenças signi-ficativas entre as duas seriações nas directivasabreviadas (N=50, Z=-1,984, p=0,026), sendoestas mais frequentes na série com modelo(N=50, Z=-2,731, p=0,005), enquanto as directivasnão abreviadas são mais frequentes na série semmodelo. Os actos expressivos positivos associadosa assertivos (N=50, Z=-1,965, p=0,027) e adirectivas abreviadas (N=50, Z=-1,804, p=0,042)são proporcionalmente mais frequentes na sériecom modelo. Porém, considerando que asfrequências observadas nestas categorias sãomarginais, dada a sua dispersão, o resultadomais saliente consiste na inversão das propor-ções de directivas abreviadas e não abreviadasnas séries com e sem modelo (41% dos actos delinguagem proferidos pelas mães).

553

TABELA 1

Actos de linguagem por tarefa (proporções médias)Série com modelo Série sem modelo

Directivos (0,53) (0,55)Interdição 0,00 0,01Encorajamento 0,12 0,13Abreviados* 0,22 0,14Não abreviados* 0,19 0,27Assertivos (0,12) (0,11)Assertivos 0,10 0,10Assert./directivo abreviado 0,00 0,00Assert./directivo não abreviado 0,02 0,01Expressivos (0,35) (0,34)Positivo 0,10 0,15Positivo/Assertivo* 0,03 0,01Positivo/directivo abreviado* 0,02 0,00Positivo/ directivo não abreviado 0,00 0,01Negativo 0,06 0,05Negativo/assertivo 0,05 0,04Negativo/directivo abreviado 0,04 0,03Negativo/directivo não abreviado 0,05 0,05

Nota. *p<0,05.

Page 12: Discurso das mães e participação das crianças na resolução ... · que essa relação é apenas significativa entre os 12 e os 15 meses. Mais tarde os benefícios do apoio materno

Mediação cognitiva – Perspectiva referencial

Quanto ao conteúdo proposicional, apresenta-mos a seguir as proporções médias dosdiferentes níveis da perspectiva referencial empor cada uma das tarefas.

Verificámos, utilizando o teste de Wilcoxon, aexistência de diferenças significativas nas expres-sões referenciais de nível 2 (N=46, Z=-4,745,p<0,001) e nível 3 (N=46, Z=-3,422, p<0,001),sendo a série sem modelo que suscita o uso maisfrequente de palavras que referem as relaçõesassimétricas (“mais pequeno do que...”, “maiordo que...”, “maior a seguir...”), sem qualqueroutra expressão referencial, enquanto na sériecom modelo são proporcionalmente maisreferidas a cor e a dimensão.

Em resumo, e a partir dos dados acima refe-ridos, podemos dizer que a seriação com modelomobiliza mais desafios metacognitivos, acen-tuando os procedimentos (directivas abreviadas),enquanto a seriação sem modelo evoca commais frequência a mediação cognitiva através dautilização do nível superior de expressõesreferenciais (relações assimétricas).

Discurso, tipo de regulação, escolaridadedas mães, variáveis nas crianças e transferênciade responsabilidade

Uma vez que a transferência de responsa-bilidade da tarefa para a criança, e o tipo deregulação exercido pela mãe, decorrem dosmecanismos semióticos utilizados durante aactividade conjunta, apresentamos a seguir ascorrelações entre as categorias do discurso quevariam em função das tarefas, a transferência de

responsabilidade e a regulação directa, conside-rando os actos de linguagem directivos e osníveis 2 e 3 da perspectiva referencial. Acrescen-támos ainda as acções executadas pela mãe,passíveis de serem imitadas, enquanto meca-nismo semiótico.

O nível de escolaridade das mães está positivae significativamente correlacionado com odesenvolvimento cognitivo e da linguagem dascrianças (r=0,308 p<0,05 e r=0,447 p<0,01,respectivamente), mas apenas apresenta umacorrelação positiva com a transferência deresponsabilidade para a criança, na seriação commodelo (r=0,323 p<0,05). A transferência deresponsabilidade pela tarefa para a criança étambém superior na série com modelo (N=50,Z=-3,045, p<0,00).

Para separarmos os resultados derivados daescolaridade das mães e do desenvolvimento eidade dos filhos, passámos à realização decorrelações parciais, para cada tarefa.

Seriação com modelo

Na primeira correlação parcial controlámos asvariáveis relativas às crianças, idade,desenvolvimento cognitivo e da linguagem(Tabela 3).

Quanto às variáveis de discurso das mães e oseu nível de escolaridade apenas se constataque quanto mais elevado o nível de escolaridadedas mães maior a tendência para utilizar o nível3 da perspectiva referencial (r=0,458, p<0,01), oque não interfere significativamente natransferência de responsabilidade para a criança(r=-,20).

554

TABELA 2

Perspectiva Referencial – Proporções médias por tarefa

Série com modelo Série sem modelo

Nível 1 0,48 0,54Nível 2* 0,34 0,10Nível 3* 0,18 0,36

Nota. *p<0,01.

Page 13: Discurso das mães e participação das crianças na resolução ... · que essa relação é apenas significativa entre os 12 e os 15 meses. Mais tarde os benefícios do apoio materno

A transferência de responsabilidade para acriança não apresenta correlações significativascom a escolaridade da mãe (r=0,179, p=0,228),mas apenas uma correlação negativa esignificativa com as acções realizadas pelas mães(r=-,668, p<0,01), como seria de esperar. Verifica--se uma tendência não significativa para as mãescom mais baixo nível de escolaridade usaremcom mais frequência as acções para imitar.

Na segunda correlação parcial controlámos avariável escolaridade da mãe, e os resultados

estão igualmente de acordo com a hipóteseinicialmente colocada. Assim, as variáveis dodiscurso e regulação das mães (Tabela 4) apare-cem negativa e significativamente correlacionadascom as transferência de responsabilidade para acriança, enquanto a idade (r=0,646, p<0,01), osscores da Raven (r=0,621, p<0,01) e Reynell(r=0,621, p<0,01) mostram correlações positivas eelevadas com a transferência de responsabilidadepara a criança.

555

TABELA 3

Série com modelo – Correlações parciais, controlando as variáveis idade, scores na Raven e Reynell das crianças, entre o discurso das mães, regulação directa,

escolaridade das mães e transferência de responsabilidade para a criança1 2 3 4 5 6 7

Directivas1 – Abreviadas –2 – Não abreviadas 0,30** –

Expressões referenciais3 – Nível 2 0,54** 0,37** –4 – Nível 3 0,38** 0,48** 0,39** –5 – Regulação directa 0,44** 0,68** 0,53** 0,49** –6 – Acções realizadas pela mãe -0,16 -0,32** -0,11 -0,28 -0,53** –7 – Escolaridade das mães 0,17 0,18 0,14 0,46** 0,09 -0,14 –8 – Transferência de responsabilidade -0,03 -0,16 -0,24 -0,02 -0,13 -0,67** 0,18

Nota. *p<0,05; **p<0,01.

TABELA 4

Série com modelo – Ccorrelações parciais, controlando a escolaridade das mães, entre discurso das mães, regulação directa, idade, scores de Raven e Reynell nas crianças

e transferência de responsabilidade1 2 3 4 5 6 7 8 9

Directivas1 – Abreviadas –2 – Não abreviadas -0,35* –

Expressões referenciais3 – Nível 2 0,57** 0,42** –4 – Nível 3 0,35* 0,52** 0,44** –5 – Regulação directa 0,50** 0,76** 0,59** 0,58** –6 – Acções realizadas pela mãe -0,03 -0,07 0,01 -0,10 -0,25 –7 – Idade das crianças -0,30* -0,49** -0,24 -0,23 -0,47** -0,33* –8 – Raven -0,31* -0,43** -0,40** -0,37** -0,49** -0,27 -0,70** –9 – Reynell -0,09 -0,43** -0,21 -0,38** -0,42** -0,30* 0,68** 0,68** –

10 – Transferência de responsabilidade -0,30* -0,48** -0,39** -0,33** -0,45** -0,68** 0,65** 0,62** 0,62**

Nota. **p<0,01; *p<0,05.

Page 14: Discurso das mães e participação das crianças na resolução ... · que essa relação é apenas significativa entre os 12 e os 15 meses. Mais tarde os benefícios do apoio materno

A regulação directa apresenta uma correlaçãopositiva e significativa com as directivasabreviadas e não abreviadas (r=0,499, p<0,01 er=0,757, p<0,01 respectivamente), e os níveis 2e 3 da perspectiva referencial presentes nodiscurso materno (r=0,590, p<0,01 e r=0,578,p<0,01, respectivamente), o que mostra que aexposição da criança a directivas abreviadas, quedepois são desdobradas em directivas nãoabreviadas contendo expressões referenciais denível 3 (r=0,524 p<0,01) tem pouco impacto natransferência de responsabilidade para a criança,visto não se verificar qualquer correlaçãosignificativa. Por outro lado, a criança éconfrontada com o input conceptual queacompanha os procedimentos.

Seriação sem modelo

Na correlação parcial com controlo dasvariáveis das crianças (idade, scores de Raven eReynell, Tabela 5), tal como na seriação commodelo, a transferência de responsabilidade paraas crianças não apresenta uma correlaçãosignificativa com a escolaridade das mães(r=0,119, p>0,05).

A escolaridade das mães apenas apresentauma correlação positiva e significativa com autilização de expressões referenciais de nível 3(r=0,289, p<0,05: quanto mais elevada a

escolaridade das mães mais utilizam a linguagemdas relações assimétricas, em particular nocontexto das directivas não abreviadas (r=0,364,p<0,05). Constata-se igualmente uma correlaçãopositiva e significativa entre a regulação directae o uso de expressões de nível superior (r=0,415,p<0,01), independentemente do nível deescolaridade das mães. Constata-se umacorrelação significativa entre a regulação directae a inclusão nas directivas não abreviadas deexpressões referenciais de nível superior(r=0,415, p<0,01).

Na segunda correlação parcial, quandocontrolamos a escolaridade das mães (Tabela 6),verificam-se correlações positivas e bastantesignificativas entre as variáveis idade (r=0,493,p<0,01), score da Raven (r=0,459, p<0,01) e daReynell (r=0,397, p<0,01), e transferência deresponsabilidade para as crianças.

Verificam-se correlações elevadas entre autilização de expressões referenciais de nível 2 e3 (r=0,413, p<0,01 e r=0,402, p<0,01,respectivamente) no contexto das directivas nãoabreviadas que constituem grande parte daregulação directa exercida pelas mães (r=0,640,p<0,01), mas sem impacto na transferência deresponsabilidade para a criança: mais uma veznão se verifica qualquer correlação significativaentre as directivas abreviadas e transferência deresponsabilidade para as crianças.

556

TABELA 5

Série sem modelo – Correlações parciais, controlando os scores Raven e Reynell nas criança, entre a escolaridade das mães, discurso das mães, regulação directa, idade

e transferência de responsabilidade pela tarefa para a criança1 2 3 4 5 6 7

Directivas1 – Abreviadas –2 – Não abreviadas 0,25 –

Expressões referenciais3 – Nível 2 -0,03 0,23 –4 – Nível 3 -0,23 0,36* -0,09 –5 – Regulação directa 0,14 0,51** 0,29 0,42** –6 – Acções realizadas pela mãe -0,23 0,05 -0,03 -0,17 0,02 –7 – Escolaridade das mães 0,12 0,11 0,13 0,29* 0,03 -0,17 –8 – Transferência de responsabilidade 0,09 -0,47** -0,22 -0,36* -0,53** -0,62** 0,12

Nota. **p<0,01; *p<0,05.

Page 15: Discurso das mães e participação das crianças na resolução ... · que essa relação é apenas significativa entre os 12 e os 15 meses. Mais tarde os benefícios do apoio materno

DISCUSSÃO

Os resultados globais da análise do discursodas mães mostram que estas modificaram osseus comportamentos ao longo da resolução deduas tarefas do mesmo domínio do conheci-mento, mas apresentadas de forma diferente: aconstrução de uma série de comprimentos, com esem modelo. Verificámos que, apesar dasalterações na mediação metacognitiva e cogni-tiva, as mães mantêm o script geral (Iniciação,Resposta Avaliação) de uma interacção deresolução conjunta entre um que sabe mais eoutro que sabe menos, isto é, começa pelo uso deactos de linguagem de iniciação e encoraja-mento, seguido de directivas para obter umaResposta, seguida de uma Avaliação, sob aforma de um acto expressivo, com ou semassertivo (Mehan, 1998).

No que respeita à função ilocutória dodiscurso, e à mediação metacognitiva, podemosconstatar que existe um efeito da tarefa, o quecontraria alguns estudos que defendem que aregulação exercida pelos pais é pouco contin-gente ao comportamento da criança durante ainteracção e é consistente ao longo do tempo(Tolmie et al., 2005). Os nossos resultados vãono sentido de confirmar os resultados e afirma-

ções de Wood (1990), Heckhausen (1987),Connor e Cross (2003) e Tenebaum et al. (2005).

Por outro lado, e dado que as tarefas propostasestão afastadas do conhecimento e competênciasactuais da maioria das crianças, a mediação doadulto assume formas diferentes, e nem sempreas mais indicadas para o que Wood, Bruner eRoss (1976), consideram scaffolding eficaz, masque são adequadas ao nível de performance dascrianças, como por exemplo usar directivasabreviadas na seriação com modelo, e asexpressões que contêm apenas referências àsrelações assimétricas mas a que as crianças nãorespondem, criando uma nova área de desenvol-vimento proximal, funcionando como estímulosexternos. A existência do modelo na série exigeda parte da mãe o uso mais frequente dedirectivas abreviadas, a partir das quais a criançatem que inferir qual a importância deste,enquanto mecanismo semiótico, no desempenhoda tarefa. Com efeito, para que a criançacompreenda a imagem ou o objecto protótipoenquanto dispositivo semiótico específico, énecessário efectuar uma série de relações einferências, cuja natureza e ordem não estãoindicadas, não bastando o processo de percepçãodas semelhanças. Estas operações podem serexpressas de forma figurativa, mas são neces-

557

TABELA 6

Série sem modelo – Correlações parciais, controlando a escolaridade das mães, entre discurso das mães, regulação directa, idade, scores de Raven e Reynell nas crianças

e transferência de responsabilidade1 2 3 4 5 6 7 8 9

Directivas1 – Abreviadas –2 – Não abreviadas 0,26 –

Expressões referenciais3 – Nível 2 0,01 0,39** –4 – Nível 3 0,20 0,29* -0,11 –5 – Regulação directa 0,18 0,64** 0,41** 0,40** –6 – Acções realizadas pela mãe -0,19 0,13 0,04 0,01 -0,23 –7 – Idade das crianças -0,11 -0,51** -0,37** 0,09 -0,41** -0,20 –8 – Raven -0,12 -0,50** -0,31* -0,15 -0,48** -0,08 0,70** –9 – Reynell -0,09 -0,34** -0,15 0,03 -0,28* -0,21 0,68** 0,68** –

10 – Transferência de responsabilidade 0,008 -0,63** -0,37** -0,34** -0,64** -0,60** 0,49** 0,46** 0,40**

Nota. **p<0,01; *p<0,05.

Page 16: Discurso das mães e participação das crianças na resolução ... · que essa relação é apenas significativa entre os 12 e os 15 meses. Mais tarde os benefícios do apoio materno

sários sinais indexicais e o estabelecimento derelações verbais (deícticos) que permitam asemiotização do ícone a nível pragmático.

No que diz respeito à mediação cognitiva(perspectiva referencial) é na série sem modeloque se regista uma proporção significativamentemais elevada de expressões de nível 3, isto é,expressões que referem as relações assimétricassem qualquer outra expressão referencial menosespecífica no contexto da tarefa, como a cor. Asmães interpretaram esta tarefa como didáctica, eembora os filhos não respondessem às directivasque continham apenas estas expressões de nívelsuperior, as mães incluíram-nas directivas nãoabreviadas, nos actos expressivos negativosacompanhados de directivas abreviadas, eutilizaram as expressões referenciais de nível 2,expressões que incluíam simultaneamente a cor ea relações assimétricas.

Quando relacionamos as variáveis de suportedas mães, incluindo as acções executadas porestas, a regulação directa, as directivas nãoabreviadas e a utilização de expressõesreferenciais, verificam-se correlações negativascom a transferência de responsabilidade, o quequer dizer que as crianças realizam as tarefassem intervenção das mães, o que não implicanecessariamente a compreensão da operação emcurso.

Assim, a transferência de responsabilidadepara a criança não se apresenta correlacionadacom as directivas abreviadas e as expressõesreferenciais de nível superior nas duas seriações.Esta constatação parece indicar que os desafiossemióticos contidos nas directivas abreviadas e oinput conceptual das expressões referenciais,não tiveram impacto no processo de resoluçãodas crianças. Consideramos que tal se deve aofacto de ser a primeira (ou das primeiras vezes)vez que as crianças mais novas entram emcontacto com os procedimentos e a linguagemprópria das relações assimétricas em simultâneo,o que constituiria uma iniciação ao conheci-mento implícito, em que a ajuda do adulto tempouco ou nenhum impacto.

Os resultados obtidos apontam igualmentepara a confirmação da nossa hipótese inicial,segundo a qual a transferência de responsa-bilidade para a criança é mediada pelo seu nívelde conhecimento nestas tarefas específicas,

podendo a escolaridade das mães funcionarcomo variável moderadora. Com efeito, as mãesde nível superior de escolaridade mostram umatendência para utilizar mais vezes expressõesreferenciais de nível superior, podendo pró--activar mais facilmente a articulação entre oprocedimento da ordenação de comprimentos e oconceito de relações assimétricas.

Os comportamentos observados podemigualmente ser interpretados segundo o modelode desenvolvimento proposto por Karmiloff-Smith (1992), o Modelo de RedescriçãoRepresentacional (MRR). Em qualquer uma dastarefas as crianças necessitam de construir umconhecimento implícito do que é uma seriação edos procedimentos para chegar à configuração(fornecida pelo modelo ou pela ordenação dasprimeiras réguas pela mãe ou sob regulaçãodirecta).

Por outro lado, se a criança inicia a aprendi-zagem de um conceito a partir do momento emque entra em contacto com a palavra que refereesse conceito (maior do que e menor ou pequenodo que), o efeito do input conceptual não éimediato, como afirmam Connor e Cross (1983),além de que a mediação linguística tem efeitosdiferentes consoante o conhecimento anteriorno domínio em causa.

Outro pressuposto do MRR, segundo o qual apassagem do conhecimento implícito, de algummodo iniciado na interacção com as mães,precisa de um processo de auto-organizaçãointerna, que articule procedimentos e conheci-mento conceptual, até chegar a um conhecimentoverbal explícito (fase 3) não se verificou, o quena situação apresentada seria fazer intercalaçõesde réguas e/ou explicar porquê, o que nãoaconteceu em qualquer das 50 díades observadas

Pelos dados obtidos neste estudo é possívelafirmar que a relação entre o nível deescolaridade das mães e os desafios meta-cognitivos, e o input conceptual por elasfornecido na resolução conjunta de umproblema, tem que ter em conta uma série devariáveis contextuais, que incluem os partici-pantes e as características das tarefas. Por outrolado, o facto de a transferência de responsabili-dade para as crianças não aparecer correlacionadacom os mecanismos semióticos mais desafiantes,põe em evidência a importância do Modelo de

558

Page 17: Discurso das mães e participação das crianças na resolução ... · que essa relação é apenas significativa entre os 12 e os 15 meses. Mais tarde os benefícios do apoio materno

Redescrição Representacional, em dois aspectosfundamentais, como já referimos, o desencadearde um conhecimento implícito num domíniodeterminado durante a actividade conjunta, emque a mediação combine simultaneamenteoperacionalizações explícitas e input conceptual,tendo em conta o nível de conhecimento dacriança. A este processo segue-se a necessidadede um processo de auto-organização individualque radica na comunicação estabelecida durante aresolução conjunta, em que procedimentos econceitos são indissociáveis e tornam possívelque a criança codifique linguisticamente asrepresentações das relações espaciais.

REFERÊNCIAS

Bronckart, J. P. (1992). El discurso como acción. Por unnuevo paradigme psicolinguistico. Anuário dePsicologia, 54, 3-48.

Bronckart, P. P. (1995). Theories of action, speech,natural language, and discourse. In James V.Wertsch, Pablo del Rio, & Amelia Alvarez (Eds.),Sociocultural studies of mind (pp. 75-94).Cambridge: Cambridge University Press.

Bruner, J. (1983). Savoir faire savoir dire. Paris:Presses Universitaires de France.

Callagan, T., & Rankin, M. (2002). Emergence ofgraphic symbol functioning and the question ofdomain specificity: A longitudinal training study.Child Development, 73(2), 359-376.

Cole, M. (1985).The zone of proximal development:Where culture and cognition create each other. InJames V. Wertsch (Ed.), Culture, Communicationand Cognition (pp. 146-1619). Cambridge:Cambridge University Press.

Connor, D. B., & Cross, D. R. (2003). Longitudinalanalysis of the presence, efficacy and stability ofmaternal during informal problem-solvinginteractions. British Journal of DevelopmentalPsychology, 21, 315-334.

Deleau, M. (1989). L’actualité de la notion demeditatiom sémiotique de la vie mentale. Enfance,42, 31-38.

Deleau, M. (1990). Les origines sociales dudéveloppement mental. Paris: Armand Colin, Ed.

Deleau, M., Gandon, E., & Taburet, V. (1993). Semioticmediation in guiding interactions with young

children: The role of context and communicationhandicap on distanciation in adult discourse.European Journal of Psychology of Education,8(4), 473-486.

Delgado-Gaitan, C. (1993). Parenting in twogenerations of Mexican American families.International Journal of Behavioral Development,16(3), 409-427.

Deloach, J. S., Miller, K. F., & Pierreoutsakos, S. L.(1998). Reasoning and problem solving. In W.Damon (Ed.), Handbook of child psychology:Volume 2: Cognition, perception, and language(pp. 801-850). Hoboken, NJ, US: John Wiley &Sons Inc.

Doise,W., & Mugny, G. (1997). Psychologie social etdéveloppement cognitif. Paris: Armand Colin.

Ellis, S., & Gauvain, M. (1992). Social and culturalinfluences on children’s collaborative ineractions.In Lucien T. Winegar, & Jaan Valsiner (Eds.),Children’s development within cultural contexts(vol. 2, pp. 155-180). Hillsdale, NJ: LawrenceErlbaum Associates, Inc.

Fidalgo, Z., & Pereira, F. (2005). Socio-culturaldifferences and the adjustment of mothers’ speechto their children’s cognitive and languagecomprehension skills. Learning and Instruction,15, 1-21.

Fodor, Jerry A. (1992). The modularity of mind.Cambridge, MA: MIT Press.

Freund, L. S. (1990). Maternal regulation of children’sproblem-solving behavior and its impact onchildren’s performance. Child Development, 61,113-126.

Gattis, M., Beering, H., & Wohlschlager, A. (2002).Goal-directed imitation. In A. Meltzzoff & W.Prinz (Eds.), The imitative mind (pp. 183-205).New York: Cambridge University Press.

Gauvain, M. (1995). Influence of purpose of aninteraction on the adult-child planning. Infancia yAprendizaje, 69-70, 141-155.

Gauvain, M., de la Ossa, J. L., & Hurtado-Ortiz, M.(2001). Parental guidance as children learn to usecultural tools: The case of pictorial plans.Cognitive Development, 16(1), 551-575.

Grusec, J. E., & Goodnow, J. J. (1994). Impact ofparental discipline methods on the child’sinternalization of values: A reconceptualisation ofcurrents points of view. DevelopmentalPsychology, 30(1), 4-19.

559

Page 18: Discurso das mães e participação das crianças na resolução ... · que essa relação é apenas significativa entre os 12 e os 15 meses. Mais tarde os benefícios do apoio materno

Guberman, S. R, & Greenfield, P. M. (1991). Learningand transfer in everyday cognition. CognitiveDevelopment, 6(3), 233-260.

Haden, C. A., & Fivush, R. (1996). Contextual variationin maternal conversational styles. Merrill-PalmerQuarterly, 42(2), 200-227.

Heath, S. (1986a). Taking a cross-cultural look atnarratives. Topics in Language Disorders, 7(1), 84-94.

Heath, S. (1986b). Sociocultural contexts of languagedevelopment. In C. Cortes (Ed.), Beyond language:Social and cultural factors in schooling languageminority students (pp. 143-186). Los Angles, CA:Descrimination, Dessimination, and AssessmentCenter, California State University.

Heckhausen, J. (1987). Balancing for weakenesses andchallenging developmental potential: Alongitudinal study of mother-infant dyads inapprenticeship relations. DevelopmentalPsychology, 23, 762-770.

Huntsinger, C., & Jose, P. E. (1995). Chinese Americanand Caucasian American interaction patterns inspatial rotation puzzle solutions. Merrill-PalmerQuarterly, 41(4), 471-496.

Huntsinger, C., & Jose, P. E. (1997). Culturaldifferences in early mathematics learning: Acomparison of Euro-American, Chinese-American,and Taiwan-Chinese families. InternationalJournal of Behavioral Development, 21(2), 371-388.

Karmiloff-Smith, A. (1992). Beyond modularity Adevelopmental perspective on cognitive science.Cambridge, MA: MIT Press.

Karpov, Y. V., & Haywood, H. C. (1998). Two ways toelaborate Vygotsky’s concept of mediation.American Psychologist, 53(1), 27-36.

Kermani, H., & Janes, H.A. (1999). Adjustment acrossTask in maternal in low-income latino immigrantfamilies. Hispanic Journal of Behavioral Sciences,21(2), 134-153.

Kermani, H., & Brenner, M. E. (2000). Maternal in thechild’s zone of proximal development across tasks:Cross-cultural perspectives. Journal of Research inChildhood Education, 15(1), 30-52.

Kontos, S. (1983). Adult-child interaction and theOrigins of metacognition. Journal of EducationalResearch, 77(1), 43-54.

Kontos, S., & Nicholas, J. (1986). Independent problemsolving in the development of metacognition. TheJournal of Genetic Psychology, 147(4), 481-495.

Leslie, A. (2000). Theory of mind” as a mechanism ofselective attention. In Michael S. Gazzaniga &Emilio Bizzi (Eds.), The New CognitiveNeurosciences (pp. 1235-1247). Cambridge, MA:MIT Press.

Martin, L. E., & Reutzel, D. R. (1996). Books forchildren: Mothers’ metacognitive decisions.Reading Psychology, 17(2), 159-180.

Mehan, H. (1998). The study of Social Interaction inEducational Settings: Accomplishements andunresolved issues. Human Development, 41, 245-269.

Mendonza, O. (1995). Developmental changes andsocioeconomic differences in mother-infant picturebook reading. European Journal of Psychology ofEducation, 10(3), 261-272.

Moss, E. (1992). The socioaffective context of jointcognitive activity. In L. Winegar & J. Valsiner(Eds.), Chidren’s development within socialcontext (vol. 2, pp. 117-154). London: LawrenceErlbaum Associates, Publishers.

Moss, E., & Blicharski, T. (1986). The observation ofteaching and learning strategies in parent-childand teacher-child interaction. Canadian Journal ofResearch in Early Childhood Education, 1(2), 21-36.

Murphy, N., & Messer, D. (2000). Differential benefitsfrom and children working alone. EducationalPsychology, 20(1), 17-31.

Mulvaney, M. K., McCartney, K., Bub, K. L., &Marshall, N. L. (2006). Determinants of dyadic andcognitive outcomes in first graders. Parenting:Science and Practice, 6(4), 297-320.

Neitzel, C., & Stright, A. D. (2003). Mothers’ ofchildren’s problem solving: establishing afoundation of academic self-regulatorycompetence. Journal of Family Psychology, 17(1),147-159.

Ossa, J., & Gauvain, M. (2001). Joint attention bymothers and children while using plans.International Journal of Behavioral Development,25(2), 176-183.

Piaget, J. (1967). La psychologie de l’intelligence.Paris: Armand Colin.

Pine, K. J., & Messer, D. J. (1998). Group collaborationeffects and the explicitness of children’sknowledge . Cognitive Development, 13, 109-126.

Philips, S., & Tolmie, A. (2007). Understanding of thebalance scale problems: The effects of parentalsupport. Infant and Child Development, 16, 96-117.

560

Page 19: Discurso das mães e participação das crianças na resolução ... · que essa relação é apenas significativa entre os 12 e os 15 meses. Mais tarde os benefícios do apoio materno

Renshaw, P. (1992). Reflecting on the experimentalcontext: Parents’s interpretations of the educatonmotive during teaching episodes. In L. Winegar &J. Valsiner (Eds.), Children’s development withinsocial context (vol. 2, pp. 53-74). Hillsdale, NJ:Lawrence Erlbaum Associates Publishers.

Rogoff, B. (1990). Apprenticeship in thinking. NewYork: Oxford University Press.

Rogoff, B., & Gardner, W. (1984). Adjustment ofadult-child instruction according to child age andtask. Developmental Psychology, 20(2), 193-199.

Rome-Flanders, T., Cronk, C., & Gourde, C. (1995).Maternal in mother-infant games and its relation tolanguage development: A longitudinal study. FirstLanguage, 15, 339-335.

Rommetveit, R. (1971/1974). Deep structures ofsentences versus message structure: Some criticalremarks about current paradigms, and suggestionsfor an alternative approach. Problèmes Actuels enPsycholinguistique, 206, 507-523.

Searle, J. (1972/1996). Les actes de langage. Paris:Editeurs des Sciences et des Arts.

Sigel, I. E. (1997). Modelo de distanciamento ydesarollo de la competencia representative.Infância y Aprendizaje, 78, 13-20.

Sorsby, A., & Martlew, M. (1991). Representationaldemands in mothers’ talk to preschool children intwo contexts: Picture book reading and a modellingtask. Journal of Child Language, 18, 373-395.

Snow, C. E. (1972). Mothers’ speech to childrenlearning language. Child Development, 43, 549-565.

St-Laurent, D., & Moss, E. (2002). Le Développementde la planification. Enfance, 4, 342-362.

Tenebaum, H. R., Snow, C. E., Roach, K. A., &Kurland, B. (2005). Talking and reading science:Longitudinal data on sex differences in mother-child conversations in low-income families.Applied Developmental Psychology, 26, 1-19.

Thompson, R. B., & Williams, D. (2006). Diversityamong low SES families: An exploration ofpredictive variables for mothers’ metacognitivequestions to their children. Human Development,3(4), 191-209

Tolmie, A., Thomsom, J. A., Foot, H. C., Whelan, K.,Morrison, S., & McLaren (2005). The effects ofadult guidance and peer discussion on thedevelopment of childrens representations:Evidence from the training of pedestrian skills.British Journal of Psychology, 96, 181-204.

Tomasello, M. (1999). The cultural origins of humancognition. Cambridge: Harvard University Press.

Tomasello, M. (2000). Culture and cognitivedevelopment. Current Directions in PsychologicalScience, 9(2), 37-40.

Travis, L. L. (1997). Goal-based organization of eventmemory in toddlers. In P. W. van den Broek, P. J.Bauer, & T. Bourg (Eds.), Developmental spans inevent comprehension and representation: Bridgingfictional and actual events (pp. 111-138). Mahwah,NJ: LEA.

Tudge, J., Putman, S., & Sidden, J. (1994). Everydayactivities of American preschollers: Lessons andwork in two socio-cultural contexts. In A. Alvarez& P. del Rio (Eds.), Socio-cultural studies: Vol. 4,Education as cultural construction (pp. 110-121).Madrid: Fundación Infancia y Apendizaje.

Vygotsky, L. (1934/1985). Pensée et langage. Paris:Editions Sociales.

Vygotsky, L. (1934/1997). Pensée et langage. Paris: LaDispute.

Wertsch, J. (1985). Vygotsky and the social formation ofthe mind. Cambridge: Harvard University Press.

Wertsch, J., & Sammarco, J. (1985). Social precursorsto individual cognitive functioning: The problem ofunits of analysis. In R. Hinde, A. N. Perret-Clermont, & J. Hinde (Eds.), Social relationshipsand cognitive development (pp. 276-293). Oxford:Clarendon Press.

Wertsch, J., Minick, N., & Arns, F. (1984). The creationof context in joint problem solving. In B. Rogoff &J. Lave (Eds.), Everyday cognition: Itsdevelopment in social context (pp. 151-171).Cambridge: Harvard University Press.

Wood, D. (1990). How children think and learn.Cambridge: Basil Blackwell.

Wood, D., & Middletone, D. (1975). A study of assistedproblem solving. British Journal of Pschology,66, 181-191.

Wood, D., Bruner, J., & Ross, G. (1976). The role oftutoring in problem solving. Journal of ChildPsychology and Psychiatry, 17, 89-100.

RESUMO

Neste estudo foram observadas 50 díades mãe--criança durante a realização conjunta de duas tarefas

561

Page 20: Discurso das mães e participação das crianças na resolução ... · que essa relação é apenas significativa entre os 12 e os 15 meses. Mais tarde os benefícios do apoio materno

de resolução de problemas. As idades das criançassituavam-se entre os 3 e os 5 anos. As díades mãe--criança foram observadas durante a realizaçãoconjunta de duas tarefas de resolução de problemas.As idades das crianças situavam-se entre os 3 e os 5anos. As tarefas pretendiam evocar nas mães situaçõesdidáticas (construção de uma série de comprimento dedez réguas, com e sem modelo). O conteúdo dodiscurso das mães foi analisado, de acordo com aspropostas de Wertsch (1985), considerando osmecanismos semióticos que estabelecem ofuncionamento inter-psicológico (a abreviação e aperspectiva referencial), que permitem a mediaçãometacognitiva e cognitiva.

A participação das crianças foi avaliada a partir dasua responsabilidade pela resolução da tarefa erelacionada com o discurso de scaffolding (apoio) dasmães, considerando as variáveis escolaridade formaldas mães e desenvolvimento cognitivo e da linguagemdos filhos.

Os resultados revelam que as mães adoptaram umscript geral de uma interacção de tutela, mas naseriação com modelo os desafios metacognitivosforam mais frequentes e na série sem modelo é amediação cognitiva que é proporcionalmente maiselevada. Contudo, não se verifica qualquer relaçãosignificativa entre o discurso das mães que incluemdesafios de nível superior, quer metacognitivos quercognitivos, e o nível de participação das crianças nastarefas. Estes resultados são discutidos em termosdas variáveis das crianças e das mães, numaperspectiva sócio-construtivista do RepresentionalRedescription Model de Karmiloff Smith (1992).

Palavras chave: Modelo de (re)descrição represen-tacional, Resolução conjunta de problemas mãe--criança, Scaffolding, Zona de desenvolvimentopotencial.

RESUME

Cinquante dyades mère-enfant ont été filmées lorsde deux tâches de résolution conjointe de problèmes.L’âge des enfants se situait entre 3 et 5 ans. Ces tâchesont été conçues pour permettre l’émergence d’uncadre didactique (la construction d’une série de piècesde différentes longueurs, avec et sans modèle). Lediscours des mères a été analysé quant à son contenu,selon la conception de Wertsch des dispositifssémiotiques que les adultes utilisent pour établir lefonctionnement interpsychologique (abréviation etperspective référentielle), et en tenant compte de lamédiation métacognitive et cognitive.

La participation des enfants a été évaluée comptetenu de leur part de responsabilité dans la résolution de

la tâche et corrélée avec le discours d’étayage de lamère, en considérant les variables “niveau d’étude dela mère” et “développement cognitif et langagier del’enfant”.

Les résultats ont révélé que les mères ont adopté unscript général d’interaction de tutelle, mais que dans lasériation avec modèle les défis métacognitifs sontplus fréquents, alors que dans la sériation sans modèle,la médiation cognitive est plus impliquée. Aucunrapport significatif n’a toutefois été constaté entre lediscours des mères, qui comporte des défis de niveausupérieur aussi bien métacognitifs que cognitifs, et leniveau de participation des enfants aux tâches. Cesrésultats sont analysés en tenant compte des variablesconsidérées pour les enfants et les mères, selon uneperspective socio-constructiviste du modèle deredescription représentationnelle proposé parKarmiloff-Smith (1992).

Mots clé: Modèle de redescription representationel,Resolution conjointe de problèmes mère-enfant,Scaffolding, Zone proximale de developement.

ABSTRACT

The purpose of this research was to assess therelation between mothers’ guidance speech andchildren’s participation in the problem-solving tasks.Fifty mother-child dyads were videotaped during twojoint problem-solving tasks. The children were agedbetween 3 and 5. The tasks were designed to elicit adidactic setting (the construction of a series of piecesof different lengths, with and without a model). Themothers’ speech was analysed according to its content,as per Wertsch’s (1985) view of the semiotic devicesthat adults use to establish inter-psychologicalfunctioning (abbreviation and referential perspective),and considering metacognitive and cognitivemediation.

The children’s participation was assessed on thebasis of the extent to which they were responsible forsolving the problem and was related to the mothers’scaffolding speech, with consideration given to thevariables mother’s formal schooling and the children’scognitive and language development. The resultsreveal that the mothers adopted a general guidancespeech script, but in the seriation with a model themetacognitive challenges were more frequent, while inthe series without a model it was the cognitivemediation that was used relatively more often.However, there was no significant relationshipbetween the discourse of the mothers who employedhigher level metacognitive or cognitive challengesand the children’s participation in the tasks. Theseresults are discussed in terms of the child and mother

562

Page 21: Discurso das mães e participação das crianças na resolução ... · que essa relação é apenas significativa entre os 12 e os 15 meses. Mais tarde os benefícios do apoio materno

variables on the basis of the socio-constructivistperspective taken by Karmiloff Smith’s Representa-tional Redescription Model (1992).

Key words: Mother-child joint problem-solving,Representational redescription model, Scaffolding,Zone of proximal development.

563

Page 22: Discurso das mães e participação das crianças na resolução ... · que essa relação é apenas significativa entre os 12 e os 15 meses. Mais tarde os benefícios do apoio materno