DISSERTAÇÃO - MARIO AUGUSTO - DIREITO - corrigido - 10-03-2012€¦ · 9º a 11, da Lei nº...

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UNIVERSIDADE PARANAENSE - UNIPAR MESTRADO EM DIREITO PROCESSUAL E CIDADANIA MÁRIO AUGUSTO DRAGO DE LUCENA UMA ANÁLISE CRÍTICA DA AÇÃO DE IMPROBIDADE COM ESPECIAL RELEVO PARA OS TIPOS CULPOSOS UMUARAMA 2011

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UNIVERSIDADE PARANAENSE - UNIPAR

MESTRADO EM DIREITO PROCESSUAL E CIDADANIA

MÁRIO AUGUSTO DRAGO DE LUCENA

UMA ANÁLISE CRÍTICA DA AÇÃO DE IMPROBIDADE COM ESPECIAL RELEVO PARA OS TIPOS CULPOSOS

UMUARAMA 2011

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MÁRIO AUGUSTO DRAGO DE LUCENA

UMA ANÁLISE CRÍTICA DA AÇÃO DE IMPROBIDADE COM ESPECIAL RELEVO

PARA OS TIPOS CULPOSOS

Trabalho de conclusão de Curso apresentado à banca examinadora do Curso de Mestrado da Universidade Paranaense – UNIPAR, como exigência parcial para obtenção do grau de Mestre, sob orientação do professor orientador Fábio Caldas de Araujo

UMUARAMA 2011

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Bibliotecária Responsável Inês Gemelli CRB 9/966

L935c Lucena, Mário Augusto Drago de. Uma análise crítica da ação de improbidade com especial relevo para tipos culposos / Mário Augusto Drago de Lucena. – Umuarama : Universidade Paranaense – UNIPAR, 2012.

103 f.

Orientador: Prof. Dr. Fábio Caldas de Araujo. Dissertação (Mestrado) - Universidade Paranaense - UNIPAR.

1. Direito penal. 2. Dolo. 3. Improbidade. 4. Culpa grave. 5. Desonestidade. 6. Inabilidade. I. Universidade Paranaense – UNIPAR. II. Título.

(21 ed) CDD 341.5222

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FOLHA DE AP ROV AÇ ÃO

MÁRIO AUGUSTO DRAGO DE LUCENA

UMA ANÁLISE CRÍTICA DA AÇÃO DE IMPROBIDADE COM ESPECIAL RELEVO PARA OS TIPOS CULPOSOS

Dissertação apresentado como requisito parcial para obtenção do título de Mestre, no Programa de Pós- graduação “Stricto Sensu” de Mestrado em Direito Processual e Cidadania da Universidade Paranaense – Unipar, pela seguinte banca examinadora:

__________________________________________ Prof. Dr. Fábio Caldas de Araújo

Orientador – Doutor em Direito pela PUC-SP

__________________________________________ Prof. Dr. Gilson Bonato

Doutor em Direito pela UFPR

__________________________________________ Prof. Dr. Celso Hiroshi Iocohama Doutor em Direito pela PUC-SP

Umuarama, 26 de outubro de 2011

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DEDICATÓRIA Dedico a DEUS pela sua presença constante e fundamental em minha vida. A meu pai, João Neudes, um amante inveterado do direito, da justiça e do bom senso. À minha mãe Isaura Líbera que, entre outras lições, me ensinou a ser perseverante. À minha outra mãe, Celita Terezinha, carinhosamente alcunhada por “Negrinha”, tão importante quanto a primeira, pelo amor incondicional que sempre me dedicou. Às minhas filhas Gabriela e Isabela, razões da minha existência. Ao meu orientador, Dr. Fábio Caldas, meu maior incentivador nos últimos anos. E, por fim, mas não menos importante, aos meus amigos/irmãos Fábio Hideki Nakanishi, Vanderlei Menóia e Fábio Caldas de Araújo, por concretizarem em atitudes o conceito de amizade.

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AGRADECIMENTOS

A DEUS, meu grande companheiro, por me permitir um convívio estreito com

ele e, consequentemente, me dar a paz necessária para, passo em passo,

conquistar os meus objetivos.

As minhas filhas, Gabriela e Isabela, simplesmente por serem o projeto que

mais deu certo em minha trajetória de vida e que são o meu maior incentivo para

continuar a crescer nos planos pessoal e profissional.

À Alana Braga, minha namorada, que em que pese o pouco tempo de

convívio e a tenra idade, foi generosa e paciente, mostrando que sua beleza externa

é infinitamente superada, pela interna.

Ao meu orientador, mestre, incentivador e amigo/irmão, Dr. Fábio Caldas de

Araújo, inicialmente por me ter convencido de que eu poderia ingressar no mestrado,

depois pelo constante apoio durante a jornada e, por fim, pela compreensão de ter

entendido as dificuldades/ensinamentos por que passei nos últimos meses e ser

consciente de que, por ele, eu gostaria que esta dissertação ficasse muito melhor.

Aos professores do mestrado pelos ensinamentos dispensados.

Aos colegas de mestrado com quem adquiri conhecimentos e fiz grandes

amizades.

A todos os meus amigos, que de forma, direta ou indireta me ajudaram neste

trabalho, cujos nomes prefiro não relacionar, pelo receio de que minha memória

possa me trair.

Aos funcionários da Secretaria de Mestrado da UNIPAR, Antonio, Renata e

......, pelo cordial tratamento a mim dispensado, facilmente confundido com carinho,

que marcou-me profundamente o coração.

Às zeladoras pelos petiscos e o bom café que proporcionaram longas e

descontraídas conversas entre professores e alunos, permitindo que reciprocamente

se conhecessem extra-aula.

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RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo analisar os atos de improbidade administrativa previstos nos arts. 9º a 11, da Lei nº 8.429/92, que causam enriquecimento ilícito, prejuízo ao erário e atentem contra a administração pública, bem como analisar os elementos para a configuração do suporte fático, dentre eles o elemento subjetivo dolo ou culpa grave, vez que a sua finalidade é alcançar e punir os agentes públicos/políticos e os terceiros a eles vinculados pelo mesmo liame subjetivo, que ajam de forma desonesta e desleal em relação à administração pública e não aqueles que sejam inábeis ou despreparados. O cabimento da ação civil por ato de improbidade deve considerar a situação peculiar de nossa estrutura federativa, que não permite equiparar a capacidade e o preparo de prefeitos e vereadores de pequenos municípios brasileiros, que na sua grande maioria não tem sequer o ensino fundamental, como o Chefe do Executivo Nacional, deputados e senadores. Não basta a mera subsunção da conduta ao tipo de ato de improbidade (tipicidade formal), sendo necessário verificar se ela deriva de má-fé, existente no administrador desonesto e, não no incompetente. Passa-se pela análise de que a utilização indiscriminada e excessiva das ações de improbidade administrativa, alcançando até singelas irregularidades, muitas vezes formais, e administradores honestos, mas despreparados, banaliza a própria ação, instrumento de extrema valia na defesa do patrimônio público, bem assim inibe as pessoas honestas de concorrerem a cargos públicos ou políticos. Por fim, conclui-se que embora conste expressamente a modalidade culposa para a configuração dos atos de improbidade administrativa que causem dano ao erário público, somente a aliança entre este e o dolo, ou culpa grave, podem embasar uma ação civil de improbidade administrativa, pois os atos praticados com culpa leve ou levíssima ou são irrelevantes ou devem ser tratados no âmbito do processo administrativo. Palavras-chave: Improbidade – dolo - culpa grave – desonestidade – inabilidade

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ABSTRACT

This paper aims to defend the acts of improper conduct laid down in articles. 9 to 11 of Law No. 8.429/92, which cause embezzlement losses to the public and violate the public administration, require for their configuration, the subjective element of intent or gross negligence, since its purpose is to reach and punish public officials / politicians and third parties that are linked to the same bond subjective, to act dishonestly and unfairly in relation to public administration and not those who are unskilled or unprepared. The pertinence of the civil action by an act of misconduct must consider the peculiar situation of our federal structure, not the ability to assimilate and preparation of mayors and councilors from small municipalities, which mostly do not even have primary education, with National Chief Executive, MPs and senators. Do not just mere subsumption conduct the type of act of impropriety (formal typicality), and need to check if it comes in bad faith, from the dishonest steward, and not the incompetent. Pass by the analysis that the use of indiscriminate and excessive actions of administrative misconduct, reaching uncomplicated irregularities, often formal, and honest administrators, but unprepared, to trivialize the action itself, extremely valuable tool in the defense of the public as well thus inhibiting honest people to compete for public office or political. Finally, we conclude that although expressly stating the mode for configuring the culpable acts of improper conduct damaging to the public purse, only the alliance between this and deceit, or negligence, can base a civil action for improper conduct, as The acts performed or very light or light trespass are irrelevant or should be treated in the administrative proceedings. Key-words: Misconduct - intent - negligence - dishonesty - disability.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ............................................................................................................9

2 A IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA: CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES .......11

3 ANÁLISE CONSTITUCIONAL E PRINCIPIOLÓGICA DA PROBRIDADE

ADMINISTRATIVA ....................................................................................................15

3.1 PRINCÍPIO DA IMPESSOALIDADE ................................................................15

3.2 PRINCÍPIO DA PUBLICIDADE........................................................................17

3.3 PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA ...........................................................................18

3.4 PRINCÍPIO DA SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO............................19

3.5 PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE...................................................................20

3.6 PRINCÍPIO DA LEGALIDADE .........................................................................23

3.7 PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE........................................................24

3.8 PRINCÍPIO DA MORALIDADE........................................................................27

4 ESTRUTURA ANALÍTICA DO ATO DE IMPROBIDADE .......................................30

4.1 DOLO...............................................................................................................30

4.2 CULPA.............................................................................................................37

4.3 BOA-FÉ E MÁ-FÉ:...........................................................................................42

5 OBJETIVO DA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA ..................................45

6 A IMPROPRIDADE EM FACE DO SISTEMA FEDERATIVO BRASILEIRO ..........55

7 SANÇÕES DA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA...................................61

7.1 PERDA DA FUNÇÃO PÚBLICA ......................................................................61

7.2 SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS:...................................................64

7.3 MULTA CIVIL...................................................................................................66

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7.4 PROIBIÇÃO DE CONTRATAR E DE RECEBER BENEFÍCIOS OU

INCENTIVOS ................................................................................................................. 67

8 AS ESPÉCIES DE ATOS DE IMPROBIDADE E SEUS ELEMENTOS

SUBJETIVOS................................................................................................................. 75

CONCLUSÃO............................................................................................................97

REFERÊNCIAS.......................................................................................................100

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INTRODUÇÃO

Diuturnamente se vê nos veículos de comunicação notícias cada vez mais

revoltantes, acerca de atos desonestos praticados por políticos, funcionários

públicos diretos ou indiretos, e terceiras pessoas a eles vinculados, que, valendo-se

de seus cargos e funções, em pouco tempo adquirem um patrimônio exorbitante,

causam rombos nos cofres públicos, “vendem” leis, pareceres e sentenças, em troca

de favores, carros, propriedades, ou simplesmente relegam a nada os princípios que

deveriam reger suas atuações.

As informações de tal jaez são tão frequentes que se tornaram naturais, pois

muitos, sequer ainda se surpreendem com elas. Como exemplo é lícito lembrar-se

de casos notórios como: dinheiro de propina depositado em paraísos fiscais,

colocado em peças íntimas, desviado para empresas de parentes, obtidos através

da venda de bovinos nunca existentes e assim por diante.

Entretanto o combate à atuação de agentes desonestos vem sido exercido

através de ações populares e de improbidade administrativa.

São verídicas as sensações de que a criatividade dos agentes ímprobos é

infinita e parece que eles estão sempre à frente. Todavia é realidade, também, que

os legitimados da ação de improbidade, principalmente os membros do Ministério

Público, têm agido de forma incansável no intuito de resgatar um pouco, pelo

menos, do dinheiro público desviado e punir os agentes ímprobos.

Ocorre que todos os legitimados devem ter equilíbrio e sensatez no uso da

ação civil por ato de improbidade administrativa, visando com ela atingir apenas os

gestores da res pública que laborem com má-fé, deslealdade, desonestidade, falta

de retidão, não ultrapassando este limite para alcançar administradores ou

funcionários retos, íntegros e leais, porém com pouco conhecimento, desastrosos e

descuidados.

Há que se distinguir os desonestos, dos inábeis. Para aqueles cabe a ação

civil por ato de improbidade administrativa e suas sanções. Para estes, quando for o

caso, processos administrativos e suas penas.

Isto se faz necessário inclusive em razão do sistema federativo adotado pelo

Brasil, onde muitos municípios têm à frente do Poder Executivo e nas câmaras de

vereadores, alcaides e presidentes, respectivamente, que sequer possuem ensino

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fundamental e, portanto, têm maior probabilidade de ferirem algum princípio ou, até,

lesionarem o patrimônio público por culpa e não por dolo.

Atente-se, ainda, que a utilização indevida da ação de improbidade e as

severas sanções da lei nº 8.429/92, inibem que pessoas honestas e preparadas

ingressem em funções públicas ou concorram a cargos eletivos, já que ficam

receosas de errarem e, consequentemente, terem seus nomes misturados aos dos

desonestos.

Os entendimentos anteriores de que o ato de improbidade poderia ser

cometido inclusive objetivamente, sem a presença do dolo e da culpa, felizmente

vêm se alterando paulatinamente. Passou da responsabilidade objetiva, para a

subjetiva, ou seja, conduta perpetrada com dolo ou culpa. Na sequência alguns

passaram a defender que apenas o dolo e a culpa grave configuram o ato ímprobo

e, por fim, já tem julgados afirmando que para a caracterização da improbidade,

imprescindível se faz a má-fé, o dolo.

Esta evolução, embora paulatina, deve ser comemorada, pois cada vez mais

tem se aproximado do grande e inestimável objetivo buscado pela lei, que é por fim

ou inibir os agentes desonestos e, consequentemente, assegurar e até incentivar os

probos de que devem assumir cargos públicos ou políticos, pois a lei existe, funciona

e protege aqueles, que mesmo falhos, agem no interesse do bem comum.

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2 A IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA: CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES

Inicialmente deve-se fazer uma menção à tênue diferença do significado dos

termos imoralidade e improbidade administrativa, ambos, conceitos vagos.

Analisando o léxico constata-se uma pequena diferença entre imoralidade e

improbidade administrativa.

A palavra moral, deriva do latim morale, que significa relativo aos costumes. O

termo improbidade, por sua vez, que também se origina do latim improbitate,

significa desonestidade. Probo do latim probu, denota de caráter integro; honesto,

honrado, reto, justo.

No léxico da língua portuguesa, verifica-se que imoralidade1 significa:

A mera leitura da Constituição Federal leva à constatação de que o conceito

de improbidade administrativa destoa do conceito de imoralidade administrativa e

cabe ao seu exegeta fixar o conceito de cada um dos termos.

De acordo com Alvarenga2:

Depois de dizer que a moralidade administrativa é definida como princípio da Administração Pública (art. 37), afirma que a idéia subjacente a esse princípio “é a de que moralidade administrativa não é moralidade comum, mas moralidade jurídica. Essa consideração não significa necessariamente que o ato legal seja honesto. Significa como disse Hauriou, que a moralidade administrativa consiste no conjunto de regras de conduta tiradas da disciplina interior da Administração”. Já, a probidade administrativa, segundo o eminente constitucionalista, repetindo lição de Marcello Caetano, “é uma forma de moralidade administrativa que mereceu consideração especial pela Constituição, que pune o ímprobo com a suspensão dos direitos políticos (art. 37, parágrafo 4º.)”. A improbidade administrativa consiste no dever de o “funcionário servir a Administração com honestidade, procedendo no exercício das suas funções, sem aproveitar os poderes ou facilidades delas decorrentes em proveito pessoal ou de outrem a quem queira favorecer”.

105 1 Falta de moralidade, indecência; 1.Prática de maus costumes, desregramento (cf. amoralidade). Improbidade, por sua vez, remete a: 1.Falta de probidade, mau caráter, desonestidade. 2. Maldade, perversidade. 2 ALVARENGA, A.J. apud SILVA, J.A.da. Improbidade administrativa questões polêmicas e atuais. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 87

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Pode-se dizer que imoralidade é gênero e improbidade a espécie.

Improbidade é uma imoralidade qualificada pela desonestidade de quem a pratica.

Silva3 conceituou improbidade administrativa da forma abaixo:

[...] improbidade administrativa é uma imoralidade administrativa qualificada,[...] uma imoralidade qualificada pelo dano ao erário e correspondente vantagem ao ímprobo ou a outrem,e por isso “é tratada ainda com mais rigor, porque entra no ordenamento constitucional como causa de suspensão dos direitos políticos do ímprobo [...].

Em que pese à imoralidade seja gênero e a improbidade espécie a distinção

entre ambas é extremamente importante, pois o desrespeito de cada uma delas gera

consequências diversas. O desrespeito à moralidade pode causar a anulação do ato

e a responsabilização administrativa e civil do agente. O desrespeito à probidade é

mais grave, pois além de causar a anulação do ato e a responsabilidade civil e

administrativa do agente, pode acarretar, nos termos da Constituição Federal:

suspensão de direitos políticos, perda da função pública, indisponibilidade de bens e

ressarcimento ao erário. HARGER4.

Os autores que conceituaram improbidade administrativa colocaram como

elemento essencial a desonestidade, a má-fé, a deslealdade do autor do ato.

Isto se extrai, por exemplo, quando Silva5 exclama: “Improbo administrativo

é o devasso da administração Pública” ou quando Aristides Junqueira Alvarenga

anota6:

Pode-se, pois, conceituar improbidade administrativa como espécie do gênero imoralidade administrativa, qualificada pela desonestidade de conduta do agente público, mediante a qual este se enriquece ilicitamente, obtém vantagem indevida, para si ou para outrem, ou causa dano ao erário.

105 3SILVA, J.A.da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros: 2001, p. 652/653. 4 HARGER, M. A inexistência de improbidade administrativa na modalidade culposa. Rev. Administrativo, Constitucional, Previdenciário, Processual Civil e Ambiental, IP-58, p. 179. 5 SILVA, J.A. Curso de direito constitucional positivo. 33ª ed. São Paulo: Malheiros, 2009. 6 ALVARENGA, A.J. Improbidade administrativa questões polêmicas e atuais, Malheiros, São Paulo: 2001.

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Neiva7 conceitua improbidade administrativa, da seguinte forma:

A improbidade administrativa configurar-se-ia como ação ou omissão dolosa de agente público ou de quem de qualquer forma concorresse para a realização da conduta, com a nota imprescindível da deslealdade, desonestidade ou ausência de caráter, que viesse a acarretar enriquecimento ilícito, lesão ao patrimônio das pessoas jurídicas mencionadas no artigo 1º da LIA, ou, ainda, que violasse os princípios da Administração Pública, nos termos previstos nos arts. 9º., 10 e 11 da citada Lei.

Pazzaglini Filho; Rosa; Fazzio Junior8 estabelecem um conceito preliminar,

porém minucioso e esclarecedor de improbidade administrativa. Dizem os autores:

Numa primeira aproximação, improbidade administrativa é o designativo técnico para a chamada corrupção administrativa, que, sob diversas formas, promove o desvirtuamento da Administração Pública e afronta os princípios nucleares da ordem jurídica (Estado de Direito, Democrático e Republicano) revelando-se pela obtenção de vantagens patrimoniais indevidas a expensas do erário, pelo exercício nocivo das funções e empregos públicos, pelo “tráfico de influência” nas esferas da Administração pública e pelo favorecimento de poucos em detrimento dos interesses da sociedade, mediante a concessão de obséquios e privilégios ilícitos.

Igualmente se vislumbra a menção e vinculação da improbidade com a falta

de integridade, ineficiência, lealdade, no direito comparado.

Osório,9 no tópico Improbidade na Perspectiva do Direito Comparado faz as

seguintes alusões:

No direito francês, embora inexista texto legal, há um reconhecimento

acerca do dever ou da obrigação ética de probidade administrativa. O Conselho de

Estado Francês já se pronunciou no sentido de que a probidade seria equivalente à

honestidade (OSÓRIO, 2007).

105 7 NEIVA, J.A.L. Improbidade administrativa: Estudo sobre a demanda na ação de conhecimento e cautelar. Niterói-RJ.: Impetus, 2006, p.13. 8 PAZZAGLINI FILHO, M.; ROSA, M.F.E.; FAZZIO JUNIOR, W. Aspectos jurídicos da defesa do patrimônio público. São Paulo: Atlas, 1996, p.35. 9 OSÓRIO, F.M. Teoria da improbidade administrativa: má gestão pública – corrupção – ineficiência. São Paulo: RT, 2007, p. 67/83.

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Na Itália a gestão pública e suas deficiências estão intimamente ligadas à

criminalidade organizada, subornos, fraudes, propinas, nepotismo e enriquecimento

ilícito, que chegou a deflagrar na década de 90 a chamada “operação mãos limpas”

(OSÓRIO, 2007).

Idêntica situação se constata na análise da gestão pública espanhola,

também marcada por constantes escândalos, mobilizações da opinião pública e

embates políticos sobre a honestidade e a vida pregressa dos políticos (OSÓRIO,

2007).

No direito positivo argentino a probidade está literalmente definida como a

retidão e a honradez. Exige que o funcionário aja de forma pública e transparente,

satisfazendo o interesse de todos e desprezando qualquer proveito pessoal

(OSÓRIO, 2007).

No direito anglo-saxônico, não é diferente. A denominada maladministration

abarca desde o menor dos problemas até os mais graves, como escândalos de

suborno, fraudes, tráfico de influência, financiamentos ilegais de campanha, atos

que na sua maciça maioria são frutos da consciência e da vontade de seus autores

(dolosos) (OSÓRIO, 2007).

Registre-se, no entanto, que no direito comparado assim como no Brasil, são

também considerados atos de improbidade administrativa aqueles provenientes da

desídia, do descuido, enfim, da culpa. Mas indiscutivelmente o grande objetivo de

todos foi e é por fim a desonestidade que impera na administração pública, no

mundo inteiro (OSÓRIO, 2007).

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3 ANÁLISE CONSTITUCIONAL E PRINCIPIOLÓGICA DA PROBRIDADE ADMINISTRATIVA

Os autores que se debruçaram em tecer comentários acerca dos princípios

regentes da probidade administrativa, embora divirjam na sua enumeração,

comungam em indicar os princípios da impessoalidade, publicidade, eficiência,

supremacia do interesse público, razoabilidade, legalidade, proporcionalidade e

moralidade como norteadores da matéria.

A análise dos princípios, muitas vezes, na prática, relegada ao segundo

plano, é de fundamental importância para a compreensão e correta aplicação do

direito ao caso concreto.

Não é incomum a propositura de ações de improbidade administrativa, pleitos

e decisões com flagrante violação aos princípios, que sequer foram objeto de

apreciação delas.

A aplicação de sanções idênticas a agentes que praticaram atos de

improbidade administrativa na modalidade culposa e dolosa e a imposição conjunta

das penas previstas nos incisos do art. 12 da Lei n. 8.429/92, a todos os casos, são

exemplos da afirmação supracitada, vez que desconsiderados, nas duas situações,

os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

Diante da importância e da imprescindibilidade dos princípios como alicerces

fundamentais que sustentam e dos quais deflui o direito positivo, passa-se a

explicitar brevemente alguns deles da forma que segue:

3.1 PRINCÍPIO DA IMPESSOALIDADE

Impessoal, para o léxico, é o que não diz respeito a uma pessoa em especial.

Na seara da administração, deve ser visto sob dois ângulos: o da administração

pública e o do administrado. Quem realiza o ato é o órgão ou a entidade e não o

agente público.

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No dizer de Garcia e Alves10 “tanto as realizações propriamente ditas, como a

publicidade dos respectivos atos, devem ser atribuídas ao ente legitimado à sua

prática, não aos recursos humanos que viabilizaram a sua concretização”.

No tocante aos administrados o princípio da impessoalidade é uma faceta do

princípio da isonomia. Significa que a administração pública deve dispensar igual

tratamento aos administrados que se encontrem em situações semelhantes, sempre

tendo em mente o seu alvo principal que é a satisfação do interesse público. Tal

escopo não é alcançado quando o que se visa é o interesse particular.

A atuação do administrador deve ser imparcial, não podendo beneficiar ou

prejudicar este ou aquele administrado. Cabe aqui a máxima de que todos são

iguais perante a lei e sob o enfoque da isonomia real, ou seja, de que os iguais

devem ser tratados igualmente e os desiguais, desigualmente, na medida de suas

desigualdades. Entendimento idêntico deve se ter no sentido de que os atos

administrativos devem gerar os mesmos efeitos aqueles que se encontrem em

posição similar, seja fática ou jurídica.

Silva11 sintetiza o que foi dito, afirmando:

O princípio ou regra da impessoalidade da Administração Pública, significa que os atos e provimentos administrativos são imputáveis não ao funcionário que os pratica mas ao órgão ou entidade administrativa em nome do qual age o funcionário. Este é mero agente da Administração pública, de sorte que não; é ele o autor institucional do ato. Ele é apenas o órgão que formalmente manifesta a vontade estatal. Por conseguinte, o administrado não se confronta com o funcionário x ou y que expediu o ato, mas com a entidade cuja vontade foi manifestada por ele.

Por fim, digno de registro é que, embora o princípio da impessoalidade em

sua acepção ativa impute a autoria do ato administrativo ao órgão ou a entidade e

não ao agente público que o viabilizou, este poderá ser responsabilizado

pessoalmente pela sua prática. Esta responsabilização pessoal ocorre toda

105 10 GARCIA, E.; ALVES, R.P. Improbidade administrativa. 4ª ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 51. 11 SILVA, J.A.da. Curso de direito constitucional positivo. 33ª ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 667.

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vez que o agente atua em desconformidade com a ordem jurídica, sem objetivar a

realização do bem comum.

Kelsen12 tratando do assunto enfatizou que “um indivíduo atua como órgão do

Estado apenas na medida em que atua baseado na autorização conferida por

alguma norma válida”.

3.2 PRINCÍPIO DA PUBLICIDADE

O princípio em epígrafe tem como objetivo oportunizar a todos o

conhecimento dos atos praticados pela administração, atribuindo transparência no

trato da coisa pública e permitindo a fiscalização deles pela população.

É inadmissível que em um Estado Democrático de Direito, onde o poder está

nas mãos do povo, que os atos administrativos sejam realizados de forma oculta, às

escuras, impedindo o conhecimento e, consequentemente, a fiscalização

exatamente pelo administrado.

Natural que o administrador público, que gere o patrimônio do povo, aja com

transparência, divulgando da maneira mais aberta possível o que vem realizando.

O desrespeito ao princípio da publicidade torna o ato inválido e ineficaz.

Segundo Tolosa Filho13: “Em tese, inexiste ato administrativo secreto ou

indisponível. Somente em situações extremamente excepcionais, permite-se o sigilo

na administração.”

A exceção da publicidade dos atos na seara administrativa vem prevista no

art. 5º XXXIII, parte final da Constituição Federal, que menciona o sigilo quando

“imprescindível à segurança da sociedade e do Estado”.

A obrigatoriedade no cumprimento do princípio da publicidade atinge todas as

pessoas administrativas, diretas ou indiretas (empresas públicas, sociedades de

economia mistas e fundações públicas), de quaisquer entes federativos.

105 12 KELSEN, H. Teoria geral do direito e do estado. São Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 376. 13 TOLOSA FILHO. B. de. Comentários à lei de improbidade administrativa. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 60.

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O conhecimento acerca do teor dos atos administrativos pode ser obtido

através do direito de petição e pelo requerimento de certidões, instrumentos

previstos no art. 5º, inciso XXXIV, alíneas “a” e “b”, respectivamente, da Carta

Magna de 1988. Em sendo estes negados deve o prejudicado valer-se do mandado

de segurança (art. 5º. LXIX, da CF) e do habeas data (art. 5º. XXXIII, da CF).

3.3 PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA

Introduzido pela Emenda Constitucional nº 19/98, em razão do

descontentamento do povo com a prestação deficiente e/ou deficitária dos serviços

públicos colocados ou não à disposição dela, o princípio da eficiência tem como

núcleo a busca da economia e produtividade dos serviços colocados em favor da

sociedade que deverão ser de boa qualidade e na quantidade suficiente.

O princípio da eficiência, não deve ser observado apenas nos serviços

públicos prestados diretamente à população, mas também nos trabalhos

administrativos internos realizados pelos entes federativos e pessoas a eles

vinculadas. Devem todos estes introduzir novas tecnologias, métodos e instrumentos

para chegarem a qualidade total da execução de suas atividades (CARVALHO

FILHO14).

Espera-se que o princípio da eficiência não tenha sido “apenas” guindado ao

plano constitucional, mas que ele seja concretizado, na prática.

É que a idéia da eficiência na administração pública já existia implicitamente.

A sociedade tinha como entendimento natural o de que o gestor da res publica,

deveria pautar sua atuação sempre no sentido de atingir a perfeição, a conveniência

e a razoabilidade dos serviços públicos e administrativos, bem assim que os

servidores fossem prestativos e rentáveis de forma a oferecer à sociedade os

melhores serviços, na quantidade suficiente, com baixo custo e no momento

oportuno.

105 14 CARVALHO FILHO, J.dos S. Manual de direito administrativo. 23ª Ed., Rio de Janeiro: Lumen Júris: 2010.

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É que é receio comum o demonstrado por Rigolin15, quando diz que:

[...] nada adianta a referência expressa na Constituição se não houver por parte da administração a efetiva intenção de melhorar a gestão da coisa pública e dos interesses da sociedade. Com efeito, nenhum órgão público se tornará eficiente por ter sido a eficiência qualificada como princípio na constituição.

De acordo com o autor citado:16 “a inclusão do princípio da eficiência no texto

constitucional foi a atitude mais ineficiente da vida dos autores da idéia, nos últimos

30 anos”.

Inegavelmente a mera inserção de um princípio no texto constitucional não

traz qualquer resultado prático se o pensamento dos agentes públicos não estiver

voltado à consecução dos reais interesses da coletividade. Aliás, totalmente

dispensável seria a enumeração de princípios relativos à administração pública se o

administrador fosse sério, probo, impessoal no trato da coisa e agisse, sempre, na

intenção de atingir o bem comum. Necessária se fez a indicação deles, porque a

realidade exige que se diga expressamente, o que todos já sabem, mas alguns se

negam a ouvir.

3.4 PRINCÍPIO DA SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO

Havendo confronto entre o interesse de um particular e o interesse da

coletividade este deve prevalecer. O interesse público “vence”, o interesse privado.

Ressalte-se, entretanto, que as asseverações acima dependem da existência

de previsão normativa antecedente. Não pode o administrador, sob o manto da

supremacia do interesse público, realizar atos que ferem os interesses do particular,

sem ter lei que o ampare.

105 15 RIGOLIN, I.B. O servidor público nas reformas constitucionais. Belo Horizonte: Fórum: 2003, p. 34. 16 RIGOLIN, I.B., op cit., p. 32.

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As atividades administrativas devem sempre ser realizadas visando o

interesse da sociedade e quando isso não ocorre, a atuação estatal estará viciada

pelo desvio de finalidade.

Deste princípio advém o direito da administração, na defesa do interesse

público, de poder criar obrigações a seus administrados, através de atos unilaterais;

a auto-executoriedade, consistente na possibilidade de ela própria executar seus

atos quando a lei preveja expressamente esta faculdade ou na eminência do

perecimento do interesse público, não houver outra via com a mesma eficácia; e o

poder de autotutela dos atos administrativos, que permite a administração revogar,

dentro de certos limites, os seus próprios atos inconvenientes e inoportunos e o

dever de anular ou convalidar os atos inválidos que realizou.

Há quem tem defendido opinião oposta, ou seja, a primazia do direito privado

sobre o público. Todavia, se é certo que o Estado tutela direitos e garantias dos

particulares, é ainda mais correto afirmar-se que, em regra, o interesse da

coletividade sempre se sobrepõe ao interesse privado. É do senso comum e base do

regime democrático, que os interesses da primeira, devem preponderar sobre os

interesses do indivíduo (CARVALHO FILHO17).

3.5 PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE “Razoável é aquilo que está dentro dos limites aceitáveis” (CARVALHO

FILHO18).

O ato é razoável quando atinge sua finalidade e sua motivação, se não é

comungada por todos, é de aceitabilidade ordinária.

Bandeira de Mello19 leciona que “o administrador quando age

discricionariamente tem a obrigação de obedecer aos critérios aceitáveis do ponto

105 17 CARVALHO FILHO, J. dos S. Manual de direito administrativo. 23ª ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 35. 18 CARVALHO FILHO, J. dos S. Manual de direito administrativo. 23ª ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 42. 19 BANDEIRA DE MELLO, C.A. Curso de direito administrativo. 28ª. Ed., São Paulo: Malheiros 2010, p. 108.

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de vista racional, harmonizando-o com o sentimento natural das pessoas

equilibradas e de forma a respeitar as finalidades que a lei impõe”.

Para o doutrinador o fato de a lei conferir certa liberdade ao administrador,

não significa que ele possa agir ao bel prazer, satisfazendo prazeres pessoais,

manipulando a regra para obter fins não desejados, nem assumidos pela lei.

Assim, havendo uma relação de congruência entre a situação fática ou

jurídica e os efeitos do ato praticado, a qual é notadamente aceita pela maioria, diz-

se que foi respeitado o princípio em análise. Caso se verifique uma discrepância

neste cotejo, clara está sua irrazoabilidade.

Garcia e Alves20 assim se referem ao princípio da Razoabilidade:

É necessário que haja uma relação de adequação entre a situação fática ou jurídica e a natureza do ato praticado, o que exige uma ponderação correta entre a causa e o efeito pretendido, consequência imediata de uma responsável identificação dos valores subjacentes ao caso.

E, continuam os autores21:

Se a análise do ato, à luz da situação fática e da finalidade almejada, denotar que ele possui um desmesurado exagero, ou uma injustificada limitação, restará clara a sua irrazoabilidade. Diversamente, se o conteúdo do ato for congruente com os motivos e os fins que o justificam, está presente a sua razoabilidade, o que demonstra que este princípio é sustentado pelo mesmo conteúdo normativo dos princípios da legalidade e da finalidade.

Desta forma, pode-se afirmar que quando o ato for realizado de modo

adequado a solucionar a situação fática ou jurídica, posta à mesa, tendo

fundamentos aceitáveis pelo entendimento do homem médio, respeitado está o

princípio da razoabilidade.

105 20 GARCIA; E.; ALVES,R.P. Improbidade administrativa. 4ª ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 57, 58. 21 GARCIA; E.; ALVES,R.P. Improbidade administrativa. 4ª ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 60.

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Nas ações de improbidade administrativa deve o magistrado analisar o caso

concreto e, constatando a pratica do ato de improbidade, aplicar a(s) pena(s) mais

adequada(s).22

Além da gravidade do ato e a extensão do dano, imprescindível que seja

observado o elemento subjetivo que comandou a conduta, pois tratar de maneira

semelhante o agente ímprobo que atuou com dolo e o que laborou com culpa, viola

os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.23

105 22 ADMINISTRATIVO – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS – PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. 1. Recurso interposto nos autos da ação de improbidade administrativa movida pelo Ministério Público Federal contra o ex-prefeito do Município de Centenário/TO, pelo não cumprimento das metas estabelecidas no Convênio n.2154/93 com Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FDNE. 2. O Tribunal regional manteve a sentença que reconheceu a materialidade da improbidade administrativa e aplicou a sanção de ressarcimento integral dos danos, afastando o pedido de suspensão dos direitos políticos por mostrar-se inadequado e desproporcional ao caso dos autos. 3. A sanção de suspensão dos direitos políticos é a mais drástica das penalidades estabelecidas no art. 12, da Lei n. 8.429/92, devendo ser aplicada tão somente em casos graves. Precedentes: REsp 1055644/GO, Rel. Min. Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 21.5.2009, DJe 1.6.2009;REsp 1097757/RS, Rel. Min. Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 1.9.2009, DJe 18.9.2009; REsp 875425/RJ, Rel. Min. Denise Arruda, Primeira Turma, julgado em 9.12.2008, DJe 11.2.2009. 4. A Lei de improbidade administrativa não estabelece a aplicação cumulativa das sanções, cabendo ao magistrado, na análise de cada caso, aplicar a mais adequada, em conformidade com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. 5. Não fere os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade a não aplicação da sanção de suspensão dos direitos políticos quando não há nos autos prova do enriquecimento ilícito do administrado, apenas pequena extensão dos danos. Agravo regimental improvido (AgRg no AgRg no Ag 1261659 / TO – STJ – 2ª Turma - Rel. Humberto Martins – DJ – 25.05.2010 – Dje 07.06.2010). 23 ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE. DANO AO ERÁRIO. CULPA. IMPROBIDADE CONFIGURADA. RESSARCIMENTO. INSUFICIÊNCIA. APLICAÇÃO DAS SANÇÕES PROPRIAMENTE DITAS. NECESSIDADE. DOSIMETRIA A CARGO DO JULGADOR ORDINÁRIO. 1. Cuidam os autos de Ação de Improbidade Administrativa movida contra ex-prefeita do Município de Rio Formoso/PE, com base em apuração feita pelo Tribunal de Contas das seguintes irregularidades: não-aplicação de material adquirido para saneamento básico e recuperação das vias públicas; dispêndios representados pelo excedente embutido nos custos globais de obras; aquisição de insumos por preços maiores que os praticados no mercado na recuperação de casas populares e escolas; e gastos com material de construção e serviços sem destinação definida. 2. A instância ordinária julgou o pedido procedente em parte para condenar a ré ao ressarcimento do Erário no valor de R$ 25.000,00, deixando, porém, de lhe impor sanções pela prática de improbidade administrativa, ao fundamento de não ter havido comprovação de dolo mas apenas negligência. 3. O art. 10 da Lei 8.429/1992, que censura as condutas ímprobas por dano ao Erário, admite a modalidade culposa. Precedentes do STJ. 4. O ressarcimento não constitui sanção propriamente dita, mas sim conseqüência necessária do prejuízo causado. Caracterizada a improbidade administrativa por dano ao Erário, a devolução dos valores é imperiosa e deve vir acompanhada de pelo menos uma das sanções legais que, efetivamente, visam a reprimir a conduta ímproba e a evitar o cometimento de novas infrações. Precedentes do STJ.

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Há situações em que se verifica que a pena de multa e razoável para a

prevenção geral e pessoal. Isto ocorre, por exemplo, quando o agente, embora aja

com dolo descumpre principio que rege a atividade estatal, sem causar dano ou

prejuízo, em especial, quando o contrato por ele celebrado for de valor irrisório.24

3.6 PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

5. A repercussão do dano, o elemento subjetivo do agente e outras particularidades do caso concreto devem ser avaliados e ponderados pelo julgador ordinário na dosimetria das sanções, aplicáveis cumulativamente ou não, à luz dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. 6. Recurso Especial provido, com o retorno do processo ao Tribunal de origem. (REsp 1184897 / PE – STJ - 2a. Turma - Rel. Ministro Herman Benjamin – DJ 15.06.2010 – DJE 27.04.2011). 24 ADMINISTRATIVO. PROCESSO CIVIL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO-OCORRÊNCIA. REVALORAÇÃO JURÍDICA DOS FATOS DESCRITOS NA ORIGEM. POSSIBILIDADE. ART. 11 DA LEI 8.429/92. PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. DOLO. EXIGÊNCIA. VIOLAÇÃO CONFIGURADA. PENALIDADES. APLICAÇÃO ALTERNATIVA. MULTA. ADMISSIBILIDADE. 1. Cuida-se de ação de improbidade ajuizada contra o ex-Prefeito de Acaiaca/MG, por ter contratado, sem procedimento licitatório, juntamente com seu irmão, a compra de materiais - toras, estacas de madeira e madeiras de escoramento - no valor aproximado de R$ 4.200,00 2. [...] 3. [...} 4. A despeito de não haver necessidade de comprovação de prejuízo ao erário, as condutas descritas no artigo 11 da LIA dependem da presença do elemento subjetivo na modalidade dolosa (EREsp 875.163/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJ 30.06.10). 5. A contratação direta de parente pelo administrador público, sem prévio procedimento de dispensa ou de inexigibilidade de licitação, ou qualquer justificativa plausível, afronta os Princípios da Impessoalidade, Legalidade, Transparência e Moralidade Administrativa, evidenciando o intuito de utilizar a máquina pública em proveito individual. Não se trata de mero descumprimento das formalidades exigidas em lei para a realização da contratação, mas de hipótese de favorecimento familiar por meio do poder público, o que destoa do senso comum e do dever de probidade inerente ao agente público. 6. O art. 12 da Lei 8.429/92 atribui ao Judiciário a realização da dosimetria da pena, tomando-se por base a gravidade da conduta, a extensão do dano e o proveito patrimonial obtido pelo agente. Nesse contexto, não há obrigatoriedade de aplicação cumulativa das sanções, cabendo ao magistrado fixar as penalidades em obediência aos Princípios da Razoabilidade e Proporcionalidade e aos fins sociais a que a Lei de Improbidade Administrativa se propõe. 7. Na espécie, considerando as informações colhidas na origem, de não ter havido prejuízo ao erário, nem enriquecimento ilícito, bem como o pequeno valor da contratação (R$ 4.200,00), é suficiente para o restabelecimento da ordem jurídica a aplicação de multa civil no valor de uma remuneração mensal percebida pelo agente púbico à época do ato praticado 8. Recurso especial provido em parte. (REsp 1156564 / MG – STJ – 2ª Turma - Rel. Ministro Castro Meira – DJ 26.08.2010 – DJE 08.09.2010).

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O princípio da legalidade estabelece que a conduta dos administradores deva

ser autorizada por lei. A norma positiva fornece o balizamento da atuação estatal.

Inexistindo lei, vedada está a atividade estatal.

Neste ponto, sempre providencial a clássica comparação de Hely Lopes

Meirelles, de que enquanto os particulares podem fazer tudo o que a lei não proíbe,

os agentes públicos só poderão fazer o que a lei permite.

Bandeira de Mello25 ensina que o princípio da legalidade “[...] implica

subordinação completa do administrador à lei. Todos os agentes públicos, desde o

que lhe ocupe a cúspide até o mais modesto deles, devem ser instrumentos de fiel e

dócil realização das finalidades normativas”.

O princípio da legalidade tem vinculação estreita com o Estado de Direito,

vale dizer, o Estado, na pessoa de seus agentes, deve respeitar as próprias leis que

edita.

Portanto, o princípio da legalidade impõe que a administração tem sua

atividade vinculada a existência de uma lei que a autorize a agir. Eventual atuação

desprovida de norma positiva ou além do que estiver nela previsto, a torna eivada de

vício.

Tolosa Filho26 reproduzindo texto do administrativista Diógenes Gasparini

registra que qualquer ação do Estado realizada fora dos contornos legais é passível

de anulação, vez que injurídica.

No entender de Moraes27, “o princípio em exame serve também para

combater o poder arbitrário do Estado”, pois este somente poderá criar obrigações

aos particulares, mediante a edição de espécies normativas elaboradas em

conformidade com o processo legislativo previsto na Carta Magna.

3.7 PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE

105 25BANDEIRA DE MELLO, C.A. Legalidade, motivo e motivação do ato administrativo; in RDP, nº 90. 1989, p. 57, 58. 26 TOLOSA FILHO, B. de. Comentários à lei de improbidade administrativa. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 56. 27 27 MORAES, A. de. M. Direito constitucional. 7ª. Ed., São Paulo: Atlas: 2000, p. 67.

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Trata-se de um mecanismo utilizado para evitar o excesso de poder, uma vez

que tem por fim conter determinadas condutas que extrapolam os limites da

necessidade, seja para reprimir (direito penal), seja para garantir a preservação do

interesse público (direito administrativo), ou ainda para impor balizas a atuação do

legislador (direito constitucional).

Bandeira de Mello28 assim se reporta ao princípio em epígrafe:

Este princípio enuncia a idéia – singela, aliás, conquanto frequentemente desconsiderada – de que as competências administrativas só podem ser validamente exercidas na extensão e intensidade correspondentes ao que seja demandado para cumprimento da finalidade de interesse público a que estão atreladas. Segue-se que os atos cujos conteúdos ultrapassem o necessário para alcançar o objetivo que justifica o uso da competência ficam maculados de ilegitimidade, porquanto desbordam do âmbito da competência; ou seja, superam os limites que naquela caso lhes corresponderiam.

Verifica-se a aplicação deste princípio no direito penal quando se constata

que a pena a ser infligida deve ser proporcional à gravidade do delito praticado.

O princípio da razoabilidade no direito administrativo atua como verdadeiro

controle da administração pública. Sua aplicação está vinculada no sentido de impor

parâmetros aos atos administrativos que só devem ser realizados quando não há

outra forma de se tutelar o interesse público e, mesmo assim, de maneira a atribuir o

mínimo de constrições possíveis aos direitos de liberdade ou propriedade dos

administrados. Quando se constatar que o ato causou um sacrifício exagerado ao

administrado e desnecessário para atingir a finalidade da lei, restaria configurada a

sua desproporcionalidade e, consequentemente, sua ilegalidade (GARCIA e

ALVES29).

Por sua vez, no direito constitucional o princípio da proporcionalidade serviu

para inibir os excessos dos legisladores. É que eles agiam, inicialmente, desde que

dentro de suas áreas de competência, como melhor lhes aprouvessem. Diante desta

105 28BANDEIRA DE MELLO, C. de. Curso de direito administrativo. 28ª ed., São Paulo: Malheiros, 2010, p.110. 29 GARCIA, E.; ALVES, R. P. Improbidade administrativa. 4ª ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 83.

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atuação sem limites, identificou-se a necessidade de se impor critérios que

vinculasse juridicamente os legisladores (GARCIA e ALVES)30.

Assim, o poder legislativo poderá exercer suas atividades livremente, porém

eventuais excessos poderão ser coibidos pelo judiciário. Trata-se de verdadeiro

controle de freios e contrapesos exercido pelo judiciário, quando identificar que,

embora através de um texto formalmente legal, o legislador extrapolou, pois

elaborou uma lei materialmente inconstitucional, ou seja, cujo conteúdo fere a

Constituição Federal.

O princípio da proporcionalidade, assim como o da razoabilidade atribui ao

Judiciário o poder de controlar os atos dos demais poderes, quando identificado

excessos praticados por estes. O excesso de poder é requisito essencial a viabilizar

o controle pelo judiciário. Não poderá, por exemplo, o julgador imiscuir-se no poder

discricionário do administrador público, que tem a faculdade de escolher uma das

formas lícitas de atuação postas à sua disposição.

No caso da lei de improbidade administrativa, cujas sanções, pelo rigor,

guardam similitude com as reprimendas penais, o princípio da proporcionalidade

deve servir para que o julgador atribua pena ao agente ímprobo, na medida

necessária e proporcional à gravidade do ato de improbidade por ele praticado. Tal

preocupação deve estar sempre presente na mente dos magistrados e

desembargadores que julgam ações de improbidade administrativa, principalmente

porque, em lamentoso descuido técnico, as sanções previstas nos incisos do artigo

12, da Lei nº 8429.92, vieram agrupadas, sem qualquer referência a aplicação

diferenciada, por exemplo, da pena para quem age com culpa, daquele que atua

com dolo.

Cabe ao julgador, respeitando o princípio da proporcionalidade, estabelecer

qual a quantidade da pena a ser aplicada e a eventual necessidade da imposição de

mais de uma delas, em razão da gravidade do ato ímprobo perpetrado, não se

descurando de sopesar igualmente, o elemento subjetivo que norteou a ação do

agente.

Os desembargadores do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, julgando

recurso relativo a ação de improbidade administrativa, baseando-se no princípio da

105 30 Ob. Cit., p. 84.

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proporcionalidade, reduziram algumas da penas impostas em primeiro grau,

conforme se vê pela ementa parcial abaixo transcrita:

Para atender à proporcionalidade, a cumulação das sanções previstas no incido II do art. 12 da LIA deve atender à gravidade do fato, e a graduação deve atender à extensão do dano e ao proveito patrimonial do agente. Ainda, deve-se considerar a intensidade do elemento volitivo. (...) Caso em que não houve dolo na prática dos atos ímprobos, a culpa foi decorrente de negligência, com escassa má-fé, o valor do montante do dano não é elevado, e não houve proveito patrimonial dos agentes. Aplicação tão somente da penalidade de ressarcimento do dano. (...)”31

Segundo a Procuradora Regional da República de São Paulo, Fachini32:

A Lei de Improbidade Administrativa deve ser interpretada de forma harmônica com o princípio da proporcionalidade. Dessa forma, nem todo ato ilegal (seja por ação ou omissão), especialmente os que possam se subsumir à dicção do art. 11 da Lei de Improbidade, atentando contra os princípios da administração pública, importarão em ato de improbidade. Lesões insignificantes, pequenos danos patrimoniais decorrentes de erro ou ignorância, desconhecimento escusável da lei e atuações sem comprovada má-fé, entre outros, certamente não merecerão ser enquadrados na Lei de Improbidade, sob pena de flagrante injustiça ou mesmo arbítrio. “Cabem a nós, aplicadores da lei em comento, atentar para as peculiaridades do caso concreto, fazer a detida análise jurídica e agir com cautela e moderação.

3.8 PRINCÍPIO DA MORALIDADE

Em síntese, pode-se afirmar que princípio da moralidade exige que o

administrador público aja, interna e externamente, honestamente.

A inclusão deste princípio no texto constitucional ocorreu em razão da

sensação de desconforto e irresignação da sociedade que assistiu inúmeras vezes,

105 31 TJRS. 2ª Câmara Cível. Apelação Cível nº 70031746894. DJ 31 mar 2010. Rel. Denise Oliveira Cezar. 32 FACCHINI, M.I.DE.O,S. Improbidade e o elemento subjetivo do agente público. De jure: Revista Jurídica do Ministério Público do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, n. 13, jul./dez. 2009, p. 518.

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os governantes agindo ao bel prazer, no interesse particular, beneficiando quem

bem entendessem, preterindo opositores, tudo com o intuito de satisfazer suas

pretensões e vaidades. Os desmandos eram tão comuns que já estava nascendo a

preferência da sociedade à figura do homem meio honesto, meio certo, meio justo,

como se isso existisse.

Destaque-se que a concepção de moralidade, honestidade independe de

verbalização, pois advém da sensação do homem, do que é certo ou errado, do que

é justo ou injusto. A sociedade geralmente não se revolta com o erro, mas sim com a

má-fé.

A imoralidade administrativa esta retratada, por exemplo, na violação do

princípio da legalidade, da impessoalidade. Comumente se vê na administração

pública, governantes realizando atos discriminatórios, beneficiando parentes,

desviando bens e serviços públicos, fraudando licitações, esvaziando os cofres

públicos, carregando o dinheiro do povo em maletas, envelopes e até em lugares

íntimos. A relação de atos desonestos parece infinita.

O princípio da moralidade tem vinculo estreito com a boa qualidade do

administrador. Espera-se que os governantes zelem da coisa pública, utilizem os

recursos em prol da comunidade, não dilapidem os bens que a todos pertencem,

ajam desprovidos de interesses escusos, valorizem o mandato que lhes foi

outorgado, sejam transparentes, realizem condutas com a observância dos motivos

e finalidades públicas, enfim, atuem no sentido de proporcionar a população uma

qualidade de vida melhor.

Prado33 assinala que: “(...) a moralidade administrativa impõe um padrão de

regularidade tanto no plano formal como no plano ético, que repele qualquer desvio

em relação aos valores resguardados pelo sistema normativo e aos fins legalmente

assinalados”

Aqui também é pertinente a afirmação de que de nada adianta constar

expressamente o princípio da moralidade na Constituição Federal se os

administradores continuarem relegando a último plano os interesses da coletividade,

laborando no sentido de satisfazer os seus próprios interesses.

105 33 PRADO, F.O.de A. Improbidade administrativa. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 52.

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Além disso, é oportuno lembrar que “o princípio da moralidade deve coexistir

harmonicamente com os demais princípios constitucionais, de modo que o

administrador não pode, v.g. sob a alegação de atuar em nome da moralidade,

impor obrigações ao administrado sem lei que o autorize” (PRADO34).

105 34 PRADO, F.O.de A. Improbidade administrativa. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 53.

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4 ESTRUTURA ANALÍTICA DO ATO DE IMPROBIDADE

4.1 DOLO

Alguns autores e julgados defendem que os atos de improbidade podem ser

realizados sem a presença do elemento subjetivo. Todavia a maioria esmagadora da

doutrina e dos aplicadores do direito tem posição diametralmente oposta, exigindo

para a configuração do ato de improbidade a presença do elemento subjetivo.35

105 35 CPC. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. VIOLAÇÃO A PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS. PROVA DA ILEGALIDADE E LESIVIDADE DO ATO. 1. Não caracteriza insuficiência de fundamentação, a circunstância de o acórdão atacado ter solvido a lide contrariamente à pretensão da parte. Inexistência de malferimento ao art. 535 do CPC. 2. A lesão a princípios administrativos contida no art. 11 da Lei nº 8.429/92 não exige dolo ou culpa na conduta do agente, nem prova da lesão ao erário público. Basta a simples ilicitude ou imoralidade administrativa para restar configurado o ato de improbidade. Caso reste demonstrada a lesão, e somente neste caso, o inciso III, do art. 12 da Lei n.º 8.429/92 autoriza seja o agente público condenado a ressarcir o erário. 3. Se não houver lesão ou se esta não restar demonstrada, o agente poderá ser condenado às demais sanções previstas no dispositivo como a perda da função pública, a suspensão dos direitos políticos, a impossibilidade de contratar com a administração pública por determinado período de tempo, dentre outras. 4. In casu, face a inexistência de ilegalidade do ato, bem como da lesividade ao erário público, os agentes não devem ser condenados a qualquer das sanções previstas no art. 12 da LIA. 5. Recurso especial improvido.(REsp 746.261/MG, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 20.04.2006, DJ 28.04.2006 p. 288). ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. ART. 535 DO CPC. CONTRATAÇÃO DE SERVIDOR SEM CONCURSO PÚBLICO PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LESÃO A PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS. AUSÊNCIA DE DANO AO ERÁRIO. 1. É impossível conhecer-se do recurso especial pela alegada violação do artigo 535 do CPC nos casos em que a argüição é genérica, por incidir a Súmula 284/STF, assim redigida: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia". 2. A ausência de prequestionamento dos artigos de lei federal tidos por contrariados torna inviável o conhecimento do apelo raro. Incidência da Súmula 211/STJ. 3. Em princípio, a lesão a princípios administrativos contida no art. 11 da Lei nº 8.429/92 não exige dolo ou culpa na conduta do agente, nem prova da lesão ao erário público. Basta a simples ilicitude ou imoralidade administrativa para restar configurado o ato de improbidade. Caso reste demonstrada a lesão, e somente neste caso, o inciso III, do art. 12 da Lei nº 8.429/92 autoriza seja o agente público condenado a ressarcir o erário. 4. A conduta do recorrido, ao contratar e manter servidores sem concurso público na Administração, amolda-se ao caput do art. 11 da Lei nº 8.429/92, ainda que o serviço público tenha sido devidamente prestado, bem como não tenha havido má-fé na conduta do administrador. 5. Não havendo prova de dano ao erário, não há que se falar em ressarcimento, nos termos da primeira parte do inciso III do art. 12 da Lei 8.429/92. As demais penalidades, inclusive a multa civil, que não ostenta feição indenizatória, são perfeitamente compatíveis com os atos de improbidade tipificados no art. 11 da Lei 8.429/92 (lesão aos princípios administrativos).

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No direito penal, a imprescindibilidade do elemento subjetivo para a

caracterização do crime foi explicitada por Hungria36 da seguinte forma:

Somente com a verificação in concreto desse nexo subjetivo se pode atribuir ao agente, para o efeito da punibilidade, uma conduta objetivamente desconforme com a ordem ético-jurídica, ou reconhecer sua incidência no juízo de reprovação que informa o preceito penal. Para que se considere um fato como punível, não basta a existência do vínculo causal objetivo entre a ação (ou omissão) e o resultado, nem o seu enquadramento formal num artigo da lei penal; é necessária a culpabilidade (culpa sensu lato) do agente, isto é, que tenha havido uma vontade de exercer-se, livre e conscientemente, para o resultado antijurídico ou apesar da representada probabilidade de que este acorresse, ou, pelo menos, revele, ainda que sem previsão do resultado, inescusável inadvertência ou imponderação. Só em tais hipóteses se apresenta o menosprezo ou descaso pela ordem jurídica e, portanto, a censurabilidade que justifica a punição (malum passionis ob malum actionis). Sem culpabilidade não é a admissível a irrogação da pena. Nulla poena sine culpa. É este um princípio central do direito penal moderno, a que o nosso Código vigente se ajustou, repelindo irrestritamente a chamada responsabilidade objetiva ou sem culpa. A culpabilidade assume duas formas únicas: o ‘dolo’ e a ‘culpa’ (stricto sensu). Dolo é a vontade livre e conscientemente dirigida ao resultado antijurídico ou, pelo menos, aceitando o risco de produzi-lo. Culpa é a omissão da atenção, cautela ou diligência normalmente empregada para prever ou evitar o resultado antijurídico. No dolo, ação (ou omissão) e resultado são referíveis à vontade; na culpa, de regra, somente a ação (ou omissão).

Do mesmo jeito que acontece no direito penal, o ato de improbidade só se

configura diante da existência de um liame subjetivo que liga conduta ao resultado.

Para Meirelles37, em que pese haja quem defenda a responsabilidade objetiva

aos agentes públicos no tocante as ações de improbidade administrativa, o mais

correto é reconhecê-la apenas na modalidade subjetiva.

É que um ato ilegal, nem sempre é ímprobo e para ter esta qualificação, há de

ser doloso ou, no mínimo, cometido com culpa gravíssima. Os julgados dos

Tribunais pátrios comungam deste entendimento. Neste sentido38: Informam os

6. Acórdão reformado, fixando-se a multa civil em três vezes o valor da remuneração recebida no último ano de mandato. 7. Recurso especial conhecido em parte e provido também em parte. (REsp. 988.374/MG – STJ – segunda turma – Rel. Min. Castro Meira – DJ 06.05.2008 – DP 16.05.2008). 36 HUNGRIA, N. Comentários ao código penal. v.1, t. II, Rio de Janeiro: Forense, 1959, p. 83. 37 MEIRELLES, H.L. Mandado de segurança. 26ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 210-211.

38 PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO DO ART. 535, II, DO CPC. NÃO-CONFIGURAÇÃO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO.

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defensores da segunda corrente que a dispensa do elemento subjetivo para a

configuração do ato de improbidade, ensejaria responsabilidade objetiva, o que

parece inadmissível atualmente, a não ser nos casos em que esta venha prevista

expressamente no texto legal.

Prado39 aduz:

Não se pode admitir responsabilidade objetiva em matéria de improbidade administrativa. Essa espécie de responsabilidade no sistema constitucional brasileiro é excepcional e restrita às pessoas públicas e prestadoras de serviço público (CF, art. 37, parágrafo 6º.). Ademais, os atos de improbidade administrativa não podem jamais prescindir de elemento subjetivo sob a forma de dolo, visto que a própria idéia de improbidade traz consigo a necessidade de um ato voluntário e consciente de transgressão a preceito obrigatório, a revelar a conduta desonesta, justificadora da pecha infamante de improbidade.

A razão de imputar-se a responsabilidade jurídica de um ato a alguém reside

justamente em demonstrar-se que sua conduta é reprovável e, por isso, merece

punição. Esta reprovabilidade e a consequente justificativa para a imposição da

pena estão no fato do autor conduzir sua conduta demonstrando menosprezo ou

SÚMULAS 282/STF e 211/STJ. ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. VIOLAÇÃO DE PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. ART. 11 DA LEI 8.429/92. ELEMENTO SUBJETIVO. NÃO-COMPROVAÇÃO. PRECEDENTES DO STJ. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA PARTE, DESPROVIDO. 1. [...]. 3. Na hipótese dos autos, o Ministério Público do Estado do Paraná ajuizou ação civil pública por ato de improbidade administrativa contra os recorridos, respectivamente prefeito e vice-prefeito do Município de Primeiro de Maio/PR, com fundamento nos arts. 10, X, e 11, I, da Lei 8.429/92, e 37, § 1º, da Constituição Federal, em razão da inserção dos nomes e respectivos cargos dos agentes políticos em dois reservatórios de água em localidades situadas no referido Município. Por ocasião da sentença, os pedidos foram julgados procedentes, contra a qual foi interposto recurso de apelação. A Corte a quo, ao analisar a controvérsia, apesar de reconhecer a irregularidade da conduta dos agentes públicos, concluiu que não houve violação dos princípios da administração pública por ausência de comprovação de dolo ou culpa. 4. O entendimento majoritário desta Corte Superior é no sentido de que a configuração de ato de improbidade administrativa exige, necessariamente, a presença do elemento subjetivo, inexistindo a possibilidade da atribuição da responsabilidade objetiva na esfera da Lei 8.429/92. 5. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, desprovido. (REsp 766.231/PR, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 25/11/2008, DJe 11/02/2009). 39 PRADO, F.O. de A. Improbidade administrativa. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 85.

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descaso com a ordem jurídica, ou seja, está no vínculo subjetivo que une conduta e

resultado (HUNGRIA40).

Não há como se negar uma ligação dos conceitos trazidos pelo direito penal,

com a matéria da improbidade administrativa.

O próprio STJ já se reportou neste sentido:

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE IMPROBIDADE. TIPICIDADE DA CONDUTA. APLICAÇÃO DA PENA. INVIABILIDADE DA SIMPLES DISPENSA DA SANÇÃO. 1. Reconhecida a ocorrência de fato que tipifica improbidade administrativa, cumpre ao juiz aplicar a correspondente sanção. Para tal efeito, não está obrigado a aplicar cumulativamente todas as penas previstas no art. 12 da Lei 8.429/92, podendo, mediante adequada fundamentação, fixá-las e dosá-las segundo a natureza, a gravidade e as conseqüências da infração, individualizando-as, se for o caso, sob os princípios do direito penal. O que não se compatibiliza com o direito é simplesmente dispensar a aplicação da pena em caso de reconhecida ocorrência da infração. 2. Recurso especial provido para o efeito de anular o acórdão recorrido. (REsp 513.576/MG, Rel. Min. Francisco Falcão, Primeira Turma, DJU 6.3.2006). Grifo nosso.

O elemento subjetivo é imprescindível para a configuração tanto da conduta

penalmente relevante, quanto da conduta ímproba e se apresenta em ambos os

casos, sob duas formas: o dolo e a culpa.

O dolo é inerente aos tipos penais e aos tipos de atos de improbidade (estes

últimos relacionados exemplificativamente nos arts. 9º. a 11, da Lei 8.429/92), não

necessitando que esteja expresso na lei. Quando o tipo penal nada menciona, a

conduta tem que ser dolosa, para ser penalmente relevante, o mesmo acontecendo

com os atos de improbidade administrativa.

Ao contrário, quando o legislador entendeu por bem que uma determinada

conduta deve ser punida por culpa, deve esta expressão vir inserida no texto legal.

Isto também deriva do direito penal, que no parágrafo único do art. 18, do Código

Penal, prevê: “Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato

previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente”.

A propósito:

105 40 HUNGRIA, N. Comentários ao código penal. v.1, t. II, Rio de Janeiro: Forense, 1983, p. 89.

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ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE. LEI 8.429/92. LICITAÇÃO. NECESSIDADE DE CONFIGURAÇÃO DO DOLO DO AGENTE PÚBLICO. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA 07/STJ. 1. Nem todo o ato irregular ou ilegal configura ato de improbidade, para os fins da Lei 8.429/92. A ilicitude que expõe o agente às sanções ali previstas está subordinada ao princípio da tipicidade: é apenas aquela especialmente qualificada pelo legislador. 2. As condutas típicas que configuram improbidade administrativa estão descritas nos arts. 9º, 10 e 11 da Lei 8.429/92, sendo que apenas para as do art. 10 a lei prevê a forma culposa. Considerando que, em atenção ao princípio da culpabilidade e ao da responsabilidade subjetiva, não se tolera responsabilização objetiva e nem, salvo quando houver lei expressa, a penalização por condutas meramente culposas, conclui-se que o silêncio da Lei tem o sentido eloqüente de desqualificar as condutas culposas nos tipos previstos nos arts. 9.º e 11. 3. É vedado o reexame de matéria fático-probatória em sede de recurso especial, a teor do que prescreve a Súmula 07 desta Corte. 4. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, improvido. (STJ - REsp 940.629/DF, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16/08/2008, DJe 04/09/2008)

Seguindo esta regra, verifica-se, por exemplo, no parágrafo 6º, do art. 129, do

Diploma Repressivo Penal a figura da lesão Corporal Culposa.41

Guardando coerência com a praxe, o legislador agiu de forma idêntica na Lei

de Improbidade Administrativa, quando no artigo 10 dispõe:

Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: (grifo nosso)

O dolo, portanto, integra a conduta e, consequentemente, o fato típico. É o

elemento subjetivo do tipo.

O dolo tem uma fase interna e outra externa. A primeira está apenas na

mente do autor e enquanto ali permanecer aprisionada, enclausurada é, ainda, um

indiferente penal. Cria-se um fim desejado. (v.g. desejo de matar alguém). A

segunda, a fase externa, ocorre quando o agente exterioriza sua proposição mental,

105 41 Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem: § 6° Se a lesão é culposa: Pena - detenção, de dois meses a um ano.

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escolhe os meios e realiza a conduta. A partir daí é que o modo de agir passa a ter

importância no mundo jurídico.

O dolo pode ser direto ou indireto.

Dolo direto ou determinado é aquele em que o agente atua com a consciência

e a vontade de realizar a conduta e produzir o resultado.

Segundo Marques42: “Diz-se direto o dolo quando o resultado no mundo

exterior corresponde perfeitamente à intenção e à vontade do agente. O objetivo por

ele representado e a direção da vontade se coadunam com o resultado do fato

praticado.”

Dolo indireto ou indeterminado, por sua vez, é aquele em que o agente

embora não queira diretamente o resultado, o prevê, e age assumindo o risco de

produzi-lo. É mais conhecido como dolo eventual e no Código Penal Brasileiro vem

previsto no art. 18, inciso I, última parte, exatamente pela expressão "assumiu o

risco de produzi-lo”.

Pode-se afirmar que o dolo abrange dois elementos: o representativo ou a

consciência e o volitivo. O elemento representativo consiste no conhecimento pelo

agente, acerca dos elementos configuradores do tipo e o elemento volitivo

caracteriza-se pela vontade de realizar a ação típica e produzir o resultado.

Zaffaroni e Pierangelli43 explicam estes elementos com maestria e didática.

Eles lecionam:

Todo querer pressupõe um conhecer. Acontece o mesmo com o dolo, pois é um querer. O conhecimento que este “querer” pressupõe é o dos elementos do tipo objetivo concreto: o dolo de homicídio (art. 121) é o querer matar um homem, que pressupõe que se saiba que o objeto da conduta é um homem, que a arma causará um resultado (previsão de causalidade); o dolo do furto(art. 155) consiste num querer subtrair coisa alheia móvel, que pressupõe que se saiba que aquilo que se subtrai é uma coisa, isto é, algo que tem certo valor patrimonial e que tal coisa é alheia.

105 42 MARQUES, J.F. Tratado de direito penal. v. 1, Campinas: Bookseller, 1997, p. 198. 43ZAFFARONI, E.R.; PIERANGELLI, J.H. Manual de direito penal brasileiro. V. 1, Parte Geral. 7ª ed., São Paulo: RT, 2008, p. 415

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Após esta explicação os autores supracitados preferem conceituar dolo como

“a vontade realizadora do tipo objetivo, guiada pelo conhecimento dos elementos

deste no caso concreto”44.

Referidos elementos estão presentes também no dolo indireto. Neste o

agente prevê o resultado, ou seja, tem a representação do que sua conduta pode

gerar, mas embora não o queira diretamente, não se importa que ele ocorra e, por

isso, age assumindo o risco de produzi-lo. Esta assunção do risco se compara a

vontade de produzir o resultado.

Sempre oportuna aqui a fórmula de Frank para explicar o dolo eventual,

lembrada por Hungria45: “Seja como for, dê no que der, em qualquer caso não deixo

de agir.”

Registre-se que a linha diferenciadora entre o dolo eventual e a culpa

consciente é muito tênue e está exatamente no fato de que no primeiro, o agente

aceita o resultado, enquanto na segunda ele não quer, sinceramente, que o

resultado ocorra. Em ambos, os agentes prevêem o resultado.

O dolo divide-se também em genérico e específico.

Enquanto o dolo genérico consiste na vontade e na consciência de praticar o

fato descrito na lei, o dolo específico representa a vontade do agente de produzir um

fim especial.

A maioria das condutas típicas tem como elemento subjetivo central e único o

dolo genérico. Todavia, alguns tipos trazem expressa ou implicitamente outro fim

que deve movimentar a ação, sob pena de não configurar o delito ou um ato de

improbidade. Nesses casos a conduta típica possui dois elementos subjetivos o

dolo, sempre presente, e o especial fim de agir.

Podem ser citados como exemplos de tipos penais, nos quais existe o

chamado dolo específico, o estupro de vulnerável previsto no artigo 217-A46, bem

assim prevaricação – artigo 31947, ambos do Código Penal.

105 44 ZAFFARONI, E.R.; PIERANGELLI, J.H. Manual de direito penal brasileiro. V. 1, Parte Geral. 7ª ed., RT, São Paulo: 2008, p. 416. 45 HUNGRIA, N. Comentários ao código penal. V.1, 5ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1979, p. 289. 46 Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (quatorze) anos: 47 Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal:

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No primeiro caso o especial fim de agir (dolo específico) está implícito.

Todavia, para a configuração do estupro de vulnerável, imprescindível que o agente

atue com a vontade e a consciência de “satisfazer a própria lascívia”. Assim sendo,

pode-se asseverar que quando um ginecologista toca as partes pudendas de uma

adolescente de 13 anos de idade o faz com vontade e consciência de fazê-lo. Há,

portanto, dolo. Se a intenção do experto era examinar a menina para verificar

eventual problema de saúde, há um irrelevante penal. Caso o interesse do

profissional era satisfazer sua concupisciência, praticou estupro de vulnerável.

No segundo caso - prevaricação - o dolo específico vem expresso no tipo, no

caso através da especial finalidade de agir consistente em “satisfazer interesse ou

sentimento pessoal.” Desta forma, se o agente deixa de praticar um ato de ofício

porque nutre pela pessoa que o requereu um sentimento de “ódio ou desprezo”

cometeu, em tese, um crime de prevaricação. Se o fez, contudo, movido pelo

sentimento de cumprimento do dever, a conduta é atípica por falta do elemento

subjetivo do tipo diverso do dolo, ou seja, o dolo específico.

4.2 CULPA

A culpa tem uma estrutura diferente do dolo. Não há um tipo culposo, onde o

agente realiza os seus elementos para obter o resultado. O tipo culposo é chamado

pelos autores de tipo aberto, porque a conduta culposa não vem descrita

abstratamente como no tipo doloso, nem poderia vir, já que são infinitas as situações

em que pode ocorrer a culpa. A culpa tem um fim, mas um fim lícito. O agente

visando atingir este objetivo acaba causando um resultado, penalmente relevante,

porque quebrou o dever objetivo de cuidado, quando agiu com imprudência,

negligência ou imperícia. Este resultado não era desejado pelo agente e não foi por

ele previsto (exceto na culpa consciente), mas ocorreu porque ele não laborou com

o dever que todas as pessoas com diligência normal devem ter.

Para se saber se alguém cometeu um crime culposo deve-se comparar a

conduta efetivamente praticada pelo agente, com aquela que uma pessoa mediana

teria realizado na mesma situação. Por esta razão é considerado elemento

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normativo, ou seja, há para a conclusão da ocorrência do tipo culposo o cotejo da

conduta do agente com a norma. A norma, segundo Capez48 “é um mandamento de

conduta normal, que não está escrito em lugar algum, mas decorre do sentimento

médio da sociedade sobre o que é justo, certo ou errado.”

São elementos do fato típico culposo:

a) conduta (sempre voluntária)

b) resultado involuntário

c) nexo causal;

d) tipicidade;

e) previsibilidade objetiva;

f) ausência de previsão (com exceção da culpa consciente) e

g) quebra do dever objetivo de cuidado.

Importante definirmos os elementos acima, bem assim o conceito de

previsibilidade subjetiva pela importância que terão no decorrer deste texto.

Conduta é a ação ou omissão humana consciente e voluntária, dirigida a uma

finalidade. Na concepção de Capez49 “conduta é a realização material da vontade

humana, mediante a prática de um ou mais atos.”

O resultado, por sua vez, é a modificação no mundo exterior, provocado pela

conduta.

Nexo causal é o elo concreto, físico, material e natural que estabelece entre

a conduta do agente e o resultado naturalístico, por meio do qual e possível dizer se

aquela deu ou não causa a este (CAPEZ50).

A tipicidade é o perfeito enquadramento entre a conduta praticada e a

descrição abstrata do tipo legal (modelo legal de conduta proibida). Capez51

conceitua tipicidade como a “subsunção, justaposição, enquadramento,

amoldamento ou integral correspondência de uma conduta praticada no mundo real

ao modelo descritivo constante da lei (tipo legal).”

A previsibilidade objetiva é um elemento do tipo culposo. Sua inexistência

afasta o tipo. Consiste na possibilidade de uma pessoa mediana prever o resultado.

105 48 CAPEZ, F. Curso de direito penal. Parte Geral. v. 1, 14ª ed., São Paulo: Saraiva, 2010, p. 231. 49 CAPEZ, F. Curso de direito penal. Parte Geral. v. 1, 14ª ed., São Paulo: Saraiva, 2010, p. 161. 50 CAPEZ, F. Curso de direito penal. Parte Geral. v. 1, 14ª ed., São Paulo: Saraiva, 2010, p. 178. 51 CAPEZ, F. Curso de direito penal. Parte Geral. v. 1, 14ª ed., São Paulo: Saraiva, 2010, p. 211.

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Ausência de previsão, como o próprio nome deixa transparecer, o agente,

não prevê o resultado típico. Ele age com um fim lícito, mas acaba, por imprudência,

negligência ou imperícia, causando um resultado previsto em lei. Por exemplo: O

agente quer ir até Curitiba (fim lícito). Pega seu carro e imprime velocidade

excessiva (quebra do dever objetivo de cuidado, na modalidade imprudência), sem

prever (ausência de previsão), embora pudesse, que seu modo de agir pode causar

um resultado (previsibilidade objetiva). Sem desejar acaba atropelando alguém que

falece (resultado típico).

Previsibilidade subjetiva é a possibilidade que o agente, considerando suas

qualidades pessoais e condições peculiares (ex. nível de estudo, local onde vive,

idade) tinha de prever o resultado. Diferente do que na previsibilidade objetiva, não

se leva em conta o homem médio, o RAZONABLE PERSONAL, mas sim as

condições do agente.

A previsibilidade subjetiva, não é elemento do tipo culposo e,

consequentemente, sua ausência não exclui o tipo, mas exclui a culpabilidade. Vale

dizer, o agente cometeu um fato típico, mas não será punido por ele pela falta da

culpabilidade.

São modalidades de culpa:

a) imprudência;

b) negligência;

c) imperícia;

Imprudência: é a forma ativa de culpa. É a ação descuidada, realizada sem

a cautela necessária. É o atuar de forma precipitada, insensata, temerária,

despreocupada, perigosa. Ex. Dirigir veículo em alta velocidade.

Negligência: é a culpa derivada da omissão. O agente deixa de fazer o que a

cautela mandava que ele fizesse. Trata-se de abstenção, inércia, inação, falta de

precaução.

Magalhães Noronha52 ensina:

105 52 MAGALHÃES NORONHA, E. Direito penal. V. 1, 30ª ed., São Paulo: Saraiva, p. 141.

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No sentido do Código ela é inação, inércia, passividade. Decorre da inatividade material (corpórea) ou subjetiva (psíquica). Reduz-se a um comportamento negativo. Negligente é que, podendo e devendo agir de determinado modo, por indolência ou preguiça mental, não age ou se comporta de modo diverso.

Ex. Deixa arma ou veneno ao alcance de crianças.

Imperícia: Falta de habilidade, de aptidão técnica, prática ou teórica.

Segundo Capez “consiste na incapacidade, na falta de conhecimento ou habilidade

para o exercício de determinado mister.”53 Ex. Médico vai curar uma ferida e amputa

a perna.

A culpa é graduada em grave, leve e levíssima, conforme a maior ou menor

condição de previsibilidade do resultado e da maior ou menor falta de cuidado

objetivo por parte do sujeito (DELMANTO, et al54).

É óbvio que se o sujeito tinha maior possibilidade de prever o resultado, sua

culpa é mais acentuada do que a daquele que tinha menos condições de avistá-lo. O

mesmo acontece com a maior ou menor forma de cuidado.

A culpa levíssima se caracteriza quando a previsibilidade somente é possível

com atenção extraordinária ou excepcional do agente. O direito penal não a pune,

mas dá margem para o ressarcimento civil (Código Penal Mirabette fl. 203).

A culpa leve acontece quando a falta poderia ser evitada se o agente atuasse

com a atenção ordinária, com o zelo próprio do homem comum.

A culpa grave se aproxima do dolo, do direito penal. Configuram-se quando o

agente atua com excessiva falta de cautela.

Santos55 determinou a amplitude do termo culpa grave nos atos jurídicos

equiparando-o com o dolo. O autor para facilitar o entendimento de sua conclusão,

decompôs a culpa grave ou inescusável em pressupostos positivos e negativos.

Nos positivos incluiu: a) gravidade excepcional, de modo a ultrapassar o que

comumente ocorre, mesmo no âmbito das falhas; b) consciência do perigo; e c)

caráter voluntário do ato ou da omissão, que não pode ser fruto de simples

105 53 CAPEZ, F. Curso de direito penal. Parte Geral. V. 1, 14ª ed., São Paulo: Saraiva, 2010, p. 233. 54 DELMANTO, C. et AL. Código penal comentado. Legislação Complementar. 6ª ed., Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p.34 55SANTOS, C.F.B. dos. Disponível em: <(http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=9615>. Acesso em: 24 de jun. de 2011.

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inadvertência. Nos negativos: a) falta da intenção de provocar o dano: se há

intenção o caso é de dolo e não de culpa grave; e b) ausência de toda e qualquer

causa justificadora.

Garcia e Alves56 situando a essência da culpa na previsibilidade do evento

danoso, lecionam:

A culpa gravíssima é definida como “a ausência de previsão de um evento que o seria por qualquer homem normal”; a culpa leve consiste no evento que “só poderia ser previsto com o emprego de uma diligência incomum, própria daqueles que exercem atividades que pressupõem, um maior grau de discernimento” e a culpa grave, por sua vez, “se consubstancia na não previsibilidade do evento que o seria pelos homens diligentes e responsáveis, qualidade esta indissociável dos gestores da coisa pública.

Em que pese a Lei de Improbidade no seu artigo 10, não tenha feito

qualquer referência aos graus de culpa e em razão disso, alguns doutrinadores

considerem que o ato de improbidade se configura seja qual for a graduação da

culpa (levíssima, leve ou grave), há os que discordam deste posicionamento

excluindo a culpa levíssima e leve, e até a grave como elemento subjetivo do ato

ímprobo, desfigurando-o.

Equívocos formais ou praticados por agente inábil não são suficientes para

embasar uma ação por ato de improbidade administrativa (MATTOS)57.

Alexandre de Moraes58 consignou:

Afastou-se, portanto, a responsabilização objetiva do servidor público, pois a finalidade da lei é responsabilizar e punir o administrador desonesto. A Lei de Improbidade, portanto, não pune a mera ilegalidade, mas a conduta ilegal ou imoral do agente público e de todo aquele que o auxilie voltada para a corrupção. O ato de improbidade administrativa exige para a sua consumação um desvio de conduta do agente público que no exercício indevido de suas funções afaste-se dos padrões éticos morais da sociedade, pretendendo obter vantagens materiais indevidas ou gerar prejuízos ao patrimônio

105 56 GARCIA, E.; ALVES, R.P. Improbidade administrativa. 4ª ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 269. 57MATTOS, M.R.G.de. O limite da improbidade administrativa. O Direito dos Administrados dentro da Lei nº 8.429/92. 2ª ed., Rio de Janeiro: América Jurídica, 2005, p. 8. 58 MORAES, A. de. M. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. São Paulo: Atlas, 2007, p. 675.

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público mesmo que não obtenha sucesso em suas intenções, como ocorre nas condutas tipificadas no art. 11, da presente lei.

4.3 BOA-FÉ E MÁ-FÉ

Indiscutível é a vinculação do ato de improbidade com a má-fé, razão pela

imprescindível que se faça uma breve explanação sobre o conceito de boa e má-fé.

O termo “boa fé” origina-se do latim, fides¸ que para os romanos significava

honestidade, lealdade, sinceridade, confiança. Ao contrário senso pode-se

compreender que má-fé é sinônimo de desonestidade, deslealdade, improbidade.

Pode-se asseverar também que uma pessoa age com má fé quando ela

intencionalmente tem o interesse de prejudicar alguém. Por sua vez, atua com boa

fé quando o faz de maneira honrada, leal, honesta, proba. Age com boa fé quem não

engana, não atua deliberadamente, propositadamente com o propósito de ludibriar o

outro.

A boa-fé se divide em boa-fé objetiva e boa-fé subjetiva.

Segundo Gonçalves59, a boa-fé subjetiva consiste no conhecimento ou na

ignorância da pessoa em relação a certos fatos e que deve ser considerada pelo

direito. Diz respeito aquela pessoa que está convicta de que está agindo em

conformidade com o direito, mas não está.

Trata-se de verdadeiro erro, entendimento equivocado sobre alguém ou

alguma coisa. É denominada subjetiva exatamente porque deve sempre se levar em

consideração a intenção do agente, sua crença, seu desconhecimento.

Boa-fé objetiva, por sua vez é aquela que advém de um princípio geral de

direito de que todos devem agir de boa-fé, com ética, em sua relações.

Gonçalves60, ao falar de boa-fé objetiva esclarece:

105 59 GONÇALVES, C.R. Direito civil brasileiro. v 3, Contratos e Atos Unilaterais. De acordo com a Lei nº 12.112, de 09.`12.2009. 7ª ed., São Paulo: Saraiva, 2010, p. 55. 60 GONÇALVES, C.R. Direito civil brasileiro. v 3, Contratos e Atos Unilaterais. De acordo com a Lei nº 12.112, de 09.`12.2009. 7ª ed., São Paulo: Saraiva, 2010, p. 56-57.

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Nesta última acepção, está fundada na honestidade, na retidão, na lealdade e na consideração para com os interesses do outro contraente, especialmente no sentido de não lhe sonegar informações relevantes a respeito do objeto e conteúdo do negócio.

Os intérpretes, os aplicadores do direito é que terão a missão e o dever de

identificar cada situação e cada agente e, assim, constatar se ele agiu de forma

honesta e escorreita, bem assim se cometeu eventual equívoco por ignorância.

Do princípio da boa-fé advém a obrigação de que as partes envolvidas em

uma relação jurídica se comportem, em todos os momentos, de maneira correta,

com lisura, honestidade, retidão.

A jurisprudência é remansosa no sentido de que não deve ser punido por ato

de improbidade, quem laborou sem má-fé.

A propósito:

“AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IRREGULARIDADE NO PROCESSO PARA CONTRATAÇÃO DE ADVOGADO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. Ausência. 1. A acusação de prática de ato de improbidade administrativa deve estar acompanhada de prova e sólida justificação para enquadrar a conduta do réu (agente público) aos elementos subjetivos do ilícito. Ausente a prova de má-fé e de proveito próprio por parte do agente, descabe a pretensão punitiva por improbidade administrativa. 2. Recurso provido.”(grifo nosso – TJMG, AC 1.0400.00.002056-2/001, Mariana, 2ª Câmara Cível, Relator Nilson Reis, j. 3/4/2007, DJMG 4/5/2007)

“PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI Nº 8.429/92. DISPENSA DE LICITAÇÃO. COMPRA E VENDA E DOAÇÃO DE IMÓVEIS REALIZADOS PELO MUNICÍPIO. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ DO AGENTE PÚBLICO. VIOLAÇÃO DOS DEVERES DE MORALIDADE E IMPESSOALIDADE. NÃO COMPROVADOS. DANO EFETIVO. AUSÊNCIA. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. SÚMULA 07/STJ. VIOLAÇÃO DO ART. 535, I E II, DO CPC. NÃO CONFIGURADA. 1. [...} 2. [...]. 3. Ação Civil Pública ajuizada por Ministério Público Estadual em face de ex-Prefeito, objetivando a anulação de contrato de compra e venda de lotes, localizados no Distrito Industrial da municipalidade, para fins de doação à indústria que quisesse se instalar no Município, com vistas à implementação do programa de incentivo ao desenvolvimento industrial. 4. [...} 5. [...] 8. O caráter sancionador da Lei nº 8.429/92 é aplicável aos agentes públicos que, por ação ou omissão, violem os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, lealdade às instituições e notadamente: a) importem em enriquecimento ilícito (art. 9º); b) causem prejuízo ao

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erário público (art. 10); c) atentem contra os princípios da Administração Pública (art. 11) compreendida nesse tópico a lesão à moralidade administrativa. 9. A exegese das regras insertas no art. 11 da Lei nº 8.429/92, considerada a gravidade das sanções e restrições impostas ao agente público, deve se realizada cum granu salis, máxime porque uma interpretação ampliativa poderá acoimar de ímprobas condutas meramente irregulares, suscetíveis de correção administrativa, posto ausente a má-fé do administrador público, preservada a moralidade administrativa e, a fortiori, ir além de que o legislador pretendeu. 10. A má-fé, consoante cediço, é premissa do ato ilegal e ímprobo e a ilegalidade só adquire o status de improbidade quando a conduta antijurídica fere os princípios constitucionais da Administração Pública coadjuvados pela má-intenção do administrador. 11. À luz de abalizada doutrina: "A probidade administrativa é uma forma de moralidade administrativa que mereceu consideração especial da Constituição, que pune o ímprobo com a suspensão de direitos políticos (art. 37, §4º). A probidade administrativa consiste no dever de o "funcionário servir a Administração com honestidade, procedendo no exercício das suas funções, sem aproveitar os poderes ou facilidades delas decorrentes em proveito pessoal ou de outrem a quem queira favorecer". O desrespeito a esse dever é que caracteriza a improbidade administrativa. Cuida-se de uma imoralidade administrativa qualificada. A improbidade administrativa é uma imoralidade qualificada pelo dano ao erário e correspondente vantagem ao ímprobo ou a outrem (...)." in José Afonso da Silva, Curso de Direito Constitucional Positivo, 24ª ED., São Paulo, Malheiros Editores, 2005, p-669. 12. Entrementes, na presente demanda, restou amplamente provado que a conduta do agente político e dos co-réus, não resultou em lesão ao erário público, nem configurou enriquecimento ilícito dos mesmos, o que conduz à inaplicação dos arts. 9º e 10, da Lei nº 8.429/92, além do fato de que o ato apontado improbo não amolda à conduta prevista no art. 11, à míngua de lesão aos princípios da impessoalidade e da moralidade administrativa, tendo em vista que a dispensa de licitação sub examine decorreu de estudo realizado pela Comissão de Licitação, consoante se infere do teor do voto condutor do acórdão recorrido. 13. [...] 14. Recurso Especial parcialmente conhecido, e nessa parte, desprovido.” (STJ, REsp 797.671, Proc. 2005/0179387-0/MG, 1ª Turma, Relator Luiz Fux, j. 5/6/2008, DJE 16/6/2008). Grifo nosso

Meirelles61, assim se reportou:

Ao prefeito, como aos demais agentes políticos, impõe-se o dever de tomar decisões governamentais de alta complexidade e importância, de interpretar as leis e de converter os seus mandamentos em atos administrativos das mais variadas espécies. Nessa missão político-administrativa é admissível que o governante erre, que se equivoque na interpretação da lei, que se confunda na apreciação da conveniência e oportunidade das medidas executivas sujeitas à sua decisão e determinação. Desde que o chefe do

105 61 MEIRELLES, H.L. Direito municipal brasileiro. 12ª ed., São Paulo: Malheiros, São Paulo: 2001, p. 761-762.

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Executivo erre em boa-fé, sem abuso de poder, sem intuito de perseguição ou favoritismo, não fica sujeito à responsabilização civil, ainda que seus atos lesem a Administração ou causem danos patrimoniais a terceiros. (....) O só fato de o ato ser lesivo não acarreta ao Prefeito a obrigação de indenizar. Necessário se torna, ainda, que além de lesivo e contrário ao direito, resulte de conduta abusiva do prefeito no desempenho de cargo ou a pretexto de seu exercício.

Di Pietro62 ratifica que “Sem um mínimo de má-fé, não se pode cogitar da

aplicação de penalidades tão severas como a suspensão dos direitos políticos e a

perda da função pública.”

5 OBJETIVO DA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

Inicialmente se diga que há muito vem se buscando moralizar a

administração pública, impedindo que pessoas ligadas a ela, seja com vínculo direto,

sejam indireto, permanente ou provisório, se valham desta

oportunidade/função/cargo/mandato para enriquecerem ou beneficiarem a elas

próprias ou a terceiros, causando ou não prejuízo ao patrimônio público, mas

sempre em razão dele.

Sabe-se que as falcatruas na administração pública, não são condutas

hodiernas. Pelo contrário. Elas sempre existiram.

Fazzio Junior63 reconhece:

Não é chaga recente. Sempre foi nociva rotina parasitando a Administração Pública. Embora as funções e cargos oficiais sejam bens de domínio público que não podem ser expostos à negociação, há muitos agentes públicos, entre os quais maus prefeitos, que fazem de seu ofício o balcão onde vendem por vias travessas aquilo que deve ser consagrado ao interesse público.

105 62 DI PIETRO, M.S.Z. Direito administrativo. 23ª ed., São Paulo: Atlas, 2010, p. 837. 63 FAZZIO JUNIOR, W. Improbidade Administrativa e Crimes de Prefeito - De acordo com a Lei de Responsabilidade Fiscal, 2ª ed., São Paulo: Atlas, 2001, p. 51.

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Além de não serem recentes, a corrupção e a desonestidade no trato da coisa

pública, não são “privilégios” do Brasil, mas sim um mal universal.

Lisboa Neiva64 citando Francisco Bilac Moreira Pinto emenda:

A corrupção, a imoralidade e a improbidade na Administração Pública não são mazelas que atingem historicamente apenas nosso país, mas também outras nações, exigindo-se instrumentos eficazes de combate que permitam a desconstituição dos atos praticados e a punição dos agentes imorais e ímprobos.

O combate à improbidade é tão antigo quanto a luta contra a corrupção, esta

existente desde os primórdios da civilização. Afinal, não se pode negar que se tratou

de corrupção o ato da serpente que, visando seduzir Adão, ofertou-lhe uma maçã,

na troca do paraíso com os prazeres da carne (GARCIA e ALVES, citando

TÁCITO)65.

Na Bíblia também se encontram várias passagens disciplinando os atos de

corrupção e suas conseqüências maléficas. Garcia e Alves66 citam, por exemplo,

que em Isaias, Capítulo 1, Versículos 21 a 23, é analisada a corrupção da polis:

Como se prostitui a cidade Fiel, Sião, cheia de retidão? A justiça habitava nela, e agora são os homicidas. Tua prata converteu-se em escória, teu vinho misturou-se com água. Teus príncipes são rebeldes, cúmplices de ladrões. Todos eles amam as dádivas e andam atrás do proveito próprio, não fazem justiça ao órfão e a causa da viúva não é evocada diante deles.

O anseio de se punir quem está à frente dos atos de corrupção, vem mobilizando os

legisladores durante longos anos, os quais quer, por irresignação pessoal, quer pela

necessidade de darem uma resposta à comunidade, vêm editando textos no sentido

de coibir a prática dessas condutas odiosas.

105 64NEIVA, J.A.L. Improbidade administrativa. estudo sobre a demanda na ação de conhecimento e cautelar. 2ª ed., Niterói-RJ. Impetus, 2006, p. 06. 65 GARCIA, E.; ALVES, R.P. Improbidade administrativa. 4ª ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 161. 66 Idem, p. 161.

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Inúmeras normas constitucionais e infraconstitucionais foram criadas

visando combater a improbidade administrativa.

De magnitude constitucional podem ser citados os seguintes textos:

O item 6º do art. 54 da Constituição Federal de 1891, previa in verbis:

Art 54 - São crimes de responsabilidade os atos do Presidente que atentarem contra: [...] 6º) a probidade da administração;

A alínea “f”, do art. 57, da Carta Magna de 1934, o inciso V, do art. 89, da

Constituição Federal de 1967, o mesmo inciso, do art. 84, da Constituição Federal

de 1969 e do artigo 85, da atual Constituição Federal tinham e tem redação

praticamente idênticas. A Constituição dos Estados Unidos do Brasil, de 10 de

novembro de 1937, na alínea “d”, do art. 85, acrescentou ao texto e,

consequentemente, como crime de responsabilidade além dos atos do Presidente,

que atentassem a probidade administrativa os que invadissem “a guarda e o dinheiro

público”.

Até a Carta de 1824 que, no seu artigo 99, determinou a irresponsabilidade

do Imperador67, tentou, indiretamente, coibir atos de improbidade, conforme se pode

constatar pela leitura do texto inserto em seu art.133:

Art. 133. Os Ministros de Estado serão responsáveis: [...] II. Por peita, suborno, ou concussão. III. Por abuso do Poder. IV. Pela falta de observância da Lei. [...] VI. Por qualquer dissipação dos bens públicos

Na art. 37, p. 4º da atual Constituição Federal, consta:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios

105 67 Art. 99. A Pessoa do Imperador é inviolável, e Sagrada: Ele não está sujeito a responsabilidade alguma.

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obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

[...]

§ 4º - Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.

Na esfera infraconstitucional, por sua vez, podem ser indicados como

instrumentos legais criados para inibir ou punir os ímprobos, o Decreto-Lei n.

3.240/1941, já previa o sequestro de bens de pessoa indiciada por crime que

causasse prejuízo para a Fazenda Pública. Anos depois surgiu a Lei n. 3.164/1957,

que se tornou conhecida como Lei Pitombo-Godói Ilha, a qual previa no seu art. 1º o

seqüestro cautelar e o perdimento, em favor da Fazenda Pública de bens adquiridos

por servidor público “em razão de influência ou abuso de cargo ou função pública, ou

de emprego em entidade autárquica, sem prejuízo da responsabilidade criminal”,

instituindo, assim, uma tutela extrapenal sancionando a improbidade administrativa.

No ano seguinte entrou em vigor a Lei n. 3.502/1958, denominada Lei Bilac Pinto,

que no seu art. 1º e parágrafos 1º e 2º, dispôs que nos casos de enriquecimento

ilícito, por influência ou abuso do cargo ou função, eram cabíveis o seqüestro e o

perdimento de bens ou valores, estendendo o alcance da expressão servidor público

a todas as pessoas que exercessem nos entes federativos quaisquer cargos,

funções ou empregos, civis ou militares, quer fossem eletivos, quer de nomeação ou

contrato, nos órgão dos três poderes, bem assim aqueles que fossem dirigentes ou

empregados de sociedades de economia mista, fundações públicas, empresas

incorporadas ao patrimônio público ou de entidades que tivessem recebido e

aplicado contribuições fiscais. Em 29 de junho de 1965 nasceu a Lei Popular

(diploma n. 4.717/65) que disciplinou as situações em que é possível se pleitear a

anulação ou a declaração de nulidade dos atos lesivos ao patrimônio público,

através da propositura da Ação Popular e atribuiu legitimidade ativa ao cidadão, ou

seja, ao nacional em pleno gozo dos direito políticos. .

Por fim, foi sancionada em 03 de julho de 1992 a Lei n. 8.429 que é

conhecida como Lei de Improbidade Administrativa, a qual entre outras regras

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definiu os sujeitos dos atos de improbidade conceituando agentes públicos em

termos amplos; determinou o dever que eles têm de observar os princípios que

regem a atividade do Estado, de não causar dano ao patrimônio público e de não se

enriquecerem ilicitamente; descreveu os tipos dos atos de improbidade e as sanções

cominadas a quem os realizar; obrigou que todos os agentes públicos divulguem as

declarações de seus bens, facilitando a fiscalização da eventual ascensão

patrimonial despropositada; e estabeleceu regras procedimentais relativas a

investigação de atos de improbidade e disposições processuais concernentes as

medidas cautelares e ações principais que poderão ser propostas contra atos

praticados por ímprobos.

No entanto, o combate a improbidade administrativa, se trata de uma

verdadeira e infindável guerra, onde os instrumentos punitivos e inibitórios trazidos

pelas leis estão abissalmente distantes da criatividade e até da petulância dos

agentes desonestos. Estes estão sempre à frente daqueles, como numa corrida de

“gatos perseguindo ratos”, com a ressalva, nesta metáfora e da linguagem popular,

que os perseguidos aqui são os “gatos”.

Fazzio Júnior68 comenta:

Os incisos do art. 12 compõem um potente arsenal de sanções suficientes para afastar a tentação dos atos de improbidade. Anote-se, entretanto, que mesmo assim, o injustificado senso de impunidade continua encorajando aqueles alcaides inescrupulosos a “avançar” sobre os bens públicos.

Da leitura de todos estes textos legais extrai-se que a intenção do legislador

sempre foi punir as pessoas que atuam de forma incorreta, desonesta, desleal, com

enriquecimento ilícito, com prejuízo ao erário público e/ou com violação aos

princípios da administração, guardando sintonia com o próprio conceito de

improbidade que, conforme afirmado em tópico anterior origina-se do latim

improbitate, que significa desonestidade, falta de probidade, mau caráter, maldade,

perversidade e o probo do latim probu, denota de caráter integro, honesto, honrado,

reto, justo 105 68 FAZZIO JUNIOR, W. Improbidade Administrativa e Crimes de Prefeito - De acordo com a Lei de Responsabilidade Fiscal, 2ª Ed. São Paulo: Atlas, 2001, p. 296.

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Burle Filho69 aduziu:

De mais a mais, por se tratar de pena gravíssima, é manifesto que a suspensão dos direitos políticos com base na Lei de Improbidade só pode Alcançar o agente cujo ato esteja marcado pela desonestidade, mas nunca aquele que tenha cometido um ato ilegal ou lesivo a um princípio sem a marca do ímprobo, ou seja, sem violar o dever de agir de honestidade. No art. 15, V, ao prever a suspensão dos direitos políticos por improbidade administrativa, o fim da Constituição é punir o ímprobo, não qualquer agente que tenha praticado um ato contrário ao direito por erro de interpretação ou mesmo por culpa, certe de que agia de conformidade com a lei.

Segundo Simão70 “o ato de improbidade qualificado como administrativo (ato

de improbidade administrativa), é aquele impregnado de desonestidade e

deslealdade.”

Registre-se que a mensagem n. 406/1991, da lavra do então Presidente da

República, Sr. Fernando Collor de Mello, encaminhada à Câmara dos Deputados no

início do segundo semestre de 1991, que originou o Projeto de Lei n. 1.446/91 e na

sequência a Lei 8.429/92, tinha como objeto a punição ao agente público pelo seu

enriquecimento ilícito. Vale dizer, a preocupação sempre foi buscar a punição

daqueles que usavam suas funções para, dolosamente, amealharem riquezas em

prejuízo do patrimônio público.

Na própria exposição de motivos o então Ministro da Justiça, Jarbas

Passarinho registrou que o combate a corrupção se fazia imprescindível, pois era

“uma das maiores mazelas que, infelizmentes, ainda afligem o País”.71

Este – o combate a corrupção, a desonestidade = foi a principal finalidade da

edição de leis como a 8.429/92.

Há muito se tenta coibir que detentores do poder, valendo-se de suas

funções se enriqueçam a custa do erário, beneficiem terceiros, fazendo “cortesia

com o chapéu alheio (do povo)”, ou causem lesões ao patrimônio público.

Escândalos frequentes e cada vez mais flagrantes, já que cometidos aos olhos de

105 69 BURLE FILHO, J.E. A ação civil pública após 20 anos: Efetividade e desafios. São Paulo: RT, 2005, p. 299. 70 SIMÃO, C. Improbidade administrativa - Teoria e Prática. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 82. 71 DO de 17.8.1991, Secção I, p.14124.

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qualquer um, sem o mínimo constrangimento, fizeram com que fossem tomadas

iniciativas legislativas visando coibir, ou no mínimo inibir a desonestidade que

pairava e, infelizmente, ainda persiste. Não há a menor dúvida de que a bandeira

levantada é a que visa combater a corrupção, a deslealdade, a falta de escrúpulos, o

tratamento propositadamente diferenciado dos cidadãos, condutas essas

notoriamente dolosas.

A propósito:

ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 11, I, DA LEI 8.429/92. AUSÊNCIA DE DANO AO ERÁRIO PÚBLICO. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. 1. "O objetivo da Lei de Improbidade é punir o administrador público desonesto, não o inábil. Ou, em outras palavras, para que se enquadre o agente público na Lei de Improbidade é necessário que haja o dolo, a culpa e o prejuízo ao ente público, caracterizado pela ação ou omissão do administrador público." (Mauro Roberto Gomes de Mattos, em "O Limite da Improbidade Administrativa" , Edit. América Jurídica, 2ª ed. pp. 7 e 8). 2. "A finalidade da lei de improbidade administrativa é punir o administrado desonesto" (Alexandre de Moraes, in "Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional", Atlas, 2002, p. 2.611). 3. "De fato, a lei alcança o administrador desonesto, não o inábil, despreparado, incompetente e desastrado" (REsp 213.994-0/MG, 1ª Turma, Rel. Min. Garcia Vieira, DOU de 27.9.1999). 4. "A Lei nº 8.429/92 da Ação de Improbidade Administrativa, que explicitou o cânone do art. 37, § 4º, da Constituição Federal, teve como escopo impor sanções aos agentes públicos incursos em atos de improbidade nos casos em que: a) importem em enriquecimento ilícito (art. 9); b) em que causem prejuízo ao erário público (art. 10); c) que atentem contra os princípios da Administração Pública (art.11), aqui também compreendida a lesão à moralidade pública" (REsp nº 480.387/SP, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª T, DJU de 24.5.2004, p. 162). 5. O recorrente sancionou lei aprovada pela Câmara Municipal que denominou prédio público com nome de pessoas vivas. 6. Inexistência de qualquer acusação de que o recorrente tenha enriquecido ilicitamente em decorrência do ato administrativo que lhe é apontado como praticado. 7. Ausência de comprovação de lesão ao patrimônio público. 8. Não configuração do tipo definido no art. 11, I, da Lei nº 8.429 de 1992. 9. Pena de suspensão de direitos políticos por quatro anos, sem nenhuma fundamentação. 10. Ilegalidade que, se existir, não configura ato de improbidade administrativa. 11. Recurso especial provido. (REsp 758639 / PB – STJ – Primeira Turma – rel. Min. José Delgado – DJ 28.03.2006 – DP 05.2006)

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A culpa, embora expressamente prevista no artigo 10, da Lei de Improbidade

Administrativa, não parece ser o elemento central dela, muito menos a razão de sua

existência. O que quiseram os legisladores com sua edição foram por fim à

desonestidade ou demonstrar à sociedade insatisfeita diante de tantas maracutaias,

que a intenção era essa e que uma medida foi tomada. A sociedade clamava por

isso. Parece, s.m.j., que a preocupação com os atos de improbidade administrativa

na modalidade culposa veio como um adicional. Até, repita-se, pelo período histórico

em que foi editada (era Collor – “Caçador de Marajás”), que se preocupava em punir

os ímprobos que cometeram atos contra o erário e não com os descuidados ou

inaptos. No mínimo, não desejavam atingir atos cometidos com culpa leve ou

levíssima, quando muito, abarcar culpa gravíssima, até pela sua proximidade com o

dolo. A posição acima defendida – de que o objetivo da lei sempre foi punir os

desonestos – está sendo literal e felizmente adotada.

O eminente Min. Garcia Vieira, consignou em seu voto no Resp n.

213.994/MG:

De fato, a lei alcança o administrador desonesto, não o inábil, despreparado, incompetente e desastrado. Com razão, o aresto guerreado ao sustentar que: “... a improbidade administrativa deve dizer necessariamente com a falta de boa fé, com a desonestidade, com a conduta-tipo do ilícito. Ora, o requerente não agiu com má-fé. Não foi desonesto, não recebeu nenhuma vantagem ilícita e não causou qualquer prejuízo aos cofres do município” [...] A punição deve ser do administrador desonesto que aufere vantagens e causa prejuízos aos cofres públicos, com o ato ilegal. Este além de ilegal deve ser lesivo.

O Desembargador Calixto72 do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, ao

tecer comentários sob o art. 11, da Lei n. 8.429/92, expôs sua opinião, da forma que

segue:

Parte-se do princípio de que não existe má-fé objetiva. O mero erro legal do agente, desprovido do mínimo de demonstração da intenção desonesta, não deve ser necessariamente compreendido dentre as condutas que geram as conseqüências dos atos tidos como ímprobos.

105 72 CALIXTO, A.L. Revista Judiciária do Paraná, ano 06, n º2, Curitiba: Janeiro, 2011, p. 47.

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Silva73 escrevendo sobre o Direito Administrativo Sancionador concluiu:

O regime jurídico brasileiro dispõe de um conjunto de leis , que forma um sistema usualmente denominado de Direito Administrativo sancionador, cujas normas se aproximam do Direito Penal.Este conjunto busca a punição de condutas lesivas ao dever de probidade e contrárias aos princípios especialmente o da moralidade. Por isso, as sanções da Lei de Improbidade Administrativa (lei 8.429/92) e da Lei da Ação Popular também devem ser interpretadas à luz dos princípios atinentes aos direitos fundamentais que informam o Direito Penal, destacando-se o princípio da culpabilidade, cujo teor prega que a punição ou a sanção só têm base constitucional para a conduta dolosa ou culposa. Aqui, no nosso entender, na esfera do Direito Administrativo Sancionador, a pena com base nas leis acima citadas não pode decorrer de conduta culposa, na medida em que esse conjunto de leis tem por finalidade punir o administrador ímprobo, desonesto, ou seja, aquele que atentou contra “a probidade na administração (CF/88, art. 85, V), não o que agiu com imprudência, negligência ou imperícia. Este pode responder por outras sanções administrativas ou por responsabilidade administrativa. De fato, se probidade significa “Honestidade”, “retidão”, a conduta do ímprobo, tem que ser lastreada na desonestidade ou falta de retidão (Grifo nosso).

Na mesma direção é lição de Dinamarco74, que ao tecer comentários acerca

do art. 10, da Lei nº 8.429/92, registrou:

Seu caput trata da ação ou omissão do agente que seja “dolosa ou culposa”, ou seja, bastaria somente a ocorrência de imprudência, imperícia ou negligência. Entretanto, a intenção desse dispositivo provavelmente foi evitar que atos causadores de danos ao erário ficassem impunes sob o escudo da dificuldade de se produzir a prova da intenção objetiva do agente. Como já foi dito, a lei visa a alcançar o administrador desonesto, não o inábil.

E, continuando, alerta o referido doutrinador, citando Eros Roberto Graus75: “Essa é

uma premissa que não deve ser esquecida pelo hermeneuta, pois tanto a

Constituição quanto as leis devem ser interpretadas por inteiro, nunca em pedaços

independentes.”

105 73 SILVA, J.A.da. Direito Administrativo Brasileiro, 36ª ed., Malheiros, São Paulo: 2010, p. 118. 74 DINAMARCO, P.S. in BUENO, C.S. e PORTO FILHO, P.P.de R, coordenadores. Improbidade administrativa questões polêmicas e atuais. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 334. 75GRAUS, E.R. in BUENO, C. S.; PORTO FILHO, P.P.de R, coordenadores. Improbidade administrativa questões polêmicas e atuais. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 334.

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Do todo, retira-se a ilação de que o que revolta e que merece séria punição

é a atitude do agente público ou do estranho a ele vinculado, que agindo com dolo

ou culpa grave, se vale de sua posição, muitas vezes objeto de grande confiança

popular, para surrupiar o dinheiro do povo em proveito próprio ou de seus

protegidos, causando prejuízos aos cofres públicos ou beneficiando-os com a

postergação dos princípios que regem a atividade estatal.

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6 A IMPROPRIDADE EM FACE DO SISTEMA FEDERATIVO BRASILEIRO

A Carta Magna 1988 manteve o Brasil como uma República Federativa, que

se caracteriza pela união de coletividades regionais autônomas – União, Estados,

Distrito Federal e Municípios.

Silva76 ensina que:

A União é a entidade federal formada pela reunião de partes componentes, constituindo pessoa jurídica de Direito Público interno, autônoma em relação aos Estados, e a que cabe exercer as prerrogativas da soberania do Estado Brasileiro. Os Estados-membros são entidades federativas componentes, dotadas de autonomia e também de personalidade jurídica de Direito Público interno.

Somente a união possui soberania, sendo que os entes federados têm

autonomia que se baseia nas capacidades de auto-organização, autogoverno e

auto-administração (MORAES)77.

Por auto-organização deve-se entender que os Estados editam suas

próprias constituições, desde que não infrinjam os princípios constitucionais

previstos no art. 34, VII, da Constituição Federal78, os princípios constitucionais

extensíveis, que são normas centrais dos entes federados e cuja observância é

obrigatória e os princípios constitucionais que se subdividem em normas de

competência e de preordenação.

105 76 SILVA, J.A. Curso de direito constitucional positivo. 33ª ed., São Paulo: Malheiros, 2010, p. 100-101. 77 MORAES, A.de M. Direito constitucional. 7ª ed., São Paulo: Atlas, 2000, p. 257. 78 Art. 34. A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para: [...] VII - assegurar a observância dos seguintes princípios constitucionais: a) forma republicana, sistema representativo e regime democrático; b) direitos da pessoa humana; c) autonomia municipal; d) prestação de contas da administração pública, direta e indireta. e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde.

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A capacidade de autogoverno consiste no fato de que o próprio eleitor do

Estado é quem escolhe seus representantes legais (Governadores e Deputados)

sem sofrer qualquer influência da União, a não ser em relação a algumas regras

como, por exemplo, a existência de três poderes (executivo, legislativo e judiciário),

a unicameralidade do poder legislativo estadual, o número de deputados e a

duração do mandato do executivo e do legislativo, que já vêm previstas na

Constituição Federal e que devem ser obedecidas (CLEVE)79

Por fim, a capacidade de auto-administração se resume no poder que “os

Estados têm de exercer suas competências administrativas, legislativas e tributárias

definidas na Constituição Federal” (MORAES80).

Os municípios foram elevados à categoria de entidade federativa81, possuem

autonomia e as capacidades de auto-governo, auto-administração e auto-

organização, como os Estados.

A República Federativa do Brasil é composta atualmente do Distrito Federal,

26 Estados e 5.560 Municípios, dentre os quais podemos destacar municípios

populosos como São Paulo-SP que tem uma população estimada de 11.253.503, o

Rio de Janeiro-RJ com 6.320.446 e Salvador-BA com 2.675.656 pessoas e cidades

diminutas como, por exemplo, Anhanguera-GO, composta de 1.020 habitantes,

Serra da Saudades-MG, com 815 pessoas e Borá-SP com 805 (CENSO de 2010).

Segundo estatística divulgada pelo jornal O Globo de 27 de julho de 2010,

mais de 53% dos candidatos que concorreriam a cargos eletivos nas eleições de

2010 e, portanto, estariam à frente dos Poderes Executivo e Legislativo das

unidades federativas, representando mais de 180.000.000 de pessoas, não

possuíam curso superior, sendo que cerca de cinco declararam-se analfabetos, 114

inseriram-se na categoria “lê e escreve” (0,6% do total), em torno de 10% dos

políticos parou no ensino fundamental completo ou incompleto, e outros 28%

chegaram ao ensino médio, mas não fizeram nenhum curso superior. Por fim,

10,7%% das pessoas que iriam tentar a eleição em outubro protocolaram que

possuíam educação universitária incompleta. 105 79 CLÉVE, Clémerson Merlin, p. 62-63. 80 MORAES, A. de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. São Paulo: Atlas, 2007, p. 260. 81 SILVA, J.A.da não comunga desta asseveração. Para o autor não existe federação formada por municípios. Existe Federação de Estados. O município é um componente da federação, mas não uma entidade federativa.(Curso de Direito Constitucional, p. 103).

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Na eleição de 2008, foi eleito 01 prefeito analfabeto (por incrível que possa

parecer), 56 que lêem e escrevem, 523 com ensino fundamental incompleto, 414

com ensino fundamental completo, 211 com ensino médio incompleto, 1494 com

ensino médio completo e 383 com ensino superior incompleto, ou seja, mais da

metade dos prefeitos do país tem no máximo o ensino médio.82

Destes singelos dados pode-se afirmar o que todos já sabem que o Brasil é

um país de diversidades extremas, seja cultural, demográfica, econômica ou social.

A lei, por sua vez, como não poderia deixar de ser, abstrata e genérica,

abrange a todos sem distinção. Isto acontece, igualmente, com a Lei de

Improbidade Administrativa e não se pode exigir que seja diferente. Entretanto,

imprescindível se faz que o exegeta e o aplicador do direito analisem o caso

concreto, aplique as leis e imponham penas diante da peculiaridade de cada

situação posta a exame ou julgamento e do seu agente, sob pena de cometerem

inúmeras e constantes injustiças.

Registre-se que não se pode colocar na mesma “vala” o prefeito municipal

da cidade de São Paulo, capital, com o alcaide de Borá, localizada no interior do

mesmo Estado. Muito menos se pode atribuir tratamento idêntico ao Governador do

Estado do Paraná e ao vereador da cidade de Malhada dos Bois, no Estado de

Sergipe, aplicando a ambos as severas sanções da Lei 8.429/92.

Não se está aqui, de maneira alguma, menosprezando este ou aquele

Município ou Estado, muito menos atribuindo maior ou menor capacidade

administrativa e intelectual a este ou aquele administrador, mas é óbvio que as

diferenças existem e devem ser sopesadas.

É certo que a assessoria de um governador de Estado tende a ser e é

infinitamente superior quantitativa e qualitativamente a de um prefeito de uma

pequena cidade da região norte do Acre.

Normalmente, também, o grau de escolaridade de um senador da república

é maior do que o de um vereador de um pequeno município Riograndense. Tem o

primeiro muito mais condições de saber acerca da existência das leis e compreendê-

las do que o segundo.

105 82 Relatório das Eleições 2008, Brasília, TSE, 2009

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A verdade é que existem diferenças culturais, educacionais, estruturais e

sociais entre os diversos “agentes públicos”, que exigem a análise concreta de cada

situação, para a justa e escorreita aplicação da lei e suas sanções.

Tolosa Filho.83 ressaltando a existência destas diferenças explica que

“necessário se faz ponderar a circunstância de que parte dos governantes,

principalmente a nível municipal, vem de origem humilde e é desprovido de cultura

técnico-administrativa”. Todavia, em que pese existam as referidas diferenças, não é

menos certo que todo homem, por mais simples que seja (e este é comumente o

mais probo), por ser dotado de razão e livre arbítrio e conhecedor que é dos

processos causais, tem plena consciência do que seu comportamento pode causar e

sabe muito bem diferenciar o certo do errado, o justo do injusto, o honesto do

desonesto.

Justamente por se tratar de um senso comum, mesmo desconhecendo os

artigos do Código Penal, até o macuco sabe, por exemplo, que furtar, matar, ofender

a integridade física de alguém, estuprar são condutas ilícitas e contrárias à lei, e

quem as pratica receberá ou deveria receber uma grave sanção. O mesmo senso

natural as pessoas têm de que o homem público não pode se enriquecer

surrupiando o dinheiro do povo, que não deve beneficiar parentes ou amigos em

prejuízo de terceiros, nem receber propina para realizar ato ilegal.

Fazzio Junior84 aduz que “nenhum prefeito desconhece, por certo, a

proibição de enriquecer-se a expensas do exercício do cargo ou de permitir que, por

ilegalidade de sua conduta, outro o faça.”

Isto ocorre porque os exemplos acima citados, quaisquer deles, causam

revolta, repugnância, insatisfação à maioria das pessoas que, de pronto, censuram a

conduta praticada e no íntimo exigem e desejam uma punição.

Este sentimento de reprovação é muito natural quando se verifica que as

condutas foram praticadas por alguém de mau caráter, movido por má-fé,

desonestidade, falta de integridade e retidão que atuou sabendo o que estava

fazendo. Vale dizer, alguém que laborou com dolo, com vontade e consciência de

fazer aquilo. Diferente é a sensação da comunidade perante um ato cometido por

105 83 TOLOSA FILHO, B. de. Comentários à lei de improbidade administrativa. Forense, Rio de Janeiro: 2003, p. 46. 84FAZZIO JUNIOR, W. Improbidade administrativa e crimes de prefeito - De acordo com a Lei de Responsabilidade Fiscal, 2ª ed., São Paulo: Atlas, 2001, p. 72.

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equivoco, descuido ou despreparo de quem o perpetrou. O senso de revolta é

infinitamente inferior, às vezes até inexistente e quando há é, de inopino, muitas

vezes perdoado.

Uma coisa é julgar a conduta de alguém que sabe que está fazendo algo

errado e continua. Outra é analisar o modo de agir de alguém que laborou em erro,

acha que está fazendo algo correto e causa um resultado indesejado.

Assim sendo, imprescindível que o agente do parquet, e o julgador, cientes

das diferenças existentes num país das dimensões do Brasil e com uma população

enorme repleta de diversidades, ajam de forma a se aproximarem o máximo possível

do intuito buscado pela lei de improbidade, jamais fazendo apenas a mera

subsunção da conduta da vida real praticada por um agente público à descrição

abstrata do tipo de ato de improbidade exemplificativamente previsto nos artigos 9º,

10 e 11, da Lei n. 8.429/92, mas principalmente analisando o elemento subjetivo que

animou a ação ou a inação do agente.

É preciso que o primeiro, o agente ministerial, durante as investigações

realizadas no inquérito civil, averigúe as circunstâncias em que o ato, em tese,

ímprobo aconteceu, não se descuidando jamais de se ater acerca das condições

pessoais e intelectuais, seja do agente, seja da equipe que o assessora. Tendo

indicativos de que o agente atuou de maneira desonesta, com má-fé, a propositura

da ação civil pública por ato de improbidade administrativa se impõe. Caso contrário,

não.

Do mesmo modo deve atuar o julgador. Analisando as provas e concluindo

que o agente agiu de forma propositada e desleal, enriquecendo a si ou a outrem

com o dinheiro do povo, ou realizando a atividade estatal em total desacordo com os

princípios que a regem, deve impor a ele as sanções previstas na lei, em bloco,

isolada, ou conjuntamente. Entretanto, se durante a instrução constatar que o sujeito

passivo não realizou a conduta movida pela má-fé, desonestidade, a decisão deve

ser pela improcedência da ação.

Todos que lidam na prática sabem que o elemento subjetivo que move a

conduta do agente está no interior, no íntimo, na mente dele e só é descoberto pelas

circunstâncias, o modo como o ato foi praticado, o descompasso evidente entre o

atuar normal e o anormal, o beneficiado e o beneficiário, o objeto e seu valor e assim

por diante.

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Justamente por esta peculiaridade devem os operadores do direito agir com

equilíbrio e sensatez, para verificarem se o agente foi realmente ímprobo e merece

as punições da Lei nº 8.429/92

É neste sentido a lição de Juarez de Freitas, que serviu de base para o voto

do Ministro Mauro Campbeel no EDecl no REsp 722.403 e que se transcreve abaixo:

"[...] para mim, para que haja improbidade administrativa, em qualquer uma das três espécies, há dois requisitos fundamentais. [...] O juiz precisa, simplesmente, de um princípio constitucional importantíssimo chamado 'princípio da sensatez'. [...] Então, o primeiro pressuposto é que, com bom senso, se examine o seguinte: há grave violação do senso médio superior de moralidade da comunidade? [...] É a primeira e mais grave pergunta para que haja uma improbidade administrativa, dada a gravidade das sanções em relação às três espécies. [...] E o segundo requisito, inequívoca intenção desonesta. [...] A mera irregularidade, a mera ilegalidade, para mim é insuficiente para condenar alguém por improbidade administrativa" (Ação civil pública – Improbidade administrativa, Boletim de Direito Administrativo n. 5, 2005, p. 543/544).

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7 SANÇÕES DA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

O art. 12 da Lei nº 8429/92, prevê a aplicação das seguintes sanções: a)

perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio; b) perda da função

pública; c) suspensão dos direitos políticos oscilando no patamar de 03 a 10 anos; d)

pagamento de multa civil; e e) proibição de contratar com o Poder Público ou

receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda

que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, também pelo

prazo previsto entre 03 a 10 anos.

Com o devido respeito ao legislador, conclui-se pela mera leitura do artigo 12

da Lei de Improbidade Administrativa, que ele pecou pela falta de técnica, vez que

colocou em três blocos, penas de diversas searas e gravidade, bem assim foi

descuidado, pois atribuiu as mesmas sanções a agentes públicos que tenham

atuado de forma dolosa ou culposa.

Não bastasse isso, constata-se que a inclusão de alguns dispositivos foi

ocioso e impertinente, vez que já previstos na própria lei em outro artigo, ou porque

tutelado pela legislação pátria em outro diploma. É o que se vê, por exemplo, da

obrigação de reparar o dano mencionado no art. 5º. Tal sanção já estava prevista no

art. 12 da Lei de Improbidade Administrativa, bem assim no art. 159, do Código Civil.

As penas atribuídas aos agentes ímprobos são realmente rigorosas, com

exceção da reparação do dano, que, por si só, não pode ser considerada sanção,

afinal, restringe-se a determinar que aqueles, devolvam ao erário aquilo que dele

retiraram indevidamente em favor próprio ou de terceiros, ou o prejuízo que lhe

causaram.

As demais sanções merecem algumas digressões:

7.1 PERDA DA FUNÇÃO PÚBLICA

Esta sanção e de extrema gravidade, vez que tem natureza expulsória.

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Trata-se do rompimento definitivo de todos os vínculos existentes entre o

infrator e a administração pública.

A sanção pode ser imposta ao Presidente da República, Vice-presidente,

Senadores, Deputados Federais, Estaduais e Distritais, Governadores de Estado e

do Distrito Federal, Prefeitos, Vereadores, Membros do Ministério Público, do Poder

Judiciário e dos Tribunais de Contas (Promotores de Justiça, Procuradores de

Justiça, Procuradores da República, Juízes, Desembargadores, Ministros dos

Tribunais Superiores, Conselheiros e Ministros dos Tribunais de Contas).

Outra questão que os autores divergem é se a sanção de perda da função

pública atinge todas as funções e cargos eletivos que o ímprobo tiver, ou se estando

licenciado de uma função pública para exercer um cargo político, pode voltar àquela

se perder seu mandato.

Alguns autores, entre os quais Fazzio Junior85 entendem que a sanção atinge

apenas aquela função pública exercida pelo ímprobo no momento da prática do ato

de improbidade.

Explica o autor:

Outra questão se põe. Agente público que se afasta de suas funções para candidatar-se à Prefeitura do Município, é leito, mas, depois, pelo cometimento de ato de improbidade administrativa, perde o cargo; pode voltar ao exercício da função pública de que se afastara? Uma vez recuperados os direitos políticos, sim. Não Perdeu toda e qualquer função pública, mas, só aquela em cujo exercício praticou o ato de improbidade administrativa. A condenação judicial não significa a perda de toda e qualquer função pública. Não fixa uma interdição, nem é perpétua.

Outros doutrinadores, entretanto, podendo citar Garcia e Alves86, e Martins

Junior87, comungam do entendimento de que o infrator perderá todas as funções

e/ou funções e cargos eletivos que ocupar, por ocasião ato ímprobo independente

da esfera de cada função ou mandato para o qual foi eleito.

105 85 FAZZIO JUNIOR, W. Improbidade administrativa e crimes de prefeito - De acordo com a Lei de Responsabilidade Fiscal, 2ª ed., São Paulo: Atlas, 2001, p. 304. 86 GARCIA, E.; ALVES, R.P. Improbidade administrativa. 4ª ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 449-450. 87 MARTINS JUNIOR, W.P. Probidade administrativa, São Paulo: Saraiva, 2001, p. 277.

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Garcia e Alves88 expõem seu entendimento da forma que segue:

Em razão da mencionada incompatibilidade entre a personalidade do agente e a gestão da coisa pública, o que se tornou claro com a prática do ato de improbidade, deve a sanção da perda da função, quando aplicada, extinguir todos os vínculos laborais existentes junto ao Poder Público. O art. 12, em seus três incisos, fala genericamente em perda da função, que não pode ser restringida àquela que por ocasião da prática do ato de improbidade, isto sob pena de se permitir a pratica de tantos ilícitos quantos sejam os vínculos existentes, em flagrante detrimento da coletividade e dos fins da lei. Ainda que o agente exerça duas ou mais atribuições, de origem eletiva ou contratual, ou uma função distinta daquela que exercia por ocasião dos ilícitos, o provimento jurisdicional haverá de alcançar todas, determinando a completa extinção das relações existentes entre o agente e o Poder Público.

O segundo entendimento é mais coerente com o escopo da sanção ora

analisada. Afinal, buscam-se pessoas honestas, íntegras, corretas para atuar em

todas as áreas da administração pública. Se for assim, e o agente foi punido

exatamente por não ter estes predicados, não tem razão alguma para ser mantido

em qualquer das funções ou cargo eletivo que esteja exercendo, pois já provou que

não tem a mínima retidão para manter-se ali. No mesmo giro, adotar-se a primeira

corrente é permitir que o ímprobo pratique tantos atos de improbidade, quantos

forem os seus cargos ou funções.

Atente-se que se, por ventura, o infrator já estiver na inatividade, seu vínculo

previdenciário com o poder público deve ser cancelado, pois ele nada mais é do que

a continuidade do ligame existente quando da prática do ato de improbidade

(GARCIA e ALVES)89.

A expressão “função pública” deve ser interpretada de forma extensiva.

Abrangem todos aqueles que exerçam, ainda que transitoriamente ou sem

remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer forma

de investidura ou vínculo, mandato cargo, em prego ou função com a as pessoas

mencionadas no artigo 1º. da Lei nº 8.429/92.

A perda do mandato pelo agente político não o impede, como no caso da

suspensão dos direitos políticos, de exercer os atos relativos ao sufrágio, podendo

votar e ser votado.

105 88 GARCIA, E.; ALVES, R.P. Improbidade administrativa. 4ª ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. 89 GARCIA, E.; ALVES, R.P. Improbidade administrativa. 4ª ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 450.

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Portanto, a exclusão do ímprobo não é um impedimento para que ele seja

novamente eleito ou reingresse na função pública. Poderá fazê-lo desde que vença

novo pleito ou obtenha aprovação em concurso público.

7.2 SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS:

Moraes90 conceitua direitos políticos como:

O conjunto de regras que disciplina as formas de atuação da soberania popular, conforme preleciona o caput do art. 14, da Constituição Federal. São direitos públicos subjetivos que investem o indivíduo no status activae civitatis, permitindo-lhe o exercício concreto da liberdade de participação nos negócios políticos do Estado, de maneira a conferir os atributos da cidadania.

Pois bem. A pena de suspensão dos direitos políticos impede que os

apenados, temporariamente, votem, ou sejam, votados. Vale dizer, eles não

participam da vida política do país pelo tempo determinado na sentença, transitada

em julgado, pois as capacidades eleitorais ativa e passiva deles, se encontram

suspensas.

Repare-se que a imposição desta pena influi e viola o regime democrático.

Afinal a decisão de um Julgador se sobrepõe à vontade de todos aqueles eleitores

que votaram no agente suspenso, impedindo que ele retorne ao cargo nas eleições

seguintes, mesmo que este seja o desejo popular.

Tem o juiz o poder de transformar um cidadão em não-cidadão, retirando o

direito dele ao sufrágio que para Moraes91 “é a essência do direito político,

expressando-se pela capacidade de eleger e ser eleito.” Impede que a população

vote e escolha o suspenso, como seu representante no poder executivo e legislativo.

O senso comum da coletividade ao se defrontar com a imposição desta pena

a agentes corruptos, desonestos, desleais, que agiram com má-fé, para a prática de

105 90 MORAES, A.de. Direito constitucional. 7ª ed., Atlas, São Paulo, 2000, p. 220. 91 MORAES, A.de. Direito constitucional. 7ª ed., Atlas, São Paulo, 2000, p. 221.

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atos de improbidade administrativa, não é de surpresa ou perplexidade, mas sim de

justiça, de dever cumprido e até de orgulho.

Diferente, no entanto, é o sentimento do povo, v.g. de uma pequena cidade

brasileira, que conhecedor dos atributos morais do prefeito local, o vem retirado do

cargo e impossibilitado de ser, por vários anos, novamente eleito, em razão de ter

cometido ato de improbidade administrativa, na modalidade culposa. Poucos

cidadãos entenderão como pode um homem de reconhecida honestidade, ser

punido com esta gravidade, por ter laborado em equívoco.

De duas, uma. Ou o julgador deve preocupar-se sobremaneira na aplicação

das sanções, em especial, a analisada neste tópico, a pessoas que praticaram ato

de improbidade na modalidade culposa, ou estas não podem ser consideradas

praticantes de tal ato, a não ser em caso de culpa gravíssima. Retomaremos o tema

com mais vagar, posteriormente.

A sanção suspensiva dos direitos políticos é mais ampla que a inelegibilidade,

já que impede o exercício do sufrágio (direito de votar e ser votado) enquanto que a

inelegibilidade inibe apenas a capacidade eleitoral passiva (direito de ser votado).

Estranho é que as causas de inelegibilidade só podem ser previstas em lei

complementar, enquanto que a suspensão dos direitos políticos está presente numa

lei ordinária – Lei nº 8429/92 (PRADO, p. 149).92

Veja-se que diante do sistema federativo brasileiro não se pode dispensar o

mesmo tratamento jurídico a cidadãos com níveis culturais e de ensino muito

diversos.

No tópico relativo ao sistema federativo tratou-se do assunto com maior

propriedade.

A suspensão dos direitos políticos, por retirar, temporariamente, a cidadania,

impede que o apenado pratique qualquer ato que exija o pleno gozo desses direitos,

como por exemplo, participar de concursos, obter cargos ou funções públicas,

ajuizar ações populares, criar ou integrar partido político e ter a iniciativa das leis,

nos casos e nas formas previstos na Constituição Federal.

105 92PRADO, F.O.de. A. Improbidade administrativa. São Paulo: Malheiros, 2001, p.149

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O certo é que as sanções da Lei de Improbidade Administrativa pelas

semelhanças que guardam com as do direito penal devem servir para punir apenas

aquele cidadão que agiu com dolo ou, ao menos, com culpa gravíssima.

7.3 MULTA CIVIL

Esta sanção está prevista para as três espécies de atos de improbidade, ou

seja, as que importam em enriquecimento ilícito, as que causem lesão ao erário e as

que atentem contra os princípios da administração pública (arts. 9º., 10 e 11, da

LIA). O seu valor oscila entre 100 (cem) vezes o valor da remuneração percebida

pelo agente público, no caso de violação aos princípios da administração pública e

03 (três) vezes o valor do acréscimo patrimonial em caso de enriquecimento ilícito.

A multa tem natureza civil e punitiva e, portanto, não se confunde com

indenização, devendo ser fixada com base na gravidade do ato e intensidade do

elemento subjetivo.

Além disso, pela sua natureza, não se confunde com a multa aplicada na

esfera penal e, consequentemente, pode ser transmitida aos herdeiros do infrator

falecido.

A multa civil tem sido um importante instrumento na prática para prevenção

geral e prevenção especial, pois o infrator realmente sente a perda patrimonial e a

vê como pena e as demais pessoas, se demovem da intenção de praticar ilícito

idêntico (GARCIA e ALVES)93.

A crítica de que a multa civil imposta pode ser risível diante do vultoso

patrimônio do infrator e, em consequência, não exerça o papel punitivo, parece

possível de ocorrer, porém em raríssimas situações, já que o valor máximo

estabelecido em cada inciso (enriquecimento ilícito – até três vezes o valor do

acréscimo patrimonial; lesão ao patrimônio público – até duas vezes o valor do dano

e afronta dos princípios da administração pública – até cem vezes a remuneração do

agente) é bem razoável e, certamente significativo para aqueles que nunca querem

105 93 GARCIA, E.; ALVES, R.P. Improbidade administrativa. 4ª ed. Lumen Juris, Rio de Janeiro: 2008, p. 469.

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perder. Cabe ao julgador, para valorizar o instituto, conjugar os parâmetros

estabelecidos na lei com uma aplicação justa, de acordo com o caso concreto.

Para não correr risco, o legitimado ativo da ação de improbidade, antevendo a

possibilidade de o infrator dilapidar o patrimônio e a multa civil aplicada ser inócua,

deve ingressar com as medidas cautelares visando garantir a futura execução.

7.4 PROIBIÇÃO DE CONTRATAR E DE RECEBER BENEFÍCIOS OU INCENTIVOS

Trata-se de uma penalidade pecuniária às avessas, pois impede que o

ímprobo obtenha lucro, laborando em favor do poder público ou recebendo destes

benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios (v.g. isenção, redução de alíquota).

Além do caráter punitivo, o ímprobo está impedido de contratar com a

administração pública, direta e indireta, de qualquer esfera (federal, estadual e

municipal) justamente porque não possui atributos morais para fazê-lo. Afinal já

demonstrou não possuir retidão no trato da coisa pública e não há porque a

administração correr o risco da situação se repetir. Tem o administrador o dever de

investigar a idoneidade da pessoa que está contratando e desabilitá-la caso recaia

sobre ela máculas morais.

Garcia e Alves94, assim se reportam sobre o assunto: A aplicação dessa sanção resulta da incompatibilidade verificada entre a conduta do ímprobo e o vínculo a ser mantido com a administração pública, o que torna desinfluente qualquer especificidade em relação a esta, já que a sanção circunda a esfera subjetiva do ímprobo, a qual não é delimitada pelo ente que tenha sido lesado pelo ato de improbidade, tornando-se extensiva a todos os demais.

O Conselho Nacional de Justiça com a edição da Resolução nº 44, de 20 de

novembro de 2007, criou o Cadastro Nacional de Condenados por Ato de

105 94 GARCIA, E.; ALVES, R.P. Improbidade administrativa. 4ª ed. Lumen Juris, Rio de Janeiro: 2008, p. 472.

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Improbidade Administrativa – CNCIA, permitindo assim que todas as pessoas de

direito público do país, tenham conhecimento das pessoas que foram condenadas,

qual(is) a(s) pena(s) aplicada(s) e em que Juízo.

O ímprobo está proibido de realizar qualquer tipo de contrato com a

administração pública, sejam unilaterais ou bilaterais, onerosos ou gratuitos. Esta

sanção, também atinge as três espécies de atos de improbidade e o tempo de sua

duração é de 10 (dez) anos para os casos de enriquecimento ilícito, 05 (cinco) anos

de lesão ao erário e 03 (três) anos por violação ou afronta aos princípios da

administração pública.

O cotejo dos incisos dos artigos 9º, 10 e 11, da Lei de Improbidade

demonstra, outra vez, a impropriedade técnica utilizada pelo legislador na imposição

em bloco das penas. É que condutas notadamente menos gravosas do que outras

são igualmente punidas.

A solução está na possibilidade do julgador aplicar uma ou mais de uma

pena, conforme a gravidade do ato, a lesão causada, o enriquecimento obtido, o

grau de reprovação da conduta e o elemento subjetivo que a moveu.

Por um tempo, após a publicação da Lei de Improbidade Administrativa houve

uma celeuma acerca do fato de se saber se as sanções previstas nos incisos I a III,

do art. 12 da Lei de Improbidade Administrativa, deveriam ser aplicadas em

conjunto, ou se o julgador poderia aplicar uma, algumas ou todas elas, dependendo

do caso.

Referida dúvida surgiu porque existem patamares indicando a pena mínima e

máxima para as sanções, de modo que alguns defendiam a tese de que as penas

deveriam ser aplicadas em bloco, sendo que ao julgador caberia, sopesando as

circunstâncias, a gravidade e o elemento anímico que moveu o ato, impor as penas

dentro daqueles limites.

A discussão foi dissipada e atualmente é pacífico o entendimento de que as

sanções podem ser impostas individualmente. Tal entendimento se coaduna com o

princípio da razoabilidade e da proporcionalidade.

Figueiredo95 ao tratar do assunto pondera: “De fato, é de se afastar a

possibilidade da aplicação conjunta das penas em bloco, obrigatoriamente. É dizer,

105 95 FIGUEIREDO, M. Improbidade administrativa. Comentários à Lei 8.429/92 e Legislação Complementar, 5ª ed., São Paulo: Malheiros, 2004, p. 136.

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há margem de manobra para o juiz, de acordo com o caso concreto, aplicar as

penas, dentre as cominadas, isolada ou cumulativamente”.

Na mesma direção e com referência a observância dos princípios da

proporcionalidade e da razoabilidade é o julgamento de Antônio José de Mattos Neto

(RDTP 20/64). Leciona o autor:

Diga-se, logo, que tais sanções, bem assim as demais deste inciso e as outras previstas nos demais incisos para outras classes de atos de improbidade, podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, pelo juiz. O juízo de convicção do julgador sereno, imbuído do espírito de razoabilidade e proporcionalidade de inflição da pena à conduta ilícita, discricionariamente determinará a penalidade ou penalidades aplicáveis ao caso. E tanto assim deve ser que o parágrafo único do art. 12 prevê que, para eleição da pena e sua dosimetria, o juiz deve levar em contar a extensão do dano e o proveito patrimonial logrado pelo agente. O caso concreto vai determinar qual pena ou quais penas serão aplicadas, bem como sua quantidade, cuja inflição dependerá do fato, da conduta do agente, do grau de culpa, de seu passado funcional, da análise do dano e sua extensão etc.

A solução acima, aplicação isolada ou conjugada ou ainda cumulada das

penas é a mais acertada, vez que coerente e justa. Amenizando a falta de técnica do

legislador, o magistrado deve, dentre as penas mencionadas para cada ato de

improbidade, analisar de maneira acurada o caso concreto e escolher entre elas

qual ou quais e em que quantidade deve(m) ser aplicada(s) para surtir o efeito de

prevenção geral e especial.

Os tribunais têm acatado a segunda corrente:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/1992. APLICAÇÃO DAS PENALIDADES. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. 1.Cuida-se de Ação Civil Pública de responsabilidade por ato de improbidade administrativa contra Prefeito do Município de TeodoroSampaio/SP e outros, pela contratação, com fraude no processo de licitação e favorecimento, para locação de um caminhão, coilegalidade e lesividade para o Erário. 2. A sentença, julgando parcialmente procedente a demanda do Ministério Público do Estado de São Paulo, condenou os réus ao ressarcimento do dano, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos, proibição de contratar com o Poder Público e multa civil. 3. O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por sua vez, deu parcial provimento à apelação para reformar a sentença e manter apenas a multa civil, com a seguinte fundamentação: "Contudo, as sanções foram fixadas

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com excessivo rigor, considerando-se o caso dos autos em que não houve apropriação de dinheiro público, inexistindo, outrossim, evidência de que o preço pago superou o do mercado. De outra parte, restituir a quantia aos cofres públicos importaria em enriquecimento sem causa do município, tendo-se em conta que os serviços foram prestados". 4. A jurisprudência do STJ é no sentido de que a aplicação das penalidades previstas no art. 12 da Lei 8.429/1992 exige que o magistrado considere, no caso concreto, "a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente" (conforme previsão expressa contida no parágrafo único do referido artigo). Assim, é preciso analisar a razoabilidade e a proporcionalidade em relação à gravidade do ato ímprobo e à cominação das penalidades, as quais podem ocorrer de maneira cumulativa ou não. 5. Hipótese em que o Tribunal de origem, com base neste conjunto fático-probatório bem delimitado, minimizou as sanções aplicadas na sentença, alegando ser desnecessária a cumulação de todas as penas nos termos do art. 12, III, da Lei 8.429/1992. As penalidades ficaram assim dispostas: "é de permanecer tão-só a multa civil, cancelando-se todas as demais sanções." 6. Não há falar em violação à Lei 8.429/1992, por estar o acórdão recorrido em conformidade com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. 7. Agravo Regimental não provido. (AgRg no REsp 1242939 / SP STJ - Segunda Turma - Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN – DJ. 24.05.2011 – DP 30.05.2011).

Somente no caso concreto, observando o grau de reprovabilidade da conduta,

o dano causado, o enriquecimento obtido, as circunstâncias em que se deu o ato e,

principalmente, o elemento subjetivo que moveu a conduta do infrator, entre outras,

é que poderá o julgador, aproximar-se da aplicação da pena justa.

Trata-se de um entendimento analógico com o da dosimetria da pena no

direito penal, onde para se obter a sanção base são consideradas a circunstâncias

judiciais, entre as quais a culpabilidade (grau de reprovabilidade da conduta), os

antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente e os motivos, as

circunstâncias e as consequências do crime.96

Registre-se que no Direito Penal o elemento subjetivo é tão importante que os

patamares da pena já vêm reduzidos no próprio tipo (v.g. homicídio doloso simples e

homicídio culposo)97.

105 96 Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime: 97 Art 121. Matar alguém: Pena - reclusão, de seis a vinte anos. [...] § 3º Se o homicídio é culposo: Pena - detenção, de um a três anos.

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Não se pode admitir, por exemplo, como idênticas, condutas que causam

lesão ao erário, uma cometida por um Governador do Estado que tem ampla

assessoria e nível educacional elevado e a outra de autoria de um Prefeito do

interior do mesmo Estado sem qualquer conhecimento jurídico, ainda mais, quando

aquele age com dolo e este com culpa.

É óbvio que a conduta do primeiro, por ser extremamente mais grave,

reprovável e cometida intencionalmente, deve ser punida com penas mais severas e

em maior quantidade do que o segundo.

Em um país de dimensões e diversidades culturais como o Brasil, onde ainda

persiste mandos e desmandos políticos, tratar agentes públicos/políticos igualmente

é afrontar flagrante e dolosamente o princípio constitucional da isonomia.

Não existe quem, em sã consciência, ache justa punição idêntica, ou muito

próxima, aquele que agiu com a consciência e a vontade de praticar ato de

improbidade administrativa causador de dano ao erário, a daquele que não quis

lesionar o patrimônio público, mas acabou lesionando, ao laborar com imprudência,

negligência ou imperícia.

Francisco Octávio de Almeida Prado98 menciona: “A dosagem da pena,

ademais, deverá levar em conta a intensidade do elemento subjetivo do agente,

revelador do caráter mais ou menos ímprobo de sua conduta”.

Apropriado considerar-se aqui o princípio da proporcionalidade e da

razoabilidade.

Conforme leciona Figueiredo99:

Deve o Judiciário, chamado a aplicar a lei, analisar amplamente a conduta do agente público em face da lei e verificar qual das penas é mais “adequada” em face do caso concreto. Não se trata de escolha arbitrária, porém legal. Assim parece demasia e arbítrio aplicar-se a pena da perda da função pública ao servidor que culposamente dispensar indevidamente dada licitação (art. 10, VIII, última parte, da Lei).Fere a lógica jurídica e a razoabilidade punir-se com perda de cargo, suspensão de direitos de 05 a 10 anos, servidor que, mediante conduta culposa (v.g. erro material involuntário comprovado) conclui indevido o processo licitatório.[...]

105 98 PRADO, F.O.de A. Improbidade administrativa. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 155. 99 FIGUEIREDO, M. Improbidade administrativa. Comentários à Lei 8.429/92 e Legislação Complementar, 5ª ed., São Paulo: Malheiros, 2004, p. 137.

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A rigorosidade das sanções dos agentes por ato de improbidade

administrativa são justificáveis e proporcionais à gravidade da conduta dolosa por

eles praticadas. Natural que aquele que se vale da função, seja qual for o vínculo

(estatutário ou celetista), por designação, nomeação ou mandato, para locupletar-se

a custa do direito do povo, causar prejuízos ao erário ou agir em desconformidade

com os princípios regentes da atividade administrativa, sejam seriamente punidos.

Há casos, inclusive, que pela sua significância, merecem a imposição das penas

previstas na lei, em bloco.

Todavia, não se pode deixar de destacar que a referida rigorosidade quando

vista sob o ângulo da punição do agente a titulo de culpa, traz consequências

desastrosas, notadamente no que diz respeito à qualidade das pessoas que se

dispõem a concorrer a cargos públicos eletivos, bem assim ao engessamento da

máquina administrativa em razão do receio dos administradores probos (os

ímprobos, pouco se preocupam) em cometer equívocos ao gerirem-na e, em

conseqüência, serem punidos.

No tocante a primeira consequência é pacífico que muitas pessoas de

conduta social ilibada, de qualidade moral e profissional indiscutível, benquistas no

grupo social onde vivem respondem de forma negativa e com veemência quando

são perquiridas acerca da possibilidade de se candidatarem a uma vaga para os

cargos públicos eletivos. É verdade que tal negação tem ligação direta com o

descrédito da classe política nacional e com o risco de concorrer de forma legal e

honesta às eleições, sem se sujeitar ou sucumbir aos vícios da população que,

ainda hoje, permutam o seu voto (único momento em que todos, ricos e pobres,

pretos e brancos, católicos ou evangélicos, idosos ou jovens, são iguais) em troca

de cestas básicas, armações de óculos ou próteses dentárias.

Todavia sabe-se que muitos deles, embora reúnam todas as virtudes de um

bom administrador e até desejem dar a sua contribuição à sociedade, preocupam-se

em ter seus nomes, patrimônio de valor inestimável, obtido ao longo dos anos,

incluídos no rol dos desonestos, por terem praticado atos imprudentes, negligentes

ou resultantes de imperícia, na administração pública.

Como todos os seres humanos estão sujeitos a cometerem atos culposos

(v.g. acidentes de trânsito) os bem intencionados, preferem não correrem o risco de

serem considerados ímprobos, a terem o poder e gerirem a coisa pública. Com isso

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afastam a idéia de serem vereadores ou prefeitos, e sequer cogitam degraus mais

altos nas esferas estadual e federal. Em consequência disso, poucas pessoas

probas se encorajam e se arriscam, e a maioria das vagas fica aberta e são

disputadas e preenchidas por pessoas despreocupadas, despreparadas, não

qualificadas e é nas mãos destas que acaba ficando a condução da res pública.

Das pessoas honestas e preocupadas que tem êxito no pleito, muitas acabam

deixando de realizar atos necessários, tanto do ponto de vista administrativo como

social, ou os realizam de maneira extremamente burocrática e vagarosa, pois têm o

receio de errar. O temor de serem punidos causa uma espécie de paralisia nos

administradores que nada ou muito pouco fazem durante o tempo do mandato. Há

um engessamento da máquina administrativa. Os atos não são realizados ou o são

tardiamente, porque o administrador desconfia de tudo e exige o que não é

necessário, com o fito de acautelar-se.

Ferraz100 ressalta a importância da aplicação dos princípios da

proporcionalidade e da razoabilidade para evitar a paralisação da atividade estatal.

Diz o autor:

Indubitável que também aqui, em face da amplitude das tipificações infracionais e da severidade das apenações, à doutrina está reservado excelso papel de, usando os metros da proporcionalidade e da razoabilidade, evitar uma visão de criminalização de condutas que até iniba e paralise a atividade administrativa.

Registre-se que tais situações não podem perdurar. As pessoas honestas e

interessadas em gerir a coisa pública devem sim concorrer aos cargos eletivos e,

eleitas, devem agir, mostrar serviço, realizar obras e serviços sociais, jamais

deixando de fazê-los por temor e falta de confiança nas instituições. Devem

ingressar no cargo, cônscios de que não serão punidos, exceto se agirem com má-

fé, dolo ou no máximo culpa grave. Devem acreditar que as instituições, o Ministério

Público e o Poder Judiciário sabem distinguir o honesto do desonesto, o mau caráter

do inábil, o aproveitador do despreparado.

105 100 FERRAZ, S. Improbidade administrativa questões polêmicas e atuais. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 366/367.

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Similar ao que acontece com os médicos que não se furtam de dar os

diagnósticos aos seus pacientes e só são punidos caso laborem em erro crasso ou

dolo, devem os administradores públicos agirem. Se o fizerem e ficar evidenciado

que a ação foi voluntária visando um resultado favorável ao bem comum que acabou

não se realizando, não podem receber punição, já que equívocos fazem parte da

essência humana. Se agirem com má-fé, com a vontade e a consciência deliberada

de se afastar colocando em segundo plano, ou prejudicar o interesse comum, seja

através do enriquecimento ilícito, seja lesionando o patrimônio público – bem de

todos, ou atentando contra os princípios regentes da administração, merece sanções

severas, já que violaram a probidade administrativa, qualidade primordial que se

espera de quem lida com a res pública.

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8 AS ESPÉCIES DE ATOS DE IMPROBIDADE E SEUS ELEMENTOS UBJETIVOS

A Lei n. 8429/92 prevê nos artigos 9º, 10 e 11, os atos considerados de

improbidade administrativa.

O caput dos referidos artigos dispõem, in verbis:

Art. 9° Constitui ato de improbidade administrativa importando enriquecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1° desta lei, e notadamente: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:

Nos incisos dos artigos supracitados foram enumeradas, em rol apenas

exemplificativo (numerus apertus), as condutas que importam em enriquecimento

ilícito, causam lesão ao erário e atentam contra os princípios da administração

pública.

Apenas no art. 10, o legislador constou expressamente que os atos de

improbidade que causam danos ao erário, podem ser praticados também na

modalidade culposa.

Utilizou-se o criador da lei, ao que tudo indica, da regra estabelecida no

parágrafo único do art. 18, do Código Penal que prevê que “salvo os casos

expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão

quando o pratica dolosamente”, ou seja, que uma conduta culposa só poderá ser

punida como crime se esta modalidade estiver expressa na lei. Nos casos em que o

texto é silente, punem-se apenas as condutas dolosas.

Os doutrinadores que escreveram sob o tema, em sua maioria, concordam

que os atos de improbidade administrativa, previstos nos art. 9º e 11, são punidos

apenas quando cometidos com dolo.

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Referindo-se aos tipos de atos improbidade previstos no artigo 9º da Lei de

Improbidade Administrativa, dizem os autores que não se concebe que o

enriquecimento ilícito resulte de imprudência ou negligência.

Costa101 leciona:

O elemento subjetivo dessa figura delitual genérica é o dolo do agente público, ou, pelo menos, a sua voluntariedade. Não vemos chances para que tal infração disciplinas comporte a modalidade culposa, pois não é credível, nem verossímil, que possa alguém ser corrupto ou desonesto por negligência, imperícia ou imprudência.

No mesmo sentido é o entendimento exposto por Pazzaglini Filho, Rosa e

Fazzio Junior102:

Ponto que merece atenção diz respeito ao elemento subjetivo necessário à caracterização das condutas elencadas naqueles dispositivos. Nenhuma das modalidades admite a forma culposa: todas são dolosas. É que todas as espécies de atuação suscetíveis de gerar enriquecimento ilícito pressupõem a consciência da antijuridicidade do resultado pretendido. Nenhum agente desconhece a proibição de se enriquecer às expensas do exercício de atividade pública ou de permitir que, por ilegalidade de sua conduta, outro o faça. Não há, pois, enriquecimento ilícito imprudente ou negligente. De culpa é que não se trata.

Para Osório103, “os dispositivos do art. 9º exigem condutas dolosas em razão

da própria forma das redações formuladas pelo legislador”.

Fazzio Junior104 em outra obra explica:

O art. 9º nada diz a respeito. Não cogita o elemento anímico do agente. Realmente, não precisa fazê-lo, porque nenhum de seus incisos admite a forma culposa; são todos crimes dolosos. Qualquer atuação suscetível de

105 101 COSTA, J.A.da. Contorno jurídico da improbidade administrativa. Brasília: Brasília Jurídica, 2000, p. 69. 102 PAZZAGLINI FILHO, ROSA e FAZZIO JUNIOR. Improbidade administrativa: Aspectos jurídicos da defesa do patrimônio público. São Paulo: Atlas, 1996, p. 63. 103 OZÓRIO, F.M. Teoria da improbidade administrativa. Má gestão pública – corrupção – ineficiência. São Paulo: RT. 2007, p. 256. 104 FAZZIO JUNIOR, W. Improbidade administrativa e crimes de prefeito. De acordo com a Lei de Responsabilidade Fiscal, São Paulo: 2001, p. 72.

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gerar enriquecimento ilícito pressupõe a consciência da antijuridicidade do resultado pretendido. A própria conduta já exala o dolo.

Dissertando sobre o art. 11, o mesmo autor105 comenta:

Má-fé expressa dolo. Ingressando no art. 11 da LIA, é bom registrar, desde logo, que as práticas enumeradas em seus incisos (o elenco é exemplificativo) são presumidamente dolosas; pressupõem a consciência da ilicitude de conduta e o ânimo de realizar o resultado proibido. Se não houver dolo, não há ato administrativo que atenta contra os princípios constitucionais da Administração. Quando cogita da espécie culpa em sentido estrito, o legislador faz menção expressa de sua admissibilidade. É o que ocorre no texto do art. 10, caput, mas não aqui. Não há, pois, violação culposa dos princípios elencados no art. 11. Ninguém é desonesto ou parcial por negligência. “Ou o prefeito labora movido pelo dolo (e pratica ato de improbidade) ou não se realiza a figura do art. 11."

Os atos que atentem contra os princípios da administração pública só serão

considerados atos de improbidade administrativa, quando o elemento subjetivo for o

dolo ou a má-fé do agente público MATTOS106.

Expressa o autor:

O tipo, caracterizador do elemento subjetivo da violação dos princípios da boa administração, a que alude o caput do art. 37 da CF, é aquele em que se verifica o dolo através da inequívoca vontade do agente público em descumprir uma obrigação legal.

O Des. Abraharm Lincoln Calixto, do Tribunal de Justiça do Estado do

Paraná, ao fazer considerações a respeito do ato de improbidade administrativa

asseverou que “não se pode afirmar que qualquer ação que viole os princípios da

administração resultará na punição do agente como enquadrável nas hipóteses

relacionadas no artigo 11 e seus incisos.”107

105 105 Op cit, p. 179. 106 MATTOS, M.R.G.de. O limite da improbidade administrativa. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2005, p. 93. 107 Breves Considerações a Respeito do Ato de Improbidade Administrativa, com Subsunção no Artigo 11 da Lei n. 8.429/92 - Revista Judiciária do Paraná, ano 06 – num. 02 Curitiba-PR: 2011

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Indubitavelmente não se vê como alguém pode enriquecer-se ou aumentar

indevidamente o patrimônio de outrem, sem o desejo de fazê-lo. A atuação do

agente que recebe propina ou utiliza um bem público em proveito particular é movida

pela vontade e a consciência de fazê-lo. Não se vislumbra situação em que alguém

por negligência ou imprudência, consiga elevar a quantidade de seus bens.

Ademais, o próprio termo “indevidamente” sugere que o modo de agir tem que ser

doloso.

No mesmo rumo não se pode conceber que alguém sofra as graves sanções

estabelecidas no inciso III do art. 12 da Lei de Improbidade Administrativa, por ter

atentado contra os princípios regentes da atividade administrativa por culpa. O

elemento anímico exigido nas condutas arroladas no art.11 é o dolo, ou seja, a

intenção voltada ao interesse de violar os princípios da legalidade, moralidade,

impessoalidade, publicidade e eficiência, tendo o agente a representação desta

violação e dos próprios princípios.

A jurisprudência pátria também reflete a exigência do dolo como elemento

subjetivo das condutas exemplificativamente previstas nos incisos 9º e 11, da Lei nº

8.429/92.

A propósito:

No caso do art. 10 – atos de improbidade administrativa que causem dano

ao erário público - inexiste unanimidade quanto ao elemento subjetivo que deve

movimentar a conduta do agente. Embora a maioria da doutrina e da jurisprudência,

embasadas no fato do legislador ter expressamente previsto a possibilidade de a

conduta ser considerada ato de improbidade quando cometida também com culpa,

já vem começando a ganhar terreno o entendimento que restringe a caracterização

do ato ímprobo somente aquele que cause danos ao erário intencionalmente,

dolosamente.

Entre as correntes que se debruçaram sobre a celeuma da configuração ou

não do ato de improbidade administrativa na modalidade culposa, prevista no art. 10

da Lei n. 8.429/92, podemos destacar quatro, a saber: a) defende a

constitucionalidade da modalidade culposa; b) defende a constitucionalidade com

ressalvas; c) defende a inconstitucionalidade da modalidade culposa e d) defende a

imprecisão legislativa do legislador que constou equivocadamente o termo “culpa” no

art.10, da lei.

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Os defensores da primeira corrente entendem que o artigo 37, §4º, da

Constituição Federal não exigiu que as condutas ímprobas tivessem como elemento

subjetivo o dolo, deixando ao alvedrio do legislador escolher qual o elemento que

animaria o modo de agir do agente. No caso, o legislador ordinário entendeu que os

comportamentos que causassem enriquecimento ilícito e os que atentassem contra

os princípios da legalidade, publicidade, impessoalidade, moralidade e eficiência só

deveriam ser tidos como atos de improbidade e, consequentemente punidos,

quando cometidos com dolo e os atos que causassem dano ao erário, deveriam ser

considerados atos de improbidade administrativa, tanto quando cometidos por dolo,

quanto por culpa. Ou seja, dolo para as condutas previstas nos arts. 9º e 11 e dolo e

culpa para os comportamentos insertos exemplificativamente nos treze incisos do

art. 10, todos da Lei de Improbidade Administrativa.

Entre os defensores desta corrente estão José dos Santos Carvalho Filho,

Alexandre de Moraes, Emerson Garcia, Rogério Pacheco Alves e Waldo Fazzio

Junior:

Fazzio Junior108 assevera que “a conduta que caracteriza a improbidade

administrativa lesiva ao erário, Expressa no art. 10 da LIA, pode ser qualquer ação

ou omissão dolosa bem como qualquer ação ou omissão culposa.”

Sendo certo que a responsabilidade objetiva exige que haja norma expressa

a prevendo, constata-se que a tipologia inserida no art.10 da Lei n. 8.429/92 admite

a modalidade dolosa e culposa (GARCIA e PACHECO, p. 267/268).

A utilização expressa do termo “culpa” no art. 10, da multicitada lei,

demonstra o interesse do legislador de que os atos lesivos ao patrimônio público

fossem punidos também quando o agente agisse com imprudência, imperícia ou

negligência. Valeu-se analogicamente da previsão contida no parágrafo único do

artigo 18, do diploma penal repressivo.

O constitucionalista Moraes109, também integrante desta corrente, assim se

pronunciou sobre o tema:

105 108 FAZZIO JUNIOR, W. Improbidade administrativa e crimes de prefeito. De acordo com a Lei de Responsabilidade Fiscal, São Paulo: 2001, p. 115.. 109 MORAES, A. Direito constitucional. São Paulo: Atlas, 2000, p. 2759.

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Para a tipificação de um ato de improbidade descrito no art. 10 não se exige a existência da vontade livre e consciente do agente em realizar qualquer das condutas dele descritas, responsabilizando-se também o agente cuja conduta, por imprudência, negligência ou imperícia, adéqüe-se àquelas previstas no art. 10. Portanto, somente nos atos de improbidade administrativa previstos no art. 10 da Lei nº. 8429/92 – caracterizados pela existência de lesão ao erário público – permite-se tanto a conduta dolosa quanto a culposa.110

Pedro Roberto Decomain, também advoga no sentido de que o agente

público descuidado, desinteressado, despreocupado com a coisa pública pode

causar um ato de improbidade. Para este autor111 “Esse pouco caso pela coisa

pública insere-se também no terreno da desonestidade.”

Para Hugo Nigro Mazzilli112: “O administrador negligente é desonesto,

violando os princípios da eficiência e da lealdade”

Portanto, os adeptos desta corrente o ato de improbidade previsto nos incisos

do art.10, da Lei n. 8.429/92, podem ser praticados tanto na modalidade dolosa

como culposa.

A segunda corrente também considera constitucional a modalidade culposa

dos atos de improbidade do art. 10, porém com temperamentos. Seus defensores

exigem para a configuração do ato de improbidade que a culpa seja grave. Excluem,

portanto, do conceito de atos ímprobos aqueles previstos no art. 10, cometidos com

culpa leve e levíssima.

Desta forma, os atos de improbidade administrativa do art. 10 da Lei n.

8.429/92, podem ser causados tanto por dolo, quanto por culpa grave.

A terceira corrente defende a inconstitucionalidade da modalidade culposa de

improbidade administrativa e o faz dizendo que a exegese do art. 10 deve ser feita

conformidade com o art. 37, §4º, da Constituição Federal de 1988 que prevê:

Art. 37. A administração pública direta ou indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também o seguinte:

105 110 Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. São Paulo: Atlas, 2007 111 DECOMAIN, P.R. Improbidade administrativa. São Paulo: Dialética, 2007, p.109. 112 MAZZILLI, H. N. A defesa dos interesses difusos em juízo. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2001.

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[...] §4º - Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação prevista em lei.

Os partidários desta corrente consideram que o conceito de Improbidade

administrativa está implícito no art. 37, p. 4º e que para a configuração do ato como

ímprobo, faz-se necessária uma ofensa à moralidade administrativa, que resulte em

enriquecimento ilícito para si ou outrem ou que cause dano ao erário. A simples

violação a ordem jurídica ou legalidade, por si só, não qualificaria o ato como

ímprobo.

Esses doutrinadores, entre os quais podemos citar Benedicto Pereira Porto

Neto, Pedro Paulo de Rezende Porto Filho, Mauro Roberto Gomes de Mattos e

Marcelo Figueiredo lecionam que os atos de improbidade administrativa só podem

ser causados por dolo, jamais por culpa. Para eles o agente público deve agir com a

vontade e a consciência de praticar o ato de improbidade. Ele deve ter a

representação acerca dos elementos do ato e a vontade de conduzir sua ação ou

abster-se de fazer, com a intenção de chegar aquele resultado previsto no verbo

núcleo do tipo.

Benedicto Pereira Porto Neto e Pedro Paulo de Rezende Porto Filho113

concluem que:

A Constituição Federal (bem como a legislação infraconstitucional) exige como elemento do tipo improbidade administrativa a intenção de praticar a ilegalidade. Elemento subjetivo é, portanto, requisito inafastável para tipificação a conduta punível na forma da Lei 8.429, de 1992. (...)Um exemplo mais radical: também seria ato de improbidade, na visão estreita contestada, o ato de servidor que, desrespeitando normas de trânsito com outro veículo, causando danos ao erário; a simples inobservância das normas de trânsito, aliás, já representaria ilegalidade, e, por tanto, ato de improbidade. Interpretação dessa ordem levaria a uma conclusão absurda: o administrador público que se utilizasse de sua competência para invalidar seu próprio ato estaria confessando sua conduta ímproba e, via de conseqüência, expondo-se às pesadas sanções constitucionais e legais. (...). Em resumo, a vontade do agente, o fim por ele almejado, é fundamental para a caracterização do ato de improbidade.

105 113 PORTO FILHO, P. P. de R. Improbidade administrativa: Requisitos para tipicidade, interesse público, n. 11, 2001.

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Aristides Junqueira Alvarenga114, também adepto desta corrente, comenta:

[...] inimaginável que alguém possa ser desonesto por mera culpa, em sentido estrito, já que ao senso de desonestidade estão jungidas as idéias de má-fé, de deslealdade, a denotar presente o dolo [...]. Estando excluída do conceito constitucional de improbidade administrativa a forma meramente culposa de conduta dos agentes públicos, a conclusão inarredável é a de que a expressão “culposa”, inserta no caput do art. 10 da lei em foco, é inconstitucional.

Defendem alguns autores que a modalidade culposa prevista no art. 10, da

lei de improbidade, é inconstitucional porque exige também o dolo específico, ou

seja, o objetivo do agente de “causar prejuízo ao erário público”.

Enquanto o dolo genérico exige o conhecimento dos elementos que

integram a descrição abstrata contida no tipo e a vontade de praticar o fato que a ele

se amolda, o que também ocorre quando o agente assume o risco pela verificação

do fato típico (dolo eventual), o dolo específico é a vontade de praticar o fato e

produzir um fim especial.

Além disso, os defensores da inconstitucionalidade do ato administrativo na

modalidade culposa se valem do argumento da boa-fé, pois quem age com esta

intenção não pode sofrer punição, ainda mais da magnitude e gravidade das

previstas no art. 12, II, da Lei de Improbidade.

Mauro Roberto Gomes de Mattos explica que não pode o legislador

considerar semelhantes as condutas praticadas com boa-fé ou falta de intenção de

lesar o ente público, com aquelas situações praticadas pelo agente público devasso,

que age com nítido escopo de fraudar o erário” (MATTOS115).

As sanções previstas no inciso II, do artigo 12, são extremamente pesadas se

considerarmos que sua imposição recairá sobre um agente que agiu culposamente.

Não bastasse isso, colocar no mesmo dispositivo, sanções idênticas para

condutas praticadas tanto por dolo, como por culpa, além de ferir a boa técnica,

afronta flagrantemente o princípio da igualdade. Trata-se de elementos subjetivos

completamente diferentes. É óbvio que quem age dolosamente deve ser punido com

105 114ALVARENGA, J.A Improbidade administrativa questões polêmicas e atuais, São Paulo: Malheiros, 2001, p.89. 115 MATTOS, M.R.G.de. O Limite da Improbidade Administrativa. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2005 p.255/256

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mais rigor do que aquele que não desejando de maneira alguma o resultado típico,

sequer assumindo o risco de produzi-lo, acaba o produzindo por ato descuidado.

Como punir com a mesma pena, v.g. perda dos direitos políticos, o agente

honesto e o desonesto? Como reprovar igualmente o agente que agiu com a

intenção deliberada de causar prejuízo ao erário e aquele que jamais quis este

resultado, mas acabou causando-o por não prever o que poderia ter previsto. Fazer

isso é o mesmo que considerar água e vinho bebidas semelhantes. É misturar água

é óleo.

O agente que atuou com boa-fé não pode receber o mesmo tratamento

sancionador que aquele que agiu com má-fe. Se isso ocorrer a violação do princípio

da isonomia é de clareza meridiana, pois trata igualmente os desiguais.

Data venia, o legislador pecou.

Marcelo Figueiredo assevera que o legislador não teve qualquer consideração

com o princípio da razoabilidade, quando admitiu que qualquer ação culposa, que

importe em lesão ao erário, configura um ato de improbidade administrativa

Não bastasse isso, ao analisarmos o rol exemplificativo previsto no artigo 10,

da Lei de Improbidade com as sanções previstas no inciso II, do art. 12 da mesma

lei, chega-se a ilação de que estas são extremamente rigorosas, desarrazoadas e

desproporcionais se aplicadas ao agente que laborou com culpa. Esbarra a injustiça

punir com uma pena de suspensão dos direitos políticos por 05 (cinco anos) ou, pior,

com a perda da função pública (tão duramente obtida na aprovação de um concurso

público), alguém que, agindo com boa-fé, visando a obtenção de resultado ilícito,

errou.

Há, indiscutivelmente, uma desproporção entre as penas previstas no art. 12,

II, e a conduta culposa.

Cabe aqui repetir que a gravidade das sanções engessa a atividade estatal e

inibem as pessoas probas e preparadas de concorrerem a cargos eletivos ou

prestarem concurso público. Afinal, quem não erra.

É de nos perquirirmos se nós promotores de justiça proporíamos uma ação

embasada em indícios, se temêssemos que ela pudesse ser julgada improcedente e

nossa atuação considerada ímproba, porque agimos equivocadamente? O mesmo

se diga do julgador. Ele decidiria com a mesma naturalidade se tivesse o receio de

que seu eventual erro lhe custaria o cargo?

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É óbvio que quem exerce função pública deve zelar por ela, mas exigir que

não erre, ou puni-lo de forma tão severa, é exigir que as funções e cargos

público/políticos passem a ser exercidas por Deus, não por homens, estes, por

essência, falhos.

A quarta corrente proposta por Maria Sylvia Zanella Di Pietro conclui que a

referência à culpa no art. 10 da Lei de Improbidade foi objeto de uma imprecisão do

legislador e por este motivo deve ser desconsiderada.

A defensora desta corrente advoga que apenas a conduta desonesta,

desleal, sem retidão deve ser considerada e punida como improbidade.

Di Pietro116 menciona:

A quantidade de leis, decretos, medidas provisórias, regulamentos, portarias torna praticamente impossível a aplicação do velho princípio de que todos conhecem a lei. Além disso, algumas normas admitem diferentes interpretações e são aplicadas por servidores públicos estranhos à área jurídica. Por isso mesmo, a aplicação da lei de improbidade exige bom-senso, pesquisa da intenção do agente, sob pena de sobrecarregar-se inutilmente o Judiciário com questões irrelevantes. A própria severidade das sanções previstas na Constituição está a demonstrar que o objetivo foi o de punir infrações que tenham um mínimo de gravidade, por apresentarem conseqüências danosas para o patrimônio público (em sentido amplo), ou propiciarem benefícios indevidos para o agente ou para terceiros. (...) Sem um mínimo de má-fé não se pode cogitar da aplicação de penalidades tão severas como a suspensão dos direitos políticos e a perda da função pública.

A autora ainda reflete117:

Dos três dispositivos que definem os atos de improbidade, somente o artigo 10 fala em ação ou omissão, dolosa ou culposa. E a mesma idéia de que, nos atos de improbidade causadores de prejuízo ao erário, exige-se dolo ou culpa, repete-se no artigo 5º da lei. É difícil dizer se Foi intencional essa exigência de dolo ou culpa apenas com relação a esse tipo de ato de improbidade, ou se foi falha do legislador, como tantas outras presentes na lei. A probabilidade de falha é a hipótese mais provável, porque não há razão que justifique essa diversidade de tratamento.

105 116 DI PIETRO, M.S.Z. Direito administrativo. São Paulo: Atlas, 2010, p. 836. 117 DI PIETRO, M.S.Z.. Direito administrativo. São Paulo: Atlas, 2010, p. 86-87

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Por via diversa – imprecisão legislativa – Maria Sylvia defende a inexistência

de ato de improbidade administrativo causado na modalidade culposa.

Das quatro correntes a que guarda maior sintonia com o conceito de

improbidade, os objetivos visados pelo legislador e é a mais adequada ao Brasil,

diante de todas as suas peculiaridades e de seu povo é a que defende a

constitucionalidade com ressalva.

Conforme se viu anteriormente improbidade significa desonestidade, falta de

retidão, deslealdade. Considerar ato de improbidade aquele que causa dano ao

erário por culpa, contrasta com o próprio conceito de improbidade. Deveria se fosse

o caso, chamar-se “ato de culpabilidade” ou “ato culposo”, jamais ato de

improbidade.

Exatamente por ligar a essência do termo improbidade à desonestidade é que

o doutrinador Aristides Junqueira Alvarenga na obra “Improbidade Administrativa, p.

89, defende a inconstitucionalidade parcial do artigo 10, da Lei n. 8.429/92. Para ele

o dolo é inerente ao conceito de improbidade e, em conseqüência, do significado de

improbidade. Sendo assim, impossível imaginar um ato de improbidade, vale dizer,

de desonestidade, na modalidade culposa.

Expõe o autor118:

excluir o dolo do conceito de desonestidade e, consequentemente, do conceito de improbidade, tornando-se inimaginável que alguém possa ser desonesto por mera culpa, em sentido estrito, já que ao senso de desonestidade estão jungidas as idéias de má-fe, de deslealdade, a denotar presente o dolo.”

Neste sentido:

RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/92. AUSÊNCIA DE DOLO. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. 1. O ato de improbidade, na sua caracterização, como de regra, exige elemento subjetivo doloso, à luz da natureza sancionatória da Lei de Improbidade Administrativa.

105 118 ALVARENGA, A.J. Improbidade administrativa questões polêmicas e atuais, São Paulo: Malheiros, 2001, p. 88.

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2. A legitimidade do negócio jurídico e a ausência objetiva de formalização contratual, reconhecida pela instância local, conjura a improbidade. 3. É que "o objetivo da Lei de Improbidade é punir o administrador público desonesto, não o inábil. Ou, em outras palavras, para que se enquadre o agente público na Lei de Improbidade é necessário que haja o dolo, a culpa e o prejuízo ao ente público, caracterizado pela ação ou omissão do administrador público." (Mauro Roberto Gomes de Mattos, em "O Limite da Improbidade Administrativa", Edit. América Jurídica, 2ª ed. pp. 7 e 8). "A finalidade da lei de improbidade administrativa é punir o administrador desonesto" (Alexandre de Moraes, in "Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional", Atlas, 2002, p. 2.611)."De fato, a lei alcança o administrador desonesto, não o inábil, despreparado, incompetente e desastrado" (REsp 213.994-0/MG, 1ª Turma, Rel. Min. Garcia Vieira, DOU de 27.9.1999)." (REsp 758.639/PB, Rel. Min. José Delgado, 1.ª Turma, DJ 15.5.2006) 4. A Lei 8.429/92 da Ação de Improbidade Administrativa, que explicitou o cânone do art. 37, § 4º da Constituição Federal, teve como escopo impor sanções aos agentes públicos incursos em atos de improbidade nos casos em que: a) importem em enriquecimento ilícito (art.9º); b) que causem prejuízo ao erário público (art. 10); c) que atentem contra os princípios da Administração Pública (art. 11), aqui também compreendida a lesão à moralidade administrativa. 5. Recurso especial provido. (STJ - REsp 734.984/SP, Rel. Ministro José Delgado, Rel. p/ Acórdão Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 18/12/2007, DJe 16/06/2008).

A posição acima de que o próprio conceito de improbidade exige o dolo em

todos os tipos de condutas tipificadas como ímprobas (arts. 9º. 10 e 11 da LIA), é

defendida por José Antonio Lisboa Neto e Sérgio de Andréa Ferreira.

O primeiro autor ensina que “a conceituação exige necessariamente o dolo,

pois não se pode admitir desonestidade, deslealdade e corrupção por negligência,

imprudência ou imperícia”119 O segundo diz que é “evidente que os atos de

improbidade pressupõe conduta dolosa. Ninguém é desonesto culposamente, por

descuido ou imperícia. Ninguém pratica atos de corrupção, a não ser

deliberadamente.”120

Alguns julgamentos do STJ vêm encampando este entendimento.

Tudo teve início com a decisão proferida no REsp 213.994/MG, cujo relator foi

o e. Min. Garcia Vieira, da Segunda Turma do STJ DJU 27.9.1999, cuja ementa é a

seguinte:

105 119 LISBOA NETO, J.A. Improbidade administrativa. Niterói: Impetus, 2006, p.11 120 FERREIRA S. de.A. A probidade na administração pública. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2002, p 35.

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ADMINISTRATIVO - RESPONSABILIDADE DE PREFEITO - CONTRATAÇÃO DE PESSOAL SEM CONCURSO PÚBLICO - AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. Não havendo enriquecimento ilícito e nem prejuízo ao erário municipal, mas inabilidade do administrador, não cabem as punições previstas na Lei nº 8.429/92. A lei alcança o administrador desonesto, não o inábil. Recurso improvido.

Outras decisões se seguiram, todas corroborando a asseveração acima.

Em 17.11.2009, foi decidido no sentido de que a culpa não configura ato de

improbidade.

A saber:

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO EXISTENTE. (PROCESSO CIVIL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. OFENSA AO ART. 535 DO CPC. NÃO-OCORRÊNCIA. ALEGADA VIOLAÇÃO DOS PRECEITOS CONTIDOS NOS ARTS. 333, INC. I, DO CPC E ART. 9º, INCS. IV E XII, DA LEI N. 8.429/99. PRETENSA TENTATIVA DE REJULGAMENTO DA MATÉRIA JÁ ANALISADA NAS INSTÂNCIAS A QUO. INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA DESTE STJ.) 1. Não há que se falar em incidência da Súmula n. 7 desta Corte Superior quando o que se deseja unicamente é a valoração de provas cujo teor foi exaustivamente exposto no acórdão combatido, a fim de (des)caracterizar atos de improbidade. 2. Cabe, aqui, considerar que o Supremo Tribunal Federal, analisando habeas corpus, entendeu não estar caracterizado elemento anímico qualquer na ação do agente embargante (seja dolo, seja culpa). 3. Esse tipo de conclusão feita na seara penal serve de aporte para as ações em que se discute improbidade administrativa. Considerações dogmáticas e jurisprudenciais. 4. O alegado "propósito eleitoreiro" que corroboraria a improbidade jamais existiu, na medida em que o embargante sequer candidatou-se a cargo algum. 5. Tem-se, na hipótese, isto sim, uma espécie de prestação de contas do trabalho realizado na gestão de secretaria de segurança. 6. Embargos de declaração acolhidos com efeitos infringentes. (EDcl no REsp 722403/RS – STJ – 2ª Turma - Rel. Mauro Campbell Marques, DJ 17.11.2009, DP 27.11.2009

Pela importância do julgado, transcreve-se abaixo parte do voto do e. Ministro

Mauro Campebell Marques:

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Inicialmente, destaco, ainda que sob pena de exaustão, que a natureza das sanções impostas em razão de enriquecimento ilícito ou de atentado aos princípios administrativos não comportaria a punição a título de culpa. Se por negligência, imprudência ou imperícia, os administradores violam os deveres de legalidade, honestidade, imparcialidade e lealdade às instituições (que é, por exemplo, o substrato fático que autoriza a incidência do art. 11 da Lei n. 8.429/92), por mais desaconselhável que isso seja, haverá irregularidade administrativa (e não improbidade), que também é uma infração, merecendo sanção por outras esferas de controle, tais como a de responsabilização fiscal, a dos processos administrativos disciplinares, a da fiscalização dos Tribunais de Contas e os demais mecanismos de controle interno da Administração Pública, sem embargos do não menos eficiente controle exercido pelos novéis Conselhos Nacionais de Justiça e do Ministério Público. Da mesma maneira, os atos que configurem enriquecimento ilícito, na forma do art. 9º da Lei n. 8.429/92.

É nesse rumo também a lição de Porto Filho121 quando diz que:

[o] ato qualificado como ímprobo é aquele que afronta o direito de forma especial, diferençada. É necessária a vontade positiva do agente administrativo de incorrer na ilicitude; o agente deve ter o propósito de alcançar objetivo vedado pelo direito; é preciso que esteja caracterizado o móvel de alcançar objetivos contrários à moralidade.

Lisboa Neto122, mesmo entendendo que todo o ato de improbidade, entre os

quais os previstos no artigo 10, da Lei de Improbidade, têm como elemento subjetivo

o dolo, defende a adoção da técnica da interpretação conforme a Constituição de

modo a equiparar a culpa grave ao dolo, o que evitaria o reconhecimento da

inconstitucionalidade material do aludido artigo.

Além disso, o que se visa é combater a imoralidade administrativa a qual

resta evidenciada no ato praticado com vontade e consciência e, muito próximo

disso, na culpa grave. Quem age com culpa leve e levíssima não atua em

desconformidade com a moral administrativa, até porque, o autor do ato imagina e

acredita que labora corretamente.

Hely Lopes Meirelles123,aduz com maestria:

105 121 PORTO FILHO, P.P. de R. Improbidade administrativa – Requisitos para tipicidade, Interesse Público n. 11, 2001, p. 82-83. 122 LISBOA NETO, J.A.Improbidade administrativa. Niterói: Impetus, 2006, p. 12. 123 MEIRELLES, H.L. Mandado de Segurança. 26ª ed, 2003. p. 210-1

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Um agente político eventualmente incompetente, atabalhoado ou negligente não é necessariamente um corrupto ou desonesto. O ato ilegal, para ser caracterizado como ato de improbidade, há de ser doloso ou, pelo menos, de culpa gravíssima. Já começa a haver jurisprudência sólida a respeito da matéria, exigindo-se a demonstração de má-fé do agente público para que ele seja responsabilizado com base na Lei da Improbidade Administrativa, aplicando-se o princípio da razoabilidade, pois nem sempre a mera ilegalidade de um determinado ato é suficiente para caracterizar a improbidade do agente. Na feliz expressão do STJ ‘a lei alcança o administrador desonesto, não o inábil’ (REsp n. 213.994-MG, Rel. Min. Garcia Vieira, DJU 27.9.99, p. 59)

A asseveração de que apenas o ato ilegal, que causa dano ao erário,

cometido culposamente, caracteriza ato de improbidade parece contraditória. É

óbvio que o ato legal, que causa prejuízo ao erário jamais será doloso e típico e se

for culposo, consequência alguma trará. Se o ato é ilegal e o agente, sabe há dolo,

nunca culpa.

Destaque-se que os tipos de ato de improbidade administrativa são abertos,

ou seja, o legislador não descreveu por completo o comportamento tido como

ímprobo, cabendo ao exegeta complementar a norma.

Há uma similaridade da lei de improbidade com a norma penal em branco, a

qual consta a sanção a ser aplicada, mas seu conteúdo é indeterminado, ou seja,

ela não vem completa, tendo a necessidade de que o intérprete se valha de outra

norma advinda da mesma fonte legislativa – denominadas normas penais em

branco, em sentido lato, também conhecidas como impróprias ou homogêneas (no

caso em da lei de improbidade o complemento viria de uma lei ordinária ex. Código

Civil) ou proceda de outra instância legiferante – normas penais em branco, em

sentido estrito, própria, heterogêneas (v.g portaria, decreto) que a complete.

No caso do direito penal podemos citar como exemplo de norma penal em

branco heterogênea, o artigo 33, caput, da Lei n. 11.343/06, que prevê o crime de

tráfico ilícito de entorpecentes, cujo complemento está na Portaria da DIMED,

vinculada ao Ministério da Saúde, pois é nela que se encontra a definição do que é

ou não substância entorpecente.

Dispõe o referido art. 33, caput:

Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer

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drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Portanto, o intérprete desta norma só poderá considerar típica a conduta do

agente depois de subsumir a palavra “drogas” ao que estabelece a portaria antes

referida. A definição do que são consideradas drogas não está presente no tipo do

art. 33, dependendo que o exegeta se valha de outro instrumento para adequar a

conduta do agente à descrição abstrata prevista no tipo.

O mesmo se diga em relação ao ato de improbidade.

Segundo Mattos:124

A norma penal em branco é aplicada ao direito administrativo, pois o princípio da tipicidade retira a subjetividade do intérprete, em homenagem ao princípio da legalidade. Não resta dúvida de que o princípio da reserva legal (art. 5º, II, da CF) impede que a Administração Pública se utilize de uma norma incompleta para punir. É “necessária, nesses casos a integração de outra norma legal para evitar sanções injustas.”

Pois bem, como se sabe a quantidade de regulamentos, atos administrativos,

leis existentes em nosso país são infindáveis, sendo que a cada dia surgem, mais e

mais. Estes integrarão as normas penais em branco, entre as quais os tipos de atos

de improbidade administrativa e os tipos penais incriminadores.

Assim, em que pese seja imprescindível a permanência do princípio

ignorantia júris neminem excusat, previsto no art. 3º da Lei de Introdução ao Código

Civil125, no ordenamento, para garantir a segurança jurídica, não se pode olvidar,

sob pena de hipocrisia, que é impossível o conhecimento de todas as normas,

regulamentos, decretos, portarias, enfim de todo este arcabouço, principalmente em

um país cuja criatividade legislativa muitas vezes demonstra a incapacidade e o

despreparo, para não dizer, o excesso de tempo ocioso de seus autores.

105 124 MATTOS, M.R.G. de.O limite da improbidade administrativa. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2005, p.04. 125 Art. 3o. Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece.

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Fábio Medina Osório126, depois de discorrer acerca de que os regulamentos e

atos administrativos comumente complementam o núcleo dos tipos proibitivos, alerta

sobre a necessidade de se observar o respeito ao princípio da tipicidade formal e

material, não deixando ao alvedrio do administrador a tarefa de tipificar, sob pena de

restar esvaziado o princípio da legalidade.

Diante da conclusão de que a tipologia dos atos administrativos geralmente

depende de complemento de outras normas, deve o aplicador da lei ter extremo zelo

em considerar uma conduta como ímproba e, consequentemente, punir seu agente.

Não basta a mera subsunção do modo de agir com o tipo – tipicidade formal, sendo

necessário verificar outros elementos, como as condições pessoais do agente, o

meio em que vive, seu grau de escolaridade, seus atributos morais, sua

possibilidade de conhecer esta ou aquela norma complementadora, o eventual dano

causado, sua extensão e, principalmente, sua intenção. Exigir-se que um vereador

de uma pequenina cidade, proprietário de um minúsculo comércio de secos e

molhados (na linguagem popular “dono de uma venda”), conhecido e eleito, pela sua

notória idoneidade moral, adquirida aos longos dos anos, saiba, ou pior,

compreenda, o conteúdo de algumas leis, decretos, portarias, parece querer ir longe

demais. Aliás, ir longe demais, afastando-se do escopo da lei e punir este indivíduo

nas sanções da lei de improbidade administrativa porque laborou negligentemente,

causando prejuízo ao erário.

O eminente Min. Garcia Vieira ao emitir seu voto no REsp.n. 213.994-0/MG,

por comungar da opinião do colega e não menos eminente Desembargador

Monteiro, citou parte do voto por este sustentado. Disse:

[...} não obstante o próprio embargado ter reconhecido que contratou servidores sem concurso público, particularidades do caso concreto levam-me a concluir que as contratações irregulares por eles promovidas, a par de terem inobservado os princípios norteadores da Administração Pública, não têm gravidade suficiente para admitir a aplicação da pena de suspensão de direitos políticos pelo prazo de cinco anos, bem como proibi-lo de contratar com o Poder Público ou receber benefício ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que pelo prazo de três anos.

105 126 OSÓRIO, F.M.O. Teoria da improbidade administrativa: Má gestão pública, corrupção, ineficiência. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 206.

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É certo que a Lei n. 8.429/92 além de coibir o dano material advindo da prática de atos desonestos, busca também punir a brevidade à moral positivada. Destarte, é imprescindível, para a aplicação das penalidades mais severas, que a atuação do administrador destoe nítida e manifestamente das pautas morais básicas, transgredindo assim, os deveres de retidão e de lealdade ao interesse público Tais características não vislumbro nas contratações efetuadas imediatamente apósa a entradda em vigor do novel Carta Magna, por um município onde reina a pobreza, companheira da desinformação. (grifo nosso)

Então, pela diversidade de cultura, peculiaridades regionais, grau de

escolaridade e outras condições do povo brasileiro e, consequentemente, dos

administradores, funcionários e políticos, não se pode generalizar a ponto de colocar

todos na “vala comum” e puni-los igualmente por atos parecidos, mas não idênticos.

A interpretação equilibrada do caso concreto é que permitirá ao aplicador da lei de

improbidade analisar, julgar e, conforme for, aplicar a(s) sanção(ões) correta(s), ao

agente público e ao terceiro a ele vinculado pelo mesmo liame subjetivo, dentre

aquelas indicadas pela lei, tudo de acordo com os princípios da razoabilidade e a

proporcionalidade com o ato praticado.

A distorção do conceito de ato de improbidade, a fuga do propósito legal,

punir administradores desonestos, e a sua ampliação para atingir pessoas honestas

que cometeram equívocos, banalizará a Lei de Improbidade Administrativa e a

última coisa que ninguém deseja (pelos menos os honestos não querem) é o

descrédito deste forte instrumento contra a corrupção.

Outra questão que deve ser colocada a reflexão é o porquê que os atos de

improbidade administrativa que causam enriquecimento ilícito só podem ser

cometidos por dolo e atos de causam prejuízo ao erário podem ser praticados, tanto

na modalidade culposa, como dolosa? O questionamento se faz oportuno, vez que a

maioria maciça dos atos que causam enriquecimento ilícito, provoca danos ao erário

o que não justifica o tratamento diferenciado de ambos.

Diga-se ainda que a CF não conceituasse improbidade administrativa e

levando-se em conta o caráter restritivo da lei, não pode o legislador estender o

significado to termo para alcançar quem o constituinte nunca quis alcançar.

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O entendimento de que a culpa deve ser grave para configurar os atos de

improbidade do art. 10 da Lei n. 8.429/92 foi utilizada pelo Tribunal de Justiça de

Minas Gerais quando apreciou um recurso onde um prefeito municipal, imbuído de

boa fé autorizou o aumento dos vencimentos de uma servidora que estava

empenhada na construção de um hospital municipal, sem observar as regras

administrativas e orçamentárias inerentes.

O Desembargador Brandão Teixeira constou em seu voto:

Ora, o ato de improbidade administrativa pela própria articulação das expressões refere-se a condutas não apenas ilegais, pois ao ato ilegal é adicionado um plus que, no caso concreto, pode perfazer ou não um ato de improbidade. Daí que parte da doutrina bate-se pela perquirição do elemento subjetivo capaz de identificar não qualquer culpa praticada pelo agente público, mas necessariamente, um campo de culpa consciente, grave, denotando indícios de conduta dolosa. Não se trata de culpa leve, característica do agente inábil, aquela que conduz o administrador no erro interpretativo em busca do significado mais correto da aplicação da lei. ( grifo nosso)

No mesmo sentido o julgado abaixo:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. MINISTÉRIO PÚBLICO. LEGITIMIDADE. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DE LEI MUNICIPAL. IMPOSSIBILIDADE. CONTRATAÇÃO DE TRABALHADORES POR TEMPO DETERMINADO, PARA FRENTES DE TRABALHO. DESNECESSIDADE DE CONCURSO PÚBLICO. ADMISSÃO FIXADA EM LEI ORDINÁRIA DO ÓRGÃO CONTRATANTE. TESTE SELETIVO NÃO REALIZADO. ILEGALIDADE QUE NÃO CONFIGURA IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INTERPRETAÇÃO AO ARTIGO 10 DA LEI 8.429/92. IMPROCEDÊNCIA. PROVIMENTO DO RECURSO. 1. Ex vi do que dispõem os artigos 127 e 129, III, da Constituição Federal, e o artigo 1°, inciso IV, 5°, caput da Lei 7.347/85, é o Ministério Público ente legitimado a postular, através de ação civil pública, a defesa do patrimônio público, que diz respeito a interesse de toda a coletividade. 2. A sentença proferida na ação civil pública, com efeito erga omnes, não pode ensejar declaração de inconstitucionalidade de lei municipal, ainda que incidenter tantum. 3. Incompatível o concurso público para a contratação temporária e transitória de trabalhadores para frentes de trabalho, devendo a Administração, para isso, cumprir o procedimento previsto em lei própria, como prescreve o artigo 37, IX, da Constituição Federal. 4. As normas que dispõem sobre a improbidade administrativa devem ser interpretadas dentro do princípio da proporcionalidade e bom senso, amoldando-as ao espírito constitucional, para evitar situações arbitrárias.

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4.b. A ilegalidade por si só não acarreta incidência da lei de improbidade, pois, segundo Fábio Medina Osório, somente os atos que, além de ilegais, se mostrarem frutos de desonestidade ou inequívoca e intolerável incompetência do agente público, devem ser considerados configuradores de improbidade administrativa. 4.c. Em todas as espécies do artigo 10 da Lei 8.429/92, o agente realiza condutas que ensejam enriquecimento indevido.”(grifou-se – Ap. Civ. 73954-6, Acórdão nº 16589, Foz do Iguaçu, 5ª Câmara Cível, Relator Airvaldo Stela Alves, DJPR 13/3/2000) PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/92, ART. 11. EXIGÊNCIA DE CONDUTA DOLOSA. 1. A improbidade administrativa, consubstanciada nas condutas previstas no artigo 11 da Lei 8.429/92, impõe "necessária cautela na exegese das regras nele insertas, porquanto sua amplitude constitui risco para o intérprete induzindo-o a acoimar de ímprobas condutas meramente irregulares, suscetíveis de correção administrativa, posto ausente a má-fé do administrador público e preservada a moralidade administrativa." (REsp 480.387/SP, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª Turma, DJ 24.05.2004) 2. Tanto a doutrina quanto a jurisprudência do STJ associam a improbidade administrativa à noção de desonestidade, de má-fé do agente público, do que decorre que a conclusão de que somente em hipóteses excepcionais, por força de inequívoca disposição legal, é que se admite a sua configuração por ato culposo (artigo 10, da Lei 8.429/92). [...] 5. Recurso especial provido. (REsp 939.142/RJ, Rel. Min. Francisco Falcão, Rel. p/ acórdão Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 10.4.2008) grifo nosso.

Outra situação que deve ser avaliada e que foi objeto de tópico anterior são

as conseqüências que advém da improbidade culposa, pois as penas são severas,

já que servem também para os ímprobos que cometeram os atos dotados de

consciência e vontade.

Qual é a pena que deve ser aplicada a um agente que cometeu um ato de

improbidade com culpa leve e que causou irrisória lesão ao erário? Suspensão dos

direitos políticos? Multa? Ou quem sabe limitação dos direitos políticos?

A imposição de uma pena desproporcional a quem causou prejuízo ao erário

por ato culposo gera efeitos contrários aos desejados e não se harmoniza com o

interesse público que o constituinte tanto quis tutelar no art. 37, p. 4º. da

Constituição Federal.

A única maneira de sintonizar o ato culposo ímprobo com o interesse público

é admitir-se que a conduta imprudente, negligente ou imperita do agente seja grave,

em razão de uma excepcional inobservância do dever objetivo de cuidado, porque

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apenas assim ela terá a mesma censurabilidade de um ato doloso. Todo o mais é

injusto e despropositado.

Eventuais equívocos cometidos com culpa leve ou levíssima devem ser

objetos de processos administrativos/sindicância, que possam até redundar na

demissão do funcionário desastrado, mas nunca deverão ser considerados atos de

improbidade.

Neste sentido também foi o posicionamento do Ministro Mauro Campbell

quando exarou seu voto como relator do EDecl no REsp. nº 772493/RS, da segunda

Turma do STJ, datado de 17.11.2009.

Note-se: essas irregularidades não podem ser entendidas como um "diminutivo" dos atos de improbidade - ensejando tratamentos pejorativos, tais como "meras" irregularidades e elas merecem combate via controles interno e externo da Administração Pública, mas não atraem a aplicação de sanções da ordem das expressas na LIA.

Impor as penas previstas no artigo 12, II, da Lei de Improbidade Administrativa,

como a perda do cargo, suspensão dos direitos políticos, proibição de contratar com

o Poder Público, a quem praticou ato que pensava escorreito, fere frontalmente o

princípio da razoabilidade.

Marcelo Figueiredo127 registrou:

Deve o judiciário, chamado a aplicar a lei, analisar amplamente a conduta do agente público em face da lei e verificar qual das penas é mais “adequada” em face do caso concreto. Não se trata de escolha arbitrária, porém legal. Assim, parece demasia e arbítrio aplicar-se a pena de perda de função pública ao servidor que culposamente dispensar indevidamente dada licitação (art. 10, VIII, última parte da Lei). Fere a lógica jurídica e a razoabilidade punir-se com a perda de cargo, suspensão de direitos políticos de 05 a 10 anos, servidor que, mediante conduta culposa (vg. Erro material involuntário comprovado) conclui indevido o processo licitatório. Poder-se-ia cogitar de eventual ressarcimento de dano (se houver) e multa; nada mais.

105 127FIGUEIREDO, M. Probidade administrativa. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 137.

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De acordo com Sérgio Monteiro Medeiros,128 nem todas, nem qualquer lesão

aos princípios da administração é idônea para caracterizar improbidade

administrativa ou justa causa para a propositura de ação de improbidade. É que se

trata de uma ação grave que marca os envolvidos, aproximando-se do que gera a

ação penal. Assim sendo, a ação de improbidade deve sim ser manejada pelo

agente ministerial ou outro legitimado, porém com extremo zelo, responsabilidade e

prudência e desde que previamente se vislumbre que o sujeito passivo da ação agiu

com má-fé.

105 128 MEDEIROS, S.M. Lei de improbidade administrativa. São Paulo: Ed. Juarez de Oliveira, 2003, p. 101).

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CONCLUSÃO

Há muito se busca soluções visando combater a desonestidade na

administração pública, um mal que assola o mundo todo. Inúmeras normas,

constitucionais e infraconstitucionais foram editadas com o escopo de servirem de

regras e de instrumentos para inibir a prática da corrupção, entre as quais está a Lei

nº 8.429/92, denominada propositadamente de Lei de Improbidade Administrativa, já

que o termo improbidade, deriva do latim improbitate, que significa desonestidade.

Referida lei indicou nos artigos 9º. a 11, exemplificativamente, as condutas

consideradas ímprobas, por causarem enriquecimento ilícito, prejuízo ao erário e

violação aos princípios que regem a administração pública e estabeleceu as

sanções para cada uma delas nos incisos I a III, respectivamente, do artigo 12.

As sanções são graves e consistem no ressarcimento integral do dano, perda

dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, perda da função pública,

suspensão dos direitos políticos, pagamento de multa civil e proibição de contratar

com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta

ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio

majoritário.

A ação de improbidade, portanto, se tornou um relevante mecanismo de

proteção dos interesses da coletividade e punição dos gestores da coisa pública e

terceiros a eles aliados, que ajam desonestamente, sem retidão, no exercício de

suas funções e cargos.

Todavia, a utilização da ação de improbidade para questões de somenos

importância, punindo, muitas vezes, gestores honestos, mas inábeis, despreparados

e incompetentes, pode vir a banalizá-la.

Justamente para que isso não ocorra é que o estudo da ação de improbidade

e principalmente das condutas que lhe servem de base é de fundamental

importância.

Não é qualquer ato ilegal ou violação aos princípios regentes da atividade

estatal que configuram ato de improbidade. Imprescindível, para a caracterização

deste, que presente se faça o dolo, a má-fé como elemento subjetivo da conduta do

agente.

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A análise acurada e a interpretação correta e cautelosa de cada caso

concreto, harmonizadas com os princípios que norteiam a matéria e as finalidades

da CF e das demais leis atinentes, é que permitirão identificar o ato de improbidade

e distingui-lo da falha funcional, do erro cometido por culpa leve ou levíssima e

situações análogas.

A ânsia inicial pela proteção do patrimônio público e correspondente interesse

coletivo deve persistir, todavia não pode ser desassociada da finalidade legal, muito

menos ser substituída pela temeridade e irresponsabilidade que levou alguns

legitimados a ingressarem com ações de improbidade, em casos em que o ato era

desprovido de seu elemento principal, o dolo.

Muitas dessas ações foram propostas porque os legitimados foram induzidos

a erro pelo próprio legislador que elaborou a lei de improbidade, seja porque não

explicou os elementos subjetivos de cada tipo, seja porque constou apenas no seu

art. 10, a possibilidade do cometimento de ato de improbidade também na

modalidade culposa, o que levou as celeumas acerca do tema, até hoje existentes.

Em razão disso agentes públicos/políticos sofreram sérias sanções, entre as

quais perda do cargo e suspensão dos direitos políticos, pela prática de ato

formalmente ímprobo, causado por culpa leve ou levíssima.

Em vista dessa dissonância entre a finalidade da lei – punir os agentes

desonestos – e o que vinha e vem acontecendo na prática – severa punição a

pessoas honestas, porém inábeis – fizeram com que os exegetas e aplicadores da

lei, revisitassem a matéria e o que se vê é uma paulatina mudança de

entendimentos.

Os tribunais vêm prolatando decisões mais justas. O acórdão pioneiro foi o

proferido no REsp 213.994, da relatoria do e. Min.Garcia Vieira, da Segunda Turma

do STJ, publicado no DJU em 27.09.1999, no qual constou que “a lei alcança o

administrador desonesto, não o inábil.” Na sequência surgiram outros e outros, entre

os quais podemos destacar os REsp. 722.403, 734.984 e 758.639, todos exigindo o

dolo e a má-fé, para a configuração de qualquer ato de improbidade.

Muitos julgados são no sentido de que o dolo ou a culpa grave são

indispensáveis para ocorrência do ato de improbidade esteja presente o dolo ou a

culpa grave, o que é bastante razoável pela proximidade desta com aquele.

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Dos estudos realizados conclui-se que o ato de improbidade só está

configurado quando a conduta do agente advier de dolo ou culpa grave. Somente

existindo indícios de que um destes elementos subjetivos esteja presente é que

poderão os legitimados ingressar com as ações de improbidade.

A atuação neste sentido trará maior credibilidade aos legitimados, elevará o

conceito da ação de improbidade e punirá severamente aqueles que agirem

deliberadamente ou com descuido excessivo no trato da coisa pública, ou seja,

censurará os desonestos, objetivo que sempre se buscou alcançar.

Meros erros funcionais, causados ou não por culpa leve ou levíssima, não

servirão como fundamento para a ação de improbidade, devendo ser objeto de

análise nas sindicâncias e/ou processos administrativos.

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