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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” AVM FACULDADE INTEGRADA TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL Por: Ingrid Toledano Alves Couto Orientador Prof. Jean Alves Rio de Janeiro 2015 DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL

Por: Ingrid Toledano Alves Couto

Orientador

Prof. Jean Alves

Rio de Janeiro

2015

DOCUMENTO PROTEGID

O PELA

LEI D

E DIR

EITO AUTORAL

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL

Apresentação de monografia à AVM Faculdade

Integrada como requisito parcial para obtenção do

grau de especialista em Direito Privado e Civil.

Por: Ingrid Toledano Alves Couto

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AGRADECIMENTOS

Aos meus mestres e amigos.

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DEDICATÓRIA

Dedico esta monografia a minha mãe,

como agradecimento pela minha

formação.

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RESUMO

A presente monografia tem por objetivo analisar a aplicabilidade da

teoria do adimplemento substancial no Brasil, como meio a evitar a resolução

dos contratos, definindo seus contornos e fundamentos. Divide-se o tema em

três capítulos. O primeiro trata sobre adimplemento e inadimplemento das

obrigações contratuais; o segundo apresenta o conceito, os contornos gerais,

os fundamentos e a aplicação da teoria em outros países e o terceiro versa

sobre a aplicabilidade da teoria em questão no ordenamento jurídico brasileiro.

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METODOLOGIA

A metodologia consiste na exploração de textos, com profunda pesquisa

bibliográfica acerca da temática proposta, abrangendo as discussões de

doutrinadores e artigos, assim como a busca jurisprudencial.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 08

CAPÍTULO I - Adimplemento e 11

inadimplemento das obrigações contratuais CAPÍTULO II - O adimplemento 25

substancial e os seus fundamentos

CAPÍTULO III – Aplicação da teoria 57

Do inadimplemento substancial no direito brasileiro CONCLUSÃO 77

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 78

ÍNDICE 80

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INTRODUÇÃO

A vertente monografia versa sobre a teoria do adimplemento

substancial, que pouco tem sido abordada pela doutrina brasileira, uma vez

que o nosso Código Civil de 1916, bem como o atual, não a positivaram.

No entanto, há o crescente número de julgados, principalmente no

Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, utilizando a mencionada teoria para

impedir a resolução dos contratos em casos em que o inadimplemento por

parte do devedor é considerado de escassa importância, com fundamento no

princípio da boa-fé objetiva, no abuso de direito e na função social do contrato.

Destarte, para melhor compreensão acerca do objeto do presente

trabalho, merece destaque o artigo 475 do Código Civil de 2002 que dispõe, in

verbis:

Art. 475. A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir

a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o

cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos,

indenização por perdas e danos.

Nota-se que o artigo em comento não faz qualquer tipo de restrição,

dando a entender que, ante a qualquer modalidade de inadimplemento, o

credor está autorizado a dissolver o vínculo contratual. Contudo, com base nos

princípios supramencionados, ao longo dos capítulos se demonstrará que a

resolução do contrato é medida extrema e em casos de inadimplemento de

escassa importância é desproporcional e contrária à finalidade econômica do

contrato.

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Nesse desiderato, a teoria do adimplemento substancial busca,

exatamente, definir as situações em que é devido ao credor pedir a resolução

do contrato.

O tema escolhido justifica-se pela crescente jurisprudência no sentido

da aplicabilidade da teoria em comento e pela dificuldade que tem surgido nos

casos concretos em definir se o adimplemento é ou não substancial. Neste

ponto, cumpre destacar que os julgados no ordenamento jurídico brasileiro têm

sido no sentido de aplicar a teoria do adimplemento substancial em situações

restritas e apenas em abordagem quantitativa.

Destarte, verifica-se, pois, a relevância no presente estudo na medida

em que é necessária maior atenção por parte da doutrina no presente tema,

para se estabeleça parâmetros teóricos, que auxiliem o Poder Judiciário a

dizer, no caso concreto, se o adimplemento é ou não de escassa importância,

bem como para que se amplie à aplicabilidade da teoria em questão.

Isto posto, destaca-se que o presente trabalho tem como objetivo

analisar a aplicabilidade da teoria do adimplemento substancial no nosso

ordenamento jurídico, abordando para tanto o direito comparado, com as suas

respectivas discussões doutrinárias, as cláusulas gerais e os princípios que

fundamentam a teoria em foco e a jurisprudência pátria.

A presente monografia, portanto, está dividida em três capítulos. O

primeiro trata sobre as noções gerais de adimplemento e inadimplemento das

obrigações contratuais; o segundo apresenta o conceito, os contornos gerais,

os fundamentos e a aplicação da teoria em foco no direito comparado e o

terceiro versa sobre a aplicabilidade de tal teoria no ordenamento jurídico

brasileiro, abordando-se os seus requisitos, as suas hipóteses de aplicação e

os seus efeitos.

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A metodologia que deverá ser adotada para a elaboração do

vertente trabalho científico consiste na exploração de textos, com uma

aprofundada pesquisa bibliográfica acerca da temática proposta, abrangendo,

para tal, as discussões de doutrinadores, artigos e revistas jurídicas, assim

como a busca jurisprudencial.

Os autores relevantes, que se destacam neste campo de pesquisa e

que serão constantemente citados no decorrer do presente trabalho, seja pelos

seus livros de doutrina, seja por suas teses ou artigos, são: Eduardo Luiz

Bussatta, Anelise Becker, Judith Martins Costa, Celso Quintella Aleixo,

Anderson Schreiber, Teresa Negreiros e Araken de Assis.

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CAPÍTULO I

ADIMPLEMENTO E INADIMPLEMENTO DAS

OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS

1.1 - Adimplemento

Inicialmente, cumpre mencionar, que em uma visão tradicional, o

adimplemento é visto como o ato pelo qual “recebe o credor o que lhe é

devido” 1. Dessa forma, a satisfação dos interesses do credor por meio do

cumprimento da prestação principal seria suficiente para extinguir as

obrigações contratuais.

Atualmente, contudo, observa-se uma mudança no conceito de

adimplemento, que passa a ocorrer “quando se realizar o conjunto de

interesses envolvidos na relação” 2. Nesse contexto, surge um maior equilíbrio

na relação obrigacional, pautada em direitos e deveres recíprocos, dirigidos a

um escopo comum. 3

Corroborando o acima exposto, José Roberto de Castro Neves:

Cumpre, desde já, ao introduzir o tema de adimplemento, frisar que, hoje, a noção de cumprimento da obrigação é muito mais ampla do que a sua idéia clássica. Com efeito, durante muito tempo vigorou o conceito de que haveria o adimplemento perfeito se o devedor

1 CHAVES, Antonio. Tratado de Direito Civil, vol. 2, tomo 1. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1982, p.157 apud SCHREIBER, Anderson. A tríplice transformação do adimplemento: Adimplemento substancial, inadimplemento antecipado e outras figuras. Revista Trimestral de Direito Civil, vol. 32. Rio de Janeiro: Padma, out-dez/2007, p.8. 2 SILVA, Jorge Cesa Ferreira da. A Boa Fé e a Violação Positiva do Contrato. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p.69 apud COSTA, Judith Martins. Comentários ao novo Código Civil. Vol. 5, tomo 1. Rio de Janeiro: Forense,2006, p.95. 3 SCHREIBER, Anderson. Op. cit. P. 8.

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oferecesse a prestação principal ao credor. Atualmente, entretanto, entende-se que o dever do devedor não se limita à obrigação principal. Como assinala Anderson Schreiber, hoje ‘reconhece-se que a obrigação transcende, em muito, o dever consubstanciado na prestação principal’ Predomina a noção de que a obrigação resulta numa série de deveres – de ambas as partes-, num processo dialético e dinâmico entre credor e devedor, composto, claro, pela prestação principal, mas na qual também têm lugar os deveres laterais e anexos, cuja observância compõe e integra o adequado adimplemento. 4

Outrossim, ganham destaque e passam a coexistir com os deveres

primários e secundários, que são predominantemente voltados para a

satisfação do credor, os deveres anexos.

Os deveres primários residem “no cumprimento da prestação conforme

inicialmente devida” 5, são “a ‘alma’ da relação obrigacional, consistindo na

efetiva prestação desejada pelo credor (um bem da vida ou mesmo um

serviço) que assume posição dominante.” 6 .

Enquanto que os deveres secundários ou acessórios são decorrentes

da prestação em si. 7 Há uma subdivisão em tais deveres apresentada por

Mário Júlio Almeida Costa em deveres de prestação secundários meramente

acessórios da prestação principal e deveres secundários de prestação

autônoma. Judith Martins Costa explica que:

Os primeiros se destinam a preparar o cumprimento ou assegurar a sua perfeita realização, como, na compra e venda de coisa que deva ser transportada, o dever de bem embalar a coisa e transportá-la, com segurança, ao local do destino. Os segundos, por sua vez, se apresentam como um sucedâneo da obrigação principal

4 NEVES, José Roberto de Castro. Direito das Obrigações. Rio de Janeiro: GZ Editora, 2009, p. 187-188. 5 Ibidem, p. 365. 6 BUSSATTA, Luiz Eduardo. Resolução dos contratos e teoria do adimplemento substancial. São Paulo, 2007, p. 8. 7 Loc. cit.

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(como dever de indenização, que surge diante da impossibilidade de prestar o prometido) ou de maneira coexistente com o dever principal (o caso de indenização por mora, que coexiste com o dever principal) 8 .

Nota-se que os deveres anexos, laterais, instrumentais ou fiduciários

decorrem do princípio da boa fé objetiva, cláusula geral dos contratos,

presente no artigo 422 do Código Civil9 e são “todos aqueles deveres

decorrentes do fato jurígeno obrigacional cujo escopo não seja, diretamente, a

realização ou substituição da prestação” 10. Eles caracterizam-se por serem

deveres genéricos de conduta que devem ser concretizados de acordo com o

contrato e as necessidades havidas. 11

No mesmo sentido, Jorge Cesa Ferreira da Silva aponta:

(...) por eles não serem determináveis com antecipação é que, se os olharmos a partir do ponto de vista da pessoa lesada, parece que somente depois de serem infringidos é que se tornou possível apontar a conduta que seria exigível e cujo desrespeito importou no dano. Não se traduzindo em prestações antecipadamente determináveis, o credor não poderá prevenir-se, tomando providências para que o devedor não deixe de cumpri-los. E quando estiver consumado o fato da respectiva inobservância, quase sempre o credor fica apenas com a possibilidade de pedir indenização pelos danos resultantes do fato de eles não terem sido observados. 12

Nesse diapasão, ainda que os deveres em comento não sejam

passíveis de taxação, bem como, em grande parte dos casos, de determinação

antecipada, podemos com o auxílio da doutrina e da jurisprudência, destacar

os principais, quais sejam: os deveres de informação, cuidado e cooperação

contratual.

8 COSTA, Judith Martins. Comentários ao novo Código Civil. Vol. 5, tomo 1. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 46-47. 9 Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé. 10 SILVA, Jorge Cesa Ferreira da. Op. cit. p. 75 apud BUSSATTA, Luiz Eduardo. Op. cit. p. 9. 11 BUSSATTA, Luiz Eduardo. Op. cit. p. 9. 12 SILVA, Jorge Cesa Ferreira da. Op. cit. p. 90 apud BUSSATTA, Luiz Eduardo. Op. cit. p. 9.

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O dever de informação “corresponde à obrigação imposta às partes de

prestar informações mutuamente a respeito de todos os aspectos relevantes

do negócio em questão” 13. Vale transcrever o exemplo trazido pelo José

Roberto de Castro Neves para elucidar o conceito acima:

(...) uma pessoa adquire de outra ações de certa sociedade. O vendedor promove o registro de venda no livro de ações da empresa, operando a efetiva transferência daquele bem e, com isso, entregando a prestação principal (as ações). O vendedor, contudo, deixou de informar o adquirente de alguns problemas da sociedade, ou de limitações atinentes àquelas ações, que representam um estorvo ao novo titular. Embora tenha cumprido a prestação principal, o vendedor deixou de atentar a alguns deveres de informação, lesando o comprador. Possivelmente o adquirente teria celebrado o negócio, mas de certo em outras bases. Cumpriu-se a prestação principal, mas não houve atenção a importante dever acessório. (...) Era legítimo que o comprador das ações esperasse que o vendedor delas o informasse acerca das peculiaridades do bem alienado? Sim. Logo, houve uma falha do devedor, que deixou de prestar as informações. 14

Já o dever de cuidado consiste na preocupação que os parceiros

contratuais devem ter para que não causem danos morais ou patrimoniais ao

longo da execução contratual.

Nesse sentido, valioso exemplo de José Roberto de Castro Neves para

ilustrar o mencionado conceito:

Imagine-se o sujeito que vende seu carro ao seu grande amigo. Entretanto, embora desejando o melhor ao comprador, o tal sujeito, vendedor do carro, deixa de averiguar a adequada situação do freio e o comprador, logo depois de pegar o automóvel, sofre um acidente, em decorrência do mal estado do freio. Aqui houve a boa-fé subjetiva, pois o vendedor queria apenas o bem do

13 NORONHA, Fernando. Direito das obrigações. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 84 apud BUSSATTA, Luiz Eduardo. Op.cit. p. 10. 14 NEVES, José Roberto de Castro. Op. cit. p.188-189.

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comprador. Faltou, contudo, o dever de cuidado, violando-se a boa-fé objetiva, que permite transparecer a culpa do devedor. 15

No que tange ao dever de cooperação contratual, observa-se que ele

pressupõe a colaboração das partes no sentido de agir lealmente e não

impedir o efetivo cumprimento das obrigações contratuais. Nesse sentido,

julgado do Tribunal de Justiça de Minas Gerais que analisou o pedido de

danos materiais e morais e lucros cessantes em caso de quebra de contrato

por concorrência desleal, nítido caso de violação do dever anexo de

cooperação contratual:

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - CLÁUSULA RESTRITIVA DE DIREITO - NÃO OBSERVÂNCIA - QUEBRA DO CONTRATO - CONCORRÊNCIA DESLEAL - DANO MATERIAL E LUCROS CESSANTES - NÃO COMPROVAÇÃO - DANOS MORAIS - INEXISTÊNCIA. A contratante que descumpre o compromisso expresso de não exercer a mesma atividade comercial anterior, praticando concorrência desleal, responde civilmente pelos danos causados a parte inocente. Não há falar em dano material e lucros cessantes quando inexiste comprovação dos gastos. O desacordo contratual não implica obrigação de indenizar os danos morais. 16

Corroborando o acima exposto, Judith Martins-Costa enumera e

exemplifica deveres anexos, senão vejamos:

(...) a) os deveres de cuidado, previdência e segurança, como o dever do depositário de não apenas guardar a coisa, mas também de acondicionar o objeto deixado em depósito; b) os deveres de aviso e esclarecimento, como o do advogado, de aconselhar o seu cliente acerca das melhores possibilidades de cada via judicial passível de escolha para satisfação de seu desideratum, o do consultor financeiro de avisar a contraparte sobre os riscos que corre, ou o do médico, de esclarecer ao paciente sobre a relação custo/benefício do

15 Ibidem, p. 320-321. 16 TJMG apelação cível nº. 1.051805.077669-2/002

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tratamento escolhido, ou dos efeitos colaterais do medicamento indicado, ou ainda, na fase pré-contratual, o do sujeito que entra em negociações, de avisar o futuro contratante sobre os fatos que podem ter relevo na formação da declaração negocial; c) os deveres de informação, de exponencial relevância no âmbito das relações jurídicas de consumo, seja por expressa disposição legal (CDC, arts. 12, in fine, 14, 18, 20, 30 e 31, entre outros), seja em atenção ao mandamento da boa-fé objetiva; d) o dever de prestar contas, que incumbe aos gestores e mandatários, em sentido amplo; e) os deveres de colaboração e cooperação, como o de colaborar para o correto adimplemento da prestação principal, ao qual se liga, pela negativa, o de não dificultar o pagamento, por parte do devedor; f) os deveres de proteção e cuidado com a pessoa e o patrimônio da contraparte, como, v.g., o dever do proprietário de uma sala de espetáculos ou de um estabelecimento comercial de planejar arquitetonicamente o prédio, a fim de diminuir os riscos de acidente; g) os deveres de omissão e de segredo, como o dever de guardar sigilo sobre os atos ou fatos dos quais se teve conhecimento em razão do contrato ou de negociações preliminares (...). 17 (grifo nosso)

Por fim, cumpre ressaltar, que os deveres anexos podem estar

presentes em todas as fases contratuais, podendo anteceder o contrato na

fase pré-contratual ou mesmo prolongar-se findo o negócio, hipótese de

responsabilidade pós-contratual. 18

1.2 Inadimplemento É cediço que o fim desejado de qualquer relação obrigacional é o

adimplemento19, que costuma ser a regra20. Atingir tal finalidade é de suma

importância para o ordenamento jurídico, pois “a segurança social depende da

17 COSTA, Judith Martins. A boa-fé no direito privado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 439 apud MORAES, Maria Celina Bodin de. (Coord.). Princípios do Direito Civil Contemporâneo. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 246. 18 COSTA, Judith Martins. Comentários ao novo Código Civil. Vol. 5, tomo 1. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 50-51. 19 NEVES, José Roberto de Castro. Op. cit. p. 309. 20 Tese, pág 25

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certeza de que as convenções, ajustadas de acordo com a lei, serão

respeitadas.” 21, bem como o descumprimento de uma obrigação costuma

causar um injusto desequilíbrio patrimonial. 22

Quadra asseverar que a maior parte das obrigações é cumprida seja

com o adimplemento decorrente do pagamento ou por meio de outros modos

de extinção das obrigações, tais como: a compensação, a novação, a dação

em pagamento, etc. Assim, apenas uma menor parte costuma ficar

descumprida, sujeitando o devedor às cominações legais aplicáveis. 23

Em linhas gerais, diante da inadimplência, surge a responsabilidade do

devedor pelo descumprimento do que foi pactuado, pela violação de deveres.

Nessa situação deve-se avaliar se a prestação ainda é útil e do interesse do

credor, caso em que, pautado no ordenamento jurídico e por meio da via

judicial, este pode impelir o devedor a cumprir os seus deveres. Entretanto, no

caso contrário, o credor pode cobrar uma reparação.

Após a exposição de idéias iniciais, cabe indagar, qual seria o conceito

de inadimplemento?

De acordo com Eduardo Luiz Bussatta:

(...) é correto afirmar que toda vez que o credor ou devedor não cumprir com o exato modelo descrito no título da obrigação, complementado pelo princípio da boa-fé objetiva e pelas disposições legais cogentes ou mesmo supletivas aplicadas ao caso, estar-se-á diante de inadimplemento. Assim, pode-se falar em inadimplemento e, consequentemente, em responsabilidade mesmo nas hipóteses em que a prestação tida como principal foi cumprida. Desse modo, a título de exemplo, ainda que o mandatário cumpra escrupulosamente o encargo que lhe foi passado pelo mandante, será considerado

21 NEVES, José Roberto de Castro. Op. cit. p. 312. 22 Loc. cit. 23 ALEIXO, Celso Quintella. Adimplemento substancial e resolução dos contratos. Dissertação (Mestrado) – UERJ Rio de Janeiro, 2005, p. 25

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inadimplente caso não preste contas dos valores por ele gastos, tenham sido ou não adiantados pelo mandante. 24

Discorrendo sobre o conceito de inadimplemento, Celso Quintella

Aleixo afirma que:

(...) o incumprimento consiste na falta antijurídica da realização da prestação devida. Somente a falta que seja contrária ao direito é que pode ser qualificada como incumprimento, Se a dívida não for paga, por exemplo, por impossibilidade superveniente, por fato do credor, porque houve novação ou compensação, a falta da prestação não é contrária ao ordenamento. O mesmo se pode dizer na hipótese de prescrição, em que a dívida existe, mas tem sua exigibilidade afetada pela vulnerabilização da pretensão. Em todos estes casos, não há o cumprimento da obrigação, mas também não há o seu inadimplemento.25

1.2.1 Modalidades de inadimplemento

Em relação às modalidades de inadimplemento, a doutrina tradicional

sustenta a existência de duas classificações, pela primeira o inadimplemento

pode ser total ou parcial e pela segunda pode ser absoluto ou relativo.

O inadimplemento total caracteriza-se pelo descumprimento integral da

dívida, enquanto que o parcial pelo descumprimento de apenas parte desta.

No que tange ao inadimplemento absoluto ou definitivo, ele ocorre

quando não existe mais a possibilidade ou a utilidade para o credor no

recebimento da prestação, já o relativo ou inadimplemento – mora, quando

essa possibilidade ainda existe ou o interesse do credor não desapareceu. 26

Cumpre mencionar que as duas classificações acima apresentadas

são distintas, sendo possível haver hipóteses de inadimplemento total e

24 BUSSATTA, Luiz Eduardo. Op. cit. p. 22-23. 25 ALEIXO, Celso Quintella. Op. cit. p. 26-27. 26 ALEIXO, Celso Quintella. Op. cit. p. 27.

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relativo, caso de atraso no pagamento de empréstimo, bem como absoluto e

parcial, caso de falha em excursão turística, em que não se visita todas as

cidades prometidas no pacote comprado. A análise deve ser feita, portanto, no

caso concreto.

Atualmente, observa-se que a doutrina moderna apresenta uma

terceira classificação de inadimplemento decorrente do princípio da boa-fé

objetiva. Trata-se da violação positiva do contrato, que se manifesta em três

situações distintas: descumprimento do dever anexo, quebra antecipada do

contrato e cumprimento defeituoso.

Os deveres anexos, abordados na parte de adimplemento do presente

capítulo, ao serem violados, dependendo do caso concreto podem ensejar o

inadimplemento, sendo possível à resolução do contrato, perdas e danos e a

exceção do contrato não cumprido. É importante ressaltar, que a relevância

dessa terceira categoria está no fato do descumprimento dos deveres laterais

configurar uma forma de inadimplemento que não se encaixa na classificação

de absoluto ou definitivo.

Para ilustrar o inadimplemento advindo do descumprimento de dever

anexo, ensejando indenização, trecho de livro do José Roberto de Castro

Neves:

Cite-se um caso examinado pelo Tribunal do Trabalho do Rio Grande do Sul. O sucedido foi o seguinte: um Banco informou aos seus empregados acerca da existência de um plano de aposentadoria incentivada e disse ainda que não haveria um plano semelhante no futuro, nas condições indicadas pelo Banco. Contudo, tempos depois, foi editado outro plano de aposentadoria incentivada, contudo em bases mais favoráveis e incentivos maiores ao empregado, se comparado com o primeiro plano. O Tribunal julgou que havia quebra positiva do contrato, nos seguintes termos: ‘Recurso extraordinário do reclamante quebra da boa- fé objetiva. Violação positiva do contrato. O conteúdo contratual é composto por pelo menos duas espécies de deveres, os deveres de prestação e os

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deveres de proteção. Os primeiros dizem respeito à prestação que caracteriza o tipo contratual, constituindo, no contrato de trabalho, a prestação de serviços, pelo empregado, e a paga de salário, pelo empregador. Os segundos dizem respeito a deveres de conduta, dentre eles os deveres de proteção à legítima confiança, de não defraudar imotivadamente a confiança legitimamente despertada na parte contrária, sob pena de violação positiva do contrato. Hipótese em que o Banco, ao declarar que não mais editaria propostas semelhantes, induziu os seus empregados – e, particularmente, o reclamante – a aderir o PAI-50’ (TRT, 4ª Região, Relator Juiz Ricardo Martins Costa, julgado em 6.9.06)

No que concerne à quebra antecipada do contrato, esta permite a

configuração do inadimplemento antes do vencimento da prestação, sempre

que se possa verificar pela conduta expressa ou tácita do devedor que este

não irá cumprir o acordado. No mesmo sentido, Anderson Schereiber assevera

que:

(...) já se reconhece ao credor o direito de agir diante de situações que vêm sendo denominadas como de inadimplemento antecipado, na esteira da doutrina anglo-saxã do antecipated breach of contract. Assim, mesmo antes do vencimento da obrigação, a recusa do devedor em cumprir a prestação no futuro já se equipararia ao inadimplemento, autorizando ao credor o ingresso em juízo para pleitear o cumprimento da prestação, ou mesmo a resolução do vínculo obrigacional com a condenação do devedor às perdas e danos. E parte da doutrina tem sustentado até que o credor tem não o direito, mas o dever de agir contra a recusa antecipada do devedor, mitigando os danos. 27

Para melhor compreender o inadimplemento antecipado do contrato

vale mencionar no vertente trabalho o caso emblemático, julgado no Tribunal

de Justiça do Rio Grande do Sul, em uma ação que objetivava a rescisão de

contrato de participação em empreendimento hospitalar, ajuizada por

contratante que, mediante o pagamento de preço em parcelas mensais,

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adquirira quotas que lhe asseguravam participação nos lucros e direito a

atendimento médico gratuito na unidade de saúde a ser construída. 28 Assim,

ao verificar que não foi tomada nenhuma providência para construir o

prometido hospital, concluiu o Tribunal que “ofende todos os princípios de

comutatividade contratual pretender que os subscritores de quotas estejam

adstritos à integralização de tais quotas, sob pena de protesto dos títulos” 29·,

julgando procedente a ação de rescisão do contrato.

O STJ já aplicou o mesmo entendimento no Resp 309626, em que as

partes contrataram a compra e venda de imóvel na planta, com entrega

prevista para novembro de 1999. Como em julho de 1998, faltando apenas um

ano para o término do prazo contratual, as obras ainda não estavam iniciadas

e havia outras circunstâncias que confirmavam a idéia de que o prédio não

seria construído, o promissório comprador promoveu ação de resolução do

contrato, com pedido de devolução do valor pago. Confira-se:

PROMESSA DE COMPRA E VENDA. Resolução. Quebra antecipada do contrato. - Evidenciado que a construtora não cumprirá o contrato, o promissário comprador pode pedir a extinção da avença e a devolução das importâncias que pagou. - Recurso não conhecido. (Resp 309626 / RJ 2001/0029132-5 Relator Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR (1102) Órgão Julgador T4 - QUARTA TURMA Data do Julgamento 07/06/2001)

Apesar da maior parte da doutrina tratar da quebra antecipada

decorrente da conduta do devedor, há entendimento de Sílvio Venosa 30 no

sentido da possibilidade dela decorrer do caso fortuito ou força maior, hipótese

de extinção do contrato sem culpa e, portanto, não gerando qualquer tipo de

27 SCHREIBER, Anderson. A tríplice transformação do adimplemento: Adimplemento substancial, inadimplemento antecipado e outras figuras. Revista Trimestral de Direito Civil, vol. 32. Rio de Janeiro: Padma, out-dez/2007, p.9. 28 Ibidem, p.12 29 TJRS, Apelação Cível 582000378, 8.2.1983, Rel. Athos Gusmão Carneiro, in Revista de Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, vol. 07, 1983, p. 387. 30 TJRS, Apelação Cívil 58200378, 8.2.1993, Rel. Ahos Gusmão Carneiro.

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sanção. Seria o caso, por exemplo, de uma enchente que destrói uma

plantação que deveria ser entregue na semana seguinte.

Por fim, a terceira manifestação da violação positiva do contrato é o

cumprimento defeituoso. Ele ocorre quando a prestação é cumprida, porém

não devidamente. Nos ensinamentos de José Roberto de Castro Neves:

Este conceito surgiu na Alemanha, no início do século XX. Estudou-se a seguinte situação: o criador de cavalos comprou ração para dar aos seus animais. Ocorreu que a ração estava podre e os cavalos morreram por conta dela. Observou-se que havia a possibilidade de os danos decorrerem não da falta do adimplemento, mas também de um adimplemento defeituoso. No caso do criador dos cavalos, houve o cumprimento da prestação consistente em entregar ração. Não se está diante de inadimplemento total ou parcial. Entretanto, por conta do estado deficiente do produto que houve o dano. Quebrou-se positivamente o contrato. O devedor ficou obrigado a reparar o prejuízo decorrente da ração que vendeu. 31

Acresce-se ainda, que o defeito deve ser substancial para que o

cumprimento defeituoso seja considerado como inadimplemento.

O defeito no cumprimento pode ser qualitativo ou quantitativo. Este se

verifica quando o devedor desrespeita o princípio da integralidade, cumprindo

parcialmente a prestação a que está adstrito, enquanto naquele há a

realização da prestação de modo distinto do previsto na obrigação, fora do

local estabelecido no contrato ou previsto em lei, com a qualidade diversa da

devida ou de coisa diversa da devida. 32

No que tange ao cumprimento defeituoso qualitativo, Luiz Eduardo

Bussatta o exemplifica de forma clara:

31 NEVES, José Roberto de Castro. Op. cit. p. 353. 32 BUSSATTA, Luiz Eduardo. Op.cit. p. 26-28.

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Ocorre, por exemplo, quando o devedor está obrigado a pagar ao credor R$100,00 (cem reais). Contudo, no vencimento, somente cumpre com R$ 80,00 (oitenta reais). Também na venda de determinada área de terras ad mensuram, vindo depois o comprador a descobrir a falta de parte da metragem prometida. 33

Em relação ao cumprimento defeituoso qualitativo, aplicou-se sua

lógica em um julgado no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul no caso de

uma pessoa que contratou o serviço de lista telefônica para fazer um marketing

pessoal, mais especificadamente o encarte de papel especial que

normalmente é colocado em local estratégico, pagando inclusive valor superior

à média. Ocorre que o serviço de lista telefônica apesar de ter colocado o

anúncio, não avisou ao cliente que a página da lista seria dobrada e assim,

ficaria a disposição de quem abre a página o serviço anunciado pelo

concorrente e o seu apenas no verso. Nesse sentido, observa-se que o

cumprimento defeituoso também é passível de ocorrer quando há violação de

dever anexo, como no caso descrito. Confira-se:

EMENTA: AÇÃO ORDINÁRIA DE RESCISÃO DE CONTRATO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ANÚNCIO EM LISTA TELEFÔNICA. ENCARTE DE PAPEL ESPECIAL, EM LOCAL ESTRATÉGICO, DOTADO DE MARCADOR. MARKETING PROMOCIONAL DA EMPRESA AUTORA ATINGIDO PELO COMPORTAMENTO INDEVIDO DA EDITORA DA LISTA TELEFÔNICA, QUE DOBROU O ENCARTE SEM COMUNICAÇÃO PRÉVIA À REQUERENTE. DOBRA QUE DESTACOU OS ANÚNCIOS DA PRINCIPAL CONCORRENTE DA AUTORA. VIOLAÇÃO AOS DEVERES DE INFORMAÇÃO E LEALDADE INERENTES AO PRINCÍPIO DA BOA FÉ OBJETIVA QUE DEVE PAUTAR AS RELAÇÕES NEGOCIAIS. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA BOA FÉ COMO FONTE DE OBRIGAÇÕES, A TEOR DO DISPOSTO NO ART. 422 DO CÓDIGO CIVIL. O fato de a requerente ter contratado anúncio destacado, em local estratégico da lista telefônica, sem ter sido previamente comunicada sobre a

33 Ibidem, p. 28.

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dobra do encarte, o que já era do conhecimento da contratada na época, atinge o dever de informar. Informação indispensável à formação do ajuste. Dever de lealdade igualmente não observado. Ao tolerar que a principal concorrente da demandante anunciasse na página anterior e posterior à dobra, permitindo anúncio destacado desta. Conduta que caracterizou o mau cumprimento do contrato, autorizando sua rescisão. Distinção entre dano moral e patrimonial. Reconhecimento da ocorrência desse último. Indenização deferida nos termos de cláusula compensatória previamente estipulada entre as partes. Compensação entre esta e a parcela do contrato, ainda que mínima, mas considerada cumprida. Honorários advocatícios. Redimensionamento. AGRAVO RETIDO DESPROVIDO. APELO DA REQUERIDA E RECURSO ADESIVO PARCIALMENTE PROVIDOS. (Apelação Cível Nº. 70012452728, Vigésima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Aquino Flores de Camargo, Julgado em 14/09/2005)

As noções de adimplemento e inadimplemento expostas, bem como as

idéias principais acerca das modalidades de inadimplemento serão

imprescindíveis para o próximo capítulo, em que serão apresentados os

conceitos, os contornos gerais, os fundamentos e a aplicação da teoria do

adimplemento substancial no direito comparado.

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CAPÍTULO II

O ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL E OS SEUS

FUNDAMENTOS

1 – Conceito e contornos gerais

Conforme exposto no primeiro capítulo, as relações obrigacionais

nascem com o intuito de que haja o devido adimplemento de todo o programa

contratual estabelecido entre as partes. Contudo, ainda que represente uma

menor parte das obrigações, há aquelas em que tal fim não é alcançado.

Nesses casos, o inadimplemento, em regra, autoriza a resolução do contrato,

ou seja, a dissolução do vínculo contratual, nos termos do artigo 475 do atual

Código Civil que dispõe:

Art. 475. A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos.

Entretanto, há modalidades de inadimplemento em que,

excepcionalmente, o direito potestativo de resolução do contrato deve ser

vedado. Trata-se dos casos em que deve ser aplicada a teoria do

adimplemento substancial, objeto da vertente monografia, como a seguir será

demonstrado.

Inicialmente, deve-se ressaltar que a teoria em comento se aplica nos

casos de inadimplemento parcial e relativo. Consoante exposto no capítulo

anterior, este ocorre quando ainda existe a utilidade ou o interesse do credor

no recebimento da prestação, enquanto aquele quando há o descumprimento

de apenas parte da dívida.

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Ademais, inclui-se ainda na aplicabilidade da referida teoria, os casos

de violação positiva do contrato em que haja cumprimento defeituoso, como

será devidamente exposto no próximo capítulo.

Dessa forma, o adimplemento substancial “é o comportamento de boa-

fé do devedor, essencialmente próximo do efetivamente devido, que impede a

resolução do contrato, por ser idôneo a apresentar resultado funcionalmente

muito semelhante ao acordado” 34 .

Complementando as informações acima, Celso Quintella Aleixo

acentua que:

Embora represente menos que o exatamente devido, estando em literal discrepância com o devido, o que foi prestado é suficiente para atingir os aspectos relevantes do contrato, proporcionando ao credor a utilidade que ele legitimamente esperava do negócio. A utilização do termo adimplemento substancial sempre quer indicar algo a menos que a exata prestação a que está adstrito o devedor, mas que demonstre que o resultado alcançado foi quase completo, no sentido de satisfazer a necessidade que o contratante buscava suprir com a realização do contrato. (...) Vê-se que a correspondência reclamada para a configuração do adimplemento substancial não é literal, mas finalista. Na esteira de autorizada doutrina, pode-se concluir que ‘a parte descumprida da obrigação não pode destruir o valor ou os objetivos do contrato’, o que quer dizer que, inobstante o credor receber menos do que faz jus, ele obtém algo tão próximo do cumprimento literal, que acaba lhe proporcionando basicamente os mesmos benefícios que seriam conseguidos se a obrigação tivesse sido cumprida à risca. Se considera substancial a prestação do devedor em seus aspectos importantes, e não em seus detalhes pequenos e irrelevantes, que possam ser remediados por outra via que não a extinção do contrato. Se fosse exigido sempre, em qualquer circunstância, que o devedor se ativesse ao teor literal da obrigação, qualquer desvio, por mais desimportante que fosse, ensejaria a resolução do contrato, com todos os

34 ALEIXO, Celso Quintella. Adimplemento substancial e resolução dos contratos. Dissertação (Mestrado) – UERJ Rio de Janeiro, 2005, p. 36

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inconvenientes que lhe são conseqüência, tanto para as partes, quanto para a sociedade, ante a importância social e econômica dos contratos. 35

Nesse diapasão, destaca-se que nos casos de adimplemento

substancial, ante a necessária vedação a resolução do contrato, é cabível, em

regra: “a indenização por perdas e danos eventualmente causados pela

manutenção do negócio, juntamente com a cobrança pelo saldo não pago

(parte não adimplida), acrescida de juros, multa e correção monetária” 36.

Por fim, para concluir as ideias iniciais, a teoria em questão não se

aplica quando o inadimplemento for intencional. Nesse sentido:

A boa-fé subjetiva, a crença de que não se está prejudicando o outro contratante, é indispensável para que se caracterize o adimplemento substancial da obrigação. É importante assentar que de modo algum está protegido o contratante que ardilosamente deixa de adimplir a integralidade do que deve, pois somente ao devedor de boa-fé fica aberta a possibilidade de manutenção do contrato. A invocação do adimplemento substancial não pode ser usada como expediente para alguém que se furte aos termos de um contrato, mas sim como uma proteção àquele que, imaculadamente, acaba por não cumprir integralmente aquilo a que se obrigou, mas atendeu a essência do interesse da outra parte, tão diminuta que foi a parte que restou inadimplida. O devedor que não foi diligente e honesto, tendo astuciosamente deixado se empenhar para a consecução do previsto no contrato, não pode se socorrer de um instrumento desenvolvido em torno da idéia de boa-fé. 37

2. Direito Comparado

Primeiramente, cumpre esclarecer que a importância do direito

comparado no presente trabalho está no fato de não haver positivação da

teoria do adimplemento substancial no Direito brasileiro. Dessa forma, a

35 Ibidem, p. 37-38. 36 Ibidem, p. 39.

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experiência estrangeira deve servir como base para o desenvolvimento da

teoria em questão no nosso ordenamento jurídico.

2.1 História da resolução do contrato por inadimplemento

Antes de analisar a aplicabilidade da teoria em foco no direito

comparado são importantes, para a melhor compreensão acerca do assunto,

breves informações sobre a história da resolução do contrato por

inadimplemento, na medida em que esta funciona como pressuposto de

aplicação da mencionada teoria. 38

No que tange à origem da resolução dos contratos, valiosa explicação

de Luiz Eduardo Bussatta:

Somente veio a ser considerada a resolução como subentendida aos contratos com prestações recíprocas com o Direito Canônico, entendimento este justificado por razões de equidade, bem como em decorrência do valor dado à interdependência das obrigações. O Decreto Quemadmodum, do Papa Inocêncio III, ao reconhecer o direito do marido de deixar a esposa infiel, recorre ao expediente de considerar implícita no contrato de matrimônio a condição de que só é obrigatório manter-se casado durante toda a vida quando há cumprimento pela outra parte do dever de fidelidade. Logo tal expediente foi estendido para todos os contratos com prestações recíprocas, sobressaindo, então a visão de interdependência das prestações. 39 (grifo nosso)

Depois de estabelecida à possibilidade de resolver o contratos em

casos de inadimplemento, surge a seguinte indagação, principalmente diante

37 Loc. cit. 38 BUSSATTA, Luiz Eduardo. Op. cit. p. 34. 39 Loc. cit.

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de um cumprimento parcial: quais tipos de descumprimento seriam aptos a

ensejar a resolução pelo contratante? 40

Nesse sentido, merece destaque o direito inglês, em que surgiu o

entendimento de que apenas o descumprimento “das obrigações essenciais

estabelecidas pelas partes no contrato, uma sendo contrapartida da outra, ou

seja, obrigações dependentes, ou interdependentes” 41 (condition) ensejariam

a resolução do contrato, enquanto que o descumprimento de um dever

meramente acessório ou principal (warranty) apenas autorizaria o credor a

requerer perdas e danos. 42

Para ilustrar a aplicação do entendimento supra, descrição do

paradigmático julgado no caso Bonne v. Eyre:

No leading case, Boone v. Eyre, o judiciário inglês considerou que a compra e venda de uma propriedade agrícola nas Índias Ocidentais não poderia ser resolvida, ante um descumprimento de menor importância por parte do vendedor. O processo versou sobre a seguinte contenda: Eyre adquiriu não somente a terra, mas juntamente com esta, os escravos que trabalhavam nas plantações, obrigando-se a pagar o vendedor, Boone, a quantia de ₤500 (quinhentas libras esterlinas), acrescidas de uma renda anual de ₤160 (cento e sessenta libras), mas deixou de pagar esta última. Demandado judicialmente, o comprador se defendeu com o argumento de que nem todos os escravos estavam legalmente em poder de Boone quando o negócio foi fechado. A falta dos escravos não foi considerada como uma condição prévia (condition precedent), hábil a desonerar o comprador de sua obrigação enquanto não cumprida a que lhe é correlata, eis que se tratava de um descumprimento de um dever colateral, cujos prejuízos poderiam ser reparados através de um pleito de perdas e danos. (...) o juiz do caso, LORD MANSFIELD, entendeu, por uma questão de equidade, que apenas obrigações que

40 Ibidem, p. 35. 41 ALEIXO, Celso Quintella. Op. cit. p. 46. 42 BUSSATTA, Luiz Eduardo. Op. cit. p. 35.

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fossem consideradas como condições interdependentes seriam suficientes para desobrigar a parte prejudicada. MANSFIELD asseverou, na ocasião, que, se a defesa do réu fosse aceita, ‘qualquer escravo que não estivesse na propriedade do autor obstacularizaria o processo’. Em tal situação, o comprador não poderia, para cumprir uma obrigação essencial, no caso, pagamento de parte do preço, exigir do vendedor o cumprimento das obrigações independentes, secundárias, que não tivessem correlação direta com a prestação principal, que, naquele caso concreto, havia sido cumprida devidamente. (...) Esse caso foi o marco a partir do qual ficou estabelecido que, se o inadimplemento for ínfimo em relação ao conteúdo do contrato, o mesmo não poderá ser objeto de resolução, cabendo ao prejudicado a reparação pelos danos sofridos. 43 (grifo nosso)

Nota-se que a distinção entre condition e warranty revelou-se

insatisfatória por não considerar a gravidade do descumprimento, o que

poderia gerar uma injustiça, pois “uma irrelevante infração a uma condition

poderia levar à resolução do contrato, e, inversamente, o descumprimento

grave, substancial, de uma warranty somente dava o direito ao recebimento de

perdas e danos” 44 .

Posteriormente, portanto, surgiu o conceito de intermediate ou

innominate term, segundo o qual o descumprimento de um dever contratual

somente possibilita a resolução do contrato se for suficientemente sério. Dessa

forma, passa-se a dar importância para a gravidade do dever descumprido e

as conseqüências à economia do contrato decorrentes de tal descumprimento. 45

Nesse diapasão, ocorreu notória evolução ao se deixar de considerar a

natureza do dever cumprido e se valorizar a gravidade de tal descumprimento,

bem como as conseqüências que resultam na economia do contrato. Assim,

43 ALEIXO, Celso Quintella. Op. cit. p. 46-47. 44 BUSSATTA, Luiz Eduardo. Op. cit. p. 37. 45 Loc. cit.

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“surge, então, o critério ou princípio conhecido como substancial failure in

performance ou, simplesmente, substancial performance”.

2.2 Direito Italiano

O Código Civil Italiano de 1942 contém disposição expressa acerca da

faculdade do credor de resolver o contrato em casos de inexecução de

pequena importância 46. Cuida-se do art. 1.455 que dispõe, in verbis:

O contrato não pode ser resolvido se o inadimplemento de uma das partes tem escassa importância, resguardando-se o interesse da outra parte.

Diante de artigo acima transcrito, cabe ao juiz, no caso concreto,

analisar a gravidade do descumprimento ocorrido. Nesse sentido, a doutrina e

a jurisprudência italiana têm discutido tal aspecto criando dois principais

critérios 47:

(...) o primeiro, objetivo, majoritário na doutrina, leva em conta a interdependência funcional da prestação e a perturbação que o inadimplemento trouxe para a economia do contrato; o segundo, subjetivo, pelo qual se deve considerar a vontade presumida das partes, o que significa dizer, verificar se a parte, conhecendo a possibilidade de ocorrer tal inadimplemento, ainda assim contrataria. Em que pese o critério objetivo, como dito, ser o preponderante na doutrina, conforme análise feita pela referida autora nas decisões proferidas pelas cortes de tal país, inexiste critério homogêneo para a valoração da gravidade do inadimplemento, na medida em que se leva em conta, a fim de determinar a gravidade, ora a causa do contrato, ora a incidência do inadimplemento na economia do contrato, invocando-se a vontade hipotética ou presumida da parte. Ademais, pelo conteúdo da referida disposição, não há distinção alguma relativamente ao objeto do descumprimento, de forma que caberá ao juiz analisar a gravidade não em relação à prestação principal, mas sim à prestação acessória,

46 Ibidem, p. 39. 47 Ibidem, p. 40.

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enfim, de tudo aquilo que for relevante para a concreta economia contratual. 48 (grifo nosso)

Outro ponto importante é o debate sobre a possibilidade de avaliação

da gravidade do inadimplemento diante da existência de cláusula resolutiva

expressa. Para a melhor compreensão, Luiz Eduardo Bussata diz que:

A controvérsia doutrinária e jurisprudencial parece pender para a impossibilidade de avaliação judicial da gravidade do descumprimento, por ter sido este previamente avaliado pelas partes. Dessa forma, estaria a avaliação “preclusa” para o magistrado, entendimento este que demonstra clara preferência pela autonomia privada em detrimento do equilíbrio contratual. 49

Ademais, “a gravidade do inadimplemento também é avaliada para fins

de admitir ou não a utilização da exceção do contrato não cumprido” 50 , eis

que o art. 1.640, segunda parte do Código Civil italiano a veda quando ela for

contrária à boa-fé. Destarte, conclui-se que em casos de adimplemento

substancial tal defesa dilatória deve ser igualmente impossibilitada. 51

Em suma, conforme conclui Celso Quintella Aleixo:

O maior mérito da lei italiana foi ter incluído a expressa ressalva ao interesse do credor, uma vez que a satisfação de tal interesse é o ponto que permite verificar o alcance da finalidade do negócio, o que é fundamental para a caracterização do adimplemento substancial. 52

2.3 Direito alemão

Em sentido semelhante é o Direito alemão que também possui regra

expressa em seu Código Civil (BGB) sobre a avaliação da gravidade do

48 Loc. cit. 49 Ibidem, p. 41. 50 Loc. cit. 51 Ibidem, p. 41-42. 52 ALEIXO, Celso Quintella. Op. cit. p. 50.

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inadimplemento para que seja permitida à parte lesada a resolução do

contrato. Assim, ela só esta só é aceita quando a parte não tiver interesse na

parcialidade. Caso contrário, o contrato é mantido, cabendo perdas e danos. 53

Complementando as informações acima, Luiz Eduardo Bussatta

assevera que:

Quadra observar que o legislador alemão fala em ‘lesão do dever’, deixando claro, com isso, que não se refere somente ao descumprimento da prestação principal, mas de todo e qualquer dever decorrente da relação contratual, positivando, assim, a visão da relação contratual complexa. Ademais, será a resolução defesa conforme o § 323 (6) do BGB, quando o credor for total ou predominantemente responsável pelas condições que poderiam permitir a resolução, ou quando não caiba ao devedor responsabilizar-se pelas condições ao tempo supervenientes, em que o credor se encontra em mora de recebimento. Como é sabido, o BGB é expresso ao impor a boa-fé objetiva aos contratantes no § 242. Não há dúvida, com isso, de que os contratantes são obrigados a guardar, durante todo o processo obrigacional, a mais estrita lealdade e cooperação mútua, de forma que se poderia, mesmo antes da inclusão da regra sobredita, defender a aplicação da teoria do adimplemento substancial, vedando, assim, o desfazimento do vínculo contratual quando, sendo o inadimplemento de escassa importância, fosse contrário à boa-fé objetiva. Contudo, preferiu o legislador deixar clara tal impossibilidade, dirimindo, assim, qualquer dúvida que pudesse ocorrer na concretização do princípio da boa-fé. 54

Cumpre destacar que a legislação alemã é inovadora em relação à

italiana, eis que ao referir-se ao “descumprimento do dever”, deixa clara a sua

aplicação às prestações laterais ou acessórias, o que não ocorre na italiana,

abrindo margens a dúvidas na doutrina.

53 BUSSATTA, Luiz Eduardo. Op. cit. p. 42-43. 54 Ibidem, p. 44.

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Antes ao exposto, é notória a opção do legislador alemão pela

manutenção do contrato. 55

2.4 Direito espanhol

No Direito espanhol, diversamente, não há disposição expressa sobre

a gravidade do inadimplemento para fins de resolução do contrato. Dessa

forma, a doutrina e a jurisprudência mostram-se favoráveis à manutenção dos

contratos, usando, pois, como fundamento para vedar a resolução diante do

descumprimento de escassa importância o princípio da boa-fé objetiva, do

pacto sunt servanda e o da conservação dos contratos. 56

Nota-se que a construção da doutrina e dos tribunais não diverge dos

debates já apresentados nos itens referentes ao direito italiano e alemão.

2.5 Convenção das Nações Unidas sobre os Contratos de Compra e

Venda Internacional de Mercadorias (Viena, 1980).

O artigo 25 da Convenção em análise dispõe:

Uma violação do contrato cometida por uma das partes é fundamental quando causa a outra parte um prejuízo tal que a prive substancialmente daquilo que lhe era legítimo esperar do contrato, salvo se a parte faltosa não previu esse resultado e se uma pessoa razoável, com idêntica qualificação e colocada na mesma situação, não o tivesse igualmente previsto.

Discorrendo sobre o dispositivo acima transcrito Luiz Eduardo

Bussatta:

Consta da Convenção das Nações Unidas sobre os Contratos de Compra e Venda Internacional de

55 Ibidem, p. 44-45. 56 Ibidem, p. 47.

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Mercadorias, firmada em Viena, 1980, que a parte, seja o comprador, seja o devedor, poderá dar por resolvido o contrato quando a violação cometida pela outra for fundamental. Vê-se desde logo, que se considera fundamental a violação, ou seja, o descumprimento que prive a parte contrária daquilo que lhe era legitimamente possível esperar do contrato. Ao levar em conta, para fim de valorar se o inadimplemento é ou não fundamental, a legítima expectativa da parte, decorrente não das suas emoções, mas dos termos contratuais, tem-se que, num primeiro momento, adotou-se uma concepção objetiva. Contudo, ela é atenuada pela imprevisibilidade do resultado, o que importa dizer, fica afastado o descumprimento fundamental, mesmo havendo um prejuízo que furte a parte não adimplente daquilo que poderia esperar do contrato, se esse resultado não é previsível a uma pessoa razoável. Dessa forma, o critério para a valoração da violação fundamental do contrato é misto. 57

Merece destaque a posição doutrinária no sentido do dispositivo em

comento ser criticável, visto que a previsibilidade ou não do resultado não

altera o dano sofrido, bem como a avaliação da culpa não só seria de difícil

apuração, como também não se coaduna com os requisitos da

responsabilidade negocial. 58

2.6 Princípios acerca dos Contratos Comerciais Internacionais do

UNIDROIT

Os princípios acerca dos Contratos Comerciais Internacionais do

UNIDROIT “correspondem a uma elaboração doutrinária aplicável aos

contratos mercantis internacionais que servem como modelo, que pode ser

adotado pelas partes ou pela legislação nacional” 59.

57 Ibidem, p. 51. 58 Ibidem, p. 52. 59 Loc. cit.

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Tais princípios influenciaram a elaboração dos Códigos civis da

Holanda, Quebec, e da Federação Russa, cuidando-se, pois, de atual estudo

jurídico. 60

Complementando as informações acima, com maestria Luiz Eduardo

Bussata diz que:

Esse diploma, ao tratar da resolução dos contratos por inadimplemento, somente a admite quando a falta de cumprimento das obrigações contratuais corresponde a um incumprimento essencial, o que importa, sem dúvida alguma, na necessidade de valorar o inadimplemento para permitir a via resolutória. E, conforme dispõe o art. 7.3, o incumprimento é essencial quando: ‘(1) Uma parte pode resolver o contrato se a falta de cumprimento de uma das obrigações da outra parte constitui um cumprimento essencial. (2) Para determinar se a falta de cumprimento de uma obrigação constitui um incumprimento essencial se terá em conta, especialmente, se: (a) o incumprimento priva substancialmente a parte prejudicada do que teria direito de esperar em virtude do contrato, a menos que a outra não houvera previsto nem poderia prever razoavelmente esse resultado; (b) a execução estrita da prestação insatisfeita era essencial segundo o contrato; (c) o incumprimento foi intencional ou temerário; (d) o incumprimento dá à parte prejudicada razões para desconfiar de que a outra cumprirá no futuro; (e) a resolução do contrato ocasionará à parte inadimplente uma perda desproporcional como conseqüência de sua preparação ou cumprimento. (3) Em caso de demora, a parte prejudicada também pode resolver o contrato se a outra parte não cumpre antes do vencimento do período suplementar concedido a ela segundo o artigo 7.1.5’ 61. (grifo nosso)

Após a leitura do art. 7.3 acima transcrito, observa-se que são

descritas uma série de importantes questões que geram debates em outros

países, como já exposto. Assim, tal estudo deve servir de fonte segura para o

60 Ibidem, p.53. 61 Loc. cit.

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legislador se guiar, pois traz soluções para situações discutidas no direito

comparado, bem como é um importante e atual trabalho sobre o tema. 62

Ante a análise feita em alguns países sobre o adimplemento

substancial, se observa inúmeras contribuições que podem servir de base para

desenvolvermos a referida teoria no ordenamento jurídico brasileiro, como será

detalhadamente abordado no próximo capítulo.

3. Fundamentos legais e constitucionais do Adimplemento

Substancial

O fundamento constitucional da teoria em foco é o princípio

constitucional da solidariedade, do qual decorrem as cláusulas gerais da boa-

fé objetiva, do abuso de direito e da função social do contrato.

Diante da ausência de previsão expressa da teoria em comento, é de

suma importância o estudo das cláusulas gerais mencionadas, como a seguir

será feito.

Destarte, com maestria Ruy Rosado de Aguiar Jr. assevera que:

O trabalho do juiz não se resume a examinar a ocorrência do incumprimento e a deferir o efeito resolutório, mas vai além, passando pelo delicado trabalho de dar consistência à falta de sistematização legal e à indeterminação dos conceitos. Deverá orientar-se pelos princípios da boa-fé (art. 422 do Código Civil) e da equidade, pelas normas do comércio jurídico, pela função econômica e social do contrato (art. 421 do Código Civil) etc., a fim de decidir entre a manutenção das avenças, de um lado, e a satisfação do interesse do credor, de outro, ponderando entre as conveniências das duas partes e o

62 Ibidem, p. 53-55.

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comportamento que ambas mantiveram durante a celebração e a execução. 63

3.1 O princípio da boa-fé contratual

O Código Civil de 1916 foi influenciado pelo Código Napoleônico, que

tinha a idéia de isonomia formal, segundo a qual todos eram tidos como iguais,

tornando-se desnecessária a intervenção estatal nas relações privadas. Neste

contexto de prevalência da autonomia da vontade pautava-se a teoria do

contrato, em que se destacavam três princípios orientadores: liberdade

contratual, obrigatoriedade dos contratos e consensualismo.

Complementando as afirmações acima, acentua Luiz Eduardo

Bussatta acerca dos referidos princípios:

(...) Assim, o princípio da liberdade contratual, pelo qual se permite ao sujeito a liberdade de contratar ou não contratar, de escolher o parceiro contratual e, ainda, de fixar o conteúdo do contrato. Corolário deste é o princípio da obrigatoriedade dos contratos, segundo o qual os contratantes, tendo manifestado sua vontade de contratação, ficam obrigados a cumprir com as obrigações assumidas. (...) Soma-se a estes o princípio do consensualismo, pelo qual o contrato se forma tão só pelo acordo de vontades, sendo desnecessário qualquer outra formalidade para sua existência e validade. 64

Cumpre destacar que o mencionado código tinha a pretensão de

regular casuisticamente todos os potenciais conflitos de interesse e o papel do

magistrado era tão somente realizar a subsunção, uma vez que o objetivo

central do direito civil era conferir segurança jurídica as relações privadas.

Dessa forma, ele se tornou rapidamente ultrapassado e devido à realidade

social e econômica, a concepção do direito civil passou a ser de isonomia

substancial. Assim, com a Constituição Federal de 1988, observa-se a

63 AGUIAR JR., Ruy Rosado de. Extinção dos contratos por incumprimento do devedor- resolução. Rio de Janeiro: Aide, 2004, p.142 apud ALEIXO, Celso Quintella. Op. cit. p. 59. 64 Ibidem, p. 59-60.

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despatrimonialização do direito civil, decorrente do princípio da dignidade da

pessoa humana, bem como o surgimento de cláusulas gerais no Código Civil

de 2002, as quais são dotadas de maior abstração, conferindo maior

discricionariedade ao julgador e evitando o envelhecimento precoce da

legislação.

Nesse desiderato, a boa-fé objetiva, cláusula geral no Código Civil de

2002 65 , não afasta a incidência dos referidos princípios decorrentes da

autonomia da vontade, mas os limita, mitigando os seus efeitos. 66

Assim, “toda a vez que se dá maior importância ao princípio da

autonomia da vontade, a boa-fé objetiva é deixada para o segundo plano; e

quando esta assume papel primordial na teoria dos contratos, a autonomia é

restringida de forma significativa”. 67

3.1.1 A boa-fé objetiva e a boa-fé subjetiva

A boa-fé apresenta duas vertentes: a objetiva e a subjetiva.

Em relação à boa-fé subjetiva, discorre Luiz Eduardo Bussatta:

(...) chamada de boa fé subjetiva, boa-fé crença, boa-fé psicológica, derivada do Direito Canônico, é utilizada especialmente no Direito das Coisas e se baseia em dados internos, meramente psicológicos, referente à ignorância de estar lesando direito alheio, o que significa dizer, o sujeito imagina que sua conduta está pautada no direito. ‘Daí se concluir que a boa-fé nada mais seria do que um estado de ignorância do sujeito; apenas um ser e não um dever. ’ Assinala Fernando de Noronha que, ‘na

65 Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé. 66 BUSSATTA, Luiz Eduardo. Op. cit. p. 61. 67 SILVA, Clóvis Veríssimo do Couto e. O princípio da boa-fé no direito brasileiro e português . In: FRADERA, Vera Márcia Jacob de. (Org.) O direito privado brasileiro na visão de Clóvis do Couto e Silva. Porto Alegre : Livraria do Advogado,1997,p.34 apud BUSSATTA, Luiz Eduardo. Op. cit. p. 62.

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situação de boa-fé subjetiva, uma pessoa acredita ser titular de um direito, que na realidade não tem, porque só existe na aparência.’ 68

Complementando a explicação sobre a boa-fé subjetiva, claríssimos

são os dizeres de Teresa Negreiros:

É nesta vertente subjetiva que se diz que alguém está de boa-fé. É o caso, por exemplo, do “terceiro de boa-fé”. Assim, pense-se na hipótese de alguém adquirir, a título oneroso, bens que pertencem ao vendedor na sua posição de herdeiro e, supervenientemente, já depois de celebrado o negócio, se constata que, afinal, o herdeiro restou excluído da sucessão, carecendo, portanto, de título para dispor de tal patrimônio. Agora, imagine-se a hipótese de um imóvel, cuja propriedade foi transferida a título de pagamento, vir a ser alienado a terceiro, após o que, constatado o erro do solvens, pretende este a reivindicação do bem. Suponha-se, ainda, a situação do mandatário que, desconhecendo a extinção do mandato que lhe atribuíra poderes para tanto, aliena bens do mandante a um terceiro. As hipóteses acima referidas apresentam situações em que se depara um tipo de conflito cuja solução concreta reside na boa-fé, ou melhor, nesta vertente subjetiva da boa-fé, chamada a desempenhar um papel decisivo. A boa-fé subjetiva consiste, nos casos acima, na escusabilidade do erro do adquirente, em crer na realidade do que era uma titularidade ilusória, e que levou à prática de um negócio jurídico, do qual o legítimo titular não participou mas cujos efeitos podem vir a se lhe opor. São hipóteses específicas – retratadas, respectivamente, nos arts. 1.817, 879, parágrafo único, e 689 do Código Civil – em que a solução do legislador é favorável ao terceiro porque de boa-fé, resguardando-o dos efeitos retroativos do vício de legitimidade do seu título aquisitivo. Protege-se de tal maneira a confiança gerada pela crença errônea numa aparente legitimação, que, em tais hipóteses, ao verdadeiro titular nada mais resta do que respeitar um negócio jurídico praticado em seu prejuízo e sem a sua participação. 69 (grifo nosso)

68 BUSSATTA, Luiz Eduardo. Op. cit. p. 67. 69 MORAES, Maria Celina Bodin de. (Coord.). Princípios do Direito Civil Contemporâneo. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p.225.

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Contudo, não é nesta vertente subjetiva que se fundamenta a teoria do

adimplemento substancial, mas sim, na objetiva. A diferença entre elas é que a

boa fé objetiva “é a própria norma, fonte direta de deveres de conduta exigíveis

quer do devedor quer do credor no âmbito da relação obrigacional” 70 ,

enquanto que a boa–fé subjetiva “mais não representa do que um elemento

constitutivo da previsão de uma norma, funcionando, pois, como um

pressuposto de facto da sua aplicação”. 71

Corroborando o conceito de boa-fé objetiva, Cláudia Lima Marques:

Boa-fé objetiva significa, portanto, uma atuação ‘refletida’, uma atuação refletindo, pensando no outro, no parceiro contratual, respeitando-o, respeitando os seus interesses legítimos, suas expectativas razoáveis, seus direitos, agindo com lealdade, sem abuso, sem obstrução, sem causar lesão ou desvantagem excessiva, cooperando para atingir o bom fim das obrigações: o cumprimento do objetivo contratual e a realização dos interesses das partes. 72

3.1.2 A tríplice função do princípio da boa-fé objetiva

Em relação às funções da boa-fé objetiva, a doutrina pátria73 destaca

três: a de cânone interpretativo-integrativo do contrato, a de fonte normativa de

deveres jurídicos e a de fonte normativa de restrição de posições jurídicas.

70 Ibidem, p. 227. 71 ALARCÃO, R. de. Direito das obrigações. Coimbra, 1983, p.91 apud MORAES, Maria Celina Bodin de. (Coord.). Op. cit. p. 227 72 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor: o novo regime das relações contratuais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 181-182. 73 Nesse sentido: SILVA, Clóvis Veríssimo do Couto e. Op. cit. p. 54-55; COSTA, Judith Martins. A boa-fé no direito privado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 427-428; MORAES, Maria Celina Bodin de. (Coord.). Princípios do Direito Civil Contemporâneo. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 223, NORONHA, Fernando. O direito dos contratos e seus princípios fundamentais: autonomia privada, boa-fé, justiça contratual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p.151, dentre outros.

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Fernando Noronha esclarece que “a função integrativa não é

qualitativamente diversa da função interpretativa: a integração é apenas a

continuação da interpretação do contrato, para além das disposições previstas

pelas partes, ou impostas pela lei”. 74

A boa-fé objetiva como critério de interpretação dos negócios jurídicos

está presente no artigo 131 do Código Civil de 2002, que dispõe:

Art. 113. Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração.

Dessa forma, consoante tal função, na interpretação dos contratos,

tendo como objeto as declarações expressas ou suprindo as lacunas

contratuais, deve-se buscar “o sentido das disposições contratuais mais

compatível com a postura leal, honesta e cooperativa com que uma parte deve

agir em relação à outra.” 75

No que concerne à função de fonte normativa de deveres jurídicos, ela

exige uma atitude de cooperação recíproca para que seja configurado o exato

processamento da relação obrigacional e a consecução da finalidade lícita. 76

Nesse sentido, “paralelamente aos deveres expressos no contrato e a

disposições legais especificamente estabelecidas, as partes é imposta ainda

uma série de deveres anexos, decorrentes das exigências de lealdade e

correção trazidas pela boa-fé objetiva” 77 .

O fundamento da função da boa-fé objetiva como um fator gerador de

deveres anexos está previsto no artigo 422 do Código Civil de 2002, in verbis:

74 NORONHA, Fernando. Op. cit. p. 166. 75 ALEIXO, Celso Quintella. Op. cit. p. 63. 76 MORAES, Maria Celina Bodin de. (Coord.). Princípios do Direito Civil Contemporâneo. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 245. 77 ALEIXO, Celso Quintella. Op.cit. p. 64.

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Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.

Por fim, a boa-fé objetiva possui a função limitadora do exercício dos

direitos subjetivos, de forma que todo e qualquer direito que for contrário ao

princípio em questão será considerado ilícito. 78 Aqui há um ponto de contato

com a teoria do abuso do direito, “já que será abusiva a conduta do contratante

que, no exercício de seus direitos, contrariar os parâmetros de lealdade e

cooperação que dele se espera, ainda que tal comportamento esteja previsto

na lei ou contrato” 79

Conforme brilhante entendimento de Celso Quintella Aleixo:

Essa dupla incidência apresenta não um conflito entre os dois institutos, abuso e boa-fé, mas sim revela um caráter de complementaridade, em que as noções destas duas cláusulas gerais são utilizadas, em seu ponto comum, para coibir a deslealdade das partes e o desvio da finalidade do contrato. 80

Nessa terceira função da boa-fé objetiva encontra-se uma das

fundamentações da teoria do adimplemento substancial, tema do vertente

trabalho, como será detalhadamente explicado no próximo capítulo.

Apenas para apresentar noções iniciais, no que tange ao

adimplemento substancial, Anelise Becker aduz que a boa-fé objetiva age81 “de

modo a proteger o devedor frente a um credor malicioso e inflexível, como

causa de limitação do exercício de um poder jurídico, no caso, o direito

78 BUSSATTA, Luiz Eduardo. Op. cit. p. 82. 79 ALEIXO, Celso Quintella. Op. cit. p. 64 80 Ibidem, p. 65. 81 Loc. cit.

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formativo de resolução, do qual é titular o credor de obrigação não cumprida” 82

.

Complementando o entendimento acima, Teresa Negreiros aduz:

Assim, é também no exercício da sua função de limitar o exercício de direitos subjetivos em nome da preservação do sinalagma que a boa-fé serve como fundamento para a chamada teoria do adimplemento substancial. De acordo com esta teoria, ainda que a norma contratual ou legal preveja a rescisão do contrato, o fato de a prestação ter sido substancialmente satisfeita veda ao credor, de acordo com os ditames da boa-fé, o exercício do direito de rescisão. Isto pois a substancialidade do adimplemento, apurada conforme as circunstâncias e em vista da finalidade econômico social do contrato em exame, garante a manutenção do equilíbrio entre as prestações correspectivas, não chegando o descumprimento parcial a abalar o sinalagma.83

3.2 Abuso de direito

A teoria do abuso do direito surgiu a partir da necessidade de “se

solucionar conflitos sociais envolvendo o exercício aparentemente lícito de

direitos subjetivos” 84.

Merece destaque a criação da jurisprudência francesa no século XIX

da teoria dos atos emulativos, que visava a impedir o exercício de um direito

subjetivo com a finalidade puramente de prejudicar outra pessoa, sem que o

titular obtivesse qualquer tipo de vantagem advinda de seu ato. Era muito

comum ocorrer esse conflito no âmbito dos direitos reais, em especial, na área

de vizinhança, sendo motivado, principalmente, pelo individualismo extremo,

82 ALEIXO, Celso Quintella. Op. cit. p. 65 apud BECKER, Anelise. A doutrina do Adimplemento Substancial no Direito Brasileiro e em Perspectiva Comparativista. In: Revista da Faculdade de Direito da UFRGS. Porto Alegre: 1993 vol. 9, n.1, p.70. 83 MORAES, Maria Celina Bodin. Op. cit. p. 237. 84 Ibidem, p. 61-62.

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em que os titulares de direitos subjetivos não se conformavam com as

limitações que não estivessem expressas no texto legal. 85

Cumpre ressaltar que os tribunais franceses não são responsáveis

pela gênese do instituto, pois trouxeram princípios do direito romano.

Entretanto, possuem notável mérito, pois as decisões foram exaradas sem

base legal do Code Civil 86, bem como surgiram “em uma época em que se

acreditava que todos os problemas poderiam ser regulados pela lei, e em que

imperava o individualismo e absolutismo dos direitos subjetivos” 87.

Vale transcrever a idéia central de dois julgados dos tribunais

franceses para ilustrar as informações acima:

No ano de 1855, a Corte de Colmar se viu diante de uma hipótese em que um cidadão que, com o único fim de privar de luz a janela do vizinho, construiu uma chaminé falsa no telhado de sua casa. Apesar da alegação do réu de que teria agido por conta de seu direito de propriedade, foi decidido que o exercício deste direito, assim como dos demais direitos subjetivos, tem como limite a satisfação de um interesse “sério e legítimo”, de modo que o judiciário não pode sancionar uma ação não justificada por uma satisfação de interesse pessoal, mas sim pelo objetivo de causar prejuízo a outrem. (...) Em outro episódio célebre, ocorrido anos mais tarde, em 1913, a corte de apelação de Amiens, no caso Clément-Bayard, considerou abusiva, para condenar o réu, a conduta do dono de um terreno que nele ergueu construção com o propósito inequívoco de prejudicar um vizinho. No terreno, havia sido construída uma estrutura de madeira com 16 metros de altura, coroada por barras de ferro pontiagudas que nenhuma utilidade proporcionava ao seu proprietário, mas por outro lado tinha a por propósito danificar os dirigíveis que estacionavam no imóvel limítrofe. Tendo efetivamente uma das lanças avariado um dirigível, seu proprietário, Clément-Bayard, reclamou em juízo a reparação dos

85 Ibidem, p. 63-66. 86 ALEIXO, Celso Quintella. Op. cit. p. 69 87 Loc. cit.

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danos sofridos, bem como a derrubada de toda a estrutura. A corte, fundamentada na ocorrência do abuso do direito de propriedade, condenou o réu a indenizar o autor pelos prejuízos matérias experimentados, bem como a retirar as barras pontiagudas, negando, todavia, a demolição de toda a armação de madeira, por não ter sido provado que esta, desprovida de suas pontas, poderia causar algum estrago. 88

Posteriormente, surgiu a teoria subjetiva defendida por Ripert, que se

aproximava dos atos emulativos na medida em que o abuso de direito também

era visto como o ato praticado com a finalidade de prejudicar. No entanto, a

novidade era que se configurava o abuso ainda que o ato trouxesse algum

benefício para o titular. Essa teoria foi criticada, eis que era difícil a

comprovação da intenção do titular do direito e essa se apresentava como

condição essencial para a qualificação do ato como abusivo.

Complementando o acima exposto, Vladimir Mucury Cardoso aduz

que:

Nessa perspectiva, Ripert aliou o abuso de direito à regra moral, a qual proíbe qualquer um de causar prejuízo a outro, o que consiste numa ‘limitação dos direitos subjetivos. (...) Abusar do direito seria, então, ‘cobrir com a aparência do direito o ato que era um dever não realizar’, especialmente quando inspirado pelo desejo de prejudicar. A intenção maléfica teria, assim, o condão de modificar o caráter do ato. A corrente subjetivista baseia-se nesses dois elementos, cuja conjunção representa o abuso de direito: a intenção maléfica de causar um dano e a aparência do direito. 89

Em seguida, observa-se o nascimento da teoria finalista que defendia

que os direitos subjetivos eram apenas relativos e não haveria direito que não

possuísse cunho social. Dessa forma “a cada direito (subjetivo) corresponderia

uma função social (o interesse), que constituiria a justificativa da proteção

88 Loc. cit. 89 MORAES, Maria Celina Bodin. Op. cit. p. 68-69.

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legal. O abuso de direito apareceria, nessa perspectiva, quando houvesse o

‘desvio da função social do espírito do direito” 90.

Nesse sentido, assevera Vladimir Mucury Cardoso que:

Josserand, no entanto, não se desprendeu totalmente da concepção subjetiva, na medida em que se reconhece a subsistência do elemento subjetivo (que “subsistirá sempre”, assevera), ao lado do elemento objetivo, social, que passa a ocupar a condição de fator preponderante. Defende que o critério para a identificação do ato abusivo é o ‘desvio do direito do seu espírito’, da finalidade da instituição, da sua função social. O abuso de direito se dá através do exercício ‘em direção contrária ou disforme com a função e o espírito’ do direito. Utiliza-se, todavia, do motivo do atuar do agente na concretização do critério finalístico proposto. Em outras palavras, sustenta que o afastamento da função social do direito se dá quando as razões que levaram o titular a agir de certa forma não se conformam com a missão social do direito. A intenção ou o ‘estado de espírito’ do titular permanece, portanto, como elemento caracterizador do abuso, como a ‘verdadeira pedra angular’ da teoria. 91

No direito brasileiro, a teoria em comento surgiu no direito processual,

havendo abuso de direito de ação ou de defesa, predominando situações em

que o autor ajuizava ações visando a prejudicar a outra parte ou em que o réu

“se defendia de forma desproporcional, superando o que poderia se ter como

razoável, como, por exemplo, negando fatos notórios ou contestando direito

líquido e certo” 92.

Cumpre ressaltar que o Código Civil de 1916, bem como significativa

parte da doutrina nacional aderiu à teoria finalista. 93. Enquanto que o atual

Código Civil adotou a perspectiva civil-constitucional e inovou no art. 187 que

dispõe, in verbis:

90 Ibidem, p. 71. 91 Ibidem, p. 73. 92 Ibidem, p. 74. 93 Ibidem, p. 75.

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Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

Nesse desiderato, a perspectiva civil-constitucional do abuso de direito

não se fundamenta mais na colisão de direitos. Estes passam a sofrer

limitação advindas do conteúdo das cláusulas gerais, principalmente “daquelas

que traduzem expressões do princípio da solidariedade, tais como a de ordem

pública, a de lealdade, a de diligência e a de boa-fé” 94. Nesse diapasão, o ato

passa a ser abusivo quando, por exemplo, contrariar a boa-fé objetiva.

Complementando as informações acima expostas, valiosa síntese de

Vladimir Mucury Cardoso:

Enfim, numa visão civil-constitucional, os valores que expiram o ordenamento jurídico, e cuja valoração no exercício de um direito caracteriza um abuso, devem ser buscados na tábua axiológica insculpida na Constituição, logo, no ápice do ordenamento jurídico. Nessa perspectiva, destaca-se a necessidade de respeito aos interesses existenciais que se encontrarem em jogo numa determinada situação jurídica, na qual se insira o direito que se pretende exercer. A inobservância desses interesses, no exercício do direito, ocasiona o desmerecimento de tutela do ato, que se tornará ilegítimo por configurar abuso de direito. (...) O abuso de direito surge, nesta perspectiva, quando há violação da cláusula geral da boa-fé, na medida em que o princípio em si representa importante dado valorativo elevado à categoria de pilar da sociedade que se pretende construir, baseada na dignidade da pessoa humana, nos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa , na cidadania, na justiça social, na igualdade material, na solidariedade e na erradicação da pobreza e da marginalização. Este é, ao menos, o plano estabelecido na constituição Federal de 1988, a que o jurista não pode permanecer indiferente. 95

94 Ibidem, p. 86-87. 95 Ibidem, p. 89-94.

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Quadra asseverar, ainda, a importância da equidade e da

proporcionalidade como forma de limitação do exercício de direito,

especialmente em face de inadimplemento de escassa importância em que o

credor deseja a resolução do contrato, assunto da vertente monografia.

No que concerne à equidade, é clara a explicação de Celso Quintella

Aleixo, a seguir:

A equidade é conceituada como ‘o princípio que modera ou modifica a aplicação da lei quando se evidencia de excessivo rigor’. É na equidade que se encontra a origem do abuso de direito, pois era um instrumento que os romanos se utilizavam para solucionar as controvérsias que lhes eram postas. O próprio brocardo summun ius, summa iniuria, revela uma estreita ligação com o excesso que caracteriza a iniqüidade. 96 (grifo nosso)

Em relação à proporcionalidade, ela “determina que o exercício de um

direito deve ser feito do modo menos gravoso para a outra parte” 97 . Assim, o

“ordenamento não pode proteger o indivíduo que se utiliza de uma maneira,

quando existe uma diferente, que imponha menor sacrifício ao outro, sem

diminuir qualquer benefício em contrapartida.” 98. Outrossim, nos casos de

adimplemento substancial, o exercício do direito de resolução do contrato

quando tal ato não traz benefício credor e ainda prejudica de forma desmedida

o devedor, configura abuso de direito, não encontrando respaldo no

ordenamento jurídico. 99

Ademais, a teoria do abuso de direito se ampliou, não mais se atendo

unicamente aos contornos do direito subjetivo. Assim, houve a inclusão de

outras categorias que também configuravam exercício de abuso de direito, tais

96 ALEIXO, Celso Quintella. Op. cit. p. 73. 97 Loc. cit. 98 Loc. cit. 99 Loc. cit.

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como: “os poderes jurídicos, os direitos potestativos, as simples faculdades, as

liberdades e quaisquer outras prerrogativas individuais” 100.

No mesmo sentido:

É certo que o desenvolvimento da noção de abuso de direito se deu, como visto, paralelamente à evolução da concepção de direito subjetivo. Esta relação, contudo, não é suficiente para aprisionar o instituto nos confins do direito subjetivo. Afinal, viu-se que o critério definidor do abuso recai no elemento valorativo do direito, haja vista que o ordenamento jurídico, ao concedê-lo ao titular, não o fez para que fosse utilizado egoisticamente. 101

3.2.1. O ato abusivo e as suas diferenças com o ato ilícito

A doutrina ainda majoritária 102 defende que o abuso de direito é um

ato ilícito, pautados, inclusive, na literalidade do art. 187 do atual Código Civil

que dispõe:

Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

Há, entretanto, posição doutrinária em sentido diverso, defendendo

que o abuso de direito é um ato antijurídico. Destarte, sustentam a existência

de ato ilícito lato sensu que se subdivide no ilícito stricto sensu e no ato

antijurídico. Assim, o ato ilícito stricto sensu é o tradicional previsto no artigo

186 (conduta, dano, dolo ou culpa e nexo causal), a seguir transcrito, in verbis,

enquanto que o antijurídico seria o abuso de direito.

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

100 Ibidem, p. 90. 101 Loc. cit. 102 PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de Direito Privado. Campinas: Bookseller. T.2, 2000, p.315. (Dentre outros.)

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O ponto principal da discussão doutrinária é que no ato ilícito stricto

sensu ocorre a violação dos limites formais impostos pelo legislador. Ao passo

que no abuso do direito ocorre a violação dos limites axiológico-normativos

impostos pelo ordenamento jurídico. Em outras palavras, quando se diz que no

ato ilícito se viola os limites formais impostos pelo legislador, o que se está

dizendo é que no ato ilícito o sujeito viola frontalmente uma regra de direito

positivo. Ao passo que no abuso, se dá a violação dos limites axiológico-

normativos, ou seja, a violação dos limites valorativos. (informação verbal) 103

Corroborando o acima exposto, com maestria Heloísa Carpena afirma

que:

No ato ilícito, o sujeito viola diretamente o comando legal, pressupondo-se então que este contenha previsão expressa daquela conduta. No abuso, o sujeito aparentemente age no exercício de seu direito, todavia, há uma violação dos valores que justificam o reconhecimento deste mesmo direito pelo ordenamento. Diz-se, portanto, que no primeiro há inobservância de limites lógico-formais e, no segundo, axiológicos - materiais. 104

Complementando as informações acima, ao discorrer sobre a distinção

de ilicitude e antijuridicidade Celso Quintella Aleixo aduz que:

A prática de um ato ilícito induz uma contrariedade direta e específica a um comando normativo, a violação de um dever originado da lei ou da vontade das partes (ilícito contratual.) Já a prática de um ato antijurídico não viola disposição específica, mas revela uma contrariedade genérica com a ordem jurídica como um todo. Um ato pode não estar atentando contra um comando normativo específico e, inobstante, estar contrariando os valores e fins do ordenamento jurídico. A antijuridicidade é, pois, a

103 Curso de Direito Civil – Prof. Fabrício Carvalho – Curso: Cej – 2009. 104 CARPENA, Heloísa. Abuso do Direito no Código de 2002: Relativização de direitos na ótica civil-constitucional. In: Coord. Gustavo Tepedino. A parte Geral do novo Código Civil – Estudos sob a Perspectiva Civil-Constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 371 apud ALEIXO, Celso Quintella. Op. cit. p. 74.

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lesão a um valor ou fim protegido pelo ordenamento. Isto não significa, todavia, que se poderá exercer um direito se algum outro valor for sacrificado, pois isto acabaria esvaziando o próprio direito subjetivo, o que também não pode ser admitido, mas sim que se o desvio de finalidade atacar um dos valores reconhecidos pela ordem jurídica o exercício será, então, abusivo. A barreira imposta ao exercício abusivo de uma posição jurídica não está no direito subjetivo do outro indivíduo, mas sim no próprio ordenamento positivo. E os valores do ordenamento são ditados não somente pela legislação ordinária, mas especialmente pela Constituição da República, que fornece os padrões para a verificação da antijuridicidade. 105

Em suma, no abuso do direito, este é exercido em desarmonia não

com a literalidade do Código, mas com os valores, com os princípios que

irradiam pelo sistema.

Para exemplificar o acima exposto, a prática de um esbulho

possessório é um ato ilícito. Já a construção de um muro com dez metros de

altura com um único objetivo de impedir que o sol bata na piscina do vizinho é

abuso do direito de propriedade, uma vez que se exerce o direito de

propriedade em desarmonia com os valores do sistema. No mesmo sentido,

julgado do Superior Tribunal de Justiça:

DIREITO CIVIL. SERVIDÕES LEGAIS E CONVENCIONAIS. DISTINÇÃO. ABUSO DE DIREITO. CONFIGURAÇÃO. - Há de se distinguir as servidões prediais legais das convencionais. As primeiras correspondem aos direitos de vizinhança, tendo como fonte direta a própria lei, incidindo independentemente da vontade das partes. Nascem em função da localização dos prédios, para possibilitar a exploração integral do imóvel dominante ou evitar o surgimento de conflitos entre os respectivos proprietários. As servidões convencionais, por sua vez, não estão previstas em lei, decorrendo do consentimento das partes.

105 ALEIXO, Celso Quintella. Op. cit. p. 74.

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- Na espécie, é incontroverso que, após o surgimento de conflito sobre a construção de muro lindeiro, as partes celebraram acordo, homologado judicialmente, por meio do qual foram fixadas condições a serem respeitadas pelos recorridos para preservação da vista da paisagem a partir do terreno dos recorrentes. Não obstante inexista informação nos autos acerca do registro da transação na matrícula do imóvel, essa composição equipara-se a uma servidão convencional, representando, no mínimo, obrigação a ser respeitada pelos signatários do acordo e seus herdeiros. - Nosso ordenamento coíbe o abuso de direito, ou seja, o desvio no exercício do direito, de modo a causar dano a outrem, nos termos do art. 187 do CC/02. Assim, considerando a obrigação assumida, de preservação da vista da paisagem a partir do terreno dos recorrentes, verifica-se que os recorridos exerceram de forma abusiva o seu direito ao plantio de árvores, descumprindo, ainda que indiretamente, o acordo firmado, na medida em que, por via transversa, sujeitaram os recorrentes aos mesmos transtornos causados pelo antigo muro de alvenaria, o qual foi substituído por verdadeiro “muro verde”, que, como antes, impede a vista panorâmica. Recurso especial conhecido e provido. 106

3.3 Função social do contrato

Ainda que seja mais fácil visualizarmos a relação entre o adimplemento

substancial e a boa-fé objetiva, assim como o abuso de direito, o instituto

também está ligado à função social do contrato, cláusula geral disposta no art.

421 do Código Civil, na medida em que há interesse social na conservação dos

negócios jurídicos. 107

Corroborando tais idéias iniciais:

Enfim, bem se vê, também na vedação da resolução quando há inadimplemento substancial, exigência de manutenção do contrato que afinal, encontra eco último

106 REsp 935474 / RJ RECURSO ESPECIAL 2004/0102491-0 Relator (a) Ministro ARI PARGENDLER (1104) Relator (a) p/ Acórdão Ministra NANCY ANDRIGHI (1118) Órgão Julgador T3 - TERCEIRA TURMA Data do Julgamento 19/08/2008 Data da Publicação/Fonte DJe 16/09/2008 107 ALEIXO, Celso Quintella. Op. cit. p. 77.

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no reconhecimento não só no interesse da parte, mas do que para ela, e para a sociedade, representa a entabulação contratual, forma de transmissão de riquezas e de promoção dos valores constitucionais (...). 108

Cumpre destacar que o princípio em comento não existia

expressamente na legislação brasileira, sendo, portanto, uma inovação o artigo

421 do atual código que dispõe:

Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato.

Ao discorrer sobre o acima transcrito artigo, Celso Quintella Aleixo

assevera que:

Quando o código afirma que a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites de sua função social, não está, e nem poderia, sob pena de violação da constituição, a dizer que o móvel das partes ao celebrar um negócio que deve ser beneficente à sociedade. Isto seria a sua socialização, e não a sua funcionalização. Dar aos contratos uma função social não significa socializá-los, muito menos extirpá-los do direito privado. Os interesses particulares dos contratantes devem ser e são protegidos, mas não são o único aspecto relevante de uma relação obrigacional, já que agora lhe é determinada uma dúplice destinação. Paralelamente à função individual que lhe é originária, devem ser respeitados os interesses sociais que na situação concreta se apresentarem como relevantes, pois ninguém pode se utilizar de um instrumento concedido pelo ordenamento para atacar valores que este elege como basilares, notadamente os que tenham relação com a dignidade do ser humano. 109 (grifo nosso)

Nesse diapasão, deste preceito nota-se que ainda que o direito privado

regule as relações entre particulares, não há mais, no contexto de eticidade e

108 GODOY, Cláudio Luiz Bueno de. A função social do contrato. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 171 apud ALEIXO, Celso Quintella. Op. cit. p. 77. 109 ALEIXO, Celso Quintella. Op. cit. p. 80.

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socialidade percebidos no Código de 2002, como dissociá-lo dos reflexos que

a sociedade pode sofrer. 110

Nesse aspecto, importante observação:

Nesse aspecto, há muito o ordenamento jurídico já prevê, em algumas situações específicas em que o contrato não pode contrariar o interesse da coletividade. Assim, não é permitido às partes, por exemplo, perfazerem contrato que tenha por objeto herança de pessoa viva (art. 426). Também é nulo o contrato cujo objeto, ou o motivo determinante do negócio, se comum a ambas as partes, for ilícito (art. 166, I e III). Tais dispositivos bem ilustram os reflexos sociais gerados pela celebração de um contrato, e a preocupação do legislador com as suas conseqüências. A evolução do direito e as mudanças sociais criaram um ambiente em que tais intervenções pontuais, embora necessárias, se revelassem insuficientes para abranger a variedade de situações que podem surgir em torno de um contrato. A identificação de sua função social corresponde assim, a uma necessidade sentida pelo estado de limitar a autonomia contratual, em face da exigência social de garantir o interesse geral ou coletivo. 111 (grifo nosso)

Acresce ainda que como a função social do contrato está

regulamentada como cláusula geral “qualquer contrato está sujeito ao controle

de não contrariedade à função que lhe reconhece o ordenamento, à verificação

de sua conformidade aos objetivos que lhe são traçados pelo documento

constitucional e por sua legislação inferior”. 112

No que tange à liberdade de contratar e a função social do contrato,

Celso Quintella Aleixo afirma com maestria:

A função social torna-se razão determinante e elemento limitador da liberdade de contratar, na medida em que esta só se justifica na persecução dos

110 Ibidem, p. 78. 111 Ibidem, p. 79. 112 Loc. cit.

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fundamentos da República. Assim se percebe que o ordenamento não reconhece espaços ilimitados à liberdade de contratar, que a autonomia do indivíduo não pode chegar ao ponto de que ele utilize mal sua liberdade cause prejuízos desnecessários e injustos à sociedade para satisfazer seu interesse privado. É óbvio que dentre os objetivos da república escolhidos pelo constituinte está a possibilidade de crescimento pessoal, tanto que a carta magna reconhece a propriedade e a livre iniciativa, mas tais aspectos não podem ser analisados individualmente, e sim dentro do contexto social em que se inserem.113 (grifo nosso)

Há uma divergência no que concerne a fundamentação constitucional

da função social do contrato, alguns entendem que sua base é o princípio da

livre iniciativa, ao passo que “GISELDA HIRONAKA entende que o fundamento

está na função social da propriedade, na medida em que o contrato se destina

à circulação de bens. E para TEREZA NEGREIROS é a solidariedade social

que dá amparo à função social do contrato.” 114

Em outro sentido, é importante estabelecermos uma diferenciação

entre o princípio da boa-fé e a função social do contrato. Em linhas gerais,

enquanto este se refere ao contrato e os interesses da sociedade, aquele se

refere às condutas praticadas pelos contratantes entre si. 115

No que tange a diferenciação apontada, Humberto Theodoro a

esclarece:

Ofende-se o princípio da boa-fé quando o contrato prejudica injustamente uma das partes, ao passo que ofende-se a função social, quando os efeitos externos do contrato prejudicam injustamente os interesses da comunidade ou de pessoas estranhas ao vínculo obrigacional. 116

113 Ibidem, p. 81. 114 Ibidem, p. 81-82. 115 Ibidem, p. 82. 116 THEODORO JR., Humberto. O contrato e a sua função social. Rio de Janeiro : Forense, 2003, p. 49.

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CAPÍTULO III

APLICAÇÃO DA TEORIA DO ADIMPLEMENTO

SUBSTANCIAL NO DIREITO BRASILEIRO

Após a apresentação dos contornos gerais da teoria em foco no

capítulo anterior, nota-se que ela funciona como limite ao exercício da

faculdade de resolução do contrato por parte do credor. Assim, para a análise

da aplicabilidade do adimplemento substancial no nosso ordenamento jurídico,

objeto do presente capítulo, é necessário, inicialmente, a identificação dos

seus elementos essenciais.

1 - Requisitos

De acordo com Anelise Becker 117, os parâmetros que devem ser

observados são: a proximidade entre o efetivamente realizado pelo devedor e

o previsto no contrato, a satisfação proporcionada ao credor pela prestação

imperfeita e o esforço e a diligência do devedor em adimplir. 118

Em outro sentido, Celso Quintella Aleixo, pautado na opinião de Ruy

Rosado Aguiar Júnior 119, ao discorrer sobre o assunto, defende que:

A proximidade entre o efetivamente realizado pelo devedor e o previsto no contrato, por outro lado, é um elemento que não deve ser separado da satisfação do interesse do credor, para arrogar-se na qualidade de requisito autônomo, pois é justamente em razão do interesse da outra parte que se verifica a proximidade do que foi descumprido com o devido, no sentido da utilização da prestação. Essa utilidade é aferível do ponto de vista desse interesse, que funciona tanto como um

117 BECKER, Anelise. Op. cit. p. 63-65. 118 ALEIXO, Celso Quintella. Op. cit. p. 85. 119 AGUIAR JÚNIOR, Ruy Rosado de. Extinção dos Contratos por Incumprimento do Devedor. Rio de Janeiro: Aide, 2004,p. 131.

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parâmetro tanto para a mora em sentido estrito, quanto para os demais casos de cumprimento imperfeito da prestação. Assim, a melhor proposta é a opção por dois requisitos: a utilidade ao interesse do credor e a boa-fé. 120 (grifo nosso)

1.1 Utilidade ao interesse do credor

Para preencher este requisito é necessário que diante do

inadimplemento a essência do interesse do credor ainda exista, devendo-se,

portanto, constatar a utilidade e o interesse na prestação devida.

Quadra destacar que a existência deste elemento deve ser analisada

no caso concreto, por admitir inúmeras variações de acordo com as

circunstâncias, senão vejamos.

Ao se comprar um bem com custo superior aos outros ou ao se pagar

mais pela execução de um serviço, é natural que haja um nível maior de

expectativa e exigência do contratante. Nessas situações, será diferenciado o

parâmetro para se aferir a existência de abusividade no direito potestativo de

resolução do contrato, em casos de cumprimento defeituoso, por exemplo.

Assim, ainda que quantitativamente a desconformidade entre o devido e o

prestado seja ínfima, pode ser que não haja mais interesse por parte do

credor, situação em que não se poderá sustentar o adimplemento substancial,

estando autorizada a resolução do contrato. 121

Inversamente, há casos em que do ponto de vista quantitativo o

adimplemento é razoavelmente inferior ao devido, mas se verifica o interesse

do credor no contrato. Nesse sentido, tem se firmado a jurisprudência nos

casos de financiamento, como constata Celso Quintella Aleixo:

120 ALEIXO, Celso Quintella. Op. cit. p. 86. 121 ALEIXO, Celso Quintella. Op. cit. p. 89.

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A jurisprudência brasileira, notadamente a do tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, nos contratos que envolvam financiamento, manifesta uma tendência em permitir uma diferença maior, entre o devido e o prestado, em média até setenta por cento do valor total da dívida. Tal valoração se justifica, uma vez que nesse tipo de contrato existe uma margem de lucro extremamente alta, o que faz com que, mesmo que proporcionalmente avantajada, a diferença ainda possibilite que com o cumprimento parcial, o agente financiador recupere o valor emprestado e ainda aufira lucros de negociação, devendo buscar o restante por outros caminhos que não o da extinção do contrato por inadimplemento. 122 (grifo nosso)

Para ilustrar as afirmações acima, julgado do Tribunal de Justiça do

Rio Grande do Sul:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. Aplicável aos negócios jurídicos firmados entre as instituições financeiras e os usuários de seus produtos e serviços, as regras previstas na Lei 8.078/90. AUSÊNCIA DE MORA SOLVENDI. Existentes na avença disposições contrárias ao sistema de proteção e defesa do consumidor e ao princípio da boa-fé objetiva, a demonstrar atuação contratual contrária ao direito, ocorre invalidade das obrigações excessivas, afastando a mora solvendi. Ausente a mora solvendi, revela-se improcedente a ação. ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL. Verificando-se, na espécie, o adimplemento substancial do negócio jurídico (mais de 70% das parcelas contratadas), torna-se inviável o pedido de busca e apreensão do bem, devendo o credor buscar seu crédito em ação de cobrança própria. APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação Cível Nº 70008815524, Décima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rogerio Gesta Leal, Julgado em 23/12/2004) (grifo nosso)

Ademais, cumpre destacar que nem sempre o recebimento da

prestação pelo credor significa que o seu interesse foi atendido, devendo ser

122 Loc. cit.

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feita à análise no caso concreto, eis que “outras circunstâncias podem levar a

parte a aceitar a prestação, como por exemplo, a ocupação do imóvel

residencial após uma reforma insatisfatória, tendo como motivo o fato de o

proprietário não ter condições de morar em outro local enquanto não resolvida

contenda.” 123

1.1.1 Critérios para a avaliação do Interesse do Credor

Há um debate doutrinário acerca do critério que deve se adotado para

avaliar a gravidade do inadimplemento. Existindo, assim, três critérios: objetivo,

subjetivo e objetivo-subjetivo.

Complementando as informações acima, explicação valiosa sobre os

mencionados critérios:

Segundo o critério subjetivo, a análise deve ser feita investigando-se qual seria a solução adotada pelas partes, especialmente pelo credor, ao se deparar com a incompletude da prestação. (...) Ou seja, o intérprete deve recorrer à presumível vontade das partes, àquilo que estas determinariam se tivessem previsto o inadimplemento ínfimo. O critério objetivo, defendido majoritariamente pela doutrina italiana e por autorizada doutrina brasileira, e também pela americana, estabelece como guia a consideração da interdependência funcional entre as prestações e ao transtorno causado pelo inadimplemento à correlação que deve haver entre ambas. A necessidade de apreciação de outros elementos, além da mera correspectividade entre as prestações fez com que parte da doutrina tentasse conciliar apreciação objetiva com a subjetiva. (...) É verdadeiro que os elementos fáticos que se apresentarem ao intérprete no caso específico devem ser levados em consideração, para que se possibilite a análise acurada do interesse do credor. O tipo de contrato, o comportamento e as condições em que

123 Ibidem, p. 94.

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ambas as partes se encontravam da conclusão do negócio, e , especialmente, da execução das prestações e todas as demais podem e devem ser objeto de apreciação, a fim de que se determine, no caso concreto se o interesse do credor foi ou não atendido. Mas isso não afasta ou mitiga a objetividade do critério. Se, diante da situação concreta apresentada restar verificado que o interesse do credor está em desacordo com os parâmetros de lealdade e correção exigidos pela boa-fé, ou contrariar a finalidade do direito que lhe é concedido pelo ordenamento, a resolução lhe será negada, sem que seja dada importância a qual seria a hipotética vontade das partes diante do problema, defendida pela teoria subjetiva. 124 (grifo nosso)

1.2 Boa-fé do devedor

Segundo este requisito, ainda que o devedor tenha inadimplido parte

de sua obrigação contratual deve agir de boa-fé, tanto no seu aspecto

subjetivo como no objetivo, para que possa ser aplicada a teoria do

adimplemento substancial.

No que concerne à boa-fé subjetiva, esta deve estar presente, uma vez

que sua dispensabilidade poderia gerar prejuízos econômicos e sociais, pois

estimularia fraudes, aumentaria a insegurança no comércio e o

inadimplemento, bem como os custos do negócio. 125

Nota-se que apenas o descumprimento intencional praticado de má-fé,

com o intuito de prejudicar os direitos da outra parte, impede a aplicação da

teoria do adimplemento substancial.

Discorrendo sobre o assunto, Celso Quintella Aleixo traz um claro

exemplo em que houve um desvio intencional na prestação respeitando-se a

boa-fé subjetiva:

124 Ibidem, p. 95.

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Uma outra hipótese interessante, que já foi objeto de julgamento pelos tribunais americanos, versou sobre contenda provocada porque o construtor plantou o edifício a uma polegada do local exato previsto no contrato, pois se a cláusula tivesse sido cumprida à risca, a aba do telhado ultrapassaria a linha divisória do terreno vizinho. A Corte de Nova York considerou que o construtor, em que pese o descumprimento, fazia jus ao recebimento integral do valor do contrato. Assim, uma variação intencional, mas de boa-fé, entre as especificações previstas no contrato, e a execução da prestação, se atendem ao interesse do credor, proporcionando a estes os mesmos benefícios esperados das especificações originais, não são causa de resolução do contrato.

Em relação à boa-fé objetiva, por toda a principiologia em que se pauta

a teoria do adimplemento substancial, em especial justamente no mencionado

princípio, o mínimo que se espera do devedor é que sua conduta seja de

acordo com tais parâmetros. Contudo, há entendimento de Anelise Becker em

sentido diverso:

Parece mais conveniente, porém, deixar a cargo do julgador, frente às circunstâncias do caso concreto, a decisão acerca da necessidade ou não de exigir tal conduta, para permitir-lhe fazer justiça, o que, afinal, é o objetivo maior. Muitas vezes, ainda que o devedor não se tenha esforçado devidamente em cumprir o contrato com exatidão, poderá ser ainda mais injusto resolve-lo se efetivamente satisfeito o interesse do credor. 126

2. Essencialidade do bem como critério auxiliar

Além dos requisitos apresentados, há critérios que devem ser levados

em consideração pelo juiz para definir a aplicabilidade ou não da teoria do

125 Ibidem, p. 97. 126 BECKER, Anelise. Op. cit. p. 65 apud Aleixo, Celso Quintella. Op. cit. p. 99.

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adimplemento substancial no caso concreto, dentre eles, destaca-se a

essencialidade do bem que será abordada a seguir.

Ressalta-se neste ponto, a impossibilidade de listar taxativamente

todos os critérios que podem ser utilizados, eis que de acordo com as precisas

palavras de Celso Quintella Aleixo:

(...)‘as questões concernentes ao adimplemento substancial são normalmente questões de fato’. Isso porque não existe, nem pode existir, por conta da elasticidade das noções que circundam o tema, uma fórmula matemática pré-definida para a caracterização do adimplemento substancial, uma receita que, de antemão, oriente todos os elementos que serão levados em consideração e quais serão excluídos, pela subsunção do fato às normas. 127

No mesmo sentido, complementa com maestria Anelise Becker:

Isto implica em um alargamento dos limites do poder judicial na apreciação do caso concreto, o que por sua vez, pressupõe uma mudança no próprio método de aplicação do direito, ou seja, a superação do raciocínio lógico-subsuntivo pelo da concreção. Apenas este último método, que utiliza parâmetros concretos para a solução de casos concretos, admite um tipo de construção jurisprudencial como a doutrina do adimplemento substancial. Decorre daí a necessidade de apurarem-se cada vez mais tais parâmetros (standards), pois eles serão os limites para o julgador. 128

A essencialidade do bem não deve ser um critério absoluto e definitivo

e sim auxiliar para que no caso concreto, o juiz pondere mais um elemento e

possa chegar a uma conclusão mais justa acerca da aplicabilidade ou não da

teoria em questão.

127 ALEIXO, Celso Quintella. Op. cit. p. 111. 128 BECKER, Anelise. Op. cit. p. 63 apud ALEIXO, Celso Quintella. Op. cit. p. 111.

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O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, com auxílio do requisito

em comento, decidiu pela manutenção de promessa de compra e venda de

terreno em loteamento, tendo em vista que, dentre outras questões, o imóvel

foi utilizado pelo devedor para erguer sua residência. 129

DIREITO CIVIL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. TERRENO LOTEADO. ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL. RESOLUÇÃO INCABÍVEL. RECONVENÇÃO. INOVAÇÃO RECURSAL. CLÁUSULAS ABUSIVAS. INEXISTÊNCIA. Demonstrado que o promitente-comprador pagou quase 70% do preço do terreno, sobre o qual, aliás, edificou sua residência, caracterizado está o adimplemento substancial, a inviabilizar a resolução do ajuste, ressalvado ao promitente-vendedor o direito à cobrança do saldo devedor. Hipótese em que o promitente-comprador acenou com a não conclusão da infra-estrutura do loteamento, circunstância a mais a impedir a resolução do contrato, em vista da exceptio non adimpleti contractus. Direito à moradia que também deve ser considerado no caso concreto. Apelo relativo à reconvenção de que se conhece parcialmente, em vista da inovação recursal. Reajuste pelo CUB não vedado pelo ordenamento jurídico, além de ser, inclusive, favorável ao promitente-comprador. Juros incidentes apenas em caso de mora, no percentual permitido em lei. Multa contratual de 10%, percentual permitido na data da contratação ¿ 1994. RECURSO CONHECIDO EM PARTE E PARCIALMENTE PROVIDO NA PARTE CONHECIDA. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70002184729, Décima Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Pedro Luiz Pozza, Julgado em 27/11/2003)

O Superior Tribunal de Justiça também impediu a resolução do

contrato usando a mesma linha de fundamentação, ao considerar nas palavras

do Relator que se trata de ‘bens essenciais à continuidade das atividades da

empresa, por se tratar de maquinário próprio à sua atividade produtiva’, no

julgado abaixo 130:

129 ALEIXO, Celso Quintella. Op. cit. p. 116. 130 Loc. cit. .

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ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. Busca e apreensão. Deferimento liminar. Adimplemento substancial. Não viola a lei a decisão que indefere o pedido liminar de busca e apreensão considerando o pequeno valor da dívida em relação ao valor do bem e o fato de que este é essencial à atividade da devedora. Recurso não conhecido. (STJ, RESP 469577/SC, 4ª Turma, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, julg. Em 25.03.2003)

Por outro lado, esse mesmo critério de essencialidade dos bens pode

beneficiar o credor “se o bem oferecido por este como contraprestação se

revestir de um caráter de essencialidade que justifique sua retomada pelo

prejudicado, com a dissolução do contrato” 131 .

Complementando as idéias supra, Celso Quintella Aleixo aduz:

Suponha-se que o credor justamente precise do valor correspondente ao bem negociado para possibilitar a aquisição de outro, que lhe tenha a mesma serventia, como por exemplo, o sujeito que vende um carro que utiliza profissionalmente para, com o resultado da venda, comprar outro. É justo que aquele que se privou de um bem essencial, alienando-o, para adquirir outro, seja prejudicado nesta nova aquisição porque o outro contratante deixou de cumprir o avençado? Se do ponto de vista econômico, for imprescindível ao prejudicado a retomada do bem, o que somente será possível com a resolução do contrato, e nenhuma outra circunstância indicar solução diversa, o inadimplemento não pode ser considerado como ínfimo, já que não atende aos interesses legítimos do credor. 132

131 Ibidem, p. 117 132 Loc. cit.

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3. Hipóteses de aplicação da teoria do adimplemento

substancial

Diante da ausência de positivação expressa da teoria em foco, com o

auxílio do direito comparado e das cláusulas gerais do nosso Código Civil atual

deve-se buscar a solução mais adequada para as dúvidas que surgem ao se

dar um maior espaço para a aplicabilidade da teoria do adimplemento

substancial.

A partir de agora se passa a analisar tais questões, que de uma forma

geral, geram discussão doutrinária e posições divergentes.

3.1 Cláusula resolutiva expressa

Pelo princípio da autonomia da vontade é lícito as parte delimitar

livremente as cláusulas contratuais, desde que estas estejam em conformidade

com as normas de ordem pública e com os princípios gerais do direito.

Destarte, admite-se no nosso ordenamento jurídico a definição prévia

das conseqüências de um eventual inadimplemento, dentre elas, a que

interessa nesse tópico é a de resolução do contrato.

Em relação a essa possibilidade das partes estabelecerem uma

cláusula resolutiva expressa, surge a seguinte indagação: é possível renunciar

ao adimplemento substancial?

Essa possibilidade não deve ser admitida por se mostrar contrária a

normas de ordem pública, em especial, a cláusula geral da boa-fé objetiva

presente no art. 422 do Código Civil de 2002 e o abuso de direito, nos termos

do art. 187 do mencionado código. Ademais, tal prática tenderia a se tornar

freqüente, principalmente nos casos em que o devedor fosse vulnerável na

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relação obrigacional, o que inviabilizaria a aplicabilidade do adimplemento

substancial no nosso ordenamento.

Corroborando o entendimento acima:

Não há dúvida de que os contratantes devem guardar, na contratação e na execução do contrato, a boa-fé objetiva. Também não há dúvida de que, de acordo com a redação do art. 422 do Código Civil, a boa-fé objetiva é norma de ordem pública, portanto inderrogável pela vontade das partes. Assim, tendo a teoria do adimplemento substancial como fundamento a boa-fé objetiva, ou seja, dela decorre, é certo que as partes não podem estabelecer cláusula que a contraria, sob pena de ser considerada abusiva. De nada adiantaria o legislador impor a boa-fé objetiva a toda e qualquer contratação se fosse admitido às partes estabelecer cláusulas que indiretamente afastem a sua aplicação. 133

Há parte da doutrina, contudo, acompanhando o posicionamento dos

tribunais italianos que sustenta estar “afastada ou preclusa a possibilidade de o

magistrado valorar a gravidade do incumprimento quando este se enquadrar

em cláusula expressamente acordada, visto que tal gravidade já foi valorada e

expressamente acordada entre as partes” 134 .

Diante da posição acima, Luiz Eduardo Bussatta pondera que:

Também não se poderá deixar de levar em conta que a cláusula resolutiva implica o reconhecimento pelas partes de que o inadimplemento lesa seus interesses e admite a resolução. Afinal, como dito, as partes, ao menos em tese, livremente valoraram a gravidade de descumprimento e entenderam que em tais hipóteses o resultado que mais lhes interessa é a extinção do vínculo. Nessa medida, havendo verdadeira cláusula resolutiva expressa (exclui-se a mera cláusula de estilo), somente em casos extremos (em que a cláusula é realmente contrária à boa-fé objetiva) será lícito ao magistrado desconsiderar a cláusula resolutória e declarar o contrato mantido. 135

133 BUSSATTA, Luiz Eduardo. Op. cit. p. 96. 134 Loc. cit. 135 Ibidem, p. 97.

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3.2 Exceção do contrato não cumprido

A exceção do contrato não cumprido ou exceptio non adimpleti contratus

está prevista no art. 476 do Código Civil de 2002 que dispõe:

Art. 476. Nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro.

Ela pressupõe completa inexecução do contrato, assim “nada mais

justo e equânime que permitir àquele que já estiver sendo prejudicado pelo

inadimplemento evite um prejuízo maior, tendo que prestar o que deve ao

inadimplente” 136.

No que tange à teoria em estudo, há a seguinte dúvida: essa defesa

poderia ser sustentada em casos de inadimplemento de escassa importância?

Como já destacado inúmeras vezes ao longo do capítulo, o

adimplemento substancial impede a dissolução do vínculo contratual, da

mesma forma, não está em consonância com os princípios e cláusulas gerais

que fundamentam a teoria em foco, a postura do credor de descumprir a sua

obrigação diante do adimplemento substancial do devedor que deverá estar de

boa-fé.

Corroborando o entendimento acima:

A doutrina nacional mais autorizada, amparada pela estrangeira, responde pela negativa, argumentando que a recusa do contratante em efetuar sua prestação motivado pelo descumprimento insignificante é ato contrário à boa-fé, o mesmo ocorrendo também quando a prestação principal é recusada por conta de um descumprimento de uma prestação secundária da outra parte. Vale transcrever aqui a orientação de Serpa Lopes: ‘Sob inspiração desse ponto de vista, se, de um lado, aos contratantes não é necessário suportar sacrifícios

136 ALEIXO, Celso Quintella. Op. cit. p. 107.

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incompatíveis com seus recursos, para assegurar uma impecável execução e suas obrigações, por outro lado, a idéia de tolerância necessária entre eles tem aplicação quando o autor não cumpriu exatamente sua prestação, mas esse defeito de execução da prestação ou as insuficiências que a diminuem são de escassa importância olhadas em seu conjunto’. 137

3.3 Cumprimento defeituoso

Esse tipo de violação positiva do contrato foi abordada no primeiro

capítulo, cumprindo ressaltar novamente que o defeito quantitativo se verifica

quando o devedor desrespeita o princípio da integralidade, cumprindo

parcialmente a prestação a que está adstrito, enquanto que o qualitativo

quando há a realização da prestação de modo distinto do previsto na

obrigação, fora do local estabelecido no contrato ou previsto em lei, com a

qualidade diversa da devida ou de coisa diversa da devida.

Em relação a este ponto, a principal questão é: quando há

cumprimento defeituoso da prestação principal pode ser aplicado o

adimplemento substancial?

Inicialmente devem ser analisados os casos em que o cumprimento

defeituoso é quantitativo, o que em geral, ocorre nas prestações em dinheiro.

Nessas hipóteses pode e deve ser aplicada a teoria em comento, uma vez que

o adimplemento substancial de uma prestação em dinheiro em regra manterá o

interesse do credor, pois a ínfima parte inadimplida será paga com os devidos

acréscimos decorrentes do atraso, bem como a conduta do credor no sentido

de dissolver o vínculo contratual seria abusiva.

Corroborando o entendimento acima:

Tal se dá especialmente nas prestações em dinheiro. Caso o devedor venha a cumprir boa parte do pactuado, faltando, assim, pequena parte a ser adimplida, não

137 Loc. cit.

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parece haver dúvida de que na grande maioria dos casos o contrato mantém a sua função econômico-social, de forma que não se justificaria o seu desfazimento. De fato, a prestação em dinheiro, objetivamente falando, sempre interessa ao credor, por ser denominador comum das trocas, assim como as perdas e danos que também são quantificadas em pecúnia. Pode-se, portanto, concluir que, em se tratando de prestação em dinheiro, o recebimento parcial interessa ao credor, bem como a cobrança posterior da quantia faltante. Logo, toda vez que a prestação em dinheiro, ainda que inexata, aproximar-se do valor efetivamente devido, haverá inadimplemento de escassa importância, e o contrato deverá ser mantido. 138

Por outro lado, no que concerne ao cumprimento defeituoso qualitativo,

dependendo do caso concreto a teoria do adimplemento substancial pode ou

não ser aplicada. Conforme exposto no início do capítulo, nessas situações,

ainda que quantitativamente a desconformidade entre o devido e o prestado

seja ínfima, pode ser que não haja mais interesse por parte do credor, devido à

frustração de suas expectativas ou a um simples detalhe na execução de um

serviço, por exemplo, que represente um descumprimento total da obrigação.

Complementando as idéias apresentadas:

Em se tratando de inexatidão qualitativa, deve o julgador ter especial cuidado ao ponderar quanto à gravidade do descumprimento, na medida em que, sob as vestes de aparente inexatidão, poderá estar escondido verdadeiro descumprimento total da obrigação, por ter sido entregue aliud pro alio. Ainda se assim não for, deve-se verificar se a prestação satisfaz os interesses objetivos do credor, visto que a diferença qualitativa importará, não raras vezes, na total inutilidade da prestação. Não há dúvida, por conseguinte, de que a inexatidão da prestação principal entra no âmbito de aplicação da teoria do adimplemento substancial, devendo-se, então, antes de deferir a resolução do contrato, valorar a importância do inadimplemento, tendo em conta, como já ressaltado, de um lado, a aproximação existente entre a prestação inexata e o programa contratual e, de outro, a função

138 BUSSATTA, Luiz Eduardo. Op. cit. p. 113.

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econômico-social do contrato, o que importa dizer, a utilidade normal da prestação. 139

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul possui julgado em que

“envolvia pequeno descumprimento (detalhes do acabamento) por parte do

empreiteiro” 140, transcrito a seguir:

CIVIL. EMPREITADA. ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL. RESOLUÇÃO INADMISSÍVEL. 1 É INADMISSÍVEL, PORQUE DESERTA, A APELAÇÃO INTERPOSTA SEM PROVA (CPC-511). PRECEDENTE DO STJ. APELAÇÃO ADESIVA NAO CONHECIDA. 2. O ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL DA PRESTACAO NAO AUTORIZA A RESOLUCAO DO CONTRATO DE EMPREITADA (CC-1092 PAR-UNICO). A PRESTACAO IMPERFEITA AUTORIZA, AO REVÉS, A CONDENAÇÃO EM PERDAS E DANOS. 3. APELAÇÃO PROVIDA EM PARTE. (Apelação Cível Nº 597044718, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Araken de Assis, Julgado em 17/04/1997).

3.4 Inadimplemento de prestação acessória

Em relação à hipótese de inadimplemento de prestação acessória, Luiz

Eduardo Bussatta ao discorrer sobre assunto, apresenta uma preciosa síntese

dos casos que ensejariam a aplicabilidade da teoria em questão, senão

vejamos:

Pelo exposto conclui-se que, de acordo com a teoria do adimplemento substancial, o incumprimento de obrigação acessória somente poderá acarretar o desfazimento do contrato quando reflete com tal gravidade na prestação principal que esta não possa ser cumprida ou impeça o resultado típico contratual ou, ainda, torne a prestação principal inútil ao credor, situações essas que, sem sobra de dúvida, refletem de forma grave na economia contratual, retirando não só o sinalagma como também a função econômico-social do contrato. 141

139 Ibidem, p. 116. 140 Loc. cit. 141 Ibidem, p. 119.

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4. Efeitos

Diante da limitação ao direito de resolução dos contratos advinda da

aplicação da teoria do adimplemento substancial, passa-se a analisar as

possibilidades conferidas ao credor para que seja restabelecido o equilíbrio do

contrato. 142

Dessa maneira, “as opções podem variar, podendo o credor, a seu

critério, optar pela que lhe pareça mais conveniente, em prejuízo de reclamar

eventuais perdas e danos complementares” 143.

4.1 Abatimento proporcional

Inicialmente, deve-se destacar que essa solução só é possível quando

o objeto da prestação do credor seja divisível. Ao discorrer sobre o assunto,

Celso Quintella Aleixo apresenta precisa explicação:

A prestação defeituosa ou insuficiente pode, em certos casos, ser remediada com facilidade, mediante a simples devolução proporcional do que foi pago e não foi prestado, ou mediante o reembolso ao credor das despesas que se fizeram necessárias para a obtenção do regular resultado integral previsto no contrato. Se a obrigação do credor insatisfeito não tiver sido ainda cumprida, ou totalmente cumprida, ele pode deduzir do que deve o que for necessário para contrabalancear a perda que sofreu. (...) O abatimento proporcional da contraprestação devida pela parte insatisfeita, embora possível de se cumulado com eventuais perdas e danos decorrentes do inadimplemento, não pode ser cumulado com o pedido de cumprimento, pois é incompatível que aquele que queira a redução de sua prestação, possa também pedir que a outra parte cumpra totalmente o acordado. A admissão conjunta das duas medidas implicaria em um

142 ALEIXO, Celso Quintella. Op. cit. p. 143 Ibidem, p. 102.

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enriquecimento sem causa em favor de um dos contratantes. Em eventual ação judicial é possível, contudo, que tais pretensões sejam deduzidas sob a forma de pedidos alternativos, em que o autor formule um ou outro pedido, de forma sucessiva ou não. 144

4.2 Pedido de cumprimento

No caso de ainda haver interesse e utilidade da prestação para o

credor, dentre as opções de restabelecimento do equilíbrio do contrato, a

insistência na concretização do contrato de acordo com o estabelecido é a

melhor solução, sendo constantemente indicada pelo judiciário. 145

Neste sentido, dois julgados do Tribunal de Justiça do Rio Grande do

Sul:

AGRAVO INTERNO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. RESOLUÇÃO DO CONTRATO. ANTECIPAÇÃO DA TUTELA. REINTEGRAÇÃO NA POSSE. DESCABIMENTO. Conforme precedentes jurisprudenciais, inclusive do STJ, inviável a reintegração liminar do promitente-vendedor na posse de imóvel prometido vender, ainda que ante a inadimplência do promitente-comprador. Caso concreto, ademais, em que apenas uma das quatro parcelas do preço não foi paga, tendo sido, ademais, consignada em juízo, o que não afasta a possibilidade de ser reconhecido o adimplemento substancial a impedir a resolução do ajuste, cabendo, quando muito, a cobrança da parcela devida. Ainda, conexa a presente demanda com a consignatória, a procedência dessa impedirá a resolução do ajuste. Agravo interno, ademais, que não ataca todos os fundamentos da decisão agravada. RECURSO IMPROVIDO, COM APLICAÇÃO DE MULTA. UNÂNIME. (Agravo Nº 70010878403, Décima Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Pedro Luiz Pozza, Julgado em 03/03/2005) (grifo nosso)

144 Ibidem, p. 104. 145 Ibidem, p. 105.

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APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. CÉDULAS DE CRÉDITO INDUSTRIAL COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AUSÊNCIA DE DISCRIMINAÇÃO DO VALOR DO DÉBITO NA NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL. Dispensada a indicação do valor do débito na notificação que se destina a comprovar a mora nas dívidas garantidas por alienação fiduciária. Exegese da Súmula 245, STJ. ALEGAÇÃO DE QUITAÇÃO DO DÉBITO. Descabida. INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. Aplicável aos negócios jurídicos firmados entre as instituições financeiras e os usuários de seus produtos e serviços, as regras previstas na Lei 8.078/90. SOBRETAXA DE 4% AO MÊS, CUMULADA COM CORREÇÃO MONETÁRIA. Abusividade. AUSÊNCIA DE MORA SOLVENDI. Existentes na avença disposições contrárias ao sistema de proteção e defesa do consumidor e ao princípio da boa-fé objetiva, a demonstrar atuação contratual contrária ao direito, ocorre invalidade das obrigações excessivas, afastando a mora solvendi. Ausente a mora solvendi, revela-se improcedente a ação. ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL. Caracterizado o adimplemento substancial, fica impedida a retomada dos bens, restando ao credor a possibilidade de buscar seu crédito através da competente ação de cobrança. ÔNUS SUCUMBENCIAIS. Invertidos. Os honorários advocatícios devem ser corrigidos pelo IGP-M até seu efetivo pagamento. APELO PROVIDO. (Apelação Cível Nº 70009961400, Décima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rogerio Gesta Leal, Julgado em 02/12/2004) (grifo nosso)

4.3 Perdas e danos

O pedido de perdas e danos compreende o que o credor efetivamente

perdeu e o que razoavelmente deixou de lucrar, consoante art. 402 do atual

Código Civil, podendo ser feito cumulativamente com as duas opções acima

descritas ou isoladamente.

Esse tipo de indenização se justifica pelos prejuízos advindo do

inadimplemento, ainda que de escassa importância, pois já que em tais casos

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é imposta a manutenção do contrato, ao menos devem ser compensados os

eventuais danos sofridos.

Nessa forma, nos termos do art. 389 do mencionado código:

Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.

Complementando o artigo acima transcrito Celso Quintella Aleixo

afirma que:

Em tais perdas se incluem a restituição, corrigida monetariamente, proporcional à parte descumprida, do que foi prestado pelo credor, como visto no item 1.1 supra, ou seu equivalente pecuniário, se a prestação do credor for divisível ou impossível a restituição; os danos suportados pelo recebimento incompleto, como, por exemplo, a contratação de terceiro para corrigir o defeito da prestação; além de eventuais lucros cessantes. 146

Para ilustrar a idéia de perdas e danos, claro exemplo de José Roberto

de Castro Neves:

Toma-se o motorista de táxi que vai a uma oficina e combina o conserto de seu automóvel. No dia determinado para a entrega do veículo, a oficina falha. Pior, fica um mês para devolver o carro. Pois além da perda pelo inadimplemento da obrigação de consertar o táxi no dia estabelecido (no que seria o dano emergente), o motorista ficou um mês sem circular com o seu carro e logo deixou de receber por todo esse tempo (prejuízo qualificado como lucros cessantes, pois resulta no que o taxista deixou de ganhar). Na junção dos danos emergentes com os lucros cessantes o ordenamento jurídico pretende abraçar todo o prejuízo sofrido pelo credor lesado. O dano material indenizado, contudo, é apenas aquele que pode razoavelmente ser identificado, não se indenizando o dano meramente possível. 147

146 Ibidem, p. 105-106. 147 NEVES, José Roberto de Castro. Op. cit. p. 378.

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Ademais, ressalta-se que “também nos casos de adimplemento

substancial, o credor tem o dever acessório de não contribuir para o

agravamento de seu próprio prejuízo, originado da boa-fé objetiva, sob pena de

ter que arcar com os danos resultantes do agravamento” 148. Assim, não pode

efetuar despesas desnecessárias para reparar um cumprimento defeituoso 149,

como no caso de uma troca de piso em um apartamento em que há um

pequeno erro na colocação de uma tábua corrida e o credor decide remover

todas e comprar novas. Nessa hipótese é notório que há meios mais brandos,

menos dispendiosos que podem efetivamente resolver a questão.

Complementando as informações acima, importante observação

relativa a adimplemento substancial com cláusula penal fixada previamente:

No caso de ter havido prefixação através de cláusula penal dos prejuízos resultantes do inadimplemento, o cumprimento substancial permite que o juiz reduza equitativamente a penalidade, na forma do artigo 413 do Código Civil. Mesma conseqüência deve ser motivada pela cláusula penal moratória, que também deve ser proporcionalmente reduzida, na medida do que foi pago. 150

148 ALEIXO, Celso Quintella. Op. cit. p.106. 149 Loc. cit. 150 Loc. cit.

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CONCLUSÃO

Ainda que não haja positivação expressa em nosso atual Código Civil,

este é composto por princípios e cláusulas gerais que fundamentam a

aplicação da teoria do adimplemento substancial. Nesse sentido, a doutrina

brasileira deve dar maior importância ao presente tema, para que se

estabeleçam parâmetros teóricos que auxiliem o Poder Judiciário a dizer no

caso concreto se cabe ou não a aplicação da teoria em comento.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça a tem utilizado tão

somente nos contratos em o inadimplemento ocorre quando faltam poucas

parcelas para que seja cumprido o programa contratual estabelecido entre as

partes.

Contudo, como foi exposto no curso do presente trabalho, a teoria em

foco pode ser aplicada quando há o cumprimento defeituoso no seu aspecto

qualitativo, casos mais ricos do que a mera abordagem quantitativa. Nesse

sentido, há crescente número de julgados no Tribunal de Justiça do Rio

Grande do Sul em que no caso concreto o Juiz deve analisar a sua

aplicabilidade, criando-se requisitos, critérios auxiliares e, portanto,

contribuindo para o seu desenvolvimento no nosso país.

Ademais, observa-se que já se fixou como parâmetro da teoria no

nosso ordenamento jurídico a ponderação entre a utilidade e o interesse do

credor aliada a boa-fé do devedor e o prejuízo que decorreria não só para o

devedor, como também para terceiros, em razão da função social do contrato,

a dissolução do vínculo entre os contratantes.

Por fim, verifica-se nas hipóteses de adimplemento substancial a

impossibilidade de renunciá-lo por meio de cláusula resolutiva expressa, bem

como de utilizar como defesa a exceção do contrato não cumprido.

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BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

ALEIXO, Celso Quintella. Adimplemento substancial e resolução dos contratos.

Dissertação (Mestrado) – UERJ. Rio de Janeiro, 2005.

BUSSATA, Luiz Eduardo. Resolução dos contratos e teoria do adimplemento

substancial São Paulo: 2007.

COSTA, Judith. Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro: Forense,

Vol.5, tomo I, 2006.

MORAES, Maria Celina Bodin de (Coordenadora). Princípios do Direito Civil

Contemporâneo. Rio de Janeiro: Renovar, 2006.

NEVES, José Roberto de Castro. Direito das Obrigações. Rio de Janeiro: CZ

Editora, 2009.

SCHREIBER, Anderson. A tríplice transformação do

adimplemento:Adimplemento substancial, inadimplemento antecipado e outras

figuras. Revista Trimestral de Direito Civil, vol 32. Rio de Janeiro: Padma, out-

dez/2007.

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BIBLIOGRAFIA CITADA

1 - ALEIXO, Celso Quintella. Adimplemento substancial e resolução dos

contratos. Dissertação (Mestrado) – UERJ. Rio de Janeiro, 2005.

2 - BUSSATA, Luiz Eduardo. Resolução dos contratos e teoria do

adimplemento substancial São Paulo: 2007.

3 - COSTA, Judith. Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro: Forense,

Vol.5, tomo I, 2006.

4 - MORAES, Maria Celina Bodin de (Coordenadora). Princípios do Direito Civil

Contemporâneo. Rio de Janeiro: Renovar, 2006.

5 - NEVES, José Roberto de Castro. Direito das Obrigações. Rio de Janeiro:

CZ Editora, 2009.

6 - SCHREIBER, Anderson. A tríplice transformação do

adimplemento:Adimplemento substancial, inadimplemento antecipado e outras

figuras. Revista Trimestral de Direito Civil, vol 32. Rio de Janeiro: Padma, out-

dez/2007.

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ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 2

AGRADECIMENTO 3

DEDICATÓRIA 4

RESUMO 5

METODOLOGIA 6

SUMÁRIO 7

INTRODUÇÃO 8

CAPÍTULO I

ADIMPLEMENTO E INADIMPLEMENTO

DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS 11

1.1 - Adimplemento 11

1.2 – Inadimplemento 16

1.2.1 – Modalidades de inadimplemento 18

CAPÍTULO II

O ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL

E SEUS FUNDAMENTOS 25

1 – Conceito e contornos gerais 25

2 – Direito Comparado 27

2.1 – História da Resolução do Contrato

por inadimplemento 28

2.2 – Direito Italiano 31

2.3 – Direito Alemão 32

2.4 – Direito Espanhol 34

2.5 – Convenção das Nações Unidas

sobre os contratos de C/V Internacional

de Mercadorias (Viena, 1980) 34

2.6 – Princípios acerca dos Contratos

Comerciais Internacionais do UNIDROIT 35

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3 – Fundamentos Legais e Constitucionais

do Adimplemento Substancial 37

3.1 – O princípio da Boa-fé Contratual 38

3.1.1 – A Boa-fé objetiva e a Boa-fé subjetiva 39

3.1.2 – A tríplice função do princípio da

Boa-fé objetiva 41

3.2 – Abuso de Direito 44

3.2.1 – O ato abusivo e as suas diferenças

Com o ato ilícito 50

3.3 – Função social do contrato 53

CAPÍTULO III

APLICAÇÃO DA TEORIA DO ADIMPLEMENTO

SUBSTANCIAL NO DIREITO BRASILEIRO 57

1 – Requisitos 57

1.1 – Utilidade ao interesse do credor 58

1.1.1 – Critérios para avaliação do

Interesse do credor 60

1.2 – Boa-fé do devedor 61

2 – Essencialidade do bem como critério auxiliar 62

3 – Hipóteses de aplicação da Teoria do

Adimplemento Substancial 66

3.1 – Cláusula Resolutiva Expressa 66

3.2 – Exceção do contrato não cumprido 68

3.3 – Cumprimento Defeituoso 69

3.4 – Inadimplemento de prestação acessória 71

4 – Efeitos 72

4.1 – Abatimento proporcional 72

4.2 – Pedido de cumprimento 73

4.3 – Perdas e danos 74

Page 82: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL · 2015-08-11 · princípio da boa-fé objetiva, no abuso de direito e na função social do contrato. Destarte, para melhor compreensão

82

CONCLUSÃO 77

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 78

BIBLIOGRAFIA CITADA 79

ÍNDICE 80