Domingo, 19 de Outubro de 2014 Nº 176 SÉRIE III...

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SEKE IA BINDO | O mar nunca aceita estranhos em casa. Cedo ou tarde atira os intrusos para as praias. Foi assim que che- gou a Pinda um homem e um cão, feitos destroços de uma tempestade que afundou o barco em que viaja- vam. O náufrago falava uma língua estranha e não sabia revelar o seu nome. Por isso foi nomeado de Mun- tu. O cão tinha pelo abundante e co- breado, era corpulento e tinha olhos meigos. Chamaram-lhe Mbizi. Quando os pescadores encontra- ram o homem expulso pelo mar, o cão lambia-lhe o rosto para aquecê-lo e ele respirava tão levemente que se perce- bia a extinção a qualquer momento. Foi agasalhado, como eram todos os viajantes que aportavam a Pinda. Co- meu e bebeu, aprendeu a falar e a di- zer. Um dia fez a sua casa e ali ficou com o cão. Muntu era da grande famí- lia de Pinda, que se estendia até ao mar do Nzeto. O seu espírito de via- jante levou-o ao Mbridge e até mais longe, ao mar aberto do Ambriz. Muntu era um viajante perpétuo e mal descansava os pés partia logo para outra viagem. Nos intervalos sabia descrever às crianças tudo o que via, todos os trilhos que abria, todas as ideias que punha a voar no céu livre do reino da paz e da abun- dância. Ele descobriu que os jacarés do Mbridge mergulham nas águas profundas do rio, para não apanha- rem os pingos de chuva. O chefe da aldeia então pergun- tou-lhe: - Como resististe ao mar? E ele respondeu: - Porque tinha de salvar o meu cão. Jamais partiria, nem para o mundo dos mortos, sem o Mbizi. - Mas foi ele que te acalentou quando sucumbias na praia… - Por isso resisti até ao limite. Sa- bia que um dia ele me ia ensinar o que é a amizade de braços abertos e a lealdade até ao último alento. Muntu não constituiu família nem aceitou um palmo de terra para fazer a sua lavra. Mas traba- lhava nas lavras dos vizinhos e ajudava nas colheitas. Por isso todos o alimentavam de bom gra- do, até ao dia em que voltava a partir com o seu fiel Mbizi, percor- rendo caminhos escondidos nas matas fechadas do Norte. As crianças rondavam a sua ca- sa, descentrada da aldeia. Esprei- tavam de longe e viam-no a medi- tar, sentado num banco à porta de casa. O cão ficava enroscado a seus pés, indiferente ao tempo que escorria vagarosamente, des- de a luz crua do amanhecer ao poente irradiando ondas de um vermelho fogueado. Um dia as crianças chegavam de mansinho para espreitar Muntu e ele já tinha partido para outra via- gem. Era mais triste do que ver partir a bela borboleta prestes a ser apanhada. Quando Muntu re- gressava havia alegria na aldeia, porque nessa noite ele contava tudo o que tinha vivido lá longe, onde as montanhas são mais al- tas do que o firmamento. Não se cansava de falar e contar. Quase sempre as crianças adormeciam a meio de uma das suas histórias fantásticas. Um dia Muntu regres- sou de viagem e Pinda estava triste. As lavras foram arrasadas por pragas e o mar dava pouco peixe. O chefe da aldeia chamou- o e perguntou-lhe: - O que havemos de fazer para o povo ter abundância? Muntu jun- tou os pescadores e ensinou-os a fazer redes para pescar no alto mar. Depois fizeram canoas mais sólidas, que corriam na água em- purradas pelo vento batendo na vela feita de fibras de lianas. E quando estavam longe da terra, en- sinou-os a navegar pelas estrelas do Cruzeiro do Sul. Em breve voltou a abundância e o chefe da aldeia per- guntou-lhe o que queria em troca. E ele disse que só desejava que ninguém mais esquecesse esta verdade: - Muntu wa sala kafwe nzala. Muntu wa wuta kassâdi kaka. Mun- tu wa sopa kazingi kaka. Os que tra- balham não podem passar fome. Quem casa não pode viver na soli- dão. Quem tem filhos não pode ser abandonado à sua sorte quando envelhece. O povo de Pinda deu as mãos, ca- da um acalentou os mais desespera- dos, todos se uniram para arrancar da terra o sustento, caçar a imponen- te mpakassa, ir ao alto mar pescar o peixe que não abundava nas praias. Todas as casas tinham comida, to- dos recuperaram a alegria. Muntu só voltou a viajar quando a última criança da aldeia dormia repleta e os bebés soltavam pelo canto da boca um fio do leite materno e arro- tavam de satisfação. O chefe da aldeia, quando viu Muntu e o seu fiel Mbizi a caminho de nova viagem, disse: - Desta vez partes tarde, não qui- seste deixar os teus irmãos com fo- me… - E Muntu respondeu com um sorriso enigmático: - Mbote wasukinina kansi ku kondi ko! É mesmo verdade: mais vale tar- de do que nunca! CONSELHOS CONTOS POPULARES ANGOLANOS PROVÉRBIO ADIVINHAS Soluções: 1. A boca, a língua e os dentes; 2. Língua; 3. Língua; 4. Galo; 5. Língua. Nós gostamos de estudar No próximo ano lectivo a minha província, o Bié, vai ter mais 200 novas salas e 20 mil carteiras para que mais crianças possam ir à escola, porque ainda há muitos meninos e meninas que querem aprender, mas não têm lugar na escola ou não têm professores. Com as novas salas, a província do Bié fica mais bem servida. Mas melhor do que saber que vamos ter mais escolas é a certeza de que no próximo ano lectivo está garantida a merenda escolar e todos vamos ter direito a manuais. Muitas crianças gostavam de ir à escola mas sem merenda esco- lar acabam por ficar em casa, porque saem cedo de casa e de- pois não aguentam ficar muito tempo nas aulas sem comer. E até tenho amigos que gostam de ir às aulas porque na escola temos direito à merenda. Nas escolas da nossa província vamos ter, este ano lectivo que vai entrar, mais crianças e melhores condições. Vai chegar um dia em que todas as crianças em idade escolar vão frequentar as au- las, porque têm salas e professores em número suficiente, e tam- bém não vai faltar a merenda escolar. ALCIDES DOS SANTOS |12 ANOS | BIÉ 1.Uma capelinha muito pequenina, com o sacristão vestido de vermelho e os santinhos todos de branco 2. Uma senhorita, muito assenhorada, nunca sai à rua, anda sempre molhada. O que é? 3.Qual é a coisa, qual é ela, que varre o céu todos os dias? 4.Passeia na praça, não é estudante, canta, sabe das horas, mas da morte não sabe. 5. Tem à porta gente armada, mas se ela sai pela porta, eles não defendem nada. «Se a tua língua se transforma em faca vai cortar a tua boca. Domingo, 19 de Outubro de 2014 Nº 176 SÉRIE III |11 Como escrever para o “Recreio” O nosso endereço é: Recreio - Página Infantil do Jornal de Angola - Rua Rainha Ginga, 18/26 - Luanda, ou para o e-mail: [email protected]. R R ecreio ecreio Suplemento infantil do Jornal de angola BRINCAR E APRENDER CARTAS DOS AMIGUINHOS AO mundo é cheio de pequenos mistérios. Muito pouca gente já viu ovo de pombo ou assistiu a enterro de anão. Há coisas que ninguém sabe realmente como funcionam. O pe- queno bolso das calças jeans também entra nesse leque de grandes mistérios da humanidade. AOs bolsos pequenos serviam para guardar os relógios. Mas, mais tarde os relógios de bolso caíram em desuso e encon- traram novas funcionalidades para o pequeno bolso. Hoje, há pessoas que o usam para guardar moedas, pendurar óculos ou guardar o isqueiro. AHá quem até o use apenas para descansar os braços. Tudo de- pende da imaginação de cada um. S S A A B B I I A A S S Q Q U U E E . . . . . . O asseio dos pés Todos os meninos já ouviram falar do chulé, aquele mau cheiro que sai dos pés quando se tiram os sapatos dos pés. Ele é provocado por micróbios que agem junta- mente com o suor do corpo. Uma forma de evitar o chulé é nunca calçar os sapatos com os pés molhados ou sujos. Lave sempre os pés e limpe- os, deixando-os bem secos e calce-os só depois. Lave tam- bém os pés sempre que des- calçar os sapatos. CASIMIRO PEDRO O viajante prodigioso que veio do mar VAMOS COLORIR

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Page 1: Domingo, 19 de Outubro de 2014 Nº 176 SÉRIE III Recreioimgs.sapo.pt/jornaldeangola/img/file544378b4dfed5Binder1.pdfque afundou o barco em que viaja - vam. O náufrago falava uma

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O mar nunca aceita estranhos emcasa. Cedo ou tarde atira os intrusospara as praias. Foi assim que che-gou a Pinda um homem e um cão,feitos destroços de uma tempestadeque afundou o barco em que viaja-vam. O náufrago falava uma línguaestranha e não sabia revelar o seunome. Por isso foi nomeado de Mun-tu. O cão tinha pelo abundante e co-breado, era corpulento e tinha olhosmeigos. Chamaram-lhe Mbizi.Quando os pescadores encontra-

ram o homem expulso pelo mar, o cãolambia-lhe o rosto para aquecê-lo e elerespirava tão levemente que se perce-bia a extinção a qualquer momento.Foi agasalhado, como eram todos osviajantes que aportavam a Pinda. Co-meu e bebeu, aprendeu a falar e a di-zer. Um dia fez a sua casa e ali ficoucom o cão. Muntu era da grande famí-lia de Pinda, que se estendia até aomar do Nzeto. O seu espírito de via-jante levou-o ao Mbridge e até maislonge, ao mar aberto do Ambriz.Muntu era um viajante perpétuo e

mal descansava os pés partia logopara outra viagem. Nos intervalossabia descrever às crianças tudo o

que via, todos os trilhos que abria,todas as ideias que punha a voar nocéu livre do reino da paz e da abun-dância. Ele descobriu que os jacarésdo Mbridge mergulham nas águasprofundas do rio, para não apanha-rem os pingos de chuva.O chefe da aldeia então pergun-

tou-lhe: - Como resististe ao mar?E ele respondeu:- Porque tinha de salvar o meu

cão. Jamais partiria, nem para omundo dos mortos, sem o Mbizi.- Mas foi ele que te acalentou

quando sucumbias na praia… - Por isso resisti até ao limite. Sa-

bia que um dia ele me ia ensinar oque é a amizade de braços abertose a lealdade até ao último alento.Muntu não constituiu família

nem aceitou um palmo de terrapara fazer a sua lavra. Mas traba-lhava nas lavras dos vizinhos eajudava nas colheitas. Por issotodos o alimentavam de bom gra-do, até ao dia em que voltava apartir com o seu fiel Mbizi, percor-rendo caminhos escondidos nasmatas fechadas do Norte.As crianças rondavam a sua ca-

sa, descentrada da aldeia. Esprei-tavam de longe e viam-no a medi-

tar, sentado num banco à porta decasa. O cão ficava enroscado aseus pés, indiferente ao tempoque escorria vagarosamente, des-de a luz crua do amanhecer aopoente irradiando ondas de umvermelho fogueado. Um dia as crianças chegavam

de mansinho para espreitar Muntue ele já tinha partido para outra via-gem. Era mais triste do que ver

partir a bela borboleta prestes aser apanhada. Quando Muntu re-gressava havia alegria na aldeia,porque nessa noite ele contavatudo o que tinha vivido lá longe,onde as montanhas são mais al-tas do que o firmamento. Não secansava de falar e contar. Quasesempre as crianças adormeciama meio de uma das suas históriasfantásticas. Um dia Muntu regres-sou de viagem e Pinda estavatriste. As lavras foram arrasadaspor pragas e o mar dava poucopeixe. O chefe da aldeia chamou-o e perguntou-lhe:- O que havemos de fazer para o

povo ter abundância? Muntu jun-tou os pescadores e ensinou-os afazer redes para pescar no altomar. Depois fizeram canoas maissólidas, que corriam na água em-purradas pelo vento batendo navela feita de fibras de lianas. Equando estavam longe da terra, en-sinou-os a navegar pelas estrelas doCruzeiro do Sul. Em breve voltou aabundância e o chefe da aldeia per-guntou-lhe o que queria em troca. E ele disse que só desejava

que ninguém mais esquecesseesta verdade:

- Muntu wa sala kafwe nzala.Muntu wa wuta kassâdi kaka. Mun-tu wa sopa kazingi kaka. Os que tra-balham não podem passar fome.Quem casa não pode viver na soli-dão. Quem tem filhos não pode serabandonado à sua sorte quandoenvelhece.O povo de Pinda deu as mãos, ca-

da um acalentou os mais desespera-dos, todos se uniram para arrancarda terra o sustento, caçar a imponen-te mpakassa, ir ao alto mar pescar opeixe que não abundava nas praias.Todas as casas tinham comida, to-dos recuperaram a alegria. Muntusó voltou a viajar quando a últimacriança da aldeia dormia repleta eos bebés soltavam pelo canto daboca um fio do leite materno e arro-tavam de satisfação.O chefe da aldeia, quando viu

Muntu e o seu fiel Mbizi a caminhode nova viagem, disse:- Desta vez partes tarde, não qui-

seste deixar os teus irmãos com fo-me… - E Muntu respondeu com umsorriso enigmático:- Mbote wasukinina kansi ku

kondi ko!É mesmo verdade: mais vale tar-

de do que nunca!

CONSELHOS

CONTOS POPULARES ANGOLANOS

PROVÉRBIO

ADIVINHAS

Soluções:1.A boca, a língua e os dentes; 2. Língua; 3. Língua; 4. Galo; 5. Língua.

Nós gostamos de estudarNo próximo ano lectivo a minha província, o Bié, vai ter mais 200novas salas e 20 mil carteiras para que mais crianças possam ir àescola, porque ainda há muitos meninos e meninas que queremaprender, mas não têm lugar na escola ou não têm professores.Com as novas salas, a província do Bié fica mais bem servida.Mas melhor do que saber que vamos ter mais escolas é a certezade que no próximo ano lectivo está garantida a merenda escolare todos vamos ter direito a manuais.Muitas crianças gostavam de ir à escola mas sem merenda esco-lar acabam por ficar em casa, porque saem cedo de casa e de-pois não aguentam ficar muito tempo nas aulas sem comer. E atétenho amigos que gostam de ir às aulas porque na escola temosdireito à merenda.Nas escolas da nossa província vamos ter, este ano lectivo quevai entrar, mais crianças e melhores condições. Vai chegar um diaem que todas as crianças em idade escolar vão frequentar as au-las, porque têm salas e professores em número suficiente, e tam-bém não vai faltar a merenda escolar.

ALCIDES DOS SANTOS |12 ANOS | BIÉ

1.Uma capelinha muito pequenina, com o sacristão vestido devermelho e os santinhos todos de branco2. Uma senhorita, muito assenhorada, nunca sai à rua, andasempre molhada. O que é?3.Qual é a coisa, qual é ela, que varre o céu todos os dias?4.Passeia na praça, não é estudante, canta, sabe das horas,mas da morte não sabe.5. Tem à porta gente armada, mas se ela sai pela porta, elesnão defendem nada.

«Se a tua língua se transformaem faca vai cortar a tua boca.

Domingo, 19 de Outubro de 2014Nº 176 SÉRIE III

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Como escrever para o “Recreio”O nosso endereço é:Recreio - Página Infantil do Jornalde Angola - Rua Rainha Ginga,18/26 - Luanda, ou para o e-mail:[email protected].

RRecreioecreioSuplemento infantil do Jornal de angola

RecreioSuplemento infantil do Jornal de angola

BRINCAR E APRENDERCARTAS DOS AMIGUINHOS

AO mundo é cheio de pequenos mistérios. Muito poucagente já viu ovo de pombo ou assistiu a enterro de anão. Hácoisas que ninguém sabe realmente como funcionam. O pe-queno bolso das calças jeans também entra nesse leque degrandes mistérios da humanidade.AOs bolsos pequenos serviam para guardar os relógios. Mas,mais tarde os relógios de bolso caíram em desuso e encon-traram novas funcionalidades para o pequeno bolso. Hoje, hápessoas que o usam para guardar moedas, pendurar óculosou guardar o isqueiro.AHá quem até o use apenas para descansar os braços. Tudo de-pende da imaginação de cada um.

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O asseio dos pésTodos os meninos já ouviramfalar do chulé, aquele maucheiro que sai dos pésquando se tiram os sapatosdos pés. Ele é provocado pormicróbios que agem junta-mente com o suor do corpo.Uma forma de evitar o chulé énunca calçar os sapatos comos pés molhados ou sujos.Lave sempre os pés e limpe-os, deixando-os bem secos ecalce-os só depois. Lave tam-bém os pés sempre que des-calçar os sapatos.

CASIMIRO PEDRO

O viajante prodigioso que veio do mar

VAMOS COLORIR