Dos usos da palavra‘lógica individualizante’, ela própria, movida por uma ética de mercado....
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Macaé, n.7, p.10-21, jul./dez. 2009.
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Dos usos da palavra: dos signos à Proxemia e Parresia como
Tecnologias na Educação
PAULO DE TARSO DE CASTRO PEIXOTO
Resumo - O presente artigo vem trazer como
campo problemático os usos da palavra e suas
ressonâncias no campo da educação.
Metodologicamente, o artigo se divide em dois
eixos: o primeiro apresentando algumas condições
históricas que utilizaram como tecnologia os usos
da palavra, com objetivos bem demarcados.
Apresentam-se os usos da palavra como
mnemotécnica a serviço das culturas orais, os usos
da palavra como tecnologia cosmológica para a
construção de uma visão racional do mundo, os
usos da palavra como experiência política e
coletiva, os usos da palavra como forma de se
dizer a verdade. O segundo eixo apresenta as
relações entre os usos da palavra para a produção
do discurso competente e suas ressonâncias na
cotidianidade da educação. Por sua vez,
problematiza-se sobre os usos da palavra como a
possibilidade de uma política de vínculos para
além das aprendizagens das competências
curriculares. Ao final, analisam-se possibilidades
de entrelaçamentos entre a produção de uma
razão sensível, movida pelos conceitos de proxemia
e parresia. Conclui-se que as políticas
educacionais, que privilegiam as aprendizagens de
competências técnicas, ligam-se ao projeto de uma
‘lógica individualizante’, ela própria, movida por
uma ética de mercado.
Palavras-Chave: Palavra, Discurso, Competência,
Parresia, Proxemia.
Abstract - This paper brings to discussion the
troublesome field of word use and its resonances
in education. It is divided into two parts: the first
one presents historical contexts in which word use
was employed as technology, having well traced
objectives. The word used as a technique that
favored oral cultures, the word used as a
cosmologic technology for building a rational view
of the world, the word used as collective and
political experience, and the word used as a way of
telling the truth. The second part presents the
relationship between the different uses of the word
in order to produce competent discourse and its
resonances in everyday education. The uses of
word are also brought up as possible ways of
creating bonds that go beyond the learning of
curricular competences. We also analyze the
possibility of connections in the creation of
sensible reasoning, supported by the concepts of
proxemia and parresia. We have concluded that
educational policies which prime for the learning
of technical competences are related to an
individualizing logic which is pushed forward by a
market ethics.
Keywords: Words, Speech, Competence, Parresia,
Proxemia.
1. INTRODUÇÃO
alavras. Através das palavras um mundo
desconhecido vai se fazendo „corpo‟. As experiências, na relação com o mundo,
vão se traduzindo em signos escritos, falados,
cantados, poetizados. Fazer a leitura do mundo,
expressar desejos, idéias e emoções mediados
pela experiência expressiva das palavras será
produzir sentidos: sempre provisórios e em
estado de „gestação‟. Por vezes, o sentido de um
estado emocional virá num momento mais
adiante. Nem sempre conseguiremos fazer o
„parto‟ dos nossos sentidos num tempo
imediato. Cabe destacar que há 5.000 anos se
produzia na Mesopotâmia um acontecimento
maior para a história do mundo: os homens
escreviam suas experiências (MANIACZYK,
2009). Essa nova técnica irá movimentar a
humanidade numa aventura que vem contribuir
para a consistência comunicacional humana.
Experiência que, depois dos 60.000 anos de
origem da linguagem, vem propiciar a
„complexificação‟ das experiências sonoras
humanas, evoluindo na direção dos signos
escritos como forma expressiva de comunicação. Novos sistemas de signos,
P
PAULO DE TARSO DE CASTRO PEIXOTO Professor da Pós-graduação em Práticas Transdisciplinares, Educação, Saúde e Violência
– FUNEMAC - Macaé (RJ) Professor Convidado do Curso de Especialização em Saúde Mental
– ENSP/FIOCRUZ – Rio de Janeiro (RJ).
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surgindo como tecnologias de „escrituras do mundo‟, construindo o sentido das experiências
através de signos simbólicos escritos, isto é,
pictogramas e ideogramas.
A aventura das escrituras irá ser perseguida
e reinventada por cada cultura. Inventada pela
civilização suméria, a escrita cuneiforme foi
aclimatada pelos acadianos, babilônios,
elamitas, hititas e assírios. Estas outras culturas
se servirão da escrita cuneiforme para traduzir
em signos escritos seus signos orais, no interior
de seus próprios idiomas. Vemos a íntima aliança entre a expressão simbólica que
experimenta „desenhar‟ a palavra, preocupada
em fixar os sons do discurso. Nesta esfera, todo
sistema de escrita vem representar uma íntima
aliança singular entre as expressões imagéticas
do mundo e a experiência „linguageira‟ da
palavra. E após 7.000 anos da invenção da
escrita cuneiforme, vemo-nos na complexa
experiência de traduzir os signos verbais em
outros signos, a tentativa, a um só tempo, de
comunicar, informar, compartilhar, expressar e
produzir a história do nosso presente. Estamos a „palavrear‟ as experiências a
todo instante. Mesmo em silêncio, somos
envolvidos por signos imagéticos em nossa
imaginação que nos verte à sua tradução em
signos ideativos, isto é, traduzindo-os em
palavras que proporcionem sentido. O
movimento perpétuo das mudanças no mundo
nos movimenta, por sua vez, ao encontro de
palavras mais coerentes com aquilo que
sentimos na relação com a vida. „Palavrear‟ a
vida! Signos sonoros movidos por nossas certezas e incertezas. „Palavrear‟ a vida!
Experiência ideativa e emocional, que nos
conduz sempre a novos territórios de sentido, de
significação. A criança que „palavreia‟ suas
experiências no esforço de fazer-se
compreender. A esposa que „palavreia‟ suas
experiências para o marido ocupado com outras
questões. O pai que „palavreia‟ ao filho seus
desejos. Palavração que não faz sentido para o
filho que deseja se conectar com outros signos.
O aluno que divaga e „sonha acordado‟ em meio às palavrações dos professores. Por sua vez,
encontraremos os professores, com todo o
esforço de tentar traduzir o universo científico e
técnico, numa palavração que possa acessar o
interesse dos alunos. Metodologias e práticas
pedagógicas que se empenham em transmitir
suas „palavrações‟ técnicas, relacionando-as à
vida – ou não! Alunos que „torcem‟ para chegar
ao horário do intervalo para poder
„experimentar‟ seus „dialetos‟ vividos no
interior da sua língua materna.
Experimentações da „palavração‟ acerca da vida, criadas e recriadas, cada uma ao seu jeito.
Cada uma de acordo com aquilo que convém num dado momento, num dado contexto.
Mudando o contexto, mudam-se os signos,
mudam-se sentidos, muda-se o texto. Texto que
muda seu tom, seus matizes, dependendo dos
usos da palavra.
E no desafio das experimentações dos usos
da palavra, a educação vem tentando cumprir o
seu mandato de „transmitir a cultura‟ e de
„formar cidadãos‟. Poderemos pensar sobre os
usos da palavra no interior das experiências
educacionais. Usar a palavra, não apenas para a transmissão da cultura, mas também como
forma de produção de vínculos. Usar a palavra,
não apenas para o cumprimento dos conteúdos,
mas também para a produção de encontros nos
quais os conhecimentos técnicos se „misturem‟
com as experiências de vida.
Poderemos indagar: qual é a razão de ser da
palavra na cotidianidade escolar? Qual é o
estatuto dado à experimentação da palavra nos
vínculos que circulam no interior das práticas e
discursos da educação?
Movido por essas inquietações, o presente artigo vem problematizar os usos da palavra em
algumas das suas dimensões e suas relações
com a educação. Serão apresentadas algumas
condições históricas, elas mesmas, utilizando-se
da tecnologia „linguageira‟ da palavra, com
objetivos bem delimitados, nestes contextos.
Num segundo momento, o artigo visibilizará as
relações na cotidianidade da educação,
aclimatando sobre estas, algumas ressonâncias
ou „parentescos‟ dos usos da palavra,
relacionando-as com a primeira parte do artigo. Metodologicamente o artigo se dividirá em dois
eixos:
1 – Primeiro eixo que visibilizará a tetravalência
dos usos da palavra:
1.1 - Dos usos da palavra enquanto a
tecnologia cultivadora de „textos orais‟.
1.2 – Dos usos da palavra com novos
contornos pela experiência da filosofia-
física dos milésios, contribuindo para a
construção de uma visão racional do mundo.
1.3 – Dos usos da palavra como tecnologia da
experiência política e coletiva.
1.4 – Dos usos da palavra como tecnologia de
dizer a verdade.
2 – Segundo eixo que aclimatará os usos da
palavra como tecnologia ao campo da educação:
numa primeira análise, problematizando-se
sobre os usos da palavra para a produção do
discurso competente e, em última análise,
traçando algumas direções para a construção de
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uma política do vínculo e da sensibilidade, por meio da proxemia e parresia.
2. DA CIVILIZAÇÃO ORAL:
Da palavra como tecnologia mediadora entre
o conhecido e o desconhecido.
Transmitir experiências vividas pela
força das palavras. Ao longo da história da
humanidade poderemos encontrar inúmeros
exemplos de civilizações orais. Nelas a
educação era movida pelos usos da palavra
falada. De geração em geração, a cultura era
transmitida por cânticos, por histórias
carregadas de valores e de crenças.
Pelo que precede visibiliza-se a
tentativa de não deixar declinar todos os conhecimentos e práticas de uma determinada
cultura através de tecnologias mnêmicas pelos
usos da palavra.
A este respeito, Vernant (1990, p. 478)
enunciará sobre a cultura grega antiga:
Assim é armazenado, nas vastas composições
épicas, o conjunto do saber, as narrativas
lendárias que funcionam como memória coletiva
e enciclopédia de conhecimentos comuns. É
nesses cantos que se encontra consignado tudo o
que um grego deve saber acerca do homem e do
seu passado – as façanhas dos heróis de outrora -,
acerca dos deuses, das suas famílias, das suas
genealogias acerca do mundo, da sua figura e das
suas origens. (VERNANT, 1990. p.
478)
Podemos imaginar este contexto no
qual a educação era transmitida pela cultura oral. Pessoas atentas às intensidades das
palavras que escorriam das poesias e dos
cânticos, narrados e cantados pelos mais antigos
e mais velhos. Olhares e ouvidos atentos para,
por seu turno, fixarem os conteúdos sensíveis de
uma cultura que se sustentava pelo uso dos
signos orais. As experiências sociais, as
vivências culturais eram „textualizadas‟ em
contextos orais. A experiência da „palavração‟
viria a ser o eixo sobre o qual toda uma
arquitetura de conhecimentos pudesse se estender no tempo.
Em meio às imagens que sobrevêm à
mente, surge uma indagação: quais processos
ocorriam para que aquelas pessoas ficassem ali,
atentas, com tanto desejo de ver, de escutar
aquela paisagem de informações? Colocando-
nos naquele lugar, meio como num sobrevôo no
qual podemos ver de cima o que ocorre,
passando por perto de cada olhar e de cada
semblante atento, compreendemos que a „liga‟
produtora deste acontecimento é complexa.
Palavras que se encadeiam com as imagens das histórias de outrora movidas por
intensas emoções. Paisagem tecida em conjunto
pela força da curiosidade que o jogo das
palavras fazia escorrer a cultura, produzindo a
liga coletiva através das emoções e das imagens
a elas associadas. Paisagem complexa que
produz a composição social, a comunhão, a
sensação de tornar-se um: comum, isto é, Como
Um!
Nesta esfera, vemos que os usos da
palavra farão parte de uma liturgia que proporciona a ligação entre as experiências
terrestres e as forças sagradas. Cultura, tradição,
religião, experiências sociais e emoções se
entrecruzando, encontrando na via das palavras
o caminho para que a educação de toda uma
coletividade pudesse nela mesma, se fazer.
2.1 DOS USOS DA PALAVRA E A ORDEM
RACIONAL DO MUNDO
A tradição filosófica milésia produzirá
um diferente modo de inteligibilidade,
utilizando-se da palavra não mais para a
transmissão da cultura mítica. A palavra
ganhará um novo estatuto com Tales de Mileto
e Anaximandro de Mileto. Os usos da palavra
estarão vertidos à compreensão da phýsis, do real, da natureza, ordenada pela compreensão
racional do mundo.
A filosofia dos milésios produzirá uma
física que narrará uma nova história do mundo.
Edificam a lógica cosmológica que busca
ordenar o desconhecido através de princípios
primordiais que explicariam a vida e todo o real.
Princípios primordiais „físicos‟, nos quais
repousam as explicações „materiais‟ que
fundamentam a vida.
Para Tales, a água será o princípio
primordial. Para Anaximandro, o apeíron, o infinito, o indeterminado. Outros filósofos se
inspirarão nesta outra forma de apreender o real,
utilizando-se da palavra não mais para se falar
de uma cultura ou dos mitos, mas para buscar
os „conceitos físicos‟ que fundamentam a vida.
A palavra ganha um novo „tom‟. Um
„tom‟ científico aparecerá já no século VI a. C.,
produzindo, por conseguinte, uma distinta
maneira de se ver a vida, para uma nova
compreensão dos processos de produção do mundo e sua gênese. Para além das
cosmogonias, pelas quais explicavam a gênese
do mundo pelas narrativas divinas, a construção
da lógica cosmológica dos milésios modulará,
de certa maneira, o olhar sobre a vida e, com
efeito, a relação com a própria vida. Jogos de
composição das palavras movidos pela
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composição de uma outra maneira de olhar os processos viventes. Vernant (1990), a este
respeito afirmará:
O mito narrava a gênese do mundo ao cantar a
glória do príncipe cujo reino fundamenta e
mantém uma ordem hierárquica entre forças
sagradas. Os milésios buscam, por detrás do
fluxo aparente das coisas, os princípios
permanentes sobre os quais repousa o justo
equilíbrio dos diversos elementos de que é
composto o universo. Mesmo se eles
conservam certos termos fundamentais dos
velhos mitos, como o de um estado primordial
de indistinção a partir do qual se desenvolve o
mundo, mesmo que eles continuem a afirmar,
com Tales, que “tudo está pleno de deuses”, os
milésios não deixam nenhum ser sobrenatural
intervir em seus esquemas explicativos. Com
eles, em sua positividade, a natureza invadiu
todo o campo do real; nada existe, nada se
produziu e nunca se produzirá que não
encontre na phýsis, tal como podemos observá-
la a cada dia, seu fundamento e sua razão. É a
força da phýsis, em sua permanência e na
diversidade de suas manifestações, que toma o
lugar dos antigos deuses; pelo poder de vida e
princípio de ordem que encobre, ela própria
assume todos os caracteres do
divino.(VERNANT, 1990. p.479)
No entanto, o novo estatuto da palavra
- não sendo reduzida à transmissão da cultura e da tradição através dos cânticos poéticos e
míticos – precisará tocar a curiosidade da
comunidade de uma nova maneira para que as
explicações cosmológicas ganhem „corpo‟ no
seio da então sociedade grega. Vernant (1990. p.
481) dirá:
Essa mudança de atitude ocasiona toda uma série
de consequências. Para atingir o seu objetivo, um
discurso explicativo deve ser exposto, não
somente enunciado sob uma forma e nos termos
que permitem compreendê-lo bem, mas ainda
entregue a uma publicidade inteira, colocado aos
olhos de todos, do mesmo modo que a redação
das leis, na cidade, torna-se um bem comum para
cada cidadão, distribuído com igualdade.
Despojada do secreto, a theoria do físico
transforma-se assim no objeto de um debate
contraditório, o confronto das argumentações
contrárias – impõem-se desde então como regras
do jogo intelectual. Ao lado da revelação
religiosa que, na forma do mistério, permanece o
apanágio de um círculo restrito de iniciados, ao
lado também da profusão de crenças comuns de
que todo o mundo participa sem que ninguém se
interrogue a seu respeito, define-se e afirma-se
uma nova noção da verdade: verdade aberta,
acessível a todos e que fundamenta em sua
própria força demonstrativa os seus critérios de
validade. (VERNANT, 1990. p. 481)
Pelo que precede, vemos que os novos
usos da palavra pelos milésios vêm dar novos
tons às experiências sociais. A palavra sendo
movida pela curiosidade e pela admiração,
produzindo um jogo no qual a força do
pensamento se alia à força das emoções e da imaginação. O efeito, desta combinação das
instâncias demasiadamente humanas (potência
de pensar, de se emocionar e de imaginar), será
o de produzir maneiras de ordenar e regular a
vida, normatizar a vida, explicando o mundo,
modificando, por sua vez, o próprio mundo e o
modo de se viver a vida. Novas modulações nos
usos da palavra se darão, movendo a vida social
em novas direções.
1.3 – DO GOSTO PELA PALAVRA: DA
PALAVRA COMO TECNOLOGIA
POLÍTICA Continuemos o nosso percurso pela era
grega ancestral, no sentido de podermos
aclimatar, no momento devido, algumas das
suas práticas e saberes à questão dos usos da
palavra como tecnologia no campo da educação.
Imaginemos, neste instante, o momento
histórico do século V a. C. A Grécia dividida em inúmeras cidades Estado. Estas guerreiam
entre si. Cada uma produzindo maneiras de
regular a vida, de proteger-se das invasões
bárbaras. Châtelet (1994, p. 16) nos dirá:
Essas cidades criaram
colônias que logo conquistaram a independência
e fazem agora circular um espírito novo. É
preciso elaborar todo um urbanismo, construir
cidades, instituir constituições, e o pensamento
tradicional está sendo submetido a duras provas.
Para essas colônias, a tradição não basta mais.
Esse espírito remonta até o centro; e, já no século
VI, todas essas cidades são varridas por um vento
de renovação. Isso vale principalmente para
Atenas, onde alguns homens vão inventar o que
será chamado de „democracia‟. Na época a
democracia se define essencialmente pela
igualdade. Todos os cidadãos, quaisquer que
sejam, quaisquer que sejam sua fortuna, sua
origem, a antiguidade de sua família, todos são
iguais perante a lei. Têm o mesmo direito de
intervir diante dos tribunais e de tomar a palavra
nas assembléias em que se decide o destino
coletivo. (CHÂTELET, 1994. p. 16)
Em meio à experiência da democracia grega, a palavra torna-se a „rainha‟
(CHÂTELET, 1994). O estatuto da palavra se
amplia com a democracia ateniense. Esta
moverá as composições de desejos e de idéias
sobre os destinos da cidade. Anteriormente, as
decisões eram veladas em segredo pela
aristocracia ateniense. Quem deliberava as
decisões eram as famílias nobres, anunciando
publicamente ao conjunto da coletividade. Vale
ressaltar que a educação era em geral moral e
militar. A palavra não era considerada como um instrumento para a tomada de decisões
coletivas. A palavra, conforme vimos pela seção
1, era o instrumento de recitação dos antigos
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poemas e cânticos tradicionais que reeditavam o sentimento de glória dos heróis e das origens
misteriosas da cidade. “Na democracia, a
palavra vai impor-se, e quem dominar a palavra
dominará a cidade” (CHÂTELET, 1994, p. 16).
Na realidade, a palavra enquanto uma
arte do debate, vertida às decisões da cidade,
terá como território gestacional Atenas. Cidade
que rechaçará os bárbaros provenientes da
Pérsia em 480 e 490 a. C. em batalhas nas quais
Atenas será a grande vencedora. A partir destas
vitórias, Atenas será considerada poderosa e, com efeito, a sua democracia, servindo como
um modelo. O gosto pela palavra, doravante,
conquistará a Grécia como um todo, conforme
Châtelet (1994):
Pode-se dizer que, partindo de Atenas, o gosto
pela palavra conquista a Grécia inteira. Ao
mesmo tempo nascem técnicas e artes. Vou ser
um pouco pedante e usar a palavra grega
tekhnê. Nessa palavra, há simultaneamente a
idéia de técnica, de um saber aplicado, e a idéia
de arte, de invenção, de produção original. Vou
ter que empregar essa palavra para marcar bem
esses dois aspectos simultâneos de prática e
invenção individual. Esse desenvolvimento da
palavra acarretará o nascimento de técnicas
específicas que serão chamadas depois de
“retórica”. Para ocupar um lugar na cidade
assim, é preciso saber falar, saber convencer.
Como aconteceu muitas vezes em outras
civilizações, o aparecimento de o aparecimento
de uma tekhnê gera o nascimento de uma
profissão. (CHÂTELET, 1994. p. 17)
Decorre deste novo estatuto da palavra,
como a „técnica de colocar bons argumentos‟, a necessidade de a democracia ateniense estimular
a educação de pessoas hábeis e com „poder de
fogo verbal‟ para os debates decisórios, quer
seja para as decisões de assuntos „privados‟, nos
tribunais, quer seja para a tomada de decisões de
assuntos públicos, nas assembléias. Atenas
precisa de „professores da arte de falar bem‟.
Aos professores que dominam a linguagem será
dedicado o título, por Platão, de „Sofistas‟.
Termo que tomou um sentido pejorativo, uma
vez que se associou à condição de falar bem,
mas, uma fala com conteúdo vazio1. Para Platão,
1 No entanto, poderemos encontrar no célebre
livro de Jean Paul Dumont (2004), intitulado
„Les Présocratiques‟, a importante contribuição de Protágoras de Abdera – o primeiro „sofista‟ –
na construção de uma teoria dos valores,
encontrada em seus pensamentos, muito antes
de Nietzsche. Protágoras com o seu
perspectivismo vem fundar a teoria relativista
pela qual a educação, as leis, a moral serão
considerados como os artifícios humanos para
regular a vida individual e social. Artifícios
criados por convenção: o que funda um valor
o sofista será aquele que fala de maneira „sofisticada‟, mas com argumentos enganosos.
No entanto, „os sofistas‟ contribuíram com o
novo estatuto conferido à experiência da palavra
com suas „escolas de política‟. Conforme
Châtelet (1994), o projeto de Platão dedicou-se
essencialmente ao combate dos „sofistas‟:
O inimigo número um é, segundo ele, essa
sofística que excitou os atenienses no
sentido próprio, que os debilitou. Ela os
lançou em empreendimentos duvidosos,
tanto no plano cultural quanto no da
política externa. Entretanto o pensamento
platônico tem o mesmo ponto de partida
que a sofística: a palavra. Platão herdou
essa característica de Sócrates.
(CHÂTELET, 1994. p. 22-23)
A crítica de Platão, em certa medida,
procederá não apenas contra os „professores da
democracia‟, mas, pelos usos que a palavra
ganhará. Num debate “o número de votos não
faz a verdade” (CHÂTELET, 1994, p.23). Será preciso problematizar,
indagar, duvidar daquilo que se debate. Platão,
retomando Sócrates com a sua arte da „ironia‟,
deseja construir problemas, conduzindo-os ao
plano do conceito. A palavra ganhará novas
direções com a experiência Socrático-platônica.
Alcançar a luz, ser um „parteiro das suas
próprias idéias‟ – experiência que Sócrates
conceituará como „maiêutica‟ – será um projeto
que Platão dará sequência, inspirado no mestre.
Orientar a conduta através da experiência com as palavras, compostas de tal maneira que se
tornem indicadores para se alcançar a
construção de „idéias verdadeiras‟: o mundo das
inteligibilidades „claras e distintas‟, isto é, o
mundo das idéias. Projeto que a educação
seguiu!
1.4 – DA PALAVRA COMO MANEIRA DE DIZER A
VERDADE:
Vimos, pelas seções precedentes, sobre
os usos que a palavra foi tomando, dentro de
certas condições históricas. Não será o nosso
interesse desenhar os usos da palavra em todas
as suas dimensões, em todas as condições
históricas, uma vez que seria um projeto
gigantesco que escapa ao campo de nossa
análise.
Desejaremos neste momento investigar
os usos da palavra, ainda, tomando como
referência a experiência grega. Apoiaremo-nos em quatro modalidades de usos da palavra como
não é a sua verdade, mas o fato deste ser
desejado.
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„constructos‟ para o „dizer a verdade das coisas e da vida‟.
Pela experiência grega antiga vemos
aparecer o conceito de parresia.
Etimologicamente, o termo vem significar a
„atividade de tudo dizer‟. A atitude
‘parresiástica’ será aquela pela qual poderá se
dizer tudo. Falar a verdade será a atitude do
‘parresisástico’, falar o que se pensa e o que se
sente, será o movimento desta atitude de estar
no mundo. No entanto, existirá um perigo de se
dizer tudo. Platão, no interior da sua obra intitulada „A República‟, afirmará a
negatividade da postura parresiástica, conforme
Foucault:
De la même façon, dans La
République au livre VIII (...) vous
trouvez la description de la mauvaise
cité démocratique, celle qui est toute
bariolée, toute disloquée, dispersée
entre des intérêts différents, des
passions différentes, des individus
qui ne s‟entendent pas. Cette mauvaise cité démocratique pratique
la parrêsia: chacun peut dire
n‟importe quoi (FOUCAULT, 2009.
p. 11)2.
Platão fará a sua crítica ao modo de
realização parresiástico, combatendo o uso da
palavra esvaziada: a palavra como mera opinião,
vazia de sustentação conceitual. No entanto,
Foucault (2009, p. 13) nos indicará, para além
do estatuto negativo dado a experiência parresiástica, algumas características
importantes para o curso do nosso trabalho.
Primeiro, para que tenhamos o modo de se
realizar a palavra ‘parresiasticamente’ será
preciso a manifestação de uma ligação
fundamental entre a verdade dita e o
pensamento daquele que a diz. Nesta esfera,
quem fala uma „verdade‟ a expressará de acordo
com aquilo que realmente pensa e sente.
Segundo, será preciso uma certa forma de
„coragem‟ naquele que exerce a parresia. Precisará, de certa maneira, uma coragem de
poder expressar sua „verdade‟, endereçada a
2 “Da mesma maneira, na República pelo livro
VIII encontraremos a descrição da nociva
cidade democrática, confusa, toda deslocada,
dispersa entre interesses diferentes, sentimentos
diferentes, indivíduos que não se entendem.
Esta nociva cidade democrática pratica a
parresia: cada um pode dizer não importa o
quê”.
quem escuta, podendo colocar em tensão e em risco a própria relação com a pessoa a quem esta
verdade é endereçada. Dessa maneira, quando a
relação permite o movimento parresiástico,
teremos, por sua vez, a coragem de se dizer a
verdade. No entanto, os usos da palavra para se
dizer a verdade, poderão colocar em risco a
própria relação em questão, ou a própria vida,
uma vez que poderão contrariar as forças
hegemônicas de um dado momento histórico.
Veremos, a seguir, outros usos da
palavra não-parresiásticos, mas que, de certa maneira, se misturam e se confundem com
aquele. Existirá o uso da palavra, com o
objetivo de se dizer a verdade, pela figura do
profeta. O profeta é aquele que é reconhecido
como alguém que „diz uma verdade‟. A sua
verdade é dita, não em nome próprio. O profeta
é o mediador entre os deuses e a verdade que
enuncia. A sua voz enuncia as palavras divinas.
O profeta, por sua vez, fala por uma outra voz,
“sa bouche sert d‟intermédiaire à une voix qui
parle d‟ailleurs. Le prophète transmet une parole
qui est, em general, la parole de Dieu” (FOUCAULT, 2009, p. 16)3. Decorre daí que a
verdade proferida pelo profeta vem de um além,
não de si. A sua palavra será a verdade sobre um
futuro obscuro que vem colorir a subjetividade
de quem recebe esta mesma verdade.
Subjetividade que se colorirá de idéias e
imagens na tentativa de revelar os inúmeros
enigmas da vida.
Um outro uso da palavra, enquanto
modo de „veridicção‟, isto é, como modo de
expressar a verdade na Grécia antiga será aquele do sábio. Este modo de dizer a verdade será
encontrada nos filósofos, mesmo inspirando-se
nos deuses, na tradição, num ensinamento, o
filósofo estará presente naquilo que endereça
aos outros. A sabedoria que ele formula é a sua
própria sabedoria de vida. O sábio manifesta seu
modo de ser e, ao contrário do profeta, ele não é
porta voz da palavra que expressa uma verdade.
Para o nosso interesse, traremos um
modo de „veridicção‟ encontrado na escola e na
Universidade. Este é o modo de „veridicção‟ daqueles que possuem um saber como tekhnê.
Este modo de saber encontra-se naqueles que
ensinam um savoir-faire (saber-fazer). Platão
caracterizará em seus diálogos os médicos, os
músicos, os chefes de armas, os ginastas como
aqueles que detêm uma tekhnê (FOUCAULT,
2009, p. 23). Serão verdades proferidas por
aqueles que possuem a técnica e um saber sobre
3 (...) “sua boca serve de intermediária a uma
voz que fala do além. O profeta transmite uma
palavra que é, em geral, a palavra de Deus.
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esta técnica. Quem possui uma determinada técnica deverá possuir um certo dever de
transmiti-la. Teremos mais um uso da palavra,
produzindo saberes estruturados,
„cientificizados‟, ordenados de uma maneira
„técnica‟. Todo o seu saber e sua técnica estão
ligados a uma tradição. Este saber, esta técnica,
para não desaparecer após a sua própria morte,
precisará ser re-endereçada às futuras gerações.
Encontraremos aqui a função do professor.
De uma maneira esquemática e, para o
interesse do nosso trabalho, falaremos das relações entre os usos da palavra como modo de
„veridicção‟ profética, do sábio, do professor e
suas íntimas relações com a forma
„parresiástica’, dentro da perspectiva que
Foucault nos apresenta.
O „parresiasta’ não é o profeta. Este
último diz a verdade, utilizando o nome de um
outro (um deus) e de maneira enigmática. O
profeta fala de maneira enigmática sobre o
destino e sobre a vida. O „parresiasta’ não é um
sábio que diz, quando quer e muitas vezes
utilizando-se do silêncio, o ser e a natureza da vida e das coisas. O „parresiasta’ não é um
professor. Ele não ensina uma técnica, um
saber, ao nome de uma tradição. O „parresiasta’
não utiliza a palavra em nome de um deus, nem
sobre a verdade do „ser‟ e a natureza das coisas,
nem o discurso da técnica e dos saberes de uma
tradição. O „parresiasta’ expressa um modo de
ser. Este modo de ser é impulsionado pelo jogo
da parresia. Um modo de relação na qual o
dizer a verdade será utilizar as palavras e os
comportamentos e ações de acordo com aquilo que se realmente pensa e sente.
No entanto, poderemos encontrar no
interior de uma mesma experiência as quatro
modalidades de „veridicção‟ (a profética, a da
sabedoria, a da técnica e a do parresiasta) na
experiência de Sócrates (FOUCAULT, 2009, p.
26). Sócrates é um parresiasta! Mas, de onde
ele recebeu a sua função de „parresiasta’? Sua
missão de interpelar as pessoas pela cidade foi
„enviada‟ pelo deus de Delphos: “ocupe-se de si
mesmo”! E Sócrates colocará o problema, advindo da „profecia‟ délfica: “conheça-te a ti
mesmo”! Sócrates começará a sua missão
movida por indicações proferidas pelo deus de
Delphos, intuindo, através desta profecia a
indicação de conhecer-se a si mesmo como
condição de encontrar a própria verdade! Sua
postura „parresiástica’ terá relações com a sua
experiência „profética‟. Da mesma maneira,
Sócrates apresentará uma relação com a postura
do sábio: o governo das paixões, o governo das
ideias, sua abstenção em relação aos prazeres,
sua „suportabilidade‟ em relação às dores e aos sofrimentos da vida, sua capacidade de se
abstrair do mundo. Existe a história de Sócrates completamente imóvel, durante uma batalha na
qual participava, para suportar o frio,
concentrando-se em si mesmo. Outro traço do
sábio encontrado em Sócrates será o do silêncio,
não dar as respostas: Sócrates não fala a verdade
que o outro procura nele! Ele é aquele que
afirma que não sabe! Uma vez que não sabe e
afirmando-se como aquele que „sabe que não
sabe‟, se coloca na posição de levantar
perguntas, de colocar problemas, de indagar, de
duvidar! Postura do sábio que faz cada um encontrar sua própria medida, seu próprio
caminho, seu próprio destino! Mesmo que o
sábio saiba, ele se sente no direito de se calar e
não endereçar ao outro a sua verdade! As
indagações de Sócrates são traços do modo de
ser ‘parresiástico’: colocar bons problemas,
duvidar, questionar, afirmar que sabe que não
sabe!
Por sua vez, encontraremos em
Sócrates aquele que virá ensinar a virtude aos
jovens, dando-lhes conhecimentos necessários,
seja para que possam viver bem, seja para governar a si e governar a cidade, através do seu
modo de ser, do seu modo de interrogar as
questões da cidade, através do seu êthos: da sua
ética de vida. Numa só experiência vemos as
figuras do profeta, do sábio, do professor e do
‘parresiasta’ na experiência socrática.
Experiência que nos movimenta a pensar as
relações da educação, do ensino, das relações
aluno-professor, professor-professor, aluno-
aluno, escola, pais, alunos e os usos da palavra
como forma de vínculo e de produção da parresia.
2 – DOS USOS DA PALAVRA NA
EDUCAÇÃO:
Oceanos de palavras. Subjetividades
que tentam captar ao próximo jogo de palavras
que expressam um novo conceito.
Subjetividades que se adormecem pela sedação
progressiva, advinda do jorro do „dilúvio‟
informacional, mediado pela tecnologia das palavras. Outras atentas, à espreita do que virá.
Tudo isso vivido, num presente, por vezes ativo,
muitas vezes, passivo. Passividade que tenta
ligar o que é dito com a vida. Outros nem mais
se incomodam, acomodam, fatigam. Palavras,
palavras, palavras...
Nesta seção temos como projeto dar a
visibilidade sobre algumas condições dos usos
da palavra na educação. Faremos,
metodologicamente, uma aclimatação entre o
primeiro eixo do artigo com o segundo eixo.
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2.1 – DOS USOS DA PALAVRA PARA A
PRODUÇÃO DA ORDEM DO DISCURSO
COMPETENTE:
Em trabalho anterior, destacamos sobre
a construção de subjetividades mutiladas e sua
íntima relação com a mutilação dos saberes
(PEIXOTO, 2009). Neste contexto, problematizamos acerca da construção de uma
visão de mundo fragmentada que, por sua vez,
tende a produzir relações fragmentadas.
Nesta esfera, vemos que os usos da
palavra como tecnologia informacional da
cultura se filia à perspectiva de um „ensino
enciclopédico‟. Todos precisarão aprender, num
mesmo tempo e a um só tempo, conteúdos
gigantescos a serem „assimilados‟ e „fixados‟.
Compreendemos que o mandato da escola em
transmitir a cultura para a construção de indivíduos competentes tecnicamente e
eticamente, tem, na sua primeira tarefa, se
concentrado. Decorre daí que os usos da
palavra, na sua maior parte, vêm servindo à
tentativa de produzir indivíduos com uma
competência técnica que, por sua vez, será
utilizada para responder aos exames, no interior
das práticas avaliativas da escola e, doravante,
nos inúmeros exames de vestibular, dentre
outros.
A palavra vem, nesta esfera, servir
como tecnologia de transmissão de um saber-fazer. Nesta experiência, o educador cumpre o
papel de transmissor da cultura para a produção
de sujeitos tecnicamente competentes. A palavra
torna-se o instrumento que irá conceituar
tecnicamente os saberes e fazeres do nosso
tempo e de outrora. A palavra será utilizada pelo
educador, principalmente, para a transmissão de
conceitos. Conceitos que, em geral, estão
„desencarnados da vida‟, isto é, estão
dissociados de uma realidade na qual poderiam
se vincular. Os usos da palavra, nestas experiências, vêm focalizar em demasia a
tekhnê, considerando-a como técnica específica
para a construção de conhecimentos
competentes a serem utilizados numa dada
profissão.
Vale ressaltar que a experiência de um
discurso competente, no seu plano técnico, é o
mais valorizado numa sociedade de mercado
que estimula a competitividade, a lucratividade
e a exploração do homem pelo próprio homem.
A palavra, nesta experiência, vem ser tributária
da produção de indivíduos competentes em saberes técnicos! Marilena Chauí (2007), a
respeito da produção do discurso competente,
vem abrir os horizontes do nosso olhar:
O discurso competente é o discurso instituído.
É aquele no qual a linguagem sofre uma
restrição que poderia ser assim resumida: não é
qualquer um que pode dizer a qualquer outro
qualquer coisa em qualquer lugar e em
qualquer circunstância. O discurso competente
confunde-se, pois, com a linguagem
institucionalmente permitida ou autorizada,
isto é, com um discurso no qual os
interlocutores já foram previamente
reconhecidos como tendo o direito de falar e
ouvir, no qual o conteúdo e a forma já foram
autorizados segundo os cânones da esfera de
sua própria competência. (CHAUÍ, 207. p. 17)
Movidos pelas enunciações de Chauí,
compreendemos que os usos da palavra ganham
a sua dimensão, que se pretende competente,
seguindo uma „ordem do discurso‟
(FOUCAULT, 2005). Discurso ordenado, sendo
aquele que será ouvido, compreendido, sentido,
proferido como aquele verdadeiro ou
autorizado. Nesta instância, aqueles que não
utilizarem a palavra, movidos pela lógica do
„discurso competente‟, serão, por definição,
considerados os incompetentes sociais. E
Marilena Chauí (2007), por seu turno, nos dirá a respeito da apropriação de um discurso
competente, invadindo todos os setores da vida:
Como escreve Lefort, o homem passa a relacionar-se com
seu trabalho pela mediação do discurso da tecnologia, a
relacionar com o desejo pela mediação do discurso da
sexologia, a relacionar-se com a alimentação pela
mediação do discurso dietético, a relacionar-se com a
criança por meio do discurso pedagógico e pediátrico, com
o lactente por meio do discurso da puericultura , com a
natureza pela mediação do discurso ecológico, com os
demais homens por meio do discurso da psicologia e da
sociologia. Em uma palavra: o homem passa a relacionar-
se com a vida, com seu corpo, com a natureza e com os
demais seres humanos através de mil pequenos modelos
científicos nos quais a dimensão propriamente humana da
experiência desapareceu. Em seu lugar surgem linhares de
artifícios mediadores e promotores do conhecimento que
constrangem cada um e todos a se submeterem à linguagem
do especialista que detém os segredos da realidade vivida e
que, indulgentemente, permite ao não-especialista a ilusão
de participar do saber. Esse discurso competente não exige
uma submissão qualquer, mas algo profundo e sinistro:
exige a interiorização de suas regras, pois aquele que não
as interiorizar corre o risco de ver-se a si mesmo como
detrito e lixo. (CHAUÍ, 2007. p. 24 e 25)
Decorre desta relação com o discurso competente a produção de determinadas formas
de estar no mundo, de viver o mundo, de se
perceber e de se compreender. As palavras vêm
ganhar um uso especializado, no qual os
indivíduos, passivamente, interiorizam-se às
suas regras, aos seus modos de enunciação e,
com efeito, tomando-as como verdades
incontestáveis a serem vividas. A experiência na
escola, nas suas diversas manifestações, poderá
superar esse uso da palavra como tecnologia de
uma ‘ordem do discurso competente’,
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tomando a palavra, ela mesma, com outras funções, como veremos.
2.2 – DOS USOS DA PALAVRA COMO
POLÍTICA DE VÍNCULOS: RAZÃO
SENSÍVEL, PROXEMIA E PARRESIA
“Você é quem sabe... eu estou aqui pra
aprender com você”! Esta „palavração‟ me
perseguiu durante anos como educador. O lugar
de um „suposto saber‟ me incomodara, muito
antes de escutar esta enunciação. Como aluno, sentia-me numa posição de receber
informações. E, sensivelmente, pude me
aproximar desta experiência do aluno. Meu
corpo sinalizava que existia algo em comum
entre as „palavrações‟ deste aluno com as
minhas próprias experiências na relação com a
educação! Meu corpo „palavreava‟ não com
signos representativos lingüísticos, mas, sim,
através de signos afetivos (DELEUZE, mimeo).
Estes últimos sempre presentes, mas, muitas
vezes, sem espaço, nem tempo para serem compreendidos e compartilhados!
Na minha experiência pessoal, o
professor era aquele que „sabia‟! Suas palavras,
por vezes, transformando-se num „dilúvio
informacional‟, inundava aquele instante,
produzindo algumas idéias: „nossa... como vou
saber tudo isso, somado às outras disciplinas de
tantos outros professores que também sabem
muito?!!”. A sensação nascida destes encontros
era a de considerar os professores como
profetas: eles falam em nome de um saber
superior que eu não conseguia compreender e muito menos „tocar‟ como uma experiência
material. O sentimento era de que eles
anunciavam, com seus discursos, saberes que
garantiriam o nosso futuro. Meio assim como a
experiência profética exposta pela seção 1.4. No
curso dessa experiência, misturavam-se às suas
imagens e seus jogos de „palavrações
conceituais‟ a própria imagem do sábio. A
austeridade do pensamento, uma postura
dirigida ao saber sobre as coisas, uma ascese em
nome da razão e do mundo das idéias! Parecia, por vezes, que tinham poderes de adivinhar o
que eu poderia estar pensando! Nesta esfera,
encarnavam-se em ato as experiências da
profecia, da sabedoria, e da técnica. Três
características que pude experimentar em
minhas vivências „coletivas‟ de aprendizagem.
No entanto, a estas três características,
pude viver em muitos instantes – mesmo que
fossem de relance, como um relâmpago que
passa diante de nós – a experiência que
expandia os momentos em sala de aula: as conversas francas! Experiência da parresia, do
falar francamente, que comparecia nas tiradas
de bom humor de alguns professores. Estes, por
vezes, pareciam se despreocupar com a
obrigação de transmitir a cultura, para se
entregar à experiência coletiva de falar sobre a
vida, falar sobre as experiências que, a um só
tempo, tocam cada um e, com efeito, envolvem
todos nós!
Para além do discurso competente,
alguns educadores faziam o uso das palavras num jogo no qual o vínculo se expandia,
fortalecendo, por sua vez, o desejo de estar com
os outros! Construção de outros conhecimentos,
para além dos já „pasteurizados‟ pelos livros e
pelos próprios discursos dos professores!
Para além do „mercado de
informações‟, desejavam utilizar as palavras
como ferramenta de aproximação, ou como nos
diz Maffesoli, como uma experiência de
„proxemia‟ (2000). Experiência na qual os usos
da palavra eram cultivados para além daqueles
tradicionais e habituais. Experiência que nos retirava de nós para sentirmo-nos num contexto
que nos enlaçava, colocando-nos num território
de interesses comuns! Desta experiência
„proxêmica‟ um outro tipo de razão, ali,
comparecia: uma razão sensível (MAFFESOLI,
2001)! Uma razão na qual, mesmo que de
maneira inconsciente, os conhecimentos, a
cultura nos tocava, nos „abarcava‟, nos tomava.
A „proxemia‟ enquanto experiência da
proximidade propicia a vivência „afetivo-
filogenética‟ que, por definição, é aquela produtora do sentimento de pertencermos a um
grupo, a um coletivo. Segundo Maffesoli (2000,
p. 193 – 194): “A proxemia remete,
essencialmente, ao surgimento de uma secessão
de “nós” que constituem a própria substância de
toda socialidade”. Nesta esfera, inauguram-se
encontros nos quais o ser é compreendido como
coexistência. São ocasiões nas quais
percebemo-nos como obra de arte: construindo
a nossa existência, ela mesma, contribuindo
para a construção de outras existências. Experiência política da virtude que Espinosa
(2000) enunciará como union corporum –
conexiones idearum: união de corpos e
conexões de idéias. Política da sensibilidade:
uma vez que deixamo-nos tocar pela
experiência do outro, ampliando as nossas
capacidades de ser tocados pelo mundo,
ampliando as nossas capacidades de avaliar os
valores, as crenças e as idéias a que estamos
condicionalmente habituados.
Nesta esfera, a imagem que sobrevém à
mente será aquela das culturas orais nas quais, através de cânticos e poesias, uma cultura
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resistia não declinar, não morrer! Resistência, pelos usos da palavra, pelo exercício
„linguageiro‟, atravessando memórias e
experiências cultivadas pela força poética! Vida
compreendida como obra de arte: poiésis,
criação! Vida criada pela abertura ao mundo,
pela abertura à diferença, pela abertura às outras
maneiras de estar no mundo!
E as relações de sala de aula? Quem
sabe poder superar o desejo incessante de
desejar transmitir. Desejar o desejo de, também,
com o outro, compor, construir! Compreender que a cada instante nossa realidade existencial,
na relação com o mundo, constrói-se,
construindo o mundo. Duplo jogo de uma
construção singular e coletiva. Nesta
experiência nossa realidade existencial é parte
de um jogo de construção de novos saberes:
sobre nós e sobre o mundo! Novas ordens de
saberes se expressam quando compreendemos
que estamos produzindo a cultura do presente,
através das nossas formas de estar no mundo, e
nos produzindo, através da cultura na qual
estamos imersos! Afinal, o tempo todo a cultura se faz e se refaz! Desta maneira, poderemos
afirmar que os saberes se constroem
territorialmente, a realidade se inventa e é
“construída por quem crê que a descobre e a
investiga (WATZLAWICK, 1994, p. 17).
Afirmar que o saber se constrói como
invenção de „realidades‟ será dizer que cada
saber deve ser uma „ferramenta‟ que tenha valor
de uso (PASSOS & RAUTER, 2009). Todo
conceito, toda idéia, expressa uma realidade e
esta deverá ter uma função! Um conceito, um saber deverá funcionar em direção aos
problemas que comparecem no presente da
nossa história, senão serão reduzidos à função
de arquivo, de memória. O risco será seu
esquecimento e „menos valia‟ pela falta de uso
coletivo.
Desenvolver as habilidades da
parresia, enquanto tecnologia do falar
francamente será, por sua vez, desenvolver a
habilidade da proxemia. Encontrar a boa forma
de se dizer ao outro aquilo que pensa! Uma ética do cuidado, uma política do respeito!
Desenvolver a habilidade de estar com os
outros, percebendo-se como produtor e produto,
como criador e como ser criado pelos encontros,
será ampliar suas possibilidades de estar no
mundo de forma ‘proxêmica’. Proxemia e
parresia (parresia), como tecnologias, elas
próprias, construindo-se e nascendo-se das
composições na cotidianidade da educação!
Não apenas os usos da palavra no seu
sentido científico, assim como tentaram os
milésios desde Tales de Mileto, não apenas utilizar a palavra como ato de decisões políticas
pela cidade, como faziam os atenieneses, não apenas usar as palavras no seu sentido mítico ou
técnico, mas também utilizar a palavra como um
ato de uma „democracia sensível‟ (FOESSEL,
2008). Experiência na qual o jogo das palavras
reenvia-nos ao mundo sensível das experiências
coletivas, nas quais temos a possibilidade de
sairmos distintos de como chegamos! Território
no qual percebemo-nos movidos por desejos,
por interesses que nos ligam e nos desligam uns
dos outros, aumentando ou diminuindo o nosso
grau de enlaçamento com os outros e conosco. Território tensional e afetivo que comparece a
cada instante e que move nossas idéias, atos e
direções!
Colocar na agenda dos encontros a
abertura ao papel dos sentimentos, dos desejos,
das experiências singulares, podendo, elas
mesmas, tocarem-se, misturarem-se àquilo que
vem sendo reinscrito cotidianamente nas
relações em sala de aula: a insistente formação
de um conhecimento e de um discurso
competente! Construir acontecimentos em sala
de aula, saindo do „negócio liberal‟ de produzir sujeitos competentes com discursos
competentes será um desafio do
contemporâneo!
Desejamos pensar quais serão as
habilidades sociais, afetivas e políticas advindas
desta política dos discursos competentes? Como
imaginar os futuros profissionais, talvez
habilitados por seus conhecimentos técnicos,
mas, incompetentes no plano ético, afetivo e
político! Quais serão os cidadãos, filhos deste
projeto de uma educação vertida ao progresso tecnológico, dirigida às „políticas
conteudísticas‟ e enciclopédicas ligadas a um
mercado que só visa a competição entre os
indivíduos?
DESFIANDO AFETOS PARA NÃO
CONCLUIR
“Gosto de vir pra escola pra conversar
com as pessoas!”. Esta enunciação nasceu de
um momento proxêmico, enquanto educador. Era um momento de entrelaçarmos nossas
idéias, afetos e experiências para pensar os
acontecimentos da educação. A „palavração‟
acima também abriu o horizonte das minhas
idéias acerca da produção de conhecimentos na
educação. A produção de conhecimentos na
educação não pode se reduzir à divinização de
conteúdos que venham servir exclusivamente às
competências técnicas! No entanto, a maior
parte do tempo, os alunos e educadores estão
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„encurralados‟ na experiência de darem conta de conteúdos dirigidos, principalmente, ao
vestibular!
Poderemos indagar: educadores,
alunos, coordenações e pais acreditam neste
modelo de educação que, na sua maior parte,
tem como télos, isto é, como fim, a construção
de um discurso e de um pensamento
competente? Em meio às tantas avaliações
existentes, em algum momento pensa-se em
avaliar o sentido deste projeto de uma educação
que tem como arte a „arte de reduzir cabeças‟ (DUFOUR, 2005) às competências técnicas?
Até que ponto todo mundo acredita, ainda, neste
projeto que tem como „inspiração‟ a Ordem e o
Progresso? Qual é a „ordem‟ que se produz com
a „progressiva‟ idéia de um projeto que se
pretende competente através da primazia de um
discurso competente tecnicamente? Até que
ponto este projeto, movido pela aquisição de
conteúdos enciclopédicos, serve mais para
ocupar crianças e adolescentes, disciplinando-
as, „docilizando-as‟ para que servilmente
obedeçam desde pequenas e não aprendam a contestar criticamente o que se mantém
instituído e decidido por alguns? Até que ponto
a violência que encontramos no interior das
escolas é parte de uma descrença neste modelo?
Estas indagações são movidas por
inúmeros afetos que se misturam às inúmeras
imagens que sobrevém à mente! Muito mais que
respondê-las, tenho a sensação de que mudanças
importantes precisam se operar na sociedade e,
não apenas no interior das relações da educação!
Uma sociedade que se permita sair da passiva „servidão voluntária‟ (LA BOÉTIÉ, 2001).
Servidão que vem servir aos interesses daqueles
que se dizem „representar interesses coletivos‟!
Servidão voluntária que deixa de exercitar um
certo tipo de experiência: a de aprender dizer a
verdade de forma pacífica, sem violência!
Aprender a arte da proxemia, da proximidade,
exercitada no interior das práticas educativas,
como forma de exercício ético-político de
compartilhamento das idéias e desejos, vertidos
aos interesses comuns! Aprender, no interior das práticas educativas, outras competências –
proxêmicas e parresiásticas – que poderão
contribuir para a construção de uma sociedade
na qual o respeito, a sensibilidade ao outro,
sejam experimentadas. No entanto, vemos que
os discursos proferidos em sala de aula, são
prioritariamente aqueles que se dirigem às
aprendizagens das competências técnicas, estão
ligados à construção individual de um discurso
dirigido, talvez, para responder às exigências do
mercado! Mas, sabemos pela experiência, que
apenas aqueles que „docilmente‟ aprenderem a „falar a língua‟ discursiva técnica, „talvez‟,
encontrarão um „lugar ao sol‟ no horizonte dinâmico do mercado! Quem não se apropriar
deste discurso estará fora! Estes serão, como
vimos, os „incompetentes sociais‟: desprovidos
da arte de falar em nome da língua
„especialística‟! No entanto, aqueles providos da
língua „especialística‟, poderão falá-la, mas
assim como um profeta: não falam em nome
próprio! Falam a língua da cultura, serva do
„divino mercado‟ (DUFOUR, 2008), falam em
nome de uma ética de mercado que só faz
dividir, separar, individualizar e competir! Lógica que vem produzir, paulatinamente,
indivíduos que utilizarão outros indivíduos para
chegarem àquilo que desejam! Lógica de
consumo entre indivíduos: não importando mais
as pessoas, importando, sim, aquilo que se
deseja para se alcançar o sucesso profissional
(individual) ou qualquer outro que seja!
Exercitar a proxemia: proximidades
entre as singulares existências! Exercitar a
parresia : aprender a compartilhar a experiência
de falar em nome próprio, respeitando-se as
diferenças. Arte do encontro, política de construir-se a si e o mundo!
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