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Psicologia na Actualidade | Edição nº37 | Julho - Agosto 2017 Psicologia na Actualidade | Edição nº37 | Julho - Agosto 2017 60 MINUTOS COM E NTREVISTA MARGARIDA GASPAR DE MATOS

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A Pschology Now – a Revista Psicologia na Actualidade, esteve à conversa com a Professora Margarida de Matos.

Esta entrevista foi uma surpresa, vimos a mulher e a investigadora, os seus sonhos, o que pensa, o que faria e acima de tudo o que tem feito.

P.AFale-nos um pouco de si a nivel pessoal e profissional?

Professora Catedrática na Faculdade de Motricidade Humana, Universidade de Lisboa e  Investi-gadora no Centro de Investigação  WJCR do ISPA e no ISAMB / Faculdade de Medicina. Sou  Psicóloga Clínica e da Saúde, especialista em Psicoterapia; Necessidades Especiais; e Psicologia do Desporto.Sou Licenciada em Psicologia Clínica no ISPA (fiz estágio no Hospital Stª Maria/Psiquiatria com o Prof Bracinha Vieira), tenho uma  Pós-graduação em Biologia Humana / Psicoterapias Cognitivas e Com-portamentais na Universidade Claude Bernard (com estágio no Hospital Pierre Wertheimer com o Prof Jean Cottraux), formação esta que me deu o titulo de Psicoterapeuta pela Associação Francesa.Sou doutorada na Faculdade de Motricidade Humana na área da Educação  Especial e Reabilitação. Fiz formação pós-doutoramento na área de promoção e educação para a saúde na SDSU, em S. Diego (Medicina do Comportamento) e na QUT, em Brisbane (Saúde Pública).A minha Agregação foi em Saúde Internacional no Instituto de Higiene e Medicina Tropical, da Univer-sidade Nova de Lisboa ligada ao meu trabalho com CPLP nomeadamente em Africa, Brasil e Timor. Sou Coordenadora nacional do estudo da OMS / HBSC entre outros estudos internacionais, e em Por-tugal da equipa Aventura Social e do projeto Dream Teens. 

Gosto muito de escrever e acho que a divulgação cientifica é uma "obrigação" de um cientista, por isto, pela minha ligação a várias redes de investigação internacionais e pela minha excelente equipa, temos um vasto número de publicações nacionais e internacionais em português, inglês, francês, espanhol e italiano.

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Tenho trabalhado sobretudo com crianças e jovens, com especial foco na promoção da saúde, nas perturbações do comportamento social, e nas questões entre-culturais (saúde internacional), que me têm levado em viagens mais ou menos prolongadas e a destinos mais ou menos longínquos e exóticos.

Tenho algum cuidado em separar a minha vida pública como investigadora, da vida privada como cidadã. Como "cidadã" não me costumo apresentar publicamente, até porque apesar de considerar ter "uma vida boa" não a acho (nem a quero) de interesse público. Tenho 3 filhos e 3 netos, moramos em Lisboa embora eu seja natural de Coimbra e lá tenha feito o "liceu".

Gosto muito de viajar, não em turismo, mas em "viagem", gosto de sair da minha zona de conforto  e ir-me reinventando. Até agora tenho conseguido isso. Quando era adolescente comecei a viajar para aprender línguas e para treinar (pratiquei dança clássica e moderna muitos anos e aproveitava os intervalos letivos para fazer cursos no estrangeiro), depois fiz várias viagens e es-tadas no estrangeiro para me especializar na Psicologia (França, Reino Unido, Estados Unidos, Austrália) e mais tarde para colaborar em redes internacionais de investigação (um pouco por todo o mundo). Mas vamos também muitas vezes de férias.Viajar em trabalho, aproxima-nos mais das pessoas e afasta-nos da lógica do "turista", viajar em férias é o "desligar total. Gosto das duas modalidades. Nunca me assustou o trabalho árduo, mas francamente a rotina quando é inútil satura-me, p.e. nunca me consigo entusiasmar com as questões institucionais palacianas, intrigas de bastidores e burocracias paralisantes. Aliás atribuo grande parte dos problemas nacionais a estas três questões.

Gosto de música, e tento manter o meu gosto (repare que não falo de talento, mas de gosto), pelo piano. Gosto de alguns desportos que não envolvam competição com especial afeto pelos desportos aquáticos e na neve (uma vez mais falo de gosto e não de talento).

Gosto de escrever, tenho vários livros (técnicos) publicados e tenho previsto mais um livro para 2017, depois  tenho uma linha editorial mais intimista toda já imaginada, que guardo para a altura em que me aposentar.Escrever coisas sobre pessoas ocupa muito espaço e tempo mental. Não consigo fazer enquanto "a correr" este dia a dia.

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P.ASabemos que tem décadas de ensino, o que pensa do ensino superior em Portugal?

Eu não me vejo muito como professora embora esteja na Faculdade já há 30 anos.Gosto dos alunos, mas o meu trabalho favorito é a investigação, a orientação de investigações no ensino pós graduado. Depois gosto de participar e supervisionar em programas de intervenção na comunidade; gosto de participar em grupos de trabalho; gosto de tentar pressionar o poder politico e servir-me da minha investigação para tentar transformar Portugal  num pais melhor, (ainda melhor).

Cada vez que estou numa turma com os alunos à frente, acho uma experiência sempre agradável e renovadora, mas definitiva-mente não me vejo como professora.

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P.ATem desenvolvido um mega projecto com a Aventura Social.O que a marcou neste projecto?

As estruturas universitárias são algo barrocas e é necessário um enorme rol de burocracias para tudo: para criar um Centro de Estudos, um Clube, um Grupo de interesse especial, uma equipa, o que quer que seja... Ao que há 30 anos (fazemos este ano em julho 30 anos) chamámos Aventura Social era basicamente "um grupo de nós". Durante estes 30 anos o grupo inicial tem-se mantido, outros elementos têm circulado em formação ou em colaboração, mas basica-

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P.AO que pensa da investigação em Portugal, nomeadamente na área da Psicologia?

Ui... entramos muito tarde neste processo, mas claro que não podemos estar permanentemente a desculpar-nos com o passado.... mas vê-se que por exemplo pegando na Psicologia comparada com as Ciências Básicas ou da Vida, esse atraso ainda é mais notório.Na minha opinião o primeiro mandato do Prof. Mariano Gago foi fundamental para pôr as coisas a sair do pântano e a andar, mas a partir daí andamos efetivamente em patinagem, escorrega para a direita , escorrega para a esquerda, para tudo e  faz tudo de novo sem avaliação do "anterior... enfim aquelas coisas para que me falta a paciência.

Então a nós que andamos a patinar nisto há muito tempo, não há incentivos, não há condições, não há coerência, não há reconhecimento. Os jovens que tentam agora entrar para o "ofício" , embora tenham nacionalmente condições que há 30 anos só havia saindo do país, ficam sem horizontes a médio prazo que lhes permitam investir com segurança no esforço do dia a dia, p.e. para concluir um projeto de doutoramento ou pos-doutoramento. A ideia geral é que individualmente estão a trabalhar para sair do país, ou ser desempregados (ou sub-empregados) altamente qualificados .

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mente do ponto de vista de nós técnicos , foi uma auto-apresentação "desburocratizada e pró-ativa com foco no desenvolvimento das pessoas e das comunidades", do ponto de vista da nossa população -alvo ( jovens) foi uma apresentação "saudável" sem ter ressonâncias patológicas, mas a apelar  para o crescimento pessoal e participação social, questões porque sempre nos batemos.

Em www.aventurasocial.com podem ver a nossa história, projetos, relatórios e publicações. Temos atualmente uma vertente de Estudos à população na área da saúde; uma área de intervenção com populações vulneráveis e uma área de intervenção universal mais ou menos associada ás politicas públicas na área da infância e juventude e suas famílias.

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P.AAcha que o governo está a par da investigação produzida nas universidades portuguesas e utiliza-a?

Este governo está há pouco tempo em funções para conseguirmos saber se vai ou não considerar o saber, a investigação  e as pessoas envolvidas em tudo isto. Costuma-se dizer que o maior sonho de um investigador é ser ouvido pelos governantes e o seu saber servir para ajudar o país (ou o mundo) a  se tornar melhor, sendo o pior pesadelo os governantes "serviram-se" desse mesmo saber , "amputando-o na medida certa" e servindo-se dele abusivamente para validar ( branquear) praticas governamentais mais duvidosas. 

É cedo para avaliar este governo. Alias a ciência vive do longo prazo e "definha" sempre que é confrontada com prática sub-de-senvolvida usada por quase todos os governos de chegar, fazer um "reset a zero" e começar tudo de novo. O país precisa de con-tinuidade em questões técnicas e os governantes nem se deviam meter nisso. É cedo para avaliar este governo mas tenho várias histórias na ordem do burlesco a ilustrar o que acabei de dizer e, diga-se de passagem não com "este ou aquele governo", mas no geral com todos.

Também há um enorme trabalho de "moralização" (no sentido de retirar da "desmoralização") da função pública, que no fundo tem funções administrativas em cada Governo. Ao longo deste anos entrar numa repartição publica foi sempre uma penosa experiencia de "regresso ao passado"! Esta "desmoralização"  dos funcionários é muitas vezes acompanhada por um estilo de chefia virada para o passado e para a manutenção do status... Fica difícil para algum governo mudar este "magma", desde há 30 anos temos progressos claro, mas sempre com muito esforço e pouco rendimento. Talvez fosse tempo de pensar nos processos e virá-los "para a luz".

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P.AImagine se fosse Ministra da Educação, quais as medidas que tomaria para o ensino em termos gerais e particulares?

Eu tive já a oportunidade de trabalhar mais de perto com dois Ministros da Educação e dois Ministros da Saúde, por sinal de partidos diferentes, que eu considerei pessoal e profissionalmente pessoas impares pela sua "visão", capacidade de trabalho e proximidade com as pessoas e com as causas. Se eles não conseguiram fazer melhor, eu também não seria capaz. Nem me prontifico a tentar  imaginar. Os Ministros têm constrições que a maior parte das pessoas nem imagina e que basicamente lhes tolhem os movimentos e deitam a baixo a motivação. Eu tenho um enorme interesse e comprometimento pelas políticas públicas, mas o problema está na engrenagem.Nem sei o que lhe diga, nem por onde começaria.

P.ASe pudesse fazer tudo de novo, o que não faria?

Como diz o Kundera na vida o ensaio geral é " a própria vida" e se eu me pusesse aqui a dizer que partes menos agradáveis eu evitaria, depois o percurso sem essas partes não me teria dado outras coisas que eu valorizo extremamente.

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Se eu tivesse seguido a carreira de bailarina teria perdido toda uma vida de investigação ; se eu tivesse ido estudar aos 17 anos para o estrangeiro não teria tido "estes" filhos e por sequência " estes" netos... ; se eu tivesse aceite ir trabalhar para o " privado" , teria perdido a colaboração com redes internacionais públicas; se eu tivesse aceite ir trabalhar " para o Governo" , tinha ficado "de-sempregada" passado o período desse governo... por isso basicamente não consigo identificar nada que claramente fizesse diferente.

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P.AQual o futuro da Psicologia em Portugal?

Só pode ser risonho. É recente e tem avançado a passos largos, sobretudo se considerarmos o que tenho vindo a falar sobre governação. Tem desafios interessantes na relação dos Psicólogos entre si e na relação dos psicólogos com "o resto do mundo".  Tudo desafios interessantes que eu aguardo a evolução com curiosidade e expectativa.  Começamos ainda há pouco a definição das carreiras, do "Ato psicológico" , a valorização e controlo de qualidade da profissão.

E os Psicólogos serão cada vez mais necessários, ao contrário de algumas carreiras que irão definhar com as novas tecnologias.Os psicólogos ajudam as pessoas a ter uma vida melhor, o seu papel esta cada vez mais valorizado e reconhecido, por isso  enquanto houver pessoas haverá necessidade de psicólogos, não apenas para as " tratar" , mas para as ajudar a desenvolver o seu potencial e a viver melhor.

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FaCuldadE dE motriCidadE humana; uniVErSidadE dE liSBoa

iSamB / FaCuldadE dE mEdiCina / uniVErSidadE dE liSBoa WJCr/ iSpa

P.ASabemos que existem muitos profissionais desempregados na área da Psicologia, o que faria para mudar esta tendência?

Essa parte já não tem a ver com o mérito da Psicologia e dos Psicólogos mas com o contexto. Por um lado talvez se deva regular a quantidade dos Psicólogos ( como se está a  fazer com a qualidade), por outro lado sensibilizar a população e os empregadores para a relevância da Psicologia... mas isso também tem sido feito.... a verdade é que há mui-tos profissionais desempregados " ponto", não só psicólogos. Há toda uma geração a "subemprego".

Talvez esta geração se tenha que especializar em versatilidade, mudança, inovação e empreendedorismo... criar e desenvolver postos de trabalho... porque não é só o desemprego , são também as condições de trabalho ( precárias) que " desmoralizam!

Mas este é um " sinal dos tempos" a contrastar  com o cinzentismo e a inércia de um fun-cionalismo público anterior de que já falámos... acontece o mesmo pela Europa fora...

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