Economia capitalista neoliberal e pandemia COVID-19

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Economia capitalista neoliberal e pandemia COVID-19:

entendendo a diferença de embarcações1

Ana Monteiro Costa2 Cauê Assis Braz3

RESUMO: Diante da crise que se intensifica com o coronavírus, este texto procura suscitar o debate sobre o enfrentamento à epidemia a partir das estruturas econômicas que nos colocam em um quadro de abissais diferenças de vulnerabilidade frente a uma crise sanitária. Para tanto, abordamos a crise de valorização do capital previamente existente, as características e as consequências do neoliberalismo sobre a concentração de renda e riqueza, a desigualdade socioeconômica e o processo de desmonte dos sistemas de saúde e de pesquisas científicas. De modo específico, procuramos destacar a situação do Brasil e demonstrar, através de dados e análises, que existe um contingente populacional com identificação étnica, de gênero e espacial, principal vítima desse sistema excludente, que transforma os bens comuns em mercadoria, que deveria ser priorizado em qualquer política pública que se proponha de enfrentamento à disseminação do vírus.

1Os autores agradecem as críticas e sugestões de Saritha Denardi Vattathara, Júlio Picon Alt,

Mauren Buzzatti, Andrey Henrique Figueiredo dos Santos, Frederico Toscano Barreto Nogueira, Daniela Dias Kuhn e João Policarpo Rodrigues Lima, isentando-os sobre quaisquer erros, sendo o conteúdo desse texto responsabilidade exclusiva dos autores. 2 Professora DECON/UFPE. Integrante GEPIES.

3 Mestrando em Desenvolvimento Rural PGDR/UFRGS. Bacharel em Ciências Econômicas

FCE/UFRGS. Integrante GEPIES.

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1. Introdução

Em meio à pandemia da COVID-19, uma frase tem sido bastante

proferida nas redes sociais “estamos todos no mesmo barco”. O oceano pode

ser o mesmo, mas as embarcações são muito diferentes, e essas diferenças se

acentuaram a partir da fase capitalista do neoliberalismo. Para discutirmos

esse assunto, propomos esse texto de discussão para o Grupo de Estudos e

Pesquisas sobre Interculturalidades e Economias do Sul – GEPIES. Nosso

objetivo é suscitar a urgência em visibilizar o sofrimento daqueles que

apresentam maior vulnerabilidade econômica, social e ambiental, nas cidades

e principalmente no campo, e defender a priorização das ações direcionadas a

essas comunidades. Para tanto, contextualizaremos a economia capitalista

central pré-coronavírus, abordando a crise de valorização do capital e as

características do neoliberalismo que, pra além de uma ideologia que sustenta

essa fase do capitalismo, é um componente estrutural fundamental para a

expansão do capital. Discorremos, então, sobre os impactos dessa crise

capitalista em economias periféricas, focando no Brasil. Tratamos essa

discussão de modo sistêmico, entenda-se que procuramos abordar aspectos

econômicos, ambientais e sociais. Essa contextualização sistêmica incorpora

um enfoque sobre aquilo que acontece no Brasil, considerando a população

que menos acessos sociais e econômicos tem ao seu alcance para se

defender, com o isolamento social.

Como método, procuramos apresentar e analisar um compilado de

análises sobre o capitalismo contemporâneo, bem como sobre aquilo que

acontece a partir do vírus. Para analisarmos a situação do sistema de saúde e

a condição sócio-econômica daqueles mais vulneráveis4 frente ao novo

contexto, recorremos a dados secundários de organismos e institutos públicos

e da sociedade civil, bem como estudos de especialistas. Consideramos que

essa seja uma contribuição importante para provocar debate em um momento

de necessidade de análise de uma conjuntura complexa, com respostas em

construção. Por isso, nossa intenção não é traçar um plano de ações, mas um

4 Reconhecemos que a vulnerabilidade sócio-econômica se concentra nas periferias dos

centros urbanos e no meio rural. Além disso, as vulnerabilidades são racializadas, ou seja, atingindo com maior dano a população negra e indígena. Essa vulnerabilidade também está mais presente entre as mulheres.

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caminho de reflexões que nos ajude a construir essas propostas em conjunto.

Para tanto, este texto aborda os seguintes temas, assim ordenados:

apontamentos sobre a crise capitalista pré-pandemia; apontamentos sobre o

neoliberalismo; algumas análises sobre o contexto a partir do coronavírus;

dados sobre o sistema de saúde no Brasil, principalmente sobre o acesso a

Unidades de Terapia Intensiva e o tipo de retenção; dados sócio-econômicos

da população brasileira mais vulnerável no contexto de isolamento social e de

segurança de saúde. Por fim, propomos uma síntese reflexiva sobre o quadro

pré e pós pandemia.

2. O capitalismo contemporâneo anterior e em meio à COVID-19

Como primeiro apontamento, esclarecemos que quando falamos de

crise nos referimos a algo estrutural do sistema capitalista. Como relembra

Prado5, o desequilíbrio permanente é próprio da essência do capital e as crises

são soluções das contradições existentes, para reestabelecer um equilíbrio

perturbado. A expansão do capital implica em um crescimento exponencial e

este incorre, endogenamente, em catástrofes. Diferentemente do pensamento

keynesiano que vê as crises como algo conjuntural, portanto regulável, a visão

marxista vê as crises como eventos que corrigem as contradições do sistema.

Mas, como aponta o professor Prado6, as crises atingem fundamentalmente

aqueles mais vulneráveis no sistema e, portanto, devemos analisar as

características dessa crise, bem como procurar propostas de mitigação e

superação do quadro atual e do que está por vir. Seguimos o diagnóstico de

Michael Roberts (2020a), segundo o qual o que presenciamos a partir do

coronavírus não é um choque, mas o resultado da busca do capital por lucro na

agricultura e na exploração da natureza, além de ser o resultado de uma

economia enfraquecida, que não chegou a se recuperar da crise 2007-08.

Temos então uma crise em três dimensões: ambiental, social e de valorização

do capital. Começaremos com a análise desta última.

5 PRADO, E. A grande onda das dívidas está chegando… Economia e Complexidade. 3 de

fevereiro de 2020. Acesso em https://eleuterioprado.blog/2020/02/03/a-grande-onda-das-dividas-esta-chegando/ 6 Idem.

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O contexto econômico pré-pandemia já estava em crise, com a

lucratividade do capital apresentando uma tendência de queda. Segundo

Roberts (2020), a economia capitalista tem crescido a uma taxa de 2,5% a.a.,

destacando-se os crescimentos dos EUA (2% a.a.), Europa e Japão (1% a.a.),

a estagnação das principais economias emergentes (Brasil, México, Turquia,

Argentina, África do Sul e Rússia), e a desaceleração da Índia e China. Ainda,

houve um estímulo, através da queda das taxas de juros, para o endividamento

de Estados e empresas, o que, argumenta Roberts (2020), cria condições para

um colapso do sistema econômico se a rentabilidade do capital cair

drasticamente [o que aconteceu a partir do isolamento social]. O passivo não

financeiro das grandes corporações tem crescido, estando a maior parte

concentrado nos ramos mais antigos da economia e não nas empresas de alta

tecnologia, o que coloca um quadro de maior dificuldade para saldar as dívidas

com os lucros. As médias e pequenas empresas, não alavancadas pelo

endividamento, acabam sem disponibilidade para investimentos (ROBERTS,

2020). Para Harvey (2020), além da crise de valorização, também já havia

problemas de insuficiência de demanda diante da capacidade de produção de

valor do capital antes do COVID-19.

As projeções para as quedas de produção no mundo com o coronavírus

(quando inicialmente a disseminação do vírus estava mais localizada na

província chinesa de Hubei) comparavam a crise com a dos anos 2008-09,

considerando a interligação da economia chinesa com os sistemas produtivos

mundiais. Mas, com a pandemia, as projeções passaram a apresentar

prognósticos recessivos aproximados àqueles da década de 1930. Mesmo no

período no qual estava praticamente restrito a província chinesa, Harvey (2020)

já sinalizava os possíveis impactos globais, por ser a China a segunda maior

economia do sistema e estar interligada às plantas industriais por todo o

mundo. O colapso das vendas, a interrupção das cadeias de suprimentos e a

acentuação da queda da taxa de lucro ocasionarão a quebra de empresas

(alguns analistas apontam que indústrias deixarão de existir). Segundo Roberts

(2020), o choque de demanda será uma conseqüência da queda da renda.

Estando as empresas endividadas, isso tem forte impacto financeiro. Roberts

(2020) aponta um ciclo econômico posterior ao vírus em formato de U, com

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uma recuperação mais lenta e não em V. O autor marxista reconhece o vírus

como um ponto de inflexão em um sistema instável que sofre uma avalanche

em função das contradições subjacentes ao mesmo.

Em relação a isso, Harvey (2020) ressalta a importância sobre o tempo

de duração de parada das economias, porque, como aponta Marx, a

desvalorização não ocorre porque as mercadorias não podem ser vendidas,

mas porque não são realizadas a tempo. Como ressalta Prado, remetendo a

Marx, o empecilho à produção capitalista é o capital, e essa contradição torna

as crises estruturais. “Se o Estado se endivida para conter o processo da crise

ou as suas piores consequências num certo momento, o próprio crescimento

de seu endividamento se torna uma nova barreira para a produção capitalista

no momento seguinte” (PRADO, postagem blog, 03.02.2020).

Segundo essa perspectiva marxista, a crise não é causada por um

choque de demanda, mas por um choque de oferta, em função das perdas de

produção, investimento e comércio em conseqüência do isolamento social. Isso

tem impacto sobre a demanda, que acaba reforçando o impacto sobre a oferta.

Como medidas econômicas de enfrentamento da crise a partir do coronavírus,

são intensificadas as operações nas quais os bancos centrais garantem

fornecer liquidez ao sistema financeiro. Mas, como pontua Roberts (2020), a

flexibilização monetária tende a empurrar alguns efeitos da crise para um futuro

muito próximo, a medida que as taxas de juros dos bancos centrais já estão

próximas de zero ou até negativas e não parecem estimular a economia em um

quadro tão incerto. O risco de uma intensificação de uma crise financeira nos

EUA, dado que a dívida corporativa está concentrada em títulos emitidos por

empresas mais fracas, é alto. Além disso, a queda do preço do petróleo gerou

uma crise no setor de energia, atingindo também o sistema financeiro, já que

os prêmios pelo risco de títulos, os custos dos empréstimos, aumentaram muito

nos setores de energia e transportes.

Roberts (2020) acentua que a amenização deste quadro está mesmo em

medidas de política fiscal, no entanto, elas parecem muito aquém do

necessário, pois se a queda prevista é de 10% da riqueza e os governos

anunciam pacotes de 1,5% do PIB, como no Reino Unido, 1,4% na Itália e 1%

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nos EUA, esses incentivos são insuficientes para a retomada. Harvey (2020)

indica que, diante de uma incapacidade de retomada da valorização do capital

pela China, tal qual ocorreu pós-crise 2007-08, uma política fiscal americana de

grandes proporções é imperativa. Segundo o autor, o capitalismo neoliberal se

sustenta cada vez mais no capital fictício e na expansão da oferta de dinheiro e

na criação de dívida. A resposta à queda do consumismo para manter o

sistema, para Harvey (2020), viria de um consumismo de massa financiado e

motivado pelo Estado, o que exigirá a socialização de toda a economia norte

americana. Importante ressaltar que essa análise foi elaborada antes dos EUA

se tornarem o epicentro da contaminação por coronavírus.

Então, a partir dos apontamentos acima, constata-se que a economia

capitalista neoliberal já se encontrava em uma grave crise de valorização.

Nossa argumentação sobre o neoliberalismo segue a interpretação

foucaultiana de Dardot e Laval (2016) e de Hamann (2012), segundo a qual a

crise atual é uma crise da governabilidade baseada na generalização dos

mercados e da concorrência nas relações humanas. Ainda, trata-se de uma

necessidade estrutural do sistema no seu processo de valorização atual. Nesta

visão, o Estado também é regido pela racionalidade de mercado, sendo um

empreendimento organizado e cobrado segundo o positivismo econômico,

tendo por obrigação fomentar a competição por meio da instalação de

mecanismos e regras que inibem ou estimulam a população e as instituições.

Não se trata de menos Estado, mas de um Estado voltado para o capital,

reduzindo seu papel distributivo com relação ao trabalho e defendendo a

austeridade fiscal que impacta na privatização, redução ou supressão dos

serviços públicos. Entender o papel do Estado neoliberal é bastante importante

para compreendermos o sistema de saúde e o quadro social que se

estabelece. Concordamos com Hamann (2012), quando defende que os

estudos da governabilidade de Foucault procuraram analisar as relações

históricas de poder, saber e subjetividade, para compreender aquilo que se

vive e construir, se for o caso, oportunidades de resistência.

Assim, é preciso compreender como a governabilidade neoliberal se

transmuta em um quadro normativo que conduz os indivíduos, usando o

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discurso da liberdade. As condutas, práticas e escolhas recebem o véu da

liberdade, mas são atos de condução, que se transformam em autocondução.

“O neoliberalismo pode ser definido como o conjunto de discursos, práticas e

dispositivos que determinam um novo modo de governo dos homens, segundo

o princípio universal da concorrência” (DARDOT e LAVAL, p. 17, 2016). Mas, a

governabilidade neoliberal não é um simples ato de imposição: governar

conforme o princípio neoliberal é exercer com os demais uma conduta que se

exerce consigo, o que pressupõe liberdade como condição de possibilidade

(DARDOT e LAVAL, 2016). Disto, os trabalhadores remetem seus “fracassos”

ao resultado de uma conduta própria ineficiente, e o comum deve ficar sob a

gerência de cada um, que, racionalmente, é capaz de fazer escolhas em uma

expansão do espectro da liberdade e da eficiência.

Para os marxistas, o capitalismo é um modo de produção econômico

que independe do direito, gerando a ordem jurídica e política que necessita a

cada etapa do seu desenvolvimento. Assim, o neoliberalismo não promove

somente um novo regime de acumulação, mas sim uma nova sociedade:

“longe de pertencer a uma ’superestrutura’ condenada a exprimir ou obstruir o

econômico, o jurídico pertence de imediato às relações de produção, na

medida em que molda o econômico a partir de dentro” (DARDOT e LAVAL, p.

24-5, 2016). Nesse sentido, assume-se que o capitalismo não é uma ordem

natural, mas que compõe um complexo econômico-jurídico, no qual não existe

política ou economia neoliberal, mas sim sociedade neoliberal. A proposta não

é saber os limites ao governo, ao mercado, aos direitos e ao cálculo da

utilidade, mas como fazer do mercado princípio do governo dos homens e de si

mesmos. É a proposição da lógica de mercado como a lógica normativa

generalizada, desde o Estado até o profundo da subjetividade (DARDOT e

LAVAL, 2016). Esse é um sistema que, na sua versão neoliberal, ameaça

fortemente os direitos civis e sociais conquistados com muitas lutas por

sindicatos e movimentos sociais.

Essa força, para dar impulso à acumulação de capital, se apresenta como um paradigma de racionalidade que visa condicionar em geral os comportamentos das pessoas, assim como o sentido do desenvolvimento da sociedade como um todo. Para tanto, ao mesmo tempo em que sacraliza o sistema econômico, busca transformar as

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pessoas em empresas, tratando-as de modo anti-humanista como se fossem mero capital humano (PRADO, p. 3, 2016).

Concomitantemente, o Estado também é regido pela racionalidade de

mercado, sendo um empreendimento organizado e cobrado segundo o

positivismo econômico, tendo por obrigação fomentar a competição por meio

da instalação de mecanismos e regras que inibem ou estimulam a população e

as instituições a fazerem escolhas dentro da lógica em que se privilegia a

acumulação de capital. “De fato, a habilidade do governo em operar sob as

regras de custo-benefício da economia máxima, ao mesmo tempo em que

‘vende’ esse ‘modo de fazer’, tornar-se seu critério único de legitimidade”

(HAMANN, p. 107, 2012). No entanto, ao reconhecer que a racionalidade de

mercado não é natural, que a competição entre as pessoas não é algo

intrínseco ao comportamento humano, e que há necessidade de haver,

portanto, uma atuação ativa na construção, consolidação e perpetuação

desses valores, o neoliberalismo tem o Estado como imprescindível. (...) “o

‘homem econômico’ é um sujeito que deve ser produzido por meio de uma

forma de conhecimento e de relações de poder que buscam encorajar e

reforçar práticas individuais de subjetivação” (HAMANN, 2012, p.107).

O neoliberalismo, portanto, compõe uma metamorfose do capitalismo

que transcende uma forma de ideologia ou tipo de política econômica7, sendo

um sistema normativo que estende a lógica do capital a todas as relações

sociais, através de sua racionalidade governamental, ou governabilidade8. A

governabilidade é vista, por Foucault, como a união das técnicas de dominação

exercida sobre os outros e de si mesmo: “governar não é governar contra a

liberdade ou a despeito da liberdade, mas governar pela liberdade, isto é, agir

ativamente no espaço de liberdade dado aos indivíduos para que estes

venham a conformar-se por si mesmos a certas normas” (DARDOT e LAVAL,

p. 19, 2016). Como consequência, o neoliberalismo acaba por minar tudo o que

é comum, como as heranças culturais e ambientais.

7 Segundo Dardot e Laval (2016), a partir dos anos 1970 e 1980 o neoliberalismo foi

interpretado como se fosse uma ideologia, que via o mercado como uma realidade natural, como uma reabilitação do laissez-faire, e como política econômica como defesa da retirada de direitos sociais e desregulamentação sobre a renda e o capital. 8 “O termo ‘governabilidade’ foi introduzido precisamente para significar as múltiplas formas

dessa atividade pela qual homens, que podem ou não pertencer a um governo, buscam conduzir a conduta de outros homens, isto é, governá-los” (DARDOT e LAVAL, p. 18, 2016).

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Ao produzir a identificação do ser humano com o homem econômico na vida prática do mundo contemporâneo, ao consagrar o auto interesse como a norma de vida de todas as esferas, o neoliberalismo passa a conspirar sistematicamente contra o ‘comum’ e, assim, contra a sociabilidade aglutinadora que preserva e desenvolve este ‘comum’, isto é, a própria democracia. Ele mina a possibilidade de uma democracia radical que se deseja, porque mina já a democracia formal e medíocre que hoje se tem (PRADO, p. 4, 2016).

Quarenta anos de neoliberalismo deixaram uma economia de mercado

ainda mais fragilizada. O que estamos presenciando com o COVID-19

demonstra a falácia do argumento de defesa de um sistema de saúde eficiente

a partir da sua mercantilização.

Tanto a propagação do vírus responsável por essa pandemia como as medidas desigualmente eficazes tomadas pelos Estados para proteger as suas populações provam, se necessário, que a saúde é, antes de mais nada, um bem público: que o estado saudável ou mórbido do corpo de cada pessoa depende em primeiro lugar do estado saudável ou mórbido do corpo social, do qual o primeiro é dependente ou um simples apêndice, e da capacidade ou não do referido corpo social se defender, por si ou através de instituições políticas, contra fatores patogênicos, em particular desenvolvendo um sistema de assistência social eficiente e uma política de saúde pública que proporcione ao segundo os meios necessários e suficientes (humanos, materiais, financeiros) (BIHR, 2020, p. 25).

Os EUA, país hegemônico do sistema, ainda discute a universalização

do acesso gratuito de saúde e paga um preço contabilizado em número de

vidas por ter, além de tudo, reduzido a disponibilidade do atendimento diante

da meta do lucro. Quando o lucro é a meta, precisa-se trabalhar a partir da

ocupação efetiva dos leitos, ou seja, uma disponibilidade just in time. Leitos

desocupados incorrem em prejuízo. Segundo Davis (2020), a Associação

Hospitalar Americana indica uma redução de 39% no número de leitos

hospitalares entre 1981 e 1999, com uma ocupação média de 90% da

capacidade o que mostra um limite para o enfrentamento de um aumento

repentino de demanda. As metas de austeridade, segundo o autor, diminuíram

os orçamentos locais destinados à saúde e também representaram o

fechamento pelo presidente Trump do escritório da Casa Branca responsável

pelo enfrentamento a pandemias, criado pelo ex-presidente Obama, quando do

surto de Ebola, em 2014.

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Em muitas partes do suposto mundo ‘civilizado’, governos locais e autoridades regionais/estaduais, que invariavelmente formam a linha de frente da defesa em emergências de saúde pública e segurança desse tipo, tinham sido privadas de financiamento graças a uma política de austeridade destinada a financiar cortes fiscais e subsídios às corporações e aos riscos (HARVEY, 2020, p. 17-18).

Para Harvey (2020), um sistema de saúde universal não ocorrerá

enquanto os movimentos populares não quebrarem o poder da indústria

farmacêutica e dos cuidados de saúde com fins lucrativos. Acesso ao sistema

de saúde e o desenvolvimento pesquisas de medicamentos e vacinas voltados

ao lucro não visam a melhoria da vida das pessoas. (...) “A indústria

farmacêutica raramente investe em prevenção. (...). Quanto mais doente nós

estamos, mais eles ganham. (...) A prevenção nem sequer era um ramo de

trabalho sedutor o suficiente para justificar parcerias público-privadas”

(HARVEY, 2020, p. 18). A lógica de acumulação aplicada à saúde não visa a

melhoria da vida das pessoas, seja na prevenção, seja no tratamento. Pelo

contrário, quando se faz lucrativo, é preferível manter as pessoas doentes.

(...) O que esta pandemia nos lembra, mais do que nos ensina, é o que muitos outros estudos epidemiológicos anteriores nos ensinaram nas décadas anteriores, e que foram negligenciados por aqueles que a deveriam ter levado em conta em primeiro lugar, os irresponsáveis que governam: o tributo pago anualmente por trabalhadores devido as condições de trabalho perigosas, insalubres e desgastantes, por doenças crônicas ou graves e anos de expectativa de vida [2]; o tributo pago não menos regularmente pelas populações humanas, particularmente urbanas, devido a múltiplas formas de poluição (ar, água, etc.), geradas pelo produtivismo capitalista [3]; o terrível recorde de décadas de junkfood, pelo qual a indústria agro-alimentar capitalista também é responsável [4]; e assim por diante (BIHR, 2020, p. 26).

Ressaltamos que a população rural tem sofrido muito com a poluição por

agrotóxicos, que ameaçam a sua saúde e modo de vida, bem como com

desapropriações, violências e ameaças. Diferente da visão de Bihr (2020), de

uma sociedade mais bucólica a partir do rural francês, as várias formas de

agressão sofridas às populações do campo no Brasil, inclusive no que tange a

poluição de rios, ar, terras, alimento são enormes. Se o sofrimento dos

periféricos da cidade e do campo se aproximam há razão para tal. O

coronavírus acaba por deixar ainda mais desnudada a desigualdade de classes

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sociais e entre os países do sistema capitalista. Temos pessoas que estão

resguardadas por um isolamento social que não prevê uma ameaça eminente

aos rendimentos; temos trabalhadores em isolamento social sendo ameaçados

e; uma massa de trabalhadores que, ameaçados e expostos pelas ruas,

integram aqueles incorporados ao sistema em piores condições. Na outra

ponta, autônomos, miseráveis e pessoas em condição de rua que estão

expostos ao risco e disputam a sobrevivência diária, que já não estavam

incorporados ao sistema: (...) “[A] COVID-19 exibe todas as características de

uma pandemia de classe, de gênero e de raça. Embora os esforços de

mitigação estejam convenientemente camuflados na retórica de que ‘estamos

todos juntos nisto’, as práticas, particularmente por parte dos governos

nacionais, sugerem motivações mais sinistras” (HARVEY, 2020, p. 21), o que

fica claro em discursos malthusianos que apontam a necessidade de

sacrificarmos algumas vidas. “E daí? Meu nome é messias, mas não faço

milagres” (Bolsonaro, presidente do Brasil, quando perguntado sobre os óbitos

por coronavirús).

Esse contexto de excluídos do sistema já estava posto anteriormente ao

vírus e, relembra-se, convive com a legitimação da meritocracia e da eficiência

neoliberais. A OIT, que em 2019 estimou haver 188 milhões de

desempregados no mundo, projeta um aumento do desemprego a partir da

COVID-19 de 5,3 milhões de pessoas (cenário de baixo impacto) e de 24,7

milhões (em um cenário de alto impacto), ou seja, o número de

desempregados chegaria a 200 milhões de pessoas, com queda de renda do

trabalho e redução dos salários, com estimativa de 8,8 milhões a 35 milhões de

pessoas que, mesmo trabalhando, estarão pobres. Cerca de ¼ da população,

segundo a AFP (Agence France-Presse), está em lockdown, cerca de 1,7

bilhões de pessoas (apud ROBERTS, 2020c). Sobre o isolamento social,

Harvey (2020), a partir daquilo que estava mais restrito a China, já sinaliza que

seriam intensas as conseqüências das rupturas das cadeias de valor das

corporações e que o efeito a longo prazo poderia ser encurtar ou diversificar as

cadeias de abastecimento. Também, segundo sua análise, se avançará para

formas de produção menos intensivas em mão-de-obra, com a incorporação

ainda mais intensa das formas de inteligência artificial. Por essa argumentação,

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teríamos uma aceleração de reorganização do trabalho na estrutura produtiva

com conseqüências bastantes preocupantes para um quadro pós-pandemia já

saturado de desemprego.

Segundo Harvey (2020), as economias capitalistas têm até 80% do seu

estímulo provocado pelo consumismo. Em termos de problemas de valorização

do capital, argumenta que as formas de consumismo que foram intensificadas

pós crise 2007-8, baseadas na redução do tempo de rotação do consumo mais

próximo do zero, ficaram inoperantes com a pandemia. Estas tiveram grandes

investimentos, destacando-se o turismo internacional que, segundo o autor,

aumentou de 800 milhões em 2010 para 1,4 bilhões em 2018, e provocou uma

onda de investimentos em infraestrutura como aeroportos, companhias aéreas,

hotéis e restaurantes, entre outros. Se a crise nos países centrais pode superar

aquilo que aconteceu na década de 1930 em termos de desemprego e falência

de empresas, nos países periféricos o quadro se agrava. Os recursos injetados

pelo Banco Mundial para países mais pobres e de economias emergentes,

cerca de US$ 50 bilhões, podem aliviar as situações, mas longe de resolvê-las.

Para piorar, segundo o autor, as taxas de juros mais baixas e o crédito mais

barato tendem a estimular o mercado de ações e a ampliação do capital fictício.

Harvey (2020) afirma que os impactos econômicos e demográficos de

disseminação do vírus dependem de vulnerabilidades preexistentes no modelo

econômico. Roberts (2020b) aponta que a desaceleração da economia chinesa

antes da crise já provocava uma redução nos preços das commodities e a fuga

de capitais das economias emergentes. Segundo o autor, considerando as

trinta maiores economias emergentes, já se verificava que o endividamento das

corporações não financeiras crescia mais do que nas economias centrais. Além

disso, pontua que também acumulam déficits fiscais e de conta corrente, e uma

composição mais arriscada da dívida. Segundo Roberts (2020b), se as

projeções para o desemprego nos países centrais são alarmantes, nas

economias periféricas são devastadoras. O Brasil, em 2019, segundo a OIT

(apud ROBERTS, 2020b, 2020) tinha 12,1% da população desempregada e o

organismo tinha projetado, antes da COVID-19, uma taxa de 11,5% em 2024, o

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que sinaliza as dificuldades de recuperação econômica mesmo sem considerar

a pandemia.

O atual governo brasileiro defende políticas econômicas, sociais e

ambientais claramente de viés neoliberal, em meio a uma acentuada

instabilidade política. Essa atuação já prejudicou muito o contexto pré-

coronavírus, mas, curiosamente9, se mantém em meio a pandemia. Com o

aumento do desemprego e da pobreza, reformas que retiram direitos

trabalhistas e de seguridade social são aprovadas, sem gerarem a expansão

da economia. O empreendedorismo individual serve de alcunha para a busca

de sustento diário de trabalhadores desesperados e desamparados. No

dispositivo do neoliberalismo as formas de opressão social e econômicas são

invisibilizadas, assumindo o resultado de escolhas individuais e não resultado

de uma condição social. O homo economicus assume uma postura diferente do

cidadão, buscando responder por si, desprezando propostas coletivas,

acabando por minar o processo político.

Portanto, para enfrentar o neoliberalismo deve-se desconstruir todo um

quadro normativo, uma racionalidade. O que aí está não se dissolverá com um

acirramento do humanismo, que se horroriza diante das crueldades causadas

pelo livre mercado. Isso já existia. A crise de 2008 comprova que o

neoliberalismo é um sistema normativo que orienta Estados, empresas e

pessoas, a despeito dos fracassos do livre mercado.

Quanto ao Estado, com o qual alguns contam ingenuamente para “controlar” os mercados, a crise mostrou até que ponto ele se fez coprodutor voluntário das normas de competitividade, à custa de todas as considerações de salvaguarda das condições mínimas de bem-estar, saúde e educação da população (DARDOT e LAVAL, p. 31, 2016).

Não se trata de menos Estado, de um Estado não interventor, mas de

um Estado que é essencial para a difusão da racionalidade neoliberal e na

9 No sentido de que economistas declaradamente neoliberais defendem uma atuação do

Estado muito mais robusta do que aquela que vem sendo proposta, a exemplo de Armínio Fraga. A partir de declarações sobre PIB privado, conceito inexistente na Contabilidade Social, fica a dúvida se a pasta da Economia age puramente por motivação ideológica, ou se desconhece as demais teorias econômicas.

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TD001 - Economia capitalista neoliberal e pandemia COVID-19: entendendo a diferença de embarcações

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crença do mercado a despeito de suas falhas10. Desse modo, a crise atual não

é uma crise de financeirização11, mas sim uma crise advinda do neoliberalismo

como uma forma de governar as sociedades, que tem como meio de expansão

a financeirização.

Mas, quando falamos nos mais pobres, nos mais vulneráveis, de quem

falamos? Apesar de saber que muitos estão para além das estatísticas, fato

que já mostra as prioridades do capitalismo, e de que os recortes são bastante

falhos, porque generalizam muitas situações, mascarando prioridades,

propomos uma breve explanação de dados sobre as condições de vida dos

brasileiros em maior vulnerabilidade frente ao COVID-19. Buscamos destacar

variáveis que nos ajudam a pensar medidas de garantia do isolamento social,

bem como a superação de tal contexto, já tão absurdamente grave no pré-

COVID-19.

3. Capitalismo neoliberal e as condições sócio-econômicas: um

olhar para a desigualdade crescente

O critério do Banco Mundial para considerar uma pessoa pobre em

termos de renda é ter um rendimento domiciliar per capita inferior a US$ 5,5

por dia, em países com rendimento médio alto, como é o Brasil. Em 2018,

25,3% da população brasileira tinha rendimento inferior a US$ 5,5 per capita

por dia, aproximadamente R$ 420 mensais, o que equivale a 44% do salário

mínimo vigente em 2018. Todos os estados das Regiões Norte e Nordeste

apresentam indicadores de pobreza acima da média nacional, enquanto os

demais estados estavam abaixo. Quase metade, 47%, dos brasileiros abaixo

da linha de pobreza em 2018 estava na Região Nordeste. Para tornar mais

clara a desigualdade sócio-espacial, no Maranhão 53% da população tinha

rendimento mensal, em 2018, de até 1 salário mínimo, enquanto que em Santa

Catarina esse percentual da população era de 8%. No recorte etário, com

10

“O Estado neoliberal não é, portanto, um ‘instrumento’ que se possa utilizar indiferentemente para finalidades contrárias. Enquanto ‘Estado-estrategista’, o codecididor dos investimentos e das normas, ele é uma peça da máquina que se deve combater” (DARDOT e LAVAL, p. 31, 2016). 11

“A autonomia e o inchaço da esfera financeira não são as causas primeiras e espontâneas de um novo modo de acumulação capitalista. A hipertrofia financeira é antes o efeito historicamente identificável de políticas que estimularam a concorrência entre os atores nacionais e mundiais das finanças” (DARDOT e LAVAL, p. 28, 2016).

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TD001 - Economia capitalista neoliberal e pandemia COVID-19: entendendo a diferença de embarcações

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renda de US$ 5,5 per capita por dia são as crianças de zero a 14 anos as mais

vulneráveis, com 42,3% delas abaixo da linha. Em oposição estão os idosos

(60 anos ou mais) com 7,5% do percentual de pessoas nessa faixa de idade

com rendimentos de até US$ 5,50 per capita ao dia. Isso mostra o quanto a

ajuda a chefes de família é urgente. A desagregação pelos tipos de arranjos

domiciliares revela que, dentre aqueles formados por responsável sem cônjuge

e com filhos de até 14 anos, mais da metade das pessoas estavam, em 2018,

abaixo da linha de US$ 5,50 per capita dia, totalizando 54%. Quando se

considera a responsável mulher preta ou parda o contingente é de 63% (IBGE,

2019).

Ao considerarmos a linha de extrema pobreza, US$ 1,90 per capita/dia,

cerca de R$ 145,00 mensais em 2018, havia no Brasil um contingente

populacional de 13,5 milhões de pessoas, contingente esse superior a

população total de países como Bolívia, Bélgica, Cuba, Grécia e Portugal,

sendo que 13,6% da população do Nordeste encontrava-se nessa situação.

Segundo o IBGE (2019), há uma forte correlação entre pobreza monetária e

precariedades e vulnerabilidades nas condições de moradia. O IBGE seleciona

quatro inadequações domiciliares para referenciar a amostra correspondente a

condições de moradia: ausência de banheiro de uso exclusivo dos moradores

do domicílio; paredes construídas com material não durável; adensamento

excessivo (três ou mais pessoas dormindo em um mesmo cômodo); ônus

excessivo com aluguel (valor do aluguel iguala ou supera 30% do rendimento

domiciliar. Em 2018, 12,8% da população brasileira residia em domicílios onde

havia ao menos uma dessas inadequações, o que equivale a um contingente

populacional de 26,6 milhões. Entre a população com rendimento domiciliar per

capita dia inferior a US$ 5,50, a proporção em domicílios nessas condições é

de 29,3%, representando 15,3 milhões de pessoas.

Mais de 37% da população brasileira reside em moradias onde falta ao

menos um serviço de saneamento básico, e entre os mais pobres chega a 60%

das pessoas nesta condição. Considerando a população total, 9,7% residem

em domicílios sem acesso à coleta de lixo, e entre aqueles que recebem até

US$ 5,50 per capita diário o percentual é de 21,1%. Do total da população,

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TD001 - Economia capitalista neoliberal e pandemia COVID-19: entendendo a diferença de embarcações

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15,1% não têm abastecimento de água por rede, e entre aqueles que recebem

até US$ 5,50 per capita diário o percentual é de 25,8%. Quanto ao

esgotamento sanitário por rede coletora, 35,7% da população não tem acesso

e entre aqueles que recebem até US$ 5,50 per capita diário o percentual é de

56,2% (IBGE, 2019). Esses dados mostram o quanto essa população está

vulnerável quanto a possibilidade de cumprir com medidas de higiene que são

fundamentais para se proteger da contaminação pela COVID-19.

Sobre o adensamento excessivo, do total, 5,6% da população e 14,5%

daqueles que estão abaixo da linha de pobreza dormem em cômodos com três

ou mais pessoas. A Região Norte é a que apresenta o maior adensamento

excessivo (13,1%) e a Região Sul, o menor (2,4%) (IBGE, 2019). O

adensamento excessivo impede o isolamento social defendido pelas

autoridades sanitárias dentro de casa, de possíveis infectados sintomáticos, e

daqueles assintomáticos, mas que podem transmitir o vírus.

Considerando exclusivamente a população residente em domicílios

alugados, as proporções de ocorrência de ônus excessivo com aluguel

chegava, em 2018, a 28% da população em geral e quando se consideram

somente aqueles abaixo da linha de US$ 5,50 eram 56,2%. O ônus excessivo

com aluguel é mais comum na Região Sudeste (6,1%) e menor na Região

Norte (2,7%), mostrando que essa inadequação está mais presente nos

domicílios mais pobres das regiões mais ricas (IBGE, 2019). Políticas de

medidas de interrupção de contas fixas para a população de renda mais baixa,

entre elas o aluguel, em cidades ricas como São Paulo são urgentes. Também

urge a necessidade de proibição de despejos nos meios rural e urbano.

Quanto aos rendimentos, em 2018, 57,6% dos rendimentos domiciliares

per capita observados eram iguais ou inferiores ao valor do salário mínimo

vigente, ou seja, até R$ 954 por mês. O Maranhão é o estado com menor

rendimento médio mensal per capita, R$ 607. Os brancos ganhavam em média

73,9% a mais do que pretos e pardos e homens ganhavam em média 27,1%

mais que as mulheres. Sobre isso, ressalta-se que a educação reduz a

desigualdade, mas não elimina; o fato de ser preto, pardo ou mulher, ainda que

com o mesmo grau de instrução de homens brancos, pode representar

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TD001 - Economia capitalista neoliberal e pandemia COVID-19: entendendo a diferença de embarcações

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rendimento menor, principalmente no setor privado. Sobre o desemprego, este

é maior entre as mulheres. As mulheres estão desocupadas em maior

proporção, têm menores rendimentos e estão sujeitas à informalidade em

termos comparativos mais do que os homens. A taxa de desocupação entre

pretos e pardos é 4,6% maior do que entre brancos. O grupo etário mais

afetado pela desocupação é o de jovens entre 14 e 29 anos, apresentando um

aumento entre os anos de 2014 e 2018, respectivamente com percentuais de

13% e 22,3% entre o grupo dessa faixa etária (IBGE, 2019). Diante disso, se

desenham perfis mais vulneráveis para enfrentar o vírus e também as

consequências do isolamento social. Ignorar essas estatísticas, ainda que

apresentem falhas, e não encarar a necessidade de pensar a partir daquelas e

daqueles que mais precisam, é escolher ignorar a existência de embarcações

com nenhuma ou quase nenhuma capacidade de enfrentar qualquer mudança

de maré.

Diante esse quadro, dados da Oxfam (2019) informam que para ao

menos oito em cada dez brasileiros não é possível progresso social, nem

econômico com um enorme abismo entre as classes sociais. Em seu relatório

“Nós e as desigualdades: percepções sobre desigualdades no Brasil”, a Oxfam

expôs que a percepção pública de pobreza no Brasil é muito diversa e distante

dos parâmetros definidos em políticas públicas. Conforme a Oxfam (2019),

para apenas 7% dos brasileiros, um indivíduo pode ser considerado pobre com

rendimentos de até R$ 210, e para 11% a pobreza é definida por rendimentos

individuais não maiores do que R$ 400. Dois em cada três entrevistados acham

que a linha da pobreza começa nos R$ 701 mensais, sendo que 53% acham

que ela está entre R$ 701 e R$ 1.000. Sob uma linha de pobreza de um salário

mínimo, o Brasil teria, em 2017, cerca de 83 milhões de pobres, perto de 40%

da população abaixo da linha da pobreza “percebida”. Com isso, nota-se que a

pobreza tem um significado diferente para a população. Apesar de o valor entre

R$ 700 e R$ 1.000 ser o dobro dos R$ 420 mensais, os dados revelam que

existe um desafio no país de melhoria na percepção da distribuição da renda.

Trata-se de condição importante para um debate realista em torno de qualquer

política redistributiva (previdência pública ou Bolsa Família, por exemplo), e

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para o fortalecimento da solidariedade social em prol de um país mais

desenvolvido e justo.

Tem sido cada vez mais frequente o combate às desigualdades no

debate público. Isso tem respaldo em instituições que simbolizam a ortodoxia e

a tradição liberal da economia como o Banco Mundial e o Fundo Monetário

Internacional - FMI. Esta virada se explica pela dificuldade da economia

mundial reagir à crise financeira de 2008. Lagarde (2015) aponta que uma

análise12 do FMI demonstra que a desigualdade excessiva de renda na

verdade reduz a taxa de crescimento econômico e torna o crescimento menos

sustentável com o tempo. Em um relatório13 é apontado que elevar em 1 ponto

percentual a parcela da renda dos pobres e da classe média aumenta o

crescimento do PIB de um país em até 0,38 ponto percentual em cinco anos.

Em contrapartida, elevar em 1 ponto percentual a parcela da renda dos ricos

reduz o crescimento do PIB em 0,08 ponto percentual. Uma explicação

possível para isso é que os ricos gastam uma fração menor de sua renda, o

que poderia reduzir a demanda agregada e enfraquecer o crescimento. Em

outras palavras, nossas constatações sugerem que – contrariando a sabedoria

popular – os benefícios da renda mais alta estão a se espalhar para cima e não

para baixo, o que demonstra claramente que os pobres e a classe média são

os principais motores do crescimento. Esses motores, infelizmente, estão

parando.

Lagarde (2015) aponta que os impulsores mais importantes da

desigualdade extrema são bem conhecidos: o progresso tecnológico e a

globalização financeira. Esses dois fatores tendem a ampliar as lacunas de

remuneração entre as pessoas com maior e menor qualificação. Somados,

auxiliam a enrijecer a mobilidade social. Estudos recentes mostram que as

economias avançadas com níveis mais baixos de mobilidade social entre as

gerações tendem a apresentar níveis mais altos de desigualdade de renda.

Nesses países, a renda dos pais é um fator determinante da renda dos filhos.

12

Estudo sobre redistribuição, desigualdade e crescimento como: Inequality and Unsustainable Growth: Two Sides of the Same Coin? 13

Estudo sobre as causas e consequências da desigualdade de renda como: Causes and Consequences of Income Inequality: A Global Perspective

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TD001 - Economia capitalista neoliberal e pandemia COVID-19: entendendo a diferença de embarcações

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Isso sugere que, para ascender socialmente, é preciso crescer na classe social

certa.

MIilanovic (2015) aponta que entre os anos de 1985 e 2010 a

desigualdade cresceu para a maioria das nações. Surpreendentemente, a

América Latina não seguiu essa tendência com destaque para o Brasil.

Lagarde (2015) aponta que o uso das chamadas transferências condicionais de

renda foram mecanismos anti-pobreza altamente bem sucedidos que

contribuíram de forma significativa para reduzir a desigualdade de renda em

países como o Brasil, o Chile e o México. No Brasil, o Programa Bolsa Família

provou ser não só eficiente, mas também econômico: com gastos de 0,5% do

PIB por ano, 50 milhões de pessoas estão sendo assistidas – ou seja, um em

cada quatro brasileiros. Sendo uma prova de que a renda básica é positiva

para todos os indivíduos da economia por seu impacto em retornar em forma

de consumo de bens e serviços pela população pobre. O desafio está em

romper com um dos pilares do capitalismo neoliberal que se fundamenta na

perpetuação da desigualdade. Na Figura 1, Milanovic (2015) mostra que todos

os pontos acima da linha de 45 graus são os casos em que houve um aumento

na desigualdade do país. Os países são representados pelo seu Índice de

Gini14, nota-se que o Brasil apresenta um dos piores quadros de desigualdade

entre os países analisados.

14

O Índice de Gini é um instrumento utilizado para auferir o grau de concentração de renda.

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Figura 1: Índice de Gini para o final dos anos 1980 e dos anos 2000

Fonte: Milanovic, 2015.

Milanovic (2015) menciona a interação entre percepção da desigualdade

e medição real da desigualdade. Para o autor, parece que, em algum

momento, a sociedade começa a discutir seriamente o tópico da desigualdade

e quando as medidas da desigualdade são feitas e publicadas, as pessoas

percebem subitamente que realmente há muito mais do que pensavam. Outra

questão é separatismo social dos ricos que é bastante notória. E, claro, outra

questão é a evasão fiscal e a riqueza oculta dos ricos, cujas magnitudes estão

sendo mensuradas e investigadas a partir dos anos 2000. A pesquisa liderada

pelo economista francês Thomas Piketty aponta que, de maneira geral, as

economias de mercado não tendem naturalmente à igualdade. Por uma

simples razão: os rendimentos (lucros, juros, dividendos) de quem já tem

riqueza, dinheiro acumulado, tendem, de forma geral, a serem maiores, a cada

ano, do que o crescimento da economia como um todo. A conclusão lógica de

Piketty foi que a parcela da população que vive de renda termina por ganhar

mais do que aqueles que têm que vender seu trabalho em troca de salário –

cujos aumentos não podem ser permanentemente maiores do que o

crescimento do produto total de um país. Sem algum tipo de interferência

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governamental e redistribuição de recursos, o mundo é uma máquina de criar

desigualdade e, pior, uma desigualdade que tende a aumentar (MEDEIROS,

2016).

Neste quadro é possível perceber que as condições de enfrentamento

da pandemia são amplamente distintas. Segundo Medeiros (2016), isso é

resultado da globalização que interliga os destinos dos países. Não só o

crescimento, como também a desigualdade de um país como o Brasil, por

exemplo, depende da desigualdade e do crescimento de regiões inteiras do

planeta – por exemplo, do crescimento chinês, que impulsionou a expansão da

agricultura brasileira na última década. Essas relações fazem a economia

mundial ser mais desigual do que qualquer nação. Em 2008 o coeficiente de

Gini da distribuição da renda do mundo era de 0,67. Neste modelo, os grandes

vencedores formam uma pequena plutocracia global. Segundo as estimativas

de Milanovic, em 2010 o 1% mais rico do planeta controlava 29% da renda e

46% de toda a riqueza mundial. Diante deste breve esboço sobre o quadro

social e econômico agravado pela concentração de renda e riqueza que se

intensifica com o neoliberalismo, propomos uma análise para uma importante

dimensão social que tem relevância acentuada a partir da pandemia. A

desigualdade cria barreiras para reagir a uma epidemia.

4. Saúde no Brasil: concentração que acentua o risco de um

descontrole sanitário

O sistema de saúde brasileiro e o acesso à saúde também apresentam

dados que nos permitem verificar as diferenças de embarcações nesse mesmo

oceano? Sim. Os dados sobre quantidades de estabelecimentos de saúde e

leitos hospitalares estão amparados pelo censo da Associação de Medicina

Intensiva Brasileira - AMIB (2016), com base nos dados do IBGE. O total de

estabelecimentos15 no Brasil são 8.011, mas a legislação exige obrigatoriedade

de leitos de unidade de terapia intensiva – UTI – somente para

estabelecimentos com mais de 100 leitos. Deste total de estabelecimentos,

24% (1.961) têm leitos de UTI e 76% (6.050) não possuem leitos de UTI. O

15

Desses estabelecimentos, 98,5% são hospitais.

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total de leitos do Brasil em 2016 era 494.496, sendo somente 8% (41.741)

desses de UTI.

Quanto à distribuição espacial, somente 15% (521) dos municípios

brasileiros tem UTI. Quando analisamos por regiões, a desigualdade no acesso

aos serviços de saúde fica desvelada: a Região Norte tem 129

estabelecimentos com UTI; a Região Nordeste 396 estabelecimentos com UTI;

a Região Centro-Oeste 166 estabelecimentos com UTI; a Região Sudeste 982

estabelecimentos com UTI; a Região Sul 288 estabelecimentos com UTI. O

estado de São Paulo, sozinho, concentra 24,1% dos estabelecimentos com

leitos de UTI do Brasil. Mas, além de saber sobre a distribuição espacial, é

fundamental saber como ocorre essa distribuição considerando o tipo de

retenção do estabelecimento com UTI. Considerando o território nacional, 44%

dos estabelecimentos com UTI são privados, 28% são públicos, 26% são

filantrópicos e 2% não são classificados. O Quadro 1 mostra a distribuição dos

estabelecimentos com leitos de UTI por região do país, considerando o tipo de

retenção do estabelecimento.

Quadro1: Quantidade de Estabelecimentos com leito de UTI por Região e tipo de retenção

Fonte: Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde – CNES - Elaboração AMIB, 2016.

REGIÃO PÚBLICO PRIVADO FILANTRÓPICANÃO

CLASSIFICADATOTAL

CENTRO-OESTE 40 92 26 8 166

Capital 23 58 13 2 96

Interior 17 34 13 6 70

NORDESTE 155 172 60 9 396

Capital 79 102 32 4 217

Interior 76 70 28 5 179

NORTE 59 54 10 6 129

Capital 44 39 7 6 96

Interior 15 15 3 - 33

SUDESTE 242 443 274 23 982

Capital 104 162 49 12 327

Interior 138 281 225 11 655

SUL 54 104 129 1 288

Capital 19 30 20 1 70

Interior 35 74 109 - 218

TOTAL 550 865 499 47 1961

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Do total da população brasileira, 205,9 milhões de habitantes16, 77%

(158,1 milhões de habitantes) é atendida pelo Sistema Único de Saúde – SUS

– e 23% (47,7 milhões de habitantes) pelo setor privado. Considerando as

regiões brasileiras, temos que: na Região Norte, 90% da população é atendida

pelo SUS; na Região Nordeste, 88% da população é atendida pelo SUS; na

Região Centro-Oeste, 80% da população é atendida pelo SUS; Na Região

Sudeste, 66% da população é atendida pelo SUS; e na Região Sul, 76% das

pessoas é atendida pelo SUS. A respeito da distribuição dos leitos de UTI, a

Região Norte tem 5,2% do total de leitos do país; a Região Nordeste 18,3% do

total dos leitos do país; a Região Centro-Oeste 8,4% do total dos leitos do país;

a Região Sudeste 53,4% do total dos leitos do país; a Região Sul 14,6% do

total dos leitos do país. O Quadro 2 mostra a proporção de leitos de UTI para

cada 10.000 habitantes, por região, diferenciando espacialmente capital e

interior, considerando o tipo de retenção.

Quadro 2: Proporção de leitos de UTI para cada 10.000 habitantes por região do país, considerando o tipo de retenção e diferenciando entre capital e interior – 2016

Fonte: CNES, IBGE, ANS TABNET - apud AMIB, 2016

Considerando o Quadro 2, vemos que existem no Brasil, em média, 2,03

leitos de UTI para cada 10.000 pessoas, distribuídos de modo bastante

desigual entre as regiões, capitais e cidades do interior e entre os tipos de

retenção, SUS e não-SUS. Entre aqueles que mais precisam do SUS há

maiores fatores de riscos de manutenção de uma qualidade de saúde.

A expressiva maioria das pessoas negras não possui plano de saúde (78,8%), e menor acesso à saúde significa maior exposição a riscos. Pessoas com menores rendimentos, sem acesso à educação e em condições de moradias precárias por falta de acesso a serviços básicos também se mostram mais expostas onde a grande maioria é negra (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2017, p. 22).

16

Estimativa para o ano de 2016.

SUS NÃO-SUS TOTAL SUS NÃO-SUS TOTAL SUS NÃO-SUS TOTAL

CENTRO-OESTE 2,51 7,9 4,18 0,54 4,74 1,07 1,17 6,61 2,24

NORDESTE 3,22 5,7 4,02 0,4 3,83 0,6 0,88 4,97 1,35

NORTE 1,9 7,22 3,07 0,32 2,09 0,4 0,75 5,64 1,23

SUDESTE 3,27 6 4,64 1,32 3,35 1,91 1,69 4,32 2,58

SUL 5,11 4,45 4,79 1,38 2,79 1,66 1,71 3,23 2,07

MÉDIA BRASIL 3,07 6,04 4,26 0,89 3,33 1,33 1,3 4,45 2,03

. Capital . . Interior . . Total .REGIÃO

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Segundo dados do IBGE (2015), pouco mais da metade da população

brasileira, 53,9%, se declararam pretas ou pardas. No que tange aqueles

atendidos pelo SUS, em 2008, conforme pesquisa do Ipea (apud MINISTÉRIO

DA SAÚDE, 2017), daqueles atendidos pelo SUS, 67% eram pretos e 47,2%

brancos. O Boletim Epidemiológico (2015 apud MINISTÉRIO DA SAÚDE,

2017) apresenta que 37,8% da população adulta preta ou parda avalia que sua

saúde é regular, ruim ou muito ruim; entre os brancos esse percentual é de

29,7%. Pelo mesmo estudo, pretos e pardos estavam 73,5% mais expostos a

viverem em domicílios com condições mais precárias do que os brancos.

Segundo Ministério da saúde (2017), a política de saúde específica para a

população preta é necessária devido às especificidades dessa população:

A partir da publicação dessa Política, o Ministério da Saúde reconhece e assume a necessidade da instituição de mecanismos de promoção da saúde integral da população negra e do enfrentamento ao racismo institucional no SUS, com vistas a superação das barreiras estruturais e cotidianas que incidem negativamente nos indicadores de saúde essa população - precocidade dos óbitos, altas taxas de mortalidade materna e infantil, maior prevalência de doenças crônicas e infecciosas e altos índices de violência. (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2017, p. 8).

Especificamente sobre doenças transmissíveis prioritárias, vamos

destacar algumas que possuem forte relação com as condições de vida. Entre

2004 a 2013, a tuberculose teve maior incidência entre as populações

indígenas e pretas. Já quanto a hanseníase, outra doença fortemente

correlacionada a condições precárias de vida, a ordem se inverte, e os mais

atingidos são pretos e indígenas. Sobre a dengue, os maiores percentuais de

óbito são entre pretos das regiões Norte e Nordeste. Além de uma maior

exposição a doenças contagiosas, os pretos são as maiores vítimas da

violência física que resulta em óbitos: no ano de 2012, mais da metade das

mortes por homicídio no Brasil, 53,37% (56.337), eram jovens (30.072) e,

desses jovens, 77% eram pretos (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2017).

Espacialmente, destacamos o rural onde, de acordo com o Plano

Nacional de Saúde (BRASIL, 2005 apud MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2013, p.

13), (...) “no campo brasileiro são encontrados os maiores índices de

mortalidade infantil, de incidência de endemias, de insalubridade e de

analfabetismo, caracterizando uma situação de enorme pobreza decorrente

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TD001 - Economia capitalista neoliberal e pandemia COVID-19: entendendo a diferença de embarcações

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das restrições ao acesso aos bens e serviços indispensáveis à vida”. Portanto,

é necessário particularizar a análise de alguns aspectos sobre os povos do

campo e das florestas17. Oliveira e Rosa (2014), a partir de pesquisa empírica

com o povo Guajajara, mostram a fragilidade das políticas púbicas de saúde

em promover qualidade de saúde, tanto no âmbito jurídico quanto no executivo

para a população indígena.

A concentração fundiária e a falta de acesso à terra são fatores que

corroboram para a violência e a vulnerabilização dessa população. Segundo os

dados da Comissão Pastoral da Terra – CPT (2019), o número de conflitos

agrários em 2018 foi de 1.489, com 28 mortes. Sobre os dados fundiários e a

participação dos agricultores familiares na produção e na posse da terra, o

Censo Agropecuário de 2017 do IBGE mostra que 77% dos estabelecimentos

rurais são de agricultores familiares, no entanto estes só ocupam 23% da área

de todos os estabelecimentos rurais do país. Do pessoal ocupado na

agropecuária do país, 67% está na agricultura familiar, com bastante

diferenciação entre as regiões, estando majoritariamente na Região Nordeste,

onde 46,6% dos ocupados na atividade agropecuária da Região estão na

agricultura familiar (Norte, 15,4%; Sudeste, 16,5%; Sul, 16%, e; Centro-Oeste,

5,5%).

A falta de acesso à água é uma realidade mais presente no meio rural.

Apenas 32,8% dos domicílios rurais estão ligados à rede de distribuição de

água, enquanto 67,2% da população capta água de chafarizes e poços

(protegidos ou não), diretamente de cursos de água sem nenhum tratamento

ou de fontes alternativas. (PNAD, 2009 apud MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2013).

Diante dos dados expostos, podemos inferir quem é a maioria dentro

dos 77% dos brasileiros que necessitam exclusivamente do SUS. Podemos

deixar mais escancarado a quem se referia a alcunha MORTE para a Emenda

17

“As populações do campo e da floresta são caracterizadas por povos e comunidades que têm seus modos de vida, produção e reprodução social relacionados predominantemente com a terra. Neste contexto estão os camponeses, sejam eles agricultores familiares, trabalhadores rurais assentados ou acampados, assalariados e temporários que residam ou não no campo. Estão ainda as comunidades tradicionais, como as ribeirinhas, quilombolas e as que habitam ou usam reservas extrativistas em áreas florestais ou aquáticas e ainda populações atingidas por barragens, entre outras” (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2013, p. 8).

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Parlamentar que restringiu investimentos públicos necessários para a saúde de

pessoas em nome de uma suposta saúde do Estado. A Emenda Constitucional

nº 95, aprovada em 2016, congela as despesas primárias, reduzindo-as em

relação ao PIB por vinte anos. A partir de 2018 foi instituído o limite do

exercício anterior, atualizado pela inflação de doze meses.

A gestão Temer finda, em 2018, mas os efeitos de sua política de austeridade permanecem, deixando uma série de retrocessos. Entre eles, a perda, apenas em 2019, de R$ 9,5 bilhões para o SUS, mesmo diante de um quadro que combina piora de indicadores como a mortalidade infantil e baixa capacidade de os entes subnacionais financiarem serviços de saúde. Tudo isso apenas nos primeiros anos de vigência de um Regime Fiscal pensado em durar até vinte exercícios. (MORETTI, 2018).

Está claro a implementação da necropolítica no capitalismo de mercado?

Para finalizarmos, voltemos a algumas afirmações de Michael Roberts (2020b).

O Covid-19 não é um assassino seletivo que escolhe os mais fracos. Fatores

ambientais estão envolvidos na mutação e disseminação do vírus, mas a

quantidade de mortes depende da ação humana. Nisso, Roberts destaca as

condições estruturais da economia, os recursos médicos e as políticas de

governo. Diante do quadro descrito, como pensar o enfrentamento à pandemia

e o pós-pandemia?

5. Considerações finais e apontamentos reflexivos: construir

pequenos barcos para a sobrevivência comunitária

Assim, partimos do sistema capitalista em crise e que ameaça

fortemente a vida humana e não-humana na sua fase neoliberal. No entanto,

apesar de ser contrário à vida, esse sistema só morre de morte matada, nunca

de morte morrida. Pensar em uma conscientização a partir do sofrimento das

pessoas acometidas pelo vírus e/ou pelo isolamento social é ignorar as

engrenagens do sistema. Como argumenta o professor Eleutério Prado:

As crises nunca indicam por si só que o capitalismo vai acabar, ao contrário, elas mostram que a violência do capital não tem limites quando se trata de encontrar uma solução para as crises que engendra. Ao se autodestruir, ele destrói não apenas coisas, mas também vidas. O capital é um sujeito automático dotado de hybris que vai da realização ao funesto (PRADO, postagem Blog Economia e Complexidade, 03.02.2020).

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Krenak (2020) analisa que é terrível o que está acontecendo com o

planeta, mas a sociedade precisa entender que não é o sal da terra. É urgente

abandonar a ideia de que a humanidade é o centro do planeta. Há muita vida

além da gente, Krenak aponta que os seres humanos não fazem falta na

biodiversidade. Pelo contrário! A proliferação dos humanos que seguem uma

lógica de interação com a Terra com base na destruição de florestas, rios e

animais desequilibram os ecossistemas permitindo o avanço de um vírus que

causa a Covid-19 e a humanidade18 tem sido mais perversa que o vírus. Isso é

comprovado por governos ignorantes que defendem a normalidade. Para eles,

a economia não pode parar. Mas a economia é uma atividade que os humanos

inventaram e que depende de pessoas. Se os humanos estão em risco,

qualquer atividade humana deixa de ter importância. Dizer que a economia é

mais importante é como dizer que o navio importa mais que a tripulação. Coisa

de quem acha que a vida é baseada em meritocracia e luta por poder. Não

podemos pagar o preço que estamos pagando e seguir insistindo nos erros.

Nos espaços dessa sub-humanidade estão experiências de resistência

que Nkosi (2020) apontou como superação das agendas de denúncia da

necropolítica do Estado diante raça e classe. São experiências de ação

localizadas nas periferias dos centros urbanos. Enquanto a quarentena não

chega, deve-se antecipar e organizar grupos comunitários e redes amplas de

defesa da saúde para suprir as ausências do Estado nas periferias. Seja

fazendo compras para os mais velhos ou com dificuldade de locomoção ou

arregimentando doações de itens de higiene para moradores de rua e os mais

necessitados e, eventualmente, pensando estratégias de socorro (locomoção

para hospitais, e até velórios, se for o caso) para a segurança das pessoas

18

Krenak aponta que a pandemia talvez ajude as pessoas a responder se somos de fato uma humanidade. Nós nos acostumamos com essa ideia, que foi naturalizada, mas ninguém mais presta atenção no verdadeiro sentido do que é ser humano. Estamos devastando o planeta, cavando um fosso gigantesco de desigualdades entre povos e sociedades. De modo que há uma sub-humanidade que vive numa grande miséria, sem chance de sair dela. Fato também naturalizado. Assim, os únicos núcleos que ainda consideram que precisam se manter agarrados na Terra são aqueles que ficaram meio esquecidos pelas bordas da humanidade, nas margens dos rios, nas beiras dos oceanos, na África, na Ásia ou na América Latina.Esta é a sub-humanidade formada por caiçaras, índios, quilombolas e aborígenes. Existe, então, uma humanidade que integra um clube seleto que não aceita novos sócios e uma camada, rústica e orgânica, que compõe uma sub-humanidade agarrada na Terra.

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periféricas. Um exemplo de ação é a articulação entre a Teia dos Povos19 e o

movimento Reaja Ou20 na região sul da Bahia promovendo a agricultura

familiar periurbana como uma alternativa de sobrevivência diante o caos com a

produção de seu próprio alimento, ajudando a manter as pessoas abastecidas

em suas residências. O Movimento dos Trabalhadores Sem Terra – MST – tem

realizado doações de alimentos e refeições em todo o país, articulando os

camponeses e citadinos. A Central Única das Favelas – CUFA – tem

intensificado as articulações de associações e movimentos comunitários locais

em redes de apoio às populações de favelas no país.

Isto, porém, não abandona a tarefa de a sociedade civil fortalecer

iniciativas como a Reforma Tributária Solidária (2018) que pauta a

progressividade nos impostos, taxas e tributos e mostra a preocupação com

um desafio futuro que é o colapso ambiental. Também torna latente a

necessidade de se destacar a pauta da Reforma Agrária. Por isso, é

necessário avançar o debate que a Terra tem um limite e pensar em formas de

legislar nossas riquezas naturais. Um sistema econômico que depende de uma

reprodução ampliada não pode ser compatível com a manutenção da vida. É

fundamental desconstruir o discurso neoliberal e defender o comum, defender

o SUS, a educação pública, a ciência, a soberania alimentar, a não

mercantilização da natureza, o sistema de seguridade social e caminhar para a

proposta da construção do poder popular. As agendas existem e não são

novas. Aliando-se e reconhecendo com o que já existe, possibilitando encontrar

rotas de fuga ao caos ocidental para a construção de pequenos barcos para

seguir no oceano da vida, priorizando as embarcações mais frágeis.

19

A Teia Agroecológica dos Povos foi criada a partir dos diálogos continuados da I Jornada de Agroecologia da Bahia, realizada em 2012, no Assentamento Terra Vista. Em formato de rede, ela tem o papel de traçar a agenda de ações anuais que auxiliam no desenvolvimento, empoderamento e emancipação das comunidades e elos que a integram.http://teiadospovos.com.br/ 20

Criada em 2005, a campanha Reaja ou será morta ou será morto é uma articulação de movimentos e comunidades de negros e negras da capital e interior do estado da Bahia, articulada nacionalmente e com organizações que lutam contra a brutalidade policial, pela causa antiprisional e pela reparação aos familiares de vítimas do Estado sendo uma frente contra o genocídio do povo negro.https://reajanasruas.blogspot.com/

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