Editorial Nortemédico 52

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EDITORIAL Miguel Guimarães Presidente do CRNOM Em defesa da Qualidade Na actual situação de crise económica, financeira e social, defender valores e princípios fundamentais é um imperativo ético e moral de todos e de cada um de nós. Defender a qualidade em saúde é, antes de mais, uma questão de bom senso e de boa gestão; e um dever e uma responsabilidade para com os doentes. E é também um imperativo ético e deon- tológico defender a transparência de processos e procedimentos. Os Sindicatos Médicos e os Ministérios da Saúde e das Finanças assinaram um acordo no passado dia 14 de Outubro. Este acordo, considerado positivo pelo Conselho Regional do Norte da Ordem dos Médicos, defende e preserva o património das Carreiras Médicas. A solução de compromisso al- cançada contempla condições aceitáveis do ponto de vista da dignidade profissional, contrariando a desregulação contratual verificada nos últimos anos e da qual os jovens médicos eram as primeiras vítimas. Por outro lado, respeita os princípios fun- dadores da Carreira Médica e do Serviço Nacional de Saúde, com a abertura de concursos públicos e a garantia de uma progressão na carreira com base na qualificação técnica e científica, respeitadora do mérito e competência profissionais. Define ainda condições para o exercício clínico na área da Medi- cina Geral e Familiar que, embora não totalmente adequadas e em absoluta correspondência com o pretendido pelos nossos Sindicatos, poderão con- tribuir para melhorar o acesso dos portugueses aos cuidados de saúde. A entrevista com os colegas Merlinde Madureira e Jorge Silva ajuda a entender melhor o acordo, que foi concretizado com base na defesa do equilíbrio e estabilidade das condições de trabalho. Não tenho qualquer dúvida que os nossos representantes sin- dicais procuraram sempre o melhor acordo possível para servir os doentes, os médicos e o País. De resto, ultrapassadas as difíceis condições po- líticas actuais, a possibilidade de voltar a nego- ciar, dentro de dois anos, as Carreiras Médicas e a respectiva grelha salarial fica como um sinal de esperança num futuro melhor para todos os médi- cos. Nas palavras de António Arnaut, “os médicos desempenham uma relevante função social ao ser- viço do homem e da comunidade”. Nesta medida, devem ter uma retribuição condigna, de acordo com as suas responsabilidades, boas condições de exercí- cio profissional, estabilidade no trabalho, formação permanente, promoção por mérito (respeitando a qualificação médica e a competência em gestão clí- nica) e incentivos à investigação. A sua motivação e grau de satisfação são fundamentais para assegurar a solidez e qualidade do SNS. A crise pode ser encarada como uma oportuni- dade. Uma oportunidade para melhorar, corrigir e construir novos alicerces que permitam tornar o SNS mais robusto. Defender o direito à saúde não é uma questão ideológica, antes um imperativo mo- ral no qual todos nós temos a obrigação de estar envolvidos. No rescaldo da Greve Nacional dos Médicos, a ne- gociação entre a Ordem e o Ministério da Saúde também está em curso. O entendimento parece ser possível, mas não existe espaço para grandes ce- dências. Não há um plano alternativo. É necessário poder de persuasão e persistência. Persistência na defesa da dignidade do ser humano, do direito à saúde, do código genético do SNS. Neste âmbito, estão neste momento em cima da mesa questões essenciais de que não vamos abdicar, e que no seu conjunto garantem a qualidade em saúde que todos temos a obrigação de exigir: - A aplicação na prática da Carreira Médica; - A publicação de legislação sobre o acto médico com base na proposta devidamente fundamen- tada já apresentada pela OM; - A consagração do respeito pelas competências médicas e o papel essencial do médico como coor- denador das equipas multidisciplinares de saúde; - A alteração do modelo de receita médica / portaria sobre a DCI de modo a conferir aos doentes o po- der de escolher o medicamento do princípio activo prescrito; 4

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Editorial do nº 52 da revista Nortemédico, publicação oficial da Secção Regional do Norte da Ordem dos Médicos

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Miguel GuimarãesPresidentedoCrNoM

Em defesa da QualidadeNa actual situação de crise económica, financeira e social, defender valores e princípios fundamentais é um imperativo ético e moral de todos e de cada um de nós. Defender a qualidade em saúde é, antes de mais, uma questão de bom senso e de boa gestão; e um dever e uma responsabilidade para com os doentes. E é também um imperativo ético e deon-tológico defender a transparência de processos e procedimentos.

Os Sindicatos Médicos e os Ministérios da Saúde e das Finanças assinaram um acordo no passado dia 14 de Outubro. Este acordo, considerado positivo pelo Conselho Regional do Norte da Ordem dos Médicos, defende e preserva o património das Carreiras Médicas. A solução de compromisso al-cançada contempla condições aceitáveis do ponto de vista da dignidade profissional, contrariando a desregulação contratual verificada nos últimos anos e da qual os jovens médicos eram as primeiras vítimas. Por outro lado, respeita os princípios fun-dadores da Carreira Médica e do Serviço Nacional de Saúde, com a abertura de concursos públicos e a garantia de uma progressão na carreira com base na qualificação técnica e científica, respeitadora do mérito e competência profissionais. Define ainda condições para o exercício clínico na área da Medi-cina Geral e Familiar que, embora não totalmente adequadas e em absoluta correspondência com o pretendido pelos nossos Sindicatos, poderão con-tribuir para melhorar o acesso dos portugueses aos cuidados de saúde.

A entrevista com os colegas Merlinde Madureira e Jorge Silva ajuda a entender melhor o acordo, que foi concretizado com base na defesa do equilíbrio e estabilidade das condições de trabalho. Não tenho qualquer dúvida que os nossos representantes sin-dicais procuraram sempre o melhor acordo possível para servir os doentes, os médicos e o País.

De resto, ultrapassadas as difíceis condições po-líticas actuais, a possibilidade de voltar a nego-ciar, dentro de dois anos, as Carreiras Médicas e a respectiva grelha salarial fica como um sinal de

esperança num futuro melhor para todos os médi-cos. Nas palavras de António Arnaut, “os médicos desempenham uma relevante função social ao ser-viço do homem e da comunidade”. Nesta medida, devem ter uma retribuição condigna, de acordo com as suas responsabilidades, boas condições de exercí-cio profissional, estabilidade no trabalho, formação permanente, promoção por mérito (respeitando a qualificação médica e a competência em gestão clí-nica) e incentivos à investigação. A sua motivação e grau de satisfação são fundamentais para assegurar a solidez e qualidade do SNS.

A crise pode ser encarada como uma oportuni-dade. Uma oportunidade para melhorar, corrigir e construir novos alicerces que permitam tornar o SNS mais robusto. Defender o direito à saúde não é uma questão ideológica, antes um imperativo mo-ral no qual todos nós temos a obrigação de estar envolvidos.

No rescaldo da Greve Nacional dos Médicos, a ne-gociação entre a Ordem e o Ministério da Saúde também está em curso. O entendimento parece ser possível, mas não existe espaço para grandes ce-dências. Não há um plano alternativo. É necessário poder de persuasão e persistência. Persistência na defesa da dignidade do ser humano, do direito à saúde, do código genético do SNS.

Neste âmbito, estão neste momento em cima da mesa questões essenciais de que não vamos abdicar, e que no seu conjunto garantem a qualidade em saúde que todos temos a obrigação de exigir: - A aplicação na prática da Carreira Médica; - A publicação de legislação sobre o acto médico

com base na proposta devidamente fundamen-tada já apresentada pela OM;

- A consagração do respeito pelas competências médicas e o papel essencial do médico como coor-denador das equipas multidisciplinares de saúde;

- A alteração do modelo de receita médica / portaria sobre a DCI de modo a conferir aos doentes o po-der de escolher o medicamento do princípio activo prescrito;

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- O respeito pelas capacidades formativas das Faculdades de Medicina e designadamente a eliminação dos 15% de vagas exclusivas para licenciados;

- A participação da OM na definição de protocolos terapêuticos e de utilização e reutilização de dis-positivos médicos.

Neste número da revista nortemédico podemos também recordar as posições públicas mais recen-tes do Conselho Regional do Norte em defesa da qualidade em saúde: na questão da nomeação dos directores executivos para os ACES da região norte; na questão da Circular Normativa da ARS Norte que colocava em causa o tratamento de doentes com patologia respiratória crónica; na questão do curso de Medicina bietápico envolvendo a CESPU e a Universidade Alfonso X El Sabio, de Espanha, e que coloca claramente em causa a qualidade da for-mação médica pré-graduada; na questão do curso de Medicina da Universidade de Aveiro; na questão do acordo celebrado entre os Sindicatos Médicos e o Governo. Tudo em nome do direito dos doentes a uma medicina altamente qualificada e conforme aos padrões de qualidade que sempre defendemos.

E através do Conselho Nacional Executivo parti-cipamos ainda noutras tomadas de posição públi-cas da Ordem na defesa dos cuidados de saúde e da qualidade da Medicina: na questão do parecer 64/2012 do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida que aborda o “racionamento em saúde”; na questão da ausência de impacto da legis-lação sobre DCI na quota de mercado dos genéricos e a necessidade de definir um novo modelo de re-ceita médica que defenda o doente; na questão do curso de Medicina da Universidade de Aveiro.

As entrevistas aos jovens médicos que também constam deste número da revista permitem-nos ter uma ideia mais precisa das suas preocupações e opiniões. O Presidente do Conselho Nacional do Médico Interno, Roberto Pinto, deixa uma mensa-gem forte com a qual estou inteiramente de acordo: “Não devemos cair na tentação de abdicar da qua-lidade”. O Presidente e o Vice-Presidente do recen-temente realizado I Congresso Nacional do Interno do Ano Comum deixam uma preocupação plena de actualidade: “É necessário melhorar a ponte entre a Academia e a Enfermaria”.

Através de um protocolo assinado com o banco Santander/Totta, a Ordem dos Médicos tomou a

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iniciativa de fornecer aos seus associados uma nova cédula profissional, a qual procura responder a um conjunto de exigências que hoje são colocadas aos médicos do ponto de vista informático. Saiba tudo sobre este tema no dossier especialmente dedi-cado ao mesmo nesta revista. E fique desde já com a informação, que queremos deixar bem vincada: nenhum médico tem de subscrever qualquer conta no referido banco para ter acesso gratuito à sua nova cédula profissional.

A todos os colegas que através das redes sociais têm manifestado a sua profunda preocupação relativa-mente à questão do valor das quotas que pagam para a Ordem dos Médicos, o Conselho Regional do Norte reitera que está disponível para fazer uma avaliação global desta matéria e participar de forma construtiva e positiva na sua discussão no Conselho Nacional Executivo. A seguir com atenção.

Por fim, não posso deixar de lembrar e de lamentar a morte recente de três ilustres médicos. O Dr. José Cardoso da Silva, fazendo minhas as palavras do Prof. Doutor Walter Oswald: «O homem médico, o cirurgião exímio, o sábio oncologista, o pioneiro da senologia, o humaníssimo e empático curador de corpos e almas nunca por demais será louvado». O Dr. Santana Maia, ex-Bastonário da Ordem dos Médicos (1993-1995), que teve uma importante intervenção cívica ao serviço da Saúde, dos doentes e dos portugueses. E o Prof. Doutor Nuno Grande, notável personalidade da Medicina portuense e na-cional, distinto humanista e fundador do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS). Rela-tivamente a todos eles, aqui fica expressa a minha profunda admiração e respeito pelos elevados valo-res que representaram e defenderam durante a sua vida. Bem Hajam.

Termino com a revista nortemédico. No passado número 50 lançamos um repto a todos os colegas da SRNOM, mas poucos foram aqueles que respon-deram. Por isso, peço novamente a sua atenção para o questionário que consta nessa revista. Atente nas questões aí colocadas e reflicta sobre as mesmas. Depois vá a www.nortemedico.pt e deixe aí as suas respostas. Ou mande-nos as suas indicações por correio. Para nós, a sua opinião é valiosa. Trabalha-mos para uma Ordem dos Médicos ao serviço de todos os médicos.

Um caloroso abraçoMiguel Guimarães