Educação Domiciliar No Brasil

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Carlos Coelho Mota 1 Fabiane Machado Barbosa 2 RESUMO O presente artigo tem por objetivo analisar a educação domiciliar no Brasil em face da proibição normativa prevista no ordenamento jurídico brasileiro, verificando o histórico do ensino domiciliar, bem como os princípios constitucionais inerentes à educação fazendo uma abordagem jurídica sobre o tema. Palavras-chave: Direito a Educação. Ensino Domiciliar. Homeschooling. HOMESCHOOLING IN BRAZIL ABSTRACT This article aims to analyze the home education in Brazil face to normative prohibition in the Brazilian legal system, checking the history of homeschooling, as well as the constitutional principles involved. It is a legal approach on education rights. Keywords: Right to Education. Household education. Homeschooling INTRODUÇÃO Ao que parece para muitos um tema novo, a educação domiciliar nada mais é do que um crescente método de ensino adotado por milhares de famílias no mundo inteiro. No Brasil, esta forma de ensino ainda se traduz em pequeníssima parcela da população, mas não é assim que acontece em outros países. De acordo com o National Center for Education Statistics do governo norte-americano, essa prática já é realidade para mais de 1,5 milhões de crianças e adolescentes somente nos Estados Unidos, o que corresponde a quase 3% das crianças norte-americanas e há 1 Bacharel em Direito pela Faculdade Estáciode Sá de Vitória. 2 Mestre em História Social das Relações Politicas pela Universidade Federal do Espírito Santo, advogada, professora e coordenadora do Núcleo de Pesquisa e Trabalho de Curso da Faculdade Estácio de Sá de Vitória/ES. E-mail: [email protected] EDUCAÇÃO DOMICILIAR NO BRASIL

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O presente artigo tem por objetivo analisar a educação domiciliar no Brasil em face da proibição normativa prevista no ordenamento jurídico brasileiro, verificando o histórico do ensino domiciliar, bem como os princípios constitucionais inerentes à educação fazendo uma abordagem jurídica sobre o tema.

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Carlos Coelho Mota1

Fabiane Machado Barbosa2

RESUMO O presente artigo tem por objetivo analisar a educação domiciliar no Brasil em face da proibição normativa prevista no ordenamento jurídico brasileiro, verificando o histórico do ensino domiciliar, bem como os princípios constitucionais inerentes à educação fazendo uma abordagem jurídica sobre o tema. Palavras-chave: Direito a Educação. Ensino Domiciliar. Homeschooling.

HOMESCHOOLING IN BRAZIL ABSTRACT This article aims to analyze the home education in Brazil face to normative prohibition in the Brazilian legal system, checking the history of homeschooling, as well as the constitutional principles involved. It is a legal approach on education rights. Keywords: Right to Education. Household education. Homeschooling

INTRODUÇÃO

Ao que parece para muitos um tema novo, a educação domiciliar nada mais é do

que um crescente método de ensino adotado por milhares de famílias no mundo

inteiro. No Brasil, esta forma de ensino ainda se traduz em pequeníssima parcela da

população, mas não é assim que acontece em outros países. De acordo com o

National Center for Education Statistics do governo norte-americano, essa prática já

é realidade para mais de 1,5 milhões de crianças e adolescentes somente nos

Estados Unidos, o que corresponde a quase 3% das crianças norte-americanas e há

1 Bacharel em Direito pela Faculdade Estáciode Sá de Vitória.

2 Mestre em História Social das Relações Politicas pela Universidade Federal do Espírito Santo,

advogada, professora e coordenadora do Núcleo de Pesquisa e Trabalho de Curso da Faculdade Estácio de Sá de Vitória/ES. E-mail: [email protected]

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décadas é adotado em países como Reino Unido, Canadá, França, Irlanda e

Austrália, dentre outros.

A educação domiciliar, também conhecida pela palavra inglesa homeschooling,

trata-se de um método de ensino em que a criança não frequenta mais a tradicional

sala de aula, sendo o ensino escolar ministrado dentro de casa pelos pais ou

tutores. Entretanto uma proibição normativa editada por lei ordinária, que está

disposta no artigo 55 do Estatuto da Criança e do Adolescente e pelo artigo 6º da Lei

de Diretrizes e Bases da Educação, torna a educação domiciliar no Brasil ilegal.

Ambos os artigos dispõem que os pais ou responsáveis devem matricular os seus

filhos na rede regular de ensino.

O presente artigo científico está alicerçado na colheita de dados por meio de

levantamento bibliográfico. São obras de renomados juristas, bem como a

publicação de diversos artigos, não deixando de lado as normas constitucionais e

infraconstitucionais, sendo feita uma escolha de elementos elaborados

historicamente, remetendo a busca de informações das sociedades passadas,

apresentando tais dados com o tipo de raciocínio dedutivo, em que há análise do

ensino escolar de uma maneira geral para o particular, isto é, a análise do ensino

domiciliar no Brasil.

1 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS INERENTES AO SER HUMANO E À

EDUCAÇÃO

Violar um princípio é muito mais grave do que transgredir uma norma qualquer. É

com base nessa premissa de Bandeira de Mello (2000, p.748) que esse artigo vai

demonstrar como que uma norma ordinária positivada no ordenamento jurídico

brasileiro não pode se opor a princípios constitucionais invocados pela Constituição

Federal, assim como a tratados internacionais do qual o Brasil é signatário.

Para conceituar a educação no Brasil, citando os seus princípios e objetivos, é válido

citar a nossa Carta Magna, a Constituição Federal de 1988:

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Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

O presente artigo não irá analisar a educação no Brasil em aspectos gerais, nem as

problemáticas no âmbito escolar. Investigará apenas os debates jurídicos entre a

educação domiciliar e a educação escolar, analisando os princípios constitucionais

frente às leis ordinárias, bem como os tratados internacionais sobre o tema.

A educação domiciliar no Brasil é um tema pouco tratado pela doutrina e

jurisprudência. Não há na Constituição Federal uma norma que expressamente

proíba ou que autorize a educação domiciliar, havendo, portanto uma lacuna

normativa. É no artigo 55 do Estatuto da Criança e do Adolescente que encontramos

uma proibição para esta prática, que diz: “Os pais ou responsáveis têm a obrigação

de matricular seus filhos ou pupilos na rede regular de ensino”, e também no artigo

6º da Lei 9.394/96 que dispõe: “É dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula

dos menores, a partir dos sete anos de idade, no ensino fundamental.”

Tais normas, entretanto, se mostram inconstitucionais, visto que a Carta Magna

exalta direitos fundamentais com princípios ali implícitos. A normatização

constitucional dispõe que a educação é direito de todos e dever do Estado e da

família. O direito à escola, não pode ser de maneira nenhuma, confundido com a

imposição de frequência escolar.

Como visto anteriormente, a obrigação do ensino está compartilhada entre o Estado

e a família, porém quem tem a primazia na educação dos filhos menores é a família,

como podemos constatar pela Declaração Universal dos Direitos Humanos

proclamada em 1948 que dispõe em seu artigo 26 que “os pais têm prioridade de

direito na escolha do gênero de instrução que será ministrada a seus filhos.”

Também é constatado no Código Civil de 2002 no artigo 1.634 que “compete aos

pais, quanto à pessoa dos filhos menores, dirigir-lhes a criação e educação.”

A própria Constituição Federal reconhece que os pais podem educar os filhos em

casa, de acordo com o disposto no artigo 229, “os pais têm o dever de assistir, criar

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e educar os filhos menores”. É notório que a grande maioria dos pais preferem

delegar o papel de educar os filhos à escola, normalmente em virtude da atuação no

mercado de trabalho, entre outros motivos. É uma faculdade que os pais, dentro de

uma democracia, têm de colocar seus descendentes em uma rede de ensino.

2 A EDUCAÇÃO DOMICILIAR DEFRONTE À ANÁLISE DE CADA CASO

CONCRETO

A adversidade que diz respeito a uma proibição normativa faz da educação

domiciliar no Brasil, algo ilegal. Tal disposição só é relevante para uma pequena

minoria que não matricula o seu filho na rede regular de ensino, porque trás esse

ensino para o âmbito familiar.

Há uma enorme distinção entre aqueles pais que negligenciam o ensino que é

devido aos seus filhos, deixando a criança na rua ou até mesmo em trabalho infantil,

não proporcionando, portanto, um futuro digno para essas crianças, em

contrapartida dos progenitores que podem e querem fazer do seu lar uma porta

aberta para o saber. Tal proibição normativa foi instituída com o intuito de coibir e

punir àqueles que de fato ensejam o chamado abandono intelectual. É razoável e

necessário analisar cada caso concreto dentro de suas perspectivas.

Apesar de pequeníssima minoria, não pode haver negligência a princípios básicos

constitucionais inerentes ao ser humano, em síntese de exposição de José Afonso

da Silva: princípio da igualdade ou isonomia, em que todos são iguais perante a lei,

sem qualquer discriminação; princípio da liberdade, como alavanca que move todos

os atos humanos; princípio da proporcionalidade da lei, visto as restrições

normativas desnecessárias e abusivas, dentre outros. Há violação também do

conceito de Estado democrático de direito, pois além de garantir os direitos de

propriedade, defende todo um rol de garantias fundamentais fundadas no princípio

da dignidade da pessoa humana.

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3 PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE

É de se verificar a possibilidade da aplicação dos princípios da proporcionalidade e

razoabilidade, assim como a equidade e os princípios gerais do direito. O primeiro

versa que a severidade da sanção deve corresponder a maior ou menor gravidade

da infração penal, visando coibir excessos desarrazoados. O segundo é uma diretriz

de bom senso aplicada ao Direito, isto é, fazendo-se necessário à medida que as

exigências formais que decorrem do princípio da legalidade tendem a reforçar mais

o texto positivado das normas do que a vontade do legislador.

Partindo desses princípios, no intuito de proteger a integridade psicológica,

emocional e até mesmo a física das crianças, o Estado tem o dever de fiscalizar o

pátrio poder para coibir abusos, mas sempre tendo em vista a liberdade da família

de traçar seus próprios caminhos. Antes do Estado, pertence aos pais a

responsabilidade para proporcionar educação a seus filhos, até mesmo porque, o

Estado não é soberano sobre a família e a família precedeu a própria existência do

Estado.

Nessa vereda, o jurista João Baptista Villela, em seu artigo publicado, nos trás

algumas reflexões:

A família não é criação do Estado ou da Igreja. Tampouco é uma invenção do direito como são, por exemplo, o “leasing”, a sociedade por cotas de responsabilidade limitada, o mandado de segurança, o aviso prévio, a suspensão condicional da pena ou o devido processo legal. Estes institutos são produtos da cultura jurídica e foram criados para servir a sociedade. Mas a família antecede ao Estado, preexiste à Igreja e é contemporâneo do direito. Pela ordem natural das coisas, não está no poder de disposição do Estado ou da Igreja desenhar, ao seu arbítrio, o perfil da família. O poder jurídico de um e de outra relativamente à família não pertence à ordem da atribuição. Pertence, ao contrário, à ordem do reconhecimento; pode-se observar, de resto, que, ao longo da história, a autoridade intrínseca da família impõe-se aos poderes sacros e profanos com um silencioso noli me tangere! Lucy Mair registra a propósito, que nem os governos de tendência coletivista mais exacerbada chegaram a cogitar de abolir a família, ainda quando tenham enfraquecidos os laços do matrimônio e encorajado os filhos a delatar os pais por subversão política.

Se os pais se mostram capazes de garantir educação de qualidade aos filhos, não

há motivo suficiente para a interferência do Estado em detrimento do direito natural

da família, cabendo-lhe, portanto, um poder coordenador e não impositor. Assim

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como existe o pluralismo político no ordenamento brasileiro, também é indispensável

a aceitação do pluralismo em outras esferas como na estrutura do sistema

educacional, de maneira a proporcionar um cumprimento eficaz da Constituição

Federal.

4 UMA ABORDAGEM JURÍDICA EM FACE DA PROIBIÇÃO NORMATIVA DO

ENSINO DOMICILIAR

Ficou consolidada pelo STF através da súmula vinculante 25 a supralegalidade dos

Tratados Internacionais sobre as leis ordinárias, visto que ficou nula a possibilidade

de prisão de depositário infiel, por força do Pacto de San José da Costa Rica. Dessa

forma, a Convenção Internacional sobre o Direito das Crianças traz em seus artigos

princípios que corroboram a inconstitucionalidade da proibição da educação

domiciliar no Brasil, assim dispondo:

Art. 3º. Todas as ações relativas às crianças devem considerar, primordialmente, o melhor interesse da criança. Art. 5º. Os Estados Partes respeitarão as responsabilidades, os direitos e os deveres dos pais ou (...) por proporcionar à criança instrução e orientação adequadas e acordes com a evolução de sua capacidade, no exercício dos direitos reconhecidos na presente Convenção. Art. 18. Caberá aos pais ou, quando for o caso, aos representantes legais para o desempenho de suas funções no que tange à educação da criança.

Se a guarda dá o direito ao seu detentor de opor-se a terceiros, podemos dizer por

analogia que os pais, detentores da guarda dos filhos, têm o direito natural de opor-

se a terceiros, inclusive ao Estado, para garantir de forma consciente e responsável

a não violação dos direitos fundamentais seus e de seus filhos. Há exposição diária

já constatada pela nossa sociedade de que na escola a criança fica sujeita ao

bullying, às drogas e à violência, bem como a doutrinação ideológica presente nas

escolas.

Ao mencionar as doutrinações ideológicas, podemos afirmar que para um país que

prega o pluralismo político, é paradoxal o fato de não haver possibilidade da criança

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ter um outro meio de ensino fundamental que não seja a escola, visto que o próprio

Estado pode usar da rede de ensino para inserir suas ideologias.

É muito importante ressaltar que a antiga Lei 4.024/61, a chamada Lei de Diretrizes

e Bases da Educação Nacional, dizia em seu artigo 30 que “não poderá exercer

função pública o pai de família ou responsável por criança em idade escolar sem

fazer prova de matrícula desta, em estabelecimento de ensino, ou de que lhe está

sendo ministrada educação no lar.” Quando em 1990 foi promulgado o Estatuto da

Criança e do Adolescente, ficou clara a colisão de normas com o artigo 55 desse

mesmo estatuto, que somente foi solucionada em 1996 com a promulgação da nova

LDB e a retirada de tal artigo.

De acordo com o jurista Damásio Evangelista de Jesus (2012), a educação à criança

pode ser ministrada de duas formas, isto é, pela educação escolar ou pela educação

domiciliar, desde que permita progressivamente o pleno desenvolvimento da

criança. Desta forma, aos pais que ministram domiciliarmente a educação aos seus

filhos não podem ser enquadrados no delito de abandono intelectual previsto no

artigo 246 do Código Penal, visto que foi providenciado o devido ensino faltando

tipicidade ao elemento normativo do tipo penal.

Outro aspecto de controvérsia jurídica se mostra no fato de que o aluno que for

aprovado no ENEM – Exame Nacional do Ensino Médio – tem como conseqüência a

expedição de um certificado de conclusão do ensino médio de acordo com Portaria

Normativa do Governo Federal expedida no início de 2010. Isso é reafirmado pela

Lei de Diretrizes e Bases da Educação dispondo que:

Art. 24. A educação básica, nos níveis fundamental e médio, será organizada de acordo com as seguintes regras comuns: II - a classificação em qualquer série ou etapa, exceto a primeira do ensino fundamental, pode ser feita: c) independentemente de escolarização anterior, mediante avaliação feita pela escola, que defina o grau de desenvolvimento e experiência do candidato e permita sua inscrição na série ou etapa adequada, conforme regulamentação do respectivo sistema de ensino.

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Portanto, independentemente do indivíduo ter concluído qualquer etapa escolar em

sua vida, basta que ele seja aprovado no ENEM que já terá concluído o ensino

médio, bem como já será apto para ingressar em qualquer rede de ensino superior.

Mais uma vez isso mostra a desnecessidade de educação escolar, para aqueles que

assim desejarem.

Com a finalidade de legalizar o ensino domiciliar no Brasil, em 1994, o então

Deputado João Teixeira fez um estudo sobre a possibilidade de normatizar o ensino

domiciliar e apresentou o Projeto de Lei nº 4.657/94 que criava o ensino domiciliar

de primeiro grau, sendo rejeitado por unanimidade no mesmo ano e,

consequentemente, foi arquivado. Mais tarde, em 1997, foi a vez do Deputado

Salatiel Carvalho tentar viabilizar um projeto de lei sobre o mesmo tema, mas dessa

vez nem chegou a ser apresentado um projeto de lei.

Atualmente, tramita no Congresso Nacional o projeto de lei 3.179/12, do Deputado

Lincoln Portela que acrescenta parágrafo ao artigo 23 da Lei 9.394/96, a Lei de

Diretrizes e Bases da Educação, para dispor sobre a possibilidade de oferta

domiciliar da educação básica. De acordo com Portela, mesmo sendo uma matéria

já anteriormente objeto de proposições que fora rejeitada, o respeito à liberdade e a

relevância da proposição, inspira a reapresentação do presente projeto de lei.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

É evidente a lacuna normativa que conflita com o direito e dever que os pais têm de

educar os seus filhos. É certo que a família e o Estado concorrem na educação das

crianças, entretanto os pais têm a primazia sobre a educação dos filhos conforme

Declaração Universal dos Direitos Humanos proclamada em 1948 e também previsto

no artigo 1.634 do Código Civil. O Estado não pode afrontar o princípio da liberdade,

exaltado na Carta Magna, coibindo os pais que desejam prover a própria educação

fundamental aos seus filhos.

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Além das vantagens que a educação domiciliar pode proporcionar, como a

qualidade do ensino, o controle que os pais passam a ter sobre a educação dos

filhos e o prazer de aprender que a criança pode amadurecer com mais facilidade, é

notório pela sociedade que a exposição diária que a criança fica sujeita ao bullying,

às drogas e à violência, fazem cada vez mais famílias adotarem esse método de

ensino no Brasil.

Também é válido destacar que os pais que ministram o ensino domiciliar adequado,

permitindo o pleno desenvolvimento da criança, não podem ser enquadrados no

delito previsto no artigo 246 do Código Penal, o abandono intelectual. Fica faltando

tipicidade ao elemento normativo do tipo penal de acordo com o jurista Damásio

Evangelista de Jesus (2012). Não é, portanto, razoável aplicar tal sanção para essa

determinada situação.

Apesar de controvérsias jurídicas que afirmam serem inconstitucionais os

dispositivos do Estatuto da Criança e do Adolescente e da Lei de Diretrizes e Bases

da Educação que dispõem sobre a obrigatoriedade de matricular os filhos na escola,

a melhor solução para o caso seria normatizar a educação domiciliar no Brasil, que

já foi apresentada em projeto de lei pelo Deputado Lincoln Portela no ano de 2012.

REFERÊNCIAS

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