Educação física e aprendizagem social - Valter Bracht

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BRACHT, Valter. Educação física e aprendizagem social. 2. ed. Porto Alegre: Magister, 1997. 122 p.

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O AUTOR 

Valter Bracht nasceu em To-ledo (PR).

Realizou seu curso de gra-duação em Educação Física na Uni-versidade Federal do Paraná.

 Na mesma Universidade con-cluiu o curso de Especialização emTreinamento Desportivo.

Ingressou na UniversidadeEstadual de Maringá, onde atua ain-da hoje como docente da disciplinade Fundamentos da Educação Físi-ca, no curso de Graduação em Edu-cação Física.

Obteve o grau de mestre emEducação Física na UniversidadeFederal de Santa Maria (RS).

EDUCAÇÃO FÍSICA E

APRENDIZAGEM SOCIAL

EDITORA MAGISTER LTDA 1997

VALTER BRACHT

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COORDENAÇÃO: JOSÉ PEREIRA RODRIGUESREVISÃO DE TEXTOS: IARA HAUBERT RODRIGUESCOMPOSIÇÃO E DIAGRAM AÇÃO: LEANDRO AUGUSTO DOS S. LIMA

©VALTER BRACHTTODOS OS DIREITOS DESTA OBRA ESTÃO RESERVADOS ÀLIVRARIA E EDITORA MAGISTER LTDAIMPRESSO EM OUTUBRO DE 1997

VALTER BRACHT

EDUCAÇÃO FÍSICA E 

APRENDIZAGEM SOCIAL

2ª EDIÇÃO

LIVRARIA E EDITORA MAGISTER LTDA PORTO ALEGRE 

1997

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Dados de Catalogação na Publicação: Nilvea Schapke - CRB 10/784

ISBN 8585275057

LIVRARIA E EDITORA MAGISTER LTDA. AV. WENCESLAU ESCOBAR, 2667/204 

FONE (051) 249-5054 PORTO ALEGRE - RS - BRASIL 

EDITOR  JOSÉ PEREIRA RODRIGUES

SUMÁRIO

CartaPrefácio.........................................................................................................9Prefácio à 2a edição..............................................................................................10

Introdução........... ................................................................................................. 11

PARTEI

Em torno da Autonomia e da Legitimidade da Educação Física.........................13

Capítulo I

1. Educação Física: a busca da autonomia pedagógica.......................................15

1.1 Introdução.................................................................................... ................. 15

1.2 Instrumento teórico da análise.......................................................................18

1.3 Educação Física Instituição Militar Instituição Esporte...........................19

1.4 A busca de um referencial teórico.................................................................24

Capítulo II

2. Educação Física: a busca da legitimação pedagógica ..................................... 33

2.1 Introdução......................................................................................................33

2.2 Excurso acerca da pergunta “o que é Educação Física?”...........................34

2.3 Crise e legitimação........................................................................................ 36

2.4 Os modelos de legitimação da Educação Física................. .............. .............36

2.5 A produção do conhecimento na e para a Educação Física............ .............. 37

2.6 A crítica e a superação dos modelos de legitimação vigentes...................... 42

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PARTE II

Aprendizagem social na Educação Física............................................................55

Capítulo III

3. A criança que pratica esportes respeita as regras do jogo... capitalista ......... 57

3.1 Introdução......................................................................................................57

3.2 O Conteúdo sócioeducativo do esporte........................................................58

3.3 Princípios de uma pedagogia crítica para a Educação Física........................65

Capítulo IV4. A Educação Física Escolar como Campo de Vivência Social.........................71

4.1 Introdução............................................................................................... ......71

4.2 A socialização através do jogo e do esporte .................................................74

4.3 A aprendizagem social no ensino dos esportes nas escolas.......................... 77

4.4 O fenômeno do jogo na sua relação com o esporte.......................................81

4.5 A metodologia do ensino do basquetebol......................................................82

4.6 Objetivos do estudo..................... ..................................................................83

4.7 Materiais e métodos....................................................................................... 84

4.7.1 Instrumentos de medida.......... ............. ............... ............. .............. .............84

4.7.1.1 Sistema de registro de comportamentos de interação social.................. 85

4.7.1.2 Questionário............................................................................................ 87

4.7.2..Coleta de dados...........................................................................................87

4.7.3 Metodologia FuncionalIntegrativa (MFI)... .............. ............... .............. ...88

4.7.4 Metodologia Tradicional (MT).................................................................. 92

4.8 Resultados e Discussão........ .............. .............. ............. ............... .............. ....92

4.9 Discussão dos resultados... .............. .............. .............. ............. ............... .... 100

4.10 Conclusão.................................................................................................. 106

Bibliografia..........................................................................................................111

O AUTOR 

Valter Bracht nasceu em Toledo (PR) no ano de 1957. Realizou seu

curso de graduação em Educação Física na Universidade Federal do Para-

ná, concluindo o curso no ano de 1980. Na mesma Universidade concluiu,

no ano seguinte, 1981, o curso de Especialização em Treinamento Despor-

tivo. Neste mesmo ano, ingressou na Universidade Estadual de Maringá,

onde atua, ainda hoje, como docente da disciplina de Fundamentos da Edu-

cação Física, no curso de Graduação em Educação Física. Em 1983, obteveo grau de mestre em Educação Física na Universidade Federal de Santa

Maria (RS). Em 1984, obteve o primeiro lugar no Prêmio MEC de Literatura

Desportiva na modalidade de Estudos Pedagógicos. Em 1990, doutorouse

 pela Universidade de Oldenburg (R.F.A). Publicou, como coautor, o livro:

Autores Coletivos, Metodologia do Ensino da Educação Física (Coleção

Magistério), editado pela Cortez Editora em 1992. Atualmente é Presidente

do Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte, e desenvolve estudos nas

áreas da Pedagogia da Educação Física e Sociologia do Esporte.

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PREFÁCIO À 2a EDIÇÃO

Dirijimonos aos leitores por ocasião desta 2a edição do "Educação

Física e Aprendizagem Social”, para agradecer a boa acolhida que este livrovem tendo junto aos colegas da área.

Decorridos quase cinco anos desde sua 1a edição, cabe ressaltar ofato do livro ter sido editado, em 1996, também em língua espanhola no paísvizinho, a Argentina (Editorial Vellez Sarsfield). É importante frisar, tam-

 bém, que decidimos manter a versão original por entendermos que as ques-tões aqui discutidas não foram esgotadas, ou seja, continuam a oferecer ele-mentos importantes para a discussão pedagógica da Educação Física.

Foi e continua sendo nossa expectativa, a de contribuir para o debateem torno de uma teoria da Educação Física, que encare esta como uma prá-tica pedagógica; reitero o convite aos colegas para participar deste projeto.

Vitória (ES), julho/l997Valter Bracht

CARTA-PREFÁCIO

Companheiro Valter,

Tudo bem? Acabo de fazer um levantamento, em nível nacional, bus-cando os textos que mais repercutiram nos anos 80 entre estudantes e

 professores de Educação Física. O resultado revelou uma antiga desconfi-ança. Você é um dos articulistas mais lidos em nossa área. A profundidade e

o rigor científico, bem como o seu poder de comunicação escrita encarrega-ramse de colocálo nessa invejável posição.

Conhecemonos em 1984, por ocasião da II Semana de EducaçãoFísica promovida pela UEM. Desde então, tenho acompanhado com muitocarinho a sua carreira e a sua militância. Tenho certeza de que o sucessodeveuse ao fato de você não desarticular Educação Física e Sociedade. Emais. Pensar, não qualquer Educação Física em uma sociedade qualquer.Pensar, sim, esta Educação Física nesta sociedade.

 Nesta sociedade onde 45% de todos bens produzidos coletivamenteestão nas mãos de 1% de proprietários. Onde as empresas multinacionaisdetêm quase o dobro das terras dos nossos lavradores. Só faltava, mesmo,ganhar uma medalha na competição da miséria. Não falta mais. Somos me-dalha de bronze, de acordo com o Banco Mundial. Será que a EducaçãoFísica não tem nada a ver com isso? Amigo Valter, você bem sabe que omis-são identificase com cumplicidade. Você não se omite e daí a sua importância.

Apesar e por causa disso tudo, fica uma lacuna. A publicação emforma de livro dos artigos que melhor representem o seu pensamento.Aguardamos.

Rio de Janeiro, 19 de fevereiro de 1992.

Do seu amigo e admirador,

*Vitor 

P.S. Sucesso na presidência do CBCE.

*PROF.: Vitor Marinho de Oliveira

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INTRODUÇÃO

Este livro compõese de uma série de artigos e ensaios, três deles já publicados anteriormente em periódicos da área, e um ainda inédito. A de-cisão de publicálos agora na forma de livro, adveio da constatação de que,no âmbito da Educação Física, os periódicos ainda não têm a mesma pene-tração dos livros, levandonos a crer que grande parte da comunidade daEducação Física ainda não teve acesso a este conteúdo. Por outro lado, o

incentivo do Prof. Vitor Marinho de Oliveira representou o empurrão final para que levássemos à frente a idéia.

O título “Educação Física e Aprendizagem Social”, num primeiromomento, pode parecer estar apenas relacionado com o conteúdo da segun-da parte, mas, na verdade, contém uma categoria que é característica parauma corrente que surge na Educação Física brasileira no início da década de80. Esta corrente, influenciada pela discussão que era levada a efeito noâmbito mais geral da pedagogia no Brasil, começa a refletir o papel socialda Educação Física, contextualizandoa no sistema educacional, e este, nasociedade capitalista brasileira, operando estas análises com um referencialteórico de orientação marxista.

Assim, o conteúdo deste livro reflete também diferentes momentosdesse movimento, e diferentes momentos do próprio autor. Contém tantoum ensaio que possui um forte caráter de denúncia (Cap, 3 "A criança que

 pratica esportes respeita as regras do jogo ... capitalista"), como um ensaioonde já a autocrítica tem seu espaço (Cap. 2 “Educação Física: a busca dalegitimação pedagógica”). Embora algumas das posições defendidas na épocaem algum destes artigos precisassem hoje ser relativadas, e outras tivessemsido superadas pelo autor, decidiuse pela publicação sem alteraçõessignificativas, de vez que, na essência, as posições permaneçam inalte-radas.

A segunda parte, que cronologicamente antecede a primeira, contémdois artigos onde a questão central é o tipo de aprendizagem social propici-ada pelas aulas de Educação Física. Em “A criança que pratica esportesrespeita as regras do jogo ... capitalista”, procuramos analisar que repercus-são política teria o tipo de aprendizagem social típica das aulas de Educação

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Física, e, no capítulo seguinte “Educação Física escolar como campo devivência social” procuramos ir além, buscando desenvolver uma alterna-tiva metodológica que levasse a um tipo de aprendizagem social que secolocasse na perspectiva de uma educação transformadora.

A primeira parte contém dois artigos, cuja preocupação central é odesenvolvimento de elementos de uma teoria pedagógica de Educação Físi-ca articulada discursivamente com uma teoria crítica da educação. No capí-tulo um, analisamos até que ponto podemos falar da Educação Física en-quanto prática pedagógica que desfrute de autonomia, ou seja, que se paute

 por princípios e códigos próprios e não de sistemas, afora a escola, com osquais se relaciona, como por exemplo, o sistema esportivo. No capítulo dois,

levamos a efeito reflexões iniciais em tomo da razão de ser da EducaçãoFísica, ou seja, da questão da legitimidade da Educação Física no currículoescolar.

Esperamos, com a publicação deste livro, propiciar o acesso de seuconteúdo a um número maior de colegas, e contribuir para incrementar odebate em torno desta prática pedagógica que é a Educação Física.

Maringá, 12 de janeiro de 1992.

Valter Bracht

PARTE I

EM TORNO DA AUTONOMIA E DA LEGITIMIDADE DA EDUCAÇÃO FÍSICA

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L

Educação Física: a busca da autonomia pedagógica 15

CAPÍTULO I

Educação Física: a busca da autonomia pedagógica

1.1 Introdução

Pareceme necessário, antes de mais nada, realizar um esforço no

sentido de estabelecer uma certa clareza terminológica quanto à expressãoEducação Física. Este termo tem sido utilizado no Brasil, concomitantemente, num sentido restrito e num sentido amplo, o que tem gerado umverdadeiro caos conceituai, que dificulta a comunicação científica e a refle-xão teórica.

 No seu sentido “restrito”, o termo Educação Física (1) abrange asatividades pedagógicas, tendo como tema o movimento corporal e que tomalugar na instituição educacional. No seu sentido “amplo” tem sido utilizado

 para designar, inadequadamente a meu ver, todas as manifestações culturaisligadas à ludomotricidade humana, que, no seu conjunto, parecemme me-lhor abarcadas por termos como cultura corporal ou cultura de movimento

(2).

1 Segundo Marinho, I.P. (1984, p. 217), é a J. Locke (16321704) que devemos autilização/sedimentação do termo Educação Física. No entanto, o autor mesmo,em obras anteriores não opera a diferenciação dos sentidos amplo e restrito.

2 Poderia aqui ser contraargumentado que o termo Educação Física é tão adequa-do quanto o de cultura corporal para designar o conjunto das atividades corporaisde movimento. O inconveniente, a meu ver, é que teríamos que substituir o termoEducação Física no seu sentido restrito, já que me parece urgente eliminar a am-

 bigüidade. Por outro lado, não gostaria de adentrar aqui na questão da im- propriedade do próprio termo Educação Física, que seria, na opinião de Sérgio(1986, p. 24), com vantagens substituído por Educação Motora, devido ao maior 

 peso e densidade ontológica deste.

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16 Educação Física e Aprendizagem Social

Em parte, a confusão se deve ao fato do profissional denominadoProfessor de Educação Física ou Licenciado em Educação Física (3), re-querer para si o direito de atuação profissional com todas as atividades cor- porais de movimento da Educação Física, passando pelo esporte, peladança, até a ginástica de academia. Essas atividades estavam desde logo presentes nos currículos de formação de professores de Educação Física noBrasil, donde a célebre afirmação de que o esporte, a dança, os jogos aginástica, etc., são os meios da Educação Física até aí nada de mais, derivandose daí a falsa conclusão de que o termo Educação Física seriamais “abrangente” do que os de Esporte, Ginástica (recreação [4]), etc.,

 porque os compreendia. Neste escrito, portanto, a expressão Educação Físi-ca será utilizada no seu sentido restrito, definido acima.

O tema Educação Física, como mencionado anteriormente, é o movi-mento corporal — é o que confere especificidade à Educação Física no inte-rior da Escola. Mas o movimento corporal ou movimento humano que é seutema, não é qualquer movimento, não é todo movimento. É o movimentohumano com determinado significado/sentido, que por sua vez, lhe é confe-rido pelo contexto históricocultural. O movimento que é tema da EducaçãoFísica é o que se apresenta na forma de jogos, de exercícios ginásticos, deesporte, de dança, etc. Esses movimentos não são propriedade exclusivadesta área ou desta prática pedagógica, muito pelo contrário, a EducaçãoFísica apoderouse em maior ou menor grau (ou foi ela que foi instrumenta-lizada?) dessas atividades corporais, pedagogizandoas (ou pretendendo pedagogizálas). Estas atividades, como disse, possuem um determinado có

3 É interessante notar que, em 1939, foi criada, integrando a Universidade do Bra-sil, a Escola Nacional de Educação Física e Desportos, cujos egressos recebiam,no entanto, o título de Professor de Educação Física (Marinho, 1984, p. 220).

4 O entendimento da recreação como uma forma específica de atividade que pu-desse figurar ao lado da ginástica, do esporte, etc., foi apenas recentemente desmistificado por RL. Moro, num artigo recomendável: Redimensionando a Recreacão em Educação Física. In: Comunidade Esportiva, nov./dez. 1986, n. 40. p. 27.

Educação Física: a busca da autonomia pedagógica 17

digo que denuncia seu condicionamento histórico, expressam/comunicamum sentido, incorporamse a um contexto que lhes confere sentido (5).

Por exemplo, os movimentos na forma de exercícios ginásticos, decorridas, etc., que incorporam os programas de preparação militar no inte-rior desta instituição, expressam e possuem um sentido, um determinadocódigo que só pode ser apreendido, se considerados o sentido e os códigosque vigoram na própria instituição militar como um todo. Isto é, o movi-mento corporal, na forma de ginástica, foi aí instrumentalizado.

Se analisarmos, através da literatura específica, a forma cultural domovimento corporal que tem sido objeto da Educação Física no Brasil, ve-remos que inicialmente (pelo menos até a década de 40 deste século), haviao predomínio do exercício ginástico principalmente o de orientação mili-tarista que, a partir de então, cede lugar progressivamente ao movimentona forma cultural de esporte. É lógico que outras expressões da cultura corpo-ral ou de movimento, estiveram/estão presentes ou são tematizados na Educa-ção Física, como a dança, jogos e brincadeiras populares. Pareceme, no entan-to, que essas expressões constituem minoria, e que podemos falar da ginásticae posteriormente de esporte, como as atividades, nos respectivos momentoshistóricos, que se apresentam como hegemônicos na Educação Física.

Por outro lado, a Educação Física, em se realizando na instituiçãoeducacional, presumese, assume o estatuto de atividade pedagógica e comotal, incorporase aos códigos e funções da própria escola. Assim sendo, pa-receme que a Educação Física, no Brasil, vai desenvolver sua identidade

(?), seus códigos, a partir da relação que estabeleceu/estabelece com ummeio ambiente que compreende, fundamentalmente, a instituição escola, ainstituição militar e a instituição esporte. E é neste conjunto de relações que

 buscaremos, inicialmente, as bases para a discussão de dois pontos que nor-tearão nossas reflexões daqui por diante:

a) O  grau de autonomia pedagógica (identidade da Educação Física)alcançada na sua relação com as instituições referidas acima;

5 Não existe um salto em distância que seja em si capitalista e um que seja em sisocialista. Somente sua contextualização permitirá identificar possíveis sentidos significados diferentes nesta ação.

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18 Educação Física e Aprendizagem Social

b) As bases de legitimação como integrantes do sistema formal de ensi-no o que compreende a questão dos objetivosconteúdos da disciplina.

1.2 Instrumento teórico de análise

Antes de adentrar a análise propriamente dita, gostaria de, antecipa-damente, explicitar alguns elementos teóricos que utilizarei na análise.

Um destes elementos é a teoria da diferenciação dos sistemas soci-

ais, como ela tem sido desenvolvida pela moderna teoria dos sistemas nasociologia (6). Os sistemas sociais, em função de sua especialização funci-onal, desenvolvem uma lógica própria que se objetiva na forma de valores,normas, códigos e semânticas. Um exemplo típico é o apresentado por K.Marx em relação à lógica própria desenvolvida pelo sistema econômico docapitalismo (7). Isto não significa que um sistema social que se diferencioude um meioambiente, que desenvolvou uma lógica própria, não mantenhamais relações com este meioambiente. Pelo contrário, autonomia não sig-nifica, neste caso, isolamento ou autarquia: “A autonomia pressupõe umadeterminada interdependência, e expressa o grau de liberdade com a qual asrelações entre o sistema e o meioambiente podem, através dos critérios seleti-vos do sistema, ser por ele próprio reguladas” (LUHMANN, 1970, p. 157).

 Na teoria dos sistemas, partese do princípio da unidade da diferençaentre o sistema e o meioambiente (CACHAY, 1986). Assim, a identidadede um sistema desenvolvese em íntima relação com o seu meioambiente.

Se nos distanciarmos agora da teoria dos sistemas (funcionalestruturalismo) ou a complementarmos com categorias do materialismo históri-co, poderíamos dizer que os sistemas sociais não podem ser simplesmentecolocados lado a lado, e sim, para superar o caráter meramente descritivo daanálise, precisamos, através da análise histórica, identificar a gênese dossistemas, as suas determinações, ou seja, através da categoria antropológica

6 Um dos mais importanies defensores desta teoria é o sociólogo alemão NiklasLUHMANN (1970). Para uma crítica a Luhmann ver HABERMAS (1983).

7 A respeito ver SCHIMANK (1987).

Educação Física: a busca da autonomia pedagógica 19

do trabalho, introduzir a questão do poder nas relações intersistemas. Issosignifica perguntar, por exemplo, em que medida um sistema não tem suaidentidade ou o sentido norteador das ações, determinadas por outros siste-mas (que constituem o seu meioambiente) mais “poderosos”? “É precisoanalisar o desenvolmento em função de sua posição na hierarquia global”(BRUHL, 1987, p. 35).

Um dos critérios que identificam a diferenciação de um sistema dizrespeito à diferenciação dos papéis (8). Isso é, em que medida os diferentes

 papéis que precisam ser cumpridos no interior de um sistema, não se con-fundem com outros de outros sistemas. Os papéis podem ser analisados a partir de diferentes características como: suas funções, qualificação neces-sária, o processo de socialização para o desempenho do papel, habilidadestécnicas que envolvem o papel, etc.

É a partir deste instrumental que pretendemos, a seguir, discutir aquestão do grau de autonomia pedagógica da Educação Física, o problemade sua identidade (9).

1.3 Educação Física - Instituição Militar - Instituição Esporte

A instituição educacional é produto de um processo de complexificação da sociedade produzido fundamentalmente pelo desenvolvimentodas forças produtivas que determinou uma diferenciação de sistemas, osquais cumprem, no conjunto das relações sociais, determinadas funções: a

transmissão do saber social acumulado exigiu o surgimento de uma institui-ção para cumprir tal tarefa o sistema educacional.

A Educação Física nasce praticamente junto com a Escola, com ossistemas nacionais de ensino, típicos da sociedade burguesa emergente dos

8 “Papéis são conjuntos ou padrões de expectativa de comportamentos (compor-tamentos esperados)” (JOAS, 1978).

9 É importante frisar que a questão que perseguimos é menos a de se a EducaçãoFísica constitui um sistema diferenciado no sentido da teoria dos sistemas, e sim,que grau de autonomia pedagógica ela alcançou, as perspectivas de desenvolvi-mento de tal autonomia, bem como as influências que sofre na formação de simidentidade.

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20 Educação Física e Aprendizagem Social

séculos XVIII e XIX. Foram inicialmente os Filantropos como Guths Muths (17591839) e Pestalozzi (17461827), que buscaram introduzir as ati-vidades corporais no currículo escolar. No entanto, a influência destes pe-dagogos na Educação Física brasileira é claramente superada pelos chama-dos métodos ginásticos, como o desenvolvido por P.H. Ling na Suécia, ou oRegulamento Geral da Educação Física conhecido no Brasil como métodofrancês. Uma outra característica marcante da Educação Física brasileiratem sido a influência da instituição militar em seu desenvolvimento. Assim,os métodos inicialmente adotados foram, viaderegra, os adotados pela ins-tituição militar, como foi o caso do já citado método francês (10).

Mas não somente os métodos ginásticos de inspiração militar foram, principalmente nas quatro primeiras décadas de nosso século, levadas à es-cola, como também os próprios instrutores ou “aplicadores” dos métodos.Ora, a preparação militar inclui historicamente a exercitação corporal como objetivo do desenvolvimento da aptidão física e do que se convencionouchamar de “formação do caráter” autodisciplina, hábitos higiênicos, ca- pacidade de suportar a dor, coragem, respeito à hierarquia.

O importante a ressaltar é que a instituição escola, neste caso, é maisou menos palco de uma ação “pedagógica“ que se legitimava a partir de sua

 presumível contribuição para a saúde, ou seja, com função higiênica (inici-almente com um conceito anatômico e posteriormente anátomofisiológico),e formação do caráter, e o seu conteúdo baseado fundamentalmente na exer-citação corporal através de exercícios analíticos, corridas, saltos, etc. Isto é,assume, através do conteúdo e da forma como ele é apresentado, através das

características dos papéis desempenhados pelos instrutores e alunos, os có-digos/símbolos/linguagem/sentido da instituição militar. O que aliás, em li-nhas gerais, não estava em dissonância com o projeto da ditadura do Estado

 Novo (ver ALMEIDA CABRAL, 1987), e portanto, com o papel atribuídoà Escola naquele período da história do Brasil.

Analisemos ainda um pouco as características dos papéis dos dois principais sujeitos envolvidos nesta atividade: o instrutor e o aluno. As fun-ções atribuídas ao instrutor eram as de apresentar os exercícios, dirigir, amanter a ordem e a disciplina. Ao aluno competia repetir e cumprir a tarefa

10 Ver a respeito MARINHO (1980).

Educação Física: a busca da autonomia pedagógica 21

atribuída pelo instrutor. A socialização do instrutor, ou seja, o processo peloqual o sujeito assumia o papel de instrutor de ginástica consistia, fundamen-talmente, num treinamento no interior da instituição militar ou numa Escolade Educação Física militar.

Poderíamos ainda analisar, por exemplo, a característica do fenotipotípico para o instrutor de ginástica, as habilidades técnicas necessárias, arelação entre instrutor e aluno. Pareceme no entanto claro que, a nível dacaracterização dos papéis, fica explícita a transferência mecânica dos códi-gos da formação física militar para a Educação Física.

A pergunta é se neste quadro acabou sendo desenvolvido algo comouma ação teóricoprática que propiciasse a recepção crítica da influênciamilitar, do papel atribuído à escola e à Educação Física pelos interessesdominantes. Tudo indica que não, ou seja, a Educação Física não desenvol-veu a este tempo, um corpo de conhecimentos que a diferenciasse funda-mentalmente da instrução física militar. A Educação Física não é ela mes-ma; em maior ou menor grau ela é a instrução física militar. A sua identida-de e o seu desenvolvimento são totalmente determinados a partir de fora.Seu entendimento como atividade eminentemente prática colabora também

 para impedir a reflexão teórica em seu interior. A figura do professor, ou seja, osujeito que poderia desempenhar tal tarefa, também não está ainda presente.

A "desmilitarização” da Educação Física brasileira dá os seus primeiros passos com a criação das primeiras escolas civis de formação de professores nofinal da década de 30 e início da de 40. Vale observar, para evitar equívocos,

que tal desmilitarização não alcançou em nossos dias o nível desejável tanto naEducação Física quanto ao nível da sociedade em geral (11).

Após a II Guerra Mundial, que coincide a grosso modo com o fim daditadura do Estado Novo, a influência do esporte cresce rapidamente. Tam- bém temos a influência neste período, do Método Natural Austríaco, desen-volvido por Gaulhofer e Streicher na Áustria e do Método da EducaçãoFísica Desportiva Generalizada, divulgado no Brasil pelo Prof. AugustoListello. Mas, como observado em outro momento, pareceme possível re-

11 A respeito ver FARIA JR (1987) e BRIGAGÃO (1985).

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22 Educação Física e Aprendizagem Social

nunciar à análise da influência destes dois métodos em favor da influênciado esporte ou da instituição esporte.

O esporte sofre, no período do pósguerra, um grande desenvolvimentoquantitativo. Afirmase paulatinamente em todos os países sob a influência dacultura européia, como o elemento hegemônico da cultura de movimento. NoBrasil as condições para o desenvolvimento do esporte, quais sejam, o desen-volvimento industrial com a conseqüente urbanização da população e dosmeios de comunicação de massa, estavam agora, mais do que antes, presen-tes. Outro aspecto importante é a progressiva esportivização de outros elemen-tos da cultura de movimento, sejam elas vindas do exterior, como o judô ou okarate, ou genuinamente brasileiras como a capoeira (ver JORGE, 1980).

Mais uma vez a Educação Física assume os códigos de uma outrainstituição, e, de tal forma, que temos então, não o esporte da escola, e simo esporte na Escola, o que indica sua subordinação aos códigos/sentido dainstituição esportiva. O esporte na escola é um braço prolongado da própriainstituição esportiva. Os códigos da instituição esportiva podem ser resumi-dos em: princípio do rendimento atléticodesportivo, competição, compara-ção de rendimentos e recordes, regulamentação rígida, sucesso esportivo ésinônimo de vitória, racionalização de meios e técnicas. O que pode ser observado é a transplantação reflexa destes códigos do esporte para a Edu-cação Física. Utilizando a linguagem sistêmica, poderseia dizer que a in-fluência do meioambiente (esporte) não foi/é selecionada (filtrada) por umcódigo próprio da Educação Física, o que demonstra sua falta de autonomiana determinação do sentido das ações em seu interior.

É importante citar que o desenvolvimento da instituição esportivanão se dá independentemente do da Educação Física: condicionamse mu-tuamente. A esta é colocada a tarefa de fornecer a “base” para o esporte derendimento. A Escola é a base da pirâmide esportiva. É o local onde o talen-to esportivo vai ser descoberto. Esta relação, portanto, não é simétrica. Por outro lado, a instituição esportiva sempre lançou mão do argumento de queesporte é cultura, é educação, para legitimarse no contexto social, e princi-

 palmente para conseguir apoio e financiamento oficial.

 Na literatura específica, temos uma disseminação de livros que concentramse no desenvolvimento de estratégias do aprendizado do esporte,centrados quase que exclusivamente nos elementos técnicotáticos do apren-

Educação Física: a busca da autonomia pedagógica 23

dizado e nas précondições fisiológicas e neuromotoras para a prática dedeterminado esporte. Estas estratégias são trazidas para a escola com funda-mentalmente uma única adaptação, qual seja, a divisão do processo em fun-ção dos tempos escolares e dos graus de ensino.

Os papéis do agora professor de Educação Física e do educando comose apresentam? Os papéis desses sujeitos também não são diferenciáveisnos seus aspectos fundamentais dos de treinador e de atleta na instituiçãoesportiva. Isto é, passouse do professorinstrutor e o de alunorecruta parao de professortreinador e de alunoatleta. A diferenciação entre o “bom”treinador e o “bom” professor não é possível. A socialização do professor émarcada pela atividade esportiva. Os próprios professores dos cursos supe-riores de Educação Física, que, aliás, possuem um currículo predominante-mente esportivo, foram e são contratados em função do seu desempenho nomundo esportivo. A conservação da divisão de turmas para as aulas de Edu-cação Física por sexo (M e F) é também, em parte, um reflexo da divisãoexistente na instituição esportiva, pelo menos justificada a partir de seuscódigos (12).

Os professores não operam a diferenciação dos papéis de treinador e professor, em parte, porque a própria Educação Física, não tendo autono-mia ou uma identidade pedagógica, não fornece um referencial, um conjun-to fundamentado e institucionalizado de expectativas de comportamento.Isto é, a própria definição do papel do professor de Educação Física inexiste.Esta falta de referência é fator de perpetuação da indiferenciação destes papéis.

Esta orientação parece, mais uma vez, adequarse bem à orientaçãotecnicista que, principalmente nas décadas de 60 e 70 predominam no sis-tema educacional brasileiro, sob a égide da ditadura militar, do projeto “BrasilGrande”. É a época dos, objetivos operacionais, do primado do planeja-mento, da tecnologia do ensino. Menos o professor e o aluno têm importân-cia no processo de ensino, e mais o planejamento (SAVIANI, 1984, p. 159). Sob esta orientação, ocorreram reducionismos, ou uma segunda reduçãodo movimento corporal nas aulas (a primeira redução já havia ocorrido atra-

12   Nunca é demais observar que, num esforço teórico de síntese como este escrito, ograu de diferenciação necessário não pode ser observado. Falo, portanto, em tendências hegemônicas, o que não exclui tendências desviantes.

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vés da assimilação dos códigos do esporte), pela necessidade de operacionalizar os objetivos, o que levou, pelo menos na tendência, à substituição dolúdico em favor de tarefas mecânicas (13).

Com isto gostaria de chamar a atenção para o fato de que não bastaautonomizarse em relação à instituição esportiva e à instituição militar vol-tandose totalmente à Escola. É preciso que a autonomização pedagógica da Educação Física compreenda uma reflexão crítica do próprio papel da Escola em nossa sociedade de classes. Isto é, não só uma relação crítica(filtragem crítica) para com o conjunto de atividades corporais (por ex. oesporte) deve ser elemento constituinte do desenvolvimento da sua identi-dade pedagógica, mas também para com a instituição educacional.

1.4 A busca de um referencial teórico

Sem dúvida, a questão dos objetivosconteúdos (métodos de ensino) daEducação Física é um dos pontos centrais do desenvolvimento da sua identida-de pedagógica que, no entanto, tem sido negligenciada, enquanto tema, pelainvestigação em Educação Física no Brasil, ou, quando muito, discutida assistematicamente. Muito mais, pareceme predominar, quanto a esta questão, umconsenso funcionallatente, cuja existência devese, pelo menos em parte, à jádiscutida subordinação da Educação Física à instituição esportiva. E esta situa-ção persiste sobretudo porque é funcional no conjunto das relações sociais, ouseja, é fator de reprodução das relações sociais dominantes, é, assim, somenteserão os objetivos e conteúdos da Educação Física - radicalmente ques

tionados quando as próprias relações sociais vigentes o forem.

 Nesse contexto, a questão da legitimação da Educação Física na Es-cola também não é objeto da investigação em Educação Física, também nãoé problematizada. Aceitase a imposição do seu sentido a partir de fora (14).

13 O lúdico é dificilmente reduzível a objetivos operacionais: o aluno deverá, nofinal da aula, ser capaz de rir corretamente pelo menos 3 vezes em 5 tentativas sic!!!.

14 Suspeito, nesse aspecto, de um certo oportunismo, como aquele da instituiçãoesportiva que manteve uma relação de "compadrio” com a ditadura militar do

 pós 64.

Educação Física: a busca da autonomia pedagógica 25

É interessante notar que, num regime autoritário, a legitimidade confundese com a legalidade. A última tende a subsumir a primeira e, assim, estaquestão é reduzida a um problema de legalidade da Educação Física (se por decreto ou não, não é o problema!).

O referido consenso funcionallatente quanto aos objetivos conteúdos da Educação Física que permanece latente enquanto não for 

 problematizado pode ser caracterizado, a partir da análise desenvolvidadas práticas hegemônicas, ainda que de forma grosseira, da seguinte forma:

Conteúdo: esporte, isto é, esporte federado, suas técnicas, regras,táticas, etc. A ginástica e a corrida, por ex., são praticadas com vistas a“parte principal”. Os jogos populares são denominados e tematizados como‘‘jogos préesportivos” (15).

Objetivos: aprendizagem dos esportes e desenvolvimento da apti-dão física (para a saúde).

É claro que a Educação Física lançou mão, para buscar legitimidadena escola, de um amplo leque de objetivos, como: desenvolvimento do sen-timento de grupo, de cooperação, da sociabilidade, da autoconfiança, doconhecimento de si, etc. etc. (ou bla, bla, bla?), objetivos que, no entanto,exercem função ideológica porque a ação pedagógica não está centrada nasua consecução, relegandoos, de fato, a “efeitos paralelos desejáveis” (16).A Educação Física fez seu o discurso pedagogicista da Educação Integral.A este respeito convêm citar o prof. MELO DE CARVALHO (1987, p. III):

“a fundamentação do educador tem de recusar o discurso pedagogicista maisou menos mistificador para assentarse na análise honesta e lúcida das basesobjetivas que sustentam a escola. Qualquer esforço fora deste quadro paraafirmar a disciplina é pura ilusão, quando não é puro e simples oportunismode caráter político e ideológico”.

Pareceme que o início da década de 80 marca o momento em que avisão hegemônica descrita anteriormente começa a sofrer os primeiros aba

15 A respeito ver a importante análise de PARLEBAS, P. (1980).

16 A dicotomia entre este discurso e a prática pedagógica ficou exemplarmente evi-dente na investigação de FERREIRA (1984).

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26 Educação Física e Aprendizagem Social

los talvez possamos falar em início de uma crise, no sentido atribuído por MEDINA (1983). Talvez seja proveitoso caracterizar, ligeiramente, essasnovas interpretações (propostas), que, viaderegra, fazem a crítica da Edu-cação Física estabelecida. Vale ressaltar que, devido à sua fragmentação einterpenetrações, estas novas interpretações resistem ainda a uma tipologiamais precisa (ver CAVALCANTI 1985 e TAFFAREL 1985).

Uma destas novas interpretações está baseada na crítica ao behaviorismo, à pedagogia tecnicista, e pode ser caracterizada como o da Edu

cação Física Humanista. Esta proposta desloca a prioridade dada ao pro-duto para o processo de ensino, introduzindo o princípio do processo deensino nãodiretivo. Os objetivos da Educação Física situamse mais no plano geral da Educação Integral. O conteúdo é muito mais instrumento para promover as relações interpessoais e facilitar o desenvolvimento danatureza, em si boa, da criança (17). Esta interpretação ou proposta mantémíntima relação com uma outra que surge a partir do chamado Esporte paraTodos. Embora surgido menos como crítica à Educação Física e mais comomovimento alternativo ao esporte de rendimento, o EPT acaba influencian-doa. Sua concepção é baseada numa crítica humanista, de cunho existenci-alista, ao esporte de rendimento (18). O objetivo central da Educação Físicatornase, nesta concepção, a instrumentalização do aluno para ocupar suashoras de lazer com atividades. E, de maneira que tal ocupação possa ocorrer de forma autônoma, crítica e criativa, existe a necessidade de utilizar for-mas variadas de movimentos corporais, diferenciandoas das atividades es-tereotipadas do esporte de alto nível. Adaptar, modificar, criar novas formasde movimento são as palavras de ordem. No entanto, “o social é entendido

como uma extensão do individual, ou seja, tratase de desenvolver atitudesde cooperação e solidariedade a fim de inserirse de maneira positiva nomeio social já dado, jamais questionado” (LIBANEO, 1985, p. 65).

17 Para esta concepção ver OLIVEIRA (1984).

18 Claramente identificável, por exemplo, no trabalho de DIECKERT (1987, p. 134):“O Esporte para Todos, desenvolvido neste meio tempo no Brasil, representamuito desta nova antropologia, que coloca a autonomia do ser humano no centro.

 Não é o esporte que faz o homem, mas o homem que faz o esporte! Ele determinao que, como, onde, quando, por quanto tempo, com quem, sob que regras, comque objetivo e sob que condições o pratica”.

Educação Física: a busca da autonomia pedagógica 27

A Psicomotricidade. Baseada na interdependência do desenvol-vimento cognitivo e motor, critica o dualismo predominante na EducaçãoFísica, e propõese, a partir de jogos de movimento e exercitações, con-tribuir para a Educação Integral. O autor de maior influência no Brasil é,sem dúvida, o francês J. LE BOULCH, para quem “a Educação Psicomoto-ra assenta no desenvolvimento de algumas aptidões de natureza perceptivae de natureza motora, em relação com as funções mentais” (apud SOBRAL,1976, p. 93). Sua proposta está expressa no título de um de seus livros: aEducação pelo movimento. Isto é, e a tentativa de instrumentalizar o movi-mento com vistas às tarefas “fundamentais” da Escola. Embora considere a

crítica ao dualismo um grande avanço, pareceme que sua base teórica aindanão apresenta os fundamentos de uma teoria pedagógica da Educação Físi-ca (pareceme também que não é esta a intenção dos seus autores). A con-cepção de Educação Física presente nesta proposta “resulta de uma pers-

 pectiva desencarnada socialmente” (MELO DE CARVALHO, 1987, p. III).Com a Psicomotricidade, temos um deslocamento da polarização da Educa-ção do movimento para a Educação pelo movimento, ficando a primeiranitidamente em segundo plano: “a Educação Psicomotora considera as ati-vidades como algo secundário, devendo subordinarse ao desenvolvimentode algumas capacidades e relacionadas com as funções mentais” (SOBRAL,1976, p. 94). A motricidade ou movimento corporal (por ex. na forma cul-tural de esporte) não é um saber a ser transmitido, e sim meio, instrumento.Por outro lado, a sua base de argumentação, a íntima relação do desenvolvi-mento de estruturas cognitivas com o desenvolvimento motor, é generalizá-vel para depois dos 1011 anos de vida somente com restrições. Ou seja, a“qualidade” da relação entre cognição e motricidade assume conotação to-

talmente diferente. Se nos primeiros anos de vida a aprendizagem de no-ções como a lateralidade, a estruturação espaçotemporal, etc. desenvol-vemse em íntima relação com o próprio desenvolvimento da motricidade,de tal maneira ser quase impossível identificar os limites entre um e outro,

 pareceme difícil afirmar o mesmo do aprendizado, por ex., de operaçõesmatemáticas mais complexas. Bem observado, a relação entre cognição emotricidade (e afetividade) não desaparece, mas assume outra “qualidade”.

A assim chamada Educação Física Revolucionária. Como bemlembra CAVALCANTI (1985), a concepção crítica ou revolucionária daEducação Física vem ensaiando os primeiros passos, porém ainda de forma

 bastante difusa, apresentandose ainda muito fragmentada. O que diferen-cia esta tendência de todas as outras descritas anteriormente é o fato dela

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28 Educação Física e Aprendizagem Social

realizar a crítica da Educação Física a partir de sua contextualização nasociedade capitalista, operando tal crítica a partir da tradição teórica domarxismo e, assim, ressaltando a dimensão política da Educação e da Edu-cação Física. Seus adeptos colocam como elemento norteador de uma “nova”Educação Física, um compromisso político com as classes oprimidas, comvistas a transformações estruturais na sociedade, condição indispensável para um com-viver Humano. Dois pontos têm sido objeto de análise crítica:a) a ideologia burguesa veiculada pela Educação Física (19); e b) a “domes-ticação do corpo” na Educação Física (crítica realizada a partir das teoriasde M. Foucault e também W. Reich (20). Como bem lembra KUNZ (1991),

estas novas concepções estão ainda numa fase críticoteórica que precisaser superada em favor de alternativas pedagógicas, para que o próprio dis-curso não perca sua ressonância crítica. Se, na análise e avaliação da funçãoque a Educação Física tem cumprido em nossa sociedade, não ocorre disso-nância maior entre estas duas correntes, o mesmo não pode ser dito das

 poucas propostas alternativas de ação pedagógica que delas tem emanado.Enquanto a primeira centra sua proposta mais na transmissão crítica do sa-

 ber, mesmo do esporte, e na luta contraideológica, a segunda centrasena experiência ou vivência corporal, nas práticas de conscientizaçãocorporal.

 Nenhuma destas novas tendências parece, no entanto, ameaçar seria-mente a hegemonia da “tendência esportiva”. Não fornecem também, até omomento, à ação pedagógica em Educação Física um quadro referencialteórico consistente.

Identificandome com a concepção revolucionária de Educação Físi-ca preferiria denominála de tendência progressista gostaria de, finali-zando e obedecendo ao caráter exploratório deste escrito, tentar uma peque-na contribuição à tarefa enunciada acima, abordando o complexo: Educa-ção do movimento Educação pelo movimento? Antes de mais nada, éimportante evitarmos aqui o “pedagogismo”. SOARES (1987) aponta o ca-minho: “cabe às disciplinas que constituem o currículo (conjunto de ativi

19 Entre outros: CASTELLANI FILHO (1983); BRACHT (1986); CARMO (1987).

20 Entre outros: MEDINA (1987) e FREIRE DA SILVA (1987).

Educação Física: a busca da autonomia pedagógica 29

dades nucleares da Escola), transmitir, enquanto partes constitutivas de umatotalidade de conhecimentos, o seu particular, sem entretanto estabelecer uma posição com o geral. Entretanto, para que possamos realizar esta tare-fa, é preciso examinar atentamente o que fundamenta cada disciplina curri-cular e o porque de sua existência. É preciso captar o que a definiu como tal,a que necessidade pedagógica veio atender”. Nesta perspectiva, parecemenecessário negarmos a oposição entre Educação pelo Movimento e Educa-ção do Movimento em favor de uma unidade dialética: Educação pelo, do e para o Movimento. A Educação Física possui um conteúdo, um saber, cujatransmissão deve ser assumida como tarefa pela Escola.

A Educação Física, na transmissão deste saber e em função dascaracterísticas, deste elemento da cultura, pode contribuir para com osobjetivos da Escola (que transcendem a especificidade de uma dada dis-ciplina).

A desconsideração da Educação do e para o movimento, em favor daEducação pelo movimento correria o perigo de negligenciar o fator históricocultural do movimento (e com ele as contradições sociais). Por isso, con-sidero que as formas culturais de movimento que se apresentam no mundovivido de nossa população alvo, precisam ser tema e problematizadas naEducação Física. Isto implica, por exemplo, a tematização da vida de movi-mento das camadas populares (ver KUNZ, 1991).

Mas como podemos legitimar a Educação Física na Escola? Em queconsiste a importância da Educação Física? Para que Educação Física? Pa

receme que a tendência progressista da Educação Física tem negligenciadoesta questão em favor da questão: para quem serve a Educação Física? Navisão da Educação Física como atividade, com o objetivo do desenvolvi-mento da aptidão física com vistas à saúde, a legitimação ocorria pela suavinculação ao mundo do trabalho, pela sua importância para a produção(força de trabalho). Como vimos, com a afirmação do esporte também comoconteúdo hegemônico na Educação Física e as modificações estruturais anível da sociedade que codeterminaram esta mudança ocorre um certodeslocamento em direção ao lazer. A Educação Física passa a ser relacionada, agora, menos diretamente com o mundo da produção, mas de formaimediata através da mediação do lazer, o que, em função do maior statussocial do trabalho (atividade “nobre”) em relação ao lazer (atividade "su

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 pérflua”), não deixa de constituirse numa dificuldade para tal legitimação(21). No entanto, o lazer e a educação para o lazer parecem, cada vez mais,serem considerados um tema e uma tarefa também da Escola (22).

Para alguns autores (KURZ [1985] e BENTO [1987]), a importânciaquantitativa que o esporte assumiu em nossa sociedade é considerada jácomo argumento justificador para a sua consideração por uma escola quenão é “cega” frente à realidade social. No entanto, para a legitimação daEducação Física, a alusão à dimensão quantitativa do esporte não me parececondição suficiente pois, antecedendo ou complementando a avaliação da

importância quantitativa do esporte, seria necessária uma avaliação do sen-tido e funções do esporte (por ex. como elemento do lazer) para o Homem enossa sociedade; portanto, uma avaliação qualitativa (normativa) do espor-te. E, neste sentido, uma teoria pedagógica da Educação Física, para alémda consideração do aspecto históricocultural concreto ou de como o movi-mento se apresenta culturalmente, não pode renunciar a uma análise antro-

 pológica do fenômeno da ludomotricidade humana, pois, para além das ca-racterísticas e códigos que os movimentos corporais e os jogos assumem a

 partir da sua contextualização históricocultural, pareceme impossível ne-gar seu caráter universal e constituinte da natureza humana. Permanecer nesta análise antropológica, fazendo dela a base única de uma teoria (dalegitimação) da Educação Física é condenála a um abstratismo ideológicoe ao ahistoricismo. No entanto, se não é condição suficiente, é, pelo menos,condição necessária.

Finalizando, gostaria de dizer que o desenvolvimento de um corpo

teórico da Educação Física que intermedie a sua relação com o “meioam biente” é tarefa nossa, ou seja, dos sujeitos que constituem a Educação Físi-ca. A autonomia pedagógica, da qual se falou aqui, necessita da investiga-ção pedagógica, que não e uma tarefa meramente técnica, que não excluimas não pode também ser confundida com a pesquisa em aprendizagem

21 O preconceito burguês em relação ao ócio acentuase quando este diz respeito asatividades corporais, o que vale combater. Ver a respeito LAFARGUE (1983).

22 Importantes a respeito são os trabalhos de MARCELLINO (1983, 1987).

motora, em crescimento e desenvolvimento, em socialização, etc., pois, seesta pode fornecer elementos para a realização dos objetivos da EducaçãoFísica, não descobrirei, com o seu auxílio, o compromisso político para comos oprimidos de nossa sociedade (23).

Educação Física: a busca da autonomia pedagógica 31

23 A falta de respostas neste escrito às muitas das questões levantadas, devese nãosó, em parte às minhas próprias limitações, ao caráter deste texto, mas também ao

 próprio estágio de desenvolvimento da Teoria da Educação Física.

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Educação Física: a busca da legitimação pedagógica

CAPÍTULO II

Educação Física: a busca da legitimação pedagógica 

2.1 Introdução

Este ensaio pretende ser um prolongamento de outro publicado ante-

riormente e que leva o título “Educação Física: a busca da autonomia peda-gógica” (BRACHT, 1989). Ambos circunscrevemse no âmbito do esforçoque faz o autor para desenvolver elementos para uma teoria (crítica) da Edu-cação Física.

 Naquele texto procurei demonstrar que aquela prática pedagógicachamada de Educação Física, e que tem como característica diferenciadoraa tematização do movimento corporal, manteve e mantém uma relação his-tórica com instituições como a militar e a esportiva, que pode ser caracteri-zada como de subordinação e que, portanto, não logrou desenvolver suaautonomia, vale dizer, regerse por princípios e códigos próprios.

Embora considere que várias questões (1) importantes para o de-senvolvimento de um corpo teórico que fundamente a prática pedagógicaem Educação Física estejam sendo discutidas em diferentes fóruns, comosimpósios e congressos, entendo que uma tem estado, estranhamente, au

1 Por exemplo: O que é Educação Física? É comum ouvirse, (nós nem sabemos oque é Educação Física)!, o que é interpretado como sinal de uma “crise de identi-dade”. A Educação Física seria uma (nova) ciência? ou, formulado de outra for-ma: a Educação Física deveria assumir o estatuto de ciência? Tem sido denuncia-do (se é que isto ainda pode ser considerado uma denúncia?!), que a função social da Educação Física, assim como da Educação como um todo, e a de reprodu-zir o nosso sistema societal, portanto, de reproduzir também, entre outras coisas,a injustiça social, etc.

3 3

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sente (para não dizer que tem sido evitada). Refirome à questão da legiti-midade da Educação Física na Escola, ou seja, a razão de ser da EducaçãoFísica no currículo escolar (2).

Pretendo, portanto, me ater mais especificamente a esta problemáti-ca, sem contudo me furtar de abordar questões que a tangenciam ou quecom ela estão intimamente relacionadas. Um exemplo, é a citada pergunta:mas afinal, o que é Educação Física?

2.2 Excurso: acerca da pergunta, o que é Educação Física?

Uma resposta a esta questão só é possível se tivermos claro o que naverdade estamos perguntando. Entendo que parte das dificuldades no en-frentamento desta pergunta, decorre da falta de clareza quanto ao “o queestamos perguntando com esta pergunta”, portanto, residem na raiz da pró-

 pria pergunta. Senão, vejamos: é comum buscarse elucidar a essência (3)da Educação Física, como se esta existisse independentemente da EducaçãoFísica concreta e situada historicamente, que conhecemos. É desta buscaque derivam expressões do tipo: “mas esta não é a verdadeira EducaçãoFísica”. Ora, a “verdadeira Educação Física” é aquela que acontece concretamente, e não uma entidade metafísica que estaria hibernando em algumrecanto à espera de sua descoberta. Se é isto que estamos perguntando (pelaessência no sentido metafísico), estamos perguntando errado, pois a “ver-dadeira” Educação Física é aquela que nós construímos no nosso fazer diá-rio. Entendo que, para apreender a Educação Física enquanto fenômeno, é

 preciso, num primeiro momento, desvencilharse daquilo que desejamos

2 Esta foi a questão que levantei no ensaio anteriormente citado, no momento quefazia a (auto)crítica às “tendências progressistas” da Educação Física, que atéentão haviam se omitido em relação a este problema.

3 Leiase, “essência metafísica”.

Educação Física: a busca da legitimação pedagógica 35

que ela seja (4). Além disso, é importante atentar para o que nos diz VI E I -RA PINTO (1979, p. 901): “o conteúdo de todo conceito é a sua história”.Acreditando estar respaldado pela história, entendo que a Educação Física é  a prática pedagógica que tem tematizado elementos da esfera da cultura corporal/movimento. Este conceito, reconheço, é ainda meramentedescritivo; além disso, seria necessário complementálo com a elucidaçãodo entendimento da expressão “prática pedagógica” (5). A resposta queofereci aqui, e que tomo como base para minhas reflexões, tem um ca-ráter descritivo, uma vez que entendo que um conceito de EducaçãoFísica é uma teoria da Educação Física, e isto estamos tentando desen-volver.

Relembrando, no Brasil os elementos da cultura corporal/movimen-to predominantes na Educação Física foram, num primeiro momento, a gi-nástica e, num segundo e esta é a situação atual o esporte (6). É impor

4 Não estou ignorando a necessária dialetização entre o velho e novo, no sentidode que existem diferentes “projetos” para a Educação Física (que refletem dife-rentes projetos de sociedade e visões de mundo). Mas enquanto projetos, elesainda não são a Educação Física.

5 Eu acentúo, a Educação Física é antes de tudo uma prática pedagógica, que comotoda prática social não é obviamente destituída de pensamento eu quero comisso me contrapor àquelas posições que a denominam preferencialmente comouma área do conhecimento. Ela elabora um corpo de conhecimentos que tendema fundamentála, pois toda prática exige uma teoria que a constitua e dirija. Masa Educação Física é uma prática social de intervenção imediata, e não uma práti-ca social cuja característica primeira seja explicar ou compreender um determi-nado fenômeno social ou uma determinada parte do real.

6 Aqui fazse necessária uma rápida observação: não posso derivar daí que o Es- porte é Educação Física. Não, o esporte é um fenômeno social que tem um desen-volvimento, embora relacionado, relativamente autônomo em relação à Educa-ção Física, assim como a dança já compunha a nossa cultura corporal/movimen-to, muito antes que o próprio termo Educação Física tivesse sido usado pela pri-meira vez.

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tante ressaltar que a eleição ou a tematização na Educação Física de deter-minado elemento ou manifestação da cultura corporal/movimento, está re-lacionada, direta ou indiretamente, com as necessidades do projeto educa-cional hegemônico em determinada época, e com a importância daquelamanifestação no plano da cultura e política em geral. A tematização privi-legiada da ginástica por exemplo, tem a ver com o papel higienista atri-

 buído à Educação Física no projeto educacional do início deste séculono Brasil (ver a respeito os estudos de (CASTELLANI 1989; SOARES,1990).

2.3 Crise e legitimação

É cada vez mais comum ouvirse nos meios da Educação Física queela se encontra em crise. É de M. SÉRGIO (1988, p. 12) a afirmação de que“o discurso da Educação Física é, desde a década de 60, declaradamente decrise”. São aludidas diferentes causas para explicar a referida crise, além dediferentes interpretações do seu caráter. Uma delas, por exemplo, parte doargumento de que não existe uma profissão regulamentada de Professor deEducação Física, o que causaria uma falta de respeito profissionais bemcomo uma indefinição do mercado de trabalho. Outros entendem que a criseé de cunho epistemológico. Considero que, neste contexto de crise, a legiti-mação da Educação Física no sistema de ensino, assume um caráter funda-mental (a questão epistemológica não está aí excluída).

Contra uma possível falta de legitimação, o professor de Educação

Física não soube, até o momento, articular nada muito além de "altos bradosde indignação” e um discurso, na maioria das vezes, teoricamente inconsis-tente, isto quando não se apega ou faz um discurso “legalista", confundindolegalidade com legitimidade.

2.4 Os modelos de legitimação da Educação Física

Como lembra HABERMAS (1983, p.220), “somente ordenamentos políticos podem ter legitimidade e perdêla; somente eles têm necessidadede legitimação”. “Legitimidade significa que há bons argumentos para queum ordenamento político seja reconhecido como justo e equânime; um or-

Educação Física: a busca da legitimação pedagógica 37

denamento legítimo merece reconhecimento. Legitimidade significa que umordenamento político é digno de ser reconhecido” (Idem, p. 219220). Eneste sentido, como lembra WEFFORT (1988), “um regime de legitimida-de política só pode ser a democracia. ... E isso porque a democracia é oúnico regime que organiza, isto é, institucionaliza, o consentimento popu-lar. sem o qual a legitimidade perece” (p. 24). Eu diria, trazendo a discussão

 para o nosso tema, que é só na democracia (ou seja, na luta democráticaentre grupos/partidos para a realização de sua proposta de democracia),que a questão da legitimidade pode vir à tona e ser efetivamente coloca-da (7).

Legitimar a Educação Física significa, então, apresentar argumentos plausíveis para a sua permanência ou inclusão no currículo escolar, apelan-do exclusivamente para a força dos argumentos, declinando do argumentoda força (que é o que acontece quando um regime autoritário “legaliza”alguma prática social). Esta legitimação precisa integrarse e apoiarse discursivamente numa teoria da Educação.

 Na verdade, a legitimação de uma matéria se dá em função do papelque uma determinada época lhe atribui. Que funções, que papéis foram atri-

 buídos à Educação Física nos diferentes momentos, e que função social/humana a (pouca) teoria da Educação Física tem advogado para esta prática pedagógica?

Antes de apresentar especificamente as tentativas de legitimação daEducação Física na Escola, gostaria de discutir brevemente a questão da

 produção do conhecimento na e para a Educação Física.

2.5 A produção do conhecimento na e para a Educação Física

A produção do conhecimento nesta área esteve pautada por proble-máticas que se derivaram dos entendimentos das funções atribuídas histori-

7 Por isso não estranha que a questão da legitimidade da Educação Física enquantocomponente curricular, comece a ser discutida após a ditadura militar 

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38 Educação Física e Aprendizagem Social

camente à Educação Física. Quais sejam: quais as contribuições do exercí-cio físico sistemático e racionalizado para a saúde, entendida enquanto saú-de biológica (higiene, funções orgânicas, etc.). Tratavase de evidenciar tam-

 bém, os efeitos sobre o desenvolvimento do “caráter”, numa visão funcionalista da sociedade. Já sob o paradigma esportivo, a problemática passa aincluir, além da possível influência de determinado esporte sobre vari-áveis relacionadas com a saúde (e com o desenvolvimento motor e or-gânico), a investigação da variável melhoria do desempenho atléticoesportivo.

Vale registrar que a teoria do conhecimento ou a concepção deciência que predominou no âmbito da produção do conhecimento naárea, foi o das ciências naturais de matriz positivista. Uma das princi-

 pais características desta concepção de ciência, e que vai nos interessar mais de perto, é que ela radicaliza a separação entre teoria e prática:“ela apresenta como medida absoluta da cientificidade, os critérios dacomprobabilidade intersubjetiva e da consistência lógica. A prática hu-mana dirigida por decisões é denunciada como acientífica por escapar ao alcance experimental e à fixação empírica como validade universal,como tudo que não pode ser subsumido a este esquema” (SCHMIEDKOWARZIK 1983, p. 21).

Isto nos remete ao problema da relação entre o conhecimento (cien-tífico) produzido na “área” e a prática pedagógica em Educação Física.

São várias as conseqüências da adoção da concepção de ciência pró- pria do positivismo pela comunidade acadêmica que se propunha a produzir conhecimento “científico” na área da Cultura Corporal/movimento. Umadelas é a de que o conhecimento produzido é, viaderegra, inútil para a

 prática pedagógica em questão. Outra é de que o conhecimento produzidonão enfrenta a questão do sentido da prática.

Para APEL (1988, p. 24), é justamente o conceito de racionalidadeque domina no interior da ciência analítica, no seu sentido de objetividadesem julgamento de valor, que coloca a impossibilidade de fundamentar ra-

Educação Física: a busca da legitimação pedagógica

cionalmente decisões normativas intersubjetivamente válidas, pois esta te-ria que submeterse às seguintes premissas:

a) Fundamento racional significa dedução lógico formal de senten-ças a partir de sentenças mais básicas.

b) Validade intersubjetiva de sentenças (afirmações) é igual a valida-de objetiva, no sentido da constatação não valorativa ou da dedução lógicoformal.

c) A partir de tal verificação ou constatação (de fatos) não é possível,com o auxílio da dedução lógica, derivar nenhum julgamento de valor ouafirmação normativa.

Mas a teoria pedagógica, bem lembra SCHMIEDKOWARZIK (1983, p. 130), tem uma dupla tarefa: “pois na medida em que a Educação éa produção do homem em homem através do homem (educador), o educa-dor necessita tanto da diretriz do “como” de sua ação educativa, como dadeterminação de sentido desta ação dirigida ao homem em seu quê. Numadas tarefas da pedagogia sobressai uma motivação prática, já que a teoria secoloca inteiramente a serviço da destinação prática do educador em sua práxis futura; na segunda tarefa sobressai uma motivação teórica, pois a teoriase esforça em desvelar ao educador o horizonte de tarefas da prática educa-cional a partir da totalidade da humanização do homem. Entretanto, a teoria

nem é ensinamento artesanal puramente prático na sua primeira forma, nemna segunda, simples sabedoria teórica; pois em ambos os casos a motivação

 prática e a teórica são mediatizadas em direção à unidade de teoria e práticano processo educacional”.

Acontece que, nas ciências analíticas de orientação positivista, nãose colocam as questões práticas onde decisões sobre o sentido da práticahumana são solicitadas. Estas são recusadas em nome da neutralidade eobjetividade científicas. Mas, como sabemos, a prática pedagógica exigetais decisões. Se a “ciência” não se responsabiliza por tais decisões, se ela

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somente se preocupa com o que é objetivamente, ou com o como (questõestécnicas), quem, e a partir de que bases vão ser tomadas estas decisões decunho normativo?

HABERMAS (1988, p.11) lembra que “questões técnicas colocamse no sentido da organização de meios racionais com vistas a objetivos, e daescolha racional entre meios alternativos tendo em vista objetivos dados(valores e máximas). Questões práticas no entanto, colocamse no sentidoda aceitação ou rejeição de normas, especialmente de normas de ação, cuja

aspiração de validade nós podemos fundamentar ou rejeitar racionalmente.Teorias que pela sua estrutura servem para esclarecer questões práticas, sãoestruturadas para entrar no âmbito da ação comunicativa”. O que é impor-tante ressaltar, é que “os interesses orientadores do conhecimento técnico e prático não são condutores da cognição, que em função da aspiração deobjetividade do conhecimento, precisariam ser colocados fora de ação. Elesmuito mais determinam o aspecto.sob o qual a realidade pode ser objetivadae assim tornada acessível à experiência" (Idem. p. 16).

Como a primeira pergunta com a qual uma teoria pedagógica (comouma teoria da Educação Física) é a do seu sentido, e a concepção de ciência

 predominante no âmbito da Educação Física exclui esta questão do rol desuas competências, a (pouca) teoria da Educação Física desenvolvida atéentão preocupouse fundamentalmente com as questões técnicas, instrumen-tais, não enfrentando a questão dos valores. Na abordagem chamada de desenvolvimentista (ver TANI et al. 1988) há inclusive, uma tentativa de fun-

damentar “cientificamente” a Educação Física a partir das necessidadesobviamente “naturais” das crianças, e porque leis naturais, passíveis de se-rem determinadas objetivamente, pois independem dos seres humanos con-cretos, na esperança de contornar a questão dos valores.

Estamos aí frente a uma das características de uma teoria da Educa-ção Física. Enquanto teoria de uma prática pedagógica, ela precisa enfren-tar a questão dos valores (penetrar no âmbito da ética). Ou seja, ela vairefletir (e fazer opções conscientes) em torno de uma visão (projeto) demundo, de Homem e de sociedade.

Educação Física: a busca da legitimação pedagógica 41

Retomando a "abordagem desenvolvimentista” de TANI et al.(1988), gostaríamos de exemplificar as limitações das abordagens em

 píricoanalíticas no que diz respeito à formulação de uma teoria peda-gógica para a Educação Física. Para os autores acima citados, “a Edu-cação Física Escolar pode ser estruturada através de abordagens ma-croscópicas, de características filosóficas e administrativas, e tambémde abordagens mais microscópicas, que parte do estudo das caracterís-ticas dos alunos em diferentes níveis de análise” (TANI et al., 1988. p.135). Os autores optaram pela abordagem microscópica, consideradauma entre várias outras possíveis. Ora, o equívoco é patente, na medidaem que as abordagens macroscópica (filosófica) e microscópica (des-crição dos processos de desenvolvimento da criança) não são indepen-dentes entre si, de tal maneira que pudéssemos a posteriori apenas so-mar uma à outra. Elas muito mais se interpenetram, pois as decisõeschamadas de filosóficas vão valerse das informações sobre o desen-volvimento da criança, assim como aquelas decisões vão determinar,como diz HABERMAS (1988), o aspecto sob o qual aquele desenvolvi-mento será objetivado e tornado acessível à experiência. Os objetivosda Educação Física na Escola não podem ser simplesmente deduzidoslogicamente dos conhecimentos sobre o desenvolvimento da criança. É

 preciso para tanto, elucidar qual o papel desejável para a Escola emnossa sociedade. Isto por sua vez implica, tanto em fazer uma leitura da sociedade em que vivemos, como implica em projetar a sociedade que almejamos. Portanto, para uma teoria para a prática pedagógica em Educação Física, o “porquê” (decisões normativas) não pode ser discutido isoladamente do “como” (questões técnico-me- 

todológicas).

Assim, as diferentes disciplinas científicas que se ocupam do movi-mento humano, enquanto não envolvidas com a prática pedagógica em Edu-cação Física, e ocupandose com dimensões parcelares desta prática, sãoapenas fornecedoras de informações em estado bruto, que precisarão passar 

 por um processo de teorização da pedagogia da Educação Física, e não po-derão jamais substituíla. A pedagogia da Educação Física enquanto ciência prática, tem seu sentido não na “compreensão, mas no aperfeiçoamento da práxis”. Assim, seria necessário que a produção do conheci

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mento para sustentar/orientar a prática pedagógica em Educação Física, se pautasse no específico do “educativo”, isto é, a problemática a ser objeto deinvestigação, seria determinada pelas questões que a prática educativa emEducação Física coloca.

Quais são então as expectativas em relação a uma teoria da Edu-cação Física? A quais perguntas deveria uma teoria da Educacão Físicaresponder? Basicamente a duas: o porque (sentido) e o como (instru-mental).

Estas duas questões de cunho geral devem ser precisadas. Uma teo-ria da prática pedagógica Educação Física, precisa: a)  poder fundamentar esta prática no currículo escolar, isto é, precisa dizer a quais necessidadesvem atender e da indispensabilidade de sua função, caracterizando assim oseu objeto ou seja, precisa se defrontar com a pergunta do porque Educa-ção Física na Escola, legitimála (implica discutir os fundamentos filosóficoantropológicos, o significado humano e social da ludomotricidade hu-mana); b) desenvolver e apoiarse numa concepção de currículo, defi-nindo, entre outras coisas, a função da Escola no contexto societal, osaber ou o conteúdo de que vai tratar, bem como dos critérios para aseleção e sistematização destes conteúdos; c) em consonância com osobjetivos e as características dos conteúdos, propor e fundamentar umametodologia do ensino; d) explicitar uma proposta para o problema daavaliação do ensino.

2.6 A crítica e a superação dos modelos de legitimação vigentes

Mas retornemos à questão da legitimação da Educação Física na Es-cola. Busquei condensar num esquema, os modelos legitimadores ou que buscam fundamentar a Educação Física na Escola, e que estão presentesexcluindose, complementandose, em diferentes momentos. Em abstrain-do desta forma (construindo tipos ideais), estou correndo o risco de genera-lizar excessivamente, como por exemplo, não levar em consideração as es

 pecificidades dos diferentes graus de ensino.

Educação Física: a busca da legitimação pedagógica 43

Eu classifiquei estas tentativas em modelos heterônomos e autôno-mos(8). As tentativas de fundamentação autônomas são aquelas que situama razão ou importância pedagógica das atividades corporais de movimentonelas mesmas. Nesta perspectiva, estas atividades encerrariam elementoshumanos fundamentais. As tentativas heterônomas, ao contrário, buscamtal razão muito mais fora das atividades, em suas repercussões sociais. Éimportante observar, mais uma vez, que são tipos ideais que criei, e que nãoaparecem de forma pura e, sim, na maioria das vezes, combinados e interelacionados.

A base teórica das legitimações autônomas tem sido basicamente aantropologia filosófica e a fenomenologia (as diferentes teorias fenomenológicas do jogo como as de HUIZINGA, BUYTENDJIK, MERLEU PONTY e também SANTIN), ao passo que as legitimações heterônomas têm nasdisciplinas científicas de cunho biológico e nas teorias sociológicas funcionalistas ou na sociologia funcionalista, sua base. É importante observar quesão os pedagogos que se valem destas teorias para fundamentar a EducaçãoFísica na Escola, e não como muitos gostariam de insinuar, de que aquelesautores estariam propondo a Educação Física na Escola.

8 Transformar o saber elaborado em saber escolar. “Essa transformação é o pocesso através do qual selecionase, do conjunto do saber sistematizado, os elementosrelevantes para o crescimento intelectual dos alunos e organizase esses elemen-tos numa forma, numa seqüência tal que possibilite a sua assimilação” (SAVIA-

 NI, 1991, p. 79).* O autor holandês Bart CRUM (1988) resumiu as tentativas de legitimação (InEducação Física enquanto atividade curricular, também em duas vertentes há:.icas: a) A concepção biologista (biologistische Fachkonzept), c b) n contvpçmiformativa (bildungstheoretische Fachkonzept).

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44 Educação Física e Aprendizagem Social

Enquanto, na perspectiva heterônoma, acentuase a funcão social,ligada principalmente ou tendo como referência básica o mundo do trabal-ho, isto é, uma função em última instância, “séria” ou “produtiva”, na pers-

 pectiva autônoma, acentuase a dimensão lúdica do humano.

GRUPE (1976. p. 35), um pedagogo que busca fundamentar a Edu-cação Física via Antropologia Filosófica, entende que a primeira questãocom a qual uma teoria da Educação Física precisaria se confrontar é exata-mente de cunho antropológico. Neste sentido, entende que a legitimação da

Educação Física é resultado de dois princípios independentes: em primeirolugar, do fato de que a existência humana é radicalmente “um ser corporalno mundo” (não existe consciência sem corpo); e, em segundo, de que o

 jogo (junto com o trabalho) pertence às formas originais (até agora não ple-namente conhecidas) da existência humana. Ora, uma educacão que estávoltada para o humano, que se volta para as dimensões essenciais do Ho-mem, não pode negligenciar a corporeidade e a ludicidade, pois estas sãoformas humanas básicas de comunicacão com o mundo (o discurso pedagogicista da Educação Integral também vai nutrirse nesta trilha de argumen-tação).

Mas, na verdade, o que tem predominado entre nós é a fundamenta-ção heterônoma. Aqui predomina uma visão instrumentalista da EducaçãoFísica. A Educação Física é fomentadora da saúde (via aptidão física), criae desenvolve hábitos higiênicos, desenvolve o sentimento cívico, etc.

Usando uma classificação desenvolvida por MARCELLINO (1987) para o Lazer, poderíamos dizer que as funções atribuídas à Educação Físicaneste plano são de ordem:

a) compensatória;

 b) utilitarista e

c) moralista.

Educação Física: a busca da legitimação pedagógica 45

Compensatória, na medida em que a Educação Física colabora paracompensar a insatisfação e alienação do trabalho intelectual em sala de aula.Uma atividade que compensa o desgaste na atividade séria e a implacávelmaterialização do mundo contemporâneo (coisificação das relações huma-nas).

Utilitarista  porque prepara para o trabalho (aptidão física e habili-dades motoras), ao mesmo tempo que prepara o indivíduo para uma ativida-de que tem a função de recuperar a força de trabalho.

Moralista  porque é uma atividade que ajuda a suportar a disciplina eas imposições obrigatórias da vida social, pela ocupação do tempo livre ematividades equilibradas, socialmente aceitas e moralmente corretas (enquantoa criança pratica esporte está ocupada com uma atividade socialmente acei-ta e não pensa em “bobagens”).

A abordagem funcionalista vê a Educação Física e a Educação comoelementos que garantem a funcionalidade do sistema como um todo, e aju-dam a prevenir disfuncionalidades ou conflitos. O fundamento científicodesta perspectiva advém das ciências biológicas e da saúde de orientação positivista. Daí advém também grande parte de suas limitações e seus reducionismos, que, em termos de concepção pedagógica, tem sido denominadae denunciada como "biologista". Na verdade, a concepção positivista daciência não pode fornecer o fundamento para a prática pedagógica, porqueela radicaliza a separação entre teoria e prática. “Ela apresenta, como medi-

da absoluta da cientificidade, os critérios dacomprobabilidade intersubjetiva e da consistência lógica. A prática humana dirigida por decisões (como éo caso da prática pedagógica V.B.) é denunciada como acientífica por esca-

 par ao alcance experimental e à fixação empírica como validade universal,como tudo que não pode ser subsumido a este esquema” (SCHMIEDKOWARZIK 1983, p. 21). A partir deste modelo teórico, questões com-

 plexas, como por exemplo a da saúde, sofrem uma redução de cunho biologista.

 Neste contexto, surge, mais recentemente, uma nova versão para le-gitimar a Educação Física na Escola. Esta tem a ver com a dimensão que

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46 Educação Física e Aprendizagem Social

assumiu o fenômeno esportivo em nossa sociedade. A dimensão quantitativado esporte parece ser razão suficiente para que a escola assuma a tarefa detransmitir este elemento da cultura. Definese, nesta perspectiva, a tarefa daEducação Física como a de desenvolver a capacidade de ação no desporto”(BENTO, 1987).

A legitimidade das práticas corporais, principalmente o esporte, nassociedades modernas, pode ser deduzida da praticamente unanimidade queo esporte hoje alcança. Ser esportivo, aparentar boa forma física, já quase

não é mais uma opção, mas sim uma imposição social. Ligada a este “boom”do corpo ou das práticas corporais, temos o “boom” da indústria do lazer edos materiais esportivos. Assim, embora os pedagogos resistam em utilizar esta nova dimensão do cotidiano de boa parte da população como elementode legitimação da Educação Física na Escola, é bem provável que a Escola, concretamente, já esteja, através das aulas de Educação Física, servindo a esta nova indústria, e a Educação Física esteja recebendo reconhecimento a partir do reconhecimento tácito (9) destas práticas corpo-rais na sociedade como um todo.

Poderíamos citar também a vertente da “psicomotricidade”, que ins-trumentaliza o movimento para as tarefas “fundamentais da escola”, e quetem sido utilizada pelos professores de Educação Física para fundamentar aEducação Física na préescola e nas quatro primeiras séries do primeirograu. Valem aqui, no entanto, as palavras de advertência de SOBRAL (1976)a respeito da Psicomotricidade: “Julgouse então conquistada a pedra filo-

sofal da educação pelo movimento, a superação do dualismo cartesiano,

9 Consumo.

Educação Física: a busca da legitimação pedagógica 47

admitiase, estava realizada na teoria e na prática! Mas é evidente, porém,que a Educação Física estava seriamente ameaçada, correndo o risco de

 perder a sua individualidade própria, e que esta educação pelo movimentoem breve diluirseia também nas disciplinas que, no movimento, haviamde ver, mais cedo ou mais tarde, um meio excelente de resolver problemasespecíficos, como a matemática, a aprendizagem da leitura e da escrita,etc.”.

E ainda importante citar que, no Brasil do pós64, temos nos textos

legais uma combinação da fundamentação da Educação Física na Escola:“Aptidão Física” (integrada na política de recursos humanos para o projetode desenvolvimento) e a Educação Física como base da pirâmide espor-tiva.

Em termos gerais, procurouse legitimar a Educação Física via: a) contribuição para o desenvolvimento da aptidão física para a saúde; b) con-tribuição para o desenvolvimento integral da criança e, neste sentido, a con-tribuição (específica) da Educação Física era principalmente sobre o “do-mínio psicomotor” ou “motor”; c) contribuição para a massificação esporti-va e detecção de talentos esportivos (a famosa base da pirâmide); d) a Edu-cação Física trata de dimensões do comportamento humano que são bási-cas: o movimento e o jogo.

Estes modelos de legitimação perduraram por muito tempo sem so-frer uma crítica mais radical e, portanto, puderam cumprir sua finalidade.

 No início da década de 80, este modelo começa a ser questionado maisradicalmente (não posso recuperar aqui as causas ou determinantes sociaisde tal movimento questionador). O filósofo Manuel Sérgio acredita que umadas mudanças mais significativas que derivaram desta crítica diz respeito aum novo paradigma no entendimento do movimento humano ou do corpo,ou ainda da motricidade humana. O movimento não é mais entendido comoo deslocamento de um “objeto” (sic!) no tempo e no espaço, mas sim comoum movimento do Homem em direção à transcendência.

Deste questionamento surge a corrente da Educação Física inicial-mente chamada de “revolucionária” ou “crítica” e hoje também denomina

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48 Educação Física e Aprendizagem Social

da de Educação Física Progressista. Esta corrente surge da crítica ao estabe-lecido. Critica a função da Educação Física a partir de um referencial teóri-co que inclui a crítica das relações sociais como um todo. Saúde? Mas quemganha com a saúde do trabalhador? Civismo? que tipo de cidadão, o subser-viente? o adaptado, aquele “ensopado” de ideologia burguesa? Aquele quenão questiona e serve ao poder? Estas criticas vão problematizar, ao menosindiretamente, as próprias bases de legitimação da Educação Física na Es-cola.

 No entanto, a Educação Física revolucionária ou progressista, no meuentendimento, não oferece ainda uma teoria positiva da Educação Física, pois, entre outras coisas, ela (que aos poucos vai se constituindo) preocu pouse muito pouco com a questão: porque Educação Física? qual a razãoou quais as razões de sua existência a partir de uma teoria crítica da Educa-ção (Física)? o termo crítica aqui não é tomado no sentido Popperiano, esim no sentido da negação da ordem social vigente, ou seja, não crítica emfunção de um procedimento presumivelmente “científico”, mas em funçãodo questionamento do conteúdo.

Pois a questão que se coloca é: se a fundamentação autônoma é, decerta forma, idealista e ahistórica e tende a cair no pedagogismo, e reco-nhecermos com SOARES (1987) que é “preciso examinar atentamente oque fundamenta cada disciplina curricular e o porquê de sua existência, e é

 preciso captar o que a definiu como tal, que necessidade pedagógica veioatender”, e se por outro lado, a fundamentação heterônoma de orientação

funcionalista encerra um momento político extremamente conservador (fa-vorecendo a vinculação da Educação Física com o setor produtivo), que perspectiva resta então à Educação Física neste quadro?

Gostaria de listar alguns pontos que poderiam apontar neste sen-tido.

Em primeiro lugar, considero que não podemos abdicar da funda-mentação autônoma. Não podemos definir/fundamentar a Educação Físicaapenas pela sua função social (não estou adotando aqui uma visão dicotô-mica entre o indivíduo e o social, mas sim, uma visão dualista interacionista,ou seja, o entendimento de que um não se deixa reduzir ao outro, e que

Educação Física: a busca da legitimação pedagógica 49

 possuem portanto especificidades que permitem falar de “duas coisas”...que se relacionam). É preciso no entanto, conferir à fundamentação autôno-ma historicidade, analisando e levando em consideração as formas históri-cas da corporeidade ou da ludomotricidade (M. Sérgio). Isto significa que

 pontos de referência para a fundamentação da Educação Física são o fenô-meno do movimento, ou seja, o fato antropológico de que os homens nassuas relações com o mundo, através do movimento deste se apropriam, mastambém, que as relações que os homens desenvolvem para com seus corpos(neste processo de apropriação do mundo) acontecem em condições históricosociais específicas e determinadas (educação através do movimento).

Precisamos considerar/postular que a cultura corporal/movimentoresume um acervo produzido pelo homem que precisa ou merece ser veicu-lado pela instituição educacional, acrescentandose, no entanto, que é preci-so fazer a crítica cultural e superála (é o nosso saber, é o saber que vamostransmitir educação do movimento).

Entendo que, no que diz respeito à fundamentação heterônoma, areferência básica ou imediata deveria deixar de ser o mundo do trabalho, e

 passar a ser o mundo do nãotrabalho, o lazer. A Educação Física educarianesta perspectiva, para os momentos do nãotrabalho (educação para o movimento). Sabemos que esta separação é empiricamente impossível, umavez que o indivíduo é um só. Portanto, as habilidades, competências, atitu-des, etc. adquiridas neste espaço pedagógico, assim como em outros, terãorepercussão sobre o contato do indivíduo com o mundo do trabalho. No

entanto, voltamos a repetir, a referência específica da Educação Física é omundo do nãotrabalho, uma vez que os seus conteúdos são os movimentosda atividade lúdica, e não da prática laborai.

Entendo que as mudanças em nível do processo produtivo e do pro-cesso de qualificação para o trabalho, diminuíram a importância direta daEducação Física neste processo (aptidão física e habilidades motoras de-crescem em importância para o processo produtivo, são cada vez menossolicitadas no trabalho). A repredução da força de trabalho, por sua vez, se dá muito mais através de uma cada vez mais necessária recuperação  psíquica. Por outro lado, cresce a importância do lazer também no processode controle social, pois o mundo do lazer está colonizado pelo mundo do

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50 Educação Física e Aprendizagem Social

trabalho. Como bem lembra HOPF (1984), um dos primeiros aspectos quelevam a modelar o comportamento dos indivíduos na esfera do consumo,nas sociedades capitalistas, é a sua rígida separação da esfera da produção.A ilusão da atividade livre ou da liberdade na esfera do consumo é, assim,condição para uma efetiva reprodução da força de trabalho.

Portanto, é preciso trabalhar com uma concepção de lazer que contrapõese ao lazer como instrumento de dominação. “Aquela que o entendecomo um fenômeno gerado historicamente e do qual emergem valores questionadores da sociedade como um todo, e sobre o qual são exercidas influ-ências da estrutura social vigente” (MARCELLINO 1987, p. 40). Nós pre-cisamos, através de uma Educação Física crítica, fazer frente aos efeitosmuitas vezes imbecilizantes da indústria cultural.

Obviamente, pode haver resistências quanto a considerar o lazer enão o trabalho como referência fundamental e primeira da Educação Física.Temos, contrapondose a isso, o valor ético do trabalho (“o trabalho digni-fica o homem”). Mas onde está a moralidade de um trabalho, cujo produto éapropriado pelo privado e que é explorado via extração e apropriação damaisvalia? Onde está a dignidade de um trabalho que não permite que um

 pai alimente, com o que recebe, sua família?

Ao postular que a dimensão heterônoma da legitimação da EducaçãoFísica tenha como referência a importância do lazer, não estamos ignorandoa relação entre trabalho e lazer e, mais genericamente, entre trabalho e cul-

tura. Aqui bem cabe a advertência de NEGT (1989, p. 38): “A dicotomiaentre cultura e trabalho é o erro do qual muitos tipos de legitimações dadominação são apenas uma conseqüência (...) Cultura não documenta a li-

 berdade enquanto resultado, pois ela somente adquire sua vida e vivacidadenos atos concretos de libertação e autolibertação. É correto que o conceitode cultura não pode ser separado da libertação e autolibertação do trabalho,mas é falsa a idéia de que a cultura somente iniciaria ali onde o trabalhotermina”.

Assim, o lazer não precisa necessariamente ser visto como uma fun-ção do setor produtivo. Ele poderia se justificar por ele mesmo. Eu gostariade, neste sentido, citar Marx:

Educação Física: a busca da legitimação pedagógica 51

“A riqueza efetiva da sociedade e a possibilidade de ampliar sempreo processo de reprodução depende, não da duração do trabalho excedente, esim da produtividade deste e do grau de eficiência das condições de produ-ção em que se efetua. De fato, o reino da liberdade começa onde o trabalhodeixa de ser determinado por necessidade e por utilidade exteriormente im-

 posta, por natureza, situase além da esfera da produção propriamente dita.O esforço para produzir com o menor dispêndio de energia e nas condiçõesmais condignas com a natureza humana situarseá sempre no reino da ne-cessidade. É além dele que começa o desenvolvimento das forças humanascomo um fim em si mesmo, o reino genuíno da liberdade, que só pode flo-rescer tendo por base o reino da necessidade. E a condição fundamentaldesse desenvolvimento humano é a redução da jornada de trabalho” (apudGALVÃO, 1984).

Portanto, “somente quando a história já tiver desenvolvido suficien-temente as forças produtivas é que o homem poderá começar a se libertar dotrabalho. Se, no modo capitalista de produção, trabalhase para criar maisriqueza para o capital, o socialismo deveria encaminhar o trabalho social

 para a criação de mais liberdade, de mais tempo livre e menos tempo detrabalho socialmente necessário. É por esta razão que Paul Lafargue diziaque o socialismo seria a realização do direito à preguiça” (GALVÃO, 1984,

 p. 48).

 Não é porque o trabalho é importante que a Educação Física é im- portante, mas porque o lazer é importante, a Educação Física é importante.

A “utilidade” da Educação Física advém do seu caráter “inútil”.

 Não é difícil perceber que, ao se tratar a questão do lazer, defrontamonos com a realidade altamente contraditória da sociedade brasileira.Como justificar uma prática pedagógica na Escola tendo como referência

 básica para sua fundamentação o lazer, numa sociedade que nem sequer concretizou o acesso ao trabalho, e que mantém marginalizada grande

 parte da população? De maneira que são estas as contradições que urgesuperar. E a Educação Física? Ela precisa buscar o sentido de sua transformação na necessidade da transformação da própria socie dade brasileira.

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52 Educação Física e Aprendizagem Social

A Educação Física, nesta perspectiva, educaria no sentido de instru-mentalizar o indivíduo para ocupar de forma autônoma seu tempo livre tam- bém com atividades corporais de movimento (com as conseqüências orgâ-nicas, motoras, psíquicas e de qualidade de vida postuladas para as ativida-des corporais de movimento), de instrumentalizar o indivíduo para entender e se posicionar criticamente frente à nossa cultura corporal/movimento, eeducaria no sentido de desenvolver uma sociabilidade composta de valoresque permitam um enfrentamento crítico com os valores dominantes.

Educação Física: a busca da legitimação pedagógica 53

Educação Física Escolar como Campo de Vivência Social

 Negligencia as

determinações sóciohistóricas

O Esporte não

exige mais exercício delegitimação. A Ed. Fí-sica esportivizada justificase pelo esporte eeste por si só na socie-dade. Por si só? O Es-

 porte mobiliza recur-sos, vinculase à Indús-tria Cultural e de bensde consumo, que a Ed.Física vai auxiliar a re-

 produzir.

Parte de uma

visão funcionalista econservadora da rela-ção EscolaSociedade

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PARTE II

APRENDIZAGEM SOCIAL NA EDUCAÇÃO FÍSICA

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A criança que pratica esporte respeita as regras do jogo ... capitalista 57

CAPÍTULO III

“A Criança que pratica esporte respeita as regras do jogo... capitalista”

3.1 Introdução

Entre os profissionais da Educação Física do Brasil, existem diferen-tes entendimentos do papel da Educação Física Escolar. Poderíamos dizer que um grande grupo pensa e age de acordo com uma visão “biológica”, a

 partir da qual o papel da Educação Física seria melhorar a aptidão física dosindivíduos, com o que estaria, automaticamente, contribuindo para o desen-volvimento social, uma vez que os indivíduos estariam mais aptos a atuar na sociedade e, portanto, seriam também mais úteis a ela. Outro grupo de

 profissionais, que juntamente com a anterior perfazem a maioria, supera decerto modo a visão anterior, agregando à melhoria da aptidão física o desen-volvimento psíquico. Esta segunda visão, que denominamos de “biopsicológica”, reconhece como papel da Educação Física a melhoria da aptidãofísica, o desenvolvimento intelectual e na abordagem sistêmica, dirseiaque a Educação Física atua sobre os domínios psicomotor, cognitivo e afe-tivo. Nestas duas visões, porém, a análise da relação da Educação Físicacom o contexto social é funcionalista, na medida que é seu papel formar física e psiquicamente um cidadão que desempenhe o melhor possível (den-

tro da atual estrutura social), o papel a ele atribuído na prática social. Destaforma são visões ahistóricas do papel social da Educação Física, como tam-

 bém circunscrevemse no âmbito das teorias acríticas da Educação (SAVI-ANI, 1984), por não reconhecerem os condicionantes sociais da Educação,Educação Física e da atividade pedagógica.

Entendemos que não podemos permanecer mais com estas visões parciais e falseadoras da nossa prática social, produzidas por uma metodo-logia positivista e fragmentada. Neste sentido, não podemos prescindir deuma análise crítica que possa identificar o papel social que a EducaçãoFísica concretamente cumpre neste momento histórico de nossa socie-dade.

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Apenas recentemente algumas tentativas neste sentido foram leva-das a efeito. Dentre elas, citamos a de CASTELLANI (1983) que, analisan-do os documentos e legislação relativos à Educação Física desde a décadade 30, chegou basicamente à conclusão de que esta tem cumprido o papel dereforçar a esteriotipação do comportamento masculino e feminino, tem co-laborado para o adestramento físico, necessário tanto à defesa da Pátria quantoà preparação e manutenção da força de trabalho necessária aos interesses daclasse dominante. CAVALCANTI (1984), demonstrou o caráter ideológicodo discurso que fundamentou a campanha “Esporte para Todos” no Brasil,na medida em que esta menosprezou os fundamentos filosóficos, sociológi-cos e psicológicos da atividade física e esportiva, e valorizou os aspectosmetodológicos, não questionando, desta forma, o significado do esporte parao homem e a sociedade. FERREIRA (1984), a partir da elaboração de umamatriz teórica dual, em que classifica as atitudes e procedimentos do profes-sor num modelo de reprodução ou numa perspectiva de transformação so-cial, procedeu a uma investigação empírica que demonstrou o caráter repro-dutivo da atividade pedagógica do professor de Educação Física do primei-ro grau. Para fazer justiça, teríamos ainda que citar as reflexões pioneiras deLOPES (1979 e 1980), e as análises críticas de OLIVEIRA (1983) e MEDI

 NA (1983).

Buscando colaborar no processo de análise crítica pelo qual passa aEducação Física no Brasil hoje, o que ocorre intensivamente com a Educa-ção de uma maneira geral, é que nos propomos a analisar e assinalar umaoutra faceta da Educação Física escolar, que é a sua contribuição no proces-so de socializaçao das crianças e adolescentes.

3.2 O conteúdo sócioeducativo do esporte

Muitos pedagogos da Educação Física/Esporte têm realçado a con-tribuição da atividade esportiva na socialização das crianças, contribuiçãoessa que tem sido utilizada como justificativa para a inclusão da EducaçãoFísica nos currículos escolares. Neste sentido, as colocações indicam que acriança através do esporte aprende que entre ela e o mundo existem “osoutros”, que para a convivência social precisamos obedecer determinadasregras, ter determinado comportamento (OBERTEUFER/ULRICH, 1977);

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aprendem as crianças, também, a conviver com vitórias e derrotas, apren-dem a vencer através do esforço pessoal; desenvolvem através do esporte aindependência e a confiança em si mesmos, o sentido de responsabili-dade, etc. Todas estas afirmações têm em comum o fato de serem afir-mações que identificam um papel positivofuncional para o esporte no

 processo educativo; privilegiam os aspectos positivofuncionais camu-flando, desta forma, os disfuncionais. Estas posições não partem de umaanálise crítica da relação entre a Educação Física/Esporte e o contextosócioeconômicopolítico e cultural em que se objetivam, e sim, da aná-lise da Educação Física/Esporte enquanto instituições autônomas e iso-

ladas, ou quando muito, como instituições funcionais, ou seja, comoinstituições que devem colaborar para a funcionalidade e harmonia dasociedade na qual se inserem. Quando estas abordagens identificam as-

 pectos negativos, estes são colocados como disfuncionais, sendo suascausas buscadas em distorções internas da própria Educação Física/Es-

 porte.

 No entanto, ao lado destas afirmações que consideram positivofuncional o resultado do processo de socialização através do esporte, podería-mos listar outras que indicam no sentido contrário, como por exemplo: pe-las regras das competições, o esporte imprime no comportamento as nor-mas desejadas da competição e da concorrência (PARLEBAS, 1980); ascondições do esporte organizado ou de rendimento são simultaneamente ascondições de uma sociedade de estruturação autoritária (WEIGELT, 1972apud DIETRICH, 1975); o ensino dos esportes nas escolas enfatiza o res-

 peito incondicional e irrefletido às regras, e dá a estas um caráter estático e

inquestionável, o que não leva à reflexão e ao questionamento, mas sim, aoacomodamento; na linguagem de WEIS (1979), forja um “conformista felize eficiente”; o aprender as regras significa reconhecer e aceitar regras pre-fixadas.

Como pudemos verificar, sob um enfoque distinto, temos tambémvalorizações diferentes do produto do processo de socialização que ocorreno esporte infantil.

Estas diferentes valorizações decorrem de diferentes visões de sociedade ou teorias sociais. As valorizações positivas estão respaldadas teórica

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mente na teoria Estruturalfuncionalista da sociedade, a partir da qual oselementos isolados do sistema social como a Educação, o Esporte, etc., po-dem ser descritos como funções do sistema. Eles são importantes desde quetenham importância funcional para o sistema, mantendo, portanto, sua esta- bilidade como unidade de funcionamento.

Uma afirmação que tem o respaldo desta teoria é a de que a novageração é educada em e para uma sociedade competitiva na qual o princípiode rendimento se impôs. O jovem esportista é confrontado muito cedo com

 princípios de rendimento, e dele é esperado não só suportar diferençasde rendimento, como também respeitálas (BÜHRLE apud DIETRICH,1975).

As análises que criticam a função socializadora que o esporte cum- pre, partem de uma teoria da sociedade que poderíamos chamar de aborda-gem (LOY et al. 1979) ou ótica (DEMO, 1983) do conflito. Esta teoria,desenvolvida por e a partir de Marx e Engels, acredita que é mais corretover a sociedade do ponto de vista de suas contradições históricas (DEMO,1983, p. 66). Portanto, a adoção desta teoria significa não entender as socie-dades capitalistas, por exemplo, como sendo harmônicas e funcionais, e simque estas encerram contradições fundamentais.

GRUNEAU apud LOY et al. (1978, p. 3401) coloca que, a partir daótica do conflito, o esporte:

1. Precisa ser entendido no contexto mais amplo das condições ob- jetivas das sociedades capitalistas.

 2. Está intimamente relacionado com as diferenças de classe em ter-

mos de poder e riqueza.

3. Todo esporte competitivo reflete a ideologia burguesa.

Por outro lado, coloca o mesmo autor que, a partir da abordagemestruturalfuncionalista, o esporte é assim encarado:

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1. O esporte competitivo reflete uma série de valores de muita im- portância para a sociedade. Desta forma, o recrutamento para o esporte cum- pre a função de integração social.

2. O esporte funciona, nas sociedades industriais ocidentais (capita-listas), como um mecanismo de mobilidade social.

3. O esporte oferece a oportunidade para a aprendizagem de diferen-tes papéis sociais.

Cumpre assinalar que, como lembra DEMO (1983), o funcionalismoé mais típico de países desenvolvidos (capitalistas), pois tal postura colabo-ra com o dominador, pois este está muito pouco interessado em mudar, por-que isto pode representar a perda de privilégios. Nesta perspectiva tratase,não de mudar o sistema, mas sim conseguir mudanças dentro do sistema.

 Não questionando o sistema (capitalista), tratase então de fazêlo funcio-nar melhor.

Assim sendo, o processo de socialização não é um processo neutro, pois ele acontece dentro de um contexto de valores específicos. Os valoresque são inculcados são os valores dominantes que, como lembram Marxe Engels (1984) em “A Ideologia Alemã”, são sempre os valores daclasse dominante. Dessa forma, o que a socialização principalmentereproduz são as desigualdades sociais, isto é, é a própria dominação se

 processando.

Assim, podemos dizer que a socialização através do esporte escolar  pode ser considerada uma forma de controle social, pela adaptação do pra-ticante aos valores e normas dominantes como condição alegada para a fun-cionalidade e desenvolvimento da sociedade. Um dos papéis que cumpre oesporte escolar em nosso País, então, é o dereproduzir e reforçar a ideolo-gia capitalista, que por sua vez visa fazer com que os valores e normas nelainseridos se apresentem como normais e desejáveis. Ou seja, a dominação ea exploração devem ser assumidas e consentidas por todos, explorados eexploradores, como natural.

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1 Ou para o mercado?

2 “Só depende de você a alegria de vencer”, dizia a propaganda do chiclete PingPong na TV, associando a idéia ao esporte.

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social. Esta crença de que no esporte desaparecem as desigualdades colabo-ra também para um certo abrandamento das contradições ou conflitos soci-ais.

SHINNICK (1978, p. 96) lembra muito bem que os valores “univer-sais” camuflam as contradições sociais, e os valores universais no esportetambém encobrem a dominação e a exploração de classe.

Assim, como vimos, realmente o esporte educa. Mas, educação

aqui significa levar o indivíduo a internalizar valores, normas decomportamento, que lhe possibilitarão adaptarse à sociedade capitalis-ta. Em suma, é uma educação que leva ao acomodamento, e não ao ques-tionamento. Uma educação que ofusca, ou lança uma cortina de fumaçasobre as contradições da sociedade capitalista. Uma educação a serviçoda classe dominante. Uma educação que não leva à formação “do indi-víduo consciente, crítico, sensível à realidade que o envolve” (OLIVEI-RA, 1983).

Se analisarmos as aulas de Educação Física onde o esporte escolar éiniciado e desenvolvido, veremos que a idéia da aprendizagem do esporteenquanto aprendizagem das técnicas esportivas, predomina. Isto porque,

 para a competição, na verdade, é isto que conta. Permeia, portanto, a buscado rendimento atléticoesportivo, que é condição para as possibilidades devitória nas competições. Com a exacerbação do espírito competitivo do es-

 porte na escola, as técnicas esportivas e o próprio esporte foram elevados à

condição de finalidade, ou seja, o esporte enquanto fim em si mesmo. Nestemomento, em que a idéia da competição (concorrência) toma conta do es-

 porte escolar, idéia esta que é fomentada pela busca da vitória, às vezes aqualquer custo (lucro), e do que ela representa na nossa sociedade (vencer na vida), já não existe mais espaço para a discussão sobre as normas doesporte, para a criação no esporte (adaptar o esporte à realidade social ecultural do grupo que faz esporte = criação cultural); já não existe maisespaço para a preocupação com o desenvolvimento de valores relacionadoscom o coletivismo (entendido como ações que visem prioritariamente o bemcomum, ou seja, priorizem o coletivo ao individual): já não existe o espaço

 para a discussão de estratégias que permitam a participação de todos osalunos com as mesmas oportunidades nas aulas, porque o professor tem de

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É ainda dentro da ótica estruturalfuncionalista que ouvimos comfreqüência a afirmação de que o esporte educa. Se indagarmos por que, ou oque tem de educativo no esporte, obteremos quase que invariavelmente aseguinte resposta: o esporte educa porque ensina a criança a conviver com avitória e a derrota, ensina a respeitar as regras do jogo (já que todos sãoiguais perante a lei, devemos respeitála, sem discutíla), ensina a vencer (no jogo e na vida) através do seu esforço pessoal (às vezes tem que, mo-mentaneamente, aliarse a outro ou outros para atingir este objetivo, proces-so que os pedagogos do esporte chamam de cooperação ou companheirismo),ensina a competir (já que a sociedade é extremamente competitiva e isto a

 prepara para a vida (1), desenvolve o respeito pela autoridade, que é o árbi-tro ou o professor (chamase a isso de disciplina). Precisamos entender queas atitudes, normas e valores que o indivíduo assume através do processo desocialização no esporte estão relacionados com sistemas de significados evalores mais amplos, que se estendem para além da situação imediata doesporte. Como lembram BERGER/BERGER (1978), os jogos das criançasnorteamericanas revelam certos valores básicos, como a independência, asrealizações individuais, o que se depreende da ênfase que põem na compe-tição individual.

 Nessa medida, não é difícil, numa rápida análise da resposta ante-riormente mencionada, identificar valores e elementos da ideologia burgue-sa. No esporte, desenvolvemse idéias ou valores que levam ao conformismo,como é o respeito incondicional a regras, porque o comportamento não con-formado no esporte não leva a modificações do esporte mas, sim, à exclusãodele. No esporte, colocase em destaque a idéia de que todos têm a oportu-

nidade de vencer (vencer no esporte = vencer na vida), através do esforço pessoal e individual (2), bastando para isso que se esforcem e que tenhamtalento (como Pelé, Zico, Bernard e outros), o que, em última análise, justi-fica e explica as diferenças sociais, negando toda e qualquer determinação

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 preocuparse com os que apresentam melhor rendimento; preocuparse coma melhoria da técnica (elevandoa à categoria de fim); preocuparse com oensino das regras internacionais dos esportes, ou melhor, com a imposiçãodas regras internacionais que permitirão as condições objetivas de compa-ração de performances; preocuparse em desenvolver nos alunos e suas equi-

 pes o espírito de competição, condição para a obtenção de vitórias (vencer na vida).

Como mencionamos anteriormente, estas características que o es-

 porte escolar apresenta não são geradas no seio do próprio esporte, e sim,são o reflexo mediatizado da estrutura social em que ele se realiza, ou seja,da sociedade capitalista. Neste momento, cabe ou surge a grande indaga-ção: em que medida ou até que ponto poderemos chegar a um quadro dife-rente? ou seja, o esporte escolar pode ser diferente? pode cumprir um papeldiferente do de inculcar a ideologia burguesa?

Se assumíssemos aqui e agora a postura das teorias críticoreprodutivistas (SAVIANI, 1984), afirmaríamos que o esporte, nesta socie-dade, invariavelmente contribuirá para a reprodução da atual estrutura so-cial. Embora reconhecendo as ferrenhas determinações sociais que sobre aEducação Física Escolar recaem, acreditamos que no seu interior a contra-dição não foi suprimida, ela persiste. Embora os espaços a serem ocupadosno sentido de uma ação transformadora sejam restritos, admitimos sua exis-tência. Neste sentido, o da identificação deste espaços, cumpre inicialmenteincluir a Educação Física/Esporte escolar no contexto mais amplo da Edu-cação e, enquanto parte desta, analisar as possibilidades de contribuição/colaboração para o processo de transformação social, condição para a con-cretização de uma sociedade mais justa e livre.

 Na busca do esclarecimento da contribuição da Educação para atransformação social, deparase com duas posições antagônicas. De umlado, a postura teórica que identifica na Educação a redenção da socie-dade/humanidade (teorias acríticas), e por outro, a postura teórica que

 percebe na Educação o papel invariável da reprodução da estrutura so-cial (teorias críticoreprodutivistas). O que cabe, no entender de SAVI-ANI (1984), não é a polarização das duas posturas, mas sim, a busca dasuperação através de uma teoria crítica da Educação, que possa iden-

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tificar a contribuição específica da Educação no processo de transfor-mação da sociedade.

Esta possível contribuição prendese ao fato de que a escola não éum instrumento homogêneo da classe dominante, pois nela refletemse ascontradições existentes na sociedade, refletese portanto o antagonismo en-tre os interesses burgueses e proletários. Neste sentido, na escola existe umespaço, embora pequeno, para o que GADOTTI (1983, p. 162) chama de“guerrilha ideológica travada na escola”.

Cumpre, para desenvolver uma pedagogia esportiva com algumaforça transformadora, tomar como ponto de partida um compromisso político com a classe oprimida e dominada, que é a classe trabalhadora; portanto, uma pedagogia que não se comprometa com os interesses bur-gueses, e sim com os interesses da classe trabalhadora e, mais ainda,com os “interesses revolucionários das classes populares” (GADOTTI,1983, p. 150).

 Neste sentido, a tarefa que se impõe parecenos ser a de desenvol-ver uma pedagogia desportiva que possibilite aos indivíduos perten-centes à classe dominada, aos oprimidos, o acesso a uma cultura espor-tiva desmistificada. Permitir ou possibilitar, através desta pedagogia,que estes indivíduos possam analisar criticamente o fenômeno esporti-vo, situálo e relacionálo com todo o contexto sócioeconômicopolítico e cultural.

3.3 Princípios de uma pedagogia crítica para a Educação Física

Embora não seja objetivo deste ensaio desenvolver uma proposta pedagógica numa perspectiva de classe, e que tenha como fundamento oreferido compromisso político com a classe dominada, ousadamente colocoalgumas reflexões que, acredito, apontam neste sentido.

Os professores de Educação Física na ação devem, efetivamente, incorporar novas posturas frente a algumas questões básicas:

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Precisam superar a visão positivista de que o movimento é predo-minantemente um comportamento motor. O movimento é humano, e o Ho-mem é fundamentalmente um ser social. A “motricidade já não é mais bio-lógica e sim histórica e social” (ROUYER, 1975, p. 192). Desta forma, omovimento tem repercussão sobre todas as dimensões do ser humano. Aconseqüência disso para a ação pedagógica é de que, nas aulas de EducaçãoFísica, devemos objetivar muito mais do que a aptidão física, a aprendiza-gem motora, a destreza desportiva, etc.; devemos entender que o movimen-to que a criança realiza num jogo tem repercussões sobre todas as dimen-sões do seu comportamento, e mais, que esta atividade veicula e faz a crian-ça introjetar determinados valores e normas de comportamento. Portanto,aquela idéia de que, atuando sobre o físico estamos automaticamente e ma-gicamente atuando sobre as outras dimensões, precisa ser superada paraque estas possam ser levadas efetivamente em consideração na ação peda-gógica, através do estabelecimento de estratégias que objetivem conscien-temente o desenvolvimento, num determinado sentido, destes outros aspec-tos/dimensões dos educandos. O que atualmente acontece é que, embora osobjetivos da Educação Física incorporem a dimensão psicosocial, as estra-tégias/atividades são totalmente norteadas pelos objetivos relacionados àaptidão física, destrezas desportivas, aprendizagem motora, esperandoseque estas, automaticamente, tenham repercussão sobre as outras dimensões.

Precisam superar a visão de infância que enfatiza o processo dedesenvolvimento da criança como natural, e não social. Falase da criançaem si, e não de uma criança situada social e historicamente. Falase da natu-reza da criança, e isto é ideológico na medida em que encobre as diferenças

 produzidas pela condição social destas crianças. “Na sociedade capitalista,definida pelas relações estabelecidas entre classes sociais antagônicas, aorigem da criança determina uma condição específica de infância” (MI-RANDA, 1984, p. 128).

Os professores de Educação Física devem buscar o entendimentode que o que determinará o uso que o indivíduo fará do movimento (naforma de esporte, de jogo, de trabalho manual, de lazer, de agressão a outrose à sociedade, etc.), não será, em última análise, a condição física, habilida-de esportiva, flexibilidade, etc., e sim, os valores e normas de comporta-mento introjetados pela condição econômica e pela posição na estrutura declasses de nossa sociedade.

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Superar a falsa polarização entre diretividade e nãodiretividade.Embora as pedagogias nãodiretivas tenham contribuído para a denúncia doexcessivo autoritarismo com que a Educação bancária (FREIRE, 1983) con-duzia o processo educativo, o oposto, ou seja, o nãodiretivismo, pode noslevar a um espontaneísmo estéril que acaba tornandose ideológico. FER-REIRA (1984), que citamos no início deste capítulo, de certo modo cai nes-ta “armadilha” quando coloca que as fontes de informações, normas e san-ções, numa perspectiva de transformação, devem provir dos interesses, ne-cessidade e motivações do educando, o “indivíduo”. Para tanto, segundo aautora, o educador deve ser um “facilitador da conscientização”, a partir demotivações “intrínsicas” dos indivíduos. Ora, as crianças não chegam “va-zias” às aulas de Educação Física; elas já estão incorporadas ao processo desocialização burguesa, e, se nós quisermos a introjeção de normas e valoresque se contrapõem aos burgueses, temos que dar uma direção, ou seja, “di-rigir” o processo educativo, pois os interesses, necessidades, etc., da crian-ça, já estão “contaminados”, isto é, estes já estão determinados pelo social(meioambiente). Assim, permitir ou facilitar, simplesmente, que eles desa-

 brochem, implica na reprodução e não na transformação. A postura de que oeducador deve apenas facilitar o desenvolvimento das potencialidades dacriança, tem como fundamento a idéia de que a criança possui uma “nature-za” que é fundamentalmente boa, e que bastaria permitir que isto se mani-festasse. Se assumirmos uma postura de classe social para a Educação, osinteresses e necessidades que devem ser levados em consideração não sãoos dos “indivíduos”, e sim os interesses de classe.

Um outro equívoco que precisa ser superado é o de que devemossimplesmente ignorar a cultura dominante, que, nesse entendimento, nãoserve à classe dominada. Não podemos simplesmente negar a cultura domi-nante, e sim permitir que a classe dominada, em dominando a cultura domi-nante, possa reconstruíla a partir de suas necessidades e interesses. Emtermos de Educação Física, significa que não devemos negar o desportocomo meio da Educação Física, porque ele, segundo alguns, é “essen-cialmente burguês” (LAGUILLAUMIE, 1978 apud FERREIRA, 1984, p.54). Para que a classe dominada possa reelaborar o esporte, tornandoo nãomais burguês, existe a necessidade que esta classe domine a cultura esportiva burguesa, mas, também, que lhe seja simultaneamente permitido desmistifícar essa mesma cultura esportiva. O esporte é burguês, não porque é estaa sua essência e, sim, porque suas múltiplas determinações lhe fornecem as

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características para tal. De maneira que, para termos um esporte nãoburguês, precisamos atuar sobre suas determinações. E o Educador representa omomento de ruptura em relação ao que é determinado socialmente, ao mes-mo tempo que define uma conduta para levar o educando a uma solidarieda-de consciente, vale dizer, ao sentido coletivo de sua formação (LIBANEO,1985). Procurando desenvolver um esporte em que o princípio do rendi-mento e da competição discriminatória (melhores dos piores), do esforço pessoal e individual (às vezes associado) para vencer o adversário não sejao norteador principal deste, desenvolvendo um esporte em que se busca o

 jogar com e não contra o adversário, um esporte onde se busca insistente-mente o desenvolvimento do coletivismo (priorização do coletivo ao indivi-dual, incluindo o “adversário/companheiro”), estaremos na verdade descarac-terizando o esporte burguês e lançando e criando as bases de um novo es- porte que, por sua vez, somente se consolidará com a criação também deuma nova ordem social, sem a qual não terá condições de sobreviver, por-que será fatalmente submetido à ordem burguesa.

Para que este novo esporte que leve a uma nova sociabilização,emerja, os professores de Educação Física devem superar também a idéia,muito difundida, de que, nas aulas de Educação Física, não se deve falar, ouseja, não se deve sentar e discutir com os alunos o que está se fazendo, sobo argumento de que a aula de Educação Física deve ser “orática” (entendase “adestrante”).

Estas são algumas reflexões sobre o processo educativo na Educação

Física Escolar que, espero, contribuam para que possamos desenvolver uma proposta pedagógica que aponte e possa realmente colaborar para o proces-so de transformação social, que permitirá a concretização de uma nova or-dem social, esta sim mais justa, fraterna e livre.

Porém, de acordo com o que hoje pensamos, acreditamos que a açãotransformadora do professor de Educação Física não deve restringirse aesta esfera, ou seja, aos muros da escola. A atuação política deste profissio-nal deve estenderse para a sua entidade representativa, seu sindicato, nãomovido, é óbvio, por uma visão corporativista e, sim, a partir de uma iden-tificação social com a classe trabalhadora. O engajamento com a categoriade profissionais ligados à educação, neste momento histórico, deve, ao nos-

A criança que pratica esporte respeita as regras do jogo ... capitalista

so ver, visar uma ação que permita que se estabeleça uma política educacio-nal, e que se concretize uma escola em nosso País, de acordo com as neces-sidades e interesses da classe trabalhadora. A atuação política do professor de Educação Física deve também alcançar a política partidária, para que,enquanto cidadão comum, assuma o papel de sujeito político da sociedade.

Finalizando, gostaríamos de lembrar as palavras do professor Flo-restan Fernandes, ditas no III Congresso Estadual de Educação, em SãoPaulo: “O educador que se nega no plano ideológico e político, se nega

também como educador” (Abril de 1985).

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A Educação Física escolar como campo de vivência social 71

CAPÍTULO IV

A Educação Física escolar como campo de vivência social 

4.1 Introdução

“A prática de Educação Física equivale à defesa de uma certa posição filosófica, ainda que o indivíduo não se dê por isso” (SÉRGIO,1978b).

Como entre os professores de Educação Física parece imperar o queP. FREIRE (1983) chama de consciência ingênua, caracterizada pela con-duta alienada e acrítica, esta reflexão filosófica é aí totalmente ausente. Comoconseqüência, a prática da Educação Física, ou seja, “a defesa de uma certa

 posição filosófica”, no nosso caso, acontece sem que os profissionais daEducação Física se dêem por isso.

Como exemplo, podemos citar a concepção de corporeidade humanaque está presente na prática da nossa Educação Física. Esta concepção caracterizase pelo dualismo, isto é, a prática da Educação Física brasileirareflete uma concepção dualista na qual o Homem é considerado como com-

 posto de duas unidades distintas: corpo e mente (não cabe neste espaçodiscutir as determinantes desta concepção).

Encontramos assim a Educação Física orientada para objetivos comoa preservação da “saúde física”, o que é reconhecidamente importante; po-rém, quando tomada exclusiva e isoladamente, resulta num equívoco peda-gógico. A concepção dualista torna “factível” a educação do físico isola-damente. Ora, sendo o Homem uma unidade (unidade da diversidade),

 portanto sendo impossível a educação do físico isoladamente, “descuidase” a Educação Física da repercussão que inevitavelmente têm suasatividades sobre a formação das “outras” dimensões da personalidadehumana.

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72 Educação Física e Aprendizagem Social

Os chamados métodos ginásticos que, por muito tempo, prepondera-ram na nossa Educação Física escolar, significam a prática da visão dualistado Homem.

O dualismo, todavia, ou esta dicotomia, nem sempre se apresentade forma tão flagrante na Educação Física. Muitas vezes vêmolo ca-muflado por um discurso pretensamente holista que, contudo, não so-

 brevive a uma análise teórica mais detalhada e/ou a uma verificaçãocrítica de sua prática. Referimonos ao fato costumeiro de se atribuir à

Educação Física finalidades “biopsicosociais” nos planejamentos di-dáticos, arrolados muitas vezes da legislação e na ação, ou seja, nomomento em que se fundem prática e teoria; os valores consideradossão de ordem “física”, com o menosprezo das questões “psicosociais”,esperandose que os efeitos positivos sobre estes ocorram automática e“magicamente”, não sendo necessário considerálos efetivamente naação pedagógica.

Além desta questão fundamental, as diversas maneiras de com- preender a Educação também têm influenciado, decisivamente, a ação pe-dagógica em Educação Física.

 Não existe a possibilidade, nem é a intenção aqui, discutir aprofundadamente as diversas teorias educacionais, vale dizer, o papel social daEducação. A breve análise que colocaremos a seguir tem o objetivo mínimode situar a nossa posição frente a esta questão.

De uma forma bastante rústica, poderíamos dizer que, entre os profissionais da Educação Física, impera a idéia ou a certeza da positi-vidade do papel da Educação em nossa sociedade. Assim, sendo a Edu-cação Física parte integrante da Educação, tem ela também uma funçãosocial positiva e importante. É a chamada visão funcionalista do papelda Educação. Tratase de colaborar, dentro do campo educacional, paraa funcionalidade, progresso e desenvolvimento de nossa sociedade. Nestaconcepção, a Educação desfruta de autonomia frente ao todo social demodo que ela se apresenta como instância social capaz de resolver os

A Educação Física escolar como campo de vivência social

 problemas de nossa sociedade, sem a necessidade da transformação es-trutural desta.

A visão anteriormente caracterizada tem muitas facetas, mas que nofundo têm em comum o fato de não se embasar numa crítica radical à socie-dade capitalista, que, com “características próprias”, é o caso da sociedade

 brasileira.

Se fizermos, no entanto, uma análise não mais funcionalista da

função social da Educação e mesmo de nossa sociedade, mas sim umaanálise a partir do materialismo histórico e dialético, chegaremos, comomuitos educadores que assim procederam, a algumas conclusões impor-tantes:

A Educação é ao mesmo tempo determinada e determinante daestrutura social. Daí que não seja possível negar o caráter político da Edu-cação. Daí que os problemas básicos da pedagogia não sejam estritamente

 pedagógicos, mas políticos e ideológicos.

A Educação nas sociedades capitalistas, ou na sociedade brasi-leira, é fator de reprodução social, vale dizer, fator de reprodução oumanutenção da sociedade de classes. Esta reprodução se dá de diversasformas:

1. O acesso à Educação é seletivo. Isto significa que a estratificaçãosocial se reflete no sistema educacional brasileiro. Filhos das camadas me-nos favorecidas, ou não têm acesso à escola ou são obrigados por múltiplasrazões a abandonála precocemente, ou ainda, quando nela permanecem,não alcançam, com não significativas excessões, os níveis de ensino secun-dário ou superior. O contrário acontece com os filhos das camadas maisfavorecidas que, viaderegra, têm acesso tanto à Educação via sistema deensino, como são beneficiados por um ambiente cultural favorável ao seudesenvolvimento intelectual. É o que poderíamos chamar de a reprodução

 pela exclusão e seletividade.

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74 Educação Física e Aprendizagem Social

2. A Escola ou a Educação, no sentido mais amplo, é veiculadorade uma visão de mundo, de homem e de sociedade impregnada da ideo-logia burguesa. Isto é, a Educação é uma das responsáveis pela sociali-zação das pessoas para viverem numa sociedade de classes, a ponto deencararem suas costradições como absolutamente normais, quando nãodesejáveis. Para a veiculação ideológica, são vários os aspectos que paratanto contribuem: vão desde a organização burocrática da instituiçãoEscola, passando pela forma de ensino até o conteúdo ensinado ou tra-tado.

Em se identificando o caráter reprodutivista da Educação brasileira,cabe ao Educador tomar uma posição que, digase de passagem, não podeser de neutralidade; “ou fazemos uma pedagogia do oprimido, ou fazemosuma pedagogia contra ele” (FREIRE, 1983). Assumindo um compromisso,que é político, com o processo de transformação estrutural da sociedade na

 perspectiva da edificação de uma sociedade efetivamente democrática, istoé, a superação da sociedade de classes, o Educador deve atuar no sentido deinverter ou reverter esta situação, buscando colocar sua prática e a Educa-ção a serviço deste projeto social.

O educador, na sua prática, quer queira quer não, é um veiculador devalores. É neste sentido que reside a vinculação da forma de ensino com oseu conteúdo. A socialização do indivíduo ou da criança se dá exatamenteatravés da internalização de valores e de normas de conduta da sociedade aque pertence. A Escola é uma das instituições que promove tal socialização.

Portanto, o fenômeno da socialização ou a aprendizagem do social tambémocorre nas aulas de Educação Física, sendo inclusive enfatizada comoimportante função pela pedagogia desportiva ou da Educação Física.Por conseguinte, existe a necessidade de aprofundarmonos nesta ques-tão.

4.2 A socialização através do jogo e do desporto

Como nos referimos anteriormente, socialização significa o proces-so de transmissão dos comportamentos socialmente esperados. Mais espe-

A Educação Física escolar como campo de vivência social 75

cificamente, a socialização para o desempenho de determinado papel socialenvolve a aquisição de capacidades (habilidades) físicas e sociais, valores,conhecimentos, atitudes, normas e disposições que podem ser aprendidasem uma ou mais instituições sociais, como por exemplo a família, a escola,o esporte, e ainda através dos meios de comunicação.

Segundo DIETRICH (1974), desde que há considerações peda-gógicas acerca dos jogos de movimento, há tanto tempo também seusaspectos socialeducativos tem sido ressaltados. A inclusão e início de

 programas de esportes na escola tem sido, freqüentemente, baseados nacrença comum de que a participação no esporte é um elemento de soci-alização que contribui para o desenvolvimento mental e social (LOY etal. 1978).

De acordo com DIETRICH (1974), se for seguida a literatura especi-alizada até o fim dos anos 60, descobrese uma relativa concordância nasdeclarações sobre as funções sócioeducativas do esporte em geral e dos

 jogos esportivos em especial, com afirmações como as de que o reconhecer das determinações de campeonatos e o respeitar (manter) das regras do jogo,educam para um sentimento de responsabilidade, de cavalheirismo, de sin-ceridade, para trabalhar com o próximo.

Os brasileiros ouviram, durante o ano de 1980, repetirse nas trans-missões esportivas da Rede Globo de Televisão, o seguinte slogan: “a crian-ça que pratica esporte respeita as regras do jogo; pratique esporte”, numaclara alusão ao conteúdo “pedagógico” do esporte.

Em suma, a literatura tem atribuído ao esporte o poder de desen-volver, em quem pratica, principalmente na criança, o companheirismo, acooperacão, o respeito às regras e normas, o valor e a força de vontade,além da responsabilidade, sentido social, etc.

Mas se essa visão que valoriza positivamente a socialização na família e na Escola foi hegemônica até a década de 60, nestas três últimas têmsurgido posições contrárias a esse respeito. São posicionamentos que concordam quanto à função socializante do esporte, e discordam, contudo, na

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76 Educação Física e Aprendizagem Social

valorização deste resultado. Por exemplo, WEIGELT apud DIETRICH(1974) afirma que as condições ou necessidades do esporte organizado, doesporte de alto nível ou de rendimento e do êxito olímpico são, simultanea-mente, as condições de uma sociedade de estruturação autoritária. Suas ne-cessidades motoras autoritárias são, conseqüentemente, preparadas durantea fase de socialização na família e na escola. CACHAY/KLEINDIENST(1975) argumentam que a aceitação, por parte da didática, de que “virtudes”são assumidas em espaços de ação esportiva e através da intemalização denormas necessárias à execução de exercícios corporais, mostra que esta di-dática representa uma educação ao acomodamento, e não ao questionamen-to e à revisão de normas.

Como ressalta PARLEBAS (1980), pelas próprias regras das compe-tições, o esporteimprime ao comportamento motor as normas desejadas dacompetição e da concorrência. Assim, o esporte é um molde social do cor-

 po.

Fica claro nesta colocação que a socialização não é um processo neu-tro e universal; pelo contrário, isso acontece dentro de um contexto de valo-res específicos. “Normas e valores podem ser aceitos, mas são sobretudoimpostos, pois normas e valores dominantes são sobretudo dos dominan-tes” (DEMO, 1983).

Como vimos anteriormente, temos diferentes valorizações dos resul-tados da aprendizagem social através do esporte. Qual seria a razão destadisparidade?

Para DIETRICH (1974), as controvertidas interpretações do sig-nificado da aprendizagem social no esporte, e nisso estão baseadas as pos-sibilidades pedagógicas do jogo esportivo, devemse a pontos de vista teó-ricos diferentes no que diz respeito à sociedade como um todo. Para ummelhor entendimento das interpretações contraditórias sobre a importânciada aprendizagem social no esporte, devemos tornar claras as teorias sociaisque as suportam.

A Educação Física escolar como campo de vivência social 77

DIETRICH (1974) analisa a aprendizagem social no esporte a partir do ponto de vista de três teorias sociológicas, quais sejam: a teoria estruturalfuncionalista, cujo principal representante é Talcot Parsons, a teoria doconflito e a teoria crítica. Das suas análises depreendese que a socializaçãoatravés do esporte, como hoje acontece, é valorizada somente a partir daótica estruturalfuncionalista da sociedade. Ainda de acordo com o autor, oesporte é mais apropriado para desenvolver valores conforme o sistema, doque valores superadores ou questionadores do sistema. O jogo esportivo éum modelo exemplar da interação equilibrada, e como tal é um símbolo

 para um sistema social que, autoregulativamente, permanece em equilí-

 brio. O jogar, disciplinada e silenciosamente, é uma forma de comunicaçãorestrita e ritualística.

Como muito bem lembra SHAFER apud LOY et al. (1978), os pro-gramas escolares de esportes têm contribuído mais no sentido de promover os valores e estilo de vida da sociedade, do que no de propiciar aos indiví-duos a oportunidade de questionar o existente, ou tentar modelos alternativos.

4.3 A aprendizagem social no ensino dos esportes nas escolas

Como afirmam LOY et al. (1978), na infância são justamente a famí-lia e a escola as instituições sociais de maior influência no processo de soci-alização. A Escola é formalizada, com regras estabelecidas, onde os profes-

sores representam não só a autoridade adulta e a necessidade de ordem edisciplina, como também os valores do conhecimento. A Escola, assim, fun-ciona para reforçar valores correntes na sociedade convencional (ELKIM,1968).

Segundo HARPER et al. (1980), na escola não se adquire apenasconhecimentos, mas aprendese também uma série de valores e de normasde comportamento. Muitos desses valores são impostos por certas práticas

 pedagógicas, como o aprendizado do sentimento de inferioridade, de sub-missão, o respeito pela ordem estabelecida, o aprendizado do “cada um por si”, da competição, inculcando desta forma o individualismo, sem que as

 pessoas se apercebam disso.

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78 Educação Física e Aprendizagem Social

Parecenos claro, pois, que, através do esporte, podem ser veicula-dos determinados valores e normas, como ilustrado por PARLEBAS (1980),quando afirma que, através do esporte, impõese todo o dispositivo oficialda instituição esportiva: federações, regulamentos, calendários de encon-tros, cerimônias, sanções, instâncias de autoridades, dirigentes, árbitros ecapitães de equipes. Participar do torneio esportivo equivale a reconhecer,implicitamente, uma tal autoridade. No campo, em última instância, é sem-

 pre o árbitro quem decidirá. O poder institucional desportivo denota umaorganização hierárquica, autoritária e centralizada. Esta aparelhagem é ple-na de implicações sóciopolíticas.

Estando a nossa atividade esportiva escolar atrelada, através de suaestruturação burocrática e da ideologia do esporte competição que a nor-teia, ao sistema esportivo internacional (BRACHT, 1983), tornase muitológico pensar que os valores acima ressaltados por PARLEBAS (1980) es-tarão norteando e influindo, fortemente, na atividade esportiva em nossasescolas, e, conseqüentemente, contribuindo para a afirmação daqueles va-lores.

Contudo, para chegarmos a uma visão mais concreta dessas relações,necessitamos aclarar quais os valores e de que forma são veiculados. Isso

 pode ser conseguido através da análise das regras ou normas que norteiamas relações dos professores com os alunos, destes entre si na escola, e, maisespecificamente, nas aulas de Educação Física onde o esporte é ensinado deforma sistemática.

A análise das regras e normas que norteiam as interações justificase pelo fato de que o “lidar” com os outros, apesar de parecer muito pessoal eúnico, tem sua constância num contexto social. O que parece espontâneo écontrolado socialmente, baseado em experiências anteriores (GEIST/WEICHERT, 1981).

A regulamentação que define o esporte como microsistema social próprio é uma parte das normas que determinam, fortemente, a relação entre professores e alunos.

A Educação Física escolar como campo de vivência social 79

 Na Escola atual, o professor é o ponto de orientação, e os alunosdevem observálo, pois ele é o início e o fim do que há para fazer. Nessaestrutura, deve ser observado o princípio básico: “obedecer ao professor”

 pois, na aula, o comportamento inteiramente aceito é somente aqueleque corresponde às regras de relacionamento validadas pela instituiçãoEscola.

É lógico que existem formas de ensino que atenuam e que procurammodificar essa relação. Porém, de acordo com os estudos de LABORINHA

(1981), BRESSANE (1981) e FARIA JR.(1981), o professor de EducaçãoFísica, no Brasil, se caracteriza pela diretividade, o que vem reforçar a situ-ação enunciada anteriormente.

Segundo LANDAU/DIETRICH (1979), um outro fato marcante dasregras que regem o ensino e a Escola é a diferenciação social dos alunos,

 baseada no rendimento individual que propicia a comparação. O espor-te e a escola são sistemas sociais que estão cunhados pela idéia da con-corrência.

 No ensino, a diferenciação através da comparação é possibilitada pelaatribuição de notas. No esporte, os resultados ou as performances são pre-miadas. Porém, o fato mais marcante é o de que, para a comparação das

 performances no esporte, existe a necessidade de igualar as condições, oque é conseguido pelo estabelecimento de regras rígidas. A estas regras

rígidas, que determinam o roteiro de ação (regras de espaço), o modo demovimentação (regras motoras) e a passagem do tempo (regras de tempo),são submetidos os alunos participantes.

 Nesse quadro, o esporte ensinado e praticado na escola reforça a de- pendência ao detentor do conhecimento, o professor, que tem o poder detomar o aluno um bom praticante; reforça o individualismo e a concorrência pela comparação das performances e reforça a obediência irrefletida àsregras. O aprenderas regras significa reconhecer e aceitar regras prédefinidas, isto é, a capacidade dos alunos de entender e compreender regras não éexigido nem desenvolvido.

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80 Educação Física e Aprendizagem Social

Se quisermos empreender uma tentativa de superação da tradicionalconcepção de aprendizado social que, no esporte, enfatiza o respeito incon-dicional e irrefletido às regras, que dá a estas um caráter estático e inquesti-onável e que não leva à reflexão e ao questionamento, mas ao acomoda-mento, precisamos determinar, em coerência com nossas idéias educacio-nais, o que deveria buscar o aprendizado social no esporte e como alcancálo.

Apoiamonos em GEIST/WEICHERT (1981), para quem o apren-

dizado social deve ser o conhecer, o tornarse consciente das normas sociaise, se necessário, o saber e o poder modificálas. Em oposição ao "comportarse socialmente" não é postulada nenhuma norma social positiva, tratase primeiro de testála num contexto social e então decidirse, livre e consci-entemente, sobre sua adoção ou modificação. Nesta concepção, tomase uma decisão livre e consciente pelo estudo das normas, tendo emvista a conscientização do processo de regulamentação, isto é, daquelescaminhos pelos quais novas regras são instituídas, discutidas e com- binadas, ou impostas e/ou destituídas. A esta concepção acrescentamosas afirmações de LANDAU/DIETRICH (1979) de que, ao aparecimen-to das regras no esporte e no ensino desse, deveria seguir um acordosocial que, ao mesmo tempo, desse chances a que essas regras fossementendidas e testadas.

Para questionar regras e significados, devese falar. A afirmação deque o ensino dos esportes não é para se sentar e discutir, mas sim para se

movimentar, deve ser encarada seriamente sob o ponto de vista da "defici-ência de movimento na escola”. No entanto, falar sobre o social não deveficar reduzido à discussão das matérias onde os alunos permanecem senta-dos, porque ali só são possíveis experiências de interação de forma reduzi-das enquanto que, nos jogos esportivos, os processos de interação são vari-ados e especiais. Além disso, o argumento de que a intensidade de movi-mento e o entendimento de que essa atividade forma uma boa aula de Edu-cação Física, onde os alunos suam sem que outros resultados sejam consci-entemente objetivados, será, neste caso, somente quantidade de movimen-to. A isso, podese opor uma consciência de qualidade de movimento a par-tir do qual o aluno, por si mesmo, motivado e consciente, pratica esporte por longo tempo (GEIST/WEICHERT, 1981).

A Educação Física escolar como campo de vivência social 81

Como lembra OLIVEIRA (1983), a Educação Física, apesar de ser uma atividade essencialmente prática, pode e deve oferecer a oportunidade

 para a formação do homem consciente, crítico e sensível à realidade que oenvolve.

DIETRICH (1974), colocando o aprendizado social como um ob- jetivo a ser buscado nas aulas de Educação Física, fez uma análise das inte-rações nos jogos esportivos, utilizando a seguinte diferenciação de concei-tos: a) ação social que aparece como efeito racional é de ação respectiva ao

trabalho e, b) ação social como compromisso comunicativo é da ação res- pectiva à interação. Na sua análise, classifica a metodologia tradicional doensino dos jogos esportivos como sendo uma ação respectiva ao trabalho, oque transforma o jogo num ritual que valoriza as normas técnicas, e no qualo comportamento divergente é encarado como interruptor, e não fomenta-dor do aprendizado social. Isto é, o jogo esportivo, como é ensinado e prati-cado atualmente, exalta o jogar como trabalho, assemelhandose a um ritualestritamente determinado. Nesse caso, os papéis são prédeterminados, e ocontrole é exercido por uma força externa, o árbitro ou o professor.

 Neste ponto, ressaltamos o fato de que, no momento em que deixa-mos de supervalorizar as regras regulativas, constitutivas e técnicas do es-

 porte, ou seja, o jogar como ação respectiva a trabalho, estamos subtraindoa característica mais acentuada do esporte moderno e recuperando, parcial-mente, o jogo.

4.4 O fenômeno do jogo na sua relação com o esporte

O esporte moderno, cada vez mais, perde as características do jogoestabelecidas por HUIZINGA (1980), que, já em 1938, detectava este pro- blema: "a sistematização e regulamentação cada vez maior do esporte im- plica a perda de uma parte das características lúdicas mais puras”.

CAGIGAL (1979) afirma que o esporte será tanto mais educativoquanto mais conservar sua qualidade lúdica, sua espontaneidade e seu poder de iniciativa. Daí porque o esporte superclassificado, levado a extremos

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82 Educação Física e Aprendizagem Social

 pelo fato do tecnicismo, modelado e esteriotipado, não é mais educativo. Omovimento esteriotipado, o gesto típico, a precisão biomecânica dos exercí-cios graças aos quais se obtiveram recordes tão surpreendentes, harmonizamse dificilmente com a riqueza do movimento humano, com a expressi-vidade pessoal do gesto e com a rica dimensão do comportamento do exer-cício físico. Para este autor, o excesso de técnicas ou o condicionamento datécnica numa atividade cujo maior valor reside na espontaneidade lúdica,no poder da expressividade da criatividade, da afirmação da pessoa e dogrupo, pode anulála. O excesso de aprendizagem de modelos, de taxionomias e o supertecnicismo são os perigos mais graves do esporte educativode nosso tempo.

Daí pensarmos que o esporte na escola deva preservar ou recupe-rar o caráter lúdico, devendo, portanto, estar a ação pedagógica voltada

 para tal.

4.5 A metodologia do ensino do basquetebol

Segundo OLIVEIRA (1981), os métodos mais utilizados para o en-sino dos esportes em geral são o método global, também conhecido por método sintético, e o método parcial, também conhecido como método ana-lítico.

A bibliografia em língua portuguesa apresentanos autores comoDAIUTO (1974), HURTADO (1978), TEIXEIRA/PINI (1978), BARROSJR. (1979), LOTUFO (s.d.) e GUILHERME (s.d.) que propõem, basica-mente, a utilização de uma metodologia parcial para o ensino dos des-

 portos. O próprio planejamento didático é elaborado obedecendose àdivisão dos desportos em fundamentos técnicos (por ex. TEIXEIRA/PINI op. cit.).

Segundo KNAPP (1963), as pesquisas têm mostrado, em linhasgerais, que o método global obtém melhores resultados em tarefas mo-toras abertas, e o analítico, em tarefas motoras fechadas. CROSS, apudXAVIER (1981), pesquisou o método global e o método parcial para

A Educação Física escolar como campo de vivência social 83

verificar qual o de maior eficácia no ensino do basquetebol para meni-nos de nove anos de idade. O resultado de seu estudo indicou que, paradestrezas simples, o método global foi melhor, e, para destrezas com- plexas, o método parcial foi superior. OLIVEIRA (1981) pesquisou osmétodos parcial e global do ensino do basquetebol para meninos de 8 a12 anos de idade e não encontrou diferença significativa entre os resul-tados obtidos.

Podese observar, nas pesquisas desenvolvidas na área de apren-

dizagem motora, que alguns aspectos das aulas de Educação Física ou en-sino dos jogos esportivos, não têm sido levados em consideração, como,

 por exemplo, a possibilidade de interrelacionamento social, tipo de apren-dizagem social, o desenvolvimento cognitivo, o desenvolvimento de moti-vação para a prática permanente do esporte que um ou outro método propi-cia.

DIETRICH et al. (1978) e ALBERTI/ROTHENBERG (1975), ana-lisando o método global e o método parcial, concluem que ambos apresen-tam uma série de vantagens e desvantagens e, para evitar as desvantagens enão abrir mão das vantagens dos dois métodos, introduzem o conceito re-creativo de educação do gesto esportivo, sistematizando o método globalem série de jogos que conduzem o aluno ao jogo final, e série de exercícios

 paralelos, usando sempre o espírito do jogo.

4.6 Objetivos do estudo

Desta forma, a concepção de aprendizagem social de GEIST/WEICHERT (1981), os resultados e as conclusões da análise da interação nos

 jogos esportivos de DIETRICH (1974), juntamente com a metodologia ba-seada no conceito recreativo de educação do gesto esportivo e, finalmente,a adoção de uma concepção de Educação e Educação Física que busca secolocar a serviço do processo de transformação social, fornecem os elemen-tos para a proposição de uma metodologia do ensino dos esportes (basque-tebol) nas escolas, a qual denominamos, para efeito prático de dissertar, deMetodologia Funcional Integrativa (MFI), cujos resultados de sua aplicação prática propusemonos a verificar.

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84 Educação Física e Aprendizagem Social

4.7 Materiais e métodos

Com o objetivo de verificar a influência da utilização da Metodolo-gia Funcional Integrativa (MFI) e da Metodologia Tradicional (MT) para oensino do basquetebol sobre a aprendizagem social, e da primeira, tambémsobre a atitude dos alunos em relação às aulas de Educação Física, foi reali-zada uma pesquisa quase experimental.

O estudo foi realizado na Escola de lº 

e 2º Graus Professora Mar-garida Lopes, pertencente à Rede Oficial de Ensino do Estado do Rio Gran-de do Sul, na cidade de Santa Maria.

A amostra do grupo experimental constituiuse dos 39 alunos per-tencentes às 6as Séries A e B reunidas, com as seguintes características:idade média de 13,54 anos, máxima de 16,5 e mínima de 11,5; condiçãosócioeconômica classificada como baixa, uma vez que 82% dos alunos

 pertenciam à categoria A, a mais baixa da caracterização sócioeconômicautilizada pela Secretaria de Educação do Estado.

A mostra dos grupos controle constou dos alunos matriculados nasséries C, D e F da mesma escola.

Foi considerada como variável independente a metodologia, dividi-da em dois níveis: MFI e MT. Como variáveis dependentes foram conside-

radas: a) aprendizagem social e b) atitude dos alunos em relação às aulas deEducação Física.

4.7.1 Instrumentos de medida

Para a mensuração das variáveis dessa pesquisa foram desenvolvidosdois instrumentos: a) sistema de registro de comportamentos de interaçãosocial (SIRCIS), para a verificação do tipo de aprendizagem social; b) ques-tionário para a apreensão da atitude dos alunos em relação às aulas de Edu-cação Física.

A Educação Física escolar como campo de vivência social 85

4.7.1.1 Sistema de registro de comportamentos de 

interação social

Este instrumento foi desenvolvido tendo como referencial os mode-los de análise de ensino de SANT’ANA (1976), UNDERWOOD (1976),FARIA JR. ( 1981 ), HEINILA (1978) e TAYLOR (1979). Da análise destesautores, saiu a decisão da utilização de um sistema de categorias para oregistro dos comportamentos. O passo seguinte foi extrair as categorias de-sejadas a partir do referencial teórico descrito na introdução deste capílulo.As categorias extraídas foram: 1.  Nível de participação. 2. Contatos sociais.3. Formação de subgrupos. 4. Participacão na resolução de conflitos. 5. Aceitação de mudanças de regras. 6. Mudança de regras e expressão deidéias.

Estas categorias foram operacionalizadas em três dimensões, isto é, positiva, neutra e negativa. A partir disto foi desenvolvida uma ficha paraos registros (Fig. 1).

Para o preenchimento dessa ficha, foram estabelecidas as seguintesinstruções: 1. Cada intervalo (de 1 a 2) corresponde a 15 segundos des-tinados à observação do aluno (15 x 2 = 30) que, somados aos 15 segundosdestinados ao registro (15 x2 = 30), perfazem um minuto. 2. Os quadradoscorrespondentes a cada intervalo são preenchidos com os símbolos +, o, ,que indicam as dimensões positiva, neutra e negativa de cada uma das cate-

gorias; 3. O observador observa durante 15 segundos o aluno, e, nos 15segundos subseqüentes, registra todos os comportamentos evidenciados na-quele intervalo.

Para a determinação da confiabilidade do instrumento, optouse pelaverificação da concordância entre observadores, cujo índice conseguido foide 80,2%.

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   F   I   G   U   R   A   1  -   F   i  c   h  a  p  a  r  a

  o  r  e  g   i  s   t  r  o   d  e  c  o  m  p  o  r   t  a  m  e  n   t  o  s   d  e   i  n   t  e  r  a  ç   ã  o  s  o  c   i  a   l   (   S   I   R   C   I   S   )

86 Educação Física e Aprendizagem Social A Educação Física escolar como campo de vivência social 87

4.7.1.2 Questionário

Os itens do questionário foram elaborados a partir da identificaçãodas áreas que pretendíamos abranger. Estas áreas referemse a: objetivos daEducação Física, transferência para situações extraescolares, forma e con-teúdo das aulas de Educação Física. O questionário foi constituído com ques-tões abertas que seguem: 1. Para que servem as aulas de Educação Física?2. Do que você mais gosta nas aulas de Educação Física? 3. Do que vocênão gosta nas aulas de Educação Física? 4. O que você aprende ou faz nas

aulas de Educação Física que você utiliza em outras situações, como por exemplo, nas outras aulas, em casa, nos fins de semana? 5. O que você achada maneira como os professores vêm dando as aulas? 6. Você sentiu algumadiferença nas nossas aulas em relação às aulas que vocês estavam tendoantes? Caso afirmativo, quais são? 7. Você gostou da forma como foramdesenvolvidas as aulas (MFI)?

Observese que as questões de nos 6 e 7 foram incluídas no questio-nário somente no pósteste, sendo que a questão 5 foi suprimida.

O instrumento foi testado quanto à clareza e objetividade de linguagemdas questões, utilizandose a técnica da testagem um a um.

4.7.2 Coleta de dados

Os dados referentes à variável “aprendizagem social”, do grupo ex- perimental, foram coletados durante oito das onze aulas realizadas nos me-ses de agosto, setembro e outubro de 1983.

Foram engajados, para tanto, nove observadores que registraramos dez primeiros minutos da aula, os dez minutos intermediários, ouseja, do 20º ao 30º minuto, e os dez minutos finais. Antes do início decada aula, foram sorteados os alunos a serem observados. Os observadores se postavam em local que permitisse visualizar e ouvir o alunoobservado.

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88 Educação Física e Aprendizagem Social

Os dados referentes a esta variável do grupo controle foram coleta-dos durante o mesmo período, através da observação e registro de seis aulasde outras turmas de 6a série do mesmo colégio, às quais estavam sendoministradas aulas de esportes coletivos.

O questionário foi aplicado para o grupo experimental antes do iní-cio do tratamento e logo após o seu término, ou seja, após a última aula.

4.7.3 Metodologia funcional-integrativa (MFI)

 Numa descrição sucinta desta proposta metodológica, colocamos quenela utilizase para o ensino de um esporte, no caso o basquetebol:

a) Uma série metodológica de jogos e uma série paralela de jogos  (Fig. 2)

b) Estrutura das aulas:

As atividades das aulas são norteadas pela seguinte estrutura: pri-meiro momento reunião com os alunos para planejamento e decisões pré-vias sobre a aula: segundo momento realização do jogo eleito; terceiromomento paralisação do jogo com discussão, reflexões e propostas para acontinuidade da aula; quarto momento testagem das soluções e variantes;quinto momento avaliação e planejamento da aula seguinte. Cumpre assi-

nalar que poderá ocorrer, no decorrer das aulas, mais de uma paralisação daatividade, desde que o desenvolvimento assim exija.

c) Procedimentos do professor:

Os procedimentos ou a conduta do professor têm como referênciaimediata, porém com a flexibilidade necessária, a estrutura das aulas es-tabelecidas anteriormente. A ação do professor deve buscar um clima deaceitação mútua entre ele e os alunos, um clima de liberdade responsável,congruência, criando uma situação de confiança e otimismo. O professor deve, também, imprimir ampla flexibilidade ao desenvolvimento do con-teúdo.

FIGURA 2 - Série metodológica de jogos para o aprendizado do basquetebol

A Educação Física escolar como campo de vivência social 89

FONTE: Adaptado pelo autor a partir de ALBERTI e ROTHENBERG (1975).

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90 Educação Física e Aprendizagem Social

Consoante com essas orientações de ordem global, deve objetiva-mente:

Incentivar os alunos e possibilitarlhes a participação no planeja-mento das aulas;

Incentivar os alunos a expressarem idéias para a realização e modi-ficação dos jogos.

Conduzir reflexões e discussões com os alunos sobre as atividadesdesenvolvidas, levandoos a refletir quanto a: 1. importância da participa-ção de todos os integrantes do grupo; 2. possibilidade e necessidade demudança das regras; 3. necessidade de conseguir ambiente agradável, coo- perativo e de companheirismo nos jogos.

Considerar as idéias expressas pelos alunos e submetêlas à apreci-ação ao grupo;

Engajar os alunos na organização e avaliação das atividades reali-zadas nas aulas;

Levar em consideração a importância de uma disciplina funcional,espontânea, em contraposição à disciplina imposta;

Explorar e utilizar a colocação de problemas aos alunos, com oobjetivo de leválos à atividade reflexiva;

Limitar ao mínimo indispensável a direção pessoal das atividades.

Podese afirmar, por conseguinte, que nas aulas desenvolvidas a par-tir da MFI, os alunos tiveram um nível de participação mais positivo nasaulas de Educação Física do que quando utilizada a MT.

A Educação Física escolar como campo de vivência social 91

A comparação entre os resultados obtidosna categoria “contatos so-ciais” quando utilizada a MFI e quando utilizada a MT, foi realizada a par-tir da tabela 1.

TABELA 1 — Freqüência total dos comportamentos positivos, neutros e negativos de seis aulas da MFI e da MT na categoria “Contatos sociais”

Podese observar, nessa tabela, que a dimensão positiva na MFI re-cebeu um percentual mais elevado de registros (50,0 contra 32,0%), ao pas-so que, nas dimensões neutra e negativa, o percentual mais elevado ocorreunas aulas da MT. A partir do cálculo do quiquadrado, podese rejeitar tam-

 bém, neste caso, a hipótese nula. Sendo assim, podese afirmar que os resul-tados obtidos nessa categoria diferem significativamente a um nível de .01,isto é, nas aulas desenvolvidas com a MFI ocorreram mais contatos sociais

 positivos do que nas aulas com a MT.A tabela 2 apresenta os dados referentes à categoria “formação de

subgrupos”. O quiquadrado calculado a partir da tabela 2 implicou na acei-tação da hipótese nula, ou seja, não existe diferença significativa entre asfreqüências de comportamento entre as duas metodologias.

TABELA 2 — Freqüência total dos comportamentos positivos, neutros e negativos na categoria “Formação de sub-grupos” de seis aulas da MFI e da MT

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92 Educação Física e Aprendizagem Social

4.7.4 Metodologia tradicional (MT)

 No presente estudo, a metodologia tradicional (MT) foi consideradacomo sendo a metodologia comumente utilizada nas aulas de Educação Fí-sica na Escola.

São geralmente utilizados, no ensino do Basquetebol, os métodos parcial e global e uma combinação de ambos, denominada de misto.

 Neste estudo, o método utilizado pelos professores do colégio emquestão foi o parcial, no qual o esporte é ensinado e aprendido através da prática separada de seus fundamentos básicos e, após o domínio desses, oesporte propriamente dito é então desenvolvido e praticado.

A ação do professor se caracteriza pela diretividade, e o objetivo principal é a busca da aprendizagem de destrezas, ou seja, dos gestos técni-cos.

4.8 Resultados e discussão

A freqüência dos comportamentos de interação social obtidos atra-vés do registro nas fichas do SIRCIS estão descritos em tabelas que se-

guem. Não existe, neste espaço, a possibilidade da apresentação das tabelasque demonstram o comportamento das freqüências por categoria e por di-mensão nas diferentes aulas observadas das duas melodologias. Desta ma-neira, apresentamos somente as tabelas resumo, onde estão computados osresultados das observações por categoria, em seis aulas desenvolvidas coma MFI e em seis aulas desenvolvidas com a MT.

A tabela 3 apresenta os resultados obtidos nas duas metodologi-as na categoria 1, isto é, “nível de participação”. Observase nesta tabe-la que, na dimensão positiva, o percentual maior ocorreu nas aulas de-senvolvidas com a MFI, e que nas dimensões neutra e negativa o maior  percentual ocorreu nas aulas desenvolvidas com a MT. O quiquadrado

A Educação Física escolar como campo de vivência social 93

calculado com os dados da tabela 3 foi 293,3. O quiquadrado tabelado para alfa = .01 e 2 graus de liberdade é igual a 9,21. Portanto, rejeitouse a hipótese nula.

TABELA 3 - Incidência total dos comportamentos positivos, neutros e negativos na categoria “Nível de participação”, em seis aulas da MFI e da MT

Os resultados da categoria “participação na resolução de conflitos” constam da tabela 4.

TABELA 4 — Freqüência total dos comportamentos positivos, neutros e  negativos na categoria “Participação na r esolução de conflitos”, 

em seis aulas da MFI e da MT

A diferença entre as duas metodologias é flagrante, não existindo anecessidade da aplicação de um teste estatístico. Ressaltese ainda que, paraessa categoria, o interesse recai não sobre a proporcionalidade entre os com-

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94 Educação Física e Aprendizagem Social

 portamentos positivo, neutros e negativos, como nas categorias 1, 2 e 3, esim, sobre o total de comportamentos verificados, pois o total de comporta-mentos registrados denota a dimensão da preocupacão do professor em ex-

 por estes conflitos, e solicitar a participação dos alunos para a sua supera-ção.

Os resultados da categoria “aceitação de mudanças de regras” estãoresumidos na tabela 5. Em razão de flagrante diferença das frequências nasduas metodologias, não foi aplicado teste estatístico.

TABELA 5 - Freqüência total dos comportamentos positivos, neutros e negativos na categoria “Aceitação de mudança de regras”, 

em seis aulas da MFI e da MT

As razões para esta diferença parecem ser: a) esta categoria somente

é utilizada quando for decidida uma mudança nas regras de determinado jogo ou exercício. Esse aspecto, por si só, favorece a MFI, pois esta prevê autilização de séries metodológicas de jogos para o ensino dos esportes, en-quanto que a MT utilizase de séries de exercícios; b) na MFI os jogos sãoapresentados pelo professor apenas com regras elementares, a partir do quenovas regras são testadas e desenvolvidas. Na MT o professor define previ-amente as regras dos exercícios ou do jogo, restando apenas aos alunosrespeitálas.

Os resultados dos registros na categoria “mudanças de regras e expressão de idéias” constam da tabela 6.

A Educação Física escolar como campo de vivência social 95

TABELA 6 - Freqüência total dos comportamentos positivos, neutros e negativos na categoria “Mudanças de regras/expressão de idéias”, 

em seis aulas da MFI e da MT

Como referido anteriormente, esses resultados mostram que os alu-nos, nas aulas desenvolvidas com a MFI, tiveram uma contribuição muitomais efetiva no que diz respeito à sugestão de mudança de regras e expres-são de idéias em relação aos alunos que participaram das aulas desen-volvidas com a MT. Isso vem ao encontro da idéia de aprendizagemsocial adotada para fundamentar a MFI que enfatiza o reconhecimentoda relatividade das normas e a conscientização do processo de regula-mentação.

Para a análise dos resultados dos questionários inicial e final, utili-zouse um procedimento hermenêutico, a análise de conteúdo.

Apresentaremos somente as tabelasresumo das questões de nos 1 e4.

A primeira questão teve o seguinte enunciado: Na sua opinião, paraque servem as aulas de Educação Física? Os resultados do préteste estãoresumidos na tabela 7 e, na tabela 8, os resultados do pósteste.

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96 Educação Física e Aprendizagem Social

TABELA 7 - Freqüência das respostas dos alunos sobre as finalidades das aulas de Educação Física no pré-teste

Categorias Freqüência total Freqüência por aspecto

1. DesenvolvimentoMorfofuncional 31 12 Desenvolvimento do corpo

10 Melhorar o preparo físico9 Desenvolver ou exercitar 

o físico ou os músculos

2. Aprendizagem desportiva 10

3. Desenvolvimento mental 2

4. Divertimento 1

5. Saúde 5

Verificase, nestas tabelas, que a diversidade das respostas dadas no préteste exigiu o estabelecimento de cinco categorias, enquanto que, no pósteste, exigiu o estabelecimento de dez. No pósteste, não apareceu acategoria “saúde”, no entanto apareceram opiniões que foram classificadasem categorias como “Educação”, “Transferência”, “Sociabilização”, “Cria-tividade”, “Novidades” e “Exercícios físicos e movimentos”, categorias es-tas ausentes no préteste.

Esses resultados demonstram que ocorreu um alargamento do en-tendimento das finalidades da Educação Física com o surgimento, no pósteste, de categorias não relacionadas exclusivamente ao domínio psicomo-tor e ao desenvolvimento morfofuncional mas, também, ao domínio sociale cognitivo.

A questão nº 4 teve a seguinte redação: O que você aprende nas aulasde Educação Física que você utiliza ou faz em outras situações (como por ex., nas outras aulas, em casa, nos finais de semana, etc.)? Os resultados dasrespostas dos alunos a esta questão no pré e no pósteste, estão resumidosnas tabelas 9 e 10.

A Educação Física escolar como campo de vivência social 97

TABELA 8 — Freqüência das respostas dos alunos sobre as finalidades das aulas de Educação Física no pós-teste

Categorias Freqüência total Freqüência por aspecto

1. DesenvolvimentoMorfofuncional 22 7 Para desenvolver os

músculos9 Para desenvolver o corpo4 Para desenvolver o físico2 Manter a forma física

2. Aprendizagem desportiva 8 7 Aprender jogos1 Aprender novas

modalidades

3. Desenvolvimento mental 2

4. Divertimento 1 Para se divertir 

5. Educação 4 3 Para educar 1 Para nos desenvolver 

6. Transferência 2 1 Para ter mais capacidadede estudos

1 Aprender coisas boas para a nossa vida e saber 

7. Socialização 6 1 União entre professores ealunos

1 Aprender a discutir os

 problemas com os colegas1 Aprender a ter responsabilidade

1 Respeitar os professores1 Desenvolver a união do

grupo1 Respeitar os colegas

8. Novidades 2

9. Exercício físico emovimento 7

10. Criatividade 1

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98 Educação Física e Aprendizagem Social

Analisandose estas duas tabelas, observase que, no pósteste, forammenos freqüentes as indicações do aprendizado de modalidades esportivas,

 jogos e exercícios.

Para a categoria 2, “regras”, houve uma indicação a menos no pósteste, porém, com uma modificação no seu sentido: no préteste os doisalunos indicaram essa categoria com as expressões “saber as regras” e “asregras de um esporte”; já nos pósteste, o aluno usou a expressão “as regras

que nós fizemos”. Isso denota que o aluno estará transferindo não somenteuma regra previamente determinada pelo professor ou pelo esporte eleito,como também uma regra que foi desenvolvida pelo próprio aluno nas aulasde Educação Física.

Também se observa no pósteste, o surgimento da categoria “socia- bilização” com oito indicações, da categoria “criatividade” com duas indi-cações, e da categoria “família” com uma indicação.

TABELA 9 - Freqüência das respostas dos alunos em relação à questão nº 4 no pré-teste

Categorias Freqüência total Freqüência por aspecto

1. Modalidades desportivase exercícios 65 17 Futebol

8 Correr 9 Volibol

2 Saltar 4 Basquetebol

10 Exercícios2 Handebol6 Jogar bola6 Jogos1 Cooper 

2. Regras 2

3. Higiene 2

4. Disciplina 2 1 Disciplina1 Se comportar 

A Educação Física escolar como campo de vivência social 99

TABELA 10 - Freqüência das respostas dos alunos em relação à questãonº 4 no pós-teste

Categorias Freqüência total Freqüência por aspecto

1. Modalidades desportivase exercícios 47 10 Futebol

8 Volibol12 Basquetebol2 Handebol6 Exercícios físicos3 Correr 6 Jogos

2. Regras 1

3. Socialização 8 3 Respeito pelos colegas3 Educado no relacionamento

com os outros1 Cooperação nos jogos

1 Sentido de grupo

4. Criatividade 2

5. Família 1 1 Ensino ao irmão oaprendido nas aulas deEducação Física

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100 Educação Física e Aprendizagem Social

4.9 Discussão dos resultados

Genericamente, verificouse que, nas aulas desenvolvidas com a MFI,ocorreu um índice maior de comportamentos positivos do que nas aulasdesenvolvidas com a MT. De acordo com a metodologia utilizada no pre-sente estudo, isso equivale dizer que a utilização da MFI propicia uma vi-vência social diferenciada de quando é utilizada a MT. Porém, para umamelhor apreciação, impõese fazermos a análise dos resultados das catego-rias.

Com relação à categoria “nível de participação”, verificouse que,nas aulas desenvolvidas com a MFI, a dimensão positiva apresentou umafreqüência muito superior à verificada nas aulas desenvolvidas com aMT. Isto significa que os alunos, nas aulas desenvolvidas com a MFI,

 participaram de forma mais efetiva das atividades, expressando maior entusiasmo e maior alegria do que os alunos que participaram das aulasde MT.

Estes resultados vão ao encontro dos pressupostos de DIETRICH etal. (1978), que colocam como desvantagens do método parcial, que foi outilizado pelos professores da MT, o fato desse método não possibilitar ou,apenas tardiamente, a satisfação do desejo de jogar das crianças. As crian-ças não se sentem atraídas pelos detalhes técnicos de um esporte, mas sim, pelo desenrolar e pelo espírito do jogo.

A participação mais efetiva conseguida nas aulas da MFI, demons-trada pela maior freqüência de comportamentos positivos registrados, tam- bém recebeu o aval dos alunos que, respondendo no pósteste à perguntasobre as diferenças entre a MFI e a MT, assim se expressaram: “os alunos praticam as aulas com mais vontade”, “os alunos participam mais”. Portan-to, a utilização de séries metodológicas de jogos propicia um maior “nívelde participação" dos alunos nas aulas de Educação Física, em contraposi-ção às séries de exercícios técnicos e táticos utilizados na metodologia par-cial.

Obviamente, esse maior nível de participação não pode ser atribuído,unicamente, à utilização do conceito recreativo da educação do gesto espor-

A Educação Física escolar como campo de vivência social 101

tivo. Os alunos citaram em relação à pergunta referida, outras diferençascom sentido positivo, como: "maior liberdade”, “mais brincadeira”, “podí-amos conversar”, “discussão dos grupos", e isso mostra que outros fatores podem ter motivado esse nível de participação maior, como por exemplo, aforma menos diretiva de conduzir as aulas.

Uma das idéias dessa metodologia é, justamente, melhorar o nível de participação do aluno a partir do seu envolvimento consciente nas decisõesde aula, de modo a assegurar uma adequação real das atividades aos seusinteresses e necessidades.

A categoria “contatos sociais” também apresentou um resultado ex- pressivamente favorável à MFI. Esses resultados indicam que, nas aulasdesenvolvidas com a MFX, os alunos comunicaramse com uma maior fre-qüência do que nas aulas da MT. A comunicação entre os alunos é condiçãonecessária quando se pretende uma participação efetiva destes na organiza-ção das atividades das aulas e na superação dos conflitos, quando se preten-de exercitar a cooperação.

O argumento muitas vezes utilizado, como lembram GEIST/WEICHERT (1981), de que uma boa aula de Educação Física se mede pelomovimento e pelo suor dos alunos, pode ser rebatido com o contraargumento de que, nestes casos, verificase somente quantidade de movimento,sem que outros objetivos estejam sendo atingidos, como a percepção críticado esporte, das regras que o regem e do seu significado social por parte dosalunos.

Um indicador da facilitação da comunicação entre os alunos na MFIsão as expressões utilizadas pelos alunos no pósteste, para expressar asdiferenças entre esta metodologia e a MT: “podíamos conversar”, “discus-são dos grupos”, “a professora anterior não deixava abrir a boca”.

 Nas aulas de Educação Física onde o professor utilizase do coman-do e tem objetivos relacionados, prioritariamente, com a aprendizagem dedestrezas esportivas (da técnica pela técnica), como demonstra a MT, asconversas (comunicação entre alunos) são normalmente encaradas como“antieconômicas" e, via de regra, são reprimidas. Nestes casos, quanto maiso aluno se detiver na realização do exercício determinado, mais produtiva

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102 Educação Física e Aprendizagem Social

será sua atuação. Quando, no entanto, o professor de Educação Física temobjetivos que visam o desenvolvimento da interação e a melhoria do enten-dimento recíproco, em suma, o desenvolvimento numa perspectiva global,a comunicação, ao invés de reprimida, deve ser convenientemente incenti-vada.

Quando as regras de um jogo não são, simplesmente, impostas pelo professor, mas resultam de um acordo entre os alunos, é necessário haver conversas sobre a conveniência, as exigências e a validade dessas regras.

Exemplo de um incentivo à intercomunicação, característica da MFI, é asolicitação freqüente do professor no sentido de que os alunos de deter-minado grupo discutam sobre a melhor maneira de organizar um determinado

 jogo, ou de resolver determinado conflito ou problema.

Com relação à categoria “formação de subgrupos”, o que se verifi-cou nas duas metodologias foi que a dimensão neutra predominou sobre asdemais, sendo que, na MT, essa predominância foi um pouco mais acentua-da. Acreditávamos que o maior envolvimento dos alunos no planejamento edecisões de aulas, propiciado pela MFI, tivesse como resultado uma maior freqüência de atitudes de iniciativa na formação de grupos para os jogos,quando comparado com a MT, o que. efetivamente ocorreu, mas de formanão significativa, como demonstraram as provas estatísticas.

 Na categoria “participação na resolução de conflitos” verificouseuma evidente diferença entre as duas metodologias, porém não em relação à

 proporcionalidade dos comportamentos positivos, neutros e negativos, e sim,no que diz respeito ao todo das freqüências nestas dimensões. Estes resulta-dos indicam, por um lado, que nas aulas da MFI, houve uma maior preocu-

 pação em expor os conflitos e de submetêlos à apreciação dos alunos parauma solução dialogada, e por outro, que os conflitos nestas aulas forammais freqüentes.

A utilização de exercícios com prédeterminação precisa pelo pro-fessor de toda a conduta motora e social do aluno, não favorece o apareci-mento de conflitos. Na verdade, o professor que se utiliza do estilo de co-mando, que estabelece como objetivo total das aulas de Educação Física oaprendizado de destrezas esportivas (MT) teme o aparecimento de confli-

A Educação Física escolar como campo de vivência social 103

tos, pois eles interrompem a ordem e prejudicam a “produtividade”. Esque-cem, no entanto, estes professores, que, neste “perigo” (o conflito), reside,de acordo com THOMAS (1978), a esperança de uma solução construtiva.A busca de uma solução conjunta satisfatória do conflito pode ter comoresultado uma melhora nas relações e/ou funcionamento de todo o grupo.

Outro aspecto que envolve essa questão é o ressaltado por LANDAU/DIETRICH (1979), de que o tratamento normalmente dado pelo pro-fessor, ou ignorando o conflito ou suprimindoo, baseado no estilo de co-

mando, só pode solucionar o conflito aparentemente, permanecendo osmotivos de fundo sem serem tocados.

Essa questão pode ser evidenciada no conflito entre os alunos “mai-ores” e “menores”, acontecido no grupo experimental. O envolvimento dosalunos na solução daquele conflito levouos, em nosso entendimento, a com-

 prometeremse e a coresponsabilizaremse pelo sucesso da solução encon-trada e sugerida por eles próprios. Neste caso formase. também, o ambien-te sóciopsicológico propício para a ação cooperativa.

Outro fator levado em consideração pela MFI e que parece ser tam- bém uma das causas dessa diferença de freqüências nesta categoria, é o deque os conflitos sobre a aplicação de regras oportunizam a discussão sobrea validade e necessidade destas regras. Conseqüentemente, há uma tomadade consciência por parte dos alunos, do processo de regulamentação e da

 própria razão de existir das regras. Ao contrário, na MT o surgimento dos

conflitos sobre regras não leva a esse tipo de questionamento, mas sim, àaplicação pura e simples destas regras, já que elas são prédeterminadas

 pelos regulamentos internacionais.

A categoria 6, “mudanças de regras/expressão de idéias” reúne, tal-vez, o fundamento mais importante da MFI. Indica essa categoria, generica-mente, o número de sugestões de mudanças de regras e o número de idéiasdadas pelos alunos nas aulas. Esclarecemos, porém, que o significado des-sas sugestões tem de ser analisado numa perspectiva teórica mais ampla.

A concepção de aprendizagem social adotada enfatiza que esta ocorrerá na medida em que o aluno passar a reconhecer, a saber, a tomar consci

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104 Educação Física e Aprendizagem Social

ência das regras e normas sociais que regulamentam a sua ação no esporte,na escola, etc., sua interação com colegas e professores, como também en-fatiza a tomada de consciência por parte do aluno, da relatividade das nor-mas, ou seja, da necessidade de adaptálas às necessidades situativas.

Em função dessa concepção, na MFI, prevêse o envolvimento dosalunos no processo de regulamentação dos jogos, o que implica a criação pelos alunos de seus próprios papéis representativos. O contrário acontece,comumente, no ensino dos esportes no qual os alunos são submetidos às

regras esportivas internacionais, sem possibilidades de questionálas. Tra-tase, portanto, do aluno apenas reconhecer as regras e observálas.

Esse aspecto refletiuse nos registros desta categoria verificados nasaulas da MT, cuja freqüência perfez apenas 10% da ocorrida nas aulas daMFI.

Durante a iniciação em determinado esporte com a utilização da MFI,diante de uma divergência entre alunos sobre a aplicação de determinadaregra, a ação do professor não é a de aplicar a regra internacional desteesporte naquela situação, mas sim. de colocar o problema aos alunos, paraque estes, através do diálogo, possam regulamentar aquelas ações esporti-vas. O resultado é que o aluno reconhece aquelas regras e tem consciênciade sua necessidade e seu significado. Essa conduta do professor na MFI,explica a maior freqüência de expressão de idéias e sugestões de mudançasde regras ocorrida nas aulas desenvolvidas com a MFI.

As regras determinadas pelos alunos correspondem às normas de açãono jogo esportivo. Porém, o estabelecimento pelos alunos, dessas regras,não garante a igualdade de agir dos jogadores em relação a elas. Muito provavelmente ocorram conflitos, e então fazemse necessárias novas dis-cussões, novas regras, etc. Esse processo diminui a sua intensidade na me-dida que as normas de ação (regras) forem sendo esclarecidas e acordadasentre os jogadores.

As formas de jogos oriundas desse processo diferenciamse do ritualde tal maneira, que os jogadores, a qualquer momento, estão em condições

A Educação Física escolar como campo de vivência social 105

de transpor a um nível idiomático as ações e de mudálas sob vontade, o quenão é possível no ritual forçado.

O maior envolvimento do aluno na programação e decisões de aula.a satisfação dos seus interesses de jogar, a liberdade na participação propi-ciada pela MFI, pressupunhase, favoreceria a modificação e a formação deatitudes positivas em relação às aulas de Educação Física.

Os resultados da análise comparativa entre o pré e o pósteste, per-

mitiram verificar que ocorreu uma ampliação no entendimento das finalida-des da Educação Física por parte dos alunos. Essa ampliação processouseem direção às finalidades normalmente atribuídas à Educação Física e, por conseqüência, nos planejamentos didáticos, mas que, como demonstram osresultados do préteste não têm correpondência na ação docente. Tratasedas finalidades “psicosociais” da Educação Física. Na questão que solici-tava aos alunos que citassem o que eles aprendem nas aulas de EducaçãoFísica e que transferem para outras situações da vida, os alunos indicaram,no pósteste, oito vezes aspectos ligados à sociabilização, numa indicaçãoclara de tomada de consciência de que outros valores são desenvolvidos nasaulas de Educação Física que não apenas aqueles ligados estritamente aoexercício físico e às destrezas esportivas. A expressão de um aluno, “apren-di que quando a gente está num grupo, a gente não pode escolher só o quequer fazer, tem que ter as opiniões de todos”, em nosso entendimento, é umademonstração clara da possibilidade do desenvolvimento desses valores. Aquestão de saber se esses valores são transferidos ou não para outras situa-

ções da vida não pode ser respondida com precisão. Acreditamos que, quantomais significativa para o aluno for essa experiência vivida e quanto mais asociedade (meio ambiente) fomentar ou reforçar esse tipo de atitude, maior será a probalidade de ocorrer esta transferência. A questão da transferência,nessa perspectiva, vinculase, portanto, à idéia de que as transformaçõessociais não ocorrerão através da escola, mas sim, terão de operarse simul-taneamente nesta e na sociedade. Mesmo assim, os educadores não devemmenosprezar a possibilidade de sua contribuição para esta transformação,nem tampouco cruzar os braços afirmando ser isso impossível. O professor deve acreditar nessa possibilidade, acrescentando à sua ação a consciêciadesta interrelação.

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106 Educação Física e Aprendizagem Social

Quanto à questão que procurou captar as diferenças que os alunos puderam perceber entre as aulas desenvolvidas com a MFI e as aulas ante-riores (MT), consideraram os alunos que as aulas da MFI propiciaram umambiente de maior liberdade, e que levaram os alunos a uma participaçãomais intensa nas atividades de jogos e nas decisões de aula sobre conteúdo,organização de grupos e regulamentação de jogos.

As expressões dos alunos no pósteste, em resposta a esta questão, principalmente as reunidas na categoria "participação”, indicam que estes

tomaram consciência de que lhes foi possibilitado participar nas aulas nãosomente como meros cumpridores de tarefas determinadas pelo professor,mas como agentes ou sujeitos da atividade educativa. Expressões como “po-díamos dar idéias”, “todo mundo podia colaborar”, “pela participação naorganização dos jogos” demonstram a percepção por parte dos alunos deque isso não lhes era permitido nas aulas anteriores, ou seja, com a Metodo-logia Tradicional.

4.10 Conclusão

Quando nos referimos à questão do conteúdo sócioeducativo dos jogos esportivos, procuramos ressaltar que os professores de Educação Fí-sica devem tomar consciência de que na escola são inculcados nos alunos,os valores e normas de comportamento “desejáveis” da nossa sociedade.Esses valores “desejáveis”, são os valores dominantes, que por sua vez, sãoos dos dominantes, ou seja, a escola reproduz a ideologia da classe domi-nante.

Como afirma LEIF (1983), toda ideologia social, cuja interiorizaçãoe reprodução a escola favorece, incide essencialmente sobre a conduta: ide-ais, modelos, imagens de autoridade, da justiça, das obrigações para com asociedade, o Estado, as instituições e os grupos. Por isso, a sociedade en-contra na escola, de maneira notável e solidamente organizada, o esteio e agarantia de perenidade de suas estruturas vigentes.

A Educação Física escolar como campo de vivência social 107

A sociedade capitalista na qual vivemos, com o auxílio do mito daliberdade (individual) e da igualdade de oportunidades, mantém uma estra-tificação social extremamente injusta. Para a manutenção de seus privilégi-os a classe dominante necessita que sejam aceitos como normais e desejá-veis determinados valores, como por exemplo, a competição ou concorrên-cia baseadas na idéia de igualdade de oportunidades, o que leva ao culto doindividualismo.

O esporte na escola não deixa de veicular e reproduzir esta ideologia.

A obediência incondicional às regras determinadas pelos regulamentos in-ternacionais (autoridades), sem que o indivíduo tenha consciência do pro-cesso de regulamentação, e a busca da performance para a superação doadversário, são exemplos.

Assim sendo, se por um lado, para favorecer o desenvolvimento deconsciências críticas (indivíduos com uma visão crítica do esporte, comofenômeno social e individual) existe a necessidade de substituir, nas aulasde Educação Física, a costumeira relação assimétrica entre professor e alu-no por uma relação baseada no diálogo na acepção de FREIRE (1978), paraque desta forma possa realmente acontecer um ato educativo libertador enão um ato domesticador, por outro, não menos importante, é o conteúdo ouobjeto dessa interação. Tratar no ensino dos jogos esportivos unicamentedos gestos técnicos ou das regras esportivas internacionais, sem relacionálas com os interesses e a realidade dos educandos, continua, em nosso en-tendimento, a não concorrer para o desenvolvimento de uma visão crítica

do esporte.

Por isto, na metodologia que propomos, a MFI, além de buscar aeliminação da dominação pela autoridade, sem no entanto renunciar o direi-to e o dever do professor de indicar uma direção, indicadora do compromisso político assumido, procurase mostrar o esporte numa perspectiva crítica,onde os alunos possam realmente “fazer” o seu esporte levando em consi-deração as características de sua realidade infantil e existencial (social, eco-nômica, política, cultural), e não apenas praticar o esporte. Para isso, entreoutras coisas, o aluno tem de participar ativa e conscientemente do processode normatização que determina as condições das interações no esporte.

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Como nos lembra BRANDÃO (1985, p. 103), ‘‘não há transmissãode conhecimento se este não se der através de um processo de reconstruçãodo conhecimento. Por isto, ensinar implica criar condições para que o seualuno compreenda como e porque chegouse a um determinado estágio deconhecimento em uma determinada área, através da desmistificação do sa- ber. Transmissão do conhecimento não é imposição de conteúdos. É sim,desenvolver um processo que permita o acesso a conteúdos através do de- bate e da critica do conhecimento estabelecido".

A MFI substitui também a prioridade dada pela Metodologia Tradi-cional ao ensino dos gestos técnicos e ao aprendizado das regras esportivasinternacionais, pela vivência do jogo. procurando transformar as aulas numcampo de ação e vivência social.

Ao problema de colocar os gestos esportivos como conteúdo “a priori”, somase a tendência burocrática da Educação e Educação Física brasi-leira. Os professores de Educação Física colocando o ensino dos esportescomo meta. ficam a estabelecer objetivos específicos como “o aluno deveráser capaz de em 5 arremessos à cesta, converter no mínimo 3”, e a procurar estratégias para atingilos e avaliálos. E nessa mania de controle acabam perdendo ou não tendo a noção das finalidades últimas de sua atividade pedagógica. Para isso concorre também a formação estritamente técnica desse profissional que não consegue inscrever sua prática num contexto socialmais amplo, num projeto de sociedade, numa visão de mundo.

A idéia de que o esporte é basicamente a comparação de desempenhos,ou seja, a competição, está fortemente enraizada na nossa sociedade. Asescolas vêem no esporte uma forma de adquirir prestígio, e para isso existea necessidade de que vençam as competições; para vencer as competiçõessuas equipes devem ser convenientemente treinadas. Essa análise foi feita para demonstrar (se é que isto é necessário) que o ensino dos gestos esporti-vos nas escolas é legitimado pela idéia da competição, e para ressaltar aestreita ligação entre a característica competitiva do esporte e a buscado aperfeiçoamento dos gestos esportivos e da condição atlética (fisio-lógica).

A Educação Física escolar como campo de vivência social 109

A competição esportiva, por sua vez, tem como suporte a ideologiada igualdade de oportunidades, ou seja, todos os competidores têm a mesmachance de vitória. Obviamente, esta idéia pressupõe apenas as condiçõesimediatas à competição e não leva em consideração as condições sociais eeconômicas dos que nela tomam parte.

Acreditamos que a competição é um elemento motivador para a par-ticipação nos jogos esportivos que não deve ser menosprezado. No entanto,existe a necessidade, a nosso ver, de determinar, embora seja difícil fazêlo,

os limites entre a desejabilidade e a indesejabilidade da competição, ou ain-da o "tipo” de competição.

Para nós, a competição é desejável na medida em que os competidoresencarem seus opositores como companheiros de jogo; tornase indesejávelna proporção em que os competidores percebam seus oponentes como ri-vais que precisam ser vencidos a todo custo e, mais indesejável ainda, quan-do transformam estes em inimigos que devem ser odiados. LEIF/BRUNELLE (1978, p. 21), referemse a esta questão de forma singular quando co-mentam que o “jogo de bocha requer um parceiro; a partida de bocha, umadversário; e o torneio, inimigos”.

Se, por um lado, o individualismo resultante da comparação de per-formances, a competição desmedida, o respeito irrefletido às regras, sãovalores de nossa sociedade que são reforçados pelo esporte e, conseqüen-temente, pelo esporte escolar, acreditamos ser possível, por outro lado, reo

rientar esse ensino e esse esporte no sentido do desenvolvimento do coletivismo (entendido como a ação pessoal comprometida prioritariamente como bem comum), do desenvolvimento da consciência da relatividade das nor-mas e da possibilidade de sobre elas agir, e de reorientar a competição es-

 portiva destituindoa da finalidade precípua de indicar a supremacia de unssobre os outros (discriminar melhores dos piores) através da análise críticado significado da competição. Porém, se nisso acreditamos e mesmo, senisso depositamos nossas esperanças educacionais, estamos conscientes tam

 bém, das limitações impostas pela ordem social vigente, para a efetivaçãode tal proposta. Nas palavras de Manuel SÉRGIO (1978) em “Desporto em

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Primeiro lugar no PrêmioMEC de Literatura Desportiva namodalidade de Estudos Pedagógi-

cos.

Em 1990, doutorouse pelaUniversidade de Oldenburg (R.F.A).

Atualmente é Presidente doColégio Brasileiro de Ciências doEsporte, e desenvolve estudos nasáreas da Pedagogia da EducaçãoFísica e Sociologia do Esporte.

O Editor

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O título "Educação Física e Aprendizagem Social", num primeiro momento pode parecer estar apenas relacionado com o conteúdo da 

segunda parte, mas, na verdade, contém uma categoria que é característica para uma corrente que surge na Educação Física 

brasileira no início da década de 80. Esta corrente, influenciada pela discussão que era levada a efeito no âmbito mais geral da pedagogia no 

Brasil, começa a refletir o papel social da Educação Física, contextualizando-a no sistema educacional.

EDUCAÇÃO FÍSICA 

APRENDIZAGEM SOCIAL

VALTER BRACHT