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87 Riscos Naturais e Protecção do Ambiente Efeitos da erosão acelerada em vertentes na sequência de incêndios florestais * Introdução Este trabalho resulta, essencialmente, da condensação de dois estudos anteriores (L. LOURENÇO, 1988-a e 1988-b) em que se analisaram alguns casos de intensificação da erosão, na sequência das chuvas caídas após a destruição da vegetação provocada por incêndios florestais. A falta da vegetação ao permitir o embate directo das gotas de água da chuva contra o solo, aumenta os efeitos da chamada erosão por salpicos. A inexistência de vegetação reduz, ainda, as taxas de infiltração e, ao mesmo tempo, aumenta os coeficientes de escoamento superficial, deixando assim disponível uma maior quantidade de água para poder erosionar a superfície topográfica. Em termos de erosão dos solos, as consequências dos incêndios florestais não se reduzem, apenas, aos efeitos do desmantelar dos próprios solos. Além do arranque do material, a erosão implica o transporte dos detritos e a sua posterior deposição. Assim sendo, os efeitos da erosão têm que ser analisados sob uma perspectiva tricotómica, ou seja, considerar erosão, transporte e acumulação como diferentes fases de um único e complexo processo, a evolução das vertentes. A actuação conjunta dos diferentes processos erosivos tem por objectivo a regularização natural das vertentes, cujo equilíbrio dinâmico é, muitas vezes, posto em causa pelo homem. Normalmente, quando isso sucede, a actuação dos processos morfogenéticos é grandemente acelerada, em especial na sequência das chuvadas caídas após a destruição da vegetação pelos incêndios florestais ou depois dos trabalhos de preparação de terrenos para a reflorestação. * Comunicações, Jornadas Científicas sobre Incêndios Florestais, Coimbra, 1988, vol. II, p. 5.1.-1 a 20.

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Efeitos da erosão acelerada em vertentes nasequência de incêndios florestais*

Introdução

Este trabalho resulta, essencialmente, da condensação de dois estudosanteriores (L. LOURENÇO, 1988-a e 1988-b) em que se analisaram alguns casosde intensificação da erosão, na sequência das chuvas caídas após a destruiçãoda vegetação provocada por incêndios florestais.

A falta da vegetação ao permitir o embate directo das gotas de água dachuva contra o solo, aumenta os efeitos da chamada erosão por salpicos. Ainexistência de vegetação reduz, ainda, as taxas de infiltração e, ao mesmotempo, aumenta os coeficientes de escoamento superficial, deixando assimdisponível uma maior quantidade de água para poder erosionar a superfícietopográfica.

Em termos de erosão dos solos, as consequências dos incêndios florestaisnão se reduzem, apenas, aos efeitos do desmantelar dos próprios solos. Alémdo arranque do material, a erosão implica o transporte dos detritos e a suaposterior deposição. Assim sendo, os efeitos da erosão têm que ser analisadossob uma perspectiva tricotómica, ou seja, considerar erosão, transporte eacumulação como diferentes fases de um único e complexo processo, aevolução das vertentes.

A actuação conjunta dos diferentes processos erosivos tem por objectivo aregularização natural das vertentes, cujo equilíbrio dinâmico é, muitas vezes,posto em causa pelo homem. Normalmente, quando isso sucede, a actuaçãodos processos morfogenéticos é grandemente acelerada, em especial nasequência das chuvadas caídas após a destruição da vegetação pelos incêndiosflorestais ou depois dos trabalhos de preparação de terrenos para areflorestação.

* Comunicações, Jornadas Científicas sobre Incêndios Florestais, Coimbra, 1988, vol. II, p. 5.1.-1 a 20.

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Os exemplos que se analisam reportam-se a duas situações diferentes.A primeira delas, tem em conta a evolução acelerada das vertentes, produzidapelas primeiras chuvas caídas depois do incêndio, evolução que pode serconsiderada normal nestas circunstâncias. A segunda, refere-se a uma situaçãomenos frequente que, como sucedeu, se pode registar mesmo decorrido algumtempo depois do fogo e que se refere a situações excepcionais, provocadas porprecipitações abundantes e concentradas.

Os casos analisados foram extraídos duma área onde, de 13 a 20 deSetembro de 1987, lavrou um violento incêndio que reduziu a cinzas cerca deonze mil hectares de floresta e mato nos concelhos de Arganil e de Oliveira doHospital.

Metodologia

O estudo dos diferentes exemplos analisados iniciou-se sempre porreconhecimentos de campo que permitiram mostrar a existência, ou não, daintensificação da erosão. Ao mesmo tempo, possibilitaram também localizarexactamente as situações detectadas e, ainda, avaliar a sua extensão.

A fim de obtermos uma visão de conjunto, sobrevoámos de helicópterotoda a área afectada. Tanto durante o voo como durante os trabalhos decampo, recolheram-se imagens dos factos mais salientes através de câmarasfotográficas e de vídeo.

Para análise de algumas situações concretas, recolhemos relatos minuciososdas pessoas que assistiram a esses acontecimentos ou que foram comprovadosindirectamente após a sua ocorrência.

Já no gabinete, para melhor compreender os mecanismos que terãocontribuído para acelerar os processos morfogenéticos, determinámos declivesdas vertentes (F. REBELO e A. CAMPAR DE ALMEIDA, 1986), analisámos tipos detempo (L. CUNHA, 1983), calculámos o valor de algumas das áreas maisafectadas e, simultaneamente, procedemos à análise morfométrica das baciasde drenagem nelas comprometidas (L. LOURENÇO, 1986-a). Por fim,representámos graficamente muitas dessas situações.

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Evolução das vertentes após as primeiras chuvas

As vertentes apresentam, na generalidade das serras de xisto, uma delgadacobertura de materiais detríticos, resultante da alteração das próprias rochas,motivo porque estas só raramente afloram à superfície.

Contudo, as grandes formas naturais de deposição observadas nessas serrasocorrem, em regra, na base das vertentes, onde as roturas de declive favorecema acumulação dos materiais que preencheram completamente muitos dosvaleiros serranos, acabando por regularizar algumas das vertentes tornando-aspraticamente rectilíneas.

A maioria desses depósitos foram formados à medida que as vertentes seiam afeiçoando, em climas muito diferentes dos actuais. Esses depósitos têm--se conservado ou têm evoluido muito lentamente, mercê da protecção que,em parte, a vegetação lhes oferece. Quando esta desaparece, queimada pelosincêndios florestais, aqueles são destruídos, pelo menos em parte e seriam levadospara os plainos aluviais de nível de base, geral ou local, se o homem, mais uma vez,não criasse roturas de declive artificiais propícias à deposição desses detritos.

Verificou-se que alguns dos efeitos erosivos são particularmentesignificativos nas áreas queimadas mais do que uma vez. Tal facto fica a dever--se a que quando ocorreu o primeiro fogo, os pinheiros mantiveram os seustroncos e grande parte dos ramos que reduziram o impacto directo das gotasda chuva. Por outro lado, uma parte significativa das folhas não costuma sertotalmente consumida pelo fogo. Assim, ao caírem, acabam por permanecersobre o solo, travando o arrastamento das partículas minerais e, deste modo,dificultam a acção erosiva, acabando por atenuar os seus efeitos.

Quando se trata de áreas queimadas pela segunda vez, num curto espaço detempo, as árvores não tiveram tempo para se desenvolverem e como, após oincêndio, todos os arbustos ficam completamente reduzidos a cinzas, nadapode impedir a actuação das forças erosivas. É nestas circunstâncias que osdiferentes processos erosivos actuam mais vigorosamente e é quando os seusefeitos ficam mais marcados na paisagem, especialmente quando os valores daprecipitação, caída imediatamente após o incêndio, são superiores aos valoresnormais para a época.

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Foi precisamente o que sucedeu com o incêndio de Arganil/Oliveira doHospital, cuja área, em grande parte, já tinha sido queimada em anosanteriores. Também a chuva que contribuiu para a sua extinção, continuou acair nos dias seguintes tendo-se registado em Coimbra, nos oito diasposteriores ao incêndio, 145,5 mm, ou seja, em oito dias caíram mais de97,9 mm do que o valor normal para todo o mês de Setembro (1951-80).Outubro continuou com muita pluviosidade, 201,4 mm, registando-se maisde 106,1 mm do que o valor normal no período acima referido.

Em função destes quantitativos anormais de precipitação, da sua posteriormanutenção e da total destruição da vegetação, uma grande parte da áreapercorrida por este incêndio, já antes reduzida a cinzas, acabou por serterrivelmente erosionada.

A intensificação da actuação dos processos erosivos na sequência dosincêndios florestais começou, normalmente, nos locais onde houveintervenção antrópica. O caso mais frequente relacionou-se com a abertura deestradas e caminhos para acesso à mata ou construídos exclusivamente paraextracção das madeiras queimadas e que, muitas vezes, foram abertoscompletamente ao acaso.

O carácter precário destes últimos, ou a falta de meios em relação aosprimeiros, levam a que sejam descuradas algumas das infraestruturasfundamentais para atenuar os efeitos erosivos. Assim, a não construção devaletas e dos correspondentes aquedutos origina a destruição das bermasassentes sobre os aterros e, algumas vezes, conduz mesmo à completadestruição dos caminhos, como nos foi dado observar nalgumas linhas de águaonde essas infraestruturas não foram tidas em conta.

Mas, mesmo quando existem, nem sempre se revelam suficientes para evitaros efeitos da acumulação dos detritos que, por sua vez, ao obstruirem as valetas,levam a que a água circule na estrada, desgastando o pavimento e destruindo aprópria berma.

O processo de destruição e entulhamento dos caminhos e estradas florestaisé simples, constituindo uma das fases de regularização das vertentes que tendea repor o perfil de equilíbrio, anterior à sua abertura, como se representaesquematicamente na fig. 1.

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Fig. 1 - Representação simplificada da evolução das vertentes nas proximidades das estradase caminhos florestais.

A - Situação inicial da vertente, antes da abertura da estrada;B - Perfil da vertente, após a construção da estrada;C - Rápida evolução do perfil da vertente provocada pelas águas pluviais depois de lhe ser retirada toda a vegetação.

1 - Erosão e transporte de material, a montante da estrada;2 - Deposição desse material na estrada;3 - Erosão na berma da estrada;

D - Perfil regularizado para que tenderia a evolução natural da vertente se, entretanto, o homem não interviesse.

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Na parte situada a montante da estrada dá-se erosão e transporte de material(fig. 1-A). A rotura de declive criada pelo talude e facilitada pelo contra decliveda valeta, acaba por levar à deposição de grande parte desse material na própriaestrada (fig. 1-B).

Concomitantemente, a água que atravessou o caminho ataca a berma,muitas vezes assente sobre aterros, iniciando o seu desmantelamento(fig. 1-C). Esse processo, a não ser interrompido pelo homem, terminaráquando se alcance um perfil de equilíbrio, próximo do inicial (fig. 1-D).

As situações mais frequentes ocorrem, pois, ao longo das estradas e doscaminhos florestais que, através de aterros e desaterros, interrompem o declivenatural da vertente e levam à deposição do material oriundo da parte superior.Frequentemente, formam-se sobre as valetas, na base dos desaterros, pequenoscones de dejecção que, consoante aumentam de volume, coalescem, unindo-seuns aos outros e tendendo a repor o equilíbrio natural da vertente se, entretanto euma vez mais, o homem não intervier retirando os materiais acumulados.

O reduzido diâmetro de algumas das infraestruturas, em particular dosaquedutos, bem como o seu fraco declive, podem contribuir para agravar,ainda mais, os efeitos da erosão. Muitas vezes, foram dimensionados paraapenas escoarem caudais normais, as afluências de vertentes cobertas devegetação, quando se deveria ter considerado também o aumento brusco queo módulo bruto sofre sempre que essa vegetação é totalmente destruída pelofogo. Nestas circunstâncias, associado ao próprio aumento de caudal, acorrente pode transportar restos de vegetação a até troncos de árvores queacrescem as possibilidades de obstrução dos referidos aquedutos.

Uma das situações mais complexas, vividas na sequência das primeiras chuvascaídas após o incêndio, foi a provocada pela ribeira do Vale Moleiro, a nascente dapovoação do Vale do Carro, onde cortou a estrada que de Coja vai para Esculca(fig. 2), deixando esta localidade sem qualquer tipo de acesso automóvel.

O afluxo de água e de carga sólida transportadas pela ribeira foramsuperiores ao dimensionamento das manilhas nela colocadas para o efeito peloque, não as podendo escoar na totalidade, levaram à formação de um regolfo amontante das mesmas (fig. 2-A). Segundo testemunhas locais a correntechegou mesmo a galgar a estrada (fig. 2-C), facilitando a sua destruição.

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Fig. 2 - Reconstituição provável dos acontecimentos que levaram ao corte da estrada Coja-Esculca.

A - Situação inicial, normal antes do incêndio; B - Formação do regolfo, por as manilhas nãoconterem o caudal da ribeira; C - A ribeira galga a estrada, contribuindo para a sua destruição;

D - Estado do corte, antes do começo das obras de reconstrução.

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A constituição do regolfo fez diminuir a competência da corrente, porperda de declive e, consequentemente, de velocidade, conduzindo à deposiçãode parte substancial da carga transportada.

A camada de lama abandonada a montante da estrada, sobre os camposcultivados, era constituída essencialmente por silte e argila que, nalguns locais,apresentava espessura superior a 20 cm. Este depósito parecia possuir, a avaliarpela coloração acinzentada, uma importante fracção constituída por cinza que,no entanto, as análises efectuadas não permitiram confirmar na totalidade.

Outra situação também e que, do mesmo modo, conduz à deposição dedetritos é devida à construção de barragens nos leitos dos principais riosserranos. A formação das respectivas albufeiras cria roturas de declive nasuperfície molhada que, por sua vez, originam a deposição de grande parte dosmateriais carreados pela corrente.

Desses materiais, os mais grosseiros, normalmente transportados porarrastamento, juntamente com grande parte das partículas de maior dimensão,transportadas em suspensão, são abandonados logo à entrada da albufeiracontribuindo para um rápido acréscimo dos derrames deltaicos sublacustres,de montante. Os detritos mais finos, por permanecerem mais tempo emsuspensão, espalham-se um pouco por toda a albufeira, podendo mesmo,quando de dimensão muito reduzida, ser descarregados, o que equivale atransporem a barragem para jusante (fig. 3).

Fig. 3 - Esquema típico da acumulação de sedimentos em albufeiras de regularização. Estão nestasituação a maior parte das albufeiras serranas cujo assoreamento natural é grandemente agravado

pelos incêndios florestais (Extraído de LENCASTRE E FRANCO, 1984, p. 377).

DESCARGADE

FUNDO

DESCARGA DEMEIO FUNDO

ÁGUA RELATIVAMENTE LIMPA

DETRITOS FLUTUANTES

AFLUÊNCIAS COM SEDIMENTOS

DELTA

FUNDO DA ALBUFEIRA

CORRENTE DE DENSIDADE

SEDIMENTOS FINOS

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A grande quantidade de detritos provenientes da evolução das vertentesimediatamente após os incêndios e, depois, da erosão dos solos preparadospara a reflorestação contribui para reduzir substancialmente o volume dessasalbufeiras e, ao mesmo tempo, diminui-lhes a própria vida útil. É evidente queo dimensionamento das albufeiras faz-se para condições normais de evoluçãodas vertentes. Sempre que essas condições se alteram, os transportes sólidospodem aumentar significativamente e, nessas circunstâncias, o volume mortodas albufeiras é preenchido com sedimentos muito mais depressa do que foraprevisto, acabando assim por encurtar a vida útil prevista para o funcionamentodessas barragens.

Outra actividade humana que também muito facilita a acção erosiva daságuas é a preparação dos terrenos para reflorestação, especialmente quando éfeita por processos mecânicos que envolvem a utilização de máquinas muitopesadas. É o caso das limpezas com lâmina e das gradagens, a quenormalmente se associam as ripagens que criam os sulcos onde se farão asplantações. A consequente movimentação dos solos e o remeximento dascamadas rochosas mais superficiais deixam grandes quantidades de partículasminerais e de pequenos fragmentos de rocha disponíveis para posteriormobilização pelas águas pluviais.

O trabalho executado pelas máquinas faz com que fiquem desagregadas,em poucas horas, muitas toneladas de material coeso. Se essa desagregaçãofosse feita pelos processos naturais de crioclastia e de termoclastia, em especialatravés das alterações introduzidas pela acção do gelo-degelo, as maisfrequentes nestas áreas nas actuais condições climáticas, seriam necessáriosalguns milhares de anos para que estas toneladas de material pudessem serpreparadas. O homem acelera, pois, muito rapidamente o que os processosnaturais levariam longo tempo a executar.

Outro exemplo de como o homem, conscientemente ou sem dar-se conta,contribui para o intensificar da erosão ocorreu quase um ano depois doincêndio. Embora a aceleração da erosão tivesse sido originada por processosnaturais, uma grande chuvada concentrada num curto espaço de tempo caídasobre vertentes desprovidas de vegetação, não teria tido consequências tãocatastróficas se o homem, desta vez encanando linhas de água, não tivesse

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actuado. Os acontecimentos registados na sequência dessa forte chuvadailustram como, mesmo depois de um período relativamente longo após oincêndio, a erosão das vertentes ainda pode ser intensificada como sequênciadaquele. Será essa situação que passaremos a analisar.

Evolução das vertentes na sequência da tempestade do dia 23 deJunho de 1988

O mês de Junho de 1988 foi muito propício à ocorrência de trovoadas naRegião Centro que, frequentemente, foram acompanhadas por intensasbátegas de água caídas, por vezes, em intervalos de tempo muito curtos, comosucedeu no dia 23, nas cabeceiras da ribeira de Pomares.

A situação sinóptica relativa a esse dia apresentava-se com uma depressãoem altitude que, em grande parte, terá sido responsável pelo estado de tempoque se fez sentir à superfície e que, de acordo com a previsão do InstitutoNacional de Meteorologia e Geofísica, apresentou períodos de céu muitonublado, vento geralmente fraco, aguaceiros e trovoadas em especial nasregiões do Norte e Centro, a partir da tarde.

Conscientes de que alguns destes fenómenos são extremamente localizados,mas atendendo a que na área afectada não existia nenhuma estaçãoclimatológica, tomámos para termo de comparação as estações mais próximasdo local: Coimbra, Penhas Douradas, Rego da Murta e Castelo Branco.Verificou-se que, em termos médios, tanto o valor das precipitações como onúmero de dias em que ocorreram foram muito superiores aos valores normaisdo mês de Junho. O mesmo sucedeu com o número de dias em que seregistaram trovoadas (QUADRO I).

Uma análise mais detalhada, feita aos valores diários de Junho de 1988,mostra que o dia 23 registou trovoada nas Penhas Douradas e em Coimbra, ondeos valores das precipitações também foram elevados, 33 e 18 mm, respectivamente,embora, com certeza, tenham sido bem superiores na área em estudo.

A pluviosidade voltou a ser intensa no dia 25 nas Penhas Douradas, 37 mm(QUADRO II), como também sucedeu na Sorgaçosa, mas foi mais espaçada no

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tempo e “encontrou o caminho livre”, pelo que já não causou tantos prejuízose teve acção erosiva menos preponderante.

Considerando que o temporal desabou com mais intensidade sobre a áreacompreendida entre o Cabeço da Chama e a Lomba da Malhada do Pai, comespecial incidência sobre o Cabeço da Sorgaçosa, admitindo que terão chovidomais de 12 mm do que nas Penhas Douradas(1) e imaginando essa precipitaçãohomogeneamente distribuída sobre as superfícies mais duramente atingidasque, por planimetragem, estimámos em cerca de 12,5 km2, teriam caído sobreelas, durante uma hora, mais de 560 mil metros cúbicos de água, o queequivale a cerca de dez mil metros cúbicos por minuto.

O escoamento deste caudal implicou um considerável aumento da alturada água das ribeiras, obrigando-as a transbordar e a inundar os camposmarginais. Os caudais afluiram na quase totalidade à ribeira de Pomares, ajusante da confluência da ribeira da Moura com a do Sobral (fig. 4), onde acheia foi particularmente sentida e onde causou enormes prejuízos.

Fonte: Normais climatológicas do Continente, Açores e Madeira correspondentes a 1931-60”, Clima dePortugal, fasc. XIII, S.M.N., Lisboa, 1965;

Instituto Nacional de Meteorologia e Geofísica, Lisboa (1988).

QUADRO I - Valores normais (1931-60) e valores observados em 1988,relativos ao mês de Junho

1 Este quantitativo é equivalente ao valor horário extremo da precipitação desde sempre registada emCoimbra, 45 mm. É bem provável que tenha sido alcançado no dia 23 de Junho porque se encontra700 metros mais elevada do que em Coimbra.

Estação e PeríodoPrecipitação Número de Dias Trovoada

(mm) ž 0,1 mm ž 1 mm ž 10 mm N.º de Dias

Coimbra 1931-601988

1931-601988

1931-601988

19881931-60

Penhas Douradas

Rego da Murta

Castelo Branco

37,7

816

8

152,666,8

254,732,0

155,022,312,2

-1525

143-4

6

6-318

1415

18

51

8

2

3102-27

15

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PD - Penhas Douradas; CO - Coimbra; CB - Castelo Branco; RM - Rego da Murta.Fonte: Instituto Nacional de Meteorologia e Geofísica.

QUADRO II - Valores diários da precipitação e observações de trovoada, nomês de Julho de 1988, no Centro de Portugal

A quantidade de água transportada pela ribeira de Pomares foi tãoimportante que, na confluência, “empurrou” o rio Alva, de água límpida,contra a margem direita e, como se isso não bastasse, as águas turvas e barrentasda ribeira de Pomares espraiaram-se à vontade, inundando a praia fluvial de Avô.

A cor das águas, na confluência da ribeira de Pomares com o rio Alva, emAvô, permite inferir a importância deste temporal e confirmar a sua localizaçãonuma área restrita, as cabeceiras da bacia hidrográfica da ribeira de Pomares.

A superfície afectada pela tempestade integra-se na margem esquerda dabacia hidrográfica do rio Alva e desenvolve-se pelas sub-bacias das ribeiras dePomares, de Aldeia e do Avelar, drenando esporões que arrancam da vertenteNorte da serra do Açor (L. LOURENÇO, 1986-a).

A parte mais duramente atingida, situa-se no sector intermédio da ribeira

11121314151617181920

21222324252627282930

22,04,0

14,010,0

0,128,011,0

6,00,00,0

24,00,0

33,00,4

37,00,00,02,0

13,019,0

2,013,0

2,06,04,0

22,09,0- -

0,00,0

6,00,0

18,00,06,00,0- -

7,015,0

4,0

5,01,0

21,06,03,09,04,00,30,0- -

12,0- -

3,00,1- -

17,00,20,0

19,010,0

- -- -- -- -- -- -- -- -- -- -

- -- -- -- -- -- -- -- -- -- -

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DiaPD CO CB RM PD CO CB RM

Precipitação (mm) Ocorrência de Trovoada

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de Pomares, seguindo um alinhamento definido pelas barrocas das Sobreiras,da Sorgaçosa, ribeira do Espinho e barroca das Fontes. Um segundo núcleo, demenor dimensão mas também severamente castigado, localiza-se nascabeceiras das ribeiras de Aldeia e do Avelar, a Ocidente e a Norte da Lombada Malhada do Pai (fig. 4).

Estas bacias hidrográficas encontram-se limitadas pelos esporões maisimportantes que, para Norte, se destacam da serra do Açor. Entre eles ouconstituindo suas digitações, encontram-se outros de menor significado queindividualizam algumas sub-bacias fluviais.

De modo geral, as vertentes apresentam declives acentuados e a sua análiseestatística mostrou que, nas três bacias hidrográficas em estudo, mais de 95%das vertentes possuem declives iguais ou superiores a 16%, mais de 85% têmdeclives iguais ou superiores a 24% e mais de 65% das vertentes desenvolvem-se com declives iguais ou superiores a 32%, sendo a classe dominante aquelaque compreende os declives situados entre 32 e 39,9%, abrangendo mais de30% do total das vertentes (L. LOURENÇO, 1988b, p. 49).

A análise morfométrica da rede de drenagem (CHRISTOFOLETTI, 1969 eSTRAHLER, 1981) veio confirmar as desigualdades detectadas numa simplesanálise quantitativa. A área da bacia hidrográfica da ribeira de Pomares, comcerca de 45 Km2, supera em muito a superfície das bacias das ribeiras de Aldeiae do Avelar, com perto de 6 e 8 Km2, respectivamente, pelo que a actuaçãomais vigorosa dos agentes erosivos nessa bacia, não será de admirar.

Do ponto de vista linear, a rede fluvial apresenta, logicamente, um grauhierárquico mais elevado na ribeira de Pomares, de ordem 5, do que nasribeiras de Aldeia e do Avelar, ambas de ordem 4. relativamente ao número eao comprimento dos canais passa-se, naturalmente, por uma situaçãosemelhante. Tanto o número de segmentos, como o seu comprimento, sãomuito superiores na ribeira de Pomares (L. LOURENÇO, 1988b, p. 51).

Mas, porque o número dos canais de ordem um depende,fundamentalmente, das características físicas da bacia de drenagem, os valoresobtidos reflectem essas características. Assim, os baixos valores encontradostraduzem características adversas à formação de canais elementares. Comefeito, trata-se de vertentes moldadas em rochas impermeáveis ou de

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permeabilidade reduzida, com declives acentuados, onde a água das chuvas,muitas vezes proveniente de aguaceiros violentos, começa por se escoar emlâmina de água mas que, depois, rapidamente se concentra. Nestas circunstâncias,a frequência dos talvegues elementares é reduzida pelo que as densidadeshidrográficas são baixas, ao mesmo tempo que os coeficientes de escoamentoe, por conseguinte, os de torrencialidade apresentam valores importantes.

A torrencialidade das bacias hidrográficas é um dos índices de maior cunhogeográfico, com particular significado em bacias hidrográficas pequenas, comoas analisadas, onde existe uma certa homogeneidade das características físicas(L. VIVAS, 1966). Obtem-se multiplicando a densidade hidrográfica peladensidade de drenagem e é tanto maior quanto menor for o valor do índiceobtido. Nos casos em análise obtiveram-se coeficientes de torrencialidadeelevados (Avelar - 31,8; Pomares - 47,4 e Aldeia - 47,7), particularmente naribeira do Avelar, devidos sobretudo aos acentuados declives das suas cabeceiras.

Se as características físicas destas bacias hidrográficas favorecem, de modogeral, a ocorrência de cheias, após a destruição da vegetação pelo incêndioflorestal essa tarefa ficou ainda mais facilitada. Assim, não é de admirar queuma tempestade, acompanhada de trovoada e de chuvas intensas, tenha originadouma cheia e, mais do que isso, que na sua passagem, as águas concentradas tenhamerosionado profundamente as vertentes e os solos dos campos por onde passaram.

A carga sólida arrancada e transportada foi de tal modo importante que,nalguns locais, modificou completamente a topografia dos leitos querentulhando poços profundos, pontões, represas, azenhas, quer ficandosimplesmente abandonada sempre que a velocidade da corrente diminuia.

A deposição de materiais teve consequências mais gravosas nos locais ondeantes, como referimos, tinha havido intervenção antrópica. Alguns dos canaisartificiais construídos pelo homem (valados, barrocos) ao ficarem entulhadosou obstruídos com troncos, obrigaram as águas a transbordar sobre os diquesde protecção, o que levou ao seu rebentamento e, depois, à erosão dos camposque o homem construira para cultivar. Noutros casos, as águas abandonaramsobre os campos a carga sólida que transportavam, deixando-os da mesmamaneira impróprios para a agricultura.

As estradas e caminhos florestais ficaram também muito danificados,

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chegando mesmo a ser intransitáveis e, por vezes, até foram completamentecortados nas linhas de água.

Os efeitos de destruição foram mais ou menos generalizados em toda a áreaafectada. Não só foram destruídas culturas em quase todos os campos situadosnas margens da ribeira de Pomares, entre o Sobral Magro e Avô, mas tambémalguns deles ficaram praticamente irrecuperáveis.

No entanto, os casos mais espectaculares ocorreram, como vimos, nassituações em que a intervenção antrópica, processada haverá entre 100 e 200anos, modificou a evolução natural das vertentes, através da construção dediques, para desvio das linhas de água que, entretanto, passou a utilizar comosolos aráveis, as “quelhadas”(2).

Mas, o homem não satisfeito com as suas “quelhadas”, continuou a alteraro equilíbrio das vertentes abrindo estradas, caminhos e, sem que o soubesse,chegando mesmo a construir casas nas linhas de água.

Aconteceu que as vertentes “resolveram retomar” a sua evolução natural eas consequências dessa atitude não se fizeram esperar. Os efeitos de destruiçãoforam mais espectaculares onde as águas rebentaram uma maior quantidadede diques(3), o que sucedeu nas imediações da Sorgaçosa e do Espinho.

Além disso, na Sorgaçosa, a enxurrada rebentou o rés-do-chão de uma casa,soterrou parcialmente uma camioneta de distribuição de refrigerantes queparara no largo para fazer descarga e arrancou do seu lugar um pontão debetão, com nove metros de comprimento, transportando-o umas dezenas demetros para jusante, deixando-o meio soterrado. No Agrual foi o pilar daponte que não suportou a fúria das águas e cedeu, ficando inclinado. EmPomares, a cheia afectou o campo de futebol e as piscinas e também abalouuma ponte do século XVII. Por fim, em Avô, levou uma ponte pênsil.2 Designação local para os socalcos.3 A maior parte dos diques rebentou por falta de limpeza. A diminuição da população e o consequente

abandono de muitos campos levou a que fossem descuidadas ou até mesmo abandonadas algumasnormas de limpeza, tanto na mata como nas linhas de água naturais e artificiais que os contornam. Asconsequências desastrosas desse procedimento têm sido por demais evidentes no caso da floresta, dadoque facilitam extraordinariamente a progressão dos incêndios ao mesmo tempo que dificultam o seucombate. Nas linhas de água surgem esporadicamente, aquém e além, alguns indícios de como a faltade limpeza dos canais fluviais pode produzir efeitos catastróficos, em especial no que concerne àerosão dos campos que as marginam.

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Fig. 4 - Esboço de localização da área afectada pelo incêndio de Setembro de 1987 e pelatempestade de Junho de 1988.

1. limite da área queimada; 2. área afectada pelo temporal de Junho; 3. área onde os efeitoserosivos mais se fizeram sentir.

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Conclusão

A aceleraração da erosão em consequência dos incêndios florestais ficou adever-se, essencialmente, à falta de vegetação.

É bem conhecido o papel que não só as copas das árvores, mas também ascoberturas arbustivas e herbáceas e, ainda, a própria manta mortadesempenham na intercepção da precipitação. Ao reduzirem a energia cinéticadas gotas de água da chuva, antes de estas atingirem a superfície, contribuempara o decréscimo da sua acção erosiva sobre os solos.

De facto, se tivermos em conta que grande parte da energia cinética de cadagota de água da chuva ou é absorvida pela vegetação ou, quando a coberturavegetal não existe, é utilizada para desagregar a estrutura dos solos,compreende-se melhor porque é que, no essencial, atribuímos os efeitos destatempestade à inexistência de vegetação e porque damos especial relevo aoimportante papel que esta desempenha como atenuante dos efeitos erosivos,particularmente daqueles que são provocados pelas chuvas intensas.

Assim, como os solos se encontravam desprovidos de vegetação, sobretudoarbustiva, o embate directo da água das gotas da chuva gerou, sobre eles, achamada erosão por salpicos, ou seja, levantou pequenas quantidades dematéria orgânica e de partículas minerais que ficaram disponíveis para seremtransportadas.

A resistência ao escoamento, provocada pelo atrito que as águas pluviaissofreriam ao escorrer pela vegetação, também foi eliminada com a falta desta,logo, a retenção ou, pelo menos, o retardamento do escoamento dessas águasdiminui e, concomitantemente, reduziu-se a infiltração.

Mas, a falta de vegetação, só por si, não acelera a erosão. São tambémnecessários quantitativos elevados de pluviosidade e, de preferência,concentrados no tempo.

A situação ideal para aumentar a intensidade da actuação dos processosmorfogenéticos resulta da conjugação da falta de vegetação com a ocorrênciade precipitações abundantes e concentradas e, ainda, com a existência de fortesdeclives o que, nas serras, se verifica frequentemente depois da ocorrência deincêndios florestais.

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Nestas circunstâncias, o escoamento inicial começou por se fazer em lâminade água, mas rapidamente passou a ser difuso e à medida que se foiorganizando, concentrou-se nas linhas de água. Os efeitos erosivos destes tiposde escoamento foram, naturalmente, diferentes. A erosão por salpicosdependeu, essencialmente, da velocidade e da massa da gota de água,enquanto que a acção erosiva duma lâmina de água deveu-se, sobretudo, à suaaltura e ao declive da vertente sobre que se deslocou.

Como os declives das vertentes são muito elevados, estiveram reunidas ascondições ideais para que os agentes erosivos nelas actuassem com toda a suaintensidade. Conforme o escoamento se foi tornando mais organizado, tantoo volume de água escoado como a quantidade de materiais transportados, acarga sólida, foram aumentando considerável e progressivamente, crescendocom eles o poder erosivo das correntes.

Deste modo, os processos morfogenéticos começaram por actuar nasvertentes, arrancando-lhes a sua parte mais superficial, normalmenteconstituída por solos pouco profundos. À medida que as águas se foramconcentrando, os caudais - líquido e sólido - aumentaram e, ao mesmo tempo,a força viva das correntes foi crescendo, pelo que os efeitos erosivos maisvisíveis, onde a intensidade de actuação dos agentes foi maior, foramprovocados pelas águas concentradas nas ribeiras da Sorgaçosa, do Espinho ede Pomares.

Agradecimento

O autor deseja exprimir o seu vivo agradecimento ao Prof. Doutor PadreAntónio Nogueira Gonçalves pela disponibilidade e pela maneira cordial eafável com que sempre nos recebeu na sua casa da Sorgaçosa, bem como aosenhor José Maria Diogo que, também na Sorgaçosa, nos conduziu aos locaisonde os efeitos erosivos foram mais surpreendentes.

Aos Profs. Doutores Fernando Rebelo e Domingos Xavier Viegas, agradeceo incentivo e o acompanhamento dados durante a realização deste estudo.

Ao Dr. Joaquim Loureiro agradece a colaboração prestada na análise

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quantitativa da rede fluvial e ao Dr. António Afonso Pinheiro Gonçalves oempenho e o esforço colocados na obtenção das fotografias tiradas durante acheia. Aos fotógrafos amadores que as obtiveram bem como ao senhorFrancisco Cruz, Director da Comarca de Arganil, agradece a cedência defotografias.

Ao motorista, senhor António Bento Ferreira e ao operador de câmaravídeo, Carlos Alberto Silva, fica grato pelos trabalhos realizados e pelacompanhia efectuada durante as jornadas em que se procedeu ao trabalho decampo. A Fernando Coroado e a Victor Hugo Fernandes agradece a execuçãodas figuras.

Por fim, dado que os trabalhos que lhe serviram de base se inserem noProjecto de Investigação sobre Incêndios Florestais, em curso no Grupo deMecânica dos Fluidos da Universidade de Coimbra, agradece-se às diversasentidades que o subsidiam e em especial às que nele intervieram maisdirectamente: Comissão Nacional Especializada de Fogos Florestais, ServiçoNacional de Bombeiros, Força Aérea Portuguesa, Instituto Nacional deMeteorologia e Geofísica e Instituto Geofísico da Universidade de Coimbra.

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