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EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS DIFUSOS E COLETIVOS: AÇÃO CIVIL PÚBLICA

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EFETIVAÇÃO DOS DIREITOSDIFUSOS E COLETIVOS:AÇÃO CIVIL PÚBLICA

ANA CLAUDIA SCHWENCK DOS SANTOS

Professora. Mestre em Direito Político e Econõmico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.Especialista em Direito Civil (Mackenzie), Direito do Trabalho pela Faculdade São Paulo (FACSP) e

Direito Empresarial pela Faculdade Autonoma de Direito (FADISP)

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Índice para catálogo sistemático:

EDITORA LTDA.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

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Rua Jaguaribe, 571CEP 01224-001São Paulo, SP — BrasilFone (11) 2167-1101www.ltr.com.brFevereiro, 2013

Todos os direitos reservados

Santos, Ana Claudia Schwenck dosEfetivação dos direitos difusos e coletivos :ação civil pública / Ana Claudia Schwenck dosSantos. — São Paulo : LTr, 2013.

1. Ação civil — Brasil 2. Efetividade3. Interesses coletivos (Direito) 4. Interessesdifusos (Direito) I. Título.

12-13680 CDU-347.44:347.922(81)

1. Brasil : Efetivação dos direitos difusos ecoletivos : Ação civil pública : Processocivil 347.44:347.922(81)

Versão impressa - LTr 4725.6 - ISBN 978-85-361-2433-9

Versão digital - LTr 7516.0 - ISBN 978-85-361-2452-0

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Dedico este trabalho a Angela, Alberto e Adriana, porrepresentarem a grande motivação que me anima, e aosmeus mestres que, com seu saber, aprimoraram o meu.

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Agradeço a todos os meus mestres pelos ensinamentos, ao orientadorProf. Dr. Gianpaolo Poggio Smanio, Prof. Dr. Pedro Henrique Demercian,

Profª Dra. Clarice Seixas Duarte, Prof. Dr. Lauro Luiz Gomes Ribeiro,Profª Dra. Patrícia Tuma M Bertolin, Prof. Dr. Sergio Seiji Shimura,

Prof. Dr. Nelson Mannrich e Profª Dra. Sônia Yuriko Kanashiro Tanakapelas diretrizes e conteúdo acadêmico.

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Uma coisa não é justa porque é lei,mas deve ser lei porque é justa.

Barão de Montesquieu

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SUMÁRIO

Prefácio — Gianpaolo Poggio Smanio ............................................................................. 13

Introdução ..................................................................................................................... 15

1. Direitos transindividuais .......................................................................................... 17

1.1. Conquista da cidadania ...................................................................................... 17

1.2. Dimensões de direitos ........................................................................................ 20

1.3. Direitos coletivos lato sensu .................................................................................. 25

1.4. Princípios que regem a tutela coletiva e difusa .................................................. 29

1.4.1. Princípio do acesso à justiça e participação social .................................. 32

1.4.2. Princípio da duração razoável do processo .............................................. 33

1.4.3. Princípios da isonomia, economia processual, flexibilidade procedimen-tal e máxima eficácia ............................................................................... 33

1.4.4. Princípio da tutela coletiva adequada ...................................................... 35

1.4.5. Princípio da motivação específica ........................................................... 35

1.4.6. Princípio da publicidade .......................................................................... 36

1.4.7. Princípio do dever da colaboração........................................................... 36

1.4.8. Princípio da preferência ........................................................................... 36

2. Efetividade ................................................................................................................. 38

2.1. Propostas para a ampliação da eficácia .............................................................. 42

3. Ministério Público e sua atuação nos direitos difusos ............................................ 47

3.1. Origens históricas do Ministério Público ........................................................... 48

3.1.1. Ministério Público como defensor dos interesses da administração ....... 49

3.1.2. Ministério Público como promotor da persecução penal ........................ 50

3.1.3. Ministério Público como defensor dos interesses da sociedade civil ...... 51

3.2. Estrutura constitucional do parquet nacional ..................................................... 53

3.3. Princípios institucionais ..................................................................................... 55

3.3.1. Princípio da unidade ................................................................................ 56

3.3.2. Princípio da indivisibilidade .................................................................... 56

3.3.3. Princípio da independência funcional ..................................................... 57

3.3.4. Princípio do promotor natural ................................................................. 57

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3.4. Garantias e impedimentos dos membros ........................................................... 58

3.5. Funções do Ministério Público no Brasil ........................................................... 59

4. Efetividade da tutela no inquérito civil ..................................................................... 62

4.1. Instrumentos de investigação ............................................................................. 64

4.2. Termo de ajustamento de conduta no inquérito civil ........................................ 65

5. Efetividade da tutela na Ação Civil Pública .............................................................. 75

5.1. Obrigatoriedade da Ação Civil Pública .............................................................. 75

5.2. Efetividade da atuação do Ministério Público ................................................... 76

5.3. Termo de ajustamento de conduta na Ação Civil Pública ................................. 80

5.4. Sentença mandamental ....................................................................................... 85

6. Ação Civil Pública e Ministério Público ................................................................... 87

6.1. Legitimidade do Ministério Público ................................................................... 87

6.2. Fase de conhecimento ........................................................................................ 89

6.3. Recursos na Ação Civil Pública .......................................................................... 97

6.3.1. Reexame necessário ................................................................................. 100

6.4. Fase de execução ................................................................................................ 105

6.5. Execução específica ............................................................................................ 107

Conclusão ................................................................................................................ 111

Bibliografia .................................................................................................................... 115

Anexo A — Anteprojeto de código brasileiro de processos coletivos ........................ 123

Anexo B — Projeto de Lei n. 5.139/2009 ...................................................................... 140

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PREFÁCIO

É com enorme satisfação que prefacio o presente livro de Ana ClaudiaSchwenk dos Santos sobre a efetivação dos direitos difusos e coletivos em nossopaís e a Ação Civil Pública. Aluna brilhante que tive o prazer de orientar em seumestrado na Universidade Presbiteriana Mackenzie, cuja pesquisa sobre o temaestudou e sistematizou aspectos muito importantes da tutela processual coletiva.

Inicialmente, anoto sua percepção da importância da tutela dos direitosdifusos e coletivos como proteção da sociedade, a partir de seu desenvolvimentona segunda metade do século passado e no presente século, revestindo o livrode atualidade e relevância jurídica e social.

A cidadania brasileira, conceituada como um dos fundamentos do EstadoDemocrático de Direito, conforme o art. 1º, inciso II, da Constituição Federal,reclama aprofundamento jurídico para que a garantia de direitos não seja apenasuma formalidade, mas passe a contar com efetivação que atenda as pessoas emsuas vidas cotidianas. Este trabalho busca analisar e estudar também estas questões.

Ao contrário de muitas obras que analisam mecanicamente os institutosjurídicos, esta apresenta análise focada na finalidade e na estrutura processualdos mecanismos da proteção coletiva, verificando suas diferenças com o processocivil tradicional, voltado para a proteção dos interesses individuais. Isto semperder de vista o necessário estudo da legislação em vigor, sobretudo da açãocivil pública, principal instrumento processual da tutela coletiva.

A partir da visão histórica dos institutos, anota a autora que os mecanismosprocessuais de proteção aos direitos difusos e coletivos eram insuficientes até aedição da Lei da Ação Civil Pública (Lei n. 7.347/85). O sistema processualentão vigente não atendia aos reclamos sociais de efetivação de direitosambientais, de habitação e urbanismo, do consumidor, da infância e juventudee de tantos outros, chamados de novos direitos, que a segunda metade do séculovinte apontava como indispensáveis para o desenvolvimento econômico e socialdo país.

A Constituição Federal de 1988 consagrou a Ação Civil Pública como oprincipal instrumento da efetivação destes direitos, ao dispor expressamentesobre ela e conferindo legitimidade constitucional para o Ministério Públicoutilizá-la, como guardião do regime democrático e dos direitos e garantiasfundamentais da cidadania.

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O presente trabalho também analisa o Ministério Público dentro destaperspectiva da proteção dos direitos difusos e coletivos através da Ação CivilPública, buscando esclarecer suas atribuições e precisar sua atuação processual.Desde a Lei da Ação Civil Pública, a Instituição do Ministério Público tambémrecebeu enfoque diverso da tradicional persecução penal, passando a ter poderese legitimidade para a defesa dos direitos difusos e coletivos, inclusive commecanismo de investigação próprio, através do Inquérito Civil, também reguladona referida legislação e estudado neste livro.

Também são estudados na presente obra os princípios da tutela coletiva,estudo necessário para que a lei da ação civil pública possa encontrar seusfundamentos e valores, legitimando seus institutos processuais e as soluçõeslegais encontradas para os problemas jurídicos trazidos pela nova modalidadede ação. Como tratar a legitimidade processual, a competência judicial, a coisajulgada e, enfim, as relações jurídicas decorrentes do processo civil coletivo,sem ferir direitos, assegurando o devido processo legal, é análise obrigatóriapara todos os estudiosos do tema e a autora não foge do tratamento de qualquerdestes temas, dando importante contribuição.

Como vimos, os principais aspectos de tão relevante tema para a culturajurídica de nosso país encontram estudo aprofundado e relevante neste livro, oque o torna leitura necessária aos alunos e profissionais que se dedicam a estaárea de ensino.

Termina a autora formulando propostas para ampliação da eficácia datutela processual coletiva que realizamos atualmente, demonstrandoconhecimento de nossos institutos jurídicos e de nossa realidade judiciária, alémda coragem necessária para ousar propostas de reformulação, o que dáatualidade ao livro e aumenta seu valor sobremaneira.

Temos, assim, convicção de que a publicação deste livro acrescenta àsnossas letras jurídicas importante análise dos temas aqui tratados e que todosos que lerem suas páginas terão acrescido seu conhecimento e cultura sobre aproteção dos chamados direitos transindividuais.

Gianpaolo Poggio SmanioProcurador de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo.

Professor Doutor dos Cursos de Mestrado e Doutoradoda Universidade Presbiteriana Mackenzie.

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INTRODUÇÃO

A sociedade, ao longo do tempo, passou a contar com número expressivode direitos inerentes à condição de indivíduo dos seus membros. A ligaçãoexistente entre o indivíduo e a sociedade fez surgir a cidadania (direitos eobrigações que regem essa relação).

Integra o conceito de cidadania o conhecimento pelos indivíduos de seusdireitos em sociedade e o modo de exercício deles. Aqueles direitos que ultrapassama esfera do indivíduo e passam a atingir um grupo deles ou a coletividade englobamos direitos da cidadania e são chamados de transindividuais.

As instituições de ensino desempenham papel importante para o cidadãopor instruí-lo a respeito de seus direitos e, com isso, torná-lo apto a exercer odireito de acesso à justiça e, por meio dele, pleitear os demais direitos transindividuaisem juízo.

A divulgação dos direitos a que as pessoas têm direito aumentou,consideravelmente, o número de demandas judiciais fundadas na mesma situaçãofática.

O grande número de processos judiciais sobre a mesma situação fez surgiro interesse em agrupá-los todos em uma demanda coletiva para propiciar oexercício do direito pelos titulares em conjunto. Foi nesse momento que seidentificou a carência existente no direito processual para a tutela coletiva e aconsequente necessidade de novas normas a respeito do processo coletivo.

O processo é instrumento de defesa dos direitos transindividuais na medidaem que garante tanto a prevenção à violação do direito quanto a repressão dainfração à lei ocorrida. Daqui a necessidade do Anteprojeto de Código Brasileirode Processos Coletivos, que prevê disposições específicas para a tutela coletiva,inclusive, com princípios próprios (mais específicos que os do processo comum)aptos a produzirem a execução específica do julgado em sede de processocoletivo.

A ação civil pública surgiu (com a Lei n. 7.347/85) com a finalidade deproteger direitos de toda a coletividade em conjunto com o Código de Defesado Consumidor (Lei n. 8.078/90). Ambas as leis, unidas, formam o microssistemade processo coletivo.

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Em que pese o fato de o Brasil já contar com um microssistema de processocoletivo, há muitas disposições que merecem ser revistas, alteradas e adicionadaspara a tutela coletiva tocar no objetivo de produzir o resultado prático (efeito)querido pelo autor com a demanda.

A presente pesquisa tem o escopo de analisar a atual situação da efetividadede direitos difusos e coletivos e propor medidas de efetividade para potencializaro fixado nos dispositivos do Anteprojeto de Código Brasileiro de ProcessosColetivos.

O estudo analisa mecanismos aptos a conduzir à efetividade da tutela coletivae, para isso, verifica os relatórios de atuação do Ministério Público, que é ocolegitimado mais atuante na seara da defesa dos direitos difusos e coletivos.

Dentre os mecanismos de que se vale o Ministério Público para a tutela dedireitos difusos e coletivos, estudaremos os mais importantes na atuaçãoextrajudicial e na judicial, quais sejam, o inquérito civil e a ação civil pública.Ambos contam com a possibilidade de celebração de termo de ajustamento deconduta; destarte verificaremos a situação atual da atuação ministerial ebuscaremos alguma tendência para o futuro.

O presente estudo não deixa de abordar aspectos peculiares inerentes àação civil pública, como é o caso do reexame necessário em sede de tutela dedireitos difusos e coletivos.

A pesquisa destaca as características especiais da execução nas tutelascoletivas e diferencia as execuções possíveis nesse tipo de demanda, com ênfasenos mecanismos coercitivos existentes à disposição do juiz.

O presente trabalho mostra-se de grande importância para a ciência doDireito, pois trata de analisar a atuação do Ministério Público na busca pelatutela de direitos difusos e coletivos, de destacar e esclarecer modos de cumprira sentença da ação civil pública com a maior efetividade, inclusive propondomedidas de maior eficácia para o Anteprojeto de Código Brasileiro de ProcessosColetivos.

A importância social deste trabalho é demonstrar como a tutela alcançadapor uma Ação Civil Pública (ACP) pode atingir o maior número de cidadãospossível e beneficiá-los com ela. O momento da execução da sentença da ACPdeve receber atenção diferenciada, pois nele a tutela é efetivamente concedidae materializa o direito pleiteado na realidade dos titulares dele.

Tais fatos e estudos doutrinários tornam relevante a realização da pesquisapor ter esta o intento de especificar meios de efetividade da tutela analisada.

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1DIREITOS TRANSINDIVIDUAIS

1.1. CONQUISTA DA CIDADANIA

Cidadania deriva do latim civitas, que significa cidade. Trata-se de direitose deveres de um indivíduo perante a sociedade em que vive. Cidadania é odireito político de participar da vida política do país em que a pessoa reside.Ademais, indica a “qualidade da pessoa que, estando na posse de plena capacidadecivil, também se encontra investida no uso e gozo de seus direitos políticos, queindicam, pois, o gozo dessa cidadania.”(1)

A cidadania passou por diversas mudanças ao longo da história paraalcançar o conceito que possui atualmente. Analisaremos essas mudanças,sucintamente, em dimensões(2) da cidadania.

A primeira dimensão da cidadania envolve a relação existente entre súditoe soberano, à época considerada verticalmente — apenas entre o detentor dopoder e os obrigados a obedecer. O cidadão possuía direitos limitativos do poderdo soberano, que devia àquele justiça e proteção. Era considerado cidadão todofilho de cidadão (ius sanguinis) que nascesse no Estado.

A segunda dimensão da cidadania caracterizou-se pelo entendimento deque a submissão voluntária do indivíduo ao Estado em troca de proteção ejustiça o transformava em um cidadão. As leis — iguais para todos —concretizavam a submissão. Nesse momento, “o cidadão como indivíduodetentor de direitos subjetivos consolida o Estado Absoluto do século XVII”.(3)

Já a terceira dimensão da cidadania rompe com a perspectiva consideradapelas outras anteriores ao adotar uma perspectiva horizontal por conta da uniãodos cidadãos para a formação de um Contrato Social criador do Estado. Aqui,verifica-se a diferença essencial existente entre a segunda e a terceira dimensões,

(1) SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. Atualizadores: Nagib Slaibi Filho e Gláucia Carvalho.Rio de Janeiro: Forense, 2010. p. 287.(2) SMANIO, Gianpaolo Poggio. As dimensões da cidadania. Revista da Escola Superior do MinistérioPúblico (ESMP). Ano 2. jan./jun. 2009, p. 13-23.(3) Op. cit., p. 14.

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porque naquela o contrato social era fruto da submissão voluntária (Hobbes(4)),e nesta ele é fruto de uma união de interesses dos cidadãos na criação do Estadocomo ente protetivo através do contrato social (Rousseau(5)). A cidadaniaadquiriu viés universal, político e horizontal com a maior participação do cidadãono Estado.

Seguindo a linha do tempo, vieram as revoluções burguesas (RevoluçãoInglesa, século XVII; Revolução Americana, século XVIII; Revolução Francesa(6),século XVIII), que marcaram o surgimento da cidadania liberal. A cidadanialiberal teve como alicerces a participação política, a igualdade, a nacionalidadee os direitos naturais do homem. O liberalismo — cenário em que surgiu acidadania liberal — é destacado por algumas características interessantementeevidenciadas por Gianpaolo Poggio Smanio:(7)

A nova ordem social é baseada no “modelo individualista hobbesiano”e na obtenção do lucro, com novos sujeitos sociais, além da ideia daformação do Estado através de um pacto consensual entre osindivíduos. Pacto que permitiria a construção da conceituação jurídicade institutos que protegerão o indivíduo da própria ação do Estado.

O liberalismo colaborou para um avanço importante que foi oreconhecimento dos direitos fundamentais do indivíduo, entretanto a cidadanianão era plena, o exercício dos direitos a ela inerentes era vedado aos analfabetos,mulheres e pobres, fato determinante para o surgimento de classes econômicasdiferentes entre si e, inclusive, escravidão.

A cidadania observada durante o período liberal era conceituada como“um status concedido pelo Estado aos seus membros, sendo seus beneficiáriosiguais em direitos e obrigações”(8), e assegurava aos cidadãos o direito políticode participar das decisões estatais através do direito de votar e ser votado,apesar de não assegurar nenhuma garantia social a mais para o cidadão. Essapostura quanto à cidadania foi alvo de muitas críticas e discussões ao longo dosséculos XIX e XX até culminar com a saturação do conceito liberal de cidadania,verificado atualmente, no século XXI.

A dimensão da cidadania observada após a cidadania liberal trouxe umdiferencial interessante, que é a inclusão social. Enquanto a cidadania liberal

(4) HOBBES, Thomas. Do cidadão. 3. ed. São Paulo: Martins, 2002. p. 35.(5) ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social. São Paulo: Companhia das Letras, 2011. p. 37.(6) Os ideais defendidos tanto pela Revolução Francesa (liberdade, igualdade e fraternidade) foramassociados às dimensões de direitos fundamentais gradativamente positivados, conforme será abordadono decorrer do capítulo 1º da presente pesquisa.(7) SMANIO, Gianpaolo Poggio. As dimensões da cidadania. Revista da Escola Superior do MinistérioPúblico (ESMP). Ano 2. jan./jun. 2009, p. 15.(8) SMANIO, Gianpaolo Poggio. As dimensões da cidadania. Revista da Escola Superior do MinistérioPúblico (ESMP). Ano 2. jan./jun. 2009, p. 17.

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restringia o exercício de direitos, a cidadania inclusiva não só assegurava o exercíciode direitos a todos como respeitava as diferenças existentes entre cada indivíduo(multiculturalidade). Nesse sentido, esclarece Gianpaolo Poggio Smanio(9):

[...] a multiculturalidade também trouxe a fragmentação dos valores,interesses e conhecimentos, fazendo necessário o reconhecimentodas divergências, como inerente ao exercício de direitos.

Neste quadro social, a complexidade de interesses torna relevante aintermediação dos conflitos cada vez mais constantes e intensos. Osprincípios jurídicos fundamentais referentes à cidadania devempressupor mecanismos jurídicos para realizar esta intermediação.

Esta intermediação jurídica faz-se importantíssima para garantir umconsenso mínimo a respeito de valores e comportamentos, a fim depermitir uma convivência social pacífica dentro da mesma comunidadepolítica.

A evolução da cidadania envolve o amplo acesso ao judiciário, às decisõespolíticas do Estado e o exercício dos direitos sociais pelos cidadãos, característicada cidadania do século XXI. O desenvolvimento de políticas públicas voltadas asanar desigualdades socioeconômicas colabora para a cidadania de inclusão,tendo como base a solidariedade dos membros da comunidade.

A importância da solidariedade na cidadania é o seu condão de colocar osindivíduos em união de propósitos para a defesa de interesses comuns e contraa exclusão da cidadania, por afirmar uma cidadania coletiva.

No século XXI, o antigo entendimento baseado no contrato social émodificado e passa a basear-se em um contrato constitucional que asseguradireitos fundamentais aos indivíduos, não só dentro do Estado em que possuemnacionalidade, mas em qualquer Estado como se todos os indivíduos tivessemassinado o contrato constitucional.

Os direitos fundamentais contam com duas espécies que merecem destaquepor terem de ser assegurados pelo Estado constitucional: os direitos da cidadaniae os direitos humanos.

Gianpaolo Poggio Smanio(10) esclarece acertadamente a cidadania ao afirmarque:

A cidadania pressupõe a liberdade para o exercício dos direitosfundamentais. A cidadania é uma condição da pessoa que vive em

(9) SMANIO, loc. cit.(10) SMANIO, Gianpaolo Poggio. As dimensões da cidadania. Revista da Escola Superior do MinistérioPúblico (ESMP). Ano 2. jan./jun. 2009, p. 20.

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uma sociedade livre. Onde há tirania não existem cidadãos. A cidadaniapressupõe a igualdade entre todos os membros da sociedade, paraque inexistam privilégios de classes ou grupos sociais no exercício dedireitos.

O alcance da cidadania pela sociedade requer um ordenamento políticoadequado a garantir os direitos inerentes à cidadania e, para isso, são necessáriaspolíticas públicas pautadas na cidadania e que envolvam todas as dimensõesdesta.

As mudanças ocorridas na sociedade, ao longo do tempo, determinaramadaptações legais para propiciar a tutela dos direitos a que fazem jus os membrosda sociedade. Esses direitos elementares e essenciais à manutenção da dignidadehumana são chamados de direitos fundamentais.(11)

1.2. DIMENSÕES DE DIREITOS

Os direitos fundamentais são expressos na Constituição Federal como meiode assegurar-lhes proteção e por conta disso são a base e o fundamento doEstado por estar este condicionado ao previsto na própria Constituição Federal.A esse respeito afirma Ingo Wolfgang Sarlet(12) que:

[...] os direitos fundamentais constituem, para além de sua funçãolimitativa do poder (que, ademais, não é comum a todos os direitos),critérios de legitimação do poder estatal e, em decorrência, da própriaordem constitucional, na medida em que ‘o poder se justifica por epela realização dos direitos do homem e que a ideia de justiça é hojeindissociável de tais direitos’.

Cumpre ressaltar que os direitos fundamentais representam a positivaçãoconstitucional de valores básicos e, por isso, compõem — com os princípiosestruturais e organizacionais presentes na Constituição Federal — o núcleosubstancial do ordenamento jurídico do Estado constitucional democrático, quedeve contar com essas vinculações materiais. Ademais, merecem destaque oschamados direitos fundamentais sociais, que asseguram direitos aostrabalhadores, direitos a prestações sociais pelo Estado e constituem, segundoIngo Wolfgang Sarlet(13), “exigência inarredável do exercício efetivo dasliberdades e garantia da igualdade de chances (oportunidades), inerentes à noção

(11) Destaque-se que a própria dignidade da pessoa humana é um direito fundamentalconstitucionalmente previsto.(12) SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 6. ed. Porto Alegre: Livraria doAdvogado, 2006. p. 71.(13) SARLET, Ingo Wolfgang. Op. cit., p. 73-74.

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de uma democracia e um Estado de Direito” cujo conteúdo seja direcionadopela justiça material e não só formal.

Os direitos fundamentais, como um todo, surgiram em momentos históricosdiversos e sofreram modificações; desses fatos decorrem as chamadas geraçõesou dimensões de direitos fundamentais.

A respeito da correção dos termos geração e dimensão, há entendimentosdiversos na doutrina. O termo geração remete à sucessão (a geração posteriorsubstitui a anterior), e não à acumulação progressiva como ocorre com os direitosfundamentais.(14) Já o termo dimensão está ligado à ideia de direitos diferentesentre si (grau maior ou menor de influência de certo direito) para parte dadoutrina. Entendemos adequado, como a maioria da doutrina, o uso do termodimensão por evitar o entendimento de que os direitos fundamentais se substituementre si quando, na verdade, eles aumentam progressiva e complementarmente.

O entendimento doutrinário a respeito do conteúdo de direitos de cadadimensão é pacífico, todavia o número existente hoje de dimensões de direitosfundamentais é objeto de interessante discussão. Três dimensões sãopacificamente consideradas.

A primeira dimensão de direitos fundamentais está relacionada ao ideal doindividualismo — século XVIII — e apresenta-se como defesa dos indivíduosperante o Estado. Os direitos surgidos nessa dimensão têm como principalcaracterística serem direitos negativos(15), porque voltados a uma abstenção,um limite à intervenção estatal.(16)

Os direitos fundamentais de primeira dimensão são assim chamados,porque foram os primeiros direitos fundamentais a serem positivados.(17)

Integram os referidos direitos os direitos à vida, à liberdade, à igualdade e àpropriedade que, posteriormente, foram ampliados, envolvendo liberdades deexpressão coletiva, direitos de participação política (evidenciando a relaçãoexistente entre os direitos fundamentais e a democracia), direito à igualdadeformal — perante a lei — e garantias processuais.

(14) A esse respeito Ingo Wolfgang Sarlet. A eficácia dos direitos fundamentais, 2006. p. 54, fazreferência à “fantasia das chamadas gerações de direitos” que leva à imprecisão terminológica e aoentendimento errôneo de que os direitos fundamentais se substituem no tempo.(15) Conforme a classificação de Jellinek. Jellinek, no final do século XIX, desenvolveu a doutrina dosquatro status do indivíduo perante o Estado: passivo (o indivíduo subordina-se ao Estado, possuideveres perante este); negativo (o homem é livre perante o Estado); positivo ou status civitatis (oindivíduo pode exigir do Estado a atuação positiva na prestação); ativo ( o indivíduo pode influenciarnas decisões do Estado através do exercício do direito do voto, por exemplo).(16) SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 6. ed. Porto Alegre: Livraria doAdvogado, 2006. p. 56.(17) MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet.Curso de direito constitucional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 233.