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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal Nuno Alexandre Soares de Almeida Porto, 2009

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Em busca da conformidade entre o Modelo de

jogo do treinador e a performance da equipa em

Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de

Portugal

Nuno Alexandre Soares de Almeida

Porto, 2009

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Em busca da conformidade entre o Modelo de

jogo do treinador e a performance da equipa em

Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de

Portugal

Monografia realizada no âmbito da disciplina

de Seminário do 5º ano da Licenciatura em

Desporto e Educação Física, na opção de

Futebol, na Faculdade de Desporto da

Universidade do Porto

Orientador: Professor Doutor Júlio Manuel Garganta da Silva

Autor: Nuno Alexandre Soares de Almeida

Porto, 2009

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Almeida, N. (2009). Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do

treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting

Clube de Portugal. Porto: N. Almeida. Dissertação de Licenciatura apresentada à

Faculdade de Desporto da Universidade do Porto.

Palavras-Chave: FUTEBOL; MODELO DE JOGO; PRINCÍPIOS DE JOGO; SISTEMA DE

JOGO; ESPECIFICIDADE.

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V

Dedicatória

Sucesso, reconhecimento, fama, glória, … Muitos de nós lutamos por motivos assim.

Mas não se constrói um bom nome da noite para o dia. É preciso trabalhar muito. Ainda que haja

tropeções e quedas, é necessário superar obstáculos. É preciso ter motivação, perseverar,

insistir, … A vida é uma sucessão de batalhas. Emprego, família, amigos: todos nós temos um

status actual. “Todo o que fazemos na vida, ecoa na eternidade.” E temos também expectativas

em relação ao futuro. “Em três semanas estarei a fazer a minha colheita. Imaginem onde

estarão, e assim será.” No entanto, as reviravoltas do destino surpreendem-nos. “A grandeza é

uma visão.” Nem sempre dá para se fazer só o que gostamos. Mas aquele que gosta do que faz,

sente orgulho em fazer melhor. A cada dia vai mais longe. Há momentos de acalmaria e há

momentos agitados, decisivos, em que a boa intenção não basta. É nesses momentos que a

vida nos cobra coragem, arrojo, criatividade e um inabalável espírito de luta. A verdade é que os

problemas e reveses ocorrem com maior frequência do que gostaríamos. Os tempos mudam,

surgem desafios e novos objectivos. Os guerreiros olham nos olhos do futuro sem medo e sem

arrogância mas com confiança de quem está pronto para o combate. Viver é também estar

preparado para situações difíceis. O modo como encaramos as dificuldades é que faz a

diferença. Às vezes perguntamos: como enfrentar as mudanças radicais que se apresentam

diante de nós? Como actuar num novo cenário, onde as coisas que fazíamos tão bem precisam

ser reaprendidas? Como lutar sem deixar para trás valores fundamentais? E mais: como saber a

medida exacta a ser tomada no momento exacto? O incrível é que justamente diante de

situações adversas, muitos redescobrem o que tem de melhor. A ética, a amizade, a capacidade

de criar novas estratégias fundamentadas na experiência e o talento para promover alianças

positivas. O espírito de liderança, a consciência da força que reside no verdadeiro trabalho em

equipa. Tudo isto aflora quando as circunstâncias exigem, quando se sabe que existe um

objectivo maior a ser alcançado. Claro que não é fácil abandonar, hábitos, costumes, … Não é

fácil adaptar-se a novos ambientes, ou usar recursos com os quais não estávamos

familiarizados. Mas todo o guerreiro sabe que o pessimismo e a insegurança nessa hora só

atrapalham. Ainda que ameaça venha de vários lados, com agilidade, força e determinação,

podemos alcançar o resultado. A combinação de energia e inteligência, assim como o equilíbrio

entre a razão e a emoção são fundamentais para o sucesso. É uma sensação extremamente

agradável chegar ao fim de uma etapa com consciência do dever cumprido. E obter a

consagração, o respeito de todos, o reconhecimento de dos colegas, a admiração das pessoas

que amamos, … Ouvir o próprio nome com orgulho. Aquele orgulho de quem viu nos obstáculos

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VI

a oportunidade de crescer. O orgulho de quem soube enfrentar as turbulências da vida e

vencer… O orgulho de ser um vencedor que não abriu mão dos seus valores fundamentais.

Para todos aqueles que participaram e participam activamente na minha vida, o MEU

SÍNCERO E PROFUNDO OBRIGADO por tudo o que me tem proporcionado ao longo de todo

este curto momento que é a nossa vida. Como nunca é demais agradecer tudo o que esta vida

me tem proporcionado através das pessoas maravilhosas que por mim tem pensado e por

processo de osmose tem penetrado no meu SER, só as seguintes palavras podem demonstrar

tudo o que eu sou e tem construído ao longo desta vida, ou seja:

Em cada minuto, uma escolha,

Em cada escolha, um resultado,

Em cada resultado, uma experiência

Experimentar é viver.

No emaranhado das sensações, o

Reconhecimento do poder de criar

Nossas próprias vivências, nos limites

Das leis da vida.

Para uns é um jogo, para outros é

Carregar a espada da luta no fio do destino.

Zíbia M. Gasparetto

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VII

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VIII

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IX

Agradecimentos

Num momento em que termina uma etapa importante da minha formação pessoal e

profissional, existem várias pessoas às quais tenho de prestar o meu reconhecimento pelo papel

que têm assumido na minha vida:

Aos meus Pais, Armando Almeida e Adília Soares, pela perfeição com que têm

executado todo este percurso a meu lado, sendo que o amor, a dedicação, o respeito e a

compreensão funcionam como equilíbrio e harmonia desta tríade, a qual tem o seu ponto alto

com o brilhar do olhar destes dois progenitores.

À minha Madrinha, Maria do Carmo, por fazer-me sentir um sobrinho e afilhado amado

como de um filho se tratasse, agradecendo-lhe pelos pequenos grandes gestos que comigo tem

e pela enorme sintonia que nos acompanha.

Aos meus queridos amigos, Anabela Dias e Senhor Góis, pela extrema sensibilidade que

vos acompanha e vos torna o espelho da minha alma quando fixamos os nossos olhares,

fazendo sentir o fio condutor que liga a terra e o céu. Questiono-me muitas vezes porque razão

fazem parte da minha vida mas mais do que me questionar, só tenho de agradecer a quem vos

enviou.

Ao Zé Manel e Ana Soares, dois expoentes máximos de singularidade, amizade,

solidariedade, genuinidade, inteligência, coerência e conhecimento profundo, os quais aguçam a

minha essência enquanto Ser Humano ao longo de todo este percurso que vamos cumprindo

juntos. Mais próximos ou mais distantes, a realidade é que o nosso pensamento está sempre

interconectado.

Ao meu avô, Joaquim Soares, aos meus tios e primos, o meu obrigado por me verem

como um exemplo de dedicação, perseverança, coragem e atitude perante a vida e pelo

percurso escolhido por mim, fazendo-me sentir, através do vosso olhar, a confiança e o desejo

que eu alcance tudo o que pretendo, uma vez que será o prolongamento de todos aqueles que

convosco contribuem para este sucesso colectivo.

À Família Gonçalves, Tia Gininha, Tio Toninho, Belocas, Rutocas e Madalena, por

serem o meu grande exemplo de equilíbrio, harmonia, compreensão, dedicação, talento e

inteligência emocional, as quais foi absorvendo de forma atento e reflexiva ao longo de todos os

momentos felizes que temos vivido.

Ao Capu, Maia, Barão, PP, Violas, Tó Zé, Serginho, Mizuno, Pinhel, Isa e Biscoito, o

meu obrigado por todos os momentos de elevado prazer, satisfação, compreensão, desfrute ao

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X

longo destes cinco anos do nosso curso, nunca esquecendo a grande paixão e loucura que nos

une, ou seja, o fenómeno Futebol.

Ao Professor Marco Bastos, pelo fabuloso ano de Estágio Pedagógico que me

proporcionou, tornando-me num profissional mas, acima de tudo, numa pessoa com mais

qualidade e capacidade, fazendo-me compreender com enorme profundidade a ligação da

dimensão profissional com a dimensão humana. Todo o sucesso que alcançámos juntos, foi fruto

da liberdade de agir sem agir livremente que me concedeu.

Aos Professores da Faculdade de Desporto, José Soares, Olímpio Bento, Vítor Frade,

José Guilherme, André Seabra, Susana Soares, Manuel Botelho, Olga Vasconcelos, Teresa

Lacerda, António Cunha, Ramiro Rolim, José António Silva, António Marques, André Barreiros,

António Fonseca, Rui Garganta, José Maia, Ana Luísa e Rui Garganta, por me terem tornado no

profissional que hoje sou, fruto da compreensão em reflexão de todos os conteúdos por vós

transmitidos mas, principalmente, por compreender que mais do que professores, em primeiro

lugar são pessoas.

Aos funcionários do bar, Sr. Jorge, Menina Carla, Menina Teresa e Meninas Manuelas,

pelo bem servir, pelo bem receber, pelo bem-estar e pelo sorriso com que sempre me

receberam, existindo mais do que uma troca de serviços, ou seja, uma troca de emoções.

Ao Professor Júlio Garganta, por ter a capacidade de transformar todos os momentos de

conversar e troca de experiências, em autênticas formações de enriquecimentos pessoal e

profissional, tendo a invariável qualidade de saber conduzir, alinhar e respeitar o modo como

cada um executa os projectos a que se destina.

Ao Paulo Bento, Ricardo Peres, João Aroso, Sr. Aurélio Pereira, Pedro Marques e Pedro

Barbosa, pela experiência única e memorável que me proporcionaram ao longo de oito longos e

exaustivos dias passados na Academia de Alcochete.

Ao Paulo Bento, pela confiança depositada em mim ao contribuir neste trabalho de forma

tão exemplar, cordial e racional, não demonstrando qualquer receio em exprimir todos os

conhecimentos que possui mas, acima de tudo, as ideias que possui e pelas quais se rege,

revelando ser mais do que uma Valioso Profissional, ou seja, um Grande Ser Humano.

Ao Ricardo Peres, pela força, coragem e crédito que demonstrou possuir ao conceder

esta oportunidade a quatro jovens estudantes e apaixonados pelo fenómeno Futebol, permitindo-

nos entrar no seu mundo pessoal.

Ao Pedro Marques, um dos responsáveis pelo Scouting do Sporting, o meu muito

obrigado pelo facto de semanalmente me enviar os jogos do Sporting Clube de Portugal, fazendo

com que o meu trabalho atingisse uma dimensão que nem eu próprio expectava.

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XI

A vocês e a todos aqueles que não estão aqui mas cuja importância é por mim

reconhecida, um MUITO OBRIGADO!

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XII

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XIII

Índice Geral Dedicatória V

Agradecimentos IX

Índice Geral XIII

Índice de Figuras XVII

Índice de Anexos XXI

Lista de Abreviaturas XXIII

Resumo XXVII

Abstract XXIX

Résumé XXXI

1. Introdução 1

2. Revisão de Literatura 9

2.1. O Método como construção de uma Cultura de referência 9

2.2. Modelo de Jogo: A Teoria que vê o seu Sentido na Prática 14

2.2.1. Das ideias à profundidade das imagens em si contidas, vivenciadas

na realidade que é o jogo! 17

2.3. O papel do Modelo de Jogo … 21

2.3.1. … na tomada de decisão do Treinador 21

2.3.2. … na intervenção do Treinador na construção do processo. 23

2.4. O papel do Modelo de Jogo na tomada de decisão dos Jogadores 26

2.4.1. A Cultura da equipa que se verifica no entendimento e interpretação

comum do jogo 28

2.4.2. Da Cultura da Percepção à Cultura Comportamental 32

2.5. A Inteligência de Jogo que se vê na interpretação Táctica 36

3. Metodologia 43

3.1. Metodologia de Pesquisa 43

3.2. Caracterização da Amostra 43

3.3. Procedimentos Metodológicos 44

3.3.1. Recolha dos Dados 44

3.3.2. Instrumento 44

3.4. Descrição do Instrumento 46

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XIV

3.4.1. Conceptualização e Explicitação das variáveis em observação 46

4. Análise e Discussão do Conteúdo da Entrevista 66

4.1. Análise da Entrevista a Paulo Bento 66

4.1.1. Motivação para o exercício da profissão 66

4.1.2. Modelo de Jogo a partir da concepção do treinador 71

4.1.2.1. Relações e congruências entre o pretendido e o sucedido 95

4.1.3. Organização posta em prática 114

5. Conclusão 129

6. Sugestões para o futuro 135

7. Bibliografia 137

8. Anexos 147

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XV

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XVI

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XVII

Índice de Figuras

Figura 1. Proposta de Modelo de organização da dinâmica do jogo de Futebol 54

Figura 1.1. A Transição-Estado Ataque/Defesa no modelo de organização da dinâmica

do jogo de Futebol da presente investigação 56

Figura 1.2. Campograma da Espacialização do terreno de jogo em doze zonas/categorias 58

Figura 1.3. A Transição-Estado Defesa/Ataque no modelo de organização da dinâmica

do jogo de Futebol da presente investigação 60

Figura 2. Sistema de Jogo Base do Sporting Clube de Portugal (Época 2008-2009) 88

Figura 3. Percurso da Equipa em termos Quantitativos 96

Figura 4. Alteração na constituição da Equipa 97

Figura 5. Sistemas Utilizados nas várias jornadas 97

Figura 6. Desenvolvimento da Posse de Bola 99

Figura 7. Zonas de Perda da Posse de Bola 101

Figura 8. Métodos de Jogo Ofensivo 102

Figura 9. Golos Obtidos e respectivos Métodos de Jogo Ofensivo 103

Figura 10. Final da Organização Ofensiva com Eficácia 104

Figura 11. Relação entre os Remates Fora mais os Remates Contra-adversário

versus os Remates Dentro mais os Remates com obtenção de Golo 105

Figura 12. Final da Organização Ofensiva sem Eficácia 106

Figura 13. Zonas de Perda da Posse de Bola 107

Figura 14. Zonas de Recuperação da Posse de Bola 107

Figura 15. Relação entre a Pressão Imediata e a Temporização 109

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XVIII

Figura 16. Número de Jogadores na Zona de Perda da Posse de Bola 110

Figura 17. Número de Jogadores na Zona de Pressão sobre a bola 110

Figura 18. Número de Jogadores deliberadamente em Organização Defensiva 112

Figura 19. Meios utilizados para o Início da Transição Defesa-Ataque / Recuperação

da Posse de Bola 113

Figura 20. – Meios utilizados para o Desenvolvimento da Transição Defesa-Ataque 114

Figura 21. A reentrada da informação como chave da coerência (Edelman,

2008, LES DOSSIERS DE La Recherche) 120

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XX

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XXI

Índice de Anexos

Anexo 1 – Entrevista a Paulo Bento I

Anexo 2 – Folha de Registos dos Jogos Observados XXV

Anexo 3 – Jogos Observados e respectivos resultados XXVIII

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XXII

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XXIII

Lista de Abreviaturas

DTEDA – Desenvolvimento da Transição-Estado Defesa-Ataque

DTEDApc – Desenvolvimento da Transição-Estado Defesa-Ataque por passe curto

DTEDApl – Desenvolvimento da Transição-Estado Defesa-Ataque por passe longo

DTEDAcd – Desenvolvimento da Transição-Estado Defesa-Ataque por condução

DTEDArc – Desenvolvimento da Transição-Estado Defesa-Ataque por recepção/controle

DTEDAd – Desenvolvimento da Transição-Estado Defesa-Ataque por drible

DTEDAdu – Desenvolvimento da Transição-Estado Defesa-Ataque por duelo

DTEDAgr – Desenvolvimento da Transição-Estado Defesa-Ataque pelo guarda-redes

FOOf – Final da Organização Ofensiva

FOOfrf – Final da Organização Ofensiva por remate fora

FOOfrd – Final da Organização Ofensiva por remate dentro

FOOfrad – Final da Organização Ofensiva por remate contra o adversário

FOOfgl – Final da Organização Ofensiva por golo

FOOfof – Atingir o terço ofensivo de forma controlada

FOOfbad – Recuperação da Posse de Bola pelo Adversário

ITEAD – Inicio da Transição-Estado Ataque-Defesa

ITEADime – Inicio da Transição-Estado Ataque-Defesa por pressão imediata

ITEADprpb – Inicio da Transição-Estado Ataque-Defesa sabendo o número de jogadores que se

encontram na zona perda da posse de bola

ITEADpress – Inicio da Transição-Estado Ataque-Defesa sabendo o número de jogadores na

zona de pressão

ITEADtemp – Inicio da Transição-Estado Ataque-Defesa executando a temporização

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XXIV

ITEDA – Inicio da Transição-Estado Defesa-Ataque

ITEDAi – Inicio da Transição-Estado Defesa-Ataque por intercepção

ITEDAd – Inicio da Transição-Estado Defesa-Ataque por desarme

ITEDAgr – Inicio da Transição-Estado Defesa-Ataque por acção do guarda-redes

ITEDAp – Inicio da Transição-Estado Defesa-Ataque seguida de passe

OD – Organização Defensiva

ODnj – Número de Jogadores em Organização Defensiva

OOf – Organização Ofensiva

OOfpc – Organização Ofensiva por passe curto

OOfpl – Organização Ofensiva por passe longo

OOfcd – Organização Ofensiva por condução

OOfrc – Organização Ofensiva por recepção/controle

OOfd – Organização Ofensiva por drible

OOfdu – Organização Ofensiva por duelo

OOfgr – Organização Ofensiva pelo guarda-redes

OOfca – Método de Jogo Ofensivo por Contra-Ataque

OOfar – Método de Jogo Ofensivo por Ataque Rápido

OOfap – Método de Jogo Ofensivo por Ataque Posicional

SD – Sector Defensivo

SMD – Sector Médio-Defensivo

SMO – Sector Médio-Ofensivo

SO – Sector Ofensivo

ZITEAD – Zona de Perda da Posse de Bola / Inicio da Transição-Estado Ataque-Defesa

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XXV

ZITEDA – Zona de Recuperação da Posse de Bola / Inicio da Transição-Estado Defesa-Ataque

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XXVI

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XXVII

Resumo

No Futebol, o processo de construção de um jogar de referência, revela-se um projecto

de elevada complexidade, uma vez que decorre de uma íntima relação entre os conhecimentos

multidisciplinares e a concepção de jogo do treinador, a cultura do Clube que representa e as

competências de compreensão e execução por parte dos jogadores. O modelo de referência

preconizado pelo treinador, existe para promover a aquisição de intenções comportamentais de

um determinado modo de jogar, a relação entre as ideias e a forma de as operacionalizar,

incluindo um conjunto de princípios de acção que sejam Específicos desse mesmo processo.

Para o presente estudo foram delineados os seguintes objectivos: (1) Aferir a influência

que as experiências do entrevistado foram tendo ao longo da sua formação desportiva, na

construção de uma visão sobre o jogo de Futebol, sobre o Modelo de Referências e sobre a

operacionalização desse modelo em treino; (2) Definir, caracterizar e saber construir um Modelo

de Jogo, verificando qual a sua lógica de concepção para posterior operacionalização; (3)

Estudar e definir um Modelo de Jogo Específico, tendo conhecimento das ideias mestras que o

Treinador da Equipa em estudo preconiza para a mesma, compreendendo a interacção entre as

ideias expressas pelo Modelo do Jogo como também, o modo como o mesmo pode evoluir; (4)

Verificar as relações e congruências entre o pretendido e o decorrido, constatando a interacção

entre o defendido e preconizado pelo Treinador e o realizado pelos jogadores, manifestando-se a

interpretação do Modelo de Jogo (os grandes princípios tácticos da equipa), nos vários

momentos do jogo, tendo em conta os jogos observados e analisados.

Na obtenção destes objectivos, procedemos a uma entrevista ao treinador do Sporting

Clube Portugal, Paulo Bento, analisando posteriormente oito jogos da mesma equipa.

Após a análise e discussão da entrevista e da observação dos jogos da equipa em

estudo, foi possível extrair algumas conclusões, das quais se destacam as seguintes: ter sido

jogador profissional, não é uma condição essencial para se ser treinador; contudo, ter vivenciado

um elevado número de experiências como jogador, revela-se uma vantagem substancial na

construção do significado pessoal; o Modelo de Jogo é a projecção de duas culturas, a do

treinador e a do Clube, em Especificidade, numa íntima relação entre a concepção e

operacionalização do mesmo; a dinâmica do competir manifesta-se parte integrante da dinâmica

do treinar, sendo que os princípios comportamentais demonstrados pela Equipa em jogo,

revelam a coerência, congruência e cumplicidade entre o pretendido e o ocorrido.

Palavras-Chave: FUTEBOL; MODELO DE JOGO; PRINCÍPIOS DE JOGO; SISTEMA DE

JOGO; ESPECIFICIDADE.

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XXIX

Abstract

Building a Game Conception in Soccer is a complex assignment, since it holds a straight

connexion, between the multidisciplinary knowledge and the game thought of the coach, the

culture of the club and the players knowledge and competences to perform. The reference model

defined by the coach, must guide the right achievement of behaviours regarding game principles

according a specific playing style. So, it is plausible to wait a straight relationship between the

ideas of the coach and the way to make it factual to the players and the team.

According to these evidences, the present study aims: (1) To check the influence of the

experiences that our interviewed had in his sport context during these years, in constructing the

vision of a Football game by a Model of References and by the materialization of this Model in

training sessions; (2) To define, to characterize and to be able to build a Model of Game, verifying

its logic of conception for future enbodiment; (3) To study and to define a Specific Game Model

having knowledge of the leading ideas that the trainer of the team in study outlines for it,

understanding the interaction between the ideas expressed by the Model of Game as well as the

way it can perform evolutions; (4) To verify the relationship and congruences between what was

intended to and what really happened , ascertaining the interaction between the defended and

the defined by the trainer and the realized by the players, showed the interpretation of the Model

of Game (the biggest tactics principles of game), in the many moments of it having in

consideration the games observed and analyzed.

To reach these goals, we have done an interview to the Soccer Coach of Sporting Club

de Portugal, Paulo Bento, and analyzing, later, eight games of this team.

After the analysis and discussion of the interviews, we highlight the following conclusions: have

been a professional player, is not a prerequisite to be a coach; however, have experienced a high

number of experiences as a player, it is a substantial advantage in the construction of personal

meaning; the Game Model is the projection of two cultures, the coach and the Club, Specificity in

an intimate relationship between the design and operation of same; the dynamics of the compete

manifests itself part of the dynamics of the train, and the behavioral principles demonstrated by

the team in the game, show consistency, congruence and complicity between the desired and the

actual facts.

Key Words: SOCCER; GAME MODEL; PRINCIPLES OF GAME; GAME SYSTEM;

SPECIFICITY.

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XXX

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XXXI

Resumé

Dans le foot, le processus de construction d’une technique de jeu spéciale se révèle un

projet de grande complexité, une fois qu’il possède une liaison profonde entre les connaissances

multidisciplinaires et la conception de jeu de l’entraîneur, la culture du Club qu’il représente et la

compréhension d’exécution du côté des joueurs. En considérant le modèle de référence

préconisé par l’entraîneur, celui-ci existe pour mettre en train l’acquisition d’intentions de

comportement d’une certaine technique, le rapport entre les idées et la forme de les accomplir, y

compris un ensemble de principes d’action spécifiques de ce même processus.

D’après tout ce qu’on a dit, on présente les objectifs suivants: (1) Déterminer l’influence

des expériences de l’interviewé tout au long da sa formation sportive vis-à-vis la construction du

match sur le Modèle de Références et encore sur l’accomplissement de ce modèle en

entraînement; (2) Définir, caractériser et savoir construire un Modèle de Jeu, vérifiant toujours sa

logique de conception pour opérationnaliser après; (3) Étudier et définir sur un Modèle de Jeu

Spécifique, en tenant compte de la connaissance des idées principales que l’entraîneur de

l’équipe en étude préconise pour la même, en comprenant l’interaction parmi les idées exprimés

par le modèle de jeu ainsi que, la manière comment il peut être développé; (4) Vérifier les

rapports et les convenances entre le prétendu et le fait, en observant l’interaction entre le

soutenu et déterminé par l’ entraîneur et celui pratiqué par les joueurs, en manifestant

l’interprétation du Modèle de jeu (les grands principes tactiques de l’équipe), dans les plusieurs

moments du jeu, en tenant compte les jeux observés et analysés.

Pour obtenir ces objectifs, on a réalisé une interview à l’entraîneur du Sporting Clube de

Portugal, Paulo Bento, et analysé, ensuite, huit jeux de la même équipe.

Après l’analyse et discussion de l’interview et de l’observation des jeux de l’équipe en étude, on a

eu la possibilité d’obtenir certaines conclusions, dont on détache les suivantes: avoir été un

joueur professionnel, n'est pas une condition sine qua non pour être un coach; cependant, ont

connu un nombre élevé d'expériences en tant que joueur, c'est un avantage substantiel dans la

construction de la signification personnelle; le Modèle du Jeu est la projection de deux cultures,

l'entraîneur et le club, spécificité dans une relation intime entre la conception et l'exploitation de

même, la dynamique de la race se manifeste lui-même partie de la dynamique du train, et les

principes de comportement démontré par l'équipe dans le jeu, preuve de cohérence, congruence

et de complicité entre le désiré et la réalité des faits.

Mots – Clés : FOOT; MODÈLE DE JEU; PRINCIPES DE JEU; SYSTÈME DE JEU;

SPÉCIFICITÉ.

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XXXII

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

1.Introdução 1

1. Introdução

“O mundo é inseparável do sujeito, mas de um sujeito que se limita a ser um projecto de mundo, e o sujeito é

inseparável do mundo, mas de um mundo que é projectado pelo próprio sujeito.”

Merleau-Ponty (1999:430)

Com o decorrer destes cincos anos da Licenciatura de Desporto, muitas foram as

experiências vividas, muitas aulas assistidas e respectivos conteúdos discutidos, muitos

congressos, colóquios, artigos lidos e trabalhos realizados. Por intermédio de todos eles e tendo

em conta toda a minha experiência anterior, fui-me apercebendo em constante reflexão e

compreensão, que o fenómeno Futebol carece de argumentação, de sustentabilidade, de

coerência, de metodologias alicerçadas em bases seguras que lhe confiram uma credibilidade

crescente, permitindo que o mesmo não seja aplaudido pelas massas, somente pelo espectáculo

que promove mas que seja admirado pela complexidade, profissionalismo, inteligência, emoção,

qualidade e objectividade com que o Futebol imana mas que poucos vêem e aplicam.

Deste modo, o transformar uma visão em acção, o projectar de um futuro a que se

aspira, faz com que os lideres de uma determinada equipa, aproveitem todas oportunidades para

mostrar em que consiste a sua visão, a sua filosofia, quais os sentimentos que esta pode

provocar e como é que os elementos impulsionadores da mesma podem vivê-la tanto hoje como

no futuro.

Para tal, utilizam-se a si próprios como instrumentos de descoberta e de mudança,

mantendo relações de proximidade com o processo e organização onde estão inseridos, não

afrouxando esforços para atingirem os seus objectivos. Apela-se a que todos os elementos

dessa organização vivam de acordo com os seus próprios valores e com os da primeira,

transformando as estruturas organizacionais e as funções da equipa, mudando normas de

relacionamento emergentes, remodelando sistemas e as expectativas de desempenho de acordo

com a visão da organização preconizada pelo líder, ajustando cada vez melhor as tarefas

individuais à missão da organização.

De acordo com Merleau-Ponty (1999), devemos "reconhecer a consciência como

projecto do mundo que ela não abarca nem possui, mas em direcção ao qual ela não cessa de

se dirigir", uma vez que “a intenção tem uma relação causal com o emprego de uma

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1.Introdução 2

determinada expressão e constitui aquilo que confere significado ao uso dessa expressão. Falar,

comunicar, é, portanto, uma forma de agir racional e intencionalmente” (Soares, 2005).

Como tal, no fenómeno Futebol, exacerba-se a urgência na compreensão do mesmo

como um meio complexo e com um potencial de crescimento que poucos percepcionam e o

sufocam, sendo crucial que o modelo de mundo que cada um dos treinadores em si encerra,

possua a capacidade de atribuir maior grandeza a um fenómeno que necessita ser pensado,

construído e vivido de foram séria e credível.

Assim, Saussure (1909, cit. por Belo, 1991:29/30) afirma que “a cada uma das coisas

que considerámos como uma verdade, chegámos por tantas vias diferentes que confessámos

não saber qual a que se deve preferir. Seria necessário, para apresentar convenientemente o

conjunto das nossas proposições, adoptar um ponto de vista fixo e bem definido”, ou seja, o

Modelo de Jogo.

De tal forma que, para o mesmo autor (1954, cit. por Belo, 1991:30) “o laço que se

estabelece entre as coisas pré-existe, neste domínio (Modelo de Jogo), às próprias coisas, e

serve para as determinar”, sendo que “só se pode atribuir crenças, desejos ou intenções a uma

criatura capaz de usar uma linguagem, um modelo de expressão, um modelo de significado,

através do qual se institui uma cultura de percepção, de compreensão”, de todo o grupo de

trabalho, alicerçado e sustentado pelos mesmos objectivos (Soares, 2005).

No que concerne ao Modelo de Jogo, este funciona como a via de acesso de referência

para a construção do processo, sendo a linguagem que o mesmo preconiza na esfera das ideias,

filosofia e visão, a ponte entre o pensamento e o mundo, permitindo-nos interligar esse plano

mediador com um modo de perceber e pensar que a linguagem põe em marcha, a constituição

de uma Cultura Específica, de uma Linguagem Própria e Identificadora de determinada equipa.

Por intermédio do supracitado, a compreensão em construção do Modelo de Jogo,

revela a sua importância ao estar alicerçado a um axioma fundamental, o qual nos demonstra

que a única via para análise do pensamento passa pela análise da linguagem, sendo já essa

“fabricação” da linguagem, uma compreensão do pensamento ao qual esta subordinada toda a

visão/filosofia defendida e concebido pelo treinador dentro do Modelo de Jogo. Caracterizando o

mesmo não por ser apenas um evento que se dá no sujeito, ou algo que este faz instintivamente,

mas algo que revela um fim visado e está por isso direccionado para um objectivo. A acção do

Modelo, em sentido próprio, é uma actualização e condensação da racionalidade (Soares, 2005),

fazendo com que o mesmo seja “tanto mais rico, quanto mais criar possibilidades aos indivíduos

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1.Introdução 3

para poder acrescentar qualquer coisa às suas funções, mas nunca à revelia das suas funções”

(Frade, 2003).

Segundo esta lógica de percepção, podemos verificar que os acontecimentos mais

complexos, conduzem os seres humanos de excelência nas mais diversas áreas, à execução da

tarefas “aparentemente” simples, sendo dotados de uma extrema sensibilidade para algo que só

quem foi ou é estimulado para e na acção, possui a capacidade de reconhecer tais informações.

Mas, tudo isto acontece porque jogador “ é considerado como um manipulador de símbolos tal

como um computador: ambos usam símbolos e realizam operações baseadas nesses mesmos

símbolos” (Gibson, 1988).

De acordo com Frade (1985), “ a aprendizagem consiste, num sentido, em fazer

significar acontecimentos, em transformar o acontecimento-ruído em acontecimento-sinal, ou

mesmo em acontecimento-signo: o ruído é transformado pela aprendizagem em sinal”, tendo

toda a informação que se transmite, estar subordinada a uma sólida raiz de ideias, ao Modelo de

Jogo que pretendemos operacionalizar conjuntamente com os jogadores, para que a mesma

seja assimilada e acomodada por pelos impulsionadores do Modelo.

O Modelo de Jogo é uma Cultura do jogo e do treino que pretendemos para a nossa

organização, para a nossa equipa, e na procura de compreender as ideias do mesmo, Morin

(1987) refere que a “Cultura não é um mero suplemento de que usufruem as sociedades

humanas em contraste com as sociedades animais. É ela que institui as regras – normas que

organizam a sociedade e governam os comportamentos dos indivíduos; constitui o capital

colectivo dos conhecimentos adquiridos, dos saberes práticos apreendidos, das experiências

vividas, da memória histórico-mítica, da própria identidade de uma sociedade.”

Consubstanciada com a afirmação de Edgar Morin, Lourenço & Ilharco (2007) afirmam

que “ (...) a forma como os outros se vêem através de quem os rodeia, é um aspecto central do

processo de formação e desenvolvimento da identidade de cada um”, uma vez que a ênfase

dada ao indivíduo deve sempre ter um referencial colectivo.

A par do anterior, Frade (2004:XXVII) destaca que “não há treino mais individualizado ou

repercussões do treino mais individualizadas do que aquelas que permite a Periodização

Táctica. Porque a primeira preocupação que tem é eleger os princípios e os princípios são

levados a efeito pelos jogadores, os jogadores em determinadas posições e determinadas

funções. Portanto se são posições e funções diversas, embora complementares, o que se

repercute em cada uma dessas posições ou funções é diverso das demais portanto é

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1.Introdução 4

individualizado”, sendo que a sua diversidade é necessária à sua unidade e a sua unidade é

necessária à sua diversidade, uma vez que esta última ao ser exigida, mantida, criada e

desenvolvida na e pela unidade sistémica que é a Equipa, que por sua vez a potencia, faz com

que esta relação complexa convirja num processo em que a diversidade organiza a unidade que

organiza a diversidade.

Como prolongamento da ideia anterior, para Gomes (2006) o Modelo de Jogo é “ (...) a

Finalidade do sistema ou seja, o Modelo de Jogo confere um determinado Sentido ao

desenvolvimento do processo face a um conjunto de regularidades que se pretendem observar.

Deste modo, o modelo permite responder à questão: para onde vamos?” Para a mesma autora,

a questão anterior é “ fundamental para desenvolver um processo direccionado para um

determinado «jogar» ou seja, para um processo Intencional. A partir dele criam-se um conjunto

de referências que definem a organização da equipa e jogadores nos vários momentos do jogo.

Deste modo, o modelo orienta o processo para um jogar concreto através dos princípios

colectivos e individuais em função do que é pretendido. Neste sentido, trata-se desenvolver um

jogar Específico e não um jogar qualquer”.

Evidenciando a importância deste Modelo de jogo, Vítor Frade (2004) afirma que o jogar

é uma organização construída pelo processo de treino, face a um futuro que se pretende atingir.

Deste modo, esclarece que o processo configura o jogo fazendo emergir determinadas

regularidades no comportamento da equipa e jogadores.

Reforçando esta lógica, Guilherme Oliveira (2006) refere que é através dos princípios do

modelo que se desenvolve a Organização colectiva e individual dos jogadores e que se expressa

num padrão de comportamentos que o treinador objectiva para a equipa.

Neste entendimento, o modelo envolve a operacionalização dos princípios de acção dos

jogadores nos vários momentos do jogo. Por isso, este conceito de modelo de jogo não se reduz

a uma ideia geral, tratando-se sobretudo de configurar as interacções dos jogadores. Reforçando

este lado pragmático do processo, Vítor Frade (2003:III) afirma que “mais importante que a

própria noção de modelo, são os princípios do próprio modelo” uma vez que nem todos

assumem a mesma importância nem são operacionalizados da mesma forma.

Por isso, a configuração do modelo resulta da articulação e desenvolvimento dos

princípios para que o jogo adquira uma dada identidade. Desta forma define uma qualidade

comportamental promovida pelos princípios de acção sobre os quais o treinador e jogadores

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1.Introdução 5

analisam e interpretam os factos do jogo e de desenvolvimento do processo. Assim, é através do

modelo que se concebem e avaliam as intenções e os acontecimentos de todo o processo face

ao que se pretende.

Alicerçado com o Modelo de Jogo e respectivos princípios de acção, surge como

continuum dos anteriores um conceito crucial para o desenvolvimento e operacionalização das

ideias do «jogar» que se pretende atingir, a Táctica. No Futebol assume importância capital o

que Barth (1994) designa por saber estratégico-táctico, e que consiste, não apenas no

conhecimento das regras da competição e das regras de gestão e organização do jogo

(estratégico-tácticas), mas também no conhecimento das condições de regulação situacional.

Deste modo, a dimensão estratégico-táctica emerge simultaneamente como pólo de

atracção, campo de configuração e território de sentido das tarefas dos jogadores no decurso do

jogo.

Ao longo dos tempos, o conceito de táctica foi-se estendendo a áreas diversas, sendo

actualmente conotado como a gestão inteligente do comportamento face a situações que

impliquem conflitualidade de interesses, ou concorrência entre objectivos, de que o desporto é

uma das expressões mais representativas (Garganta, 1997). Deste modo, a táctica não traduz

apenas uma organização das variáveis físicas (tempo e espaço) do jogo mas implica também, e

sobretudo, uma organização informacional.

Assim sendo, a organização informacional gerada pelos jogadores e equipa não devem

ser apenas consideradas as distâncias métricas, mas também o espaço de interacção e a

componente decisional (Moreno, 1994), sendo que os jogadores devem eleger os espaços de

jogo que permitam um intercâmbio de funções entre os companheiros (Garganta, 1997),

estabelecendo-se, para além de hipóteses possíveis, relações de preferência que garantam uma

maior eficácia. Isto conduz a uma correcta estruturação do espaço de acção de cada jogador

gerando um determinado sistema de interacção (Menaut, 1982, cit. por Sousa, 2000), ou seja,

um complexo de relações mútuas que se estabelece entre os jogadores, de acordo com as

finalidades das respectivas acções de jogo.

Assim, são as situações de jogo com a variabilidade, imprevisibilidade, alternância e

aleatoriedade que lhes é inerente, que determinam a direcção dos comportamentos a adoptar

pelos jogadores, pelo que a estes é reclamada uma atitude táctica permanente (Garganta, 1995).

Segundo o mesmo autor, a ocorrência de determinados comportamentos, mesmo os mais

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1.Introdução 6

elementares como uma corrida ou salto, num dado momento ou numa dada zona do terreno de

jogo, é mais ou menos pertinente em função das configurações que o jogo apresenta.

Segundo Tavares (cit. por Garganta, 1997:35), o desempenho dos jogadores depende

em primeira análise dos aspectos relacionados com o processamento da informação (leitura do

jogo) e as decisões, confluindo esta ideia com o conceito de excelência cognitiva, o qual se

subdivide em capacidades tácticas e habilidades de tomada de decisão (Starkes & Ericsson,

2003).

Centrando-me no conhecimento táctico e estratégico, segundo McPherson (1994) e

Starkes (1993), o conhecimento táctico não envolve apenas a habilidade para determinar qual é

a estratégia mais apropriada numa dada situação mas também, se a estratégia pode ser

executada com sucesso dentro dos constrangimentos dos movimentos requeridos. Assim, a

perícia táctica no desporto é completamente diferente dos domínios de desempenho não motor

sendo que as limitações fisiológicas e técnicas, obrigam as opções estratégicas disponíveis para

sustentar o desempenho.

Após o “explanar” anterior das ideias e conceitos sobre os quais pretendemos que o

trabalho seja desenvolvido e se sustente, determinámos como palavras-chave do mesmo:

Futebol, Modelo de Jogo, Princípios de Jogo, Sistema de Jogo, Especificidade, Inteligência

Criativa.

Na realização deste trabalho, tenho como objectivos:

• Aferir a influência que as experiências do entrevistado foram tendo ao longo da sua

formação desportiva, na construção de uma visão sobre o jogo de Futebol, sobre o

Modelo de Referências e sobre a operacionalização desse modelo em treino;

• Definir, caracterizar e saber construir um Modelo de Jogo, verificando qual a sua lógica

de concepção para posterior operacionalização;

• Estudar e definir um Modelo de Jogo Específico, tendo conhecimento das ideias mestras

que o Treinador da Equipa em estudo preconiza para a mesma, compreendendo a

interacção entre as ideias expressas pelo Modelo do Jogo como também, o modo como

o mesmo pode evoluir;

• Verificar a relação e congruência entre o pretendido e o ocorrido, constatando a

interacção entre o defendido e preconizado pelo Treinador e o realizado pelos

jogadores, manifestando-se a interpretação do Modelo de Jogo (os grandes princípios

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1.Introdução 7

tácticos da equipa), nos vários momentos do jogo, tendo em conta os jogos observados

e analisados.

Na tentativa de concretizar as nossas intenções, entrevistamos um treinador de futebol

conceituado e com uma carreira como profissional curta mas de elevado nível, o qual trabalha,

actualmente, num dos melhores clubes nacionais: Paulo Bento. A partir daquilo que o

entrevistado nos revelou, fizemos a relação entre as experiências que passou, com as ideias que

apresenta e que procura exponenciar e a forma como concretiza no plano prático, aquilo que

pensa sobre o seu Modelo de Jogo e o modo como o operacionaliza.

Partindo destes pressupostos, estruturamos a dissertação em sete pontos. No primeiro,

a “Introdução”, no qual expomos o problema, delimitamos o tema, apresentamos a sua

pertinência e procedemos à enunciação dos nossos objectivos.

No segundo ponto, fazemos a revisão de literatura, começando por uma

contextualização das ideias chaves por que se deve reger um Modelo de Referência,

enveredando na construção de um Cultura e Linguagem próprias, culminando na pesquisa em

que deverá consistir o processo de construção do Modelo de Jogo e como se faz emergir o

mesmo.

No terceiro ponto, explicamos a metodologia aplicada neste trabalho, bem como a

justificação para as categorias de análise construídas, percepcionadas e registadas, não so

através da entrevista mas também, por meio dos oitos jogos analisados.

No quarto ponto, apresentamos e discutimos a nossa entrevista, confrontando aquilo que

é dito pelo entrevistado com aquilo que encontramos na nossa revisão de literatura e procurando

perceber os porquês da forma como pensa e operacionaliza o seu Modelo de Jogo,

consubstanciando a mesma com a analisada vídeo dos jogos da respectiva equipa.

No quinto ponto evidenciamos aquelas que nos parecem ser as conclusões mais

importantes e que revelam o alcançar dos objectivos propostos.

O sexto ponto reporta-se às referências bibliográficas que foram consultadas para a

realização deste estudo.

No sétimo ponto e último ponto está transcrita de forma integral a entrevista que

realizamos, de acordo com o guião utilizado na consecução da mesma.

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1.Introdução 8

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2.Revisão de Literatura 9

2. Revisão de Literatura

2.1. O Método como construção de uma Cultura de Referência

“ Não há real para lá do que o diz, porque o real espera ser dito, ou seja pensado, para começar a existir.”

Vergílio Ferreira (1978)

Num mundo em que “Tudo tem lugar onde Nada existe” e onde esse nada caminha para

o tudo inalcançável, o qual nos permite percorrer um caminho, caminho esse que “se hace al

andar” (Machado, cit. por Marques, 2000), há que dizer que o futuro começa hoje, não

esperando pelo que faremos num longínquo amanhã. Como tal, Bento afirma (1998) que a sua

função de formador de opinião e de pessoas, firma-se na construção e projecção desse futuro

através de sonhos e ideias, estimulando a realização das mesmas nesse futuro que é semeado

no aqui e agora, para ser colhido no amanhã.

Para Marques (2000), “distanciámo-nos dos outros seres pela inteligência, pela

linguagem, nas construções com que edificámos a nossa cultura. Foi graças a esta, e pela

educação, que superámos a nossa condição animal. Elevando-nos a uma outra condição. A

cultura é, então, a verdadeira criação do Homem. A coisa imperecível por ele criada.” Por

intermédio da comunicação existente entre os caracteres complexos e profundos que interligam

o longo caminho que vai dá inteligência à linguagem, sendo que tais conceitos estão

intimamente relacionados com a origem da Humanidade, fazem com que o caminho entre ambas

seja extremamente complexo mas passível de ser decifrado, culminando no reconhecimento do

mesmo como Cultura.

Como afirma Soares (2005:42), o interesse filosófico pela linguagem não se limita ao

facto de esta ser uma via de acesso ao pensamento, é também uma fenómeno revelador da

peculiaridade do ser humano enquanto tal, sendo este constitutivamente um animal symbolicum,

não só por revelar as competências linguísticas próprias, mas porque toda a praxis linguística

constitui o seu habitat natural. Apesar desse habitat natural ser um local inacessível, complexo e

labiríntico, o qual é uma construção e/ou reconstrução sucessiva de muitas passagens ou

divisões, dispostas tão confusamente que com dificuldade se lhe acha a saída, o ser humano

permite que a entrada nesse mundo se dê através da linguagem. A mesma autora menciona que

(2005:40), “ocorre pensar num outro aspecto da linguagem, o da sua relação com o mundo: ela

surge-nos como um plano mediador, uma via de acesso entre o pensamento e mundo, um

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2.Revisão de Literatura 10

espelho no qual se reflectem as coisas.” Continua dizendo que “se pudermos confiar neste

isomorfismo entre as palavras e as coisas, a estrutura da linguagem parece poder servir como

uma pauta adequada para reflexão metafísica e ontológica.”

A via de acesso que a autora faz referência, sendo a linguagem a ponte entre o

pensamento e o mundo, permite-nos interligar esse plano mediador com um modo de perceber e

pensar que a linguagem põe em marcha. Assim sendo, a linguagem põe em marcha processos

cognitivos básicos como os da identificação, reconhecimento, memória e imaginação.

Concomitantemente com o nascimento da linguagem, surgiu o nascimento da consciência

central por intermédio da compreensão da relação processual entre o organismo e o objecto, isto

é, “a consciência central ocorre quando os mecanismos cerebrais de representação geram um

relato imagético, não verbal, de como o próprio estado do organismo é afetado pelo

processamento de um objeto pelo organismo, e quando esse processo realça a imagem do

objeto causativo, destacando-o assim em um contexto espacial e temporal.” (Damásio, 2000).

A formação desse contexto espacial e temporal prende-se com o bem mais precioso do

homem, ou seja, as suas ideias (Karl Popper, cit. por Bento, 1995). O mesmo autor destaca que

o Homem vê o que as teorias e os conhecimentos permitem ver, funcionando como instrumentos

idênticos aos nossos olhos e ouvidos, os quais utilizamos para nos orientarmos e afirmarmos no

mundo. São as ideias, as perspectivas e as teorias que permitem exaltar o sentir, o perceber, o

entender da nossa realidade. Através das primeiras, Bento (1995:73) afirma que “saímos com

elas pelo mundo, vemos e extraímos dele uma informação à medida dos nossos conhecimentos.

A uma diferença de ideias, de teorias e conhecimentos, corresponde uma diferença na captação

e no entendimento das coisas.” A par da opinião anterior, Cunha e Silva (1999) menciona que “o

sujeito do conhecimento constrói-se a si próprio no acto de conhecer. Serve-se do outro para se

edificar.”

Todas as ideias, consubstanciadas ou não pelas teorias, desenvolvem conhecimento, o

qual é específico da realidade que percepcionámos e vivenciámos, sendo que as três dimensões

anteriores são desenvolvidas por intermédio das palavras, as quais são a causa do real porque

provocam e produzem factos, isto é, participam na produção do mundo (Bento, 1995).

“Cada pessoa trás dentro da sua cabeça um modelo mental do mundo, uma

representação subjectiva da realidade externa... assim, à medida que a experiência e a

investigação científica insuflam na sociedade conhecimentos mais refinados e exactos, novos

conceitos e novos modos de pensar ultrapassam, contradizem e tornam obsoletas anteriores

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2.Revisão de Literatura 11

ideias e opiniões acerca do mundo” (Tofler, 1970). Por intermédio da afirmação de Alvin Tofler e

reportando-nos ao futebol, podemos depreender que a existência de um referencial de acção

constituído por um conjunto de orientações e princípios que coordenam as acções e os

comportamentos da equipa, definindo-se assim um modelo de organização do mundo, ou seja,

um modelo de organização do seu jogo. Corroborando com a afirmação acima, Bento (1995)

afirma que “ (…) o treinador transporta para as situações de treino e competição não uma

qualquer competência técnica ou táctica, mas sim uma versão individual da formação requerida

para o desempenho das respectivas funções.”

Para o efeito, Alves & Araújo (1996) consideram que a qualidade de tomada de decisão

do jogador em situação desportiva depende do seu conhecimento declarativo e processual

específicos, das suas capacidades cognitivas, da capacidade (competências) no uso das

capacidades cognitivas, das preferências pessoais e dos factores motivacionais, sendo que o

treinador tem um papel fulcral na orientação da percepção dos mesmos. Ou seja, só é possível

antecipar, projectar ou problematizar determinadas situações em função dos conhecimentos que

se possui e dos meios que se conhece e do que se dispõe para agir (Graça & Oliveira, 1995).

No caso concreto do Futebol, Garganta (2005) menciona que o mesmo se trata de uma

modalidade situacional, na qual as competências dos jogadores e das equipas de Futebol

reportam-se a grandes categorias de problemas, atravessando diferentes níveis de organização,

em resposta aos sinais do envolvimento. A problematização do jogo exige que existam pessoas

com formação teórica e prática sustentada, coerente e de elevado nível, possibilitando que exista

uma estreita ligação entre ambas, ou seja, é através da formação, a qual é objectivada em

competências sociais, culturais, pedagógicas (perceptivas, construtivas, didácticas, expressivas,

comunicativa, organizativas) e metodológicas, que o treinador se apresenta em face dos outros

sujeitos intervenientes no seu campo profissional” (Bento, 1995 e 1999).

Assim, a base fundamental do trabalho de cada gestor está na equipa. Ela constitui a

sua unidade de acção, a sua ferramenta de trabalho. Com ela o gestor alcança metas e produz

resultados. Para tanto, precisa de saber como escolher a sua equipa, como desenhar o trabalho

para aplicar as competências dela, como liderar e impulsionar a equipa, como motivá-la, como

avaliar o seu desempenho para melhorá-lo cada vez mais e como recompensá-la para reforçar e

reconhecer o seu valor (Chiavenato, 2004)

Araújo (1997) define o treinador como um gestor de pessoas, onde lhe cumpre ter uma

acção decisiva em tudo o que diga respeito ao rendimento e à qualidade de intervenção dos

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2.Revisão de Literatura 12

componentes que a integram, decorrendo num ambiente em constante mutação e a que tem de

se adaptar permanentemente, antecipando o futuro na medida do possível, aqui e agora e no

espaço e no tempo.

É inegável a influência que o treinador exerce sobre as atitudes e comportamentos,

sobre os princípios, valores, orientações e sentido de vida dos atletas. Nenhum treinador é igual,

como tal o modelo que transporta para os contextos de treino e competição, possuem a sua

impressão digital (Campos, 2007). Assim, treinar é modelar através de um projecto (Marina,

1995), ou seja, “para o treino ser treino, e não apenas exercitação, impõe-se uma carta de

intenções, um caderno de compromissos que funcione como representação dos aspectos”

(Garganta, 2000), sendo que a interligação dos mesmos, conferem sentido ao processo,

rumando intencionalmente na direcção objectivada pelo treinador.

É por demais evidente que “Ser Treinador” exige um conhecimento multidisciplinar, uma

vez que o treinador deve ter uma acção decisiva em todo o processo evolutivo da equipa,

aplicando directamente um conjunto de conhecimentos que vai adquirindo, fruto da evolução, do

treino, da competição, das ciências que os apoiam e da sociedade (Frade, 2007).

Csikszentmihalyi et al. (1993) salienta o facto dos treinadores que perduram nas mentes

dos jogadores, são aqueles que demonstram entusiasmo e paixão na transmissão dos

conhecimentos que outro treinador qualquer o faria sem qualquer emocionalidade. Quando o

prazer na profissão é demonstrado, isso fica gravado na memória de quem é ensinado. Os

traços que tornam os treinadores influentes estão relacionados com a capacidade que eles

demonstram em encorajar a integração promovendo suporte e harmonia e, simultaneamente, em

estimular a diferenciação ao tornar o envolvimento e a liberdade possíveis.

Segundo Horn (2002), o treinador é visto como um poderoso agente socializador junto

dos jovens atletas, o qual, para além de ser um gestor, um motivador, um potenciador, um

condutor, é, acima de tudo, um organizador, estando todas as dimensões que o mesmo

manipula, ao serviço de um plano superior, o plano organizativo. Assim, a palavra organização

está contaminada por um sem número de circunstâncias que têm a ver com a própria vida pelo

que é considerada uma palavra polissémica, quer dizer, pode assumir diversos sentidos (Pires,

2005). Segundo o mesmo autor, “ A organização, faz a organização da organização”, a qual

significa:

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2.Revisão de Literatura 13

• A organização – conjunto de princípios que governam a actividade de um clube ou

qualquer outro organismo desportivo. • Faz a organização – acto de organizar (gerir), ou esforço dirigido à prossecução de

determinados objectivos desportivos; • Da organização – organismo criado, por exemplo, um clube.

Desta forma, podemos depreender que a organização que o modelo de jogo do treinador

possui (o plano das ideias), dirige, conduz e constrói uma equipa, dentro de determinados

princípios, valores, regras e sentido, culminando numa morfogénese da equipa, não só através

do jogo que pratica, mas também, através das dinâmicas interactivas entre as ideias que os

jogadores põem em prática e as defendidas pelo treinador. Trata-se da construção de um corpo,

de uma “forma de formas” (morfogénese), de uma equipa, sendo que o corpo (equipa) e a

imagem se fundem até ao corpo (equipa) ser só imagem, e por isso uma matéria plástica

modelizável através da utilização das potencialidades videográficas (Fargier, 1993, cit. por

Cunha e Silva, 1999). “ O corpo como lugar de inscrição, torna-se só inscrição, perde-se e

dissolve-se nas sucessivas cadeias de signos que lhe são atribuídas. De tanto o vermos,

perdemo-lo de vista; de tanto o tornarmos símbolo dos mais fenómenos e acontecimentos,

perdemos-lhe os contornos. E uma cultura sem corpo é uma cultura incontornável” (Carlos,

1991, cit. por Cunha e Silva, 1999).

Perante o Modelo de Jogo o qual é um organizador de ideias, possibilitando que se crie

um caminho de desenvolvimento das mesmas, cada sujeito percebe o jogo, as suas

configurações, em função das aquisições anteriores e do estado presente. Perante o fenómeno

jogo, o observador constrói uma paisagem de observação, entendida como um conjunto de

estímulos organizados face ao “ponto de vista” que ele possui sobre o fenómeno. Ou seja, retém

o que se lhe afigura pertinente, interpreta os dados dispersos e organiza-os conferindo-lhes um

sentido próprio, o que quer dizer que o sentido do jogo é construído e depende de um modelo de

referência (Garganta, 1997).

Para Temprado (1991, cit. por Garganta, 1997) os conhecimentos que estão na base do

pensamento táctico estão organizados sob a forma de cenários, de acordo com um conjunto de

indicadores (referências), de objectivos a alcançar e de efeitos a produzir. Deste modo, os

conhecimentos de que um jogador dispõe permitem-lhe orientar-se, prioritariamente, para certas

sequências de acção, em detrimento de outras. Assim, os conceitos de ordem (sequências de

acção) e de auto-organização (o modo como são organizadas essas sequências), obviamente

que estão estritamente relacionados um ao outro. Após tudo isto, quando dizemos que um

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2.Revisão de Literatura 14

objecto ou um sistema é organizado, nós dizemos que este está ordenado com um determinado

sentido (Shiner, 1997).

2.2. Modelo de Jogo: A Teoria que vê o seu Sentido na Prática

“O Modelo de Jogo é essencialmente mental, porque são os jogadores que jogam e os jogadores têm interpretações e essas interpretações quando eles começam a relacionar-se uns com os outros, dão-se de forma independente”.

Guilherme Oliveira (2003)

Ao longo dos tempos, todas as dimensões da nossa sociedade tem sofrido mudanças

constantes, mudanças essas que se devem essencialmente ao principal desafio de quem gere

uma Organização com o objectivo de que a mesma atinja o sucesso pelo seu meio mais

complexo, ou seja, o Ser Humano, culminando no facto dessas pessoas comuns terem a

capacidade de realizar coisas extraordinárias (Chiavenato, 2002:4).

Para tal, é necessário que essa mesma organização considere “ as pessoas como seres

humanos, profundamente diferentes entre si, dotados de personalidade própria, com uma

história pessoal particular e diferenciada, possuidores de habilidades e conhecimentos,

destrezas e capacidades indispensáveis à adequada gestão dos recursos organizacionais”

(Chiavenato, 2000:20). Assim, as organizações pretendem que a mesma seja constituída por

elementos impulsionadores da organização e capazes de dotá-la da inteligência, do talento e da

aprendizagem indispensáveis à sua constante renovação e competitividade num mundo pleno de

mudanças e desafios (idem, 2000:21). Ou seja, pretendem-se que a organização possua

pessoas com capacidade de impulso próprio, que invistam na organização por intermédio do seu

esforço, dedicação, responsabilidade, comprometimento, entre outras, havendo retorno através

do sucesso colectivo das organizações.

Para que tudo isto possa ser viável, é imperial que a organização possua um líder – o

treinador – que albergue dentro da sua cabeça um modelo mental do mundo, fazendo com que o

mesmo possa afigurar-se mais pertinente através da “sua adequação à personalidade do

treinador e dos jogadores, bem como à cultura específica do clube onde o trabalho se

desenvolve” (Garganta, 2004). Isto é, o treinador deve possuir um modelo (de Jogo) como algo

que incorpora uma determinada realidade confinada a cada contexto específico (Clube). É

simultaneamente algo de tão concreto pois é orientador e permite determinar a direcção e o

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2.Revisão de Literatura 15

sentido em que pretende ir, e também é algo de utópico porque por mais que se procure nunca

se vai encontrar. É sempre algo que se procura, nunca está acabado e nunca tem fim. O futuro é

sempre o elemento estruturante do processo porque o treinador tem de ver sempre “mais à

frente”, tem de no momento da operacionalização, saber aquilo que pretende para verificar se

tudo está a decorrer exactamente conforme planeado e nesse sentido, o feedback deve ser o

mais congruente possível. Tudo isto tendo o Modelo de Jogo como “pano de fundo”.

A Concepção/Modelo de Jogo são dois conceitos que se encontram intimamente

relacionados, e segundo Guilherme Oliveira (2003:XXII/XXIII) “A Concepção de Jogo e o Modelo

de Jogo são coisas muito semelhantes, provavelmente a mesma coisa relativamente às ideias”,

sendo que “a única diferença é que a primeira centra-se no plano das ideias enquanto que a

segunda centra-se na operacionalização dessas ideias.” A intimidade existente entre os dois

conceitos verifica-se num continuum existente entre as ideias de jogo e a operacionalização das

mesmas, isto é, um processo de visualização criado pelo treinador, processo esse que permite

que as imagens contidas no modo como se concebe o jogo, se tornem realidade por intermédio

das acções dos jogadores, ao operacionalizarem essas mesmas intenções (princípios de acção)

em reciprocidade com o treinador.

Das ideias à operacionalização das mesmas, do treinador ao jogador, existe um fio

condutor que está assente numa base sólida na qual se encontra o processo intencional, ou

seja, as traves mestras que servirão de bússola para a construção do caminho interminável a

percorrer pelo colectivo, pela equipa. Assim sendo, “ (...) a Finalidade do sistema ou seja, o

Modelo de Jogo confere um determinado Sentido ao desenvolvimento do processo face a um

conjunto de regularidades que se pretendem observar.” (Gomes, 2006:28). Dessa forma, cria-se

um processo intencional, sendo que o mesmo alicerça um “conjunto de referências que definem

a organização da equipa e jogadores nos vários momentos do jogo” orientando “ (...) o processo

para um jogar concreto através dos princípios colectivos e individuais em função do que é

pretendido” (idem, 2006:29).

Evidenciando a importância do Modelo de jogo, Vítor Frade (2007) afirma que o jogar é

uma organização construída pelo processo de treino, face a um futuro que se pretende atingir.

Deste modo, esclarece que o processo configura o jogo fazendo emergir determinadas

regularidades no comportamento da equipa e jogadores. Em consonância com a ideia do autor

anterior, Garganta (1997) afirma que a forma de entender e de actuar do praticante de JDC

(Futebol), depende de um metanível – o “modelo de jogo”. As relações que ele estabelece entre

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2.Revisão de Literatura 16

o modelo e as situações que ocorrem no jogo, orientam as respectivas decisões, condicionando

a organização da percepção, a compreensão das informações e a resposta motora.

A condução intencional do processo de jogo que encontra o seu sentido na concepção

que o treinador tem sobre o jogo e as ideias específicas que pretende projectar no último, em

sintonia com o modelo que pretende operacionalizar dentro do seu contexto específico (a sua

equipa), conduz o olhar, a visão de toda a estrutura organizativa e organizante para um futuro

lógico, sustentado, coeso e condutor, tudo isto porque se traça um futebol específico, um

fenómeno construído. Segundo Tamarit (2007), “un Equipo (...) es el resultado de un Fenómeno

Construido (de ahí que exista una geografía y una historia futebolística, así como diferentes tipos

de «fútbol»), siendo diferente de cualquier otro «juego» o «fútbol»”.

Para além do futebol ser um fenómeno construído, o autor anterior afirma que também “

(...) es Determinístico en la medida en que, en el momento de la construcción, sabemos lo que

queremos construir, lo que queremos alcanzar en el futuro.” (idem, 2007). Deste modo, podemos

dizer que cada treinador tem a sua ideia de jogo, de futebol, alicerçada às suas vivências

anteriores e às presentes, operacionalizando-as num contexto singular, com uma matriz cultural

enraizada, sendo somente a sua concepção de jogo (ideias sobre o mesmo), o meio mais

favorável para seduzir os jogadores sobre o processo que se pretende conduzir “a bom porto”.

Concorrendo para este sentido, Guilherme Oliveira (2006) refere-nos que é importante

que “o treinador saiba muito bem aquilo que pretende da equipa e do jogo, que tenha ideias

muito concretas relativamente às invariantes/padrões que pretende que a sua equipa e os

respectivos jogadores manifestem”. Evidenciando a importância do Modelo de jogo, Vítor Frade

(1985:5) refere que o modelo é como uma “pedagogia do projecto” que deve estar

constantemente a ser visualizado assumindo-se no elemento causal do futuro, no jogar

específico que se pretende atingir. Deste modo, esclarece que o processo configura o jogo

fazendo emergir determinadas regularidades no comportamento da equipa e jogadores.

Como conclusão deste ponto, o qual ao mesmo tempo permite realizar a interacção com

subcapítulo que se segue, através da descrição do processo de visualização referido pelos

autores Elmer e Alyce Green (1977, cit. Por Beswick, 2001) constatámos o quão imperial é

possuir um guia lógico, identificativo e referencial aquando das nossas acções dentro de uma

organização, ainda para mais quando desempenhamos as funções de treinador, ou seja, “como

começamos a percepcionar que não somos totalmente vítimas da genética, do condicionamento,

e dos acidentes, as modificações começam a acontecer nas nossas vidas, a natureza começa a

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2.Revisão de Literatura 17

responder-nos de um novo modo, e as coisas que visualizamos, embora improváveis, começam

a acontecer com uma frequência crescente - os nossos corpos tendem a fazer o que lhes dizem

para fazer, se soubermos como dizer-lhes”. Assim sendo, o corpo do treinador dá vida às ideias

que possui... através dos jogadores.

2.2.1. Das ideias à profundidade das imagens em si contidas,

vivenciadas na realidade que é o jogo!

“Os Treinadores pintam imagens - as mais simples, as melhores.”

Ron Greenwood (cit. por Beswick, 2001)

O Modelo não se restringe ao plano conceptual ou ideológico do jogo, ou seja,

compreende igualmente o lado prático uma vez que o jogo é um fenómeno que se encontra em

permanente construção. Em concordância com este ponto, Castelo (1996) e Guilherme Oliveira

(2008) referem que, para além do modelo de jogo compreender uma evolução dinâmica e

criativa ao longo do seu processo de desenvolvimento, também consideram que é tão crucial o

lado das ideias do treinador para o jogar como o é o lado prático do processo, da forma como os

jogadores compreendem o projecto colectivo da equipa e o desenvolvem.

Face a isto, utilizando um dos princípios fundamentais defendidos por Descartes, através

do qual a ciência se desenvolveu, demonstrando a importância do treinador no que concerne à

explanação e operacionalização das suas ideias, o mesmo afirma que “orientar ordenadamente

os pensamentos, começando pelos objectos mais simples e mais fáceis de compreender para

mostrar como pouco a pouco, por graus sucessivos, se chega ao conhecimento dos mais

complexos” (1937, cit. por Gomes, 2008a:15). Associado a este princípio, o treinador deve

retratar imagens, quadros, pinturas, o mais simples, o melhor possível como forma dos

jogadores compreenderem, reconhecerem e caminharem segundo referências que preconizam o

futuro que se pretende alcançar.

Para que a compreensão e formulação dessas mesmas imagens se processe, é

necessário consciencializar toda a organização colectiva que “ (...) a capacidade de pensar

coincide com uma capacidade de simbolizar e de significar” (Soares, 2005:38). Deste modo, os

jogadores podem dar forma às ideias do treinador imaginando-se em acção, e como Lynch

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2.Revisão de Literatura 18

(1986, cit. Beswick, 2001) explica “as imagens ficam tão vivas que o seu sistema nervoso central

não consegue distinguir entre um evento verdadeiro ou imaginário; o seu corpo responde a

ambos do mesmo modo. Assim, um atleta que pinta cada movimento de um evento

correctamente com antecedência, terá uma maior possibilidade de repetir aqueles movimentos,

tendo-os "praticado", de certo modo, antes do evento real. Pense a visualização como um

experimentar de um vestido. Ele é uma forma de prática que o torna familiar com a tarefa”.

Pensar a visualização (do Modelo de Jogo) como um experimentar de um vestido, o qual

é uma forma de prática que se torna familiar com a tarefa, faz-nos reportar ao modelo de jogo

como se de um vestido se tratasse, ou seja, independentemente das medidas, da matriz, da

identidade que o mesmo possui pelas suas formas, não deixa de estar sujeito a reajustes

constantes tendo em vista uma evolução gradativa e interminável, não sendo um “fato pronto-a-

vestir”. Segundo Frank Rijkaard (in Barend & Van Dorp, 1999:72) “Quando Johan se iniciou

como Treinador do Ajax, ele tinha a visão na qual ele continuou acreditar, mesmo quando as

coisas não corriam bem”, ou seja, constatamos que apesar de toda a complexidade que constitui

a construção de um «jogar» específico, o qual está subordinado à concepção/modelo de jogo do

treinador, a essência do mesmo nunca deve ser alterada, uma vez que as medidas do vestido

estão lá (visão/filosofia sobre o «jogar»), alterando-se a sua caracterização por intermédio de

quem o interpreta, dirige, constrói e determina o seu caminho (o treinador e os jogadores).

A visão na qual um treinador consubstancia os seus referenciais sobre o jogo, assenta

num conhecimento específico, sendo que este se representa através da informação que é

representada mentalmente sobre um formato específico (Eysenck & Keane, 1994). Dentro de

uma mesma perspectiva, Damásio (1994 e 2000) refere que as representações constituem o

depósito de todo o conhecimento, tanto o inato como do adquirido através da experiência. Para o

mesmo autor (idem, 2000), a representação “Significa simplesmente «padrão consistentemente

relacionado com alguma coisa», seja com uma imagem mental, seja com um conjunto coerente

de actividades neurais no interior duma região cerebral específica”, ou seja, as ideias do

treinador serão as representações mentais por intermédio das imagens na cabeça dos

jogadores, conferindo-lhes um padrão de potenciais disposições para a prática, padrões esses

relacionados com os referenciais que essas mesmas ideias possuem ao serem

operacionalizadas, construindo-se uma ponte entre o que o treinador preconiza e o modo como

os jogadores o interpretam. Corroborando com a citação de Damásio e seguindo uma ordem

lógica de compreensão das ideias do mesmo, Steve McClaren afirma que “Um grande treinador

é aquele que consegue entrar na cabeça dos jogadores e permanecer lá”, sendo fundamental

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2.Revisão de Literatura 19

que o treinador para além de crer numa filosofia de jogo, com ela seduza os seus jogadores

(Valdano, 1998:10).

Embora existam divergências acentuadas relativamente à origem das imagens mentais,

há unanimidade no reconhecimento da relação destas com as experiências, com as memórias,

com o conhecimento e com as mudanças que estes provocam (Damásio, 1994, 2000;

Greenfield, 2000; Williams et al., 2000; Damásio, 2003, cit. por Guilherme Oliveira, 2004). Como

tal, Damásio (1994:112) refere que o “conhecimento factual necessário para o raciocínio e para a

tomada de decisões chega à mente sob a forma de imagens”, imagens essas que estão contidas

nas ideias que o treinador pretende para o seu jogar, as quais são e estão hierarquizadas de

forma lógica, tendo em vista um futuro evolutivo da equipa em direcção aos objectivos que estão

definidos, sendo que as mesmas só serão compreendidas pelos jogadores, se existir uma forte

transmissão da informação teórica interligada com a prática, ou seja, com a operacionalização

dos exercícios relativos a essas mesmas ideias.

Assim sendo, o conceito imagem mental significa algo que é construído pelo cérebro

através das modalidades sensoriais e é representado na mente (Damásio, 1994; Behrmann,

2000; Damásio, 2000; Greenfield; Kossolyn, 2000; Llinas, 2000, cit. por Guilherme Oliveira,

2004). Então, falar-se de imagens mentais é falar-se das imagens que são criadas através do

“sentir” de todas as modalidades sensoriais levadas a cabo pelas experiências vivenciadas.

Desta forma, as imagens mentais evidenciam de forma criativa propriedades, processos,

relações e acções do organismo com o mundo (Damásio, 1994; Behrmann, 2000; Damásio,

2000; Greenfield; Kossolyn, 2000; Llinas, 2000; Williams et al., 2000; Damásio, 2003; cit. por

Guilherme Oliveira, 2004).

Todas essas propriedades, processos, relações e acções do organismo com o mundo,

inserem-se numa realidade de jogo que o treinador pretende, não sendo um jogo qualquer mas

sim, o nosso «jogar». Se a ligação das ideias do treinador às imagens formadas pelos jogadores,

advêm não só da transmissão da informação teórica associada à operacionalização dessas

mesmas ideias no treino, então, podemos concluir que tudo passa pelo modelo que

pretendemos. Segundo Faria (s/d, cit. por Lourenço & Ilharco, 2007, pp. 94), “ Modelo, no fundo,

é o entendimento da complexidade que é o jogo e a identidade do treinador em função desse

jogo. É olhar para o jogo, modelá-lo entre indivíduos pensantes, o que se pretende é que exista

uma linguagem comum. Isto só se consegue se todo o processo de treino e de jogo for

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2.Revisão de Literatura 20

concebido numa perspectiva de organizar comportamentos que criem essa linguagem comum.

Tem de se pensar o jogo a cada minuto e a cada segundo.”

Dois bons exemplos da complexidade que o jogo em si encerra, tendo em conta a

elevada quantidade de imagens que os jogadores processam, gerem, seleccionam e escolhem,

as quais estão subordinadas a um referencial comum entre todos eles, ou seja, o modelo de

jogo, é possível constatar através da afirmação de Bosman (in Barend, F. & Van Dorp, H.,

1999:74) e Pelé (cit. por Lobo, 2008), respectivamente: “Cruyff sempre foi muito perspicaz na

distância entre o avançado centro – neste caso o Marco Van Basten – e eu próprio, não podendo

estar mais de cinco a dez metros, sendo que quando o ataque era travado, eu não devia permitir

que o adversário tivesse espaço para o contra-ataque. Quando nós atacávamos, eu também

tinha de estar perto do Marco devido ao facto dele poder jogar apoiado comigo (passes curtos).

Onde eu sinto dificuldade é no facto de ter de observar onde está a bola, saber o que decorre

atrás de mim e, também, percepcionar o que quer que o Marco faça. Eu tenho de antecipar os

movimentos do Marco, os quais requerem muita concentração (...) Mas eu não sou o jogador

para o qual eles tem de passar a bola. Eu não tenho de pedir a bola, tenho sim de criar espaço.”;

Num curto diálogo, entre Nílton Santos e Pelé, no qual o segundo questiona Nílton sobre o que é

que se passa na cabeça dos jogadores na hora de uma jogada, Nílton respondeu “Tem nego aí

que não passa nada.”, ao que Pelé confessou “Pois na minha passa um filme de longa-

metragem!”

Tendo em conta os dois exemplos anteriores, e verificando-se a complexidade dos

referenciais que o jogo possui pela enormidade de estímulos que imana, estando esses

estímulos não só associados ao Modelo de Jogo da equipa que representam mas também, a

todas as vivências que caracterizam o processo de formação do jogador ao longo da sua

carreira, António Damásio (2009) refere que “o cérebro cognitivo funciona numa escala de

milisegundos, por isso é extremamente fácil para nós aprendermos muito rapidamente uma

quantidade de factos, recolhermos uma quantidade de imagens e recordarmo-nos delas,

manipularmos de uma forma inteligente e ao mesmo tempo, as emoções que deviam ter sido

disparadas em relação a certos factos, em relação a certos acontecimentos, não conseguem ser

disparadas por não há tempo.”

Assim sendo, o Modelo de Jogo potencia o conhecimento do jogo, o vivenciar das

circunstâncias do mesmo, o reconhecer dos referenciais colectivos e individuais, dentro dos

planos de acção comuns (princípios de jogo) e individuais, dentro dos princípios colectivos da

equipa, alicerçados aos quatro momentos do jogo, permitindo que a equipa tenha e adopte um

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2.Revisão de Literatura 21

comportamento prospectivo e não reactivo, ou seja, haja sobre o meio, sobre o jogo, criando no

mesmo as circunstâncias favoráveis para que os padrões da própria equipa se manifestem,

fazendo com que os jogadores ajam sobre o jogo e não reajam perante o que o jogo dita. Assim

sendo, é crucial que o sentido que o Modelo de Jogo dá à equipa, faça com que a mesma

conduza o jogo para onde pretende.

2.3. O papel do Modelo de Jogo …

“ Nascemos para o sentido, não para o prazer, a não ser que esse prazer esteja embebido de sentido.”

Jacob Needleman (2008)

Um profundo conhecimento do Modelo de Jogo, “permitir conhecer muito bem o «jogar»

que se quer implementar pois só um intenso domínio disto é que permite que se “jogue” com

todos os factores em causa com a devida fluidez e sempre com metas específicas bem

delineadas” (Campos, 2007). É através do modelo de jogo que o treinador e os jogadores

desenvolvem uma dada forma de jogar, com determinados princípios de acção. Como tal, “para

se conseguir um determinado jogar é preciso conhecê-lo e conhecer é ter um Modelo de Jogo

que vai direccionar a Intencionalidade daquilo que nós pretendemos” (Gomes, 2007), pelo facto

de cada treinador conceber e criar o seu próprio modelo de jogo.

2.3.1. … na tomada de decisão do Treinador…

O facto do modelo de jogo ser concebido e criado por um determinado treinador,

existindo uma ligação intrínseca entre o que se pretende e o que se vai operacionalizar, permite-

nos dizer que conhecer bem o modelo de jogo é ter uma ideia mais geral, a qual está alicerçada

a comportamentos mais específicos, permitindo que os redireccionamentos e reajustamentos

sejam realizados de forma constante, de acordo com as necessidades contextuais, tendo em

vista a Especificidade do mesmo, ou seja, não é um Modelo de Jogo qualquer, é o nosso

modelo, é o “jogar” do treinador que o concebeu, criou e conhece.

Deste modo, Guilherme Oliveira (2006) afirma que “o modelo de jogo é uma coisa muito

complexa e muitas vezes as pessoas são muito redutoras no entendimento deste conceito de

modelo porque pensam que o modelo de jogo é apenas um conjunto de comportamentos e

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2.Revisão de Literatura 22

ideias que o treinador tem que transmitir a determinados jogadores”. E por isso acrescenta que

“o modelo de jogo tem a ver com as ideias que o treinador tem para transmitir aos jogadores, isto

é, com a sua concepção de jogo, mas também tem de estar relacionado com os jogadores que

tem pela frente, com o que entendem de jogo. Deve estar relacionado com o clube onde está,

com a cultura desse clube porque existem clubes com culturas completamente diferentes.”

Desta forma, reconhece-se um papel fundamental ao contexto e aos aspectos que

influenciam o desenvolvimento e a concretização do modelo, tendo nos conhecimentos que o

jogador dispõe, os quais lhe são transmitidos na relação que trava com o treinador no

desenvolvimento do processo, uma orientação prioritária para certas sequências de acção, em

detrimento de outras (Tavares, 1993). Visto isto, para Morin (1990, cit. por Tavares, 2003) “todo

o conhecimento adquirido sobre o conhecimento torna-se num meio de conhecimento,

iluminando o conhecimento que permitiu adquiri-lo”. Concorrendo com a afirmação anterior, a

transmissão do modelo de jogo do treinador aos seus jogadores, permite que haja um cruzar de

ideias, as quais estão directamente relacionadas com as vivências de cada um dos

intervenientes. Essas mesmas vivências conduziram e conduzirão o treinador e o jogador no

criar dos seus próprios modelos, modelos esses que formam o conhecimento de cada um deles,

condicionando e dirigindo a focalização da sua atenção na informação para a qual ambos estão

mais sensíveis, permitindo-lhes desenvolver esse conhecimento, ou seja, o seu conhecimento

específico, o de cada um deles.

Apesar destes dois intervenientes serem duas das pedras fundamentais para o

desenvolvimento do mesmo, há que salientar que ambos se encontram inseridos numa estrutura

mais complexa, a qual funciona como ponto de partida para tudo, ou seja, “é evidente que

quando um clube contrata um treinador, contrata ideias de jogo porque sabe que vai jogar dentro

de determinadas ideias. Mas também o treinador quando chega a um clube tem de compreender

que vai para um clube com um determinado tipo de história, com determinado tipo de cultura,

com um determinado historial num país com determinadas características. E o treinador tem de

compreender tudo isso e o modelo de jogo tem de envolver tudo isso. E se não se envolve com

tudo isso, o que vai acontecer é que, por mais qualidade que possa ter, pode não ter o mesmo

sucesso do que se tudo isso estiver relacionado” (Guilherme Oliveira, 2007).

Segundo a ideia enunciada pelo autor anterior, o treinador quando é contratado para

uma organização superior, o Clube, não vai nem pode alterar as estruturas identificadoras da

mesma, pelo facto de estar a sacrificar, anos e anos de história. Então, o treinador é inserido

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2.Revisão de Literatura 23

nessa estrutura com o intuito de acrescentar a sua cultura (de jogo) ao mesmo, possibilitando

que haja uma evolução da entidade superior, por intermédio de novas linhas de orientação do

processo. Assim, o desenvolvimento de um jogo envolve um conjunto de aspectos que o

treinador, enquanto líder do processo, tem de gerir para o conduzir para onde pretende.

Neste sentido, para Vítor Frade (2003:VII) o treinador assume-se no “comando exterior

ao sistema regulado”, sendo que o papel do mesmo “é para interferir” com o sentido de

“catalisar” a concretização do processo. Tendo em conta esta vertente pragmática, o autor

considera determinante que o treinador “tem de ser na realidade o indivíduo que aproxima tudo

que é favorável ao crescimento qualitativo do processo, no sentido do futuro a que se aspira”. Ou

seja, observando a “Inteireza Inquebrantável do jogo”, assumimos o modelo como a concepção

de uma expressão de jogo tendo como princípio base, o estar constantemente a ser visualizado,

mantendo-se o futuro como o elemento causal do comportamento (Frade, 1985, 2006 e 2007).

2.3.2. … e na intervenção do mesmo no decorrer da construção do

processo.

Mais do que planear e estruturar o processo, no entendimento de Guilherme Oliveira

(2004), o treinador tem um papel determinante na concretização do mesmo, através da sua

intervenção. O seu modo de interagir e intervir no desenvolvimento do processo de treino e da

competição é muito importante, na medida em que regula os acontecimentos no sentido do que

pretende (Garganta, 2004). Guilherme Oliveira (2004) reconhece que a forma como o treinador

intervém “no aqui e agora” é muito importante para configurar a qualidade do processo, ou seja,

“os jogadores agem livremente, sem serem livres de agir” (Oliveira et al., 2006), em função do

que se pretende.

Assim sendo e em função da construção de um jogar de qualidade que o treinador

pretende para a sua equipa, uma das características marcantes para que tal se verifique é o

jogar como equipa, e como tal, Mourinho (in Oliveira et al., 2006) afirma que para se jogar desse

modo é necessário “ter organização, ter determinadas regularidades que fazem com que, nos

quatro momentos do jogo, todos os jogadores pensem em função da mesma coisa ao mesmo

tempo”. Para que tal possa ser construído, o treinador deverá ter como bússola orientadora

desse processo, a organização do jogo preconizada no Modelo de Jogo do primeiro.

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2.Revisão de Literatura 24

Respeitar essa bússola é cumprir o supraprincípio da especificidade, atingido através do

pragmatizar a fraccionação, isto é, através do contemplar da vivenciação aquisitiva dos diversos

princípios, subprincípios, subprincípios dos subprincípios do seu jogar (Oliveira et al., 2006).

Portanto, seguindo a ideia dos autores anteriores, não podemos ignorar que a “dinâmica do

competir é parte integrante da dinâmica do treinar”, como também, “Só se poderá chamar

especificidade à Especificidade, se houver uma permanente e constante relação entre as

componentes psico-cognitivas, táctico-técnicas, “físicas” e coordenativas, em correlação permanente

com o modelo de jogo adoptado e respectivos princípios que lhe dão corpo.” (Guilherme Oliveira,

1991).

Corroborando com a afirmação anterior, Gomes (2007) menciona que “o sentido da

progressão do menos complexo para o mais complexo tem uma ordem e essa ordem só tem

Sentido quando conhecemos bem o jogar e percebemos o que é mais difícil”. Ou seja, o

conhecimento profundo do processo que pretendemos desenvolver, é que nos faz criar as linhas de

condução ou referenciais de orientação do processo, fazendo com que o mesmo esteja sob o

comando de uma hierarquização lógica de condução, permitindo que o desenvolvimento e evolução

do Modelo de Jogo estejam alicerçados a uma lógica coerente, que de etapa para etapa, assuma

uma complexidade crescente.

A construção do Modelo de Jogo assume o desenvolvimento de uma complexidade

crescente, rumo à evolução do nosso «jogar», o qual tem necessidades contextuais, tendo em vista

a Especificidade. Uma vez que a Especificidade depende “ (…) dos contextos, do próprio modelo e

do próprio jogar.” (idem, 2007), a hierarquização dos princípios adquire uma particular importância.

Assim sendo, a interacção dos princípios da alternância horizontal, da progressão complexa e das

propensões em Especificidade, “não podem deixar de estar interligados pelo jogar, por isso é que o

Modelo é extremamente importante, porque é uma coisa que se vai desenvolvendo e é o que vai

dar Sentido à articulação destes princípios todos.” (ibidem, 2007).

Deste modo e tendo em consideração que os três princípios metodológicos estão

interligados, não sendo possível dar primazia a nenhum deles, há que saber como é que cada um

deles contribui para a construção do Modelo, sendo que os mesmos fazem a ponte entre o Modelo

de Jogo e o Modelo de Treino.

Por intermédio do Princípio das Propensões, o qual se refere à criação de contextos

propícios a determinadas aquisições, Gomes (2007) refere que “tem de haver um Sentido

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2.Revisão de Literatura 25

associado, pois só é aquisitivo quando ao fazermos, soubermos minimamente aquilo que estamos a

fazer.” (...), conduzindo-nos simultaneamente com os jogadores, numa primeira instância para uma

dimensão maior, “que é a dimensão do Sentido porque temos que desenvolver o jogar por níveis de

organização e temos que articular os sentidos e hierarquizar.” Numa segunda instância para uma

dimensão menor, “que é saber nesse mesmo Sentido que contexto é que vamos proporcionar.”

Para que os contextos propícios a determinadas aquisições sejam vivenciados na sua

plenitude, há que ter em conta o Princípio da Alternância Horizontal, o qual, segundo Gomes (2007)

permite “ (…) variar o registo das solicitações específicas em cada dia (…) ” e, através dessa

variação, reconhecer o desgaste que os jogadores têm, fraccionando o jogar para que em cada dia,

estejam a desenvolver esse mesmo jogar dentro de desempenhos máximos, tanto em condições

mentais como físicas. Completando o ciclo metodológico, há que variar o grau de complexidade e,

por consequência, o tipo de exigências, permitindo que o objectivo do treinador não se centre

somente na evolução do jogar mas também, na necessidade que esse mesmo jogar exige em

termos de recuperação.

Seguindo o raciocínio anterior, surge uma crescente preocupação com a questão da

familiarização com aquilo que é a cultura de jogo da própria equipa, sendo que o treinador tem

um papel crucial no modo como intervém, ou seja, existe uma necessidade constante de avaliar

o que é a nossa equipa, os nossos jogadores e qual o conhecimento dos mesmos sobre o jogo

da equipa (Faria, 2007). Assim, quanto maior for a cultura de jogo da equipa, mais facilitada será

a antecipação do nosso jogo.

Portanto, o Modelo de Jogo surge do desenvolvimento de uma procura empírica, a partir

dos princípios do modelo de jogo para apreender uma lógica prática do desenvolvimento desse

modelo, conduzindo-o para critérios de análise contextualizados pelo modelo que o treinador

pretende desenvolver com os jogadores. Reforçando este lado pragmático do processo, Vítor

Frade (2003:III) afirma que “mais importante que a própria noção de modelo, são os princípios do

próprio modelo”, uma vez que nem todos assumem a mesma importância nem são

operacionalizados da mesma forma.

Seguindo a ideia do autor supracitado, Gomes (2007) afirma que “a manutenção do

princípio é uma coisa dinâmica em evolução constante”, permitindo-nos perceber que o treinador

potencia uma ideia de evolução permanente, ou seja, apesar de uma equipa ter solidificado uma

determinada forma de jogar, a mesma não deve ser estanque, tendo o treinador um papel

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2.Revisão de Literatura 26

imperial no criar de uma complexidade crescente desse mesmo jogar. Caso contrário, não há

evolução nem da equipa nem dos jogadores (Guilherme Oliveira, 2007).

Concluindo este ponto, a qualidade da intervenção do treinador está dependente de um

perfeito conhecimento do Modelo de Jogo. Como tal, Faria (2007) aponta estas preocupações

como nucleares quando diz o seguinte: “Durante a execução do exercício, a intervenção em

função da relação jogador-exercício-treinador, leva a que por vezes sintamos a necessidade de

criar ainda mais qualquer acrescento para que o que pretendemos se manifeste de forma ainda

mais vincada e este tipo de intervenção é apenas possível se soubermos muito bem onde

estamos e para onde queremos ir, isto é, exige-se um conhecimento muito bem estruturado do

Modelo de Jogo que nos permita reajustar a intervenção sempre no sentido de um

direccionamento específico.”

2.4. O papel do Modelo de Jogo na tomada de decisão dos

Jogadores

“ Exercitamos o nosso Modelo de Jogo, exercitamos os nossos princípios e sub-princípios de jogo,

adaptamos os jogadores a ideias comuns a todos, de forma a estabelecer a mesma linguagem

comportamental. Trabalhamos exclusivamente as situações de jogo que me interessam, fazemos a sua

distribuição semanal de acordo com a nossa lógica de recuperação, treino e competição, progressividade

e alternância. Criamos hábitos com vista à manutenção da forma desportiva da equipa, que se traduz por

um frequente «jogar bem» ”

Mourinho (2005)

“A maneira como o indivíduo apreende e interpreta a informação depende da sua

experiência, dos seus valores, das suas aptidões, das suas necessidades e das suas

expectativas. Temos tendência para reter os dados que são compatíveis com as nossas

convicções e as nossas ideologias, e que nos convêm” (Abravanel, 1986).

De acordo com Faria (1999), o jogo é uma construção activa que se desenvolve e

decorre da afirmação e actualização das escolhas e decisões dos jogadores, realizadas num

ambiente de constrangimentos e possibilidades.

Concorrendo para esta questão, Frade (1985:21) reconhece que “toda a acção do jogo

contém incerteza” e por isso, é necessário “realizar estratégias de comportamento, como arte de

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agir em condições aleatórias e adversas”. Através desta ideia, este autor evidencia a importância

de um modelo de comportamentos e princípios de acção para construir uma dada forma de

jogar.

Reforçando este aspecto, Le Moigne (1994), refere que o projecto do modelizador – o

modelo de jogo – permite compreendê-lo projectivamente ou seja, torna a representação

significativa. Assim, pode dizer-se que as decisões dos jogadores têm um determinado valor e

sentido, na concretização e desenvolvimento do modelo de jogo. Por isso, os factos de jogo são

interpretados à luz de um mesmo código simbólico ou seja, de um universo conceptual. Universo

conceptual esse que permite que o jogo esteja, constantemente, a ser visualizado pelos

jogadores, constituindo-se um «filme de longa metragem» como salienta Pelé (cit. por Lobo,

2008).

Por intermédio das afirmações anteriores, depreendemos que os acontecimentos mais

complexos, os quais conduzem os seres humanos de excelência nas mais diversas áreas, à

execução da tarefas “aparentemente” simples, são dotados de uma extrema sensibilidade para

algo que só quem foi ou é estimulado para e na acção, possui a capacidade de reconhecer tais

informações. Mas, tudo isto acontece porque jogador é considerado como um manipulador de

símbolos tal como um computador: ambos usam símbolos e realizam operações baseadas

nesses mesmos símbolos (1988, Gibson, cit. por Wallian, N. & Chang, C.-W., 2007). Segundo

Frade (1985), “A aprendizagem consiste, num sentido, em fazer significar acontecimentos, em

transformar o acontecimento-ruído em acontecimento-sinal, ou mesmo em acontecimento-signo:

o ruído é transformado pela aprendizagem em sinal.”, sendo que toda a informação que se

transmite e se pretende que seja assimilada e acomodada por parte dos jogadores, está

subordinada a uma sólida raiz de ideias, ao Modelo de Jogo que pretendemos operacionalizar

conjuntamente com os jogadores. O Modelo de Jogo é uma Cultura do jogo e do treino que

pretendemos para a nossa organização, para a nossa equipa, e na procura de compreender as

ideias do mesmo, Morin (1987) refere que a “Cultura não é um mero suplemento de que

usufruem as sociedades humanas em contraste com as sociedades animais. É ela que institui as

regras – normas que organizam a sociedade e governam os comportamentos dos indivíduos;

constitui o capital colectivo dos conhecimentos adquiridos, dos saberes práticos apreendidos,

das experiências vividas, da memória histórico-mítica, da própria identidade de uma sociedade.”

Consubstanciada com a afirmação de Edgar Morin, Lourenço & Ilharco (2007) afirmam

que “ (...) a forma como os outros se vêem através de quem os rodeia é um aspecto central do

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processo de formação e desenvolvimento da identidade de cada um.”, sendo que a ênfase dada

ao indivíduo deve sempre ter um referencial colectivo e segundo Frade (2004, cit. por Campos,

2007:35/36): “Não há treino mais individualizado ou repercussões do treino mais individualizadas

do que aquelas que permite a Periodização Táctica. Porque a primeira preocupação que tem é

eleger os princípios e os princípios são levados a efeito pelos jogadores, os jogadores em

determinadas posições e determinadas funções. Portanto se são posições e funções diversas,

embora complementares, o que se repercute em cada uma dessas posições ou funções é

diverso das demais portanto é individualizado.”

Deste modo e corroborando com a afirmação anterior, Damásio (2000) afirma que “Um

organismo dotado de consciência ampliada dá mostras de que atenta para uma grande esfera de

informações que estão presentes não só no meio externo mas também no interno, o meio de sua

mente.” Como exemplo e tendo em conta que o jogador é um elemento possuidor de consciência

ampliada, podemos dizer que durante as suas acções no jogo, provavelmente, presta atenção a

vários conteúdos mentais ao mesmo tempo: o seu posicionamento, o local onde está a bola, o

momento de jogo em que a equipa se encontra, quais as suas funções perante esse momento,

que questões suscita o jogo e como deve responder às mesmas, qual o resultado, como está a

responder a equipa às circunstâncias do jogo, sendo que tudo isto se processa no próprio

jogador, no ser conhecedor do contexto onde está inserido. Como tal, o autor salienta (idem,

2000) que “Nem todos esses conteúdos se destacam igualmente, estão definidos com o mesmo

grau de nitidez, mas todos se encontram no palco e, em um momento ou outro, por muitos

segundos ou até minutos, um ou alguns deles vêm para a ribalta.”

2.4.1. A Cultura da equipa que se verifica no entendimento e

interpretação comum do jogo

O modelo de jogo define-se na referência colectiva a partir da qual os jogadores

analisam e interpretam os factos do jogo conferindo-lhe uma significação pessoal, a qual deve

convergir para uma lógica interna de funcionamento (Garganta & Cunha e Silva, 2000; Gomes,

2006). Deste modo, é importante que este entendimento individual seja congruente com o

entendimento da equipa para se criar uma lógica comum, não podendo deixar salientar que o

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2.Revisão de Literatura 29

mesmo modela a base de interpretação dos jogadores, os quais têm ideias, experiências,

valores e conhecimentos diferentes. Através dele os factos do jogo são interpretados segundo

uma mesma lógica (Gomes, 2006).

Segundo Saussure (cit. por Gomes, 2006:8), uma equipa “ (...) é uma totalidade

organizada por elementos solitários, que podem definir-se apenas uns em relação aos outros,

em função do seu lugar nesta totalidade.” mas para que tal aconteça, Valdano (1998) e Cruyff (in

Barend, F. & Van Dorp, H., 1999) defendem que para existir um jogo de qualidade, é crucial ter

cinco ou seis jogadores a pensar na mesma coisa ao mesmo tempo como também, se um ou

dois jogadores não estiverem cem por cento concentrados e falharem no desempenho das suas

funções, a equipa não funcionará bem.

O modelo de jogo e os seus princípios procuram uma percepção comum dos factos do

jogo concorrendo para uma organização comportamental, ou seja, que as decisões dos

jogadores se inscrevam num contexto Específico Colectivo. Convergindo nesta lógica, esta ideia

enaltece a importância de perante um mesmo acontecimento haver um entendimento comum

dos jogadores. Segundo Vítor Frade (1985:3), existe “a necessidade de ter já em si uma

representação daquilo que apreende”.

A relevância deste conceito é fundamental pois como nos refere Cunha e Silva

(1999:57), “a percepção é já, de certa forma, acção, porque o corpo se encontra comprometido

com o mundo quando percepciona: como que o antecipa”. Assim, Garganta (2005:180) defende

que o jogo existe na confluência de uma dimensão mais previsível (as leis e princípios de jogo),

com outra menos previsível, materializada a partir da autonomia dos jogadores, os quais

introduzem a diversidade e singularidade dos acontecimentos.

Justifica-se então dizer que o “ (…) jogo e o treino devem ser perspectivados como

sistemas acontecimentais dinâmicos, a partir do reconhecimento da importância das interacções

dos jogadores/equipas para agirem eficazmente em situações de elevada instabilidade e

variabilidade.” (Júlio e Araújo, 2005), sendo que esse diálogo de ordem-desordem-auto-

organização, desenvolve-se continuamente dentro de um sistema aberto relativo que pode estar

auto-determinado e auto-regenerando-se (Wallian, N. & Chang, C.-W., 2007). Assim um sistema

autónomo, como é o caso da equipa, troca não só com o meio ambiente mas também dentro do

seu próprio sistema.

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Deste modo, a tomada de decisão não é algo aleatório ou seja, apesar das

particularidades do contexto, o jogador é sobre condicionado a decidir em função do projecto de

jogo da equipa e portanto, dos seus princípios. Assim, o modelo de jogo permite condicionar as

escolhas dos jogadores para um padrão de possibilidades ou seja, orienta as decisões dos

jogadores.

Damásio (2003) refere-nos que a tomada de decisão resulta dos valores e das

representações que temos acerca dos fenómenos em que nos envolvemos. Assim, o modelo de

jogo permite desenvolver um conjunto de convicções e representações mentais dos

comportamentos a desenvolver nos vários momentos de jogo.

A partir desta lógica, os princípios contextualizam as decisões dos jogadores nos vários

momentos e portanto, definem-se na ordem organizativa do jogo. Neste sentido, os princípios

criam uma cultura. Através deste conceito procuramos esclarecer a existência de um conjunto de

valores e princípios que caracterizam a dinâmica da equipa como uma entidade colectiva. Desta

forma, edifica-se uma representação e uma base de funcionamento que faz com que os

comportamentos individuais se inscrevam espontaneamente nessa mesma cultura. Tal como

acontece nas sociedades, a existência individual desenvolve-se de acordo com um conjunto de

princípios e valores que asseguram uma coexistência, segundo uma cultura (Gomes, 2006).

Baseando-nos no conceito de conhecimento personificado (Lave & Wenger, 1991;

Kishner e Whitson, 1997; in Wallian, N. & Chang, C.-W., 2007), não podemos separar mais “a

acção” dos “actos do discurso” pelo facto do modelo de jogo ser o promotor da manifestação das

ideias, dos valores, das regras, das acções, as quais culminam em acções que possuem uma

relação íntima entre “o que se faz” e o “que se diz”. Para que seja possível a manifestação de

uma cultura, é importante que os princípios de jogo permitam que os jogadores e equipa tenham

sucesso na resolução dos seus problemas, uma vez que “o jogador só consegue fazer

determinado comportamento bem se primeiro o compreender e depois, se achar que realmente

esse comportamento é benéfico, tanto para a equipa como para ele” (Guillherme Oliveira, 2006:).

Corroborando com a afirmação anterior, Frade (2003) destaca que o jogo “ tem de

nascer primeiro na cabeça dos jogadores”, sendo crucial que o treinador saiba utilizar estratégias

para que os jogadores reconheçam a importância de determinado comportamento porque só

dessa forma a qualidade se manifesta (Guillherme Oliveira, 2006), ou seja, os jogadores

funcionam como condutores do processo, são as suas convicções que desenvolvem o modelo

de jogo.

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Pela existência de uma lógica de condução do processo, a configuração a dar à prática

de modo a tornar possível a antecipação, é algo de imperial na construção de uma lógica de

resolução de problemas, os quais se devem ao facto de existir “uma prática Específica, isto é,

desde o início do processo, temos que criar um contexto macro que nos vai direccionar sempre

no mesmo sentido e, seja num exercício mais particular, seja num exercício mais complexo, isso

tem que estar sempre presente.” (Gomes, 2008). Dentro da mesma lógica, Guilherme Oliveira

(2007) afirma que um “comportamento mais geral no momento de organização ofensiva e o

comportamento mais individual tem a ver com esse comportamento mais geral”.

Esta sujeição a um contexto macro revela-se assim como a chave para cada jogador

perceber antecipadamente o que vai ser decidido pelo colega, sendo esta a premissa base para

se poder antecipar tornando o jogo mais rápido.

Partilhando da mesma opinião, Mourinho (s/d, Oliveira et al., 2006:121) afirma que “Não

se confunda «velocidade de jogo» com «velocidade do jogo». A primeira está intimamente ligada

à «velocidade mental», à capacidade de antecipar o que vai acontecer e decidir pela resposta

mais adequada, levando-nos para o treino qualitativo, contextualizado.” O mesmo autor (idem,

2006:122-123) defende que todos os jogadores têm de saber que em “ (…) determinada posição

há um jogador, que sob o ponto de vista geométrico há algo construído no terreno de jogo que

lhes permite antecipar a acção”, conduzindo a construção de um jogar de qualidade na cabeça

dos jogadores, ou seja, “um mapa do seu futebol” (Resende, 2002:18).

Deste modo, a preocupação dos jogadores deve centrar-se nos adversários e nunca os

colegas. Como tal, para que isto aconteça, implica que exista uma “ «Obsessão» pelo Jogo

Posicional”, tendo por base um ajustado Sistema de Jogo, através do qual “cada Jogador possui

um mapa do jogar da equipa, que lhe permite a qualquer momento ter a noção de onde se

encontram os colegas.” Assim, esta deixa de ser uma preocupação, passando a ter apenas de

gerir o posicionamento dos adversários, este sim, imprevisível à partida. (Maciel, 2008).

Por intermédio da ideia, a qual nos conduz para a percepção de uma geometria da

equipa, dos referenciais que a mesma oferece aos jogadores em treino e em jogo, conduz-nos

para a noção de fenomenológica, “no sentido em que coloca ênfase nas condições necessárias

(não as propriedades) para uma dada entidade, ser o que é” (Ilharco & Lourenço, 2007). A par

disto, Introca e Ilharco (cit. por Ilharco & Lourenço, 2007:82) salientam que, “para a

fenomenologia, o significado não está «em» algo mas antes ele se encontra «na» ligação, nas

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relações ou referências para o algo, para ser como já é tomado quando adquirido pela nossa

actividade contínua na nossa vida quotidiana.”

2.4.2. Da Cultura da Percepção à Cultura Comportamental

O jogo é uma actividade que resulta das ligações, das relações ou referências para o

algo e, como tal, concretiza-se na acção. Expressando esta ideia, Frade (2003:XVI) refere que o

jogo acontece no domínio de “um saber fazer”. Contudo, este saber fazer é tanto melhor quanto

mais apoiado num saber sobre um saber fazer, ou seja, sobre um entendimento consciente das

interacções a desenvolver no jogo.

Neste sentido, o entendimento comum do jogo serve para potenciar o desenvolvimento

de uma cultura comportamental (Gomes, 2008). Como exemplo, Frade (2006) afirma que “ o

Eusébio era um exímio executante mas se lhe pedissem para explicar, ele não sabia. Por outro

lado, o Paulo Sousa executava excelentemente as suas acções e para além disso, verbalizava-

as tão bem quanto executava. Os jogadores são profissionais de futebol, profissionais de um

saber fazer mas se para além disso, souberem explicar como o fazem (saber sobre o saber

fazer), ainda melhor!” São essas experiências e as explicações de como elas são executadas,

que permitem vivenciar exteriormente o que os jogadores executam e o que sentem após a

execução. Contudo, os jogadores não tem obrigação de saber explicar o modo como executam

porque isso não lhes é exigido mas caso o consigam fazer e, neste caso do melhor modo, todos

os apaixonados pelo Futebol agradecerão o seu contributo.

De acordo com o supracitado, há que diferenciar o conhecimento implícito e conhecimento

explícito manifestados. Ao dizermos que os jogadores sabem fazer muitas coisas, estamos a falar

de um conhecimento implícito, ou seja, um conhecimento que eles não têm – de forma explícita –

como tal, mas do qual já podem dispor quando o utilizam. Deste modo, dizemos que saber que uma

coisa é mais ou menos assim (explícito) e falamos de um saber sobre como alguma coisa que

funciona (implícito). Se todos os jogadores utilizassem o seu discurso com base no saber, não seria

necessário considerar as duas formas de saber: saber implícito e saber explícito. Expressamos

assim, em qualquer contexto, simplicidade e clareza utilizando os dois termos do saber e saber fazer

(Spitzer, 2007).

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2.Revisão de Literatura 33

Assim, importa salientar que existe uma preocupação com a construção de um vínculo

entre o saber fazer e um saber sobre um saber fazer, isto é, “o corpo e a mente podem ser

juntos. É possível desenvolver hábitos em que o corpo e a mente se encontrem perfeitamente

coordenados” (Varela et al., 2001:55). O resultado desta íntima ligação, em jogo, manifesta não

só o conhecimento do próprio meditador individual mas também, é extensível a todos os outros

elementos, conferindo a “um determinado jogar uma dimensão consciente, uma Consciência

Táctica, e não apenas algo circunscrito à esfera do automatismo” (Maciel, 2008).

Deste modo, a Consciência Táctica, um saber sobre um saber fazer, tem como principal

valia numa modalidade colectiva como o Futebol, permitir a sincronia de pensamentos entre os

elementos de uma equipa. O saber sobre um saber fazer, é o domínio do saber que permite que

os jogadores pensem em função da mesma coisa ao mesmo tempo (Carvalhal, 2002). É esse

pensamento grupal, o qual está centrado na referência colectiva que permite aos jogadores

analisar e interpretar o jogo, conferindo-lhe significado individual e categorizando deste modo os

dados significativos do contexto (Gomes, 2008). Por isso, a Cultura comportamental comum, a

qual tem subjacente a consciencialização de um determinado Modelo de Jogo (Maciel, 2008),

que se encontra subordinado à concepção e condução de um jogo através de uma

SupraDimensão do mesmo, a SupraDimensão Táctica (Lopes, 2007).

No Futebol, sendo a Inteligência um auxílio determinante, torna-se fundamental pensar

sobre o que se faz, com o intuito de se poder perceber como se faz e como se pensa, ou qual a

distância a que nos encontramos de tais intentos, e quais as razões para tal. Deste modo, “o

verdadeiro treino”, vai além da criação de um saber fazer, devendo permitir desenvolver

igualmente um conhecimento sobre o saber fazer (Garganta, 2004), mas sobretudo, em nosso

entendimento, o desenvolvimento de um saber sobre o saber fazer. A par da ideia anterior,

Guilherme Oliveira (2006) destaca que se “pretende criar uma certa filosofia de entendimento e

de manifestação do comportamento.”

O fundamento do treino é preparação inteligente dos jogadores. Trata-se de um

raciocínio global, complexo, que envolve o treino e o jogo da mesma forma e no mesmo

processo. O treino faz parte do todo que é o jogo (Ilharco & Lourenço, 2007). Quando o treino faz

o jogo, também há a desmontagem do processo e, consequentemente, do jogo. Dessa forma, há

uma permanente articulação de sentido, que permite, em todos os momentos do treino, haver

coerência no que se faz e nos conhecimentos adquiridos pela equipa e pelos jogadores

(Guilherme Oliveira, 2004).

“A qualidade do jogo depende do conhecimento que os jogadores têm do que querem,

do que sabem, daquilo que não sabem, do que podem e não podem fazer.” (Garganta & Oliveira,

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2.Revisão de Literatura 34

1996:8). De acordo com Frade (2007) estes saberes podem ser concretizados considerando-se,

um saber fazer e um saber sobre um saber fazer. Assim, evidencia-se o sentido e a

intencionalidade da educação do jogador para uma inteligência superior, para linhas

orientadoras, as quais se formam por intermédio do Modelo de Jogo. Essas linhas de orientação

ou princípios de jogo, os quais são objectos de e do treino, não são nem mais nem menos do

que comportamentos colectivos e individuais, articulados entre si.

Por intermédio de um outro olhar, Guilherme Oliveira (2006 e 2008) perspectiva o

princípio de jogo como um início, inicio esse que tem a si alicerçados os conceitos de

organizações estrutural e funcional. A primeira centra-se nas disposições iniciais dos jogadores

em campo, ou seja, um mapa geométrico inicial, estático. Implicitamente relacionada com a

primeira, surge-nos a funcional como uma forma de manifestação do Modelo de Jogo, isto é, “ é

o produto da criação que a interacção entre a concepção de jogo do treinador, os princípios e os

sub-princípios que o constituem, a intervenção activa dos jogadores no Modelo e as diferentes

estruturas que esse Modelo pode assumir” (idem, 2006 e 2008).

Deste modo, a equipa e o jogo que a mesma produz está em permanente construção

dependendo das interacções entre os diferentes aspectos que os constitui, parecendo-nos

crucial mencionar que os acontecimentos que não são abrangidos pelos princípios, ao eclodirem

no calor do jogo, possam criar novos entendimentos e conhecimentos do jogo como também,

novas possibilidades de acção. Ou seja, a “natureza é imprevisível porque, no ponto de

bifurcação, apresentam-se em geral diversas possibilidades. É então um problema de

probabilidade determinar qual das possibilidades se vai realizar. É o «fim das certezas» e o

aparecimento da pluralidade dos futuros” (Morin, 1999).

Tudo que foi anteriormente destacado processa-se sobre um conjunto de invariâncias

(comportamentos que se manifestam com regularidade) pretendidas pelo Modelo de Jogo, tendo

como pano de fundo o próprio jogo. Uma vez que é o jogo que dita as próprias leis, funcionando

o Modelo de Jogo como forma de as contrariar num campo de força e ideias em confronto,

destacámos que as equipas em confronto potenciam as suas características através dos

momentos do jogo. Deste modo, Teodorescu (1984) divide o jogo em duas fases: a fase

defensiva e a fase ofensiva. A primeira é caracterizada pela equipa não ter a posse da bola e

através de acções colectivas e individuais, que não infrinjam as leis do jogo, tentam ganhá-la de

forma a evitar o golo na sua baliza. A segunda caracteriza-se por a equipa ter a posse da bola e

através de acções colectivas e individuais, sem infringirem as leis do jogo tentar marcar golo

(idem, 1984).

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

2.Revisão de Literatura 35

Tendo em conta o termo fases, o qual surge em função da característica sequencial

dessas mesmas etapas, ou seja, existe sempre uma lógica sequencial implícita (Guilherme

Oliveira, 2004).

Uma outra perspectiva relativamente à organização e dinâmica do jogo de Futebol surge

pela utilização do termo momento em detrimento do termo fase. Pretende-se assim mapear o

jogo de Futebol a partir de momentos (Barreira, 2006).

Desta forma, a perspectiva que preconiza a organização do jogo de Futebol em

momentos, refere que os jogadores, tanto individual como colectivamente, procuram atingir o

objectivo do jogo, não por duas fases, mas através de quatro momentos (Louis Van Gaal, in

Kormelink e Seeverens, 1997; Mourinho, 1999; Guilherme Oliveira, 2004):

(1) o momento de organização ofensiva, considerado o conjunto de comportamentos que

a equipa assume quando adquire a posse de bola, com o objectivo de preparar e criar situações

ofensivas, de forma a marcar golo;

(2) o momento de Transição ataque/defesa, como os comportamentos que se devem

assumir nos segundos após perda de posse de bola, estando ambas as equipas

desorganizadas;

(3) o momento de organização defensiva, que visa contrariar o primeiro momento, isto é,

quando não existe a posse de bola, organizar-se de forma a impedir que a equipa adversária se

prepare, crie situações de golo e marque golo;

(4) o momento de Transição defesa/ataque, que se caracteriza pelos comportamentos

que se devem ter nos segundos imediatos ao recuperar-se a posse de bola.

Concluindo, podemos constatar que os diferentes momentos do jogo apresentam

comportamentos que podem assumir várias escalas, ou seja, uma escala colectiva, sectorial ou

grupal, inter-sectorial e individual. Assim, Castelo (1996) salienta dois aspectos que os Modelos

de Jogo devem evidenciar, isto é, refere-se à definição e reprodução do sistema de relações e

inter-relações estabelecidas entre os diferentes elementos da equipa, como também, evidencia o

carácter aberto e criativo do Modelo.

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

2.Revisão de Literatura 36

2.5. A Inteligência de Jogo que se vê na interpretação Táctica

“ O corpo é absolutamente imprescindível para a produção dos conhecimentos, das emoções e da consciência, isto

é, das imagens mentais. Neste sentido, o cérebro deixou de ser considerado o único sistema produtor de vida

mental, logo, saber não é a consequência do que se sabe, mas do fazer aquilo que se sabe. Isto é, nenhuma teoria

esgota o objecto ou pode ser tão perfeita que ocupe o lugar do objecto.”

Guilherme Oliveira (2004)

“ São as palavras que são a causa do real e não o inverso. Não é da realidade que

tiramos as palavras com que a referimos, mas é das palavras que tiramos o real que elas

inventam. (…) As palavras provocam e produzem factos, ou seja, participam na produção do

mundo” (Bento, 1994). Assim, podemos depreender que a acção é o meio através do qual as

palavras inventam e produzem a realidade constituindo-se “ um modo de transformar

voluntariamente circunstâncias em efeitos esperados. Cada acção é de facto «uma acção-em-

projecto», um processo onde o sujeito está implicado para modificar o mundo de uma maneira

esperada, no termo da tomada de decisão processada e de uma especulação mental. A acção

implica um diálogo com o ambiente, onde as crenças e os desejos, o conhecimento e as

expectativas orientam as intenções de sujeito” (Searle, 1983, cit. por Wallian, N. & Chang, C.-W.,

2007).

Deste modo, Bill Walsh (cit. por Beswick, 1999) descreve o Ser Treinador como “a

redução de incerteza”, ou seja, os bons treinadores reduzem a complexidade para jogadores.

Para que tudo isso se processe, destaca-se a utilização de um modelo como produtor, construtor

e precursor de um processo, o qual pode ser considerado como uma representação simplificada

da realidade (Melo, Godinho et al., 2002), estando relacionado com processos construtivos que

estão ligados a concepções de conhecimento (Garganta, 1997) de determinado fenómeno ou

realidade.

Fazer do jogo objecto de estudo é um imperativo fundamental, na medida em que o

conhecimento da sua lógica e dos seus princípios1 tem implicações importantes nos planos de

ensino, treino e controlo da prestação dos jogadores e das equipas, factores que concorrem para

a sua qualidade (Garganta, 1997), optimizando os comportamentos dos jogadores e das equipas

na competição. Assim, vários autores (Queiroz, 1986; Gréhaigne, 1992; Garganta & Pinto, 1994;

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

2.Revisão de Literatura 37

Frade, 2007) consideram que o Futebol é um jogo táctico e que se manifesta pela interacção das

diferentes dimensões.

Deste modo, a caracterização da estrutura da actividade e a análise do conteúdo do jogo

têm vindo revelar uma importância e influência crescentes na estrutura e na organização do

treino de Futebol (Garganta, 2000), quer no que respeita aos factores técnicos e tácticos

(Castelo, 1996), quer no que concerne às exigências físicas (Bangsbo et al., 1991).

Para tal, foi fulcral a promoção do futebol de qualidade através do jogo, das equipas e

dos jogadores, cujas ideias colectivas e individuais se promoviam através da dimensão táctica, à

qual foi reconhecida por unanimidade a sua importância na evolução do jogo, sendo

impulsionadora das qualidades de desempenho e gestora do direccionamento do processo

(Guilherme Oliveira, 2004).

1

A táctica decorre de objectivos: imediatos da acção de jogo quando tomados

isoladamente; de médio e longo prazo quando referentes à vitória na competição. Exprime-se

por comportamentos observáveis, desenvolvidos por um processo decisional que pressupõe

informação e conhecimento dos “sujeitos da acção que se enfrentam, das condições em que se

desenvolve o confronto, da relação intrínseca com os objectivos e do carácter sistemático

reflectido nos planos e alternativas para a resolução dos problemas colocados” (Zech, 1971;

Teodorescu, 1977; Letzelter, 1978; Hagedorn, 1982; Konzag, 1983; Wrzos, 1984; Duricek, 1985;

Gréhaigne, 1992; cit. por Garganta e Oliveira, 1996: 14 e 15).

A par do anteriormente mencionado, a táctica possui uma “dimensão espaço – temporal

de realização, traduzida quer pela sua subordinação à estratégia, quer pela delimitação ou

constrangimentos espaço – temporais da acção de jogo” (Letzelter, 1978; Zerhouni, 1980;

LaRose, 1992; Duricek, 1985; Moreno, 1993; Mercier e Cross, s.d.; cit. por Garganta e Oliveira,

1996: 15), sendo também observáveis os níveis de relação intra-equipa, onde coexistem a

táctica individual, de grupo e colectiva (Zech, 1977; Zerhouni, 1980; cit. por Garganta e Oliveira,

1996).

Corroborando com as ideias anteriores, Greco (2006) salienta que nos desportos colectivos, em

todos os momentos, têm-se como referência a tríade tempo-espaço-situação, as quais possuem

1 Os princípios de jogo podem ser considerados como as características que uma equipa evidencia nos diferentes momentos de

jogo, isto é, são padrões de comportamento táctico-técnico que podem assumir várias escalas, mas são sempre representativos

do modelo de jogo adoptado, independentemente da escala de manifestação (Queiroz, 1983; Teodorescu, 1984; Oliveira, 2004,

cit. por Sousa, 2005).

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

2.Revisão de Literatura 38

como algumas das componentes os companheiros de equipa, adversário, bola, objectivos e

metas a alcançar, sendo um problema que terá de ser resolvido pelos jogadores, tendo em conta

que as anteriores são importantes condicionantes da decisão táctica

Destes, os factores tácticos são indicados, por alguns treinadores, como sendo os mais

relevantes para o rendimento no Futebol (Garganta, 1997). No entanto, salvaguarda-se a

importância dos demais factores, pelo papel relevante que assumem no suporte dos

comportamentos tácticos que o jogo exige. Assim, torna-se evidente que um comportamento

táctico se apresente numa estreita relação de dependência recíproca com os processos

cognitivos. Intrinsecamente relacionado com a ideia anterior, Abernethy (1991) destaca que “os

grandes jogadores parecem executar os seus movimentos como se tivessem todo o tempo do

mundo para executar os mesmos.” Ou seja, “ esses comportamentos e padrões de jogo

requisitam dos jogadores conhecimentos específicos/imagens mentais para o seu

reconhecimento e para a respectiva intervenção” (Guilherme Oliveira, 2004).

Abarcando todos os factores acima mencionados, dando destaque à relação entre a

dimensão táctica e os processos cognitivos, Rui Faria (cit. por Ilharco & Lourenço, 2007:78)

menciona que “ O jogo joga-se fundamentalmente com a cabeça. A mente tem de estar sempre

presente e o jogo tem de começar por ser um fenómeno pensado. O cérebro não está isolado

dos pés; as coisas não acontecem dessa forma. Os pés funcionam num processo que passa

pela mente.”

Numa perspectiva do jogo propriamente dito, este caracteriza-se por complexas relações

de oposição e de cooperação que decorrem dos objectivos de jogadores e equipas, assim como

do conhecimento que estes possuem do jogo, de si próprios e dos adversários (Garganta e

Oliveira, 1996). Assim, a forma de actuação de um jogador está fortemente condicionada pelos

seus modelos de explicação, mais concretamente, pelo modo como ele concebe e percebe o

jogo. São esses modelos que induzem as respectivas decisões, condicionando a organização da

percepção, a compreensão das informações e a resposta motora (Garganta, 1997).

Contudo, deve-se entender táctica não apenas como uma das dimensões tradicionais do

jogo, mas sim como a dimensão unificadora que dá sentido e lógica a todas as outras. Assim, a

dimensão táctica funciona como a interacção das diferentes dimensões, dos diferentes

jogadores, dos diferentes intervenientes no jogo (jogadores e treinadores) e dos respectivos

conhecimentos que estes evidenciam (Guilherme Oliveira, 2004), devendo constituir-se como o

princípio director da organização do jogo (Teodorescu 1984; Garganta, 1997).

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2.Revisão de Literatura 39

Ora segundo Bayer (1994), a cooperação representa um dos traços específicos dos

desportos colectivos, quer dizer que todo o jogador dentro da equipa e em função do objectivo

comum previamente determinado deverá ajudar os seus companheiros e comunicar com eles.

Para comunicar é necessário falar a mesma linguagem, quer dizer, ter um sistema de referência

comum. Ora jogar com princípios idênticos, utilizando factores idênticos representa ter uma

linguagem que vai permitir a compreensão mútua. Respeitando estes princípios operacionais

susceptíveis de evolução, o jogador deve perceber constantemente, compreender e antecipar as

situações que se desenrolam, para agir de maneira vantajosa durante aquelas nas quais se

encontra implicado. Essa atitude só será possível se todos actuarem numa base de acção

idêntica e significativa para todos.

No jogo, a táctica é um meio através do qual uma equipa tenta valorizar as

particularidades dos seus próprios jogadores, bem como outras qualidades acumuladas durante

a preparação. O mesmo refere que o papel da táctica na obtenção da vitória cresce

paralelamente ao valor das equipas em disputa, em especial quando são sensivelmente

próximas física, técnica e psicologicamente.

Segundo Teodorescu (1984) e Riera (1995), importa ter presente que, a táctica individual

constitui a base da táctica colectiva, no sentido de encontrar soluções para superar a equipa

adversária, tanto no ataque como na defesa. Os jogadores devem saber o que fazer em conjunto

(táctica colectiva), para poderem resolver o problema subsequente, o como fazer (táctica

individual), ou seja seleccionar e utilizar a resposta motora mais adequada (Dugrand, 1989;

Garganta e Pinto, 1996).

Neste âmbito, por táctica individual, Teodorescu (1984) entende ser o conjunto de

acções individuais utilizadas conscientemente por um jogador na luta com um ou mais

adversários e em colaboração com os companheiros, com o objectivo da realização das missões

do jogo, tanto no ataque como na defesa.

Por intermédio de uma observação microscópica, táctica não significa somente uma

organização em função do espaço de jogo e das missões específicas dos jogadores, esta

pressupõe, em última análise, a existência de uma concepção unitária para o desenrolar do jogo,

ou por outras palavras, o tema geral sobre o qual os jogadores concordam e que lhes permite

estabelecer uma linguagem comum (Castelo, 1996). Trata-se de formar “jogadores inteligentes”

(Greco, 1999), com capacidade de decisão, dotados de recursos, experiências e conhecimentos

para solucionar diferentes situações do jogo, sendo que “o importante é formar jogadores, não

repetidores” (Greco, 1988:30).

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2.Revisão de Literatura 40

Pretendendo-se que o praticante analise, perceba e aja, em função da leitura do jogo, é

fundamental a forma como o professor/treinador emite informação. Quando prescreve soluções

(ex. diz ao jogador para executar “passe de 1ª instância”) não induz o praticante a ler o jogo, não

percebendo este, na maioria das situações, a razão da solução prescrita (Mesquita, 2007).

Contrariamente, se o professor/treinador questiona o praticante, no sentido de ele

identificar o cenário de jogo (para o mesmo exemplo, diz ao jogador: “quais são e como estão

posicionados os teus colegas de equipa para que seja possível o passe de 1ª instância?”), este

pode decidir em função de análise que realizou, compreendendo o motivo da solução adoptada

(idem, 2007)

Verificando os exemplos mencionados e segundo a mesma autora, não basta que as

tarefas de aprendizagem apelem para o sentido táctico, se o professor/treinador na emissão de

informação não promover a autonomia na tomada de decisão táctica. Dito de outra forma, mais

importante que prescrever é fundamental questionar os praticantes, na medida em que

incrementa o desenvolvimento do raciocínio táctico e a autonomia decisional, pressupostos

edificadores da prática do jogo qualificado.

Paris & Winograd (1998, cit. por Mesquita, 2007) enfatizam a importância da implicação

dos processos cognitivos na tomada de decisão quando referem que ser estratega é mais

importante do que ter uma estratégia. O facto de se ter uma estratégia não significa que se saiba

aplicá-la oportunamente, porquanto ela existe independentemente da configuração ecológica do

envolvimento situacional. Pelo contrário, ser estratega significa que, antes de decidir, o

praticante realiza uma análise cuidada da situação-problema, equaciona as alternativas de

solução e adopta a solução ajustada às particularidades contextuais. Neste sentido, torna-se

crucial para os jogadores que o desenvolvimento dos processos de análise e de interpretação

das situações sobre as quais vão agir, abrindo o caminho a sua compreensão e,

concomitantemente, para a adopção de processos decisionais, cada vez mais complexos.

Para o efeito, o treinador deve orientar a percepção dos jogadores para uma capacidade

de leitura do jogo e de execução das habilidades técnicas de nível superior, fazendo com que o

entendimento do jogo se expanda, não se tratando “ (…) de um problema sensorial ou

meramente técnico, mas de uma questão que é, antes de tudo, conceptual” (Garganta, 2004).

Através de um apelo preferencial à observação, pela contextualização da instrução nos

cenários concretos de prática, e utilizando preferencialmente o questionamento como técnica

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2.Revisão de Literatura 41

instrucional, os treinadores promovem o desenvolvimento da capacidade perceptiva no ambiente

ecológico da tarefa e consequentemente, a valorização da inteligência táctica. Relevância

cognitiva que é mediada pelo treino e pelo jogo, permitindo que as acções dos jogadores se

organizem em hábitos que são sistemas de produção de conhecimentos (Marina, 1995).

É essencial para o desenvolvimento da antecipação que os jogadores de futebol com

elevada capacidade na leitura do jogo, seleccionem as sugestões visuais e reconheçam os

modelos do jogo como a acção. Além desta capacidade de processar informação relativa a

contexto, os jogadores com maior capacidade têm expectativas à priori mais exactas dos

eventos, comparativamente com jogadores menos capacitados. Este conhecimento superior "da

probabilidade situacional" ajuda os jogadores na condução da informação percepcionada,

verificando as expectativas iniciais (Stratton et al, 2004).

Essa probabilidade situacional pode ser genérica, aplicável numa variedade de cenários

relacionados que implicam jogadores diferentes e equipes, ou específico (relacionar com uma

determinada equipe ou jogador) na natureza. A relação cíclica entre as expectativas iniciais do

jogador relativamente ao que provavelmente acontecerá e a interpretação mais eficaz da

informação relativa ao contexto, é a fundação principal da habilidade de antecipação no futebol

(Williams, 2000). Então, as relações que o jogador estabelece entre este modelo e as situações

que ocorrem no jogo, orientam as respectivas decisões, condicionando a organização da

percepção, a compreensão das informações e a resposta motora (Garganta, 1997).

Parece igualmente plausível, conceber a Inteligência como uma faculdade específica e

não generalista. O conhecimento é algo específico e contextual, não preexistindo em nenhum

lugar ou forma, mas actuando em situações particulares (Varela et al., 2001), sendo que “os

limites da minha linguagem, são os limites do meu mundo” (Wittgenstein, cit. por Bento, 1994).

O facto de a Inteligência ser específica, torna necessário que os jovens sejam

confrontados com situações de aprendizagem o mais próximo possível da realidade (Jensen,

2002). A par do anterior, Gaiteiro (2006:122) sugere que esta, não se trata de uma Inteligência

qualquer, mas sim específica e que se encontra “subjacente ao jogar futebol, um saber que se

concretiza na acção.”

A Inteligência de jogo reporta-se às ligações que os Jogadores estabelecem entre si e

ao modo como preenchem o Jogo, sendo uma faculdade que não se vê nem se avalia mas que

se expressa por indicadores relacionados sobretudo, com o modo como os Jogadores criam

contextos e se ajustam a estes, e ainda com o modo intencional com que se relacionam (Gomes,

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2.Revisão de Literatura 42

2008). O que implica que o fomento da Inteligência de Jogo, através da vivenciação de um

determinado jogar que tenha subjacente um padrão de conexões.

Um dos aspectos mais relevantes da Inteligência de Jogo, em nosso entendimento, e

enquanto Inteligência em acção resulta do seu carácter operativo e funcional (Cunha e Silva,

2008), uma necessidade inerente a esta actividade. São também estas características que

permitem destrinçar este conceito de Entendimento de Jogo. “Por entendimento, consideramos o

corpus teórico relativo a uma determinada matéria. Motivo pelo qual sugerimos, que o

Entendimento de Jogo se encontra mais relacionado com a dimensão teórica do Jogo, e não

com a praxis” (Maciel, 2008). Ou seja, contrariamente à Inteligência de Jogo, é um saber

inoperacional, que não se expressando em campo, tem também lugar no Fenómeno

multidimensional que é o Futebol. Enquanto a Inteligência de Jogo, abarcando o Entendimento

de Jogo, vai mais além, reportando-se à esfera do fazer e observa-se, de modo mais evidente

nos Jogadores pela expressão dos seus desempenhos, mas também pelos treinadores, os

quais, embora de modo diferenciado também têm de evidenciar um saber operacional, que lhes

permita a partir do Entendimento de Jogo, agir e adoptar estratégias que permitam solucionar os

problemas que o Jogo, a Competição e o treino colocam (idem, 2008). Marisa Gomes (2008)

concorda com a necessidade de diferenciar os conceitos de Entendimento de Jogo e Inteligência

de Jogo, esclarecendo que apenas os Jogadores e treinadores podem revelar Inteligência de

Jogo, por serem parte integrante de um contexto, de um “nicho ecológico”, os quais podem

intervir no lado emergente.

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3.Metodologia 43 43

3. Metodologia

Para a concretização dos objectivos definidos para o estudo, foram realizadas pesquisas

qualitativa e quantitativa, com recurso à realização de uma entrevista em ambiente natural, com

posterior interpretação e análise das informações recolhidas, como também, conjugação das

mesmas com os jogos observados segundo as traves mestras que se seguirão.

3.1. Metodologia de Pesquisa

No que diz respeito à parte teórica, foi realizada uma pesquisa bibliográfica e

documental, tendo sido seleccionada a informação que melhor pareceu enquadrar-se com o

tema em questão.

A partir desta base e de acordo com os objectivos especificados, foram elaboradas uma

série de questões guia que serviram de suporte para a entrevista realizada.

Relativamente à parte prática, a metodologia utilizada na recolha dos dados, ocorreu sob

a forma de inquérito oral, por meio de entrevista de estrutura aberta, com base em questões

guia, previamente elaboradas e registadas num gravador Olympus (VN240PC). Desta forma, o

entrevistado pude expor os seus pontos de vista de uma forma clara e mais aprofundada.

A entrevista foi gravada com o conhecimento e autorização do entrevistado.

Alicerçada à entrevista, foi também realizada a observação, análise e consequente

interpretação dos dados referentes aos oito jogos da equipa do Sporting Clube de Portugal.

3.2. Caracterização da Amostra

Quando se opta pela realização de entrevista com posterior observação audiovisual dos

jogos referentes à Equipa do Treinador em questão, pretende-se saber aquilo que o entrevistado

pensa acerca de um determinado assunto, com o intuito de esclarecer vários dos aspectos

abordados na revisão bibliográfica, para que os mesmos possam ser corroborados por

intermédio da análise e observação audiovisual. Nesse sentido, a escolha dessa pessoa foi

bastante criteriosa, para que a qualidade fosse indiscutível e para que aquilo que ele pudesse

referir, fosse substancial e de referência.

De acordo com o que foi dito, o treinador de futebol seleccionado foi:

• Paulo Bento (Treinador de Principal da Equipa Sénior do Sporting Clube de Portugal).

Este treinador foi o escolhido porque para além de estar num dos melhores clubes

nacionais de futebol, já desenvolve um trabalho no mesmo há três anos e meio, existindo tempo

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3.Metodologia 44 44

suficiente para que o método utilizado pelo mesmo, demonstre os seus frutos, sendo-lhe

reconhecida grande qualidade e competência. Para além disso, antes de desenvolver a função

de treinador, o nosso entrevistado fez a sua formação como jogador no Sport Lisboa e Benfica e

Estrela da Amadora, prolongando a sua formação como jogador profissional no Sporting Clube

de Portugal, Real Ovideo Club de Fútbol, representando igualmente, a Selecção Nacional

Portuguesa nas mais variadas competições internacionais.

Segundo o mencionado, o nosso entrevistado manifesta todas as características para a

execução deste trabalho.

3.3. Procedimentos Metodológicos

3.3.1. Recolha dos Dados

A entrevista foi realizada no dia 2 de Abril de 2009, no local previamente estabelecido

pelo entrevistado. Antes do início da mesma, o entrevistado foi informado dos objectivos do

estudo e da forma como a entrevista estava estruturada.

Para explorar devida e correctamente o seu conteúdo, foi utilizado um gravador com o

conhecimento e autorização dos entrevistados.

Posteriormente a entrevista foi transcrita para o programa Microsoft Word 2003 do

Microsoft Windows XP Home Edition.

No que concerne a visualização e análise dos jogos da Equipa em questão, utilizamos o

software Windows Media Player 11 e uma folha de registo com os respectivos critérios e

variáveis definidas para observação (ver em Anexos).

3.3.2. Instrumento

Como análise, a priori, verificamos o conteúdo que a entrevista possui segundo as

orientações por nós perspectivadas para a execução do trabalho, uma vez que para a execução

da mesma, dividimos a entrevista em três macroestruturas:

1º Motivação para o exercício da profissão – na qual, procuramos entender como é

que as experiências do nosso entrevistado, ao longo da sua carreira, o conduziram e

influenciaram para o exercício da profissão de treinador de futebol;

2º Modelo de Jogo a partir da concepção do treinador – quais os princípios, valores,

ideias, referências que norteiam a concepção de jogo por parte do treinador, como estão

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3.Metodologia 45 45

organizadas e de que forma as estrutura, de modo a que possamos caracterizar o seu

Modelo de Jogo, verificando não só como o mesmo pode emergir mas, por outro lado,

verificar o fio condutor entre a concepção e a operacionalização, utilizando a observação

dos jogos para constatar tais factos;

3º Organização posta em prática – tendo em conta o Modelo de Jogo preconizado pelo

treinador, observar e compreender o modo como se processa toda a construção,

desenvolvimento e organização do processo, de forma a que o mesmo, através de um

treino altamente qualitativo, se expresse num jogar organizado e consubstanciado numa

vertente teórica sustentada e coerente.

Depois de encontradas as linhas de condução para o desenho observacional, torna-se

possível, a posteriori, definir a condução destas na investigação, manifestando-se fundamental a

delimitação das possíveis situações de observação a partir das quais serão recolhidos os dados

deste estudo. Neste sentido, o passo seguinte consiste na definição e explicitação de um

conjunto de critérios conducentes à selecção da possível amostra, uma vez que em virtude do

carácter da investigação, a metodologia utilizada para a observação dos quatro momentos do

jogo, assentou no método preconizado por Barreira (2006).

De acordo com a observação dos jogos, este foram filmados pelo clube da amostra,

sendo no caso do Sporting Clube de Portugal, cedidos em formato DVD pelo Gabinete de

Scouting.

A visualização dos jogos e respectivas tarefas de observação foram efectuadas por

DVD, através de um computador portátil HP Pavilion Entertainment PC, com processador AMD

Turion X2 Ultra 64 GHz, através da utilização do software Windows Media Player 11, o qual

possui uma função – reprodução – que confere uma vantagem significativa relativamente à

visualização por vídeo. Ou seja, para além das vantagens comuns com a utilização vídeo,

nomeadamente a capacidade de realização de observação e de reobservação da mesma

conduta quantas vezes se achar necessário para uma correcta interpretação ou reformulação do

registo, assim como da visualização em “slow motion”, permite analisar com maior detalhe e

atenção todos os pormenores a registar.

Desta forma, cada sequência de cada momento de jogo foi observado pelo menos uma

vez em velocidade normal, tantas quantas necessárias em “slow motion”. Torna-se assim

possível que o observador se sinta mais seguro na codificação de categorias e indicadores,

diminuindo deste modo o erro.

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

3.Metodologia 46 46

Na construção do instrumento, tivemos em particular atenção a definição de cada critério

vertebrador, existindo o cuidado de criar algo que o identificasse e diferenciasse relativamente

aos demais critérios conforme é possível constatar na folha de registo dos dados do jogo (ver em

Anexos). Desta forma, foi criado para cada critério/categoria uma raiz identificativa, que colocada

no início de cada código, permite identificar a conduta codificada como pertencente a um critério,

ou seja, variável.

3.4. Descrição do Instrumento

3.4.1. Conceptualização e Explicitação das variáveis em observação

De acordo com o anteriormente manifestado e após ter sido realizada a análise da

entrevista, foram definidas a linhas orientadoras ou princípios comportamentais padrão do

«jogar» relativo à Equipa do Sporting Clube de Portugal, treinado por Paulo Bento.

De todos os princípios destacados ao longo da entrevista, os quais se encontram abaixo

citados, permitem-nos construir os critérios e respectivas variáveis de análise e observação,

segundo os quatro momentos de jogo caracterizados pelo treinador.

O objectivo da análise e observação dos jogos já mencionados, centra-se na

constatação de um conjunto de invariâncias (comportamentos que se manifestam com

regularidade) pretendidas pelo Modelo de Jogo, tendo como pano de fundo o próprio jogo

preconizado e pretendido pelo treinador.

Uma vez que é o jogo que dita as próprias leis, funcionando o Modelo de Jogo como

forma de as contrariar num campo de forças e ideias em confronto, destacámos que as equipas

em confronto potenciam as suas características através dos momentos do jogo. Deste modo,

Teodorescu (1984) divide o jogo em duas fases: a fase defensiva e a fase ofensiva. A primeira é

caracterizada pela equipa não ter a posse da bola e através de acções colectivas e individuais,

que não infrinjam as leis do jogo, tentam ganhá-la de forma a evitar o golo na sua baliza. A

segunda caracteriza-se por a equipa ter a posse da bola e através de acções colectivas e

individuais, sem infringirem as leis do jogo tentar marcar golo (idem, 1984).

Tendo em conta o termo fases, o qual surge em função da característica sequencial

dessas mesmas etapas, ou seja, existe sempre uma lógica sequencial implícita (Guilherme

Oliveira, 2004).

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

3.Metodologia 47 47

Uma outra perspectiva relativamente à organização e dinâmica do jogo de Futebol surge

pela utilização do termo momento em detrimento do termo fase. Pretende-se assim mapear o

jogo de Futebol a partir de momentos (Barreira, 2006).

Desta forma, a perspectiva que preconiza a organização do jogo de Futebol em

momentos, refere que os jogadores, tanto individual como colectivamente, procuram atingir o

objectivo do jogo, não por duas fases, mas através de quatro momentos (Louis Van Gaal, in

Kormelink e Seeverens, 1997; Mourinho, 1999; Guilherme Oliveira, 2004):

(1) O Momento de Organização Ofensiva, considerado o conjunto de comportamentos

que a equipa assume quando adquire a posse de bola, com o objectivo de preparar e criar

situações ofensivas, de forma a marcar golo;

(2) O Momento de Transição Ataque/Defesa, como os comportamentos que se devem

assumir nos segundos após perda de posse de bola, estando ambas as equipas

desorganizadas;

(3) O Momento de Organização Defensiva, que visa contrariar o primeiro momento, isto

é, quando não existe a posse de bola, organizar-se de forma a impedir que a equipa adversária

se prepare, crie situações de golo e marque golo;

(4) O Momento de Transição Defesa/Ataque, que se caracteriza pelos comportamentos

que se devem ter nos segundos imediatos ao recuperar-se a posse de bola.

Como continuum dos momentos supracitados de modo a que possamos aprofundar os

mesmos, podemos constatar que os diferentes momentos do jogo apresentam comportamentos

que podem assumir várias escalas, ou seja, uma escala colectiva, sectorial ou grupal, inter-

sectorial e individual. Assim, Castelo (1996) salienta dois aspectos que os Modelos de Jogo

devem evidenciar, isto é, refere-se à definição e reprodução do sistema de relações e inter-

relações estabelecidas entre os diferentes elementos da equipa, como também, evidencia o

carácter aberto e criativo do Modelo.

De acordo com esta lógica, para podermos proceder à análise e discussão, a posteriori,

entre o pretendido e o ocorrido através da análise de vídeo, foi necessário caracterizar, a priori, o

Modelo de Jogo do Sporting Clube de Portugal através da análise da entrevista realizada ao

Treinador da mesma, Paulo Bento.

Na entrevista realizada, verificámos que para se criar uma dada forma de jogar,

estabelece-se a organização dos princípios de jogo da equipa de modo a desenvolver o Modelo.

Para jogar como pretende, em primeiro lugar, Paulo Bento (Anexo 1, pág. IX) quer que a sua

equipa, no Momento de Organização Ofensiva, dê Profundidade ao jogo, ou seja, “sempre que

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3.Metodologia 48 48

se possa jogar para a frente, não tem de jogar para o lado. Depois quando não se puder jogar

para a frente, primeiro para o lado do que para trás”, isto é, Segurança.

Desta forma, para que estes dois princípios se manifestem, existem premissas inerentes

aos mesmos, significando que na primeira e segunda fases de construção, o entrevistado

pretende que haja “zero por cento de risco”, enquanto na criação e finalização, “cem por cento

de risco” (Paulo Bento, Anexo 1, pág. IX). Como exemplo para a concretização da primeira e

segunda fases, Paulo Bento preconiza que os seus jogadores realizem “o menos toques

possíveis especialmente pela linha defensiva, que a bola não circule pelos quatro defesas mais

do que uma vez, que a bola não passe de lateral a lateral e volte, outra vez, de lateral a lateral.

Não jogar com os dois laterais à mesma altura quando estamos a iniciar a nossa fase de

construção” (Anexo 1, pág. IX).

Alicerçado ao mesmo, não pretende que os seus jogadores sejam criativos na primeira

fase de construção, uma vez que quer “que um jogador seja seguro, simples e eficaz mas que

tenha boa técnica, ou seja, deslocando a bola a 30 e a 40 metros e que a coloque nas zonas em

que nós queremos sair a jogar. Por exemplo, que saiba conduzir a bola à procura de libertar

espaços em zonas mais adiantadas para ligarmos o nosso jogo” (Paulo Bento, Anexo 1, pág.

XV).

No que concerne às fases de criação e finalização, há o objectivo manifesto de “dar

largura, normalmente, com os nossos médios interiores, termos os pontas-de-lança como

suporte para a nossa profundidade, seja no espaço interior, seja quando temos de sair pelos

corredores” (Paulo Bento, Anexo 1, pág. IX).

Por intermédio da descrição supracitada pelo treinador e como forma de analisarmos de

forma coerente e sistematizada os vários momentos do jogo, definimos como início do processo

de Organização Ofensiva todas as intervenções motoras que um jogador e companheiros da

mesma equipa (colectivo) realizam desde o final da Transição-Estado defesa/ataque, estando

em disposição de dar continuidade à posse de bola, na tentativa de cumprir os princípios gerais

da acção do jogo ofensivo: (1) conservar a bola; (2) progredir com a bola para a baliza

adversária; (3) desequilibrar a defesa adversária e tentar marcar golo (Bayer, 1994), até

acontecer uma conduta inerente critério 3 – ITEAD – Início Da Transição-Estado Ataque-Defesa /

Perda Da Posse De Bola (Início da Transição Ataque-Defesa).

Para tal, seleccionámos como variáveis mais pertinentes para análise do respectivo

momento – Organização Ofensiva –, às seguintes:

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3.Metodologia 49 49

Critério 1 – OOf – DESENVOLVIMENTO DA POSSE DE BOLA (Inicio e

Desenvolvimento da Organização Ofensiva)

(1) OOfpc – Organização Ofensiva por passe curto: sempre que o portador da bola realiza

um passe curto (passe dentro da mesma zona ou entre duas zonas contíguas) para um dos

companheiros com o intuito de dar continuidade à OOf;

(2) OOfpl – Organização Ofensiva por passe longo: sempre que o portador da bola realiza

um passe longo (passe entre duas zonas não contíguas) para um dos companheiros com o

intuito de dar continuidade à OOf;

(3) OOfcd – Organização Ofensiva por condução: o portador da bola realiza um número de

contactos consecutivo, igual ou superior a três, fazendo-a progredir pelo terreno de jogo;

(4) OOfrc – Organização Ofensiva por recepção/controle: acção em que um jogador da

equipa em OOf recebe e controla a bola enviada por um colega, mantendo a continuidade da

OOf;

(5) OOfd – Organização Ofensiva por drible: o portador da bola procura ultrapassar o(s)

seu(s) adversário(s) directo(s), e manter a posse de bola ou ganhar posição ou espaço sobre

este(s), mantendo a continuidade da OOf;

(6) OOfdu – Organização Ofensiva por duelo: acção em que um jogador da equipa em posse

bola disputa a mesma com um adversário (p. ex. uma bola em trajectória aérea não controlada

por nenhum dos jogadores), tentando manter a continuidade da OOf;

(7) OOfgr – Organização Ofensiva pelo guarda-redes: intervenção ocasional do guarda-redes

da equipa em OOf.

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3.Metodologia 50 50

De acordo com as variáveis anteriormente seleccionadas, revela-se crucial que as

mesmas sejam identificadoras e configurem um determinado Método de Jogo Ofensivo. No

que concerne ao último, Garganta (1997) considera que o observador deverá entender a forma

como os jogadores duma equipa desenvolvem o processo ofensivo da sua equipa, desde o

momento da aquisição ou recuperação da posse da bola, até ao momento de finalização ou

perda da posse da bola.

Para a caracterização desta variável, o autor (1997) considera as seguintes referências:

a. Relação de forças da equipa que defende, equilíbrio ou desequilíbrio espacial, face

ao ataque, no momento da conquista ou aquisição da posse de bola;

b. Tipo de passes utilizados (direcção/sentido, alcance);

c. Número de passes utilizados;

d. Tempo de realização do ataque;

e. Ritmo de jogo.

Segundo vários autores (Teodorescu, 1977; Wrzos, 1984; Mombaerts, 1991; Castelo,

1994; in Garganta, 1997), consideram três métodos de jogo ofensivos fundamentais: contra-

ataque, ataque rápido e ataque posicional. Tendo em conta o primeiro dos três métodos, Contra-

Ataque, este é uma acção táctica que consiste em, logo após ter conquistado a bola no meio

campo defensivo próprio, procurar chegar o mais rapidamente possível à baliza adversária, sem

que o oponente tenha tempo para se organizar defensivamente (Ramos, 1982, cit. por Garganta,

1997).

Por outro lado, Castelo (1992, cit. por Garganta, 1997) menciona que o que distingue o

método anterior do Ataque Rápido, reside no facto de que enquanto no primeiro se assegura as

condições mais favoráveis para preparar a fase de finalização antes da defesa contrária se

organizar, no ataque rápido a fase de finalização é preparada já com a defesa adversária

organizada.

Diametralmente oposta aos dois métodos anteriormente mencionados, encontra-se o

Ataque Posicional, o qual possui uma fase de construção mais demorada e elaborada e na qual

a transição defesa-ataque se processa com predominância dos passes curtos, desmarcações de

apoio e coberturas ofensivas (Garganta, 1997).

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3.Metodologia 51 51

Tendo em conta as três definições apresentadas, de seguida enunciaremos as

características que pretendemos observar através da investigação que estamos a realizar, ou

seja:

Método de Jogo Ofensivo (MJO):

(8) OOfca – Método de Jogo Ofensivo por Contra-Ataque:

8.1. A bola é conquistada no meio campo defensivo e a equipa adversária apresenta-se

avançada no terreno de jogo e desequilibrada defensivamente;

8.2. Utilizam-se sobretudo passes longos e para a frente. A circulação da bola é

realizada mais em profundidade do que em largura, com desmarcações de ruptura;

8.3. Passes em número reduzido (igual ou inferior a 5);

8.4. Rápida transição da zona de conquista da bola para a zona de finalização; baixo

tempo de realização do ataque, em regra, igual ou inferior a 12’’;

8.5. Ritmo de jogo elevado (elevada velocidade de circulação da bola e dos jogadores).

(9) OOfar – Método de Jogo Ofensivo por Ataque Rápido:

9.1. A bola é conquistada no meio campo defensivo ou ofensivo e a equipa adversária

apresenta-se equilibrada defensivamente;

9.2. A circulação da bola é realizada em profundidade e em largura, com passes rápidos,

curtos e longos alternados, e desmarcações de ruptura;

9.3. 7 é o número máximo de passes realizados;

9.4. Tempo de realização do ataque não ultrapassa, em regra, os 18’’;

9.5. Ritmo de jogo elevado (elevada velocidade de circulação da bola e dos jogadores).

(10) OOfap – Método de Jogo Ofensivo por Ataque Posicional:

10.1. A bola é conquistada no meio campo defensivo ou ofensivo e a equipa adversária

apresenta-se equilibrada defensivamente;

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3.Metodologia 52 52

10.2. A circulação de bola é realizada mais em largura do que em profundidade, com

passes curtos e desmarcações de apoio;

10.3. Realiza acima de 7 passes;

10.4. Tempo de realização do ataque elevado (superior a 18’’);

10.5. Ritmo de jogo lento relativamente aos dois métodos anteriores (menor velocidade

de circulação da bola e dos jogadores).

Como todo os momentos do jogo possuem uma relação de profunda inter-

independência, co-influenciando com o decorrer do mesmo, considerámos que a equipa finaliza

o início e desenvolvimento da Organização Ofensiva / Desenvolvimento da Posse de Bola (OOf)

quando se concretiza uma das situações do presente catálogo, apresentando-se um final com

eficácia ou sem eficácia ofensiva.

Deste modo, as variáveis seleccionadas para o critério 2 são as que se seguem:

Critério 2 – FOOf – FINAL DA ORGANIZAÇÃO OFENSIVA (Finalização com ou sem

eficácia)

Critério 2.1 – FOOfef – FINAL DA ORGANIZAÇÃO OFENSIVA COM EFICÁCIA

(11) FOOfefrf – Final da Organização Ofensiva por remate fora: o FOOfef finaliza com um

remate efectuado por um jogador atacante que sai pela linha de fundo e / ou para fora do terreno

de jogo sem atingir o alvo;

(12) FOOfefrd – Final da Organização Ofensiva por remate dentro: o FOOfef finaliza com

remate efectuado por um atacante que atinge o alvo (baliza adversária, incluindo os postes e a

barra), sem que resulte golo;

(13) FOOfefrad – Final da Organização Ofensiva por remate contra o adversário: o FOOfef

finaliza com remate de um atacante que atinge um adversário;

(14) FOOfefgl – Final da Organização Ofensiva por golo: o FOOfef finaliza com a obtenção

de um golo a favor devidamente validado pelo árbitro do jogo;

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3.Metodologia 53 53

(15) FOOfefof – Atingir o terço ofensivo de forma controlada: o FOOfef finaliza quando a bola

atinge (por passe ou condução) o Sector Ofensivo (Sector Defensivo da equipa adversária),

tendo o condutor/receptor da bola no Sector Ofensivo a obrigatoriedade de manter o seu

domínio/controle, dando continuidade à fase ofensiva nesse sector de jogo (Sector Ofensivo);

Critério 2.2 – FOOfsef – FINAL DA ORGANIZAÇÃO OFENSIVA SEM EFICÁCIA

(16) FOOfsefbad – Recuperação da Posse de Bola pelo Adversário: o FOOfsef finaliza pela

RPB pela equipa adversária através de um desarme, intercepção, duelo, etc;

(17) FOOfsefgrad – Recuperação da Posse de Bola pelo Guarda-Redes Adversário: o

FOOfsef finaliza pela RPB pelo gr adversário (excluindo a acção de defesa de um remate dirigido

à baliza por esta se tratar de uma conduta FOOfefrd);

(18) FOOfseff – Recuperação da Posse de Bola com lançamento para fora: o FOOfsef

finaliza devido a um lançamento para fora do terreno de jogo por um dos atacantes, dando

origem ao perda da posse de bola (excluindo a acção de remate que sai pela linha de fundo e/ou

para fora do terreno de jogo sem atingir a baliza adversária: conduta FOOfefrf), ou por um

jogador adversário, permitindo a continuidade da posse de bola da Equipa Observada;

(19) FOOfsefi – Recuperação da Posse de Bola por Infracção: o FOOfsef finaliza devido a

uma infracção às leis do jogo cometida pela equipa atacante (perde a posse de bola), ou

cometida pelo adversário (equipa em fase ofensiva mantém a posse de bola).

Antes de enveredarmos propriamente pelo momento que se segue, – Transição Ataque-

Defesa – revela-se imperial, numa primeira instância, introduzir e elucidar a diferença entre dois

conceitos chave para análise desta secção, ou seja, Transição-Estado e Transição-Interface,

conforme a recuperação ou a perda da posse de bola aconteça, ou não, de modo directo. Assim,

a “Transição” é considerada como um Estado quando a recuperação ou a perda da posse de

bola acontece de modo directo. Ou seja, a bola tem de ser recuperada, permanecendo dentro do

espaço de jogo regulamentar e não sendo cometidas infracções às leis do jogo (contra ou a

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favor). Não podem, deste modo, ocorrer condutas indutoras da fase estática de jogo. Já quando

ocorre de forma indirecta, será designada por Transição–Interfase.

Esta circunstância, além de se apresentar como fulcral ao nível do padrão de

desenvolvimento da fase ofensiva ou da fase defensiva, também manifesta a lei da co-

responsabilidade ou processo recorrente, o qual indica que todos os momentos de jogo se auto-

influenciam e auto-determinam, fazendo com que os acontecimentos de um se repercutam nos

restantes, desencadeando ciclos constantes e diferentes pelas suas propriedades, verificando-se

que “todo o processo cujos estados ou efeitos finais produzem os estados iniciais ou as causas

iniciais” (Morin, 1977:175).

Por intermédio dos dois conceitos de Transição supracitados, os quais se apresentam na

investigação realizada por Barreira (2006:67-68) através do mapeamento da dinâmica do jogo de

Futebol pelo próprio autor (Figura 2), verificámos que o conceito operacional de Transição é

entendido segundo as duas formas distintas já referidas: como Estado e como Interfase,

conforme a recuperação ou a perda da posse de bola aconteça, ou não, de modo directo

pressupondo a manutenção da fase dinâmica do jogo.

Figura 1. Proposta de Modelo de organização da dinâmica do jogo de Futebol (Retirado de

Barreira, 2006)

Assim, podemos dizer que a Transição-Interfase e a Transição-Estado são duas formas

de caracterizar a mudança de fase de jogo, uma vez que a primeira caracteriza-se por um

instante que indica a mudança da posse de bola entre as equipas e assim de fases de jogo.

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3.Metodologia 55 55

Enquanto a segunda se caracteriza por um lapso de tempo durante o qual decorrem

comportamentos táctico-técnicos, em função dos constrangimentos espaço-temporais do jogo.

Pelo exposto, o entendimento sobre a dinâmica dos possíveis fluxos do jogo de Futebol

e do conceito operacional Transição, a nossa atenção será direccionada para a Transição

enquanto Estado.

A Transição-Estado, objecto do estudo, inicia-se com a recuperação ou com a perda da

posse de bola de forma directa, terminando quando se observarem no fluxo de jogo, um conjunto

determinado de condições que advêm da interacção das Macro-estruturas espaço, tempo e

tarefa, sempre em relação com a equipa adversária.

Relativamente ao Momento de Transição Ataque-Defesa, Paulo Bento concebe que a

equipa seja muito agressiva no primeiro instante, objectivando somente roubar a posse de bola

ao adversário. Por outro lado, no segundo instante, o objectivo centra-se na temporização da

saída do adversário para o ataque, reagrupando com o maior número de jogadores possível, “e

dentro do nosso sistema também, que esse maior número de jogadores possível sejam oito

jogadores, isto é, se tivermos de partir a equipa, partimos com quatro defesas, quatro médios, e

os dois jogadores da frente” (Anexo 1, pág. X).

Ao articularmos os dois momentos de jogo supracitados, verificámos a existência de

uma íntima relação comunicacional e sequencial entre ambos, uma vez que no Momento de

Organização Ofensiva, os pontas-de-lança servem como suporte na construção do processo

ofensivo, tanto no corredor central como nos laterais, associando-se ao facto do treinador

pretender que a equipa se agrupe na estrutura de 1-4-4 (+2) aquando da sua Transição Ataque-

Defesa, de modo a que a equipa, mesmo sem a posse de bola, já esteja preparada para

corresponder a uma “hipotética” Transição Defesa-Ataque, manifestando que a sua

intencionalidade de defender com 9 jogadores (GR+8) se aprofunda numa racionalização de

como atacar de seguida. Isto é, as duas fases do jogo, defender e atacar, não se dissociam em

nenhum momento.

Para que tal seja possível, no presente trabalho, pretendem-se investigar ambos os

Momentos Transição, neste caso, o Momento de Transição-Estado Ataque-Defesa, pelo que é

essencial definir quando este Estado se inicia e quando termina, como mostra a figura 1.1.

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Figura 1.1. A Transição-Estado Ataque/Defesa no modelo de organização da dinâmica do jogo

de Futebol da presente investigação (Retirado de Barreira, 2006)

Para que tal se processe, o início da Transição – Estado ataque/defesa acontece

quando se verifica uma perda da posse de bola de modo directo. Enquanto o final da mesma se

desencadeia quando se observa um dos critérios definidores desta situação. Assim, as situações

que conduzem ao final do Estado de Transição ataque/defesa são as referidas de seguida, ou

seja:

a. PrPB directa no SECTOR OFENSIVO ou SECTOR MÉDIO – OFENSIVO:

Após PrPB directa, a mesma atinge o Sector Médio – Ofensivo, no qual deverá existir

um contexto de interacção no Centro do Jogo «Sem Pressão (SP)» sobre o adversário. A

Transição–Estado ataque/defesa não termina enquanto não for criada uma situação SP no SMO.

b. RPB directa no SECTOR MÉDIO – DEFENSIVO:

i. No Centro do Jogo2 verifica-se uma situação de «Pressão3», terminando a Transição–

Estado ataque/defesa quando é realizada a passagem para uma situação de SP nesse mesmo

sector.

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3.Metodologia 57 57

2

ii. No Centro do Jogo verifica-se uma situação de «Sem Pressão (SP)». A fase

defensiva poderá começar e terminar em Estado de Transição. Esta situação não acontece

(existe um final de Transição–Estado ataque/defesa), ou seja, a Transição–Estado

ataque/defesa termina quando, mantendo o contexto de interacção, sejam efectuados três

passes positivos entre jogadores da equipa adversária.

Se o contexto de interacção no Centro do Jogo se alterar, adoptam-se os critérios

anteriores.

Para a observação do Momento de Transição-Estado Ataque-Defesa, procedemos à

execução da mesma acção através das seguintes variáveis:

Critério 3 – ITEAD – INÍCIO DA TRANSIÇÃO-ESTADO ATAQUE-DEFESA / PERDA DA

POSSE DE BOLA (Início da Transição Ataque-Defesa)

Com vista ao registo espacial das condutas comportamentais do(s) jogador(es) em cada

critério definido, foi seguida a divisão de Garganta (1997) e Silva (2004) em doze zonas de igual

dimensão, a que se atribui a designação de Campograma. A cada zona corresponde uma

categoria diferente, ou seja, um campo de jogo é constituído por doze unidades categoriais que

formam um sistema de categorias exaustivo e mutuamente excluente.

Deste modo, as variáveis números 20 e 26 – ZITEAD – Zona de Perda da Posse de Bola

/ Inicio da Transição-Estado Ataque-Defesa e ZITEDA – Zona de Recuperação da Posse de Bola

/ Inicio da Transição-Estado Defesa-Ataque, respectivamente – possuem a mesma referência de

observação e execução, uma vez que os dados das mesmas serão cruzados de forma a que se

possam verificar as congruências entre o pretendido e ocorrido para ambos os momentos a que

a respectivas zonas pertencem.

2 Define-se Centro do Jogo como a zona onde a bola se movimenta num determinado instante (Castelo, 1996), isto é, através do contexto de cooperação e de oposição dos jogadores influentes no jogo na zona do campograma onde se encontra o portador da bola. 3 O conceito de Pressão encontra-se directamente relacionado com factores táctico – estratégicos inerentes ao contexto de cooperação e oposição dos subsistemas ou níveis de organização «equipa»; «confronto parcial» e «confronto individual», que transformam a cada momento o fluxo acontecimental do jogo (Gréhaigne, 2001), sendo fundamental compreender qual a influência do contexto de interacção no Centro do Jogo no fluxo conductural do jogo.

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Sentido do Ataque

Figura 1.2. Campograma da Espacialização do terreno de jogo em doze zonas/categorias –

Formado a partir de uma divisão longitudinal em três corredores (lateral direito, lateral esquerdo

e central) e quatro sectores (defensivo; médio – defensivo; médio – ofensivo; ofensivo)

(Adaptado de Garganta, 1997 e Silva, 2004)

(20) ZITEAD – Zona de Perda da Posse de Bola / Inicio da Transição-Estado Ataque-Defesa;

(21) ITEADime – Inicio da Transição-Estado Ataque-Defesa por pressão imediata: a ITEAD

inicia-se após a perda imediata da posse de bola, centrando-se a zona de pressão na própria

zona onde se processou a perda da mesma, como também, pelo número de jogadores que se

encontram dentro da mesma;

(22) ITEADprpb – Inicio da Transição-Estado Ataque-Defesa sabendo o número de

jogadores que se encontram na zona perda da posse de bola: contabilizar o número de

jogadores directamente relacionados e inseridos na zona de perda da posse de bola;

(23) ITEADpress – Inicio da Transição-Estado Ataque-Defesa sabendo o número de

jogadores na zona de pressão: contabilizar o número de jogadores que exercem pressão

efectiva sobre o portador da bola e potenciais adversários em posição de dar continuidade à

mesma, dentro da zona de perda da mesma;

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3.Metodologia 59 59

(24) ITEADtemp – Inicio da Transição-Estado Ataque-Defesa executando a temporização:

não sendo neutralizada a perda da posse de bola através da sua recuperação imediata na zona

onde a perda ocorreu, os jogadores da Equipa Observada retardam a progressão por parte dos

adversários no terreno de jogo.

No caso de não conseguir recuperar a posse de bola, neste momento de transição, a

equipa entra em Organização Defensiva. Neste momento, a equipa privilegia pressionar o mais

alto possível, defender em somente dois corredores, encurtando o espaço em função da pressão

que é executada na frente (em Profundidade), mantendo a concentração defensiva e

agressividade sobre o adversário, objectivando-se que o executem como uma equipa solidária

(Paulo Bento, Anexo 1, págs. X e XI). Esclarecendo a ideia, dá como exemplo: “os nossos

pontas-de-lança a sairem nos laterais contrários quando o adversário joga com um linha de

quatro, que é o que se usa mais em Portugal. Mas normalmente, é o ponta-de-lança que sai no

lateral contrário, concentrando a equipa normalmente em dois corredores, ignorando o corredor

contrário onde está a bola e depois, por questões estratégias, podemos obrigar o adversário a

jogar mais por dentro ou por fora” (idem, Anexo 1, pág. X).

Para que a Organização Defensiva possa ser observada, esta inicia-se e caracteriza-se

pela perda da posse da bola pela Equipa Observada não tendo êxito na execução da pressão

imediata e respectiva recuperação de bola após perda da mesma, acabando por executar a

acção de temporizar como forma de entrar em Organização Defensiva. Assim, a variável

seleccionada para a observação da equipa em estudo centrou-se:

Critério 4 – OD – DESENVOLVIMENTO DA ORG. DEFENSIVA (Posicionamento da

Equipa)

(25) ODnj – Número de Jogadores em Organização Defensiva: a OD centra-se na

contabilização os jogadores que participam activamente neste Momento do Jogo, não tendo em

conta, os jogadores que se encontram deliberadamente disponíveis para o Momento de

Transição, ou seja, à frente da linha da bola.

Desta forma e após a equipa recuperar a posse de bola, a Transição Defesa-Ataque

processa-se de dois modos: “saindo logo pelo corredor onde recuperamos a bola, ou seja,

suportando-nos aí com os jogadores da frente ou com um suporte à retaguarda, preferindo que

seja mais com o médio defensivo do que com os centrais, para podermos variar o centro do jogo

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

e sairmos pelo corredor contrário”, isto é, tirando a bola o mais rápido possível da zona de

pressão, seja em Profundidade, seja em Amplitude, criando a possibilidade de sair pelo corredor

contrário (Paulo Bento, Anexo 1, pág. IX).

Pelo objectivo que o trabalho em si encerra e a par do mencionado anteriormente no

Momento de Transição-Estado Ataque/Defesa, salientámos que o mesmo se repercute para o

Momento de Transição-Estado Defesa/Ataque, sendo essencial definir quando este Estado se

inicia e quando termina, como mostra a figura 1.3.

Figura 1.3. A Transição-Estado Defesa/Ataque no modelo de organização da dinâmica do jogo

de Futebol da presente investigação (Retirado de Barreira, 2006)

O início da Transição – Estado defesa/ataque acontece quando se verifica uma

recuperação da posse de bola de modo directo. Relativamente ao final da mesma, esta ocorre

quando se observa um dos critérios definidores desta situação. Assim, as situações que

conduzem ao final do Estado de Transição defesa/ataque são as referidas de seguida, ou seja:

a. RPB directa no SECTOR DEFENSIVO ou SECTOR MÉDIO – DEFENSIVO:

Após RPB directa, a mesma atinge o Sector Médio – Ofensivo, no qual deverá existir um

contexto de interacção no Centro do Jogo «Sem Pressão (SP)». A Transição–Estado

defesa/ataque não termina enquanto não for criada uma situação SP no SMO.

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

3.Metodologia 61 61

b. RPB directa no SECTOR MÉDIO – OFENSIVO:

i. No Centro do Jogo verifica-se uma situação de «Pressão», terminando a Transição–

Estado defesa/ataque quando é realizada a passagem para uma situação de SP nesse mesmo

sector.

ii. No Centro do Jogo verifica-se uma situação de «Sem Pressão (SP)». A fase ofensiva

poderá começar e terminar em Estado de Transição. Esta situação não acontece (existe um final

de Transição–Estado defesa/ataque), ou seja, a Transição–Estado defesa/ataque termina

quando, mantendo o contexto de interacção, sejam efectuados três passes positivos entre

jogadores da mesma equipa.

Se o contexto de interacção no Centro do Jogo se alterar, adoptam-se os critérios

anteriores.

Neste momento do jogo – Transição Defesa-Ataque –, as variáveis seleccionadas para a

execução da observação dos vídeos relativos à equipa do Sporting Clube de Portugal foram:

Critério 5 – ITEDA – INÍCIO DA TRANSIÇÃO-ESTADO DEFESA-ATAQUE /

RECUPERAÇÃO DA POSSE DE BOLA (Início da Transição Defesa-Ataque)

(26) ZITEDA – Zona de Recuperação da Posse de Bola / Inicio da Transição-Estado Defesa-

Ataque;

Tipos de Recuperação da Posse de Bola:

(27) ITEDAi – Inicio da Transição-Estado Defesa-Ataque por intercepção: a ITEDA inicia-se

através da intercepção de um passe ou remate do adversário, sem que exista interrupção do

jogo. É também intercepção quando o adversário efectua um passe errado para o espaço vazio.

(28) ITEDAd – Inicio da Transição-Estado Defesa-Ataque por desarme: a ITEDA inicia-se

através de desarme, intervindo sobre a bola a uma situação de luta directa com um atacante

adversário, que a procura conservar, sem que exista interrupção do jogo.

(29) ITEDAgr – Inicio da Transição-Estado Defesa-Ataque por acção do guarda-redes: a

ITEDA inicia-se através da conquista da posse de bola por acção do gr (como por exemplo

agarrar a bola após cruzamento ou remate, etc.). Esta conduta contará ou não como início de

TEDA consoante o critério do observador, que tem por base o nível de organização defensiva

do adversário quando a bola é reposta pelo Guarda-Redes da Equipa Observada.

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

3.Metodologia 62 62

Recuperação da Posse de Bola seguida de passe:

(30) ITEDAp – Inicio da Transição-Estado Defesa-Ataque seguida de passe: a ITEDA inicia-

se através de uma acção defensiva de um jogador da Equipa Observada, que é de imediato

seguida por passe, sem que exista interrupção do jogo. Considera-se passe o envio da bola, de

forma deliberada ou não, até um outro jogador da Equipa Observada, sem que exista Posse de

Bola, dando continuidade à ITEDA. A acção defensiva pode ser uma intercepção, uma disputa

de bola (p. ex. uma bola em trajectória aérea não controlada por nenhum dos jogadores), ou um

desarme.

Critério 6 – DTEDA – DESENVOLVIMENTO DA TRANSIÇÃO-ESTADO DEFESA-

ATAQUE (Desenvolvimento da Transição)

(31) DTEDApc – Desenvolvimento da Transição-Estado Defesa-Ataque por passe curto:

sempre que o portador da bola realiza um passe curto (passe dentro da mesma zona ou entre

duas zonas contíguas) para um dos companheiros com o intuito de dar continuidade à DTEDA;

(32) DTEDApl – Desenvolvimento da Transição-Estado Defesa-Ataque por passe longo:

sempre que o portador da bola realiza um passe longo (passe entre duas zonas não contíguas)

para um dos companheiros com o intuito de dar continuidade à DTEDA;

(33) DTEDAcd – Desenvolvimento da Transição-Estado Defesa-Ataque por condução: o

portador da bola realiza um número de contactos consecutivo, igual ou superior a três, fazendo-

a progredir pelo terreno de jogo;

(34) DTEDArc – Desenvolvimento da Transição-Estado Defesa-Ataque por

recepção/controle: acção em que um jogador da equipa em DTEDA recebe e controla a bola

enviada por um colega, mantendo a continuidade da DTEDA;

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

3.Metodologia 63 63

(35) DTEDAd – Desenvolvimento da Transição-Estado Defesa-Ataque por drible: o portador

da bola procura ultrapassar o(s) seu(s) adversário(s) directo(s), e manter a posse de bola ou

ganhar posição ou espaço sobre este(s), mantendo a continuidade da DTEDA;

(36) DTEDAdu – Desenvolvimento da Transição-Estado Defesa-Ataque por duelo: acção em

que um jogador da equipa em posse bola disputa a mesma com um adversário (p. ex. uma bola

em trajectória aérea não controlada por nenhum dos jogadores), tentando manter a continuidade

da DTEDA;

(37) DTEDAgr – Desenvolvimento da Transição-Estado Defesa-Ataque pelo guarda-redes:

intervenção ocasional do guarda-redes da equipa em DTEDA.

Segundo as ideias expressas pelo treinador relativamente aos quatros momentos de

jogo que o seu Modelo contempla, o nosso objectivo prende-se com a relação, existente ou não,

entre o pretendido pelo mesmo e o realizado pelos jogadores, caracterizando a equipa do

Sporting Clube de Portugal segundo o preconizado pelo seu treinador e executado pelos seus

jogadores. Para que tal possa ser compreendido, posteriormente, passaremos à análise dos oito

vídeos da respectiva equipa.

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

3.Metodologia 64 64

Critério 1 Critério 2 Critério 3 Critério 4 Critério 5 Critério 6

OOf –DESENVOLVIMENTO DA POSSE DE BOLA

(Inicio e Desenvolvimento da Organização Ofensiva)

FOOf – FINAL DA ORG. OFENSIVA (Finalização com ou

sem eficácia)

ITEAD – INICIO DA TEAD/PrPB

(Inicio da Transição Ataque-Defesa)

OD –DESENVOLVIMENTO DA ORG. DEFENSIVA (Posicionamento da

Equipa)

ITEDA – INICIO DA TEDA / RPB

(Inicio da Transição Defesa-

Ataque)

DTEDA – DESENVOLVIMENTO

DA TEDA (Desenvolvimento da

Transição)

(1) Desenvolvimento da

OF por passe curto (OOfpc)

(2) Desenvolvimento da

OF por passe longo (OOfpl)

(3) Desenvolvimento da

OF por condução (OOfcd)

(4) Desenvolvimento da

OF por recepção/controle (OOfrc)

(5) Desenvolvimento da

OF por drible (OOfd)

Finalização com Eficácia (FOOfef):

(11) Remate Fora (FOOfefrf)

(12) Remate

Dentro (FOOfefrd)

(13) Remate

contra o adversário (FOOfefrad)

(14) Obtenção de

Golo (FOOfefgl)

(15) Atingir o terço

(20) ZPrP Bola

(ZITEAD)

(21) Pressão Imediata (ITEADime)

(22) Número de

Jogadores na Zona de Perda da Posse de Bola (ITEADprpb)

(23) Número de

Jogadores na Zona de Pressão (ITEADpres)

(24) Temporização

(ITEADtemp)

(25) Número de

Jogadores em Organização Defensiva (ODnj)

(26) ZRP Bola

(ZITEDA) Tipos de Recuperação da PB: - (27) por intercepção (ITEDAi) - (28) por desarme (ITEDAd) - (29) por acção do guarda-redes (ITEDAgr) (30) Recuperação da PB seguida de passe (ITEDAp)

(31) Desenvolvimento da TEDA por passe curto (DTEDApc) (32) Desenvolvimento da TEDA por passe longo (DTEDApl) (33) Desenvolvimento da TEDA por condução (DTEDAcd) (34) Desenvolvimento da TEDA por recepção/controle (DTEDArc) (35) Desenvolvimento da TEDA por drible 1x1 (DTEDAd) (36) Desenvolvimento da TEDA por duelo (DTdu) (37) Desenvolvimento

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

3.Metodologia 65 65

(6) Desenvolvimento da OF por duelo (OOfdu)

(7) Desenvolvimento da

OF por acção do gr da equipa em fase ofensiva (OFgr)

Método de Jogo Ofensivo:

(8) Contra-Ataque (OOfca)

(9) Ataque Rápido

(OOfar)

(10) Ataque Posicional (OOfap)

ofensivo de forma controlada (FOOfefof)

Finalização sem Eficácia (FOOfsef):

(16) RPB adversário (FOOfsefbad)

(17) RPB pelo

guarda-redes adversário (FOOfsefgrad)

(18) RPB

lançamento para fora (FOOfseff)

(19) RPB infracção

(FOOfsefi)

da TEDA por acção do gr da equipa em fase ofensiva (DTgr)

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 66 66

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 67 67

4. Análise e Discussão do Conteúdo da Entrevista

4.1. Análise da Entrevista ao treinador Paulo Bento

Como forma de analisarmos e discutirmos os dados relativos ao nosso tema em estudo

– “Em busca da conformidade entre o Modelo de Jogo do treinador e a performance da equipa

em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal” –, determinamos como guia lógico

para a execução deste trabalho que o mesmo fosse dividido em três macroestruturas. Assim

sendo, a divisão dessas três macroestruturas prende-se com a análise da entrevista realizada a

Paulo Bento, sendo que a segunda macroestrutura – Modelo de Jogo a partir da concepção do

Treinador –, será complementada pela análise de vídeo de oito jogos do Sporting Clube de

Portugal.

Assim sendo e antes de passarmos à análise e discussão propriamente ditas,

salientámos que dentro destas macroestruturas se desenvolverão microestruturas.

4.1.1. Motivação para o exercício da profissão

Ao estar inserido num grupo, para nele se poder viver, conviver e evoluir é necessário

que o indivíduo apreenda e interprete a informação que o mesmo defende, preconiza e utiliza.

Para tal, a equipa e os seus jogadores constroem a sua experiência, os seus valores, as suas

aptidões, as suas necessidades e as suas expectativas. Assim, há a tendência para retermos e

defendermos os dados que são compatíveis com as nossas convicções e as nossas ideologias,

e que nos convêm.

Por intermédio da experiência, valores, regras, necessidades, expectativas, constrói-se o

conhecimento que temos da realidade, conhecimento o qual vamos alicerçar as nossas

convicções, as nossas referências, culminando em condutas de acção. Para tal, é importante

conhecer quais foram os aspectos que o treinador em questão determinou como cruciais para

melhor conhecer o jogo de Futebol.

Deste modo, Paulo Bento (Anexo 1, pág. I) refere que “os aspectos determinantes para

se conhecer melhor o futebol são o estar-se ou tentar-se aperceber dentro da tua experiência

enquanto jogador primeiro e depois como treinador, ou seja, a organização, focalizar-se na

organização das equipas, tentando entender o mais possível e o melhor possível aquilo que

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 68 68

estavas a fazer, especialmente na tua experiência enquanto jogador, ou seja, ao nível do treino.”

O entrevistado acrescenta ainda que é essencial “entenderes o que estás a fazer e o porquê de

o estares a fazer.” Então, podemos depreender que a conjugação de saberes adquiridos

enquanto jogador, numa primeira fase, e actualmente, como treinador, permitem que a

percepção, entendimento e conhecimento sobre o jogo sejam profundos. Tudo isto subordinado

à compreensão dos exercícios executados no treino, fazendo do jogador um Ser Inteligente, pelo

facto de não se limitar a executar mas também, a compreender o que executa e por que razão o

faz.

O facto de a Inteligência ser específica, torna necessário que os jogadores sejam

confrontados com situações de aprendizagem o mais próximo possível da realidade (Jensen,

2002), como também, não se trata de uma Inteligência qualquer, mas sim específica e que se

encontra “subjacente ao jogar futebol, um saber que se concretiza na acção” (Gaiteiro,

2006:122). Por isso, Pires (2005) revela ser crucial entender que só existe desenvolvimento

pessoal, organizacional e social quando a taxa de aprendizagem é superior à taxa de mudança,

ou seja, compreender o que se executa e por que razão o jogador o faz, permite manifestar que

o último tem “a necessidade de ter já em si uma representação daquilo que apreende” (Frade,

1985:3).

Dentro do mesmo raciocínio, Paulo Bento (Anexo 1, pág. I) salienta que a compreensão

“acaba por se tornar mais fácil quando passas para a tua outra experiência como treinador,

poderes explicar aos outros por que razão o vão fazer, para que é que o vão fazer porque tens

uma vivência anterior.” Conjugar a experiência de jogador com a de treinador revela-se um ponto

de coligação em destaque, para que o conhecimento sobre o jogo seja exacerbado. Tudo isto

porque para além da compreensão em vivenciação, a qual é uma peça fundamental para que o

jogador crie um profundo conhecimento sobre o jogo, também se revela imperial que o treinador

saiba transformar o conhecimento que advém do saber fazer como jogador, num saber sobre um

saber fazer como treinador. Tudo isto consubstanciado na vivência anterior.

Tendo em conta a sua formação enquanto jogador, Paulo Bento (Anexo 1, pág. I) afirma

que “a organização de uma equipa, a organização do jogo é aquilo que para mim foi o mais

importante ao longo da minha carreira de jogador.” Como ponto de coligação entre ambas as

formações, a de jogador e a de treinador, as quais são um complemento uma da outra, em

direcção a um conhecimento cada vez mais profundo sobre o futebol, Paulo Bento (Anexo 1,

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 69 69

pág. I) revela que na sua função de treinador o mais importante “é tu entenderes o jogo de uma

forma quase total.”

A problematização do jogo exige que existam pessoas com formação teórica e prática

sustentada, coerente e de elevado nível, possibilitando que exista uma estreita ligação entre

ambas, ou seja, é através da formação, a qual é “objectivada em competências sociais, culturais,

pedagógicas (perceptivas, construtivas, didácticas, expressivas, comunicativa, organizativas) e

metodológicas, que o treinador se apresenta em face dos outros sujeitos intervenientes no seu

campo profissional” (Bento, 1995 e 1999). Por outro lado, o treinador é um elemento que “deve

tomar partido, elegendo a sua visão, o seu método, o seu caminho, tomando consciência de que

os métodos são bons quando os seus utilizadores reconhecem o respectivo alcance e limites”

(Garganta, 2004).

Para que tal seja possível e tendo como base fundamental do seu trabalho a condução

da unidade de acção – a equipa –, o treinador precisa de saber como escolher a sua equipa,

como desenhar o trabalho para aplicar as suas competências, como liderar e impulsionar a

equipa, como motivá-la, como avaliar o seu desempenho para melhorá-lo cada vez mais e como

recompensá-la para reforçar e reconhecer o seu valor. Mas, ao longo de todo este processo, os

jogadores vivenciam vários modelos de jogo, os quais são orientados por treinadores diferentes,

conduzindo os primeiros para referências distintas.

Deste modo, Paulo Bento (Anexo 1, pág. II) afirma que “não é fácil identificarmo-nos só

com um modelo de jogo dos treinadores (…) porque é muito difícil haver só um modelo de jogo

ao longo da tua carreira, diria impossível.” Por este facto, o mesmo (Anexo 1, pág. II) salienta

que o “mais difícil é escolher um com quem tu te identifiques”, fazendo-nos compreender que as

referências do treinador e as do jogador, muitas das vezes não confluem numa mesma

perspectiva relativamente ao modo como percepcionam o contexto onde estão inseridos, sem

como isto comprometer a equipa, os seus objectivos, as suas ideias, os seus valores e as suas

expectativas. Pura e simplesmente, como vivenciaram contextos distintos subordinados as

outras ideias e visões, é natural que construam outro conhecimento que tem tudo para poder

enriquecer o modelo (de jogo) do aqui e agora.

Corroborando com o anteriormente desenvolvido, Paulo Bento (Anexo 1, pág. II) refere

que “o tirar ou como diz o Capelo «o roubar» um pouco de cada um, aquilo com que tu mais te

identificavas, as melhores qualidades e aqui estamos a falar só em termos tácticos, ou seja, tudo

aquilo que faz referência ao modelo de jogo para depois tu, em função das equipas que fores

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 70 70

treinando, poderes aproveitar aquilo que aprendeste”, isto é, vivenciar e experienciar vários

modelos que permitem ao jogador extrair conhecimentos úteis do contexto organizacional onde

esteve e está inserido, fazendo com que a concepção de jogo do mesmo se alargue e

aprofunde, em direcção a um «jogar» próprio, o qual se constrói no caminho que percorre até

exercer a função de treinador.

Assim, caminhámos para um dos aspectos fundamentais do processo de treino, ou seja,

treinar em especificidade. Este aspecto torna-se importante para a construção do nosso Modelo

de Jogo pelo facto de retirarmos ideias, visões e vivências de outros modelos, os quais eram

específicos de cada treinador, mediante a equipa e contexto onde estavam inseridos. Como tal,

Guilherme Oliveira (2003) salienta que “a especificidade é a relação que existe entre o Modelo

de Jogo que se adoptou e a operacionalização do treino. Tudo aquilo que se faz no treino é em

função do Modelo de Jogo adoptado e essa relação é fruto da especificidade.”

A transmissão do modelo de jogo do treinador aos seus jogadores, permite que haja um

cruzar de ideias, as quais estão directamente relacionadas com as vivências de cada um dos

intervenientes. Essas mesmas vivências conduziram e conduzirão o treinador e o jogador no

criar dos seus próprios modelos, modelos esses que formam o conhecimento de cada um deles,

condicionando e dirigindo a focalização da sua atenção na informação para a qual ambos estão

mais sensíveis, permitindo-lhes desenvolver esse conhecimento, ou seja, o seu conhecimento

específico, o de cada um deles.

O conhecimento específico que cada um dos treinadores transmite por intermédio do

seu modelo de jogo, acarreta uma complexidade tal que faz com que emerjam algumas

características em detrimento de outras. Assim, Paulo Bento (Anexo 1, págs. II e III) menciona

que João Alves, Lillo e Fernando Vásquez foram os treinadores que mais o influenciaram ao

longo do seu percurso como profissional de futebol, segundo características distintas. Para o

mesmo entrevistado (Anexo 1, pág. II e III), “João Alves marcou-me muito por vários aspectos

tendo em conta os pessoais (…) foi o primeiro treinador que eu tive em termos profissionais e

naquela altura, notava-se que ao nível do treino que há situações que hoje em dia se fazem que

ele já o fazia naquela altura… falamos em termos de exercícios, da concepção de algumas

unidades de treino… Por isso, foi um treinador que me marcou pela sua organização, pela sua

capacidade de liderança no treino.”

Por outro lado, Paulo Bento (Anexo 1, pág. III) afirma que Lillo foi “um treinador muito

exigente sobre o ponto de vista táctico”, enquanto que Fernando Vásquez se destacava pela

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 71 71

“capacidade de organizar a equipa através de um processo muito simples, ou seja, era um

treinador que usava muito a simplicidade nas unidades de treino, na preparação do microciclo,

até mesmo no seu próprio discurso era um treinador simples e fácil, (…) de entender.”

Podemos, assim, verificar que as características que mais se destacam nos treinadores

supracitados, prendem-se com a organização e capacidade de liderança no treino, pelo

exacerbar da dimensão táctica, estando alicerçada à mesma uma grande exigência, deslocando-

nos para uma simplicidade de processos na organização da equipa, articulada com um discurso

que acompanhava o registo mencionado. Tudo isto, conduziu a focalização do entrevistado para

determinadas referências, as quais salienta que não devem ser alvo de imitação, devendo

atribuir-se o cunho pessoal. Essas mesmas referências conduziram-no para o desenvolvimento

da capacidade de ler e ver o jogo.

Alicerçada à última ideia, Paulo Bento (Anexo 1, pág. III) refere que “estes três

treinadores foram os que me levaram a ver o futebol de uma maneira diferente daquela que

vemos no início da mesma (…)” como também, “ (…) ensinaram-me a ver o jogo e aprendi com

eles muitas coisas, as quais não se devem imitar porque acho que isso não se deve fazer mas

tentando praticar.” Assim, constatámos que os vários modelos de jogo vivenciados pelo

entrevistado enquanto jogador, lhe proporcionaram a construção de um significado pessoal,

sendo este fruto de uma compreensão em projecção (Moigne, 1994), convergindo numa lógica

interna de funcionamento (Garganta & Cunha e Silva, 2000).

Como ponte entre a primeira macroestrutura de análise e discussão – Motivação para o

exercício da profissão –, e a segunda – Modelo de Jogo a partir da concepção do treinador –

dirigimos o nosso olhar para a caracterização do modelo de jogo do Sporting Clube de Portugal,

verificando, não só a complexidade que a sua lógica de construção acarreta como também, os

princípios de jogo específicos dos quatro momentos de jogo privilegiados pelo treinador, ou seja,

Organização Ofensiva, Transição Ataque-Defesa, Organização Defensiva e Transição Defesa-

Ataque.

4.1.2. Modelo de Jogo a partir da concepção do treinador

Como ponto de partida para compreender a complexidade que o treinador atribuí à

ligação intrínseca entre a concepção e operacionalização do modelo de jogo, há que executar

uma pergunta chave antes de se construir um «jogar» de qualidade ambicionado por todos, ou

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 72 72

seja, “O Meu Modelo de Jogo ou o Modelo de Jogo que eu vou trabalhar em determinada

situação?” (Paulo Bento, Anexo 1, pág. II). Assim, podemos analisar a questão de partida que

Paulo Bento propõem de duas formas: o modelo de jogo ideal do treinador (?) ou o modelo de

jogo do treinador adaptado ao contexto onde está inserido?

Analisando o primeiro ponto da questão – “ O Meu Modelo de Jogo (…) ” –, podemos

dizer que cada treinador trás “ (…) dentro da sua cabeça um modelo mental do mundo, uma

representa subjectiva da realidade externa (…) ” (Tofler, 1970) na qual criou todas as suas

referências, alicerçadas a valores, regras, princípios que transporta consigo para as situações de

treino e competição, sendo o seu modelo ideal de jogo “ (…) uma versão individual da formação

requerida para o desempenho das respectivas funções” (Bento, 1995).

Passando de uma concepção individual do modelo de jogo, para a projecção desse

mesmo modelo numa construção dinâmica e interactiva com o Clube, equipa técnica, jogadores,

entre outros, verificámos que é na operacionalização do mesmo que se encontra o potencial do

próprio modelo, ou seja, quando as ideias que o treinador possui sobre determinada realidade,

sobre determinado jogo, se interconectam com as referências dos seus jogadores, convergindo

ou divergindo em determinados pontos. Como tal, Paulo Bento (Anexo 1, pág. II) salienta que “

não há só um modelo de jogo ou o nosso modelo de jogo. Há o nosso modelo de jogo para este

trabalho que queremos desenvolver, para esta equipa que nós treinamos, para este clube onde

nós estamos.”

Assim, a base fundamental do trabalho de cada gestor, como é o caso do treinador, está

na equipa. Ela constitui a sua unidade de acção, a sua ferramenta de trabalho, cumprindo-lhe ter

uma acção decisiva sobre a mesma. Acção essa crucial em tudo o que diga respeito ao

rendimento e à qualidade de intervenção dos componentes que integram a equipa, decorrendo

num ambiente em constante mutação e a que tem de se adaptar permanentemente, antecipando

o futuro na medida do possível, no aqui e agora, no espaço e no tempo (Araújo, 1997;

Chiavenato, 2004).

Mais do que percepcionar a dimensão que as ideias do treinador possuem na estreita

ligação com os jogadores, revela-se de substancial importância compreender o conhecimento

multidisciplinar que o treinador possui (Frade, 2007), pelo facto do mesmo exercer uma acção

decisiva na construção do seu «jogar», revelando que o conhece na íntegra, possuindo assim a

capacidade para direccioná-lo no sentido que ele pretende (Gomes, 2007).

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 73 73

Deste modo, como forma de compreendermos a relação que existe entre a Cultura de

um Clube e o Modelo de Jogo do treinador, Paulo Bento (Anexo 1, pág. IV) afirma que “ uma das

coisas que deve estar dentro do modelo de jogo é a cultura do clube e as ideias do treinador, ou

seja, o treinador deve saber moldar as suas ideias em função da cultura do clube.” A par disto,

Guilherme Oliveira (2007) menciona que “o treinador quando chega a um clube tem de

compreender que vai para um clube com um determinado tipo de história, com determinado tipo

de cultura, com um determinado historial num país com determinadas características. E o

treinador tem de compreender tudo isso e o modelo de jogo tem de envolver tudo isso.”

Pela complexidade estrutural, funcional e organizacional que o modelo de jogo possui,

compreendê-lo na sua globalidade é um dos factores que faz com que o mesmo seja de elevada

importância na execução, aplicação e evolução de um «jogar» de qualidade. Como tal,

Guilherme Oliveira (2008) salienta “o modelo de jogo é uma coisa muito complexa e muitas

vezes as pessoas são muito redutoras no entendimento deste conceito de modelo porque

pensam que o modelo de jogo é apenas um conjunto de comportamentos e ideias que o

treinador tem que transmitir a determinados jogadores”.

Utilizando a apreciação global de Paulo Bento (Anexo 1, pág. IV) sobre o conceito de

Modelo de Jogo, o autor define-o como “ (…) uma forma de jogar, dentro dessa forma de jogar

encontram-se as ideias do treinador, e logicamente também, a cultura do clube porque tu vais

pôr um pouco a equipa a jogar não só em função da cultura do clube mas também, em função

das tuas ideias tendo em conta a cultura do clube.”

Evidenciando esta relação de reciprocidade entre a Cultura do Clube e o Modelo de

Jogo do treinador, as quais se influenciam mutuamente num processo de construção sustentada,

dinâmica, coesa e de elevada complexidade, devemos salientar como primeiro ponto crucial

desta relação, a Cultura do Clube. Assim sendo, Paulo Cunha e Silva (1999) destaca que “o

sujeito do conhecimento constrói-se a si próprio no acto de conhecer. Serve-se do outro para se

edificar”, ou seja, o treinador operacionaliza as suas ideias, valores, regras, princípios em

consonância com as ideias de uma hierarquia à qual está subordinado, o Clube. Como prova

disso, Guilherme Oliveira (2007) evidencia que “quando um clube contrata um treinador, contrata

ideias de jogo porque sabe que vai jogar dentro de determinadas ideias (…) e o treinador tem de

compreender tudo isso e o modelo de jogo tem de envolver tudo isso. E se não se envolve com

tudo isso, o que vai acontecer é que, por mais qualidade que possa ter, pode não ter o mesmo

sucesso do que se tudo isso estiver relacionado.”

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 74 74

Assim, há um conjugar de ideias, teorias e conhecimentos que concorrem para um

mesmo objectivo, sendo que junção destas duas culturas, a do Clube e a do Treinador, se

fundem numa só, sendo que a primeira permitirá, em larga escala, a projecção da segunda,

objectivando-se um crescimento universal de ambas na construção de um futebol de qualidade,

o qual se percepciona na imagem final que a equipa transmite no terreno de jogo.

Deste modo, “a Cultura do Sporting até pela obrigatoriedade que têm em ganhar, pela

sua história, obriga que no nosso modelo de jogo uma das situações que tenha de haver seja a

iniciativa” (Paulo Bento, Anexo 1, pág. IV). Verificámos, então, que uma das características base

do Modelo de Jogo do Sporting é a Cultura do “Ganhar”, sendo que a mesma condiciona o

Modelo de Jogo do treinador, ou seja, atribuí-lhe características fundamentais à priori,

hierarquizando uma filosofia de jogo, numa filosofia da vitória.

A construção do «jogar» de qualidade que conduz ao sucesso colectivo, neste caso

concreto, assenta na concepção e operacionalização de um futebol com iniciativa. Essa iniciativa

traduz-se na “maior capacidade para dominar o adversário do que propriamente jogar a

especular com a situação, a especular com o jogo. Culturalmente não é um Clube que tenha

adoptado essa forma de jogar e nós, também, não o pretendemos fazer nem o temos feito”

(Paulo Bento, Anexo 1, págs. IV e V). A par da afirmação anterior, constatámos a estreita e

íntima relação que deve existir entre a Cultura do Clube e o Modelo do Treinador, permitindo-nos

dizer que o plano mediador pelo qual comunicam, constrói um modo de perceber e pensar que a

sua linguagem comum põe em marcha através da identificação, reconhecimento, memória e

imaginação (processos cognitivos básicos) (Soares, 2005).

Uma vez que a iniciativa é um dos princípios fundamentais da Cultura do Sporting, este

mesmo princípio desenvolve-se através de dois princípios de jogo, ou seja, o maior tempo

possível em organização ofensiva em interacção com uma elevada capacidade para ter a bola,

funcionando como dois dos “aspectos mais importantes do modelo de jogo” (Paulo Bento, Anexo

1, pág. V). Consubstanciado com o supracitado, Paulo Bento (Anexo 1, pág. V) afirma que o que

dá “primazia ou uma particular atenção são as situações de posse de bola que levem os

jogadores a saber jogar dessa forma, ou seja, a saber estar mais tempo a jogar dessa forma,

não descurando os outros aspectos do jogo.”

A par do entrevistado, Mourinho (cit. por Oliveira et al., 2006:192) afirma que “algo que

para mim também é muito claro é que, para se assumir o jogo, é necessário ter a bola. Assumir o

jogo é ter a bola e usufruir dela. A minha táctica principal passa por termos noção bem clara da

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4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 75 75

coisa mais importante no futebol moderno para além de marcar golos: ter a bola.” Assim,

depreendemos que uma das características que marca a relação íntrinseca entre a Cultura do

Clube e o Modelo de Jogo de Equipas de Top, centra-se no facto dessa interligação ser

sustentada pela capacidade de iniciativa, pelo marcar dos ritmos e velocidade de jogo, pelo

domínio exercido sobre o adversário, ditando o desenrolar do jogo. Ou seja, exerce-se uma

influência consciente sobre o meio por intermédio de acções grupais, de modo a que os

princípios inerentes à Cultura da Equipa se superiorizem em confronto com o adversário.

Apesar da iniciativa de jogo ser um supraprincípio táctico que constitui o Modelo de Jogo

do Sporting, há que ter em conta a capacidade de adaptabilidade e versatilidade que o jogo

obriga mediante a imprevisibilidade e inconstância que o adversário no confronto de valores,

ideias, princípios e referências, introduz no jogo. De tal modo, revela-se imperial compreender se

a cultura e filosofia inerentes ao Modelo de Jogo se mantêm independentemente da equipa que

defrontam. Segundo o modo como Paulo Bento (Anexo 1, pág. V) concebe o jogo, o mesmo

salienta que “mantém-se o que é o nosso objectivo, mantém-se o que é a nossa mentalidade,

mantém-se o que é a nossa forma de jogar porque para mim não faz sentido, mesmo que

reconheçámos que o adversário possua um maior potencial e aqui, (…) não faz sentido mudar

aquilo que se treina de uma forma rotineira, de uma forma programada, de um forma

sistemática.”

Reforçando o lado pragmático do processo, Vítor Frade (2003:III) destaca que “mais

importante que a própria noção de modelo, são os princípios do próprio modelo”, uma vez que

nem todos assumem a mesma importância nem são operacionalizados da mesma forma.

Implícito ao mencionado, o mesmo autor (1985:21) reconhece que devido ao facto de todas as

acções do jogo conterem incerteza, é necessário “realizar estratégias de comportamento, como

arte de agir em condições aleatórias e adversas”, evidenciando a importância de um modelo de

comportamentos e princípios de acção para construir uma dada forma de jogar.

Para que tal se possa processar, ressalta a necessidade imperial de estabilidade na

estruturação, condução e construção do processo. Por intermédio dessa estabilidade relativa, a

qual é necessária em todos os níveis de processamento, do mais simples ao mais complexo,

constatando-se a sua existência quando alguém se relaciona com vários objectos no espaço ou

quando reage emocionalmente, de certa maneira e a certas situações, sempre de um modo

consistente (Damásio, 2000). Ou seja, através da “Inteireza Inquebrantável do jogo”, assumimos

o modelo como a concepção de uma expressão de jogo tendo como princípio base, o estar

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4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 76 76

constantemente a ser visualizado, mantendo-se o futuro como o elemento causal do

comportamento (Frade, 1985, 2006 e 2007).

Devido à inerente complexidade que o jogo em si encerra, verifica-se através da mesma,

a existência da estabilidade na esfera das ideias, sustentando a continuidade da(s) referência(s),

sendo, pois, um requisito da equipa. Na busca de um substrato biológico para a equipa, devem-

se identificar estruturas capazes de fornecer essa estabilidade (Damásio, 2000), culminando na

acreditação de “ (…) um modelo de jogo perfeitamente definido e não fugir dele, acreditar nele, é

um aspecto marcante das minhas equipas. E é fundamental que isso aconteça!” (Mourinho, s/d,

in Oliveira et al, 2006:191).

Assim, por percebermos o um, pensámos que percebemos o dois, porque um e um são

dois. Contudo, precisámos também de perceber o “e”, isto é, mais do que compreender o ponto

de partida e definirmos a(s) meta(s) que pretendemos atingir, revela-se de elevadíssima

importância utilizar os meios mais ricos, mais eficazes, mais eficientes e que, acima de tudo,

façam com que os jogadores sejam os condutores do processo, pela sua capacidade de

compreensão em execução, fazendo evoluir o projecto para o qual todos contribuem. Então,

mais do que compreender o “um e um”, é imperial compreender o “e”, isto é, o “caminho”,

salientando-se que a verdadeira importância das coisas não está nas coisas em si mesmas mas

sim, nas relações estabelecidas entre elas.

Desta forma, a comunicação entre o modelo e as situações que ocorrem no jogo,

orientam as respectivas decisões, condicionando a organização da percepção, a compreensão

das informações e a resposta motora dos jogadores (Garganta, 1997), fazendo-nos percepcionar

o jogo como “uma dinâmica do conjunto mas que tem sub-dinâmicas que estão relacionadas

com essa mesma dinâmica de conjunto” (Guilherme Oliveira, 2006). Então, podemos

compreender o jogo como uma unidade colectiva resultante das relações que os jogadores

estabelecem entre si.

Pelo facto do Futebol ser uma modalidade situacional, fazendo emergir a especificidade

relativa a cada modelo de jogo, à cultura organizacional que o próprio «jogar» encerra, podemos

definir o modelo de jogo com um fenómeno que se manifesta por influência da interacção

exercida com ambiente e com o contexto, sobre a expressão do «jogar» que o treinador

ambiciona e constrói com os seus jogadores, perpetuando a construção do «jogar» sobre

“saberes situacionais.”

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4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 77 77

Analogamente e reportando-nos a um exemplo das Neurociências, através de Gerald

Edelman (2008:11), verificámos que nos processos cerebrais, o fio condutor entre os grupos

neuronais vai sendo alterado em função das interacções com o ambiente, nomeadamente a nível

sensorial, manifestando-se assim, um fenómeno epigenético, sobre a expressão do genoma.

Não fazendo sentido mudar o que se treina de uma forma rotineira, de uma forma

programada, de um forma sistemática, Paulo Bento salienta que “o que pode ter e deve ter

sentido é dentro do modelo de jogo da equipa, adoptar algumas situações em termos

estratégicos para, não só, provocar danos no adversário como ao mesmo tempo, adoptar

estratégias para que o adversário não nos provoque danos” (Anexo 1, pág. V). Para que tal seja

possível, mais do que conhecer o adversário por intermédio do seu plano de princípios,

identificando-se uma matriz de jogo, um jogo «cientificável» pelo facto de o podermos identificar,

caracterizar e definir (Oliveira et al., 2006:187), esses dados só serão úteis, caso uma equipa

evidencie uma clara identidade de jogo, uma panóplia de invariâncias, suportando “as «nuances

estratégicas de circunstância» sem se descaracterizar” (idem, 2006:189).

Atribuindo maior profundidade à ideia anterior, Paulo Bento (Anexo 1, pág. VI) destaca

que o seu “modelo de jogo, neste caso concreto o do Sporting, está identificado”, demonstrando

que tais conceitos estão intimamente relacionados com a origem da qualidade de um «jogar»,

fazendo com que o mesmo possa ser decifrado, culminando no reconhecimento do último como

cultura, uma vez que os jogadores ao analisarem e interpretarem os factos do jogo, conferem-lhe

uma significação pessoal (Gomes, 2000a). Isto é, a significação pessoal deve convergir para

uma lógica interna de funcionamento, de forma a que o sistema se auto-regule, resultando do

funcionamento colectivo do mesmo, a organização da equipa por intermédio da “coexistência” de

interacções individuais regidas pelo Modelo de Jogo (Garganta & Cunha e Silva, 2000;

Guilherme Oliveira, 2006; Gomes 2008a).

O Modelo não se restringe somente ao plano conceptual ou ideológico do jogo, ou seja,

compreende igualmente o lado prático uma vez que o jogo é um fenómeno que se encontra em

permanente construção. Assim, para além do modelo de jogo compreender uma evolução

dinâmica e criativa ao longo do seu processo de desenvolvimento, também se revela crucial o

lado das ideias do treinador para o jogar como o é o lado prático do processo, para que os

jogadores compreendam o projecto colectivo da equipa e o desenvolvam (Castelo, 1996;

Guilherme Oliveira, 2008).

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4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 78 78

Para que esse crescimento ou evolução do Modelo de Jogo se processem, em direcção

a um futuro presente com um fim inalcançável, há que saber quais as nuances que devemos

operar ao longo do processo, de modo a que o Modelo se desenvolva paralelamente com o

«jogar» de qualidade.

Deste modo, Paulo Bento (Anexo 1, pág. VII) destaca que “as nuances foram mais em

termos de sistema, dentro do modelo de jogo, do que propriamente em termos de modelo de

jogo. (…) E aquilo que temos tentado fazer, mesmo com algumas alterações em termos de

sistema e mais o segundo sistema do que propriamente o primeiro, uma vez que o mesmo se

tem mantido inalterável, praticamente desde Dezembro de 2005-Janeiro de 2006. Depois aquilo

que alteramos um pouco, foi o nosso segundo sistema”. É-nos permitido constactar, numa

primeira instância, que a evolução do Modelo de Jogo se processa ao nível da alteração do

sistema de jogo, neste caso, do sistema alternativo ou segundo sistema.

Contudo e tendo em conta a identidade demonstrada através da Cultura Táctica e

Organizativa implícita à Equipa do Sporting, há que manifestar a importância de se possuir o

sistema de jogo base ou principal coeso, estável e favorável ao desempenho colectivo da própria

equipa, favorecendo a projecção do segundo sistema por intermédio dos alicerçes iniciais que o

primeiro lhe confere. De forma a verificarmos a mudança estrutural em consonância com a

evolução do Modelo, verificámos que a partir do 1-4-4-2 losângulo como sistema de jogo base ou

principal, na época 2006-2007, o Sporting utilizou como sistema alternativo ao primeiro, o 1-3-5-2

enquanto, na presente época, 2008-2009, utilizou o 1-4-4-2 clássico, fazendo-nos percepcionar

as mudanças operadas ao longo dos 3 anos e meio que o Treinador entrevistado se encontra no

Clube (Paulo Bento, Anexo 1, pág. VII).

Numa segunda instância, verificando-se outra variável que permite a evolução do

Modelo, o entrevistado afirma que “o modelo de jogo é o mesmo mas algumas questões de

interpretação do modelo de jogo são diferentes porque os jogadores também são diferentes. E

mesmo trabalhando da mesma forma, em termos de treino, com a evolução natural das

situações, nem sempre consegues jogar da mesma maneira, tendo num fundo a mesma ideia de

jogo. Isso tem mais haver com as características dos jogadores e também, com os momentos da

época” (Paulo Bento, Anexo 1, pág. VIII).

A par de Paulo Bento, Mourinho (cit. por Oliveira et al., 2006:177) salienta que a sua

principal preocupação na operacionalização do Modelo de Jogo após a primeira época no

Futebol Clube do Porto, se centrou na manutenção do grupo «sob controlo» de forma a ampliar o

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4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 79 79

seu modelo de jogo, em direcção a um modelo mais rigoroso. Tendo subordinado à ideia do

último o sistema de jogo, neste caso 1-4-3-3 ou 1-4-4-2, afirma que a transição de um sistema

para o outro lhe concedeu “maior rigor em termos de disciplina táctica, em termos de posições e

de funções (…) Muito mais «táctica»!” (idem, 2006:177).

De encontro com Paulo Bento e José Mourinho, no que concerne ao destaque que o

treinador possui na concepção, desenvolvimento e operacionalização do «jogar» da equipa,

Rijkaard (in Barend & Van Dorp, 1999:72) menciona que “ o Johan Cruyff é o Ajax. Ele decide a

táctica desde o primeiro minuto até ao último”, reafirmando a importância que o treinador possui

na construção e condução do Modelo de Jogo através da visão na qual consubstancia os seus

referenciais sobre o jogo, subordinada a um conhecimento específico, sendo que este se

representa através da informação que é representada mentalmente sobre um formato específico

(Eysenck & Keane, 1994).

Respeitar a bússola que é o conhecimento específico implícito ao Modelo de Jogo do

Treinador, significa cumprir o supraprincípio da especificidade, atingido através do pragmatizar a

fraccionação, isto é, através do contemplar da vivenciação aquisitiva dos diversos princípios,

subprincípios, subprincípios dos subprincípios do seu «jogar» (Oliveira et al., 2006). Portanto, não

podemos ignorar que a “dinâmica do competir é parte integrante da dinâmica do treinar”, como

também, “só se poderá chamar especificidade à Especificidade, se houver uma permanente e

constante relação entre as componentes psico-cognitivas, táctico-técnicas, “físicas” e coordenativas,

em correlação permanente com o modelo de jogo adoptado e respectivos princípios que lhe dão

corpo.” (Guilherme Oliveira, 1991).

Assim, na construção da geometria intencional e interactiva que caracteriza a equipa no seu

plano estático, o qual adquire vida com a aplicação dos princípios de acção ou de jogo, plano

dinâmico, podemos constatar que a relação dialéctica entre o Modelo de Jogo do Treinador e os

Jogadores, se produz num plano profundo do Modelo, ou seja, no momento em que os jogadores

dão vida ao plano estático (Sistema de Jogo), por intermédio dos princípios de jogo, os quais são um

início da transição entre o plano estático e o plano dinâmico do Sistema de Jogo.

De acordo com esta questão e não diferenciando o sistema estático do sistema funcional,

Paulo Bento (Anexo 1, pág. XXIII) afirma que não separa a “dinâmica e o sistema. Um precisa do

outro. Eu para poder dinamizar um sistema tenho de saber qual é, de onde é que parto. Logo, eu

tenho um sistema para saber quais são os meus movimentos de partida. Depois, onde é que quero

chegar, já vai ser definido por outras coisas. Mas como é que eu parto, eu tenho de saber!”

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4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 80 80

Neste sentido, é possível antecipar o aparecimento de determinados padrões de interacções

dos jogadores pelo facto do jogador ter a capacidade e espaço para criar e inventar na

concretização dos princípios de jogo, os quais são padrões de comportamento táctico-técnicos que

permitem caracterizar uma equipa nos diferentes momentos de jogo.

Por intermédio de um outro olhar, Guilherme Oliveira (2006) perspectiva o princípio de

jogo como um início, inicio esse que tem a si alicerçados os conceitos de organizações estrutural

e funcional. A primeira centra-se nas disposições iniciais dos jogadores em campo, ou seja, um

mapa geométrico inicial, estático. Implicitamente relacionada com a primeira, surge-nos a

funcional como uma forma de manifestação do Modelo de Jogo, isto é, “ é o produto da criação

que a interacção entre a concepção de jogo do treinador, os princípios e os sub-princípios que o

constituem, a intervenção activa dos jogadores no Modelo e as diferentes estruturas que esse

Modelo pode assumir” (idem, 2006).

Assim, a evolução do conceito de organização construiu-se associada à ideia de

estrutura, distorcendo e reduzindo a sua importância. Desta forma, a estrutura representa o lado

rígido e estático do sistema, sendo através do «jogar» - “uma fenomenologia dinâmica de

interacções” (Gomes, 2006) –, que as dinâmicas do jogo se tornam numa funcionalidade

organizada a partir de uma estrutura.

Deste modo, caso o «jogar» não seja percepcionado e compreendido dentro de uma

percepção global associada à complexidade que a estrutura estática possui, aquando do adquirir

do dinamismo que a mesma revela através dos princípios de jogo pela qual a organização se

rege, dará lugar ao “ (…) enfraquecimento do sentimento de responsabilidade, cada um tende a

ser responsável apenas pela sua tarefa e isso leva ao enfraquecimento da solidariedade, o

jogador já não entende mais os seus laços orgânicos” (Morin, 2003) com o grupo em que cada

um deles se encontra inserido, perdendo-se o determinismo que a organização compreende, não

permitindo que a mesma funcione como um programa que regula e orienta a evolução do

sistema.

Enfatizando esta questão, Mourinho (s/d, in Oliveira et al., 2006:192) destaca que “ (…)

todos os jogadores têm de saber que em determinada posição há um jogador, que sob o ponto

de vista geométrico há algo construído no terreno de jogo que lhes permite antecipar a acção”,

conduzindo à construção de um jogar de qualidade na cabeça dos jogadores, ou seja, “um mapa

do seu futebol” (Resende, 2002:18).

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4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 81 81

Deste modo, a preocupação dos jogadores deve centrar-se nos adversários e nunca nos

colegas. Como tal, para que isto aconteça, implica que exista uma “ «Obsessão» pelo Jogo

Posicional”, tendo por base um Sistema de Jogo, o qual permite que cada jogador possua “um

mapa do jogar da equipa, que lhe permite a qualquer momento ter a noção de onde se

encontram os colegas.” Assim, esta deixa de ser uma preocupação, passando a ter apenas de

gerir o posicionamento dos adversários, este sim, imprevisível à partida (Maciel, 2008).

Por intermédio da ideia, a qual nos conduz para a percepção de uma geometria da

equipa, dos referenciais que a mesma oferece aos jogadores em treino e em jogo, conduz-nos

para a noção de fenomenologia, “no sentido em que coloca ênfase nas condições necessárias

(não as propriedades) para uma dada entidade, ser o que é” (Ilharco & Lourenço, 2007). A par

disto, Introca e Ilharco (2004, cit. por Ilharco & Lourenço, 2007:82) salientam que, “para a

fenomenologia, o significado não está «em» algo mas antes ele se encontra «na» ligação, nas

relações ou referências para o algo, para ser como já é tomado quando adquirido pela nossa

actividade contínua na nossa vida quotidiana.”

Neste sentido, a organização compreende uma ordem que faz emergir determinadas

regularidades no comportamento dos jogadores e por isso, não é algo estanque, encontrando-se

na raiz da estrutura (Bohm, D. & Peat, F. D., 1989:188). Deste modo, “o sistema de jogo é o

ponto de partida para configurar a dinâmica do jogar mas a funcionalidade compreende as

características dos jogadores, os princípios de acção em determinados momentos, as

estratégias de resolução em determinados contextos”, evidenciando-se nos vários momentos de

jogo, uma organização das relações dos jogadores díspar apesar de partirem de uma mesma

estrutura (Gomes, 2006).

Executando um paralelismo entre a estrutura que caracteriza o sistema de jogo como um

corpo, o qual parte de uma simples ordem linear para um «arranjo» de tais ordens, implicando a

junção de várias ordens semelhantes (Bohm, D. & Peat, F. D., 1989:189), tratando-se da

construção de um corpo, de uma “forma de formas” (morfogénese), de uma equipa, sendo que o

corpo (equipa) e a imagem se fundem até ao corpo (equipa) ser só imagem, e por isso uma

matéria plástica modelizável através da utilização das potencialidades videográficas (1993,

Fargier, cit. Cunha e Silva, 1999), culminando na divisam dos limites de validade desta

abstracção (estrutura), constituindo-se no desenvolvimento de novas noções pelo alargamento

do contexto (Bohm, D. & Peat, F. D., 1989:188).

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4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 82 82

Por intermédio do exemplo de Ayrton Senna (1998), podemos verificar a ideia

supracitada, uma vez que “o carro (estrutura) é uma extensão da gente (de quem o interpreta o

jogo – jogadores). Uma extensão do corpo pois você está lá, apertado. Você faz parte dele.

Quanto mais parte dele você puder ser e sentir, mais sensível você será às ações e reações

dele. Sendo assim, fica melhor para tirar vantagem. É um trabalho do corpo para perceber a

realidade, o bom funcionamento da dinâmica.”

Aprofundando este bom funcionamento da dinâmica, a qual tende, por exemplo, para

sequências de ordem-desordem-interacção-organização ou desordem-interacção-ordem-

organização (Morin, 1977), originando uma forma de mobilidade em que algumas forças que

tendem a quebrar a estrutura, “são compensadas por processos que têm lugar dentro da própria

estrutura” (Bohm, D. & Peat, F. D., 1989:192), ou seja, “ é a força do chassi que o salva de um

acidente, é a potência do motor que o empurra para a frente, é a capacidade dos freios para

pará-lo, é o movimento da suspensão que absorve os trancos e a vibração do motor, a pista, os

pneus. Os pneus que o levam para a frente com suavidade, que lhe dão garra para parar rápido,

se necessário ou seguir em frente, se precisar arrancar ou virar rápido. Poderia descrever tantas

coisas, tantos detalhes. Você faz parte disto. E quanto mais fizer parte disto formando uma

unidade melhor será, certamente” (Senna, 1998).

O vínculo à acção compreende a interacção de reciprocidade entre o jogo e o jogador,

condicionando-se e exaltando-se mutuamente. Contudo, essa interacção deve ser construída e

direccionada pelo processo de “fabricação” de um «jogar» em função de um conjunto de ideias,

colectivas e individuais, de jogo, isto é, pela singularidade do Modelo de Jogo da equipa

alicerçada há sustentabilidade dada pela Cultura do Clube e do Treinador.

O Modelo de Jogo da equipa deve privilegiar invariantes colectivas e possibilitar, dentro

dessas invariantes, variantes individuais. Isto implica que o processo de construção deva

fomentar a criação de possibilidades de acção e não de certezas de acção, repercutindo-se na

dinâmica de criação, solidificação e recriação de conhecimentos dos jogadores e na dinâmica do

próprio jogo. Assim, a partir dos princípios de jogo, o Modelo de Jogo é exaltado numa

articulação entre comportamentos colectivos e individuais que constroem, no e pelo treino,

dando sentido e intencionalidade à condução do processo, ou seja, do jogo, educando os

jogadores para a percepção de linhas orientadoras comuns, fomentando o desencadear de uma

Inteligência Superior.

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 83 83

Esse processo de aprendizagem a que o Modelo nos conduz, permite que “ (…) todos os

aspectos de tal experiência, sejam físicos ou mentais, emocionais ou intelectuais, podem ser

profundamente afectados pela inteligência criativa, sempre e onde ela esteja apta a actuar, já

que através da sua acção tudo é susceptível de assumir um novo significado” (Bohm, D. & Peat,

F. D., 1989:285), avançando novas ordens e estruturas sensoriais que formam novas

percepções, novas referências, expressando-se o Modelo “em todo o instante”, uma vez que ele

“guia todo o processo de operacionalização” (Guilherme Oliveira, 2006).

Desta forma, torna-se relevante caracterizar, numa primeira instância, os grandes

princípios de jogo subordinados à equipa em análise através do “olho clínico” do seu treinador.

Posteriormente, numa segunda instância, caracterizar-se-á o Modelo de Jogador, segundo as

suas características globais, sectoriais e posicionais, tendo em particular atenção, às quatro

dimensões que sustentam o mesmo, ou seja, dimensões táctica, técnica, psicológica e física

(Bangsbo et al., 1991; Castelo, 1996).

De acordo com esta lógica, para criar uma dada forma de jogar estabelece-se a

organização dos princípios de jogo da equipa de modo a desenvolver o modelo. Para jogar como

pretende, em primeiro lugar, Paulo Bento (Anexo 1, pág. IX) quer que a sua equipa, no Momento

de Organização Ofensiva, dê Profundidade ao jogo, ou seja, “ sempre que se possa jogar para a

frente, não tem de jogar para o lado. Depois quando não se puder jogar para a frente, primeiro

para o lado do que para trás”, isto é, Segurança.

Desta forma, para que estes dois princípios se manifestem, existem premissas inerentes

aos mesmos, significando que na primeira e segunda fases de construção, o entrevistado

pretende que haja “zero por cento de risco”, enquanto na criação e finalização, “cem por cento

de risco” (Paulo Bento, Anexo 1, pág. IX). Como exemplo para a concretização da primeira e

segunda fases, Paulo Bento preconiza que os seus jogadores realizem “o menos toques

possíveis especialmente pela linha defensiva, que a bola não circule pelos quatro defesas mais

do que uma vez, que a bola não passe de lateral a lateral e volte, outra vez, de lateral a lateral.

Não jogar com os dois laterais à mesma altura quando estamos a iniciar a nossa fase de

construção” (Anexo 1, pág. IX).

Alicerçado ao mesmo, não pretende que os seus jogadores sejam criativos na primeira

fase de construção, uma vez que quer “que um jogador seja seguro, simples e eficaz mas que

tenha boa técnica, ou seja, deslocando a bola a 30 e a 40 metros e que a coloque nas zonas em

que nós queremos sair a jogar. Por exemplo, que saiba conduzir a bola à procura de libertar

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 84 84

espaços em zonas mais adiantadas para ligarmos o nosso jogo” (Paulo Bento, Anexo 1, pág.

XV).

No que concerne às fases de criação e finalização, há o objectivo manifesto de “dar

largura, normalmente, com os nossos médios interiores, termos os pontas-de-lança como

suporte para a nossa profundidade, seja no espaço interior, seja quando temos de sair pelos

corredores” (Paulo Bento, Anexo 1, pág. IX).

Relativamente ao Momento de Transição Ataque-Defesa, Paulo Bento concebe que a

equipa seja muito agressiva no primeiro instante, objectivando somente roubar a posse de bola

ao adversário. Por outro lado, no segundo instante, o objectivo centra-se na temporização da

saída do adversário para o ataque, reagrupando com o maior número de jogadores possível, “e

dentro do nosso sistema também, que esse maior número de jogadores possível sejam oito

jogadores, isto é, se tivermos de partir a equipa, partimos com quatro defesas, quatro médios, e

os dois jogadores da frente” (Anexo 1, pág. X).

Ao articularmos os dois momentos de jogo supracitados, verificámos a existência de

uma íntima relação comunicacional e sequencial entre ambos os momentos, uma vez que no

Momento de Organização Ofensiva, os pontas-de-lança servem como suporte na construção do

processo ofensivo, tanto no corredor central como nos laterais, associando-se ao facto do

treinador pretender que a equipa se agrupe na estrutura de 1-4-4 (+2) aquando da sua Transição

Ataque-Defesa, de modo a que a equipa, mesmo sem a posse de bola, já esteja preparada para

corresponder a uma “hipotética” Transição Defesa-Ataque, manifestando que a sua

intencionalidade de defender com 9 (GR+8) jogadores se aprofunda numa racionalização de

como atacar de seguida. Isto é, as duas fases do jogo, defender e atacar, não se dissociam em

nenhum momento.

Assim, manifesta-se a lei da co-responsabilidade ou processo recorrente, a qual indica

que todos os momentos de jogo se auto-influenciam e auto-determinam, fazendo com que os

acontecimentos de um se repercutam nos restantes, desencadeando ciclos constantes e

diferentes pelas suas propriedades, verificando-se que “todo o processo cujos estados ou efeitos

finais produzem os estados iniciais ou as causas iniciais” (Morin, 1977:175).

No caso de não conseguir recuperar a posse de bola, neste momento de transição, a

equipa entra em Organização Defensiva. Neste momento, a equipa privilegia pressionar o mais

alto possível, defender em somente dois corredores, encurtando o espaço em função da pressão

que é executada na frente (em Profundidade), mantendo a concentração defensiva e

agressividade sobre o adversário, objectivando-se que o executem como uma equipa solidária

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4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 85 85

(Paulo Bento, Anexo 1, págs. X e XI). Esclarecendo a ideia, dá como exemplo: “os nossos

pontas-de-lança a sairem nos laterais contrários quando o adversário joga com um linha de

quatro, que é o que se usa mais em Portugal. Mas normalmente, é o ponta-de-lança que sai no

lateral contrário, concentrando a equipa normalmente em dois corredores, ignorando o corredor

contrário onde está a bola e depois, por questões estratégias, podemos obrigar o adversário a

jogar mais por dentro ou por fora” (idem, Anexo 1, pág. X).

Desta forma e após a equipa recuperar a posse de bola, a Transição Defesa-Ataque

processa-se de dois modos: “saindo logo pelo corredor onde recuperamos a bola, ou seja,

suportando-nos aí com os jogadores da frente ou com um suporte à retaguarda, preferindo que

seja mais com o médio defensivo do que com os centrais, para podermos variar o centro do jogo

e sairmos pelo corredor contrário”, isto é, tirando a bola o mais rápido possível da zona de

pressão, seja em Profundidade, seja em Amplitude, criando a possibilidade de sair pelo corredor

contrário (Paulo Bento, Anexo 1, pág. IX).

Segundo as ideias expressas pelo treinador relativamente aos quatros momentos de

jogo que o seu Modelo contempla, podemos caracterizar a equipa do Sporting Clube de Portugal

como sendo uma equipa que privilegia a posse de bola, estando grande parte do tempo de jogo

no Momento de Organização Ofensiva, exponenciando um dos seus grandes princípios, ou seja,

a iniciativa. Para que tal possa acontecer, deve ser uma equipa que tem de possuir uma elevada

concentração defensiva e que “saiba onde quer pressionar, quando quer pressionar e como quer

pressionar”, tendo no primeiro momento de transição, um dos pontos mais fortes da sua

organização, de forma a manter a iniciativa de jogo. Ou seja, perder a posse de bola e recuperá-

la de imediato, manifestando-se na construção do processo ofensivo, a criatividade, a segurança

e o equilíbrio (Paulo Bento, Anexo 1, págs. IX, X, XI e XV).

Para que todos estes princípios de jogo se possam exaltar, torna-se fundamental que a

filosofia e a equipa assumam a mesma importância, sendo que a ideia de equipa é mais

importante que um jogador (individualidade), estando subordinado aos mesmos a obrigação de

cumprir e defender a ideia do Clube. Para que tal, o Modelo de Jogo prolongasse e projectasse

num Modelo de Treino, num Modelo de Exercícios em Especificidade, sendo que o Modelo de

Jogador que o treinador concebe, desenvolve e operacionaliza, se constrói no continuum entre o

treino específico e o exercício em especificidade.

Deste modo, revela-se de uma importância capital, descrever as principais

características que os jogadores reúnem para cumprir eficazmente as exigências do(s)

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 86 86

sistema(s) de jogo preconizado(s), segundo a concepção de jogo do treinador. Analisando as

mesmas segundo as características globais preconizadas pelo Treinador Paulo Bento, podemos

definir que “há uma coisa que tem de estar o mais possível em todos os jogadores, a técnica”,

uma vez que se se objectiva ter iniciativa, ter o domínio do jogo, é necessário ter a posse de

bola. Como tal, ter boa relação com bola, sabendo e querendo tê-la, manifesta a existência e a

necessidade de algo mais do que a dimensão técnica, exaltando-se uma característica mental,

ou seja, personalidade. “Técnica para saber o que faz e personalidade para a ter, para a querer

ter” (Anexo 1, pág. XII).

Do ponto de vista da dimensão física, o Treinador atribuí grande revelância à velocidade,

não uma velocidade qualquer, ou seja, não se resume somente à velocidade de deslocamento

mas, principalmente, à velocidade de execução, salientando que “para isso, é preciso ter

técnica.”

Depois, a inteligência táctica em termos ofensivos e defensivos. Ofensivamente, possuir

jogadores que pensem o jogo, que saibam o que tem para fazer em cada momento com bola,

enquanto que defensivamente, sejam jogadores que saibam o que tem de fazer quando não tem

a bola, descriminando quando, como e onde se há-de pressionar. Para a interpretação e

desenvolvimento desta dimensão táctica, é necessário conjugar a dimensão psicológica, sendo

que o treinador defende que tem de existir agressividade no modo como os jogadores

manifestam “disponibilidade para ir à procura da bola” (Anexo 1, pág. XII).

Para além da agressividade, Paulo Bento salienta que o perfil psicológico de todos os

seus jogadores, independentemente da sua função, deve assentar em factores como a

mentalidade vencedora, coragem e solidariedade. Esta última característica, não se encontra

somente subordinada a cada uma das individualidades que constitui o grupo mas sim, a uma

solidaridade grupal, colectiva. Isto é, “a solidariedade, fundamentalmente entre os jogadores…

Essa para mim é que é fundamental! Ou seja, entre eles, são aqueles que vão executar mais as

tarefas, tem que haver essa solidariedade” (Anexo 1, págs. XXIII e XXIV).

Em jeito de síntese, no que concerne às características globais, o treinador define o

jogador inteligente como sendo um jogador que melhor define os quatro momentos do jogo,

manifestando que “quanto mais jogadores inteligentes houver nos quatro momentos do jogo,

mais forte é a equipa porque todos vão fazer as coisas com uma maior capacidade e uma maior

qualidade.” Ou seja, serem jogadores que estão constantemente a ver como é que o jogo está a

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 87 87

decorrer, liderando as acções do jogo, de forma a que decidam bem em determinados

momentos (Paulo Bento, Anexo 1, págs. XIX e XX).

Ao aprofundarmos essas características globais, conduzimos o nosso olhar para uma

vertente cada vez mais específica no que toca aos sectores e posições dos jogadores dentro do

sistema de jogo da equipa. Uma vez que todo o sistema, para além de ser unos/múltiplos,

também é unos/diversos, exalta a relação íntima entre unidade e diversidade do mesmo (Morin,

1977).

Segundo a ideia manifestada pelo autor supracitado, a sua diversidade é necessária à

sua unidade e a sua unidade é necessária à sua diversidade, sendo esta última exigida, mantida,

criada e desenvolvida na e pela unidade sistémica – Equipa –, que por sua vez cria e

desenvolve.

Existe decerto um problema de relação complexa, ou seja complementar, concorrente e

antagónico, entre diversidade e unidade, isto é, entre a ordem repetitiva e o desenrolar da

variedade, que resolve, fazendo com que esta relação complexa convirja num processo em que

a diversidade organiza unidade que organiza a diversidade.

Para que tais conceitos possam ser assimilados e desenvolvidos, os treinadores devem

reduzir a complexidade para os jogadores, clarificando a interpretação do último sobre a sua

função, permitindo que o jogador aceite o seu papel, construindo-se assim, a confiança e a

motivação do mesmo no desempenho da sua função dentro da unidade da equipa. Por

intermédio deste processo, o jogador sentir-se-á pronto para jogar, compreendendo o seu

trabalho no terreno de jogo e aceitando esse papel. Para tal, Bill Walsh (1998, cit. por Beswick,

2001) descreve o Ser Treinador como “a redução de incerteza”, verificando-se a importância da

utilização por parte do treinador de um modelo como produtor, construtor e precursor de um

processo, o qual pode ser considerado como uma representação simplificada da realidade (Melo,

Godinho et al., 2002a), estando relacionado com processos construtivos que estão ligados a

concepções de conhecimento (Garganta, 1997) de determinado fenómeno ou realidade.

Embora todas as posições compartilhem de determinadas exigências fundamentais, os

treinadores devem ensinar habilidades e responsabilidades específicas para as várias posições,

preparando as descrições das funções/papéis e das responsabilidades de cada jogador dentro

do Modelo de Jogo Específico de cada Equipa. Como exemplo dessa descrição, Mourinho

(s/data) salienta como características dos jogadores no seu sistema de jogo, as qualidades

Tácticas, a Personalidade, as qualidades Técnicas e qualidades Físicas.

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

Figura 2. Sistema de Jogo Base do Sporting Clube de Portugal (Época 2008

Centrando-nos precisamente na equipa do Sporting Clube de Portugal em termos

sectoriais e posicionais (Figura 1), Paulo Bento

jogadores do seguinte modo:

• Número 1 (Guarda

processos defensivos, na Organização Ofensiva, este deve assumir um

posicionamento mais avançado, jogand

jogo de pés para participar na primeira fase de construção do jogo, tornando

mais um elemento na organização colectiva da equipa.

Defensiva, revela

baliza e na área

em contextos de remate e de cruzamento,

que dominem as bolas no espaço.

psicológicas a capacidade de c

jogo com uma estru

humildade (Peres, 2009, in Pereira, 2009)

Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do

Sistema de Jogo Base do Sporting Clube de Portugal (Época 2008-2009)

nos precisamente na equipa do Sporting Clube de Portugal em termos

sectoriais e posicionais (Figura 1), Paulo Bento (Anexo 1, págs. XIII e XIV) caracteriza os seus

Número 1 (Guarda-Redes) – Apesar da sua principal função estar inerente aos

processos defensivos, na Organização Ofensiva, este deve assumir um

posicionamento mais avançado, jogando fora da baliza, utilizando o seu bom

jogo de pés para participar na primeira fase de construção do jogo, tornando

mais um elemento na organização colectiva da equipa. Na Organização

revela-se determinante que estes dominem o posicionamento

baliza e na área e os respectivos deslocamentos, que saibam defender a linha

extos de remate e de cruzamento, que resolvam as situações de 1x1,

que dominem as bolas no espaço. Tudo isto possuindo como qualidades

apacidade de concentração, de superar o erro e a pressão do

jogo com uma estrutura mental forte e equilibrada, tendo coragem,

(Peres, 2009, in Pereira, 2009).

Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do

2009)

nos precisamente na equipa do Sporting Clube de Portugal em termos

(Anexo 1, págs. XIII e XIV) caracteriza os seus

Apesar da sua principal função estar inerente aos

processos defensivos, na Organização Ofensiva, este deve assumir um

o fora da baliza, utilizando o seu bom

jogo de pés para participar na primeira fase de construção do jogo, tornando-se

Na Organização

dominem o posicionamento na

que saibam defender a linha

ue resolvam as situações de 1x1, e

Tudo isto possuindo como qualidades

centração, de superar o erro e a pressão do

confiança e

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 89 89

• Números 3 e 4 (Defesas Centrais) – São jogadores muito importantes na

primeira fase de construção do processo ofensivo, manifestando-se a sua

qualidade técnica para numa execução de elevada qualidade. Relativamente ao

processo defensivo, são jogadores rápidos, uma vez que a equipa deixa 30 a 40

metros de terreno de jogo nas suas costas, não executando fora-de-jogo, e

revelam um jogo aéreo forte.

• Números 2 e 5 (Laterais) – Manifestam-se jogadores rápidos e resistentes, pelo

facto de terem de ter a “capacidade de ir e vir”, apoiando e suportando o

processo ofensivo da equipa consoante o corredor de jogo pelo qual o mesmo

se desencadeia, reequilibrando sempre a sua posição após a participação

ofensiva. Segundo o treinador Paulo Bento (Anexo 1, pág. XVI), pontualmente,

os laterais também são jogadores que podem manifestar a sua vertente criativa

em determinadas zonas, sendo que no momento ofensivo “não devem estar,

devem aparecer!” Ou seja, “caso vão 50 vezes não vão surpreender ninguém.

Se forem 5 vezes, vão surpreender o adversário.”

• Número 6 (Médio Defensivo) – Jogador com elevada velocidade de execução,

utilizando os dois pés, para que execute a mudança do centro do jogo com

grande qualidade. Apesar de jogo aéreo não ser condição imprescindível para a

sua posição, é necessário que a possua a par da agressividade.

• Números 7 e 8 (Médios Interiores) – Apesar do acepção da própria palavra

“interiores”, conduzir a nossa compreensão para médios que jogam

preferencialmente no corredor central, Paulo Bento pretende esses jogadores

tenham capacidade de dar largura ao jogo sob o ponto de vista táctico, ou seja,

variando a sua distribuição e ocupação racional do espaço entre os corredores

laterais e o central. Pelo seu posicionamento, sejam jogadores com boa

capacidade para desequilibrar em situações de um contra um, sendo velozes e

resistentes nas suas incursões, atingindo as zonas de finalização. Ou seja, para

além de serem jogadores intervenientes na fase de criação, também devem

integrar a última fase, a fase de finalização. Defensivamente, devem demonstrar

boa comunicação e interacção com os dois pontas-de-lança, sabendo quando

devem realizar coberturas aos mesmos ou terem iniciativa para ser eles a

pressionar. Devem inverter a sua movimentação, comparativamente com o

processo ofensivo, ou seja, ofensivamente, jogavam de dentro para fora,

enquanto defensivamente devem jogar no espaço interior, manifestando uma

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 90 90

grande capacidade mental pelo facto de realizar funções e movimentações

segundo directrizes diferentes, mediante cada momento do jogo. Os médios

interiores, pela zona do campo que ocupam dentro do sistema de jogo, possuem

a liberdade para serem mais criativos.

• Número 10 (Médio Ofensivo) – No cômputo geral, Paulo Bento pretende um

número dez bom tecnicamente, manifestando elevada qualidade na execução

do último passe, movimentação de forma racional de modo a ganhar ou criar

espaços no corredor central, sendo que a sua zona de acção possui uma

elevada densidade de jogadores. A par dos laterais e dos médios interiores, este

jogador possui liberdade para ser mais criativo pela zona do campo que ocupam

dentro do sistema de jogo. Do ponto de vista defensivo, sejam jogadores com

boa capacidade de execução do primeiro momento de transição e de

recuperação defensiva, sendo bem dotados em termos de resistência.

• Número 9 e 11 (Pontas-de-lança) – Por intermédio da concepção do treinador,

os pontas-de-lança devem ser jogadores “que saibam segurar bem a bola, que

saibam procurar bem o espaço, que saibam jogar em função um do outro.”

Importante que a diversidade se manifeste nesta posição, uma vez que a

utilização de jogadores mais velozes, jogadores mais posicionais, entre outros,

permitem que as interacções se desencadeiem de forma diferente. Pela zona do

campo que este jogadores ocupam dentro do sistema de jogo, tem liberdade

para serem mais criativos, podendo driblar mais e arriscar na ultima fase da

Organização Ofensiva. Pela sua manifesta inteligência, são “jogadores com

capacidade para orientar o jogo do adversário”, pressionando e obrigando a que

o seu jogo seja direccionado para determinadas zonas do terreno, sendo

agressivos e reactivos após a perda da bola, jogando em função um do outro.

Como a equipa defensivamente se estrutura num 1-4-4 (+2), sendo esses dois,

os pontas-de-lança, estes devem saber posicionar-se consoante a organização

defensiva da sua equipa como forma de darem início à Transição Defesa-

Ataque, através do primeiro princípio da mesma, ou seja, em Profundidade.

Fazer do jogo objecto de estudo é um imperativo fundamental, na medida em que o

conhecimento da sua lógica e dos seus princípios tem implicações importantes nos planos de

ensino, treino e controlo da prestação dos jogadores e das equipas, factores que concorrem para

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 91 91

a sua qualidade (Garganta, 1997), optimizando os comportamentos dos jogadores e das equipas

na competição.

Assim, vários autores (Queiroz, 1986; Gréhaigne, 1992; Garganta & Pinto, 1994; Frade,

2007) consideram que o Futebol é um jogo táctico e que se manifesta pela interacção das

diferentes dimensões (técnica, física e psicológica), devendo-se entender que a dimensão táctica

não apenas como uma das dimensões tradicionais do jogo, mas sim como a dimensão

unificadora que dá sentido e lógica a todas as outras.

Deste modo, a dimensão táctica funciona como a interacção das diferentes dimensões,

dos diferentes jogadores, dos diferentes intervenientes no jogo (jogadores e treinadores) e dos

respectivos conhecimentos que estes evidenciam (Guilherme Oliveira, 2004), devendo constituir-

se como o princípio director da organização do jogo (Teodorescu 1984; Garganta, 1997).

Tendo em conta a exacerbação atribuída à dimensão táctica, a qual se revela uma

supradimensão, um imperativo categórico, o referencial que aparece da existência do processo,

uma emergência intencional. “Mas não um táctico qualquer. É táctico modelo, táctico cultura, é

táctico como entendimento colectivo de uma forma de jogar e de uma filosofia de jogo, definida

claramente pelo treinador e que tem que ser a relação entre cada um dos elementos da equipa e

sob a qual todos se devem orientar. Portanto, táctico sim, mas como modelo, como linha de

orientação em termos de organização” (Faria, 2003:LXXVII).

A par do mencionado anteriormente, Paulo Bento (Anexo 1, pág. XXII) define o conceito

de Táctica como o entendimento do jogo dentro dos quatro momentos do mesmo, salientando a

importância capital dos jogadores saberem o que fazem em cada um deles. “A táctica, mais do

que o sistema, (…) é a forma como as equipas se organizam, como os jogadores utilizam os

princípios de jogo dentro do modelo de jogo, ou seja, cada um dentro do nosso sistema de jogo,

como é que os jogadores utilizam os princípios de jogo para o modelo de jogo”, não pressupondo

somente uma organização em função do espaço de jogo e das missões específicas dos

jogadores, mas também, a existência de uma concepção unitária para o desenrolar do jogo, ou

por outras palavras, o tema geral sobre o qual os jogadores concordam e que lhes permite

estabelecer uma linguagem comum (Castelo, 1996).

Portanto, “quem percebe de táctica, percebe de jogo, entende o jogo! Pois, quando

entende o jogo, aplica em função dos seus princípios e do seu modelo de jogo, que é o que

treina” (Anexo 1, pág. XXII), manifestando-se que o jogador só reconhece determinado

comportamento, se primeiro o compreender e depois, determinar que o mesmo é benéfico, tanto

para a equipa como para ele (Guilherme Oliveira, 2006).

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 92 92

Numa relação intrínseca com o conceito de táctica, caminhando de braço dado com a

mesma, surge o conceito de inteligência, mais precisamente, o de inteligência táctica ou de jogo.

A Inteligência de jogo reporta-se às ligações que os Jogadores estabelecem entre si e ao modo

como preenchem o Jogo, sendo uma faculdade que não se vê nem se avalia mas que se

expressa por indicadores relacionados sobretudo, com o modo como os Jogadores criam

contextos e se ajustam a estes, e ainda com o modo intencional com que se relacionam (Gomes,

2008a). O que implica que o fomento da Inteligência de Jogo, através da vivenciação de um

determinado jogar que tenha subjacente um padrão de conexões.

Um dos aspectos mais relevantes da Inteligência de Jogo, no nosso entendimento, e

enquanto Inteligência em acção, resulta do seu carácter operativo e funcional (Cunha e Silva,

2008), uma necessidade inerente a esta actividade, tratando-se de formar “jogadores

inteligentes” (Greco, 1999), com capacidade de decisão, dotados de recursos, experiências e

conhecimentos para solucionar diferentes situações do jogo, sendo que “o importante é formar

jogadores, não repetidores” (Greco, 1988: 30).

Parece igualmente plausível, conceber a Inteligência como uma faculdade específica e

não generalista. O conhecimento é algo específico e contextual, não preexistindo em nenhum

lugar ou forma, mas actuando em situações particulares (Varela et al., 2001), sendo que “os

limites da minha linguagem, são os limites do meu mundo” (Wittgenstein, cit. por Bento, 1994),

não se tratando “ (…) de um problema sensorial ou meramente técnico, mas de uma questão

que é, antes de tudo, conceptual” (Garganta, 2004).

Para que essa inteligência de jogo se manifeste, Paulo Bento (Anexo 1, pág. XXI)

salienta que se em determinado momento do jogo, não estão a conseguir por em prática a

estratégia delineada por questões técnicas, por questões tácticas ou por questões mentais, “tem

que se tentar que aconteçam algumas situações em determinados jogadores, para que se possa

fazer com que a equipa consiga colocar em prática aquilo que estava pré-definido ou reajustar-

se, em função daquilo que o adversário nos está a colocar, sem mudar a nossa forma de jogar,

sem mudar as nossas características mas adaptando-nos um bocadinho ou usando outras

armas em função daquilo que o jogo nos está a pedir. Daí a inteligência ser uma inteligência

táctica, ou seja, o entendimento do jogo.”

Compreendendo como é que a inteligência táctica e o entendimento do jogo se

processam, verificámos que a Concepção de Jogo por parte do Treinador possui uma relação

íntima com a Operacionalização do Modelo de Jogo, sendo que para além de ambas serem uma

face da mesma moeda, a primeira centra-se no plano das ideias e a segunda, na

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 93 93

operacionalização, desenvolvimento dessas mesmas ideias. Assim, é no plano da operação, no

plano da “fabricação do jogar” que são exponenciadas e exaltadas as ideias concebidas pelo

Treinador, estando as últimas directamente relacionadas com a Cultura do Clube, constituindo-

se uma Cultura Global, emergindo estas duas subculturas.

Para que essa emergência intencional se processe, nesta cadeia hierárquica

descendente, a qual nos conduz do plano macro para o micro, revela-se imperial que o sistema

possua uma estrutura inicial ou de base por intermédio da qual se possam manifestar dinâmicas

relativas aos padrões de comportamentos colectivos e individuais, atribuindo movimento e

desestruturações estruturantes, para que a dinâmica atribua novas configurações e significados

à estrutura inicial.

Com a interpretação e compreensão das desestruturações estruturantes que se

desencadeiam ao longo do processo, o treinador mas principalmente, os jogadores, constroem

um mapa geométrico do seu futebol dentro da globalidade que é a Equipa, constituindo-se uma

linguagem global e comum, a qual se manifesta como o “bilhete de identidade” dessa

globalidade e das suas individualidades, não só pela interpretação individual de cada uma delas,

mas, acima de tudo, pelo harmonia que se desenvolve.

Esse conexionismo específico, referente às características específicas que cada equipa

manifesta, “adquire dinâmica ao arrancar num dado estado aleatório (sistema de jogo) e

permitindo que cada célula (jogador) atinja um determinado estado a cada momento (discreto)

de um modo síncrono (ou seja, todas as células (jogadores) atingem os seus respectivos

estados em conjunto) ”, sendo desencadeado através de regras de acção (princípios de jogo ou

de acção) que fornecem à rede neuronal (equipa) “não apenas configurações emergentes” mas

também, “capacidade de sintetizar novas configurações de acordo com a experiência” (Varela et

al., 2001:129-130).

Para tal, existe um Modelo de Treino, um Modelo de Exercício e um Modelo de Jogador

segundo a concepção do Treinador. Assim, para que a equipa seja um sistema altamente

cooperativo, as densas interligações entre os jogadores implicam que quase tudo o que decorrer

será uma função de tudo aquilo que os jogadores se encontram a fazer, cumprindo a nível local

(posicionamento específico de cada um dentro do sistema de jogo) as funções específicas do

mesmo, cooperando desse modo com o nível global (interligação das redes complexas dos

jogadores, às quais se relacionam umas com as outras em formato de rede) (idem, 2001:132).

Como resultado, todo o sistema possui um interdependência, uma vez que todo o

sistema adquire uma coerência interna com padrões intrincados, mesmo que não seja possível

dizer como é que eles se manifestam (Varela et al., 2001:132; Frade, 2007), ou seja, “o modelo é

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 94 94

tanto mais rico, quanto mais criar possibilidades aos indivíduos para poder acrescentar qualquer

coisa às suas funções, mas nunca à revelia das suas funções” (Frade, 2003).

Esse acrescento de qualquer coisa às suas funções, permite aos jogadores desenvolver

movimentos numa outra direcção, desenvolvendo uma acção criativa da inteligência, originando-

se nas profundezas da ordem à qual estão subordinados, não sendo “apropriado pensar que a

experiência é qualquer coisa que exista por si, modificada só de tempos a tempos pelas

percepções, pensamentos e acções que brotam da inteligência criativa” (Bohm, D. & Peat, F. D.,

1989:285). Neste seguimento, podemos considerá-la como a capacidade de perceber novas

categorias e novas ordens, encontrando-se numa zona intermédia entre um novo domínio para a

criatividade, ou seja, algo que permite a transição de um estado inicial para um estado posterior,

aumentando a complexidade do sistema.

Considerando a criatividade e imprevisibilidade que cada jogador pode exprimir na sua

posição/função, Paulo Bento (Anexo 1, pág. XIV) afirma que não dá primazia à criatividade e à

imprevisibilidade, permite sim que o jogador seja criativo para o adversário, “para os

companheiros não!” Como tal, é imperial que os padrões de conexões da equipa, padrões

ressonantes, apesar do tempo que levam a emergir, sejam o fio condutor da compreensão e

entendimento do jogo por parte dos jogadores, pelo conhecimento intra e inter posição e função

dos mesmos, envolvendo muitos ciclos de actividade em ambos os sentidos entre todos os

níveis locais participantes (jogadores) (Varela et al., 2001:136)

Inerente à ideia anterior, a manifestação de uma nova ordem de criatividade, dar-se-á

“dentro desse modelo de jogo, dentro dessa forma de jogar da equipa, entra a criatividade e a

imprevisibilidade, não entra antes” querendo que elas se manifestem nas zonas onde os

jogadores a devem ter (Paulo Bento, Anexo 1, pág. XV).

Contudo, o entrevistado destaca que em determinados momentos do jogo, em várias

zonas do campo, os jogadores vão ter de ser criativos, tendo de improvisar alguma situação,

manifestando uma característica mental para tal, ou seja, a coragem. “Coragem para encara os

adversários, para fazer situações de um contra um…” Apesar disso, Paulo Bento não dá

primazia à criatividade, atribuindo-a sim à Organização Colectiva, ou seja, ao que pretende da

sua equipa em termos ofensivos e defensivos (idem, Anexo 1, pág. XIV e XV).

Para que haja a emergência da nova ordem, criatividade, dentro do Modelo de Jogo, há

que conjugar a Organização Colectiva da Equipa com a Criatividade Individual, a qual se deve

manifestar em “zonas! Zonas onde eles podem e devem fazer.” Posteriormente, “há que ler as

situações para se saber onde é que posso e onde é que devo fazer”, uma vez que “há zonas em

que só tem de ter uma decisão, é a decisão que faz parte de um modelo de jogo, da nossa forma

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 95 95

de jogar. Noutras zonas, há mais decisões para o nosso modelo de jogo e então aí, é a escolha.

Nós podemos dizer o caminho mas depois lá, é que o jogador tem de o escolher” (ibidem, Anexo

1, pág. XV e XVI).

Segundo a ideia de Bohm e Peat (1989:350) e projectando-se os alicerces supracitados

sobre a criatividade, verificámos que qualquer que seja o conteúdo desse movimento criativo, ele

possuí uma intensidade apaixonada e tensão vibrante suficientes para transpor ou dissolver os

bloqueamentos da criatividade.

Deste modo, o Modelo de Jogo ao oferecer uma qualidade organizativa e organizante,

permite exponenciar uma nova variável evolutiva, ou seja, a inteligência criativa, existindo a

tendência para induzir movimento semelhante nos restantes elementos constituintes da estrutura

chamada equipa. O reconhecimento da importância desta nova ordem por parte da equipa

aquando do expressar da mesma por um dos seus elementos, conduz à integração da mesma

como factor crucial para o desenvolvimento do sistema, atribuindo à forma global de jogar da

equipa, um acrescento evolutivo, reconhecendo no jogador que a executou, a qualidade e a

capacidade de o ter demonstrado no momento, na zona e na circunstância ideal de jogo para a

equipa.

Deste modo e como forma de analisarmos as relações e congruências entre o

pretendido e o sucedido, ou seja, do modelo de jogo do treinador ao jogo praticado pela equipa,

de seguida passaremos à análise das respectivas relações e congruências, verificando se a

equipa é um prolongamento dos princípios defendidos e treinados pelo treinador.

4.1.2.1. Relações e congruências entre o pretendido e o decorrido

Posteriormente à análise dos oitos jogos do Sporting Clube de Portugal e como forma de

constatarmos as devidas relações e congruências entre as ideias do treinador e o executado

pelos jogadores, iniciaremos à respectiva análise do seguimento modo:

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

Figura 3. Percurso da Equipa em termos Quantitativos

No que concerne ao percurso da equipa em termos quantitativos, ou seja, relativamente

aos resultados alcançados pela mesma, podemos constatar, numa primeira instância, que dos

oitos jogos analisados, o Sporting conquistou sete vitórias e um empate, manifes

percurso praticamente exemplar e de enorme regularidade. Salientando este facto, verificámos

que 87,5% (7) dos resultados obtidos se traduzem em vitória, 12,5% (1) em empate e 0% em

derrotas (0).

Directamente relacionado com este facto e funcion

interacção a posteriori, a relação entre o sistema de jogo e as alterações efectuadas na

constituição da equipa associadas aos resultados obtidos, fornecem

relativamente à assimilação do Modelo de Jo

com o A, B, C ou D e no outro jogo, o A já não joga mas joga o Y, então... o teu objectivo é o

mesmo, ganhar! Ganhar com os outros jogadores mas com jogadores que são teus, com os

jogadores do plantel, jogadores que tu treinas todos para uma forma de jogar.

a equipa mas jogarmos da mesma forma, estamos mais perto de ganhar, ou seja, dentro do

mesmo sistema de jogo porque os jogadores estão preparados para isso e mesmo dentro do

mesmo modelo de jogo porque os jogadores também tão preparados para isso. Todos se

prepararam para isso!” (Anexo 1, Paulo Bento, págs. XVII/XVIII)

0

0,5

1

1,5

2

2,5

3

3,5

23 24

Re

sult

ad

os

Percurso da Equipa em Termos

Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do

Percurso da Equipa em termos Quantitativos

No que concerne ao percurso da equipa em termos quantitativos, ou seja, relativamente

aos resultados alcançados pela mesma, podemos constatar, numa primeira instância, que dos

oitos jogos analisados, o Sporting conquistou sete vitórias e um empate, manifes

percurso praticamente exemplar e de enorme regularidade. Salientando este facto, verificámos

que 87,5% (7) dos resultados obtidos se traduzem em vitória, 12,5% (1) em empate e 0% em

Directamente relacionado com este facto e funcionando o mesmo como um ponto de

, a relação entre o sistema de jogo e as alterações efectuadas na

constituição da equipa associadas aos resultados obtidos, fornecem-nos um bom micro

relativamente à assimilação do Modelo de Jogo por parte da equipa uma vez que,

com o A, B, C ou D e no outro jogo, o A já não joga mas joga o Y, então... o teu objectivo é o

mesmo, ganhar! Ganhar com os outros jogadores mas com jogadores que são teus, com os

jogadores que tu treinas todos para uma forma de jogar. (…) se mudarmos

a equipa mas jogarmos da mesma forma, estamos mais perto de ganhar, ou seja, dentro do

mesmo sistema de jogo porque os jogadores estão preparados para isso e mesmo dentro do

lo de jogo porque os jogadores também tão preparados para isso. Todos se

(Anexo 1, Paulo Bento, págs. XVII/XVIII).

24 25 26 27 28 29 30

Jornadas

Percurso da Equipa em Termos

Quantitativos

Vitória (3)

Empate (1)

Derrota (0)

Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do

No que concerne ao percurso da equipa em termos quantitativos, ou seja, relativamente

aos resultados alcançados pela mesma, podemos constatar, numa primeira instância, que dos

oitos jogos analisados, o Sporting conquistou sete vitórias e um empate, manifestando um

percurso praticamente exemplar e de enorme regularidade. Salientando este facto, verificámos

que 87,5% (7) dos resultados obtidos se traduzem em vitória, 12,5% (1) em empate e 0% em

ando o mesmo como um ponto de

, a relação entre o sistema de jogo e as alterações efectuadas na

nos um bom micro-indicador

go por parte da equipa uma vez que, “ (…) se é

com o A, B, C ou D e no outro jogo, o A já não joga mas joga o Y, então... o teu objectivo é o

mesmo, ganhar! Ganhar com os outros jogadores mas com jogadores que são teus, com os

se mudarmos

a equipa mas jogarmos da mesma forma, estamos mais perto de ganhar, ou seja, dentro do

mesmo sistema de jogo porque os jogadores estão preparados para isso e mesmo dentro do

lo de jogo porque os jogadores também tão preparados para isso. Todos se

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

Figura 4. Alteração na constituição da Equipa

Figura 5. Sistemas Utilizados nas várias jornadas

Tendo em conta o anteriormente dito, é-nos permitido verificar que ao longo dos oitos

jogos analisados, houve somente uma alteração dentro do sistema jogo preconizado pela

equipa, ou seja, da 23ª à 28ª jornadas, o Sporting utilizou o seu sistema de jogo principal, 1-4-4-

2 Losango, alterando somente o mesmo na 29ª jornada para uma variável do primeiro, 1-4-2-3-1,

voltando a adoptar o seu sistema de jogo principal na 30ª jornada.

De acordo com o que o treinador preconiza para a sua equipa no que toca às variações

dentro dos seus sistemas de jogo, verificámos que a única vez que o primeiro o alterou, não

optou pelo 1-4-4-2 Clássico, demonstrando assim que para além de ter um sistema alternativo,

possui uma terceira variante do 1-4-4-2 Losango.

Por outro lado, às alterações efectuadas na constituição da equipa possuem indicadores

muito importantes relativamente às variações dentro da mesma ao longo das várias jornadas. Da

23ª para a 24ª jornada, realizou-se uma alteração, enquanto da 24ª para 25ª e da 25ª para a 26ª

0

1

2

3

4

23 24 25 26 27 28 29 30

Sis

tem

as

de

Jo

go

Jornadas

Sistemas Utilizados

1-4-4-2 Losângo (3)

1-4-4-2 Clássico (2)

1-4-2-3-1 (1)

0

2

4

6

23/24 24/25 25/26 26/27 27/28 28/29 29/30

de

alt

era

çõe

s

Jornadas

Alterações na constituição da Equipa

1 Alteração

2 Alterações

3 Alterações

4 Alterações

5 Alterações

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 98 98

jornadas, se realizaram duas em ambas. Posteriormente, da 26ª para 27ª, da 27ª para 28ª, da

última para a 29ª e desta para a 30ª, verificaram-se quatro, duas, quatro e cinco alterações

respectivamente.

Alicerçado a todas estas alterações e como forma de complexificar as mesmas, em

alguns jogos, houve modificações estruturais no losango de meio-campo do Sporting, as quais

se podem repercutir em jogo com novas modificações funcionais pela interpretação dos

jogadores.

Após termos analisado o percurso da equipa em termos quantitativos, as variações dos

seus sistemas de jogo como também, as alterações na constituição da equipa ao longo das

várias jornadas, verificámos que apesar de todas as alterações, tanto no sistema de jogo como

na constituição da equipa, não foram nem são motivos para se dizer que a equipa perdeu

identidade e que os seus jogadores não souberam interpretar e responder de forma eficaz aos

desafios propostos pelo jogo. Muito pelo contrário! Todas as modificações operadas revelaram

sustentabilidade, coerência, treino, reflexão, versatilidade, culminando numa compreensão dos

jogadores de nível superior, não centrando a sua preocupação somente na compreensão das

acções individuais mas principalmente, na compreensão das acções colectivas.

Assim e associado a todos os resultados obtidos pela equipa, podemos afirmar, numa

primeira análise quantitativa, que existe relação e congruência entre as ideias que o treinador

preconiza e treina comparativamente com o conhecimento dos jogadores.

Enveredando pela análise qualitativa, tendo em conta os critérios impostos para a

execução da mesma, iniciaremos a sua execução pelo Momento da Organização Ofensiva tendo

em conta o que os dados nos relatam.

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

Figura 6. Critério 1 – OOf – Desenvolvimento da Posse de Bola

Relativamente ao início e desenvolvimento da Organização Ofensiva e segundo os

dados expressos pela Figura 6, constatámos que 58,34% (1686 passes curtos) deste momento

do jogo se processa através do gesto técnico passe curto, 17,13% (495 passes longos) por

passes longos e 9,10% (263 conduções/transporte de bola) por condução de bola.

Por outro lado e como valor intermédio, verificámos que 8,03% (232 duelos) das acções

ofensivas se processam através de duelos.

Como acções menos executadas neste momento do jogo, encontram-se de forma

decrescente a recepção e controlo da bola com 3,94% (114 recepções e controlos de bola), 3,22

% (93 dribles) de dribles executados e 0,24% (7 acções do guarda-redes) acções operadas pelo

guarda-redes na Organização Ofensiva.

Tendo em conta os dados supracitados e segundo as posições específicas do sistema

de jogo preconizado pelo treinador, podemos salientar que os defesas centrais variavam as suas

acções técnicas entre o passe curto, o passe longo e a condução de bola. O passe curto foi

preferencialmente utilizado em amplitude, sendo direccionado na maior parte dos casos para os

defesas laterais e médio defensivo, enquanto os passes curtos em profundidade eram

executados para os pontas-de-lança e passes longos em profundidade para os médios

1686

495

263114 93 232

758,34 17,13 9,10 3,94 3,22 8,03 0,24

0

200

400

600

800

1000

1200

1400

1600

1800

(1) OOfpc (2) OOfpl (3) OOfcd (4) OOfrc (5) OOfd (6) OOfdu (7) OOfgr

de

Oco

rrê

nci

as

Variáveis

Critério 1 - OOf - Desenvovimento da

Posse de Bola

Total

%

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 100 100

interiores. Muitas das acções de condução por parte dos defesas centrais eram precedidas de

passe curto em profundidade para os pontas-de-lança e, por outro lado, em profundidade para

os médios interiores.

No que concerne ao médio defensivo e médios interiores, as acções técnicas por estes

desenvolvidas assentaram no passe curto e drible. Relativamente ao passe curto, o médio

defensivo alternava em o passe em segurança para os defesas laterais e o passe em

profundidade para os pontas-de-lança. No que toca ao drible, este era realizado

preferencialmente pelos médios interiores no meio-campo ofensivo, mais precisamente nos

corredores laterais.

Centrando a nossa atenção nas posições específicas mais avançadas do Sporting, ou

seja, pontas-de-lança, podemos verificar que as acções mais efectuadas pelos mesmos foram os

passes curtos e os dribles. Os passes curtos em amplitude e profundidade eram

preferencialmente executados de avançado para avançado enquanto os passes curtos em

segurança e amplitude eram direccionados para o médio defensivo e médios interiores.

Numa primeira instância, ao reportarmo-nos aos princípios de jogo manifestados por

Paulo Bento, podemos indicar que os 0% de risco nas primeira e segunda fases de construção

como também, os 100% de risco nas fases de criação e finalização se verificam através da

análise dos valores obtidos na Figura 7, ou seja, zonas de perda da posse de bola. Analisando a

Figura, verifica-se que no meio-campo defensivo (sector defensivo + sector médio-defensivo) a

percentagem de perdas da posse de bola se centra nos 18,54% enquanto no meio-campo

ofensivo (sector médio-ofensivo + sector ofensivo), a percentagem de perdas encontra-se nos

81,46%.

Por intermédio destes dados podemos concluir que o Sporting é uma equipa que arrisca

pouco no seu meio-campo defensivo, privilegiando a segurança na execução dos passes, não

arriscando nos confrontos do um contra um e erra poucos passes. A partir do momento em que

entra no meio-campo ofensivo, existe a autorização para que a equipa possa arrisca, ser mais

criativa, desenvolvendo o seu jogo com maior tranquilidade, isto é, o importante é chegar com

segurança ao meio-campo ofensivo.

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

Figura 7.

Numa segunda instância, o treinador privilegia que os seus defesas centrais manifestem

dois tipos de comportamentos no início da sua Organização Ofensiva, ou seja, que coloquem a

bola a 30/40 metros nas zonas onde pretende sair a

pelo corredor central como forma de atraírem os adversários para executarem passes em

profundidade, libertando a bola para jogadores em posições mais avançadas e favoráveis.

Tendo em conta os princípios supracitados,

centrais do Sporting privilegiavam os passes longos em profundidade/amplitude para o médio

interior direito – Pereirinha ou Yannick Djaló

mesma para os pontas-de-lança

joga na posição 10 (médio ofensivo)

passes curtos em amplitude.

Como terceira e última instância, ao incidirmos o nosso foco de atenção

defensivo, podemos salientar que o treinador não pretende que haja

da bola pelos quatro defesas aquando da primeira e segunda fases da Organização Ofensiva.

Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do

Figura 7. Zonas de Perda da Posse de Bola

Numa segunda instância, o treinador privilegia que os seus defesas centrais manifestem

dois tipos de comportamentos no início da sua Organização Ofensiva, ou seja, que coloquem a

bola a 30/40 metros nas zonas onde pretende sair a jogar como também, saiam em condução

pelo corredor central como forma de atraírem os adversários para executarem passes em

profundidade, libertando a bola para jogadores em posições mais avançadas e favoráveis.

Tendo em conta os princípios supracitados, foi possível constatar que os defesas

centrais do Sporting privilegiavam os passes longos em profundidade/amplitude para o médio

Pereirinha ou Yannick Djaló – como também, a condução de bola para liberta

lança e estes comunicarem com os médios interiores e jogador que

joga na posição 10 (médio ofensivo) ou conduzirem para libertarem nos médios interiores com

Como terceira e última instância, ao incidirmos o nosso foco de atenção

defensivo, podemos salientar que o treinador não pretende que haja mais do que uma

da bola pelos quatro defesas aquando da primeira e segunda fases da Organização Ofensiva.

Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do

Numa segunda instância, o treinador privilegia que os seus defesas centrais manifestem

dois tipos de comportamentos no início da sua Organização Ofensiva, ou seja, que coloquem a

jogar como também, saiam em condução

pelo corredor central como forma de atraírem os adversários para executarem passes em

profundidade, libertando a bola para jogadores em posições mais avançadas e favoráveis.

foi possível constatar que os defesas

centrais do Sporting privilegiavam os passes longos em profundidade/amplitude para o médio

como também, a condução de bola para libertar a

e estes comunicarem com os médios interiores e jogador que

ou conduzirem para libertarem nos médios interiores com

Como terceira e última instância, ao incidirmos o nosso foco de atenção no quarteto

mais do que uma rotação

da bola pelos quatro defesas aquando da primeira e segunda fases da Organização Ofensiva.

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

Relativamente a este facto, verificámos que nos oito jogos analisados não houve qualquer tipo

de ocorrência relativa a este princípio, sendo que ao existir a respectiva circulação de bola, tanto

os laterais como os centrais dão continuidade ao jogo por intermédio das acções supracitadas.

Dando continuidade à análise da Organização Ofensiva e antes de caracterizar o final da

mesma, há que identificar que tipo(s) de Método(s) de Jogo Ofensivo é que a equipa do Sporting

utiliza e com qual dos métodos atinge maior sucesso. A partir dos dados presentes na

Figura 8. Métodos de Jogo Ofensivo

Figura 8, pode constatar-se que 54,06% (193 ataques posicionais) dos ataques realizados pela

equipa são ataques posicionais, 38,10% (136 ataques rápidos) são ataques rápidos e 7,84% (28

contra-ataques) são contra-ataques. Segundo estes dados verificámos que mais de metade dos

ataques realizados pelo Sporting, possuem como método de jogo ofensivo o ataque posicional,

sendo um indicador da superioridade exercida e assumida pela equipa aquando da sua

abordagem ao jogo, contribuindo para uma das características manifestadas pelo treinador, ou

seja, uma equipa com iniciativa.

Por outro lado e associado ao método de jogo ofensivo, revela-se de tamanha

importância verificar através de que método é que o Sporting obtêm maior percentagem de êxito

no desenvolvimento do seu jogo ofensivo.

Através da Figura 9, pode afirmar-se que dos 15 golos marcados pela equipa, após os

oito jogos realizados, concluímos que 53,33% (8 golos) foram obtidos por ataque rápido, 20% (3

28

136

193

7,84

38,1054,06

0

50

100

150

200

250

(8) OOfca (9) OOfar (10) OOfap

de

Oco

rrê

nci

as

Variáveis

Método de Jogo Ofensivo - MJO

Total

%

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

golos) por ataque posicional e com a mesma percentagem por execução de bolas paradas,

culminando 6,67% (1 golo) através de contra-ataque.

Figura 9. Golos Obtidos e respectivos Métodos de Jogo Ofensivo

Ao cruzarmos os dados, afirmámos que a equipa do Sporting dá primazia ao método de

jogo ofensivo ataque posicional mas obtém mais êxito na execução da sua Organização

Ofensiva por intermédio do método de jogo ofensivo ataque rápido.

Debruçando-nos agora sobre o modo com a Organização Ofensiva é concluída – com

eficácia ou sem eficácia –, passaremos à execução da mesma verificando, em primeiro lugar, o

Final da Organização Ofensiva com Eficácia.

1

8

3 36,67

53,33

20,00 20,00

0

10

20

30

40

50

60

Em Contra-

Ataque

Em Ataque

Rápido

Em Ataque

Posicional

De Bola Parada

de

Go

los

Método de Jogo Ofensivo

Golos Obtidos

Total

%

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

Figura 10. Final da Organização Ofensiva com Eficácia

Antes de nos centrarmos propriamente sobre o modo mais eficaz de concluir a

Organização Ofensiva, convém salientar que o Sporting manifestou ser uma equipa que atinge o

terço ofensivo com aparente facilidade tendo a bola controlada. É-nos possível percepcionar tal

comportamento através do total de ocorrências realizadas, ou seja, 426 vezes que a equipa em

questão atingiu o terço ofensivo em oito jogos. Corroborando com este dado, encontra-se a

média de ocorrências executadas por jogo, isto é, 53,25 significa o número de ocorrências por

jogo em que o Sporting atingiu o terço ofensivo com a bola controlada como também, as zonas

em que se processou a perda da posse de bola (Figura 7). Ou seja, 81,46% das perdas da

posse de bola foram operadas no meio-campo ofensivo.

No que respeita à conclusão com êxito da Organização Ofensiva, salientámos que ao

cruzarmos os dados relativos aos remates fora mais os remates contra-adversário com os dados

dos remates dentro mais obtenção de golo, obtemos as respectivas percentagens na ordem dos

52,38% para os primeiros e 47,62% para os segundos. Assim, mais de 50% dos remates não

atingem o espaço da baliza propriamente dito, enquanto 48% dos mesmos atingem, revelando

que em cada 10 remates realizados, 7 dos mesmos atingiram o espaço demarcado pela baliza

e/ou foram golo (Figura 11).

54 4512 15

426

42,86 35,71 9,52 11,900

100

200

300

400

500

(11) FOOfefrf (12) FOOfefrd (13)

FOOfefrad

(14) FOOfefgl (15) FOOfefof Nº

de

Oco

rrê

nci

as

Variáveis

Critério 2.1 - FOOfef - Final da

Organização Ofensiva com Eficácia

Total

%

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

Figura 11. Relação entre os Remates Fora mais os Remates Contra-adversário versus os

Remates Dentro mais os Remates com obtenção de Golo

Como último ponto de análise desta Figura, podemos salientar que nos oito jogos

realizados, em três jornadas houve mais remates fora/contra-adversário, noutras três inverteram-

se os papéis, existindo três em que houve mais remates dentro/golo, enquanto em duas das oito

jornadas, se verificaram o mesmo número de remates fora/contra-adversário e número de

remates dentro/golo.

Por outro lado e no que concerne ao final da Organização Ofensiva sem eficácia, foi-nos

dado a perceber que em 352 ocorrências, 143 (40,63%) foram efectuadas por intermédio de

recuperação do adversário, corte após cruzamento, passe curto ou passe longo, 55 (15,63%)

delas processaram-se por recuperação de bola por parte do guarda-redes após cruzamento,

passes curto ou longo interceptados, 124 (35,23%) por lançamento fora após cruzamento longo

para fora do terreno de jogo, mau passe por parte da equipa em observação e intercepção do

adversário colocando a bola fora e, por último, 30 dos quais (8,52%) foram efectuadas por

infracção/falta da equipa do Sporting sobre o adversário aquando da Organização Ofensiva da

primeira (Figura 12).

6

109

10

7

13

3

8

2

8

12

10

7

11

4

6

0

2

4

6

8

10

12

14

23 24 25 26 27 28 29 30

de

Oco

rrê

nci

as

Jornadas

Relação entre Remates Fora+Contra-

Adversário/Remates Dentro+Golo

(11) FOOfefrf + (12)

FOOfefrd

(13) FOOfefrad + (14)

FOOfefgl

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

Figura 12. Final da Organização Ofensiva sem Eficácia

Relativamente à Figura 11, há ainda a destacar o facto de o Sporting ser uma equipa

pouco faltosa aquando do seu momento de criação e finalização do processo ofensivo, uma vez

que em 352 acções, só efectuaram 30 faltas sendo a média por jogo de 3,75 faltas.

Direccionando o nosso olhar para outro momento de jogo, isto é, o Momento de

Transição Estado Ataque-Defesa, vamos incidir, em primeiro lugar, a nossa atenção sobre as

zonas onde ocorrem com maior frequência as perdas da posse de bola comparando com as

zonas onde se dá o maior número de recuperações. Em segundo lugar, analisaremos qual dos

dois princípios de jogo definidos pelo treinador para este momento, é o mais utilizado, segundo a

ordem hierárquica estipulada para os mesmos. E por último, a relação entre a densidade de

jogadores na zona de perda e na zona de pressão.

143

55

124

3040,63

15,63

35,23

8,52

0

20

40

60

80

100

120

140

160

(16)

FOOfsefbad

(17)

FOOfsefgrad

(18) FOOfseff (19) FOOfsefi

de

Oco

rrê

nci

as

Variáveis

Critério 2.2 - FOOfsef - Final da

Organização Ofensiva sem Eficácia

Total

%

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

Figura 13.

Figura 14.

No que respeita ao prim

constatar que 81,46% das perdas da posse de bola registadas pela equipa observada se

processam nos sectores médio-

Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do

Figura 13. Zonas de Perda da Posse de Bola

Zonas de Recuperação da Posse de Bola

No que respeita ao primeiro ponto de análise e observando o Figura 13

constatar que 81,46% das perdas da posse de bola registadas pela equipa observada se

-ofensivo e ofensivo (meio-campo ofensivo). Da percentagem

Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do

Figura 13, podemos

constatar que 81,46% das perdas da posse de bola registadas pela equipa observada se

campo ofensivo). Da percentagem

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 108 108

acima mencionada, retiram-se outros dados importantes relativos às zonas onde ocorrem essas

perdas com maior frequência. Tendo em conta este ponto, verificámos que o Sporting é uma

equipa que perde maior parte das suas posses de bola no sector médio-ofensivo, uma vez que

as zonas 7, 8 e 9, registam 16,7%, 18,56% e 14,77% da perdas respectivamente.

Contudo, a zona 11, parte integrante do sector ofensivo, regista uma grande

percentagem de perdas com 12,5% da totalidade, manifestando-se como uma zona de grande

acesso por parte da equipa observada.

Não deixando de ter em conta os dados anteriores, revela-se crucial cruzar os dados das

zonas de perda de posse de bola com as zonas de recuperação da mesma, pelo facto dessa

relação nos poder elucidar sobre qual dos princípios de jogo do Momento de Transição Ataque-

Defesa recai a primazia. Assim e analisando o Figura 14, verificámos que 78,43% das

recuperações da posse de bola se processam nos sectores defensivo e meio-campo defensivo

(meio-campo defensivo).

Ao aprofundarmos mais esta questão, é-nos dado a perceber que as zonas 4, 5 e 6 são

as zonas com maior frequência de recuperação da posse de bola, uma vez que 14,86%, 18,37%

e 11,66% correspondem, respectivamente, às zonas mencionadas.

No entanto, a zona 2, parte integrante do sector defensivo, regista uma grande

percentagem de recuperações com 16,32% da totalidade, sendo que essas mesmas

recuperações se processaram através de “alívios” defensivos por parte da equipa adversária, por

passes longos e cruzamentos interceptados pelo guarda-redes da equipa em observação.

Cruzando os dados relativos às zonas de perda e zonas de recuperação, é-nos dado a

perceber que ambas são contíguas, uma vez que a maior frequência de perdas se dá no sector

médio-ofensivo (zonas 7, 8 e 9) e o maior frequência de recuperações no sector médio-defensivo

(zonas 4, 5 e 6), ou seja, estes dados manifestam que a equipa do Sporting mal perde a posse

da bola, procura a recuperação imediata da mesma, acabando por ser eficaz na sua execução

pelo facto das zonas de recuperação serem contíguas às de perda e apresentarem valores

percentuais muito semelhantes.

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

Corroborando com este facto, encontra-se a relação entre a pressão imediata (1º

momento de transição ataque-defesa) e a temporização (2º momento de transição ataque-

defesa). Centrando a nossa atenção no Figura 15, compreendemos que é dada primazia ao

primeiro momento de Transição Ataque-Defesa – 189 ocorrências (80,08%) – em detrimento do

Figura 15. Relação entre a Pressão Imediata e a Temporização

segundo momento – 47 ocorrências (19,92%).

Deste modo e conjugando os dados relativos à análise das zonas de perda e de

recuperação da posse de bola com a primazia dada ao primeiro momento de Transição Ataque-

Defesa, podemos concluir que o Sporting revela ser uma equipa que mal perde a posse da bola,

procura recuperá-la rapidamente, exercendo pressão imediata sobre os adversários e caso não

consiga recuperar a bola de imediato, procura temporizar as acções dos últimos como forma de

se auto-reorganizar.

Ainda relacionado com este momento do jogo, também nos assolou ser importante

relacionar o número de jogadores na zona de perda com o número de jogadores na zona de

pressão.

189

47

80,08

19,92

0

50

100

150

200

(21) ITEADime (24) ITEADtemp

de

Oco

rrê

nci

as

Variáveis

Critério 3 - Pressão Imediata vs

Temporização

Total

%

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

Figura 16. Número de Jogadores na Zona de Perda da Posse de Bola

Figura 17. Número de Jogadores na Zona de Pressão sobre a bola

De acordo com esta questão e segundo o Figura 16, verificámos que o número de

jogadores que se encontram na zona de perda de posse de bola se centra no valor numérico 3

(108 presenças – 41,54%), enquanto os valores que se seguem se centram nos 2 jogadores (81

presenças – 35,15%) e 4 jogadores (37 presenças – 14,23%).

46

86

103

10 0

18,78

35,10 42,04

4,08 0,000

20

40

60

80

100

120

0 1 2 3 4

de

Pa

rtic

ipa

çõe

s

Nº de Jogadores

Critério 3 - ITEAD nº de jogadores em

Pressão

Total

%

23

81

108

37

118,85

31,1541,54

14,234,23

0

20

40

60

80

100

120

1 2 3 4 5

N º

de

Pa

rtu

cpa

çõe

s

Nº de Jogadores

Critério 3 - ITEAD nº de jogadores na

Perda da Posse de Bola

Total

%

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 111 111

Já no que respeita ao Figura 17 e analisando o mesmo por ordem decrescente,

constatámos que o número de jogadores na zona de pressão se centra 2 jogadores (103

participações – 42,04%), 1 jogador (86 participações – 35,10%) e 0 jogadores (46 participações

– 18,78%), tendo em conta que este último dado se manifestou em situações que os jogadores

da equipa adversária recuperavam a bola após errado, estando esses jogadores no seu sector

defensivo (meio-campo defensivo), ou seja, no último quarto de campo do Sporting.

Ao cruzarmos os dados, por cada 3 jogadores (108 presenças – 41,54%) que se

encontram na zona de perda de posse de bola, 2 desses 3 jogadores (103 participações –

42,04%) executam pressão imediata na respectiva zona de perda. Enquanto por cada dois

jogadores (81 presenças – 35,15%), 1 desses 2 jogadores (86 participações – 35,10%) executa

pressão imediata.

Como ponto conclusivo no que concerne ao Momento de Transição Ataque-Defesa e

tendo em conta os princípios preconizados pelo treinador para o mesmo, podemos dizer que o

Sporting é uma equipa que procura recuperar a bola rapidamente, exercendo pressão imediata

sobre os adversários, tendo praticamente 3 ou 2 jogadores na zona de perda da posse de bola,

repercutindo-se a acção de pressão imediata na zona de perda por 2 ou 1 jogadores,

respectivamente.

Pela sequência lógica apresentada relativamente aos Momentos de Jogo, enveredámos

agora pela Organização Defensiva, analisando se a Equipa do Sporting defende

deliberadamente com 9 jogadores, deixando, em grande parte do tempo em que estão inseridos

neste momento, 2 jogadores posicionados intencionalmente para o início do Momento de

Transição Defesa-Ataque, revelando a interdependência do acto de defender e o de atacar,

sendo esses dois jogadores os pontas-de-lança.

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

Figura 18. Número de Jogadores deliberadamente em Organização Defensiva

Por intermédio do Figura 18, podemos constatar que o princípio defendido e treinado

pelo treinador do Sporting se manifesta perfeitamente, uma vez que dos 174 Momentos de

Organização Defensiva registados, 129 dos mesmos (74,14%) ocorreram com os 2 pontas-de-

lança em posição manifesta de poderem dar continuidade à recuperação da posse de bola,

podendo operar-se à Transição Defesa-Ataque, ou seja, a Equipa do Sporting defende no 1-4-4-

(+2).

Incidindo a nossa atenção sobre o Momento de Transição Defesa-Ataque e atendendo

ao que o Figura 19 nos demonstra, é-nos dado a perceber que 68,82% (234 ocorrências) das

recuperações de bola foram efectuadas através de intercepções, 20,88% (71 ocorrências) por

desarme e 10,29% (35 ocorrências) por intercepção de bola através do guarda-redes. Tendo em

conta estes dados e as zonas de maior frequência de recuperação da posse de bola – zonas 4, 5

e 6 (Sector médio-defensivo) –, podemos concluir que o meio mais utilizado para recuperação da

bola se processa por intermédio das intercepções.

1

29

129

15

0,5716,67

74,14

8,62

0

20

40

60

80

100

120

140

7 8 9 10

de

Pa

rtic

ipa

çõe

s

Nº de Jogadores

Critério 4 – OD – Desenvolvimento da

Organização Defensiva

Total

%

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

Figura 19. Meios utilizados para o Início da Transição Defesa-Ataque / Recuperação da

Posse de Bola

Por outro lado e segundo as 340 recuperações da posse de bola (somatório das

variáveis 27 ITEDAi, 28 ITEDAd e 29 ITEDAgr), podemos verificar que 240 das quais foram

precedidas de passe, enquanto 100 não foram. Assim, concluímos que 70,59% das

recuperações da posse de bola efectuadas, foram precedidas de passe, advindas de um grande

número intercepções, alguns desarmes e poucas intercepções por parte do guarda-redes.

De acordo com os dados anteriores e relacionando-os com o desenvolvimento da

Transição Defesa-Ataque (Figura 20), verificámos que 63,99% foram executados em passe

(passes curtos – 165 / 49,11%; passes longos – 50 / 14,88%), existindo um desfasamento de

6,6% entre a transição efectuada por passe e o número de passes (curtos e longos) no

desenvolvimento da Transição Defesa-Ataque (30 ITEDAp relativamente a 31 DTEDApc e 32

DTEDApl), sendo que esse valor se deve ao número ocorrências tanto no critério 5 como no

critério 6, serem ligeiramente diferentes.

Contudo, este desfasamento não faz com os valores devam ser preservados, uma vez

que estão relacionados.

234

7135

240

68,82

20,88 10,290

50

100

150

200

250

300

(27) ITEDAi (28) ITEDAd (29) ITEDAgr (30) ITEDAp

de

Oco

rrê

nci

as

Variáveis

Critério 5 - ITEDA - Início da Transição-

Estado Defesa-Ataque / Recuperação da

Posse de Bola

Total

%

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

Figura 20. Meios utilizados para o Desenvolvimento da Transição Defesa-Ataque

No entanto, das 100 ocorrências que não foram precedidas de passe, 21,43% tiveram

como principal acção a condução de bola (72 ocorrências), tendo como acções secundárias, o

duelo (15 ocorrências – 4,46%), drible (14 ocorrências – 4,17%), recepção/controlo de bola (10

ocorrências – 2,98%) e acção do guarda-redes (10 ocorrências – 2,98%).

Por intermédio destes dados e conjugando-os com as zonas de recuperação da posse

de bola, com a primazia atribuída e operada pela equipa no que corresponde ao primeiro

momento de Transição Ataque-Defesa, ou seja, pressão imediata para recuperação rápida da

posse de bola, com o número de jogadores na zona de perda e em pressão imediata, podemos

dizer que a equipa do Sporting privilegia o desenvolvimento do momento supracitado por passe

curto (Figura 20), ou seja, jogo apoiado utilizando tanto o princípio de acção de sair pelo mesmo

corredor onde recuperou a bola como também, tirando a bola da zona de pressão pelo médio

defensivo. Por outro lado, em caso de inexistência de pressão ou espaço livre para progressão

ou transporte de bola, o Sporting utiliza com segundo meio mais frequente de desenvolvimento

da Transição Defesa-Ataque, a condução de bola (Figura 20), maioritariamente efectuada pelos

seus médios interiores.

Como ponto conclusivo deste momento de jogo, verificámos que a Equipa Observada

utiliza como terceiro meio mais frequente o passe longo (Figura 20), constatando-se que o

165

5072

10 14 15 10

49,11

14,88 21,432,98 4,17 4,46 2,98

0

50

100

150

200

(31)

DTEDApc

(32)

DTEDApl

(33)

DTEDAcd

(34)

DTEDArc

(35)

DTEDAd

(36)

DTEDAdu

(37)

DTEDAgr

de

Oco

rrê

nci

as

Variáveis

Critério 6 – DTEDA – Desenvolvimento da

Transição-Estado Defesa-Ataque

Total

%

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 115 115

princípio de acção na procura dos pontas-de-lança através do passe longo em profundidade, não

foi o meio mais utilizado ao longo dos oito jogos observados.

Após a análise e discussão dos quatro momentos de jogo da equipa observada,

utilizando as ideias expressas pelo treinador na entrevista realizada relativamente ao que

contempla o seu Modelo nos quatros momentos de jogo, tendo em conta os comportamentos

manifestados pela sua equipa e devidamente analisados por nós, podemos concluir que existe

uma enorme relação e congruência entre o pretendido pelo treinador e o ocorrido aquando da

competição. Como forma de podermos elucidar esta afirmação, podemos dizer que a equipa do

Sporting Clube de Portugal, Época 2008/2009, se caracteriza por ser uma equipa que privilegia a

posse de bola, estando grande parte do tempo de jogo no Momento de Organização Ofensiva,

exponenciando um dos seus grandes princípios, ou seja, a iniciativa (ataque posicional). Para

que tal possa acontecer, deve ser uma equipa que tem de possuir uma elevada concentração

defensiva e que “saiba onde quer pressionar, quando quer pressionar e como quer pressionar”,

tendo no primeiro momento de transição, um dos pontos mais fortes da sua organização, de

forma a manter a iniciativa de jogo. Ou seja, perder a posse de bola e recuperá-la de imediato,

manifestando-se na construção do processo ofensivo, a criatividade, a segurança e o equilíbrio

(Paulo Bento, Anexo 1, págs. IX, X, XI e XV).

4.1.3. Organização posta em prática

Transformar a visão em acção, faz com que os treinadores aproveitem todas as

oportunidades para mostrar em que consiste a visão, quais os sentimentos que esta provoca e

como é que os jogadores podem vivê-la tanto hoje como no futuro. Utilizam-se a si próprios

como instrumentos de descoberta e de mudança, mantêm-se relações de proximidade com o

processo e não afrouxam os esforços antes de atingirem os objectivos. Idealmente, em todas as

interacções e em todas as decisões, os treinadores actuam de forma coerente com os seus

próprios princípios, valores, referências e com os valores da organização que pretendem criar.

Para tal, apelam aos jogadores para que vivam de acordo com os seus próprios valores

e com a missão da organização, transformando as estruturas organizacionais e as funções da

equipa, mudando as normas de relacionamento, remodelando os sistemas e as expectativas de

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 116 116

desempenho de acordo com a visão e fazem com que as tarefas que os jogadores executam se

ajustem melhor à missão da organização (Goleman et al., 2002).

Assim, as organizações pretendem que a mesma seja constituída por elementos

impulsionadores da organização e capazes de dotá-la da inteligência, do talento e da

aprendizagem indispensáveis à sua constante renovação e competitividade num mundo pleno de

mudanças e desafios (Chiavenato, 2000:21). Ou seja, pretendem-se que a organização possua

pessoas com capacidade de impulso próprio, que invistam na organização por intermédio do seu

esforço, dedicação, responsabilidade, comprometimento, entre outras, havendo retorno através

do sucesso colectivo das organizações.

Para que tudo isto possa ser viável, é imperial que a organização possua um líder – o

treinador – que albergue dentro da sua cabeça um modelo mental do mundo, fazendo com que o

mesmo possa afigurar-se mais pertinente através da “sua adequação à personalidade do

treinador e dos jogadores, bem como à cultura específica do clube onde o trabalho se

desenvolve” (Garganta, 2004).

Depois da abordagem ao Modelo de Jogo, passando pelo sistema de jogo e constituição

de novas ordens, culminando na importância que os jogadores possuem no reconhecimento e

identificação com o Modelo e a sua evolução dentro do mesmo, revela-se crucial verificar como é

que tudo isto se processa. Para tal, nada melhor do que caracterizarmos os promotores de

tamanha complexidade, ou seja, a Equipa Técnica, verificando o modo como desenvolvem toda

a construção da equipa.

Por intermédio da entrevista realizada a Paulo Bento (Anexo 1, pág. XXIII e XXIV)

verificámos que o treinador destaca a organização e a solidariedade como características

fundamentais para a execução do trabalho da sua equipa técnica. No que concerne à

organização, o treinador salienta a sua importância “para que cada um saiba o que tem de fazer,

o que cada um leva para o treino”, de modo a que possa existir dinâmica no desenvovlimento da

operacionalização no treino. “A dinâmica da equipa técnica está dentro da organização da

equipa técnica, ou seja, daí dizer o que é que vais fazer para o campo, o que é que vais fazer na

primeira fase do treino, na segunda fase do treino, quem o faz, como é que faz…”, existindo

sincronismo e conexionismo entre todos os elementos da mesma, sendo algo simultaneamente

tão concreto pois é orientador e permite determinar a direcção e o sentido em que se pretende ir.

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4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 117 117

Como o futuro é sempre o elemento estruturante do processo, esta união de esforços

entre todos os elementos da equipa técnica, permite que todos o projectem “mais à frente”, tendo

no momento da operacionalização, de saber aquilo que se pretende para verificar se tudo está a

decorrer exactamente conforme planeado e nesse sentido, o feedback deve ser o mais

congruente possível. Tudo isto tendo o Modelo de Jogo como “pano de fundo”.

Quanto à solidariedade, o treinador exacerba que esta não se cinge somente aos

resultados. Por outro lado, esta possui maior relevância no que toca à “forma como partilhas as

coisas, como fazes as coisas em equipa. Se no campo queres que cada um saiba o que tem de

fazer e se aquele que vai executar uma tarefa, os outros sabem e estão preparados para o fazer,

tens de, em primeiro lugar, na preparação, dar oportunidade que todos possam contribuir para

isso, falar, colocar, até que chegamos a um consenso final. Depois a decisão é mais solitária, é

individual mas a partilha, tens de saber fazê-la” (Anexo 1, pág. XXIV).

A par disto, é inegável a influência que toda a Equipa Técnica exerce sobre as atitudes e

comportamentos, sobre os princípios, valores, orientações e o sentido que vai ser atribuído a

tudo o que os jogadores vão executar em compreensão. Nenhum treinador é igual, como tal o

modelo que transporta para os contextos de treino e competição, possuem a sua impressão

digital (Campos, 2007), a qual é construída em profunda comunicação, interacção, compreensão

e solidariedade como todos os elementos dessa equipa. Assim, treinar é modelar através de um

projecto (Marina, 1995), ou seja, “para o treino ser treino, e não apenas exercitação, impõe-se

uma carta de intenções, um caderno de compromissos que funcione como representação dos

aspectos” (Garganta, 2000), sendo que a interligação dos mesmos, conferem sentido ao

processo, rumando intencionalmente na direcção objectivada não só pelo treinador mas,

principalmente, pelo trabalho desenvolvido por toda a equipa.

Deste modo, Paulo Bento (Anexo 1, págs. II e VI) destaca a existência do “modelo de

jogo para este trabalho que queremos desenvolver, para esta equipa que nós treinamos, para

este clube onde nós estamos”, sendo que no caso concreto do Sporting, “está identificado.” Uma

vez que o Modelo de Jogo está identificado, o mesmo impõe que se criem padrões de conexões

alicerçados às ideias, visão, filosofia e comportamentos que o mesmo sustenta e estabiliza.

Segundo Andrew Coward (1990, in Jensen, 2002), afirma que o cérebro forma

rapidamente hierarquias para extrair ou criar padrões. Os padrões dão à informação um

contexto. De outra forma, esta seria rejeitada por ser considerada desprovida de sentido. Isto é

muito relevante e deve ser utilizado como uma informação teórica para a construção do Modelo

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 118 118

de Jogo. Ou seja, para que a construção e aplicação do Modelo se processem, existe a

necessidade de se realizar uma nova identificação ou reidentificação com o Modelo, utilizando

um suporte teórico como auxiliar.

Assim, Paulo Bento (Anexo 1, pág. VIII) menciona que os jogadores que transitam da

época anterior para a nova época, não necessitam “de ouvir essa mesma informação teórica

porque não há alterações, pelo menos numa fase inicial”, daí lhe ter atribuido a designação de

reidentificação. Enquanto que para os novos jogadores que chegam ao Clube, o procedimento

que é utilizado centra-se na apresentação dessa mesma informação teórica, executando-se uma

nova identificação por parte dos novos elementos para com o Modelo.

Porém, quando há a necessidade de haver a “introdução de um novo sistema de jogo,

dentro do nosso modelo, ou o sistema alternativo para o nosso modelo de jogo, fazê-lo como

fazemos no início da temporada, ou seja, com todos e sob o ponto de vista teórico também.”

Podemos depreender que o plano relacionado com uma identificação mais teórica sobre aquilo

que se pretende no plano da interacção prática reveste-se de alguma importância, e como tal,

Guilherme Oliveira (2007) salienta que “aquilo que eu faço é apresentar os comportamentos de

uma forma verbal e de uma forma visual para eles terem uma noção muito exacta daquilo que eu

quero que eles depois façam, pois embora eu pretenda que os comportamentos se transformem

em hábitos, também pretendo que, antes de se transformarem em hábito, eles percebem aquilo

que estão a fazer, para actuarem no Jogo em função das necessidades que o próprio Jogo pede

mas sempre dentro de padrões comportamentais que nós acharmos que são os ideais para a

nossa equipa. Por isso é extremamente importante nós explicarmos bem aquilo que queremos

para eles perceberem e a visualização de vídeos com esse tipo de comportamentos é

fundamental para essa mesma compreensão.”

Dando continuidade à ideia supracitada pelo autor Andrew Coward, o nosso cérebro na

realidade funciona por padrões e é o modo dele trabalhar de forma mais adaptativa (por isso são

abertos), eficaz e eficiente. Se assim é, o treino de uma determinada forma de jogar tem de os

fazer emergir. É uma questão biológica. Eles fazem parte da maneira como o cérebro consegue

evoluir e incorporar o meio ambiente que o rodeia. Por isso mesmo, temos de os criar através de

um processo de treino que não retire a importância a nenhuma dimensão, mas que as

superlative todas sobre o signo da Especificidade. Temos de construir de forma muito coerente e

concreta a forma como pretendemos que a equipa jogue e depois todo o treino deve ser nesse

sentido.

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 119 119

Para além disso, a construção de padrões começa a um nível microscópico, nos

neurónios. Eles não conseguem aprender de forma individual, apenas em grupo e são estas

redes de neurónios que conseguem reconhecer e responder à aprendizagem significativa, de

forma inter-independente. Da mesma forma que isto ocorre com cada um, numa óptica mais

abrangente, considerando o que a equipa realiza, as relações decorrem de interacções, ou seja,

cada um age de forma individual mas quando o faz importa que actue segundo princípios

colectivos que fazem com que tenha de interagir de acordo com um projecto comum.

Por tudo isto, podemos dizer que o estabelecimento de conexões (pertinência -

familiarização com o Modelo de Jogo) e a localização de redes neuronais adaptativas

(construção de padrões - no treino sob o registo da emoção) são factores críticos na formação

de significados intrínsecos. A par desta ideia, Paulo Bento (Anexo 1, pág. VI) operacionaliza o

seu Modelo de Jogo através da execução de exercícios segundo o que foi apresentado e

defendido sob o ponto de vista teórico, permitindo que os jogadores reconheçam equivalência e

sustentabilidade na prática. “Quando lhes apresentamos aquilo que em cada momento do jogo, é

o nosso objectivo para o nosso modelo de jogo, levamo-lo depois para o campo, para que os

jogadores pratiquem aquilo que nós também teorizamos com eles. Isto é, fazer os exercícios na

zona onde queremos que eles ocorram, fazê-lo da maneira que queremos que em termos

mentais ocorram no jogo. Por isso, no fundo é passar da informação que lhes damos em relação

aquilo que queremos em cada momento (do jogo), passá-lo para a prática.”

A partir das ideias mencionadas anteriormente, evidenciam-se dois conceitos muito

importantes na construção e aplicação do Modelo de Jogo ao longo do seu desenvolvimento

processual, isto é, identificação e reentrada da informação teórica relacionada com a execução

prática e a repetição sistemática. No que concerne à relação teórico-prática que o Modelo de

Jogo encerra, Gerald Edelman (2008:11) destaca o conceito de reentrada como chave da

coerência do processo através do exemplo manifestado entre duas cartas em resposta a

estímulos diferentes, mas correlacionadas e conectadas por fibras reentrantes. Se, ao longo do

tempo, os grupos neuronais representados por esferas, no mapa 1, forem frequentemente

activadas de forma simultânea com aqueles representados por cubos, no mapa 2, as suas

ligações serão reforçadas. Como tal, as respostas dos dois cartões serão ligadas entre si,

reforçando-se as ligações entre os dois estímulos percebidos no mundo exterior (Figura 21).

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

Figura 21. A reentrada da informação como chave da coerência (Edelman, 2008, LES

DOSSIERS DE La Recherche)

Pelo indicador supracitado, podemos percepcionar o facto da “paisagem mental” ter de

nascer primeiro na cabeça dos jogadores (Frade, 2003), para que os mesmos possam acreditar

numa lógica de funcionamento dos comportamentos individuais e colectivos, isto é, “o jogador só

consegue fazer determinado comportamento bem se primeiro o compreender e depois, se achar

que realmente esse comportamento é benéfico, tanto para a equipa como para ele” (Guilherme

Oliveira, 2006). Em similitude com os autores anteriores, Paulo Bento (Anexo 1, pág. VI e VII)

exacerba que “a sua construção e a sua aplicação tenham sempre uma relação muito grande

entre aquilo que se transmite e aquilo que se faz porque se transmitirmos uma coisa e formos

fazer outra, o jogador aí não tem capacidade nem vê credibilidade naquilo que se faz.”

Relativamente ao segundo conceito, repetição sistemática, esta emana da tremenda

importância do treinar em especificidade, tendo na repetição sistemática o suporte à viabilidade

da aquisição dos seus princípios de jogo, permitindo-lhe promover o aparecimento, no cerne do

meio colectivo que é a Equipa, das “intenções em acto em conformidade com as intenções

prévias”, no sentido de diminuir a discrepância entre ambas (Oliveira et al., 2006:201).

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4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 121 121

De acordo com o pensamento lógico, coerente e estruturado manifestado pelo

entrevistado, podemos destacar que da identificação total do Modelo de Jogo por parte do

treinador e da equipa, à transmissão teórica dos fundamentos de jogo na vertente teórica, tendo

reconhecimento dos mesmos na execução em compreensão por intermédio da reentrada da

informação teórica pela acção contextual executada em treino, auxiliada pela repetição

sistemática em especificidade, deslocamo-nos para o potenciar do Modelo de Jogo no seu

habitat natural, no terreno de jogo.

Para que o desenvolvimento de um «jogar» específico se dê em direcção a um futuro

presente com um fim inalcançável, Paulo Bento potencia, desenvolve e faz com que o seu

processo de jogo evolua através de novos exercícios e do confronto entre os seus sistemas de

jogo, de modo a que a Equipa seja sujeita a índices de dificuldade superiores.

De forma a que tal se manifeste, Paulo Bento destaca que utiliza “novos exercícios para

os mesmos objectivos mas não mais do que isso, pelo facto de achar que a única maneira que

há para melhorar um modelo de jogo é treinando mais, evoluindo ao nível do treino para que o

modelo ao nível do jogo possa evoluir também. Isso passa, acima de tudo por tentar de alguma

forma, criar novos desafios aos jogadores em termos de exercícios para que eles possam ir

descobrindo coisas diferentes.”

Por outro lado, a colocação em confronto dos dois sistemas de jogo preconizados para a

equipa no treino, permite trabalhar os dois sistemas da mesma maneira e em algumas situações

também, podendo colocá-los em confronto. Tudo isto com o intuito de induzir nos jogadores uma

familiaridade com as ideias de cada sistema e dos respectivos princípios de jogo. Para Paulo

Bento, esta aplicação permitiu que “não só se adquirisse as ideias em termos daquilo que nós

queríamos para nós e, ao mesmo tempo, um confronto desses dois sistemas” (Anexo 1, pág. IV).

Alicerçado à ideia anterior e de acordo com Paulo Cunha e Silva (1999:86), “o

movimento de um estado ao mesmo estado (a repetição) admite a transformação (a variação),

como se, durante o percurso previamente estabelecido, surgissem novas possibilidades que

apontassem para outros trajectos e outros destinos”, os quais permitem que o próprio gesto

humano signifique “para lá da simples existência e presença de facto, inaugurando um sentido.

O comportamento simbólico é privilégio do corpo próprio e da sua estrutura afectiva” (Dantas,

2001:177), favorecendo a construção de novos trajectos, novos significados que ao serem

compreendidos se transformam em conhecimento, permitindo a evolução de todo o sistema

organizacional, ou seja, a Equipa.

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4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 122 122

Os novos desafios impostos aos jogadores nos treinos através dos exercícios, permitem

descobrir novos caminhos para o desenvolvimento do processo de jogo, devendo assim

salientar-se que o treino é um momento de aprendizagem onde os jogadores podem aprimorar e

resolver os erros que os condicionam, tanto a nível individual como colectivo. Como o treino se

centra na aquisição em exercitação e compreensão de princípios comportamentais e suas

respectivas interacções, de modo a que os jogadores saibam resolver os problemas que se lhes

colocam, podemos dizer que o treino promove conhecimentos específicos, colectivos e

individuais.

Deste modo, “quando o treino faz o jogo, também há a desmontagem do processo e,

consequentemente, do jogo”, sendo que daqui emerge uma “permanente articulação de sentido,

que permite, em todos os momentos do treino, haver coerência no que se faz e nos

conhecimentos adquiridos pela equipa e jogadores” (Guilherme Oliveira, 2004). Como tal, os

jogadores são cumpridores dos princípios, agindo e colaborando na construção de uma

linguagem comum, tendo liberdade para atribuir uma outra característica à linguagem comum na

interpretação desses mesmos princípios, ou seja, uma linguagem criadora.

Para que essa construção criadora possa ser possível, “o treinador deve pintar os

quadros, os melhores, os mais simples” (Beswick, 2001), uma vez que a dinâmica do processo é

uma “fenomenotécnica” de natureza não linear (Frade, 2007). Segundo Guilherme Oliveira

(2004), “a não linearidade advém da natureza do próprio processo e da necessidade do treinador

ter que geri-lo, criá-lo e direccioná-lo sistematicamente no sentido da Especificidade e do Modelo

de Jogo.”

Implicitamente relacionado com esta questão, Paulo Bento (Anexo 1, pág. III) afirma que

“no futebol a maior dificuldade é usar a simplicidade, ou seja, quanto mais simples for o jogo,

quanto mais simples for a transmissão das ideias, pelo menos teoricamente, maior capacidade

deverá haver de recepção, para compreender essa mesma mensagem.” Contudo, o mesmo

autor exacerba que o jogador tem maior e melhor disponibilidade e capacidade para ouvir e

executar as situações mais simples, não deixando de existir a complexidade no exercício e na

intervenção do treinador. Isto é, “a complexidade já lá está no exercício, pelo menos simplificá-la

na comunicação, naquilo que pretendemos dos jogadores no exercício” (Anexo 1, pág. IV).

Ao falarmos de situações mais simples, não pretendemos diminuir a capacidade

intelectual do jogador mas sim, demonstrar a importância capital que o treinador possui ao

fornecer aos jogadores o seu foco de atenção no exercício, aquando da explicação do mesmo e

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4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 123 123

do seu respectivo objectivo, ou seja, executarem-no em função de determinado comportamento

(Guilherme Oliveira, 2007).

O Modelo de Jogo por si só, é um meio riquíssimo para que a construção do «jogar»

específico de cada equipa se processe e desenvolva, alicerçado às culturas emergentes, a do

Clube e a do Treinador, uma vez que caminham de “braço dado” com a Especificidade. Assim,

todas as acções executadas dentro das linhas orientadoras desta ligação, possuem objectivos

claros, coerentes, interligados e estruturadores de uma prática que sustenta a ideia de evolução

permanente do processo.

Deste modo, os treinadores devem utilizar determinadas estratégias para que os

jogadores se identifiquem o melhor possível com o seu Modelo de Jogo. Para que tal se

manifeste, Jorge Jesus (2009:5) destaca como primeiro pilar desta relação treinador-jogador, a

comunicação, dizendo que “se a mensagem do treinador passar facilmente, os jogadores vão

assimilá-la rapidamente”, uma vez que “com os jogadores a linguagem é a do futebol!” (idem,

2009:7). Em sintonia com a opinião de Jorge Jesus, Paulo Bento (Anexo 1, pág. IV e XI)

menciona que “quanto mais simples for a transmissão, mais fácil é para os jogadores interpretá-

la”, nunca perdendo de vista a relação estratégica entre a comunicação e a prática, sendo que

“elas tem de convergir relativamente aquilo que se diz e aquilo que se faz.”

No exacerbar da relação existente entre a comunicação e a prática, emerge a “estratégia

com algo que está adstrito ao que se passa colateralmente ao jogo propriamente dito, e aos

aspectos que dependem, sobretudo da intervenção do treinador” (Garganta. 2000:51) mas neste

caso, o conceito de estratégia está directamente relacionado com o plano de acção manifestado

pelo treinador no treino, de forma a que os jogadores concretizem os objectivos do mesmo.

Como estamos a tratar de uma questão operacional, do aqui e agora da acção, a interacção

entre a comunicação e a prática assentam em duas dimensões da equipa, isto é, numa visão

colectiva e individual.

Para Paulo Bento (Anexo 1, pág. XII) a utilização de estratégias individuais na

intervenção sobre os jogadores em termos tácticos, muitas das vezes, não se releva o meio mais

indicado de intervir, pelo facto de se ter de ir à procura de “um trabalho individualizado, deixando

de ser um trabalho dentro da organização da equipa.” No que concerne à aplicação e informação

manifestada, o treinador privilegia que a primeira se centre nas questões mais colectivas,

intervindo segundo os aspectos tácticos mais relevantes. Enquanto na segunda, procura realizar

“a junção das duas, isto é, a parte individual para o jogador poder entender certas e

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4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 124 124

determinadas coisas e colectivamente, para se falar sobre a forma de jogar da equipa e aquilo

que pretendemos” (Anexo 1, pág. XI).

De forma a que tal se possa manifestar, Garganta (2000:57) defende que a detecção

dos erros e correcção da execução são dois pontos que merecem atenção especial, de tal modo

que “o treinador deve estar capacitado para identificar os erros, bem como mecanismos

(perceptivos, decisionais, cognitivos, motores) que estão na base da sua ocorrência durante a

prática, fazendo deste um potente aliado para perseguir os objectivos pretendidos.” Para o

mesmo autor (2000:57), de forma a que os erros possam ser considerados como tal, isto é,

contextualizados e específicos de um dado padrão comportamento, “devem ser observados à luz

de um conjunto de princípios e ideias que, no seu conjunto, poderão constituir uma espécie de

teoria da acção (operacionalização do Modelo de Jogo), se nos centrarmos especialmente sobre

a forma como são detectados e corrigidos” no Futebol, cumprindo-se o Princípio da

Especificidade na operacionalização de um dado Modelo de Jogo, o qual subentende a

Articulação Hierarquizada dos princípios de jogo, fazendo emergir um dado «jogar» (Frade,

2003).

Contudo, é nas situações de maior contragimento, imprevissiblidade, exigência e

variabilidade que brotam as maiores dificuldades para a execução dos padrões comportamentais

treinados, como também, se dá a emergência dos princípios preconizados pelo Modelo de Jogo

operacionalizado. Assim, é frequente que os erros se dêem em situações de complexidade

superior, sendo aí, no aqui e agora da acção, que os jogadores tem “de ter a capacidade para

dar essa resposta e a equipa ao mesmo tempo, em função daquilo que o jogo está a dar, saber

inverter o rumo dos acontecimentos” (Paulo Bento, Anexo 1, pág. XIX), manifestando o

reconhecimento, a compreensão e a interpretação adequadas da informação proveniente do

jogo.

Como exemplo prático da situação supracitada, Paulo Bento (Anexo 1, pág. XX) destaca

que “o problema disso muitas vezes tem haver com as características dos jogadores. Há

jogadores que muitas vezes a sua principal característica é de decisão, não é de temporização...

Logo, no momento em que a equipa não precisa de decidir mas precisar de temporizar, ou seja,

o jogador acaba por naquele momento não estar a ler bem o jogo para aquilo que a equipa

precisa. A equipa precisa de temporizar uma acção e aquilo que faz é acelerar essa acção, ou

seja, eu estou a decidir mais do que a temporizar, estou a ir sempre para a frente, estou a

procurar sempre uma situação de risco...”

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4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 125 125

Daqui emerge uma questão essencial no decorrer do jogo, ou seja, a ligação entre a má

decisão de um jogador e a intervenção do treinador perante a respectiva decisão. Neste ponto,

Paulo Bento (Anexo 1, pág. XX) é peremptório ao afirma que “o treinador, na minha opinião, tem

muito tempo onde pode intervir, que é durante a semana, no treino. Depois tem muito pouco

tempo onde pode intervir, que são 10 minutos no intervalo. Aí tem de se tentar gerir muitas das

coisas que acontecem em 90 minutos, tentar gerir o mais importante, aquilo que é mais

determinante.”

A envolvência caótica que tanto o treino como no jogo criam, promove o despoletar de

uma constante aleatoriedade e imprevisibilidade, existindo a necessidade de intervenção

sistemática e no momento propriamente dito, revelando-se fundamental para gerir e criar o jogo

pretendido. Para Guilherme Oliveira (2004:156-157), “independentemente do princípio ou do

sub-princípio, do exercício mais complexo ou menos complexo, da intervenção do treinador mais

global ou mais pormenorizada, isto é, das diferentes escalas de intervenção, a Especificidade

deve estar sempre presente e deve ser representativa do Modelo de Jogo criado. A

Especificidade, em todas as escalas possíveis, terá de ser sempre uma invariante/constante do

processo.”

Ou seja, para além do treinador estar ligado à singularidade da equipa, tendo que estar

presente em todo o processo de intervenção (na criação, na organização, na gestão e na

operacionalização do processo de treino), é essencial que seja transmitida uma mensagem por

um elemento fundamental na estruturação da equipa que não somente o treinador. Para a

divulgação de tal mensagem, Paulo Bento (Anexo 1, pág. XX) procura utilizar uma pausa no jogo

para chamar alguém, tentando enviar um feedback por algum jogador, de forma a que a equipa

inverta a situação que estão a vivenciar.

No momento em que interage com o jogador através do qual pretende que a mensagem

seja transmitida, Paulo Bento (Anexo 1, pág. XXI) salienta que a opção recaí sobre um elemento

que tenha o “poder transmitir uma coisa em que os outros o ouçam.” Apesar do conteúdo da

informação transmitida ser táctico, sobrevaloriza-se a dimensão psicológica e qualidade de

tratamento da informação, ou seja, o poder de influencia positiva que determinados elementos

tem no seio do grupo como também, a capacidade que tem para a transmitir e, ao mesmo

tempo, controlá-la. “Eu passei por essa experiência enquanto jogador, normalmente vinha por

mim essa informação, e isso tem haver, muitas vezes, com a posição que o jogador ocupa.”

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4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 126 126

Dentro desta sequência lógica de pensamento, podemos constatar que o jogador possui

uma grande necessidade de compreensão em acção de todas as acções que executa em treino

e em jogo, de forma a possuir uma conhecimento profundo sobre o Modelo de Jogo.

Alicerçada a esta ideia, verificámos a exaltação de um dado «jogar» segundo os

referenciais que o mesmo oferece aos jogadores em treino e em jogo, conduzindo-nos para a

noção de fenomenológica, “no sentido em que coloca ênfase nas condições necessárias (não as

propriedades) para uma dada entidade, ser o que é” (Ilharco & Lourenço, 2007). A par disto,

Introca e Ilharco (cit. por Ilharco & Lourenço, 2007:82) salientam que, “para a fenomenologia, o

significado não está «em» algo mas antes ele se encontra «na» ligação, nas relações ou

referências para o algo, para ser como já é tomado quando adquirido pela nossa actividade

contínua na nossa vida quotidiana.” Dentro deste processo, podemos destacar que o

conhecimento do jogo ou aquilo que deve ser o facto mais importante do futebol, deve centrar-se

no entendimento do jogo, uma vez que “quanto melhor entenderes o jogo, mais fácil será para ti

a abordagem ao jogo, a abordagem ao treino” (Paulo Bento, Anexo 1, pág. I).

Essa abordagem qualitativa do jogo e do treino, faz com que a programação semanal

por parte da Equipa Técnica seja executada em função do que se desenrolou no jogo anterior e

do que se vai desenrolar no próximo, de tal modo que Paulo Bento (Anexo 1, pág. I) salienta que

“quanto mais analisares essa situação, quanto mais entenderes essa situação, ou seja, aquilo

que o jogo te pede, aquilo que o último jogo te deu e o próximo te pede, quanto melhor tu

entenderes isso, mais fácil será” a planificação dos objectivos semanais.

Conforme a planificação perspectivada pelo treinador, manifesta-se que os jogadores

sejam os impulsionadores de todo o processo, sendo que na ideia de Cruyff (1999) o importante

não é a equipa que ganha, mas sim ter um sistema que ganhe. De acordo com a opinião de

Paulo Bento (Anexo 1, pág. XVII-XVIII), são os jogadores que ganham porque interpretam o que

treinam, uma vez que se um treinador compõe um plantel, com uma dada forma de jogar

segundo as ideias do mesmo e a Cultura do Clube, “então, aquilo que tu vais treinar é uma forma

de jogar para ganhar e depois, tu ganhas com a forma de jogar mas com os jogadores que

interpretam a tua forma de jogar.” Independentemente dos jogadores que a colocam em prática,

“o teu objectivo é o mesmo, ganhar! Ganhar com os outros jogadores mas com jogadores que

são teus, com os jogadores do plantel, jogadores que tu treinas todos para uma forma de jogar.

Por isso, tu ganhas ou tentas ganhar com os teus jogadores e a forma como tu os preparas no

teu modelo de jogo, na tua forma de jogar. Como tal, o que ganha é o todo. Ganha o teu treino, o

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4.Análise e Discussão dos Conteúdos da Entrevista 127 127

teu jogo, os teus jogadores e a tua ideia. Agora, eles ganham porque fazem passar a tua ideia ou

tu ganhas porque eles conseguiram fazer passar a tua ideia, ou seja, a tua forma de jogar! Aquilo

que eles interpretam!“

O próprio Frank Rijkaard salientava que mesmo quando não ganhavam, Cruyff não

abdicava da sua visão, das suas ideias, de nada do que mostrava aos jogadores, desde o início

do processo, fazendo-nos pensar que uma das características fundamentais para quem treina,

centra-se no facto de não abdicar da sua visão independentemente dos resultados!

Em jeito de conclusão, Paulo Bento (Anexo 1, pág. XVIII) remata dizendo que “se tens

uma ideia, constróis uma ideia de jogo, levas os teus atletas a definir essa ideia de jogo e

correndo um jogo, dois mal, tu vais dizer aos teus atletas que afinal isto está tudo mal, vamos

partir para outra! Depois perdes mais dois jogos e vamos voltar à mesma... Não existe! Ou

vamos ter mais uma terceira... Não existe! Isso não existe porque senão, não conseguimos

trabalhar... Se nós dizemos todos, Académicos ou os que não foram Académicos, dizemos

todos, isto vive de rotinas. Se vive de rotinas, se nós as mudarmos ao fim de algum tempo, não

as temos. Vamos ter de arranjar outras, e para arranjar outras demora tempo. Por isso, não faz

sentido nenhum mudar uma situação porque acontece um ou outro percalço pelo caminho. Ou tu

acreditas naquilo que constróís desde o início” ou o processo não atinge o sucesso, uma vez que

tudo isto tem de estar intrinsicamente relacionado, “dentro do modelo de jogo!

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5.Conclusão 128

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5.Conclusão 129

5. Conclusões

“O modelo é tanto mais rico, quanto mais criar possibilidades aos indivíduos para poder acrescentar qualquer

coisa às suas funções, mas nunca à revelia das suas funções.”

Frade (2003)

Ao longo do presente estudo, foi notória a intencionalidade do enfoque do nosso olhar,

ao debruçarmo-nos na compreensão de um percurso infindável sobre o fenómeno Futebol, o

qual e no caso concreto do treinador Paulo Bento, se iniciou a partir de uma carreira de jogador

profissional, permitindo-lhe edificar-se de forma sustentada, coerente, inteligente e organizada,

numa carreira de treinador profissional.

A transição entre o papel de jogador e a função de treinador, advém de uma vivência

anterior enquanto jogador profissional, proporcionando-lhe uma compreensão em execução ao

longo de muitos anos, criando um elo de ligação muito forte e profundo ao transformar o saber

fazer como jogador (conhecimento implícito), num saber sobre um saber fazer como treinador

(conhecimento explícito). Esse continuum entre ambos os saberes, fez com que o treinador

construísse uma versão individual da formação requerida para o desempenho das suas

respectivas funções jogando, projectando-se todo esse conhecimento multidisciplinar, num

modelo do mundo (modelo de jogo) criado pelas experiências, valores, regras, princípios vividos

por intermédio de outros modelos de mundo, criando as suas próprias referências, as quais

convergem numa lógica interna de funcionamento.

Passando de uma concepção individual do modelo de jogo, para a projecção desse

mesmo modelo numa construção dinâmica e interactiva com o Clube, o treinador e a sua

respectiva equipa técnica, tem de compreender que o Clube possui uma história, uma cultura e

características próprias do país a que pertence, sendo que para além disso, o seu modelo de

jogo tem de envolver tudo isso.

Assim, há um conjugar de ideias, teorias e conhecimentos que concorrem para um

mesmo objectivo, sendo que a junção destas duas culturas, Cultura do Clube e do Treinador, se

fundem numa só – Cultura Universal –, permitindo que a primeira, em larga escala, se projecte

na e através da segunda, objectivando-se um crescimento universal de ambas na construção de

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5.Conclusão 130

um futebol de qualidade, o qual se percepciona na imagem final que a equipa transmite no

terreno de jogo.

A emergência da Cultura Universal, fez com que num mesmo plano hierárquico, se

processasse a evolução do Modelo de Jogo, o qual possui como um dos seus grandes

supraprincípios, a Especificidade. A última repercute-se numa relação profunda entre o Modelo

de Jogo concebido por cada treinador e a operacionalização do mesmo no treino, uma vez que

tudo aquilo que se faz no treino, é em função do Modelo de Jogo criado, sendo essa relação

fruto da especificidade, a qual em todas as escalas possíveis, terá de ser sempre uma

invariante/constante do processo.

A relação íntima e profunda entre a Cultura Universal e o Modelo de Jogo Específico da

Equipa Observada, permitiu-nos caracterizar o Sporting como um clube que tem como cultura

predominante, a Cultura do “Ganhar”. Por seu intermédio, foi-nos dado a perceber que uma das

características que marca a relação intrínseca entre a Cultura do Clube e o Modelo de Jogo do

Sporting, centra-se no facto dessa interligação ser sustentada pela capacidade de iniciativa, pelo

marcar de ritmos e velocidade de jogo, pelo domínio exercido sobre o adversário, ditando o

desenrolar do jogo. Isto é, exerce-se uma influência consciente sobre o meio por intermédio de

acções grupais, de modo a que os princípios inerentes à Cultura da Equipa se superiorizem em

confronto com o adversário.

Contudo, para que os princípios de jogo inerentes à Cultura Organizacional da Equipa se

expressem, é necessário definir uma hierarquia de comportamentos, uma vez que nem todos

são operacionalizados da mesma forma porque não assumem a mesma importância. A par disto,

destacámos, que os Momentos de Transição Ataque-Defesa e de Organização Ofensiva se

revelaram os mais importantes na equipa do Sporting.

Relativamente ao primeiro, este manifestou-se crucial pelo facto do Sporting ser uma

equipa que procurava jogar de forma regular em Organização Ofensiva, tendo maior domínio

sobre o jogo, utilizando a sua posse de bola para poder atacar de forma rápida ou posicional,

mantendo a iniciativa de jogo. Ao procurar manter a iniciativa dentro do mesmo, há que num

primeiro momento de perda da posse de bola, recuperá-la rapidamente para que possam iniciar

de imediato o Momento de Organização Ofensiva. Caso não seja possível recuperar de imediato,

temporizando a acção do adversário, para que a equipa se organize defensivamente.

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

5.Conclusão 131

Na Organização Ofensiva, privilegiam zero por cento de risco na primeira e na segunda

fases de construção, não circulando a bola de lateral a lateral, executando de preferência a

condução/transporte de bola por parte dos defesas centrais, atraindo a equipa adversária para

libertar espaço para o início da fase de criação por intermédio dos médios ou por passe longo

em profundidade para o médio interior que proporcionar mais profundidade à equipa. Nesse

momento de jogo e consoante o corredor de jogo onde a bola se encontra, um dos médios

interiores assume a posição de um médio-ala, proporcionando que a equipa possua maior

amplitude, mas, acima de tudo, mais profundidade no seu jogo. Com esta movimentação, os

pontas-de-lança funcionam como linhas de passe mais profundas para o médio interior contrário,

para o médio defensivo e para o jogador que ocupa a posição 10 ou de médio ofensivo.

Na fase final da Organização Ofensiva, ou seja, na fase de finalização, é uma equipa

que possui cem por cento de liberdade para poder dar azo à sua capacidade e inteligência

criativas, demonstrando através de sete vitórias e um empate, ao longo dos oito jogos

observados, que sabe usufruir das oportunidades de golo que constrói, marcando 15 golos, em

que 8 (53,33%) foram obtidos por ataque rápido, 3 (20%) por ataque posicional, 3 (20%) através

das bolas paradas e 1 (6,67%) por contra-ataque.

Devido à inerente complexidade que a construção de um «jogar» de qualidade encerra,

e de forma a que as ideias e a filosofia do treinador encontrem eco no lado pragmático, na

operacionalizado do Modelo, deve exacerbar-se na construção desse «jogar», a estabilidade na

esfera das ideias, sustentando a continuidade das referências, ou seja, uma panóplia de

invariâncias que para além de credibilizarem o Modelo de Jogo, fazem com que a equipa saiba

suportar as nuances estratégicas de circunstância que o jogo impõe pelo confronto com o

adversário, sem que esta se descaracterize.

A não descaracterização da equipa associada ao reconhecimento dos princípios de jogo

que a mesma expõem, defende, preconizada e aplica em jogo, faz com que esta seja

identificada e caracterizada como uma equipa com identidade. A estabilidade dos processos,

conduz à construção de uma identidade que ao expressar-se em jogo de forma regular e

sustentada, conduz o treinador para a percepção do Modelo de Jogo, do Modelo de Treino, do

Modelo de Jogador e do Modelo de Exercício como um prolongamento do primeiro, sendo que

esta cadeia decrescente em termos de complexidade, ou seja, do plano macro para o micro,

conduz o treinador para a observação da sua equipa como se tratasse de um processo

nanotecnológico.

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

5.Conclusão 132

Este processo permite que o treinador consiga ir ao cerne da questão, incidir a sua

atenção nos problemas que a sua equipa possa demonstrar, tendo a destreza para o poder

corrigir de forma imediata, sabendo onde se encontra o “foco infeccioso”.

Sendo o Futebol uma modalidade situacional que emerge da especificidade de cada

modelo de jogo e cultura organizacional que o próprio «jogar» possui, expressando-se pela

estabilidade dos seus comportamentos, a qual lhe atribui traços identificativos, também nos

conduz para a percepção do mesmo como um fenómeno epigenético. Ou seja, este depende da

influência do ambiente, do contexto, dos “saberes situacionais”, sobre a expressão do «jogar»

que o treinador ambiciona e constrói com os seus jogadores.

Para além de um dos elementos estruturantes do processo, no momento da

operacionalização, se centrar no saber do que se pretende executar para verificar se tudo

decorre exactamente conforme o planeado, os feedbacks devem ser o mais congruentes

possível com os objectivos que o treinador pretende para a sua equipa. Como tal, a dinâmica do

competir manifesta-se parte integrante da dinâmica do treinar, existindo uma constante relação

entre as componentes psico-cognitivas, táctico-técnicas, “físicas” e coordenativas, estando todas

elas permanentemente correlacionadas com o Modelo de Jogo concebido e respectivos

princípios que lhe dão corpo.

Esta dinâmica surge no momento em que os jogadores dão vida ao plano estático

(Sistema de Jogo), por intermédio dos respectivos princípios, os quais são o inicio da transição

entre o plano estático e o plano dinâmico do Sistema de Jogo. O poder dinamizar um sistema

surge através do onde e do como parte a equipa, estando tudo alicerçado aos conceitos de

organização estrutural e funcional.

Por intermédio desta organização estrutural, do mapa geométrico inicial (estático),

emerge uma fenomenologia dinâmica de interacções, que brota da concepção de jogo do

treinador, dos princípios e sub-princípios que o constituem e sobre os quais os jogadores

intervêm de forma activa, tornando-se numa funcionalidade organizada a partir de uma estrutura

inicial, que faz com que o Modelo adquira diferentes estruturas consoante as dinâmicas impostas

pelos princípios. Assim se constituí um mapa do «jogar» de cada equipa, o qual assentam num

conhecimento profundo dos jogadores dentro da própria equipa pelo jogo posicional e

respectivas relações com os outros jogadores, existindo só a preocupação com os adversários.

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

5.Conclusão 133

A singularidade na “fabricação” de um «jogar» é fruto da interacção que deve ser

construída e direccionada em função de um conjunto de ideias, colectivas e individuais, de jogo,

criando-se possibilidades de acção e não de certezas de acção, repercutindo-se na dinâmica de

criação, solidificação e recriação de conhecimentos dos jogadores e na dinâmica do próprio jogo.

Assim, o Modelo de Jogo funciona como um processo de aprendizagem, proporcionando

que todas as acções sejam susceptíveis de se tornarem num novo significado, uma vez que os

jogadores são cumpridores dos princípios, agindo e colaborando na construção de uma

linguagem comum, tendo liberdade para atribuir uma outra característica à linguagem comum na

interpretação desses mesmos princípios, ou seja, uma linguagem criadora.

A construção dessa linguagem criadora emerge de padrões hierarquizados em termos

cerebrais, padrões esses que são a informação dos contextos criados e vivenciados pelos

jogadores, fazendo com que a percepção e compreensão do meio evoluam através do incorporar

dessas mesmas acções, as quais ao interrelacionarem-se de forma interdependente,

proporcionam que cada jogador aja de forma individual mas ao fazê-lo, actuam segundo

princípios colectivos que fazem com que tenham de se interagir sistematicamente.

A identificação total do Modelo de Jogo por parte do treinador e da equipa, à

transmissão teórica dos fundamentos de jogo na vertente teórica, tendo reconhecimento dos

mesmos na execução em compreensão por intermédio da reentrada da informação teórica pela

acção contextual executada em treino, auxiliada pela repetição sistemática em especificidade,

faz com que o Modelo de Jogo se potencie no seu habitat natural, no terreno de jogo.

Tudo isto, se deve ao “caminho” que o Modelo de Jogo permite executar, salientando-se

que mais do que compreendermos o jogo como uma unidade colectiva resultante das relações

que os jogadores estabelecem entre si, salientámos que a verdadeira importância das coisas

não está nas coisas em si mesmas mas sim, nas relações estabelecidas entre elas, uma vez que

o Modelo de Jogo não se esgota nas relações entre os jogadores, é muito mais complexo do que

isso e não pode ser menosprezado.

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

5.Conclusão 134

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

5.Conclusão 135

6. Sugestões para o futuro

Tendo em conta o estudo realizado, podemos constatar que o mesmo possui carácter

evolutivo e de elevada complexidade se prolongarmos o seu estudo.

Desta forma, sugiro como trabalho futuro, o estudo de três Modelos de Jogo distintos,

englobando três equipas de três países diferentes mas que em termos internacionais, compitam

na Liga dos Campeões. A execução do estudo prendesse com a análise e observação dos três

Modelos de Jogo das respectivas equipas, caracterizando os mesmos no que concerne ao modo

como competem no seu Campeonato Nacional e na Liga dos Campeões, de modo a que

possamos analisar as diferenças entre os últimos dentro das competições nacionais como

também, nas competições internacionais.

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

7.Bibliografia 144

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

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8.Anexos I

8. Anexos

Anexo 1: Entrevista a Paulo Bento

Treinador Principal da Equipa Sénior do Sporting Clube de Portugal

Nuno de Almeida – Ao longo da sua experiência enquanto jogador, quais foram os

aspectos que considera determinantes para o levarem a conhecer melhor o jogo de

Futebol “por dentro”?

Paulo Bento: Os aspectos que são determinantes para se conhecer melhor o futebol

são o estar-se ou tentar-se aperceber dentro da tua experiência enquanto jogador primeiro e

depois como treinador, ou seja, a organização, focalizar-se na organização das equipas,

tentando entender o mais possível e o melhor possível aquilo que estavas a fazer, especialmente

na tua experiência enquanto jogador, ou seja, ao nível do treino. Entenderes o que estás a fazer

e o porquê de o estares a fazer. Isso acaba por se tornar mais fácil quando passas para a tua

outra experiência como treinador, poderes explicar aos outros por que razão o vão fazer, para

que é que o vão fazer porque tens uma vivência anterior. Agora, aquilo que é o conhecimento

do jogo ou que deve ser o facto mais importante do futebol, deve ser o entendimento do jogo

porque quanto melhor entenderes o jogo, mais fácil será para ti a abordagem ao jogo, a

abordagem ao treino. A preparação do teu plano semanal tem muito a ver com isso... com o que

se desenrolou no jogo e com aquilo que tu queres que se vá desenrolar no próximo. Por isso,

quanto mais analisares essa situação, quanto mais entenderes essa situação, ou seja, aquilo

que o jogo te pede, aquilo que o último jogo te deu e o próximo te pede, quanto melhor tu

entenderes isso, mais fácil será. Então, a organização de uma equipa, a organização do jogo é

aquilo que para mim foi o mais importante ao longo da minha carreira de jogador, principalmente

a partir de uma determinada altura porque no início da carreira de jogador não se pensa nisso

naturalmente, e agora como treinador é para mim o mais importante, ou seja, é tu entenderes o

jogo de uma forma quase total.

Nuno de Almeida – Considerando os Modelos de Jogo utilizados pelos diferentes

treinadores que o orientaram ao longo da sua carreira de jogador, qual aquele com que

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

8.Anexos II

mais se identifica? Porquê?

Paulo Bento: Não é fácil identificarmo-nos só com um modelo de jogo dos treinadores.

Ou seja, ao longo da carreira de jogador com 15 anos é muito difícil ficares com um modelo de

jogo, até porque é muito difícil haver só um modelo de jogo ao longo da tua carreira, diria

impossível. Enquanto treinador, torna-se difícil, ao longo de uma carreira de treinador também

treinares ou identificares-te só um modelo de jogo. Eu dou como exemplo nalgumas situações

que o treinador não tem aquilo que é o meu modelo de jogo. Numa conversa meio informal que

tive contigo sobre um colóquio que houve e onde eu fiz uma comunicação, eu comecei com uma

pergunta: “O Meu Modelo de Jogo ou o Modelo de Jogo que eu vou trabalhar em determinada

situação?”, isto é, o modelo de jogo para onde eu estou, para os jogadores que tenho. Não há só

um modelo de jogo ou o nosso modelo de jogo. Há o nosso modelo de jogo para este trabalho

que queremos desenvolver, para esta equipa que nós treinamos, para este clube onde nós

estamos. Por isso ao longo da carreira e por diversos treinadores, ainda mais difícil é escolher

um com quem tu te identifiques. O que houve foi o tirar ou com diz o Capelo “o roubar” um pouco

de cada um, aquilo com que tu mais te identificavas, as melhores qualidades e aqui estamos a

falar só em termos tácticos, ou seja, tudo aquilo que faz referência ao modelo de jogo para

depois tu, em função das equipas que fores treinando, poderes aproveitar aquilo que aprendeste,

aquilo que “bebeste”... mas nunca uma só situação ou várias situações de um só treinador ou

modelo de jogo que eles apresentaram.

Nuno de Almeida – Eu sei que todas elas fizeram as suas referências, conduziram

a sua maneira de perspectivar o jogo para um determinado sentido mas, ao longo da sua

carreira, qual foi aquela pessoa ou que treinador que teve um cunho marcante em si,

quase como que o conduziu para ver o jogo numa perspectiva que não a tinha

anteriormente?

Paulo Bento: Como eu já disse anteriormente, João Alves marcou-me muito por vários

aspectos tendo em conta os pessoais também. Em termos de futebol e estamos a falar quase à

vinte anos, foi o primeiro treinador que eu tive em termos profissionais e naquela altura, notava-

se que ao nível do treino que há situações que hoje em dia se fazem que ele já o fazia naquela

altura... falamos em termos de exercícios, da concepção de algumas unidades de treino... Por

isso, foi um treinador que me marcou pela sua organização, pela sua capacidade de liderança no

treino também. Depois Lillo em Espanha (no Oviedo), pela parte táctica, ou seja, era um

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

8.Anexos III

treinador que ia à exaustão, exacerbava o mais possível a táctica no treino.... raramente havia

aquelas situações de jogo que costumamos dizer que vamos fazer GR + 10 vs 10 + GR, quase

que não havia durante o microciclo. Um treinador muito exigente sobre o ponto de vista táctico. E

depois, Fernando Vásquez pelo facto de ter uma capacidade de organizar a equipa através de

um processo muito simples, ou seja, era um treinador que usava muito a simplicidade nas

unidades de treino, na preparação do microciclo, até mesmo no seu próprio discurso era um

treinador simples e fácil, num bom sentido, de entender. A ordem aqui não é importante mas

estes três treinadores foram os que me levaram a ver o futebol de uma maneira diferente

daquela que vemos no início da mesma, apesar do João Alves o ter sido no início da carreira,

Lillo e Fernando Vásquez já com alguma experiência no futebol espanhol... cada um há sua

maneira pelos aspectos que referi, ensinaram-me a ver o jogo e aprendi com eles muitas coisas,

as quais não se devem imitar porque acho que isso não se deve fazer mas tentando praticar.

Nuno de Almeida – Então, por intermédio do seu discurso, posso dizer que o

Paulo concorda com a frase que o treinador deve pintar os quadros, os melhores, os mais

simples?

Paulo Bento: Sim... eu penso que no futebol a maior dificuldade é usar a simplicidade,

ou seja, quanto mais simples for o jogo, quanto mais simples for a transmissão das ideias, pelo

menos teoricamente, maior capacidade deverá haver de recepção, para compreender essa

mesma mensagem. Por isso, acho que o jogador possui uma disponibilidade maior e melhor

para ouvir e para fazer situações mais simples. Contudo, isso não implica que na mesma

orientação do treinador não haja lugar à complexidade no exercício. Na transmissão da ideia,

quanto mais simples for a transmissão da ideia, melhor, mesmo que o exercício tenha uma

complexidade maior que outros exercícios, nesse mesmo exercício deve-se simplificar o mais

possível a transmissão daquilo que pretendemos do jogador para esse exercício...

Nuno de Almeida – Até porque os jogadores trazem consigo uma bagagem

riquíssima de estímulos, uma série de linhas de condução anteriores do jogo, e muitas

vezes o Paulo perspectiva as coisas tendo um enfoque circunstancial, ou seja, é isto que

eu quero neste momento, não esquecendo a bagagem anterior que os jogadores trazem

do modelo de jogo porque isso os jogadores tem de saber...

Paulo Bento: O facto de criarmos mais complexidade num exercício, não significa que a

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

8.Anexos IV

complexidade tenha de vir também da transmissão da ideia, ou seja, a complexidade já lá está

no exercício, pelo menos simplificá-la na comunicação, naquilo que pretendemos dos jogadores

no exercício. Mas regra geral, quanto mais simples for a transmissão, mais fácil é para os

jogadores interpretá-la...

Nuno de Almeida – Qual a relação que entende dever existir entre a Cultura de um

Clube e o Modelo de Jogo do treinador desse clube?

Paulo Bento: Uma das coisas que deve estar dentro do modelo de jogo é a cultura do

clube e as ideias do treinador, ou seja, o treinador deve saber moldar as suas ideias em função

da cultura do clube e não fazer ou querer mudar uma cultura que tem tantos e tantos anos, pelas

ideias do treinador. Isto é, o clube pode adoptar algumas situações que estejam relacionadas

com a ideia do treinador mas a cultura do clube deve estar inserida dentro do modelo de jogo.

No fundo, o modelo de jogo significa uma forma de jogar, dentro dessa forma de jogar

encontram-se as ideias do treinador, e logicamente também, a cultura do clube porque tu vais

pôr um pouco a equipa a jogar não só em função da cultura do clube mas também, em função

das tuas ideias tendo em conta a cultura do clube.

Nuno de Almeida – E o que é que a Cultura do Sporting dá ao modelo de jogo do

Paulo em conjunto com a sua Equipa Técnica? Características que o Clube tenha que lhe

permitam exponenciar umas coisas, potenciar outras...

Paulo Bento: A Cultura do Sporting até pela obrigatoriedade que têm em ganhar, pela

sua história, obriga que no nosso modelo de jogo uma das situações que tenha de haver seja a

iniciativa. Isto é, maior capacidade para dominar o adversário do que propriamente jogar a

especular com a situação, a especular com o jogo. Culturalmente não é um Clube que tenha

adoptado essa forma de jogar e nós, também, não o pretendemos fazer nem o temos feito. Daí

que o nosso modelo de jogo passe por sermos uma equipa com iniciativa, uma equipa que

esteja mais tempo em organização ofensiva, uma equipa que faça da sua capacidade para ter a

bola, um dos aspectos mais importantes do modelo de jogo. Agora só isso não chega! Ou seja,

não há nenhuma equipa que consiga ter um modelo de jogo só com um momento dos quatro

que existem, só pela organização ofensiva. O que damos primazia ou uma particular atenção

são as situações de posse de bola que levem os jogadores a saber jogar dessa forma, ou seja, a

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8.Anexos V

saber estar mais tempo a jogar dessa forma, não descurando os outros aspectos do jogo. O

facto de eu ter uma equipa que tenha de ter iniciativa, que tenha de ter capacidade para dominar

o adversário, não significa que em vários momentos do jogo não tenha somente de controlar o

adversário, não tenha de se sujeitar ao poderio do adversário e que saiba conviver com essas

situações. Por isso, todos eles tem de trabalhar! Agora, fazêmo-lo de maneira que a equipa

possa jogar de acordo com as ideias do treinador mas também, enquadrado naquilo que é a

história e a cultura do clube.

Nuno de Almeida – A sua cultura, a sua filosofia de jogo, as quais estão inerentes

ao seu modelo de jogo, mantêm-se independentemente de quem seja a equipa contra

quem joga?

Paulo Bento: Mantém-se o que é o nosso objectivo, mantém-se o que é a nossa

mentalidade, mantém-se o que é a nossa forma de jogar porque para mim não faz sentido,

mesmo que reconheçámos que o adversário possua um maior potencial e aqui, falamos um

pouco na questão das competições europeias, não faz sentido mudar aquilo que se treina de

uma forma rotineira, de uma forma programada, de um forma sistemática. Aquilo que faz sentido

é dentro da competição onde estamos, do tipo de competição em que estamos, daquilo que a

competição nos pede em determinado momento porque mesmo a própria Liga dos Campeões

acarreta algumas circunstâncias diferentes comparativamente com um jogo a eliminar. Não faz

sentido mudar a forma de jogar, a mentalidade com que encarramos a competição, a

mentalidade com que encarramos o jogo... O que pode ter e deve ter sentido é dentro do modelo

de jogo da equipa, adoptar algumas situações em termos estratégicos para, não só, provocar

danos no adversário como ao mesmo tempo, adoptar estratégias para que o adversário não nos

provoque danos. E aí, especialmente aquilo que fazemos nas competições a nível nacional, em

que temos que ter mais iniciativa, em que temos que usar uma mentalidade de maior dominio,

nesta situção, por exemplo se for na Liga dos Campeões, existe uma menor preocupação em

exercer esse mesmo dominio pelo potencial do adversário do que nas competições internas. Isto

não significa que não trabalhemos da mesma maneira com as nuances que eu falei

anteriormente, até porque o adversário também obriga a jogar de outra forma, e consegue-o

através do seu potencial, não conseguindo exercer o mesmo domínio, a mesma iniciativa que

constumamos ter nas competições a nível interno.

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8.Anexos VI

Nuno de Almeida – Como definiria o Modelo de Jogo com o qual se identifica?

Quais as principais preocupações na respectiva construção e aplicação?

Paulo Bento: O modelo de jogo, neste caso concreto o do Sporting, está identificado. E

reportando-nos à primeira questão, não o meu modelo de jogo mas sim o modelo que nós temos

agora, ou seja, o modelo de jogo que o Sporting tem neste momento e neste caso, que nós

aplicamos enquanto Equipa Técnica. Por isso, definir o seu modelo de jogo não o meu mas sim

aquele que tenho agora, o que eu tenho neste momento. Como disse, mais iniciativa, mais

dominio, tendo a preparação visando esses dois factores. Depois a construção e aplicação dele

tem haver com aquilo que transmitimos aos jogadores, ou seja, o conhecimento que lhes damos

daquilo que queremos. Depois, utilizando a aplicação, levá-los com exercícios a que aquilo que

lhes dissemos do ponto de vista teórico, eles vejam equivalência daquilo que vamos fazer na

prática. Quando lhes apresentamos aquilo que em cada momento do jogo, é o nosso objectivo

para o nosso modelo de jogo, levamo-lo depois para o campo, para que os jogadores pratiquem

aquilo que nós também teorizamos com eles. Isto é, fazer os exercícios na zona onde queremos

que eles ocorram, fazê-lo da maneira que queremos que em termos mentais ocorram no jogo.

Por isso, no fundo é passar da informação que lhes damos em relação aquilo que queremos em

cada momento (do jogo), passá-lo para a prática. Isto é, para o nível do treino que é o mais

importante porque só chegamos bem ao jogo, praticando durante muito tempo no treino. No

fundo, essas são as principais preocupações na construção e na aplicação. Construir, primeiro,

sobre o ponto de vista teórico e numa fase inicial da temporada, sendo aí o momento em que se

constrói a maior informação e depois, estamos sempre em actividade permanente. Em segundo,

com aplicação, uma vez que essa é sempre permanente. Acima de tudo, que a sua construção e

a sua aplicação tenham sempre uma relação muito grande entre aquilo que se transmite e aquilo

que se faz porque se transmitirmos uma coisa e formos fazer outra, o jogador aí não tem

capacidade nem vê credibilidade naquilo que se faz. Ou seja, dizer para fazer uma coisa e

depois, quando formos executá-la, não fazermos aquilo que dissemos, não faz sentido, ou seja,

o jogador deixa de acreditar naquilo que está a fazer.

Nuno de Almeida – E, ao longo destes quatro anos, quais foram as nuances dentro

do seu modelo inicial e do que agora se encontra, quais delas foram sendo “limadas”

tendo em vista o potenciar, o melhoramento do modelo de jogo, reportando-se ao antes e

ao agora?

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

8.Anexos VII

Paulo Bento: As nuances foram mais em termos de sistema, dentro do modelo de jogo,

do que propriamente em termos de modelo de jogo. Em primeiro lugar, eu quando cheguei aqui,

aquilo que fiz foi adaptar-me aquilo que havia, aos jogadores que tinha naquele momento, daí

não passarmos logo de uma fase imediata a jogarmos de forma como estamos a jogar, mais até

em termos de sistema de jogo. Depois, dentro daquilo que eu pretendia, passados aqueles

primeiros oito meses, procurar jogadores que se adaptassem aos que já cá estavam e aquilo que

era a nossa ideia, para depois potenciar. E aquilo que temos tentado fazer, mesmo com algumas

alterações em termos de sistema e mais o segundo sistema do que propriamente o primeiro,

uma vez que o mesmo se tem mantido inalterável, praticamente desde Dezembro de 2005-

Janeiro de 2006. Depois aquilo que alteramos um pouco, foi o nosso segundo sistema. Neste

momento, temos mais um 1-4-4-2 clássico... Em 2006-2007, chegamos a jogar num sistema de

1-3-5-2... Mas, em relação ao modelo de jogo, não existem alterações na nossa forma de jogar.

Aquilo que tentamos é potenciar esse modelo de jogo no treino. Novos exercícios para os

mesmos objectivos mas não mais do que isso, pelo facto de achar que a única maneira que há

para melhorar um modelo de jogo é treinando mais, evoluindo ao nível do treino para que o

modelo ao nível do jogo possa evoluir também. Isso passa, acima de tudo por tentar de alguma

forma, criar novos desafios aos jogadores em termos de exercícios para que eles possam ir

descobrindo coisas diferentes. Tudo isto sempre com um mesmo objectivo. Ao longo dos três

anos, aquilo que houve, mesmo tendo um modelo de jogo completamente definido em cada ano,

sem grandes alterações em termos de modelo, evidenciando mais em termos de sistema, aquilo

que pode ser ou pelos que tenho a ideia que em função das características dos jogadores e das

vicissitudes que existem ao longo de uma temporada, o Sporting jogou de maneira diferente

naquele trajecto 2005-2006. Em 2006-2007, também jogava diferente da época anterior. E em

2008-2009, jogava diferente de 2007-2008, tendo tudo haver com as características dos

jogadores. O modelo de jogo é o mesmo mas algumas questões de interpretação do modelo de

jogo são diferentes porque os jogadores também são diferentes. E mesmo trabalhando da

mesma forma, em termos de treino, com a evolução natural das situações, nem sempre

consegues jogar da mesma maneira, tendo num fundo a mesma ideia de jogo. Isso tem mais

haver com as características dos jogadores e também, com os momentos da época.

Nuno de Almeida – Com os jogadores que se mantêm dentro do seu modelo e que

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8.Anexos VIII

tem seguido um trajecto consigo dentro do Clube, qual é o trabalho que faz com eles para

que haja uma nova identificação ou reidentificação com o modelo? E relativamente aos

jogadores novos, que tipo de trabalho faz para que eles reconheçam aquilo que se

pretende?

Paulo Bento: Em primeiro lugar, com informação teórica. No fundo como se começa

qualquer ciclo, ou seja, qualquer início de trabalho. Os que já cá estavam, em função daquilo que

vamos fazer, já não necessitam de ouvir essa mesma informação teórica porque não há

alterações, pelo menos numa fase inicial, sendo que os jogadores em termos teóricos não

precisam disso. O que fazemos é apresentar essa mesma informação teórica aos jogadores que

chegam, aos que se vão integrar no grupo. Depois quando tem haver com a introdução de um

novo sistema de jogo, dentro do nosso modelo, ou o sistema alternativo para o nosso modelo de

jogo, fazê-lo como fazemos no início da temporada, ou seja, com todos e sob o ponto de vista

teórico também. Passando depois à aplicação, quer de um quer de outro, dando mais ênfase

aquele que é mais usado numa fase inicial, sendo aquele que vai ser mais usado e usando o

outro, menos tempo, pelo facto de estarmos a perspectivar numa fase inicial, usá-lo menos

vezes. Aquilo que é possível fazer e que nós fizemos no início deste ano, em função de alguma

maturidade, de um conhecimento dos jogadores já muito elevado, não só da forma de jogar do

nosso modelo de jogo mas também, do sistema. Através da maturidade dos jogadores, numa

fase inicial da temporada, fazer algumas situações nas unidades de treino, no treino, de trabalhar

os dois sistemas da mesmas maneira, em algumas situações até em confronto. Isto no início da

temporada, sendo que os jogadores deste modo, conseguem não só trabalhar aquelas que são

as nossas ideias para cada sistema, os princípios para cada sistema e ao mesmo tempo,

estarem em confronto. Ou seja, dentro dos nossos dois sistemas estarem em confronto porque

até pode acontecer na situação de jogo (competição), nós jogarmos em 1-4-4-2 losângulo e a

equipa adversária em 1-4-4-2 clássico ou nós jogarmos em clássico e a equipa contrária em

losângulo. Isso acabou por fazer com que no início da temporada, não só se adquirisse as ideias

em termos daquilo que nós queríamos para nós e, ao mesmo tempo, um confronto desses dois

sistemas.

Nuno de Almeida – Por favor, pode resumir quais são as principais regras de

acção/princípios tácticos a que dá primazia dentro dos quatro momentos do jogo:

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8.Anexos IX

Organização Ofensiva, Transição Ataque-Defesa, Organização Defensiva e Transição

Defesa-Ataque?

Paulo Bento: Na Organização Ofensiva, e se quissermos também, na Transição

Defesa-Ataque, em primeiro lugar, Profundidade. Sempre que se possa jogar para a frente, não

tem de jogar para o lado. Depois quando não se puder jogar para a frente, primeiro para o lado

do que para trás. Segurança, ou seja, em termos de Organização Ofensiva e Transição Defesa-

Ataque mesmo tendo como primeiro princípio Profundidade, Segurança, isto é, dentro da

Organização Ofensiva, primeira fase e segunda fase, zero por cento de risco, criação e

finalização, cem por cento de risco. Depois há princípios para essa primeira e segunda fase, que

tem já tem haver com o modelo de jogo, isto é, o menos toques possíveis especialmente pela

linha defensiva, que a bola não circule pelos quatro defesas mais do que uma vez, que a bola

não passe de lateral a lateral e volte, outra vez, de lateral a lateral. Não jogar com os dois

laterais à mesma altura quando estamos a iniciar a nossa fase de construção e depois, tem

haver com o nosso sistema de jogo, ou seja, dar largura, normalmente, com os nossos médios

interiores, termos os pontas-de-lança como suporte para a nossa profundidade, seja no espaço

interior, seja quando temos de sair pelos corredores. Na Transição Defesa-Ataque, um pouco a

questão da Profundidade de duas formas: saindo logo pelo corredor onde recuperamos a bola,

ou seja, suportando-nos aí com os jogadores da frente ou com um suporte à retaguarda,

preferindo que seja mais com o médio defensivo do que com os centrais, para podermos variar o

centro do jogo e sairmos pelo corredor contrário, isto é, tirar a bola da zona de pressão o mais

rápido possível, seja em Profundidade, seja de forma mais lateralizada, possibilitando-nos a

saída pelo corredor contrário. Em termos de Organização Defensiva, aquilo que privilegiamos é

tentar pressionar o mais alto possível, com princípios que normalmente utilizamos, por exemplo,

com os nossos pontas-de-lança a sairem nos laterais contrários quando o adversário joga com

um linha de quatro, que é o que se usa mais em Portugal. Mas normalmente, é o ponta-de-lança

que sai no lateral contrário, concentrando a equipa normalmente em dois corredores, ignorando

o corredor contrário onde está a bola e depois, por questões estratégias, podemos obrigar o

adversário a jogar mais por dentro ou por fora. Na Organização Defensiva ter sempre um

controlo da Profundidade, ou seja, que a linha de quatro tenha sempre um bom controlo da

Profundidade. Isto é, que saiba quando é que tem de encurtar o espaço em função da pressão

que há na frente ou tirar espaço ao adversário porque não fazemos fora-de-jogo, a ideia de

colocar os adversários em situação de fora de jogo. Depois, na nossa Transição Ataque-Defesa,

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8.Anexos X

aquilo que pretendemos é sermos muito agressivos, no primeiro momento de transição, tendo o

objectivo de roubar e só, como segunda prioridade, com o objectivo de temporizar a saída do

adversário para o ataque. Como segundo momento, ou seja, como fazem maior parte das

equipas, reagrupar com o maior número de jogadores possíveis, juntando aí a questão da

profundidade da linha de quatro, ou seja, retirar logo espaço ao adversário para dar tempo a que

se regrupe com o maior número de jogadores possível, e dentro do nosso sistema também, que

esse maior número de jogadores possível sejam oito jogadores, isto é, se tivermos de partir a

equipa, partimos com quatro defesas, quatro médios, e os dois jogadores da frente. Assim

sendo, a nossa figura em termos de losângulo ou com duas linhas de quatro se for o outro

sistema, e jogar com os dois homens na frente para depois podermos sair com eles para o

ataque.

Nuno de Almeida – Se o Paulo conseguisse resumir os princípios dos quatro

momentos de jogo num grande princípio que norteasse todos os outros, na sua opinião,

como é que o definiria? Ou seja, a minha equipa é...

Paulo Bento – Só numa palavra não é fácil...

Nuno de Almeida – Numa ou duas frases!

Paulo Bento – Que seja uma equipa em termos ofensivos queira ser criativa, sendo

segura e não perdendo o equilíbrio, ou seja, sendo sempre equilibrada. Uma equipa

defensivamente que tenha uma boa concentração defensiva, que seja uma equipa que saiba

onde quer pressionar, quando quer pressionar e como quer pressionar. E, seja uma equipa

extremamente agressiva no momento da perda da bola, para fazer face aquilo que nós achamos

que para uma equipa como a nossa é o mais importante, o primeiro momento de transição para

que continuemos a ter iniciativa. Logo, termos o primeiro momento de transição o mais forte

possível para recuperar a bola. Ou seja, no fundo uma equipa criativa, segura e equilibrada sob

o ponto de vista ofensivo, que nunca perca o equilíbrio quando tem a bola no seu momento

ofensivo e sob o ponto de vista defensivo, com uma boa concentração defensiva e agressiva.

Isso é no fundo aquilo que em termos defensivos que se possa dizer, uma vez que poderia dizer

mais coisas mas para resumir, que saiba defender em dois corredores, daí a concentração

defensiva, e agressiva, ou seja, quando tem de recuperar a bola que seja uma equipa solidária.

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8.Anexos XI

Nuno de Almeida – Que estratégias utiliza para que os atletas se identifiquem o

melhor possível com o seu modelo de jogo?

Paulo Bento: Aquelas que no fundo já falamos sobre elas. A comunicação e a prática...

no fundo são as duas que se devem aplicar e temos obrigatoriamente de fazer com que as duas

possam convergir, ou seja, elas tem de convergir relativamente aquilo que se diz e aquilo que se

faz. As estratégias que se podem utilizar são colectivas ou individuais, isto é, colectivas mais até

na questão da informação e mesmo em casos pontuais, podem ser realizadas individualmente e

depois, normalmente na aplicação, mais colectivas, mais relacionadas com o exercício. É mais

difícil usar estratégias individuais para a aplicação, tendo mais haver com aspectos técnicos e

também, tendo haver com aspectos tácticos mas para se executar, para se aplicar, são

normalmente e do meu ponto de vista, mais colectivas. Para informar, pode ser a junção das

duas, isto é, a parte individual para o jogador poder entender certas e determinadas coisas e

colectivamente, para se falar sobre a forma de jogar da equipa e aquilo que pretendemos.

Individualmente está mais relacionado com aquilo que o jogador está a fazer em termos de treino

como também, em termos de jogo. Ou seja, dentro daquilo que nós pretendemos, fazê-lo

individualmente na aplicação em termos tácticos, o que não é fácil! Só o será se dentro do

colectivo formos corrigindo o jogador em questão individualmente, individualmente na

verdadeira acepção da palavra, isto é, ir à procura de aplicar alguma coisa individualmente em

termos tácticos, tem de ser um trabalho individualizado, deixando de ser um trabalho dentro da

organização da equipa.

Nuno de Almeida – Pode sintetizar algumas características que reconheça como

importantes nos jogadores, para que reúnam condições para lidar eficazmente com as

exigências do(s) sistema(s) de jogo preconizado(s)?

Paulo Bento: Para quem quer ter um modelo de jogo como nós temos, há uma coisa

que tem de estar o mais possível em todos os jogadores, a técnica. Se queremos ter uma equipa

com iniciativa, uma equipa que domine, tem de ter boa relação com a bola, tem de saber ter a

bola, tem de querer ter a bola, logo personalidade. Técnica para saber o que faz e personalidade

para a ter, para a querer ter. Isto em termos ofensivos se o quisermos assim.... Técnica e a

personalidade! Aqui está um pouco aquilo que é a qualidade técnica e a parte mental... Depois,

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8.Anexos XII

as questões físicas, mais numas posições do que noutras, damos preferência há velocidade.

Hoje em dia, fundamental... Mas agora aqui, não só a velocidade no deslocamento mas

velocidade na execução e, para isso, é preciso ter técnica. Depois, inteligência em termos

ofensivos, jogadores inteligentes, que pensem o jogo, que saibam o que tem para fazer a cada

momento... Se vou fazer acções individuais, se vou fazer acções colectivas, se vou sair para o

ataque, se vou temporizar o ataque, ou seja, jogadores que em determinadas posições, esta

questão da temporização é mais marcante porque há posições que são mais marcantes do que

outras. Sob o ponto de vista defensivo, inteligência, ou seja, que todos os jogadores saibam o

que tem de fazer quando não tem a bola, quando é que há-de pressionar, como é que há-de

pressionar e onde é que há-de pressionar,... Agressividade! Se o anterior tinha haver com a

parte táctica, este aqui já tem um pouco haver com a parte mental, com a agressividade, com a

disponibilidade para ir à procura da bola e, depois também em função das posições em que

jogam, possuem requisitos que são importantes...

Nuno de Almeida – E se nós enveredarmos por aí, por sectores, por posições...

Paulo Bento – Por sectores e a parte ofensiva, eu acho que é mais fácil... A técnica em

todas as posições, independentemente do sistema parece-me importante, especialmente para

quem quer ter iniciativa, ou seja, qualidade técnica. Depois, a questão dos laterais em termos

ofensivos que sejam rápidos, que sejam ao mesmo tempo resistentes, que tenham capacidade

de ir e vir... Na questão dos centrais, no meu ponto de vista ofensivo, a questão técnica por

causa da construção. Hoje em dia, na minha opinião, quanto melhor forem os centrais de uma

equipa, mais facilidade tem a construção do jogo dessa equipa e, ao mesmo tempo, do ponto de

vista defensivo, que sejam rápidos, especialmente numa equipa que tenha de jogar com 30 a 40

metros nas costas, jogadores que sejam rápidos e definitivamente, que sejam jogadores fortes

no jogo áereo. Médio Defensivo, rápido a executar mais do que no deslocamento, que tenha

velocidade a executar. Se jogar com os dois pés, tanto melhor, sendo um jogador com boa

capacidade para virar o centro do jogo, mais fácil se torna se for um jogador eficaz a jogar com

os dois pés. Defensivamente, que seja forte no jogo áereo mas não digo que seja uma condição

imprescindível, parecendo-me que é uma boa condição para poder jogar como médio defensivo,

sendo também agressivo. Depois dois médios interiores, que tendo a palavra e no nosso sistema

um pouco, médio interiores, que tenham capacidade para dar largura no jogo, sob o ponto de

vista táctico que tenham capacidade para dar largura no jogo, que sejam jogadores que tenham

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8.Anexos XIII

capacidade de desequilibrar em situações de um contra um, que tenham velocidade. Quando

digo velocidade, não falo da velocidade de um extremo mas que sejam jogadores velozes e

resistentes, tendo ao mesmo tempo, do ponto de vista táctico, capacidade para chegar a zonas

de finalização. Sob o ponto de vista defensivo, uma boa relação com os dois jogadores da frente,

ou seja, os médios interiores tenham uma boa relação com os pontas-de-lança para saberem

quando é que tem de fazer coberturas ao ponta-de-lança, quando tem de ser um deles o

primeiro a pressionar e, que sejam jogadores que joguem bem no espaço interior, ou seja, que

sejam jogadores que ao contrário do processo ofensivo, em que partem de dentro para fora, no

processo defensivo sejam precisamente o contrário, que tenham capacidade para jogar no

espaço interior e para isso, é preciso que sejam jogadores mentalmente fortes, para estarem nas

duas funções. Um número dez bom tecnicamente, ou seja, um jogador bom no último passe, que

sejam um jogador capaz de descobrir espaços, mesmo estando uma maior densidade na sua

zona de acção. Mobilidade... que seja um jogador com capacidade de ir para os espaços e

apesar de nós termos jogadores na posição 10 com características diferentes, o caso do

Moutinho e do Romagnoli, que sejam jogadores sob o ponto de vista defensivo, tenham uma boa

capacidade para o primeiro momento de transição e, ao mesmo tempo, que sejam jogadores

com uma boa capacidade de recuperação defensiva, isto é, jogadores fisicamente bem dotados

em termos de resistência. Temos uma diferença como é óbvio, basta ver um jogo do Sporting

quando joga o Moutinho ou o Romagnoli, não só nos mecanismos ofensivos mas aí menos

diferença porque cada um faz as coisas em função das suas características mas, em termos

defensivos, há naturalmente maiores diferenças até pela capacidade física. Depois, os pontas-

de-lança que saibam segurar bem a bola, que saibam procurar bem o espaço, que saibam jogar

em função um do outro, que sejam... não me parecendo essencial porque isso depende muito do

modelo de jogo da equipa mas se forem fortes no jogo áereo, tanto melhor. Muitas vezes não se

é um jogador forte no jogo áereo mas é-se um jogador forte nas zonas de finalização. Dentro do

plantel, há alguns jogadores no sector ofensivo que devem ter como característica principal a

velocidade, ou seja, para se poder jogar de maneira diferente. No fundo, aqui está um pouco de

tudo, a técnica, a táctica e a velocidade... depois, defensivamente que sejam inteligentes porque

são normalmente os jogadores com capacidade para orientar o jogo do adversário, a pressão

sobre uma equipa, que sejam jogadores que saibam jogar em termos defensivos, um em função

do outro, jogadores agressivos e reactivos após a perda da bola e, no fundo, jogadores que se

saibam posicionar e ver como a equipa se está a organizar defensivamente, para estarem

disponíveis para depois podermos fazer a transição para o ataque.

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8.Anexos XIV

Nuno de Almeida – Considerando a especificidade da posição/função para cada

jogador no âmbito do seu Sistema de Jogo, dá primazia à criatividade e à

imprevisibilidade que cada jogador pode exprimir?

Paulo Bento: Não dou primazia à criatividade e à imprevisibilidade, deixo o jogador ser

criativo e imprevisível para o adversário, para os companheiros não! Ou seja, o que para mim é

fundamental é que o jogador... até porque se queremos e dentro daquilo que estamos a falar, se

queremos uma equipa que assuma a iniciativa, se queremos uma equipa que queira dominar,

sabemos que em algum momento do jogo ou em vários momentos do jogo, em várias zonas do

campo ou nalgumas zonas do campo, ele vai ter de ser criativo, ele vai ter de improvisar alguma

situação, ele vai ter de ser corajoso, sendo também outra das coisas que acho que um jogador

que esteja numa equipa grande deva ter. Coragem para encara os adversários, para fazer

situações de um contra um... Agora, eu não lhe dou primazia! Eu dou primazia aquilo que falei

anteriormente na organização da equipa, ou seja, como é que quero uma equipa em termos

ofensivos e em termos defensivos. Dentro desse modelo de jogo, dentro dessa forma de jogar da

equipa, entra a criatividade e a imprevisibilidade, não entra antes. Não quero que um jogador

seja criativo na primeira fase de construção, eu quero que um jogador seja seguro, simples e

eficaz mas que tenha boa técnica, ou seja, deslocando a bola a 30 e a 40 metros e que a

coloque nas zonas em que nós queremos sair a jogar. Por exemplo, que saiba conduzir a bola à

procura de libertar espaços em zonas mais adiantadas para ligarmos o nosso jogo. Agora, o que

quero é que o jogador tenha essa criatividade e imprevisibilidade nas zonas onde a deve ter. Se

um jogador, por exemplo, numa zona tem possibilidade de fazer dois contra um e quiser fazer

um contra um, isso para mim não é ser criativo, isso para mim é complicar, é ser complicativo.

Ou seja, se eu tenho uma situação onde posso fazer dois contra um com sucesso, não devo ir

para uma situação onde vou fazer um contra um e tenho 50% de sucesso. Eu devo fazer um

contra um, nas zonas pré-definidas para o fazer e nas condições em que tenho mesmo de o

fazer! Nalgumas situações se não tenho outra oportunidade senão fazer um contra dois, então

vou tentar fazer um contra dois, senão tenho outra possibilidade, o.k., posso tentar fazê-lo, uma

vez! Quando tenho a possibilidade de o fazer e na qual sou menos criativo, mas sou mais prático

e mais eficaz. Como? Tendo a possibilidade de o fazer em dois contra um em vez de fazer, um

contra um. Por isso é que eu lhe digo que não lhe dou primazia porque primazia dou ao resto, à

formal global de jogar da equipa. Dou-lhe (à criatividade) é espaço para que o jogador se torne

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8.Anexos XV

criativo, e se um jogador é criativo que o demonstre quando tem de o fazer, nas zonas onde tem

de o fazer e quando tem de o fazer.

Nuno de Almeida – Como procura conciliar criatividade individual e organização

colectiva, tendo em conta o Modelo de Jogo desejado para a equipa?

Paulo Bento: Zonas! Zonas onde eles podem e devem fazer. E depois há que ler as

situações para se saber onde é que posso e onde é que devo fazer porque não é proibido um

central fintar, não é proibido um lateral fintar, é um risco um central fintar. Normalmente pelas

zonas do campo onde joga, pelas zonas onde está inserido, por aquilo que não tem atrás dele, é

complicado um central fintar. Não está impedido de o fazer mas deve saber quando é que o deve

fazer, pode ocorrer uma situação em que vá a uma bola parada, ou a uma segunda bola e

depois, pode fintar. Agora, quando está na organização de jogo da equipa, um central deve

conduzir e passar mais do que practicamente fintar, ou seja, não tem que o fazer! Não significa

que após um desarme, não possa fazer um drible mas tem de saber onde é que o deve fazer.

Normalmente, dentro do nosso sistema de jogo, os jogadores que normalmente vão driblar mais,

que normalmente vão estar em zonas onde podem driblar mais, onde se podem tornar mais

criativos são os pontas-de-lança, o jogador da posição 10 e os médios interiores e os laterais

pontualmente, ou seja, quando aparecem porque também, não devem estar, devem aparecer!

Caso vão 50 vezes não vão surpreender ninguém. Se forem 5 vezes, vão surpreender o

adversário. Aí também o pode fazer o central, o lateral um pouco como o central, em

determinadas zonas onde ele está muito tempo, não deve correr riscos, mesmo estando numa

posição que pode estar mais resguardado, mais protegido porque está num corredor e se a

equipa for bem organizada, pode colmatar melhor uma situação de risco, do que no corredor

central com um central ou mesmo às vezes com um médio defensivo, mas também, nessas

zonas não o deve fazer. Quando está em zonas mais adiantadas, quando já está practicamente

na terceira fase ou na finalização, aí também tem o seu à-vontade para o poder fazer e tem, não

autorização, mas está na zona onde o pode fazer, onde tem de decidir se vai cruzar, se vai

passar, se vai fazer uma combinação directa mas já está numa zona onde pode ser ele a ter

mais uma decisão. Há zonas em que só tem de ter uma decisão, é a decisão que faz parte de

um modelo de jogo, da nossa forma de jogar. Noutras zonas, há mais decisões para o nosso

modelo de jogo e então aí, é a escolha. Nós podemos dizer o caminho mas depois lá, é que o

jogador tem de o escolher.

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8.Anexos XVI

Nuno de Almeida – Então o que o Paulo pretende dentro do seu modelo de jogo

relativamente à criatividade, é que os seus jogadores saibam utilizar as zonas para

potenciar a criatividade de cada um.

Paulo Bento – Claro! Claro! Não só a criatividade... O que é importante é o que é que se

tem de fazer em cada zona! Daí, em termos ofensivos, tenho zero por cento de risco até ao

meio-campo... depende da zona que queiramos definir... por exemplo, pode ser 10 metros ou 15

metros mais à frente. Tenho cem por cento de risco ao pé da área do adversário. Aí posso ter

cem por cento de risco porque teoricamente, se lá chego com capacidade para ter risco é porque

chego normalmente bem. Então aí, devo ter. Ofensivamente e defensivamente a mesma coisa.

Eu defensivamente também tenho de saber o que faço em cada zona, ou seja, como é que

pressiono quando estou ao pé da área do adversário, como é que pressiono quando estou no

meio-campo e como é que pressiono quando estou perto da minha área. Os meus princípios

podem ser os mesmos mas a forma de os executar pode não ser a mesma, ou seja, eu posso

fazer contenção e cobertura ao pé da área do adversário ou contenção e cobertura ao pé da

minha área e não o faço da mesma forma. Devo manter-me agressivo nas duas zonas mas a

capacidade que eu tenho de ter para roubar a bola perto da área do adversário e o risco que eu

posso correr para roubar a bola ao pé da área do adversário, tem de ser maior do que aquele

que eu faço ao pé da minha área. Aí, aquilo que me interessa é defender a baliza, ou seja,

defender mesmo a baliza, enquanto do outro lado, eu posso querer e devo querer roubar a bola,

na nossa forma de jogar devemos querer roubar a bola. Ao pé da minha baliza, tenho de ter mais

cuidado por questões de bola parada, por várias situações. Quer ofensivamente, quer

defensivamente, eu tenho de saber sempre o que é que devo fazer em cada zona porque... às

vezes, na minha perspectiva é um erro, a questão da criatividade e da imprevisibilidade! Nós

dizemos sempre o que é que eu devo fazer com bola em cada zona, e sem bola tem porque nós

não jogamos só com bola, também jogamos sem ela...

Nuno de Almeida – Através de uma frase do Cruyff quando ele era treinador do

Ajax, afirmava que "Não é importante a equipa que ganha, mas sim ter um sistema que

ganhe!"... Qual é a sua opinião? Essa forma de pensar, a visão/filosofia, os princípios de

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8.Anexos XVII

jogo, são eles que ganham e não são os jogadores que ganham?!

Paulo Bento – São os jogadores porque interpretam o que se treina. O que eu digo é os

jogadores podem mudar, a equipa pode ficar... Quando compões um plantel, compões para jogar

de uma determinada forma e segundo as tuas ideias, segundo a cultura de um clube. Então,

aquilo que tu vais treinar é uma forma de jogar para ganhar e depois, tu ganhas com a forma de

jogar mas com os jogadores que interpretam a tua forma de jogar. Depois, se é com o A, B, C ou

D e no outro jogo, o A já não joga mas joga o Y, então... o teu objectivo é o mesmo, ganhar!

Ganhar com os outros jogadores mas com jogadores que são teus, com os jogadores do plantel,

jogadores que tu treinas todos para uma forma de jogar. Por isso, tu ganhas ou tentas ganhar

com os teus jogadores e a forma como tu os preparas no teu modelo de jogo, na tua forma de

jogar. Como tal, o que ganha é o todo. Ganha o teu treino, o teu jogo, os teus jogadores e a tua

ideia. Agora, eles ganham porque fazem passar a tua ideia ou tu ganhas porque eles

conseguiram fazer passar a tua ideia, ou seja, a tua forma de jogar! Aquilo que eles interpretam!

Eu acho que ele diz isso nesse sentido, se mudarmos a equipa mas jogarmos da mesma forma,

estamos mais perto de ganhar, ou seja, dentro do mesmo sistema de jogo porque os jogadores

estão preparados para isso e mesmo dentro do mesmo modelo de jogo porque os jogadores

também tão preparados para isso. Todos se prepararam para isso! Porque senão, cada vez que

houvesse uma alteração de jogadores, tivessemos de mudar o sistema de jogo era

extremamente complicado, aliás, eu diria praticamente impossível porque não há tempo para

trabalhar. Eu não partilho da opinião de que durante uma época, especialmente no caso do qual

estamos a falar, ou seja, de um Clube Grande, que há muito tempo para trabalhar vários

sistemas. Não partilho dessa opinião!

Nuno de Almeida – Para conjugar com a frase referida na pergunta anterior, que o

próprio Frank Rijkaard que era jogador do Cruyff dizia que: "Quando não ganhamos, o

Cruyff não abdica da sua visão, não abdica das suas ideias, não abdica de nada do que

nos mostrou, desde o início do processo", o que me faz pensar que é uma das

características fundamentais para quem treina, não abdicar da sua visão

independentemente dos resultados!

Paulo Bento – Se tens uma ideia, constróis uma ideia de jogo, levas os teus atleas a

defenir essa ideia de jogo e correndo um jogo, dois mal, tu vais dizer aos teus atletas que afinal

isto está tudo mal, vamos partir para outra! Depois perdes mais dois jogos e vamos voltar à

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8.Anexos XVIII

mesma... Não existe! Ou vamos ter mais uma terceira... Não existe! Isso não existe porque

senão, não conseguimos trabalhar... Se nós dizemos todos, Académicos ou os que não foram

Académicos, dizemos todos, isto vive de rotinas. Se vive de rotinas, se nós as mudarmos ao fim

de algum tempo, não as temos. Vamos ter de arranjar outras, e para arranjar outras demora

tempo. Por isso, não faz sentido nenhum mudar uma situação porque acontece um ou outro

percalço pelo caminho. Ou tu acreditas naquilo que constróís desde o início ou então, se

andarmos sempre a mudar, podemos ter nuances, podemos mudar jogadores, como temos dois

sistemas, podemos passar a jogar mais num do que noutro… Agora tudo isto dentro do modelo

de jogo! Pode até mudar o sistema de jogo mas não podes mudar o modelo porque não o

consegues fazer, os jogadores não vão conseguir interpretar num semana ou em duas semanas,

algo que trabalharam dois meses antes... Mas como nesses dois mês aconteceu um percalço ou

outro, eu em 15 dias vou querer mudar e vou querer que eles interpretem... É impossível! Pode

sair num jogo mas com continuidade, não sai.

Nuno de Almeida – Na sua opinião, o que é que pensa que é um equipa inteligente

e o que é que é a inteligência de um jogador dentro dessa equipa?

Paulo Bento – Uma equipa inteligente é uma equipa que sabe a todo o momento aquilo

que deve fazer, ou seja, que consegue controlar todos os momentos do jogo,... atenção que

pode ser uma equipa inteligente e que em determinados jogos, não o consiga fazer! Não há

nenhuma que o consiga fazer em todos os jogos da temporada... Uma equipa que seja

inteligente ou que seja uma boa equipa, é aquela que consegue controlar todos os momentos do

jogo ou dominar todos os momentos do jogo, e saber entender aquilo que o jogo está a pedir (As

perguntas que o jogo lhe faz!). Ou seja, se o jogo me está a pedir mais disto, eu tenho de ter a

capacidade para dar essa resposta e a equipa ao mesmo tempo, em função daquilo que o jogo

está a dar, saber inverter o rumo dos acontecimentos. Falavámos na Terça-Feira... Eu estou

cinco, seis minutos e a bola não consegue passar do meio-campo e a minha equipa, dentro da

minha forma de jogar, com a minha linha de quatro (defesas) está mais alta, não consegue

jogar... Mas estou ali cinco, seis minutos que só sai a bola e as vezes nem a bola sai... e a minha

equipa não consegue jogar sequer jogar 15, nem 20 metros. Então, tem que haver nesse

momento em que o jogo está a pedir outra coisa, que queiramos sair a jogar, por exemplo.

Temos de tomar outra acção, outra atitude no jogo para nos podermos colocar noutra zona onde

gostamos de estar mais, onde nos sentimos mais cómodos. Mas isso é entender o jogo, ou seja,

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8.Anexos XIX

é estar numa situação de Organização Defensiva durante muito tempo e sem sair em Transição

Ofensiva, e com um simples meter a bola fora e ganhar terreno, posso passar outra vez a jogar

em Organização Ofensiva e Transição Defensiva, que é aquilo que mais estou habituado e que

os jogadores mais estão habituados. Por isso, é saber controlar os quatro momentos do jogo. No

fundo é isto... E saber conviver com cada um deles, ser forte em cada um deles, ou seja, é ser-

se uma equipa inteligente, uma equipa boa, acima de tudo, uma equipa com capacidade mais do

que inteligente, é uma equipa com capacidade! Um jogador inteligente, é um jogador que define

melhor os quatro momentos do jogo. Quanto mais jogadores inteligentes houver nos quatro

momentos do jogo, mais forte é a equipa porque todos vão fazer as coisas com uma maior

capacidade e uma maior qualidade. O jogador que saiba, em determinado momento, fazer acção

que referi anteriormente, ou seja, estar a ver como é que o jogo está a decorrer e ser ele a

mandar nessa acção, ser um jogador que decida bem em determinados momentos. Por

exemplo, se estamos a perder muito a bola na Transição Ofensiva, guardá-la um bocadinho,

saber temporizar o jogo, saber em algum momento ganhar uma bola parada para que se possa

respirar... No fundo é, também, como a equipa tem de saber controlar e dominar os quatro

momentos do jogo, os jogadores também tem de o saber fazer. Quanto mais jogadores houver a

controlar e a dominar os quatro momentos do jogo, melhor a equipa o faz. Depois, o problema

disso muitas vezes tem haver com as características dos jogadores. Há jogadores que muitas

vezes a sua principal característica é de decisão, não é de temporização... Logo, no momento

em que a equipa não precisa de decidir mas precisar de temporizar, ou seja, o jogador acaba por

naquele momento não estar a ler bem o jogo para aquilo que a equipa precisa. A equipa precisa

de temporizar uma acção e aquilo que faz é acelerar essa acção, ou seja, eu estou a decidir

mais do que a temporizar, estou a ir sempre para a frente, estou a procurar sempre uma situação

de risco...

Nuno de Almeida – E aí, como é que o treinador intervém?

Paulo Bento – Não é fácil intervir! O treinador na minha opinião, tem muito tempo onde

pode intervir, que é durante a semana, no treino. Depois tem muito pouco tempo onde pode

intervir, que são 10 minutos no intervalo. Aí tem de se tentar gerir muitas das coisas que

acontecem em 90 minutos, tentar gerir o mais importante, aquilo que é mais determinante.

Durante a primeira parte ou a segunda parte, quando essas acções que estavamos a falar

anteriormente ocorrem com maior frequência, a única forma é tentar em alguma pausa, chamar

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8.Anexos XX

alguém ou num momento que haja, tentar enviar um feedback por algum jogador para fazermos

uma situação contrária àquilo que estamos a passar. Mas não é fácil com o jogo a decorrer,

chegar aos jogadores e, acima de tudo, se é uma acção muito colectiva, chegar aos jogadores

todos é impossível. E depois, por uma ideia que é passada a um jogador para passar ao outro,

não chega da mesma maneira e isso, muitas vezes, torna-se mais complicado chegar aos

jogadores durante o mesmo.

Nuno de Almeida – Quando surgem esses momentos que tem necessidade de

intervir, procura chamar alguns que lêem melhor, que interpretem melhor para que

consiga perceber melhor a mensagem?

Paulo Bento – Tentasse chamar um jogador e, acima de tudo, onde possa chegar. Tem

a ver com as características do jogador, não só em termos tácticos mas também, em termos de

personalidade, ou seja, de poder transmitir uma coisa em que os outros o ouçam. Depois, para

quem é a mensagem! Se é uma mensagem mais global ou mais individual. A mensagem

individual é mais fácil de fazer, apesar de poder não chegar da mesma maneira mas o passar

para um elemento, para uma situação ou outra em que o chamar atenção, corrigr ou elogiar o

que seja nesse momento. Depois a acção colectiva, tem haver também com a característica do

jogador, com a personalidade do jogador e com a posição do jogador. Eu passei por essa

experiência enquanto jogador, normalmente vinha por mim essa informação, e isso tem haver,

muitas vezes, com a posição que o jogador ocupa. Pela capacidade que a partir daí tem de dar a

informação mas, ao mesmo tempo, controlá-la.

Nuno de Almeida – Pela maneira como o Paulo fala de inteligência, a sua

inteligência é táctica, advém muito do que é que a equipa pretende para os quatro

momentos do jogo e como cada um interpreta esses quatro momentos, incorporando uma

lógica comum a todos. Quando eu lhe fiz a questão, o Paulo definiu-a como uma

inteligência táctica...

Paulo Bento – Claro! Uma inteligência para o jogo, ou seja, aquilo que o jogador tem de

saber para o jogo. O jogador leva as directrizes no início, daquilo que a gente julga ou pensa que

se vai passar. Então, formulámos uma estratégia que é comunicada e praticada mas... depois, o

jogo pode determinar outras coisas porque o adversário pode apresentar uma estratégia

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8.Anexos XXI

diferente, pode apresentar um sistema diferente porque nós não estamos a conseguir, mesmo

que tudo saia como o previsto, não estamos a conseguir pô-la em prática, por mérito do

adversário ou demérito nosso. E aí, senão estamos a conseguir pô-la em prática, por questões

técnicas, por questões tácticas ou por questões mentais, tem que se tentar que aconteçam

algumas situações em determinados jogadores, para que se possa fazer com que a equipa

consiga colocar em prática aquilo que estava pré-definido ou reajustar-se, em função daquilo que

o adversário nos está a colocar, sem mudar a nossa forma de jogar, sem mudar as nossas

características mas adaptando-nos um bocadinho ou usando outras armas em função daquilo

que o jogo nos está a pedir. Daí a inteligência ser uma inteligência táctica, ou seja, o

entendimento do jogo.

Nuno de Almeida – Específica para a nossa equipa…

Paulo Bento – Específica para a nossa equipa e em função daquilo que o adversário

está a fazer em determinado momento. O exemplo que eu dei há pouco… Se nos estão a

pressionar mais, ou seja, se nos está a tapar mais os corredores laterais, nós temos de sair mais

por dentro. Nós temos de ter uma estratégia em que nós digamos que vamos sair sempre por

fora, ou seja, a nossa 1ª fase de construção vai ser por fora porque entendemos que o

adversário nos vai tapar por dentro. E o adversário chega ao jogo e, nos primeiros 10 minutos,

não conseguimos sair por fora porque o adversário coloca lá dois. Tentar chegar ao jogador se

ele não está a conseguir fazê-lo, tentar chegar para lhe dizer para sair por dentro, para sairmos

de uma forma mais directa quando chegamos ao corredor. Tentar levar o jogador, dentro daquilo

que são os mecanismos do nosso modelo de jogo, tentar combater aquela situação, apelando a

alguns jogadores que comuniquem ou esperando, em alguns casos, como é evidente, que eles

consigam fruto dessa inteligência do jogo, readaptar-se ou adaptar-se aquilo que o jogo está a

dar naquele momento.

Nuno de Almeida – Para si o que é a Táctica? Como é que a define?

Paulo Bento – A táctica é, acima de tudo, o entendimento do jogo dentro dos quatro

momentos do mesmo. Eu saber o que é que faço em cada um. A táctica, mais do que o sistema,

apesar do sistema ser também importante, é a forma como as equipas se organizam, como os

jogadores utilizam os princípios de jogo dentro do modelo de jogo, ou seja, cada um dentro do

nosso sistema de jogo, como é que os jogadores utilizam os princípios de jogo para o modelo de

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

8.Anexos XXII

jogo. A táctica, acima de tudo, é o entendimento do jogo. A táctica é como é que cada jogador

participa em cada momento do jogo, para que a equipa compreenda e execute todos os

momentos do jogo da melhor forma. No fundo é entender o jogo! Quem percebe de táctica,

percebe de jogo, entende o jogo! Pois, quando entende o jogo, aplica em função dos seus

princípios e do seu modelo de jogo, que é o que treina. Mas, para se falar de táctica, fala-se de

entendimento do jogo.

Nuno de Almeida – Para si, qual é a diferença entre o sistema funcional e o

sistema dinâmico?

Paulo Bento – Eu não separo a dinâmica e o sistema. Um precisa do outro. Eu para

poder dinamizar um sistema tenho de saber qual é, de onde é que parto. Logo, eu tenho um

sistema para saber quais são os meus movimentos de partida. Depois, onde é que quero chegar,

já vai ser definido por outras coisas. Mas como é que eu parto, eu tenho de saber! De onde é

que parto, quando é que parto e depois, aonde vou chegar, já depende… depende do adversário

também. Mas a dinâmica do sistema é evidente que é importante porque não vamos jogar com

11 jogadores parados. Agora, também é verdade que não se pode dar dinâmica a uma coisa que

não se sabe o que é! Por isso é que eu digo que as duas coisas estão ligadas, ou seja, para mim

é importante o sistema, definir os princípios de jogo desse sistema, o que no fundo já estamos a

definir o modelo de jogo mas depois, a dinâmica é o que se lhe dá. Para mim as duas coisas são

importantes, ou seja, o sistema de jogo e a dinâmica porque ambas estão no modelo de jogo.

Nuno de Almeida – Anteriormente, definiu-me os seus jogadores em termos das

suas qualidades técnicas, tácticas e físicas… Agora, perguntava-lhe qual é o perfil de

jogador que pretende para o seu modelo de jogo em termos psicológicos, tendo em conta

todas as outras?

Paulo Bento – Eu penso que isso para qualquer modelo de jogo, há muitos traços não

de um jogador mas de todos os jogadores e aqui não importa a função. Há características que

são mais importantes para a função, ou seja, para a posição que ele joga, para a função que vai

desempenhar. E aqui só falando da parte mental, hoje em dia, a agressividade, a mentalidade, a

coragem e depois, uma coisa que eu acho que é boa mas que está a haver um pouco menos, a

solidariedade… A questão da solidariedade, não só no aspecto mental, ou seja, no aspecto do

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

8.Anexos XXIII

grupo, por exemplo, a coragem também tem a ver com o aspecto mental, têm de existir para

executar algo na tarefa, para executar algo em termos táctico-técnicos. A mentalidade é a

mesma coisa… Eu se for mentalmente forte, vou executar a minha tarefa seguramente melhor.

Eu se for mentalmente forte, consigo suportar certas e determinadas situações que ocorrem ao

longo de uma temporada, como por exemplo, não jogar, perder um jogo ou perder dois jogos

seguidos. E a solidariedade, fundamentalmente entre os jogadores… Essa para mim é que é

fundamental! Ou seja, entre eles, são aqueles que vão executar mais as tarefas, tem que haver

essa solidariedade. Isso para mim é que são os factores mais importantes em termos mentais de

um jogador, ou seja, a agressividade, a mentalidade, a coragem e a solidariedade. Depois

poderão haver outros que também sejam importante, tais como, confiança, personalidade,…

mas aí já estamos a falar mais em termos de qualidade. Normalmente, falamos muito de

confiança, de personalidade falamos muito para um jogador que gosta de ter a bola, que arrisca,

o que nem sempre é só nessas situações. Personalidade vem muito noutras situações

também… Vem muito em situações que não tem a bola, em situações fora do jogo!

Nuno de Almeida – Falamos do modelo, falamos do sistema, falamos a

importância que os jogadores possuem no reconhecimento e na identificação com o

modelo mas esquecemo-nos de falar de um ponto importante, ou seja, como é que o

Paulo se caracteriza como treinador? Tudo isto se deve a alguém como tal, como é que

caracteriza a sua estrutura, a sua equipa de trabalho?

Paulo Bento – Se quiseres ter um traço e aqui falo mais de equipa técnica, da parte do

treino. Depois há uma parte que ajuda nessa organização e que tem mais haver com questões

logisticas. Reportando-me só à questão da equipa técnica, que são aqueles que trabalhamos

todos diariamente porque há treinos a fazer, à situações a fazer todos os dias… Eu, numa

palavra, organizados. Numa palavra, organizados. Se fossemos falar de equipa técnica, mais do

que a questão individual de quais é que são as características do treinador, como equipa,

organizados. Acho que é o primeiro ponto que uma equipa técnica deve ter. Organização para

que cada um saiba o que tem de fazer, o que cada um leva para o treino também e depois, a

dinâmica. A dinâmica da equipa técnica está dentro da organização da equipa técnica, ou seja,

daí dizer o que é que vais fazer para o campo, o que é que vais fazer na primeira fase do treino,

na segunda fase do treino, quem o faz, como é que faz… Mas tem haver com o facto de estares

focado na primeira fase do treino, estar focalizado na sua tarefa. Os outros que não vão fazer,

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

8.Anexos XXIV

devem saber o que está a ser feito e devem estar focalizados no que se está a fazer. Quando

passamos para a segunda fase, inverte-se o papel, entra em acção outro colaborador, por

exemplo, mas o que deu a primeira fase também sabe o que é que vai ser feito e se também

tiver de fazer, faz… E depois, na última fase, em que entra, por exemplo, o treinador principal, os

outros sabem o que é que o treinador principal pensa e o que vai fazer. Por isso, eu digo

organizados! A dinâmica de uma equipa técnica está dentro da sua organização também.

Depois, solidários. Solidários e não falo só na questão dos resultados. Falo também na forma

como partilhas as coisas, como fazes as coisas em equipa. Se no campo queres que cada um

saiba o que tem de fazer e se aquele que vai executar uma tarefa, os outros sabem e estão

preparados para o fazer, tens de, em primeiro lugar, na preparação, dar oportunidade que todos

possam contribuir para isso, falar, colocar, até que chegamos a um consenso final. Depois a

decisão é mais solitária, é individual mas a partilha, tens de saber fazê-la.

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Em busca da conformidade entre o Modelo de jogo do treinador e a performance da equipa em Futebol. Estudo de caso do Sporting Clube de Portugal

8.Anexos XXV

Anexo 2: Folha de Registo dos Jogos Observados

Critério 1 – OOf – DESENVOLVIMENTO DA POSSE DE BOLA (Inicio e Desenvolvimento da

Organização Ofensiva)

Variáveis em Estudo na presente investigação

Nº de vezes que ocorrem

(1) OOfpc – Organização Ofensiva por passe curto

(2) OOfpl – Organização Ofensiva por passe longo

(3) OOfcd – Organização Ofensiva por condução

(4) OOfrc – Organização Ofensiva por recepção/controle

(5) OOfd – Organização Ofensiva por drible

(6) OOfdu – Organização Ofensiva por duelo

(7) OOfgr – Organização Ofensiva pelo guarda-redes

Método de Jogo Ofensivo (MJO)

(8) OOfca – Método de Jogo Ofensivo por Contra-Ataque

(9) OOfar – Método de Jogo Ofensivo por Ataque Rápido

(10) OOfap – Método de Jogo Ofensivo por Ataque Posicional

Critério 2 – FOOf – FINAL DA ORGANIZAÇÃO OFENSIVA (Finalização com ou sem eficácia)

Critério 2.1 – FOOfef – FINAL DA ORGANIZAÇÃO OFENSIVA COM EFICÁCIA

Variáveis em Estudo na presente investigação

Nº de vezes que ocorrem

(11) FOOfefrf – Final da Organização Ofensiva por remate fora

(12) FOOfefrd – Final da Organização Ofensiva por remate dentro

(13) FOOfefrad – Final da Organização Ofensiva por remate contra o adversário

(14) FOOfefgl – Final da Organização Ofensiva por golo (15) FOOfefof – Atingir o terço ofensivo de forma controlada

Critério 2.2 – FOOfsef – FINAL DA ORGANIZAÇÃO OFENSIVA SEM EFICÁCIA

Variáveis em Estudo na presente investigação

Nº de vezes que ocorrem

(16) FOOfsefbad – Recuperação da Posse de Bola pelo Adversário

(17) FOOfsefgrad – Recuperação da Posse de Bola pelo Guarda-Redes Adversário

(18) FOOfseff – Recuperação da Posse de Bola com lançamento para fora

(19) FOOfsefi – Recuperação da Posse de Bola por Infracção

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8.Anexos XXVI

Critério 3 – ITEAD – INÍCIO DA TRANSIÇÃO-ESTADO ATAQUE-DEFESA / PERDA DA

POSSE DE BOLA (Início da Transição Ataque-Defesa)

Variáveis em Estudo na presente investigação

(20) ZONAS 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12

Nº de vezes em que ocorrem

(21) ITEADime – Inicio da Transição-Estado Ataque-Defesa por pressão imediata

(22) ITEADprpb – Inicio da Transição-Estado Ataque-Defesa sabendo o número de jogadores que se encontram na zona perda da posse de bola

(23) ITEADpress – Inicio da Transição-Estado Ataque-Defesa sabendo o número de jogadores na zona de pressão

(24) ITEADtemp – Inicio da Transição-Estado Ataque-Defesa executando a temporização

Critério 4 – OD – DESENVOLVIMENTO DA ORG. DEFENSIVA (Posicionamento da Equipa)

Variáveis em Estudo na presente investigação

Nº de vezes que ocorrem

(25) ODnj – Número de Jogadores em Organização Defensiva

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8.Anexos XXVII

Critério 5 – ITEDA – INÍCIO DA TRANSIÇÃO-ESTADO DEFESA-ATAQUE / RECUPERAÇÃO

DA POSSE DE BOLA (Início da Transição Defesa-Ataque)

Variáveis em Estudo na presente investigação

(26) ZONAS 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12

Nº de vezes que ocorrem

(27) ITEDAi – Inicio da Transição-Estado Defesa-Ataque por intercepção

(28) ITEDAd – Inicio da Transição-Estado Defesa-Ataque por desarme

(29) ITEDAgr – Inicio da Transição-Estado Defesa-Ataque por acção do guarda-redes

(30) ITEDAp – Inicio da Transição-Estado Defesa-Ataque seguida de passe

Critério 6 – DTEDA – DESENVOLVIMENTO DA TRANSIÇÃO-ESTADO DEFESA-ATAQUE

(Desenvolvimento da Transição)

Variáveis em Estudo na presente investigação

Nº de vezes que ocorrem

(31) DTEDApc – Desenvolvimento da Transição-Estado Defesa-Ataque por passe curto

(32) DTEDApl – Desenvolvimento da Transição-Estado Defesa-Ataque por passe longo

(33) DTEDAcd – Desenvolvimento da Transição-Estado Defesa-Ataque por condução

(34) DTEDArc – Desenvolvimento da Transição-Estado Defesa-Ataque por recepção/controle

(35) DTEDAd – Desenvolvimento da Transição-Estado Defesa-Ataque por drible

(36) DTEDAdu – Desenvolvimento da Transição-Estado Defesa-Ataque por duelo

(37) DTEDAgr – Desenvolvimento da Transição-Estado Defesa-Ataque pelo guarda-redes

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7.Anexos XXVIII

Anexo 3: Jogos Observados e respectivos resultados

Sporting Clube de Portugal – Época 2008/2009

23ª

Jornada

24ª

Jornada

25ª

Jornada

26ª

Jornada

27ª

Jornada

28ª

Jornada

29ª

Jornada

30ª

Jornada

0 - 1

3 - 1

1 - 2

2 - 1

0 - 0

2 - 1

1 - 2

3 - 1