Ensaios Sobre Consórcios Intermunicipais de Saúde

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     ENSAIOS SOBRE CONSÓRCIOS INTERMUNICIPAIS DE SAÚDE : Financiamento, Comportamento Estratégico, Incentivos e Economia Política Luciana da Silva Teixeira 2007

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Consórcios Intermunicipais

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    Teixeira, Luciana da Silva. Ensaios sobre consrcios intermunicipais de sade : financiamento,comportamento estratgico, incentivos e economia poltica / Luciana daSilva Teixeira. Braslia : Cmara dos Deputados, Coordenao de Publicaes, 2007. 128 p. (Srie temas de interesse do legislativo ; n. 11)

    Orientador: Maurcio Soares Bugarin. Originalmente apresentada como tese da autora (doutorado Universidadede Braslia, Departamento de Economia). ISBN 85-7365-480-5

    1. Municipalizao da sade, Brasil. 2. Servio de sade, Brasil. 3. Consrcio intermunicipal, aspectos econ micos, Brasil. I. Ttulo. II. Srie.

    CDU 614(81)

    ISBN 85-7365-480-5

    SrIETemas de interesse do legislativo

    n. 11

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  • Aos meus filhos, Bruno e Diogo.

  • sumrio

    Prefcio............................................................................................................................................................................... 11

    introduo.......................................................................................................................................................................... 15

    caPtulo.1..os.cis.e.o.sus:.os.consrcios.intermuniciPais.no.sistema.nico.de.sade......................................... 19resumo................................................................................................................................................................................................. 20

    introduo........................................................................................................................................................................................... 20

    i..conceitualizao............................................................................................................................................................................. 21

    ii..o.sistema.de.sade.brasileiro........................................................................................................................................................ 23

    iii..descentralizao.das.aes.de.sade......................................................................................................................................... 25

    iV..rePartio.de.comPetncias.e.resPonsabilidades.no.sus........................................................................................................... 30

    iV.1.comPetncias.das.trs.esferas.federadas........................................................................................................................... 31

    iV.2.resPonsabilidades.das.condies.de.gesto.do.sus.......................................................................................................... 32

    V..financiamento.do.sus.................................................................................................................................................................... 34

    Vi..Perfil.dos.consrcios.intermuniciPais.de.sade........................................................................................................................ 37

    Vii..financiamento.dos.consrcios.intermuniciPais.de.sade........................................................................................................ 38

    Vii.1.transferncias.federais...................................................................................................................................................... 39

    Vii.2.contribuies.estaduais..................................................................................................................................................... 40

    Vii.3.ParticiPao.municiPal........................................................................................................................................................ 42

    Viii..concluses.................................................................................................................................................................................. 44

    caPtulo.2..consrcios.intermuniciPais.de.sade:.uma.anlise..luz.da.teoria.dos.jogos........................................ 47resumo................................................................................................................................................................................................. 48

    introduo........................................................................................................................................................................................... 48

    i..o.modelo.bsico............................................................................................................................................................................... 51

    i.1.descrio.do.jogo................................................................................................................................................................... 51

    i.2.a.funo.de.Produo.de.sade............................................................................................................................................. 52

    i.3.a.utilidade.do.Poltico........................................................................................................................................................... 54

    i.4.a.restrio.oramentria....................................................................................................................................................... 56

    i.5.os.estados.da.natureza........................................................................................................................................................... 57

    i.6.a.forma.extensiVa.do.jogo...................................................................................................................................................... 58

    ii..modelo.1:.com.Punio.................................................................................................................................................................. 60

    iii..modelo.2:.sem.Punio................................................................................................................................................................. 64

    iV..um.PaPel.Para.a.natureza............................................................................................................................................................... 68

    V..outras.extenses............................................................................................................................................................................. 69

    V.1.formato.do.jogo.no.Primeiro.Perodo................................................................................................................................... 69

    V.2.simetria.na.Possibilidade.de.abandonar.o.consrcio........................................................................................................... 69

    V.3.simetria.na.funo.de.utilidade.dos.Prefeitos.................................................................................................................... 70

    V.4.jogo.infinitamente.rePetido................................................................................................................................................... 70

    V.5.fator.de.desconto.intertemPoral......................................................................................................................................... 71

    Vi..concluso...................................................................................................................................................................................... 71

    caPtulo.3..incentiVos.em.consrcios.intermuniciPais.de.sade:.uma.abordagem.sob.a.tica.da.teoria.dos.contratos............................................................................................................................................................................ 75

    resumo................................................................................................................................................................................................. 76

    introduo........................................................................................................................................................................................... 76

    i..modelo.bsico.................................................................................................................................................................................. 79

    i.1.elementos.do.modelo............................................................................................................................................................. 79

    i.2.resultados............................................................................................................................................................................... 81

  • ii..incentiVo.financeiro.dos.goVernos.federal.e/ou.estaduais......................................................................................................... 82

    ii.1.o.Problema.do.goVerno......................................................................................................................................................... 82

    ii.2.o.clculo.das.funes.de.utilidade.indireta...................................................................................................................... 83

    ii.3.a.soluo.do.Problema.do.goVerno..................................................................................................................................... 85

    ii.4.um.exemPlo............................................................................................................................................................................ 86

    iii..Commitment.entre.municPios........................................................................................................................................................ 88

    iV..um.modelo.hbrido......................................................................................................................................................................... 90

    V..concluso........................................................................................................................................................................................ 92

    caPtulo.4..efeito.da.heterogeneidade.entre.municPios.sobre.a.formao.de.consrcio.intermuniciPal.de.sade... 95resumo................................................................................................................................................................................................. 96

    introduo........................................................................................................................................................................................... 96

    i..ProViso.autrquica.de.serVios.de.sade...................................................................................................................................... 99

    i.1.comPetio.Pr-eleitoral...................................................................................................................................................... 99

    i.2.o.municPio.e.seus.eleitores................................................................................................................................................... 99

    i.3.equilbrio.eleitoral.............................................................................................................................................................. 100

    ii..ProViso.consorciada.do.bem.Pblico.sade........................................................................................................................... 102

    ii.1.consrcio.intermuniciPal.de.sade................................................................................................................................... 102

    ii.2.funo.de.Produo.de.sade............................................................................................................................................ 103

    ii.3.negociao........................................................................................................................................................................... 104

    ii.4.efeitos.sobre.o.gasto.em.sade.......................................................................................................................................... 105

    iii..anlise.de.bem-estar:.que.consrcios.sero.formados?.......................................................................................................... 107

    iii.1.comPetio.Pr-eleitoral:.a.economia.Poltica.na.formao.de.consrcios...................................................................... 107

    iii.2.consrcio.de.municPios.homogneos.............................................................................................................................. 108

    iii.3.consrcio.de.municPios.com.Preferncias.homogneas.e.rendas.distintas.................................................................. 108

    iii.4.consrcio.de.municPios.com.rendas.homogneas.e.Preferncias.distintas.................................................................. 110

    iii.5.consrcio.de.municPios.com.rendas.e.Preferncias.distintas....................................................................................... 110

    iii.6.que.consrcios.sero.formados?..................................................................................................................................... 110

    iV..concluso..................................................................................................................................................................................... 112

    concluso..um.roteiro.Para.Pesquisas.futuras........................................................................................................... 117

    referncias....................................................................................................................................................................... 123

  • Listagem de iLustraes

    tabelas

    tabela.1:.brasil:.estimatiVa.do.gasto.nacional.em.sade..2003..................................................................................................... 24

    tabela.2:.municPios.consorciados.e.total.de.municPios.brasileiros,.segundo.faixa.PoPulacional..2002................................ 37

    tabela.3:.distribuio.de.municPios.consorciados,.segundo.decil.de.renda..2002.................................................................... 37

    tabela.4:.dados.estaduais:.transferncias.do.sus.e.desPesas.com.inVestimento.sobre.a.desPesa.total.e.recursos.PrPrios.

    aPlicados.em.sade..2004.................................................................................................................................................................. 40

    tabela.5:.dados.municiPais.Por.faixa.PoPulacional:.transferncias.do.sus.e.desPesas.com.inVestimento.sobre.a.desPesa.total.

    e.recursos.PrPrios.aPlicados.em.sade..2004................................................................................................................................ 43

    tabela.6:.transferncias.per Capita.sus.e.constitucionais,.segundo.o.tamanho.do.municPio..2003...................................... 103

    tabela.7:.renda.per Capita.e.decis.de.renda.de.municPios.consorciados.e.no.consorciados.Por.diretoria.regional.de.sade.

    (drs).do.estado.de.minas.gerais..1999....................................................................................................................................... 113

    quadros

    quadro.1:.ParticiPao.do.estado.do.mt.no.financiamento.de.alguns.cis..2003.................................................................... 42

    figuras

    figura.1:.a.forma.extensiVa.do.jogo.no.Primeiro.Perodo................................................................................................................ 58

    figura.2:.o.jogo.no.segundo.Perodo.sem.formao.de.consrcio................................................................................................. 59

    figura.3:.o.jogo.no.segundo.Perodo.com.formao.de.consrcio................................................................................................ 60

    figura.4:.ordenao.temPoral.......................................................................................................................................................... 81

  • Prefcio

  • Ensaios sobre Consrcios Intermunicipais de Sade12

    Em meio s vicissitudes caractersticas do dia-a-dia daqueles que escolheram a carreira aca-dmica, desponta a enriquecedora experincia de participar do processo de desenvolvimento aca-dmico daqueles alunos que ingressam em nosso universo formal. Com muitas indagaes sobre o mundo que os cerca, mas com poucas ferramentas para analis-las, vo pouco a pouco aprendendo como responder a essas questes de forma cada vez mais depurada e concluem seu programa de estudos com muitos instrumentos, algumas respostas, mas, sobretudo, com um entendimento pro-fundo dos problemas que geraram as questes originais. Tal qual um pai que acompanha o cresci-mento de seu filho, acompanhar o amadurecimento acadmico dos alunos enche o professor de um sentimento de profunda realizao.

    Pela sua vivacidade, dedicao, originalidade e profundidade de pensamento, a Luciana me permitiu desfrutar, no processo de orientao de sua tese de doutorado, de uma das experincias mais gratificantes de minha carreira acadmica. Tudo comeou num curso avanado de Teoria dos Jogos que lecionei no Departamento de Economia da Universidade de Braslia e que, aps algumas semanas de aula teve seu corpo discente reduzido pela metade. Luciana foi uma aluna participa-tiva, perspicaz, intuitiva, capaz de dar com brilho aquele difcil passo que separa a teoria de suas aplicaes relevantes. Ao trmino da disciplina Luciana elaborou trabalho de investigao sobre os incentivos adversos na formao e na sustentabilidade dos consrcios intermunicipais de sade no Brasil. O estudo mostra que a possibilidade de usufruir os benefcios do consrcio sem, no entanto, pagar para a sua manuteno financeira, cria incentivos inadimplncia por parte dos municpios-membros, o que pode, em ltima instncia, tornar a instituio insustentvel. Esse trabalho foi o embrio do segundo captulo da tese agora publicada.

    Em seguida, j formalmente como minha orientanda, Luciana cursou a disciplina de Econo-mia da Informao e dos Incentivos, que permitiu a elaborao de um modelo do tipo Principal-Agente para caracterizar os problemas de incentivos com os quais se defrontam os membros de consrcios intermunicipais de sade, e apresentar sugestes para resolver esses problemas. Grande nfase dada nesse trabalho para o papel do governo central no como um mero fornecedor de re-cursos, mas como regulador das relaes intergovernamentais em um pas federativo. A abordagem inovadora desse trabalho, cuja verso final constitui o terceiro captulo do presente livro, foi laurea-da no Primeiro Prmio de Teses e Dissertaes em Economia da Sade, organizado pela Associao Brasileira de Economia da Sade (ABrES).

    A disciplina seguinte, de Economia Poltica, ofereceu o instrumental necessrio para uma an-lise aprofundada sobre quais caractersticas dos municpios tornam mais provvel a formao e a sustentabilidade dos consrcios. O estudo evidencia a dificuldade em se formar consrcios quando h grande heterogeneidade entre os municpios envolvidos, prevendo que apenas se associaro consrcios envolvendo municpios de tamanho e viso compatveis sobre a importncia do investimento em sade. O trabalho resultante, que constitui o quarto captulo deste volume, recebeu o primeiro lugar no Pr-mio em Economia da Sade, organizado conjuntamente pelo Ministrio da Sade, pela ABrES, pelo DFID (Departamento para o Desenvolvimento Internacional do governo Britnico) e pelo IPEA.

    A premiada tese que agora se transforma em livro foi completada por uma cuidadosa descrio e anlise do Sistema nico de Sade e sua relao com os consrcios intermunicipais de sade.

  • 13

    Ao longo do presente estudo, o uso cuidadoso e inovador da teoria econmica positiva permi-tem uma anlise objetiva, coerente e aprofundada dos consrcios intermunicipais de sade, fugindo das respostas fceis das discusses superficiais. Alm disso, o estudo dos consrcios reflete uma das principais preocupaes do momento na rea de polticas pblicas, qual seja a alocao eficiente do gasto pblico, e pode ser estendido para qualquer tipo de organizao horizontal voluntria, prece-dendo inclusive a recentemente aprovada lei dos consrcios pblicos.

    Segundo o economista francs do sculo passado, Georges Elgozy, Un problme politique est un problme conomique sans solution. A instabilidade institucional atual das parcerias inter-governamentais claramente um problema poltico oriundo de um problema econmico de estrutu-ras organizacionais mal desenhadas. O presente trabalho apresenta importante contribuio para a soluo desse problema, sendo, portanto, de grande utilidade no somente para aqueles interessa-dos em definir estruturas organizacionais eficientes para o uso de recursos pblicos em sade, mas tambm nas mais diversas reas de interesse do setor pblico como educao, segurana, transpor-tes, servio social.

    Maurcio Bugarin

    Prefcio

  • Introduo

  • Ensaios sobre Consrcios Intermunicipais de Sade16

    Um dos pilares da reforma sanitria brasileira materializada na Constituio Federal de

    1988 e aprofundada pela Lei Orgnica da Sade , a descentralizao das aes e servios de sade

    surge como forma de racionalizar e imprimir maior eficincia ao sistema de sade. A adaptao dos

    servios s condies locais, a maior participao da populao na tomada de decises e o incre-

    mento da eficincia alocativa so alguns dos resultados positivos almejados por esse processo.

    A transferncia de responsabilidades, especialmente no tocante execuo de funes sociais,

    da Unio para estados e, principalmente, para municpios tem se deparado, no entanto, com defici-

    ncias organizacionais e financeiras das instncias subnacionais de governo, bem como com inefi-

    cincias devido a perdas de escala e de escopo decorrentes da excessiva fragmentao dos servios

    de sade. A perda de escala produtiva, resultante do incremento no nmero de estabelecimentos

    muitas vezes com baixa taxa de ocupao e de equipamentos, sem que houvesse base quantitativa

    que o justificasse, gerou sistemas de sade ineficientes e reduo da qualidade dos servios presta-

    dos populao.

    Como forma de superar essas dificuldades e recobrar no s escala produtiva como financeira

    adequadas, j na dcada de 80 municpios brasileiros se uniram para prover servios por meio de

    Consrcios Intermunicipais de Sade (CIS). Assim, podem-se considerar os consrcios como um

    subproduto do processo de municipalizao da sade no Brasil.

    Esse movimento, que contou com perodos de deliberado incentivo por parte do Ministrio da

    Sade e de algumas Secretarias Estaduais de Sade, vem crescendo ao longo das ltimas dcadas.

    Em 1999, mais de 35% dos municpios brasileiros participavam dessa forma de gesto inovadora

    do SUS. Apesar de alguns grupos de pesquisadores brasileiros terem se dedicado ao tema, essa

    marcante realidade no cenrio da sade no Brasil continua a merecer uma anlise econmica mais

    aprofundada.

    Este livro pretende contribuir para o desenvolvimento de tal anlise. Por serem associaes

    espontneas e voluntrias de municpios que resolvem se unir para gerir e prover conjuntamente ser-

    vios de sade, problemas de incentivo e de economia poltica surgem quando se analisa a formao

    e sustentabilidade poltico-financeira dos consrcios. Para garantir a sobrevivncia e estabilidade

    dessas associaes necessrio analisar que tipos de municpios so mais suscetveis formao da

    parceria e os mecanismos de incentivos a serem implementados para assegurar esses objetivos.

    A fim de analisar essas questes, o livro foi desenvolvido em quatro captulos. O primeiro

    captulo traa um perfil dos CIS no mbito do Sistema nico de Sade (SUS). Essas associaes

    so, em sua grande maioria, formadas por municpios de pequeno porte e renda mdia e alta. No

    se configuram como gestoras dos sistemas municipais de sade e, portanto, no possuem respon-

    sabilidades e prerrogativas prprias. A direo nica dos sistemas municipais de sade continua,

    portanto, a cargo dos municpios. Os consrcios so apenas uma nova forma de organizar e prover

    servios de sade mediante a conjugao de recursos financeiros, tecnolgicos, materiais e huma-

    nos. Sendo assim, nesse captulo analisada a questo federativa no setor sade as responsabili-

  • Introduo 17

    dades, os requisitos e as prerrogativas de cada esfera de governo. Ainda no captulo1 so descritas

    as fontes de financiamento dos consrcios: transferncias federais para municpios, contribuies

    estaduais e participaes municipais.

    O segundo captulo analisa, por meio de um modelo formal de teoria dos jogos, compor-

    tamentos estratgicos de prefeitos e suas repercusses sobre a viabilidade poltico-financeira de

    consrcios. Os resultados do estudo mostram que a formao e a sustentabilidade dessas parcerias

    dependem dos ganhos resultantes do consorciamento e da adoo de mecanismos de punio a

    municpios inadimplentes (free riders). Quando esses instrumentos no esto disponveis, essas as-

    sociaes podem ser ameaadas.

    Sendo assim, torna-se necessrio desenvolver novos mecanismos de incentivos que garantam a

    criao e manuteno de consrcios. O estudo desenvolvido no terceiro captulo analisa, sob a tica da

    teoria dos contratos, o papel do Estado para resolver o problema do free rider de forma crvel.

    Por fim, o captulo quatro desenvolve modelos de competio pr-eleitoral na esfera local com

    o objetivo de analisar efeitos da heterogeneidade entre os municpios relativos renda, poder de

    barganha dos prefeitos e preferncias dos eleitores sobre a formao dos consrcios. Tendo sido

    resolvido o problema do free rider, estuda-se mais uma possvel fonte de instabilidade para a criao

    de consrcios e identifica-se que tipos de municpios tendem a se consorciar. Sugere-se que ir haver

    formao de consrcios heterogneos justamente quando o municpio mais rico deseja reduzir o

    gasto em sade, e o municpio mais pobre deseja increment-lo.

    O livro pretende, assim, contribuir para a discusso sobre os Consrcios Intermunicipais de

    Sade com base em fundamentos tericos propiciados pelas teorias das parcerias e da competio

    eleitoral, aliados a modelos formais de teoria dos jogos e teoria de contratos. Ao longo do livro, os

    resultados tericos obtidos sero pontuados pela anlise dos ditames da Lei dos Consrcios, aprovada

    em 6 de abril de 2005, que dispe sobre normas gerais para a Unio, os estados, o Distrito Federal e os

    municpios contratarem consrcios pblicos para a realizao de objetivos de interesse comum.

  • Captulo 1

    Os CIs e O sUs: Os COnsrCIOs IntermUnICIpaIs nO sIstema nICO de sade

  • Ensaios sobre Consrcios Intermunicipais de Sade20

    resumo

    O captulo traa o perfil dos Consrcios Intermunicipais de Sade (CIS) no Brasil, principal-

    mente no tocante a seus aspectos econmico-financeiros. Por serem associaes de municpios e no

    se configurarem, portanto, como uma nova instncia de governo, analisa-se o papel desses entes no

    mbito do Sistema nico de Sade (SUS) e de seu relacionamento com as demais esferas federadas

    a fim de compreender os mecanismos de funcionamento e atuao dessas associaes. Quanto ao

    financiamento dos CIS, descrevem-se os fluxos de transferncias federais, de contribuies estadu-

    ais e das participaes municipais no custeio de aes e servios prestados pelos consrcios.

    introduo

    Para cumprir com as responsabilidades atribudas aos municpios pela Constituio Federal

    de 1988 e pela legislao infraconstitucional no tocante execuo de aes e servios de sade, v-

    rias municipalidades, a partir da dcada de 80, resolveram se unir para formar Consrcios Intermu-

    nicipais de Sade (CIS). No final da dcada de 90, mais de dois mil municpios j se encontravam

    consorciados e atendiam a cerca de 20% da populao brasileira.

    Essas parcerias foram criadas com inmeras finalidades: ampliar a oferta de servios de sa-

    de, melhorar o acesso da populao a esses servios e aes, propiciar maior articulao poltica

    entre as localidades consorciadas, organizar a referncia ambulatorial e hospitalar e promover in-

    vestimentos em infra-estrutura, equipamentos e insumos, entre outras1. De maneira geral, verifica-se

    atuao significativa dos consrcios na proviso de servios secundrios e tercirios de sade.

    Essa nova realidade na gesto do SUS suscitou o desenvolvimento de uma linha de pesquisa

    que visa a analisar aspectos econmico-financeiros dessas associaes.

    A fim de traar um perfil dos CIS no Brasil, este primeiro captulo trata da insero dos CIS

    no mbito do SUS. Para tanto, preciso estudar o papel desempenhado pelos entes constituintes

    os municpios no sistema de sade brasileiro e o relacionamento destes com as demais esferas

    federadas, fundamentado por um arcabouo legal que disps sobre a implementao do SUS e que

    aprofundou o processo de descentralizao da sade. Mais especificamente, o captulo pretende

    mapear as principais fontes de financiamento dos consrcios.

    Para alcanar essas metas, o captulo foi estruturado em oito sees. Na primeira, define-se

    o que vem a ser um consrcio, independentemente de sua rea de atuao, e, posteriormente, o

    que so os Consrcios Intermunicipais de Sade. Para situar o CIS no mbito do sistema de sade

    brasileiro, a seo II apresenta uma breve caracterizao do SUS. A terceira seo apresenta, por

    meio da anlise das diversas leis e normas que regem o setor de sade, a evoluo do processo de

    1 Lima & Pastrana (2000).

  • Captulo 1 Os CIS e o SUS: os consrcios intermunicipais no Sistema nico de Sade 21

    descentralizao. A seo IV sintetiza as principais tendncias desse processo, as competncias das

    trs esferas federadas e as responsabilidades das diferentes condies de gesto do SUS. Finalmen-

    te, a seo V fornece um panorama do financiamento do SUS, especialmente dos mecanismos de

    transferncia de recursos da Unio para estados e municpios.

    Tendo sido analisados o contexto, as responsabilidades e prerrogativas municipais, a seo

    VI apresenta o perfil dos CIS, principalmente em seus aspectos econmico-financeiros. A seo se-

    guinte trata especificamente do financiamento dos consrcios. Estudam-se suas trs fontes bsicas:

    recursos provenientes de transferncias federais para os municpios envolvidos; recursos oriundos

    das Secretarias Estaduais de Sade; e recursos de quotas municipais. As concluses so apresenta-

    das na seo VIII.

    i. ConCeituaLizao

    Vrias so as tentativas de conceituar consrcios. Lima (2000) cita diversos autores e suas

    definies, entre elas:

    Consrcio (...) implica a idia de associao, ligao, unio e, no mbito das relaes

    intermunicipais, nada mais apropriado do que a formao de entidades visando o estudo, o

    acompanhamento, o diagnstico das solues que, via de regra, envolve municpios limtrofes

    e com problemas que se identificam numa ordem cada vez mais crescente, em funo de forte

    demanda dos administrados (Torres, 1995).

    Consrcio um acordo administrativo para realizar servios de interesse recproco de en-

    tidades pblicas, sempre da mesma espcie, e organizaes particulares, em mtua colaborao

    (Meirelles, 1996).

    Das definies, depreende-se que os consrcios so uma forma de cooperao entre dois ou

    mais municpios que se unem para realizar determinadas aes de interesse comum. Como ser

    visto mais adiante, a Lei dos Consrcios Lei no 11.107, de 6 de abril de 2005 prev a associao

    entre diferentes entes federados e no apenas entre municpios, prtica aceita anteriormente. Dentre

    as aes desempenhadas por consrcios, destaca-se a formao de parcerias para a execuo de

    aes de saneamento, para instalaes de energia eltrica, construo de estradas e para a realizao

    de atividades de proteo, promoo e recuperao da sade.

    Os primeiros consrcios de sade no Brasil foram criados ainda na dcada de 80, impulsiona-

    dos pelo processo de descentralizao, mas foi na dcada de 90 que eles se multiplicaram por todo

    o pas e, principalmente, pela regio Sudeste. At 1999, segundo dados do IBGE, 2.040 municpios

    haviam se unido por meio de Consrcios Intermunicipais de Sade.

  • Ensaios sobre Consrcios Intermunicipais de Sade22

    2 Ministrio da Sade (1997), p. 23.

    A possibilidade de estabelecer mecanismos e instrumentos de coordenao e cooperao en-

    tre entes federados para a proviso de servios pblicos foi introduzida pela Emenda no 19, de 1998,

    que implementou a reforma Administrativa e deu nova redao ao art. 241 da Constituio Federal.

    Tal artigo estabelece, in verbis, que:

    Art. 241. A Unio, os Estados, o Distrito Federal e os Municpios disciplinaro por meio

    de lei os consrcios pblicos e os convnios de cooperao entre os entes federados, autorizando

    a gesto associada de servios pblicos, bem como a transferncia total ou parcial de encargos,

    servios, pessoal e bens essenciais continuidade dos servios transferidos.

    Na rea da sade, dispositivos da Lei Orgnica da Sade composta pelas Leis no 8.080 e no

    8.142, ambas de 1990 fazem meno aos consrcios. Em seu artigo 10o, a Lei no 8.080 estabelece que:

    Art. 10o Os municpios podero constituir consrcios para desenvolver, em conjunto, as

    aes e os servios de sade que lhe correspondam.

    Pargrafo 1o Aplica-se aos consrcios administrativos intermunicipais o princpio de

    direo nica, e os respectivos atos constitutivos disporo sobre sua observncia.

    Pargrafo 2o No nvel municipal, o Sistema nico de Sade (SUS) poder organizar-se

    em distritos de forma a integrar e articular recursos, tcnicas e prticas voltadas para a cobertura

    total das aes de sade.

    J o artigo 18 dessa mesma lei determina que os municpios podero formar consrcios ad-

    ministrativos intermunicipais (inciso VII). Tambm a Lei no 8.142/90 faz referncia aos consrcios.

    No pargrafo 3o do artigo 3o, autoriza os municpios a formarem consrcios para execuo de aes

    e servios de sade.

    Em que pesem as menes e previses legais para a criao de consrcios, a instituio de me-

    canismos para a gesto associada de servios ficou pendente de regulamentao por mais de cinco

    anos. Para preencher essa lacuna, foi editada a Lei no 11.107, de 6 de abril de 2005, que dispe sobre

    normas gerais para a Unio, os estados, o Distrito Federal e os municpios contratarem consrcios

    pblicos para a realizao de objetivos de interesse comum.

    Cabe notar que os CIS no se configuram como uma nova instncia no mbito do estado, in-

    termediria ao municpio. Portanto, segundo documento do MS2, no gestor de nenhum Sistema

    Municipal de Sade, no um centralizador de recursos, no interfere na autonomia municipal e

    no substitui as responsabilidades e competncias do gestor estadual e municipal.

    Sendo assim, para compreender seus mecanismos de financiamento e atuao, torna-se ne-

    cessrio contextualizar os CIS no mbito do SUS. Cabe, portanto, relacionar as competncias,

  • Captulo 1 Os CIS e o SUS: os consrcios intermunicipais no Sistema nico de Sade 23

    responsabilidades e condies de gesto desses entes federados no sistema pblico de sade. Alm

    disso, a fim de compreender a sistemtica de financiamento dessas parcerias, cabe descrever os cri-

    trios de repasse de recursos federais para estados e municpios, as contribuies dos estados para

    os CIS e as participaes dos municpios integrantes de consrcios.

    ii. o sistema de sade brasiLeiro

    Com o advento da Constituio de 1988, o sistema de sade brasileiro passou a ser formado, ba-

    sicamente, por um segmento pblico, denominado Sistema nico de Sade (SUS), que de acesso uni-

    versal e gratuito, e um segmento privado autnomo, onde predominam operadoras de planos e seguros

    de sade, cujos servios so custeados diretamente pelas famlias ou em conjunto com empresas3.

    O SUS constitudo pelo conjunto de aes e servios de sade prestados por rgos e ins-

    tituies pblicas federais4, estaduais e municipais. A iniciativa privada participa do SUS como

    prestadora de servios, mediante contratos.

    Em concordncia com as novas diretrizes constitucionais, a Norma Operacional Bsica no

    01/93 iniciou o processo de transferncia da gesto das aes de sade para estados e municpios,

    aprofundado, em 1996, pela Norma Operacional Bsica do SUS no 01/96 (NOB-SUS 01/96).

    Mais recentemente, em 2001, com a aprovao da Norma Operacional Bsica de Assistncia

    Sade do SUS no 01/01 (NOAS-SUS 01/01) e, em 2002, com a edio da Norma Operacional da

    Assistncia Sade do SUS no 01/02 (NOAS-SUS 01/02), foram estabelecidas novas diretrizes para

    o processo de descentralizao, por intermdio de um processo de regionalizao assistencial.

    Em linhas gerais, a Norma Operacional de Assistncia Sade (NOAS) no 01/01 do SUS se

    propunha a: (i) ampliar as responsabilidades dos municpios com relao ateno bsica ao criar

    a Gesto da Ateno Bsica Ampliada (GPABA); (ii) regionalizar a assistncia por meio da implan-

    tao de distritos assistenciais e microrregies de sade; (iii) criar mecanismos para fortalecer a

    capacidade de gesto do SUS; e (iv) proceder atualizao dos critrios de habilitao de estados

    e municpios nas formas de gesto descentralizada. Uma anlise mais detalhada da NOAS 01/01, e

    tambm das principais modificaes propostas pela NOAS-SUS 01/02, ser apresentada adiante.

    Outra caracterstica do SUS a nfase dada participao da sociedade. A participao comuni-

    tria e o controle da sociedade (accountability mechanisms), nos mbitos federal, estadual e municipal, so

    assegurados pelos Conselhos de Sade, que contam com a participao paritria de representantes dos

    usurios (50%) e do Estado, prestadores de servios e trabalhadores da sade (50%). Ademais, de quatro

    em quatro anos so realizadas Conferncias Nacionais de Sade, tambm de composio paritria.

    3 Segundo dados da Pesquisa Nacional de Amostra de Domiclios (PNAD) 1998, do IBGE, cerca de 38,7 milhes de pessoas (24,5% da populao brasileira) esto vinculadas a alguma forma de plano e seguro de sade. 4 A partir de 1988, os servios mdico-assistenciais da Previdncia Social passaram competncia administrativa do Ministrio da Sade, dos estados e dos municpios.

  • Ensaios sobre Consrcios Intermunicipais de Sade24

    5 Excludos os gastos com planos e seguros de sade. Os principais itens de gastos so medicamentos e tratamento odontolgico.

    As principais fontes de financiamento do gasto pblico em sade so, no mbito da Unio,

    contribuies que incidem sobre o faturamento (Contribuio para o Financiamento da Segurida-

    de Social COFINS) e lucro lquido de empresas (Contribuio sobre o Lucro Lquido CSLL),

    sobre a movimentao bancria de pessoas fsicas e jurdicas (Contribuio Provisria sobre a Mo-

    vimentao Financeira CPMF) e recursos fiscais (recursos Ordinrios do Tesouro Nacional). No

    mbito de estados e municpios, as fontes de recursos so originrias de impostos gerais.

    Para conferir maior estabilidade ao financiamento do Sistema nico de Sade (SUS), aps

    longa tramitao no Legislativo foi aprovada no ano 2000 a Emenda Constitucional no 29, que vin-

    cula recursos ao SUS. A emenda, conforme ser analisado, definiu patamares mnimos de gasto nas

    trs esferas de governo (Unio, estados e municpios) para o financiamento pblico da sade.

    Quanto aos dispndios, estima-se que o gasto nacional em sade (pblico e privado) no Brasil

    foi de cerca de r$ 118 bilhes no ano 2003, representando cerca de 7,6% do PIB, e um per capita de

    quase r$ 670,00 (tabela 1).

    O gasto pblico total (Unio, estados e municpios), que representa 45,3% do gasto nacional

    em sade, atingiu o total de r$ 53,6 bilhes (3,45% do PIB e um per capita de r$ 303,00). A maior

    parte desse valor originria da Unio (22,9%). A participao dos estados corresponde a 10,3%,

    enquanto a dos municpios, 12,01%.

    O gasto privado, por sua vez, composto pelo dispndio direto das famlias e de despesas patro-

    nais com planos e seguros de sade para empregados e dependentes. Em 2003, o gasto privado atingiu

    o valor de aproximadamente r$ 64,7 bilhes (54,7% do gasto nacional), representando 4,16% do PIB

    e um per capita de r$ 366,00. Do total, r$ 23,2 bilhes correspondem ao gasto das famlias e empresas

    com planos e seguros de sade e r$ 41,6 bilhes so gastos diretos das famlias5. A presente pesquisa

    visa a analisar os mecanismos de transferncias de recursos da Unio para os estados e municpios e

    de participao desses entes federados no financiamento do setor e dos CIS, mais especificamente.

    Tabela 1. Brasil: estimativa do gasto nacional em sade 2003

    Gasto Valor (em R$ mil) % % do PIB Per capita (em R$ mil)Gasto pblico 53.623,90 45,30 3,45 303,17Unio 27.181,20 22,96 1,75 153,67Estados 12.224,30 10,33 0,79 69,11Municpios 14.218,50 12,01 0,91 81,39Gasto privado 64.751,20 54,70 4,16 366,08Seguros mdicos privados 23.177,84 19,58 1,49 131,04Gasto direto das famlias 41.573,34 35,12 2,67 235,04Gasto nacional com sade 118.375,10 100,00 7,61 669,25Fonte: SIOPS/MS, Notas tcnicas 10/2004 e 09/2005; World Health Report 2006/OMS, IBGE.

  • Captulo 1 Os CIS e o SUS: os consrcios intermunicipais no Sistema nico de Sade 25

    iii. desCentraLizao das aes de sade

    A Constituio Federal de 1988 estabeleceu que os municpios fazem parte da Federao e,

    portanto, gozam da mesma autonomia conferida aos outros entes. No Ttulo VIII Da Ordem So-

    cial, Captulo II Da Seguridade Social, Seo II Da Sade, foi estabelecido que:

    Art. 198. As aes e servios pblicos de sade integram uma rede regionalizada e hierar-

    quizada e constituem um sistema nico, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:

    I descentralizao, com direo nica em cada esfera de governo;

    O processo de descentralizao da sade foi ratificado pela Lei Orgnica da Sade e pelas

    Normas Operacionais Bsicas que a ela se seguiram. Durante a vigncia da primeira norma do SUS, a

    NOB-SUS 01/91, esse processo foi tmido: os entes subnacionais ainda no tinham a prerrogativa de

    decidir sobre o tipo de servio a ser prestado, e o pagamento era realizado diretamente ao prestador.

    De fato, somente em 1993, com a publicao da Norma Operacional Bsica do SUS no 01/93

    (NOB-SUS 01/93), que o processo se intensificou. Durante a vigncia dessa NOB foi instalada,

    no mbito federal, a Comisso Intergestores Tripartite (CIT), composta por representantes das trs

    esferas de governo, e as Comisses Intergestores Bipartites (CIBs), compostas por representantes

    das Secretarias Estaduais e Municipais de Sade, com o intuito de sediar as discusses tcnicas no

    mbito de cada estado. As decises acordadas nessas instncias teriam que ser referendadas pelos

    Conselhos de Sade e pelos gestores do sistema. Ampliou-se, assim, a participao da sociedade na

    discusso do SUS.

    Alm disso, a NOB 93 criou trs estgios de gesto incipiente, parcial e semiplena em que

    tanto estados como municpios podiam se habilitar, atendidos certos requisitos. Os entes federados

    que no estivessem inscritos em nenhuma das trs formas de gesto permaneciam na condio de

    prestadores de servios.

    A grande inovao da NOB 93 foi a criao da gesto semiplena, pela qual o municpio recebia

    todos os recursos do custeio ambulatorial e hospitalar do Fundo Nacional de Sade para o Fundo

    Municipal de Sade, o chamado repasse fundo a fundo6. Os estados e municpios enquadrados sob

    essa forma de gesto passavam a ter total responsabilidade sobre a gesto da prestao de servios de

    sade. Criou-se, portanto, pela primeira vez, o municpio gestor e o repasse de recursos fundo a fundo,

    mesmo que restrito apenas cobertura hospitalar e ambulatorial. A maioria dos municpios, entretan-

    to, continuava sujeita relao intergovernamental de compra e venda de servios.

    Entretanto, foi somente com a NOB-SUS 01/96 que, de fato, o processo de descentralizao

    da sade foi aprofundado. 6 Mdici (2002) relata que o atual modelo de financiamento do gasto pblico em sade no Brasil se baseia nos fundos de sade (nacional, estaduais e municipais), espinha dorsal da estrutura de transferncias de recursos entre os trs nveis de governo. A transferncia fundo a fundo se d quando recursos federais so transferidos diretamente aos fundos estaduais e municipais.

  • Ensaios sobre Consrcios Intermunicipais de Sade26

    A NOB 01/96 estabeleceu o processo de Programao Pactuada e Integrada (PPI) entre os

    gestores e integrada entre as trs esferas de governo, envolvendo as atividades de assistncia sade,

    de vigilncia e de epidemiologia e controle de doenas. A PPI teria como funo definir as respon-

    sabilidades dos municpios no que diz respeito garantia de acesso da populao aos servios de

    sade no prprio territrio ou por meio de encaminhamento a outros municpios.

    Essa NOB criou, tambm, os tetos de financiamento compostos pelo Teto Financeiro para

    a Assistncia (TFA), pelo Teto Financeiro para Vigilncia Sanitria (TFVS) e pelo Teto Financeiro

    de Epidemiologia e Controle de Doenas (TFECD). Os tetos financeiros dos estados e municpios,

    pisos, fraes e ndices eram estabelecidos pela PPI, negociados nas Comisses Intergestores

    Bipartite e Tripartite, aprovados nos Conselhos e formalizados pelos gestores estadual e federal.

    A implementao da PPI, entretanto, no foi efetivada na maior parte dos estados, dificultando a

    integrao intermunicipal.

    Essa norma reduziu as formas de gesto municipal a apenas duas: Gesto Plena da Assistncia

    Bsica de Sade (GPAB) e Gesto Plena do Sistema Municipal (GPSM). Os municpios habilitados

    na GPAB recebiam apenas recursos para financiamento de aes bsicas de forma regular e autom-

    tica. Os procedimentos ambulatoriais, assim como os hospitalares, eram remunerados por produo.

    J os municpios em GPSM recebiam, em seus fundos de sade, valores relativos a procedimentos

    de mdia e alta complexidade. Aos municpios sob essa condio de gesto foi conferida, portanto,

    autonomia para gerir o sistema de sade como um todo, um dos grandes avanos da NOB 96.

    J os estados podiam se habilitar a uma das duas formas de gesto: Gesto Avanada do

    Sistema Estadual (GASE) e Gesto Plena do Sistema Estadual (GPSE). Como na NOB 93, a siste-

    mtica de repasse de recursos para estados e municpios dependia da condio de gesto em que o

    municpio se encontrava habilitado. As responsabilidades das diferentes condies de gesto esta-

    dual e municipal sero expostas na seo IV.2.

    Importantes avanos foram logrados com a NOB 01/96. Todos os municpios passaram a

    receber recursos fundo a fundo, sejam referentes ao Piso da Ateno Bsica (PAB), conforme deta-

    lhado na seo V, no caso dos municpios sob Gesto Plena da Assistncia Bsica, sejam referentes

    ao Teto Global de Financiamento do Municpio (TGFM), no caso de estarem habilitados na Gesto

    Plena do Sistema Municipal. Alm disso, pela primeira vez foram descentralizados recursos para a

    vigilncia sanitria, epidemiolgica e de controle de doenas que, nos municpios em Gesto Plena

    do Sistema, so repassados fundo a fundo. Como foi mencionado, a NOB 96 tambm inovou ao

    propor que todos os valores referentes aos pisos, tetos, fraes e ndices fossem definidos por meio

    da PPI, negociados nas CIB e CIT e aprovados pelos Conselhos. Por fim, essa norma sinalizou

    para a mudana no modelo assistencial ao criar incentivos para adoo de estratgias de cuidados

    primrios de sade (PHC), como a implantao do Programa de Agentes Comunitrios de Sade

    (PACS) e do Programa de Sade da Famlia (PSF).

  • Captulo 1 Os CIS e o SUS: os consrcios intermunicipais no Sistema nico de Sade 27

    Por outro lado, vrias disposies da NOB 01/96 foram objeto de crticas, e alguns aspectos

    relevantes deixaram de ser tratados em seu texto. Durante sua vigncia, continuaram a no ser apli-

    cados os critrios para repasse de recursos a estados e municpios, dispostos no artigo 35 da Lei no

    8.080 de 19907, sendo que, para vrias aes e programas, continuaram a ser utilizados apenas o

    critrio populacional e caractersticas quantitativas e qualitativas da rede. Apesar de prever o repasse

    de recursos fundo a fundo para a assistncia sade, foi mantida a remunerao por procedimento

    relativa a atividades de vigilncia sanitria e controle de doenas transmissveis. Ademais, ao repasse

    de recursos federais, no foram condicionadas contrapartidas estadual e municipal, tornando irre-

    gular a participao dos entes subnacionais no financiamento da sade.

    Outra fragilidade dessa norma reside no fato de que resolues das Comisses Intergestores

    Bipartites freqentemente se sobrepunham aos prprios dispositivos da NOB 96, resultando em

    conflitos de competncia entre estados e municpios e impossibilitando o comando nico sobre os

    prestadores de servios. Mesmo em alguns municpios em Gesto Plena do Sistema, estados conti-

    nuaram a manter relaes diretas com prestadores.

    Com o intuito de apresentar diretrizes para o avano do processo de descentralizao da sade,

    baseado na regionalizao e hierarquizao da rede, conforme consta do artigo 198 da Constituio

    Federal, foi publicada, em janeiro de 2001, a Norma Operacional da Assistncia Sade (NOAS-

    SUS) no 01/01. Essa norma pretendeu, em linhas gerais, promover maior eqidade na alocao de

    recursos e no acesso da populao s aes e servios de sade em todos os nveis de ateno.

    A NOAS 01/01 definiu mais uma forma de habilitao, a Gesto Plena da Ateno Bsica

    Ampliada (GPABA). Na GPABA, os municpios devem assumir os procedimentos do atual PAB,

    alm de outros procedimentos ambulatoriais de menor complexidade8, de forma que todos os mu-

    nicpios brasileiros ofertem, em seu territrio, o primeiro nvel de ateno em sade. Ficou estabe-

    lecido que dever haver uma ampliao do valor fixo do PAB e que o repasse desses recursos estar

    condicionado a uma avaliao dos municpios quanto ao seu desempenho na ateno bsica e

    capacidade de garantir sua populao, com suficincia e qualidade, as aes correspondentes

    Ateno Bsica Ampliada. Alm disso, o gestor municipal dever participar ativamente do processo

    de regionalizao e de Programao Pactuada e Integrada no estado, visando garantir o acesso de

    sua populao aos outros nveis de ateno, cujos servios no estejam em seu territrio9.

    A NOAS tambm instituiu o Plano Diretor de regionalizao (PDr) como instrumento de

    ordenamento do processo de regionalizao da assistncia em cada estado e no Distrito Federal. O

    7 De acordo com esse artigo, 50% dos recursos seriam repassados de forma regular e automtica aos gestores estaduais e muni-cipais com base em dados populacionais, e a outra metade atenderia aos seguintes critrios: perfil demogrfico da regio; perfil epidemiolgico da populao a ser coberta; caractersticas quantitativas e qualitativas da rede de sade na rea; desempenho tcnico, econmico e financeiro no perodo anterior; nveis de participao do setor de sade nos oramentos estaduais e mu-nicipais; previso do plano qinqenal de investimento da rede; ressarcimento do atendimento a servios prestados para outras esferas de governo.8 As aes estratgicas mnimas da ateno bsica so: controle da tuberculose, eliminao da hansenase, controle da hiperten-so, controle do diabetes mellitus, aes de sade bucal, aes de sade da criana e aes de sade da mulher.9 Ministrio da Sade (2001a).

  • Ensaios sobre Consrcios Intermunicipais de Sade28

    PDr deve ser elaborado de forma a garantir o acesso de todos os cidados aos servios necessrios

    resoluo de seus problemas de sade, em qualquer nvel de ateno, diretamente ou mediante o es-

    tabelecimento de compromissos entre gestores para o atendimento de referncias intermunicipais.

    Para tanto, foram definidas regies/microrregies de sade como o territrio base para o pla-

    nejamento da ateno sade. Entre os requisitos para a qualificao das regies/microrregies de

    sade est a habilitao do(s) municpio(s)-sede de mdulo assistencial10 em Gesto Plena do Sistema

    Municipal. Para se habilitarem a essa condio, os municpios devem ofertar, alm dos procedimentos

    da Ateno Bsica Ampliada, um conjunto mnimo de servios de mdia complexidade11 (designados

    EPMI) para sua populao e para a populao de outros municpios a ele adscritos. Esses servios

    sero financiados com base em um valor per capita nacional transferido fundo a fundo ao municpio.

    Vrias so as crticas a essa norma12. Discute-se a criao de inmeros novos conceitos e a

    sobreposio de uma infinidade de planos e instrumentos de programao e controle, que tornam

    a gesto do sistema de sade demasiadamente burocratizada. Mais ainda, questiona-se a definio

    de um valor per capita para os procedimentos de mdia complexidade que, provavelmente, ser rea-

    lizado com base em valores de sries histricas de produo.

    Os defensores da municipalizao criticam ainda a excessiva centralizao das decises de re-

    gionalizao na esfera federal e estadual, denominando esse processo de descentralizao de cima

    para baixo. Os mecanismos propostos gerariam perda de autonomia municipal e excessiva rigidez no

    processo de habilitao de municpios, que passariam a depender menos da vontade poltica e capaci-

    dade de gesto das instncias municipais e mais da existncia de servios nos respectivos territrios.

    Tcnicos e consultores do Ministrio da Sade mantiveram posio contrria. Defenderam

    que, pelos dispositivos da NOAS, o desenho da regionalizao e a definio do status de gesto

    de cada municpio deixava de ser um atributo isolado e de deciso solitria de cada municpio. A

    escolha das sedes de mdulo e dos plos microrregionais passava a ser uma deciso conjunta dos

    municpios vizinhos, sob coordenao do estado federado. A descentralizao passava a se dar no

    por meio de um modelo bipolar municpio-ministrio (de baixo para cima), mas de baixo para os

    lados, de cima para baixo, dos lados para os lados, de forma complexa e interativa. A NOAS

    induziria uma certa solidariedade forada entre os municpios inter-relacionados na assistncia,

    de forma a minimizar os conflitos distributivos e a reduzir as barreiras ao acesso de pacientes.

    Os crticos da NOAS tambm afirmavam que est implcito na norma que o Ministrio da

    Sade responsvel pela alta complexidade; os estados, pela mdia; e os municpios, pela ateno

    10 Mdulo assistencial definido, na NOAS 01/01, como a base territorial que apresente resolubilidade correspondente ao primeiro nvel de referncia de mdia complexidade, constitudo por um ou mais municpios.11 O Bloco de Procedimentos de Mdia Complexidade foi reorganizado em trs grandes elencos de procedimentos (EPM-I, EPM-II e EPM-III, chamados daqui para frente de M1, M2 e M3, respectivamente), admitindo-se incorporao tecnolgica di-ferenciada e gradativa entre servios e entre diferentes municpios que compem uma dada microrregio ou regio de sade nos estados. Os servios integrantes do primeiro nvel de referncia em mdia complexidade compreendem: laboratrio, radiologia simples, ultra-sonografia obsttrica, atendimento psicoterpico, fisioterapia bsica, algumas aes odontolgicas especializa-das e leitos hospitalares para atendimento do parto normal, primeiro atendimento em clnica mdica e pediatria.12 Carvalho, G. (2001a e 2001b) e Sola, J. (2001).

  • Captulo 1 Os CIS e o SUS: os consrcios intermunicipais no Sistema nico de Sade 29

    bsica. Seus idealizadores rebateram as crticas, assumindo que, de fato, o Ministrio da Sade

    detm responsabilidade especial sobre a alta complexidade. Como a cobertura desses servios deve

    ser necessariamente garantida em outros estados, a questo passava a ser alada a uma esfera su-

    praestadual, isto , nacional. Com esse propsito, foi criada a Cmara Nacional de regulao da

    Alta Complexidade (CNrAC) para garantir o fluxo dos pacientes necessitados desse tipo de proce-

    dimento assistencial13.

    Para superar os impasses advindos da tentativa de implementao da NOAS 01/01, foi edi-

    tada a NOAS 01/02. Em linhas gerais, os principais entraves eram resultantes das dificuldades em

    se estabelecer o comando nico sobre os prestadores de servios de mdia e alta complexidade e

    assegurar a totalidade da gesto municipal nas sedes dos mdulos assistenciais, bem como da falta

    de clareza quanto explicitao dos mecanismos necessrios ao gestor estadual para garantir as

    referncias intermunicipais.

    Dessa forma, a NOAS 01/02 instituiu a possibilidade no apenas de os municpios em Ges-

    to Plena do Sistema, como tambm os habilitados na Gesto Plena da Ateno Bsica Ampliada

    (GPABA), qualificarem-se como sede de mdulos assistenciais. Neste caso, porm, foi estabelecido

    o comando nico do estado sobre os prestadores de servios, o que trouxe assim maior flexibilidade

    para a qualificao de microrregies.

    Na norma tambm explicitado o Limite Financeiro da Assistncia do Estado, que dever ser

    programado e composto pela parcela de recursos financeiros, sob gesto municipal, para o aten-

    dimento da populao residente; pela parcela para o atendimento das referncias intermunicipais;

    pela parcela para o atendimento da populao residente sob gesto estadual e por outros recursos

    sob gesto estadual alocados nos municpios ou na Secretaria Estadual de Sade (SES). Cita-se

    tambm que os limites financeiros da assistncia devem ser definidos globalmente em cada estado

    a partir da aplicao de critrios e parmetros de programao ambulatorial e hospitalar, respeitado

    o limite financeiro estadual, bem como a definio de referncias intermunicipais na PPI.

    Em linhas gerais, o processo de descentralizao da sade no Brasil avanou em diversos

    aspectos. Verificou-se, por exemplo, um acentuado aumento do percentual de recursos financeiros

    descentralizados para estados e municpios sobre o total de gastos do Ministrio da Sade, que su-

    biu de 7,1% em 1993 para 39,8% em 2000 e para 56,3% em 2004. Esse percentual ainda mais signi-

    ficativo quando se retiram do cmputo as despesas no descentralizveis, como pessoal, inativos

    e pensionistas, e como o pagamento da dvida (amortizao e encargos financeiros). Nesse caso, em

    2003, 85% dos dispndios totais do Ministrio da Sade foram distribudos regionalmente.

    As explicaes para o significativo incremento dos repasses do Ministrio da Sade para a

    esfera municipal encontram-se na implementao do PAB, estabelecido pela NOB 01/96, e no cres-

    13 A CNrAC indicar SES, aps consultados os hospitais referenciais/consultoras, qual o estado que estar apto a receber o paciente para a execuo do procedimento.

  • Ensaios sobre Consrcios Intermunicipais de Sade30

    cimento do nmero de municpios habilitados na gesto plena e que, portanto, recebiam maior

    soma de recursos fundo a fundo.

    Por outro lado, h que se considerar que o aumento dos recursos transferidos s esferas

    subnacionais se deu por meio de mecanismos que vinculam as transferncias a aes e servios

    especficos a serem executados pelos estados e municpios. preciso, portanto, analisar o avano

    da descentralizao no s pela tica quantitativa, mas tambm se levando em conta a gesto dos

    recursos descentralizados. As ltimas normas da sade, principalmente a NOAS 01/01, corroboram

    essa lgica: estabeleceram uma srie de critrios para a habilitao de municpios, ampliando as

    transferncias, por um lado, mas, por outro, engessando ainda mais a gesto desses recursos.

    iv. repartio de CompetnCias e responsabiLidades no sus

    A anlise da legislao que implementou e consolidou o SUS e redefiniu as responsabilidades

    da Unio, estados e municpios mostra vrias tendncias do processo de descentralizao da sade.

    Observa-se que, gradativamente, buscou-se estabelecer diretrizes para a descentralizao

    prioritria da ateno bsica (principalmente atravs da NOB 01/96, que criou o PAB) e s mais

    recentemente inicia-se o estabelecimento de regras mais contundentes quanto descentralizao da

    mdia e alta complexidade (NOAS). No que tange alta complexidade, principalmente, essas regras

    norteiam aspectos relacionados ao acesso e regulao dos servios de sade no mbito do SUS,

    mas pouco foi realizado no sentido de modificar sua lgica de financiamento.

    Quanto organizao do sistema, verificado inicialmente um movimento de forte munici-

    palizao das aes e servios de sade, seguido da busca de estruturao de redes regionalizadas

    e hierarquizadas. Houve necessidade, portanto, de retomar uma escala de produo em sade a

    qual se encontra, no momento atual, excessivamente fragmentada que assegure maior eficincia ao

    sistema e que permita o estabelecimento de uma rede de ateno integral sade.

    No que diz respeito aos papis dos gestores, observa-se no s a responsabilidade quanto

    contratao, ao controle, ao cadastramento, auditoria e ao pagamento, como tambm uma preo-

    cupao em estabelecer rotinas de avaliao e regulao de prestadores.

    No tocante ao financiamento, verifica-se a ampliao do critrio per capita de alocao de

    recursos, que primeiramente estava restrito apenas ao PAB, e que recentemente incorporou os pro-

    cedimentos do M1. Evidencia-se tambm uma ntida tendncia para que parcelas crescentes dos

    recursos sejam repassadas com base em programao (PPI), em detrimento de pagamentos diretos

    a prestadores, ou com base em sries histricas de gasto. A NOAS procurou reorganizar o processo

    de programao, que no foi implementado com sucesso durante a vigncia da NOB 96, dividindo-

    a em trs grandes grupos: assistncia, sob a coordenao do MS; vigilncia, da Agncia Nacional

    de Vigilncia Sanitria (ANVISA); e epidemiologia e controle de doenas, da Fundao Nacional

    de Sade (FUNASA). recentemente, o Pacto pela Sade, como ser descrito adiante, procurou

  • Captulo 1 Os CIS e o SUS: os consrcios intermunicipais no Sistema nico de Sade 31

    simplificar e melhor organizar as formas de financiamento, sem, contudo, flexibilizar a alocao dos

    recursos de cada bloco, de forma a conferir maior autonomia a estados e municpios.

    iv.1 CompetnCias das trs esferas federadas

    A Constituio Federal consagrou como dever do Estado, isto , dos trs nveis de poder, o

    direito de todos os cidados sade e ao acesso universal e igualitrio s suas aes e servios. As

    competncias conjuntas da Unio, estados e municpios foram estabelecidas para assegurar esse

    direito por meio de diretrizes bsicas para a organizao e financiamento do SUS (Lei Orgnica da

    Sade). A definio de competncias conjuntas retomada na NOAS com respeito, em linhas ge-

    rais, s atribuies de controle, regulao e avaliao do SUS pelos trs nveis de governo e, em par-

    ticular, definio de responsabilidades pelos servios de alta complexidade (acesso e regulao).

    A legislao reserva Unio a competncia, em geral, para formular polticas, definir normas

    e coordenar o sistema nacional (Lei 8.080/90), bem como incentivar o gestor estadual (NOB 01/96).

    A NOAS, por sua vez, d nfase ao papel da Unio em relao poltica de alta complexidade, que

    vai desde a definio de normas at o seu financiamento.

    Quanto competncia dos estados e do Distrito Federal, a Lei Orgnica resume o papel dessa

    esfera promoo das condies para que os municpios possam gerir seu sistema e gesto su-

    pletiva de servios e aes nos casos em que os municpios no estejam aptos para tanto. A atuao

    supletiva do estado tambm est presente na formulao de polticas e no controle de aes. Em

    geral, o estado no apresenta competncia privativa j que, em grande parte, atua supletivamente ou

    complementarmente ao municpio. O seu papel, portanto, no ficou claramente definido.

    A NOB 01/96, alm de reforar as competncias estabelecidas na Lei 8.080, agrega a idia

    embrionria do estado como motor da integrao dos sistemas municipais, que, no entanto, no

    foi implementada na vigncia dessa norma. Na Lei Orgnica, o estado participa do processo de

    regionalizao, como regulador e no como promotor. V-se, portanto, uma tendncia crescente

    participao do estado no processo de regionalizao, que se consubstancia, de fato, com a NOAS,

    visto que a NOB 96, embora reconhecendo um papel coordenador aos estados, no instituiu os

    instrumentos adequados para seu exerccio.

    A NOAS 01/02, como foi mencionado, estabeleceu diversos instrumentos, como o Plano Dire-

    tor de regionalizao, que norteiam o processo de regionalizao, tendo o estado como seu coorde-

    nador. Enquanto a legislao anterior enunciou o princpio da regionalizao e traou linhas gerais

    sobre a atuao do estado dentro desse contexto, a NOAS incorporou mecanismos formais para a

    formao de uma rede regionalizada e hierarquizada de servios de sade, apresentando critrios e

    requisitos para a qualificao de microrregies/regies de sade.

    Quanto ao papel dos municpios no SUS, j na Constituio de 1988, foi estabelecido que

    a esses entes compete prestar servios de atendimento sade. A Lei Orgnica estabeleceu, mais

    especificamente, que cabe aos municpios planejar, organizar, controlar e avaliar as aes e os

  • Ensaios sobre Consrcios Intermunicipais de Sade32

    servios de sade e gerir e executar os servios pblicos de sade. Segundo a NOB 01/96, compete

    ao municpio o controle, a avaliao e auditoria dos prestadores de servios de sade situados em

    seu territrio. Verifica-se que as normas posteriores NOB 01/96 no tratam especificamente das

    competncias dos municpios, visto que o seu papel j tinha sido claramente traado, e a municipa-

    lizao dos servios e aes alcanada com xito. Caberia, como foi realizado pela NOAS, voltar a

    ateno para a definio das competncias do estado de forma a avanar no processo de descentra-

    lizao, considerando a formao de sistemas regionalizados e integrados de sade.

    iv.2 responsabiLidades das Condies de gesto do sus

    As responsabilidades de estados e municpios no SUS dependem, como mencionado, do es-

    tgio alcanado no processo de descentralizao das aes e servios de sade, o qual, por sua vez,

    determina a habilitao desses entes em uma das condies de gesto do SUS.

    A NOAS estabeleceu que os estados habilitados na Gesto Avanada do Sistema Estadual

    (GASE) devem, entre outras atribuies, elaborar a PPI, coordenar os sistemas de referncia e exe-

    cutar operaes complexas, voltadas ao controle de doenas, que possam beneficiar-se de economia

    de escala. Os estados em Gesto Plena do Sistema Estadual (GPSE) acumulam os atributos da

    GASE. A diferena fundamental entre uma e outra forma de gesto que, na GPSE, o estado

    responsvel pela contratao, controle, auditoria e pagamento do conjunto dos servios sob sua

    gesto, alm de seu cadastro e avaliao essas ltimas duas responsabilidades introduzidas pela

    NOAS , e passa a receber as transferncias para o custeio dos servios sob sua gesto diretamente

    no regime fundo a fundo, aliado maior autonomia de alocao interna desses recursos.

    Ao se comparar a NOB 01/96 com a NOAS 01/02, percebe-se, basicamente, que a NOAS

    adicionou responsabilidades referentes organizao do processo de regionalizao, como a elabo-

    rao do Plano Diretor de regionalizao (PDr) e a viabilizao dos Termos de Compromisso para

    Garantia de Acesso14. Houve uma ntida preocupao com as referncias intermunicipais e com a

    elaborao da PPI. Sendo assim, para se habilitarem s condies de gesto da NOAS 01/02, os es-

    tados devem apresentar o PDr, a PPI e a comprovao de alimentao do Sistema de Informaes

    sobre Oramentos Pblicos em Sade (SIOPS). Alm disso, o estado torna-se tambm responsvel

    pela coordenao e acompanhamento dos indicadores de ateno bsica.

    Diferentemente da Gesto Avanada do Sistema Estadual, os estados em GPSE devem ter

    50% de seu Limite Financeiro da Assistncia comprometidos com transferncias regulares e au-

    tomticas aos municpios. Cabe notar que, com a NOAS, abolido, para os estados em Gesto

    Avanada, o requisito de comprometimento de percentual do Teto Financeiro da Assistncia com

    esse tipo de transferncia (que era de 30% na NOB 01/96). Tambm retirada a exigncia de que

    uma certa proporo de municpios esteja habilitada no estado (60% dos municpios em estados na

    14 Esse documento consolida pactos entre gestores municipais no mbito da PPI. Deve conter metas fsicas e financeiras quanto aos servios a serem ofertados nos municpios de referncias, bem como os compromissos assumidos pelas SES e SMS.

  • Captulo 1 Os CIS e o SUS: os consrcios intermunicipais no Sistema nico de Sade 33

    Gesto Avanada e 80%, na Gesto Plena). Em outras palavras, verifica-se uma flexibilizao dos

    requisitos para a habilitao dos estados, principalmente no que diz respeito Gesto Avanada, de

    forma a torn-la mais vivel e interessante vis--vis os poucos benefcios monetrios advindos dessa

    habilitao.

    Supondo que os municpios em GPSM, habilitados pela NOB 01/96, tenham cumprido a

    obrigatoriedade de se atualizarem nas regras estabelecidas pela NOAS 01/01, tem-se, atualmente,

    trs formas de gesto municipal: GPAB, GPABA e GPSM, conforme mencionado previamente.

    Os municpios, independentemente da forma de gesto em que estejam habilitados, so res-

    ponsveis pela elaborao da programao municipal, pela gerncia de unidades ambulatoriais pr-

    prias, do estado ou da Unio, em conformidade com decises da CIB e da CIT, e pela prestao de

    diversos servios de sade, entre outras atribuies.

    Os municpios em GPABA tm as seguintes responsabilidades, adicionalmente queles ha-

    bilitados em GPAB: prestao de servios/contratao, controle, auditoria e pagamento relativos s

    reas estratgicas mnimas, elaborao de Plano Municipal (contendo Agenda de Sade Municipal e

    Quadro de Metas) e cadastramento de usurios segundo estratgia do Carto Nacional de Sade.

    A diferena bsica entre as responsabilidades de municpios em GPABA e em GPSM refere-se

    alocao dos recursos programados no prprio municpio, que, no primeiro caso, fica restrita aos

    servios bsicos do PAB-A e proposta de referncia ambulatorial especializada e hospitalar e, para

    a gesto plena do sistema municipal, inclui todos os servios de sade, inclusive as referncias.

    Os municpios em GPABA so responsveis pela prestao e contratao de servios, controle,

    auditoria e pagamento dos procedimentos cobertos pelo PAB, acrescidos dos procedimentos das reas

    estratgicas mnimas. Os municpios em GPSM devem garantir a prestao de servios no territrio

    municipal, inclusive os de referncia populao no-residente, e dos demais servios que no esto

    disponveis no prprio municpio. Desempenham tambm as tarefas de contratao, controle, audito-

    ria, cadastro, pagamento e avaliao de todos os prestadores de servios localizados no municpio.

    A NOAS incorporou ao elenco de responsabilidades dos municpios em GPSM a assinatura

    de Pacto da Ateno Bsica com o Estado15 e a integrao dos servios existentes no municpio aos

    mecanismos de regulao ambulatoriais e hospitalares. Vrios dos requisitos habilitao muni-

    cipal passaram a incluir, com a NOAS, inmeros instrumentos que possibilitam sua comprovao

    formal (como, por exemplo, por meio do SIOPS).

    Ademais, conforme foi mencionado na seo III, a NOAS, ao definir o conceito de regies

    e microrregies de sade, estabeleceu requisitos para sua qualificao, como, por exemplo: habili-

    tao do(s) municpio(s)-sede do(s) mdulo(s) assistencial(is) em GPSM ou GPAB-A e de todos

    os demais em GPAB-A; comprovao pelo(s) municpio(s)-sede do(s) mdulo(s) assistencial(is)

    da capacidade de ofertar o conjunto dos servios correspondentes ao primeiro nvel de referncia

    15 Esse Pacto um instrumento formal de negociao entre gestores das trs esferas de governo, em que so acordadas metas a serem alcanadas em relao a indicadores de sade previamente definidos.

  • Ensaios sobre Consrcios Intermunicipais de Sade34

    intermunicipal com suficincia para sua populao e para a populao de outros municpios a ele

    adscritos; comprovao pelo(s) municpio(s)-plo da capacidade de ofertar um conjunto de servi-

    os correspondentes a um nvel de ateno acima do mdulo assistencial.

    v. finanCiamento do sus

    O financiamento da sade ao longo da dcada de 90 foi marcado pela forte instabilidade de

    receitas, j que no havia fontes especficas e percentuais de vinculao para o setor da sade. Com

    o intuito de reduzir a incerteza quanto ao seu financiamento, foi aprovada a Emenda Constitucional

    no 29, de 13 de novembro de 2000 (EC 29).

    Ficou definido no artigo 77, pargrafo 1o, do ADCT que, no caso da Unio, no ano 2000, o

    total de recursos mnimos aplicado em aes e servios de sade seria equivalente ao montante em-

    penhado no exerccio financeiro de 1999, acrescido de, no mnimo, 5%. Do ano 2001 ao ano 2004, o

    valor mnimo seria aquele apurado no ano anterior, corrigido pela variao nominal do PIB.

    No caso dos estados e do Distrito Federal, os recursos mnimos deveriam ser equivalentes a

    12% da arrecadao de impostos e das transferncias constitucionais, deduzidas as parcelas que

    fossem transferidas aos municpios. Quanto aos municpios, os recursos mnimos deveriam ser equi-

    valentes a 15% da arrecadao de impostos e dos recursos de transferncias constitucionais. Caso os

    estados, Distrito Federal e municpios aplicassem menos recursos que os percentuais previstos, se-

    riam obrigados a elevar progressivamente suas aplicaes em sade at 2004 na razo de pelo menos

    um quinto por ano, e, a partir de 2000, essas aplicaes seriam de pelo menos 7%. Alm disso, a cada

    cinco anos estava prevista a possibilidade de ajuste dos percentuais, podendo estes at mesmo cair.

    A partir de 2005, lei complementar, a que se refere o 3o do art. 198 da Constituio Federal,

    deveria estabelecer regras definitivas sobre o montante de recursos para a sade da Unio, estados,

    Distrito Federal e municpios, os critrios de rateio e a fiscalizao e controle desses recursos, elimi-

    nando, assim, controvrsias existentes quanto ao montante e forma de distribuio dos recursos

    mnimos a serem aplicados em sade. No entanto, com mais de um ano de atraso, o projeto de lei

    complementar ainda aguarda para ser votado no Congresso Nacional.

    Apesar de os resultados at o momento no serem satisfatrios, acredita-se que a vinculao

    de recursos sade se traduza em maiores compromissos, principalmente dos estados, no custeio

    das aes de sade. Por conseguinte, esse novo padro de financiamento do setor deve ter reflexo

    sobre a formao de novos consrcios e a manuteno dos j existentes.

    Estabelecidas as receitas que comporo o oramento federal para a sade, cabe analisar os

    mecanismos de transferncias de recursos para estados e municpios.

    por meio do processo de Programao Pactuada e Integrada (PPI), como mencionado na

    seo III, que so acordados, com base em parmetros, os montantes de recursos a serem repassa-

    dos a estados e municpios e a sua alocao entre diversas aes e servios, inclusive aqueles ofer-

  • Captulo 1 Os CIS e o SUS: os consrcios intermunicipais no Sistema nico de Sade 35

    tados por meio dos consrcios. Dessa forma, obtm-se os tetos financeiros de cada um desses entes

    que, somados, formam o Teto Financeiro Global da sade.

    Existem, ainda, recursos que no so includos nos tetos financeiros de estados e municpios

    (recursos extra-teto) para o custeio de aes consideradas estratgicas (transplantes de rgos, cam-

    panhas de preveno do cncer do colo uterino e outras) e para a remunerao de procedimentos de

    alta complexidade em pacientes com referncia interestadual, disponibilizados por meio do Fundo

    de Aes Estratgicas e Compensao (FAEC), criado pela Portaria GM no 531, em 30 de abril de

    1999. Os recursos do FAEC so repassados para contas especficas dos estados e municpios em

    Gesto Plena do Sistema, vinculadas ao respectivo Fundo de Sade.

    At 2001 no havia limites por estado ou municpio para o custeio desses procedimentos

    por meio do FAEC. A Portaria 627, de 26 de abril de 2001, fixou, porm, limites para gastos dos

    governos subnacionais com servios de alta complexidade e liberou apenas os recursos para aes

    estratgicas. Dessa forma, no caso de as despesas com os procedimentos de alta complexidade ul-

    trapassarem o valor estipulado para estados e/ou municpios em Gesto Plena, seu excedente onera-

    ria a dotao destinada assistncia de mdia complexidade (Portaria no 2.103, de 13 de novembro

    de 2001). Essa determinao que no foi implementada at o presente foi ratificada pelo Pacto

    pela Sade, mencionado a seguir.

    Em fevereiro de 2006, por meio da Portaria no 399/GM, foi divulgado o Pacto pela Sade para

    2006, que inclui novas diretrizes para o financiamento do SUS. Pela nova sistemtica, foram criados

    cinco grandes blocos de financiamento para o custeio da sade, que so: (i) Ateno Bsica; (ii)

    Ateno de Mdia e Alta Complexidade; (iii) Vigilncia em Sade; (iv) Assistncia Farmacutica; e

    (v) Gesto do SUS.

    Os recursos financeiros federais que compem o Bloco Financeiro da Ateno Bsica sero

    divididos em dois componentes: o Piso da Ateno Bsica Fixo (PAB fixo), obtido da multiplicao

    de um valor per capita nacional pela populao do municpio, e o Piso da Ateno Bsica Varivel

    (PAB varivel). Os valores dos pisos sero definidos em portaria especfica. Os recursos do PAB con-

    tinuaro a ser transferidos de forma regular e automtica do Fundo Nacional de Sade aos fundos

    de sade dos municpios e do Distrito Federal.

    Os recursos do Piso de Ateno Bsica Varivel so destinados a custear o desenvolvimento

    de estratgias especficas, como: Sade da Famlia, Agentes Comunitrios de Sade, Sade Bucal,

    Fator de Incentivo da Ateno Bsica aos Povos Indgenas, Incentivo Sade no Sistema Previdenci-

    rio e Compensao de Especificidades regionais. A novidade neste bloco esta ltima estratgia

    Compensao das Especificidades regionais para a qual ser transferido um montante igual a 5%

    do valor mnimo do PAB fixo multiplicado pela populao do estado.

    Os recursos do bloco de financiamento da ateno de mdia e alta complexidade compem

    o Limite Financeiro da Mdia e Alta Complexidade Ambulatorial e Hospitalar do Distrito Fede-

    ral, dos estados e dos municpios. O valor continuar a ser definido pela Programao Pactuada

  • Ensaios sobre Consrcios Intermunicipais de Sade36

    Integrada (PPI). Procedimentos que so atualmente custeados pelo Fundo de Aes Estratgicas

    e Compensao (FAEC) sero incorporados ao Limite Financeiro, conforme pactuao entre os

    gestores. O FAEC, doravante, se destinar ao custeio de procedimentos regulados pela Central Na-

    cional de regulao da Alta Complexidade transplantes e Aes Estratgicas Emergenciais e

    cobertura temporria de novos procedimentos que sejam incorporados ao SUS, at a formao de

    mdia histrica de valores que possibilite sua agregao tabela de remunerao de procedimentos

    de mdia e alta complexidade.

    Os recursos financeiros destinados Vigilncia em Sade agrupam as aes de Vigilncia Epi-

    demiolgica, Ambiental e Sanitria. Esses recursos comporo o Limite Financeiro de Vigilncia em

    Sade dos estados, dos municpios e do Distrito Federal. O Limite formado por dois componentes:

    a Vigilncia Epidemiolgica e Ambiental em Sade e a Vigilncia Sanitria em Sade. O Limite Finan-

    ceiro da Vigilncia em Sade ser transferido em parcelas mensais e o valor da transferncia mensal

    para cada um dos estados, Distrito Federal e municpios, bem como o Limite Financeiro respectivo

    ser estabelecido em portaria especfica, que detalhar os diferentes componentes que o formaro.

    A assistncia farmacutica quarto bloco ser financiada pelos trs gestores do SUS. Este blo-

    co se organiza em trs componentes: bsico, estratgico e medicamentos de dispensao excepcional.

    O componente bsico formado por uma parte fixa e outra varivel. A parte fixa corresponde

    a um valor per capita transferido para municpios, Distrito Federal e estados, conforme pactuao

    na CIB. A parte varivel corresponde a valor com base per capita para aes de assistncia farma-

    cutica dos programas de Hipertenso e Diabetes (exceto insulina), Asma e rinite, Sade Mental,

    Sade da Mulher, Alimentao e Nutrio e Combate ao Tabagismo. A parte varivel tambm ser

    transferida ao municpio ou estado segundo pactuao na CIB, medida que forem implementados

    os programas especficos.

    O componente estratgico da assistncia farmacutica, por sua vez, compreende o forneci-

    mento de medicamentos, produtos e insumos. Esses medicamentos so de responsabilidade do

    Ministrio da Sade e compreendem: medicamentos para o controle de endemias como tuberculose,

    hansenase, malria, leishmaniose, Chagas e outras doenas endmicas de abrangncia nacional

    ou regional; medicamentos anti-retrovirais para a Aids; produtos e insumos para o Programa Na-

    cional de Sangue e Hemoderivados, Imunobiolgicos e Insulina. O componente medicamentos de

    dispensao excepcional, por sua vez, que integra o Grupo 36 Medicamentos da Tabela Descritiva

    do SIA/SUS, financiado e distribudo de acordo com pactuao entre o Ministrio da Sade e as

    Secretarias Estaduais de Sade.

    O quinto bloco, Financiamento da Gesto do SUS, destina-se ao custeio de aes especficas

    relacionadas organizao dos servios, acesso da populao sade e aplicao dos recursos do SUS.

    Este bloco ser composto pelos seguintes sub-blocos: (i) regulao, controle, avaliao e auditoria; (ii)

    planejamento e oramento; (iii) programao; (iv) regionalizao; (v) participao e controle social; (vi)

    gesto do trabalho; (vii) educao em sade; e (viii) incentivo implementao de polticas especficas.

  • Captulo 1 Os CIS e o SUS: os consrcios intermunicipais no Sistema nico de Sade 37

    Em separado devero ser repassados recursos para investimentos que devero priorizar a

    readequao e a expanso da rede fsica de sade e a constituio dos espaos de regulao. So

    prioritrios os investimentos para reforar a regionalizao dos servios e a ateno bsica.

    vi. perfiL dos ConsrCios intermuniCipais de sade

    Mapeamento de consrcios existentes em 2002 revela que quase 40 milhes de brasileiros, o

    equivalente a cerca de 25% da populao brasileira, recebiam atendimento em unidades de sade de

    municpios consorciados. Desses municpios, 78,6% tm populao de at 20 mil habitantes e 96,9%

    tm menos de 100 mil habitantes. Vale ressaltar que h apenas 3 municpios consorciados com po-

    pulao superior a 500 mil habitantes (Macei, ribeiro Preto e Braslia), em que pese existir um

    total de 33 municpios brasileiros nesse extrato populacional.

    Tabela 2. Municpios consorciados e total de municpios brasileiros, segundo faixa populacional 2002Populao Total de municpios consorciados % Total de municpios brasileiros %At 5.000 633 29,18 1.371 24,66De 5.001 a 20.000 1.073 49,47 2.666 47,95De 20.001 a 100.000 397 18,30 1.292 23,24De 100.001 a 500.000 63 2,90 198 3,56

    Mais de 500.000 3 0,14 33 0,59Total 2.169 100,00 5.560 100,00Fonte: IBGE, Perfil dos municpios brasileiros - gesto pblica 2002.Elaborao da autora.

    No tocante renda, pela tabela 3, verifica-se que a maior parte dos municpios consorciados

    (52%) tem renda mdia entre o quinto e oitavo decil. Portanto, tem-se que os municpios que se

    consorciam so, em geral, municpios com renda mdia a alta. Cabe ressaltar, tambm, que a freq-

    ncia de municpios consorciados que esto nos decis mdios e altos de renda , proporcionalmente,

    superior freqncia dos municpios brasileiros nessas mesmas faixas de renda. De maneira geral,

    os consrcios esto distribudos igualmente em quase todos os decis de renda, com exceo dos mu-

    nicpios muito pobres (primeiro, segundo e terceiro decis) ou extremamente ricos (dcimo decil).

    Tabela 3. Distribuio de municpios consorciados, segundo decil de renda 2002

    Decis de renda no de municpios consorciados %1 102 4,702 123 5,673 161 7,424 241 11,115 275 12,686 301 13,88Fonte: IBGE, Perfil dos municpios brasileiros - gesto pblica 2002.Elaborao da autora.

  • Ensaios sobre Consrcios Intermunicipais de Sade38

    Tabela 3. Distribuio de municpios consorciados, segundo decil de renda 2002

    Decis de renda no de municpios consorciados %

    7 279 12,868 264 12,179 228 10,5110 195 8,99Total 2.169 100Fonte: IBGE, Perfil dos municpios brasileiros - gesto pblica 2002.Elaborao da autora.

    Quanto atuao dos CIS, segundo estudo de Lima & Pastrana, que teve por objetivo traar

    diagnstico dos consrcios em Minas Gerais16, observou-se que, nesse estado, 95,7% das parcerias

    foram constitudas, entre outras finalidades, para o atendimento de especialidades e servios de

    apoio diagnstico. Apenas 25,7% dos consrcios em Minas realizavam aes de ateno bsica e

    28,6%, de ateno hospitalar.

    Informaes da Secretaria Estadual de Sade do Mato Grosso17 revelam que 100% dos con-

    srcios do estado atendem a reas de especialidades mdicas (assistncias secundria e terciria) e

    realizam exames complementares de apoio diagnstico.

    No tocante ao financiamento dos CIS, pesquisa desenvolvida pelas mesmas autoras18, em que