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ENTRE A JUDICIALIZAÇÃO E A JURIDICIZAÇÃO DA POLÍTICA: O ESPAÇO QUE CABE À ADVOCACIA DE ESTADO Tiago Gubert Cury 1 Brasília 2015 1 Procurador do Estado do Rio Grande do Sul. Email: [email protected]

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ENTRE A JUDICIALIZAÇÃO E A JURIDICIZAÇÃO DA POLÍTICA: O ESPAÇO QUE CABE À ADVOCACIA DE ESTADO

Tiago Gubert Cury1

Brasília

2015

1 Procurador do Estado do Rio Grande do Sul. Email: [email protected]

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RESUMO

O intuito deste trabalho é demonstrar que o protagonismo judicial não representa solução para

a crise de legitimidade, mas arrisca agravar o desequilíbrio entre os poderes e o próprio

núcleo essencial da democracia. Pretende-se também demonstrar que somente a ocupação,

pela Advocacia Pública, do espaço que lhe cabe, poderá reestabelecer o equilíbrio e instaurar

um Estado de Juridicidade.

1. INTRODUÇÃO

Nunca foi tão palpável a tensão existente entre constitucionalismo, que reconhece

nos textos constitucionais norma apta a orientar e limitar o exercício do poder político, e

democracia, que reconhece a soberania do povo e a ideia de autogoverno. De um lado, o

poder para decidir, democrática e majoritariamente, quanto às regras que deverão reger a vida

social; de outro, a limitação deste poder.

Trata-se, ao fim e ao cabo, de tensão entre Direito e Política, especialmente porque,

se o poder político encontra fundamento, limites e orientação na norma constitucional, então

exercer política é aplicar a Constituição.

Por óbvio, decidir em meio à divergência não é tarefa das mais simples. Por mais que

os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil estejam estabelecidos pelo

constituinte2, definir os meios a serem empregados para alcançá-los é um trabalho bastante

tormentoso, especialmente se consideradas as circunstâncias da política3: (i) o povo,

2 Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. 3 A construção foi extraída da obra Law and Disagreement, de Jeremy Waldron. O autor faz uma adaptação da ideia de circunstâncias da justiça, de John Rawls. Waldron refere: “the felt need among the members of a certain group for a common framework or decision or course of action on some matter, even in the face of disagreement about what that framework, decision or action should be, are the circumstances of politics. (...) Like scarcity and limited altruism in the case of justice, the circumstances of politics come as a pair. Disagreement would not matter if there did not need to be a concerted course of action; and the need for a common course of action would not give rise to politics as we know it if there was not at least the potential for disagreement about what the concerted course of action should be”. Em tradução livre: “a necessidade sentida pelos membros de um determinado grupo por uma linha de atuação, decisão ou curso de ação comum a respeito de algum assunto, mesmo quando houver dissenso sobre qual deve ser essa linha de atuação, decisão ou curso de ação, são as circunstâncias da política. (...) Como a escassez e altruísmo limitado no caso da justiça, as circunstâncias da política vêm em par. Dissenso não importaria se não fosse a necessidade de um curso de ação concatenado; e a necessidade de um curso de ação concatenado não faria surgir a política como a conhecemos se

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soberano, reconhece a necessidade de agir conjuntamente para atingir determinados objetivos

sociais (por exemplo, aqueles do art. 3º da Constituição Federal), (ii) mas os indivíduos

discordam acerca dos meios a serem empregados para concretizá-los.

Quando do exercício do poder político resultam leis, atos administrativos ou mesmo

omissões que não atendem aos interesses de determinado grupo (o que invariavelmente

ocorre), surge um conflito cujo equacionamento vem sendo protagonizado pelo Poder

Judiciário.

Assim é que o Judiciário, só nos últimos anos, decidiu sobre: (i) pesquisa com

células-tronco embrionárias (ADI 3.510-DF); (ii) interrupção da gestação de fetos

anencefálicos (ADPF 54/DF); (iii) legitimidade de ações afirmativas e quotas sociais e raciais

(ADI 3.330); (iv) importação de pneus usados (ADPF 101-DF); (v) proibição do uso de

amianto (ADI 3.937-SP)4. Está na iminência de decidir sobre a (des)criminalização do uso de

drogas (RE 635.659-SP), e acaba de julgar pela inconstitucionalidade de dispositivos legais

que autorizavam contribuições de pessoas jurídicas ao financiamento de campanhas eleitorais

(ADI 4650). Isso para não referir as inúmeras intervenções em políticas públicas, realizadas

pelo Poder Judiciário, quando julga ações individuais ou coletivas.

Não à toa, em entrevista concedida à revista VEJA5, Joaquim Falcão referiu ao

século XXI como o “século do Judiciário”:

As grandes questões nacionais de cada país estão sendo definidas por esse poder. Os empréstimos da chanceler alemã Angela Merkel para a Espanha foram parar na suprema corte espanhola. A política financeira do Banco Central da Europa teve de ser avaliada pela suprema corte de Portugal. No século XIX, os legislativos tinham o protagonismo. No século XX, foi a vez do Executivo. Chegou o século do Judiciário.

Não há como negar que hoje, no Brasil, existe um quadro de protagonismo judicial.

Alguns entendem que a atuação mais avantajada do Poder Judiciário é saudável e necessária,

especialmente diante da crise de legitimidade que assola os demais Poderes da República.

Apontam, então, que o Judiciário estaria apenas reequilibrando o exercício do poder,

tornando efetiva a Constituição e garantindo a própria democracia.

não houvesse, pelo menos, o potencial para o dissenso”. Extraído de WALDRON, Jeremy. Law and disagreement. Oxford University Press, 1999. Página. 103. 4Trata-se de um resumo do rol ilustrativo trazido em BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro: exposição sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência. 6ª ed. Ver e atual. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 369-369. 5FALCÃO, Joaquim. Este é o século do Judiciário. São Paulo: 2015. Veja, São Paulo, edição 2442, ano 48, n. 36, p. 15-19, 9 set 2015. Entrevista concedida a Thiago Prado.

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O intuito deste trabalho é demonstrar que o protagonismo judicial não representa

solução para a crise de legitimidade. Ao revés, arrisca agravar o desequilíbrio entre os

Poderes e o próprio núcleo essencial da democracia. Mediante incursões teóricas nos

paradigmas positivista e neoconstitucionalista, sugere um reforço das fronteiras entre os

espaços político e jurídico, sem negar o evidente e necessário diálogo entre ambos.

Ao final, ver-se-á que o Judiciário não tem condições de, sozinho, reestabelecer o

equilíbrio entre os Poderes, sendo inafastável a necessidade de que a Advocacia de Estado

seja trazida para a posição que lhe cabe no diálogo jurídico-político.

2. POSITIVISMO E NEOCONSTITUCIONALISMO

Com a difusão do paradigma neoconstitucionalista, houve uma profunda alteração na

forma como se relacionam os poderes. Isso certamente afeta a todos os operadores do Direito.

Assim, para uma melhor compreensão da temática que se pretende explorar e, especialmente,

do espaço que deve ser ocupado pela Advocacia de Estado, pretende-se analisar, ainda que

superficialmente, como se desenvolve o diálogo entre Direito e Política sob os enfoques

positivista e neoconstitucionalista.

2.1. Positivismo: ciência jurídica e política jurídica

Para os fins deste trabalho interessa a linha desenvolvida por Kelsen e, em especial, a

forma como o autor pretendeu separar as funções jurídico-científica e jurídico-política. Para

melhor compreender isso, é interessante estabelecer a premissa de que aplicação do Direito é,

simultaneamente, produção do Direito. Conforme explica Hans Kelsen6:

A aplicação do Direito é simultaneamente produção do Direito. Estes dois conceitos não representam, como pensa a teoria tradicional, uma oposição absoluta. É desacertado distinguir entre atos de criação e atos de aplicação do Direito. Com efeito, se deixarmos de lado os casos-limite - a pressuposição da norma fundamental e a execução do ato coercivo - entre os quais se desenvolve o processo jurídico, todo ato jurídico é simultaneamente aplicação de uma norma superior e produção, regulada por esta norma, de uma norma inferior. Se considerarmos a ordem jurídica estadual sem ter em conta um Direito internacional que lhe esteja supraordenado, então a norma fundamental determina, de fato, a criação da Constituição, sem que ela própria seja, ao mesmo tempo, aplicação de uma norma superior. Mas a criação da Constituição realiza-se por aplicação da norma fundamental. Por

6KELSEN, Hans. Teoria pura do direito; tradução João Baptista Machado. 8ª ed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2009. Página 261.

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aplicação da Constituição, opera-se a criação das normas jurídicas gerais através da legislação e do costume; e, em aplicação destas normas gerais, realiza-se a criação das normas individuais através das decisões judiciais e das resoluções administrativas. Somente a execução do ato coercivo estatuído por estas normas individuais - o último ato do processo de produção jurídica - se opera em aplicação das normas individuais que a determinam sem que seja, ela própria, criação de uma norma.

Tem-se assim que, por exemplo, a criação de uma lei implica, simultaneamente,

criação de Direito (o ato posto – lei – é fonte de Direito) e aplicação do Direito (pois a

criação da lei consiste no exercício de uma competência atribuída por norma constitucional).

Do mesmo modo, a prolação de uma decisão judicial implica, simultaneamente, criação do

Direito (o ato posto – norma individual da decisão judicial – é fonte de Direito) e aplicação

do Direito (pois a criação da norma individual da decisão judicial decorre do exercício de uma

competência atribuída por uma norma legal/constitucional). Por fim, também a produção de

um ato administrativo consiste em aplicação do Direito (a Constituição, a lei) e criação do

Direito (quando, v.g., cria obrigação para determinado indivíduo, ou estabelece regulamento

geral). Esta interpretação, da qual resulta criação de Direito, é denominada por Kelsen de

interpretação autêntica7.

Interpretação consiste, segundo Kelsen, numa “operação mental que acompanha o

processo da aplicação do Direito no seu progredir de um escalão superior para um escalão

inferior”8. Trata-se, sobretudo, de determinar qual o conteúdo que se deverá encontrar no “ato

a por” (a lei, a decisão judicial, o ato administrativo). Ocorre que o Direito (a norma jurídica)

padece de relativa indeterminação, sempre presente em maior ou menor grau. Esta

indeterminação pode ser intencional, quando a norma de escalão superior deliberadamente

delega à norma de escalão inferior a atribuição de continuar o processo de determinação de

conteúdo, ou não-intencional, quando decorre, por exemplo, da pluralidade de significados

dos termos empregados pelo texto da norma de direito a aplicar. Acerca dessa indeterminação,

Kelsen aponta9:

7“Através deste ato de vontade se distingue a interpretação jurídica feita pelo órgão aplicador do Direito de toda e qualquer outra interpretação, especialmente da interpretação levada a cabo pela ciência jurídica. A interpretação feita pelo órgão aplicador do Direito é sempre autêntica. Ela cria Direito. Na verdade, só se fala de interpretação autêntica quando esta interpretação assuma a forma de uma lei ou de um tratado de Direito internacional e tem caráter geral, quer dizer, cria Direito não apenas para um caso concreto mas para todos os casos iguais, ou seja, quando o ato designado como interpretação autêntica represente a produção de uma norma geral. Mas autêntica, isto é, criadora de Direito é-o a interpretação feita através de um órgão aplicador do Direito ainda quando cria Direito apenas para um caso concreto, quer dizer, quando esse órgão apenas crie uma norma individual ou execute uma sanção. (...).” Kelsen, Hans. Teoria pura do direito; tradução João Baptista Machado. 8ª ed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2009. Página 394. 8 KELSEN, Hans. Op. cit. Página 387-389. 9 Op. cit. Página 388

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Aqui temos em primeira linha a pluralidade de significações e uma palavra ou de uma sequência de palavras em que a norma se exprime: o sentido verbal da norma não é unívoco, o órgão que tem de aplicar a norma encontra-se perante várias significações possíveis. A mesma situação se apresenta quando o que executa a norma crê poder presumir que entre a expressão verbal da norma e a vontade da autoridade legisladora, que se há de exprimir através daquela expressão verbal, existe uma discrepância, podendo em tal caso deixar por completo de lado a resposta à questão de saber por que modos aquela vontade pode ser determinada. De todo o modo, tem de aceitar-se como possível investigá-la a partir de outras fontes que não expressão verbal da própria norma, na medida em que possa presumir-se que esta não corresponde à vontade de quem estabeleceu a norma.

(...)

A indeterminação do ato jurídico a pôr pode finalmente ser também a consequência do fato de duas normas, que pretendem valer simultaneamente – porque, v.g., estão contidas numa mesma lei -, contradizerem total ou parcialmente.

Conclui o jurista austríaco que, diante da permanente indeterminação do Direito a

aplicar, a cognição sobre o sentido da norma resulta na obtenção de uma moldura dentro da

qual existem várias possibilidades de definição do ato a por. A questão pode ser sintetizada

na seguinte passagem da Teoria Pura do Direito10:

O Direito a aplicar forma, em todas estas hipóteses, uma moldura dentro da qual existem várias possibilidade de aplicação, pelo que é conforme ao Direito todo ato que se mantenha dentro deste quadro ou moldura, que preencha esta moldura em qualquer sentido possível.

Do ponto de vista da Teoria Pura do Direito, portanto, há de se considerar que a

interpretação do Direito a aplicar não conduz a uma única solução possível. A identificação

das várias soluções possíveis seria um ato de cognição; a eleição de uma dessas

possibilidades, um ato de vontade.

À ciência do Direito caberia identificar as arestas que formam a moldura dentro da

qual estão presentes as várias possibilidades de aplicação do Direito. Todas as possibilidades

de aplicação que se encontrarem dentro da moldura seriam, do ponto de vista do direito

positivo, válidas (todas teriam, do ponto de vista da ciência do direito, “igual valor”11). A

escolha de uma dentre as várias possibilidades não seria tarefa da ciência jurídica. Seria um

ato de vontade, a cargo da política do Direito:

A questão de saber qual é, de entre as possibilidades que se apresentam nos quadros do Direito a aplicar, a “correta”, não é sequer – segundo o próprio

10 Op. cit.. Página 390 11 Op. cit. Página 390

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pressuposto de que se parte – uma questão de conhecimento dirigido ao Direito positivo, não é um problema de teoria do Direito, mas um problema de política do Direito. A tarefa que consiste em obter, a partir da lei, a única sentença justa (certa) ou o único ato administrativo correto é, no essencial, idêntica à tarefa de quem se proponha, nos quadros da Constituição, criar as únicas leis justas (certas). Assim como da Constituição, através de interpretação, não podemos extrair as únicas leis corretas, tampouco podemos, a partir da lei, por interpretação, obter as únicas sentenças corretas.12

As críticas mais sérias ao positivismo (ou ao positivismo de cunho normativo, como

o de Kelsen) dirigem-se justamente ao reconhecimento deste elemento volitivo no ato de

aplicação do Direito. Aponta-se que isso daria ensejo a arbitrariedades, o que não poderia ser

admitido por uma ciência jurídica.

Sem adentrar nesse mérito, tem-se que o reconhecimento expresso de que existe, no

ato de aplicação do Direito, um momento reservado à vontade pode ser de grande utilidade

para fundamentar a existência de um espaço reservado à deliberação democrática (a escolha

de uma determinada via de ação) quando da aplicação da Constituição, especialmente pelos

agentes políticos. Ao mesmo tempo, denuncia que o órgão judiciário, quando aplica o Direito,

também imprime, no ato, certa medida de volição.

2.2. Neoconstitucionalismo: judicialização da política

Apesar do apurado detalhamento teórico que Kelsen imprimiu à sua Teoria Pura do

Direito, não há como ignorar que “positivismo hoje no País é quase um palavrão13”. É

recorrente a afirmação de que o positivismo resta fulminado pelo (nem tão) novo paradigma

12 Op. cit. Página 393 13A constatação é de Daniel Sarmento e Cláudio Pereira de Souza Neto, sendo logo criticada, em nota de rodapé: “Como não positivistas, temos a necessária imparcialidade para criticar os equívocos da doutrina brasileira nas suas invectivas contra o positivismo, que muitas vezes caracterizam verdadeira ‘falácia do espantalho’: ataca-se não a própria teoria positivista, mas uma distorcida caricatura dela. Duas afirmações erradas são muito frequentes: a de que o positivismo recusa a aplicação dos princípios jurídicos e a de que ele teria sido a Filosofia do Direito cultivada na Alemanha nazista. Quanto ao primeiro ponto, não há nenhuma incompatibilidade lógica entre positivismo e princípios, desde que os princípios estejam devidamente incorporados na ordem jurídico-positiva. Vários autores positivistas contemporâneos, como Luis Prietro Sanchís, Luigi Ferrajoli e Gregorio Peces-Barba, atribuíram espaço importante para os princípios nas suas teorias. Mesmo no Direito Publico brasileiro, juristas de inspiração positivista kelseniana construíram suas com apoio em argumentação principiológica, como Geraldo Ataliba e Celso Antônio Bandeira de Mello. No que tange ao segundo ponto – a chamada redutio ad hitlerum - , os estudos mais autorizados de História do Direito comprovam que não foi o positivismo a teoria jurídica dominante no nazismo, mas uma espécie de jusnaturalismo de inspiração hegeliana, que se insurgia contra o formalismo e recorria com frequência a conceitos muito vagos para justificar a barbárie, como os de ‘comunidade popular’.”. Em SARMENTO, Daniel; SOUZA NETO, Cláudio Pereira de. Controle de constitucionalidade e democracia: algumas teorias e parâmetros de ativismo. In. SARMENTO, Daniel (Coord.). Jurisdição constitucional e política. Rio de Janeiro: Forense, 2015. Página 99-100.

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neoconstitucional. Mas talvez isso ocorra porque as expectativas depositadas no

neoconstitucionalimo estejam um pouco exageradas.

Sob o aspecto teórico, o neoconstitucionalismo pode ser compreendido mediante

análise de três grandes transformações que, conforme aponta Luís Roberto Barroso, alteraram

profundamente as teorias tradicionais acerca da aplicação do direito constitucional. Segundo o

autor, esse conjunto de alterações contempla: “a) o reconhecimento de força normativa à

Constituição; b) a expansão da jurisdição constitucional; c) o desenvolvimento de uma nova

dogmática da interpretação constitucional”.14

Daniel Sarmento e Cláudio Pereira de Souza Neto elaboram um arranjo parecido

para sintetizar as principais mudanças operadas pelo neoconstitucionalismo15:

“Essa linha teórica é fortemente associada a diversos fenômenos reciprocamente implicados, seja no campo empírico, seja no plano da dogmática jurídica, que podem ser assim sintetizados: a) reconhecimento da força normativa dos princípios jurídicos e valorização da sua importância no processo de aplicação do Direito; b) rejeição ao formalismo e recurso mais frequente a métodos ou ‘estilos’ mais abertos de raciocínio jurídico, como ponderação, tópica, teorias da argumentação, etc.; c) constitucionalização do Direito, com a irradiação das normas e valores constitucionais para todos os ramos do ordenamento; d) reaproximação entre o Direito e a Moral; e e) judicialização da política e das relações sociais, com um significativo deslocamento de poder da esfera do Legislativo e do Executivo para o Poder Judiciário.”

Ao lado do referido marco teórico, o marco filosófico do neoconstitucionalismo seria

o fortalecimento do paradigma pós-positivista, assim descrito por Luís Roberto Barroso16:

O pós-positivismo busca ir além da legalidade estrita, mas não despreza o direito posto; procura empreender uma leitura moral do Direito, mas sem recorrer a categorias metafísicas. A interpretação e aplicação do ordenamento jurídico hão de ser inspiradas por uma teoria de justiça, mas não pode comportar voluntarismos e personalismos, sobretudo os judiciais. No conjunto de ideias ricas e heterogêneas que procuram abrigo neste paradigma em construção incluem-se a atribuição de normatividade aos princípios e a definição de suas relações com valores e regras; a reabilitação da razão prática e da argumentação jurídica; a formação de uma nova hermenêutica constitucional; e o desenvolvimento de uma teoria dos direitos

14 BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito (o triunfo tardio do direito constitucional no Brasil). Disponível em: http://www.luisrobertobarroso.com.br/wp-content/themes/LRB/pdf/neoconstitucionalismo_e_constitucionalizacao_do_direito_pt.pdf. Acessado em 06/09/2015. Página 6. 15SARMENTO, Daniel; SOUZA NETO, Cláudio Pereira de. Op. cit. Página 95-96. 16 BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito (o triunfo tardio do direito constitucional no Brasil). Disponível em: http://www.luisrobertobarroso.com.br/wp-content/themes/LRB/pdf/neoconstitucionalismo_e_constitucionalizacao_do_direito_pt.pdf. Acessado em 06/09/2015. Página 6.

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fundamentais edificada sobre o fundamento da dignidade humana. Nesse ambiente, promove-se uma reaproximação entre o Direito e a filosofia.

Esse conjunto de transformações, em especial o reconhecimento de força normativa

à Constituição, a reaproximação entre Direito e Moral e o (necessário) abandono ao

formalismo exagerado, com a consequente adoção de técnicas interpretativas mais abertas,

conduziram à constitucionalização do Direito. O termo, aqui, vai entendido como “um efeito

expansivo das normas constitucionais, cujo conteúdo material e axiológico se irradia, com

força normativa, por todo o sistema jurídico”, como propugna Luís Roberto Barroso17, de

modo que “[o]s valores, os fins públicos e os comportamentos contemplados nos princípios e

regras da Constituição passam a condicionar a validade e o sentido de todas as normas do

direito infraconstitucional”.

Torna-se evidente como nunca que, se o exercício do poder político deve se dar

conforme a orientação e nos limites da Constituição, então exercer política é (deve ser)

aplicar o Direito; logo, o agir político é (deve ser) também agir jurídico.

2.3. Protagonismo judicial – justificação preocupante

Já que os valores e princípios incorporados ao texto constitucional passam a

condicionar a validade e sentido de todas as normas de direito infraconstitucional, soa lógico

que o sistema brasileiro atribua ao Judiciário18 a tarefa de apreciar a adequação constitucional

das decisões políticas tomadas pelos poderes Legislativo e Executivo. A legitimidade deste

controle é indiscutível. Porém, sem a adequada parcimônia, essa sistemática pode conduzir a

um indesejado desequilíbrio de forças.

Em decorrência daquilo que se disse na breve exposição sobre o paradigma

constitucional, hoje não há o menor constrangimento em afirmar-se o papel político exercido

pela jurisdição constitucional19. Daí que o Supremo Tribunal Federal, conforme visto,

17 Op. cit. Página 16-17. 18 Ao menos, preponderantemente, já que não se desconhece a existência de sistemas de controle de constitucionalidade no âmbito dos Executivo e do Legislativo. 19 BARROSO, Luís Roberto. A razão sem voto: o supremo tribunal federal e o governo da maioria. In. SARMENTO, Daniel (Coord.). Jurisdição constitucional e política. Rio de Janeiro: Forense, 2015. Páginas 18 s seguintes. Luiz Fux e Carlos Eduardo Frazão referem que “enquanto órgão político, esses Tribunais de cúpula também são instâncias de representação popular, máxima quando o processo político majoritário não atende satisfatoriamente os anseios e reclames de determinado segmento da sociedade” em FUX, Luiz; FRAZÃO, Carlos Eduardo. O Supremo Tribunal Federal na fronteira entre o direito e apolítica: alguns parâmetros de atuação. In. SARMENTO, Daniel (Coord.). Jurisdição constitucional e política. Rio de Janeiro: Forense, 2015. Página 72.

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decidiu, só nos últimos anos, questões de suma importância para a sociedade, muitas delas

altamente controvertidas, especialmente em face do elevadíssimo cunho moral presente nos

debates20. Mas nem é preciso ir até o órgão de cúpula do Judiciário. Como, no Brasil,

qualquer juiz pode deixar de aplicar lei ou ato normativo infralegal que repute

inconstitucional, é corriqueiro o afastamento da incidência de normas infraconstitucionais na

praxe forense. Para ficar com três exemplos bastante singelos, pode-se referir: (i) o caso em

que o juiz afasta a responsabilidade do proprietário registral de veículo alienado sem

comunicação ao órgão de trânsito, afastando a incidência do art. 134 do CTB, ao fundamento

de que a propriedade transfere-se com a tradição; (ii) o caso em que o juiz condena o Estado

ao fornecimento de medicamento ou tratamento experimental; (iii) o caso em que o juiz, em

mandado de segurança, defere matrícula escolar a criança que não completou a idade mínima

exigida nas normas regulamentares, ao fundamento de que deve prevalecer o direito

fundamental à educação, extraído diretamente da Constituição.

Em qualquer dos casos acima exemplificados, seja ou não dotado de grande

complexidade jurídico-moral, há interferência do Judiciário em políticas públicas (aqui

abrangendo normas definidoras de direitos prestacionais ou meramente organizacionais)

aprovadas pelos poderes constituídos. O desafio é definir até que ponto esta interferência é

devida, e a partir de quando passa a configurar-se como arbitrária.

Conforme adiantado, entende-se que o estado de coisas atual evidencia a existência

de um protagonismo judicial que gera um indesejável desequilíbrio de forças. Por outro lado,

o argumento clássico utilizado para barrar interferências do Judiciário em decisões políticas –

o princípio da separação dos poderes – encontra-se já superado, até pelo reconhecimento de

que a Constituição é norma jurídica que orienta e limita os poderes constituídos.

Em prol da legitimidade do controle jurisdicional, Luís Roberto Barroso compila

diversos argumentos, extraídos de diversos estudos21:

- o acolhimento generalizado da jurisdição constitucional representa uma ampliação da atuação do Judiciário, corresponde à busca de um novo

20 Conforme referido na introdução, o STF decidiu: (i) pesquisa com células-tronco embrionárias (ADI 3.510-DF); (ii) interrupção da gestação de fetos anencefálicos (ADPF 54-DF); (iii) legitimidade de ações afirmativas e quotas sociais e raciais (ADI 3.330-DF); (iv) importação de pneus usados (ADPF 101-DF); (v) proibição do uso de amianto (ADI 3.937-SP)20. Está na iminência de decidir sobre a (des)criminalização do uso de drogas (RE 635.659-SP), e acaba de julgar pela inconstitucionalidade de dispositivos legais que autorizavam contribuições de pessoas jurídicas ao financiamento de campanhas eleitorais (ADI 4650). Há quem já sustente a inconstitucionalidade de uma possível redução da maioridade penal. 21BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro: exposição sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência. 6ª ed. Ver e atual. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 79.

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equilíbrio por força da expansão das funções dos outros dois Poderes no âmbito do Estado Moderno;

- a jurisdição constitucional é um instrumento valioso na superação do déficit de legitimidade dos órgãos políticos eletivos, cuja composição e atuação são muitas vezes desvirtuadas por fatores como o abuso do poder econômico, o uso da máquina administrativa, a manipulação dos meios de comunicação, os grupos de interesse e depressão, além do sombrio culto pós-moderno à imagem sem conteúdo;

- juízes e tribunais constitucionais são insubstituíveis na tutela e efetivação dos direitos fundamentais, núcleo sobre o qual se assenta o ideal substantivo de democracia;

- a jurisdição constitucional deve assegurar o exercício e desenvolvimento dos procedimentos democráticos, mantendo desobstruídos os canais de comunicação, as possibilidades de alternância no poder e a participação adequada das minorias nos processos decisórios.

Muitos dos fundamentos em prol da legitimidade da jurisdição constitucional servem

também para fundamentar uma atuação excessivamente avantajada do Judiciário. Cabe

analisá-los um a um.

O primeiro argumento – (re)equilíbrio por força da expansão das funções dos

outros dois Poderes no âmbito do Estado Moderno – não serve para justificar a substituição,

pelo Judiciário, dos agentes políticos constitucionalmente encarregados de tomar as decisões

políticas em prol dos objetivos constitucionalmente tidos como relevantes. Protagonismo

judicial não reflete equilíbrio de forças. Se há protagonista, há desequilíbrio.

O segundo argumento – a jurisdição constitucional como instrumento de superação

do déficit de legitimidade dos órgãos políticos eletivos – também não escapa a uma análise

mais detida22. Se existe um déficit de legitimidade dos órgãos políticos eletivos, é necessário

olhar para as regras de formação da composição e de funcionamento desses órgãos eletivos.

Tais regras devem coibir os alegados desvirtuamentos. Aliás, se o problema está no déficit de

legitimidade dos órgãos políticos eletivos, a transferência de protagonismo ao Judiciário é um

sintoma, e não uma solução para o problema.

22 Esse argumento é repetido por Luís Roberto Barroso em BARROSO, Luís Roberto. A razão sem voto: o supremo tribunal federal e o governo da maioria. In. SARMENTO, Daniel (Coord.). Jurisdição constitucional e política. Rio de Janeiro: Forense, 2015. Página 22: “No Brasil, por igual, vive-se uma situação delicada, em que a atividade política desprendeu-se da sociedade civil, que passou a vê-la com indiferença, desconfiança ou desprezo. Ao longo dos anos, a ampla exposição das disfunções do financiamento eleitoral, das relações oblíquas entre Executivo e parlamentares e do exercício de cargos públicos para benefício próprio revelou as mazelas de um sistema que gera muita indignação e poucos resultados. Em suma: a doutrina, que antes se interessava pelo tema da dificuldade contramajoritária dos tribunais constitucionais, começa a voltar atenção para o déficit democrático da representação política”.

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No mais, os próprios órgãos encarregados do controle de constitucionalidade não

escapam a seus próprios desvirtuamentos, como bem aponta Paulo Bonavides em trabalho

intitulado Jurisdição constitucional e legitimidade23:

Ora, essa relação pessoal [entre juiz nomeado e entidade nomeante] tem havido lastimavelmente no caso da designação dos Ministros do Supremo Tribunal Federal do Brasil e ocorre de forma assombrosa, preocupante e em tal dimensão crescente, que já provoca uma reação generalizada no País, que procede tanto do meio jurídico como da opinião pública.

Em artigo intitulado “A escolha do ministro do Supremo”, Joaquim Falcão, mestre em Direito pela Universidade de Harvard e professor da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro, partindo desta interrogação: onde trabalhavam desde 1988 os ministros, quando indicados pelo Presidente? Deu a seguinte resposta: cerca de 50% dos indicados trabalhavam diretamente com a Presidência.

No mais, referir que a jurisdição constitucional pode superar o déficit de legitimidade

dos representantes eleitos perde sentido quando se considera que os Ministros do Supremo

Tribunal Federal são nomeados pelo Presidente da República e sabatinados pelo Senado

Federal24.

O terceiro argumento – juízes e tribunais constitucionais são insubstituíveis na

tutela e efetivação dos direitos fundamentais, núcleo sobre o qual se assenta o ideal

substantivo de democracia – é, na verdade, decorrente do anterior. Tal raciocínio exprime que,

se há um déficit democrático em relação ao Executivo e Legislativo, restaria à Justiça

Constitucional o papel de fazer valer a Constituição. Noutro estudo, Barroso parece encampar

este entendimento25:

[N]ão é incomum nem surpreendente que o Judiciário, em certos contextos, seja melhor intérprete do sentimento majoritário. Inúmeras razões contribuem para isso. Inicio por uma que é menos explorada pela doutrina em geral, mas particularmente significativa no Brasil. Juízes são recrutados, na primeira instância, mediante concurso público. Isso significa que pessoas vindas de diferentes origens sociais, desde que tenham cursado uma Faculdade de Direito e tenham feito um estudo sistemático aplicado, podem ingressar na magistratura. Essa ordem de coisas produziu, ao longo dos anos, um drástico efeito democratizador do Judiciário. Por outro lado, o acesso a

23 BONAVIDES, Paulo. Jurisdição constitucional e legitimidade (algumas observações sobre o Brasil). Estud. av., São Paulo , v. 18, n. 51, p. 129, Aug. 2004. Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142004000200007&lng=en&nrm=iso>. Acesso em 06/10/2015. 24 Art. 84, XIV, da Constituição Federal. 25 BARROSO, Luís Roberto. A razão sem voto: o Supremo Tribunal Federal e o governo da maioria. In. SARMENTO, Daniel (Coord.). Jurisdição constitucional e política. Rio de Janeiro: Forense, 2015. Página 24-25.

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uma vaga no Congresso envolve um custo financeiro elevado, que obriga o candidato, com frequência, a buscar financiamentos e parcerias com diferentes atores econômicos e empresariais. Esse fato produz uma inevitável aliança com alguns interesses particulares. Por essa razão, em algumas circunstâncias, juízes são capazes de representar melhor – ou com mais independência – a vontade da sociedade. (...)

Diversas outras razões se acrescem a essa. Em primeiro lugar, juízes possuem a garantia da vitaliciedade. Como consequência, não estão sujeitos às circunstâncias de curso prazo da política eleitoral, tampouco, ao menos em princípio, a tentações populistas. (...) Por fim, mas não menos importante, decisões judiciais precisam ser motivadas. Isso significa que, para serem válidas, jamais poderão ser um ato de pura vontade discricionária: a ordem jurídica impõe ao juiz de qualquer grau o dever de apresentar razões, isto é, os fundamentos e argumentos de seu raciocínio e convencimento.

Encaminhamentos nesse sentido enveredam por caminhos perigosos: eis que, de

repente, o fato de a decisão ser tomada por agente concursado, ao invés de eleito, e vitalício,

ao invés de temporário, torna a decisão mais... democrática? Concorda-se que não se pode

admitir como situação de normalidade o alegado desvio de conduta dos agentes políticos

eleitos, sejam eles causados por tentações populistas, ou por comprometimento com

interesses privados de agentes econômicos. Mas se tal estado de coisas representa uma

anormalidade, então não pode servir para fundamentar como normal um protagonismo

judicial que reflete, justamente, um quadro de coisas aberrante. Conforme referido, o

protagonismo judicial está mais para um sintoma do que para uma solução do problema.

Ainda em relação a este terceiro argumento, cumpre apontar que a Advocacia de

Estado possui um papel de grande relevância, mas que (por diversas razões) ainda não vem

exercendo a contento, na tutela e efetivação dos direitos fundamentais pela Administração

Pública. A questão será aprofundada na parte final deste trabalho.

Por fim, o quarto argumento - a jurisdição constitucional deve assegurar o exercício

e desenvolvimento dos procedimentos democráticos – não afasta, mas sim reforça a

importância de regras democráticas que permitam a adequada representatividade de todos os

grupos na tomada de decisões políticas, garantindo um debate transparente e igualitário entre

os envolvidos. Não se admite que haja a supressão dessa instância para que as grandes

decisões políticas da comunidade, sobre justiça, moral e direitos sejam, todas elas,

transferidas aos onze ministros do Supremo Tribunal Federal, ou a juízes singulares

espalhados pelo país. Democracia consiste em assegurar ao povo o poder de tomar,

justamente, as decisões que se mostrem mais importantes ao desenvolvimento da sociedade.

Nas palavras de Jeremy Waldron:

14

It follows that those who value popular participation in politics should not value it in a spirit that stops short at the threshold of disagreements about rights. Such curtailment, I believe, betrays the spirit of those who struggled for democracy and universal suffrage. The workers who braved cavalry charges at Peterloo in 1819, the women who chained themselves to the White House railings or threw themselves under the hooves of the King’s horse at Epsom in turn-of-the-century suffrage campaigns, the African-Americans who faced batons, police-dogs, fire hoses, and worse in the Civil Rights movement in the 1950s and ‘60s, did these things to secure a voice on the matters of political principle that confronted their community. They did not do them simply for the sake of a vote on interstitial issues of policy that had no compelling moral dimension. They fought for the franchise because they believe that controversies about the fundamental ordering of their society – factory and hours legislation, property rights, free speech, police powers, temperance, campaign reform – were controversies for them to sort out, respectfully and on a basis of equality, because they were the people who would be affected by the outcome26.

Em síntese, se o primeiro e o quarto argumentos justificam a existência de um

sistema efetivo de controle de adequação constitucional, não chegam a justificar um

protagonismo judicial. Já o segundo e terceiro argumentos, ao apontarem que existe um

déficit democrático dos órgãos políticos eletivos e que juízes e tribunais constitucionais são

insubstituíveis na tutela e efetivação dos direitos fundamentais, revelam sintomas de uma

falência orgânica que se faz iminente.

3. ADVOCACIA DE ESTADO: CIÊNCIA JURÍDICA E FUNÇÃO POLÍTICA

Tudo que se disse até agora evidencia a nítida tensão entre jurisdição constitucional

e democracia, como bem apontam Daniel Sarmento e Cláudio Pereira de Souza Neto27:

Na verdade, a relação entre jurisdição constitucional e democracia envolve uma tensão sinérgica. Há sinergia, porque o exercício adequado do controle de constitucionalidade pode proteger pressupostos necessários ao bom

26 Em tradução livre: Ocorre que aqueles que dão valor à participação popular na política não deveriam fazê-lo de modo a desistir logo ao primeiro sinal de dissenso sobre direitos. Esse encurtamento, acredito, trai o espírito daqueles que lutaram pela democracia e pelo sufrágio universal. Os trabalhadores que enfrentaram a cavalaria em Peterloo em 1819, as mulheres que se acorrentaram às cercas da Casa Branca ou se jogaram debaixo dos cascos dos cavalos do Rei em Epsom, nas manifestações pelo voto da virada do século, os afro-americanos que enfrentaram cassetetes, cães da polícia, mangueiras de incêndio, e coisas piores no movimento pelos Direitos Civis nos anos 50 e 60, fizeram essas coisas para garantir voz nos assuntos políticos que se impunham à comunidade. Não o fizeram apenas pelo voto em assuntos políticos rotineiros sem maiores dimensões morais. Lutaram pela causa porque acreditavam que controvérsias sobre os fundamentos da sociedade – legislação trabalhista, sobre jornada de trabalho, direito de propriedade, liberdade de expressão, poder de polícia, consumo de álcool, reformas eleitorais – deveriam ser resolvidas por eles próprios, de forma respeitosa e isonômica, porque eles eram as pessoas que seriam afetadas pelos resultados. Extraído de WALDRON, Jeremy. Law and disagreement. Oxford University Press, 1999. Página. 15. 27 SARMENTO, Daniel; SOUZA NETO, Cláudio Pereira de. Op. cit. Páginas 83-84.

15

funcionamento da democracia, como as regras equânimes do jogo político e os direitos fundamentais. (...)

Entretanto, há também uma tensão potencial entre a jurisdição constitucional e a democracia. Se a imposição de limites para a decisão das maiorias pode ser justificada em nome da democracia, o exagero revela-se antidemocrático, por cercear em demasia a possibilidade de o povo se autogovernar. O problema se agrava quando a jurisdição constitucional passa a ser concebida como o fórum central para o equacionamento dos conflitos políticos, sociais e morais mais relevantes da sociedade, ou como detentora do poder de ditar “a última palavra” sobre o sentido da Constituição. Em outras palavras, a dificuldade democrática pode não vir do remédio – o controle de constitucionalidade –, mas da sua dosagem.

Esta tensão fica ainda mais aparente quando se aceita a relativa indeterminação

como circunstância inerente ao ato de aplicação do Direito. Esta indeterminação é

reconhecida (ainda que de maneiras diferentes) tanto pelo positivismo kelseniano como pelo

paradigma neoconstitucionalista. Por isso, a aplicação do Direito contempla, para além do

aspecto cognoscitivo, também um elemento discricionário (ou voluntarista, se assim se

preferir) que, apesar de tão criticada no positivismo kelseniano, permanece presente no

paradigma neoconstitucionalista. Este, afinal, quando admite que aplicar o Direito é

interpretar princípios, ponderar valores, para, sempre que necessário, elaborar uma solução

que não está ‘pré-pronta’ no ordenamento, está afirmando também que existe um espaço de

escolha, e escolha é vontade, ainda que limitada pela ordem jurídica constitucional (e pelos

princípios e valores que a informam). Ainda que se exija adequada fundamentação para as

escolhas feitas, é impossível afastar, por completo, o elemento volitivo presente no ato de

aplicação do Direito.

É de se questionar, então, a afirmativa de que o positivismo resta superado pelo

advento do neoconstitucionalismo. Afinal, o positivismo (ao menos na linha desenvolvida por

Kelsen) jamais se revelou incompatível com o caráter normativo dos princípios ou com o

controle de constitucionalidade de normas. No mais, se é certo que recusa uma correlação

conceitual necessária entre Direito e Moral, nunca recusou a possibilidade de incorporação de

normas morais ao direito positivo28.

28 Em suas próprias palavras: “A produção do ato jurídico dentro da moldura da norma jurídica aplicanda é livre, isto é, realiza-se segundo a livre apreciação do órgão chamado a produzir o ato. Só assim não seria se o próprio Direito positivo delegasse em certas normas metajurídicas como a Moral, a Justiça, etc. Mas, neste caso, estas transformar-se-iam em normas de Direito positivo.” Kelsen, Hans. Teoria pura do direito; tradução João Baptista Machado. 8ª ed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2009. Página 393-394. Aqui há que se concordar com Lenio Streck, quando afirma que “Kelsen separou a ciência do direito da moral e não o direito da moral”, em STRECK, Lenio Luiz. Cumprir ou não a lei? Dois casos de “antipositivismos” equivocados. Disponível em http://www.conjur.com.br/2014-nov-27/senso-incomum-cumprir-ou-nao-lei-dois-casos-antipositivismos-equivocados. Acessado em 05/09/2015.

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Por outro lado, o positivismo kelseniano, ao reconhecer expressamente a presença do

elemento volitivo no ato de aplicação do Direito, apresenta uma vantagem em relação ao

neoconstitucionalismo. Enquanto Kelsen reconhece a relativa indeterminação do Direito a

aplicar, e oferece, em resposta, a moldura de possibilidades como limite de aplicação, o

neoconstitucionalismo tenta afastar esse voluntarismo, mas não deixa de admitir que “em

relação a inúmeras questões (...) a solução dos problemas não se encontra pré-pronta no

sistema jurídico”, de modo que “precisará ser construída argumentativamente pelo juiz, a

quem caberá formular juízos de valor e optar por uma das soluções comportadas pelo

ordenamento”29. A diferença é que o neoconstitucionalismo, ao menos nos moldes em que

vem sendo aplicado, dá ênfase à construção judicial do Direito, mas pouco fala da aplicação

do Direito pelo legislador e pelo administrador. Parece desconsiderar (ao menos no discurso

corrente) que Legislativo e Executivo também são órgãos jurídicos; também são intérpretes

autênticos; também aplicam (e, portanto, criam) Direito.

Esse enfoque na construção judicial do Direito, em detrimento do espaço que

também é ocupado pelos demais Poderes, acaba fomentando o fenômeno do protagonismo

judicial.

Tudo considerado, tem-se que o cenário jurídico pátrio padece de uma síndrome de

arbitrariedade, que figura como causa do protagonismo judicial, mas que também é

alimentada por ele. Arbitrariedade, aqui, deve ser compreendida numa tripla acepção30:

i. Imprevisibilidade do produto da aplicação do Direito, especialmente quando

a aplicação é feita pelo Poder Judiciário: se a indeterminação do Direito abre

margens à discricionariedade, e se o Direito a aplicar admite várias soluções

29 BARROSO, Luís Roberto. A razão sem voto: o Supremo Tribunal Federal e o governo da maioria. In. SARMENTO, Daniel (Coord.). Jurisdição constitucional e política. Rio de Janeiro: Forense, 2015. Página 14. 30 Sobre a arbitrariedade, aponta Jeremy Waldron: “In modern jurisprudence, the word ‘arbitrarity’ has at least three connotations, all of them bad. (1) sometimes it means ‘unpredictable’ (…) (2) Sometimes it means ‘unreasoned’, as when a decision is made on the basis of whim or reflex prejudice rather than on the basis of argument. (…) (3) A third sense of ‘arbitrariness’ is particularly important with regard to American constitucional law. Some feel that even if judges are making moral decisions as reasonably and as predictably as they can, still their decisions lack political legitimacy. It is for the people or the legislator they have elected to make that sort of decision; it is not for the judges to take the determination of social principle and social value into their own hands”. Tradução livre: “Na doutrina moderna, a palavra ‘arbitrariedade’ tem pelo menos três conotações, todas negativas. (1) Às vezes significa ‘imprevisibilidade’ (...) (2) Noutras vezes significa ‘infundada’, como quando uma decisão é tomada com base em razões inexplicáveis, ou em preconceitos, ao invés de fundada em argumentação (...) Um terceiro sentido de ‘arbitrariedade’ é particularmente importante no que diz respeito ao direito constitucional americano. Alguns entendem que mesmo quando juízes tomam decisões morais da forma mais fundamentada e previsível possível, ainda assim essas decisões carecem de legitimidade política. É ao povo ou aos legisladores eleitos que cabe a tomada de tais decisões; não cabe aos juízes tomarem para si a função de determinar os princípios e valores da sociedade.” WALDRON, Jeremy. Law and disagreement. Oxford University Press, 1999. Página. 167-168.

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possíveis para uma dada situação, é possível que casos idênticos, se julgados

isoladamente, recebam soluções distintas. Para isso, necessária a criação de

sistemas de contenção de arbitrariedades deste tipo.

ii. Ausência de fundamentação das decisões: uma decisão desprovida de

fundamentação racional (ainda que previsível) também pode ser tomada

como arbitrária. Isso pode afetar a aplicação do Direito por qualquer dos

poderes constituídos.

iii. Ausência de legitimação política: ainda que juízes ponderem e concretizem

os princípios e valores tutelados pela ordem jurídica da forma mais previsível

e fundamentada possível, suas decisões podem ser tidas como arbitrárias

quando conflitarem com decisões tomadas por agentes políticos eleitos pelo

povo, ante a ausência de legitimação política.

Parte desses problemas já conta com soluções razoavelmente encaminhadas. A

arbitrariedade decorrente da ausência de fundamentação nas decisões judiciais tende a ser

combatida com atribuição de maior ônus argumentativo aos órgãos jurisdicionais31; a

imprevisibilidade das decisões – em especial, ante a possibilidade de decisões diversas para

casos semelhantes – pode ser enfrentada mediante criação de um sistema de precedentes

judiciais vinculantes32. A questão mais intrincada, porém, respeita à ausência de legitimação

política. Conforme visto, os defensores de uma intervenção judicial mais ostensiva alegam

que, em certas ocasiões, o Judiciário encontra melhores condições de refletir os interesses das

maiorias democráticas, dados os constantes desvios e falhas estruturais que minam a

legitimidade política dos agentes eleitos.

Nem tudo, porém, pode ser resolvido pelo Judiciário. Falta-lhe legitimação

democrática, e isso é inerente ao seu perfil institucional. O caminho há que seguir pelo

restabelecimento da legitimação dos órgãos eleitos. Para sanear esta questão e, assim,

reestabelecer o equilíbrio de forças, imprescindível que se restitua à Advocacia Pública as

condições necessárias para que exerça, adequadamente, sua função precípua: o controle de

juridicidade da Administração Pública.

31 Veja-se, por exemplo, a previsão contida no art. 489, §1º, da Lei 13.105/15 (Novo Código de Processo Civil). 32 Parece ser o caminho adotado pelo Novo Código de Processo Civil

18

3.1. Advocacia pública e controle de juridicidade

Graças ao labor e esforços de renomados juristas, hoje não é preciso dizer muito para

demonstrar que a função precípua da Advocacia de Estado é a defesa do interesse público.

Mas, como não podia deixar de ser, o emprego do termo interesse público revela, uma vez

mais, a indeterminação relativa do Direito. Há muitos interesses públicos. Renato Alessi, por

exemplo, falava em interesse público primário e interesse público secundário. Quanto a isso,

considera-se acertado o entendimento segundo o qual à Advocacia de Estado caberia,

precipuamente, a tutela do interesse público primário, admitindo-se a defesa do interesse

público secundário quando este for compatível com aquele. Tais conclusões podem ser

extraídas de autorizadas vozes, referindo aqui, em nome de todas, as de Diogo de Figueiredo

Moreira Neto e Luciane Moessa de Souza33.

Mas mesmo a compreensão do que seja interesse público primário não é unívoca. Há

diversos interesses públicos primários que, não raro, conflitam, exigindo a tomada de decisão

sobre qual deverá preponderar.

Reconhecendo o fenômeno, o constituinte, ao tratar das Funções Essenciais à Justiça,

estipulou a segmentação em vários ramos, contemplando o Ministério Público, na seção I; a

Advocacia Pública, na seção II; a Advocacia (em geral), na seção III; e a Defensoria Pública,

na seção IV. Todas essas funções dirigem-se à tutela do interesse público, cada qual à sua

maneira.

À Advocacia de Estado o constituinte atribuiu (i) a assessoria e consultoria jurídica

do Poder Executivo e (ii) a representação judicial do Estado. Essa dicotomia é fundamental.

Não por menos, ao referir “as atividades de consultoria e assessoramento jurídico”, o art. 131

da Constituição Federal34 destina-as ao Poder Executivo, enquanto remete à União (ou,

adaptando, ao Estado) a função de representação judicial e extrajudicial. Vale dizer: o

33 SOUZA, Luciane Moessa de. Autonomia institucional da advocacia pública e funcional de seus membros: instrumentos necessários para a concretização do Estado Democrático de Direito. In. GUEDES, Jefferson Carús; SOUZA, Luciane Moessa de (Coord.). Advocacia de Estado: questões institucionais para a construção de um Estado de Justiça: estudos em homenagem a Diogo de Figueiredo Moreira Neto e José Antonio Dias Toffoli. Belo Horizonte: Fórum, 2009 e MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. A Advocacia de Estado revisitada: essencialidade ao Estado Democrático de Direito. In GUEDES, Jefferson Carús; SOUZA, Luciane Moessa de (Coord.). Advocacia de Estado: questões institucionais para a construção de um Estado de Justiça: estudos em homenagem a Diogo de Figueiredo Moreira Neto e José Antonio Dias Toffoli. Belo Horizonte: Fórum, 2009. 34 Constituição Federal, art. 131. A Advocacia-Geral da União é a instituição que, diretamente ou através de órgão vinculado, representa a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo.

19

constituinte tinha claro que à Advocacia de Estado cabe a prestação de dois serviços, para

dois clientes distintos: representa, judicial e extrajudicialmente, o Estado (entidade

permanente), e provê orientação jurídica ao Poder Executivo (poder democraticamente eleito

para exercer, politica e provisoriamente, as atribuições que lhe competem, segundo a vontade

majoritária, e desde que nos limites da Constituição).

Essa dicotomia confere às funções acometidas à Advocacia de Estado uma dupla

dimensão que precisa ser mais bem compreendida. Tal somente é possível tomando em conta

(i) que a Constituição incorporou em seu texto normativo diversos princípios e valores, que

figuram como limites para a atuação estatal, (ii) que o constituinte, ainda que estabelecendo

tais limites, deixou uma considerável margem de liberdade para tomada de decisões políticas,

(iii) que o exercício dessa liberdade é orientado pelo princípio democrático e por

procedimentos constitucionalmente estabelecidos, (iv) de modo que os representantes do

povo, eleitos para tomada de decisões em nome dele, ao exercerem o poder que lhes compete,

agem politicamente, mas, simultaneamente (e sobretudo), agem juridicamente.

Daí a necessidade de o Constituinte estabelecer, como função essencial à Justiça, um

órgão cuja atribuição seja prover orientação jurídica ao Poder Executivo. E é preciso ter bem

claro: se o agir político é (deve ser) agir jurídico, o exercício do poder político constituído

somente é legítimo quando (e enquanto) atue dentro dos limites traçados pelo poder

constituinte. Para sintetizar: o exercício do poder político somente é legítimo quando exercido

dentro dos limites da juridicidade, de modo que a orientação jurídica que deve ser exercida

pela Advocacia de Estado somente pode ser compreendida como orientação para uma

atuação política dentro dos limites da juridicidade.

Já a representação judicial e extrajudicial do Estado, que não se confunde com o

papel de prover orientação jurídica ao poder político, apesar de não menos importante, deve

compatibilizar-se com o que restou exposto.

Resta, portanto, saber como compreender e compatibilizar ambas as dimensões

(orientação jurídica do poder político e representação do Estado) dessa Função Essencial à

Justiça.

20

3.2. Advocacia Pública e ciência jurídica

É para explicitar o modo como se deve exercer a atribuição de orientar,

juridicamente, o agir político, que se socorre na concepção de ciência do Direito

desenvolvida por Hans Kelsen, nos termos delineados alhures.

Tomando-se por premissa que (i) o Direito a aplicar (a Constituição e as leis, e todos

os princípios, regras e valores nelas positivados) forma uma moldura dentro da qual existem

várias possibilidade de aplicação, resultando conforme ao Direito todo ato que se mantenha

dentro deste quadro ou moldura, (ii) e que a escolha de uma dentre as várias possibilidades de

aplicação é um ato de vontade ou de política do Direito, caberá concluir que (iii) o agente

político que pretenda observância à Constituição quando do estabelecimento de um ato

jurídico encontrará, na ordem jurídica, uma moldura dentro da qual existirão várias

possibilidades, devendo escolher uma dentre as várias, sendo que qualquer delas será tida

como conforme ao Direito.

O uso do termo política de Direito não é despropositado. Já ficou bastante claro que

não se defende que ao administrador, ou ao legislador, caiba qualquer escolha. Política de

Direito não é politicagem, e discricionariedade não é arbitrariedade. A escolha somente será

válida se observar os limites da moldura deduzida da interpretação do texto constitucional.

Diogo de Figueiredo Moreira Neto fala em “decidir de direito”35. Ao legislador cabe criar as

leis necessárias para, conferindo densidade aos comandos constitucionais, efetivar,

harmoniosamente, os inúmeros interesses que representam os fins do Estado; ao

administrador cabe dar fiel execução a essas leis. Num e noutro caso, escolhas serão feitas.

Se à Advocacia de Estado é atribuída a função e controlar a juridicidade dessas

escolhas, quando emanadas do Poder Executivo, propõe-se que tal controle consista no

adequado delineamento dos limites traçados pela moldura de possibilidades de aplicação do

Direito. Cabe orientar o administrador sobre como é possível agir para que ele eleja, dentre as

possibilidades abertas, aquela que, segundo a vontade do povo que ele representa, melhor

atenda ao desempenho do múnus que lhe cabe enquanto agente político democraticamente

eleito para fazer tais escolhas.

35MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. A Advocacia de Estado revisitada: essencialidade ao Estado Democrático de Direito. In. GUEDES, Jefferson Carús; SOUZA, Luciane Moessa de (Coord.). Advocaica de Estado: questões institucionais para a construção de um Estado de Justiça: estudos em homenagem a Diogo de Figueiredo Moreira Neto e José Antonio Dias Toffoli. Belo Horizonte: Fórum, 2009. p. 43

21

Noutras palavras, ao exercer o controle de juridicidade, deve o advogado público

postar-se como autêntico cientista do Direito. Posto um problema, deverá verificar, a partir da

análise do Direito a aplicar, o delineamento da moldura de possibilidades, apresentando ao

agente político os limites de liberdade que a juridicidade confere a seu agir político.

O atuar científico, orientado ao agir político, coloca da Advocacia de Estado em

posição única dentre as carreiras públicas que integram as Funções Essenciais à Justiça.

Dentre todas, é a única da qual pode exigir-se tal postura36; as demais carreiras exercem,

antes, funções jurídico-políticas, pois trazem ao Tribunal uma interpretação que pretendem

seja reconhecida como a única correta para o Direito a aplicar. A diferenciação proposta é

extraída, mais uma vez, do mestre Hans Kelsen37:

A interpretação jurídico-científica não pode fazer outra coisa senão estabelecer as possíveis significações de uma norma jurídica. Como conhecimento do seu objeto, ela não pode tomar qualquer decisão entre as possibilidades por si mesma reveladas, mas tem de deixar tal decisão ao órgão que, segundo a ordem jurídica, é competente para aplicar o Direito. Um advogado que, no interesse do seu constituinte, propõe ao tribunal apenas uma das várias interpretações possíveis da norma jurídica a aplicar a certo caso, e um escritor que, num comentário, elege uma interpretação determinada, de entre as várias interpretações possíveis, como a única “acertada”, não realizam uma função jurídico-científica, mas uma função jurídico-política (de política jurídica).

Portanto, ao Advogado de Estado, no papel de controle de juridicidade, cabe a

função jurídico-científica, deixando ao administrador o papel decisório, o papel de política

jurídica (ou, melhor, política-dentro-da-juridicidade).

3.3. Advocacia pública e política: a defesa do princípio majoritário

Visto que controle de juridicidade – função precípua da Advocacia de Estado –

consiste exatamente em conciliar escolhas políticas e normatividade constitucional, resta

analisar como isso se compatibiliza com a atuação em juízo.

Todas as funções essenciais à Justiça atuam ostensivamente em juízo. Não raro,

figuram em polos opostos da demanda, sem que deixem de patrocinar, cada qual a seu modo,

a defesa do interesse público. Mas aqui também há uma peculiaridade que singulariza o atuar

36 Poder-se-ia dizer que o Ministério Público, quando atua na qualidade de fiscal da lei, exerce função semelhante. Para além de outras objeções possíveis, há que se considerar que o Ministério Público não possui a mesma relação de proximidade com o poder político, se comparado à Advocacia de Estado. 37 KELSEN, Hans. Op. cit. Páginas 395-396.

22

da Advocacia de Estado. Para demonstrá-lo, pede-se escusas para trazer alguns exemplos de

situações bastante corriqueiras na praxe forense:

i. Numa ação ajuizada por intermédio da Defensoria Pública, em que se postula o

fornecimento de medicamentos, o advogado público defenderá a negativa

administrativa38, aduzindo a existência de uma política pública que, embasada

em evidências científicas, excluiu de seu rol de prestações aquele medicamento

postulado, mas que contempla o fornecimento de outros medicamentos,

igualmente eficazes para tratamento do quadro clínico apresentado.

ii. Numa ação, patrocinada por advogado privado, em que o administrado pretende

afastar a responsabilidade decorrente da prática de infrações de trânsito, alegando

que foram praticadas por terceiro adquirente o veículo, que não comunicou a

transferência ao órgão de trânsito, o advogado público busca amparo no art. 134

do Código de Trânsito Brasileiro, que torna o alienante solidariamente

responsável pelas penalidades impostas quando não efetivada a comunicação de

venda.

iii. Numa ação em que se busca direito à matrícula escolar, indeferida porque a

criança não possui a idade mínima exigida pelas normas vigentes, o Procurador

do Estado busca afirmar a validade de tais normas (aduzindo que tem lastro em

estudos pedagógicos e na necessidade de estabelecer parâmetros e garantir

previsibilidade ao número de vagas necessárias para atendimento da demanda

para o ano letivo) e do ato de indeferimento praticado com fundamento nelas.

Poder-se-ia seguir indefinidamente, apenas para demonstrar que o traço comum na

atuação do advogado público, em todos os casos, é a defesa centrada, primariamente, em

argumentos de fundamento imediatamente legal e mediatamente constitucional39. O

raciocínio subjacente pode ser expresso assim: “se o ato impugnado foi praticado com

fundamento em lei; e se essa lei é dotada de adequação constitucional, então o ato é jurídico e

deve ser mantido”. As demais funções essenciais à Justiça não encontram o menor

constrangimento em postular o afastamento desses atos, que, não raras vezes, reputam como

juridicamente inválidos.

38 Desde que tal negativa tenha sido exarada com amparo nas normas jurídicas regentes da política pública em questão. 39 Se o advogado, porém, concluir, após detida análise, que o ato impugnado é antijurídico (carente de fundamento legal ou manifestamente contrário à Constituição), entende-se que não deverá defende-lo, mas sim atentar para os procedimentos internos à organização da carreira tendentes ao reconhecimento, em juízo, do direito postulado pelo autor, ou, ao menos, limitação do âmbito da defesa (v.g., não impugnar a alegação de ilicitude do ato, mas discutir apenas quantum indenizatório).

23

O fato de o Advogado de Estado buscar, primariamente, amparo normativo-

constitucional para a defesa dos atos impugnados por outros atores jurídicos diz muito sobre a

natureza do interesse público tutelado pelos advogados públicos, que poderá ser mais bem

compreendida resgatando, uma vez mais, a distinção entre função científico-jurídica e função

político-jurídica, nos moldes propostos por Kelsen.

À função jurídico-científica, conforme visto, cabe estabelecer as possíveis

significações de uma norma jurídica. Ela não pode tomar qualquer decisão entre as

possibilidades reveladas, devendo deixar tal decisão ao órgão que, segundo a ordem jurídica,

é competente para aplicar o Direito. Esta função seria exercida pela Advocacia de Estado para

fins de orientação jurídica do poder político, exercendo controle de juridicidade.

Já a decisão pela adoção de uma dentre as várias possibilidades de aplicação do

Direito caberia à função jurídico-política. Assim, para Kelsen40:

[u]m advogado que, no interesse do seu constituinte, propõe ao tribunal apenas uma das várias interpretações possíveis da norma jurídica a aplicar a certo caso, e um escritor que, num comentário, elege uma interpretação determinada, de entre as várias interpretações possíveis, como a única ‘acertada’, não ‘realizam uma função jurídico-científica, mas uma função jurídico-política (de política jurídica).

Conforme visto, quando o agente político (legislador ou administrador) edita lei ou

produz ato administrativo, está aplicando o Direito. Como o Direito a aplicar (a Constituição,

as leis) padece de relativa indeterminação, o agente político elege, dentre as várias possíveis,

uma interpretação determinada. Exerce, portanto, função jurídico-política.

Quando atuam em juízo impugnando a validade de uma dada lei ou ato

administrativo, o advogado privado, o defensor público e o Ministério Público também

propõem ao tribunal uma determinada interpretação do Direito a aplicar, mas diversa daquela

interpretação dada pelo agente político que estatuiu o ato impugnado. E aqui reside a

peculiaridade que marca a atuação do advogado público: a interpretação do Direito a aplicar

que ele defenderá em juízo será aquela interpretação dada pelo agente político eleito. Ao

contrário dos atores vinculados às demais funções essenciais à Justiça, o advogado público

não exerce, ele próprio, função jurídico-política, mas se limita à defesa da decisão jurídico-

política tomada pelo agente político democraticamente eleito e, portanto, legitimado para a

decisão. Defende, em suma, uma interpretação autêntica.

40KELSEN, Hans. Op. cit. Páginas 395-396.

24

Tem-se, portanto, que a Advocacia de Estado, quando atua em juízo na defesa de um

ato legal ou administrativo, está defendendo uma interpretação dada ao ordenamento jurídico

por órgão democraticamente eleito para tanto. Isso porque, conforme dito alhures, o

legislador, ao editar leis, está aplicando a Constituição, e, simultaneamente criando Direito;

do mesmo modo, o administrador, ao estatuir um determinado ato, está aplicando a

Constituição, as leis e demais normas de hierarquia superior, e, simultaneamente, criando

Direito.

Considerando que a Constituição da República Federativa do Brasil estatuiu um

regime democrático representativo, pautado pelo princípio majoritário, mediante eleição

periódica de representantes através do voto direto, secreto e universal, é a estes representantes

que cabe o exercício da função jurídico-política. É esta legitimação – a legitimação pelo

princípio majoritário – que figura no cerne da ideia de interesse público tutelado pela

Advocacia de Estado.

Não se olvida que os representantes eleitos deverão observar os limites

procedimentais e materiais estabelecidos pelo poder constituinte, contando, para tanto, com a

orientação jurídica da Advocacia de Estado, órgão encarregado desta função.

Quando o ato emanado do poder político for constitucionalmente adequado (ou seja,

quando o poder decisório ínsito ao ato de aplicação do Direito houver sido exercido dentro

dos limites estabelecidos pelo Direito a aplicar), será atribuição da Advocacia de Estado

defender este ato. Como dito, ao fazê-lo, estará defendendo o princípio majoritário. O

tribunal que afastar um ato constitucionalmente adequado, estatuído pelo agente político

competente, para substituí-lo por outro ato, ainda que também materialmente adequado à

Constituição, estará usurpando poder político que não lhe pertence, e proferindo decisão

judicial arbitrária. Afinal, a substituição de um ato constitucionalmente adequado por outro

ato constitucionalmente adequado configura, em última análise, a substituição de uma vontade

por outra, e não se admite afastamento da vontade democraticamente formada pela vontade do

juiz.

Por outro lado, quando o ato emanado do poder político for constitucionalmente

inadequado (ou seja, quando o poder político houver laborado fora dos limites estabelecidos

pelo ordenamento jurídico), o ato será contrário ao Direito, e não será atribuição da

Advocacia de Estado defender-lhe o mérito. Poderá, apenas, exercer o contraditório para

apurar a veracidade dos fatos alegados, o adequado montante do dano, e, se for o caso, apurar

eventual responsabilização de terceiros.

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4. CONCLUSÕES

A forma de compreender a relação entre Constituição e Poder passou por diversas

mudanças ao longo dos últimos séculos. Hoje se admite que o texto constitucional tem força

normativa, que ele orienta e limita os poderes constituídos, e que deve haver um sistema de

controle de adequação constitucional dos atos emanados no exercício do poder político. Tudo

considerado, a tensão que se desenha neste cenário é compreensível.

Ocorre que permanece um espaço de deliberação aos poderes eleitos, dentro do qual

poderão agir com certa liberdade. Essa liberdade deverá ser exercida de forma

constitucionalmente adequada. Como, atualmente, parece faltar um instrumento apto a

assegurar essa adequação (basta considerar os inúmeros escândalos noticiados nos últimos

tempos), fala-se em déficit de legitimação democrática dos poderes eleitos. O Judiciário passa

a considerar-se mais preparado não apenas para exercer sua função contramajoritária, mas

também para melhor representar os anseios das maiorias, não, porém, sem suscitar graves

objeções quanto à carência de legitimidade para fazê-lo. Delineia-se, então, um cenário de

crise de legitimação do poder, ou uma situação arbitrariedade endêmica.

A partir disso, somado ao que já foi exposto, pode-se concluir:

i. O atual quadro de arbitrariedade endêmica somente poderá ser contornado

mediante o aprimoramento do canal de diálogo entre Direito e Política, ou,

melhor, entre o Direito e os agentes encarregados da tomada das decisões

políticas. Este diálogo deve ser (e só pode ser) operacionalizado pela

Advocacia de Estado, à qual o art. 131 da Constituição atribui “as atividades

de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo”.

ii. A Advocacia de Estado tem posição ideal para dar cabo desta função

dialógica, pois guarda relação de proximidade tanto com o poder político

como com a comunidade jurídica.

iii. Essa função dialógica instrumentaliza-se mediante exercício da orientação

jurídica do poder político e do controle de juridicidade dos atos praticados

pela administração pública. Aqui, defende-se que o advogado público deve

investir-se em postura científica, limitando-se a estabelecer balizas para

orientação do exercício da liberdade na deliberação política.

iv. Se isso não ocorre hoje, é porque não houve o avanço necessário no

reconhecimento da independência e da autonomia da Advocacia de Estado.

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Afinal, não há como laborar cientificamente sem a necessária independência.

Enquanto a Advocacia de Estado sujeitar-se tão elevado grau de interferência

do poder político, não poderá dar cabo de sua função precípua.

v. Quando atua em juízo¸ representando a pessoa jurídica de direito público à

qual se vincula, o advogado público também guarda peculiaridade em relação

aos membros das demais funções essenciais à Justiça, pois defende opções

jurídico-políticas emanadas de intérpretes autênticos, que são os agentes

democraticamente eleitos ou aqueles que atuam em nome deles. Assim, o

advogado público, em juízo, atua em defesa do princípio majoritário, que

caracteriza o interesse público tutelado pela Advocacia de Estado.

vi. Não existe incompatibilidade entre as funções de controle de juridicidade da

Administração Pública e representação judicial do Estado, desde que a

primeira seja exercida com a adequada independência, e a segunda não seja

proposta como ‘defesa incondicional de todo e qualquer ato administrativo’.

Trata-se, ao fim e ao cabo, da dupla dimensão inerente à Função Essencial

desempenhada pela Advocacia de Estado;

vii. Não se quer aqui afirmar que a Advocacia de Estado é uma Advocacia de

Governo. Trata-se de uma Advocacia de Bons Governos, assim considerado

todo governo que der cumprimento ao juramento prestado perante o povo:

manter, defender e cumprir a Constituição, observar as leis, promover o bem

geral. Uma atuação nesses moldes permitirá à Advocacia de Estado tutelar o

interesse público, aqui entendido como aquele definido pelos representantes

do povo, democraticamente eleitos, e desde que mediante exercício

constitucionalmente adequado do poder político.

viii. Esta forma de pensar a Advocacia de Estado permite ainda conciliar as

funções de defesa do gestor e defesa do interesse público. Assim, o bom

gestor deve ser orientado (com autonomia e independência!) e defendido pela

Advocacia de Estado; o mau gestor deve ser coibido. Para tanto, necessário

instrumentalizar a Advocacia de Estado com ferramentas aptas a orientar e

controlar, com autonomia, independência, e cientificidade, o agir político.

Sem uma Advocacia de Estado autônoma e independente, a função dialógica entre

Direito e Política que lhe cabe fica prejudicada. Essa ausência gera desequilíbrio, e o espaço

que deveria ser do advogado público acaba, cada vez mais, ocupado pelo Judiciário. Ao invés

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da tão aguardada juridicização da política, teremos uma cada vez maior judicialização da

política. Perde a nação, valendo o alerta deixado, com a mais absoluta autoridade, por Diogo

de Figueiredo Moreira Neto41:

Mas, além de geralmente lento e tantas vezes defasa em suas respostas institucionais, o País, não raro teve que suportar, como um anátema a persegui-lo, uma sucessão de escolhas políticas infelizes, e aqui encontra o dado novo do controle – que em grande número delas vem ocorrendo por absoluta carência de um conveniente e efetivo controle de juridicidade – levando-o a rumos desconcertantes e anacrônicos, que não somente inibiram a implementação dos avanços necessários, como, por mais de uma vez, condenaram-no a retrocessos, entre orgias de gastos faraônicos, inflação desabrida e intermináveis demagogias.

Considerado o estado de coisas atual, quando a busca é pela verdadeira democracia,

não há, no momento, função mais nobre nem mais importante do que a Advocacia de Estado.

41 MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Op. cit. p. 33

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