Espiral 29

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N.º 29 - Outubro / Dezembro de 2007 boletim da associação FRA FRA FRA FRA FRATERNIT TERNIT TERNIT TERNIT TERNITAS AS AS AS AS MOVIMENTO MOVIMENTO MOVIMENTO MOVIMENTO MOVIMENTO espiral espiral espiral espiral espiral (continua na pág. 2) Q uantas e quantas vezes temos recitado esta invocação: «Enviai Senhor o Vosso Espírito e tudo será criado! E renovareis a face da Terra!» Nestes últimos tempos ocorre-me muitas vezes este pensamento: porque não apelar a cada membro do nosso Movimento que, no silêncio do seu cora- ção, invoque o Espírito e escute a resposta que Ele lhe transmitirá? Eu próprio o tenho feito, e por isso mesmo tomei a decisão de que vos quero falar. Quando em 2005 Quando em 2005 Quando em 2005 Quando em 2005 Quando em 2005 aceitei a escolha que de mim fizeram para assumir a presidência da Fraternitas, fi-lo com espírito de serviço, consciente de todas as minhas limitações e fraquezas, mas com vontade de ajudar a nossa caminhada com coração jovem e o dinamismo possível, de que ainda disponho. Claro que nunca o poderia fazer sozinho, e por isso apelei a um conjunto de pessoas para que me acompanhassem nesse esforço e comigo fizessem essa mesma caminhada. Foram inexcedíveis de ge- nerosidade e empenhamento, e em conjunto procu- rámos fazer o melhor para que a Fraternitas seja de facto um «movimento», não uma mera e piedosa «associação» estática e saudosista, mas algo que procurasse sempre avançar, melhorar, experimentan- do novos caminhos, tentando metodologias de ino- vação, procurando ajudas internas e externas para reflectir, aprofundar, vivenciar em conjunto e parti- lha as nossas próprias experiências e sucessos, bem como as dificuldades e fracassos. Ao longo deste tempo em que assumimos a res- ponsabilidade de dirigir, nunca esquecendo as gran- des linhas de orientação do nosso querido P. e Filipe Figueiredo, e daqueles que foram, no correr dos anos e desde o princípio, segurando o leme desta nossa frágil embarcação, procurámos estar atentos à von- tade diversificada dos membros da Fraternitas, e con- cretizar, inovando, as aspirações que foram sendo expressas em várias ocasiões. Fizemo-lo sempre em espírito de serviço, e fomos procurando recolher os sentimentos de todos face às inovações que fomos introduzindo. Como é evidente, em todo o grupo humano há diferentes sensibilidades, são várias as perspectivas, é plural a visão das coisas. Isso é uma enorme ri- queza, e o facto de nem todas as iniciativas agra- darem do mesmo modo a todos os elementos, ape- nas significa que cada um vive a sua plenitude de vida e de esperança de modo diversificado. Ainda bem, e seria assustador se sucedesse doutra forma. Nunca esteve na nossa preocupação agradar a todos, porque isso só seria possível se nada fizésse- mos, se ficássemos no imobilismo repetitivo das coi- sas. Toda a mudança tem o seu quê de inquietante, e aceitámos com tranquilidade as diferentes reac- ções às diversas iniciativas tomadas. Com tranquili- dade mas com enorme respeito por cada opinião, por cada sensibilidade. Em Abril de 2008 Em Abril de 2008 Em Abril de 2008 Em Abril de 2008 Em Abril de 2008, no nosso Encontro Nacio- nal, em Fátima, terá lugar a Assembleia-Geral para eleição por três anos dos órgãos directivos da Fraternitas. Ainda falta algum tempo, mas estas coi- sas não se improvisam. Por isso, partilho convosco a decisão de não me apresentar de novo a essa elei- ção. Os meus companheiros de caminho já sabem desta decisão e temos dialogado sobre ela. O que nos parece é que não faz muito sentido a prática que tem sido normal, não só na nossa como na maioria das instituições. A Direcção cessante é que sugere quem lhe deve suceder, e embora exista sempre a possibilidade de aparecerem outras listas, Vinde Espírito Santo e renovareis 1 Padre Américo 2 Dossier: Curso de Actualização 3 a 7 Hans Küng e a crise da Igreja 8 Carta de D. Manuel Falcão 8 SumáRIO SumáRIO SumáRIO SumáRIO SumáRIO VINDE VINDE VINDE VINDE VINDE ESPÍRITO S ESPÍRITO S ESPÍRITO S ESPÍRITO S ESPÍRITO SANTO… ANTO… ANTO… ANTO… ANTO… E RENO E RENO E RENO E RENO E RENOVAREIS AREIS AREIS AREIS AREIS

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N.º 29 - Outubro / Dezembro de 2007

boletim da associação FRAFRAFRAFRAFRATERNITTERNITTERNITTERNITTERNITASASASASAS MOVIMENTOMOVIMENTOMOVIMENTOMOVIMENTOMOVIMENTO

espiralespiralespiralespiralespiral

(continua na pág. 2)

Quantas e quantas vezes temos recitado estainvocação: «Enviai Senhor o Vosso Espírito

e tudo será criado! E renovareis a face da Terra!»Nestes últimos tempos ocorre-me muitas vezes este

pensamento: porque não apelar a cada membrodo nosso Movimento que, no silêncio do seu cora-ção, invoque o Espírito e escute a resposta que Elelhe transmitirá? Eu próprio o tenho feito, e por issomesmo tomei a decisão de que vos quero falar.

Quando em 2005Quando em 2005Quando em 2005Quando em 2005Quando em 2005 aceitei a escolha que demim fizeram para assumir a presidência da Fraternitas,fi-lo com espírito de serviço, consciente de todas asminhas limitações e fraquezas, mas com vontade deajudar a nossa caminhada com coração jovem e odinamismo possível, de que ainda disponho.

Claro que nunca o poderia fazer sozinho, e porisso apelei a um conjunto de pessoas para que meacompanhassem nesse esforço e comigo fizessemessa mesma caminhada. Foram inexcedíveis de ge-nerosidade e empenhamento, e em conjunto procu-rámos fazer o melhor para que a Fraternitas seja defacto um «movimento», não uma mera e piedosa«associação» estática e saudosista, mas algo queprocurasse sempre avançar, melhorar, experimentan-do novos caminhos, tentando metodologias de ino-vação, procurando ajudas internas e externas parareflectir, aprofundar, vivenciar em conjunto e parti-lha as nossas próprias experiências e sucessos, bemcomo as dificuldades e fracassos.

Ao longo deste tempo em que assumimos a res-ponsabilidade de dirigir, nunca esquecendo as gran-des linhas de orientação do nosso querido P.e FilipeFigueiredo, e daqueles que foram, no correr dos anose desde o princípio, segurando o leme desta nossa

frágil embarcação, procurámos estar atentos à von-tade diversificada dos membros da Fraternitas, e con-cretizar, inovando, as aspirações que foram sendoexpressas em várias ocasiões. Fizemo-lo sempre emespírito de serviço, e fomos procurando recolher ossentimentos de todos face às inovações que fomosintroduzindo.

Como é evidente, em todo o grupo humano hádiferentes sensibilidades, são várias as perspectivas,é plural a visão das coisas. Isso é uma enorme ri-queza, e o facto de nem todas as iniciativas agra-darem do mesmo modo a todos os elementos, ape-nas significa que cada um vive a sua plenitude devida e de esperança de modo diversificado. Aindabem, e seria assustador se sucedesse doutra forma.

Nunca esteve na nossa preocupação agradar atodos, porque isso só seria possível se nada fizésse-mos, se ficássemos no imobilismo repetitivo das coi-sas. Toda a mudança tem o seu quê de inquietante,e aceitámos com tranquilidade as diferentes reac-ções às diversas iniciativas tomadas. Com tranquili-dade mas com enorme respeito por cada opinião,por cada sensibilidade.

Em Abril de 2008Em Abril de 2008Em Abril de 2008Em Abril de 2008Em Abril de 2008, no nosso Encontro Nacio-nal, em Fátima, terá lugar a Assembleia-Geral paraeleição por três anos dos órgãos directivos daFraternitas. Ainda falta algum tempo, mas estas coi-sas não se improvisam. Por isso, partilho convosco adecisão de não me apresentar de novo a essa elei-ção. Os meus companheiros de caminho já sabemdesta decisão e temos dialogado sobre ela.

O que nos parece é que não faz muito sentido aprática que tem sido normal, não só na nossa comona maioria das instituições. A Direcção cessante éque sugere quem lhe deve suceder, e embora existasempre a possibilidade de aparecerem outras listas,

Vinde Espírito Santo e renovareis 1

Padre Américo 2

Dossier: Curso de Actualização 3 a 7

Hans Küng e a crise da Igreja 8

Carta de D. Manuel Falcão 8

SumáRIOSumáRIOSumáRIOSumáRIOSumáRIO

VINDEVINDEVINDEVINDEVINDEESPÍRITO SESPÍRITO SESPÍRITO SESPÍRITO SESPÍRITO SANTO…ANTO…ANTO…ANTO…ANTO…

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na prática todos se instalam na cómoda posição dedeixar essa tarefa para os outros, nada se preocu-pando com o assunto, e limitando-se a concordarou não com a lista apresentada.

É necessário que cada um vá pensando se nãolhe cabe porventura também a responsabilidade desugerir uma lista, de encontrar um grupo de genteque o acompanhe nas suas aspirações no que dizrespeito ao futuro da Fraternitas, naquilo que enten-de que deve ser feito, modificado, melhorado, ino-vado. Sobretudo numa instituição como a nossa cujamédia de idade dos associados é relativamente ele-vada, ainda se torna mais importante a renovação.

Renovar Renovar Renovar Renovar Renovar significa efectivamente «tornar novo», ouseja, não deixar envelhecer, anquilosar, ficar na roti-na. E quando pedimos ao Espírito Santo que «renovea face da terra», estamos a pedir-Lhe que em tudohaja «novidade», surpresa, atenção aos sinais dostempos e das pessoas, capacidade de mudança,espírito de juventude.

Os nossos membros mais novos em idade têm

capacidades enormes de nos ajudar a todos a reno-var, e neste momento a Fraternitas necessita muitodeles. Mas apenas se todos e todas se dispuserem aisso é que poderemos avançar, dar mais passos nocaminho que encetámos e temos vindo a seguir.

O ideal seria não que aparecesse uma única listapara as eleições de Abril 2008, mas mais que uma,para que pudéssemos «escolher» de verdade. Quan-do se apresenta só uma lista, como podemos esco-lher? Também entre nós as virtudes do espírito demo-crático se podem exercitar, mas as «listas únicas» nãoajudam nada a isso.

O Espírito sopra onde quer, mas se não nos dis-pusermos a ouvir a Sua voz e abrir o nosso coração,o Seu «sopro» não terá eficácia. Neste nosso últimoCurso de Actualização realizado em Viseu, com aexcelente orientação de D. Ilídio Leandro, vivemosclaramente essa enorme força da Palavra quandonos dispusemos a «Escutar». Este é o momento depassar à prática essa «escuta» do Espírito.

(Continuação pág. 1)

Vasco FernandesVasco FernandesVasco FernandesVasco FernandesVasco Fernandes

Pe AMÉRICO

Éum marco na história recente da Igreja doPorto; uma referência para todos. Revelou-se

essencialmente como um educador. «Não há rapa-zes maus» – uma máxima de toda a sua vida, umaaposta de toda a sua actividade. Acreditava essen-cialmente que em cada jovem há um interior válido,muitas vezes esquecido e, até, obscurecido.

A 23 de Outubro teria completado 120 anos.Natural de Penafiel, foi o oitavo filho de uma nume-rosa família. Jovem, emprega-se numa loja de fer-ragens, no Porto. Tentando melhorar o nível de vida,vai até Moçambique, onde se torna despachante.Regressa a Portugal questionado pela vida, insatis-feito, e busca a paz interior e o equilíbrio da fé noConvento dos Franciscanos, em Tui, Espanha. Per-manece dois anos. Não é aquela vida contemplativaque procura! Ele contempla Deus vivo no homem,imagem viva d’Ele.

Continua a busca. Bate à porta do Seminário noPorto. Nada consegue... Há caminhos que têm deser percorridos. E vai até Coimbra. Aí, o Bispo abre--lhe as portas à ordenação sacerdotal.

É nomeado pároco, mas não chega a tomar pos-se. Está debilitado, muito fraco! O Prelado confia-lhea «Sopa dos Pobres». Aqui, o padre Américo revelaas suas capacidades humanas e o homem de fé.Num meio desfavorecido descobre a sede que aquela

gente marginalizada tem de Deus. Não O conhe-cem! Por isso passam sem Ele.

Estamos em 1935. Padre novo, organiza umaColónia de Férias do Garoto da Baixa de Coimbra.É pouco tempo! Mas dá uma dimensão nova à vidabreve daqueles miúdos. Em 1940, aparece a pri-meira Casa do Gaiato, em Miranda do Corvo...depois a de Paço de Sousa...

O homem fraco, doente, multiplica-se. Os Laresde Rapazes, em Coimbra e no Porto, são outra eta-pa fundamental no percurso da Obra da Rua, quese vai afirmando e alargando. Mais a sul, abre umacasa para doentes incuráveis em Beire, Paredes.

«O Gaiato» é o jornal oficial de toda a Obra daRua. Partilha amor. Humaniza todas as situações. Osproblemas humanos são vistos nesta perspectiva. AFé e o Humano acompanham-se, transformam-se,apoiam-se, completam-se...

O editor dá uma perspectiva, uma visão do PaiAmérico. Num breve texto - «Pedaços de Doutrina» -recorda a palavra de fé dele.

Eu, que nunca me encontrei com o Padre Américo,nem o ouvi falar, releio agora com muita emoção assuas palavras. São de facto palavras de vida.Incarnam Aquele que veio para que tivéssemos «vidaem abundância». Há outras publicações, na mesmalinha, que reproduzem textos ou comunicam o seupensamento: «O Barredo», «O Pão dos Pobres».

Há pouco mais de 50 anos, Padre Américo foivítima de um acidente de viação. Mas continua vivona Obra da Rua e na memória do povo bom.

Há 120 anos, deram-lhe um nome - AméricoHá 120 anos, deram-lhe um nome - AméricoHá 120 anos, deram-lhe um nome - AméricoHá 120 anos, deram-lhe um nome - AméricoHá 120 anos, deram-lhe um nome - Américo

Monteiro de Aguiar -, cujas iniciais (AMA) tra-Monteiro de Aguiar -, cujas iniciais (AMA) tra-Monteiro de Aguiar -, cujas iniciais (AMA) tra-Monteiro de Aguiar -, cujas iniciais (AMA) tra-Monteiro de Aguiar -, cujas iniciais (AMA) tra-

çaram a sua vida e obra.çaram a sua vida e obra.çaram a sua vida e obra.çaram a sua vida e obra.çaram a sua vida e obra.

Joaquim SoaresJoaquim SoaresJoaquim SoaresJoaquim SoaresJoaquim Soares

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CURSO DE ACTUALIZAÇÃO - V iseu 5 a 7 de Outubro de 2007

Escolhi este tema pela suaforça e omnipresença na

nossa vida e pela carga terapêuti-ca que tem na nossa existência detodos os dias.

Não nos passa pela cabeçadeixar de utilizar a palavra comoforma de comunicação, seja paranos declararmos e fazermos pre-sentes, seja para nos comunicar-mos no nosso saber, no nossodarmo-nos e entregarmo-nos aosoutros, no nosso acolhimento, nonosso confiar e no nosso querer...

Muitas vezes, e dadas determi-nadas e quase totais dependênci-as, é a força da palavra que nostorna livres e que nos permite a de-fesa dos nossos direitos e a afir-mação da nossa personalidade.Todos nós temos um conhecimen-to inato deste valor, fruto da nossanatureza ou fruto da nossa experi-ência: mulheres e padres.

Porque é importante, e porquetodos temos consciência deste va-lor e da supremacia que dá a quema sabe usar e/ou manipular, háque utilizá-la na recta ordem, tor-nando-a fonte de saúde e de paz,para nós e para todos, e não ocontrário.

Porque me lembrei deste temae vo-lo propus? O próximo Síno-do dos Bispos, a realizar em Ou-tubro de 2009, tem como tema «APalavra de Deus na vida e na mis-

são da Igreja», e o Plano pastoralda Diocese de Viseu para os trêspróximos anos também versa amesma temática... Reflectindopara vós e convosco, estou a ac-tualizar-me, na diocese e na Igre-ja Universal. Desculpai o egoísmo,pois quero aprender muitoconvosco.

A PALAVRA pode ser tambémolhar, atitude, gesto... Isto é, umaforma de comunicação e que,como dizemos, no mal e no bem,aqueles – gestos, atitudes e olha-res – podem valer por mil pala-vras...

FORÇA TERAPÊUTICA... Sabe-mos todos que sim. Diz-se isto domédico (alguém que, só por o verou ouvir, fica curado ou, pelo me-nos, ficou melhor)... Poder-se-ádizer de qualquer área e, mesmo,de qualquer pessoa. Uma pala-vra de paz, cria paz; de amor, geraamor; de vida, gera qualidade devida... Daqui a importância emacolher bem alguém que vem terconnosco…

Não se diz que, hoje, há mui-tos psicólogos e psiquiatras porquenão há tantos confessionários?!...O atendimento corrector erespeitador de doentes psíquicos,de supostos «possessos»… é im-portante para curar, libertar, ao jeitode Lc 4, 18-19. Também se dá ocontrário: guerras de palavras;gestos que afastam; olhares quetransmitem ódio e que gelam aspessoas...

Hoje, este tema está bem na or-dem do dia, dadas as propostasque têm vindo a lume para ascapelanias hospitalares. Diz, a estepropósito, D. António Marcelino:«Só quem nunca sentiu a comuni-cação silenciosa de um gesto res-peitoso quando o silêncio diz mais

que as palavras, pode pensar quebasta que o capelão do hospitalseja como um bombeiro de servi-ço, à espera do pedido por escritoe assinado, para se poder aproxi-mar da cama do doente» (in Cor-reio do Vouga, 26.09.2007).

Sabemos, também, a inutilida-de das palavras quando elas nãotêm nem transmitem conteúdo. En-tão, diz-se: «Só tem palavreado»...«Palavras leva-as o vento»...«Parole, parole, parole»… «Deboas intenções está o infernocheio»... «Bem fala o Frei Tomás:segue o que ele diz, não o que elefaz»... Há, pois, o perigo de tor-nar a palavra inútil ou ofensiva…Assim diz S. Tiago: «Cada um sejapronto para ouvir, lento para falare lento para se irar (…) e recebeicom mansidão a Palavra em vóssemeada, a qual pode salvar asvossas almas. Mas tendes de a pôrem prática e não apenas ouvi-la,enganando-vos a vós mesmos» (Tg1, 19.21-22). É a prova de queela é, de verdade, «mais afiadado que toda a espada de doisgumes» (cf Heb 4, 12) …

PALAVRA tem origem no latim– VERBO. Verbo é um conteúdo, éa verbalização de uma acção.Deve corresponder-lhe, sempre,uma acção concreta ou o desejodela... É o centro e síntese da afir-mação e há pessoas que apenasfalam os verbos e tornam-se inteli-gíveis, enquanto os artigos, prono-mes, adjectivos, substantivos... sãoincompletos no sentido...

Então, a Palavra mais comple-ta, é Jesus Cristo, o Verbo, Palavrade Deus. É desta Palavra – torna-da Pessoa no Verbo, Jesus Cristo –que vamos, sobretudo, falar ouque vai estar na base da nossareflexão nestes dias.

A FORÇA TERAPÊUTICA DA PALAVRAfonte de saúde e de paz por D. Ilídio Leandro, Bispo de Viseupor D. Ilídio Leandro, Bispo de Viseupor D. Ilídio Leandro, Bispo de Viseupor D. Ilídio Leandro, Bispo de Viseupor D. Ilídio Leandro, Bispo de Viseu

A «Fraternitas» reuniu-se emA «Fraternitas» reuniu-se emA «Fraternitas» reuniu-se emA «Fraternitas» reuniu-se emA «Fraternitas» reuniu-se em

Viseu para o CursoViseu para o CursoViseu para o CursoViseu para o CursoViseu para o Curso

de Actualização, de 5 a 7de Actualização, de 5 a 7de Actualização, de 5 a 7de Actualização, de 5 a 7de Actualização, de 5 a 7

de Outubro. Participaramde Outubro. Participaramde Outubro. Participaramde Outubro. Participaramde Outubro. Participaram

perto de 50 membros,perto de 50 membros,perto de 50 membros,perto de 50 membros,perto de 50 membros,

e sorveram o temae sorveram o temae sorveram o temae sorveram o temae sorveram o tema

que o «Espiral» publicaque o «Espiral» publicaque o «Espiral» publicaque o «Espiral» publicaque o «Espiral» publica

nesnesnesnesnesttttte dossiere dossiere dossiere dossiere dossier, a pensar, a pensar, a pensar, a pensar, a pensar

em todos aqueles queem todos aqueles queem todos aqueles queem todos aqueles queem todos aqueles que

não puderam estarnão puderam estarnão puderam estarnão puderam estarnão puderam estar

presentes.presentes.presentes.presentes.presentes.

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No princípio era o Verbo –a Palavra –, e esta Pala-

vra é de Deus, é Deus, vem deDeus e permanece eternamente (Jo1, 1-18). Torna-nos contemporâ-neos da sua pronúncia, destinatá-rios directos e em primeira-mão.Faz de nós pessoas convocadas,como protagonistas, para a sua re-alização e para sermos testemu-nhas do seu cumprimento.

O homem tem mostrado queprecisa de ouvir Deus... No AntigoTestamento fala-se da angústiaperante o silêncio de Deus. Hojeclama-se: «Senhor Padre, reze pormim… Está mais perto de Deus…Deus, a mim, não me ouve.»

Nota-se muitas vezes nesta pro-cura que, buscando todas as for-mas de O descobrir e pôr a falar,

também há a ilicitude de «tentarDeus». Daí, Deus, depois de tertentado e experimentado tantasformas, Ele próprio Se tornou Pa-lavra. E Ela é Jesus Cristo, o VerboEncarnado, a Palavra eterna ditapelo Pai (cf Heb 1, 1-3).

De facto, a Palavra mais plenae mais perfeita é Jesus Cristo. Ele éa Palavra Criadora e Redentora doPai. Podemos, numa linguagemhumana, pensar este esquema:Deus – Verbo – Palavra – Pessoa –Jesus Cristo – Palavra de Deus –Boa Nova – Evangelho (anuncia-do, vivido, celebrado).

«No princípio existia o Verbo; oVerbo estava com Deus; e o Verboera Deus»... «Por Ele é que tudocomeçou a existir»... «e sem Elenada veio à existência»... «N’Ele é

que estava a vida de tudo o queveio a existir»... «O Verbo era a Luzverdadeira»... «E o Verbo fez-Sehomem e veio habitar connosco»...

Cristo é a Palavra de Deus e aSua força comunicadora. Esta co-municação realiza-se, em primei-ro lugar, pela Criação, e, em se-gundo, pela Redenção ou NovaCriação. Uma e outra são acçãode doação de Vida e de tudo oque significa amor.

PRIMEIRA CRIAÇÃOPRIMEIRA CRIAÇÃOPRIMEIRA CRIAÇÃOPRIMEIRA CRIAÇÃOPRIMEIRA CRIAÇÃOSão belas e significativas as Pa-

lavras da Criação (cf Gen. 1),numa harmonia perfeita entre oDeus que fala e o Deus que age:é a Palavra que Se realiza. Anteci-pa-se sempre com um refrão re-petido em cada acção, lembran-

Jesus Cristo, a Palavra Criadorae Redentora do Pai

A Palavra de Deus é viva, érealizadora, mais afiada

que a espada de dois gumes: elapenetra até onde se dividem a vidado corpo e a do espírito, as articu-lações e as medulas e é capaz dedistinguir as intenções e os pensa-mentos do coração.» (Heb 4, 12).

A Palavra de Deus tem esta for-ça – a de realizar para nós, hoje,uma Nova Encarnação e umaNova Páscoa. Por isso, ela é, tam-bém, o conteúdo da Nova Evan-gelização. Faltam os novos discí-pulos-missionários, com novosmétodos, novas estratégias, novalinguagem, novo entusiasmo...

Não é verdade que perdemoso carácter de novidade, o especi-ficamente novo do Evangelho deJesus Cristo? N’Ele tudo é novo: oTestamento, a Aliança, a Vida, o

Mediação da Palavrapara encontrar, viver e transmitir paz e saúde

Homem, o Mandamento... E hoje,para nós, o que é o Cristianismo?O que resta de novidade, ou o quesentimos de verdadeiramente novopara nós, que tenhamos alegria,pressa, necessidade de anunciaraos outros?... Precisamos de recu-perar a Teologia da Notícia, o ver-dadeiro carisma da Boa Nova daSalvação, o autêntico fundamen-to e conteúdo do Evangelho...

Não duvidamos que a Palavrade Deus é caminho de «purifica-ção», como nos diz Jesus: «Vós jáestais purificados pela palavra quevos tenho anunciado» (Jo 15, 3).Porém, será que nós nos deixamospurificar, limpar, higienizar, com aPalavra que acolhemos e anunci-amos aos outros?...

A Palavra tem uma força salu-tar, de acordo com a Epístola aos

Hebreus. Importa que a missão deJesus continue a ser vivida pelosanunciadores da Igreja e que, pelaverdade e transparência das nossasvidas, o anúncio seja significante esignificativo.

A missão de Jesus Cristo vemanunciada em S. Lucas (cf Lc 4, 18-19) e esta é a missão da Igreja:«Anunciar a Boa Nova aos pobres;proclamar a libertação aos cativos;recuperar a vista aos cegos; mandarem liberdade os oprimidos; procla-mar um ano favorável da parte doSenhor; e, cumpriu-se hoje a Escri-tura que acabais de ouvir.»

O cristão é chamado a viver estapassagem, tornando-se, pela pala-vra, pela vida e pelo testemunho,um instrumento de cura, de liberta-ção (salvação) e de paz – um ins-trumento de saúde integral, alguém

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do, sempre, o poder criador daPalavra. «Deus disse»: «Faça-se aluz»... «e a luz foi feita». «Haja umfirmamento»... «e assim aconte-ceu». «Reunam-se as águas» ... «eassim aconteceu». «Que a terraproduza»... «e assim aconteceu».«Haja luzeiros no firmamento» ...«e assim aconteceu». «Que aságuas sejam povoadas de inúme-ros seres vivos»... Deus criou, se-gundo as suas espécies (...) e viuque isto era bom» (...) Que a terraproduza seres vivos» ... «e assimaconteceu». «Façamos o ser huma-no à Nossa imagem, à Nossa se-melhança. (...) Deus criou o ser hu-mano à Sua imagem, criou-o à ima-gem de Deus; Ele os criou homeme mulher»...

REDENÇÃOREDENÇÃOREDENÇÃOREDENÇÃOREDENÇÃOSão igualmente significativas as

Palavras da Redenção, que apa-recem já, como tipo e promessa,no Livro do Êxodo (cf Ex 3, 7-10).

São, igualmente, verbos – palavras– com imediata tradução na ac-ção realizadora, criadora e liber-tadora (salvadora) de Deus: «OSenhor disse: Eu bem vi a opres-são do Meu Povo. (...) Ouvi o seuclamor. (...) Conheço os seus so-frimentos. (...) Desci a fim de o li-bertar. (...) E agora, eis que o cla-mor dos filhos de Israel chegou atéMim e vi também a tirania. (...) Eagora, vai. (...) Eu te envio... Fazsair o Meu povo.»

PLENITUDE DOS TEMPOSPLENITUDE DOS TEMPOSPLENITUDE DOS TEMPOSPLENITUDE DOS TEMPOSPLENITUDE DOS TEMPOSA Nova Criação acontece no

Anúncio do Nascimento de Jesus(cf Lc 1, 26-38): «Maria disse, en-tão: “Eis a serva do Senhor, faça-seem mim segundo a Tua palavra” =faça-se em mim a Palavra de Deus= aconteça em mim a vontade deDeus = Haja vida nova e salva-ção...

«E o anjo retirou-se de juntodela» = e assim aconteceu... no

Nascimento de Jesus (cf Lc 2, 1-20): «Hoje, na cidade de David,nasceu-vos um Salvador, que é oMessias Senhor.» = realizou-se oPlano de Deus...

«De repente, juntou-se ao anjouma multidão do exército celeste,louvando a Deus e dizendo: “Gló-ria a Deus nas alturas e paz na ter-ra aos homens do Seu agrado” =e assim aconteceu...

que, em cada situação, conhece,vive e anuncia a Boa Nova, como testemunho da própria vida.

Este desafio à Igreja Jesus fê-lono Mandato (Mt 28, 18-20), noenvio dos 72 discípulos e na fina-lidade da sua experiência apos-tólica e missionária: saudação,desejo da paz, curas, anúncio:«Dizei-lhes: “Está perto de vós oReino de Deus.” (L2 10, 1-12).

Para isto, é necessário que se-jamos coerentes e que a nossavida tenha consequências... Asbem-aventuranças, a Eucaristia, osfrutos do Espírito Santo(... ) sãoexemplos de coerência que devemtornar o nosso ser cristãodeontologicamente consciente ecompetente. Teremos a confirma-ção da palavra de Jesus (Ele refe-re que há coisas que são escondi-das aos sábios e reveladas, por-que compreendidas pelos simplese humildes) sempre que formossimples e humildes, pois compre-enderemos muito melhor e reve-

laremos com muita mais eficá-cia!...

Quando a Palavra de Deus écolocada nas mãos de pessoassimples, os frutos aparecem. É umadas experiências da leitura oranteda Bíblia. Porque toda a pessoatem a capacidade de conhecerDeus. Em cada uma existem as «se-mentes do Verbo» e a certeza deque a conversão é um «retorno», éum «voltar». Significa também que,quando vamos anunciar o Evan-gelho a alguém ou lhe comunica-mos a Palavra, Deus já lá está, an-tecipando-Se sempre, pois Ele éQuem prepara o coração de al-guém para O receber. Ele é Quemparte sempre ao encontro dequem está perdido…

Importa que eu leia e fale daPalavra de Deus como um conjun-to de cartas de amor que Deus nosfoi escrevendo ao longo da histó-ria e que, às minhas, ainda nãolhes respondi, ou, talvez, ainda nãoas compreendi, ou, mesmo, nãoabri muitas delas...

Hoje, ao ler-se a Palavra deDeus, deveria sempre dizer-se:“Leitura da Carta de S. Paulo (…)aos cristãos de Viseu, Porto, Lis-boa”… e tirar-se o «naquele tem-po», pois é no hoje da nossa his-tória que Deus nos quer falar porJesus Cristo.

E a interpretação da Palavra deDeus deve ser feita também parahoje, para as pessoas e os acon-tecimentos de hoje.

PPPPPARA REFLECTIRARA REFLECTIRARA REFLECTIRARA REFLECTIRARA REFLECTIRQual a importância da comunicação social que temos? Como nos

influencia? Como poderá ser evangélica e evangelizadora?Como vencer o anonimato em que se vive através do acolhimento,

do silêncio e da escuta dos outros? Como criar novos estilos de relaci-onamento entre pessoas?

Que pensais da concordânciaentre a palavra e a acção, nas di-versas áreas e dimensões da vida:cultural, social, política e eclesial?

Que poderemos aprender dostextos bíblicos que foram aponta-dos durante a reflexão?

Partilhai estas e as posterioresreflexões para o correio electróni-co: [email protected].

E consultai os comentários emwww.fraternitas.pt.

PARA REFLECTIR

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O silêncio é a atitude dequem quer escutar, quer

falar e, sobretudo, quer praticar aPalavra.

Silêncio, escuta, anúncio, prá-tica. Cada aspecto não é valorabsoluto em si mesmo, mas estáem relação com outros e em fun-ção de outros, e o seu objectivofinal é a comunhão. Nisto tem se-melhanças com a vida da Trinda-de. Ela é uma relação para que oOutro viva e Se construa semprena comunhão.

O Silêncio está em função daEscuta da Palavra. O Anúncio estáem função da necessidade de co-municar a Palavra. A Prática da Pa-lavra está em função da autentici-dade da mesma Palava, para queela, tal qual a semente que nos éentregue, possa ser acolhida, ger-mine e dê fruto.

Não é fácil aceitar, entender eviver o Silêncio. Normalmente, oSilêncio mete medo e traz insegu-rança. A pessoa fala, por vezes,sem ter nada a comunicar mas,somente, para não se pôr emquestão e para não ser confron-tada com as suas inseguranças...Por isso, as nossas palavras nãoproduzem efeitos... São banais esão, tantas vezes, puros ruídos.

Além disso, ao não criar con-dições de Silêncio, não há capa-cidade de reflexão, de assimila-ção, de aprofundamento, depersonalização... e as palavras eas vidas tornam-se muito superfi-ciais, muito ocas e vazias. Usam-seas palavras não para transmitirpaz, saúde, experiências de vida,mas para tirar aos outros a opor-tunidade de falar... às vezes, paracomunicar agressividade, acusa-ção, auto-suficiência, “egos”...ou, então, para não ouvir nemdeixar ouvir o que o outro podequerer comunicar, pondo-me emquestão... Não é isto que, por ve-zes, vemos – nas televisões e ou-

tros órgãos de comunicação social– nos debates políticos, por exem-plo?...

A força e o valor do Silêncioestão na oportunidade que ele dáà contemplação... manifestam-sena riqueza e força e transparênciado olhar, na beleza e serenidadee expressividade do sorriso...

O silêncio faz-nos escutar, rece-ber e saborear a Palavra de Deuscomo se a ouvíssemos no Paraísoterrestre, de mãos dadas com Deusque passeia connosco... Leva-nos,também, a escutar, receber e sa-borear, interiormente, as palavrasdos outros, como se deixássemosentrar os outros no coração, antesde lhes darmos a resposta... Nãovem daqui a expressão de «dormir,primeiro, sobre o travesseiro»? Oude «contar até 10, antes de respon-der»?... No fundo, é acolher o ou-tro no coração e, a partir daqui, terdisponibilidade de tempo, de reló-gio, de agenda e, sobretudo, decoração para escutar até ao fim…

Há necessidade dedocificarmos o coração, a cabeçae a vida e, para isto, não há comodeixarmos, pelas palavras, que osoutros entrem no meu coração e,com as suas palavras, higienizarmosa cabeça, o coração e a vida para,ao falarmos, não reagirmos pelaforça do instinto mas pelaafectividade da misericórdia (isto é,

ter, no coração, um lugar para ooutro que vem ao meu encontro).

Levar as palavas a sério é le-var os outros a sério mas, deve sertambém, não prejudicar ninguémcom palavras ocas, precipitadase agressivas. Posso dizer que nun-ca me arrependi por ter deixadode dizer palavras... Arrependi-mede dizer algumas e, por vezes, nãodescanso enquanto não peço des-culpa por ter dito determinadaspalavras... Sei que, com algumaspalavras, outras pessoas ficarama sofrer e se não foi por amor epara as ajudar, eu não tinha o di-reito de as pronunciar, somente porvaidade, vingança, nervosismo oufraqueza...

As nossas palavras deveriamconter sempre, de uma forma cla-ra, uma Boa Notícia, uma BoaNova, de forma a que, a nossapresença, junto de outrém, deixas-se sempre uma sensação de novi-dade feliz ou de coragem, paz econfiança... Deveríamos ter o gos-to de ser mensageiros de boasnovas de paz, de alegria e deamor, ainda que tenhamos quecalar algumas... É importante re-flectir e cumprir a mensagem doadágio: «Dos outros, se não po-des dizer bem, não digas nada».

Que belo exemplos os casosde Zaqueu, da Samaritana, damulher pecadora, do filho pródi-go, de Pedro... Não foram, emcaso algum, os muitos argumen-tos que mudaram as suas vidas.Foi, e é sempre, a proximidade, oolhar, o acolhimento, a ternura...,que levam à mudança... É o pre-ferir a misericórdia ao sacrifício...

Normalmente, como procedoeu?... Importa reforçar a necessi-dade de coerência entre «palavra»e «acontecimento», isto é, entre oque digo e o que faço. De outraforma, posso deixar de ser leva-do a sério: na família, na profis-são, na vida (como o rapaz queguardava o rebanho e gostava debrincar ao «aí vem lobo!».

REFLECTIR EM CASALREFLECTIR EM CASALREFLECTIR EM CASALREFLECTIR EM CASALREFLECTIR EM CASAL

Como é a nossa relação de di-álogo, de contemplação, de aco-lhimento e de escuta? Que pode-ria modificar-se na nossa vida con-jugal e familiar?

O que poderá a relaçãoTrinitária ensinar à nossa vida decasal, de família e de convivênciasocial?

Qual a importância da oraçãopara o casal e a família cristãos?

O PODER DO SILÊNCIO

CURSO DE ACTUALIZAÇÃO - V iseu 5 a 7 de Outubro de 2007

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Cada pessoa é uma Pala-vra de Deus e, como tal,

é convidada a ser uma mensagema anunciar a beleza, o bem, a ver-dade. Como e com que palavraspoderemos ser Paz e Saúde paraos outros, sobretudo para os quenos estão mais próximos?

As «palavras» mais compreen-síveis e mais eficazes são: atitudes,olhar, gestos, palavras, por estaordem. Todas elas, fundamentadasem sentimentos válidos, sinceros eduradoiros, são capazes de ven-cer todas as vicissitudes.

Nestas diversas «palavras» háexpressões que são (con)sagradase que transportam uma força ca-paz de levar calma, serenidade,amor. Vejamos algumas na Bíblia:

«Eu te perdoo os teus pecados.Vai em paz»; «Ninguém te conde-nou? Eu também não te condeno.Vai em paz»; «Eu sou a ressurrei-ção e a vida»; «Já não vos chamoservos, mas amigos»; «Meu Pai étambém vosso Pai»; «Deus amoude tal modo o mundo que lhe deuo Seu Filho único»; «Eu vim paraque tenham vida e vida em abun-dância»; «Ninguém tem maior amordo que Quem dá a vida por aque-les que ama»; «Eu sou o Pão davida»; «Eu sou a Luz do mundo»;«Eu sou o Bom Pastor»; «Eu sou oCaminho, a Verdade e a Vida»;«Não fostes vós que Meescolhestes; Eu vos escolhi a vós»;«Permanecei em Mim e Eu perma-necerei em vós»; «Vinde a Mim, vós

todos os que andais cansados… Euvos aliviarei»; «Vou preparar-vos umlugar»; «Onde dois ou três estãoreunidos no Meu nome Eu estouno meio deles»; «Eu estareiconvosco até ao fim dos tempos»;«Façamos Festa».

Para Deus, ninguém está lon-ge, perdido, afastado. Deus nãoconhece a derrota. Ele nunca Sedesilude com ninguém. Ele vai sem-pre até ao fim, por cada um. Aconversão é sempre um reencon-tro e um retorno, pois Deus nãoSe vai embora. Ele volta-Se. Ain-da que cada um de nós desistisse,Deus estava lá – Jer 1, 5-8. Aquisente-se a força evangelizadora daPalavra, quando ela é movida pelaEsperança (cf Jer 1, 9-12).

A glória de Deus é o homemque vive. Ele diz: «Amo-te.» Dizer aoutro «amo-te» é dizer-lhe: «Tu nãomorrerás», «tu és alguém que euadmiro e de quem gosto muito, talcomo és», «não penses mais nisso– perdoo-te e conta sempre comi-go. Eu quero, também, contar con-tigo», «és uma pessoa fantástica...Porém, se fizesses desta maneira,serias muito melhor...»

Há um outro aspecto importan-te: habituemo-nos a «fazer memó-ria» agradecida e reconcilia-dorados outros... Evoquemos osmomentos felizes das nossasrelações, como se de um di-ário, um álbum se tratasse,e acreditemos que essa felize encorajadora recordação

depende sempre de nós. Não se-jamos nunca como aquele mari-do que jamais se lembra dos ani-versários da esposa ou dos fi-lhos… Porém, não guardemostambém os momentos difíceis em«gavetas», que abrimos de temposa tempos e nas situações mais di-fíceis, para atirar à cara do outro.

Para sermos pessoas e sinais acomunicar paz e saúde, temos queviver estas dimensões na nossa pró-pria vida. Isto acontece quando onosso olhar e pensamento sobre apessoa de alguém é de amor, demisericórdia, de confiança, de aco-lhimento.

É cumprir a Carta de S. Tiago,quando nos diz: «Mas tendes de apôr em prática e não apenas ouvi-la,enganando-vos a vós mesmos.Porque, quem se contenta com ou-vir a palavra, sem a pôr em prática,assemelha-se a alguém que con-templa a sua fisionomia num espe-lho; mal acaba de se contemplar,sai dali e esquece-se de como era.Aquele, porém, que medita comatenção a lei perfeita, a lei da liber-dade, e nela persevera – não comoquem a ouve e logo se esquece,mas como quem a cumpre – esseencontrará a felicidade ao pô-la emprática» (Tg 1, 22-25).

CURSO DE ACTUALIZAÇÃO - V iseu 5 a 7 de Outubro de 2007

CADA PESSOA É PALAVRA DE PAZ E SAÚDE

Ao meio-dia de 1 de Novembro, festa de Todos os San-tos, no Hospital de Stº. António, no Porto, Deus chamou a Sio nosso querido Domingos Moreira, que esteve internado ummês com graves complicações pulmonares. Um tumor cere-bral limitou-o mais de nove anos, com altos e baixos, em grande sofrimento e fortes incapacidades.No entanto, nunca se revoltou, se lamuriou, se impacientou. Deixou-nos uma tremenda lição, semprecom um sorriso pacífico, e sem uma queixa. Mais um dos nossos queridos sócios que intercede por nós!À Celeste e ao seu filho Gilberto, a Fraternitas leva aquele abraço, e contem sempre connosco!

DOMINGOS MOREIRA: a lição da paz e da aceitação

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espiralespiralespiralespiralespiral Responsável: Fernando FélixPraceta dos Malmequeres, 4 - 3.º Esq.Massamá / 2745-816 Queluze-mail: [email protected]

Boletim da AssociaçãoFraternitas Movimento

N.º 29 - Outubro/Dezembro de 2007N.º 29 - Outubro/Dezembro de 2007N.º 29 - Outubro/Dezembro de 2007N.º 29 - Outubro/Dezembro de 2007N.º 29 - Outubro/Dezembro de 2007www.fraternitas.ptwww.fraternitas.ptwww.fraternitas.ptwww.fraternitas.ptwww.fraternitas.pt

O teólogo suíço Hans Küng acaba de editaro segundo tomo das suas memórias com o

título «Verdade controversa». Esta obra de mais de700 páginas, com uma escrita agradável, tendo nu-merosas estórias e referências, constitui uma fonte pri-morosa sobre a história da Igreja do tempo presen-te. Cobre o período que vai de 1968 a 1979.

O teólogo evoca no livro a sua relação, primeiroamigável e, depois, conflituosa com o seu confradeJoseph Ratzinger, o qual preferiu a carreira eclesiásti-ca à liberdade de pensamento. Segundo o professorKüng «os nossos caminhos de vida avançam em pa-ralelo, distanciam-se e cruzam-se de novo».

Na conferência de imprensa de apresentação, quese estendeu ao período que será tratado no terceirolivro, o teólogo suíço rebelde apresenta João Paulo IIcomo um Papa conservador, um homem pouco aber-to, abrupto e inflexível. Mas evoca principalmente oseu encontro a 30 de Julho de 1983 com o CardealRatzinger, então Prefeito da Congregação para aDoutrina da Fé. Foi um autêntico diálogo de surdos.Só em 2005, isto é, 22 anos mais tarde, o professorKüng virá a encontrar-se de novo com o seu antigocolega, entretanto feito Papa.

Hans Küng, que teve de ajustar contas com Romanum passado recente, desenha um quadro bastantesombrio da crise actual da Igreja, directamente rela-cionado com o recuo conservador e o aumento daintransigência. A impressão contrária deve-se à dife-rença de evolução entre os países e nomeadamenteno que toca à secularização que atingiu menos ospaíses do terceiro mundo, para já, pelo menos.

No diário suíço em alemão SonntagsZeitung, de16 de Setembro, o professor Küng insiste particular-mente na falta de padres. Porque não podem pôrem causa certas regras estéreis como a do celibato,e encarar novas formas de ministério sacerdotal, osBispos mostram-se evasivos a respeito de assunto tãodramático. Tanto mais que, segundo ele, as mulhe-res são consideradas «crentes de banda estreita». Narealidade, porém, numerosas comunidades paroqui-ais estilhaçar-se-iam se as mulheres as não levassemà cabeça e às costas.

Segundo Küng, as coisas mudariam, por exem-plo na Suíça, se os paroquianos de base se revoltas-sem: «É razoável colocar a questão se se deverá con-tinuar a entregar impostos às dioceses quando nãohá padres nas paróquias.»

Hans Künge a crise da Igreja

UM RAUM RAUM RAUM RAUM RATZINGER INTRIGUISTTZINGER INTRIGUISTTZINGER INTRIGUISTTZINGER INTRIGUISTTZINGER INTRIGUISTAAAAAO teólogo suíço evoca também a relação difícil

com o colega Ratzinger e tem palavras extremamen-te duras para com o Papa actual: «Manifestou aquiloque era – um polícia. Submeteu-se à Cúria Romana,denunciando-me e fazendo-me condenar como nãocatólico, e jogou um jogo duplo: escrevia-me cartasde reconciliação e preparava sanções contra mim.»

É sobretudo a duplicidade que revolta Hans Küng,dissimulação de que se queixou também BernhardHaering, igualmente perseguido pelo Santo Ofício.Suave e benevolente na aparência, o CardealRatzinger afiava o cutelo e cravava-o pelas costas.

Ao ser nomeado Arcebispo de Munique e Carde-al em 1977, Joseph Ratzinger poderia ter facilitadoo entendimento com Küng. De facto, aproximou-sedo Cardeal Arcebispo de Colónia, Joseph Hoeffner,um tradicionalista convicto, e dizia o pior possível deKüng ao Prefeito da Congregação para a Doutrinada Fé, o Cardeal Franjo Kuharic. Este, de origemcroata, era, por temperamento, mais propenso à in-dulgência e à complacência, mas não resistia à se-veridade do temível Secretário do Santo Ofício deentão, o dominicano Monsenhor Jean-Jérôme Hamer.

Sem o equiparar a Joseph Ratzinger, Küng criticaigualmente o Cardeal Kaarl Lehmann, actual Bispode Mongúncia e presidente da Conferência dos Bis-pos Alemães. Censura-o principalmente por não oter apoiado. Jovem e brilhante teólogo de Friburgo,Monsenhor Lehmann quis fazer carreira. Segundooutras fontes, sendo herdeiro de grandes preladosliberais, como o Cardeal Franz Koenig e JuliusDoepfner, Kaarl Lehmann privilegiava o diálogo, queo tom, por vezes incisivo de Küng, é preciso reconhe-cer, não facilitava.

Hans Küng acrescentou um volume às suasHans Küng acrescentou um volume às suasHans Küng acrescentou um volume às suasHans Küng acrescentou um volume às suasHans Küng acrescentou um volume às suas

memórias. O texto faz transparecer a sua co-memórias. O texto faz transparecer a sua co-memórias. O texto faz transparecer a sua co-memórias. O texto faz transparecer a sua co-memórias. O texto faz transparecer a sua co-

ragem e liberdade na fé e no pensamento.ragem e liberdade na fé e no pensamento.ragem e liberdade na fé e no pensamento.ragem e liberdade na fé e no pensamento.ragem e liberdade na fé e no pensamento.

tEXTO: Réginal UrtebizetEXTO: Réginal UrtebizetEXTO: Réginal UrtebizetEXTO: Réginal UrtebizetEXTO: Réginal UrtebizeTradução: Carlos LeonelTradução: Carlos LeonelTradução: Carlos LeonelTradução: Carlos LeonelTradução: Carlos Leonel

Carta de D. Manuel Falcão, Bispo emérito de BejaAcabo de passar a vista pelo número 28 do Espi-

ral. Felicito pelo encontro com o Senhor D. Ilídio Le-andro em Outubro próximo.

Li com interesse o relato das «Férias Missionári-as», que me fizeram lembrar os apelos do actual Papapara o Dia das Missões, no 50.º aniversário da céle-bre Encíclica Fidei Donum de Pio XII.

Achei curiosa e oportuna a intervenção de ManuelPaiva sobre o bom “português”.

Fiquei com dúvidas sobre o que escreveu o CarlosLeonel sobre a liberdade na Igreja.

Faço votos para que a Associação “Fraternitas”continue a sua missão de alertar os sacerdotes que,na actual disciplina da Igreja, deixaram o exercício dasordens, mas sem terem perdido o desejo sincero decontinuar ao serviço do Reino de Deus na Terra.