Estética da máquina na arquitectura contemporânea

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http://repositorio.ulusiada.pt Universidades Lusíada Carvalho, Maria de Jesus Mendes de, 1962- Estética da máquina na arquitectura contemporânea http://hdl.handle.net/11067/1480 Metadata Issue Date 2015-03-18 Abstract O presente trabalho visa efectuar uma reflexão em torno da arquitectura do século XX, abordando-a de uma maneira inovadora e elegendo a máquina como princípio estruturante e unificador. Esta abordagem não pretende contradizer ou legitimar nenhuma das correntes artísticas ou filosóficas expostas, antes desenvolve um conceito que passa por enquadrar a arquitectura num contexto marcado pela máquina. Nesta lógica, a nossa reflexão centra-se no que podemos apelidar de um certo confronto entre o natu... Keywords Máquinas - Aspectos estéticos, Sistemas homem-máquina, Espaço (Arquitectura), Arquitectura - Estética - Século 20, Arquitectura - Filosofia - Século 20, Arquitectura moderna - - Século 20 Type doctoralThesis Peer Reviewed No Collections [ULL-FAA] Teses This page was automatically generated in 2018-02-24T14:03:05Z with information provided by the Repository

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http://repositorio.ulusiada.pt

Universidades Lusíada

Carvalho, Maria de Jesus Mendes de, 1962-

Estética da máquina na arquitecturacontemporâneahttp://hdl.handle.net/11067/1480

Metadata

Issue Date 2015-03-18

Abstract O presente trabalho visa efectuar uma reflexão em torno da arquitecturado século XX, abordando-a de uma maneira inovadora e elegendo amáquina como princípio estruturante e unificador. Esta abordagemnão pretende contradizer ou legitimar nenhuma das correntes artísticasou filosóficas expostas, antes desenvolve um conceito que passa porenquadrar a arquitectura num contexto marcado pela máquina. Nestalógica, a nossa reflexão centra-se no que podemos apelidar de um certoconfronto entre o natu...

Keywords Máquinas - Aspectos estéticos, Sistemas homem-máquina, Espaço(Arquitectura), Arquitectura - Estética - Século 20, Arquitectura -Filosofia - Século 20, Arquitectura moderna - - Século 20

Type doctoralThesis

Peer Reviewed No

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U N I V E R S I D A D E L U S Í A D A D E L I S B O A

Faculdade de Arquitectura e Artes

Doutoramento em Arquitectura

Estética da máquina na arquitectura contemporânea

Realizado por: Maria de Jesus Mendes de Carvalho

Orientado por: Prof. Doutor António Jacinto Rodrigues

Constituição do Júri: Presidente: Prof. Doutor Eng. Diamantino Freitas Gomes Durão Director Científico: Prof. Doutor Arqt. Joaquim José Ferrão de Oliveira Braizinha Orientador: Prof. Doutor António Jacinto Rodrigues Arguente: Prof. Doutor Arqt. Luís Filipe Ferreira Afonso Arguente: Prof. Doutor Miguel Santiago Fernandes Vogal: Prof. Doutor Arqt. Joaquim Marcelino da Conceição dos Santos Vogal: Prof. Doutor Arqt. Vitor Manuel Canedo Neves

Tese aprovada em:

23 de Junho de 2009

Lisboa

2008

Page 3: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

U N I V E R S I D A D E L U S Í A D A D E L I S B O A

ESTÉTICA DA MÁQUINA NA ARQUITECTURA CONTEMPORÂNEA

MARIA DE JESUS CARVALHO

TESE PARA A OBTENÇÃO DO GRAU DE DOUTOR

LISBOA

2008

Page 4: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

II

A G R A D E C I M E N T O S

Em primeiro lugar, pretendo expressar o meu mais profundo agradecimento

ao meu orientador, Professor Doutor Jacinto Rodrigues, não só pela

sabedoria, interesse e disponibilidade com que orientou este trabalho, bem

como pelo incentivo que sempre constituíram os seus comentários e

sugestões, mas, sobretudo, pela dedicação e pela confiança que a sua

pessoa, sempre, depositou na minha faculdade para a prossecução deste

objectivo.

O apoio do meu orientador foi, igualmente, fundamental, na indicação de

livros que, pela leitura e reflexões que neles ou a partir deles me foi possível

fazer, foram determinantes para o desenvolvimento desta tese.

Em termos institucionais, devo ainda uma menção de agradecimento à

Universidade Lusíada de Lisboa, nomeadamente, pelos apoios logísticos

que sempre me proporcionaram.

A apresentação deste trabalho encerra um período de longo trabalho e

aprendizagem. E neste período que foi, principalmente, de formação

pessoal, muitas foram as situações e as pessoas que directa ou

indirectamente contribuíram para o enriquecimento do meu conhecimento,

contudo, quero dedicar um agradecimento especial a todos os familiares,

amigos e colegas que me apoiaram e incentivaram, em particular à

Margarida e ao Pedro.

Page 5: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

III

“Pour l’homme produire de l’artificiel est une activité absolument

naturelle”

Ezio Manzine, in Artfacts. Vers une ecologie de L’Environnement Artificiel.

1991, p.44

“Parto em busca de um problema, mas este suscita-me outros”

José Ortega y Gasset in O que é o conhecimento? ,

2002, p.26

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IV

Page 7: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

V

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VI

L I S T A D E I L U S T R A Ç Õ E S

Figura 1:Figura 1:Figura 1:Figura 1: Desenhos de Goethe como resultado da observação da metamorfose da planta arquetípica. Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: RODRIGUES, Jacinto. [s.d.]. Arte e arquitectura de Rudolf Steiner. Lisboa :

Civilização, p.14. Figura 2 : Figura 2 : Figura 2 : Figura 2 : Primeiro Goetheanum. Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: RODRIGUES, Jacinto. [s.d.]. Arte e arquitectura de Rudolf Steiner. Lisboa : Civilização, p.16.

Figura 3:Figura 3:Figura 3:Figura 3: Dupla cúpula do primeiro Goetheanum. Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: RODRIGUES, Jacinto. [s.d.]. Arte e arquitectura de Rudolf Steiner. Lisboa : Civilização, p.17. Figura 4:Figura 4:Figura 4:Figura 4: Comparação entre as estruturas edificadas e a estrutura do corpo humano. Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: RODRIGUES, Jacinto. [s.d.]. Arte e arquitectura de Rudolf Steiner. Lisboa :

Civilização, p.25. Figura 5: Figura 5: Figura 5: Figura 5: Ideia inicial de cobrir o primeiro Goetheanum. Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: RODRIGUES, Jacinto. [s.d.]. Arte e arquitectura de Rudolf Steiner. Lisboa : Civilização, p.16. Figura 6: Figura 6: Figura 6: Figura 6: Casa de Wittgenstein, fotografia do interior, Viena, 1926-1928. Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: MONTANER, Josep Maria. 2002. As formas do século XX. Barcelona : Gustavo Gili, p.91. Figura 7:Figura 7:Figura 7:Figura 7: A casa Wittgenstein em Viena, fotografia e alçados. Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: AICHER, Otl. 2001. Analógico y digital. Barcelona : Gustavo Gili, p.200. Figura 8: Figura 8: Figura 8: Figura 8: Planta da casa de Wittgenstein. Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: MONTANER, Josep Maria. 2002. As formas do século XX. Barcelona : Gustavo Gili, p.91. Figura 9:Figura 9:Figura 9:Figura 9: Esquiço do aeroporto e estação ferroviária (1913- 1914). Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: TISDALL, Caroline, BOZZOLA, Angelo. 1977. Futurism. London : Thames and Hudson, p.121

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VII

Figura 10:Figura 10:Figura 10:Figura 10: Projecto para o aeroporto e estação ferroviária (1914). Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: <http://cours.cegep-st-jerome.qc.ca/530-gjb-p.l/sant'eli.htm>

Figura 11Figura 11Figura 11Figura 11 Projecto da cidade do futuro (1914). Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: <http://cours.cegep-st-jerome.qc.ca/530-gjb-p.l/sant'eli.htm> Figura 12:Figura 12:Figura 12:Figura 12: Projecto da cidade do futuro. Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: <http://cours.cegep-st-jerome.qc.ca/530-gjb-p.l/sant'eli.htm>

Figura 13:Figura 13:Figura 13:Figura 13: Projecto dos irmãos Vesnin para o Palácio do Trabalho (1923). Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: Bloomfield et al.1996.The Modern Functional Building: Texts and Documents Santa Monica : Institute History, Art and Humanities, p.206. Figura 14:Figura 14:Figura 14:Figura 14: Monumento à Terceira Internacional. Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: COLQUHOUN, Alan. 2002. La arquitectura moderna. Barcelona : Gustavo Gili, p.124. Figura 15:Figura 15:Figura 15:Figura 15: Projecto para a tribuna de Lenine, El Lissitzky (1920). Fonte:Fonte:Fonte:Fonte:CURTIS, William. 1996. Modern Architecture, Since 1900. London, eth. Ed. : Phaidon, p.205. Figura 16: Figura 16: Figura 16: Figura 16: Capa de Veshch|/Gegenstand .Object, Lissitzky (1922). Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: FRAMPTON, Kenneth. 2003. História crítica da arquitectura moderna. São Paulo : Martins Fontes, p.158. Figura 17: Figura 17: Figura 17: Figura 17: Projecto de Simbirchev para um restaurante suspenso (1922-23). Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: FRAMPTON, Kenneth. 2003. História crítica da arquitectura moderna. São Paulo : Martins Fontes, p.205. Figura 18: Figura 18: Figura 18: Figura 18: Projecto para o edifício Pravda. Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: FRAMPTON, Kenneth. 2003. História crítica da arquitectura moderna. São Paulo : Martins Fontes, p.208. Figura 19Figura 19Figura 19Figura 19: Casa Sommerfeld. Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: BAX, Marty. 1991. Bauhaus, Lectures. Notes (1930 -1933). Amsterdam : Architectura & Natura.,p.33. .... Figura 20:Figura 20:Figura 20:Figura 20: Vestíbulo da Casa Sommerfeld FonteFonteFonteFonte: RODRIGUES, Jacinto. 1989. A Bauhaus e o ensino artístico. Lisboa : Editorial

Presença, p.65.

Page 10: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

VIII

Figura 21:Figura 21:Figura 21:Figura 21: Casa Am Horn. Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: BAX, Marty. 1991, Bauhaus, Lectures. Notes (1930 -1933). Amsterdam :

Architectura & Natura. p. 36. FFFFigura 22:igura 22:igura 22:igura 22: Planta da casa Am Horn. Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: OLIVEIRA, Luciane Gonzaga. 2004. Arquitectura Moderna na Alemanha no período 1900 a 1933. Rio de Janeiro : Dissertação de Mestrado, p.132. Disponível na Internet em: <http://www.maxwell.lambda.ele.puc-rio.br/cgi-

bin/PRG_0599.EXE/6486_1.PDF?NrOcoSis=17964&CdLinPrg=pt> Figura 23:Figura 23:Figura 23:Figura 23: Edifício da Bauhaus. Fonte: GiIEDION, Sigfried. 1992. Walter Gropius. New York : Dover Publications, p. 124. Figura 24:Figura 24:Figura 24:Figura 24: Vista geral do edifício da Bauhaus. Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: RODRIGUES, Jacinto. 1989. A Bauhaus e o ensino artístico. Lisboa : Editorial Presença, p.65. Figura 25:Figura 25:Figura 25:Figura 25: Edifício da Bauhaus. Fonte: GiIEDION, Sigfried. 1992. Walter Gropius. New York : Dover Publications, p. 127. Figura 26:Figura 26:Figura 26:Figura 26: Maqueta do Palácio dos Sovietes. Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: ARGAN, Giulio Carlo. 1988. Arte moderna. São Paulo : Companhia das Letras, p.404. Figura 27:Figura 27:Figura 27:Figura 27: Planta do Palácio dos Sovietes. Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: RODRIGUES, Jacinto. 1989. A Bauhaus e o ensino artístico. Lisboa : Editorial Presença, p.183. Figura 28:Figura 28:Figura 28:Figura 28: Projecto para o Palácio dos Sovietes. Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: RODRIGUES, Jacinto. 1989. A Bauhaus e o ensino artístico. Lisboa : Editorial Presença, p.183. Figura 29:Figura 29:Figura 29:Figura 29: Casas dos mestres da Bauhaus. Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: <http://www.bc.edu/bc_org/avp/cas/fnart/fa267/gropius.html> Figura 30:Figura 30:Figura 30:Figura 30:Casas dos mestres da Bauhaus FFFFonte: <onte: <onte: <onte: <http://www.bc.edu/bc_org/avp/cas/fnart/fa267/gropius.html>

Page 11: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

IX

Figura 31:Figura 31:Figura 31:Figura 31: Casa de aço. Fonte: <Fonte: <Fonte: <Fonte: <http://eng.archinform.net/projekte/1141.htm>

Figura 32:Figura 32:Figura 32:Figura 32: Pavilhão da Alemanha na Exposição de Barcelona. Fonte:<Fonte:<Fonte:<Fonte:<http://pt.wikipedia.org/wiki/Pavilh%C3%A3o_alem%C3%A3o_na_Feira_Universal_de_Barcelona> Figura 33:Figura 33:Figura 33:Figura 33: Esquiço do interior de Pavilhão da Alemanha na Exposição de Barcelona.

Fonte:<Fonte:<Fonte:<Fonte:<http://pt.wikipedia.org/wiki/Pavilh%C3%A3o_alem%C3%A3o_na_Feira_Universal_de_Barcelona> Figura 34:Figura 34:Figura 34:Figura 34: Desenhos realizados por Le Corbusier. Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: <http://www.arquitectura.com/historia/protag/corbu/corbu_1/corbu_1.asp> Figura 35:Figura 35:Figura 35:Figura 35: Le Corbusier, Ozenfant e Dermée, os fundadores de L’Esprit Nouveau. Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: <http://www.arquitectura.com/historia/protag/corbu/corbu_1/corbu_1.asp> Figura 36:Figura 36:Figura 36:Figura 36: Capa do primeiro número de L’Espirit Noveau dirigido por Le Corbusier. Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: LE CORBUSIER. 1964. Oeuvre complète 1910-1929. Zurich : Edition D’Architecture, p.33. Figura 37:Figura 37:Figura 37:Figura 37: Esqueleto da Casa Dominó (1914). Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: MONTANER, Josep Maria. 2002. As formas do século XX. Barcelona : Gustavo Gili, p.89. Figura 38:Figura 38:Figura 38:Figura 38: Esquiços do Modulor. Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: ARGAN, Giulio Carlo. 1988. Arte moderna. São Paulo : Companhia das Letras, p.265. Figura 39:Figura 39:Figura 39:Figura 39: O Modulor uma nova medida. Fonte:<Fonte:<Fonte:<Fonte:<http://www.architektur.tudarmstadt.de/powerhouse/db/248,id_15,s_Papers.sp.fb15> Figura 40:Figura 40:Figura 40:Figura 40: Casa Citrohan (casas em série). FonteFonteFonteFonte:::: Le Corbusier. 2000. Por uma Arquitectura. São Paulo : Editora Perspectiva, p.171. Figura 41:Figura 41:Figura 41:Figura 41: Esquiço da casa Citrohan. FonteFonteFonteFonte:::: Le Corbusier. 2000. Por uma Arquitectura. São Paulo : Editora Perspectiva,

p.172.

Page 12: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

X

Figura 42:Figura 42:Figura 42:Figura 42: Interior da casa em série. FonteFonteFonteFonte:::: Le Corbusier. 2000. Por uma Arquitectura. São Paulo : Editora Perspectiva,

p.172. Figura 43:Figura 43:Figura 43:Figura 43: Ville Savoye. FonteFonteFonteFonte:::: <http://www.greatbuildings.com/buildings/Villa_Savoye.html> Figura 44:Figura 44:Figura 44:Figura 44: Plantas da Ville Savoye.

FonteFonteFonteFonte:::: COLQUHOUN, Alan. 2002. La arquitectura moderna. Barcelona : Gustavo Gili, p.150-151. Figura 45Figura 45Figura 45Figura 45: O lugar – Petit Maison FonteFonteFonteFonte:::: <http://www.athenaeum.ch/corbpem0.htm.> Figura 46:Figura 46:Figura 46:Figura 46: O circuito do sol. FonteFonteFonteFonte:::: <http://www.athenaeum.ch/corbpem0.htm.> Figura 47:Figura 47:Figura 47:Figura 47: Esquiços de Le Corbusier. FonteFonteFonteFonte: <: <: <: <http://www.athenaeum.ch/corbpem0.htm.> Figura 48:Figura 48:Figura 48:Figura 48: Maqueta do projecto para o concurso do Palácio dos Sovietes Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: ARGAN, Giulio Carlo. 1988. Arte moderna. São Paulo : Companhia das Letras, p.403. Figura 49:Figura 49:Figura 49:Figura 49: Projecto para o concurso do Palácio dos Sovietes (1913) Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: ARGAN, Giulio Carlo. 1988. Arte moderna. São Paulo : Companhia das Letras, p.403. FiFiFiFigura 50:gura 50:gura 50:gura 50: Corte de um Transatlântico para ilustrar a vida colectiva. Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: CURTIS, William J.R. 1987. Le Corbusier; Ideas y formas. Madrid : Hermann Blume, p.173 Figura 51:Figura 51:Figura 51:Figura 51: Planta e Corte da Cisterna de águas pluviais. Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: BOESIGER, Willy.1995. Le Corbusier. Oeuvre Complete. Vol. VI. 9. ed. Les Éditions d’architecture. p.29. Figura 52:Figura 52:Figura 52:Figura 52: Exterior da Capela de Notre Dame du Haut. Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: ARGAN, Giulio Carlo. 1988. Arte moderna. São Paulo : Companhia das Letras, p.389.

Page 13: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

XI

Figura 53:Figura 53:Figura 53:Figura 53: Esquiço da Capela de Notre Dame du Haut. Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: BOESIGER, Willy.1995. Le Corbusier. Oeuvre Complete. Vol. VI. 9. ed. Les

Éditions d’architecture. p.17. Figura 54:Figura 54:Figura 54:Figura 54: Planta da Capela de Notre Dame du Haut. Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: BOESIGER, Willy.1995. Le Corbusier. Oeuvre Complete. Vol. VI. 9. ed. Les Éditions d’architecture. p.21.

Figura 55:Figura 55:Figura 55:Figura 55: Prairie House. Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: WRIGHT, Frank Lloyd. 1991. Frank Lloyd Wright. Nürnberg : Taschen, p.50. Figura 56:Figura 56:Figura 56:Figura 56: Prairie House. Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: WRIGHT, Frank Lloyd. 1991. Frank Lloyd Wright. Nürnberg : Taschen, p.50. Figura 5Figura 5Figura 5Figura 57:7:7:7: Projecto para Broadacre City. Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: FRAMPTON, Kenneth. 2003. História crítica da arquitectura moderna. São Paulo : Martins Fontes, p.230. Figura 58:Figura 58:Figura 58:Figura 58: Casa Kaufmann. FonteFonteFonteFonte: <http://www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq000/esp009.asp.> Figura 59:Figura 59:Figura 59:Figura 59: Casa Kaufmann. FonteFonteFonteFonte: <http://www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq000/esp009.asp.> Figura 60:Figura 60:Figura 60:Figura 60: Casa Kaufmann, o natural e o artificial fundem-se em harmonia. Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: WRIGHT, Frank Lloyd. 1991. Frank Lloyd Wright. Nürnberg : Taschen, p.118. Figura 61:Figura 61:Figura 61:Figura 61: Esquiço do Museu Guggenheim de Nova Iorque.

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte:<<<<http://www.franklloydwright.org/index.cfm?section=research&action=thework

> Figura 62:Figura 62:Figura 62:Figura 62: Espiral do Museu Guggenheim de Nova Iorque. Fonte: ZEVI, Bruno. 1998. Frank Lloyd Wright. 7ª ed. Barcelona : Gustavo Gili. p.225.

Figura 63:Figura 63:Figura 63:Figura 63: Planta do Sanatório de Paimio. Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: HOLMO, Maija, LATHI, Markku. 1998. Alvar Aalto. Helsinki : Rakennustieto, p.41.

Page 14: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

XII

Figura 64:Figura 64:Figura 64:Figura 64: Estudos de ângulos de incidência da luz solar na Biblioteca de Viipuri. Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: RIBEIRO, Rogério, BJÖRK, Cisela, coord. 1998. Alvar Aalto 1898-100 Catálogo da Exposição. Almada : Câmara Municipal de Almada, p.32. Figura 65:Figura 65:Figura 65:Figura 65: Desenhos de Villa Mairea Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: SCHILDT, Göran. 1986. Alvar Aalto, the decisive years, New York : Rizzoli, p.41.

Figura 66:Figura 66:Figura 66:Figura 66: Entrada de Villa Mairea Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: <http://www.designboom.com/history/aalto/villa.html.> Figura 67:Figura 67:Figura 67:Figura 67: Pormenor da entrada de Villa Mairea Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: <http://www.designboom.com/history/aalto/villa.html.> Figura 68:Figura 68:Figura 68:Figura 68: Interior de Villa Mairea Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: SCHILDT, Göran. 1986. Alvar Aalto, the decisive years, New York : Rizzoli, p.41. Figura 69:Figura 69:Figura 69:Figura 69: Pormenores que marcam a relação com a natureza Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: RIBEIRO, Rogério, BJÖRK, Cisela. 1998. Alvar Aalto 1898 100 Catálogo da Exposição. Almada : Câmara Municipal de Almada, p.36. Figura 70:Figura 70:Figura 70:Figura 70: Desenho projectual do templo de Vuoksenniska Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: RIBEIRO, Rogério, BJÖRK, Cisela. 1998. Alvar Aalto 1898 100 Catálogo da Exposição. Almada : Câmara Municipal de Almada, p.56. Figura 71:Figura 71:Figura 71:Figura 71: Templo de Vuoksenniska. Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: RIBEIRO, Rogério, BJÖRK, Cisela. 1998. Alvar Aalto 1898 100 Catálogo da Exposição. Almada : Câmara Municipal de Almada, p.56. Figura 72:Figura 72:Figura 72:Figura 72: Interior do templo de Heiling Geiskt-Kirche. Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: <http://www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq070/arq070_01.asp>

Figura 73Figura 73Figura 73Figura 73: Planta do conjunto na Igreja de Santa Maria, em Riola Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: <http://www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq070/arq070_01.asp>

Figura 74Figura 74Figura 74Figura 74: Interior da igreja de Santa Maria.

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: <http://www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq070/arq070_01.asp>

Page 15: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

XIII

Figura 75Figura 75Figura 75Figura 75: Fachada principal da Igreja de Santa Maria.

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: <http://www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq070/arq070_01.asp>

Figura 76Figura 76Figura 76Figura 76: Imagem do filme Tempos Modernos.

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: <http://www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq070/arq070_01.asp>

Figura 77Figura 77Figura 77Figura 77: Imagem da casa da família Arpel em O meu Tio.

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: <http://www.rizoma.net/interna.php?id=211&secao=anarquitextura>

Figura 78:Figura 78:Figura 78:Figura 78: Imagem do filme Metropolis de Fritz Lang (1925-1926).

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: WHITFORD, Frank. 1995. Bauhaus. London : Thames and Hudson. Figura 79:Figura 79:Figura 79:Figura 79: Casa Dymaxion (1929).

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: PIROVANO, Carlo. (ed.). 1990. History of Industrial Design, 1910-1990. [s.l.] : Electra, p.329. Figura 80:Figura 80:Figura 80:Figura 80: Wichita house, machine for living (1946).

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: PIROVANO, Carlo. (ed.). 1990. History of Industrial Design, 1910-1990. [s.l.] : Electra, p.330.

Figura 81:Figura 81:Figura 81:Figura 81: Projecto para a grande cúpula transparente para Manhattan (1962).

Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: FRAMPTON, Kenneth. 2003. História crítica da arquitectura moderna. São Paulo : Martins Fontes, p.343.

Figura 82:Figura 82:Figura 82:Figura 82: Centro George Pompidou (1972-77).

Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: FRAMPTON, Kenneth. 2003. História crítica da arquitectura moderna. São Paulo : Martins Fontes, p.347.

Figura 83Figura 83Figura 83Figura 83: Planta das cubic houses.

Fonte: <Fonte: <Fonte: <Fonte: <http://img183.imageshack.us/my.php?image=semttulo1uy5.jpg>

Figura 84:Figura 84:Figura 84:Figura 84: Nova babilónia.

Fonte: <Fonte: <Fonte: <Fonte: <http://www.moskitofilm.nl/?page_id=28>

Page 16: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

XIV

Figura 85:Figura 85:Figura 85:Figura 85: Imagem do grupo Archigram.

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: <http://www.rizoma.net/interna.php?id=186&secao=anarquitextura>

Figura 86:Figura 86:Figura 86:Figura 86: Projecto Plug-in-City.

FonteFonteFonteFonte: <http://www.rizoma.net/interna.php?id=186&secao=anarquitextura>

Figura 87:Figura 87:Figura 87:Figura 87: Projecto da cápsula Plug-in-City.

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: <http://www.rizoma.net/interna.php?id=186&secao=anarquitextura>

Figura 88:Figura 88:Figura 88:Figura 88: Projecto Walking City.

Fonte: Fonte: Fonte: Fonte: FRAMPTON, Kenneth. 2003. História crítica da arquitectura moderna. São Paulo : Martins Fontes, p.342.

Figura 89:Figura 89:Figura 89:Figura 89: Projecto Living Pod de David Green.

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: <http://www.rizoma.net/interna.php?id=186&secao=anarquitextura>

Figura 90:Figura 90:Figura 90:Figura 90: Projecto Cushicle.

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: <http://www.rizoma.net/interna.php?id=186&secao=anarquitextura>

Figura 91:Figura 91:Figura 91:Figura 91: Projecto Suitalonn.

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: <http://www.babot.co.jp/museum/life/wear.html>

Figura 92:Figura 92:Figura 92:Figura 92: Centro Urbano de Kwan em Hong-Kong.

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: STEELE, James. 2001. Arquitectura y revolucíon digital. México : Gustavo Gili, p.82.

Figura 93:Figura 93:Figura 93:Figura 93: Escritórios centrais de Telenor em Oslo.

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: STEELE, James. 2001. Arquitectura y revolucíon digital. México : Gustavo Gili, p.84.

Figura Figura Figura Figura 94:94:94:94: Urbanização de Hollywood-Orange em Los Angeles.

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: STEELE, James. 2001. Arquitectura y revolucíon digital. México : Gustavo Gili, p.86.

Page 17: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

XV

Figura 95:Figura 95:Figura 95:Figura 95: Templo budista em Xiyuan.

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: STEELE, James. 2001. Arquitectura y revolucíon digital. México : Gustavo

Gili, p.90.

Figura 96:Figura 96:Figura 96:Figura 96: Casa Oak Park Pass.

Fonte:<Fonte:<Fonte:<Fonte:<http://www.arcspace.com/architects/roto/Oak_Pass_House/index.html>

Figura 97:Figura 97:Figura 97:Figura 97: Casa Oak Park Pass.

Fonte:<Fonte:<Fonte:<Fonte:<http://www.arcspace.com/architects/roto/Oak_Pass_House/index.html>

Figura 98:Figura 98:Figura 98:Figura 98: Escola Secundária Diamond Ranch em Pomona.

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: STEELE, James. 2001. Arquitectura y revolucíon digital. México : Gustavo Gili, p.94.

Figura 99:Figura 99:Figura 99:Figura 99: Projecto Eden em Corwall.

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: STEELE, James. 2001. Arquitectura y revolucíon digital. México : Gustavo Gili, p.32 e104. Figura 100:Figura 100:Figura 100:Figura 100: Projecto Eden em Corwall.

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: STEELE, James. 2001. Arquitectura y revolucíon digital. México : Gustavo Gili, p.105.

Figura 101:Figura 101:Figura 101:Figura 101: Projecto Eden em Corwall.

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: STEELE, James. 2001. Arquitectura y revolucíon digital. México : Gustavo Gili, p.106.

Figura 102:Figura 102:Figura 102:Figura 102: Esquiço do projecto para a Disney.

Fonte: <http://www.arcspace.com/architects/gehry/disney2/>

Figura 103:Figura 103:Figura 103:Figura 103: Concert Hall da Disney em Los Angeles.

FonteFonteFonteFonte: http://www.arcspace.com/architects/gehry/disney2/

Page 18: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

XVI

Figura 104:Figura 104:Figura 104:Figura 104: Planta do Guggenheim de Bilbao.

FonteFonteFonteFonte: BRUGGEN, Coosje Van. 1997. Franck Gerhy Guggenheim Bilbao. New York

: Guggenheim Museum Publication, p.148-149.

Figura 105:Figura 105:Figura 105:Figura 105: Guggenheim de Bilbao.

FonteFonteFonteFonte: http://www.arcspace.com/architects/gehry/disney2/

Figura 106:Figura 106:Figura 106:Figura 106: Mediateca de Sendai.

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: STEELE, James. 2001. Arquitectura y revolucíon digital. México : Gustavo Gili, p.153.Gili, p.153.Gili, p.153.Gili, p.153.

Figura 107:Figura 107:Figura 107:Figura 107: Desenvolvimento orgânico da forma que relaciona a arquitectura de Karl Chu com a natureza.

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: STEELE, James. 2001. Arquitectura y revolucíon digital. México : Gustavo Gili, p.153.

Figura 108:Figura 108:Figura 108:Figura 108: Na procura de um princípio transcendental, Karl Chu incorpora nos seus desenhos os novos avanços em mecânica quântica.

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: STEELE, James. 2001. Arquitectura y revolucíon digital. México : Gustavo Gili, p.138.

Figura 109Figura 109Figura 109Figura 109: A síntese dos princípios cosmogenéticos e a contínua transformação da natureza.

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: STEELE, James. 2001. Arquitectura y revolucíon digital. México : Gustavo Gili, p.140.

Figura 110:Figura 110:Figura 110:Figura 110: Investigação sobre semelhanças morfológicas entre construção e concepção, Karl Chu, revoluciona o significado de arquitectura ecológica.

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: STEELE, James. 2001. Arquitectura y revolucíon digital. México : Gustavo Gili, p.40.

Figura 111Figura 111Figura 111Figura 111: Hotel New Palace em Noorswijk.

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: STEELE, James. 2001. Arquitectura y revolucíon digital. México : Gustavo Gili, p.143 e 146.

Page 19: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

XVII

Figura 112:Figura 112:Figura 112:Figura 112: Pavilhão da água H2O, Nox.

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: <http://www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq000/esp222.asp.>

Figura 113:Figura 113:Figura 113:Figura 113: Pavilhão da água salgada, Oosterhuis Associates

Fonte:Fonte:Fonte:Fonte: <http://www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq000/esp222.asp.> Figura 114:Figura 114:Figura 114:Figura 114: Teoria das cordas cósmicas – Superstrings.

FonteFonteFonteFonte: <http://astro.if.ufrgs.br/univ/string/string.htm>

Page 20: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

XVIII

L I S T A D E A B R E V I A T U R A S , S I G L A S E

A C R Ó N I M O S

AFK Arbeitsrat für Kunst.

CAD Computer-Aided Design.

CATIA Computer Assisted Three-dimentional Interactive Aplication.

CIAM Congresso Internacional de Arquitectura Moderna.

C.I.E.R.E.C. Centre interdisciplinaire d’études et des recherches sur l’expression contemporaine.

IBM Internacional Business Machines.

MIT Massachusetts Institute of Technology.

NBBJ Atelier de arquitectura e design.

OSA União de arquitectos contemporâneos.

PGM Primeira Guerra Mundial.

RoTo Atelier fundado por Michael Rotondi.

SCF-Arc Southern California Institute of Architecture.

SEG Designação de torre de apartamentos em Viena.

SGM Segunda Guerra Mundial.

Team X Designação como passou a dar-se ao CIAM a partir de 1956.

UFA Universum Film AG.

UFRGS Universidade Federal de Rio Grande do Sul.

Page 21: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

XIX

S U M Á R I O

Ficha Catalográfica I Agradecimentos II Epígrafe III Apresentação: Título, resumo e palavras-chave IV Presentation: Title, abstract and keywords V Lista de ilustrações VI Lista de abreviatura, siglas e acrónimos XVIII Sumário XIX 1. Introdução 1 Parte I Binómio Homem MáquinaParte I Binómio Homem MáquinaParte I Binómio Homem MáquinaParte I Binómio Homem Máquina 15 2. O Contexto da máquina no início do século XX 16

2.1. O homem e a máquina 16 2.2. Conceitos contraditórios 30

2.2.1. Evolução técnica 30 2.2.2. Problemática nos meios artísticos 36

3. Tendências emergentes 48 3.1. Organicismo de Steiner 49 3.2. Racionalismo de Wittgenstein 59 3.3. A máquina como elemento de vanguarda 67

3.3.1. Futurismo italiano 67 3.3.2. Construtivismo russo 84

Parte II Paradigma da MáquinaParte II Paradigma da MáquinaParte II Paradigma da MáquinaParte II Paradigma da Máquina 95 4. Em direcção a um novo paradigma 96

4.1. Situação da máquina na Alemanha 96 4.2. A máquina no percurso da Bauhaus 107

4.2.1. O funcionalismo orgânico de Gropius 107 4.2.2. O funcionalismo produtivista de Meyer 132

Page 22: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

XX

4.2.3. O funcionalismo formalista de Mies 139 4.3. Le Corbusier 143

4.3.1. Formação pessoal entre a natureza e a técnica 143 4.3.2. L’Esprit Nouveau 150 4.3.3. Modulor - a escala humana adaptada à máquina 156 4.3.4. O fascínio pela máquina 166 4.3.5. A Máquina de habitar – casa 170 4.3.6. A Máquina colectiva – edifícios públicos 178 4.3.7. Machines à emovoir 190

5. Sintonia entre o homem e a máquina 201 5.1. Frank Lloyd Wright 201

5.1.1. Entusiasmo pela máquina 201 5.1.2. A emergência de uma nova estética 210 5.1.3. Fascínio pela natureza 222

5.2. Alvar Aalto, Humanizar a arquitectura 231 5.2.1. A natureza como pretexto 231 5.2.2. O funcionalismo e o homem 236 5.2.3. O ciclo da vida 249

6. Novos conceitos na relação homem/máquina 260 6.1. Crítica ao racionalismo 260 6.2. Sistemas e estruturas 267 6.3. Simbiose entre organismos e máquinas – Archigram 280

Parte III Resolução do Binómio Homem MáquinaParte III Resolução do Binómio Homem MáquinaParte III Resolução do Binómio Homem MáquinaParte III Resolução do Binómio Homem Máquina 291 7. O Digital substitui o analógico 292

7.1. O computador como ferramenta 297 7.2. O computador ao serviço do homem e da natureza 312

8. Reinventar o espaço 328 8.1. CATIA - Frank Gehry 328 8.2. A máquina como pretexto 334

9. Construir o artificial por metodologias sustentadas em processos naturais 336 9.1. Espaço genético – Karl Chu 336

Page 23: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

XXI

9.2. Transformação do elemento arquitectónico 342 9.3. Sistemas híbridos 350

10. Conclusão 366

10.1. Reflexões finais 411 11. Bibliografia 415

11.1. Bibliografia específica 415 11.1.1. Publicações de Autor 415 11.1.2. Publicações Periódicas 422 11.1.3. Publicações Electrónicas 423

11.2. Bibliografia geral 426 11.2.1. Publicações de Autor 426 11.2.2. Publicações Periódicas 430 11.2.3. Publicações Electrónicas 431

12. Índice Onomástico 434

Page 24: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

1

I N T R O D U Ç Ã O

Este trabalho centra-se na problemática em torno das implicações

que a máquina 1111 e, consequentemente, o fenómeno técnico, tiveram

na arquitectura do século XX, que não sendo novo sofreu alterações

profundas neste período que se pretende estudar.

Assim, com base numa metodologia assente no confronto entre o

homem e a máquina, este trabalho tem como fio condutor a seguinte

questão de investigação: Como pode a arquitectura ser influenciada

pelo fenómeno da máquina e como pode a máquina ser uma

ferramenta fundamental ao serviço do homem?

É possível afirmar que desde a pré-história a essência da natureza

humana se forma num processo que se poderia considerar de contre

nature, um tema que permite uma vasta e complexa multiplicidade de

abordagens mas das quais destacamos o pensamento de Bernard

Stiegler, segundo o qual “l’apparition de l’homme est l’apparition de la

1111 Entendemos o conceito de máquina como o paradigma da artificialidade e o

homem o elemento natural que nos interessa. Assim é fundamental perceber ao

longo do trabalho a relação artificial/natural.

Page 25: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

2

technique” (1994, p. 152), pelo que, na perspectiva do autor, o

homem inventa a técnica e é inventado por ela é uma hipótese que

atravessa o pensamento filosófico desde a Grécia antiga até à

filosofia contemporânea.

Efectivamente, a evolução do homem, tal como a arquitectura, nunca

estiveram dependentes apenas do orgânico ou do instintivo, pois do

mesmo modo que o homem constrói um instrumento ou uma arma,

constrói, também, um abrigo e, por certo, desde o tempo em que a

arquitectura não se diferenciava do acto de construir, que se pode

presenciar o processo de artificialização da natureza e constatar a

importância do factor técnico neste processo.

Desta verificação se infere que a importância da máquina é uma

constante que remonta ao início da humanidade e que se estende a

várias áreas do conhecimento, nomeadamente, é possível dizer que

conforme o homem evoluiu na forma como manipula e controla a

natureza, também, na mesma proporção, esses avanços se foram

traduzindo na arquitectura.

Todavia, e apesar da evolução técnica ser permanente no devir da

humanidade, o estabelecimento duma dramática divisão entre o

natural e o artificial, característica da cultura industrial, é um

fenómeno recente e o fim do século XIX testemunhou um conjunto

Page 26: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

3

de processos técnicos que transformaram, rápida e profundamente,

as relações do homem com a máquina, e que influenciaram de forma

determinante todo o século XX.

Porém, face às diferenças significativas produzidas ao longo dos

últimos cem anos, em que se passou de uma condição pré industrial

a uma tecnologia digital, o tema escolhido só fazia sentido se

abrangesse todo este século.

Se é um facto que, neste período de um século, os arquitectos

aceitaram a ideia progressista da máquina associada a uma

sociedade fortemente industrializada, torna-se fundamental entender

como esta questão influenciou o seu universo conceptual e como

contribuiu para desenvolver as suas ideias e os seus projectos.

Para esse fim recorreremos a um processo de sistematização em

que a selecção e ordenação, dos autores e obras, obedecerão a

critérios assentes nos processos de concepção que estiveram na

génese e desenvolvimento da ideia original, bem como, nos casos

em que se justifique, dos processos de construção.

Este trabalho parte, assim, da hipótese de que a criatividade artística

do século XX é permeada por um imaginário, a um tempo colectivo e

a outro individual, no qual os princípios das formatações

arquitectónicas se fundem, muitas vezes, num recital de harmonia

Page 27: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

4

em que natureza e a técnica contribuem na mesma proporção para o

processo de concepção e de construção.

Esta análise visa, portanto, investigar um conjunto de factos

associados ao conceito da máquina que influenciaram de forma

definitiva a cultura arquitectónica do seu tempo e de tempos futuros,

para o efeito dividimos o trabalho em três partes:

Parte I

Enquadrar na sociedade e na arquitectura o fenómeno da máquina

na transição dos séculos XIX-XX e perceber como no início do século

XX os arquitectos definiram estratégias sustentadas na natureza e na

máquina que influenciaram todo o século XX.

Reflectir de modo sintético as questões relativas ao homem e à

máquina na sociedade.

Perceber o espírito da época no início do século XX, nomeadamente,

verificar o papel da máquina e das novas tecnologias enquanto

fenómenos emergentes na cultura moderna.

Constatar uma certa pressão que a máquina exercia na sociedade e

nos meios artísticos, e a sua consequente inclusão nos pressupostos

da arquitectura.

Compreender a situação de conflito entre o artesanato e a máquina,

Page 28: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

5

bem como a posição de alguns artistas como Ruskin e Muthesius.

Reflectir sobre as posturas organicista de Steiner e racionalista de

Wittgenstein.

Demonstrar que a imagem da máquina, na arquitectura, é associada

a movimentos de vanguarda que, por sua vez, perseguiam o culto

duma nova forma e duma outra estética, como foi o caso do

futurismo.

Verificar que, no início do século XX, os mecanismos geradores para

as construções de novas sociedades cruzam-se com a influência da

máquina, como é o caso do construtivismo.

Parte II

Nas obras e arquitectos seleccionados neste capítulo, e nas

interpretações que pretendemos efectuar, vamos tentar oferecer uma

reflexão sobre o universo conceptual e construtivo da arquitectura,

estabelecendo uma relação entre a natureza e a máquina.

A nossa reflexão pretende, ainda, revelar momentos fulcrais em que

a lógica mecânica se ajustou aos processos conceptuais da

arquitectura - numa época em que esta aspirava à máxima

funcionalidade da mesma maneira que a máquina procurava que

todas as partes cumprissem o seu papel na engrenagem - e perceber

o modo como a arquitectura procurava ajustar-se às

Page 29: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

6

exigências da função, nem sempre em oposição ao orgânico que,

fortemente influenciado pela metamorfose e pelo crescimento,

privilegiava o natural e o homem.

Desta apreciação vamos, certamente, sentir algumas dicotomias

relativamente ao modo como estes arquitectos se relacionam

intencionalmente com o universo do natural e do artificial.

Assim, para além da descrição e interpretação das tendências

arquitectónicas pretende-se:

Perceber de que modo a Bauhaus enquadrou o paradigma da

máquina e reflectir sobre o percurso da escola entre o funcionalismo

orgânico de Gropius e o funcionalismo técnico de Mies van der Rohe,

constatando a permeabilidade entre estas duas posições, que não

sendo convergentes também não eram divergentes.

Esta análise vai dar particular destaque a Le Corbusier, pois foi ele o

arquitecto que premonitoriamente teve consciência do fenómeno

novo que emergia na sociedade do início do século: o maquinismo.

Para ele era importante aprender com a máquina visto que a

pretendia colocar ao serviço do homem e, no seu percurso, percebe-

se uma preocupação constante com a funcionalidade na arquitectura

Page 30: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

7

e com a necessidade de ajustar o espaço às exigências do corpo

humano, associando a casa à ideia de máquina de habitar,2222 pelo que

vamos verificar como no seu trabalho considerou, em simultâneo, a

importância da natureza e o papel da máquina na vida do Homem.

De facto, apesar da arquitectura moderna não demonstrar particular

interesse pelas relações com a natureza, vamos tentar aferir de que

modo é que ela foi protagonista em diversas obras de arquitectura e

perceber como obras nascidas sob o signo do orgânico se

enquadram na mesma artificialidade que caracterizou o movimento

moderno, do qual Frank Lloyd Wright é o paradigma máximo. E

perceber, ainda, de que modo o percurso deste arquitecto foi

influenciado pelas criticas de Mumford. 3333

2222 Esta expressão foi consagrada por Le Corbusier e aparece quase sempre

referenciada a este importante arquitecto francês, sobre o qual iremos dedicar uma

parte importante deste trabalho, embora também tenha influenciado o universo

conceputal de outros arquitectos como iremos constatar.

3333 Sobre o seu trabalho consideramos importante a perspectiva de Francastel (1956,

p. 41): “La machine est à ses yeux, le lieu de rencontre actuel, le dénominateur

commun des individus et des groupes: cités, régions, Etats. Elle a modifié ou

réorienté les désirs, les idées, les moyens d’action et les buts de l’homme. Elle

Page 31: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

8

Vamos, ainda, compreender o contexto da obra de Alvar Aalto e a

forte cumplicidade da sua arquitectura com o homem, no que

poderíamos considerar de funcionalismo orgânico e perceber que, de

facto, as questões técnicas também não foram desprezadas.

Neste último capítulo, continuando a problemática entre o homem e

máquina, vamos demonstrar de que modo as formas do mundo

industrial começaram a estender-se à arquitectura e como, a partir da

segunda metade do século XX, passaram a ser repetidas

sistematicamente em muitas obras, ajustando as formas aos mais

diversos materiais, conforme os avanços técnicos o iam permitindo.

Vamos, por isso, constatar como as formas e as tipologias,

inspiradas no mundo da máquina, encontraram referências no mundo

industrial: as fábricas e as refinarias de petróleo eram uma imagem

que se pretendia reproduzir conscientemente, “definitivamente o

paradigma da artificialidade encontrou a sua continuidade na

arquitectura high tech.” (Montaner, 2002, p. 82)

domine, pour le meilleur et pour le pire, sa destinée actuelle. Elle détermine la culture

qui produit et rend utilisables les instruments sans lesquels el n’y a plus de vie ou

d’activité utile sur la planète. Mumford pose ainsi en principe le primat absolu de la

machine sans le discuter. »

Page 32: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

9

No entanto, essa situação não implicava que se aceitasse a máquina

incondicionalmente pois desenvolvia-se uma forte crítica que se

estendia, também à sociedade e cujas inquietações atravessavam o

meio filosófico na mesma proporção. Assim, vamos tentar perceber

de que modo esta situação se ajustou à arquitectura,

nomeadamente, a crítica que se desenvolveu relativamente ao

racionalismo, derivava da urgência de criar novos conceitos para o

homem e para o espaço.

As complexas estruturas arquitectónicas multifuncionais, concebidas

e realizadas por meios tecnológicos avançados, povoam o imaginário

dos anos 70, em especial o grupo britânico Archigram. Este grupo

desenvolveu novos conceitos para o acto de habitar, mormente a

casa cápsula, e neste trabalho vamos tentar destrinçar como a forma

e a função estão intimamente ligadas à forma orgânica e à função

mecânica, indissociáveis da ideia de máquina de habitar.

Aliás, do mesmo modo que Le Corbusier, a arquitectura mutante do

grupo Archigram propõe novos espaços considerando o espaço

mínimo, mas agora, ajustado a outra época, assiste-se na

arquitectura, tal como na sociedade, a uma simbiose crescente entre

a natureza humana e a técnica. A arquitectura aparece como uma

segunda pele do corpo humano e, mais próxima do limite da

Page 33: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

10

artificialidade, torna-se mais orgânica, perseguindo uma forte

cumplicidade entre a máxima artificialidade e o organismo vivo, em

estreita ligação com as metamorfoses da vida.

Parte III

Na última parte do trabalho, propomo-nos enquadrar de novo o

fenómeno da máquina, mas, agora, na transição do século XX-XXI.

Na realidade, apesar de eventualmente podermos encontrar algum

paralelismo com os fenómenos que ocorreram no início do século XX

existem nesta nova era diferenças significativas óbvias, provocadas

pelos avanços tecnológicos, principalmente porque a máquina

permitiu criar novos conceitos que alteraram profundamente os

valores do espaço, nomeadamente, o ciberespaço. Nesta

perspectiva torna-se urgente perceber novos conceitos, como

arquitectura virtual e as transarquitecturas. 4444

Pretendemos ainda reflectir sobre a problemática da máquina e como

esta pode ser uma ferramenta ao serviço do homem e da natureza,

4444 Por se tratar de um conceito muito abrangente este termo aparece sempre no

plural.

Page 34: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

11

selecionando para o efeito alguns trabalhos que possam servir de

paradigma quer pela positiva quer pela negativa.

Nesta ordem de ideias podemos, igualmente, analisar o trabalho de

Marcos Novak e o novo conceito, as transarquitecturas ou a

arquitectura líquida ou, ainda, o pavilhão da Água na Holanda, do

grupo Nox, destinado a albergar uma exposição permanente sobre a

importância da água no planeta Terra, demonstrando que no projecto

foi utilizado um conjunto de procedimentos interactivos mas em que,

contudo, as variáveis são determinadas pela natureza.

Vamos analisar, ainda, os trabalhos de Karl Chu e de John Frazer, e

perceber que os pretextos com que desenvolveram os seus trabalhos

estão assentes em princípios sustentados na evolução de

organismos e constatar que tal como na sociedade, também, na

arquitectura os processos híbridos permitem configurações nunca

antes verificadas.

Vamos, igualmente, procurar entender como os arquitectos utilizam,

nos seus trabalhos, as novas tecnologias e se, efectivamente, a

máquina, agora o computador, se tornou numa ferramenta

fundamental e, neste contexto, destacar o trabalho de Frank Gehry e

a aplicação do sistema CATIA. Por conseguinte, tornar-se-á

necessário indagar até que ponto o arquitecto se deixa conduzir pelo

Page 35: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

12

computador ou, ainda, a forma como o computador pode funcionar

como pretexto conceptual.

No âmbito deste trabalho, vamos também investigar de que modo a

natureza e os processos naturais contribuem para os avanços

tecnológicos.

Todavia, perceber de que modo os arquitectos e a sociedade - a

arquitectura não é alheia aos fenómenos sociais antes pelo contrário,

absorve-os e reinventa-os - foram sensíveis à máquina, implica,

igualmente, perceber as correntes filosóficas e os conceitos que se

foram girando em torno do tema e, ainda, reflectir sobre o uso do

computador no ensino da arquitectura e na formação de novos

arquitectos.

Consequentemente, e tratando-se de uma investigação muito

complexa e muito extensa - perceber os fenómenos arquitectónicos,

as metodologias conceptuais, a forma como os arquitectos se

relacionaram com a sua época, se ajustaram aos fenómenos

técnicos e de que modo conseguiram inovar - não se poderiam

abranger todas as obras nem todos os arquitectos, pelo que se optou

apenas pelos que melhor se enquadrariam dentro das questões que

se evocam neste trabalho.

Naturalmente, é importante salientar que apenas se tiveram em

Page 36: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

13

consideração os trabalhos que permitiriam estabelecer um fio

condutor dentro do contexto deste trabalho.

Também por essas razões, e por uma questão de extensão do

trabalho, se excluiu o tema da cidade, optando-se por o incluir,

somente, nas situações em que se revela fundamental para se

clarificar o contexto dentro do tema da investigação.

De resto, pretende-se perceber que a evolução e ascensão da

máquina não pode indiciar a destruição da arquitectura, mas o

aprimorar de uma ferramenta que os pessimistas radicais

aconselhariam a abandonar, por entenderem contribuir para

dissimular a essência da arquitectura, uma posição provavelmente

comum a todas as épocas, particularmente nas transições de século,

enquanto que outros, mais optimistas, acreditariam que a resposta

possa estar na vontade e capacidade do homem em conduzir o

trajecto da máquina, por forma a que esta introduza novos dados ou

coordenadas.

Destes considerandos ressalta a necessidade de trazer para a ordem

do dia a discussão em torno das questões éticas relativas à máquina,

razão pela qual, neste trabalho, se procura reflectir sobre os

diferentes contributos de vários arquitectos, ao longo do século XX,

pretendendo-se evidenciar não todos os trabalhos, como já

Page 37: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

14

referimos, mas os que mais se destacaram pela capacidade de

englobar quer a dimensão humana, quer a dimensão técnica, pois

cremos ser por ambas que passa a verdadeira arquitectura.

Neste sentido, esta investigação parte da hipótese de que quanto

melhor tiver sido, no passado, a relação entre o natural e o artificial,

melhor terão sido os resultados obtidos nas obras de arquitectura, e

que provavelmente será esse o caminho a seguir no futuro.

Page 38: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

15

P A R T E I

B I N Ó M I O H O M E M M Á Q U I N A

Page 39: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

16

2 . O C O N T E X T O D A M Á Q U I N A N O I N Í C I O D O

S É C U L O X X

2 . 1 . O H O M E M E A M Á Q U I N A

Quando se analisam as questões relativas ao natural e ao artificial

rapidamente se infere que o processo de artificialização da natureza

está presente desde a formação do homem e das primeiras

sociedades, pelo que uma investigação sobre as relações entre o

homem e a arquitectura passa, muito, por compreender uma vontade

expressa do homem, desde os tempos mais remotos, em controlar e

transformar a natureza, constatando-se, assim, que a arquitectura é,

sempre, o resultado de um processo de artificialização da natureza.

É nesta perspectiva que, a partir duma análise do trabalho de

historiadores e investigadores relativamente à história, teoria e crítica

de arquitectura, se pode tentar estabelecer um paralelismo com os

trabalhos de antropologia relativos à evolução do homem e provar

que os processos que acompanharam a evolução, nunca estiveram

dependentes apenas do orgânico ou do instintivo, conforme o

Page 40: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

17

defende André Lemos (2003) com base no trabalho de Moscovici, 5555

no livro La Société Contre Nature, em que prova que em nenhuma

fase da sua evolução, o homem esteve dependente somente do

orgânico ou do instintivo, mostrando que a sociedade e o homem

evoluem num constante processo de artificialização, podendo-se,

assim, defenir a máquina entendida como uma extensão das

componentes inatas do ser humano.

Nesta nossa análise pretendemos, igualmente, demonstrar que, tal

como no caso do homem, também a arquitectura nunca esteve

dependente apenas do orgânico ou do instintivo, pois da mesma

forma que o primeiro homem constrói um instrumento ou uma arma,

num processo de afirmação e de defesa contra a natureza, constrói,

também, um abrigo, e isto ainda no tempo em que a arquitectura não

se diferenciava do acto de construir.

Importa, por isso, fazer uma breve retrospecção que fundamente a

convicção de que a máquina e a arquitectura sempre estiveram

5555 Moscovi tem um percurso científico muito rico e diversificado, contribuiu para a

refundação da psicologia social na Europa e mostrou a contemporaneidade dos

fundadores da sociologia de hoje, tendo, ainda, avançado perspectivas inovadoras

para a construção da antropologia das sociedades contemporâneas.

Page 41: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

18

associadas desde a mais remota antiguidade, como é o caso dos

construtores megalíticos das pirâmides que utilizaram a tecnologia

mais avançada da sua época, um completo sistema de organização

social apelidado por Mumford (1969, capítulos 8 e 9), de mega

máquina, que tornou possível, mediante recursos mecânicos

relativamente primitivos, a contrução de obras colossais.

O que nos permite, também, concluir que do mesmo modo, que

quando se estuda a origem da arquitectura, se pode entender o

papel fundamental da técnica, pode-se, também, de igual forma,

equacionar o facto do fenómeno técnico ser, também, a primeira

característica do fenómeno arquitectónico.

Intenta-se, pois, nesta reflexão dissecar o problema do artificial –

tecknè e do natural - phusis na arquitectura contemporânea de

maneira a descodificar esta dicotomia, já que na arquitectura, tal

como na sociedade, não existem como entidades isoladas.

Por um lado, a palavra grega technè significa habilidade prática ou

técnica, e dela derivaram essencialmente sinónimos de arte,

significativos da habilidade através da qual é possível obter

voluntariamente um determinado resultado. Esta habilidade pode

resultar da experiência simples e da imitação, do conhecimento das

regras de acções codificadas ou de um conhecimento científico.

Page 42: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

19

Diferente da actividade artística, propriamente dita, cuja finalidade é

meramente estética, a técnica visa a utilidade e a eficácia. De uma

forma simplista, pode-se afirmar que da obra de arte, em geral, não

se espera nem se exige funcionalidade, ao contrário da arquitectura,

que implica funcionalidade.

E ainda que a técnica seja, cada vez mais, objecto de numerosas

reflexões e que as suas consequências, na vida quotidiana,

despertem inúmeras inquietações e condicionem o domínio da

natureza pelo homem, é um facto que vários especialistas, nesta

matéria, defendem a propensão do homem para a técnica como um

critério essencial da humanidade.

Na verdade, depois de Aristóteles, muitos filósofos analisaram a

associação recíproca entre a inteligência do homem e o fabrico de

utensílios que permitem transformar a matéria em seu proveito. O

fabrico de utensílios ou de abrigos supõe, efectivamente, que se

represente mentalmente a acção a concretizar, criando a forma do

utensílio ou do abrigo mais apropriado à natureza envolvente.

A técnica, tal como a linguagem, aparece, assim, indissociável do

pensamento, logo indissociável da humanidade e se o homem faz

parte da natureza, as relações com ela são, desde a origem,

fortemente dependentes do utensílio, do abrigo ou da arquitectura,

Page 43: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

20

pelo que se pode afirmar que se a partir de um conjunto de utensílios

se pode desenvolver uma máquina, pode-se, igualmente, dizer que

uma máquina, em sentido lato, é uma forma desenvolvida a partir de

um conjunto de mecanismos, de modo a produzir um determinado

efeito, apenas com um estímulo inicial.

Por outro lado, a palavra grega phusis significa natureza, algo que se

pode reproduzir e que é comum associar-se a organismo, um ser

organizado, constituído por órgãos diferenciados e interdependentes,

definidos por uma ou várias funções específicas.

Inspirada na natureza, a teoria organicista é frequentemente

associada à sociedade e à comunidade como um todo e à sua

relação com as suas partes - os indivíduos que as determinam, em

analogia com um organismo vivo em que as partes não se

manifestam isoladas das relações que têm entre elas.

Assim, o organicismo opõe-se simultaneamente aos seres

inanimados e às máquinas. Contrariamente aos seres inanimados, o

organismo é um ser organizado que se constitui numa totalidade

unificada de órgãos independentes, com relações de

interdependência, dotado de uma certa autonomia variável segundo

um determinado grau de complexidade e que comporta um princípio

de movimento interno.

Page 44: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

21

O natural e a máquina pode remeter-nos para um outro conceito - o

sistema, que pela sua autoregulação e a sua estrutura interna podem

ser comparados com seres vivos e podem ser entendidos como

máquinas, este carácter duplo que os sistemas assumem vai ser

particularmente abordado ao longo do trabalho.

Não se pretendendo fazer história e não sendo esta uma prioridade

do trabalho parece-nos, no entanto, oportuno recuar ao século XVII

para enquadrar o fascínio do homem pela máquina.

A partir do século XVII, a máquina vai servir de modelo à física

científica e pode-se dizer que toda a natureza foi como que

assimilada por uma gigantesca máquina, numa lógica de onde, em

geral, não se excluem o corpo humano nem os fenómenos

biológicos. Neste novo mundo máquina, a natureza torna-se racional,

independente da experiência sensível e, em princípio, pode ser

completamente dominada.

Apesar, de frequentemente, se opor a máquina à natureza e ao ser

vivo, em particular, colocando de um lado as estruturas mecânicas e

do outro a espontaneidade dos seres vivos, é interessante entender

Page 45: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

22

porque recusava Decartes 6666 essa oposição. Ele classifica o corpo

humano como a mais perfeita das máquinas que funciona por

impulsos naturais, mas defende que as consequências dos instintos

e desejos podem ser sempre controlados ou alterados pela mente.

Segundo este filósofo, os animais e as plantas podem explicar-se

através das leis gerais da mecânica, a única diferença reside na sua

complexidade, pois os animais são máquinas, infinitamente mais

sofisticadas do que qualquer uma que o homem poderá alguma vez

realizar. Mas se Decartes recusa opor a máquina ao ser vivo, é para

introduzir um dualismo ainda maior - a oposição entre um

comportamento mecânico e uma conduta racional. No texto que se

segue Decartes (1990, apud, Clément, 1997, p.91 e 92) 7777 vai

fundamentar essa ideia:

6666 Na obra deste filósofo o Mundo supõe, como em qualquer máquina, uma

inteligência criadora que só pode ser Deus, considerando a perfeição do objecto

criado.

7777 DESCARTES, R. 1990. Discours de la méthode (1637) V P. Paris : Hatier, p.64 -

65

Page 46: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

23

(…) a demonstrar que se existissem máquinas que tivessem os

órgãos e a figura de um macaco ou de qualquer outro animal

irracional, não teríamos nenhum meio de reconhecer que elas

eram de natureza diferente desses animais, ao passo que, se

existissem algumas que se parecessem com os nossos corpos

e imitassem as nossas acções com maior perfeição possível,

teríamos sempre duas maneiras muito seguras para

reconhecer que elas não seriam, todavia, verdadeiramente

homens. A primeira é que nunca poderiam utilizar palavras

nem outros sinais como nós fazemos, para comunicar aos

outros os nossos pensamentos.

Na mesma linha de raciocínio o filósofo refere, ainda:

Pois pode bem conceber-se que uma máquina seja feita de

modo a articular palavras e até algumas a propósito das

acções corporais que causarão alguma mudança nos seus

órgãos, como por exemplo, se a tocam em qualquer sítio, ela

pergunte o que querem dizer-lhe, ou que grite quando a

afectam, ou coisas semelhantes, mas não que ela as organize

de maneira diferente, para responder ao sentido de tudo o que

se diga na sua presença, como os homens, mesmo os mais

imbecis, podem fazer. A segunda é que, mesmo que fizessem

Page 47: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

24

várias coisas, tão bem ou mesmo melhor do que qualquer de

nós, falhariam indubitavelmente noutras, através das quais

descobriríamos que não agiam através do conhecimento, mas

apenas pela disposição dos seus órgãos. Pois, enquanto a

razão é um instrumento universal que pode ser utilizado em

toda a espécie de situações, estes órgãos necessitam de uma

disposição especial para cada acção particular; donde se pode

concluir que é impossível haver numa máquina diversidade

suficiente para fazer agir em todas as circunstâncias da vida,

da mesma maneira como a razão nos faz agir.”

Decartes parecia estar aqui numa estratégia antecipada,

relativamente ao que viria a ser o futuro da relação homem-máquina.

A propósito desta oposição entre o mecânico e o racional e para

tentar entender o modo como estes factores influenciaram a vida do

homem e a arquitectura, disciplina à qual esta relação não é

indiferente, uma vez que depende, na mesma proporção, da

capacidade artística e da tecnologia.

Por seu lado, o mundo clássico, associou a ideia do arquitecto à de

técnico que organizava o trabalho humano. Para Vitrúvio, arquitecto

e engenheiro romano que deixou um conjunto de documentos muito

importantes na sua obra De architectura, o único tratado europeu do

Page 48: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

25

período greco-romano que chegou aos nossos dias, não existia

qualquer diferenciação entre o arquitecto e o engenheiro, um

conceito que perdurou até à época moderna.

No entanto, durante a Idade Média, a obra de Vitrúvio não foi

devidamente valorizada pois a arquitectura era considerada como

uma espécie de artesanato, que deveria ser aprendida através da

prática de arquitectos experientes, e entendia-se a classificação das

actividades humanas e de ensino de modo diferente do da

Antiguidade.

O Renascimento, em particular, veio alterar a posição social de cada

uma das artes, e a pintura e a escultura que eram, até então,

consideradas como pormenores da arquitectura tornaram-se actos

independentes.

Desde essa época, houve múltiplas tentativas de normalizar as

disciplinas que se estabelecem como Belas Artes. Especialmente

marcante é a tradução da obra de Vitrúvio por Charles Perrault,

publicada em 1694, um marco na tentativa de aproximar a

Page 49: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

26

arquitectura de uma lógica técnico – científica. 8888 A separação, até

então inexistente, entre as artes e as ciências, foi consequência de

um processo de tensão entre os antigos e os modernos. Durante o

século XVIII, ela dá forma ao chamado sistema moderno de artes,

que consistia em agrupar as actividades humanas cujos mistérios

não se podiam quantificar. As Belas Artes, que teriam o prazer como

fim, são separadas das artes híbridas, em que o prazer e a utilidade

se misturam. O primeiro grupo incluía obras de arte onde não se

espera funcionalidade, como a pintura e a escultura, e o segundo

abarcava a arquitectura onde a funcionalidade é fundamental, pois se

uma obra arquitectónica não cumpre esse aspecto pode-se assumir

que se trata de uma obra falhada.

Na verdade, os aspectos funcionais associados aos estéticos e

técnicos condicionaram a arquitectura e colocaram-na entre as belas

artes e as engenharias, o que provocou uma classificação dúbia no

8888 No primeiro impacto, esta tentativa fracassou, pois a influência de Perrault na

arquitectura não foi grande, no entanto, o facto mais importante foi ter iniciado um

processo de debate como se pode verificar no seu livro Parrallèles des Anciens et

des Moderne en ce qui regarde les Arts et les Science (1688-1697).

Page 50: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

27

âmbito destas duas profissões, e apesar de não se pretender

constituir, nesta retrospectiva, a história de como a profissão se

bifurcou na vertente estética e técnica, convém referir um marco

importante que foi a fundação em França, em 1795, da Escola

Politécnica para formar engenheiros, algo completamente distinto da

Escola de Belas Artes, cuja missão era ensinar os futuros

arquitectos.

Todo o século XIX esteve condicionado por uma polémica em que as

rivalidades profissionais se cruzavam com as correntes de

pensamento e com os conflitos políticos e culturais, e muitos

arquitectos tentaram procurar um estilo da época, reproduzindo ou

não a variante da história, enquanto que os engenheiros enobreciam

as suas construções com uma mistura ecléctica e valorizavam a

vertente técnica.

Pareceu-nos oportuno enquadrar, agora, esta questão entre o

arquitecto e o engenheiro pois, como se irá perceber a polémica

estende-se ao século XX, e ao longo deste trabalho vamos constatar

a importância da engenharia no processo conceptual da arquitectura.

Na sociedade da época existia já uma grande aceitação da

importância do progresso científico e técnico, no entanto podemos

afirmar que a adesão não podia ser considerada total, porque se era

Page 51: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

28

um facto que as máquinas eliminariam a parte mais penosa do

trabalho humano, permitindo aumentar a riqueza dos povos, e

contribuindo de forma particular para o desenvolvimento da

sociedade, a verdade é que esta assunção não era partilhada por

todos da mesma maneira, e, paralelamente, existia também uma

critica feroz à máquina, que se vinha desenvolvendo desde a

influência do romantismo.

O romantismo negava a máquina por entender que esta se opunha

ao sentido da vida e da criação, desenvolvendo a linha de

pensamento que, ainda nos nossos dias, continua a povoar reflexões

sobre a sociedade e sobre a vida do homem, perspectivando uma

humanidade alienada pela máquina que, contudo, é fruto da sua

própria criação.

Conforme vamos verificar ao longo do desenvolvimento deste trabalho

vários ramos do conhecimento continuaram a fazer da máquina um

princípio fundamental para entender o mundo. Segundo Eduardo

Subirats (1987, p. 53) a máquina é, assim, uma peça fundamental na

cultura ocidental, defendendo inclusive que:

(…) desde Descartes la máquina ha sido concebida en la historia

de la cultura occidental como la expresión máxima y el medio

decisivo del poder humano sobre la naturaleza y, en

Page 52: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

29

consecuencia, como un instrumento emancipador.

Por exemplo, para Francastel (1956, p. 15):

Comme toute les autres formes de l’activité humaine, l’art a été

profondément influencé depuis un siècle par le développement

immense d’une civilisation mécanique. (…) Une idée très

généralement admise est que le fait dominant de notre époque

consiste dans la détermination soudaine et absolue par la

machine des conditions de l’existence humaine.

É esta valorização dos diferentes ramos da ciência e da arte

relativamente à máquina, que nos obriga a uma reflexão mais

profunda sobre o desenvolvimento que ao longo do século XX, a

máquina teve, e continua a ter, na evolução do homem e em

particular na arquitectura ao longo do século XX.

Page 53: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

30

2 . 2 . C O N C E I T O S C O N T R A D I T Ó R I O S

2 . 2 . 1 . E V O L U Ç Ã O T É C N I C A

A partir da segunda metade do século XIX, o processo evolutivo de

artificialização da natureza ganha uma dimensão especial, e um

conjunto de transformações, nomeadamente o fascínio pela

máquina, aponta, decididamente, para uma cisão entre o natural e o

artificial. De facto, se é certo que o natural e o mecânico nem sempre

foram antagónicos e que houve épocas na história da humanidade

em que se identificavam em paralelo, mais difícil é precisar quando

estes dois conceitos se tornaram, efectivamente, antagónicos, como,

aliás, é comprovado pela posição de alguns autores

contemporâneos.

Na opinião de Mumford (1969a, capítulos 1), os grandes progressos

técnicos começaram a cristalizar por volta do século XVI, devido à

dissociação do anímico e do mecânico, questionando, este autor, se

a maior dificuldade encontrada no processo desta dissociação não

seria a persistência na maneira de pensar animista.

Já Montaner (2002, p. 22), por exemplo, defende que este fenómeno,

que caracterizou particularmente grande parte da cultura industrial, é

mais recente: “no séc. XIX com o predomínio do racionalismo

Page 54: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

31

positivista, provocou nos países industriais europeus uma cisão entre

o artificial e o natural, uma contraposição irreconciliável entre a

indústria e a agricultura”.

Apesar de não se poder precisar um momento especifico no qual

este processo de dissociação se verificou, facto que não nos parece

de relevância excepcional para a nossa análise, vamos optar por

situar a problemática no final do século XIX e no início do século XX,

época em que o factor técnico foi determinante na relação entre o

homem e a natureza. Efectivamente, a evolução técnica foi um

elemento fundamental na forma de pensar e de construir o espaço e

foi determinante na afirmação da arquitectura relativamente à

natureza, afirmação esta que decorre do modo como o homem

manipula as matérias construtivas.

No final de século XIX surge um novo elemento construtivo – o

betão9999, que vai determinar de forma irreversível a relação entre o

homem e a técnica. Este material, considerado novo, já tinha sido

9999 Este material tinha sido aplicado pelos romanos e foi uma técnica de construção

muito importante a partir do século I d.c. contudo caiu no esquecimento e só voltou a

ser divulgado por volta de 1800 no livro de Rodelet, Art de Bâtir.

Page 55: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

32

aplicado anteriormente e voltou a ser redescoberto em França, no

entanto as suas possibilidades permitiram-lhe, desde logo, uma

rápida divulgação e a partir de 1832, são efectuadas várias patentes

relativas a combinações que apontavam para o betão armado.

O impacto deste material foi enorme, construíram-se estruturas de

grandes vãos, até então impensáveis, o espaço ganhou uma nova

dimensão e os edifícios adquiriram uma grande leveza. As novas

possibilidades do betão, combinadas ou não com ferro, traziam para

a ribalta a figura do engenheiro e, segundo François Coignet, a

Exposição Internacional de 1855 confirmava que o cimento, o betão

e o ferro estavam destinados a substituir a pedra.

Sem dúvida que a utilização do betão, na arquitectura, foi

notoriamente um dos aspectos mais importantes no processo de

habitar, já que as possibilidades técnicas deste novo elemento

construtivo determinam a relação entre o homem e o espaço. Com

efeito, a arquitectura do século XX não se pode definir sem se

perceberem as possibilidades espaciais produzidas a partir do

emprego do betão que veio instituir um conceito revolucionário e de

vanguarda. Este material permitia a produção em quantidade a

custos reduzidos, possibilitava criar elementos pré-fabricados que

facilitavam o processo de execução, vencia grandes áreas com

Page 56: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

33

estruturas simples, consolidava a ideia da construção tecnicamente

funcional e, fundamentalmente, permitia através das características

estruturais e da sua plasticidade, associar o trabalho criativo do

homem à ideia de máquina.

Mas se por um lado o progresso técnico era uma constante, e se os

avanços tecnológicos se iam sobrepondo às técnicas tradicionais ou

artesanais, é preciso constatar que por outro lado existia, também,

um movimento forte que apontava em sentido contrário.

Na realidade, em paralelo com o desenvolvimento técnico do século

XIX, o organicismo assumia-se como uma doutrina que compara as

formas de organização e de funcionamento das sociedades com as

dos seres vivos, e que formulado a partir da ideia de organismo,

considera a vida como um resultado organizado, estabelecendo

analogias com os organismos vivos, em oposição aos seres

inanimados e às máquinas.

Por conseguinte, a arquitectura orgânica procura as formas do

mundo orgânico, dos organismos vivos presentes na natureza e

estabelece sempre, uma analogia com a vida, procurando sobretudo,

“imitar a necessidade de adaptação, crescimento e desenvolvimento

das formas da natureza.” (Montaner, 2002, p.20)

Importa notar que apesar de alguns arquitectos e teóricos

Page 57: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

34

contemporâneos caracterizarem de modos perfeitamente distintos o

organicismo e o maquinismo, como por exemplo Montaner que

dedica a primeira e a segunda parte da sua obra As formas do século

XX, respectivamente, a organismos e a máquinas, não podemos

entender estes dois temas como simplesmente antagónicos. Por

exemplo Collins (1970, p.161) em Los Ideales de la Arquitectura

Moderna, su evolucion (1750-1950) na terceira parte dedicada ao

Funcionalismo, considera nos dois primeiros capítulos: la analogía

biológica, como uma das ideias na doutrina arquitectónica que se

começou a desenvolver por volta de 1750 10101010 e a analogia mecânica,

como uma doutrina utilizada durante o século XIX:

De las diversas analogías utilizadas durante o siglo pasado para

aclarar los principios de una nueva arquitectura, probablemente

la única que tuvo una importancia igual a la analogía biológica

fue la analogía establecida entre edificios y máquinas.

10101010 Esta época foi também marcada por importantes livros cientificos: “Species

Plantarum de Linneo (1753), en el que todo el reino vegetal se clasificaba con pares

de nombres o estilos de acuerdo com la disposición de los órganos reproductivos de

la hembra , y La Histoire Naturelle de Buffon (1947), vasto compendio general de las

leyes que gobiernan el universo.” (Collins, 1970, p.151)

Page 58: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

35

As manifestações arquitectónicas são, sempre, meios de

transmissão cultural e, neste sentido, são testemunhos

inquestionáveis dos ideais do trabalho artístico da sociedade, da

época e dos contextos culturais em que foram produzidos.

Assim, torna-se necessário estudar algumas obras e autores numa

análise comparativa entre épocas e contextos culturais diferentes,

enquadrando-os com conceitos ideológicos e perceber como

influenciaram o universo da arquitectura.

Page 59: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

36

2 . 2 . 2 . P R O B L E M Á T I C A N O S M E I O S A R T Í S T I C O S

Assim, apesar deste estudo não se referir ao século XIX, em

particular, parece-nos pertinente explorar a problemática instalada,

no final daquele século, relativamente ao fenómeno máquina na

sociedade, nomeadamente, analisar a posição de alguns autores,

como é o caso de Ruskin e Morris.

Ruskin foi um polémico escritor que defendia a ideia de uma vida

baseada na simplicidade e isenta de vícios. Classificava

negativamente a máquina e o que ela representava, referia-se “às

cidades industrializadas do seu tempo, nas quais do seu ponto de

vista, a felicidade do Homem sucumbe por entre as fábricas e o ruído

da máquina” (Spinozzi, 2006, p. 231) 11111111, e revoltava-se contra as

consequências negativas do desempenho de tarefas executadas de

forma mecânica que, em sua opinião, contribuíam para a infelicidade

dos trabalhadores e para a decadência das sociedades.

11111111 Tradução livre: Spinozzi, Paola, Art and Aesthetics in Utopia: William Morris’s

Response to the Challenge of the People, in Marinela Freitas e Fátima Vieira Utopia

Matlers: Theory Politics Literature and the Arts.

Page 60: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

37

Esta ideia já estava presente, uns anos antes, no capítulo The Nature

of Gothic incluído no The Stones of Venice 12121212 (1851-1853), uma obra

em cuja primeira edição se apelava, de forma persuasiva, à

importância da preservação das obras de arquitectura. Contudo, no

prefácio da terceira edição, Morris (1800) lamenta que tal não esteja

a acontecer e, em The Seven Lamps of Architecture, no prefácio de

uma das várias edições percebe-se um total desencanto decorrente

do facto das heranças arquitectónicas continuarem a não serem

preservadas de modo digno.

Ruskin, para além de escritor, tinha também estudado pintura e

arquitectura, era membro do Brotherhood, 13131313 e foi um dos primeiros a

compreender que os fundamentos da arte, na sociedade, estavam

muito fragilizados com a revolução industrial, pois entendia a obra de

arte, e em particular a arquitectura, como uma expressão da

12121212 Esta obra de Ruskin apresenta-se como resultado de um trabalho rigoroso e

refere as dificuldades que o autor teve em caracterizar os edifícios de Veneza, uma

vez que a maior parte tinham sido alvo de sucessivas restaurações que por vezes

aboliram por completo o seu traço original.

13131313 Os objectivos deste grupo pré-rafaelita, fundado em 1848, consistiam em alcançar

o sentido de beleza que caracterizava épocas passadas.

Page 61: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

38

mentalidade humana, defendendo a arquitectura de outros tempos

como uma força vital, semelhante ao poder renovador da natureza.

O facto de ser professor na Universidade de Oxford influenciou toda

uma geração de estudantes e Matteson, por exemplo, apoiado nas

teorias defendidas por Ruskin, sublinha essa ideia num trabalho

sobre estética e ética da arquitectura. (Matteson, 2002)

A atitude de Ruskin, fortemente ligada à estética, fazia com que

defendesse a importância da arte e da beleza numa sociedade que

considerava fortemente industrializada e que, por via dessa situação,

instituía a fealdade na vida quotidiana dos cidadãos. Os motivos de

Ruskin para esta aversão à máquina eram, assim, essencialmente de

natureza estética, de defesa convicta da importância da beleza e da

arte, e o seu trabalho foi fundamental para criar uma situação de

compromisso entre uma realidade complexa, que a arte enfrentava, e

a sua total emancipação como fenómeno artístico.

Ruskin foi um dos primeiros a criticar as estações de caminho de

ferro e o Palácio de Cristal, símbolos da nova era, e só aceitava a

ideia de que as máquinas podiam ser necessárias e úteis como os

“escravos que serviram para poupar trabalho ao homem, para uma

Page 62: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

39

autêntica economia de trabalho, mais pesado e exaustivo” 14141414. (Crane,

1892 apud Pevsner, 1936, p.27)

Nesta postura vislumbra-se uma certa abertura para a aceitação da

máquina, no entanto não nos podemos esquecer que as suas ideias

confluem com as de Henry Moore, um dos poucos artistas do século

XX que manteve uma posição assumidamente humanista e de forte

relação com a natureza, recusando a postura do artista intelectual e

valorizando o artista artesão, pois, na perspectiva de Moore, não se

podia executar uma escultura sem o prazer da arte, sem o prazer de

sentir os materiais.

Esta era uma posição também partilhada por William Morris que se

preocupava com as consequências da revolução industrial,

principalmente, com o desaparecimento do artesanato e com o

protagonismo do trabalho mecânico em detrimento do prazer do

trabalho manual.

Morris desvalorizava a posição do artista intelectual e as formas de

inspiração, enquadradas em determinados período de tempo: “Toda

essa história de inspiração é puro disparate”, dizia ele: “não existe tal

14141414 CRANE, Walter. 1892. The Cleims of Decorative Art. London : [s.n.] .p.65.

Page 63: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

40

coisa o que importa é o trabalho manual”.15151515 (Mackail, 1899 apud

Pevsner, 1936, p.23).

Morris culpava a massificação industrial e a redução do trabalho

individual pela degradação do património arquitectónico e, nesse

âmbito, integrou a Society for the Protection of Ancient Buildings, que

defendia uma cumplicidade idêntica para a vida e para a arquitectura,

que se pretendiam ambas afastadas da máquina. Contudo, na área

da arquitectura, Morris estava mais preocupado com a integração

urbana dos edifícios do que propriamente com as suas

características formais.16161616

15151515 Mackail, J. W. 1899. The Life of William Morris. London, p.186. Reeditado nos

World’s Classies, 1950. Em 1910-1915 May Morris publicou Collected Works,

acrescentando-lhe dois volumes de bibliografia: William Morris Artist, Writer,

Socialist, 1936. As cartas de Morris foram publicadas em 1950, por P. Henderson,

London. As palestras de Morris foram reeditadas em 1992,The Complete Work’s of

William Morris.

16161616 Sobre este assunto Margarida Barata, conclui com base na Introdução de William

Morris: A Life of Our Time de Chris Miele que os ensaios de Morris se baseavam,

sobretudo, em emoções e não em fundamentações teóricas, talvez pela deficiência

de conhecimentos arquitectónicos, embora nos seus tempos de juventude se tenha

interessado pelo estudo da arquitectura.

Page 64: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

41

Morris rejeitava os valores da era industrial que caracterizavam o

período vitoriano e defendia que a arte devia ser partilhada por todos

como um bem essencial, colocando uma questão relativa ao destino

da arte no século XX: “Que interesse pode ter a arte se não puder

ser acessível a todos?”17171717, (Mackail, 1899 apud Pevsner, 1936, p.22)

pois para ele a arte não devia ser um privilégio dos ricos. No livro

The Prospects of Architecture in Civilization (1881) apresentou as

suas ideias e proclamou que todos, sem excepção, deviam ter direito

a uma habitação digna e a usufruir da beleza e da funcionalidade dos

objectos de uso comum.

A sua percepção de arte derivava do conhecimento que possuía do

trabalho medieval, que surgia para ele como modelo de autenticidade

e de inspiração. Esta arte, influenciada pelo artesanato gótico,

conduzia, no entanto, a um novo conceito: “a verdadeira arte deve

ser feita pelo povo e para o povo, como uma bênção para quem a faz

e para quem a desfruta” 18181818 (Morris, 1914 apud Pevsner, 1936, p.23),

17171717 MACKAIL, J. W.. 1899. The Life of William Morris. London : [s.n]. p.99.

18181818 MORRIS, William. 1992. The Collected Works of William Morris. XXII, London :

Thomas Press. p. 47, 50, 58, 73, 80.

Page 65: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

42

Nota-se nesta posição uma postura inovadora que reflecte as suas

ideologias socialistas, embora, na prática, a arte pelo povo e para o

povo na prática não se traduzisse numa situação linear e

apresentasse algumas contradições que decorriam, sobretudo, do

facto de parecer impossível uma arte economicamente viável.

Mas o trabalho de Morris não se limitou ao plano teórico e com a

fundação da firma Morris; Marshall & Faulkner vai-se assistir ao início

de uma nova etapa na arte ocidental, já que, neste espaço, se

reuniam várias áreas associadas às belas artes, pintura, gravura,

mobiliário e metais, que desenvolveram todo um trabalho com efeitos

positivos e inovadores nos diversos ramos da produção comercial.

Apesar de Morris ter considerado ao longo da sua vida “a máquina

seu inimigo fidigal: a produção mecânica como condição de vida é

um mal absoluto” 19191919 (Morris, 1914 apud Pevsner, 1936, p.26),

percebe-se nos seus últimos discursos uma atitude mais cautelosa e,

de certa forma, oposta aos seus discursos iniciais, chegando mesmo

a afirmar que devíamos tornar-nos “senhores das nossas máquinas e

usá-las como instrumentos para conseguir melhores condições de

19191919 CRANE, Walter. 1892. The Cleims of Decorative Art. London : [s.n.]. p.335-336.

Page 66: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

43

vida”20202020 (Morris, 1914 apud Pevsner, 1936, p.26). Esta aparente

contradição pode ser interpretada de diferentes ângulos porque se

Morris, por um lado, teve consciência de que o design era importante

na melhoria da qualidade de vida, um aspecto relacionado com a

função prática e a dimensão material, por outro lado, também, não

desprezou a função estética na sua dimensão espiritual.

Note-se mais uma vez que as ideias de Morris não eram partilhadas

por todos e que existiam diferenças significativas no entendimento

que se fazia da máquina. Na época existiam já algumas posições

que se aproximavam do que viria a ser a realidade do futuro,

nomeadamente, por parte de Lewis Day e de John Sedding Day,

conhecido arquitecto da escola revivalista gótica. Lewis Day era um

contemporâneo de Morris que, em 1882, com uma postura

completamente diferente da dele, relativamente à máquina, afirmava:

“Quer queiramos quer não, as máquinas, os motores a vapor e a

electricidade tanto quanto agora podemos saber, virão a ter qualquer

coisa que ver com a futura arte decorativa”. Este desenhador

industrial entendia que: “O público praticamente já decidira que

20202020 CRANE, Walter. 1892. The Cleims of Decorative Art. London : [s.n.]. p.179.

Page 67: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

44

preferira o trabalho mecânico (...) por mais que protestemos que ele

escolheu mal, nunca conseguiremos que nos prestem grande

atenção”. 21212121 (Day, 1882 apud Pevsner, 1936, p.28).

Continuando a fundamentação deste ponto de vista, Sedding,22222222

(1893 apud Pevsner, 1936, p.28-29), dez anos mais tarde, viria a

exprimir uma posição idêntica:

Não devemos pensar que deixarão de usar as máquinas. É

impossível organizar a manufactura em qualquer outra base.

Vale mais reconhecermos isto de maneira inequívoca (...) do

que revoltarmo-nos contra um facto real e inevitável.

Como temos vindo a comprovar coexistiram, nesta altura, ideias com

diferenças significativas relativamente ao modo como se abordava o

tema da máquina, no entanto todas elas foram veículos, igualmente

importantes, de transmissão cultural e todas elas influenciaram o

futuro da arte e da arquitectura.

21212121 DAY, Lewis. 1882. Every–day Art: Short Essays on the Arts Not so Fine. London :

[s.n.].

22222222 SEDDING, John Day. 1893. Art and Handicraft. London : [s.n].

Page 68: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

45

Na época, muitos seguidores de Morris mantiveram uma idêntica

atitude negativa em relação aos modernos modelos de produção. O

movimento Arts and Crafts,23232323 defendia a renovação do artesanato

artístico, em particular, um dos representantes desta orientação,

Walter Crane, o mais conhecido dos discípulos de Morris, também

recusava a produção mecânica, pois, para ele “a verdadeira base, as

verdadeiras raízes estão no trabalho manual” 24242424 (Pevsner, 1936,

p.26), tal como Morris tinha referido anteriormente.

Outro seguidor de Morris e Crane, Ashbee, entendia que o trabalho

manual era a condição essencial da cultura artística, quer da

arquitectura quer das outras artes, pelo que todos os objectos

deviam ser produzidos em boas condições, sendo que, para ele, a

23232323 Ideologia que surge na Grã Bretanha, como resposta ao efeito da industrialização

que tratava o trabalhador como um autómato, provocando a degradação da

qualidade dos objectos, a finalidade consistia em adaptar os objectos às funções, a

característica estilística derivava de formas simples através de motivos lineares e

orgânicos e as fontes de inspiração eram a arte gótica, formas naturais de plantas e

de animais.

24242424 Este tema foi amplamente debatido em 1888, na primeira exposição conforme se

pode comprovar no catálogo da Arts and Crafts Exihibition Society. p.7.

Page 69: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

46

arte para o uso quotidiano não podia ser barata, e Ashbee, mais

original e reformador do que Crane, irá fundar a Guild and School of

Handieraft.

A escola irá divulgavar as suas ideias e apesar da sua postura ser,

nalguns aspectos, ainda mais influenciada pelo artesanato medieval

do que a de Morris, existe uma atitude aparentemente mais

progressista. Se analisarmos os discursos de Ashbee, pode-se

observar uma evolução relativamente ao modo como entendia a

produção mecânica, apresentando, no início, uma atitude quase

idêntica à de Morris e Crane, “não repudiamos a máquina”25252525

(Ashbee, 1901, apud Pevsner, 1936, p.27) e advogavando

“acolhemo-la até muito bem. Desejamos simplesmente que ela seja

dominada”, para alguns anos depois, em 1910, romper com as suas

ligações a Ruskin e Morris, ao escrever dois livros em que manifesta

uma posição mais disponível para acolher o fenómeno mecânico: “a

civilização moderna depende da máquina e não é possível a

qualquer sistema que dependa da máquina, encorajar ou favorecer o

25252525 ASBHEE, Charles. 1901. Endeavour towards the Teachings of J. Ruskin and W.

Morris. London : [s.n.]. p.47.

Page 70: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

47

ensino das artes deixar de reconhecer este facto”. 26262626 (Ashbee, 1911

apud Pevsner, 1936, p.28)

Nesta fase de transição do século, é interessante notar a importância

da máquina no fenómeno artístico, em geral, e um facto

inquestionável é que, independentemente de uma maior ou menor

adesão ou mesmo de renúncia total, a máquina esteve presente nos

discursos e nas doutrinas, reflectindo-se como fenómeno emergente

na sociedade.

Constatamos que, até aqui, a influência inglesa, nesta fase de

transição em que o fenómeno da máquina emerge na sociedade e

influencia os acontecimentos ao nível da arquitectura e da arte, foi

fundamental, no entanto, após a morte de William Morris, os

principais acontecimentos vão se desenvolver no continente e nos

Estados Unidos da América.

26262626 ASBHEE, Charles. 1911 Should We Stop Art Teachings Art? London. p.4. ,

ASBHEE, Charles. 1917. Where the Great City Stands. London. [s.n.]. p. 3.

Page 71: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

48

3 . T E N D Ê N C I A S E M E R G E N T E S

Na transição do século percebemos que em torno do tema da

máquina desenvolveram-se várias posições, relativamente ao modo

como ela marcou a arquitectura do século XX.

Os que valorizaram as questões do natural não desprezando a

técnica, pois foi através de elementos naturais que surgiram os

pretextos com que construíram as suas formas orgânicas, como é o

caso de Steiner, e os valorizaram uma vertente mais funcional e mais

racionalista, numa total analogia com a máquina, como é o caso de

Wittgenstein. A máquina surgia, ainda, associada a movimentos de

vanguarda, como foi o caso do futurismo italiano e do construtivismo

russo.

Nesta análise, como já foi referido, pretende-se demonstrar que a

arquitectura nunca esteve, apenas, dependente ou do orgânico ou do

mecânico, sendo bastante interessante notar que apesar de muitos

autores se preocuparem com a integração da máquina na arte e com

as consequências operativas desse processo de integração,

nomeadamente, com a problemática do artista, nem todos

partilharam das mesmas preocupações, o que não impediu a

construção de um trabalho efectivamente válido.

Page 72: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

49

3 . 1 . O O R G A N I C I S M O D E S T E I N E R

Veremos a seguir o trabalho de Rudolf Steiner (1861-1925), cujas

ideias contrastam com as da maioria dos seus contemporâneos, na

medida em que valorizam as formas do mundo orgânico e dos

organismos vivos, procurando estabelecer uma analogia entre a

arquitectura e a natureza, e em que as características da natureza

são entendidas na sua plenitude: adaptação ao meio, crescimento e

desenvolvimento.

Apesar da sua formação técnica em engenharia, Steiner interessava-

se pela filosofia e pela literatura, em particular pela obra de Goethe 27272727

27272727 Figura importante da literatura alemã (1749-1832), um dos líderes do movimento

literário romântico alemão, desenvolveu trabalhos na área da botânica. O seu

Figura 1

Desenhos de Goethe como resultado da observação da metamorfose da planta arquetípica.

Page 73: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

50

(1749-1832), figura da literatura alemã e mundial a viver em Weimer,

e que Steiner chega a considerar, numa conferência, “Goethe, pai da

nova estética”. (Rodrigues, [s.d.], p.14)

A investigação sobre a obra de Goethe,28282828 nomeadamente, a

observação das plantas, das cores e o grande interesse por um

conhecimento interdisciplinar influenciou de forma determinante o

trabalho de Steiner e os seus projectos, compostos por formas

orgânicas, apresentavam analogias com organismos vivos onde se

percebiam princípios de organização interna e tipos de

funcionamento de corpos vivos.

trabalho estendeu-se a várias áreas e a sua análise fenomenológica não se resumia

à botânica, mas também à teoria do conhecimento, entre outras.

28282828 Segundo Collins (1970, p. 152): “Goethe, que en sus tiempos era tan famoso

científico como poeta, inventó en la miesma época la palabra morfología. Siendo

poeta, entendió el término morfología con un sentido mucho más amplio que el que

damos hoy (cuando los temas a estudiar se limitan a la comparación relación de

estruturas vivientes y su desarrollo, incluyendo las formas inanimadas como los

minerales. Esto (…), fue un elemento de confusión en la analogía biológica, pues,

desde sus inicios, no se sabía si la morfología se referia a estruturas vivientes, o a

estruturas de crecimento.”

Page 74: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

51

Efectivamente, a observação do fenómeno da vida e a metamorfose

dos seres vivos era indispensável ao processo artístico de Steiner,

um princípio que vai presidir ao desenvolvimento do seu trabalho e

que, baseado na postura filosófica e anti-mecanicista de Goethe, se

opunha ao conceito mecânico que implicaria, sempre, um processo

estimulado a partir de impulsos exteriores.

Do mesmo modo que outros contemporâneos discutiam o paradigma

da máquina, Steiner considerava o homem o elemento fundamental

do universo e é com base nesta teoria que cria o movimento cultural,

a Antroposófia, que significa a sabedoria do homem enquanto ser

composto de corpo, alma e espírito.

A Antroposofia propunha um entendimento do ser humano e do

cosmos, incentivando o trabalho de meditação e de percepção do

mundo consciente, para que os conhecimentos antroposóficos

pudessem contribuir para a redescoberta das fontes espirituais que a

ciência, entretanto, tinha esquecido.

Page 75: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

52

Steiner deu conferências nas maiores cidades da Europa e em 1924

fundou, na Suiça, o movimento Antroposófico Universal, 29292929 para

todos os que se preocupassem com a vida anímica, dos indivíduos

ou da sociedade, com base num profundo conhecimento do mundo

espiritual.

Na Suíça, Steiner constrói entre 1913 e 1920, o primeiro de dois

Goetheanum, um edifício de componente fortemente plástica,

destinado a albergar a Sociedade Antroposófica Geral, instituição

que comportava a Universidade Livre e a Ciência Espiritual, com

sede no Dornach. Os edifícios foram projectados por Steiner, tendo o

mais importante sido chamado de Goetheanum que, inicialmente, era

em madeira mas que após um incêndio na noite de S. Silvestre em

1923, foi reconstruído em betão armado.

Os Goetheanums eram inspirados no princípio da metamorfose e no

descobrimento da planta primária, como aparecia nos textos

científicos de Goethe, e nos dois projectos percebia-se claramente

29292929 A partir desta época, esta ciência espiritual foi aplicada a diversas áreas, na

medicina antroposófica, na pedagogia Waldorf, na euritmia, na terapia artística e na

arquitectura entre outras.

Figura 2

Primeiro Goetheanum.

Figura 3

Dupla cúpula do primeiro Goetheanum.

Page 76: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

53

uma linguagem orgânica. O primeiro era composto por duas cúpulas

interligadas, de tamanhos diferentes, assentes em dois cilindros e

uma plataforma. O segundo, também projectado por Steiner, foi

inaugurado em 1928, já depois da sua morte, e assemelhava-se a

um grande organismo vivo integrado na envolvente, e reflectia

formas expressionistas. Próximo do edifício central, na zona de

intervenção urbanística, existe uma série de edifícios, como a Casa

Duldeck, com uma forma idêntica à do Goetheanum, a Casa de Vidro

e a Fábrica de Calefação, que também apresentam formas orgânicas

e holísticas, na mesma linguagem do Geotheanum.

Nos Geotheanums percebe-se a metodologia de Goethe que tanto

intrigava Steiner, “Goethe via claramente que um organismo não

podia ser um objecto inanimado, pois, ele contém algo mais do que

as forças da natureza inorgânica.” (Rodrigues, [s.d.], p.28)

Assim, segundo este autor, Goethe procura no reino vegetal o

princípio activo que tanto intrigava Descartes:

No domínio da natureza o essencial é a ideia de vida. Quer

dizer a observação do organismo vivo integral e não as suas

partes inanimadas (...) o cadáver não é o animal inteiro. Falta-

lhes neste caso, uma parte capital, a parte essencial: a vida.

(Rodrigues, [s.d.], p. 29)

Page 77: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

54

Em ambos os Goetheanums, percebe-se uma analogia biológica que

vai para além das imagens formais, pois cada parte do edifício tinha

sentido em relação ao todo, ao mesmo tempo que cada parte se

metamorfoseava em outra, tanto em planta como em volume, ou

mesmo nos detalhes.

A admiração profunda pela obra de Goethe, e voltamos a insistir na

observação das plantas, nas cores e no grande interesse pelo

conhecimento interdisciplinar, povoa, constantemente, o trabalho de

Steiner. Os seus projectos, como já referimos também, eram

compostos por formas orgânicas e apresentavam analogias com

organismos vivos, nas quais se percebiam princípios de organização

interna e tipos de funcionamento de corpos vivos; no entanto, isto

não quer dizer que desprezasse as questões técnicas e construtivas,

ou até, a sua formação de engenheiro na Escola Politécnica de

Viena.

Aliás, podemos verificar estas duas vertentes, técnica e orgânica,

desde o início da sua vida profissional, como é o caso do projecto de

Johannesbau em Munique, que comportava vários modelos

experimentais e cujo “projecto inicial nasce essencialmente de uma

Figura 4

Comparação entre as estruturas edificadas e a estrutura do corpo humano.

Page 78: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

55

dinâmica vinda do interior”. Segundo Hartmann 30303030 (1973, apud

Rodrigues, s.d, p.16), Steiner desejava que “o edifício ficasse todo

coberto com terra onde nascesse erva”, contudo, em simultâneo com

a vertente orgânica, este projecto apresenta, também, uma

componente técnica e científica muito forte, pois a sua concretização

implicava a construção de uma cúpula que cobria um auditório único

para mil pessoas, uma verdadeira inovação tecnológica para a

época. Este projecto revelou-se deveras importante já que os

modelos experimentais que concretizou, foram determinantes para a

concepção formal e funcional do Goetheanum.

Apesar das obras mais conhecidas de Steiner serem o primeiro e o

segundo Geotheanums, existem outros edifícios onde se verificam

relações interessantes entre a forma como conciliava a organicidade

plástica e os factores técnicos. Podemos, inclusive, constatar que

sem os avanços tecnológicos que aconteciam um pouco por todo o

lado, o carácter orgânico das suas formas seria provavelmente

impossível de concretizar, pelo que vamos referir, ainda, outros

projectos que reflectem estas duas vertentes.

30303030 HARTMANN, Georg. 1973. Les vitraux du Goetheanum. Dornach : Philosophisch

Anthrposophischer Verlag. p.10

Figura 5

Ideia inicial de cobrir o primeiro Goetheanum.

Page 79: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

56

Com efeito, no ano do início da construção do primeiro Goetheanum,

Steiner projecta o Euritmeu, desenvolvendo uma linguagem

perfeitamente distinta. Neste projecto, ele vai experimentar novas

técnicas e o betão possibilita-lhe uma plasticidade completamente

diferente da utilizada no primeiro Geotheanum, construído em

madeira, e consegue, assim, uma obra em que a organicidade e a

funcionalidade técnica se cruzam reciprocamente.

No ano seguinte, constrói a Glass Haus que a partir de uma lógica

decorrente das proporções históricas, apresenta uma linguagem

plástica específica, marcada por uma forte componente orgânica,

onde está presente a ideia global da obra, controlando-se os

detalhes de todas as partes como, por exemplo, das portas e dos

respectivos fechos.

Duma forma geral, podemos afirmar que a obra de Steiner é

influenciada por analogias com os seres vivos e pelos seus

conhecimentos interdisciplinares, contudo, as suas obras para além

de proporcionarem ao homem um lugar para habitar - a função

existencial da arquitectura, proporcionam também uma perfeita

adequação entre a forma e a função reflectindo, ainda, a

Page 80: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

57

funcionalidade técnica. 31313131Isto mesmo, pode-se constatar na Casa

Armazém de Livros, projectada em 1913, um edifício de formas

simples em que o projecto estava determinado pela função e os

próprios conceitos eram gerados pela especificidade do programa.

Outros exemplos, do que acabamos de referir, são as três habitações

Euritmistas de 1921, pois combinam um programa funcional com

uma linguagem plástica. “São edificações de carácter utilitário mas

que pela sua forma explicitariam emblematicamente a arte do

movimento de que se ocupavam os utentes”. (Rodrigues, [s.d]., 22)

Apesar de Steiner não ter manifestado particular interesse pelas

questões inerentes ao fenómeno da máquina e aos processos de

produção industrial que lhe estavam associados, como o caso da

estandardização, é importante referir que a casa Ita Wegman é um

31313131 Segundo Collins (1970, p.153): “Cuando se aplicó la analogia biológica a la teoria

del arte, el problema de forma y función se dejó de lado centrándose el interés en el

modo de crecimiento de las formas, más que en la manera como trabajan” e

corrobora com as ideias de Coleridge relativamente á oposição entre a forma

mecânica sempre resultante de um processo de premeditação: “La forma orgánica,

por outro lado, es innata, se forma al desarrollarse desde dentro, y la totalidad de su

desarrollo es lo mismo que la perfección de su forma exterior”. (1970, p.154)

Page 81: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

58

exemplo que reflecte a integração de um processo de

estandardização no processo de concepção, numa simbiose perfeita

e pouco comum para a época. De facto este projecto propunha um

edifício, organizado em peças desmontáveis, cuja montagem foi

efectuada num estaleiro, possibilitando um processo muito rápido de

edificação que demorou menos de dois meses.

Em 1886, Rudolf Steiner aborda as questões relacionadas com o

estudo da natureza, explorando uma multiplicidade de

conhecimentos e fazendo uma relação entre a prática, a teoria e arte,

numa forma global de pensamento a que Jacinto Rodrigues chamou

intuição imaginativa, um conceito que derivava de um modo de

expressão artística, denominado Gezant Kunst Werk que significava

a Obra de Arte Total, e que Wagner vai mais tarde utilizar para

explicar a multiplicidade de linguagens simultâneas numa obra de

arte, como expressão global da imagem do homem: pensamento,

sentimento e vontade.

Assim, Steiner foi um dos artístas que marcou o panorama

arquitectónico ao longo do século, com repercussões que ainda hoje

perduram, como teremos oportunidade de provar no

desenvolvimento deste trabalho.

Page 82: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

59

3 . 2 . R A C I O N A L I S M O D E W I T T G E N S T E I N

A relação de Ludwig Wittgenstein (1889-1951) com a arquitectura,

apesar de apenas ter construído uma casa, 32323232 justifica-se

plenamente, neste trabalho, na medida em que aquela construção

está de tal maneira ligada à sua filosofia, que a podemos considerar

uma obra decisiva na arquitectura do início do século. Efectivamente,

existe uma relação estreita entre a sua arquitectura e a sua filosofia

para além da simples coincidência de apenas ter construído uma

casa e de, também, apenas ter editado uma obra, em vida, mas que

contribuiu para revolucionar a filosofia, tal como a casa de Viena

revolucionou a arquitectura.

Wittgenstein durante toda a vida trabalhou com máquinas, em 1906

entra para Techinsche Hochschule de Berlim e dois anos mais tarde

para Universidade de Manchester para se especializar em

aeronáutica, chegando mesmo a desenhar um motor a reacção.

32323232 Embora se refira sempre que Wittgenstein só construiu uma casa, ele construiu

também, uma pequena casa em madeira tradicional na Noruega, o seu pequeno

refúgio, para se dedicar ao estudo da lógica, onde viveu entre 1913 e 1914.

Page 83: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

60

Contudo, rapidamente, abandona esta vertente técnica, ainda que

mais tarde venha a retomá-la de modo particular aquando da

construção da casa para a irmã, e passa a dedicar-se à matemática,

ingressando na Universidade de Cambridge para estudar lógica com

o filósofo Bertrand Russell. É desta relação entre lógica e filosofia

que vai nascer, em 1921, o seu Tractatus Logico-Philosophicus 33333333

que, embora constasse apenas de algumas páginas, rapidamente

alcançou um grande prestígio e, ainda hoje, continua a fascinar os

filósofos.

Numa primeira leitura do Tractatus poderá pensar-se que

Wittgenstein pretende acabar com a ética, com a religião e com a

filosofia,34343434 tal como na casa parece pretender acabar com o modo

33333333 Escreveu esta obra em 1918 nas trincheiras da guerra em Itália e dedicou-a a um

matemático David Pinsent um estudante que se tornou seu grande amigo e que

morre antes de a obra estar concluída.

34343434 Wittgenstein exerce uma grande influência sobre o Círculo de Viena (a que nunca

pertenceu) e sobre o neopositivismo lógico. O seu projecto consistia em basear a

ciência numa linguagem inteiramente redutível a formulações de observações

directas, e denunciar na metafísica um conjunto de preposições não significantes por

serem experimentalmente inverificáveis....

Page 84: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

61

antigo de pensar a arquitectura, libertando-a de estilos e da história,

contudo, numa leitura mais atenta da obra, percebe-se que tenta

preservar a intriga em torno da vida e de tudo o que as palavras não

conseguem descrever.

Tal como na casa, procura e especula em torno da vida e do modo

original de habitar o espaço, procurando dentro da casa a

racionalidade perdida na arquitectura.

Enquanto que no tratado a linguagem e os seus limites são o tema

central, na casa existe também um conjunto de sinais que servem

como manifesto para expressar modos de pensar e de sentir, sendo

que no limite despir a casa do supérfluo é o voltar às origens no

modo do homem habitar o espaço.

No tratado, a linguagem de pensamento referida por Wittgenstein é

comum a todos os homens, independentemente da sua origem e

cultura, já que a realidade ou o mundo são entendidos como

universalmente partilhados pela humanidade e, portanto, apenas têm

um único significado.

O tratado assume uma concepção universal do homem, desprezando

não apenas a história mas, igualmente, as diferentes culturas, tal

como se verifica na casa, e embora sabendo que isto é bastante

ambicioso, podemos considerar que para o mundo ocidental talvez

Page 85: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

62

existisse a possibilidade de conceber uma casa de um modo

universal.

É curioso, no entanto, notar que a partir de 1929, Wittgenstein

abandona esta ideia de matriz universal comum a todos os homens,

e fá-la depender cada vez mais da cultura a que está ligada, um

conceito que podemos considerar como o tema de fundo presente na

segunda fase de Wittgenstein.35353535

O projecto da casa de Margarethe Stonborough, irmã de Wittgenstein

situada em Kundmanngasse 19, e que se atribui ao filósofo foi, na

verdade, entregue a um jovem arquitecto Erich Engelmann, 36363636 um

amigo da família, mas como Wittgenstein tinha participado em

conversa nos primeiros esboços, Engelmann vai posteriormente

35353535 A partir de 1930, inicia uma nova fase na filosofia que será consagrada na sua

obra intitulada Investigações Filosóficas, publicada postumamente em 1953, e que

vai exercer uma grande influência sobre a filosofia analítica em geral.

36363636 Discípulo de Adolf Loos, contudo, esta casa veio a revelar-se pelo seu aspecto

anti ornamento, ainda, muito mais radical do que as obras de Loos. Para Loos, o

importante não era o processo de fabricação, se era feito à mão ou à máquina, o

que interessava era a qualidade do produto e se de facto expressava os valores

culturais da época.

Figura 6

Casa de Wittgenstein, fotografia do interior, Viena, (1926-1928).

Page 86: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

63

convidá-lo a participar na construção, por lhe parecer que ele

entendia melhor as intenções da irmã. Assim e apesar da proposta já

estar definida quando entrou no processo de construção, a influência

Wittgenstein foi tão grande que ele foi considerado o arquitecto da

casa.

A casa Kundmanngasse foi construída entre as duas filosofias, ou

entre o que se considera ser as duas fases de Wittgenstein, entre o

Tratactus e o Philosophical Investigations, num período no qual

Wittgenstein se tinha afastado da investigação filosófica, Montaner

(2002, p.90) sustenta que:

A casa reflecte a mente clara e ordenadora de Wittgenstein,

preocupado pela conexão entre todos os elementos

inferiores, sem deixar nada isolado, ressaltando com

extrema claridade as estruturas construtivas, espaciais e

mecânicas. Como uma grande máquina, o volume da casa

propriamente dita se eleva por cima de uma imensa

plataforma que ocupa toda a extensão de lote e onde estão

situados a garagem, os depósitos e as instalações, sobre o

qual repousa o jardim elevado.

A construção enquadra-se na ideia de residência da alta burguesia,

espaço de encontro da burguesia com os artistas da cidade. No piso

Figura 7

A casa Wittgenstein em Viena, fotografia e alçados.

Page 87: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

64

inferior percebe-se perfeitamente essa situação. 37373737 A casa constitui-

se em corpos construtivos claros e autónomos, encaixados uns nos

outros de telhado plano, sem qualquer ornamentação, sem cornijas

sem balanços, apenas terminados com grandes terraços. A planta

apresenta a forma de um “T” e desenvolve-se em torno de um corpo

central, em torno deste organizam-se diferentes cubos que se lêem

de forma clara e inequívoca. As portas e as janelas eram construídas

em aço e foram especialmente desenhadas para a casa, e os

pormenores foram desenhados em tubo cilindrico curvado, uma

inovação para a época, muito utilizada posteriormente.

Se voltarmos ao Tratactus verificámos que é já perceptível a vontade

de redução ao mínimo essencial, a sua célebre frase: o que se pode

dizer, pode-se dizer claramente, reflecte o posicionamento do

filósofo. De facto, a casa também não tem nada de supérfluo e

apresenta aspectos que se podem, mesmo, relacionar quer com o

racionalismo quer com o futurismo, estaríamos aqui a considerar o

37373737 No piso inferior existe uma sala para concertos íntimos, um salão, uma sala de

jantar, dois terraços e um hall, e um quarto, provavelmente para a dona da casa. O

piso intermédio é o piso dos quartos e dos aposentos do pessoal de serviço, e o

terceiro piso destina-se aos filhos e ao o pessoal dedicado à educação dos mesmos.

Figura 8

Planta da casa de Wittgenstein.

Page 88: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

65

que podemos apelidar dum manifesto de vanguarda, na mesma linha

de raciocínio que Montaner (2002, p.90):

Além de ser uma autêntica casa máquina, também é um

mecanismo lógico, um circuito eléctrico baseado em duas

possibilidades, aberta e fechada, um discurso de lógica

filosófica articulado a partir de frases centrais e estruturas

construtivas essenciais. Uma obra manifesto que se

aproxima ao limite minimalista da forma arquitectónica, além

do qual só existe estrutura construção e engenharia.

Em síntese, podemos assumir que Wittgenstein projecta uma

arquitectura despojada, é como se pretendesse um regresso às

origens, uma libertação dos estilos e das decorações precedentes,

eliminando o supérfluo em perfeita analogia com uma máquina, na

qual não existem peças a mais, mas apenas as estritamente

necessárias ao seu correcto funcionamento.

O despojamento é de tal forma evidente que uma outra irmã de

Wittgenstein chegou mesmo a considerar que a lógica se tinha

transformado em pedra, e efectivamente, mais tarde, Wittgenstein

escreveria “la lógica como lenguaje ideal en el espacio sin aire,

recomendando la plática de la filosofía en la lenguaje corriente.”

(Aicher, 1992, p.203)

Page 89: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

66

Segundo Aicher (1992, p.204), o Tractatus refere a estrutura da

forma e da série formal em conexão com a formulação do propósito

principal, pelo que “la relación interna que ordena una serie, es

equivalente a la operación mediante la cual un miembro se origina a

partir de otro.”

Para este autor seria interessante entender esta relação como um

principio matemático, contudo nós, no âmbito da temática deste

trabalho, preferimos entendê-la como uma vertente de procura

relativamente ao organismo, em que cada parte funciona em

conexão com as outras, em que cada parte se origina a partir de

outra.

Não há a menor dúvida que a arquitectura de Wittgenstein

denunciava a sua filosofia e aponta para a ideia de máquina de

habitar, todavia, verificamos também que a simplicidade da qualidade

espacial da sua casa obedece a uma racionalidade e a uma ordem

clara que, no entanto, não desprezam a vida humana.

Page 90: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

67

3 . 3 . A M Á Q U I N A C O M O E L E M E N T O D E

V A N G U A R D A

3 . 3 . 1 . F U T U R I S M O I T A L I A N O

O futurismo, enquanto movimento, foi consolidado como tal no início

do século XX, em Milão, com o escritor Filippo Tommaso Marinetti,

considerado il nuovi poeti futuristi, a publicar as suas ideias na

primeira página do jornal parisiense Le Figaro, em Fevereiro de

1909, e a constituírem um manifesto que “(...) era un himno de

alabanza a la mecanización total de la vida” (Colquhoun, 2002, p.99),

e que continha ideias que influenciaram e perturbaram artistas em

todo o mundo.

Com efeito, o futurismo foi o primeiro movimento artístico que

colocou a máquina numa posição de excelência, defendendo a

abolição de tudo o que pudesse relacionar-se com influências

tradicionais e propondo uma cultura para o povo, totalmente nova,

baseada num conceito inovador – a máquina.

Na perspectiva deste movimento a máquina passa a ser o novo

símbolo, uma invenção maravilhosa produzida pelo homem que,

Page 91: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

68

conforme referido no ponto quatro do manifesto, apela a “uma beleza

nova: a beleza da velocidade”, 38383838 um conceito que vai fazer com que

as forças mecânicas sejam temas frequentes dos primeiros trabalhos

futuristas.

Marinetti, grande impulsionador do movimento, explica as suas ideias

baseado neste conceito inovador e proclama:

A máquina: síntese dos maiores esforços cerebrais da

humanidade. A máquina equivalente mecânico, orgânico do

globo terrestre. A máquina novo corpo quase vivo quase

humano que multiplica o nosso. A máquina produto e

consequência que por sua vez produz infinitas consequências

e modificações na sensibilidade, no espírito e na vida. Não há

salvação, portanto, fora da estética da máquina e do esplendor

geométrico que nós, os futuristas, pregamos e glorificamos há

dezasseis anos. A estética da máquina tem por elementos a

força, a velocidade, a luz, a ordem, a disciplina, o método, a

concisão essencial e a síntese, a feliz precisão das

38383838 Este manifesto foi publicado no jornal Le Figaro em 20 de Fevereiro de 1909,

pode ser consultado na Internet em http://pt.wikipedia.org/wiki/Manifesto_futurista.

Page 92: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

69

engrenagens, a concorrência das energias para uma única

trajectória. (Esthetica Futurista, 1916)

Este texto vai marcar definitivamente a posição do manifesto futurista

e em 1911, no volume Le futurisme, o escritor homenageia O

Homem multiplicado e O Reino da Maquina, realizando-se um pouco

por todo o lado, nesse ano e no seguinte, Exposições Futuristas em

que se percebia a exaltação da máquina.

Na verdade Marinetti trabalhava em colaboração com um pequeno

grupo de escritores e artistas, da área da pintura e da música, e

juntos publicaram um conjunto de manifestos que influenciaram de

forma inquestionável os grupos de vanguarda que se seguiram.

Entre estes inovadores encontramos nomes como Carlo Carrà, Luigi

Russolo, Gino Severini, Giacomo Balla, Umberto Boccioni que em

1910, publicam O manifesto da pintura futurista. 39393939

Deste importante grupo de futuristas destacam-se Boccioni e Balla,

artistas que basearam o seu trabalho no dinamismo plástico,

39393939 Este documento de Umberto Boccioni, Manifesto técnico da pintura futurista foi

mais tarde reimpresso.

Page 93: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

70

incorporando um léxico de formas facilmente associadas ao

movimento, à velocidade, à vida moderna e à violência.

Para Balla o conceito de dinamismo tem como base a repetição

rítmica do movimento relativamente ao espaço que, também, está

em movimento, sendo o movimento a velocidade, “a velocidade que

se relaciona com o objecto que se move e o espaço em que ele se

move”. (Argan, 1988, p.441)

Os temas fundamentais para Boccioni desenvolvem-se em

ambientes dinâmicos, em que o observador se envolve com a vida

moderna e cuja referência principal é a máquina. O corpo,

influenciado pelo impulso da velocidade, deforma-se até ao limite da

elasticidade e o artista estuda os efeitos físicos da velocidade na

forma do corpo humano, pretendendo erguer um monumento que

simboliza o Homem da civilização mecânica, um hino ao homem em

perfeita sintonia com a máquina. Este tema é explorado, também, por

Balla em Automóvel e Ruído 40404040,,,, mas de uma forma diferente, com a

máquina a ser concebida para cumprir o seu papel: ser veloz, com as

suas formas dinâmicas a serem absorvidas pela dinâmica do espaço.

40404040 Aquarela, tinta sobre tela 0.71x1,00m, Amesterdão, Stedelijk Museum.

Page 94: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

71

Podemos, pois, concluir que os futuristas rejeitaram a arte do

passado e entraram na era moderna, aderindo de forma entusiasta à

máquina, numa nova vertente estética que para além da sua

influência na pintura, na escultura e noutros géneros artísticos,

também se reflectiu na arquitectura, ainda que de forma menos

intensa.

Segundo Allan Colquhoun, (2002,p.110), escreveram-se dois

manifestos de arquitectura futurista no início de 1914: o primeiro

pertencia à vertente romana e foi efectuado pelo jovem Eurico

Prampolini, o segundo por Boccioni, apenas publicado em 1960,

aparentemente porque naquele mesmo ano, em Junho, foi publicado

outro manifesto do mesmo tipo por Antonio Sant’Elia.

Antonio Sant’Elia é considerado o arquitecto futurista por excelência

e quando se tenta investigar este movimento, dificilmente

encontramos outro nome com igual destaque. Sant’Elia estudou em

Milão e Bolonha e abriu um atelier em Milão, cidade fortemente

marcada pelo factor industrial e que acolheu o movimento futurista,

tendo o arquitecto feito parte da academia de Brera onde conheceu o

também arquitecto Mario Chiattone, os pintores Carlo Carrà e Achille

Figura 9

Esquiço para aeroporto e estação ferroviária, 1913-14.

Page 95: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

72

Funi e onde vai adquirir, com Guiseppe Mentessi, uma técnica de

desenho que utilizará na sua obra. 41414141 Sant’Elia juntou-se ao

Movimento Futurista aquando da exposição Nuove Tendenze, em

que apresentou um conjunto de desenhos em perspectiva que

representavam a sua arquitectura de futuro, contudo, a relação entre

estes desenhos e o movimento futurista continua a ser objecto de

polémica para historiadores e investigadores.

No Manifesto da arquitectura futurista Sant’Elia expressou

sinteticamente as ideias expressas no catálogo da exposição,

conhecida como Messagio, 42424242 no entanto, é interessante notar que se

o texto se identifica de forma plena com as ideias do movimento, os

desenhos nem sempre apresentam a mesma coerência, situação

41414141 O chamado desenho do barroco tardio que se reflectia num sistema de

perspectivas oblíquas (scena per angolo). Os desenhos de Sant’ Elia têm igualmente

semelhanças com o trabalho desenvolvido por estudantes da Akademie der

Bildende Künstre na Áustria (a Wagners-chule, ou escola de Otto Wagner),

nomeadamente, no desenho da torre de Emil Hoppe (1902).

42424242 Sobre esta exposição em Da Costa Meyer, Esther. 1995. The Work of Antonio

Sant’Elia: Retreat into Future. New Haven : Yale University Press. p. 211.(O capítulo

V apresenta a história detalha do manifesto).

Figura 10

Projecto para aeroporto e estação ferroviária (1914).

Page 96: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

73

que segundo alguns autores se deve ao convívio com Boccioni e

Marinetti, chegando mesmo a especular-se a intervenção destes

futuristas na execução do manifesto.

Efectivamente, o carácter estático dos volumes e a monumentalidade

(provocada pela posição exterior do observador) expressos nos

registos deixados por Sant’Elia, contrariam a caducidade, o efémero,

a necessidade constante de renovação, condições fundamentais

para o sucesso da arquitectura futurista.

In the early manifestos, as in the paintings, the cityis a

backdrop on to which the dynamism of Futurism life is

projected, and isolated building are singled out to symbolize

the modern age. (Tisdall, 1977, p.121)

A arquitectura futurista propunha um novo conceito que procurava

dar resposta às novas exigências da vida moderna e criar uma nova

sensibilidade, uma nova estética, em ruptura decisiva com a

continuidade história. Nesta alteração, que se impunha, era

necessário utilizar os novos recursos da ciência e da técnica em

conjunto com os novos materiais e os novos conhecimentos, que

permitiam construções mais ligeiras, mais plásticas, mais dinâmicas.

Sant’Elia desenvolvia, assim, uma visão antecipada da arquitectura

do futuro que não era compatível com as grandes catedrais, com os

Page 97: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

74

grandes monumentos ou com qualquer outro edifício clássico ou

tradicional mas que se ajustava aos novos monumentos do futuro: as

centrais hidroeléctricas, as estações ferroviárias, as zonas portuárias.

Estes novos edifícios eram estruturas não ornamentadas onde o

cimento, o vidro e o ferro determinavam o seu valor estético; o

edifício e a cidade funcionariam como uma enorme máquina em que

cada peça cumpria a sua função – habitar. Sant’Elia foi,

eventualmente, o primeiro arquitecto a considerar a casa como uma

máquina de habitar, para ele a cidade devia ser concebida como “un

immense chantier bruyant, agile, mobile, dynamique dans toutes ses

parties, et la maison moderne comparable à une machine

gigantesque”. (Janulardo, 2003)

Provavelmente porque morreu cedo, a obra construída de Sant’Elia

resume-se apenas a três construções pequenas, a um conjunto de

desenhos relativos a projectos vários, a estudos de fachada e a

perspectivas de forte componente utópica, no entanto, são

suficientemente ricos para que Colquhoun (2002,p. 98) tenha

classificado os desenhos deste arquitecto em três classes.

Na primeira classe, as primeiras perspectivas foram executadas até

1913, e não tinham qualquer tipo de ornamentação, pareciam

esboços inacabados e apresentavam títulos genéricos como Edifício

Page 98: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

75

moderno, Monumento ou Construção industrial. Estes registos

tinham sido influenciados por fotografias de silos de grão norte

americanos, incluídos por Gropius em Jahrbuch des Deutschen

Werkbundes.

Na segunda classe, foram agrupados os desenhos de formas,

também elas abstractas e que se adaptavam a edifícios do tipo

industrial, nomeadamente a central hidroeléctrica, um edifício que

reflectia a rápida industrialização a que se assistia no princípio do

século XX.

Por fim, numa terceira classe, existe outro conjunto de desenhos com

o nome La Città Nuova. Estes são muito detalhados e elaborados, e

as perspectivas já não são confundidas com esboços e revelam-se

como desenhos efectivamente terminados. Reconhecemos nestes

desenhos uma cidade do futuro, os pisos inferiores são atravessados

por uma rede de túneis, viadutos e pontes que fazem as ligações a

vários níveis. Os desenhos apresentam, tal como o nome indica, uma

cidade da qual desapareceram todos os vestígios da natureza e onde

predominam os sistemas de comunicação horizontais e verticais,

com atravessamentos elevados que dinamizam o espaço exterior,

numa linguagem de futuro complementada com torres verticais e

elevadores, e com a zona habitacional a aparecer encaixada nesta

Figura 11

Projecto da cidade do futuro.

Page 99: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

76

estrutura, lembrando uma imagem duma central hidroeléctrica.

Neste modelo de cidade, Sant’Elia utilizou referências de outros

modelos, nomeadamente as ilustrações populares do futuro de Nova

York, a Maison à Gradins (1912) de Henri Sauvage em Paris, e o

projecto Ferdinandsbrücke (1905) de Otto Wagner, conquanto que

estes últimos registos apresentem uma visão mais tradicional, com

uma vivência urbana menos futurista do que a de Sant’Elia, onde não

faltam as árvores e as pessoas, o que não deixa de ser curioso, pois,

apesar de se tratar de um registo de infra-estruturas de transportes

para Viena, não se considerou qualquer meio de transporte.

Para Antonio Sant’Elia o problema da arquitectura futurista impunha

um novo modelo de arquitectura que ele vai sintetizar num

documento, que redigiu e publicou em Julho de 1914, e no qual

defende a necessidade de combater e de desprezar:

1. Toda la pseuda-arquitectura de vanguardia, austríaca,

húngara, alemana y norte americana;

2. Toda la arquitectura clásica, solemne, hierática,

escenográfica, decorativa, monumental, agraciada y

agradable;

3. El embalsamamiento, la reconstrucción, la reproducción de

los monumentos y los palacios antiguos;

Figura 12

Projectos da cidade do futuro.

Page 100: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

77

4. Las líneas perpendiculares y horizontales, las formas

cúbicas y piramidales, que son estáticas, pesadas,

oprimentes y absolutamente ajenas a nuestra novísima

sensibilidad;

5. El uso de materiales macizos, voluminosos, duraderos,

anticuados y costosos. 43434343 (apud, 1999, Agustín Mancebo)

É interessante notar neste articulado de princípios uma vontade

expressa de romper com todo um conjunto de convenções e

cânones, oriundos de postulados anteriores comummente aceites,

sendo evidente uma intenção de ruptura que, efectivamente,

podemos enquadrar no conjunto de premissas aos quais se

associam todos os conceitos de vanguarda. Mas Sant’Elia não

pretende apenas romper com os códigos do passado, já que é,

igualmente, manifesta a sua intenção de promover uma busca

deliberada pela originalidade, uma procura de uma outra estética e,

substancialmente, o cultivo de uma nova forma que, sustentada pela

43434343 Esta e outras partes do Manifesto podem ser consultadas na Internet em

http://www.uclm.es/cdce/sin/sin6/1elia.htm.

Page 101: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

78

imagem da máquina, promovesse a mecanização da vida e a ideia

da velocidade.

Assim, defende também a necessidade de proclamar:

1. che l’architettura futurista è l’architettura del calcolo,

dell’audacia temeraria e della semplicità; l’architettura del

cemento armado, del ferro, del vetro, del cartone, dell fibra

tessile e di tutti quei surrogati del legno, della pietra e del

matonne che permettono do ottenere il massimo della elasticità

e della leggerezza;

2. che l’architettura futurista non è per questo un’arida

combinazione di praticità e di utilità, ma rimane arte, cioè

sintesi, espressione;

3. che le linee oblique e quelle ellitiche sono dinamiche, per la

loro stessa natura, hanno uma potenxa emotiva superiore a

quelle perpendicolare e delle orizzontali, e che non vi può

essere un’architettura dinamicamente integratice all’infuori di

esse;

4. che, la decorazione come qualche cosa di sovrapposto

all’architettura, è un assurdo, e che soltanto dall’uso e dalla

disposizione original del materiale greggio o nudo o

Page 102: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

79

violentemente colorato, dipende il valore decorativo

dell’architettura futurista;

5. che, come gli antichi trassero ispirazione dell’arte dagli

elementi della natura, noi – materialmente e spiritualmente

artificiali – dobbiamo trovare quell’inspirazione negli elementi

del nuovisimo mondo meccanico che abbiamo creato, di cui

l’archittetura deve essere la più bella espressione, la sintesi più

completa, l’integrazzione artistica più efficace;

6. l’architettura come arte della forma degli edifici secondo

criteri prestabiliti è finita;

7. per architettura si deve intendere lo sforzo di armonizzare

com libertà e com grande audacia, l’ambiente com l’uomo, cioè

rendere il mondo delle cose uma proiezione diretta del mondo

dello spirito;

8. da un’architettura così concepita non può nascere nessuna

abitudine plastica e lineare, perché i caratteri fondamentali

dell’architettura futurista saranno la caducità e la transitorietà.

Le case durarenno neno di noi Ogni generazione dovrà

fabbricarsi de sua città. Questo costante rinnivamento

dell’ambiente architettonico contribuirà alla vittoria del

Futurismo, che già si afferma com le Parole in libertà, il

Page 103: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

80

Dinamismo plastico, la Musica sensa quadratura e l’Arte dei

rumori, e pel quale lottiamo senza tregua contro la viliaccheria

passatista. 44444444

Mais uma vez encontramos nesta estratégia de Sant’Elia a intenção

de abolir as técnicas construtivas antigas, bem como toda a

sabedoria artesã ancestralmente acumulada pelos mestres e

arquitectos ocidentais, propondo-se em definitivo a troca do dogma

pela construção de algo novo e inédito. Decididamente, Sant’Elia

estava claramente numa estratégia de antecipação relativamente ao

fenómeno da máquina, no entanto, o seu desejo de comunicar as

suas ideias confrontava-se com o facto de romper totalmente com os

cânones tradicionais, o que à partida dificultava a compreensão e a

comunicação com a sociedade da época, situação que caracteriza

todos os movimentos de vanguarda.

Como já afirmámos, anteriormente, na obra de Antonio Sant’Elia

percebe-se uma visão de casa e de cidade enquanto máquina de

44444444 SANT’ELIA, Antonio. Manfiesto dell’architettura futurista. In La arquitectura

futurista [em linha]. [S.l.] : [s.n.], [s.d.] [referência de 25 de Novembro de 2006].

Disponível na Internet em: <http://www.sant-elia.net/forme.htm>.

Page 104: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

81

habitar, fortemente marcada por uma interpretação poética pois, à

semelhança de outros futuristas, ele partilha do conceito de beleza

dinâmica. O futurismo desenvolve-se, assim, em torno de um espaço

dinâmico, tentando captar a velocidade das figuras e dos objectos

em movimento no espaço, podendo-se afirmar que o artista futurista,

como já tivemos oportunidade de ver em Boccini e Balla, não está

interessado em captar o objecto propriamente dito, o seu interesse

foca-se na plasticidade da velocidade descrita no espaço.

Este conceito, porém, não foi suficientemente trabalhado na obra de

Sant’Elia, o que pode ser explicado por falta de oportunidade já que,

em 1916, ingressou no exército italiano e morreu durante a I Guerra

Mundial, sem possibilidade de dar continuidade ao seu trabalho que,

mesmo assim, é marcado por uma forte componente utópica e é

verdadeiramente direccionado para o futuro.

O futurismo inclui-se, portanto, nos modelos gerais da noção de

vanguarda defendida por muitos historiadores, críticos e teóricos de

arte, visto que, por um lado, existem uma série de fenómenos de

ruptura com a tradição e com o passado e, também, uma busca

deliberada da originalidade e, por outro lado, é manifesto o carácter

de progresso inovador e de oposição relativamente à sensibilidade

da época. No entanto a partir desta época e apesar de muitos

Page 105: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

82

arquitectos procurarem uma racionalidade sustentada na era da

máquina, verificou-se que em Itália, curiosamente, neste país as

obras de arquitectura, de uma forma geral, apontavam para uma

linguagem baseada em valores estéticos do classicismo italiano,

pese embora as primeiras obras de Terragni poderem apontar para

algumas referências a temas industriais.

O tema da máquina contaminava, assim, a sociedade da época e

nos Estados Unidos aparecia, igualmente, associado à ideia de

movimento e de velocidade, surgindo, a seguir à Grande Depressão,

um novo conceito, o Styling, 45454545 baseado na aerodinâmica, tema

45454545 Este novo conceito equivalia aos princípios do funcionalismo europeu e teve

como protagonista o francês Raymond Loewy que emigrou para os Estados Unidos

e aí desenvolveu diversos trabalhos ao nível do design industrial, ficando conhecido

pelo nariz de tubarão na locomotiva de Baldwin’s. Na verdade podemos dizer que o

Styling que era, frequentemente, classificado de forma pejorativa contaminava a vida

do homem nas sociedades urbanas.Neste processo o novo papel do design

industrial foi fundamental: “(...) durante os anos quarenta e cinquenta um americano

médio podia passar todo o dia rodeado por produtos modernizados por Loewy, o

aparelho de barbear Schik, o tubo da pasta de dentes Pepsodent, o carro

Sudebaker, o pacote de cigarros Lucky Strike, as máquinas da Coca-Cola, e ao final

do dia, a lata de Cerveja Carling Black Laber” Tradução livre: (Bayley, 1992, p.261)

Page 106: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

83

recorrente de uma sociedade fortemente influenciada pela tecnologia

e pela investigação cientifica.

Veremos mais adiante que estas características se repetirão em

outras vanguardas, como no caso do Movimento Archigram, nos

anos 60 e 70, em que certos desenhos parecem recuperar o

imaginário de Sant’Elia.

Page 107: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

84

3 . 3 . 2 . O C O N S T R U T I V I S M O R U S S O

Nos primeiros trinta anos do século XX, surgiram por toda a Europa

várias correntes de vanguarda que questionavam a função social do

artista e a sua relação com os meios de produção industrial. Mesmo

na Rússia, que no princípio do século continuava a viver sob um

regime feudal, o artesanato dava lugar ao trabalho mecanizado e, por

conseguinte, a lógica da máquina ia-se convertendo num modelo

para arte e, nomeadamente, para a arquitectura. Paradoxalmente e

ao contrário do que se passava no Ocidente, em que existia uma

clara oposição entre os que defendiam a máquina e os que

manifestavam alguma preocupação relativamente a ela, na Rússia,

os movimentos a favor da arte industrial eram coincidentes com os

das belas artes.

Na verdade, neste país, os artistas tinham participado activamente

na revolução de 1917 e, consequentemente, começou a desenhar-se

Page 108: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

85

uma certa articulação entre a arquitectura e o poder político, 46464646

culminando em 1921, com a viragem para uma nova política

económica que, por sua vez, criava a oportunidade dos artistas e dos

intelectuais repensarem um novo modo de vida para o novo homem.

Estavam assim lançadas as premissas para construir um novo

mundo em várias vertentes: política, social, económica e, sobretudo,

artística.

Emocionados por los espectáculos mecânicos de la vida

moderna mecanizada, los construtivistas sustituyen los

elementos naturales de la antiga pintura por los de las

máquinas, por naturalezas muertas donde las peras, las

manzanas y los vasos de vino por bielas o engraganajes.47474747

(Ozenfant y Jeanneret, 1994, p.208)

46464646 O país encontrava-se numa situação de pobreza extrema, agravada pela Primeira

Guerra Mundial e pela Guerra Civil, e os revolucionários defendiam que uma vida

nova só poderia ser possível em novas cidades.

47474747 Texto de Ozenfant Sur les écoles cubistes et post-cubistes, in Journal de

Psychologie Normale e Pathologique, 1926.

Figura 13

Projecto dos irmãos Vesnin para o Palácio do Trabalho (1923).

Page 109: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

86

A ideia de futuro passava, assim, por um imaginário sustentado

numa reflexão teórica em que o desenvolvimento industrial era

acompanhado pelo desenvolvimento das velhas cidades. Toda a

geração de artistas, designada como de esquerda, rejeitava os

modelos do passado e experimentava novas formas para transformar

a vida e a cidade e, concretamente no campo teórico, artistas como

Moïse Guinzburg ensaiavam formas arquitectónicas que se

revelassem compatíveis com os valores da nova sociedade.

Entretanto, a partir de 1915, o Suprematismo e o Construtivismo são

duas correntes que se inserem num grande movimento de vanguarda

ideológica e revolucionária. Estas duas correntes, no entanto,

passaram por um conjunto de etapas e se, no início, o

Suprematismo, associado à figura de Kasimir Maverich e marcado

por cores puras, formas básicas e abstracção geométrica, reduzia a

realidade a duas dimensões, mais tarde passou para as três

dimensões, conceptualizando os Proun, designação que derivava da

abreviatura em russo de projectos para a afirmação do novo,

projectos de arquitectura de cariz utópico. Em contraponto, o

construtivismo experimentava formas leves, construídas em malhas

de ferro, alumínio e zinco, de aparência etérea que pareciam

competir com as leis da gravidade.

Page 110: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

87

Efectivamente, no início, o construtivismo tinha uma componente

escultórica derivada da collage e quando evoluiu para a construção

de objectos tridimensionais, utilizando materiais como ferro, a

madeira o vidro e o aço, desenvolveu-os no sentido de acentuar a

noção de estrutura e de movimento no espaço, conseguindo-o

através de tensões e de forças em equilíbrio, em substituição das

clássicas massas sólidas e estáticas.

O monumento à Terceira Internacional Comunista, de Tatlin 48484848 (1919-

1920), a localizar junto ao rio Neva, San Petersburgo, é considerado

o paradigma do construtivismo soviético. O projecto consistia numa

torre inclinada que, com cerca de quatrocentos metros de altura,

devia expressar formas inéditas de um novo tempo, sendo que o

conjunto era composto por três volumes, que rodariam sobre o seu

próprio eixo, e que simbolizariam o poder e os serviços de

informação, toda uma estrutura que representava “una fusión de

48484848 A reconstrução da maqueta (3m de altura e 1,60 de diâmetro) encontra-se no

Museu de Arte Moderna de Estocolmo.

Figura 14

Monumento à Terceira Internacional.

Page 111: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

88

forma cubo futurista e estrutura casi racional” 49494949 (Colquhoun, 2005,

p.123).

Não obstante, é interessante constatar que Tatlin utilizou para esta

estrutura a “forma de espiral de crescimento da concha de caracol,

neste caso conformada por traços rectilíneos” (Montaner, 2002, p.

24), provando que as formas do mundo orgânico podem conviver

harmoniosamente com o imaginário do mundo da máquina.

Importa reter que o principal objectivo do construtivismo era que os

objectos artísticos fossem construídos a partir de materiais pré-

existentes, utilizando-se todas as técnicas possíveis de maneira a

desenvolver uma linguagem formal baseada em elementos

geométricos e clareza técnica.

Assim, as ideias do construtivismo na área do urbanismo incidiam na

construção de edifícios com características muito específicas, a que

49494949 O termo cubo futurismo foi utilizado pela primeira vez em 1913, por Korney

Chukovsky (1882-1969), referindo-se a um grupo de poetas vanguardistas do qual

faziam parte Vladimir Mayakovsky e o pintor David Burlyuk, pelo que o termo foi

adoptado pelos pintores progressistas e está associado à pintura russa do período

compreendido entre 1912 e 1915.

Page 112: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

89

chamavam de condensadores sociais 50505050, e que procuravam criar um

novo conceito para a sociedade, enfim livre, numa atitude estética

influenciada pelo sentido de funcionalismo 51515151 e de utilitarismo, que

viria a marcar uma boa parte da produção artística soviética, daquela

época.

Apesar disso, o construtivismo apresentava um grande contraste

relativamente ao racionalismo, pois para aquela vanguarda a

essência da arte não assentava sobre o princípio da forma mas sim,

sobre o princípio da construção.

Na verdade, o Primeiro Grupo de Acção Construtivista fazia uma

leitura mais ampla do conceito de vanguarda da obra, que passava

pela ideia de construção e daí o terem preferido chamar-lhe arte da

produção, já que o artista-construtor era o artista “que combinaría en

una sola persona las habilidades del artista y del engeneiro”

50505050 Também conhecidos como palácios para os operários tratavam-se de espaços de

lazer, clubes para trabalhadores e dispunham de alojamentos comuns.

51515151 O funcionalismo foi uma corrente arquitectónica que se desenvolveu na Europa e

no Mundo Ocidental na segunda metade do século XX, e cujas ideias fundamentais

foram sintetizadas por Louis Sullivan na sua célebre frase form follows function.

Figura 15

Projecto para a tribuna de Lenine, El Lissitzky (1920).

Page 113: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

90

(Colquhoun, 2005, p.123), assim, a principal preocupação centrava-

se no papel do artista no seio da economia industrial, preocupação

essa também partilhada pelos artistas do Ocidente.

No entanto, temos de assinalar que, tirando algumas excepções,

sobretudo na pintura, fotografia e artes gráficas, os projectos de

renovação urbana nunca chegaram a ser realizados.

Quando se refere o ideal construtivista parece-nos obrigatório

nomear El Lissitzky, 52525252 figura importante da vanguarda russa,

colaborador de Malvich, de quem era amigo e discípulo no

desenvolvimento do Suprematismo, que prosseguiu toda a sua

carreira orientado pelo princípio de que o artista pode ser um agente

de mudança, aliás, princípio esse que resumiu numa expressão

criação orientada para um objectivo, e que vai ter enorme influência

no panorama artístico, quer nacional quer internacionalmente.

52525252 Nos seus trabalhos propunha uma atitude construtivista que procurava uma

aproximação das abordagens metafísica do suprematismo e materialista do

construtivismo russo, interessou-se particularmente pelo futurismo italiano e pelo

cubismo francês.

Page 114: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

91

Em 1920, em Moscovo, foi fundada a Vjutemas - Escola Superior de

Oficinas Técnicas e Artísticas – com o intuito de formar artistas para

a indústria e para a transformação cultural do país. Esta escola, que

incluía no seu corpo docente o teórico construtivista Borís Arvatov,

Rodchenko e El Lissitzky, tornou-se logo num lugar de divulgação

das ideias do Construtivismo e, realmente, muitos objectos foram

construídos, embora poucos tenham entrado em linha de produção,

pois não existia uma experiência fabril sustentável. Pontualmente,

esse trabalho concretizou-se em projecto de edifícios, como é o caso

do restaurante suspenso de Simbirchev, com uma estrutura arrojada

para as capacidades da engenharia da época. Por certo, os

Vjutemas com a sua experiência de inovação assumiram, na Rússia,

uma importância idêntica à da Bauhaus, na Alemanha, tendo mesmo

existido ligações entre as duas escolas, nomeadamente, através de

Kandinsky e de El Lissitzky.

Mais tarde, em 1925 e também em Moscovo, foi fundada a OSA, um

grupo onde, para além dos arquitectos que tinham trabalhado na

Bauhaus, existiam, igualmente, teóricos e desenhadores de objectos

industriais, fotógrafos e professores, todos membros que se

classificavam de construtivistas.

Com efeito, o principal objectivo deste movimento, liderado

Figura 16

Capa de Veshch/Gegenstand, Object, Lissitzky (1922)

Figura 17

Projecto de Simbirchev para um restaurante suspenso, (1922-23).

Page 115: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

92

intelectualmente por Moiséi Guínzburg e Alezandr Vesnín e que já se

manifestara um pouco antes da Revolução Russa, passava por

conciliar o homem com a máquina e o trabalho industrial com a

criatividade pessoal.

Para estes arquitectos, a casa e o urbanismo eram os principais

instrumentos dos ideais socialistas, e Guínzburg concebeu para

Narkomfín (1928-1929), um conjunto de apartamentos, baseados em

princípios vanguardistas onde ensaiou a área mínima, adoptando

uma imagem com grandes afinidades com a arquitectura moderna e

com a ideia de máquina de habitar defendida por Le Corbusier, pese

embora estas casas não terem sido bem aceites pelo governo de

Estaline e pelas famílias que não estavam, ainda, preparadas para

habitar um espaço tão racional quanto aquele.

Guínsburg teve, ainda assim, oportunidade de ensaiar um outro

modelo, igualmente inspirado em Le Corbusier, e projectou para

Magnitogorsk, 53535353 em 1928, uma das novas cidades projectadas na

primeira parte do Plano Quinquenal, um conjunto de casas em

53535353 Estes projectos baseavam-se nas teorias do sociólogo Mijaíl Ojitóvich que

defendia uma relação equilibrada entre a vida rural e a vida urbana.

Page 116: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

93

madeira, assentes sobre pilotis, também com fortes influências nos

princípios de Le Corbusier.

Podemos ainda referir outros projectos marcantes de arquitectura

construtivista que espelham os mesmos princípios de vanguarda,

como é o caso do projecto para o concurso da sede do jornal Pravda

(1924) em Moscovo, dos irmãos Vesnin, que segundo Colquhoun

(2002, p.128):

Este proyecto es una máquina informativa transparente en la

que la estructura y el equipamiento del edificio, junto con sus

accesorios mediáticos, se convierten en vehículos para la

retórica y la propaganda. El edificio se ha convertido en el

signo de su propia función.

Ou ainda o pavilhão da URSS na Exposição Internacional das Artes

Decorativas de Paris (1925) de Konstantin Melnikov, um projecto que

Montaner (2002 p.74) considera:

(...) uma arquitectura composta por formas dinâmicas e

matemáticas, que parte de metáforas maquinistas, mostra a

montagem das peças, expressa o movimento das partes

estruturais e busca, em ultima instância, criar uma forma de

arte que possa ser produzida em série.

Figura 18

Projecto para o edifício Pravda.

Page 117: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

94

No âmbito do nosso trabalho é pertinente referir a importância do

construtivismo na sua busca por novos modos de pensar a forma e

de metaforizar a máquina. Este movimento, lançado em Moscovo por

Vladimir Tatlin e Alexander Rodchenco, El Lissitzky e Naum Gabo,

disseminou as suas ideias pelo ocidente no início os anos 20,

influenciando o urbanismo, a arquitectura, o design e as artes visuais

e se, na sua fase inicial, se regista a influência dos Futuristas e do

Suprematismo, por sua vez, fora da Rússia, são os construtivistas

que vão exercer enorme influência na Bauhaus, através de Moholy-

Nagy e El Lissitzky, no De Stijl, 54545454 através de El Lissitzky e, de uma

forma geral, na arquitectura do Movimento Moderno. Com este

movimento que continuou a influenciar épocas futuras encerramos a

primeira parte deste trabalho, percebendo que as quatro vertentes

apontadas neste capítulo, influenciaram toda a arquitectura do séc.

XX.

54545454 A origem deste movimento holandês está relacionada com Theo van Doesburg e

apesar das suas obras iniciais serem marcadas pelo impressionismo, fauvismo e

expressionismo, a sua ligação a Mondrian converteu o seu trabalho à abstracção, à

introdução de elementos geométricos e às cores primárias.

Page 118: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

95

P A R T E I I

P A R A D I G M A D A M Á Q U I N A

Page 119: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

96

4 . E M D I R E C Ç Ã O A U M N O V O P A R A D I G M A

4 . 1 . S I T U A Ç Ã O D A M Á Q U I N A N A A L E M A N H A

A máquina emergia, igualmente, na sociedade alemã e neste

processo uma figura de relevo foi Hermann Muthesius, pois esteve,

entre 1896 e 1903, na embaixada da Alemanha em Londres, e

promoveu a união artística entre os dois países. Quando regressou à

Alemanha estava convencido da importância do bom senso e da

simplicidade na arquitectura e na arte, contudo, enquanto em

Inglaterra se defendia a qualidade da produção artesanal, Muthesius

entendia que esses conceitos estéticos deviam ser aplicados à

produção industrial, confiando na utilização da máquina, e,

rapidamente, assumiu a liderança de uma nova tendência, a

Sachlichkeit, que coincidiu com a ascensão da Arte Nova na

Alemanha.

Na Alemanha, Muthesius além de propôr um novo conceito para a

arquitectura e para as artes inglesas, a Sachlichkeit, que significa ao

mesmo tempo pertinente, apropriado e objectivo, também solicita ao

artista moderno uma pura e perfeita utilidade. Para ele, apenas os

objectos feitos à máquina são produzidos de acordo com o espírito

da época, “são eles os únicos que podem resolver o problema da

Page 120: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

97

criação de um novo estilo um Maschinenstil”. 55555555 (Muthesius, 1901,

apud, Pevsner, 1937, p.37) Na sua opinião, os exemplos já faziam

parte do quotidiano da época, pois por todo o lado proliferavam

estações de caminho de ferro, pavilhões de exposição, pontes e

navios a vapor, e se já faziam parte do imaginário colectivo, então as

formas deviam ser determinadas, apenas, pelos fins a que se

destinavam:

O progresso futuro só pode, portanto, ser imaginado em função

de uma rigorosa Sachlichkeit e de uma rejeição total de toda a

decoração que seja meramente justaposta. Os edifícios e os

objectos de uso comum que forem feitos de acordo com estes

princípios serão dotados de uma elegância perfeita, que tem

origem na adequação e (...) na concisão. 56 (Muthesius, 1902,

apud, Pevsner, 1937, p.38)

55555555 MUTHESIUS, Hermann. 1901. Kunst und Maschine. [S.l.] : Dekorative Kunst, ix.

p.141 e seg.

56565656 MUTHESIUS, Hermann. 1902. Stilarchitectur und Baukunst. Mülheim-Ruhr : [s.n.]

p. 50, 51 e 53.

Page 121: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

98

Neste período, era por demais evidente o fascínio pela máquina,

tema que ocupava artistas de várias vertentes, como é o caso de

Hermann Obrist, que escreveu em 1903, sobre os navios a vapor: “a

beleza dos seus poderosos e colossais, mas tranquilos, contornos

(...) a sua maravilhosa utilidade, a sua elegância, suavidade e

esplendor”:57575757 (Obrist, 1903, apud Pevsner, 1936, p.39) Outros

autores acompanham a ideia de Muthesius, por exemplo, Wilhelm

Schäfer, escritor e poeta, propunha a Sachliche Ausbildung para

todas as formas e, por isso, promovia uma expansão deste estilo

moderno em diferentes níveis da sociedade. Podemos, ainda, referir

a posição de Friedrich Naumann que enquanto político se preocupa,

sobretudo, com os aspectos sociais da arquitectura e da arte, o que o

levou desde muito cedo a apaixonar-se pela máquina e que,

provavelmente inspirado em Muthesius, refere também os barcos,

pontes, gasómetros, estações de caminho de ferro, e mercados

cobertos como os nossos novos edifícios, considerando, assim:

(…) a construção em ferro a maior experiência artística do

nosso tempo porque aqui não há aplicação da arte à

57575757 OBRIST, Hermann. 1903. Neue Möglicheiten in der bildenden. Kunstwart, xvi, II

parte. p.21.

Page 122: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

99

construção, nem há decoração medida à força, nem afectação.

Aqui há criação destinada ao uso prático (...) há possibilidades

até agora inexprimíveis. Estão alteradas todas as noções de

espaço, de peso e de sustentação. 58585858 (Naumann, 1904, apud,

Pevsner, 1936, p.40)

Ao longo do trabalho, iremos constatar que estas questões de

espaço peso e sustentação, que consideramos pertinentes, se

podem articular noutro contexto.

Mas este fascínio não era de modo algum generalizado e outras

figuras, igualmente importantes da intelectualidade alemã, como

Oswald Spengler, Martin Heidegger e Ernst Jünger, repudiavam

radicalmente a máquina.

Efectivamente, existia um movimento ludetista 59595959 que estava contra a

inovação tecnológica, numa atitude de resistência à mudança

58585858 NAUMANN, Friedrich. 1904. Die Kunst im Zeitalter der machine. XVII, II Parte.

[S.l.] : Kunstwart. p.323.

59595959 Este termo refere-se originalmente a uma série de motins levados a cabo por

alguns membros deste grupo já antes da revolução industrial, no Reino Unido este

fenómeno data de 1830.

Page 123: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

100

derivada de diversas razões, a principal das quais tem a ver com a

ameaça de desumanização que esta inovação implicava.

Importa esclarecer que a reforma artística na Alemanha estava

desde o início assente na identidade nacional e os que participaram,

nesta reforma, sentiram essa dicotomia que separava a vontade de

retorno às origens pré-industriais da vontade de modernização para

acompanhar o progresso comercial. A reforma cultural teve origem

no movimento alemão Arts and Crafts (Kunstcgwerbe) e, na

sequência desta situação, Muthesius, numa conferência em 1907,

desaconselhou os artífices e industriais alemães de continuarem a

imitar os modelos antigos. Este discurso provocou graves discussões

nas sociedades comerciais e, no fim desse ano, um grupo de

fabricantes, em colaboração com alguns arquitectos, artistas e

escritores, fundaram a Deutsche Werkbund. 60606060 Esta associação

pretendia demonstrar que era possível um elevado nível de

60606060 Esta associação de trabalho alemã, fundada em 1907, por um grupo de

arquitectos, designers e empresários que tinham estado de algum modo ligados a

Jugendstil (arte nova alemã), contribuiu com a sua industrialização para o

reconhecimento da arte e da técnica alemãs, retirando à Inglaterra a liderança

industrial mundial.

Page 124: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

101

qualidade na produção industrial, reconhecendo no design, a

inteligência, e na máquina, uma ferramenta fundamental de trabalho.

A Werkbund dividia-se entre os partidários de Muthesius e os de

Henry Van de Velde, um arquitecto belga que ensinava em Weimer e

que tinha bastante influência sobre os seus colegas alemães, mais

preocupados com as características conceptuais da produção

artesanal da Arte Nova. Van de Velde rejeitava os Arts and Crafts, 61616161

criticava a arte de Morris e fazia a apologia da beleza da máquina: “A

acção dos seus braços de ferro”, proclamou ele, “criará beleza desde

que seja a beleza que os guie”. 62626262 (1902, apud Pevsner, 1936, p.33)

Aliás, com o mesmo ponto de vista, já em 1900 afirmava: “Porque

razão hão-de os artistas que constroem palácios de pedra merecer

mais consideração do que os que constroem de metal?” (1903, apud

61616161 Esta sua posição está expressa em dois volumes que resumem as suas

conferências entre 1902 e 1903, Die Kunstgewerbe Laienpredigten e, Die

Renaissance im Modernen Kunstgewerbe.

62626262 VELDE, Henry Van de. 1902. Die Kunstgewerbe Laienpredigten. Leipzing : [s.n.].

p. 36.

Page 125: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

102

Pevsner, 1936, p.33) “Os engenheiros são elementos básicos do

novo estilo”. 63636363

Contudo a posição de Muthesius 64646464 (apud, Pevsner, 1936, p. 41-42)

acabaria por prevalecer, pois a sociedade tinha como intenção:

(…) reunir os melhores representantes da arte, da industria,

dos ofícios, e do comércio, de conjugar todos os esforços para

a produção do trabalho industrial de alta qualidade e construir

uma plataforma de união para todos aqueles que quisessem e

fossem capazes de trabalhar para conseguir uma qualidade

superior.

A Qualität era definida não apenas como “trabalho bem feito e para

durar, ou emprego de materiais perfeitos e autênticos”, mas também

como “a possibilidade de se atingir um todo orgânico que fosse

sachlich, nobre e assim, se quiserem, tornado artístico” 65656565, e desde o

63636363 VELDE, Henry Van de. 1903. Die Renaissance im Modernen Kunstgewerbe.

Leipzing : [s.n.]. p.30.

64646464 VELDE, Henry Van de. 1903. Die Renaissance im Modernen Kunstgewerbe.

Leipzing : [s.n.]. p.30.

65656565 Werkbund, Berlim, citada in Jahre Deutscher e in Die Form VIII. 1932. p.302.

Page 126: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

103

início que se percebe que a Werkbund não se opunha, de todo, à

produção mecânica, tanto que no discurso inaugural da primeira

reunião anual, o arquitecto Theodor Fischer 66666666 (1907, apud Pevsner,

1936, p. 42) afirmou:

Não há nenhuma linha divisória nítida entre a ferramenta e a

máquina. É possível uma produção de grande nível, quer com

ferramentas quer com máquinas, desde que o homem domine

a máquina e faça dela uma ferramenta. (...) A culpa da

produção inferior não cabe às máquinas em si mas à nossa

incapacidade de as manejar adequadamente.

E do mesmo modo acreditava que:

(…) o mal não vem da produção em massa ou da divisão do

trabalho, mas do facto da indústria ter perdido a noção de

finalidade, que é conseguir uma qualidade superior, e de não

sentir o dever de servir a comunidade, mas sim o direito de ser

o tirano da nossa época.67676767 (1907, apud, Pevsner, 1936, p.42)

66666666 Werkbund, Berlim, 1932, citada in Jahre Deutscher e in Die Form VIII. p.324.

67676767 Werkbund, Berlim, 1932, citada in Jahre Deutscher e in Die Form VIII, p.310.

Page 127: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

104

Sem dúvida, o papel da Werkdund foi muito importante, pois

contribuiu com a sua indústria para o reconhecimento mundial da

arte e da técnica alemãs, retirando a liderança à Inglaterra. A

Werkbund tinha como intenção provar que era possível obter um

elevado nível de qualidade na produção industrial utilizando a

máquina como ferramenta e, neste processo, este principio foi

fundamental para divulgar as ideias do Movimento Moderno, tendo o

sucesso sido de tal forma imediato que, rapidamente, outras escolas

artísticas colocaram de lado os métodos medievais, das antigas

corporações de ofícios alemães e admitiram os progressos

modernistas.

Apesar desta vertente progressista ser comum e de se instalar um

pouco por toda a parte, existiam diferenças significativas no modo

como se aceitava a arte mecânica nas estratégias pedagógicas, e

que eram originadas pelo facto da postura dos vários directores e

professores ser, também, diferente.

Esta situação, de forma análoga verificava-se na Deutsche

Werkbund, ainda que um dos objectivos fosse desenvolver e acelerar

diversas iniciativas de integração da arte na indústria, à escala

Page 128: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

105

nacional. Logo na primeira reunião anual percebeu-se que existiam

algumas divergências, por um lado Muthesius 68686868 (apud, Pevsner,

1936, p.43) principal figura da associação, defendia que:

A arquitectura e toda a esfera de actividades da Werkbund

tendem para a estandardização. Só a estandardização pode

restituir ao artista a importância universal que este possuía em

épocas de civilização harmoniosa. Só através da

estandardização (...) como salutar concentração de forças,

pode criar-se um gosto aceite por todos e digno de confiança.

Ao contrário, Van de Velde (apud, Pevsner, 1936, p.44)69696969 defendia a

beleza da máquina e o individualismo:

Enquanto houver artistas na Werkbund eles protestarão contra

todos os cânones impostos e toda a estandardização. O artista

é essencial e intimamente um individualista apaixonado, um

criador espontâneo. Nunca ele se submeterá de livre vontade a

uma disciplina que o ponha na dependência de um cânone ou

de uma norma.

68686868 Werkbund, Berlim, 1932, citada in Jahre Deutscher e in Die Form VIII, p. 316-317.

69696969 Werkbund, Berlim, 1932, citada in Jahre Deutscher e in Die Form VIII, p.94.

Page 129: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

106

No seio desta duas questões emerge uma posição híbrida, Gropius,

na época membro da Werkbund, vivia a disputa entre os que

seguiram a tendência industrial de Muthesius e os que se mantinham

numa tendência mais artesanal, no espírito de Henry van de Velde.

Em 1909, numa postura mais próxima de Muthesius, elaborou um

memorando sobre a estandardização e a produção em massa de

casas pequenas e respectivas metodologias de produção. Mais

tarde, na qualidade de director, Gropius reorganizou o programa da

escola artística de Weimer com uma vertente modernista, e de 1914

a 1919, conciliou o melhor de ambas as vertentes, num programa

que foi o Manifesto da Bauhaus.

Page 130: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

107

4 . 2 . A M Á Q U I N A N O P E R C U R S O D A B A U H A U S 70707070

4 . 2 . 1 . F U N C I O N A L I S M O O R G Â N I C O D E G R O P I U S

Nos anos de crise do pós guerra, Gropius foi nomeado director da

escola de Van de Velde e reuniu as escolas de Belas Artes e a

escola de Artes Aplicadas e, assim, as duas escolas de arte de

Weimer fundiram-se numa só sendo-lhes atribuído o nome de

Staatliches Bauhaus. Na fase inicial, a escola tinha, também, muito

em comum com as antigas corporações medievais, compostas por

mestres e por aprendizes e era marcada por uma estratégia

ideológica próxima da linha do expressionismo, desenvolvendo uma

forte oposição à máquina.

70707070 Do mesmo modo que Jacinto Rodrigues e Wingler consideramos para a Bauhaus

três momentos distintos: 1913 - 1928, em Weimer com a direcção de Walter Gropius,

(em 1923 foi transferida para Dessau); 1928 - 1930 sobre a direcção de Hannes

Meyer e de 1930 - 1932, com Mies van der Rohe (a escola é encerrada em Dessau

e transferida para Berlim). Porém, Marty Bax considerou dentro do primeiro período,

ainda, duas fases o expressiomismo (1912 - 1922) e art and tecnique, a new unity

(1922 - 1925).

Page 131: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

108

No início da sua formação, os aprendizes passavam por uma fase de

contacto directo com elementos do mundo material, botânico e

zoológico, como uma iniciação à sensibilidade; numa fase intermédia

estabeleciam relações com as formas elementares e, depois,

passavam à aprendizagem dos processos de construção, da

composição das cores, dos instrumentos e ferramentas e, por fim, a

um estudo generalizado da natureza, onde tomavam contacto com

os materiais de construção, como a argila, a pedra, a madeira, o

metal e os vidros; só após esta fase final da sua formação, adquiriam

conhecimentos de engenharia que lhes permitia receberem o

diploma de Mestre da Bauhaus.

Nota-se nesta estratégia um forte compromisso entre o factor

orgânico e o factor técnico, numa relação crescente que pretendia,

primeiro, o domínio dos elementos naturais e só depois dos

tecnológicos, o que reflecte bem as fundamentações teóricas e

práticas da escola.

De facto, Gropius preconizava uma escola não hierárquica, assente

em princípios de pesquisa e de colaboração entre alunos e mestres,

e acreditava que o progresso devia basear-se na educação e na

democracia, quer na escola quer na sociedade, defendendo que o

lugar dos artistas, cuja tarefa social era o ensino, deveria ser na

Page 132: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

109

escola. Entre os seus colaboradores tinha os melhores artistas, como

por exemplo Klee, Kandinsky, Moholy-Navy e Itten, e segundo

Jacinto Rodrigues. (1989, p.96):

A escola procurava a simbiose do artista e do artesão: A

Bauhaus não quer apenas formar artesãos, mas sim uma elite

de criadores. Esta elite deverá no entanto trabalhar os

materiais com as suas próprias mãos e servir como servem os

operários.

Todavia, esta proposta de Gropius para socializar a arte não foi bem

aceite pela maioria dos artistas europeus, mas, segundo ele isso

poderia ser ultrapassado através de um profícuo trabalho em prol do

novo espírito da construção.

Um projecto importante, desta fase inicial da Bauhaus, é a casa

Sommerfeld, pois expressa uma estética baseada na metamorfose

da vida que reflecte as intenções programáticas da escola. A madeira

era, nesse período, considerada como o material mais propício à vida

e esta casa, construída a partir de troncos, aproveitando deste

material orgânico toda a sua expressividade estética, insere-se na

estratégia pedagógica que tinha como centro unificador a

arquitectura e comprova, ainda, a influência dos princípios de Rudolf

Steiner, na Bauhaus.

Figura 19

Casa Sommerfeld.

Figura 20

Vestibulo da Casa Sommerfeld.

Page 133: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

110

This structure was the first example of the new functionalism in

Germany. The internal arrangement was determined by an

efficient use of space in a minimal living area, the furnishings

were parctical, hygienic and functional, and the white exterior

was meant to convey that same effect. (Bax, 1991, p.35)

Gropius acreditava que tal como noutros tempos a arte se uniu ao

artesanato, também, nesta era da máquina, estavam reunidas as

condições para a arte se unir à produção industrial, pois “Gropius no

dudaba de que la máquina podía ser espiritualizada por medio del

arte, y abogaba por una arquitectura del racionalismo técnico (...)”

(Colquhoun, 2002, p.68), e, duma forma geral, podemos dizer que do

ponto de vista técnico se procurava encontrar a forma padrão com o

predomínio de formas geométricas.

Como já vimos, Gropius, por um lado, era a favor da integração da

concepção no processo de produção, conforme defendido por

Muthesius, e por outro defendia, também, o individualismo de Van de

Velde; no fundo, pretendia fazer a integração destes dois factores

que tinham causado grande discussão na primeira reunião da

Werkbund mas, no entanto, isso não o colocava em perfeita sintonia

com Muthesius.

Efectivamente, na prática, a situação era bem diferente e, enquanto

Page 134: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

111

Muthesius era apoiado pelo meio empresarial e governamental, que

fazia o controle da actividade artística, Gropius, pelo contrário, era

implacável, e defendia que o artista devia ser livre de qualquer

influência política. No entanto, “ambos creían que el artista (o el

arquitecto como artista) era por entonces un intelectual que tenía

encomendada la misión de inventar las formas de la era de la

máquina, considerada ésta como una totalidad cultural.” (Colquhoun,

2002, p.68)

Em 1919, Gropius, Adolf Behne e Bruno Taut criaram a Arbeitsrat für

Kunst, um sindicato de artistas à semelhança dos trabalhadores

soviéticos da revolução. Este sindicato de forte vertente

expressionista, tinha na sua direcção Gropius que organizou uma

exposição de Arquitectos Desconhecidos. Esta exposição tinha sido

proposta por Taut antes da sua demissão e, embora, apontasse para

a participação exclusiva de arquitectos, na realidade, abrangia,

também, participantes de outras vertentes artísticas, no que

podemos descrever como uma integração de todas as artes debaixo

da alçada da arquitectura.

As obras apresentadas na exposição, que ocorreu no gabinete

gráfico de J. B. Neumann, tinham como objectivo a recusa da

arquitectura funcional, em oposição ao conceito Sachlich da

Page 135: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

112

Werkdund. Muitas considerações foram feitas por vários artistas

relativamente aos trabalhos apresentados na exposição, contudo, no

contexto desta abordagem, parece-nos interessante classificá-las, do

mesmo modo que Colquhoun, em duas categorias: uma linguagem

naturalista e uma linguagem anti-naturalista, parecendo,

respectivamente, derivadas de desenhos infantis, ou então,

manipuladas a partir de imagens estereotipadas de arquitectura, em

formas festivas e fantásticas, um pouco incongruentes, mas em todo

o caso revelando no seu conjunto, mais uma vez, o modo como o

natural e o artificial proporcionam analogias muito interessantes.

Como temos vindo a analisar o tema da máquina gerou várias

posturas contraditórias e verifica-se que alguns autores que

começaram por rejeitá-la acabaram por ter posições mais tolerantes

ao longo das suas vidas. É interessante verificar que mesmo os que

eram antimáquina, ou cuja empatia por ela era menor, começaram a

absorver o novo espírito emergente muito mais depressa, como se

pode verificar com Adolf Behne, importante crítico, defensor do

expressionismo 71717171 e figura importante do AFK que, em 1919,

71717171 Antes da primeira guerra mundial, o expressionismo na literatura e na pintura

apresentava características bem definidas e manifestava-se em grupos como Die

Page 136: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

113

defendia no seu livro Die Wiederkehr der Kunsti, uma postura contra

a máquina e, pouco tempo depois, em 1922, altera a sua posição,

apresentando num artigo, Arte, Artesanato e Tecnologia, apresenta

uma outra ideia, completamente diversa da inicial, onde se defende

que a máquina possibilitava a divisão do trabalho e, assim, tornava-

se mais fácil para o trabalhador entender a sua função na sociedade

fortemente industrializada, um novo conceito para Behne mas similar

ao de Gropius no seu discurso Arte e construção industrial, de 1911.

Estas diferentes posturas originaram e aprofundaram conflitos

internos na Bauhaus e conduziram, em 1922, à substituição do pintor

suíço Johannes Itten por Moholy-Navy, um construtivista húngaro.

Esta alteração produziu uma mudança significativa, principalmente

no que concerne o ensino da arte, tendo a escola passado a

apresentar um perfil mais racionalista, com uma vertente técnica

Bruche e Der Blaue Reiter, contudo na arquitectura nota-se um atraso relativamente

às outras artes, resultante de uma enorme crise na sociedade alemã e nesta fase,

encontramos pouco exemplos, apenas alguma obras de Hans Poelzig-Torre de

Possen (1910) e de Max Berg, em especial, Fahrhunderthalle de Breslau. No

entanto depois da Primeira Guerra Mundial, a arquitectura expressionista está

associada a movimentos visionários e de vanguarda que dão origem a diversos

projectos utópicos.

Page 137: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

114

mais marcada, inclusive com Moholy-Navy a valorizar o trabalho com

materiais industriais da era da maquina, explorando assim novos

materiais como o vidro e o aço.

De facto, registavam-se diferenças significativas entre as ideias

daqueles dois professores, que foram equiparadas por Colquhoun às

que existiam entre os racionalistas e os construtivistas na vanguarda

russa, nomeadamente, Itten baseava-se em “princípios psicológicos

formalistas”, enquanto que Moholy-Navy privilegiava “técnicas

mecánicas de montaje”, (Colquhoun, 2002, p.161) defendendo assim

o principio da construção em vez do principio da forma.

Esta abordagem, também, está patente no texto de Albers,

companheiro de Moholy, que definia os princípios do curso:

(...) Buscaba el desarrollo de un lenguaje visual nuevo y

contemporáneo (...) y esto, con el tiempo, llevó a pasar del

énfasis en expresión personal (...) a un uso más racional,

económico y estructural del propio material (...); hablando en

términos pictóricos, del collage al montaje. (Banham, 1989,

p.286)

Esta nova tendência da escola vai acentuar-se com a transferência,

por razões políticas, da Bauhaus para Dessau, visto que neste

processo se deu uma troca do corpo docente e a escola adquiriu

Page 138: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

115

uma nova teoria estética que valorizava, ainda mais, a componente

técnica, privilegiando a união entre arte e técnica, conforme

testemunha Gropius:

(:..) los talleres de la Bauhaus son esencialmente laboratorios

en los que se desarrollan e se mejoran cuidadosamente

productos adecuados para su producción en serie y típicos de

nuestro tiempo. (Colquhoun, 2002, p.162)

Um outro aspecto importante no processo de transformação da

Bauhaus, que contribuiu para um impulso da técnica, apontando para

uma mudança de paradigma, foi a primeira exposição em 1923, com

o tema Arte e tecnologia, uma nova unidade; Gropius tinha um

programa de forte cariz arquitectónico que, para além de conciliar

arte e tecnologia, propunha, também, a divulgação da arquitectura

internacional com uma intenção específica, a união entre a arte e a

tecnologia, visando uma arquitectura mais funcional.

In order to design a thing so that it will function correctly, we

[first] have to investigate its nature. The elements aiding the

study of the nature of a thing are not only the laws of

machanics, statics, optics ans acoustics, but also the laws of

proportion. These are a matter of the world of the intellect. In

order to achieve precision here, we must consciously seek to

Page 139: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

116

make the personal factor more objective, but every work of art

carries the signature of its creator. (Bax, 1991, p.39)

Conforme podemos constatar neste texto, é evidente uma vontade

de mudança, espelhada no principal elemento da exposição, a casa

modelo da exposição Haus Am Horn, projecto de Georg Muche, sob

a direcção de Adolf Meyer e que era a primeira casa de um projecto

urbanístico, projectado por Gropius e Forbat de apoio à escola.

Neste projecto, também, podemos encontrar analogias entre habitat

naturais do mundo organico – as colmeias e a ideia de máquina de

habitar.

The planning at Am Horn is also historically significant because

it provided for a limited number of typical houses which, with the

development of mass production, allowed a variable, so-called

honeycomb construction. As early as 1922, Gropuius labelled

these typical houses machine for living in. (Klotz, 1989, p.54)

A casa organizava-se numa área de 12.7x12.7 (m) de forma simples,

com o objectivo de simplificar as tarefas na habitação, reduzindo ao

máximo os espaços de circulação e privilegiando os espaços mais

funcionais, de modo a mecanizar as funções associadas ao acto de

habitar, com destaque para a cozinha onde foram introduzidos novos

conceitos.

Figura 22

Planta da casa Am Horn.

Figura 21

Casa Am Horn.

Page 140: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

117

Gropius stated that the aim of the house was to achieve the

greatest comfort with the greatest economy by the application

of the best craftsmanship and the best distribution of space in

form, size and artculation. Gropius went on: In each room

function is important, e. g. the kitchen is the most pratical and

simple of kitchens – but is not possible to use it as a dining

room as well. Each room has its own definite character which

suits its purpose. (Whitford, 1984, p.143)

Na construção da casa Am Horn foram utilizados aos processos

inovadores para a época e a sua edificação demorou apenas quatro

meses.

Apesar da casa apontar para a construção em série, facto que era

uma inovação para a época, este processo não podia ser

reproduzido de forma simples, pois foram utilizados materiais muito

caros, no entanto, a sua construção foi um marco importante no

modo de entender a arquitectura e sobre ela escreveram vários

autores, como Jacinto Rodrigues (1989, p.94) que refere que “esta

experiência da Casa de Am Horn mostra, apesar da limitações

tecnológicas existentes, uma influência cada vez mais forte do

modelo urbano-industrial.”

A viragem na metodologia da escola estava prestes a iniciar-se e se

Page 141: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

118

até aqui, se privilegiavam as aptidões manuais e a criação orgânica,

contudo a partir da exposição de 1923, percebe-se um percurso

orientado, no sentido de solucionar o binómio arte/artesanato, o que

parecia irreversível começava, agora, a ser promovido:

“craftsmanship’s and industry, art and technology thoughts and

feelings”. (Fiedler, 1995, p.147)

Neste momento de viragem, outro aspecto importante a considerar

na exposição de 1923, para além da Casa Am Horn, foi a exibição

das fotomontagens de Metropolis, de Paul Citroën, discípulo intimo

de Itten, no que se poderá entender como uma visão antecipada da

cidade do futuro, um mundo dominado pela máquina em que

gigantescos edifícios são habitados por seres solitários. Esta obra

dilacerante lançava pistas definitivas sobre as cidades imaginárias do

futuro e das utopias urbanas, um tema que serviu de inspiração para

as cidades futuristas que povoariam, a partir daqui, o imaginário

cinematográfico, provando que era possível estabelecer, também,

uma relação entre o cinema e a arquitectura.

O recurso à tecnologia passou, desta forma, a ser incentivado, mas

sem se negligenciarem os princípios da criatividade e individualidade

artísticas. A escola manteve-se no centro da cultura comunitária

procurando humanizar a máquina e, assim, alcançar uma

Page 142: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

119

interdependência activa, nova e eficaz, entre todos os processos de

criação artística, que conduzisse a um equilíbrio renovado na

sociedade.

In the instructional programme, the second highest goal

mentioned now has: pratical experimental work for

housebuildind and furnishing. Development of standard models

for industry and crafts. For this purpose, a pratical experimental

department was set up. (Bax, 1991, p.45)

A transferência da Bauhaus para Dessau implicou, igualmente, a

construção de um novo edifício. “This location was chosen in part

because the city, faced with a great shortage of housing, was

receptive to Gropius ideas about mechanization and rationalization of

housing construction”. (Bax, 1991, p.42)

Gropius, com a colaboração de mestres e alunos, construiu a obra

mais importante do funcionalismo racionalista alemão e um marco na

arquitectura moderna, sendo que foi fundamental o processo

didáctico que acompanhou o processo de concepção e construção

do edifício. The objective was to give artistic design a more scientific

basis by providing additional thecnical knowledge. (Bax, 1991, p.47)

No entanto, importa aqui notar que este projecto considera as

questões técnicas, o homem e sua função social, numa dimensão

Figura 23

Edifício da Bauhaus.

Page 143: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

120

holística que no contexto da nossa problemática nos obriga a

reflectir:

Com efeito o edifício da Bauhaus, antes de ser um organismo

arquitectónico e urbanístico, é um organismo social. É uma

proposta para uma plataforma nova da sociedade que liga num

edifício único nó operativo educar-aprender e produzir, pensar e

fazer, a obra do artista a actividade do homem e da máquina 72727272

(Busignani, 1978, apud, Rodrigues, 1989, p.134)

No edifício da Bauhaus, em Dessau, a planta foi projectada em

sintonia com o moderno, o edifício abre-se ao exterior através de

grandes planos envidraçados, com o duplo objectivo de ventilar e

eliminar os laboratórios e, em simultâneo, de abrir a escola ao

exterior. Pretendia-se uma comunidade democrática onde a escola

assumisse o papel fundamental de comunicação com o exterior, tal

como Gropius idealizava, um espaço que articulasse o trabalho e o

lazer numa harmonia perfeita. Neste sentido, podemos

inclusivamente considerá-la a máquina perfeita: Argan faz uma

descrição da escola que aponta claramente para uma máquina, um

72727272 BUSIGNANI, Alberto. 1978. Walter Gropius. Florença : Jansoni. p.25-26.

Figura 24

Vista geral do edifício da Bauhaus.

Page 144: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

121

dispositivo mecânico (ou orgânico) que desempenha a tarefa social,

o ensino, precisando de uma fonte de energia que, neste caso, seria

o factor humano.

Apesar da máquina não ser um modelo formal da arquitectura

moderna, Argan, com base nos testemunhos de Gropius, descreve o

edifício principal e os edifícios adjacentes como uma enorme

máquina e, efectivamente, na descrição dos volumes, não faltam

associações a partes específicas da máquina, conforme podemos

constatar:

(…) Essa rotação ideal entendida como rotura de equilíbrio

estático e início de movimento é confiada a um sistema de

forças (a tensão interna é recíproca da massa, explica Gropius),

que de desenvolve a partir da situação espacial e da entidade

dos blocos. O eixo de rotação encontra-se no corpo central, que

tem maior desenvolvimento em altura, a galeria longa e baixa

não é senão um braço da alavanca, cuja extensão é

proporcional ao corpo da direita. O equilíbrio dinâmico do

conjunto baseia-se no facto de que a massa maior do corpo da

esquerda, directamente articulado ao eixo, encontra

correspondência na maior extensão dos corpos da direita.

(Argan, 1988, p.392)

Figura 25

Edifício da Bauhaus.

Page 145: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

122

Este conceito estético foi também aplicado mais tarde, depois de

Gropius sair da Bauhaus (1931), no projecto apresentado para o

palácio dos Sovietes em Moscovo e, se analisarmos a interpretação

de Argan, verificamos que não faltam alusões a um complexo

engenho mecânico com as suas engrenagens, pois a solução formal

de Gropius aponta para uma analogia final com a máquina, estando

carregada de significados simbólicos, num edifício constituído,

conforme refere Argan (1988, p.402), por:

(…) massas circulares ou orbitais, girando em torno de um

eixo, como se fosse o elemento de um complexo engenho

mecânico (...) a forma possui um sentido simbólico: o palácio

dos sovietes é o motor da revolução, e o aspecto maquínico é

uma provável alusão à conquista proletária do sistema

industrial.

Aliás, é interessante referir, igualmente, que os edifícios

apresentados por outros dois concorrentes, mais propriamente os

projectos de Liubetkin e de Le Corbusier, partilhavam do mesmo

espírito, não deixando dúvidas que a máquina estava, rapidamente, a

Figura 26

Maqueta Palácio dos Sovietes.

Figura 27

Planta do Palácio dos Sovietes.

Figura 28

Projecto para o Palácio dos Sovietes.

Page 146: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

123

ganhar terreno no universo conceptual dos arquitectos.

De regresso à Bauhaus há a referir que nas suas imediações, junto

de um pequeno bosque, foram construídos seis alojamentos para

professores, também, dignos de registo. Nestes espaços

habitacionais, Gropius cria módulos susceptíveis de serem

embutidos ou combinados de múltiplas maneiras, articulando

estandardização e variedade de formas, numa organização interior

que obedece a um estrito racionalismo lógico funcional. Pode-se

dizer que, no seguimento da Casa Am Horn, a experiência da casa

de espaço mínimo prosseguia com o máximo de rigor. Assim, a

instalação da cozinha, a organização dos armários embutidos dentro

das paredes, o aproveitamento de todos os espaços, constituem sem

dúvida uma obra de grande rigor funcionalista.

Gropius stated that the aim of the house was to achieve the

greatest comfort with the greatest economy by the application

of the best craftsmanship and the best distribution of space in

form, size and artculation. Gropius went on: In each room

function is important, e. g. the kitchen is the most pratical and

simple of kitchens – but is not possible to use it as a dining

room as well. Each room has its own definite character which

suits its purpose. (Whitford, 1984, p.143)

Figura 29

Casas dos Mestres da Bauhaus.

Page 147: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

124

Outro exemplo de racionalização, no qual a Bauhaus participou, foi a

experiência do conjunto habitacional de Törten, em 1926-28, em que

as habitações unifamiliares se organizavam em plantas simples, com

4 ou 5 compartimentos, e com as casas a serem construídas

segundo uma linha de montagem que permitiu uma grande rapidez

de execução e de instalação e, consequentemente, uma redução de

custos.

Neste projecto de habitações unifamiliares, é interessante constatar

que ao conceito de racionalização e planeamento, muito associado à

mecanização do processo, existia, também, uma forte componente

ligada à natureza. Efectivamente, um dos objectivos era fixar as

populações à actividade agrícola, como complemento ao trabalho

mecanizado, proporcionando-lhes uma relação com a natureza e

valorizando os valores humanos, tão prementes na sociedade alemã.

Todavia, se o conceito de vida passava por criar uma harmonia entre

o rural e o industrial, em que as pequenas habitações se articulavam

organicamente no território, esta não era uma situação previsível a

curto prazo, pois o contexto político da Alemanha apontava em

sentido contrário, pelo que o maior contributo deste trabalho, nascido

da Bauhaus, pode radicar na “noção de espaço mínimo, da chamada

Figura 30

Casas dos Mestres da Bauhaus

Page 148: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

125

vivenda mínima”, conforme refere Jacinto Rodrigues (1989, p.38).

Há ainda a salientar que um dos aspectos mais importantes deste

projecto foi o modo como se processaram, ao nível técnico, os

trabalhos de execução. Com base numa boa programação,

equacionando questões da ordem metodológica e financeira, a obra

foi programada e faseada para aumentar o rendimento e, para isso,

foram colocados estaleiros no local, as técnicas tiveram como

objectivo reduzir o transporte de materiais volumosos, foram

efectuadas unidades de construção de paredes em painéis, ou seja,

foram criados todos os procedimentos para racionalizar os trabalhos.

Este trabalho, em cooperação com a Sociedade de Investigação do

Governo para a construção de Casas Económicas, permitiu que

rapidamente se construíssem as casas, contudo, veio a verificar-se

que este sistema, altamente racionalizado, não tinha diminuído os

custos do modo que era suposto; não obstante, temos de reconhecer

que foi um processo muito importante para a arquitectura e para o

urbanismo moderno.

Outro exemplo, neste bairro de Törten, que nos interessa apresentar

neste estudo, por o considerarmos um contributo particular que

marca a emergência do novo paradigma na forma do homem habitar

o espaço, foi o projecto de Carl Fieger. É uma casa cheia de

Page 149: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

126

funcionalidade racionalista e a sua linguagem arquitectónica, muito

cuidada, transforma-a num exemplo de grande qualidade formal.

Ainda no mesmo bairro, aparece a casa de Georg Muche e Richard

Paulick que, ao contrário da anterior que apontava claramente para

um modelo de máquina de habitar, aproveitou a evolução técnica

para edificar uma casa experimental em aço e que provava a sua

dependência do orgânico, já que Muche pretendia realizar uma

habitação de crescimento variável como os organismos e com

unidades de pré-fabricação industrial em forma de módulos:

The customary house is built on a floor plan, fixed in the

organization of its rooms. This would be correct if the number of

family members always remained the same and if the space

requiremened remained unchangerd. But the family is a flexible

organism, and its numbers increase or decrease wiyh the time.

Hence, the floor plan must be worked out in such a way that

enlargement or diminution is possible as a natural arrangement,

without having to demolish building units (…) (Wingler, 1993, p.

417)

Nesta fase, é importante referir os conflitos ideológicos existentes na

sociedade alemã, com a vanguarda a dividir-se entre os

funcionalistas e os racionalistas. Segundo Behne, os funcionalistas

Figura 31

Casa de aço.

Page 150: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

127

poderiam ser chamados de organicistas, contudo, o sentido atribuído

não tinha como base o artista reprodutor da natureza, ou as leis da

natureza, mas sim, o entender o edifício como a extensão do corpo

humano, aplicado a uma função particular, e incapaz de se adaptar a

situações mais abrangentes, exactamente ao contrário do

preconizado pelos racionalistas, “Si el funcionalista busca la mayor

adecuación posible a la finalidad más especializada posible, el

racionalista busca la mayor conformidad a distintas situaciones. Los

funcionalistas son individualistas, mientras que los racionalistas

asumen su responsabilidad con la sociedad”. 73737373 (Doesburg, 1990,

apud, Colquhoun, 2002, p.169)

Um outro aspecto, indissociável da transição entre os métodos de

fabricação artesanais e industriais, foi a construção, promovida pela

Werkbund, do Bairro Weissenhof, que ficou conhecido como símbolo

da arquitectura progressista. Na realidade, a Werkbund estava

interessada em promover a pré-fabricação e, assim, pediu a Mies

Van Der Rohe para urbanizar, em Stuttgard, um bairro com sessenta

habitações destinado a alojar famílias com poucos recursos

73737373 DOESBURG, Van. 1990. On European Architecture: Complete Essays from Het

Bouwbedrijf, 1924-1931. Basilea/Boston : Birkbäuser, p.88-95.

Page 151: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

128

económicos, e, neste caso, a industrialização do processo de

construção já iria permitir reduzir, de facto, o custo de construção.

Para o efeito, em que o modo principal seria a pré-fabricação, foram

convidados vários arquitectos de diferentes países, tendo Gropius

participado com duas casas e, nas suas intenções, podemos

perceber a ideia geral do grupo.

The most interesting of the experiements carried out under the

Weimer Republic was the Weissenhof Housing Project for the

Werkbund Exhibition at Stuttgard. In his two detached houses

Gropius again caoncentrated upon the techniques of building

constrution – this time upon dry wall conbstruction: light steel

franmework, with wall panels of compressed cork covered with

sheets of asbests cement. (Giedion, 1992a, p.75)

Além da colaboração de Gropius, esta experiência tem uma relação

particular com a Bauhaus porque no bairro existia, igualmente, um

prédio de habitação de Mies van der Rohe, futuro director da

Bauhaus. Esta obra é particularmente importante pois concretizava

uma aproximação entre a arquitectura e a tecnologia industrial

derivada do edifício colectivo de Mies se desenvolver a partir de uma

estrutura de aço e das paredes se constituírem em painéis de

revestimento pré-fabricados.

Page 152: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

129

Nesta época, Mies van der Rohe era director da Werkbund e assistiu-

se a uma mudança nítida. Giedion (1992, p.598-599) faz notar que:

The Weissenhof Housing Settlement gives evidence of two

great changes: the change from handricraft methods of

construction to industrialization, and the premonition of a new

way of live. (…) The Weissenhof Housing Settlement is

dominated by Mies van der Rohe’s steel-framed apartement

house. (…) Many architectural critics found the continuous steel

suports that ran freely through the houses of Mies van der Rohe

and Le Corbusier very unsightly. It seems that it is especially

difficult for the architect to free himself from the appearance of

traditional structural methods in wich the walls were the bearing

members of the house.

A partir de 1925, o esquema urbanístico assenta essencialmente na

casa unifamiliar, integrada no quarteirão em grandes conjuntos, a

arquitectura pretende, assim, resolver aspectos sociais da vida

urbana.

Conforme temos verificado, o modelo de meados dos anos 20, do

ponto de vista do urbanismo, construía-se, neste caso, com base na

cidade-jardim, na casa muito mecanizada, implantada numa base

orgânica mas em que a casa resolvia problemas funcionais, um

Page 153: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

130

conceito imortalizado por Le Corbusier na famosa frase: a casa como

máquina de habitar; no entanto, ainda se constata muito respeito

pela envolvente, ou seja, perdura o confronto entre estas duas

vertentes: a casa mecanizada e o exterior natural orgânico. Contudo

previa-se uma mudança no quadro e a máquina estava prestes a

tornar-se num modelo unitário, as mega-estruturas urbanas

sobrepunham-se ao modelo de cidade-jardim; num processo que

Jacinto Rodrigues (1989, p.147) considerou:

Um salto tecnológico para permitir à casa máquina de habitar

tornar-se cidade máquina, se possível integrada numa mega-

estrutura ou em várias implantações ritmadas de modo a

aproveitarem espaços e sol.

Um projecto que vai reflectir essa nova fase de transição é o modelo

urbano para Spandau-Haselhurst – Berlim de 1929, que considerava,

além de um conjunto de casas habitacionais entre dois e cinco

andares, um edifício de doze andares que constituíram um exemplo

do que viriam a ser as cidades máquina do futuro.

É interessante constatar que com este projecto, que ganhou o

primeiro prémio, Gropius estava aqui com uma posição bem mais

permeável, entre o natural e o mecânico, do que aquela que tinha

aquando da formação da Bauhaus, mas continuando a revelar a

Page 154: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

131

mesma sensibilidade para com o orgânico, do qual o fenómeno

humano é o paradigma por excelência, conferindo à sua obra uma

importante dimensão poética que faz dela um exemplo na

arquitectura mundial.

Com a emigração de Gropius para a América, devido à perseguição

nazi, a Bauhaus mudou-se para Berlim e Hannes Meyer assumiu a

direcção da escola até 1933, e a escola seguiu um novo rumo.

No entanto, após a saída de Gropius da direcção da escola, o

espiritualismo de que a Bauhaus estivera imbuída foi irradiado,

e o mundo da produção instituiu-se como objectivo principal.

(Barata, 2007, p.22)

Page 155: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

132

4 . 2 . 2 . F U N C I O N A L I S M O P R O D U T I V I S T A D E

M E Y E R

As ideias de Meyer eram próximas das defendidas pela esquerda

construtivista, defendendo a arquitectura com um modelo técnico

produtivo que apontava para algumas linhas de continuidade com o

passado da Bauhaus, e que pelo seu rigor matemático, apontava,

também, para a linha formal de Wittgenstein. O trabalho deste

director, talvez o menos conhecido da Bauhaus, foi durante muito

tempo explicado, apenas, pelas suas tendências políticas e, mais

recentemente, associado a uma vertente funcional do funcionalismo

produtivista, contudo, não podemos esquecer que, inicialmente, os

seus projectos reflectiam um neoclassicismo característico do

movimento suíço da cidade jardim, no qual teve uma participação

activa.74747474

74747474 Estas motivações teriam surgido por volta de 1912, 1913, quando fez uma viagem

de estudo a Inglaterra, onde teve oportunidade de contactos com o movimento da

cidade jardim e com as cooperativas de habitação de Londres e Birmingham, e só

mais tarde aderiria aos princípios do movimento moderno.

Page 156: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

133

Nos três anos em que assumiu a direcção da escola, Meyer tentou

substituir a estrutura pedagógica introduzindo novos temas, como a

psicologia, a sociologia e a economia e valorizando a racionalidade,

o materialismo e o ensino científico. Os seus princípios baseavam-se

quer no profundo conhecimento da construção, numa vertente

técnica, quer num compromisso total com a existência humana.

Para ele, a construção devia ser um processo elementar simples que

reflectisse as necessidades essenciais do ser humano, ideias essas

que, de uma forma geral, aparecem expressas no texto Construir,

publicado na revista nº 4 da Bauhaus, em 1928, onde expõe a sua

estratégia e na qual se percebe o compromisso entre a

funcionalidade técnica a que se destina os espaços habitáveis

subordinada, á função principal, a vida.

Para Meyer a vida é uma função, pelo que construir é um processo

biológico e não um processo estético.

Nesta sequência, Rodrigues (1989, p.159) resume, assim, a

metodologia hiperfuncionalista de Hannes Meyer:

Vida sexual, sono, animais domésticos, jardinagem, higiene

pessoal, protecção contra as intempéries, manutenção e

higiene da casa, manutenção do carro, cozinha, aquecimento,

luz solar, serviços.

Page 157: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

134

Neste texto, reflectem-se claramente as necessidades biológicas,

físicas, intelectuais e espirituais que Meyer tinha em conta para

tornar a vida possível, em qualquer tipo de construção, delineando

uma arquitectura que não se prendia com questões estéticas mas,

antes, com questões de ordem funcional que se resumiam ao bem

estar da vida humana.

É curioso constatar o modo como Meyer enquadra, por um lado, o

problema do artificial e do natural, e por outro, as preocupações com

o facto da arquitectura poder harmonizar as exigências do indivíduo e

da sociedade, numa perspectiva tão próxima da que foi a primeira

característica do factor humano, a construção de um abrigo, mas,

agora, adaptada a novas possibilidades tecnológicas.

Na sequência desta inovação conceptual, foram desenvolvidos

cursos e palestras na área de sociologia e biologia, no sentido de

adequar a técnica aos interesses da comunidade, numa atitude

contemporânea ligada às questões sociais e cientificas e que

deveriam ser equacionadas, com igual importância, no processo de

concepção dos projectos.

Como se percebe, existem importantes diferenças entre a Bauhaus

de Gropius e a nova escola de Meyer, sendo a mais significativa o

modo como Meyer valoriza a ciência e a técnica numa concepção

Page 158: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

135

tecnicista 75757575 independente das questões estéticas com as quais

Gropius tanto se identificava.

As ideias com que pretendia organizar a continuação da escola

foram expressas na revista ABC e num artigo escrito por Meyer, O

novo mundo, percebe-se o modo como rejeita a arte e a obra de arte,

criticando o individualismo e elevando os ideais colectivos da

sociedade socialista, assim, “a crença na máquina como protectora

da riqueza social é também outra base do seu discurso”. (Rodrigues,

1989, p.160)

Hannes Meyer reduzia, pois, o acto de habitar a uma questão

técnica, a um esquema funcional, a casa seria entendida como uma

máquina de habitar, e os novos materiais fariam a integração deste

novo conceito.

Meyer attempted to accentuate architecture by expanding the

curriculum and by creating a division between a sientifically

75757575 Meyer dividiu o departamento de arquitectura numa secção teórica (Baulehre) e

numa secção teórica (Bauabteilung): “The Baulebre was structured along the lines of

a technical college and comprised subjects such as statics, building construction, the

theory of building materials, technical drawing, heating, ventilation, climatology (…)”.

(Bax, 1991, p.48)

Page 159: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

136

objective and an artistically expressive direction. Thus, he was

actually continuing the afore-mentioned activist objective of

bringing about a synthesis between art and technique. (Bax,

1991, p.47)

Nesta fase, as questões do urbanismo ganham uma nova dimensão

no seio da Bauhaus visto que, para além do interesse de Hannes

Meyer por estas questões, que perdurava desde o plano de

urbanização de Basileia, existiam outros factores importantes, como

o primeiro congresso do CIAM, em Serraz, e, também a figura de

Hilberseimer, seguidor, na escola, das ideias de Gropius

relativamente à cidade moderna e que desenvolveu um trabalho que

influenciou de forma particular as cidades dos nossos dias.

Jacinto Rodrigues (1989, p.170) considera-o uma figura importante

nos ensaios relativos à cidade-máquina, pois uma das suas ideias:

(…) consiste em querer conferir o máximo de racionalidade e

funcionalidade ao alojamento, no intuito dum máximo de

produtividade baseado sobre gastos mínimos. A noção de

alojamento mínimo vital, ou ainda mínimo de existência

alicerça-se nesta perspectiva.

Importa assinalar que embora o espírito apontasse para modelos

urbanos, que se articulavam entre a cidade máquina e a casa

Page 160: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

137

máquina e os espaços mínimos, as mega estruturas não

desprezavam a existência da vida e, assim, os espaços

racionalizados organizavam-se em articulação com a paisagem e

com a natureza, como se testemunha no projecto executado sob a

direcção de Hannes Meyer, entre 1928 e 1930, a Bundeschule des

Allgemein Deutschen Gewerkschaftsbundes (Escola da

Confederação Geral dos Sindicatos Operários Alemães), em

Bernaue. Este complexo foi implantado num terreno em desnível e foi

bem integrado na paisagem do lago e da floresta, com os volumes a

serem bem dimensionados e a proporcionarem uma relação

interessante entre o espaço interior e espaço exterior, e podendo-se

verificar que:

(…) Nesta obra Hannes Meyer testemunha uma sensibilidade à

natureza que contradiz alguns textos em que se pode ler um

excessivo funcionalismo, baseando apenas em factores

técnico-materiais a forma da arquitectura. (Rodrigues, 1989,

p.176).

Neste parágrafo, percebe-se que apesar da vertente técnica

desenvolvida por Meyer ser marcada pela relação com a indústria,

existia paralelamente uma forte sensibilidade para com a natureza e

para com o homem, como elemento fundamental.

Page 161: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

138

Hannes Meyer always adopted an ecological perspective (...)

For instance, he frequently spoke of need for a Biological

Architecture, and in his building plans -such as his design for

the Palace of the League of Nations – he turned away from

construtivism towards an Organic Building, as in the Federal

School at Bernau. (Bax, 1991, p.50)

É curioso que, na Bauhaus, sendo Meyer o que mais se aproxima da

máquina é, também, aquele que mais se aproxima do homem.

Page 162: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

139

4 . 2 . 3 . F U N C I O N A L I S M O F O R M A L I S T A D E M I E S

Entretanto, com a ascensão e vitória dos nazis, na Alemanha, Mies

van der Rohe vai assumir a direcção da Bauhaus e tentar retirar, da

escola, as conotações políticas a ela associadas, procedendo a uma

reformulação das actividades curriculares. A escola assume, então,

uma nova estratégia, notando-se uma maior preocupação técnica,

em que os objectivos pedagógicos se reflectem, essencialmente, no

campo da arquitectura, e em que os cursos passam a transparecer

essa mesma vertente técnica, que passa a estar a cargo de

engenheiros: estática, mecânica, resistência de materiais, entre

outros.

Para entender esta estratégia de Mies é importante determo-nos um

pouco no seu percurso: quando chegou à escola era já um arquitecto

com uma carreira considerável, que tinha comprovado nas suas

obras uma grande sensibilidade estética e, sobretudo, uma enorme

competência técnica. Era filho de artesão e desde muito cedo

trabalhou a pedra, estivera também, como já foi referido, envolvido

no ideal da Werkbund, onde tentou passar para a indústria as

Page 163: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

140

aptidões do artesão. “Furthermore, Mies probably was sensitive to

the ideas of the expresionist and Rudolf Steiner at that time.” 76767676 (Bax,

1991, p. 53)

A vertente técnica que marcou a sua obra passa muito pelo interesse

que votou à obra de Sckinkel e ao modo como trabalhou as técnicas

do seu tempo. Também trabalhou no atelier de Behrens, e desde o

início, as suas obras oscilam entre um racionalismo formal e o

racionalismo poético de Stijl, sendo de referir que, na época, a

Holanda tinha uma das mais avançadas escolas, do mundo da

arquitectura.

Esta sua posição leva-o a investigar o tema arranha-céus em vidro e,

em 1921, projecta o primeiro para a primeira de quatro exposições,

organizada pelo Novembergruppe, um conjunto de arquitectos

radicais que propunham a renovação da arquitectura. O edifício

reflecte o domínio técnico, em paralelo com um ideal de casa

transparente que se ergue entre o céu e a terra, e é marcado, na

76767676 Segundo este autor: “From 1910 on, he regularly visited the garden city of

Werkbund member Karl Schmidt-Hellerau because his fiancée Ada Bruhn took

courses at the school of the (anthroposophical) eurythmic-pedagogue Emile Jaques-

Dalcroze located there.” (p.53)

Figura 32

Pavilhão de Barcelona.

Page 164: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

141

mesma proporção, pela vertente utópica e expressionista. Aliás essa

vertente expressionista acompanha a obra de Mies e está, também,

patente no monumento a Rosa Luxembourg, considerado como uma

peça expressionista.

Em 1926, Mies é nomeado responsável pela Werkbund, realizando aí

um dos exemplos mais avançados da ligação arquitectura/indústria

daquele tempo. O pavilhão para a Exposição Mundial de 1929, em

Barcelona, tornou-se um exemplo típico daquilo que podemos

chamar o funcionalismo formalista de Mies van der Rohe. Mostrando

uma notável precisão técnica, acabamentos de um requinte até ai

nunca alcançado pelos arquitectos modernos, o pavilhão cumpria o

objectivo de se apresentar como símbolo da produção de qualidade e

perfeição da técnica alemãs.

Na escola, em termos de funcionamento os ateliers foram

reorganizados de modo a colocarem-se, essencialmente, ao serviço

da arquitectura. As disciplinas técnicas ficaram a cargo dos

engenheiros e os cursos eminentemente técnicos, organizavam-se

em disciplinas como a estática, mecânica, resistência de materiais,

construções de ferro e de betão armado.

Como vimos, o percurso da Bauhaus orientou-se no sentido de tentar

solucionar o binómio homem-máquina, pese embora alguns autores

Figura 33

Esquiço do interior do pavilhão de Barcelona.

Page 165: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

142

terem sugerido outras reflexões como arte/artesanato;

indústria/artesanato, ensino artístico / ensino técnico.

Contudo, neste trabalho interessou-nos particularmente o modo

como a escola se foi ajustando na tentativa de dar resposta à

necessidade de criar habitações com qualidade e como equacionou

as questões relacionadas com a função habitacional, consciente das

necessidades do ser humano e do valor acrescido que a máquina

podia trazer à vida do homem.

Page 166: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

143

4 . 3 . L E C O R B U S I E R

4 . 3 . 1 . F O R M A Ç Ã O P E S S O A L E N T R E A

N A T U R E Z A E A T É C N I C A

O suíço Charles-Edouard Jeanneret, conhecido como Le Corbusier,

foi, eventualmente, o primeiro arquitecto a abordar as questões do

natural e do artificial de forma explícita e a afirmar várias vezes, no

seu percurso, a importância da natureza e o papel fundamental da

máquina na vida do Homem. Na verdade, a sua relação intensa com

a natureza e com a técnica, em paralelo com a componente artística,

desenvolveram-se a partir da mais tenra infância, pois todos este

factores estavam muito presentes no seio da sua família e, apesar do

fascínio pela máquina, este arquitecto continuou sempre a manifestar

uma forte relação de apreço e de respeito pela natureza,

conseguindo manter esta vertente natural ao longo da sua trajectória

pela arquitectura, conforme vamos tentar provar.

Le Corbusier cresceu em La Chaux-de-Fonds, uma povoação

relativamente pequena mas com um certo reconhecimento

internacional e fortes relações com o estrangeiro, visto que os

relógios, fabricados neste lugar, tinham criado uma concorrência com

o exterior e crescia, ali, uma vertente artística com uma certa

Page 167: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

144

relevância.

Na primeira fase da sua vida, Le Corbusier tem uma relação muito

próxima com o pai Charles Jeannearet, presidente do clube alpino de

montanhismo e grande apreciador da natureza, que ocupava grande

parte dos tempos livres a escalar montanhas e a observar com

grande pormenor a natureza, de modo que o filho, que muitas vezes

o acompanhava, conhecia bem os fenómenos naturais da região.

Los bosques y las cumbres de las montañas eran lugares

inquietantes e imponentes que proporcionaban al joven

Jeanneret momentos de liberación interna ante las fuerzas

épicas y grandiosas de la naturaleza. Así lo recordaba (Le

Corbusier apud Curtis, 1987, p.18) muchos años después:

Estábamos siempre en las cumbres, el horizonte inmenso era

algo habitual para nosotros. Cuando el mar de nubes se

extendía hasta al infinito, era como el mar de verdad, que yo no

había visto nunca. Era el espectáculo culminante.

Paralelamente a esta aptidão para apreciar detalhadamente a

natureza, o senhor Jeannearet, que trabalhava na indústria relojoeira

como esmaltador, valorizava o artesanato e, consequentemente,

defendia a precisão e a perfeição.

Figura 34

Desenhos realizados por Le Corbusier.

Page 168: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

145

A mãe de Le Corbusier, além de também perseguir este ideal de

perfeição, não descurava na formação do filho a disciplina e o gosto

pelo trabalho. Pianista e professora de música, despertou-lhe a

sensibilidade e o gosto por valores culturais, imbuídos do sentido de

rigor e que o arquitecto, sempre que recorda a sua mãe, resume

numa frase: “Lo que hagas, hazlo bien”.(Curtis, 1987, p.17)

Com efeito, no seio da sua família valorizavam-se “por igual las

aptitudes técnicas, intelectuales y estéticas” (Curtis, 1987, p.17) e Le

Corbusier percebeu muito cedo a importância destes valores na sua

formação, tanto que, em 1911, referiu:

En cuanto a mí, no comparto la idea de que con 25 años haya

que tener una posición en la vida (...) Me siento atraído por una

idea mucho menos forzada de la vida (...) más como una

sinfonía que como el tic-tac de un reloj. (Curtis, 1987, p.26)

Este pequeno texto é de facto elucidativo porque para além das suas

palavras aludirem, tal como a sua obra, ao confronto do domínio do

sensível, do artístico, do humano – a sinfonia, com o da técnica - o

tic-tac, o relógio, podemos igualmente, constactar que Le Corbusier

teve na sua formação os três princípios fundamentais que

sustentarão a sua arquitectura: o amor pela natureza, incutido pelo

pai; o factor técnico, a admiração pela máquina, a perfeição,

Page 169: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

146

desenvolvidos pelo contacto com a actividade relojoeira, 77777777 e a

sensibilidade artística, promovida pela mãe.

Na realidade, apesar de se tratar duma época muito marcada pela

máquina e deste tema ser o aspecto mais abordado na obra de Le

Corbusier, sobre o qual vários historiadores e autores do século XX

produziram obras e formularam teorias, podemos afirmar que as

vertentes técnica e natural sempre se sentiram, em simultâneo, nas

palavras e na obra deste arquitecto.

Uma das principais preocupações do arquitecto era a funcionalidade,

os seus projectos apresentavam linhas simples e funcionais, cada

projecto tinha uma lógica e o objectivo principal era o bem-estar dos

habitantes. Le Corbusier não procurava uma arquitectura decorativa

ou ornamental, nem pretendia exaltar qualquer tipo de emoção ou de

espiritualidade, apenas procurava a funcionalidade prática. Esta

77777777 Curiosamente Mumford, em 1934, no seu livro Technics and Civilization defende

ser o relógio e não a máquina a vapor, a máquina clara da moderna idade industrial,

ainda, nesta obra segundo Francastel (1956, p. 41) “l’auteur s’est proposé d’etudier

les conséquences de l’instrusion de la machine dans la vie publiques et privée des

hommes, principalement en fonction de l’urbanisme et de l’architecture, mais dans

une perspective qui embrasse l’évolution totale des temps modernes. »

Page 170: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

147

postura, que reflectia a sua personalidade, marcou todos os seus

projectos e foi responsável pela sua participação no movimento

Purismo. 78787878

Nos seus primeiros trabalhos são já perceptíveis ensaios com as

tecnologias modernas, como é o caso da investigação sobre a

aplicação de técnicas industriais a que se dedicou enquanto

trabalhava em La Chaux-de-Fonds, entre 1911 e 1917. Le Corbusier,

ainda que mantivesse uma postura relacionada com a arquitectura

tradicional, visava já aplicar aquelas técnicas num projecto de casa

colectiva, assente na ideia de cidades-jardim.

Na fase inicial, Le Corbusier sentiu-se, de facto, muito atraído pelo

fenómeno técnico e quando, em 1914, visitou a exposição de

Colónia, ficou fascinado com a imagem mecânica provocada pela

utilização do betão, do aço e do vidro em alguns pavilhões,

nomeadamente, no pavilhão Deutscher Werkbund, no Deutzen

Motoren e no pavilhão de Cristal de Bruno Taut. Com efeito, na

78787878 Este movimento é lançado por Amédée Ozenfand e objectiva a compreensão de

um fenómeno, defendendo apenas a pureza de uma tradição ou ortodoxia e

rejeitando qualquer outra possibilidade.

Page 171: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

148

sociedade alemã da época estava já muito presente a ideia de

técnica industrial, todavia, Le Corbusier, apesar de fascinado com a

aplicação inovadora dos novos materiais, evidencia na sua

correspondência alguns receios na aceitação de uma ideia

unificadora, não deixando de ser interessante esta postura cautelosa

relativamente a estas questões, que de igual modo preocupavam o

meio intelectual da época.

Com a aquisição do Jahrbuch de Werkbund de 1913, Le Corbusier

ficou entusiasmado com fotografias de fábricas, silos e barcos de

guerra que evocavam de forma particular a era da máquina e ficou

especialmente interessado num artigo de Walter Gropius que

abordava a forma estética na engenharia. Gropius fazia a

comparação dos monumentos do antigo Egipto com os silos

americanos e canadianos e apelava a um novo estilo baseado em

formas simples de proporções claras, “los nuevos tiempos exigen su

propia expresión”. (Curtis, 1987, p.41)

Efectivamente, este tipo de abordagem já tinha sido feita por Le

Corbusier, em 1911, pois da primeira vez que vira o Partenón

comparou-o a uma máquina e referiu com admiração as matemáticas

divinas do edifício. Assim, sabendo-se que nesta época ainda era

pouco provável a relação entre estes dois arquitectos, poder-se-á

Page 172: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

149

colocar a hipótese de existir uma certa unidade na tendência de

evolução técnica autónoma, para desenvolver uma nova forma de

habitar.

Page 173: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

150

4 . 3 . 2 . L ’ E S P R I T N O U V E A U

Em 1917, Le Corbusier instalou-se em Paris e começou a trabalhar

numa fábrica como administrador delegado para assuntos técnicos e

director do processo de fabricação. Paralelamente, montou um

estúdio e começou a pintar a óleo com a orientação de Amédée

Ozenfant, iniciando-se uma colaboração que deu origem a vários

artigos publicados na revista L’Esprit Nouveau. 79797979

O tema principal de L’Esprit Nouveau equacionava a problemática

relação entre a arte e a sociedade industrial e os seus artigos,

contendo frases como: ”Há um espírito novo: é um espírito de

construção e de síntese guiado por uma concepção clara. (…)

Ninguém nega hoje a estética que exala das criações da indústria

moderna.” (Le Corbusier, 2000, p.59) defendiam a ideia de que o

mundo industrial moderno implicava novas perspectivas para o

79797979 Nos primeiros artigos explicam onde nos leva a vida moderna, considerando um

facto irreversível a máquina: “Al revolucionar el trabajo, la máquina siembra los

gérmenes de grandes transformaciones sociales, al imponer al espíritu condiciones

diferentes, prepara una orientacíon nueva.” (Ozenfant/Jenneret, 1994, p.21)

Figura 36

Capa do primeiro número dirigido por Le Corbusier.

Figura 35

Le Corbusier, Ozenfant e Dermée, os fundadores de L’Espirit Nouveau.

Page 174: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

151

homem e para a sociedade. A ideia geral era superar-se a dicotomia

entre a arte e a ciência para que da união destas duas realidades,

que utilizavam meios diferentes, resultasse uma nova estética.

Esta era uma ideia também partilhada por De Stijl, segundo

Colquhoun, mas o que diferenciava a L’Esprit Nouveau de De Stijl

era a esperança de que a nova estética se revelaria clássica no seu

espírito. A ideia de sobreposição entre o velho e o novo, como no

caso do Partenón a ser comparado com um automóvel moderno,

ficou sublinhada nos ensaios monográficos de mestres clássicos

franceses, como Poussin e Ingres.80808080

A ciência e a tecnologia tinham alcançado um tão elevado grau de

perfeição que potencializavam a possibilidade de criar obras de arte

de uma beleza plástica inquestionável e objectiva. Um dos artigos

mais polémicos da revista Domaine de L’Esprit Nouveau, número 1

referia:

80808080 Estes artigos alternavam com os de Charles Henry (1959-1926) autor de

Introduction à une Esthéthique scientifique, e cuja teoria psicofísica da arte

influenciou a estética formalista do período entre guerras.

Page 175: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

152

Nadie niega hoy a la estética el que se desprenda de las

construcciones de la industria moderna. Cada vez más, las

construcciones industriales, las máquinas se establecen con

proporciones, juegos de volúmes y materias tales que muchas

de ellas son verdaderas obras de arte, porque comportan el

número es decir el orden. (Ozenfant e Jeanneret, 1994, p.49)

Para L’Esprit Nouveau era inquestionável a importância do artista e

da sua função numa sociedade contaminada pela máquina:

No podíamos hacer más que ocuparnos del maquismo,

estimando que era el fenómeno nuevo, el acontecimiento de la

época. (...) Constatamos que el maquinismo está basado en la

geometría y, finalmente, establecimos que el hombre sólo vive,

de hecho, de geometría es, hablando com propiedad, su

lenguaje mismo, significando com esto que el orden es una

modalidad de la geometría y que el hombre sólo se manifiesta

por el orden. (Le Corbusier, 1983, p.18-19)

Analisando a obra de Le Corbusier, percebe-se que em nenhuma

fase do seu trabalho as suas ideias estiveram, apenas, dependentes

do orgânico ou da técnica. Efectivamente, o sistema de ideias de Le

Page 176: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

153

Corbusier 81818181 (1925, apud Colquhoun, 2002, p.139) transferia este

dualismo para o resultado:

El primer objetivo de la arquitectura – escribía – es crear

organismos que sean perfectamente viables. El segundo –

donde realmente empieza la arquitectura moderna – es

conmover nuestros sentidos con unas formas armoniosas, e

nuestras mentes mediante la percepción de las relaciones

matemáticas que las unifican.

As ideias de Le Corbusier sobre a arquitectura moderna espelham-se

na evolução que incutiu ao emprego do betão armado, um material já

com uma utilização muito importante na arquitectura moderna do

início do século XX, mas que era aplicado de um modo limitado na

maioria das obras. Com efeito, Le Corbusier aprendera com Auguste

Perret, seu mestre, a considerar o betão armado como um material

estruturalmente moderno e vai utilizá-lo de uma maneira

completamente distinta, tirando partido das suas características para

o aplicar na industrialização. A primeira experiência foi com a

81818181 JEANNEARET, Charles-Édouard.1925. Ce salon D’Automne em L’Espirit

Nouveau 28, enero, p. 2332-5, citado em LEGAULT, Réjean, p. 261.

Page 177: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

154

estrutura Domino (1914) que consistia num sistema pré-fabricado em

que as lajes eram independentes das paredes, e embora nos

primeiros projectos com este sistema as paredes exteriores fossem

“estructuralmente redundantes todavía parecían ser de

fábrica”.(Colquhuon, 2002, p. 142)

Le Corbusier, ao contrário do que se passava com outros arquitectos,

rapidamente começou a utilizar o betão de forma diferente, tanto que

em 1927, construiu a casa Citrohan em Weissenhof, na exposição

patrocinada por Deutsche Werkbund, conceptualizando uma

proposta de manifesta evolução qualitativa em que desaparece a

presença da estrutura, tornando o esqueleto estrutural oculto, um

processo em que a obra de Le Corbusier ganha uma dimensão

particular, distinguindo-se definitivamente da dos seus colegas

modernos.

No discurso do arquitecto eram muito comuns associações com

partes de organismos tanto que uns anos mais tarde a propósito do

projecto da uma casa em Neuilly-sur-Seine, Le Corbusier, (Boesiger,

I vol., 1995, p.89 ) em carta à senhora Meyer faz a associação entre

as técnicas construtivas e os sistemas orgânicos:

(...) on est accoustumé depuis des années à voir des plans qui

sont si compliqués qu’ils donnent l’impression d’hommes

Figura 37

Esqueleto da Casa Dominó (1914).

Page 178: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

155

portant les viscères au-dehors. Nous avons tenu à ce que les

viscères soient dedans classés, rangés, et que seule une

masse limpide apparût.

Estas observações revelam a concepção que Le Corbusier tinha da

relação entre a tecnologia moderna, nomeadamente, a máquina e a

natureza. A tecnologia, em permanente mudança, faz com que o

edifício seja funcionalmente eficaz, satisfazendo umas necessidades

e dando origem a outras. Assim, do mesmo modo que a maquinaria

do carro, a tecnologia da casa deveria ser invisível. “Tanto la casa

como el coche son objets-type: complejos conjuntos de funciones

enfundadas en membranas platónicas.” (Colquhoun, 2002, p.146)

Importa notar que esta analogia mêcanica e biológica comporta uma

relação entre a forma e a função, pois se as formas orgânicas podem

ser estudadas como se fossem máquinas, as máquinas,

frequentemente, encontram soluções com base em príncipios

naturais.

Page 179: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

156

4 . 3 . 3 . M O D U L O R - A E S C A L A H U M A N A

A D A P T A D A À M Á Q U I N A

É de salientar que, para Le Corbusier, a vertente técnica nunca se

desenvolveu afastada do sentido da harmonia e da escala humana,

conforme se pode comprovar em frases proferidas pelo arquitecto

(Le Corbusier, 1973, p.65):

La arquitectura se juzga con los ojos que ven, com la cabeza

que gira, con las piernas que andan. La arquitectura no es un

fenómeno sincrónico, sino sucesivo, hecho de espectáculos

que se sumun unos a otros e se suceden en el espacio y en el

tiempo, como la música. (...) El ojo humano no es el de una

mosca situada en el corazón de un poliedro, sino en el cuerpo

de un hombre, a uno e otro lado e la nariz y a una altura media

de 1,60 m del suelo. Tal es el aparato de que disponemos para

apreciar la sensación arquitectónica.

Neste texto que nos remete, também, para a herança musical da sua

mãe, Le Corbusier sublinha a importância que dá ao homem na

concepção do espaço. De facto, para este arquitecto o homem era o

elemento fundamental no processo de artificialização do espaço, pelo

que idealizou o tamanho padrão do homem (1,83m) e criou, através

Page 180: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

157

da divisão do corpo humano de forma harmónica e equilibrada e

agradável à visão, uma série de medidas proporcionais sustentadas

na matemática, produzindo uma sistematização, baseada na razão

de ouro, que servia para regrar os seus projectos e as suas pinturas.

Le Corbusier estava, realmente, consciente da necessidade de

ajustar o espaço à escala humana, o homem elemento natural, e

deste aspecto ser fundamental para enquadrar os novos conceitos

de habitar, e é desta perspectiva que nasce o Modulor, 82828282 um sistema

de medidas e proporções assente nos números de ouro que aplicou

de várias formas, nomeadamente, nas suas espirais que nasciam a

partir da colagem de rectângulos de ouro e dum mecanismo

matemático.

A importância desta inovação pode ser dimensionada nas próprias

palavras que Le Corbusier 83838383 proferiu, quando numa entrevista, foi

82828282 O Modulor foi apresentado ao público na primeira metade do século XX e que,

alguns anos depois, Le Corbusier obrigava-se a uma nova publicação baseada no

sucesso da primeira.

83838383 Los orígenes. In Vida y Obra de Le Corbusier [em linha]. Buenos Aires :

Arquitectura en Línea, 1997-2007 [Referência de 26 de Outubro de 2006]. Disponível

na Internet em: <http://www.arquitectura.com>.

Figura 39

O Modulor uma nova medida.

Figura 38

Esquiços do Modulor.

Page 181: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

158

confrontado sobre o trabalho desenvolvido com o Modulor:

Luca Paccioli escribo durante el Renacimiento La Divina

Proporcione, inspirada en cosas del pasado. El número de oro

Pitágoras. Yo aporté algo nuevo al número de oro gracias al

sistema métrico de la Revolución. (...) Antes eran el pie y la

pulgada, una escala humana. Y con el métrico perdimos eso ya

que despersonalizó los instrumentos de medida. El metro, el

centímetro, el decímetro no son de la escala, el modulor sí.

Tomé las proporciones desde el plexo solar hasta la cabeza e

el brazo y encontré la sección de oro allí.(...) Y creé un sistema

de dimensionamiento que responde a las dimensiones del

cuerpo humano.

Na sequência deste raciocínio, podemos perceber esta variedade de

dimensões harmoniosas à escala humana que podiam ser aplicadas

uiniversalmente à arquitectura e à indústria.

Na verdade, os resultados deste trabalho contribuíram de uma forma

definitiva para a mudança dos raciocínios e proporcionaram novas

abordagens no âmbito da arquitectura.

(…) Le Modulor s’est répandu dans le monde entier, il a été

adopté avec enthousiasme par quantité de praticiens et surtout

par la jeunesse. Il faut admettre qu’il était attendu, car les

Page 182: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

159

tâches modernes de la série, de la normalisation, de

l’industrialisation, ne peuvent pas être abordées sans

l ‘existence d’une gamme commune de dimensions. Le Modulor

en a proposé une. (Boesiger, 1995, V vol. p.173)

Page 183: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

160

4 . 3 . 4 . O F A S C Í N I O P E L A M Á Q U I N A

O tema da máquina interessou particularmente Le Corbusier e as

suas considerações relativas a este tema foram expostas em Vers

une Architecture (1923), um livro muito importante na arquitectura do

século XX, que reunia, com ligeiras modificações, os artigos

publicados durante 1920-21, na L'Espirit Nouveau.

Le Corbusier tentava incentivar os arquitectos da época para as

características particulares das construções industriais e das grandes

máquinas do mundo moderno. Estas obras seriam sinceras, simples

e nobres, face à falsidade da arquitectura académica. Para ele o

novo mundo industrial estava cheio de conotações positivas e

enquanto os arquitectos ensinavam aos jovens estudantes “(...) o

falso, o artifício e as obsequiosidades dos cortesãos”, os engenheiros

pelo contrário, pareciam-lhe diferentes: “(...) sãos, viris e saudáveis,

úteis e activos, morais e alegres". (Le Corbusier, 2000, p.6)

Na perspectiva de Le Corbusier, as ordens clássicas estavam mortas

e deviam ser substituídas por um modelo estético que simbolizasse a

era da máquina; revelava-se imprescindível criar um novo sistema

Page 184: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

161

simbólico, uma nova linguagem, mas se na nova imagem criada

abundam as metáforas e as analogias à máquina, 84848484 também não

deixam de estar presentes alguns princípios que marcaram o

classicismo, como a proporção e o rigor das ideias e das formas.

Continuando a fundamentação deste ponto de vista, Le Corbusier

(2000, p.166) propunha para a arquitectura as mesmas metodologias

industriais; "depois de se ter produzido nas fábricas tantos canhões,

aviões, camiões, vagões perguntamo-nos: Não se poderia fabricar

casas? Eis aí um estado de espírito completamente actual".

É a partir deste raciocínio de fabricação em série que Le Corbusier

(2000, p.67) sustenta a famosa definição: "Uma casa é uma máquina

de habitar. Banhos, sol, água quente, água fria, temperatura

84848484 A analogia entre a arquitectura e a máquina não era nova, Viollet –le- Duc figura

do racionalismo gótico do século XIX nas suas analogias “(...) buscava la

comparación con las máquinas, especialmente los barcos y las locomotoras. En esto

pudo estar influido por Fergusson o por su protector, Prosper Merimée quien se

lamentó, en varios artículos periodísticos, de que los arquitectos estuvieran

diseñando barcos de vapor tomando como modelos las galeras antiguas. La

analogía entre la arquitectura gótica e las máquinas era algo conocido desde hacía

tiempo. Ya en 1804, Friedrich von Schlegel comparó la catedral de Estrasburgo con

el mecanismo de un reloj.” (Collins, 1970, p. 164)

Page 185: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

162

conforme a vontade, conservação dos alimentos, higiene, beleza e

proporção. Le Corbusier, (2000, p.88) não duvida, pois, que:

Se o problema da habitação do apartamento fosse estudado

como um chassis, veríamos as nossas casas se

transformarem, melhorarem rapidamente. Se as casas fossem

construídas industrialmente, em série como chassis, veríamos

surgir rapidamente formas inesperadas, porém sadias,

justificáveis e a estética se formularia com uma precisão

surpreendente.

Nesta sequência de ideias Le Corbusier vai desenvolver vários

projectos em série, dos quais o mais conhecido é a casa Citrohan,

que no seu conjunto procuravam dar resposta à necessidade de se

"agir contra a antiga casa que usava mal o espaço. É preciso (...)

considerar a casa como uma máquina de morar ou como uma

ferramenta". Le Corbusier, (2000, p.180) inspirado nos métodos que

o industrial norte americano Henry Ford introduziu na sua empresa

com o famoso modelo “T” - a casa Citrohan era um jogo de palavras

que significava uma casa como um carro - tentava produzir casas em

série através da estandardização das principais peças e de Figura 40

Casa Citrohan (casas em série).

Page 186: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

163

processos que diminuiriam consideravelmente o preço das casas.85858585

Esta visão rígida de organização de trabalho que Le Corbusier

propunha para a construção da casa máquina, era baseada num

sistema de organização de trabalho desenvolvido pelo engenheiro

norte-americano Frederich Taylor e que, entre 1903 e 1909, ficou

conhecido como o taylorismo. 86868686

A casa Citrohan era cúbica, tinha a cobertura plana - numa fase

posterior tornou-se independente do território e deixou o solo para o

estacionamento - tinha alusões mediterrânicas e náuticas, e os

terraços assemelhavam-se a coberturas de barcos. A particularidade

da casa prendia-se com o pé direito duplo da sala, com uma galeria

85858585 Neste apelo à indústria propunha entre outros elementos a janela como elemento

mecânico que se devia tipificar na construção da casa: “on peut fabriquer une

nouvelle fenêtre combinable indéfiniment, à échelle nouvelle, basée sur l’emploi de

la glace ou du verre épais et l’application mécanique du coulissant de la fermeture

par excentrique”. (Boesiger, 1995, I vol., p.77)

86868686 Este sistema obedecia a uma ideia principal que tinha como finalidade a utilização

ideal da máquina, com base na importância essencial da preparação do trabalho

estabelecendo fases distintas que passavam pela concepção e execução e ainda

uma procura sistemática na economia de gastos.

Figura 41

Esquiço da Casa Citrohan.

Figura 42

Interior das casas em série.

Page 187: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

164

inspirada num café de trabalhadores de Paris; os interiores simples

reflectiam o rigor da planta funcional e a casa era bem iluminada

através de uma grande superfície envidraçada com alusões fabris

por onde se fazia o contacto com a natureza.

Nesta perspectiva é adequado vermos que a casa Citrohan estava

concebida para qualquer pessoa, em qualquer lugar, isto é, como um

produto abstracto da tecnologia mas, apesar da grande preocupação

do arquitecto em encontrar o ideal de máquina de viver, verificamos

que o contacto com a natureza, sempre presente nos seus projectos,

não é desprezado.

Esta casa é também importante por ter nela que que Le Corbusier

aplica os cinco pontos da nova arquitectura, as regras de um novo

sistema arquitectónico, cinco pontos esses que ficaram na história da

arquitectura moderna pois combinavam, sabiamente, a vertente

técnica e a vertente natural: os pilotis, a planta livre, a janela corrida

e a fachada livre, e a cobertura ajardinada.

A máquina era o conceito que servia de fundamento ao progresso

mundial e para o qual Le Corbusier utilizava um paralelismo filosófico

“para comparar los procesos del universo con un mecanismo que

funcionasse de acuerdo con leyes precisas” (Curtis, 1987, p.53), uma

noção que ele transpunha para a ideia de casa que funcionaria como

Page 188: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

165

uma máquina de habitar, o que não implicava que a casa fosse

apenas um objecto meramente utilitário pois deveria equacionar,

igualmente, um conjunto de questões de ordem geral, relacionadas

com o acto de habitar.

O principal objectivo da casa Citrohan era resolver o problema da

falta de casas na França do pós guerra e o arquitecto pretendia ver

as suas ideias aproveitadas pelas entidades competentes pois a sua

casa englobava quer o ideal de objecto funcional quer a categoria de

obra de arte, devido às suas “proporciones sensatas, unos espacios

agradables e la eliminación de la decoración injustificada y de los

hábitos sin sentido”. (Curtis, 1987, p.54)

Neste processo é notório o salto conceptual que se deu desde a

adequação económica e industrial até ao conceito estético, isto no

entendimento de que a palavra estética, em sentido comum, não só

se associa à beleza em todas as acepções deste termo, como

também designa a teoria da sensibilidade à beleza, em especial à

beleza artística e, por conseguinte, à arte.

Neste contexto Juan Ramirez (1986, p.9) coloca uma questão

pertinente, formulada a partir do prefácio da terceira edição de Por

uma arquitectura:

Por qué piensa Le Corbusier que muchas máquinas son

Page 189: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

166

verdaderas obras de arte? Mediante qué proceso mental la

casa-máquina pasa a ser considerada más hermosa que la

tradicional? La asociación, de origen platónico, entre pureza-

belleza va unida a la de máquina-sinceridad (o nobleza).

Cuando se maneja el cálculo – afirma Le Corbusier –uno se

halla en un estado de espirito puro y, en ese estado de espíritu

el gusto sigue los caminos seguros.

Continuando a fundamentação deste ponto de vista, este autor

prossegue:

(...) el arquitecto verdadero, aún siguiendo fielmente el ejemplo

del ingeniero, transcendería el mero utilitarismo mecánico para

entrar en el juego complejo de la expresión simbólica, con una

búsqueda consciente de la belleza.

A forma artística seria, então, o resultado lógico do problema bem

formulado, tal como os navios a vapor e os aviões, cuja forma

corresponde exactamente à função e, por conseguinte, seriam tão

belos como o Partenon.

O problema bem formulado, conforme Le Corbusier defendia,

ordenava e equacionava todos os dados e não deixava dúvidas

relativamente aos resultados.

Na sequência deste ponto de vista, parece-nos oportuno

Page 190: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

167

reflectir sobre o modo como Collins (1970, p.165) questionou a

beleza de um edifício e uma máquina: “Cuál es la qualidade de un

edifício que corresponda a la belleza del movimento en potencia?

Como se destigue entre la belleza del movimento de una máquina y

la máquina en sí misma?”87878787Segundo este autor:

(…) Pero aunque consideremos que las máquinas son bonitas,

o que poseen ciertas cualidades estéticas, es evivente que la

analogía mecánica comparte com la analogía biológica la

mesma desventaje básica cuando se aplica a la teoría

arquitectónica. Em ambas, la forma e o movimento están

inseparablement combinados.

Neste caso, o sentido de beleza pode ser associado à capacidade de

funcionamento do organismo vivo tal como a de uma máquina.

Contudo, a máquina é apenas a expressão física de um processo

que ocorre num determinado tempo e como a história tem provado,

87878787 Entenda-se que esta noção de beleza tem como antecedente o estudo sobre as

estrutras do passado a as máquinas pois Viollet- le- Duc apesar de considerar, por

exemplo, uma locomotiva feia admirava a potencia das suas funções.

Page 191: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

168

em pouco anos, a mais bela máquina pode-se transformar num

objecto morto.

No entanto, a mensagem de Le Corbusier era sem duvida o facto de

que as formas funcionais seriam sem dúvida belas e na sua época os

carros, os barcos eram os objectos com uma função precisa que

correspondia aos anseios da sociedade industrial.

El tiemplo griego se relaciona por su standardización con las

grandes máquinas que nos son tan familiares, y la lección de la

máquina se reduce así a tres generalizaciones: en primier lugar,

un problema bien planteado encuentra solución en forma

natural, en segundo lugar, ya que todos los hombres tienen la

misma organización biológica, todos tienen las mismas

necesidades básicas; y en tercer lugar, la arquitectura, como la

máquina debe ser un producto de selección competitiva

aplicada a estandards que deben determinarse por un análisis

lógico de experimentación. (Collins, 1970, p.167)

Como temos verificado a arquitectura passa por resolver um

problema relacionado com a forma e a função e cuja solução é

inequívoca. Argan (1996, p. 265) reduziu os dados desta equação a

um denominador comum com duas variantes: a natureza e a história

ou civilização, tentando ainda demonstrar que não se tratavam de

Page 192: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

169

contradições mas de entidades semelhantes que se poderiam

facilmente relacionar de forma simples. Por nosso lado e no âmbito

deste trabalho poder-se-á, mesmo, adicionar um outro dado à

equação e provar que, do lado da história e da civilização, a máquina

aparece, igualmente, como um elemento fundamental.

Page 193: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

170

4 . 3 . 5 . M Á Q U I N A D E H A B I T A R - C A S A

Le Corbusier, influenciado pelo Cubismo, 88888888 defendia a concepção do

espaço contínuo inseparável da envolvente - o edifício penetra a

natureza e é penetrado por ela –, em que a casa, paralelamente à

ideia de máquina de habitar, estabelecia uma relação permeável com

a natureza. Desta forma, a casa desenvolvia-se, em geral, suspensa

sobre pilotis para permitir um contacto mais directo com a natureza e

sem constituir qualquer obstáculo, conceitos que derivavam da

concepção cubista do espaço contínuo, plástico, habitável de forma

contínua em múltiplas dimensões e direcções. É nesta perspectiva e

no intuito de demonstrar a nossa hipótese que vamos, em seguida,

referir alguns exemplos que mostram o modo como Le Corbusier

constrói os seus trabalhos, relacionando o factor natureza com o

88888888 Tendência artística surgida no início do século que pretendia representar os

objectos retirando a sua aparência imediata, criar uma arte que se dirigisse

especialmente à inteligência e ao espírito, e que tinha como princípio que tudo na

natureza podia ser traduzido pelas formas básicas como o cone, o cilindro ou a

esfera; rejeitou as técnicas tradicionais de perspectiva bem como a imitação da

natureza.

Page 194: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

171

conceito da máquina de habitar e como estes dois aspectos

contribuem de igual modo para o processo de concepção.

O primeiro exemplo é a Ville Savoye considerada um dos pilares do

racionalismo arquitectónico europeu e que foi construída sobre um

imenso espaço verde. O lugar onde se inseria a casa não é

simplesmente um lugar onde a natureza podia ser contemplada, é

antes um lugar onde a natureza podia ser sentida de forma plena.

Aqui, a natureza aparece como condição essencial da arquitectura,

“Le Corbusier pousou a casa na relva como um objecto, sem

perturbar nada”. (Argan, 1988, p.387).

A casa assume-se como um paralelepípedo branco, suspenso entre

pilotis, o bloco superior torna-se muito leve devido às janelas

contínuas que o subdividem em faixas paralelas, mas desiguais com

uma certa proporcionalidade, não é monocromática mas assume-se

como um quadro purista. A cor branca, do bloco principal suspenso e

dos pilotis, demarca-se das paredes verdes do bloco inferior, bem

como do verde, do rosa e do azul das curvas dos elementos

superiores. O facto do edifício estar suspenso sobre o imenso verde

torna a sua relação com a natureza muito particular, que o próprio

arquitecto especifica “a fachada em quatro lados, aproveita a luz e a

vista da paisagem: é uma função pura e simples”. (Argan, 1988,

Figura 43

Ville Savoye.

Page 195: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

172

p.387)

A ideia geradora para o edifício é privilegiar a relação com a

natureza, quer na forma como se insere no território deixando o

máximo de área verde possível à superfície, quer na relação visual

dos seus longos rasgos. Contudo, é importante salientar que apesar

de na Ville Savoye o arquitecto valorizar a relação com a natureza, a

ideia da máquina está igualmente presente, conforme prova o acesso

ao edifício, feito através do automóvel, e a geometria inferior do

edifício, que é determinada em função do raio de curvatura do

veículo. É igualmente de notar que a entrada desta estrutura, por sua

vez, é materializada em vidro com alusões à era industrial,

indubitavelmente a casa representa, segundo Curtis (1987, p.98):

(…) una alegoría sobre la vida moderna ideal que afecta incuso

a las tipologías de Le Corbusier para la ciudad: niveles

separados para personas y coches, terrazas a cielo abierto, y

una rampa que exalta el movimento.

Forçosamente temos de reconhecer que neste projecto, apesar da

arquitectura moderna não dedicar particular interesse aos valores da

natureza, Le Corbusier assume a natureza como protagonista, em

simultâneo com ideias que defendia para a casa máquina de habitar,

superando, de forma brilhante e mais uma vez, a dicotomia entre o

Figura 44

Plantas da Ville Savoye.

Page 196: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

173

natural e o artificial. O edifício foi de resto considerado por Curtis

(1987, p.94) como a “imagen por excelencia de la machine à habiter,

una casa prístina y saludable abierta a la luz, el sol y las vistas por

encima de la vegetación”

No seguimento desta análise vamos encontrar uma outra obra

interessante de referir, a Petit Maison, que se situava no Chemim

Bergére, junto ao lago Léman, e que testemunha a vontade expressa

de Le Corbusier em construir uma casa com uma forte relação entre

a natureza e a ideia da máquina de habitar. Como ele próprio dizia,

trazia no bolso os dados da proposta, apenas precisava de encontrar

o terreno, e quando o encontrou concebeu um projecto no qual se

conjugam de forma clara dois factores, conforme definido

previamente pelo próprio arquitecto, (Le Corbusier, 1923):

Première donnée: Le soleil est au sud. Le lac s’étale au sud

devant les coteaux. Le lac et les Alpes qui s’y réfléchissent sont

devant, régnants d’est en ouest. Voilà de quoi conditionner le

plan: face au sud, il s’étend en longueur un logis de quatre

mètres de profondeur, mais dont le front mesure 16 m. Sa

fenêtre a onze mètres de long.

Seconde donnée: la machine à habiter. Des fonctions précises

avec des dimensions spécifiques pouvant atteindre en

Figura 45

O lugar - Petit Maison.

Figura 46

O circuito do sol.

Page 197: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

174

minimum utile: une marche économe et efficiente réalisant les

contiguïtés efficaces. Une superficie minima avait été allouée

pour chaque fonction, le total donnait 54 m. Le plan achevé, et

tout dégagement compris, la maison couvrait 60 m carrés, sur

un seul niveau.89898989

Neste projecto, percebe-se claramente a forte cumplicidade de Le

Corbusier entre aproveitar ao máximo os elementos da natureza e

conceber a casa como máquina de habitar. Apesar da Petit Maison

comportar uma forte relação com o lugar, esta casa poderia encaixar-

se na definição de Montaner, (2002, p.88) quanto às estruturas

espaciais de Le Corbusier, “procurava o mecanismo do protótipo que

lhe permitia produzir casas em série (horizontais ou compactas)”

contudo, neste caso, não se aplicou este princípio, pois,

curiosamente, a câmara considerou esta arquitectura um crime

contra a natureza e proibiu que ela fosse imitada.

Não obstante, e para além do equilíbrio entre o natural e a ideia de

89898989 LE CORBUSIER. Une petite maison, extraído de: Maison Corseaux, racontée por

Le Corbusier [em linha] [referência de 27 de Outubro de 2005]. Disponível na

Internet em:< http://www.athenaeum.ch/corbpem0.htm>

Figura 47

Esquiços de Le Corbusier

Page 198: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

175

máquina, esta casa reflecte também a grande preocupação do

arquitecto com o sol, preocupação essa que o arquitecto apresenta

na primeira premissa para a conceptualização da casa e que foi

objecto de pesquisa, durante anos, com a intenção de cruzar

técnicas antigas com técnicas modernas. É que se nos anos vinte, Le

Corbusier defendia que uma solução do tipo maquinista,

tecnicamente bem resolvida, permitia construir uma casa em

qualquer lado, nos anos trinta a sua opinião altera-se. Conforme

temos vindo a verificar, as preocupações de Le Corbusier com a

exposição solar são uma constante na sua obra, e na tentativa de

enquadrar o problema e na sequência das suas viagens ao norte de

África, pensou em algo equivalente para a Europa, porém moderno,

que funcionasse como as masharalias, ou quebra ventos de madeira,

dos edifícios árabes.

Nos apartamentos Ponsich, desenhados para a Argélia em 1933,

embora não tenham sido construídos, percebe-se como um edifício

alto pode combinar uma fachada de vidro com um painel de lâminas

protectoras de maneira a controlar a forma como o sol e a luz

atravessam o edifício. Igualmente no Palácio da Justiça, em Argel, os

brise-soleil foram integrados na estrutura, optimizando a relação

entre a luz e a sombra, uma solução de Le Corbusier que mais tarde,

quer na Índia quer na Europa, se revelaria de extrema

Page 199: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

176

importância.

Outro exemplo, este muito menos interessante, relativamente ao

tema da casa-máquina, é a casa Beistegui que em 1929 Le

Corbusier projectou para Beistegui, um milionário que pretendia uma

residência vanguardista. O tema principal desta habitação, nos

Campos Elísios, era uma promenade architectural, em torno de uma

escada de caracol e de um conjunto de açoteias que se escondiam

por detrás de planos elevados, de onde se descobriam os principais

monumentos de Paris, como a Torre Eiffel e o Arco de Triunfo; no

entanto podemos constatar que aqui, e talvez por se tratar de um

apartamento, a natureza foi artificializada na sua pior versão.

Interessa assinalar, contudo, que na casa Beistegui o fenómeno

técnico foi aplicado com um detalhe bastante arrojado para a época -

o controle visual de Paris era feito a partir de um periscópio rotativo

que saía de um elemento em forma de chaminé. Neste projecto

foram pensados vários tipos de dispositivos, como por exemplo, um

projector de filmes oculto, combinado com um processo automático

de persianas à base de roldanas e uma escada de caracol que se

enrolava à volta de uma coluna, em forma de rosca de vidro, numa

situação de antecipação da casa robotizada.

No projecto o arquitecto propõe, ainda, um conjunto de sebes que

Page 200: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

177

deslizavam no sentido ascendente e descendente, com a vegetação

a ser convertida em tapete, num resultado extremo do processo de

artificialização da natureza. “La vegetación – el gran emblema moral

de los planes urbanísticos ideales de Le Corbusier se convenía aquí

en una absurda alfombra que imitaba el césped”. (Curtis, 1987,

p.110)

Todavia podemos concluir que, independentemente da qualidade dos

resultados obtidos, as questões relativas ao natural e ao artificial

continuavam sempre presentes nos processos conceptuais e

construtivos deste arquitecto.

Page 201: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

178

4 . 3 . 6 . A M Á Q U I N A C O L E C T I V A - E D I F Í C I O S

P Ú B L I C O S

Para Le Corbusier as instituições públicas não deveriam reproduzir

qualquer tipo de monumentalidade, referências históricas ou

contextos políticos, ainda assim os seus edifícios públicos não eram

pensados, unicamente, como uma ampliação da casa máquina pois

era-lhes atribuído um carácter cerimonial e uma hierarquia

semelhante à de um palácio. Eram edifícios concebidos: “(...) como

máquinas colectivas que exaltasen los programas y los ritos de la

vida social contemporánea a partir de un substrato de reminiscencias

clásicas y de recursos ordenadores”. (Curtis, 1987, p.85)

O primeiro edifício público da era da máquina que Le Corbusier teve

oportunidade de desenhar, foi o projecto para o Concurso da

Sociedade das Nações em 1926. Para este concurso das Nações

Unidas chegaram propostas de todo o mundo e era evidente a

vontade de relacionar o homem, ser natural por excelência, com o

novo conceito que envolvia a máquina: nalgumas propostas, o modo

como se expressava a unidade mundial, através de formas

circulares, era demasiado óbvio; outras apresentavam edifícios que

sugeriam fábricas, símbolo do desenvolvimento tecnológico, como foi

Page 202: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

179

o caso das propostas de Richard Neutra e Rudolf Schindler, com um

projecto dum parlamento mundial suspenso sobre um lago; Hannes

Meyer, por seu lado, apresentava um projecto em que harmonizava

as duas vertentes, a Sociedade das Nações funcionaria como um

humanismo para elites, com formas industriais transparentes, criando

um parlamento do povo para todos: um edifício que expressava o

socialismo mundial.

Le Corbusier, por sua vez, entendia o edifício da Sociedade das

Nações como um espaço que acolhesse um conjunto de líderes, que

tinham como objectivo obter uma nova ideia de consenso para a

humanidade, e que se elevasse relativamente aos princípios do

nacionalismo. Nesta lógica, Curtis (1987, p.86) sustenta que Le

Corbusier concebeu:

(...) un límpido palacio de la era de la máquina para las elites,

que combinaba los principios de los cinco pontos de una

arquitectura nueva con una hábil interpretación de recursos

compositivos clásicos tales como ejes primarios y secundarios,

jerarquías entre lo cotidiano y lo ceremonial, y una

impresionante simetría en algunas de las fachadas.

No edifício do Secretariado, Le Corbusier articulou dois conceitos de

forma particular, por um lado o mito da máquina, por outro a natureza

Page 203: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

180

e os organismos. Combinava os planos deslizantes e a rotação

dinâmica na planta que denunciavam o movimento moderno com

uma clara hierarquia clássica de eixo e linhas de aproxim0ação,

alcançando uma escultura de volume redondo que centrava sobre si

o cenário paisagístico e o traçado diagonal do Quai du Présidente

Wilson. Na mesma linha de raciocínio, Curtis (1987, p.88) refere que

o edifício:

Mostraba cómo la planta libre podía descomponerse de dentro

a fuera, de modo que un edificio se convirtiera en un

mecanismo de partes discretas unidas por barras, o bien en un

organismo con glándulas alimentadas por arterias.

No Verão de 1926, Le Corbusier foi convidado pela Centrosoyus para

apresentar um projecto no concurso para a nova sede em Moscovo.

Vários factores marcavam de forma determinante as propostas, entre

eles, o programa funcional do projecto que associava trabalho e

lazer, situação que a vanguarda russa denominou de condensador

social. Outro factor importante foi o facto de nalgumas cidades

russas a arquitectura mecanicista ser uma tendência dominante,

como consequência das especificidades da própria época

revolucionária.

Nos anos anteriores, Le Corbusier tinha travado conhecimento com a

Page 204: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

181

vanguarda russa e com as ideias da revolução, que marcaram o

comunismo e o estado soviético, o que o ajudou a ter uma melhor

percepção das intenções simbólicas no concurso do Palácio dos

Sovietes, assim, continuando a fundamentação do mesmo ponto de

vista, Curtis (1987, p. 92) prossegue:

Su proyecto era un ejercicio premeditado de dinámica

escultórica, una reluciente máquina adaptada a las

necesidades de la circulación, la acústica y la estructura. En

planta parecía una figura mecanomórfica con cabeza, brazos,

una fina cintura y piernas (...).

Com efeito, no projecto do Centrosoyus percebe-se que o arquitecto

concebe uma estrutura em que se organiza um processo de simbiose

entre o fenómeno orgânico e o fenómeno técnico - o modelo da

máquina era essencial no mundo industrial. Le Corbusier combinou

de forma particular a ideia de organismo, um corpo com as suas

partes, com o fenómeno técnico, que aparece como uma evolução

da matéria viva, num processo em que o orgânico e o detalhe técnico

se constroem mutuamente.

Podemos notar que também neste projecto, à semelhança do

processo já utilizado para o concurso da Sociedade das Nações, Le

Corbusier concebe o auditório principal como:

Figura 48

Maqueta do projecto para o Palácio dos Sovietes.

Page 205: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

182

La cabeza del esquema, desplegando el resto de las funciones

a su alrededor en un collage construtivista que, con sus alas

extendidas y sus marquesinas curvas, evocaba la imagen de

un avión, y que se adaptaba a las diagonales de las calles. Los

pilotis eran de tamaños y perfiles diversos para acentuar los

diferentes elementos dentro de una jerarquía global, miestras

que las fachadas incluían un acristalamiento doble por cuyo

interior se debía impulsar mecánicamente aire frío o caliente.

Le Corbusier llamaba a este sistema de doble piel respiration

exacte(...). (Curtis, 1987, p. 89)

O arquitecto denuncia, assim, o modo como o mecânico e o orgânico

figuram mutuamente nos seus raciocínios conceptuais, no sistema de

aquecimento e ventilação do projecto de execucção do

Centrosoyus.90909090

90909090 Como o próprio arquitecto refere: “J’installe une usine à air exact. C’est une petit

entrepise quelques petits locaux, je fabrique de l’air à 18 degrés d’une humidification

conform aux besoin de la saison. Par un ventilateur, je souffle cet air dans des

gaines judicieusement disposées. Des moyens de détente de cet air ont été créés

annulant tout courant d’air. L’air émane. Ce régime à 18 degrés de temperature sera

notre système artériel. J’ai disposé un système veineux. J’absorbe au moyen d’un

Figura 49

Projecto para o Palácio dos Sovietes (1931).

Page 206: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

183

Em 1929, Paul Otlet, secretário da Union des Associations

Internationales, visita Le Corbusier com a intenção de criar, em

Genebra, um espaço dedicado à cultura mundial que consagrasse a

paz e o progresso, através de um intercâmbio multidisciplinar, e que

abrangesse todos os campos do saber. De certa forma visava-se

criar uma instituição que combinasse as faculdades intelectuais de

elite com as instituições públicas, uma ideia que resultava da tese de

Paul Otlet e que Le Corbusier (1983, p.59) resume:

(...) para administrar bien un mundo en remodelación (tal como

el maquinismo nos lo impone sin piedad) es indispensable

conocer el estado comparado de las naciones, de los pueblos,

de las razas, de las ciudades que participan hoy en el concierto

mundial, de donde: Edificio de los Continentes, Estados,

Ciudades, es decir urbanismo, es decir todo lo que os los

hombres en sociedad, en pueblos o en comunas han realizado

second ventilateur la même quantité d’air. Un circuit s’etablit. L’air respiré est rejeté

revient à l’usine à l’air exact. Là, il passe par les bains de potasse où il perd son

carbone. Il passe par un ozonificateur qui le régènère. Il vient aux batteries qui le (…)

refroidissent, s’il s’est trop chauffée dans poumons des habitants.” (Boesiger, I vol.,

p.211)

Page 207: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

184

bajo el signo de la cooperación, de la solidaridad.

Esta ideia de conceber um lugar, inspirador e coordenador de nobres

ideias era particularmente interessante para Le Corbusier e, nesta

perspectiva, concebeu o Mundaneum como uma acrópole, um

recinto de templos, um projecto teórico que o próprio autor

considerou de académico quer pela questão do programa, quer pela

questão das formas. Contudo, fê-lo com uma implantação real, a

encosta de Grand-Saconnex, junto ao lago Léman, em Genebra,

sobre a Sociedade das Nações; e a esta cidade elevada acedia-se

por uma via-sacra que começava no lago, através de um itinerário de

plataformas, pátios e rampas que terminava no santuário do museu.

Assim na perspectiva de Le Corbusier (1983, p.55) o Mundaneum:

(...) ha sido concebido sobre las bases más racionales de la

arquitectura moderna del hormigón armado y del hierro y con el

espíritu más estrictamente objetivo en todo lo que concierne al

acondicionamiento particular de cada uno de sus edificios.

A hierarquia axial deste conjunto podia confundir-se com a de um

qualquer arquitecto de formação Beaux-Arts, pois neste projecto, Le

Corbusier apontava para uma arquitectura monumental, onde

estavam presentes elementos da arquitectura tradicional ocidental,

como os pátios, os muros, os templos, as pirâmides em forma de

Page 208: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

185

escada. A pirâmide, essa, constituía o arquétipo de referência,

mostrando como uma forma do passado se pode enquadrar numa

imagem do futuro.

Porém, se por um lado o Mundaneum foi traçado com a ajuda da

secção de áurea e se propunha integrar os valores ideais e

universais que subsistiram a todas as épocas, por outro, os edifícios:

(...) eran flamantes monumentos de la era de la máquina

despojados de aderezos históricos, pero evocadores de los

esquemas de orden antiguos. El Museo Mundial (...) volvía al

arquetipo correspondiente tanto al zigurat como al tempo de

Salomón, es decir a la imagen de una montaña cósmica

mundial. En este caso las esquinas apuntaban a las direcciones

principales de la brújula. Su subía a la cúspide en ascensor y

luego se iba bajando por una serie de rampas de piendente

suave, experimentando el fluir do tempo desde el prehistórico a

lo moderno, y en cada giro el tamaño del edificio se hacía

mayor para incluir el volumen siempre creciente de saber.(...)

Como era habitual, Le Corbusier combinaba un microcosmo del

proceso histórico y una espiral orgánica relacionada con las

leyes naturales y las matemáticas. (Curtis, 1987, p.90)

Na Cité de Refuge conhecida, também, por Maison Salut, Le

Page 209: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

186

Corbusier teve oportunidade de fazer um edifício para albergar

pessoas desfavorecidas. O programa combinava alojamentos para

homens e mulheres, um infantário, uma cantina para residentes ou

visitantes e oficinas para formar trabalhadores.

No edifício, que acolhia o Exercito de Salvação, equivalente ao

condensador social soviético, o volume interrompia a malha

tradicional e pretendia assumir-se como um novo mecanismo

gerador de uma espacialidade, fortemente relacionada com a

vegetação e com a luz, que proporcionasse o bem estar e a

exaltação moral.

Neste projecto, novamente, sente-se a vertente técnica e orgânica,

sendo de assinalar que nos primeiros esquiços o edifício organizava-

se em dois blocos assentes sobre pilotis, com um jardim escavado e

uma ponte a assegurarem a ligação. Os pilotis duplos alinhados pelo

meio dos edifícios, canalizavam os percursos e “(...) armonizaran

tanto con el flujo de la circulación como con las nuevas curvas

orgánicas del edificio” (Curtis, 1987, 106)

Um auditório em forma de cunha reforçava a entrada e reconciliava a

geometria da rua com os blocos laterais. Os blocos tinham a frente

para sul completamente encerrada e as fachadas totalmente

envidraçadas para oeste, o edifício “era la imagen de una nueva

Page 210: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

187

machine à habiter bien definida que se oponía a los ruinosos edificios

en torno suyo: Le Corbusier lo calificaba como una usine du bien,

una fábrica del bien”. (Curtis, 1987, p.102)

Mais tarde, para dar resposta a uma mudança no programa e para

tornar a proposta mais simples, os blocos rodaram e converteram-se

num bloco único alargado com um plano compacto no limite sul.

Neste projecto, Le Corbusier tentou resolver os problemas de

ventilação e de calafetação do edifício com uma dupla pele de

respiração exacta, como podemos constatar este termo utilizado pelo

arquitecto permite analogias com organismos vivos e a sua obsessão

por superfícies envidraçadas recorda o entusiasmo do arquitecto

pelas fachadas das fábricas.

La cité de Refuge daba nuevos significados a la idea del

bloque. Las zonas públicas eran como trozos o fragmentos de

la planta libre que se hubieran puesto fuera del edificio. Se

asemejaban a dos pistones y las válvulas de un motor

desmontado. (...) A marquesina de acero sostenida por tubos

formando una “V” podía interpretarse como un puente levadizo

puesto cabeza abajo. Una referencia más precisa es al del

barco. (Curtis, 1987, p.102)

Efectivamente, os transatlânticos já formavam parte da iconografia

Page 211: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

188

do arquitecto, contudo, foi o seu regresso da América do Sul, a bordo

do Lutétia, em 1929, que lhe forneceu o mote derradeiro para a ideia

de uma cidade internacional flutuante.

Las alusiones náuticas se aprecian en el bloque largo con su

proa puntiaguda, en la chimenea, las cubiertas y muchas cosas

más. Presumiblemente la metáfora tiñe aquí un aspecto

adicional: un barco de salvación que rescata del olvido a los

náufragos de la sociedad. (Curtis, 1987, p. 102)

O pavilhão suíço, por sua vez, era um edifício destinado a albergar

estudantes e perseguia uma forte relação com a vegetação

envolvente e com a luz, pelo que o arquitecto propôs uma caixa de

aço e cristal bem proporcionada, apoiada em robustos pilotis de

betão armado e orientada para sul, para um terreno que seria no

futuro uma pista de atletismo.

No projecto, os quartos dos estudantes assumiam uma dupla

atmosfera, de camarote de barco e de cela de mosteiro; mais uma

vez, Le Corbusier incorpora o conceito de máquina de habitar em

plena natureza – a comunidade ideal flutuando em cima da natureza,

aliás, o arquitecto denuncia este facto quando apresenta a imagem

do edifício associada a uma imagem de vida ideal. Segundo Curtis

(1987, p.104)

Figura 50

Corte de um Transatlântico para ilustrar a vida colectiva

Page 212: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

189

Estas fotografías retóricas nos ofrecen una visión en blanco

y negro de un mundo ideal de cuerpos sanos y mentes

sanas, en el que la mecanización y la naturaleza marchan

en armonía al tiempo que los placeres esenciales - la luz, el

espacio y la vegetación - están a disposición de todo el

mundo.

Page 213: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

190

4 . 3 . 7 . M A C H I N E S À E M O V O I R 91919191

Em 1950, Le Corbusier projecta a capela de Nôtre Dame du Haut,

em Ronchamp. As premissas permanecem as mesmas, a procura da

relação entre o espaço construído e a natureza, combinadas de

forma particular com o factor técnico mas, aparentemente, este

projecto não se resolve com a proporção áurea ou com a ideia de

máquina de habitar, alguns autores excluem mesmo estes factores,

atribuindo a ideia do projecto a um golpe de força como é o caso de

Argan, ou como outros que classificam a capela como o monumento

do novo irracionalismo.

Efectivamente, quando se analisa esta obra tem-se a sensação de se

tratar de um acto isolado no percurso do arquitecto, bem aceite por

uns e muito criticada por outros, e de certa maneira esta obra afasta-

se dos princípios de concepção a que Le Corbusier nos tinha

91919191 Este termo foi utilizado em L’Esprit Nouveau nº 4 (1921) e, posteriormente, por

Fábio Müller, na tese de dissertação de mestrado: O templo Cristão na

Modernidade: permanências simbólicas e conquistas figurativas, na UFRGS, versão

reduzida em, Ronchamp e La Tourette: machines à emovoir.

Page 214: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

191

habituado; neste caso, o arquitecto rompe com o estilo canónico e

geométrico para constituir uma liberdade geométrica articulada,

segundo superfícies curvas, planos inclinados e rasgos assimétricas.

No entanto, na abordagem que faremos em seguida, tentaremos

provar que também neste projecto, o arquitecto cruzou de forma

híbrida os aspectos relacionados com a natureza e com a técnica.

Le Corbusier pertencia a uma família protestante, desde muito cedo

duvidou das religiões instituídas e a sua formação científica veio a

contribuir para o afastamento progressivo do mundo religioso.

Contudo, não era insensível às questões espirituais e na juventude

desenvolvera noções de estética e de verdade que aspiravam a uma

visão do mundo idealista. Efectivamente, na sua geração eram

comuns raciocínios que substituíam Deus por outros valores

espirituais, como beleza, natureza, geometria e sobretudo uma fé

verdadeira no ser humano.

As palavras de Le Corbusier expressam, de facto, estas posições:

Eu lutei, entre, por um lado, o Racionalismo fortemente imbuído

em mim por uma vida activa e pelo pouco de ciência que

aprendi na escola, e por outro, a inata e intuitiva ideia de um ser

Page 215: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

192

Supremo, que me é revelado aos poucos pela contemplação da

natureza. 92929292 (Benton. 1987, apud Mulller, 2005, p.2)

Inicialmente, Le Corbusier não aceitou o convite para projectar

Ronchamp, já que a relação anterior com as autoridades

eclesiásticas aquando do projecto para Sainte-Baume não lhe tinha

deixado grande vontade para desenvolver projectos religiosos,

apesar de curiosamente Le Corbusier ter a secreta intenção de

erguer um templo místico em Jura.

Mesmo assim, a vontade expressa do clero, segundo Ledeur e a

força do lugar convenceram o arquitecto a aceitar o convite:

Não temos muito para oferecer-te, mas temos o seguinte: um

cenário maravilhoso e a possibilidade de completar o trabalho.

Não sei se estás acostumado a projectar igrejas, mas se deves

construir uma, então as condições oferecidas em Ronchamp

são as ideais. Não é uma causa perdida: estás livre de criar o

92929292 BENTON, Tim. 1987. The sacred and the search for myths, in RAEBURN,

Michael,. Le Corbusier, Architect of the Century. p. 238 a 245.

Page 216: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

193

que quiseres.93939393 (1974, apud, Müller, 2005)

No projecto, Le Corbusier considerou a condição sagrada do território

e a relação especial com a força da natureza. Desde os tempos mais

remotos que a colina de Ronchamp era considerada sagrada, entre

outros aspectos pela sua particular exposição ao sol, tanto que na

Idade Média praticava-se, no local, o culto da Virgem, à volta de uma

esfinge com supostos poderes milagrosos. Mais recentemente,

precisamente em 1944, após os bombardeamentos, a colina ganhou

uma nova dimensão patriótica, associada à França livre, sendo

necessário, para acolher os peregrinos, erguer outra capela em

substituição da destruída.

Os seus primeiros esboçetos, entretanto perdidos, consideravam a

localização dos quatros horizontes e o percurso do Sol, elemento

natural sempre presente nos registos do arquitecto. É interessante

observar que neste projecto Le Corbusier tomou como referência a

natureza, o homem e o lugar, esquecendo um pouco a ideia de

93939393 Sobre este assunto Cônego Ledeur, em entrevista cedida em Março de 1974 a

Danièle Pauly. In PAULY Danièle.1997. La Chapelle du Ronchamp. Basel:

Birkhauser. p.59.

Page 217: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

194

máquina, combinando os factores técnicos com os materiais

utilizados. No entanto o local forçou à ponderação de dois aspectos

técnicos: um primeiro, relacionado com o facto de naquele sítio existir

pouca água e ser difícil transportá-la por se tratar de um ponto

elevado, o que implicava um dispositivo de armazenamento; e um

segundo, que era preciso resolver, prendia-se com as questões

acústicas, para as quais o arquitecto propôs formas curvas já

testadas, por si, anteriormente, em auditórios e em salas de reunião

de outras obras.

Assim, neste projecto, a planta de Ronchamp considera, tal como em

projecto anteriores, tanto as questões técnicas como as naturais,

embora combinadas de outro modo, segundo Curtis (1987, p.179).

“(...) el antecedente más próximo de la planta de Ronchamp debe

buscarse en las curvas cóncavas y convexas – evocadoras del

paisaje (...)”. Aliás, estas intenções verificam-se em vários esquiços

de conchas onde se percebe a manipulação entre os espaços

internos e externos, e foram, inclusive, reforçadas por Le Corbusier

pois, quando apresentou a maqueta da capela, fez questão de ser

fotografado junto de formas acústicas.

Em síntese, podemos concluir, tal como Curtis (1987, p.179), que no

processo de concepção do arquitecto se percebem saltos analógicos

Figura 52

Exterior da Capela de Nôtre Dame du Haut.

Figura 51

Planta e corte da Cisterna de águas pluviais

Page 218: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

195

que podem ter sido inspirados quer em questões funcionais: “un

carapazón de cangrejo (...), el casco de un barco, recuerdos de

esclusas o saltos de esquí, o perfil y la estructura de las alas de un

avión”, quer em semelhanças formais e estruturais, inclusive em

ressonâncias de linguagem: “en francés coquille significa concha ou

carapazón y coque casco de barco”.

Apesar de na maioria dos testemunhos deixados por Le Corbusier da

forma em betão se poder assemelhar à proa de um navio, tema

muito explorado pelo autor, na capela de Ronchamp podemos

encontrar também:

Dimensões calculadas pelo Modulor, o púlpito em betão à vista,

a mesa do altar em pedra, a sacada da galeria do coro, os

blocos verticais das fontes e o volume ortogonal do

confessionário, elementos estáticos que contrastam com os

limites curvos côncavos e convexos das paredes e da

cobertura. (Müller, 2005)

O que prova que o homem está sempre presente nos mecanismos

conceptuais de Le Corbusier.

Este contraste, combinado com o jogo de luz e sombra,

proporcionava ao visitante uma experiência intensa, de certo modo

mística e cósmica, que incentivava a espiritualidade e a emoção

Figura 54

Planta da Capela de Nôtre Dame du Haut.

Figura 53

Esquiço da Capela de Nôtre Dame du Haut.

Page 219: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

196

humana. Daí que a capela fosse considerada como machine à

emovoir.

No projecto de La Tourette, Le Corbusier privilegia o homem e

apesar de se tratar, também, de um edifício religioso, o Mosteiro da

Ordem Dominicana denominado, igualmente, de machine à emovoir,

tem mais diferenças do que semelhanças com Ronchamp, contudo a

semelhança que nos interessa prende-se com o modo como o

homem se relaciona com o espaço: “De même que pour la Chapelle

de Ronchamp, Le Corbusier trouve un programme d’échelle humaine

à l’échelle humaine.” (Boesigner, 1995, VI vol. p. 16)

Na realidade, o programa funcional era completamente diferente:

pretendia-se combinar um programa de um mosteiro com uma igreja,

onde se privilegiasse o recolhimento, a meditação e a experiência

interior do indivíduo “a arquitectura e a natureza são agentes

contraditórios e, portanto, o diálogo entre o edifício e a paisagem é

de contraste (...)”. (Müller, 2005)

Le Corbusier foi polivalente no mundo das artes, participou em

movimentos que influenciaram as formas de pensar e teve como

objectivo primordial a procura da funcionalidade em todos os

espaços, suprimindo os elementos decorativos e ornamentais.

O fundamento do racionalismo de Le Corbusier é cartesiano,

Page 220: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

197

conforme o próprio assume, o seu desenvolvimento é iluminista, de

tipo rousseauniano, colocando em primeiro lugar a funcionalidade e a

felicidade individual. Na sua morte em Agosto de 1965, André

Malraux, define o arquitecto como:

Fue pintor, escultor e más secretamente poeta. No luchó ni por

la pintura, ni por la escultura, ni por la arquitectura. Su famosa

frase: Una casa es una máquina para vivir no lo pinta bien; si lo

hace otra frase: La casa debe ser el estuche de la vida, la

máquina de la felicidad. 94949494

Nesta perspectiva confirma-se o facto de Le Corbusier considerar a

sociedade um elemento fundamental e que a sua ligação com a

natureza originária não podia ter limites. O arquitecto tinha o dever

de fornecer à sociedade uma condição natural, e ao mesmo tempo

racional, que acompanhasse o desenvolvimento tecnológico, pois, o

destino natural da sociedade é o progresso.

Ao longo do seu percurso, Le Corbusier (1983, p.19), ao contrário de

94949494 Los orígenes. In Vida y Obra de Le Corbusier [em linha]. Buenos Aires :

Arquitectura en Línea, 1997-2007 [Referência de 26 de Outubro de 2006]. Disponível

na Internet em: <http://www.arquitectura.com>.

Page 221: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

198

alguns colegas que se indignavam com o mito de máquina

destruidora de vida, percebe que o contributo da máquina é

fundamental para a evolução do homem: “nosotros, al contrario,

queríamos llegar a aprender la lección de la máquina, a fin de

abandonarla después a su simple papel, que es el de servir”. Para

ele, o conceito da máquina estendia-se à sociedade e os fenómenos

novos da história do homem: “Le maquinismo nos ha dado un

aspecto de nuestro mundo absolutamente nuevo, aspecto que los

otros siglos no podían revestir.” (Le Corbusier, 1983, p. 23)

Como se tentou demonstrar nesta análise, relativamente à obra de

Le Corbusier, podemos considerar que nos seus projectos ele

propunha uma simbiose entre o natural, a partir da ideia de

organismo, e a evolução técnica, criando espaços ajustados às

exigências do homem moderno.

Numa entrevista, quando questionado sobre a importância do betão

enquanto elemento estrutural na sua obra, Le Corbusier reconhece

que, tecnologicamente, este elemento abriu-lhe um universo de

possibilidades e permitiu-lhe construir um universo de formas muito

variado. Contudo, nessa mesma entrevista, quando lhe perguntaram

porque razão não se deixou dominar por este material, Le Corbusier

deixa claro a sua posição:

Page 222: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

199

No, lo que me dominó es el animal humano, el núcleo familiar,

la familia, el logar. Es darle al ser humano su cáscara. Mi

arquitectura es como un organismo vivo, es biológica. Tiene un

suporte óseo, hay fuerzas musculares, redes sanguíneas y

nerviosas. (...) Todo lo impecable de la biología lo puse en mis

casa”. 95959595

Sem dúvida, Le Corbusier foi um visionário pleno de ideias e de

conceitos inovadores que alterou profundamente a arquitectura do

seu tempo, e conquanto que a sua intervenção não se tenha limitado

à arquitectura - foi também escritor, pintor, e escultor, ainda que este

estudo não se tenha debruçado sobre estas vertentes -, certamente

que as suas prestações mais positivas se revelaram enquanto

arquitecto e pensador revolucionário.

De facto, a importância da máquina na arquitectura de Le Corbusier

não se pode restringir à incorporação de novas tecnologias no acto

de construir, ela constituiu-se historicamente enquanto conceito e

95959595 Los orígenes. In Vida y Obra de Le Corbusier [em linha]. Buenos Aires :

Arquitectura en Línea, 1997-2007 [Referência de 26 de Outubro de 2006]. Disponível

na Internet em: <http://www.arquitectura.com>.

Page 223: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

200

acompanhou o processo de evolução no acto de habitar do homem

do século XX.

Page 224: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

201

5 . S I N T O N I A E N T R E O H O M E M E A M Á Q U I N A

5 . 1 . F R A N K L L O Y D W R I G H T

5 . 1 . 1 E N T U S I A S M O P E L A M Á Q U I N A

Frank Lloyd Wright perspectivava a arquitectura como reflexo da vida

moderna e desde o início do seu percurso profissional desenvolveu

uma contínua rejeição das convenções românticas e dos processos

de concepção desenvolvidos com base em conceitos históricos,

muito comuns no início do século XX e que, em seu entender, não

traduziam de forma alguma a actualidade.

À semelhança de Ruskin e Morris, Wright defende o papel

fundamental da natureza na vida do homem, contudo, não

desvaloriza a máquina, antes pelo contrário, Wright percebe a sua

importância e quando promove a fusão do homem e da natureza,

considera a máquina um forte aliado na evolução do ser humano e,

principalmente, da arquitectura, pois, segundo Montaner (2002,

p.28), “nos instrumentos mentais de Wright ocorria uma sintonia

perfeita entre o mundo da máquina e o mundo da natureza”. Nesta

reflexão, vai tentar fazer-se uma análise comparativa de alguns

trabalhos que testemunham o modo como este arquitecto utilizou

quer a natureza, quer a máquina, nos seus processos

Page 225: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

202

criativos, desmistificando um pouco a ideia de que Wright assumia

uma posição exclusivamente mais próxima da arquitectura orgânica,

ideia essa defendida, inclusive, pelo próprio arquitecto e um conceito

presente em vários estudos que tentam determinar até que ponto a

arquitectura de Wright não é indiferente à máquina nem à influência

da tecnologia.

Com efeito, desde muito cedo, Wright manifesta o seu interesse pela

máquina, tanto que em 1901, leu publicamente o manifesto The Art

and Craft of the Machine, (Wright, 1931) onde deixa transparecer o

seu entusiasmo pelas locomotivas, barcos a vapor e máquinas

industriais, visionando que os edifícios do futuro estariam, por

conseguinte, condenados a libertarem-se dos aspectos que os

ligavam à história e que o espaço teria de ser reequacionado com

base na vida moderna.

À máquina caberia o papel de cumprir essa tarefa e, já nessa altura,

a posição do arquitecto estava tendencialmente associada à dos

pensadores mais progressistas, em particular, de arte e de

arquitectura. Porém, essas ideias mantiveram-se circunscritas aos

Estados Unidos e não tiveram muitos adeptos na Europa, antes da

Primeira Guerra Mundial, à excepção de Anatole de Baulot que

proclamava a decadência do arquitecto em favor do engenheiro,

Page 226: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

203

considerado l’homme moderne par excellence, sendo, no entanto, de

referir que apesar da distância entre os continentes europeu e

americano, existia uma certa semelhança no modo como as

questões relativas à máquina eram enquadradas.

Wright reconhece, também a problemática entre a arte e a máquina,

contudo a sua posição é clara visto que defende sempre a

necessidade de aceitação da máquina como facto inquestionável na

evolução da humanidade. Efectivamente, “Wright tem uma fé tão

inabalável na máquina que prevê uma possibilidade de salvação para

o artífice: basta que este se resolva a aprender humildemente com a

máquina”. (Pevsner, 1936, p.36)

Logo no princípio da sua actividade, Wright recusa a mescla de

estilos que predominam no final do século XIX, defendendo que a

forma do edifício deve adaptar-se à função e à envolvente,

valorizando a coerência e as qualidades estruturais e estéticas dos

materiais utilizados na construção.

Assim, numa fase inicial da sua arquitectura, projectou espaços

Page 227: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

204

habitacionais, as prairie style 96969696, aplicando alguns conceitos do

movimento Arts and Crafts. Eram espaços caracterizados por perfis

baixos onde estava presente a horizontalidade, os espaços interiores

eram fluidos e percebia-se o esforço por integrar a construção na

paisagem envolvente. É curioso notar esta aparente dicotomia em

Wright que, ao mesmo tempo que defendia a importância da

máquina, construía as suas casas envolvidas em ambientes naturais,

onde abundavam os elementos verdes, e no interior das habitações

reinava a fluidez e a funcionalidade do espaço.

96969696 Termo com que ficaram conhecidas as casa construídas por Wright entre 1900 e

1911. Ele apreciava a prairie pela tranquilidade, pela sua grande simplicidade e

pelos aspectos naturais, as árvores, as flores, o contraste do céu, conforme revelou

na sua primeira autobiografia em 1932.

Figura 55

Prairie house.

Page 228: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

205

É também de assinalar que, logo nestes projectos, está presente a

preocupação com a funcionalidade e com a noção de espaço, uma

das prioridades de Wright, tornar “o espaço mais espaçoso (...) e

poderá haver um sentido de espaço em qualquer edifício, seja ele

grande ou pequeno”. (apud, Pevsner, 1936, p.35) Aliás, este

arquitecto sempre definiu a sua arquitectura como orgânica,

exactamente porque evoluía naturalmente da necessidade funcional,

em vez de derivar de uma forma predefinida.

Não obstante, importa assinalar que o fascínio pelos aspectos

naturais, que de certa forma eram desprezados no movimento

moderno, não o impediu de experimentar a utilização de novas

técnicas construtivas, como é o caso do projecto do Unity Temple no

Oak Park (1905-1908), em que utilizou o betão armado, explorando

não só as suas capacidades estruturais, como também as suas

Figura 56

Prairie house.

Page 229: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

206

potencialidades, colocando este material à vista e revelando uma

atitude pioneira, numa época em que os seus contemporâneos

cobriam o betão com pedra ou tijolo.

Wright’s embracing of concrete’s plasticity at both the small and

large scale was particularly significant in his development of a

new kind of concrete block. He believed that the concrete could

“be printed, goffered while fresh and wet” which “would be

nearer to its nature, aesthetically, than” other casting

techniques. He thought impressed concrete patterns were

reminiscent of those in stone from ancient leaves and other

organic life. It was vaguely implied that naturalness of the

phenomenon in stone reflected favorably upon impressions in

concrete block. (Patterson, 1994, 116)

Na verdade, e também desde os primeiros trabalhos, Wright

manifesta um conhecimento profundo e um grande respeito pelos

materiais, respeito esse que o distingue dos outros arquitectos da

sua época e mesmo de posteriores: a pedra, o tijolo e a madeira,

apesar de serem materiais antigos, agora redescobertos para

responderem às exigências de modo original e Wright utiliza-os

sempre da maneira que considera mais natural. De facto, verificava-

se que em grande parte da arquitectura do séc. XIX, não só os

Page 230: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

207

materiais naturais eram desdenhados, como também os materiais

novos, como o betão, o aço, o metal e o ferro eram utilizados de

forma desactualizada mas Wright, por seu lado, pressentiu que estes

novos materiais, assim como os novos métodos, seriam uma óptima

solução para a arquitectura do século XX.

Em 1909, apesar do sucesso que o seu trabalho já alcançara, Wright

sentia-se insatisfeito e começou a preparar material para a sua tese,

denominada de Ausgefuhrte Bauten und von Frank Lloyd Wright,

mais conhecida por Wasmuth Portfolio, um trabalho em dois

volumes, repletos de planos inovadores e de perspectivas com

visões de futuro, e que coincidiu com uma viagem do arquitecto pela

Europa, pelo que foi amplamente divulgado, em especial na

Alemanha e na Holanda, contribuindo de forma eficaz para o

desenvolvimento da arquitectura moderna.

Quando Wright regressou aos Estados Unidos, em 1911, iniciou a

construção de Taliesin, um novo conceito de escola a que nos

dedicaremos mais adiante, e retomou a sua carreira com dois

grandes projectos, o Hotel Imperial de Tóquio e os Midway Gardens

em Chicago, tendo, ainda nesta fase, construído algumas habitações

onde empregou o novo sistema de block concrete systeme.

Efectivamente, desde muito cedo que Wright vira na máquina uma

Page 231: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

208

importante ferramenta, tanto assim que, em 1915, decorrente do seu

igual fascínio pela ideia dos pré-fabricados, começou a trabalhar com

base no American Ready-Cut System Houses, revelando que as

suas ideias eram bastante mais evoluídas do que as possibilidades

da indústria da época permitiam mas, em Los Angeles, as quatro

casas em blocos de betão, construídas entre 1917 e 1924, provam

de que modo Wright utiliza a técnica num dos seus processos de

construção, numa resolução inovadora para a época, “(...) the

machine should be a tool in the hand of the artist. In this case, the

machine was the form, or mold, into which the concrete was poured

in order to form the block.” (Pfeiffer 1991, p.26) Com efeito, aqui, a

máquina foi de facto, um utensílio na mão do artista, a máquina foi a

cofragem para produzir os blocos de betão que, na época, eram

considerados um elemento pobre da construção, nunca utilizado

como acabamento final. Mais uma vez, Wright colocou a indústria ao

serviço da construção, trabalhando e transformando materiais com o

auxílio da máquina, situação que estenderá a outros materiais da

indústria da construção, como placas de metal, cobre, alumínio, tudo

elementos que ao longo de toda a sua obra, ele trabalha para aplicar

nos seus edifícios, de forma inovadora.

Page 232: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

209

Wright’s approach to concrete masonry is consistente with that

to other materials. He appears to have focused on the

properties he thought potentially beautiful, to have violated

others in lieu of larger goals, and to have never let the nature of

the material in its entirety dictate the direction of the design.

Compared to that of other architects of the mid-20th century,

however, Wright’s use of block was far more demonstrative of

its nature in his strongest examples and only slightly less

expressive than the norm in his weakest. (Patterson, 1994,

p.150)

Page 233: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

210

5 . 1 . 2 . A E M E R G Ê N C I A D E U M A N O V A E S T É T I C A

Na primeira metade dos anos vinte, Lewis Mumford 97979797 travou

conhecimento com a arquitectura de Wright, apenas, por fotografias,

publicações ou pelo testemunho de colegas, como Mendelsohn que

mencionou superficialmente a obra de Wright em Stieks and Stones,

98989898 e mais tarde no jornal holandês Wendingen, quando este dedicou

uma edição especial ao arquitecto americano, Mumford foi convidado

pelo editor Hendricus Wijdeveld a contribuir com um artigo.

Neste artigo é curioso notar o modo simplista como Mumford

equacionou as críticas em três aspectos principais, numa visão

97979797 Inicialmente, Mumford interessa-se pelo trabalho de Wright nomeadamente pela

sua relação com Sullivan, primeiro arquitecto modernista norte-americano com quem

Wright trabalhou no início da sua carreira.

98989898 Mumford conheceu o trabalho de Wright através de um trabalho conhecido como

Usable Past. Este projecto de investigação da produção criativa do séc. XIX, foi

referida em Stieks and Stones e nos quatro livros seguintes, resultado da avaliação da

arquitectura americana bem diferente da análise estilística comum, pois Mumford fazia

a análise social das formas e funções dos edifícios. Esta obra foi bastante criticada em

especial pelos mais conservadores.

Page 234: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

211

antecipada da globalidade da arquitectura de Frank Lloyd Wright. No

primeiro, considerou Wright como um seguidor de H. H. Richardson e

Louis Sullivan, no segundo, classificou Wright como opositor ao

machine like funcionalim, emergente no seio dos modernistas

europeus, como era o caso de Le Corbusier. O terceiro considerava

o trabalho de Wright a síntese ideal para a reunião de dois aspectos

fundamentais, a funcionalidade e a paisagem americana. É de

salientar que estas ideias iriam mais tarde ser reiteradas num outro

artigo, The Poison of Good Taste no The American Mercury.

Na sequência, deste artigo Mumford e Wright começaram a

correspondência que precedeu uma longa e atribulada amizade.99999999

Em Agosto de 1926, Wright era já, a meio da sua carreira, um

arquitecto mundialmente considerado e Lewis Mumford era um

comentador e crítico cultural, em ascensão, que ambicionava ter um

grande protagonismo intelectual. Mumford considerava que Wright

ocupava um lugar de destaque na arquitectura moderna, no entanto,

para Wright, as críticas de Mumford, quando positivas, apenas

99999999 Esta correspondência foi publicada recentemente (2001), Frank Lloyd

Wright+Lewis Mumford: Thirty Years of Correspondence.

Page 235: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

212

legitimavam o processo criativo, mas quando negativas provocavam

profundas inseguranças criativas. Geralmente, estas críticas, não

eram bem aceites e apesar de ter existido um relacionamento

relativamente intenso em algumas fases, Mumford resistiu sempre a

uma amizade mais próxima, pois não pretendia grandes influências

que pusessem em risco a credibilidade das suas críticas.

A arquitectura era o tema principal da actividade de Mumford,

nomeadamente, no que se relacionava com a necessidade de

adaptação da vida moderna. Depois de ler Architecture and

Democracy, de Claude Bragdon, e constatar a sua abordagem

orgânica ao desenho moderno, não hesitou em considerar Wright o

maior defensor do conceito de arquitectura orgânica e, no entanto,

apesar de ambos rejeitarem a confusão das grandes cidades e dos

arranha céus, não tinham o mesmo entendimento, pois Mumford

preferia a reconstrução das cidades com base no modelo de cidade

tradicional, e Wright defendia a iluminação da cidade tradicional.

Aliás, em 1930, Wright publicou The Disappearing Citty, no qual

apelava à descentralização radical das cidades americanas, ideias

que mais tarde estarão na base da Broadacre City.

Contudo, se neste aspecto, da revitalização das cidades, discordam

profundamente, há outro com o qual Mumford concorda plenamente

Page 236: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

213

com Wright, nomeadamente no que respeita à sua subordinação ao

conceito mecânico ou technic – um termo que o crítico valorizava,

cada vez mais, face às exigências do mundo moderno, e sobre o

qual escreveu:

His architecture though he has pioneered with modern methods

of construction and delighted in mechanical techniques, is not

merely a passive adaptation to the machine age: it is a reaching

toward a more biotechnic economy, better grounded in the

permanent realities of birth, growth, reproduction, and the

natural environment than is the dominant order of paper values

and merely mechanical efficiencies. 100100100100 (Mumford, 1926, apud,

Pfeiffer+Wojtowicz, 2001, p.14)

Duas grandes controvérsias, a propósito de duas importantes

exposições de arquitectura, vão envolver Mumford e Wright. A

primeira foi originada pela exclusão de Wright da World’ Fair, de

1933, igualmente conhecida como Century of Progress Exposition. O

arquitecto Raymond Hood, co-responsável da exposição, decidiu

100100100100 MUMFORD, Lewis. 1926. The Brown Decades: A Study in American Experience

and Culture. New York : Boni and Liveright. p.168 e 169.

Page 237: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

214

afastá-lo, com a justificação de que o arquitecto não tinha perfil para

trabalhar em equipa e, apesar dos esforços de Mumford junto de

Hood e de várias reuniões nesse sentido, a inclusão de Wright não

veio a acontecer.

A segunda controvérsia foi a propósito de Modern Architecture:

International Exhibition, no Museu de Arte Moderna de Nova Iorque.

O museu tinha a intenção de apresentar uma exposição sobre o

tema International Style com especial incidência na nova estética da

máquina, que se desenvolvia na Europa e que se diferenciava dos

edifícios revivalistas românticos da arquitectura americana da época.

Henry-Russell Hitchcock, Jr. seleccionou um grupo de New Pionners

que incluía no núcleo principal Gropius, Mies van der Rohe, Oud e Le

Corbusier, este último com particular destaque.

Wright tinha sido excluído da exposição, o que gerou uma certa

discordância, nomeadamente por parte de Mumford que entretanto

assumiu uma posição de mediador, defendendo que seria um

enorme vazio para a arquitectura americana deixar Wright à margem

daquela exposição. Em Março de 1931, Philip Johnson convidou

Mumford a participar na parte da exposição dedicada à habitação,

pois o crítico tinha importantes conhecimentos nesta área, derivados

da sua participação na Regional Planning Association of America e

Page 238: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

215

em empreendimentos habitacionais desenvolvidos na Europa.

Este convite reforçou de forma extremamente importante a posição

de Mumford como mediador para a inclusão de Wright na exposição,

tanto assim, que Johnson, apesar da posição do seu colega

Hitchcock, solicitou a participação de Wright no evento. Wright, por

sua vez, contribuiu com o projecto de House of the Mesa, um

projecto que comprovou, de facto, que Wright era

inquestionavelmente um arquitecto pioneiro do século XX.

Esta exposição foi, igualmente, importante no confronto da

arquitectura de Wright e dos seus pares, pois foi possível observar

que, pese embora a distância e a aparente diferença entre o orgânico

de Wright e o fascínio europeu pelo betão, as suas posições não

eram tão antagónicas como à partida se podia pensar, e é nesta

sequência de ideias que Mumford vai concluir que a habitação

apresentava uma maior qualidade do que a arquitectura, de uma

forma geral:

Mr. Wright’s work is not so far away from the best European

architecture as he imagines – or as they perhaps do. His new

buildings have lost the ornamental exuberance of the Midway

Gardens and the Imperial Hotel: they are more in the line of his

earlier houses. Meanwhile, the Europeans have moved nearer

Page 239: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

216

to Wright: passing from dogma to building, they have lost a little

of their in ferro-concrete as an absolute, they have acquired

some of Wright’s love for natural materials, his interest in the

site and the landscape, his feeling for the region” 101101101101 (Mumford,

1923, apud, Pfeiffer+Wojtowicz, 2001, p.17)

Em 1932, Wright pretendeu construir um novo conceito de escola, a

Taliesin Fellowship, uma experiência de jovens arquitectos que

trabalhavam no atelier de Wright, executavam projectos e, também

trabalhavam na agricultura. O método de ensino era inspirado na

investigação e na arte e filosofias orientais, pelas quais Wright se

interessava, pois via na arquitectura japonesa uma ligação profunda

entre o homem e a natureza, em que a importância do passado não

assumia uma posição histórica, antes consubstanciava-se numa

continuidade orgânica entre o homem que evoluía através duma

relação íntima com a natureza, baseada na contemplação e na

meditação.

Esta escola-casa de Wright desenvolvia, assim, um processo de

101101101101 MUMFORD, Lewis. 1923. The Sky Line: Organic Architecture. New Yorker. 27 th

February 1923, nº 8. p.45.

Page 240: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

217

ensino diferente do da Bauhaus, tinha uma posição muito familiar

com os seus discípulos e nesta comunidade, em que se privilegiava

uma forte relação com a natureza e com os materiais, o arquitecto

assumia, de certa forma, a posição de um sábio oriental. Os

processos tecnológicos, esses, eram enquadrados em comunhão

com a natureza e os alunos aprendiam a compreender o espírito dos

materiais e a espacialidade do lugar. Em relação à arquitectura, esta

perspectivava-se como uma construção natural como o crescimento,

um princípio fundamental que aparenta derivar directamente das

ideias de Goethe, embora não tenha sido possível ao longo deste

trabalho comprovar se Wright, alguma vez, teve contacto directo com

a sua obra.

A natural plan grew in all directions. (It was Goethe’s idea that

architecture outht to appeal primarily to our sense of bodily

movement, and that thus a man blindfolded and led through a

well- planned house should experience pleasure like that we

feel in dancing). Wright’s best plans created delight in the

unfamiliar, but gradually revealed a rigorous logic. Their great

reach asserted a new freedom of shelter in nature, and their

rooms were bathed in light and air. In his more compact plans,

the major rooms often followed a single axis, forming a great

vista through the interior and past casement windows or

Page 241: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

218

glass door, past porches and terraces, and on into the

landscape. (Hoffmann, 1986, p.41)

No final de 1934, Wright e os seus alunos começaram a construir, na

sequência do projecto The Disappearing City, um modelo em

madeira a grande escala, a Broadacre City, um projecto para a

descentralização urbana. Podemos constatar que este projecto

combinava de forma particular uma área urbana extensa, em que os

arranha céus que Wright desprezava, se situavam numa estrutura

agrária, em longos campos, como um conjunto de comunidades

constituídas por zonas residenciais, com casas de vários tamanhos,

construídas em parcelas de um acre e economicamente acessíveis.

Além de zonas habitacionais concebiam-se, ainda, zonas comerciais,

zonas agrícolas, e os meios de comunicação privilegiados eram o

Figura 57

Projecto para Broadacre City.

Page 242: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

219

automóvel e um modelo experimental de helicóptero.

Apesar de Mumford divergir do arquitecto no que diz respeito ao

conceito de cidade, este crítico considerou o contributo de Wright

importante no planeamento urbano da paisagem e das novas

cidades, ainda que não tenha poupado críticas negativas aos

modelos habitacionais com os quais discordava, pois defendia o

modelo de terrace-block housing baseado na sua experiência na

Regional Planning Association of America:

The weakest point in Broadacre City is the design of the minimal

house. Wright, who hates the very word housing, has created a

design for single-family houses for the lower-income groups

which compares very unfavorably, I think, with the European

and American housing he detests. He should have permitted

himself to dream more generously. As soon as he reaches the

level of the two-car house, he shows that he is still our most

original architect, as capable of producing beauty in

standardized units as in his favored materials that spring out the

Page 243: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

220

earth.102102102102 (Mumford, 1935, apud, Pfeiffer+Wojtowicz, 2001, p.19)

Na sequência deste projecto, Wright criou o ideal, igualmente

utópico, de casas baratas Usanion, de um só andar, que permitiam

uma forte relação com a arquitectura e a natureza, tirando o máximo

partido da paisagem americana e, embora utópicos, estes projectos

tiveram a virtude de introduzir uma unidade para Wright, a reunião

entre a natureza e a produção de casas em série.

Os anos 30 trouxeram a Wright prestígio nacional e internacional,

firmado ainda mais por dois importantes projectos, a casa Kaufmann

na Pennsyvania (1935), e o S. C. Johnson et Son Headquarters

Building em Racine, Wisconsim (1936), que permitiram novas

possibilidades tecnológicas, referimo-nos, nomeadamente, à

utilização de betão armado. De facto, em Wiscousin, Wright, constrói

um espectacular edifício de escritórios transparente da era da

máquina, em contraste com os pilares de betão sustentados por

traves em forma de cogumelos, mais uma vez incorporando materiais

e métodos em inúmeras soluções inovadoras.

102102102102 MUMFORD, Lewis. 1935. The Sky Line: Mr. Wright’s City-Downton Dignity. New

Worker II, 27th April 1935.

Page 244: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

221

Wright defendia o transcendentalismo e, como outros adeptos desta

doutrina filosófica, considerava a natureza de modo quase místico,

atribuindo à natureza um lugar fundamental no desenvolvimento

psicológico do homem. Este respeito pela natureza é bem expresso

no modo como Wright sempre se referia a ela, escrevendo esta

palavra com “N” maiúsculo do mesmo modo que escrevia Deus, aliás

costumava afirmar “Nature is all the body of God we will ever

know”.103103103103

Wright considerava que o contexto natural era fundamental para a

evolução positiva do homem e da arquitectura e propôs soluções

para a arquitectura que provam que se pode viver em harmonia com

a natureza.104104104104

103103103103 WRIGHT, Frank Lloyd, Wallace Mike. The life and work of Frank Lloyd Wright

[em linha] : Mike Wallace’s interviews with Frank Lloyd Wright. New York : Public

Brodcasting Service, 1957 [referência de 25 de Novembro 2007]. Disponível na

Internet em: <http: www.pbs.org/flw/buildings/index.ht>.

104104104104 Considerando a natureza como pretexto foi publicado um artigo na revista

Arquitectura nº 269, que deu origem ao artigo A casa sobre a natureza. A vila

Malaparte e a Casa da Cascata.

Page 245: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

222

5 . 1 . 3 . F A S C Í N I O P E L A N A T U R E Z A

O projecto que assimila, de forma inquestionável, esta ideia é a casa

construída para a família Kaufmann. Esta casa, também conhecida

como a Fallingwater, foi construída num elemento natural por

excelência, uma cascata de um pequeno riacho de 6km, Bear Run.

Mal conheceu o lugar, Wright ficou impressionado com o ruído das

cascatas, a vitalidade do bosque recém plantado e o poder das

rochas, considerando-os, de imediato, elementos a ponderar no

projecto. Assim, logo nos primeiros estudos, decide implantar a casa

justamente sobre a cascata, conceptualizando uma solução em

profundo respeito pela natureza.

É neste sentido que podemos afirmar que Wright faz com que a

natureza seja o pretexto do projecto, uma forma que surge do

crescimento orgânico, incrustada na própria natureza:

(…) a casa aparece firmemente ancorada à solidez do terreno

e, apesar dos seus amplos planos envidraçados, é protectora

no seu interior como uma caverna, parece, enfim, falar de um

mundo em que o homem e os processos naturais, o artificial e o

Figura 58

Casa Kaufmann.

Page 246: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

223

natural se encontram em total harmonia. (Muñoz, 2000) 105105105105

Na Casa Kaufmann, a especulação racional, própria da natureza

intocável, assume um valor superior a qualquer outro, a casa é

colocada no interior da natureza, o volume decompõe-se num

conjunto de sequências horizontais sem remate de cobertura,

sustentadas pelo eixo vertical da grande chaminé em pedra.

Neste projecto, Wright não considerou nenhuma estrutura fixa para

erguer o edifício, a casa desprende-se em elementos sequenciais

que vão crescendo organicamente como nos organismos vivos.

Apesar da imersão da casa na natureza e dos contrastes naturais

produzidos pela simbiose entre o natural e o artificial, podemos

afirmar que, da arquitectura da época, este será o melhor exemplo

em que o artificial foi totalmente controlado pelo arquitecto; aqui, o

mais importante não foi obedecer a uma qualquer imagem moderna,

mas, antes, estabelecer uma relação de harmonia entre a natureza e

a produção do homem, comprovando, novamente, o fascínio de

Wright pela arte japonesa.

105105105105 O texto original de Kaufmann, JR., Edgard, foi publicado no Prólogo de Frank L.

Wright’s Fallingwater. The house and Its History.

Figura 59

Casa Kaufmann.

Figura 60

Casa Kaufmann – o natural e o artifical fundem-se em harmonia.

Page 247: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

224

Na casa da cascata podemos ainda constatar o significado da

arquitectura orgânica para Wright: eliminação de um volume espacial

de formas geométricas rígidas, espaço constituído a partir de um

sistema dinâmico, dimensionado a partir da existência do homem,

provando que a vida é um elemento essencial para a criação do

edifício.

No New Yorker, Mumford fez uma crítica muito favorável a propósito

da exposição fotográfica da Kaufmann House:

The perpectual youngness and freshness of his mind were

never better shown than in this treatment of this extraordinary

problem. The site would have frightened any conventional

architect out of his wits. Wight uses the opportunity to

demonstrate that when the need arises he can swing a

cantilever across space, using the method of construction not as

a cliché of modernism but as a rational engineering solution of

real problem. 106106106106 (1938, apud, Pfeiffer+Wojtowicz, 2001, p.20)

Em 1937, a escola Fellowship instalou-se temporariamente em

106106106106 MUMFORD, Lewis.1938. The Sky Line: At Home, Indoors and Out. New Yorker ,

February 1938, nº 13, p.31.

Page 248: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

225

Phoenix, no Arizona, e Wright continuou o seu trabalho que ia sendo

cada vez mais divulgado, de tal forma que, na sequência de um

conjunto de palestras em Londres, várias revistas, como o

Architectural Forum, Time e An Organic Architecture, dedicaram-lhe

artigos. É então que Wright, com o intuito de proteger o seu trabalho,

cria a Frank Lloyd Wright Foundation.

Entretanto, o desentendimento a propósito da Broadacre City

provocara a interrupção da correspondência que Wright e Mumford

mantinham há alguns anos e Mumford, por seu lado, continuou a

crítica a Broadacre City no The Culture of Cities, obra com a qual

este crítico foi internacionalmente reconhecido no estudo da história

e do planeamento das cidades. Mas apesar do desacordo quanto a

Broadacre, Mumford continuou a valorizar o trabalho de Wright,

embora limitando-se à arquitectura residencial, conforme expressou

em Abril de 1941, numa palestra, Daney Lectures, no Alabama

College, e publicada como The South in Architecture.

Mesmo assim, os contactos entre ambos tornaram-se bastante

agressivos e foram agravados por posições políticas divergentes,

porquanto Mumford assumia abertamente a sua posição contra o

nazismo e o fascismo, e Wright opunha-se veementemente ao

envolvimento dos Estados Unidos, na Segunda Guerra Mundial. Esta

Page 249: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

226

discórdia criou um vazio de 10 anos em que não se comunicaram,

contudo não impediu que Mumford, continuasse a admirar o

arquitecto, conforme prova a carta a um amigo, o poeta John Gould

Flecher:

I should say he is one of great architectural geniuses of our

time; nor merely that, but of any time (...) He has more

imagination in his little finger than most of his contemporaries

have in their whole organism; and his combination of the poet

and the engineer is a rare one, though the poet is sometimes

capricious and (the) engineer uses his great talent to perform

stunts. (Pfeiffer+Wojtowicz, 2001, p.23)

Os dois só voltam a relacionar-se em 1951, a propósito de Sixty

Years of Living Architecture, a maior Exposição da obra de Wright,

que se inaugurou em Filadélfia e que esteve patente em várias

cidades americanas e europeias. Em Itália, a exposição foi tão bem

recebida que o arquitecto foi mesmo homenageado e, a pretexto

deste acontecimento, Wright vai enviar a Mumford o prefácio da

exposição, provocando no crítico uma comoção sincera, resultante

quer do teor da dedicatória, “in spite of all, your old F.Ll.W.”

(Pfeiffer+Wojtowicz, p.193), quer deste facto coincidir com a

conclusão da biografia do seu filho, morto enquanto cumpria o

Page 250: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

227

serviço militar. No Green Memories, Mumford iria defender o

ressurgimento e valorização do amor como uma atitude fundamental

para a sobrevivência da humanidade.

Outro acontecimento importante desta fase foi o facto de Mumford

convencer Wright a contribuir com um dos seus primeiros trabalhos

The Art and Craft of the Machine, para a colecção Roots of

Contemporary Architecture 107107107107, o que não deixa de ser curioso visto

que Wright, nesta altura, estava assumidamente associado à

arquitectura orgânica, porém, Mumford não se esquecera que o

arquitecto desde muito cedo se tinha virado para a máquina.

Como já foi salientado várias vezes, neste trabalho, Wright

classificou os seus edifícios como uma arquitectura orgânica,

contudo convém esclarecer, que não esqueceu por isso a

designação que foi utilizada pelo seu mestre Louis Sullivan form

follows function, mas que Wright, tanto no seu trabalho como na

interpretação desta designação, leva mais longe do que Sullivan.

Para Wright o orgânico supunha a evolução da necessidade

107107107107 Este trabalho pode ser consultado em, The Art and Craft of the Machine, p.169-

185.

Figura 61

Esquiço do Museu Guggenheim de Nova Iorque.

Page 251: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

228

funcional e não a aplicação de uma forma determinada. Na verdade,

para Wright a arquitectura orgânica era uma arquitectura onde todas

as partes são ligadas e onde todas almejam um melhor rendimento:

continuidade e totalidade. Mas, dentro de um contexto ainda mais

lato e mais profundo, ele afirmará que um edifício orgânico, qualquer

que seja a sua data de construção, tem que se adequar à função, à

época e terá que convir ao homem.

Um exemplo disso é o Museu Guggenheim de Nova Iorque. Na

concepção do espaço museológico e do percurso expositivo, Wright,

procura “a unidade orgânica entre o espaço e a estrutura” (Montaner,

2002, p.28) lembrando o movimento em espiral de algumas plantas.

Apesar deste ensaio sobre a obra de Wright abordar, quase

exclusivamente, a sua posição relativamente aos aspectos orgânicos

e técnicos, consideramos que o elemento importante, presente em

todos os trabalhos de Frank Lloyd Wright, e que domina todas as

reflexões é, indubitavelmente, o dos valores humanos. Este

elemento, que ele denominou de humanidade, ocupa o lugar central

em qualquer edifício por ele concebido.

No fim da sua vida, em 1957, Wright escreve, Un Testament, um

livro, em parte autobiográfico, que passa em revista as suas obras,

os seus princípios fundamentais, as realizações e os resultados

Figura 62

Foto da espiral do Museu Guggenheim de Nova Iorque.

Page 252: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

229

obtidos. Ele resume, assim, as forças da sua obra e, também, as

forças da arquitectura, tal como ele a entende e que o último capítulo

do livro, esclarecedoramente intitulado La humanité – Lumiére du

Monde, sintetiza:

Constantly I have referred to a more humane architecture, so I

will try to explain what humane means to me, an architect. Like

organic architecture, the quality of humanity is interior to man.

As the solar system is reckoned is terms of light-years, so may

the inner light be what we are calling humanity. (Pfeiffer, 1991,

p.36)

Não podemos terminar este capítulo sem nos voltarmos a referir ao

admirador e maior crítico de Wright, Mumford, e ao seu

relacionamento de trinta anos. Após a morte de Wright ficou um vazio

na sua crítica que não foi preenchido por nenhum arquitecto, pois

nenhum outro trabalho espelhou melhor os princípios orgânicos e

humanos defendidos por Mumford. No fundo, os dois opunham-se à

arquitectura americana da época e ambos acreditavam que a

arquitectura podia revitalizar a sociedade, cada vez mais ameaçada

e fragmentada, e cada um, à sua maneira, lutou a favor da

arquitectura orgânica adaptada à sociedade humana e ao meio

natural.

Page 253: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

230

Architecture thus rises as a metaphor of nature. Nature’s

inexhaustible models of organization are recognized as its

greatest gifts. A building conceived as a perfect organism can

rise with dignity from even the most dismal urban site as a total

work of art. The clear expression of a characteristc visual idea

achieves a living presence like that of a noble individual.

Architecture can claim its place beside every tree and flower.

(Hoffmann, 1986, p.39)

Page 254: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

231

5 . 2 . A L V A R A A L T O , H U M A N I Z A R A

A R Q U I T E C T U R A

5 . 2 . 1 . A N A T U R E Z A C O M O P R E T E X T O

Nesta abordagem que pretendemos fazer sobre o modo como os

arquitectos, do século XX, constituíram os universos conceptuais

com base em processos lógicos sustentados no natural e no artificial,

considerando, neste último caso, a máquina como paradigma

principal, podemos considerar Alvar Aalto como o arquitecto que

mais contribuiu para a humanização da arquitectura.

Efectivamente, este arquitecto valorizava de modo particular o ser

humano e se bem que subscrevesse os princípios funcionalistas,

tinha consciência de que o funcionalismo técnico, por si só, não

definia a arquitectura e, portanto, defendia a necessidade de criar

novos conceitos.

Sans se réfugier dans un romantisme qui rejette les avantages

techniques et économiques des temps modernes, el reconnut

les dangers de la technique et tenta de démontrer qu’elle peut

être mise au service de l´homme, plutôt que l’inverse. (Fleig et

al,1992, vol I, p.13)

Page 255: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

232

Neste sentido, Alvar Aalto utilizava a natureza como elemento para

humanizar a arquitectura, num processo que podemos considerar

como a transposição do elemento natural para a construção artificial.

A natureza é, assim, integrada no projecto e assume-se como uma

parte de um todo, ocupando um determinado papel no conjunto,

sustentando, desta forma, os pressupostos do funcionalismo.

No entanto, Alvar Alto soube reconhecer que a expressão de Sullivan

era demasiado redutora no modo como defendia que a forma devia

ser inseparável da função. De facto, para os funcionalistas o edifício

não podia ser entendido sem o seu aspecto funcional, pois a

experiência técnica da arquitectura assentava na função, com a

utilidade a revelar-se uma propriedade fundamental do edifício. Com

efeito, Alvar Aalto deu-se conta de que os critérios funcionalistas não

eram suficientes para definir a arquitectura, uma vez que eram

aplicados à posteriori, ou seja, num momento da adequação do

edifício à função.

Importa assinalar que a aspiração principal do funcionalismo era

produzir industrialmente uma arquitectura habitacional, com

condições aceitáveis em termos de higiene e de preço, pelo que a

reforma social do funcionalismo estava direccionada para os

habitantes da cidade, dando azo a um método de trabalho analítico e

Page 256: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

233

racional, radicado nos ideais da cultura da máquina.

Assim, no pós guerra, a funcionalidade e a técnica ganharam uma

dimensão particular porquanto havia a necessidade de construir, em

grande quantidade, habitações funcionais a preços acessíveis, pelo

que se produziram algumas mudanças ao nível das habitações, no

sentido de rentabilizar as dimensões, flexibilizar o espaço e ensaiar

soluções de estandardização.

Embora Alvar Aalto tenha alicerçado a sua relação com a

arquitectura internacional em meados de 1928, quando organizou em

Helsínquia uma exposição sobre o tema habitação mínima e, depois,

quando viajou para a Europa a fim de participar no CIAM de 1929,

foi, de facto, a reconstrução a que se procedeu após o fim da

Segunda Guerra Mundial, que possibilitou o reconhecimento dos

arquitectos finlandeses e, consequentemente, a sua afirmação na

vanguarda internacional. É importante referir que a Finlândia não

tinha tradição académica e que a arquitectura apresentava tradições

assentes no classicismo, conquanto este fosse aplicado de forma

muito simplificada, com base na arquitectura tradicional nórdica,

cujas obras mais antigas eram construídas em madeira, um método

de construção muito comum e que foi sempre utilizado por

arquitectos, em diversas zonas do país.

Page 257: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

234

Outro aspecto importante, que devemos salientar para perceber o

contexto da arquitectura na Finlândia e o trabalho de Aalto em

particular, é o facto de na paisagem nórdica predominarem,

constantemente, a natureza e o meio natural, e os edifícios serem

sempre enquadrados em forte cumplicidade com a estrutura e a

escala da natureza.108108108108

Alvar Aalto não nega nem a tradição finlandesa, nem a herança

nórdica e, por conseguinte, os dois aspectos, atrás referidos, vão

influenciar a sua arquitectura, onde a natureza aparece como um

elemento fundamental, quer nos edifícios mais clássicos, quer nas

últimas obras. De facto, ao analisarmos o trabalho deste arquitecto

reconhece-se, no início da sua actividade, um forte classicismo

romântico, influenciado em Asplund,109109109109 e, mais tarde, marcas do

108108108108 Na Finlândia, já antes da Segunda Guerra Mundial, a natureza tinha sido fonte

de inspiração para obras de arquitectura, como as obras de Erick Bryggmam e de

Peima Pietilä que eram marcadas por uma vertente orgânica. Pietilä procurava,

inclusive, desenhar edifícios parecidos com as formas naturais, inspirando-se em

rochas, conchas, copas de árvores, perfis de peixes e de outros animais.

109109109109 Apesar da formação deste arquitecto ter como base os princípios da escola

romântica, os seus trabalhos revelam uma versão pessoal e modernizada do

Page 258: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

235

racionalismo e do construtivismo, mas podemos, igualmente,

constatar que privilegia, sempre, a relação entre o homem e a

natureza, e relega a máquina para um plano marginal.

neoclássico, no seu percurso, percebe-se que adopta formas do racionalismo

emergente na Europa contudo interpretado de forma mais livre e espontânea, numa

vertente que se pode considerar orgânica.

Page 259: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

236

5 . 2 . 2 . F U N C I O N A L I S M O E O H O M E M

Na fase em que Aalto assumiu o modelo funcionalista, o melhor

exemplo, ainda que na Biblioteca de Viipuri e na sede de Turum

Sonamat, também, possamos constatar essa influência, foi, sem

dúvida, o Sanatório de Paimio, um projecto que viria a ser um marco

na arquitectura mundial e em que todo o trabalho de investigação,

sobre o funcionamento do edifício, foi efectuado com o pessoal que

iria trabalhar na obra.

O edifício era um volume esbelto composto por vários corpos, que se

desenvolvia numa área extensa em vários ângulos e aberturas

variadas. O objectivo de Aalto, decorrente das características

terapêuticas do edifício, era orientar da melhor forma possível o

maior corpo do volume, correspondente ao quarto dos doentes, pelo

que, este edifício em altura, foi construído de forma a obter uma boa

exposição solar e a proporcionar uma ventilação adequada. “La

ventilation mécanique n’entre pas en ligne de compte, car c’est l’air

Figura 63

Planta de do Sanatório de Paimio.

Page 260: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

237

frais, riche en ozone, qui importe dans la thérapeutique. “110110110110 (Fleig et

al, 1992, I vol. p. 31)

A exposição solar, porém, condicionara de forma particular o

processo conceptual, todavia, o arquitecto não se deixou limitar pela

sua formação racionalista e tentou conciliar a máxima funcionalidade

do programa, sem ser de uma maneira estática ou definitiva.

Efectivamente, o sol foi sempre um factor importante nas obras de

Aalto, pelo que Argan considera, neste caso, ser esse o modelo ideal

de Aalto, conforme afirma: “o modelo ideal de Gropius era uma

máquina em movimento, o modelo ideal de Aalto é o relógio solar;

110110110110 Neste edifício que podemos considerar praticamente de fenêtres ouvertes “La

seule ventilation mécanique du sanatorium se trouve à la cuisine, elle est installée de

sorte qu’on puisse se dispenser de portes entre la cuisine, l’office et la salle à

manger. Un canal en verre à compartiments évacue l’air vivié, comme dans les

fabriques de papier. Quatre compartiments de ventilation sont disposés au-dessus

des marmites et chacun évacue un pourcentage moindre dans mesure où il est placé

plus haut. Le dernier n’absorbe plus que les ultimes traces d’odeurs. Ce système

fonctionne à satisfaction et, surtout, il évite le va-et-vient des portes.”(Fleig, et al,

1992, I vol. p. 40) Este exemplo é um dos que prova que Aalto utiliza a técncia de

modo a dar mais qualidade aos espaços.

Page 261: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

238

não há porque um relógio solar deva ser menos racional que uma

máquina.” (1988, p.414)

Não podemos esquecer que neste projecto as preocupações de

Aalto estendem-se ao nível da utilização plena do espaço,

desenhando os equipamentos e, especialmente, podemos constatar

nesta estratégia uma forte cumplicidade com a técnica, provando que

a técnica podia ser uma mais valia para o ser humano, como é o

caso do mobiliário de madeira flexível. Efectivamente, Aalto, no

próprio Sanatório, procedeu a várias experiências ao nível do

mobiliário, com vista à construção de peças leves, flexíveis, fáceis de

limpar, enfim, adequados à sua função. Este mobiliário concorria com

as características das peças cromadas, que começavam a ser

construídas na Europa, contudo, o arquitecto não queria, aplicar este

tipo de material, pois entendia que estas superfícies tubulares não

eram bons materiais para aplicar em peças para o uso do ser

humano.

After extensive experimentation in wood, the flexible system

was discovered and a method and material combined to

produce furniture which was better for the human touch and

more suitable as the general material for the long ands painful

life in a sanatorium. (Schildt, 1997, p.106).

Page 262: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

239

Esta preocupação com o factor humano vai, aliás, ser assunto de

duas publicações de Alvar Aalto: em 1935, num artigo, intitulado O

racionalismo e o homem, vai criticar a utilização inadequada da

iluminação artificial na arquitectura, em geral, destacando,

principalmente, a dos hospitais que não tinha em conta as condições

específicas dos pacientes, e, também, a nova cadeira produzida com

os modos de fabricação e de produção modernos; e cinco anos mais

tarde, em A humanização da arquitectura, 111111111111 vai salientar os

exemplos do Sanatório de Paimio (1929-33) e da Biblioteca de Viipuri

(1927-35) para ilustrar que a finalidade da Arquitectura é sempre a

de compatibilizar o mundo material com a vida humana, focando as

experiências que efectuou no sanatório, ao nível da relação do

doente com o quarto e ao nível da melhor utilização deste espaço

pelo indivíduo. Foram estas experiências que o levaram a projectar o

quarto em função da pessoa deitada, já que era nesta posição que

os doentes estavam na maior parte do tempo, e que o levaram a

introduzir algumas inovações nas cores das paredes e do tecto, e na

111111111111 Cujo sub-título era: O funcionalismo para se tornar verdadeiramente eficaz, deve

optar um ponto de vista humano, o que revela bem os princípios que defendia para a

arquitectura.

Figura 64

Estudos de ângulos de incidência da luz solar na Biblioteca de Viipuri.

Page 263: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

240

localização da iluminação natural, da iluminação artificial, do

aquecimento e, mesmo, das janelas e das portas. Também a

necessidade de resguardar o indivíduo de ruídos perturbadores,

levou a que nos quartos duplos se insonorizassem paredes ou se

concebessem os lavabos de forma a diminuir o som provocado pelos

jactos de água.

Apesar de podermos considerar este período como a fase em que

associamos Aalto ao funcionalismo, não podemos esquecer, como

foi referido anteriormente, que se denotava já nos mecanismos

conceptuais deste arquitecto, uma abertura para uma linguagem

mais expressiva que se afastava do rigor das linhas geométricas. Isto

mesmo, podemos verificar na Biblioteca de Viipuri, de 1934,

nomeadamente, no espaço interior da sala de conferências que

Aalto, por razões acústicas, modelou com paredes ondulantes de

madeira e por razões de iluminação prevê superficies cónicas no

tecto da biblioteca.

L’ éclairage est une chose essentielle dans une bibliothèque.

Ici, la lumière pénétrait par des lanterneaux coniques de 2 m de

diamètre environ. Les disques horizontaux en verre possèdent

des qualités qui évitent les fissures risquant de se produire

dans un climat rigoureux.

Page 264: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

241

Le soleil ne donne pas directement dans la salle mais se trouve

réfléchi par les surfaces coniques des lanterneaux, ce qui

dispense d’employer des verres opaques. Cette lumière diffuse

est particuluèrement agréable pour le lecteur qui n’importe

quelle place sans avoir l’inconvénientde l’ombre ou des reflets.

(Fleig et al, 1992, II vol. p.49)

Mais uma vez e tal como no sanatório, o arquitecto finlandês

ultrapassa os limites impostos pela necessidade de responder às

questões funcionais e técnicas, percebendo-se neste projecto uma

vontade expressa de adequação do espaço ao homem, em que a

arquitectura devia harmonizar o mundo material com corpo, conforme

ele próprio expõe:

The main problem connected with a library is that of the human

eye. A library can be well constructed and can be functional in a

technical way even without the solving of this problem, but it is

not humanly and architecturally complete unless it deals

satisfactorily with the main human function in the building that of

reading a book. (Schildt, 1997, p.104)

E com as competências humanas:

The problem of reading a book is more than a problem of the

eye; a good reading light permits the use of many positions of

Page 265: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

242

the human body and every suitable relation between book and

eye. Reading a book involves both culturally and physically a

strange kind of concentration, the duty of architectural is to

eliminate all disturbing elements. (Schildt, 1997, p.106)

Efectivamente, Aalto, mesmo na fase funcionalista, estava já muito

atento às necessidades humanas e se voltarmos à sua obra O

racionalismo e o homem, em que expôs a sua teoria da necessidade

de alargamento do conceito de racionalismo, podemos ver que

defendia a inclusão de características psicológicas na

conceptualização, como forma de alargamento do modo de trabalho

racional e para que os resultados obtidos fossem mais humanos.

Aalto preconizava, aqui, a possibilidade de incluir a Psicologia nas

qualidades exigidas aos objectos, e isto, inclusive, como contraponto

a uma diversidade incaracterística de objectos de formas cubistas

onde abundavam tubos cromados, placas de vidro e combinações de

cores várias, considerados por ele de um modernismo formalista

duvidoso mas que, entretanto, proliferavam, numa tentativa de

resposta à acusação de que a Arquitectura Moderna se revelava

inumana, por estar assente em métodos estritamente racionais.

É nesta dualidade que podemos sustentar a nossa convicção de que,

duma forma geral, Alvar Aalto é um dos arquitectos que melhor

Page 266: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

243

representa, em simultâneo, o funcionalismo e a arquitectura

orgânica. Na realidade, o trabalho de Alvar Aalto oscilou sempre

entre a pesquisa de soluções aplicáveis à produção de casas em

série e esse processo de inspiração na natureza, procurando, assim,

a reunião de espaços funcionais e ecológicos, no que se pode

considerar de estandardização elástica,112112112112 ideia que Montaner (2002,

p.106), também, corrobora:

As obras de Alvar Aalto foram se convertendo em manifesto de

uma arquitectura que conseguia ser orgânica emotiva, humana

e realista empregando os mecanismos modernos do

racionalismo, do funcionalismo e da abstracção.

A Villa Mairea vai funcionar para o arquitecto como um espécie de

ensaio ideal para testar este modelo, já que em toda a envolvente

existia natureza que, por seu lado, se apresentava em alinhamentos

verticais sucessivos e diferentes. Segundo Montaner (2002, p.106):

“A Villa Mairea, uma obra cheia de contrastes e justaposições,

112112112112 Esta expressão utilizada por Alvar Aalto, expressa claramente as suas ideias

relativamente à uniformização dos modelos produzidos em série e, em simultâneo, à

necessidade de adaptar esses modelos às variações possíveis de um qualquer

corpo.

Figura 65

Desenhos da Villa Mairea.

Page 267: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

244

integra o princípio popular com o moderno e o industrial e apresenta

uma relação com a natureza que não é meramente, mimética.”

Na casa, a arquitectura funciona dependente do homem, o natural e

o artificial entrelaçam-se logo, desde a pérgola da entrada, numa

sintonia perfeita entre o construído e a natureza, neste caso, a

floresta. Trata-se de uma casa em que a função habitacional

combina com múltiplas sensações, criando uma atmosfera interna

acolhedora e calma. Um pátio cria a transição entre o artificial e a

natureza, e estabelece relações de continuidade entre a casa e o

percurso da floresta marcando, por um lado, uma forte identidade,

por outro lado, os limites dos edifícios que compõem a vila (a sauna,

a pequena elevação artificial, os muros e as cercas em madeira)

foram traçados artificialmente, no solo da floresta, como se

crescessem da própria natureza.

É um projecto em que os diversos materiais utilizados foram também

elementos importantes na integração dos edifícios e na

caracterização do espaço conjunto. As paredes brancas, a pedra, a

terra, a presença da madeira no seu estado natural, assumem

diferentes expressões nesta intervenção, em que o natural e o

artificial se confunde. De tal forma, que ao aproximarmo-nos de Villa

Mairea, através da floresta de pinheiros, a fachada branca

Figura 68

Interior da Villa Mairea.

Figura 67

Pormenor da entrada.

Figura 66

Entrada da Villa Mairea.

Page 268: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

245

modernista corta o cenário mas, ao entrarmos na casa, o cenário da

floresta abre-se de novo, com a luz a ser filtrada através dos finos

pilares em madeira no hall de entrada, e com as grandes janelas

viradas para o jardim a prolongarem o cenário.

Importa assinalar que neste projecto foi fundamental o processo de

incorporação da madeira no trabalho de Aalto, pois ele não só

colocou o valor expressivo deste material em forte concorrência com

o betão, material que até então viabilizava o modernismo

internacional, como também introduziu a possibilidade de considerar

a madeira como um material capaz de se adaptar à produção em

série.

Nenhum outro arquitecto trabalhou a madeira como Aalto, que

provou não existir uma forma específica para a utilizar e que, apesar

de se tratar de um material antigo, ele conseguiu aplicá-lo de forma

verdadeiramente nova utilizando a máquina e a tecnologia como

método de trabalho, um pouco à semelhança do que se tinha

passado com o betão.113113113113

113113113113 Exemplo disso o Pavilhão de Paris (1937), em que Aalto ganhou o Primeiro

Prémio : “Les pilliers et les traverses avaient été conçus et fabriqués spécialement

Figura 69

Pormenores que marcam a relação com a natureza

Page 269: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

246

Será a partir desta época que Aalto, apesar da sua declarada postura

de antimecanicista, estabelece uma relação com a indústria,

fundando e dirigindo a Artek, uma fábrica em que explorou as

técnicas industriais, produzindo desenhos de mobiliário para a

indústria, com o patrocínio da indústria madeireira finlandesa.

Neste processo é possível provar que Aalto, também, consegue fazer

da máquina um forte aliado, tal como afirma Daciano Costa a

propósito do Centenário de Aalto:

Ninguém como Alvar Aalto encarou a madeira como um

material novo de facto, implicando a descoberta e

desenvolvimento duma tecnologia que passou a representar a

evolução cultural. Essa evolução não é uma simples evolução

estética, é um daqueles factos técnicos de cruzamento entre a

evolução e progresso que determinam as grandes etapas do

processo da cultura do projecto. (Ribeiro e Björk, 1998, p.69)

pour cette construction. Il n’ y avait pas que les piliers qui indiquaient les qualités

particulières du bois, mais aussi des combinaisons obliques selon un système

porteur triangulé. Ainsi les propriétés de rigidité du bois furent démonstrées à

nouveau d’une façon moderne, tout en exploitant les vertus traditionnelles propres à

la constrution.” (Fleig el al, 1992, I vol. p.78):

Page 270: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

247

A madeira laminada era já um material que permitia atingir um bom

coeficiente de elasticidade, porém, Aalto vai desenvolver a

flexibilidade das curvas e contra curvas deste material, de modo a

conseguir uma posição estável nos objectos criados, modelando a

madeira laminada às curvas do corpo, em perfeito equilíbrio, numa

demonstração de como o fenómeno mecânico, de que dependia a

sociedade moderna, podia ser trabalhado em estreita dependência

com a estrutura orgânica e, perfeitamente, adaptado à forma

humana. Máquina, Homem e Natureza reunidos sob a tónica da

modernidade.

Aalto revelava, assim, plena consciência, da necessidade de

combinação destes três factores, quer na arquitectura, quer nos seus

equipamentos. Para ele, uma peça de mobiliário devia ser “A light,

inexpensive object, accessible to all social classes, easy to clean and

durable. It should combine maximum comfort with maximum ease of

technical manufacture.” (Schildt, 1997, p.107)

A partir desta época, o processo conceptual de Aalto vai basear-se,

sobretudo, nas linhas de ondulação dos planos, como foi o caso dos

alojamentos, Baker House de Massachusetts Intitute of Technology

em Cambridge de 1949, ou o Aalto-Theater, em Essen na Alemanha,

de 1959, terminado já depois da sua morte.

Page 271: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

248

Frequentemente associa-se a linha ondulada à linha expressiva da

vida, de tudo o que nasce, cresce e se multiplica no espaço.

Contudo, a arquitectura de Aalto não pode ser considerada

simplesmente de naturalista ou organicista pois a sua obra assentava

também numa forte experiência do espaço que resultava em formas

perfeitamente adequadas ao homem e à sociedade, pelo que Aalto

descobriu “(…) que uma linha ou superfícies curvas não são menos

racionais do que uma linha recta ou uma superfície plana.” (Argan,

1988, p.414)

Page 272: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

249

5 . 2 . 3 . O C I C L O D A V I D A

Os espaços religiosos, 114114114114 também, têm lugar na obra de Aalto e é

importante assinalar que as estratégias do arquitecto, desde os

primeiros trabalhos nos anos 30 até à última obra em Riola, vão

evoluindo do racionalismo formal para o organicismo, onde o factor

técnico surge combinado com o factor humano.

Na verdade, nos trabalhos da fase inicial, existe uma aproximação ao

racionalismo funcionalista, como aquando da reformulação e

construção de algumas igrejas, nomeadamente Jyväskylä e

Muurame, e nas quais se percebe uma certa geometria relacionada

com o movimento internacional. De facto, e embora este período seja

aquele em que podemos verificar uma maior aproximação de Aalto

ao racionalismo funcionalista, já se percebe que não era um

114114114114 Sobre este assunto Müller fez uma análise comparativa dos programas

eclesiásticas das obras, em Alvar Aalto e a igreja feito corpo, onde se percebe a

estratégia de forte relação entre o homem e a natureza em oposição à máquina.

Neste trabalho, o autor considera no corpus arquitectónico do arquitecto a natureza

como organismo, explicando, no entanto, as preocupações do arquitecto com as

questões técnicas em cada um dos seus projectos.

Page 273: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

250

arquitecto que obedecesse a cânones, mesmo que, nesta época,

ainda estivesse, de certa forma, afastado da vertente orgânica com

que mais tarde iria ficar conhecido.

Nos anos 50, após 30 anos de afastamento, Aalto volta ao tema

sacro concebendo duas capelas, uma em Malon na Finlândia, e outra

em Lingby, na Dinamarca e, mesmo que ambos os projectos não

tenham sido realizados, importa notar a forma como é resolvida a

funcionalidade dos espaços em sintonia com as chaves simbólicas

do projecto, mais concretamente a intriga relativamente à vida e à

morte, e o modo como recorre à luz para criar uma simbologia muito

particular.

É que apesar de se tratarem de espaços construídos sobre plantas

regulares, 115115115115 a luz, um importante elemento natural, em especial no

norte da Finlândia, assume um protagonismo simbólico, qualificando

o espaço em ambos os projectos. A luz é aqui um elemento

fundamental e, do mesmo modo que Le Corbusier experimentou em

Ronchamp, também Aalto, nestas duas capelas, apela ao

115115115115 Em Malam, as três capelas estão colocadas triangularmente sobre si e em

Lingby, as duas capelas são de planta quadrada.

Page 274: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

251

transcendental, se bem que utilize a metáfora entre a vida e a morte,

apelando uma vez mais para o ciclo de vida subjacente ao factor

orgânico.

Segundo Müller (2001) em Lingby as chaves simbólicas e funcionais

são as mesmas das capelas em Malam, mas constituídas de uma

outra forma:

(...) e os pátios da vida multiplicam-se estão lá novamente, as

capelas de planta quadrada, com disposição interna dos

assentos em três lados do catafalco e dois assentos em três

lados do catafalco, e dois assentos separados, o da vida para a

morte e o da morte novamente para a vida, os pátios servindo

de esperança para um mundo melhor tanto neste como no

outro lado. (Muller, 2001, p. 3)

Nestas duas capelas são já perceptíveis quer um percurso

conceptual assente numa ênfase simbólica do espaço, quer um

principado da luz como modo de intensificação do aspecto

transcendental, todavia, nas igrejas de Lahti e principalmente, em

Sheinäjoki, Aalto irá complementar aqueles aspectos com todo um

conjunto de premissas funcionais, figurativas e simbólicas que serão

referenciais permanentes nas suas posteriores obras eclesiásticas,

como será o caso da planta de volume trapezoidal estreitando em

Page 275: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

252

direcção ao altar, projectada, assim, por razões de ordem acústica,

segundo o próprio arquitecto.

Efectivamente em Seinäjoki, o volume da caixa dissolve-se e o factor

técnico 116116116116 tem um papel importante na estabilização da forma, e a

utilização do trapézio, tanto em planta como em volume, dá azo a

uma forma plástica particular que se por um lado, ainda, conserva

linhas baseadas no que era habitual nos anos 30 – os planos rectos

e brancos e o interior claro –, por outro lado, inova ao estabelecer a

relação do homem com o divino, através do aumento da perspectiva

até ao altar, conseguido pelos suportes interiores, pela inclinação do

tecto da nave e, novamente, pelo protagonismo da luz que

emergindo dum grande pano de vidro, camuflado pelos recortes

verticais das fachadas laterais, enche o espaço sagrado.

Mais uma vez, neste projecto, Aalto não se deixou dominar pelas

questões técnicas e concebeu: “a ideia da igreja feito corpo,

organismo vivo de feições irregulares onde há ordem imanente que

116116116116 Em relação à acústica sabe-se de antemão que os planos paralelos não

proporcionam boas condições para a propagação do som, assim como se devem

respeitar certas distâncias e comprimentos por causa dos fenómenos de

reverberação e de eco.

Page 276: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

253

tudo relaciona e faz funcionar a partir de uma fonte cerebral –

figurativa – e emocional – simbólica”. (Müller, 2001, p.4)

No templo de Vuoksenniska, em Imatra, a conceptualização do

espaço interior foi condicionada pelo ritual luterano e, face à

necessidade de conciliar a criação de um espaço polivalente,

passível de outras actividades para além da do culto, com o

refinamento da acústica do canto e do sermão, imprescindível à

liturgia luterana onde impera a palavra, resultou numa condição

assimétrica originada pela sobreposição, ao trapézio, dum intricado

esquema formal de planos rectos e curvos.

Com efeito, a parede onde se situa o púlpito é recta e opõe-se à

superfície cilíndrica a partir de um traçado curvo, imposto por razões

acústicas. As preocupações acústicas definem, igualmente, a

volumetria assimétrica do interior, tanto que as janelas de superfícies

cilíndricas são planos oblíquos que se adaptam às linhas do tecto e

este, por seu lado, é irregular por forma a devolver para o centro do

espaço, ou seja, para a assembleia dos fiéis, o som emitido desde as

extremidades, isto é, pelo altar e pelo coro. Os três espaços são

ligados a partir do eixo e, aqui, o plano trapezoidal é de novo

utilizado para valorizar a zona do altar e do púlpito, confrontando-os

com os outros elemento litúrgicos.

Figura 71

Templo de Vuoksenniska.

Figura 70

Desenho projectual do templo de Vuoksenniska.

Page 277: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

254

Com o volume a decrescer em altura à medida que se aproxima do

altar, Aalto vai marcar a geometria orgânica com linhas estruturais

cobertas que ultrapassam o espaço transversalmente ao eixo maior,

até encontrarem os apoios que marcam a intersecção dos nichos

curvos da parede acústica e, neste ponto, as vigas transversais

ramificam-se em três partes para distribuir as cargas. Aalto combina,

assim, a questão da funcionalidade técnica e da funcionalidade

orgânica, podendo-se mesmo afirmar que, na igreja de

Vuoksenniska, o arquitecto vai para além da funcionalidade e que até

a racionalidade funcional própria da modernidade, associada às

questões acústicas e às condições essenciais do projecto, é

ultrapassada pelo carácter orgânico.

Um aspecto importante deste projecto que também se verificou nos

crematórios de Lyngby foi i facto de Aalto recusar a instalção de um

elevador eléctrico para transportar a urna funerária.

A l’église de Vuoksenniska, les parois s’ouvrent ou se ferment

avant le culte – on ne remarque pas l’apport de la technique,

les fidèles trouvent les lieux tels qu’ils sont préparés. En

revanche, au crématoire, la machinerie s’empare

ostensiblements des morts, mais Aalto désire que ce soyent les

vivants qui emportent les morts. Cet exemple est un de ceux

Page 278: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

255

qui montrent qu’ Aalto utilise le technique, mais qu’il empêche

qu’elle n’entrave l’humain. (Fleig, 1992, I vol., p.13)

O templo de Heiling Geiskt-Kirche em Wolfsburg, na Alemanha, para

além de se tratar de um volume que igualmente aponta para o

orgânico, obedece, também, a uma composição arquitectónica em

que se procura cumprir com a funcionalidade, no respeito pelos actos

que aí se praticam, e em que a forma estrutural - a planta trapezoidal

dá lugar a uma série de pórticos arqueados na longitudinal,

convergentes desde a entrada até ao altar - e a luz, elemento natural,

aparecem como protagonistas da articulação formal do espaço.

Neste projecto, a luz entra apenas por planos de vidro translúcido, de

perfil orgânico, que iluminam o espaço com exuberância e por um

grande plano de vidro alto que propicia a entrada de luz pela pia e

pelo baptistério.

É um templo em que se nota, por um lado, o afastamento, cada vez

maior, relativamente às formas geométricas, observadas nos

programas eclesiásticos de Lathi e Seinajäki, a favor de um volume

fragmentado e mais orgânico, e por outro lado, um novo modo de

entender o sistema compositivo, em que desaparece a nave única,

em forma de casca, para dar lugar a uma composição de três partes,

articuladas de forma inteligente. Verifica-se, aqui, um tipo de

Figura 72

Interior do templo de Heiling Geiskt-Kirche

Page 279: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

256

estratégia importante para tornar o espaço mais humano e em que a

construção passa a fazer parte do processo de concepção do

arquitecto, tal como já o tinha experimentado na parede acústica de

Imatra.

No templo de Stephanus-Kirche em Detmorode, também na

Alemanha, Aalto vai aplicar os princípios já utilizados nas outras

estruturas eclesiásticas, igualmente de forma trapezoidal desde a

entrada até ao altar, privilegiando a convergência visual, as boas

condições acústicas, trabalhando a forma estrutural e a luz em

sintonia, ainda que abdique da eloquência escultórica presente em

Imatra e, principalmente, em Wolfsburg, a favor de linhas mais

contidas mas nem por isso menos orgânicas.

Ainda no contexto do nosso trabalho, parece-nos pertinente frisar o

modo como Aalto, em Stephanus-Kirche, aperfeiçoou as questões

acústicas, após uma investigação baseada na forma como o som

produzido pela voz, pelo canto e pelo órgão seria ouvido neste

espaço. Efectivamente, a questão técnica foi combinada com a

reprodução de elementos naturais, utilizando-se doze conchas de

madeira de 2,50 m, suspensas no tecto sobre o espaço destinado

aos fieis, para obter uma melhor acústica, sendo particularmente

interessante o modo como o arquitecto resolve as questões técnicas,

Figura 73

Planta do conjunto em Santa Maria, em Riola

Page 280: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

257

desta vez, recorrendo a formas orgânicas em sintonia com o

elemento natural, a madeira.

A derradeira síntese de Aalto neste tipo de programas vai acontecer

na Igreja de Santa Maria, em Riola, onde consegue a mais completa

de todas as obras, sintetizando todas as anteriores. A geometria

rígida, na base da concepção dos racionalistas, dá lugar a um

sentido orgânico, onde a função religiosa aparece reforçada pelo

sentimento de espiritualidade e pela dimensão interior muito própria

do ser humano, com o interior da igreja a apelar, também, ao espaço

interior do homem.

Neste último trabalho reconhece-se uma simbiose, entre a forma

como resolveu as questões técnicas e as questões humanas, 117117117117que

117117117117 A relação entre estes dois aspectos da obra de Aalto influenciaram o trabalho do

dinamarquês Jörn Utzon, considerado por Montaner (2001, p.89) entre o

organicismo e a tecnologia: “Utzon procurará desenhar (...) um sistema padronizado

e préfabricado de componentes ou células espaciais que fossem montadas

posteriormente, integrando desenhos de formas livres, com eferências orgânicas a

aves e outros animais adaptáveis a diversos contextos ambientais. (...) As suas

propostas procuram atender às exigências da industrialização e normalização, sem

sacrificar a flexibilidade e expressividade necessárias para se orientar pelo caminho

incerto das funções e desejos humanos.”

Figura 74

Interior da Igreja de Santa Maria

Page 281: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

258

parece transportar uma mensagem intemporal. Efectivamente o

modo natural e humano de desenhar e de fazer arquitectura aponta,

claramente, para uma estratégia humana e ecológica, fenómenos

transversais a todas as épocas, passado, presente e futuro,

conforme provam as seguintes palavras, de Alvar Aalto em 1940 118118118118

(apud, Lathi, 1998)

Architect’s work’s concentrates on creating harmony, tying

together of threads from the living future to the living past. The

basis is man – with all his countless emotional threads – and

nature (man included).

De todos os arquitectos que nos referimos até ao momento, Aalto

parece ser aquele que melhor consubstancia os aspectos

relacionados com a intemporalidade pois afinal o homem, que na sua

evolução se vem adaptando espacialmente ao mundo, mantém-se o

mesmo, as suas características físicas mantêm-se as mesmas, não

se alteraram significativamente com o tempo e parece certo que na

sua essência se vão manter as mesmas, apesar de por vezes os

118118118118 Referido por Markku Lathi, na Introdução do Catálogo da Exposição Alvar Aalto

p.14.

Figura 75

Fachada principal da Igreja de Santa Maria

Page 282: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

259

avanços produzidos nas várias áreas da ciência apontarem em

sentido contrário.

Page 283: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

260

6 . N O V O S C O N C E I T O S N A R E L A Ç Ã O H O M E M /

M Á Q U I N A

6 . 1 . C R Í T I C A A O R A C I O N A L I S M O

Na passagem para a segunda metade do século XX, os modelos

conceptuais centram-se, sobretudo, em torno da velha questão da

arquitectura que envolve a relação do homem com o espaço de

habitar.

Importa, portanto, analisar a cumplicidade que se estabeleceu entre

o modo como a tecnologia foi ganhando terreno e o desenvolvimento

de uma certa sensibilidade que, ao mesmo tempo, emergia no que

concerne as exigências naturais do homem relativamente ao espaço.

Com efeito, neste processo, assiste-se a uma tomada de consciência

da necessidade de conferir ao espaço uma maior adaptabilidade;

agora, mais do que a função, tornava-se necessário perceber as

características próprias do ser humano. Nesta abordagem, vamos,

ainda, constatar que na sociedade e na arquitectura essas questões

foram objecto de algumas inquietações que, no caso da arquitectura,

permitiram avanços significativos na relação entre o homem e o seu

habitat.

Page 284: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

261

De facto, existiam na sociedade algumas inquietações relativamente

ao modo como se aceitava os avanços tecnológicos e Theodor

Wiesengrund-Adorno, juntamente com outros filósofos, reflectiam

sobre as dimensões deste avanços provocados após as revoluções

industriais 119119119119, alertando para o perigo do homem estar prestes a

perder a sua autonomia e da sociedade correr o risco de se

desumanizar, visto que o homem não passaria de um vulgar

instrumento de trabalho e de consumo e poderia, mesmo, tornar-se

num mero objecto.120120120120

Este tipo de preocupações estendia-se, aliás, a outras áreas da

sociedade e no cinema, por exemplo, Jacques Tati fez uma

interpretação/crítica desta nova realidade, baseada nas contradições

entre o natural, associado à própria essência humana, e o artificial,

119119119119 O domínio da razão humana, que se caracterizava como uma doutrina durante o

Iluminismo, deu lugar ao domínio da razão técnica.

120120120120 Adorno em Dialéctica do Esclarecimento tem um capítulo sobre Indústria Cultural

onde reflecte acerca dos perigos da racionalidade técnica. Em Mínima Moralia (obra

publicada depois do exílio nos Estados Unidos, devido à de guerra na Europa)

apresenta pequenas morais sobre a vida mutilada, reflecte um conjunto de ensaios

pessimistas e declara-se contra o funcionalismo.

Page 285: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

262

fruto dos sucessivos avanços tecnológicos. Este tipo de

manifestação não era inédita pois, já em meados dos anos 30,

Charlie Chaplin tinha utilizado esta arte no filme Tempos Modernos,

uma sátira intemporal que apelava para uma reflexão sobre a relação

do homem contra a máquina, no entanto, Tati, num outro contexto

social em que se aceita de forma generalizada os benefícios da

máquina, faz nos seus filmes uma critica à arquitectura moderna e

uma sátira aos comportamentos ridículos decorrentes do acto de

habitar esses espaços. Ele consegue trabalhar os opostos e

confronta a construção tradicional e irracional com a moderna e

racional onde, na sua opinião, o homem ficava como que tolhido e

obrigado a desenvolver movimentos mecânicos.121121121121 É o caso, por

exemplo, do filme O meu tio em que na casa da família Arpel, uma

moradia unifamiliar, se percebe o paradigma moderno-racional, com

o funcional e o geométrico a esmagarem qualquer hipótese de vida

natural e onde o homem, para poder habitar aquele espaço, tem de

121121121121 Para reproduzir essa sensação de artificialidade, os actores tinham que

deslocar-se em linhas rectas e ângulos rectos, nunca em circunferências, os

movimentos eram assim robotorizados.

Figura 76

Imagem do filme Tempos Modernos.

Figura 77

Imagem da casa da família Arpel em O meu Tio

Page 286: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

263

se comportar como mais um objecto e daí que os seus próprios

movimentos se passem a efectuar em linha recta como os robôs.122122122122

Efectivamente, Adorno levantava algumas questões sobre o facto do

homem ser apenas um mero instrumento manipulado e baseado

numa ideologia assente na racionalidade técnica vigente, contudo,

parece-nos necessário esclarecer que o mito do homem-máquina

não era algo de novo na sociedade e que, mediante as

possibilidades técnicas de cada época, foi assumindo várias formas

ao longo dos tempos, ocupando sempre a vanguarda do seu tempo,

ainda que, paralelamente, carregasse consigo um certa preocupação

relativamente ao mecânico.

Não obstante, esta antinomia do natural e do artificial com que nos

deparamos desde o século XVIII, estava prestes a ganhar um novo

rumo, apesar da sociedade continuar a revelar algum receio em

relação ao mecânico. De facto, como já foi referido, estas

manifestações não eram recentes, conforme comprovam enúmeras

122122122122 Na peça de Opilek, Karel Capek, em 1917, utilizou a palavra robota que significa

trabalho escravo e foi utilizada pela primeira vez no seu drama utópico Rossum,

sendo que o robô se tornou popular a partir de 1921.

Page 287: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

264

obras literárias e cinematográficas, tais como O homem uma

máquina de La Mattrie, uma obra de 1748 em que se encara a

possibilidade de reprodução artificial do ser humano ou, ainda, o

romance Erewohn, or over the Range de 1872 de Samuel Butlers

onde se protagoniza a superioridade da máquina sobre o homem. De

assinalar, igualmente, que mais tarde, em 1980, no filme Blade

Runner, surgem seres fabricados, desprovidos de sentimentos

humanos, num cenário de ambiente futurista onde se tenta criticar o

urbanismo do Movimento Moderno e do pós Moderno e das cidades

utópicas do futuro, lembrando as cidades imaginadas por San’Elia ou

por Fritz Lang em Metropolis, e antecipando alguns projectos de

futuro.

No entanto, o desenvolvimento do ser robótico estava à beira de

ganhar uma nova dimensão e já não era visto apenas como uma

máquina autónoma que libertava o homem das actividades rotineiras,

ou como anderoides, robôs semelhantes a homens sem capacidade

de pensar, dava agora um salto evolutivo e tratava-se de um

organismo híbrido, o Cyborg (homem semelhante a robô), existente

numa sociedade onde o humano e o tecnológico se constroem

mutuamente.

Por outro lado, Henri Bergson (1859-1941), um dos primeiros

Figura 77

Imagem do filme Metropolis de Fritz Lang, (1925-1926)

Page 288: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

265

filósofos a superar o positivismo e o idealismo do século XIX e um

dos que mais se manifestou contra o mecanicismo, tendo-se tornado

o representante mais conceituado da nova filosofia de vida, 123123123123

apresenta uma nova visão antimecanicista, rejeita o mecanismo

darwinista e neodarwista e, ainda, toda a concepção mecanicista do

órgão vivo. Para ele, a faculdade humana que corresponderia à

matéria espacial era a inteligência e seria esta inteligência analítica

que teria a capacidade de decompor e voltar a compor, segundo

qualquer lei ou sistema, defendendo que:

O órgão vivo deve ser considerado como a expressão

complexa de uma função simples, pode ser comparado a um

quadro composto de milhares de traços, mas que expressa a

inspiração simples do artista. Sem dúvida, o organismo contém

um mecanismo, parece até ser um mecanismo. Mas assim

como num arco dividido em minúsculos segmentos, estes

123123123123 Anteriormente Jules Lachelier (1932–1918) e Émile Boutroux (1845-1918), de

quem Bergson tinha sido discípulo, já tinham manifestado um tendência espiritualista

e personalista da filosofia francesa que apontava para uma nova filosofia de vida,

que apesar de repudiar o spencerismo, tinha em conta, igualmente, muitas das

ideias evolucionistas e utilitárias do inglês Herbert Spencer.

Page 289: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

266

segmentos coincidem aparentemente como uma tangente,

assim também a vida examinada em suas minúcias como os

métodos das ciências da natureza parece um mecanismo mas

não é. 124124124124 (Carvalho, 1968)

Duas ideias que se revelarão extremamente fecundas para perceber

as questões que o computador, também, levanta na arquitectura e o

facto do arquitecto poder, igualmente, ser manipulado por ele e pela

inteligência artificial.

124124124124 Tradução de António Pinto de Carvalho, em A Filosofia Contemporânea

Ocidental, de Henri Bergson por J. M. Bochenski.

Page 290: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

267

6 . 2 . S I S T E M A S E E S T R U T U R A S

Entretanto, é interessante constatar que do mesmo modo que na

sociedade se questionava o modo como se entendia a máquina,

também, na arquitectura, se iam denotando algumas transformações.

Segundo Francastel (1956, p.37):

La théorie du compromis qui mettait la machine au service de

l’art se résout ainsi en une identification de l’art avec la

thecnique contemporaine. Incontestablement, le mouvement de

CIAM repréraire de ce point de vu um moment important dans

l’histoire et dans le dévoleppement du mythe de la machine.

(…) Toute la question des valeurs réelles de cette idéologie qui

oposse la civilisation machiniste à l’art et à la Nature et ce qui

cherche l’issue dans une psuedo mise en contact de l’homme à

la fois avec paysage – dernier vestigue d’un rousseauisme pétri

d’orgueil – et avec la técnique sera reprise par la suite.

O CIAM definira os pontos gerais que caracterizavam a arquitectura

moderna em princípios que eram fundamentalmente racionalistas e

analíticos e que se baseavam num sistema de classificação que

Page 291: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

268

dividia a cidade em várias funções, 125125125125 numa perspectiva formal de

origem cartesiana. Contudo, este tipo de postura era muito

questionada pelos membros mais jovens, incluindo por Le Corbusier,

embora nunca por ele completamente assumido, o que originou uma

certa cumplicidade entre este conhecido arquitecto francês e esta

geração mais jovem. Esta parceria, entre Le Corbusier e os jovens

arquitectos, permitiu-lhes assumir, em conjunto, um papel dominante

nos CIAM e, a partir do 9º congresso, os holandeses do grupo Doorn

repudiaram declaradamente a Carta de Atenas,126126126126 tendo-lhes sido

solicitado pelo conselho dos CIAM a organização do congresso

125125125125 As funções principais seriam: « Habiter, jouer, travailler, et circuler, c’est ainsi

que dans tous les projects d’urbanisme, inspirés par la doutrine, plusiers treinte

seront utilisées pour colorer les zones de conditionnement humain ». (Francastel,

1956, p.38)

126126126126 No CIAM IV sobre o tema The Functional City, foi produzido o mais conhecido

documento Athens Charter: “The Charter criticized contemporary society for not

satisfying the biological or psychological needs of city inhabitants, and for the

proliferation of private interests, and called for collective action and the

reorganization of planning on a human scale regarding the dwelling unit as the basic

element. It also stressed the need to use the resources of modern technological

progress.” (Khan, 1998, p.37)

Page 292: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

269

seguinte. A partir desse altura o grupo de 10 membros, 127127127127 saído dos

Doorn e agora ampliado, passou a chamar-se Team X.

O Team X, embora de origem racionalista, defendia um primeiro

modelo com base na criação de símbolos da nova comunidade e na

psicologia da percepção, apontando assim o caminho para criar

diversas aproximações a um mesmo objecto e estabelecer uma

relação sensível com o mundo.

Neste contexto é determinante esclarecer que a percepção é uma

actividade vital de qualquer organismo na relação com aquilo que o

rodeia, mais uma vez o orgânico a manifestar-se na relação de todas

as partes de um corpo com aquilo que o rodeia, numa dimensão

holística.

A obra do Team X propunha, ainda, um segundo modelo que se

baseava na teoria dos sistemas e que perspectivava a aplicação do

princípio da autoregulação às máquinas, à psicologia e à sociedade,

127127127127 Os membros fundadores eram os holandeses:1. Jacob Berend Bakema, 2. Aldo

van Eyck, 3. Sandy van Ginkel e 4. Hovens-Greve, os ingleses 5. Alison e 6. Peter

Smithson, 7. W. y G. Howell John Voelcker, os franceses 8. Georges Candilis e 9.

Shadrach Woods e o suíço 10. Rolf Gutmann.

Page 293: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

270

numa conceptualização em que cada um destes sistemas era

organizado de forma a apoiarem-se entre si, de modo autoregulador.

Estas ideias foram fundamentais para definir o futuro da arquitectura:

por um lado, a tendência técnica muito vincada pelas megaestruturas

high-tech, associadas a uma certa ideia de vanguarda vinculada pela

máquina, por outro, o homem e uma relação sensível mais forte com

o espaço que o rodeia, sendo de referir que apesar das

megaestruturas ganharem um destaque especial na fase de

transição do meio do século XX, elas já estavam latentes nos

projectos de alguns arquitectos, como é o caso de Le Corbusier ou

de Frank Lloyd Wright.

Richard Buckminster Fuller foi, igualmente, um dos que muito cedo

recusou a fórmula do racionalismo na arquitectura e que se dedicou

à aplicação de processos industriais nesta arte.

Assim Fuller converteu o lema tipico do funcionalismo less is more

em more is less, o seu pragmatismo determinou a construção da

casa e do carro Dymaxion.

In 1927 the dymaxion principle, that is the principle of the

obtaining the maximum of advantage with the minimum of

advantage with the minimum of energy, permitted Buckminster

Fuller to develop an innovative system of structural

Figura 79

Casa Dymaxion (1929).

Page 294: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

271

prefabrication that was applied both to the design of a house

suspended by steel ties from a hollow central pylon.(Pirovano,

1990, p.329)

Assim a Dymaxion House foi concebida como uma estrutura de

cabos de aço, suspensa numa árvore com vinte metros de altura e,

verificando que este projecto poderia funcionar como protótipo de

muitas macroestruturas do futuro, Fuller projectou, também, uma

versão motorizada, em três rodas, o Dymaxion Car.

A sua fidelidade a este tipo de construção foi contínua e, durante a

guerra, realizou residências de forma cilíndrica, com características

industriais, para uso do exército no Pacífico e, em 1946, projectou

em pequena série, a Wichita House,128128128128 cuja produção nunca chegou

a ser comercializada.

The latter housed the ducts for the installations connected to a

prefabricated and modular technological block, invented in 1929

128128128128 Em plena Guerra-fria, Fuller concebeu “um refúgio de papel de 4,60 m de

diâmetro e capacidade para seis homens. Este foi chamado de Kleenex e pesava

três vezes menos que uma tenda e não custava então dez dólares, podendo ser

facilmente carregada e descartada após utilizada. Tradução livre (Machale, 1966, p.

32-33)

Figura 80

Wichita house, machine for living, (1946).

Page 295: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

272

and patented in 1936. The Wichita house, built in Kansas by the

Beech Aircraft Co., was development of this model. It had a

transportable shell structure of sheet steel and was made up of

less than 200 separate components, among them partition

closets, forerunners of closet walls. (Pirovano, 1990, p.329)

Todavia, foi a partir daí que se passou a dedicar aos projectos que

viriam a ser aqueles com que melhor se referencia Fuller: as cúpulas

geométricas, 129129129129 compostas de retículos poliédricos em aço e

cobertas por elementos de materiais variados com o aço, o alumínio,

materiais transparentes e mesmo materiais recicláveis como o

papelão.

A notoriedade de Fuller e o reflexo do seu trabalho dedicado às

técnicas de industrialização, vão-se afirmar no âmbito internacional

aquando da sua participação na Expo de Montreal, em 1967 e,

efectivamente, podemos constatar que, desde então, muitas das

suas ideias vão aparecer um pouco por todo o lado, implícitas em

trabalhos futuros.

129129129129 Em 1953, constrói uma cúpula de alumínio para a fábrica da Ford em Dearborn,

de 8,5 toneladas de peso. Projectou ainda uma grande cúpula transparente para

Manhattan, com 3,2 quilómetros de diâmetro e 1600 metros de altura.

Figura 81

Grande cúpula transparente para Manhattan (1962).

Page 296: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

273

É o caso do estruturalismo, uma nova tendência que surgiu na

Holanda, protagonizada por Piet Blom e Joop van Stigt, e que se

inspirou também na ideia, defendida em 1952 pelo arquitecto

holandês Wim van Bodegravan, a criação de uma estrutura de

formas que pudesse mudar com o tempo mas que, nessa

transmutação, conservasse a sua coerência e significado. Esta ideia,

vai estar na origem da aldeia infantil de Blom e de Stigt, em que um

sistema préfabricado permitia que peças idênticas e reconhecíveis se

combinassem mediante um conjunto de regras. Esta combinação, de

ordem e flexibilidade e de centralidade e dispersão, vai ser ainda

incorporada por Herman Hertzberger e disseminar-se na Holanda,

nos anos 60 e 70.

As formas e as tipologias, inspiradas no mundo da máquina,

encontram referências no mundo industrial e do mesmo modo que no

início do século se reproduziam fábricas e centrais hidroeléctricas,

também, nesta época, se reproduziam conscientemente edifícios

com analogias a refinarias de petróleo, e segundo Montaner (2002,

p.92) :

Definitivamente o paradigma da artificialidade encontrou a sua

continuidade, na arquitectura high tech, uma arquitectura que,

além de seus valores formais e culturais se baseia na

Page 297: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

274

materialidade e na construtividade do projecto na ênfase nas

articulações e nos nós, no recurso à repetição modular e no

equívoco mecanicista de que uma boa construção equivale a

uma boa arquitectura.

O mundo da máquina, um pouco por todo o lado, inspirava

arquitectos, como é o caso de Richard Rogers e Renzo Piano no

Centro Pompidou, em Paris onde abundavam as tipologias do mundo

industrial, como as escadas rolantes que atravessam o edifício e que

fazem lembrar as refinarias de petróleo.

Em 1974, Piet Blom projecta em Helmond, Roterdão, as primeiras

experiências das Cubic Houses, construídas entre 1975 e 1984 em

simultâneo com a Spanish Kay Housing, cujo espaço propunha uma

forma de habitar que contrariava a ortogonalidade e colocava o

homem numa nova relação com o espaço habitável.

Assim, o modelo da repetição desenvolvido por via da máquina e

adoptado pelo movimento moderno, surgia agora como protótipo

para a construção de mega estruturas.

No âmbito da análise efectuada neste trabalho importa, desde já,

referir que os aspectos utópicos e paradigmáticos das

megaestruturas não surgem tão diferenciados das questões de

habitabilidade básicas do ser humano, antes, assumem-se como

Figura 82

Centro George Pompidou

Figura 83

Planta das cubic houses

Page 298: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

275

resposta das novas tecnologias a uma velha questão – habitar.

A par dos estruturalistas, surgiram também, em 1960, os

metabolistas no Congresso Mundial de Desenho em Tóquio, em

simultâneo com o projecto de Kenzo Tange, para a baía de Tóquio,

no qual o arquitecto utilizava palavras de cariz biológico, como célula

e metabolismo, no que o próprio considerou uma oposição clara ao

funcionalismo. Tange propunha colmatar o grave problema da

densidade populacional através de um projecto de uma nova cidade,

situada por cima das águas da baia de Tóquio, em que estruturas

flutuantes, constituídas por materiais substituíveis, podiam acolher

cerca de 10 milhões de pessoas. Era uma cidade cuja estrutura

geral, um duplo eixo de transportes que albergava todos os edifícios

públicos e à qual se acrescentavam outros eixos secundários que

albergavam as zonas residenciais, recordava o plano da Vila

Radieuse 130130130130 de Le Corbusier, onde Tange tinha trabalhado, mas que

diferia desta na alienação total de qualquer terreno natural.

130130130130 É interessante que na Ville Radieuse e na Ville Contemporaine de Le Corbusier

este concilia os valores absolutos da natureza e da tecnologia. Assim, enquanto

trabalho e a vida doméstica têm lugar em edifícios em altura, nos espaços exteriores

cultiva-se o espírito e o corpo.

Page 299: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

276

De resto, a partir dos anos 60, os princípios arquitectónicos

começaram a alterar-se e passaram a incluir elementos de ficção, os

projectos evoluíam segundo um modelo tecnológico de estruturas

móveis que surgiam como contraponto aos conceitos mecânicos;

assim, as cidades deixavam de ser a soma do construído e do

habitante e passaria a existir um todo, embora este dependesse do

factor mobilidade.

Os novos tempos permitiam, agora, uma evolução da casa futurista

que se assemelhava a uma grande máquina e, por conseguinte, a

noção de casa dinâmica dos futuristas foi substituída por casas que

flutuam e que se movimentam. Estas ideias não eram novas, já

tinham sido escritas no Velho Testamento e, para além de Kenzo

Tange em Tóquio, também, Buckminster Fuller nos Estados Unidos,

idealizou cidades flutuantes, construídas em super estruturas de aço

com capacidade para milhares de pessoas, que poderiam ser

edificadas em estaleiros navais e transportadas para o mar. Outro

arquitecto, Hans Hollein em 1964, trabalhou, inclusive, a imagem de

um porta-aviões sobre a imagem de uma paisagem austríaca,

Aircraft Carrier City in Landscape, sugerindo assim que as cidades

poderiam ser situadas em qualquer lado.

Este novo conceito de habitar o espaço foi também defendido por

Page 300: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

277

Victor E. Nieuwenhuys, também conhecido como Constant, que no

seu projecto Nova Babilónia 131131131131(1967-1970), afirmava ser primordial

que o ambiente do homem fosse flexível e variável, garantindo

qualquer movimento, qualquer mudança de lugar, qualquer alteração

do estado de ânimo ou mesmo qualquer estilo de conduta.

Com efeito, a Nova Babilónia propunha-se formalizar um conceito da

cidade que teria tido a sua génese nas ideias expostas no ensaio de

1953, Formulário de novo urbanismo. 132132132132 (Ivan, 1958) Constant,

membro do grupo de pintores COBRA, ingressou na Internacional

Situacionista 133133133133 e, nesse contexto, iniciou uma série de maquetas e

desenhos que representavam a cidade Nova Babilónia.

A cidade de Constant resulta da sua própria antevisão da futura

sociedade moderna, com a previsão de um mundo em que a

tecnologia se sobrepôs completamente à natureza, em que o ócio

131131131131 Designação sugerida pelo próprio Guy Debord da Internacional Situacionista.

132132132132 Gilles Ivan (pseudónimo francês do russo Ivan Chtcheglov activista do

movimento Situacionist Internation)

133133133133 O movimento situacionista foi criado por artistas e pensadores de várias

nacionalidades, provenientes de diversos movimentos artísticos revolucionários.

Figura 84

Nova Babilónia

Page 301: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

278

substituiu o trabalho e em que as comunidades voltaram a ser

nómadas, à semelhança do que tinham sido, durante séculos, os

maiores protagonistas da humanidade.

Esta construção, idealizada como uma rede que cobriria todo o

planeta, teria, ao nível do terreno, a produção e o transporte por

meios mecânicos, isto porque eram considerados inibidores da vida

social, e esta, por seu lado, desenvolver-se-ia sem quaisquer

constrangimentos sobre uma imensa construção sobre pilotis. O

resultado é uma imagem feérica de várias plantas contendo as

funções habitacionais e sociais e que estariam em permanente

reconstrução, graças aos seus habitantes e às máquinas

cibernéticas.

Ao contrário do esquema cartesiano tradicional, promovido pela carta

de Atenas, em que a cidade assentava numa hierarquia hermética de

partes distintas, harmonizadas por um núcleo central, a cidade mega

estrutural, quer privilegie uma infra-estrutura relativamente fixa ou

preveja um sistema auto regulador, é entendida como uma teia em

desenvolvimento contínuo, conforme o exige a sua dinâmica interior,

numa unidade indivisível, orgânica e autoregulada. No entanto, o

resultado ao nível da forma, se visto numa perspectiva

arquitectónica, é algo redutor por gerar, apenas, duas ideias, utopia

Page 302: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

279

ou distopia, conforme a interpretação maniqueísta que se confere ao

sistema em si oculto. É o que parece acontecer com a Nova

Babilónia de Constant que representando um mundo que se mantém

e reproduz eficazmente, não tem, contudo, nenhum propósito

racional.

Ainda assim, a obra de Constant é única entre os

megaestruturalistas, pois revela, no contexto deste trabalho, relações

conscientes com as vanguardas do princípio do século XX, como o

futurismo, o construtivismo e reúne a particularidade de pretender

construir um espaço urbano que fosse de encontro do que seria a

vida ideal de qualquer ser humano.

As propostas urbanas de Constant foram pensadas para uma

hipotética sociedade marxista e antiutilitarista da liberdade e da

justiça, com a propriedade comunitária do solo, para o Homo

ludens, um indivíduo livre criativo e nómade. (Montaner, 2002,

p.138)

Page 303: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

280

6 . 3 . S I M B I O S E E N T R E O H O M E M E A M Á Q U I N A -

A R C H I G R A M

No caso dos Archigram, grupo britânico fundado em 1961, que

ajudou a consolidar a imagem do movimento megaestruturalista,

vamos assistir a uma obra de vanguarda de cariz utópico e, no

entanto, também muito virada para o homem e para o espaço

mínimo habitável.

Com os Archigram a procura incessante pela simbiose perfeita entre

indivíduo e espaço habitável leva mais uma vez, como aconteceu

frequentemente ao longo do século XX, à problemática do corpo

humano, na arquitectura, ao limite do utópico.

Assim, nos anos 60, à semelhança do que tinha acontecido no início

do século, o protagonismo volta a Inglaterra mas, desta vez, numa

postura mais utópica, investiga-se sobre o estudo da arquitectura a

partir do espaço mínimo habitável, como também já o tinha sido

durante a primeira metade do século. Contudo, o espaço destinado à

habitação é, agora, encarado de uma forma mais radical, com a

arquitectura a ser entendida como um prolongamento do corpo

humano, duma maneira ainda não pensada até então, em termos

arquitecturais.

Page 304: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

281

O grupo, que tinha grandes afinidades com os metabolistas

japoneses, fazia de forma inovadora a simbiose entre conceitos

orgânicos associados à origem da vida e a técnica através de

grandes estruturas, e assim, propunha:

(...) o desenvolvimento e a adaptação de megaestruturas de

encaixe nas quais as células vivas, como na obra de Noriaki

Kurokawa, seriam reduzidas a casulos pré-fabricados presos a

enormes arranha-céus helicoidais. (Frampton, 1997, p.334).

Efectivamente, o grupo e movimento Archigram, fundado por Peter

Cook, 134134134134 concebeu projectos não construídos e articulava-se com os

dez anos da revista do mesmo nome, publicada em Londres, entre

1961 e 1974. A maioria do trabalho, desenvolvido pelo grupo ou

individualmente, foi apresentada na revista e o grupo, conforme o

nome sugere (Architecture + Telegram), concebia uma arquitectura

rápida, simples e direccionada para os avanços da tecnologia, uma

arquitectura claramente voltada para a relação entre as cidades e as

134134134134 O grupo era constituído por outros elementos como Warren Charly (1927-1987),

Ron Herron (1930-1944), Dennis Crompton (1935), Michael Webb (1937) e David

Greene (1937).

Page 305: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

282

novas tecnologias de informação, numa hipérbole do movimento e da

percepção em que a construção era equacionada numa espécie de

autocaravana, numa habitação pré-fabricada e transportável.

A evolução vertiginosa das sociedades e das suas tecnologias gerou

toda uma necessidade de adaptação dos espaços às transfigurações

subsequentes, a que o grupo Archigram tenta dar resposta com o

que se pode nomear de arquitectura mutante. Na sua base estão

dois conceitos, corpo e movimento, numa busca radical de

intersecção entre espaço e corpo e de migração das próprias

habitações. Aqui, trata-se de entender o edifício e o seu habitante

como uma entidade única, capaz de porvir a todas as necessidades

do homem: subsistência, lazer, deslocação, inclusão social e,

sobretudo, liberdade.

Nos anos 60 e princípios de 70, os Archigram produzem, no

seguimento do projecto Plug-in-City, uma série de protótipos de

cápsulas que encarnariam a habitação do futuro e que eram

constituídas por unidades completamente pré-fabricadas, totalmente

ergonómicas, funcionalmente eficazes e com componentes passíveis

de serem substituídos mal se revelassem obsoletos. A produção em

série de cada elemento construtivo confere a toda a obra dos

Archigram um carácter industrial que está em absoluta sintonia com

Figura 85

Imagem do grupo Archigram

Figura 86

Projecto Plug-in-City

Page 306: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

283

as posições que defendiam relativamente ao futuro do homem, da

arquitectura, da cidade e, consequentemente, do mundo, mundo este

tão veloz e mutante que não permite mais o produto artesanal e

único.

Com efeito, a rica icnografia, ou poderemos antes dizer iconografia,

de projectos como a Plug-in-City (1964) tinha origem nas diversas

manifestações socio-culturais da época - as viagens ao espaço, a

ciência popular, a arte pop, a tecnologia das refinarias de petróleo e

da investigação subaquática, e, também, as torres cilíndricas dos

projectos metabolistas. O uso das imagens pré elaboradas e de cariz

popular visava atacar a ideia de arquitectura enquanto disciplina

puramente académica reservada a elites abastadas, numa tentativa

de democratização do próprio movimento moderno que se via assim

invadido por outras artes menores. Os desenhos dos Archigram, na

sua quase obsessiva elaboração dos detalhes, no ecletismo

manifesto das suas imagens e na sua apresentação dos projectos

desde o exterior, chegam a lembrar os da Città Nuova de Sant’Elia,

no entanto estas obras revelam como que um sarcasmo,

cuidadosamente incorporado, como que a alertar para o perigo

tecnológico que ao mesmo tempo evocam.

Os Archigram concebiam a cidade como um organismo vivo e era

Figura 87

Projecto da cápsula da Plug-in-City

Page 307: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

284

este organismo que moldaria o homem do futuro, homem que

apenas necessitaria de um espaço mínimo capaz de suprir todas as

suas necessidades, pois vê na tecnologia a solução para todos os

seus problemas, e é neste conceito que surge a cápsula da Plug-In

City, um espaço mínimo que continha um programa de habitação

completo e cujo única limitação parecia ser a obrigatoriedade de

estar inserida numa torre, com milhares de outras cápsulas.

Assistimos, assim, a uma redefinição completa da habitação na

cidade, com a noção de colectivo a ser de tal modo exponenciada

que o estilo de vida torna-se parecido com o de um hotel,

acarretando, inevitavelmente, alterações na estrutura da própria

sociedade.

As Gasket Homes são a segunda experiência dos Archigram neste

campo mas, ao contrário do projecto anterior, as cápsulas libertam-

se da torre, agregando-se em extensão, virtualmente até ao infinito, e

apresentam uma maior plasticidade, acompanhando mais as curvas

do corpo.

Figura 88

Projecto Walking City.

Page 308: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

285

O salto determinante dar-se-á com a Walking City,135135135135 de Ron Herron,

um conceito de estruturas de habitação, nómadas e simbióticas, que

intimamente ligadas ao corpo, previam situações como a locomoção

e o envelhecimento, e enquanto a Plug-In City e as suas cápsulas

eram ainda estruturas alheias ao corpo humano, as novas estruturas

são essencialmente híbridas e fundem-se no seu habitante,

revelando uma capacidade evolutiva em antítese directa com a

noção ancestral de edifício, baseada na sua inércia e no seu domínio

sobre o corpo.

135135135135 Guilherme Kujawski fez um paralelismo entre esta estrutura e as unidades de

habitação de Marselha de Le corbusier após a SGM, assim a Walking City (1964)

seria constituída por unidades de habitação dotadas de pernas robóticas num sinal

de resposta ao cenário de guerra-fria.

Figura 89

Projecto Living Pod de David Green

Page 309: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

286

A Living Pod e o Auto-Environment são unidades literalmente

móveis, passíveis de serem implantadas em qualquer lugar, sem que

se registem alterações nas condições usufruídas pelo corpo que

nelas vive. A Living Pod era uma cápsula viva composta por partes

insufláveis e extensíveis, e, também, por máquinas acopladas, que

supririam todas as necessidades do habitante, no que podemos

comparar a uma estrutura orgânica que se comporta como uma

extensão do corpo. É já o despertar de uma arquitectura do útero que

os Archigram continuariam a desenvolver, mas ainda permanece,

aqui, o conceito de casa, de um espaço que se sente e que continua

a enclausurar, e não o conceito de segunda pele, uma verdadeira

pele habitável, como conceptualizariam os exemplos máximos do

Cushicle e do Suitaloon.

O Cushicle (cushion + vehicle) é a materialização do conceito de

Peter Cook de uma casa ser idêntica a uma roupa que se veste,

apenas diferindo dela no tamanho, por a casa permitir dentro dela

qualquer número de pessoas, mas ambas estão sujeitas a mudanças

e metaforicamente uma roupa é um abrigo e até pode ser um veículo

se lhe for adicionado um motor. O Cushicle aparece, então, com três

valências: uma pele individual que como uma peça de roupa

assegura a privacidade do corpo e o protege das condições

climáticas e, que ao ser insuflada, se transforma numa chaise-

Page 310: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

287

longue coberta ou num pequeno compartimento, uma estrutura

metálica de suporte que assente num sistema de ar, funciona como

um veículo de curto-alcance; e, ainda, uma série de serviços de

apoio que asseguram as necessidades básicas, como o

entretenimento e as comunicações do habitante. O Cushicle é um

ambiente completo e totalmente móvel que se molda à vontade do

habitante, que se usa como se fosse uma roupa, num sentido têxtil

do espaço que se reduz quase ao limite, quase até ao contacto com

a pele humana.

O limite, esse, ao ponto da quase coincidência com a pele do corpo,

vai surgir com o Suitaloon, que continua o Cushicle no sentido de o

Figura 90

Projecto Cushicle

Page 311: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

288

radicalizar, no que foi apregoado como “Clothing for living in – or if it

wasn’t for my Suitaloon I would have to buy a house” (Cook, 1972). O

Suitaloon já não é um mecanismo composto, mas uma unidade em

si, um grande envelope que, simultaneamente, abriga o corpo, é

meio de locomoção, gera energia, e tem, ainda, a possibilidade de se

auto expandir ou de permitir a fusão com o Suitaloon de um outro

habitante.

Se o Suitaloon é como que o projecto de uma pele, o Bubble,

concebido por Peter Reyner Banham, que partilhava as ideias dos

Archigram, é praticamente a abolição da pele, com o corpo a ser

protegido por sensações mais do que por uma estrutura. É um

projecto de uma bolha que envolveria o corpo, actuando como um

envelope móvel, que, mais uma vez, substituiria o sentido

convencional da arquitectura como edifício, e cuja concretização

passaria pela criação de uma zona de conforto portátil, gerada por

um mecanismo espacial, continuando a fundamentação deste ponto

de vista, Montaner (2002, p.92) refere:

As aspirações do Archigram se aproximaram a mundos

diversos, como ficção científica e pop art, e inclusive

contrapostas, porque queriam conciliar o racionalismo com a

eficácia do organiscismo. Algumas casas-cápsulas

Figura 91

Projecto Suitalonn

Page 312: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

289

apresentavam formas orgânicas, pois tinham pontos em

comum com os metabolistas japoneses, para os quais as

fantasias urbanas baseadas na alta tecnologia assumiam

formas vegetais e de organismos vivos.

O que sobretudo importa reter é que arquitectura mutante do grupo

Archigram propõe novos espaços considerando o espaço mínimo, do

mesmo modo que Le Corbusier, contudo, ajustado a outra época.

Este grupo percebe na arquitectura uma simbiose crescente entre a

natureza humana e a técnica, perseguindo a arquitectura como

segunda pele do corpo humano. Podemos dizer que à medida que se

aumenta o grau de concretização técnico na arquitectura, esta torna-

se em simultâneo mais orgânica, desenvolvendo uma forte

cumplicidade entre a artificialidade e o organismo vivo, procurando

acompanhar as metamorfoses da vida, no que se pode considerar

um novo conceito de máquina de habitar.

Não menos importante é, também, um outro conceito implícito nestes

projectos, o da abolição do sentido da arquitectura como um

ambiente fixo para os corpos que se deslocam. Assim, o movimento

aqui passa a ser também o da modificação do espaço e do corpo,

mesmo quando os corpos não se deslocam no espaço. Na verdade,

os vários conceitos de vanguarda introduzidos pelos Archigram foram

Page 313: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

290

determinantes para as transformações que se iriam produzir no final

do século XX.

Page 314: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

291

P A R T E I I I

R E S O L U Ç Ã O B I N Ó M I O H O M E M M Á Q U I N A

Page 315: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

292

7 . O D I G I T A L S U B S T I T U I U O A N A L Ó G I C O

À semelhança de como no início deste trabalho se enquadrou o tema

da máquina, apresentando um conjunto de reflexões relativas ao

modo como na transição entre o século XIX e XX, se aceitou ou se

questionou este novo paradigma, faz sentido neste momento,

proceder novamente a um enquadramento para perceber em que

medida a arquitectura acompanha as novas tecnologias numa nova

época de transição, agora entre o século XX e XXI. E é curioso notar

que neste processo se encontra algum paralelismo na forma como a

sociedade e os arquitectos, em particular, se relacionam com estes

novos conceitos que alteram profundamente as convenções e os

valores do espaço.

Podemos assim provar que tal como o debate do início do século XX

foi fundamental para se definirem estratégias ao longo de todo o

século XX, também agora, ele surge com igual importância para

definir novas estratégias para o século XXI.

É inquestionável que o século XX foi fortemente marcado pela

máquina, facto que parece ter alcançado o seu expoente na

arquitectura virtual ou digital que, num espaço sem existência física,

permite alcançar níveis sem precedentes na concepção de qualquer

Page 316: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

293

forma ou matéria, um espaço verdadeiramente inovador no qual se

poderá criar qualquer forma ou matéria.

Embora não se pretenda fazer história, parece-nos importante

perceber um pouco a origem da palavra virtual. Efectivamente, esta

palavra não é nova, a sua origem remonta a um termo pré-histórico

de uma língua entretanto extinta, e a sua génese é wiros que

significava homem. Num processo de transformação do latim

primitivo, a palavra passou a vir e ganhou novos significados,

correspondendo, também, herói ou guerreiro. O que nos interessa

assinalar é que a origem do termo está intimamente relacionada com

as competências do ser humano e que se foi transformando ao longo

dos tempos, desde, de Santo Agostinho, Lupasco, São Tomás de

Aquino, entre outros, que reflectiram profundamente sobre o

significado dessa palavra, até Francis Bacon, por exemplo, que

associou virtude a conhecimento, culminando em Foucault, em que

virtus foi entendido como base em princípios da informação, do

conhecimento e da comunicação. No entanto, na passagem do

milénio esperava-nos uma profunda revolução no que se entende por

virtual.

Na verdade, as fronteiras entre o espaço e o tempo deixavam de ser

definidas, a matéria da arquitectura deixava de ser física, criavam-se

Page 317: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

294

novos conceitos que preconizavam a introdução de novas

metodologias na forma de pensar e de construir a arquitectura e,

apesar de no início a arquitectura virtual não ter de ser

obrigatoriamente criada em computadores ou concebida no

ciberespaço, na realidade, os seus protagonistas estavam fortemente

vinculados ao desenvolvimento das novas tecnologias de informação

e de comunicação.

Todavia, é preciso entender que a noção de virtual não deve ser

limitada simplesmente à produção ou utilização de novas tecnologias

na área da informação e da comunicação, pois o termo acompanha a

história da evolução do homem. Neste contexto conjugam-se dois

factores: um, que alerta para os perigos e limitações, e outro, que

aponta para possibilidades de construção de uma nova subjectividade

no processo de evolução do homem.

Assim, à semelhança do debate que acompanhou a sociedade no

final do século XIX, surge um novo grupo de ludistas que lideram uma

nova tendência, ainda que menos radical já que reconhecem as

vantagens da máquina, contudo questionam a sua aceitação

incondicional, como é o caso de Joseph Weizenbaum, em Berkeley,

antigo colaborador do MIT, e de Albert Borgmann na Universidade de

Montana, entre outros. Porém, parece-nos importante destacar,

Page 318: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

295

dentro deste grupo, Hubert L. Dreyfus que, no início dos anos 70,

manifestou as suas preocupações, numa critica à inteligência

artificial, na publicação de What Computer Can’t Do: A Critique of

Artificial Reason. 136136136136

Entretanto, aparecem alguns filósofos, como os franceses Félix

Guatarri e Pierre Lévy, 137137137137 que embora revelem, igualmente, uma

postura cautelosa, apresentam uma visão mais optimista

relativamente às novas tecnologias da comunicação. Em Caosmose,

Um novo Paradigma Estético, por exemplo, Guatarri abordou

algumas temáticas, que mais tarde foram desenvolvidas por Lévy, em

que admitia que o conceito de máquina não se manifesta

136136136136 Esta interessante obra reflecte o modo como se foi constituindo a crença nas

ciências: o intento de Gottfried Leibniz de reduzir o mundo material a cálculo

matemático, o papel da razão na essência do ser humano, bem como o modo como

a racionalidade passou a dominar a tradição científica ocidental. Dreyfus associa o

valor inerente à tecnologia do mesmo modo que o valor dado pela tradição científica

ocidental foi associado à racionalidade.

137137137137 Na verdade, a noção de virtual já tinha sido tratada por outros contemporâneos

como Gilles Deleuze e Michaek Serres.

Page 319: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

296

isoladamente do meio exterior mas, sempre, em complementariedade

com o homem.

Mais contrastantes são as ideias de Paul Virilio e Jean Baudrillard, na

medida em que enfatizam os perigos e os limites do virtual. Virilio,

não sendo um conservador, já que aceita a tecnologia e analisa

prudentemente as consequências que as inovações técnicas

produzem numa sociedade como a actual, tem tido uma postura

céptica neste debate, pois no seu entender “não se deve idealizar

nem mitificar os objectos técnicos”138138138138 (Virilio, 1999)

Por seu lado, Baudrillard critica, também, as tecnologias electrónicas

de comunicação, divergindo de Lévy num ponto fundamental, que nos

interessa no âmbito deste trabalho, como é a noção de virtual, que de

acordo com Baudrillard carrega consigo os aspectos negativos e sem

limites do que considera ser a informação como catástrofe.

138138138138 VIRILIO, Paul, FUTORANSKY, Luisa. Paul Virilio entrevistado em Paris por Luisa

Futoransky a propósito do lançamento do seu novo livro, A Bomba Informática. Flirt

[em linha]. Julho 1999, n. 12 [referência de 7 de Maio de 2007 Disponível na internet em:

<http://www.flirt.net.novis.pt/arquivo/f_julho/julho/textos/virilio.htm>

Page 320: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

297

7 . 1 O C O M P U T A D O R C O M O F E R R A M E N T A

Assim, no final do século XX, como se tem tentado mostrar, a

arquitectura depara-se com um novo conceito no processo de

artificialização do espaço, o ciberespaço, 139139139139 um termo surgido no

romance de William Gibson Neuromancer, uma obra de ficção

científica que explorou a cultura digital. Este conceito desenvolveu-se

a par do avanço da tecnologia e o desenvolvimento do ciberespaço,

enquanto novo conceito filosófico, veio a revelar-se fundamental no

sentido de vincular a arquitectura virtual, também denominada de

digital.

Efectivamente, o computador e as suas possibilidades conduziram a

uma revolução em termos de espaço e de tempo, passando-se em

pouco mais de um século, de uma condição pré industrial para o

ciberespaço, pelo que o tema da arquitectura virtual tem vindo a ser

discutido cada vez de forma mais generalizada, sendo que alguns

autores, como é caso de James Steele, considerem que este debate

é ainda insuficiente.

139139139139 A palavra ciber deriva da palavra grega kyberman que significa controlar.

Page 321: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

298

Neste contexto, parece-nos importante tentar perceber o modo como

os arquitectos utilizam as possibilidades viabilizadas pelo

computador, uma vez que existem distinções claras no uso que

fazem desta ferramenta.

Estas distinções prendem-se, essencialmente, com o facto de alguns

arquitectos utilizarem o computador apenas como uma mera

ferramenta nas várias fases do processo de concepção, isto é, como

um complemento ao métodos tradicionais, ao contrário de outros que,

intencionalmente, aproveitam ao máximo todos os recursos

tecnológicos a que têm acesso para definirem as suas próprias

metodologias. Há ainda que considerar um terceiro grupo, o dos

arquitectos que se deixam conduzir pelo computador, passando este

a liderar o processo de concepção, situação que tem gerado algumas

inquietações entre os arquitectos. Um quarto grupo que podemos

ainda considerar, é aquele onde se verifica uma simbiose entre o

factor humano/natural e o tecnológico, existindo entre estes dois

factores uma relação íntima que proporciona a construção de um

espaço que podemos considerar de híbrido.

Steele classificou, em quatro grandes temas, o modo como se utiliza

o computador em arquitectura, englobando igualmente, em cada um

deles, vários trabalhos, no entanto e apesar de algumas semelhanças

Page 322: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

299

formais com a maneira como enquadramos o tema, nesta nossa

análise, como iremos constatar, a perspectiva a apresentar enquadra-

se no modo como o virtual influencia a arquitectura e, em simultâneo,

a forma como o homem se relaciona com o espaço.

É nesta ordem de ideias que defendemos que se o computador,

como ferramenta de trabalho, potencia por si só uma imagem que se

pode considerar de vanguarda, e se a máquina é o maior aliado do

homem, podemos também provar que os maiores avanços são

produzidos quando existe uma forte cumplicidade entre o homem e a

máquina, e tal como se defende o híbrido para a sociedade, também

se pode provar que, de forma análoga, a arquitectura mais qualificada

transpira sempre a sensibilidade da época.

No entanto, antes de defendermos esta ideia, parece-nos necessário

contextualizar este tema. Sem dúvida que o uso do computador como

ferramenta de trabalho tem algumas vantagens, uma vez que

simplifica o modo de projectar, facilita a produção de desenhos

repetitivos, permite a visualização tridimensional, imprime a sensação

de movimento e de animação aos espaços, antecipando as possíveis

utilizações, transforma esboçetos em secções tridimensionais,

permite criar desenhos ousados e de vanguarda e desenvolver

projectos em terrenos de topografias difíceis, de tal forma que

Page 323: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

300

podemos mesmo afirmar que se conseguem desenvolver projectos

de arquitectura impossíveis de resolver com representações

convencionais ou sem o auxílio do computador. Esta ferramenta

ajuda, inclusive, a resolver questões relacionados com o meio

ambiente, tais como a exposição solar e os níveis de iluminação, de

maneira a que através da criação de formas mais aerodinâmicas, se

obtenha uma melhor rentabilização dos elementos.

Importa notar que estas vantagens, introduzidas pelo computador,

funcionam a favor da relação do homem com o espaço de habitar, e

apresentam alguma continuidade com as questões que intrigaram os

arquitectos ao longo de todo o século XX, e aos quais dedicamos os

capítulos anteriores deste trabalho, contudo estas questões

aparecem, agora, ajustadas a novas realidades tecnológicas,

construindo, nalguns casos, situações de revolução e até mesmo de

movimento de ruptura, como anteriormente acontecera,

nomeadamente, com o futurismo, o construtivismo e com a Bauhaus.

Indiscutivelmente, a forma como se trabalha o computador altera-se

de arquitecto para arquitecto, segundo intenções muito específicas,

como iremos ver, e independentemente do facto do número de

programas para computador estar constantemente a ser actualizado

e de a todo o momento surgir novo software para arquitectos.

Page 324: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

301

Alguns arquitectos utilizam o computador como complemento dos

métodos de desenhos tradicional e, não tencionando mudar as suas

metodologias, desenvolvem o seu projecto essencialmente com base

em maquetas de trabalho, utilizando o AutoCad apenas para as

tarefas repetitivas e levantamentos técnicos.

No entanto, principalmente quando trabalham em projectos de grande

escala, aproveitam algumas das outras vantagens do uso do

computador e, nesse caso, utilizam hardware (o computador e os

seus periféricos) e software (programas/suportes lógicos)

fundamentais para a visualização tridimensional, ou, ainda, o software

de documentação, outro exemplo muito eficaz para estudar as várias

possibilidades do projectos e que permite construir todo o tipo de

maquetas tridimensionais, físicas ou virtuais.

Nesta versão em que o computador é apenas uma ferramenta,

verificamos que uma das vantagens de utilizar determinados

programas, é a facilidade com que se criam formas aerodinâmicas

que transmitem a sensação de velocidade e fluidez, sendo de registar

que à semelhança do que tinha acontecido com o futurismo nos anos

20, a noção de movimento aparece ligada à vanguarda, só que agora

o computador facilita a criação de formas ainda mais ousadas. Neste

caso, o computador é a ferramenta que possibilita levar a

Page 325: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

302

representação das formas mais adiante, como acontece, por

exemplo, com o vidro que difícil de representar no inicio do século,

pode agora com o computador, ser reproduzido em projecto de uma

forma mais real.

Não obstante, convém ter presente que a disciplina de arquitectura

comporta mais do que a simples representação de algo e devemos

assinalar que em alguns projectos a utilização de métodos digitais

veio mascarar ou rotular a essência e a qualidade do projecto,

revelando conceitos que não vão para além de uma qualquer imagem

consumista ao gosto da época, muito ao modo de como o estilo

eclético fazia algumas reproduções no fim do século XIX.

Parece ser este o caso do projecto de Graha Kuningan, uma torre de

50 andares projectada e construída entre 1995 e 1998 no centro de

Yakarta, na Indonésia, em que a firma NBBJ utilizou o computador

para criar uma certa sensação de movimento e fluidez, conseguida

através de dois remates de vidro ligeiramente curvo que

contrastavam com o centro urbano, rígido e rectilíneo.

Efectivamente, nem todos os exemplos de desenhos criados por

computador, nomeadamente, os que permitem acrescentar a noção

de velocidade a partir de técnicas digitais, se traduzem em bons

exemplos de arte arquitectónica, como é o caso da NBBJ no centro

Figura 92

Centro Urbano de Kwan em Hong-Kong

Page 326: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

303

Urbano de Kwan Tong que, embora considere algumas questões que

poderiam ser interessantes, denota contudo alguma falta de

sensibilidade na forma como as questões foram trabalhadas,

provando que neste caso concreto a tecnologia não esteve a favor do

projecto de arquitectura.

Assim, apesar da torre de escritórios em vidro marcar a diferença do

projecto relativamente à envolvente, percebe-se que o projecto segue

os vulgares padrões formais, comuns a este tipo de projectos, como é

o caso do átrio central, paradigma da velocidade que abraça esta

estrutura urbana, que poderia ser inserido com a mesma ligeireza, em

qualquer outra cidade ou em qualquer outra malha urbana. Aqui, o

arquitecto não trabalhou qualquer conceito e o projecto foi tratado

como um mero objecto ou produto da era digital.

Outra prova de que o computador por si só não resolve melhor um

qualquer projecto é o dos novos escritórios centrais da Telenor, uma

das firmas de telecomunicações mais importantes da Noruega, para

os terrenos do antigo Aeroporto Internacional de Oslo, em Farnebu.

Neste caso, percebe-se claramente uma aposta na qualidade do

projecto pois do mesmo modo como trabalha com a tecnologia digital,

também considera a natureza e a história do lugar. “La memoria de la

pista de aterrizage que finaliza en una espectacular vista del fiordo de

Figura 93

Escritórios centrais de Telenor em Oslo

Page 327: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

304

Oslo consigue yuxtaponer el frisson da máquina a un pequeño

paraíso natural” (Steele, 2001, p.83), provando-se mais uma vez a

importância da necessidade de cruzar a máquina e a natureza numa

cumplicidade positiva.

Por outro lado, o RoTo Architects, 140140140140 um atelier relativamente

pequeno mas com um percurso muito interessante, apresenta todo

um trabalho desenvolvido a partir das capacidades técnicas do

computador em conjunto com uma grande sensibilidade,

considerando, neste caso, fundamental a leitura do lugar. Assim, para

chegarem à forma definitiva, trabalham imersos num intenso trabalho

em que conciliam as maquetas tradicionais e a simulação virtual.

É o que aconteceu, por exemplo, no projecto de HollYwood-Orange

em que RoTo só introduziu software do tipo Power CAD e Form-Z,

depois de estarem definidos os diagramas convencionais e os

esboçetos conceptuais. Isto, porque segundo Rotondi, é apenas a

140140140140 Michael Rotondi é um dos fundadores de SCI-Arc (Southern California Institute of

Architecture), que chefiou de 1987 a 1997. Com o seu então sócio Tom Mayne,

Rotondi também cofundou, em 1976 o conhecido Morphosis em Los Angeles. Mais

tarde, em 1991, criou RoTo, com Clark Stevens, um antigo colaborador e aluno em

Morphosis.

Figura 94

Urbanização de Hollywood-Orange em Los Angeles.

Page 328: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

305

partir desse momento que os diagramas passam para um processo

de “leer y redefinir el sitio, para gerar uma cartografía neutral, para

que el edificio empiece a reflejar y asimilar todos los aspectos que lo

rodean”.

Com efeito, como temos vindo a tentar provar, a arquitectura

testemunha sempre as intenções do seu autor e as capacidades

técnicas possíveis numa determinada época, podendo-se constatar

que a natureza e o lugar influenciam todo o processo conceptual e,

neste caso, o Software Form–Z foi utilizado para transportar os

esboçetos conceptuais para espaços tridimensionais, em paralelo

com as características do lugar, e as maquetas tradicionais iam-se

construindo a partir das formas que surgiam do computador.

Aqui, as metodologias aplicadas contemplaram aspectos

fundamentais para a prática da arquitectura, como o raciocínio, a

reflexão e o sentido crítico, factores que constroem, por parte dos

arquitectos, um discurso conceptual coerente.

Uma estratégia idêntica foi adoptada por RoTo nos projectos para o

mosteiro Budista Xiyuan e para a casa Oak Park Pass. Assim, na

realização de maquetas foram considerados factores como a

investigação gráfica inicial, a simulação por computador dos

esboçetos conceptuais e a cartografia detalhada do lugar, pelo que o

Figura 95

Templo Budista Xiyuan.

Figura 96

Casa Oak Park Pass.

Page 329: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

306

projecto final reflectia todo um processo gráfico, com base em

registos digitais e tridimensionais. Por outro lado, nestes dois

projectos estiveram, também, reunidas as condições para uma maior

reflexão em torno do natural, como por exemplo no mosteiro, em que

o arquitecto e o cliente se empenharam em criar uma “serena unión

entre a arquitectura y naturaleza” (Steele, 2001, p.90). Já a casa,

colocada num desfiladeiro, implicou, devido às características do

local, uma reflexão ainda mais profunda a propósito do lugar, com a

natureza e respectivas condicionantes a influenciarem

particularmente todo o processo conceptual.

Desta forma, o modelo topográfico em computador assinalou um

triângulo de pontos de cota elevada e rebaixou alguns pontos para

permitir o acesso gradual aos vários níveis do monte de penhascos

rochosos, cobrindo ambos os pontos com uma cobertura ondulada e

dobrada. Na verdade, Rotondi percebe esta cobertura ondulada como

símbolo emblemático nas mudanças dos paradigmas que o desenho

assistido por computador pode viabilizar e, eventualmente, podemos

encontrar nesta cobertura, alguma semelhança com a cobertura de

Ronchamp de Le Corbusier.

Mas se neste projecto de RoTo se percebe que o computador

permitiu criar desenhos ousados e de vanguarda, desafiando a

Figura 97

Casa Oak Park Pass.

Page 330: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

307

configuração da própria envolvente natural, devemos, igualmente,

referir um outro exemplo em que a paisagem natural desempenhou

um importante papel na solução formal, que foi a que Morphosis

adoptou quando interveio numa ladeira de forte inclinação em

Pomona, na Califórnia.

E aqui é mais uma vez a máquina, neste caso o computador, que

torna possível um projecto que, à partida, parecia impossível de

construir, devido aos declives acentuados. Importa reter que este

projecto do School District foi efectuado num terreno de 30 hectares,

fortemente inclinado, em que era necessário acautelar o perigo de

deslocamento de terras e de possíveis problemas de erosão, devido à

drenagem das águas pluviais, e que o projecto procurava, também,

preservar a vegetação existente.

De resto, apesar de neste projecto se perceber a forte intenção de

libertar o máximo de solo possível, numa estratégia de contraste

entre a ladeira que configura o terreno e a escola, existe em

Figura 98

Escola Secundária Diamond Ranch em Pomona.

Page 331: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

308

simultâneo a intenção de provar que é possível dominar a natureza,

num projecto ousado que diferencia o construído do natural, num

gesto de conquista só possível devido aos novos métodos

informáticos.

Ainda neste contexto, em que o computador é a ferramenta

fundamental para criar registos que antecipam representações de

uma realidade, não podemos deixar de fazer referência ao Rose

Center for Earth and Space (Panetário Hayden) no American Museum

of Natural History de Manhattan, projectado pelo grupo de arquitectos

de James Stewart Polshek Partnership.

Neste projecto, a esfera parece desafiar a gravidade, o planetário

parece flutuar no interior de um enorme cubo de vidro aparentemente

sem qualquer apoio estrutural. Isto foi alcançado porque o único

apoio da esfera foi efectuado de forma muito subtil para criar a ideia

de levitação da esfera, o que foi conseguido através da aparência

cristalina dos painéis de vidro do cubo.141141141141 Neste projecto concilia-se o

141141141141 A estrutura de revestimento da esfera comporta 5.599.663 peças acústicas em

forma de diamante com curvaturas distintas, impossíveis de construir ou mesmo

desenhar sem a ajuda dos meios informáticos.

Page 332: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

309

facto do computador possibilitar a construção da estrutura em termos

formais e técnicos, com a própria funcionalidade do planetário que

propõe uma imagem de vanguarda. 142142142142 Assim, a larga rampa em

espiral de acesso aos teatros tenta fazer uma alusão ao Caminho

Cósmico, onde os visitantes podem apreciar a grandeza da via láctea

e comparar os planetas do sistema solar:

Un puente que penetra en el centro de la esfera se convierte

en el umbral de paso del mundo real a un universo virtual,

expuesto a los espectadores en asientos tipo nave espacial

que retumban a través de un paseo teleológico directo hasta

las lejanas galaxias, sin tener todavía en consideración ni la

teoría general de la relatividad, ni la teoría de cuerdas.

(Steele, 2001, p.96)

O universo é desta forma mostrado, aproveitando as várias

possibilidades do computador para criar espaços e percursos

espaciais, combinados com uma interactividade própria do programa

da exposição.

142142142142 Assiste-se um pouco por todo o mundo a uma transformação ao nível dos

museus, de forma a possibilitarem uma interactividade entre o utilizador e o espaço.

Page 333: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

310

Um outro projecto, também ele em forma de esfera, é a Assembleia

da Greater London Authority em que o arquitecto Norman Foster por

razões ambientais, para controlar as perdas e ganhos de calor e para

conseguir melhor rendimento energético, recorreu a esta forma

geométrica que foi manipulada a partir de uma experiência em

computador.

Desde os primeiros projectos, e também muito devido à influência de

Rogers, 143143143143 é perceptível nos trabalhos de Foster a presença do estilo

high-tech, contudo esta tendência foi sendo aligeirada, notando-se

que a imagem industrial, marcada nos seus projectos pela repetição

de alguns elementos, nunca foi abandonada.

No projecto da Assembleia percebe-se, também, a presença desses

elementos repetitivos, do mesmo modo que se percebe uma grande

preocupação na sua relação com o meio ambiente em tornar o

edifício sustentável, pois o edifício procura a melhor forma de se

adaptar à exposição solar, de rentabilizar as trocas de calor, sendo

143143143143 Este arquitecto trabalhou durante um tempo com Richard Buckmister Fuller e

fundou em 1965 um atelier de arquitectura, o TEAM 4. Mais tarde, numa sociedade

com Richard Rogers, mudou o nome para Foster and Partners.

Page 334: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

311

revestido com painéis fotovoltaicos que alimentam as bombas de

extracção de ar. Neste caso, o edifício tenta tirar partido dos avanços

técnicos para sustentar a sua própria existência.

Page 335: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

312

7 . 2 . O C O M P U T A D O R A O S E R V I Ç O D O H O M E M E

D A N A T U R E Z A

Uma das facetas interessantes do computador é poder experimentar

formas espaciais de modo a melhorar a qualidade ambiental, questão

que desde há muito preocupa os arquitectos e que vai sendo tida

cada vez mais em conta nos avanços produzidos, muito também

devido às novas possibilidades técnicas. Assim, o avanço técnico

permite criar formas cada vez mais aerodinâmicas, como é o caso da

companhia de seguros Swiss Reinsurance, em que uma estrutura em

diagonal no interior do edifício, facilita a ventilação: devido às

diferenças de pressão existentes individualmente em cada piso, o ar

fresco é capturado no exterior, através de pequenas frestas

horizontais no remate do vidro e do alumínio que constituem o

revestimento do edifício.

Indubitavelmente, as tecnologias digitais podem trazer mais valias

nas questões ambientais e um dos exemplos que justificam esta

afirmação é o Projecto Eden, situado em Cornwall e iniciado em 2000

por Nicholas Grimshaw & Partner. Este projecto pretende ser uma

reprodução de ecossistemas terrestres dentro de uma cobertura

fechada hermética, pois esta estrutura foi planeada com a ideia de Figura 99

Projecto Eden em Corwall.

Page 336: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

313

salvaguardar o solo na zona de uma das mais antigas minas de

estanho, entretanto abandonada.

De facto, podemos incluir este projecto num conjunto de projectos

impossíveis de executar com métodos de representação

convencionais, porém, neste caso, os meios digitais viabilizaram a

construção duma estrutura flexível de complexos painéis de vidro que

se iriam organizar organicamente na natureza.

Importa notar que foram os meios digitais que tornaram possível

construir um forma flexível, com a mesma capacidade de adaptação

dos organismos vivos, num espaço cuja intenção é que se perceba a

necessidade de reflexão em torno dos problemas da ecologia e dos

ecossistemas naturais.

É curioso constatar que sempre com a ideia de uma forte

cumplicidade com o natural, se podem construir analogias entre o

natural e o artificial, e no projecto Eden foram, ainda, criadas zonas

bioclimáticas, biomas, valorizando a biodiversidade do mundo

vegetal, cobertas, por um interessante sistema técnico, onde se

percebe uma intenção conceptual de acordo com a regras do mundo

orgânico, assente em princípios como a adaptação ao meio, o

crescimento e o desenvolvimento:

Los biomas estancos gracias a un exoskeleton (esqueleto de

Figura 100

Projecto Eden em Corwall.

Figura 101

Projecto Eden em Corwall.

Page 337: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

314

hexágonos) de acero ligero cubierto por una suave membrana

transparente, se dividen en regiones húmedas templadas y

tropicales; se ha prestado una atención especial a establecer

un contraste entre el interior e el exterior. A geometría esférica

resultó ser la más adecuada – o mínimo de superficie cubre el

máximo de volumen – para definir una estructura fuerte e ligera,

construida a partir de piezas tubulares rectas que trabajan a

compresión, unidas con juntas de hierro colado estándar,

configurando una geometría de alvéolos hexagonales de 9

metros. Los hexágonos se revisten de almohadones

transparentes hinchados, ambos elementos conforman una

cubierta extremamente ligera. (Steele, 2001, p.107)

Este texto permite-nos reconhecer, facilmente, alguns princípios de

metamorfose experimentados por Steiner, no entanto, agora

ajustados a novas tecnologias, pois enquanto Steiner experimentou a

plasticidade do betão, para construir as suas estruturas orgânicas,

Nicholas Grismshaw & Partner experimenta as novas tecnologias de

vanguarda, numa época com outras possibilidades de trabalhar os

materiais, nomeadamente, o vidro.

Outro exemplo onde a utilização do computador permitiu construir

formas arrojadas, neste caso definitivamente associadas a uma

Page 338: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

315

tendência high-tech, foi a proposta para as torres Petronas em Kuala

Lumpur, na Malásia, e que provou que esta tendência podia ser

ajustada a uma imagem formal que se identificasse com diferentes

culturas, como foi o caso previamente definido no programa do

concurso internacional. Na verdade, os avanços tecnológicos

permitiram construir duas torres de 452 metros de altura com 88

pisos, revestidas em painéis de aço inoxidável alternados com

bandas horizontais de vidro reflector, que foram pensados com o

intuito de dar resposta às repentinas mudanças do clima na Malásia,

em que o sol e as nuvens se substituem várias vezes ao longo do dia.

Neste caso e independentemente da qualidade do projecto, o

computador não só permitiu a construção de uma arrojada estrutura,

como foi igualmente importante para recriar os desenhos tradicionais

da cultura islâmica.

Interessa sublinhar que a questão da recriação a partir da reprodução

se poder tornar numa contribuição perigosa, é uma situação que tem

alguma semelhança com o modo como se enquadrou o tema da

máquina na revolução industrial e com as diferenças que existiram ao

nível do entendimento que se fazia desta ferramenta.

Efectivamente, o facto da câmara digital permitir facilmente réplicas

de reproduções antigas está a gerar alguma controvérsia, pois trata-

Page 339: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

316

se de um processo que põe em causa não apenas a veracidade da

herança cultural, como também a velha questão da reprodutibilidade

técnica.144144144144 Aliás, um exemplo pouco positivo do uso que se fez desta

aplicação, gerando criticas muito negativas quanto à utilização desta

prática informática, foi o que o arquitecto Abdel Wahed El-Wakil

realizou na mesquita do Rei Saud, na Arábia Saudita, ao copiar os

motivos escavados debaixo da entrada principal da mesquita do

sultão em Hasan, no Cairo.

No entanto, nem todas as reconstruções ou reproduções de

arquitectura, em realidades virtuais, têm efeitos negativos, como

revela o trabalho do arquitecto Dennis Holloway que embora tenha

uma formação marcada pelo modernismo, manifestou desde cedo o

seu interesse pelo que chama de verdadeira arquitectura americana,

em que os edifícios aparentam crescer organicamente da terra. Na

sua investigação, concluiu que a arquitectura indígena americana

apresenta características diferentes das da arquitectura dos outros

144144144144 Benjamin Walter publicou em 1936, um ensaio A obra de Arte na Era da

Reprodutibilidade Técnica, em que reflecte sobre as novas potencialidades

artísticas, nomeadamente no aparecimento da fotografia e os perigos inerentes ao

facto de se poder deixar de distinguir o original da cópia.

Page 340: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

317

continentes, já que estas construções apresentavam soluções

moldadas pelo tempo e reflectiam importantes experimentações no

campo das condições climáticas e micro-ambientais dos continentes

americanos.

A partir de 1973, fase do primeiro embargo do petróleo árabe, Dennis

Holloway investigou formas arquitectónicas com o objectivo de

encontrar soluções alternativas de aquecimento e de refrigeração dos

edifícios que não dependessem de combustíveis fósseis, e a

aplicação dos conhecimentos relacionados com a energia solar,

associados ao processo de concepção arquitectónica, veio a

contribuir para dar uma nova vitalidade e contemporaneidade à sua

arquitectura.

Certamente, a arquitectura que minimize a dependência de

combustíveis fósseis contribui para diminuir o aquecimento global e o

efeito de estufa provocado pelas emissões do dióxido de carbono, e

este seu trabalho de investigação sobre a utilização passiva da

energia solar revelou-se um forte contributo. De facto este trabalho

que tinha muitos pontos em comum com a arquitectura indígena

americana, permitiu que desenvolvesse a partir de 1990, no Novo

México, um interessantíssimo trabalho.

A partir dessa altura desenvolveu um programa electrónico chamado

Page 341: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

318

de ray tracing, que consistia em fotografar e animar o modelo que o

ajudou a desenvolver no Novo México, em 1997, trabalhos para os

clientes indígenas, provando que uma técnica do presente pode

ajudar a construir com base em princípios ancestrais do passado.

O computador também ajudou Grimshaw & Partner a delinear a

completa geometria que se utilizou para resolver o problema que

propunha integrar um novo balneário em seis edifícios já existentes,

três dos quais catalogados como edifícios históricos da cidade

georgiana de Bath, na Inglaterra. Inserido numa zona muito vinculada

à tradição termal, o projecto visava revitalizar, tanto para indicações

médicas como para lazer, as únicas fontes termais naturais do Reino

Unido e que estavam fora de serviço desde 1978.

Neste caso, assistiu-se a um esforço de cooperação entre o governo

municipal e o operador termal da Holanda, Thermal Developements,

com vista a promover a fusão entre edifícios novos e reabilitados e

com a intenção de atrair de novo as pessoas até esta histórica cidade

e revitalizar o uso termal.

Assim, foi proposto que o solar do já demolido edifício Beau Street

fosse ocupado pelo único edifício de nova planta que a intervenção

supunha: um cubo organizado em três plantas situado junto ao

balneário, numa relação harmoniosa. A cobertura do cubo apoia-se

Page 342: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

319

numas colunas de grande escala que, por sua vez, emergem desde a

piscina de forma livre que, por seu lado, actua como uma lâmina

prateada que reflecte a geometria cúbica. À semelhança do que o

construtor Decimus Burton utilizou no século XIX para conter os

banhos termais, o cubo é perfurado por lentes de vidro que, durante o

dia, disseminam a luz natural para o interior e que, à medida que é

filtrada pelo vapor que emana da piscina de água quente, cria um

efeito muito parecido com as tradições omriyyad dos banhos turcos.

Também a relação entre o muro cortina, no linear de vidro, e a rígida

geometria do cubo que a contém, é curiosa e apela deliberadamente

aos muros desenhados num estilo paladiano, numa associação

directa entre os actuais protagonistas da tendência high-tech britânica

e os melhores exemplos da escola de engenharia do ferro e do vidro

do período da revolução industrial.

Outro exemplo que igualmente podemos considerar, é a torre de

apartamentos e escritórios SEG, situada em Donau-City, em Viena.

Este projecto surgiu na sequência dos cinemas UFA, construídos em

Dresden (1993-1998), onde Coop Himmelb(l)au, numa estratégia de

vanguarda, ensaiou formas bastante arrojadas no espaço público.

Na torre SEG, contudo, pode-se constatar que para além desta

condição, reflexo das novas técnicas digitais, existiu, igualmente, uma

Page 343: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

320

grande preocupação com as questões ambientais. Assim, foi

considerado para o edifício uma fachada de vidro inteligente, que de

certa forma unifica as habitações, trabalhando conjuntamente com

uma caixa de ar na cobertura que permite regular as temperaturas

extremas de Viena, tanto no Inverno como no Verão. Esta fachada

climática que a partir do exterior parece uniforme, oculta uma secção

muito dinâmica que configura apartamentos tipo loft e, desta maneira,

a fachada em vidro que, por sua vez, protege viveiros de plantas que

crescem em altura, converte esta construção num verdadeiro edifício

verde.

No quadro que apresentamos, foram apresentadas algumas

estratégias de como se pode enquadrar o computador na

representação de espaços arquitectónicos e de como se pode

potenciar a sua utilização em favor de uma qualquer tecnologia, é no

entanto importante assinalar que algumas das preocupações que

intrigaram arquitectos, como os da Bauhaus, Le Corbusier ou Frank

Lloyd Wright, entre outros, continuam presentes nas gerações que se

lhes seguiram, nomeadamente, no que concerne a necessidade de

ajustar o espaço habitável ao homem e de criar, através das

condições naturais, melhor qualidade no interior dos espaços, em que

o edifício passa a servir melhor um fim específico, o de habitar

Page 344: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

321

melhor.

Como temos verificado, é interessante constatar que mesmo a

arquitectura construída através de processos digitais não descurou as

temáticas que se prendem com o meio ambiente, o que também

podemos observar com Ken Yeang 145145145145 e a sua equipa de arquitectos,

ao criarem a ideia de arranha céu sustentável, assente na convicção

deste arquitecto de que a resolução dos problemas sociais e

económicos passa por criar uma tipologia de edifício em altura que

deverá ser humanizado e adequado às questões da sustentabilidade.

O trabalho de Ken Yeang ficou ainda mais conceituado quando

ganhou o prémio Aga Khan de arquitectura, devido às suas

estratégias de ventilação natural aplicadas na Menara Messinaga.

Neste caso, o arquitecto conceptualizou na parte superior do edifício

uma pequena asa que dirigia o vento para o átrio interior central e,

para além do aspecto formal, teve a preocupação em colocar as

145145145145 Fez a sua formação na académica na Architectural Association de Londres e na

Universidade da Pensilvânia sofreu a influência de Ian McHarg, pioneiro no conceito

de planeamento ecológico, autor de Design with Nature.

Page 345: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

322

bandas de protecção solar e as galerias de maneira a conseguir um

melhor rendimento da incidência solar.

Outro exemplo, são os escritórios centrais do partido UMNO em

Pennang, na Malásia, um projecto pensado de modo a reduzir os

custos energéticos, pelo que para substituir o ar condicionado por

ventilação natural, foi projectado um enorme muro, mais um vez em

forma de pequena asa, e colocado estrategicamente por forma a

interceptar os ventos na parte superior do edifício e, em seguida,

encaminhá-los a todos os escritórios, sendo de assinalar nesta

estratégia, as semelhanças formais com o orgânico – a forma

adaptada à função.

Mas, apesar do interesse de todo o trabalho desenvolvido por esta

equipa, é contudo no projecto da torre Nagoya 2005, que Hamzah e

Yeang sintetizam muitas das ideias que o atelier desenvolvera nas

últimas décadas. Neste caso, mais uma vez, foi o computador que

permitiu que se viabilizasse a ideia de incorporar vegetação com

parte da tecnologia da torre, o que foi conseguido através da

conceptualização de uma estrutura compatível e pela optimização

dos sistemas de climatização, viabilizando assim, num interface entre

o natural e o artificial, os princípios da sustentabilidade.

Pittard Sullivan em Culver City, a oeste de Los Angeles, é outro

Page 346: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

323

projecto frequentemente associado à era digital e que se destacou

enquanto espaço passível de ser considerado de cidade de futuro. O

projecto foi concebido num espaço onde antes se situava uma área

industrial, entretanto desactivada, e portanto tratava-se de proceder a

uma reabilitação industrial que atraísse novas empresas, fundadas

agora noutra área económica, os serviços, que por seu lado,

acompanhava a evolução tecnológica.

Curiosamente, a cada um dos projectos foi dado um nome escolhido

de um léxico que tinha referências com a inteligência artificial, uma

situação que a própria arquitectura queria nomear.

No sentido de privilegiar a sustentabilidade, foi criado um sistema que

pudesse fundir a rede de transportes, habitações e espaços de lazer,

respeitando de certo modo as pré existências industriais e tentando

recuperar parte da antiga estrutura, em particular a que se justificava

em termos simbólicos, para se aplicarem novamente, do mesmo

modo ou em combinações diferentes, demonstrando que também a

reciclagem pode ser compatível com a arquitectura actual. Aliás, outro

conceito protagonizado neste projecto foi a criação de um espaço de

uso misto, de modo a reduzir a dependência dos transportes e a

reduzir os gastos energéticos.

Os arquitectos Moore, Ruble e Yudelle Eric Moss projectaram para

Page 347: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

324

este espaço, o protótipo da casa para o novo milénio e, no projecto,

tentaram conciliar o que seriam as necessidades de habitação para o

homem com as mudanças sociais, demográficas e tecnológicas,

mediante um processo executado em conjunto com os métodos

tradicionais e com as possibilidades tecnológicas oferecidas pelo

computador.

De facto, estas técnicas híbridas criaram um sistema de componentes

espaciais e construtivos que pode associar várias formas, permitindo

um grande número de combinações.

A simulação virtual permitia, desta maneira, possibilidades de

experimentação em termos de configuração do espaço, para melhor

adaptação aos novos modos de habitar e às alterações do número de

habitantes por família, bem como para rentabilizar exposições solares

ou níveis de luminosidade, entre outros métodos de aproveitamento

energético, sendo interessante constatar que estas questões

correspondem às preocupações que, ao longo de todo o século XX,

estiveram presentes na construção de espaços.

Este sistema implicava todo um conjunto de elementos, tais como:

elementos pesados com o qual eram compostos os espessos muros,

chaminés e outros elementos com funções estruturais; elementos

ligeiros constituídos por protecções solares, paredes deslizantes, que

Page 348: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

325

permitiam ajustar o uso habitacional de forma flexiva, planos leves,

grelhas metálicas de ventilação, que podem utilizar energia solar e

elementos que fazem a relação com a envolvente; elementos de

apoio que englobam cozinhas, instalações sanitárias, recuperadores

de energia solar e eólica; e ainda elementos interiores

suficientemente flexíveis para facilitar usos distintos.

O quinto elemento, habitações paisagens, constituía-se como a

matriz de um conjunto de espaços exteriores, onde se incluem

terraços, pátios, espaços de lazer e recreio que fazem a conexão

entre interior e exterior.

No entanto, este projecto, apesar de ser associado por alguns

autores a cidade do futuro, apresenta algumas características que

revelam um certo conformismo formal, faltando-lhe uma procura mais

profunda de uma nova estética, ou mesmo de uma originalidade, que

apostasse mais no cultivo dum conceito de vanguarda.

Um trabalho que consideramos particularmente consciente e

intemporal, e no qual se percebe que as novas estratégias de

concepção do espaço ultrapassam largamente a aplicação prática

dos novos instrumentos de comunicação e as novos tecnologias, é a

abordagem feita por Fréderic Nantois e Fiona Meadows.

Apesar de ser cada vez mais difícil pensar em arquitectura sem

Page 349: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

326

considerar os recursos tecnológicos, estes dois autores incluíram na

sua reflexão três aspectos que consideraram fundamentais, todos

eles conhecidos e utilizados frequentemente por arquitectos e

independentemente da maior ou menor disponibilidade de recursos

tecnológicos que disponham: o processo de concepção, a

comunicação e as tecnologias.

Com efeito, é curioso verificar que conquanto que utilizem recursos

tecnológicos avançados, as questões que consideram são

intemporais e facilmente reconhecidas por quem tem que conceber

um projecto de arquitectura. Em primeira instância, consideram a

investigação de problemáticas particulares ligadas ao processo de

concepção do espaço; em segunda, a comunicação que reflecte o

resultado das experiências da investigação e permite uma

representação espacial da ideia do autor, estabelecendo uma relação

entre o objecto criado e o espaço habitado, neste caso trata-se do

espaço da percepção e das sensações físicas que, na actualidade,

temos de considerar como o seu análogo virtual ou digital; por fim, o

projecto de arquitectura permite comprovar os princípios dos

conceitos desenvolvidos na investigação e a inscrição na matéria de

todos esses princípios.

Estas três noções apesar de não serem novas têm no entanto a

Page 350: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

327

particularidade de contarem com aplicações media que lhes permite

criar novas bases no campo da concepção e da percepção do

espaço, provando mais uma vez a necessidade de adequação e de

interacção entre a arquitectura e a técnica, existindo de facto uma

estrutura comum que se pode estender a várias épocas, sendo que

na actual teremos de considerar o ciberespaço.

Page 351: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

328

8 . R E I N V E N T A R O E S P A Ç O

8 . 1 . C A T I A – F R A N K G E H R Y

Na verdade, todo o conjunto de situações até aqui expostas é

importante para a arquitectura mas, naturalmente, os arquitectos não

podem deixar de ir mais além na utilização do computador, como o irá

provar o trabalho de Frank Gehry, nomeadamente com a aplicação

do sistema CATIA.

É interessante observar que tal como aconteceu no fim do século

XIX, em que a engenharia ganhou um grande protagonismo e abriu

novas possibilidades à arquitectura, como foi o caso da utilização do

betão, também no final do século XX, se repete essa situação, em

que os avanços ao nível da operacionalidade na arquitectura, são

potenciados pela engenharia, conforme vamos a seguir constatar.

Em 1982, a IBM 146146146146 anunciou a primeira versão do sistema de

desenho mecânico CATIA. Este sistema foi desenvolvido por

146146146146 Em 1976, esta firma tinha já lançado no mercado um Sistema de Visualização de

Gráficos 2250 (2250 Graphics Display Sistem), um dos primeiros terminais com

Figura 102

Concert Hall da Disney em Los Angeles.

Figura 102

Esquiço do projecto para a Disney.

Figura 103

Concert Hall da Disney em Los Angeles.

Page 352: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

329

Dassault Systèmes – uma empresa subsidiária do fabricante

aeronaútico francês dos aviões caça – para adquirir capacidades de

controlo de superfícies num sistema de desenho já existente e, desde

então, o CATIA tem vindo a ser utilizado como facilitador de todas as

fases do processo de desenho, desde a fase inicial do conceito até à

construção. Na realidade, este sistema permite o intercâmbio de

informação digital, e a permanente dependência dos autores em

relação a este sistema revela bem a importância e a capacidade de

CATIA.

Frank Gehry foi um dos arquitectos que mais investiu na aplicação do

CATIA e embora o tenha utilizado pela primeira vez na sua proposta

para Barcelona, foi no seu projecto para o auditório da Disney, em

Los Angeles, que o utilizou de um forma mais arrojada, bem mais

além do que da simples representação gráfica. Com efeito, o seu

trabalho é deveras pertinente pois faz uma transferência para a

arquitectura do trabalho desenvolvido pela engenharia aeronáutica.

Na vila Olímpica de Barcelona, o sistema CATIA foi utilizado para

resolver dificuldades estruturais complexas e de grandes dimensões,

possibilidades para aceitar gráficos vectoriais CAD, que podiam ajustar-se a

programas de computapudores que continham uma qualquer proposta.

Page 353: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

330

e o que diferenciava este sistema dos restantes era o facto de se

utilizarem equações polinómicas, com o espaço a deixar assim de ser

entendido por pontos e passar a ser definido por uma equação, o que

permitia aceder a um qualquer ponto concreto, de uma qualquer

superfície. Segundo Glymph (Bruggen, 1997, p.135) director da firma:

“(...) CATIA, a program that deals with polynomial equations instead of

polygons, is pretty much capable of fefining any face, it knows it.” Um

rigor que permitia uma melhor adaptação da proposta, tal, Gehry

(apud,Bruggen, 1997, p.138)147147147147 refere numa entrevista:

Many of the forms he is developing now are only possible

through the computer. Bilbao is a perfect example. Prior to the

development of the computer applications in the office, they

would have been considered something to move away from. It

might have a pencil and straight-edge, but it would take us

decades.

Neste caso, Gehry percebeu as capacidades do CATIA para traduzir

os registos produzidos nos esquissos, realizados a partir de collages,

147147147147 ZAERA, Alejandro.1995. Conversations with Frank O. Gehry. In El Croquis

(Madrid) 74/75. p.153

Figura 104

Planta do Guggenheim de Bilbau.

Page 354: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

331

potenciando as capacidades de imaginação e de formalização de

complexidade. Gehry apoiou-se na técnicas de collage, que uma

qualquer forma, independentemente do seu grau de derivavam

frequentemente de formas curvas, utilizadas pelo construtivismo

russo durante os anos 20, um movimento, como vimos, que

sustentava a necessidade de repensar de que modo a forma segue a

função, e que se descobrem claramente na sua técnica de esboçetos,

baseada no fluxo da consciência.

O paradigma da utilização das possibilidades do computador para

criar formas complexas e construções arquitectónicas, até há data

impensáveis, é de facto o Museu Guggenheim, em Bilbau. 148148148148

A aplicação do sistema CATIA passou, efectivamente, a fazer parte

da maioria dos projectos de engenharia e do mesmo modo como

acontecera em meados do século XX, verificava-se agora, no seu

final, que existia mais uma vez, uma forte cumplicidade entre os

avanços da arquitectura e os avanços na construção de máquinas em

geral, com o automóvel, por excelência o espaço de transporte do

148148148148 Steele considerou-a a catedral da era digital, um símbolo da cultura da sua

época, equivalente a igrejas e catedrais de outros tempos.

Figura 105

Guggenheim de Bilbau.

Page 355: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

332

homem, a beneficiar também dos avanços produzidos pelo CATIA 149149149149,

fazendo lembrar as associações de Le Corbusier entre o espaço de

habitar e o automóvel.

Sem dúvida, este edifício da era digital, revestido a titânio que

reflectia todo o espaço envolvente, alcançou rapidamente o

reconhecimento internacional substituindo mesmo, o Museu de

Guggenheim de Nova Yorque que na altura da sua construção tinha,

igualmente, introduzido novos conceitos ao nível da espacialidade. O

titânio tinha substituído o betão e de novo a engenharia foi

fundamental para levar mais longe a ideia do arquitecto.

Until then, Gehry had been frustrated with contractors or

manufacturers he consulted who calimed that his sculptural

shapes could nor be built or were not economical. In

acknowledging that their limitations became his own he began

to lean more and more toward Frank Lloyd Wright’s theory that

149149149149 Os três principais fabricantes de automóveis de Detroit adoptaram o sistema de

aplicação interactiva para a construção tridimensional por computador, permitindo

melhores rendimentos dos custos e dos tempos de produção.

Page 356: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

333

an architect has to be a master builder as well. (Bruggen, 1997,

p.138)

O Guggenheim de Bilbau revolucionou completamente a forma de

construir o espaço, e com o computador a deixar de ser apenas uma

ferramenta e passar a ser um sistema inteligente de construção,

pode-se questionar, em que medida o computador conduziu, ou não,

o processo de concepção do projecto, como podemos constatar na

reflexão de Steele (2001, p.130):

La aplicación CATIA ha abierto nuevas puertas a la creación,

pero muchos se preguntan hasta dónde nos conducirá esta

tecnología y si realmente proporciona un umbral hacia nuevos

territorios, pues se trata exclusivamente de pura forma, sin base

teórica alguna en la que fundamentarse.

Este fenómeno, importante que o trabalho de Gehry reflecte,

proporcionou uma maior consciência em torno da necessidade do

debate sobre a modernidade e sobre o moderno, discussão essa, que

ultrapassa largamente a disciplina da arquitectura e que se estendeu

a outras áreas do conhecimento.

Page 357: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

334

8 . 2 . A M Á Q U I N A C O M O P R E T E X T O

Toyo Ito é um arquitecto que considera que há na nossa época, no

que respeita à cidade, um espaço fictício e imaginário que se está a

formar a partir de uma colagem de fragmentos mas que, todavia,

existe no espaço real, referindo Tóquio como uma cidade simulada,

na qual se vive. Mais concretamente, Ito defende que numa

sociedade como a actual, em que a informação é evasiva, existe

também, para além do nosso corpo real, um corpo virtual criado pela

acção da informação.

Este arquitecto refere a propósito da orientação conceptual dos seus

projectos, ao longo da sua carreira, que o sentido e o significado dos

seus trabalhos estão a mudar, pois se no passado a tecnologia era

apresentada de modo visível, agora é diferente. Segundo ele,

actualmente, a tecnologia é algo que esconde, que as pessoas têm

de procurar, não é visível, é um elemento que se explora de forma

indirecta.

Neste sentido, na Mediateca em Sendai, Toyo Ito vai testemunhar a

utilização da tecnologia informática como inspiração conceptual e

figurativa.

Figura 106

Mediateca em Sendai

Page 358: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

335

Com efeito, neste projecto, para além de se poder observar uma

associação entre as árvores, existentes na avenida principal de

Sendai, e os cabos gigantes, constata-se também que a fachada de

vidro envolvente, que parece enclausurar um chip gigante de

computador, tem um plano oco que favorece a ventilação natural que

circula entre planos de vidro, reforçando o interface natural-artificial.

Tomamos na sua globalidade, os arquéticos de Ito se anaden a

sua alquimia cientifica muito parecida: o anhelo humano por

superar a fragilidade do corpo com uma tecnologia que melhore

a sua perfeição e a sua longitividade: figuramente recreada na

pele que envolve a Mediateca. (Steele, 2001, p.153)

Efectivamente, na Mediateca de Ito a concepção está assente numa

metáfora da máquina, observando-se um imaginário de cabos que

podemos associar à era digital, ideia essa do digital que estará,

igualmente, presente na proposta de Peter Eisenman para o concurso

do Museu du Quai Branly, um projecto em que se percebe a intenção

do arquitecto em aplicar padrões binários cartesianos, por forma a

reforçar os princípios da inteligência artificial.

Page 359: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

336

9 . C O N S T R U I R O A R T I F I C I A L P O R

M E T O D O L O G I A S S U S T E N T A D A S E M P R O C E S S O S

N A T U R A I S

9 . 1 . E S P A Ç O G E N É T I C O – K A R L C H U

Entretanto, vai surgindo outra geração de arquitectos que

desenvolvem conceitos cujo elemento gerador da ideia está

directamente associado aos recursos tecnológicos e à associação

directa a elementos da natureza, como reflectem os trabalhos de Karl

Chu com a introdução do elemento espaço genético que, embora se

restrinja ao ciberespaço, comporta um referencial cientifico

subjacente à mecânica quântica e às novas tecnologias de

informação e de percepção do espaço, em particular as que dizem

respeito ao conceito de movimento abstracto.

Figura 107

Desenvolvimento orgânico da forma que relaciona a arquitectura de Karl Chu com a natureza.

Page 360: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

337

Karl Chu incorpora nos seus registos os novos avanços na mecânica

quântica, fruto da procura de um princípio natural transcendental, e

encontramos no seu trabalho uma nova de atitude que define o

paradigma evolutivo de conceitos, a partir da mutação de modelos

tridimensionais por computador, para criar ambientes simulados.

Efectivamente, a noção de espaço e de tempo tem sofrido alterações

profundas, verificando-se que nas recentes investigações no âmbito

da mecânica quântica, se tenta unificar a gravidade, o que

consequentemente provoca a introdução de um novo conceito de

tempo imaginário, em que todas as possibilidades do espaço têm

idênticas condições, consubstanciando uma lei científica abstracta,

que segundo Steele:

Lo que esta nueva ley implica es que, en tiempo real existe una

importante diferencia entre dirección, pasado y futuro. Esta

diferencia se rige por la segunda ley de la termodinámica, que

predice que, en todo sistema cerrado, la entropía (la medición

Figura 108

Na procura de um princípio transcendental, Karl Chu incorpora nos seus desenhos os novos avanços em mecânica quântica.

Figura 109

A síntese dos princípios cosmogenéticos e a contínua transformação da natureza.

Page 361: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

338

del desorden de un sistema) aumenta con el tiempo, lo que

implica necesariamente una dirección.150150150150

Nesta perspectiva o autor prossegue:

(...) Las teorías de la mecánica cuántica desarrolladas a partir

del estudio de los aguajeros negros también han mejorado la

comprensión del espacio, la teoría de partículas ha demostrado

que no existe el espacio vacío, pues para que así fuera los

campos gravitatorios e electromagnéticos deberían tener un

valor nulo. Las fluctuaciones cuánticas en los valores de estos

campos han indicado la existencia de pares de partículas que

no son reales pues no pueden ser medidas directamente con

un detector de partículas, pero han sido clasificadas como

virtuales porque sus efectos indirectos sí pueden ser medidos y

previstos teóricamente.151151151151 (Hawking, 1998, apud Steele, 2001,

p.25-26)

150150150150 A esta direcção os físicos denominaram a flecha do tempo, uma expressão que

abrange uma direcção psicológica e um sentido de tempo, desde o Big Bang.

151151151151 Hawking, Stephen.1998. A Brief History of the Time, New York : Bantam Books. p.

106-109. No original: “These particles are virtual particles like the particles that carry

Page 362: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

339

Na verdade, o trabalho de Chu reporta-se a recentes investigações

sobre o modo como o homem se relaciona com o espaço,

nomeadamente, a percepção e, mais uma vez, é definida uma

relação entre o homem e o espaço, porém, esta actividade vital para

qualquer organismo em contacto com o espaço, exprime uma relação

sensível, o que, de acordo com Karl Chu, radica no facto do homem

ter uma capacidade nata para se adaptar ao futuro, elegendo o

espaço genético de modo diferente do da formulação de imagens

interactivas que se associam ao conceito de ciberespaço, o que,

segundo ele, constrói “una nueva concepción cósmica de razón que

evolucionará a partir de los cambios en la conciencia de espacio-

tiempo”. (Steele, 2001, p.141)

Efectivamente, Karl Chu questiona o tema da transformação da

natureza através da influência da racionalidade, tema que finalmente

cristaliza na modernidade e com o qual este arquitecto abre um

debate em torno da transformação da modernidade: “um principio

the gravitational force of the sun: unlike real particles, they cannot be observed directly

wich a particle detector. However, their indirect effets, such as small changes in the

energy of electron orbits in atoms, can be measured and agree with the theoretical

predictions to a remarkable degree of accuracy”.

Figura 110

Investigação sobre semelhanças morfológicas entre construção e concepção, Karl Chu, revoluciona o significado de arquitectura ecológica.

Page 363: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

340

cosmogenético donde la síntesis es el principal resultado del retorno

a una segunda naturaleza, un nuevo concepto de naturaleza

transcendente.”152152152152 (Chu, 1998, apud, Steele, 2001, p.139)

Nesta nova fase e no âmbito do que temos vindo a tratar, importa

abordar, igualmente, o trabalho inovador de Lars Spuybroek,

relativamente aos modos de conceber e construir arquitectura, no

seio da firma holandesa NOX que, também, utiliza o computador para

gerar diagramas que são convertidos em espaço arquitectónico,

desenvolvendo um trabalho que não se concentrou apenas num

discurso de gerações e que patrocinou, também, uma interessante

crítica ao funcionalismo. 153153153153

A conceptualização de Lars Spurybroek parte da ideia de que tudo o

que é estático está condenado à extinção, já que todos os

organismos vivos se transformam, o que Sanford Kwinter classifica de

um sistema flexível movido pela própria flexibilidade, pela sua

152152152152 Chu, Karl S. 1998. Genetic Space: Hourglass of the Demiurge, in Architectural

Design, vol 68, nº 11/12, nov.-dez, p. 69

153153153153 Este discurso está baseado nas ideias de Maurice Merleau-Ponty (1999) no seu

livro Fenomenologia da Percepção.

Page 364: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

341

capacidade de movimento, de proceder a diferenciações internas, de

absorver, de transformar e de trocar informações com o ambiente

envolvente. E da mesma forma que é a vida, também um organismo

vivo possui uma extraordinária capacidade de concentrar em si um

fluxo de ordem, pelo que a capacidade de um sistema fluído manter a

ordem interna, deve-se à capacidade para alterar a própria estrutura.

Tal significa que a ordem não existe como forma no espaço, mas sim

como movimento no tempo: uma direcção. Assim, para que uma

forma exista, é necessário que saiba transformar-se em si mesma e

isto não se refere a uma forma capaz de se mover, constituindo-se

antes como um movimento que passa através da forma. É através da

alteração da forma que os sistemas flexíveis ou as entidades vivas

procuram garantir a sua integridade e o seu vigor.

Page 365: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

342

9 . 2 . T R A N S F O R M A Ç Ã O D O E L E M E N T O

A R Q U I T E C T Ó N I C O

Conforme referimos anteriormente, a NOX utiliza o computador para

gerar diagramas que são combinados e convertidos em espaço

arquitectónico e, assim, o projecto é iniciado a partir de diagramas de

vários tipos, a que chamam movimentos no edifício, em conjunto com

diagramas conceptuais por computador, que posteriormente se

animam ao introduzirem-se os dados quantificáveis, dando como

resultado o movimento da arquitectura. Então, a partir destes

esquemas, a NOX desenha novos diagramas que definem os

modelos de comportamento – movimentos do corpo – que depois se

traduzem em espaço.

É interessante perceber que tal como no futurismo, também aqui, o

movimento e a velocidade ganham um novo protagonismo e de novo

surge a noção de vanguarda. Neste caso, o movimento da

arquitectura considera a fusão de todas as partículas do espaço, o

que apenas é possível com os meios digitais específicos desta época,

referindo Steele (2001, p.142) na sua obra que:

(...) el movimiento en la arquitectura se analiza a medida que

la transformación de un elemento arquitectónico a otro, desde

Page 366: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

343

el suelo al muro, desde la línea a la superficie, desde el punto

a la línea (...) todos estos morfhing (técnica de animación por

la cual una imagen es gradualmente convertida en otra),

mezclas, fusiones, torsiones, rotaciones, laminados y fisuras

se van ajustando con una sucesión de acciones que pasan a

integrar la forma y construyen sus intersticios.

Um exemplo que se pode referir e onde é evidente a vontade de

eliminar a separação física do espaço, é o projecto de 1997, para o

hotel New Palace, junto à praia de Noorswijk na Holanda, cuja

proposta evidencia uma intenção clara de eliminar a separação linear

entre a terra, a água e o céu.

No topo do edifício, ao longo de uma estrutura metálica de 1.40m

revestida de um material translúcido, elevam-se partículas em espiral

ascendente, que representam a areia da praia e as gotas de água

em constante movimento, criando a ideia de leveza e de sensações

várias, numa estrutura que faz lembrar a torre Tatlin, contudo

adaptada à era digital.

No interior do hotel pode-se igualmente, estabelecer uma relação

com a natureza, neste caso a água do oceano, pelo que uma

envolvente ao hotel, translúcida, possibilita a projecção dos reflexos

da água do oceano para o interior.

Figura 111

Hotel New Palace em Noorswijk.

Page 367: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

344

Por certo, o grupo Nox introduziu mudanças significativas no modo

de pensar e de construir a arquitectura, utilizando técnicas de

animação digital na representação e criação de espaço

arquitectónico. Estas técnicas modelam as formas e as estruturas

arquitectónicas no campo do espaço virtual, formado por múltiplos

movimentos, fusões, torções, rotações, fissuras e forças em

constante transformação. Este tipo de animação gráfica, utilizado por

alguns arquitectos, recorre a um grelha líquida que foi criada a partir

da grelha convencional, uma das ferramentas de trabalho tradicional

dos arquitectos, mais conhecida como rectícula, e que Marcos Silva

(2004) define do seguinte modo:

Ela é constituída por um arranjo de linhas ou eixos de

verticais e horizontais que são distribuídos em intervalos

regulares no plano bidimensional e no volume tridimensional,

com o objectivo de modelar e ordenar as formas e os espaços

no momento em que estão sendo criados. É um elemento

referencial de apoio à morfogénese do espaço que indica

alguns parâmetros da geometria espacial como posição,

escala e proporção.

Explicando de modo simples o processo de evolução para a grelha

líquida:

Page 368: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

345

Assim a grelha líquida é uma grelha rígida convencional que

foi aprimorada pelas tecnologias de computação gráfica

adquirindo flexibilidade, maleabilidade, fluidez e mutabilidade,

entre outras propriedades. (Silva, 2004)

Esta grelha foi então utilizada pelo grupo Nox, em conjunto com o

atelier de arquitectura Oosterhuis Associates, para projectar o

Pavilhão H2O destinado a uma exposição permanente sobre a

importância da água no planeta Terra, a construir na ilha artificial de

Neeltje, na Holanda.

Os intervenientes no projecto concluíram que o edifício de exposição

e a própria exposição deviam configurar um único espaço, pelo que a

arquitectura seria construída em ambientes de múltiplas

características sensoriais, onde se privilegiaria os sentidos, e em que

esses ambientes, informatizados e interactivos, seriam em simultâneo

reais e virtuais.

O projecto foi pensado a partir de dois espaços distintos e interligados

de maneira idêntica ao modo como a água existe na Terra: o pavilhão

de água doce e o pavilhão de água salgada criariam um micro

organismo gigante que avança em direcção ao mar e, do mesmo

modo que os rios seguem em direcção ao mar, também aqui existiria

uma alusão às correntes das águas naturais que flúem até ao mar,

Page 369: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

346

sendo de salientar a forma como, neste caso, se trabalha o artificial e

o natural.

O pavilhão de água doce seria localizado nas margens da ilha, no

limite entre a mar e a terra, apresentando uma volumetria deformada,

alongada e fluída, com um revestimento exterior metálico, prateado e

brilhante, em contraste com o pavilhão de água salgada que tomava

a dianteira e ficaria suspenso sobre o mar. Por sua vez, este espaço

de água salgada apresentava um volume com uma forma definida e

angular revestido de um material sintético, do tipo da borracha, preto

fosco, verificando-se que apesar de os pavilhões serem

complementares, ambos detêm uma identidade própria.

Na estratégia do grupo Nox percebe-se uma forte intenção em criar

um sistema interactivo e dinâmico que se insere nos princípios

interactivos a que os espaços de exposição nos vêm habituando,

contudo, desta vez, o elemento natural, a água e a sua fluidez,

permitia levar mais longe a proposta e criar um adequado sistema de

imersão:

O aspecto fluído e maleável das superfícies envolventes do

espaço arquitectónico são reforçados por alguns elementos

arquitectónicos móveis, como pisos e superfícies curvas e

ondulantes, feitos com tela vazada especial que se movimenta

Figura 112

Pavilhão da água H2O, Nox.

Page 370: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

347

electronicamente assim que é tocada pelos visitantes. A sua

mobilidade e maleabilidade são similares à da grelha líquida.

Essas qualidades da arquitectura são ainda mais acentuadas

pelas imagens digitais em movimento contínuo e crescente, que

são projectadas directamente sobre as superfícies envolventes.

Com isso o espaço torna-se aparentemente ilimitado. (Silva,

2004)

Neste complexo, o visitante ao percorrer os pavilhões sente que

funcionam como organismos vivos e, neste caso, o termo movimento

pode ser considerado como dar vida ao espaço. Com efeito, no

pavilhão de água doce, o visitante para além de alterar a sua

percepção relativamente ao espaço, tem também de mudar a sua

postura corporal. As regras espaciais a que está habituado alteram-

se, os níveis deixam de ser ortogonais e passam a superfícies

envolventes curvas, ondulantes e móveis, mais próximas dos

movimentos que o corpo pode descrever no espaço, privilegiando-se

uma experiência táctil e obrigando a uma constante necessidade de

utilizar os órgãos sensoriais e perceptivos de um modo muito intenso.

Por sua vez, o pavilhão da água salgada está dividido em dois

momentos distintos. Ao entrarem no pavilhão, os visitantes descem

por uma escada e são conduzidos ao interior, situado abaixo da linha

Page 371: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

348

do mar, e nesse interior espera-os um espaço molhado e escuro, com

uma iluminação muito especial. Os visitantes são, então,

confrontados com uma onda real que em intervalos regulares inunda

o espaço, tendo que esperar que a onda se dissolva para se poderem

dirigir para uma rampa que dá acesso a uma plataforma que os

conduz a uma abertura para o exterior. Neste local, podem avistar o

mar e a paisagem local, através de um sistema que pode, ou não,

bloquear esse alinhamento visual de forma imprevisível, esperando-

os ainda, neste percurso, um espaço designado de sensorium. Este

ponto já se localiza no piso superior, que por sua vez é separado de

inferior por um pavimento curvo, que se movimenta em simultâneo

com as restantes superfícies envolventes, um movimento que é

acentuado pelas representações virtuais ondulantes das águas do

mar, projectadas por reflexos de som, luz e cor, nas superfícies

envolventes de policarbonato translúcido.

Todavia, os procedimentos de interactividade dos dois pavilhões são

bem diferentes, pois enquanto que no pavilhão de água doce estão

localizados no interior e são accionados pelo próprio visitante, no de

água salgada, o espaço reage de acordo com os estímulos externos,

tendo sido utilizado um sistema informático especial que permite

receber informações diversas do exterior, emitidas por uma estação

localizada no mar. Essas informações, tais como o movimento

Figura 113

Pavilhão da água salgada Oosterhuis Associates.

Page 372: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

349

das marés e a velocidade do vento, são introduzidas numa base de

dados que é continuamente actualizada, permitindo uma

transformação permanente e uma forte relação do edifício com o

meio exterior. Desta forma, o programa propõe um roteiro base em

que as variáveis são introduzidas pela natureza em permanente

mutação, em paralelismo evidente com as características dos

organismos vivos e respectivas metamorfoses.

Sem dúvida, o espaço arquitectónico do pavilhão H2O faz parte de

uma nova forma de habitar o espaço, questionando tanto os próprios

limites do espaço como a ortogonalidade cartesiana em que o

homem se habitou a viver ao longo dos anos, abrindo, inclusive, uma

brecha na dinâmica das arquitecturas líquidas. Contudo, o que

importa reter é que estes espaços descobrem novas possibilidades

para o espaço habitável, podendo constituir-se como uma alternativa

ecológica para a arquitectura porquanto alguns dos princípios

abordados neste tipo de arquitectura, podem, de facto, ser

associados “a princípios de morfogénese dos casulos, das conchas

de alguns moluscos e de outros organismos vivos que criam os seus

habitats a partir de superfícies que os envolvem” (Silva, 2004)

Page 373: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

350

9 . 3 . S I S T E M A S H Í B R I D O S

Por certo, nota-se nos trabalhos que apresentamos de Karl Chu e de

Lars Spuybroek uma forte cumplicidade na sua associação aos

princípios e regras do mundo natural, todavia, parece-nos que o

trabalho de John Frazer na Architectural Association de Londres,

consubstanciado em pesquisas que assentam numa procura do

algoritmo genético que simule no computador a evolução natural de

qualquer organismo, constitui o melhor exemplo do que estamos a

tentar provar.

Frazer há estado involucrado en la búsqueda de un

algorítmico genético que permita al ordenador emular a

evolución natural, creando modelos arquitectónicos virtuales

que puedan responder de forma distinta según el entorno en

que se encuentren. 154154154154 (1995, apud, Steelle, 2001, p.38)

Nos processos de concepção deste arquitecto, os modelos virtuais

são criados a partir de princípios baseados na natureza e que

154154154154 Sobre este assunto, Frazer John. 1995. An Evolutionary Architecture. London :

Architectural Association.

Page 374: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

351

contextualizam o espaço relativamente à envolvente, uma abordagem

metodológica com algum paralelismo nos trabalhos de Steiner, do

início do século.

Entre 1967 e 1990, ano em que concretizou o Universal Constructor,

a Architectural Association:

(...) aprendió e desarolló lenguages, desarrolló códigos para

máquinas, y diseñó y construyó sus proprios circuitos,

proyectando jerárquicamente funciones simples, tal como

ocurren en la naturaleza (...). (Steele, 2001, p.38)

Nota-se nesta estratégia uma atitude de cumplicidade entre a

máquina e a natureza, pois, (...) “en lugar de reconfigurar un

programa Cad existente; Frazer decidió construir un ordenador

personalizado y programarlo de modo que le permitiera replicar

sistemas biológicos.” (Steele, 2001, p.38)

Outras palavras que vêm de encontro ao que pretendemos

demonstrar neste trabalho, são as expressas pelo próprio Frazer 155155155155

(1991, apud Steele, 2001, p.38):

155155155155 Frazer, J. H. 1991. Can computers be Just a Tool?, Systematica: Mutual Uses of

Cybernetics and Science, vol 8, Amesterdam, p. 27-36.

Page 375: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

352

En este proceso, el arquitecto deja de ser diseñador para

transformarse en el catalizador, y a arquitectura pasa a ser

una “forma de vida artificial, sujeta, como el mundo natural, a

los principios de acción morfogenética, codificación genética,

copia e selección.

De resto, a libertação do corpo das limitações físicas, a partir da

metamorfose através das máquinas, é um tema recorrente mas que

agora parece, cada vez mais, próximo de poder tornar-se realidade.

Em 1960, Manfred Clynes combinou as palavras cibernética e

organismo, dando azo ao vocábulo cyborg, 156156156156 e, entretanto, Ray

Kurtzweil, no seu l ivro The Age of the Spiritual Machine: Whe

Computers Exceed Human Inteligence, recorre à ideia de um cyborg

híbrido da ficção cientifica e transporta-o para a realidade,

156156156156 O mito do homem máquina está presente desde os robôs, máquinas autónomas

que libertavam o homem das tarefas rotineiras, desde os andróides robôs,

semelhantes ao homem mas sem capacidade de pensar, e desde dos cyborgues

semelhantes aos robôs e para além dos endobot, criação de Otto E. Rössler, seres

virtuais autoconscientes que habitam o mundo virtual, existem ainda os bióides e os

clones de Sterlac e Hans Moravec, que são desenvolvidos genéticamente e

considerados desdobramentos do homem máquina.

Page 376: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

353

assinalando que o intercâmbio produzido entre o cérebro humano e

os circuitos do computador permitirá ao homem conceber-se a si

próprio, passando a evolução biológica por uma evolução tecnológica

157157157157 e, provavelmente, ainda segundo as suas previsões, será difícil no

final do século XXI, estabelecer uma distinção eficaz entre os seres

humanos e as entidades computacionais inteligentes.

Este contexto, porém, obriga-nos a analisar uma outra perspectiva,

relativamente ao modo como a natureza pode manifestar-se em

termos de conceito – o caos.

O caos pode ser considerado como a forma extrema da desordem

que ocorre na natureza - um grau elevado de fragmentos conduz ao

caos e, assim, este caos abre a possibilidade a mutações e

157157157157 Este tema foi desenvolvido por Carlos Camargos Mendonça em Subjectividade e

Tecnologia: as novas máquinas produtoras de corpos; neste artigo o autor faz uma

reflexão acerca da interacção entre o homem e a máquina, entendendo por

subjectividade o mesmo que Guatarri (1993, p. 19) “o conjunto de condições que torna

possível que as instâncias individuais e/ou colectivas estejam em posição de emergir

como território existencial auto-referêncial, em adjacência ou em relação com uma

alteridade ela mesma subjectiva”.

Page 377: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

354

transformações várias, podendo conduzir à imprevisibilidade dos

sistemas 158158158158, tal como é imprevisível a natureza humana.

Associado a este fenómeno do caos temos os fractais, muito comuns

na natureza e que podem ser comprovados em várias ciências, como

na física, num conceito como a entropia (medida de desordem do

universo) e nos progressos da mecânica quântica, na matemática, em

que veio revolucionar o estudo estatístico e acrescentar uma nova

forma intuitiva, na biologia, que tem utilizado esta teoria para fazer

previsões em relação à evolução genética, na sismologia, com a

previsão de sismos, e em muitas outras áreas, incluindo uma que nos

interessa particularmente, a arte, em que as influências artísticas são

complicadas de determinar.

Neste aspecto, revelam-se cada vez mais imprevisíveis os avanços

que o computador permite, nomeadamente, no que respeita ao

158158158158 A Teoria do Caos surgiu como necessidade de dar resposta às flutuações

imprevisíveis da natureza. Uma lei básica da Teoria do Caos remete para a evolução

de um sistema dinâmico em constante dependência das condições iniciais, pelo que

a Teoria do Caos tenta explicar fenómenos que são classificados como de casuais,

mas que na verdade podem ser verificados, testados e simulados, ainda que a sua

previsão seja geralmente casual.

Page 378: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

355

realismo visual, completamente transformado pela geometria fractal e

as suas imagens espectaculares, que artistas das várias áreas

adoptam, inovando as simbologias que, por sua vez, traduzem as

novas formas de pensar.

Importa, por isso, referir a pesquisa de Mandelbrot 159159159159 que forneceu

teorias matemáticas para explicar o fenómeno da probabilidade

errática e métodos de auto semelhança em probabilidades, e que

investigou relativamente a processos esporádicos, termodinâmica,

astrologia e arte com a ajuda do computador, criando e

desenvolvendo a geometria fractal.

Nesta perspectiva, é interessante constatar que as formas orgânicas

das estruturas naturais possuem, também, geometrias fractais e que

esta pode ser aplicada em qualquer situação, seja a natureza ou

qualquer outra área. É o que prova o trabalho de Akio Hizume, para

quem a secção dourada constitui o mais simples gerador fractal,

sendo que este instrumento matemático, e mais tarde as suas

159159159159 A obra de Benoît Mandelbrot está reproduzida em Objectos Fractais, a edição

original em francês tem um subtítulo que ajuda a compreender melhor o conteúdo:

Les Objects Fractals: form, hasard et dimension.

Page 379: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

356

tentativas de aplicação à actividade artísta, como revela o trabalho de

M.C. Ascher, originam a rede Penrose que contribuirá para a

constituição de novas possibilidades para a arquitectura, para a

representação gráfica e, inclusivamente, para o pensamento humano,

já que esta rede surge como um importante instrumento de trabalho

por considerar a forma do universo infinito.

Akio, durante muito tempo, tentou profectizar as formas de Rudolf

Steiner e a partir da rede Penrose, concebeu dois trabalhos, um, ao

nível do planeamento urbano, a cidade auto-semelhante e quasi-

periódica, e outro, um monumento hexadimensional, o Goetheanum

3.

Ainda na sequência do seu trabalho, Akio Hizume inventou em 1992,

um complexo de varas, tridimensional autoportante hexa-axial, a que

chamou star cage e que foi patenteado no Japão, tendo, já antes,

criado duas invenções em que a utilização da rede Penrose serviu

para realizar modelos unidimensionais, bidimensionais e

tridimensionais.

Perante um tal ambiente, aquilo a que designamos por

inteligência é uma lógica dimensional superior, situada além

da dialéctica. A rede Perose, não só constitui um instrumento

de concepção inovador, como também foi capaz de

Page 380: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

357

desenvolver uma nova referência de pensamento. Embora na

natureza tenha já utilizado a rede Penrose, poderá ainda

assim que esta venha a tornar-se um signo essencial da

arquitectura. (Hizume, 1998)

Entretanto, com base na ideia de unificar a teoria da

Relatividade e a Mecânica Quântica, surge um equivalente

físico e matemático das formas digitais, a String Theory.

Efectivamente, um grupo de investigadores na área da física

perceberam que esta teoria das cordas permitia resolver

alguns problemas, relacionados com o espaço e com o

tempo, que pareciam impossíveis de solucionar. Neste grupo

podemos destacar Michael Green que definiu para o espaço

onze dimensões, acrescentando assim, às anteriormente

definidas por Einstein, sete às três dimensões para o espaço,

e uma para o tempo160160160160, e dentro das quais sobressai o

graviton (o quantum da gravitação):

160160160160 Efectivamente, se cada ponto do espaço tiver essas dimensões extra, estarão

tão enroladas que não podem ser detectadas directamente. Contudo, se estas

dimensões extras forem associadas a espaços compactados – para cada ponto do

espaço/tempo (quadri-dimensional) – podem ser observadas apesar do seu tamanho

Figura 114

Teoria das cordas cósmicas - Superstrings.

Page 381: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

358

(...)Una partícula de gravedad que proporcionaba el enlace

necesario entre la microescala de la mecánica cuántica y la

macroescala de la relatividad general, desbloqueando

cuestiones que parecían irreconciliables entre la teoría de

partículas y la teoría de la gravedad. (Steele, 2001, p.63)

Esta Teoria das Cordas que tenta explicar os componentes

fundamentais de tudo o que existe no universo, mas que até agora

não foi comprovada experimentalmente pelos cientistas, procura

resolver o grande enigma da física actual que reside na busca de

uma teoria que englobe tanto o mundo microscópio explicado pela

física quântica, quanto o universo descrito pela relatividade de

Einstein.

Aliás, apesar da teoria das cordas não estar completamente

demonstrada, existem alguns novos efeitos que podem ser

descobertos e que podem ser muito interessantes para a teoria, ainda

que não sejam meras previsões quantitativas. Uma dessas previsões,

muito reduzido. Desde o início do século XX que existe uma incompatibilidade entre

a Teoria da Relatividade Geral e a Mecânica Quântica, pois a gravitação descrita

pela primeira é determinista e contínua, propriedades não compatíveis com a

segunda.

Page 382: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

359

a de dimensões extras do espaço que prevêem fenómenos

espectaculares, pode nunca vir a ser provada mas é por demais

evidente que vale a pena procurá-la. Uma outra previsão é a das

cordas cósmicas que são uma espécie de dobra no espaço, e que se

configurariam como fios maciços esticados entre galáxias.

Os dois modos de reconhecê-las assentariam, um, no facto de serem

muito finas mas muitos macias, de tal forma que quando a luz passa

por perto delas, é deflectida; e outro, por meio de radiação

gravitacional dado que as ondas se movem e, assim, quando se

movimentam de um lado para o outro, podem gerar ondas

gravitacionais.

Esta ideia foi desenvolvida em 1995, por Edward Witten, do Institute

for Avance Study de Princeton, e provocou outro avanço na teoria das

cordas ao introduzir a ideia de que os planos de cordas são na

realidade membranas que vibram, o que leva Steele a referir que:

La teoría das cuerdas resuelve la oposición entre la debilidad

relativa de la gravedad y la fortaleza da las fuerzas eléctricas,

magnéticas y nucleares, pues la gravedad, a diferencia de las

fuerzas anteriormente citadas, puede derramarse fuera de la

Page 383: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

360

membrana e inducir a repensar la actual teoría do espacio-

tiempo como fruto de una casualidad irrelevante.161161161161 (Cole,

1999, apud Steele, 2001, p.65)

Como temos vindo a demonstrar, as formas da natureza na sua

infinita materialidade possibilitam várias aproximações entre a

máquina e o organismo, aproximação que a teoria das dobras

também permite. Aqui, os seres vivos e as coisas seriam

completamente formados por infinitas dobras, podendo o fractal e a

dobra coincidir, uma vez que ambas prevêem uma explicação para as

formas desordenadas e complexas.

Esta teoria permitiu a Daniel Libeskind fazer algumas analogias com

as máquinas de tortura, na ampliação do Museu Judaico em Berlim:

Imaginando novos espaços matemáticos, recriando universos

de fragmentos geométricos que explodem e flutuam, feitos de

abstracções colisões e colagem, Libeskind elaborou uma obra

composta por pavilhões e exposições que buscam expressar a

força das linhas dobradas. (Montaner, 2002, p. 212)

161161161161 COLE K. C. 1999. Time. Space Obsolete, New View of Universe in Los Angeles

Times, 16 th November, p. A1.

Page 384: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

361

Efectivamente, este tema das dobras e dos fractais não é recente, na

arquitectura, visto que essas formas complexas e repetitivas que se

desdobram, tinham anteriormente inspirado outros trabalhos, como os

de Piranisi, ou, neste século, os de Alvar Aalto, que já referimos, ou

os de Reima Pietilä em Tampere na Igreja de Kaleva, e em Otaniemi

no Centro Dipoli, para estudantes.

Contudo, mais recentemente, este tema tem surgido com uma certa

frequência no discurso de arquitectos que se destacam no contexto

actual, nomeadamente, no trabalho da arquitecta iraniana Zaha

Hadid, para a estação de bombeiros na fábrica Vitra em Weil am

Rhein, na obra de Enric Miralles ou de Rem Koolhaas, e ainda no

trabalho de Ben van Berkel. Não obstante, destacamos de entre eles

o trabalho da equipa de Foreign Office Architects, dirigida por

Alejandro Zaera Polo e Farshid Moussavi, particularmente o terminal

Marítimo de Yokohama que segundo Montaner (2002, p.216) se

traduz num espaço que:

(...) é composto por uma forma unitária e cinética contínua e

dobrada: um sistema activo e operativo que serve para conduzir

todos os fluxos dos viajantes, comunicando de maneira fluida

os diferentes níveis e convertendo a cobertura do terminal na

plataforma de um imenso espaço público, uma paisagem

Page 385: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

362

topográfica ondulada cujas ranhuras e dobras possibilitam a

circulação de diferentes pavimentos. Se algumas formas de

fractais e dobras foram geradas na natureza para facilitar o

intercâmbio de fluxos e de energia (por exemplo, os sistemas

sanguíneos e nervoso ou a seiva das árvores) tais estruturas

podem adaptar-se eficazmente para canalizar os fluxos na

arquitectura.

O que nos leva, no contexto do nosso trabalho, a assinalar a

pertinência desta lógica, em que os processos de concepção se

ajustam aos fenómenos sistémicos da natureza.

Antes de terminar o nosso trabalho devemos, ainda reflectir sobre um

novo conceito: as transarquitecturas, uma arquitectura multifacetada

que se desenvolve entre a informação e a matéria, entre o virtual e o

real, e, mais, inerentemente inteligente e interactiva.

Este conceito de arquitectura líquida e transarquitecturas faz parte de

todo um novo universo conceptual como o de Novak, que oscila

sempre entre o virtual e o real. Nele, o espaço adquire uma nova

dimensão que não passa pelas noções de cheio e de vazio, e que se

pode qualificar de inteligente, pois as construções possuem sensores

que manipulam as características visíveis do espaço.

Nestas arquitecturas, a noção de limite é trabalhada de uma forma

Page 386: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

363

inovadora e os espaços deixam de ser estanques com limites

definidos e passam a ter uma relação espacial, intimamente

relacionada com o corpo. Questionado sobre as consequências da

ausência de forças fisícas no ciberespaço, Novak (1995) explica:

Our consciousness has evolved into and througt this particular

enbodiment, this particular body, in this particular context. In

other bodies and other spaces, we would have differing

consciousnesses. (…) In creating these liquid architectures, we

define potential avenues for the development of our

consciousness. Since we decide what physics our virtual have,

we implicitly decide what direction our preception will move in.

162162162162

Nesta dimensão, em que o corpo é o elemento determinante do

espaço, faz ainda sentido considerar dois trabalhos do artista e

designer, Char Davies, desenvolvidos entre 1994 e 2001, onde

se explora uma aproximação entre a componente física e

162162162162 NOVAK, Marcos, Ludovico, Alessandro. Marcos Novak interview, by Alessandro

Ludovico [em linha]. Neural Magazine. 1995. [referência de 29 de Dezembro 2007].

Disponível na Internet em: <http://www.neural.it/english/marcos.novak.htm>

Page 387: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

364

espiritual, e que reflectem: “um trabalho integrado de arte,

programação do software e corpo”. Tal como refere Erik David:

“Osmose é um ousado golpe na expansão tanto do poder como

do significado de realidade virtual e faz isso aprofundando a

experiência subjectiva da interface homem-máquina”.163163163163 (Char,

1998, apud Eichemberg, 2002)

Mais em concreto, podemos dizer que o trabalho de Davies, em

particular, apresenta um potencial dos ambientes imersivos para a

exploração de novos espaços arquitectónicos, em que a visão e a

experiência desses ambientes se revelam tão humanas quanto a de

se estar presente numa qualquer realidade física.

Assim, a procura de novos ambientes virtuais vai encontrar novas

maneiras de dialogar com a arquitectura contemporânea, não apenas

no sentido visual ou tridimensional do espaço mas, também, criando

novos conceitos que passam sempre por uma nova relação com o

corpo e com o espaço.

163163163163 Char, Davies, Virtual Dimension, architecture, representation and crash culture,

Changing Space: VR as an Arena of Being (ed. By Michael Heim). Nova York,

Princeton Architectural Press, 1998, p.144-155.

Page 388: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

365

Conforme temos tentado provar, a máquina e os seus análogos

tecnológicos podem ser entendidos como um prolongamento das

capacidades inatas do homem e, levando esta definição ao extremo,

podemos mesmo considerar o homem como uma máquina, na

medida em que apresenta características que se podem assemelhar

a um mecanismo. Porém, este tipo de reflexão vem colocar a questão

de definir até que ponto o contemporâneo é marcado pela

emergência de novos paradigmas ou, se pelo contrário, os

paradigmas actuais são apenas o reflexo de velhas associações entre

o homem e a natureza.

Nesta perspectiva, podemos partilhar a ideia de Pierre Lévy de que

não se deve raciocinar em termos de ruptura, de que o real se opõe

ao virtual, dado que da mesma forma como na sociedade a

passagem do real ao virtual se constituiu num processo de

humanização, também se pode concluir que na arquitectura, situação

que não é excepção às outras, se reconhece um processo idêntico,

pois apesar da arquitectura ser sempre um processo de

artificialização, ela tem a obrigação de estar, acima de tudo, ao

serviço do homem, isto é, essa artificialização deve estar

direccionada no sentido de tornar a arquitectura mais humana.

Page 389: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

366

1 0 . C O N C L U S Ã O

Este trabalho desenvolveu-se na procura de um melhor

conhecimento do paradigma da máquina na arquitectura

contemporânea e do modo como este fenómeno promoveu uma

nova forma de habitar o espaço, numa multiplicidade de abordagens,

mas das quais o homem, elemento natural por excelência, é o

denominador comum.

O princípio da máquina que desde Descartes se vinha impondo como

um valor universal só foi definitivamente adquirido a partir do

aparecimento das vanguardas artísticas do século XX pois, conforme

evidenciámos, foi apenas com a intervenção da modernidade

estética, representada por movimentos artísticos europeus de

ruptura, que a máquina se converteu num símbolo cultural universal

e num princípio socialmente formador, convertendo-se num

fenómeno dotado duma racionalidade em si mesma emancipadora.

Nesta sequência, a máquina foi convertida num objectivo e num valor

em si mesmo, em torno da qual se articularam um conjunto de

questões formais, plásticas, compositivas, construtivas e

organizativas do projecto, que nem sempre se reduziram a uma

concepção estritamente mecanicista ou sequer funcionalista.

Page 390: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

367

Assim, e face à nossa consciência de novos problemas históricos

entretanto surgidos, impõe-se um reconsiderar dos caminhos

percorridos pela modernidade artística do século XX, ou seja, urge

rever o passado como forma de poder transformar o presente em

que vivemos, e com este presente desbravar caminhos para o futuro

e para uma realidade melhor.

Procurou-se neste trabalho fazer uma aproximação ao fenómeno da

máquina em paralelo com o fenómeno humano, tema bastante actual

nesta nova época de transição de século. A escolha deste tema

como objecto de estudo serviu para pôr a descoberto as novas

práticas na arquitectura do século XX, para reflectir sobre as mais

antigas e deu-nos a possibilidade de descobrir outras facetas da

cultura arquitectónica. O interesse em questionar as práticas da

arquitectura na sociedade, nas suas vertentes humana e técnica,

insere-se na tentativa bem mais vasta e primordial de procurar

perceber a evolução da própria humanidade, reequacionando as

eternas questões que relacionam o homem com o espaço de habitar.

Assim, procurámos perceber o contexto global em que surgiram os

conceitos contraditórios relativamente à máquina e as respectivas

fundamentações de vários autores para, efectivamente,

constatarmos uma certa permeabilidade naquelas posturas, quer dos

Page 391: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

368

que eram contra, e mesmo esses não o eram totalmente, quer dos

que defendiam o uso da máquina, e também estes não o defendiam

totalmente.

A comienzos del siglo xx, los primeiros críticos de la era de la

máquina, Carlyle y Ruskin, se valen de la analogía entre lo

auténtico y lo orgánico. En el principio mecánico de la máquina

vem un peligro para la autenticidad del hombre. Todo lo que el

hombre miesmo hace com ayuda de medios técnicos es, a su

critério, artificial y, por ello, no auténtico. (Aicher, 2001, p.11)

Para Ruskin, como vimos, os fundamentos da arte encontravam-se

fragilizados com a revolução industrial, pois entendia a arquitectura

como a expressão da mentalidade humana, defendia a arquitectura

de outros tempos como uma força vital semelhante ao poder

renovador da natureza. Os motivos de Ruskin para a aversão à

máquina eram de ordem estética, pois valorizava a postura do

artesão, para ele o importante era o trabalho manual.

Ainda assim, aceitava a máquina como um escravo para poupar o

trabalho do homem vislumbrando uma certa abertura para a

aceitação da máquina, contudo, com uma certa reserva, pois

verificámos que as suas ideias confluem em Henry Moore, um dos

poucos artistas do século XX que manteve uma postura

Page 392: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

369

assumidamente humanista e de forte relação com a natureza.

Salientámos, ainda, a postura de Morris que culpava a massificação

industrial e a redução do trabalho individual pela degradação da

arquitectura, rejeitava os valores da era industrial e defendia que a

arte e a arquitectura se dirigiam a todos, e em The Prospects of

Architecture in Civilization proclamou uma habitação digna e

funcional para todos. Pese embora o seu conhecimento derivasse do

trabalho medieval, e o considerasse como um modelo de

autenticidade e de inspiração, isso não limitou o seu trabalho, pois

teve a consciência que o design era importante na melhoria das

condições de vida, pois a arte para o povo só seria possível através

da produção industrial, pelo que o seu trabalho não se limitou ao

plano teórico e fundou a firma a Morris, Marshall & Faulkanan com

efeitos amplamente positivos na produção comercial.

Assim, apesar de Morris considerar a máquina como um inimigo,

tivemos oportunidade de constatar que foi evoluindo para uma

posição mais tolerante que aceitava incorporar as máquinas no

intuito de alcançar melhores condições vida.

Paralelamente, verificámos que existiam outros contemporâneos com

posições completamente diferentes, como o caso de Lewis Day e

John Day, que afirmavam ser já, na época, a máquina um dado

Page 393: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

370

adquirido e escolhido, pela sociedade, e não haveria forma de

reverter o processo.

Na transição do século foi interessante notar a importância da

máquina no fenómeno artístico e confirmámos que isso é um facto

inquestionável, tanto que, independentemente de uma maior ou

menor adesão, ou mesmo, de renúncia, a máquina esteve

omnipresente nos discursos e nas doutrinas, assumindo-se como

fenómeno emergente na sociedade.

Outro factor que averiguámos ter influenciado a criação de novos

conceitos na arquitectura foi, no final do século XIX, o ressuscitar do

betão, um material que permitiu efectuar estruturas de grandes vãos,

inimagináveis até à época, conferindo ao espaço uma nova dinâmica

e dotando os edifícios duma inovadora leveza e plasticidade. As

possibilidades deste novo elemento construtivo alteraram por

completo a relação entre o homem e o espaço, introduzindo um novo

conceito revolucionário e de vanguarda que só encontrará

paralelismo, no fim do séc. XX, com o ciberespaço que, por seu lado,

irá mais uma vez revolucionar e introduzir novos conceitos na

arquitectura. Conforme examinámos, o betão, para além da

plasticidade espacial que permitia configurar formas orgânicas e, em

simultâneo, formas da era da máquina, possibilitou, ao vencer

Page 394: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

371

grandes áreas com estruturas simples, a construção com qualidade e

em quantidade, a custos reduzidos, consolidando a característica de

material tecnicamente funcional; o progresso técnico sobrepôs-se

paulatinamente às técnicas tradicionais e artesanais, permitindo

novas possibilidades para a arquitectura.

Neste contexto verificámos, igualmente, como o início do século ficou

marcado pelas posições de Steiner e pelo modo como valorizou as

formas do mundo orgânico e que, também, só foram possíveis de

concretizar através dos progressos técnicos, incluindo o betão,

entretanto registados.

De igual modo, examinámos como na obra de Wittgenstein se revela

a mesma concepção universal para a arquitectura e para a filosofia, e

como a casa para a irmã, com a sua lógica matemática reflecte a

lógica do Tratactus.

Concluímos, então, que relativamente à arquitectura se assumiam

duas posições com perspectivas e abordagens marcadas pela

diferença mas que, no entanto, não eram antagónicas pois o natural

e a máquina revelavam-se, em uníssono, fundamentais para dar

corpo a estas obras de arquitectura.

Para além destas duas posturas, a de Steiner mais próxima do

orgânico e a de Wittgenstein mais próxima da máquina,

Page 395: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

372

considerámos que a máquina constituiu-se como um novo conceito,

pelo que destacámos, ainda, o facto da máquina e do maquinismo

terem, nesta fase inicial da sua emergência, uma dimensão espiritual

própria, constituindo-se ambos como princípio de uma utopia

reveladora de salvação e esperança. Logo, o futurismo de Marinetti

baseava-se na máquina, defendia a abolição de todas as influências

tradicionais e Sant’Elia, que protagonizou este movimento de ruptura,

expressou as suas ideias em Messagio. A máquina e a velocidade

tornaram-se símbolos da arquitectura futurista e constatámos como

este movimento influenciou profundamente outras vanguardas ao

longo do século. Procurámos ainda caracterizar o modo como a

lógica mecânica, baseada num ideal de esperança e utopia, se

enquadrou nos aspectos racionalistas da nova concepção formal do

construtivismo. Assim, estes conceitos ligados a uma sociedade

industrial cumpriam o objectivo revolucionário e de vanguarda, e

disso vimos o exemplo do construtivismo na Rússia.

Efectivamente, a máquina, que no inicio do século e que à época se

referia a um fenómeno científico, técnico e civilizador, adquiriu

entrementes um carácter universal de um princípio de

homogeneização e de organização social, não prescindindo,

contudo, de analogias com a natureza e com o homem.

Page 396: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

373

Procurámos reflectir, também, sobre as posições de Muthesius na

Alemanha que, tal como Morris, defendia o bom senso e a

simplicidade na arte e na arquitectura, mas que, ao contrário de

Morris, entendia deverem esses conceitos ser aplicados à produção

industrial, abraçando a utilização da máquina e assumindo a

liderança de uma nova tendência: a Sachlichkeit. Vimos que esta

tendência privilegiava a utilidade pura e perfeita e confrontava o

sentido de apropriado e de objectivo, pois os objectos, feitos à

máquina, é que eram produzidos de acordo com o espírito da época.

Aliás, como verificámos, este conceito era partilhado pela Deutsche

Werkbund que defendia um elevado nível de qualidade na produção

industrial, vendo no design, a inteligência do homem, e na máquina,

a ferramenta fundamental.

Para a Werkbund não havia nenhuma diferença entre a ferramenta e

a máquina desde que fosse o homem a dominar a máquina e a

utilizasse como ferramenta; de facto, é interessante constatar que se

trata de um conceito transversal ao longo dos tempos e, pese

embora os novos avanços técnicos, este conceito permanece

bastante actual conforme o presente trabalho tentou provar.

No âmbito do trabalho que desenvolvemos, tivemos oportunidade de

salientar o modo como o conceito da máquina se manifestou na

Page 397: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

374

Bauhaus, progredindo do funcionalismo orgânico de Gropius até ao

funcionalismo técnico de Mies. No início, a escola tinha muito em

comum com as antigas cooperações medievais e, marcada por uma

estratégia ideológica próxima do expressionismo, promovia uma forte

oposição relativamente à máquina enquanto um fim em si mesmo, o

que, conforme pudemos observar, assentava num forte compromisso

entre o factor orgânico e técnico e numa relação crescente que

pretendia, primeiro, o domínio dos elementos naturais e, só depois, o

dos técnicos.

Salientámos, por isso, um projecto importante desta fase, a casa

Sommerfeld, que expressa a estética baseada na metamorfose da

vida e reflecte as intenções programáticas da Bauhaus. Esta casa

em madeira, material que nesse período era considerado como

propício à vida, era construída a partir de troncos e aproveitava toda

a expressividade estética daquele material orgânico, reconhecendo-

se nessa estratégia uma lógica unificadora que comprova a influência

de Steiner.

Gropius acreditava que, tal como noutros tempos em que a arte se

uniu ao artesanato, também, naquela era da máquina, estavam

reunidas as condições para a arte se unir à produção industrial.

Provámos como, no fundo, Gropius pretendia a integração de dois

Page 398: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

375

factores de concepção no processo de produção: o defendido por

Muthesius e o individualismo de Van der Velde.

Verificámos contudo que, pese embora Muthesius e Gropius

acreditarem ambos que a função do artista era inventar formas da

era da máquina, a prática revelava-se diferente, pois Muthesius era

apoiado pelo meio empresarial e governamental, que fazia o controlo

da actividade artística, e Gropius, pelo contrário, defendia que o

artista devia ser livre da influência política.

Por conseguinte, o paradigma da máquina na Bauhaus ia evoluindo e

alguns dos que inicialmente se opunham à máquina iam cedendo ao

seu predomínio, conforme constatámos em Adolf Behne que, no seu

livro Die Wiederkehr der Kunisti, assumira uma postura contra a

máquina para, apenas dois anos mais tarde, alterar a sua posição no

artigo Arte, Artesanato e Tecnologia, enaltecendo a máquina numa

atitude análoga à de Gropius em Arte e Construção Industrial.

Efectivamente, vimos como estas diferentes posições de maior ou

menor aceitação da máquina originaram conflitos e quando Johannes

Itten foi substituido por Moholy-Navy, verificámos que a escola

passou a apresentar um perfil mais racionalista, marcado por uma

forte vertente técnica que promovia o trabalho que utilizasse novos

materiais da era da máquina.

Page 399: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

376

Salientámos, nesta sequência, a exposição de 1923 como um novo

impulso da componente técnica, pois neste evento foi perceptível

uma união entre a arte e a técnica, nomeadamente, com a casa Am

Horn que ao organizar-se numa área pequena, 162 m2 de forma

simples, reduzindo os espaços e privilegiando a funcionalidade,

apontava definitivamente para a produção em série e para uma

mudança de paradigma.

Nesta fase sublinhámos outro acontecimento importante, a exibição

das fotomontagens de Metropolis, marcada pela influência do

futurismo que difundia uma visão antecipada da cidade de futuro, um

mundo dominado pela máquina, e que lançava novas pistas sobre o

que poderiam ser as cidades imaginárias do futuro.

Como fizemos notar, o recurso à tecnologia passou a ser

incentivado, a escola manteve-se no centro da cultura comunitária

procurando humanizar a máquina, e com a transferência da Bauhaus

para Desseau construiu-se a mais importante obra do funcionalismo

e do racionalismo alemão. Analisámos, portanto, como foi marcante

o processo de concepção e construção do edifício em que o

mecânico e o orgânico se fundem pois, conforme prova Argan, o

edifício desempenha um papel social e na sua descrição não faltam

comparações e alusões a partes específicas da máquina, analogias

Page 400: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

377

que Argan transfere, igualmente, para o Palácio dos Sovietes em

Moscovo.

Percebemos, também, que os alojamentos para os professores

continuam a experiência da Casa Am Horn e como o paradigma da

máquina era amplamente considerado, visto que, por um lado, o

interior reflectia um racionalismo lógico formal e, por outro, o projecto

previa a standardização de várias partes da casa por forma a

mecanizar as tarefas dentro do espaço.

Neste e noutros exemplos de conjuntos de habitações unifamiliares,

evidenciámos o exemplo de espaços organizados em plantas

simples, construídos segundo uma linha de montagem que permitia

grande rapidez de execução e redução de custos. Contudo,

constatámos também que, paralelamente a esta racionalização,

existia uma forte componente ligada à natureza pois, na verdade,

intentava-se fixar as populações à actividade agrícola como

complemento ao trabalho mecanizado, proporcionando uma relação

com a natureza e valorizando os valores humanos.

A marcar a emergência do novo paradigma da máquina, não

pudemos deixar de assinalar o Bairro Torten e a casa Carl Fieger,

uma habitação onde a racionalidade funcionalista e a sua coerente

linguagem arquitectónica foram um exemplo de grande qualidade

Page 401: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

378

formal.

A ideia de George Muche era realizar uma casa de crescimento

variável com unidades de pré fabricação industrial, em forma de

módulos, que permitiam que o espaço pudesse ser adaptado ao

número de pessoas do agregado familiar, conceptualizando-se,

inovadoramente em termos arquitectorais, a família como um

organismo variável.

Como percebemos, a casa, em meados dos anos 20 e apesar de

muito mecanizada, localizava-se numa envolvente natural, todavia, a

máquina estava prestes a tornar-se num modelo de megaestrutura

que, rapidamente, se sobrepunha ao modelo de cidade jardim e

Gropius, no projecto urbano para Spandau – Haselhust, espelhava já

uma posição bem mais ambígua, no que concerne o natural e o

mecânico, do que aquando da formação da escola.

Ainda no percurso da Bauhaus, verificámos como a entrada de

Meyer determinou um modelo técnico associado a uma vertente do

funcionalismo produtivista que, apesar dos princípios se basearem

no profundo conhecimento da vertente técnica da construção,

subentendia um compromisso total com a existência humana, como

o provam os temas introduzidos como a psicologia e a sociologia.

Para Meyer, conforme ideias expressas em Construir que centravam

Page 402: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

379

o acto de habitar nas questões biológicas e nas questões técnicas

em torno do homem, a construção deveria ser um processo

elementar simples que espelhasse as necessidades básicas do ser

humano, a arquitectura não se prendia, aqui, com as questões

estéticas mas sim com as questões funcionais, intimamente

relacionadas com o acto de habitar e que passavam pelo bem estar

da vida humana e com a necessidade de responder às questões da

vida biológica.

Mas tivemos oportunidade de notar que, apesar dos modelos de

Meyer apontarem entre a casa máquina e a cidade máquina, as

estruturas urbanas não desprezavam a existência da vida e que os

espaços racionalizados se organizavam em articulação com a

paisagem e com a natureza, como é o caso de Bundeschule des

Allgemein Deuschen Gewerkschaftsbundes, o que nos levou a

sublinhar que Meyer é, na Bauhaus, aquele que mais se aproxima da

máquina e, ao mesmo tempo, aquele que mais se aproxima do

homem.

Observámos, em seguida, como o caminho em direcção a uma,

ainda maior, valorização da máquina continua com Funcionalismo

Técnico de Mies van der Rohe, numa nova estratégia em que os

objectivos se reflectem, essencialmente, na arquitectura que passou

Page 403: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

380

a uma vertente mais técnica, tendo a escola ficado a cargo dos

engenheiros, conforme exemplificámos com o pavilhão da Exposição

Mundial de 1929, em Barcelona, que se tornou um símbolo de

precisão técnica notável e da produção de qualidade e de perfeição

da técnica alemã.

Em suma, sustentámos que a Bauhaus desenvolveu um percurso em

que, embora a arquitectura se vá distanciando do orgânico em

direcção a uma maior aproximação da máquina, representando o

funcionalismo técnico o expoente máximo, a escola não perdeu a

sensibilidade nem a poética para com o ser humano.

Nesta nossa análise, ao longo da arquitectura do século XX, houve

um enfoque especial para Le Corbusier que visionariamente aferiu de

uma nova emergência na sociedade do início do século: o

maquinismo. Destacámos, efectivamente, que o seu concomitante

fascínio pela máquina e pela natureza pode ter começado muito

cedo, dado os dois factores terem estado muito presentes na sua

formação, e pudemos constatar que ao longo do seu percurso foi,

sempre, premente a sua preocupação com a funcionalidade da

arquitectura em estreita conexão com a imprescindibilidade de

ajustar o espaço às exigências do corpo humano, associando a casa

à ideia de máquina de habitar, numa atitude pioneira que intentava

Page 404: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

381

aprender com a máquina para posteriormente a colocar ao serviço do

homem.

Vimos, então, como na sua colaboração com a revista L’Esprit

Nouveau se equacionava a problemática relação entre a arte e a

sociedade industrial, defendendo-se assertivamente a importância do

artista e a sua função numa sociedade contaminada pela máquina.

Como já referimos atrás, o betão foi o elemento que possibilitou

novas possibilidades para a arquitectura e Le Corbusier aplicou-o de

forma mais arrojada que os seus contemporâneos e, assim, construiu

a casa Domino, que representou uma evolução qualitativa com a

estrutura a tornar-se oculta e, na sua análise, confirmámos os

pressupostos que procurávamos revelar, pois o próprio arquitecto faz

uma associação entre os sistemas construtivos e os sistemas

orgânicos.

No entanto, as suas preocupações reflectiam-se também na escala

humana que considerava como um sistema métrico e, de facto, no

Modulor, a vertente técnica não se desenvolvia afastada do sentido

de harmonia e de escala humana, provando-se que Le Corbusier

estava realmente consciente da necessidade de ajustar o espaço à

escala humana.

Demonstrámos como o tema da máquina interessou particularmente

Page 405: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

382

Le Corbusier e como em Por Uma Arquitectura, que continha de

forma geral os artigos publicados em L’Esprit Nouveau, tentava

incentivar os arquitectos para as características particulares das

construções industriais e das grandes máquinas do mundo moderno,

metáforas da era da máquina que o arquitecto preconizava virem a

substituir os antigos modelos.

Com efeito, para Le Corbusier, a casa deveria ser como uma

máquina de habitar e o problema da máquina deveria ser

equacionado como um chassi de um carro. Verificámos, assim, que

foi nesta lógica que Le Corbusier, com o intuito de resolver o

problema da falta de casas, construiu a casa Citrohan, a casa

considerada como uma ferramenta, e que inspirada no modelo de

Henry Ford e no modelo norte americano de Taylor se assumia como

uma produção em série, através da standardização das principais

peças.

A casa Citrohan tinha muitas alusões mediterrânicas e náuticas, os

terraços assemelhavam-se a coberturas de barcos, a planta funcional

envidraçada e bem iluminada com alusões fabris e em pleno

contacto com a natureza e, reflexo dos novos tempos, era concebida

para qualquer pessoa e em qualquer lado, característica típica do

produto industrial.

Page 406: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

383

Le Corbusier, influenciado pelo Cubismo, defendia a concepção do

espaço contínuo, o edifício era inseparável da envolvente, assim a

casa penetra na natureza e é penetrada por ela, estabelecendo uma

relação íntima com a natureza.

Um exemplo que assinalámos foi o da Ville Savoye em que a casa se

desenvolve suspensa sobre pilotis, com vista a um contacto mais

directo com a natureza e inseparável da envolvente, conceitos que

derivavam da concepção cubista do espaço e que o tornavam

habitável de forma contínua em múltiplas dimensões. Assim, a ideia

geradora é privilegiar a relação com a natureza em paralelo com o

conceito de máquina de habitar.

Efectivamente, esta relação entre a natureza e a técnica

acompanhou desde cedo o universo conceptual de Le Corbusier,

conforme pudemos ver na Petit Maison que testemunha a vontade de

Corbusier em construir uma casa com uma forte relação entre a

natureza e a ideia de máquina de habitar. Os dados, que tinham sido

previamente definidos pelo arquitecto, continham os elementos

naturais e a casa máquina, sendo o Sol um dos elementos naturais

com que o arquitecto tinha particular cuidado, facto que o levou

inclusivamente a uma investigação técnica e à produção dos

paradigmáticos brise soleil.

Page 407: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

384

O fascínio de Le Corbusier pela máquina estendia-se aos edifícios

públicos que funcionavam como máquinas colectivas, e o primeiro

exemplo que referimos foi o do Concurso para a Sociedade das

Nações, em cujas propostas percebemos a vontade de relacionar o

homem com a máquina, quer como ideia de mecanismo quer como

se fosse um organismo. Este edifício seria uma espécie de

parlamento para o povo, humanismo para elites, e Le Corbusier

articulava, aqui, o mito da máquina com a natureza, percebendo-se

na leitura do edifício uma situação dupla: a dinâmica da rotação dos

planos e, ao mesmo tempo, um organismo composto de glândulas e

artérias.

Esta ideia de simbiose entre o fenómeno técnico e o orgânico foi

ainda mais perceptível no projecto de Centrosoyus, no qual não só

constatámos a vontade de construir um edifício de arquitectura

mecanicista, aliás uma tendência da sociedade russa industrializada,

como, também, verificámos o facto do edifício apresentar a forma de

um corpo.

Neste projecto, o arquitecto ajustou as necessidades técnicas à

dinâmica da máquina e, em simultâneo, o edifício parecia uma figura

humana, daí termos sustentado que, numa atitude de antecipação, o

edifício apontava para um híbrido, provando que o mecânico e o

Page 408: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

385

orgânico figuraram mutuamente nos processos conceptuais do

arquitecto.

Vimos, igualmente, como das máquinas colectivas que Le Corbusier

concebeu, a Cité Refuge foi a que formalmente tinha mais afinidades

com o transatlântico.

Este edifício, também denominado de Exército de Salvação,

equivalente ao condensador soviético, era a imagem de uma

máquina de habitar que se opunha à envolvente, era quase como

uma cidade internacional flutuante, contudo, se ao mesmo tempo era

uma fábrica do bem, no piso térreo os percursos harmonizavam-se

em configurações orgânicas. Neste edifício, Le Corbusier resolveu os

problemas de ventilação chamando-lhe respiration exacte, provando-

se que nas suas soluções técnicas estavam presentes analogias

biológicas, associadas a funções orgânicas.

No Pavilhão Suíço constatámos, também, a ideia de máquina onde,

tal como num barco, os quartos se assemelhavam a camarotes e,

todavia, esta máquina de habitar flutuava em cima da natureza, era a

imagem do edifício associada à vida ideal, reunida debaixo da alçada

da máquina e da natureza

No projecto de Ronchamp, o arquitecto cruzou, também, de forma

híbrida os aspectos relacionados com a natureza e com a técnica.

Page 409: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

386

Nos primeiros esboços, considerou a localização de quatro

horizontes e o percurso do Sol, elemento natural sempre presente

nos registos de Le Corbusier que, aqui, combinou a com natureza e o

homem, esquecendo um pouco a ideia de máquina.

Salientámos, também, a influência da natureza nas formas côncavas

e convexas, e a semelhança com a máquina pois, formalmente, a

igreja assemelhava-se à proa de um barco.

Por outro lado, o jogo de luz e de sombra provoca uma experiência

intensa que incentiva a espiritualidade e a emoção humana, pelo que

foi considerada como uma machine á emovoir, provando-se que Le

Corbusier estava, nesta capela, numa estratégia de considerar o

factor humano para além da dimensão técnica.

No entanto, sublinhámos também a ideia de que apesar de Le

Corbusier ser constantemente associado ao modo como enquadrou

o fenómeno da máquina na sua obra, a natureza desempenhou um

papel igualmente importante, comprovando-o o modo como nas suas

obras considerou, em simultâneo, a importância da natureza e o

papel da máquina na vida do Homem.

Provámos que apesar da arquitectura moderna não demonstrar

particular interesse pelas relações com a natureza, é possível

perceber de que modo é que ela foi protagonista em diversas obras

Page 410: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

387

de arquitectura, e constatar que obras nascidas sob o signo da

máquina se articulam com o aspecto orgânico para a seguir

constatarmos o contrário, que obras geradas sob o signo do

orgânico, se enquadram na mesma artificialidade que caracterizou o

movimento moderno e que o paradigma da máquina, directa ou

indirectamente, esteve presente, como o são exemplo as obras de

Wright e de Aalto.

De facto, salientámos que embora Wright defendesse o papel da

natureza na vida do homem e seja frequentemente associado à

arquitectura orgânica, situação com que ele próprio se identificava,

conseguimos provar que ele considerou, também, o paradigma da

máquina nos seus processos criativos.

Vimos como logo no princípio da sua carreira se percebeu que

Wright não era indiferente à máquina, quando leu publicamente o

manifesto The Art and Craft of the Machine e manifestou claramente

o seu entusiasmo pela máquina, verificando-se que apesar da

distância entre os Estados Unidos e a Europa, existia alguma

semelhança no modo como este tema era enquadrado.

No entanto, desde as Praire Houses que se percebe, também, uma

tendência para enquadrar as casas em ambientes naturais, onde a

espacialidade da casa devia evoluir da necessidade funcional.

Page 411: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

388

Destacámos, também, uma relação de amizade entre Wright e

Mumford, que se manteve durante vários anos e que foi marcada,

sobretudo, pela correspondência entre ambos. A arquitectura era o

principal tema na crítica de Mumford e Wright era o arquitecto que

ele privilegiava e, embora nunca lhe tenha poupando criticas,

acreditava, tal como Wright, na utilização dos métodos modernos de

construção, ainda que considerasse, também, que esse processo

não era uma mera adaptação à era das máquinas, pois a

arquitectura tinha de ser sempre para o homem.

Um aspecto muito interessante foi quando percebemos que o

contexto da exposição sobre o tema International Style, na qual se

evidenciou o confronto entre Wright e os arquitectos europeus, revela

que a aparente diferença entre o orgânico de Wright e o fascínio

europeu pelo betão não eram situações tão antagónicos como à

primeira vista poderiam parecer. Pois na realidade, a opinião de

Mumford de que os europeus estavam a aproximar-se mais de

Wright e tinham perdido um pouco a fé no betão, como um absoluto,

para adquirirem um pouco do amor de Wright por materiais naturais,

vai de encontro ao que pretendemos provar: uma certa

permeabilidade entre o orgânico e a técnica como uma tendência

geral entre os arquitectos que se destacaram no século XX. Na

verdade, no percurso de Wright, a natureza foi sempre um

Page 412: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

389

elemento importante e na Escola de Tatliesin, os jovens arquitectos

aprendiam inspirados na arte japonesa que promovia uma ligação

profunda entre o homem e a natureza, valorizando-se a continuidade

orgânica em que o homem evoluía através de uma relação intima

com a natureza, baseada na meditação e na contemplação.

Pudemos observar que a arquitectura de Wright perspectivava uma

construção natural como o crescimento, ideias que derivam de

Goethe mas que, no entanto, no seu imaginário, o paradigma da

máquina não fora esquecido. Em Broadracre City, combinou de

forma particular uma área urbana, em que os arranha céus se situam

numa estrutura agrária como um conjunto de comunidades

construídas por zonas residenciais, um projecto de descentralização

urbana, no qual casas de vários tamanhos eram constituídas em

parcelas de um acre, atravessadas por auto-estradas e em que os

meios de comunicação eram o automóvel e um modelo experimental

de helicóptero.

Neste projecto, pudemos provar que a intervenção de Wright

passava sempre por uma relação entre a natureza e a cidade, neste

caso cidade mecanizada em contraponto com as zonas residenciais

orgânicas.

Wright defendia a transcendência e considerava a natureza de forma

Page 413: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

390

mística, atribuindo-lhe um lugar fundamental no desenvolvimento

psicológico do homem, por considerar o contexto natural fundamental

para a evolução positiva do homem.

Um projecto que assimila esta ideia de harmonia com a natureza é a

casa da Fallingwater; aqui a natureza é o pretexto do projecto, a casa

surge do crescimento orgânico, incrustada na própria natureza e,

apesar dos seus amplos envidraçados, a casa assume uma função

protectora. A natureza assume um valor superior a qualquer outro, a

casa é colocada no interior da natureza, no eixo vertical a grande

chaminé reporta aos primeiros espaços habitados pelo homem em

que a fogueira era o centro do espaço, e o seu material assemelha-

se a uma caverna. Os próprios materiais utilizados em determinadas

situações ajudam a configurar essa semelhança com uma caverna. A

casa desprende-se em elementos sequenciais que parecem crescer

como organismos vivos, apesar da imersão da casa na natureza e

dos contrastes naturais produzidos, podemos dizer que se trata de

um exemplo em que o artificial foi completamente controlado pelo

arquitecto. Neste projecto, o mais importante não foi obedecer a uma

qualquer imagem moderna mas, antes, estabelecer uma harmoniosa

relação entre a natureza e a produção do homem.

Neste trabalho, pudemos perceber que Aalto foi o arquitecto que

Page 414: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

391

mais se aproximou do homem e da natureza e o que mais contribuiu

para humanizar a arquitectura, isto sem se afastar completamente do

paradigma da máquina, apesar de a relegar para um plano marginal.

Efectivamente, este arquitecto, ainda que no início subscrevesse os

princípios do funcionalismo, teve logo consciência de que o

funcionalismo técnico, só por si, não definia a arquitectura, pelo que

tivemos oportunidade de salientar o modo como Aalto se mantém fiel

à natureza e como isso é um reflexo do contexto da arquitectura do

seu país.

Vimos, então, como nos edifícios que se destacam neste período

funcionalista, se percebe uma preocupação com as questões

humanas em paralelo com as questões técnicas.

No sanatório de Paimo, para além de resolver as questões técnicas,

Aalto entende que a arquitectura tem de resolver, igualmente, as

questões humanas derivadas do modo de habitar os espaços.

Assim, no sanatório, para além de resolver a máxima funcionalidade

do programa, resolve também questões como a exposição solar e a

ventilação, em sintonia com a melhor forma do homem se relacionar

com o espaço. Estas preocupações, no sentido de adaptar os

espaços ao homem e à função, percebem-se, também, na Biblioteca

de Viipuri, onde as questões funcionais e técnicas passavam,

Page 415: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

392

inclusivamente, por relacionar o espaço da biblioteca com o olho

humano, já que para Aalto a biblioteca não estaria bem resolvida,

técnica e funcionalmente, se não satisfizesse a principal função – a

de ler um livro.

Vimos como este tipo de questões foi abordado em O Racionalismo

e o homem, no qual o arquitecto reflectiu sobre a necessidade de

tornar o racionalismo mais humano e, efectivamente, pudemos

verificar que Aalto foi o arquitecto que melhor representou o

funcionalismo e a arquitectura orgânica, pelo que se pode situá-lo

numa versão que podemos apelidar de funcionalismo orgânico.

Na Villa Mairea, percebeu-se a forte cumplicidade entre a natureza e

o homem, a floresta prolonga-se para a casa desde o átrio de

entrada, o pátio cria relações de continuidade com a envolvente e o

interior e o exterior confundem-se num jogo de luz e sombra. Neste

projecto, o arquitecto utilizou o valor expressivo da madeira provando

que a produção em série e a estandardização também, se podem

aplicar a este material.

Nos espaços religiosos pudemos também notar uma progressão do

racionalismo funcionalista, dos primeiros trabalhos em Malon e em

Linghy, para o racionalismo orgânico em Riola. Também, neste caso,

pudemos verificar que Aalto apesar de se preocupar com as boas

Page 416: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

393

soluções, nomeadamente em termos de iluminação, não se deixou

dominar apenas pelas questões técnicas e pensa alguns espaços

como corpos, de tal modo que em alguns casos utiliza a metáfora da

vida e a morte.

No seguimento da nossa análise, verificámos que a partir dos anos

cinquenta se instalou a crise do racionalismo que se reflectiu numa

consciência de novas questões relacionadas com o acto de habitar.

Efectivamente, o princípio de uma estética cartesiana e de um

conceito cultural utópico, ligado ao maquinismo, foi, a partir dos anos

30, progressivamente desaparecendo no panorama da arquitectura

moderna e, nesta fase, mais do que criar um estilo baseado nas

inovações tecnológicas era necessário pensar em obras de

arquitectura que reflectissem os valores científicos e racionais

ajustados às necessidades do homem que, por sua vez,

ultrapassavam largamente as questões funcionais.

Assim, evidenciámos como as complexas estruturas arquitectónicas

multifuncionais, concebidas e realizadas por meios tecnológicos

avançados, povoam o imaginário dos anos 70 e como no grupo

britânico Archigram, que desenvolveu novos conceitos de habitar na

casa cápsula, se percebe a forma e a função intimamente ligadas à

forma orgânica e à função mecânica, indissociáveis da ideia de

Page 417: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

394

máquina de habitar.

Vimos como, do mesmo modo que Le Corbusier, a arquitectura

mutante do grupo Archigram propunha novos espaços considerando

o espaço mínimo, no entanto, adaptado a novos tempos, pressente-

se na arquitectura, tal como na sociedade, uma simbiose crescente

entre a natureza humana e a técnica. A arquitectura aparece como

uma segunda pele do corpo humano e, mais próxima do limite da

artificialidade, torna-se mais orgânica e procura uma forte associação

entre a máxima artificialidade e o organismo vivo, em estreita ligação

com as metamorfoses da vida.

Na transição do século XX para o século XXI pudemos visualizar

algum paralelismo no modo como a sociedade encarou, de novo, o

paradigma da máquina, com as novas tecnologias a apontarem para

novas realidades e com o digital e o virtual a substituírem a máquina

analógica.

À semelhança das questões que se colocaram relativamente ao

modo como se enquadrou este tema, no início do século XX,

observámos novamente, no final do século, um grupo que questiona

e um grupo que aceita, embora essa aceitação também não seja

incondicional, conforme referimos com a postura cautelosa de Felix

Guatarri e Pierre Lévy e as mais contrastantes de Paul Virilio e Jean

Page 418: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

395

Baudrillard.

O computador conduziu a uma nova relação em termos de espaço e

de tempo, o ciberespaço substituiu o espaço físico e conseguimos

perceber até que ponto o computador é uma ferramenta e a forma de

se poder tirar partido desta ferramenta a favor do homem, e notámos

como do mesmo modo que se defendem processos híbridos para o

homem, também, essa situação se reflecte na arquitectura.

No entanto, nem todas as posições se revelam positivas e de

vanguarda e pudemos constatar que os métodos digitais podem

servir, apenas, para mascarar conceitos que não vão além de uma

qualquer imagem ao gosto da época, do mesmo modo como

eclectismo fazia algumas reproduções no fim do século XIX, ou para

criar falsas imagem de vanguarda, muitas das vezes com base na

ideia de velocidade. Efectivamente, esse conceito de movimento e

velocidade que os futuristas apresentaram no início do século e que,

na época, se manifestou de extrema importância, agora, no fim do

século XX, só por si revela-se insuficiente.

Um exemplo é o caso de Graha Kuningan, no centro de Kwan Tong,

em que o computador imprimiu aos registos do edifício uma imagem

que dá a sensação de movimento e fluidez mas, como

comprovámos, a tecnologia não esteve a favor do projecto pois este

Page 419: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

396

apresenta vulgares padrões formais, não sendo trabalhado qualquer

outro conceito para além da velocidade.

Salientámos, também, que o computador pode ser uma ferramenta

importante no modo como possibilita uma leitura mais objectiva do

lugar e, em certos casos, como possibilita criar projectos ousados em

territórios complexos, como foi o caso da School Distrit em que

percebemos uma intenção clara de dominar a natureza.

Outra das facetas interessantes do computador que constatámos, é

poder testar situações espaciais que permitam melhorar a qualidade

ambiental e as questões da sustentabilidade.

Vimos, isso mesmo, no projecto Eden de Nicholas Grimshaw

Partener, um projecto em que é perceptível a analogia entre o

artificial e o natural, dando forma a uma estrutura que tinha como

objectivo valorizar a biodiversidade do mundo vegetal. Esta estrutura

foi concebida com base em regras do mundo orgânico e assente em

princípios que consideramos idênticos aos de Steiner. Com efeito, já

um século antes, este arquitecto privilegiava a adaptação ao meio, o

crescimento e o desenvolvimento mas, no caso presente, as novas

tecnologias permitiram a construção de uma estrutura de aço ligeiro,

coberta com uma membrana transparente construída como o corpo

de um animal, verificámos como as tecnologias actuais permitem que

Page 420: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

397

o carácter orgânico fosse conseguido através de uma estrutura mais

plástica do que as estruturas de Steiner.

Assim, uma das questões relevantes foi perceber que da mesma

maneira como, no fim do século XIX, o betão deu novas

possibilidades à arquitectura, também, no fim do século XX, os

avanços desta arte passam pela aplicação das possibilidades que o

digital permite testar, possibilitando depois a construção de

estruturas impensáveis há umas décadas atrás.

É igualmente curioso assistir que tal como o automóvel foi um

elemento gerador de ideias e de associações várias, no início do

século XX, também, no fim do século XX, Frank Gehry utilizou a

versão do sistema de desenho CATIA, desenvolvido por uma

empresa aeronáutica que fabricava aviões de caça. Verificámos

como este sistema, utilizado pela primeira vez na proposta para

Barcelona, foi depois aperfeiçoado no auditório da Disney e obteve a

sua consagração máxima no Museu de Guggenheim de Bilbau.

Sustentámos, pois, a mudança de um novo paradigma, já que o

betão que tinha permitido no Museu de Nova York uma espacialidade

verdadeiramente inovadora para a época, era agora substituído pelo

titânio e pelo desenho em computador e, de novo, a engenharia foi

fundamental para formalizar a ideia do arquitecto.

Page 421: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

398

Como tinha acontecido no Guggenheim de Nova Yorque a simbiose

entre a tecnologia e imaginários conceptuais baseados em formas do

mundo orgânico é um tema recorrente na arquitectura, como é o

caso da espiral de aço e vidro do edifício da BMW, em Munique, com

evidentes alusões a turbinas e a motores aeronáuticos.

Também vimos como Toyo Ito utiliza a metáfora da máquina na

Mediateca de Sendai, testemunhando a utilização da tecnologia

informática como inspiração conceptual e, da mesma forma como os

futuristas utilizaram, nos seus pressupostos, a ideia da máquina

como pretexto, também, neste contexto, enquadrámos uma nova

geração de arquitectos que, entretanto, foi surgindo e que está

directamente associada aos recursos tecnológicos e a elementos da

natureza. Assim, destacámos os trabalhos de Chu com a introdução

do elemento genético que comporta um referencial científico

subjacente à mecânica quântica porque, efectivamente, Chu

incorpora nos seus registos novos avanços da mecânica quântica,

resultante de um princípio natural transcendental, e encontrámos no

seu trabalho uma nova atitude definida como paradigma evolutivo,

conceitos produzidos a partir da mutação de modelos tridimensionais

por computador e que criam ambientes simulados.

Como tivemos oportunidade de confirmar, a noção de espaço e de

Page 422: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

399

tempo tem sofrido alterações profundas, também elas só possíveis

devido aos novos avanços da mecânica quântica, que provocam a

introdução de um novo conceito de tempo imaginário. O trabalho de

Chu, por seu lado, reporta-se a recentes investigações sobre o modo

como o homem se relaciona com o espaço, nomeadamente a

percepção, actividade do sistema cognitivo, vital para qualquer

organismo, em contacto com o espaço, que exprime uma relação

sensível, o que de acordo com Karl Chu radica no facto de o homem

ter uma capacidade nata para se adaptar ao futuro. Este arquitecto

elege, assim, o espaço genético e considera-o de modo diferente do

da formulação das imagens interactivas que se associam ao conceito

de ciberespaço, pois, constatámos como Karl Chu questiona o tema

da transformação da natureza, através da influência da

racionalidade, em conjunto com o, da transformação da

modernidade, procurando no seu trabalho reiniciar o debate em torno

da racionalidade, tema que parece cristalizar na modernidade.

Analisámos, ainda, o trabalho de Lars Spuybroek, igualmente

inovador no que concerne o modo de conceber e construir

arquitectura, que com a firma holandesa NOX utiliza o computador

para gerar diagramas que são depois convertidos em espaço

arquitectónico, num trabalho que possibilitou uma interessante crítica

ao funcionalismo. A conceptualização de Spuybroek assenta

Page 423: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

400

na ideia de que o estático está condenado à extinção, já que todos

os organismos vivos se transformam, e este sistema flexível é assim

denominado pela capacidade de movimento, de proceder a

diferenciações internas de absorver, de transformar e de trocar

informações com o ambiente envolvente.

Nesta perspectiva, um organismo vivo possui uma extraordinária

capacidade de centrar-se em torno de um fluxo de ordem, pelo que a

capacidade do sistema fluído manter uma ordem interna deve-se à

capacidade para alterar a sua própria estrutura e, tal significa que a

ordem não existe como forma no espaço mas, sim, como movimento

no espaço: uma direcção.

Nox utiliza, então, o computador para gerar diagramas de vários

tipos, a que chama movimento do edifício, e é este conjunto de

diagramas conceptuais, construídos em computador, que

posteriormente se animam e que resultam em movimento de

arquitectura. A partir desses esquemas, a NOX desenha novos

diagramas que, por sua vez, definem os modelos de comportamento,

movimentos do corpo que depois se traduzem em espaço.

Neste trabalho, foi interessante perceber que, tal como no futurismo,

também, aqui, o movimento e a velocidade ganham um novo

protagonismo e de novo surge uma noção de vanguarda. Neste caso

Page 424: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

401

considera-se a fusão de todas as partículas do espaço, o que apenas

é possível através de meios digitais e, no Hotel de Noorswijk, junto à

praia, a intenção é exactamente a fusão do espaço, extinguindo-se

as barreiras entre a terra, o céu e a água. A estrutura metálica é

revestida por um material translúcido onde se elevam partículas em

espiral ascendente e o movimento constante provocado pelas

partículas cria uma ideia de leveza e fluidez, podendo-se estabelecer

uma associação entre esta estrutura e a torre de Tatlin, porém,

adaptada à era digital, pois a torre construtivista estava para as

construções da época do mesmo modo que, hoje, esta estrutura está

para as construções actuais.

Nesta investigação reflectiu-se, ainda, sobre as mudanças

produzidas nos modos de pensar e de construir arquitectura

mediante a utilização de técnicas de animação digital e recorrendo a

uma grelha líquida que foi criada a partir do aperfeiçoamento das

técnicas de computação gráfica da grelha convencional, uma das

ferramentas convencionais, mais conhecida como rectícula. Esta

situação gerou novas possibilidades para o espaço, como

flexibilidade, maleabilidade, fluidez e mutabilidade, e a nova grelha

foi, assim, utilizada para projectar o pavilhão H2O, um pavilhão sobre

o tema da água a construir na ilha artificial de Neeltje.

Page 425: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

402

A intenção era criar um espaço único, a arquitectura seria construída

em ambientes de múltiplas características sensoriais onde se

privilegiariam os sentidos e em que os ambientes informatizados e

interactivos seriam em simultâneo reais e virtuais. O projecto foi

pensado a partir de dois espaços distintos e interligados de maneira

idêntica, em analogia com o modo como a água existe na terra. O

pavilhão de água doce e de água salgada criariam um micro

organismo gigante e, do mesmo modo que os rios seguem em

direcção ao mar, também, neste caso, existia um alusão às correntes

naturais que fluem até ao mar, sendo particularmente interessantes

as associações entre o artificial e o natural. O visitante ao percorrer o

espaço tem a sensação de que este funciona como um organismo

vivo, o movimento ajuda a dar vida ao espaço e o utilizador tem

necessidade de recorrer aos órgãos sensoriais, privilegiando-se uma

experiência táctil e espacial que permite receber informações

diversas do exterior que, por sua vez, são emitidas a partir uma

estação localizada no mar.

Os espaços funcionam ou em função de uma onda que

periodicamente inunda o espaço, ou através de informações, como o

movimento das marés e a velocidade do vento, que dado serem

continuamente actualizadas, permitem uma transformação

permanente do edifício e desenvolvem uma forte relação do

Page 426: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

403

edifício com o meio exterior. Assim, o programa dos edifícios propõe

um percurso com base em variáveis introduzidas pela natureza em

permanente metamorfose.

Este pavilhão propõe uma nova forma de habitar o espaço,

questionando tanto os próprios limites do espaço, como a

ortogonalidade cartesiana em que o homem se habituou a viver ao

longo do tempo. Estes espaços descobrem novas possibilidades

para o espaço habitável, podendo constituir-se como uma alternativa

ecológica para a arquitectura e verificámos, ainda, que este tipo de

arquitectura pode ser associado a princípios de morfogénese dos

casulos, das conchas e de outros organismos vivos que criam os

seus habitat a partir de superfícies que os envolvem.

Outro trabalho sobre o qual reflectimos foi o de Frazer que se

desenvolve em forte cumplicidade com os princípios e regras do

mundo natural e em que o algoritmo genético simula no computador

a evolução natural de qualquer organismo. Observámos como, nos

modelos de concepção deste arquitecto, os modelos virtuais são

criados com base na natureza e contextualizam o espaço

relativamente à envolvente, uma abordagem metodológica que

encontra algum paralelismo nos trabalhos de Steiner e de

Wittgenstein. Efectivamente, Frazer aprendeu e desenvolveu

Page 427: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

404

técnicas de linguagem e códigos para máquinas, com base em

fenómenos que ocorrem na natureza tentando copiar os

modelos/sistemas biológicos.

Procurámos, igualmente, perceber como pode a natureza, em termos

de conceito, manifestar-se de um outro modo – o caos. Esta forma

extrema de desordem que ocorre na natureza abre toda uma

possibilidade de mutações e de transformações, várias podendo

conduzir à imprevisibilidade do sistema, de forma análoga à

imprevisibilidade da própria natureza.

Neste contexto, e associado a este fenómeno do caos, percorremos

também os fractais, muito comuns na natureza e que podem ser

comprovados em várias ciências, num conceito como a entropia ou

nos progressos da mecânica quântica. Verificámos que os avanços

do computador permitem um realismo visual, completamente

transformado pela geometria fractal e pelas imagens espectaculares,

inovando as simbologias que, por vezes, traduzem novas formas de

pensar. Nesta matéria, foi importante a pesquisa de Mandelbrot que

experimentou teorias matemáticas para explicar o fenómeno da

probabilidade errática e os processos de auto semelhança em

probabilidades.

Neste contexto abordámos o trabalho de Akio Hizume e constatámos

Page 428: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

405

como a secção dourada constitui um dos mais simples geradores

fractais e como as suas tentativas de aplicação à actividade artística

contribuíram para a constituição de novas possibilidades para a

arquitectura, para a representação gráfica e, inclusive, para o

pensamento humano.

Pudemos provar como Akio, que durante muito tempo profetizou as

formas de Rudolf Steiner, conseguiu a partir da rede Penrose

conceber um monumento hexadimensional, o Geotheanum 3,

reinventando temas antigos.

Contudo, com base na ordem e na desordem, surge um equivalente

físico e matemático das formas digitais, a String Theory. Revelámos

como um grupo de investigadores, da área da física, perceberam que

esta teoria das cordas poderia resolver alguns problemas

relacionados com o espaço e com o tempo e destacámos, neste

grupo, Michael Green que definiu para o espaço onze dimensões,

acrescentando assim às de Einstein, sete dimensões para o espaço,

e uma para o tempo, e das quais sobressai a graviton. Esta partícula

proporciona a relação necessária entre a micro escala da mecânica

quântica e a macro escala da relatividade geral, apontando novas

pistas para soluções que pareciam difíceis de resolver entre a teoria

das partículas e a teoria da gravidade.

Page 429: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

406

Atriduímos, por isso, relevância à String Theory porque esta tenta

explicar as componentes fundamentais de tudo o que existe no

universo e, apesar de não ter sido ainda comprovada, procura

resolver o grande enigma da física actual que reside na busca de

uma teoria que englobe todo o universo.

Neste contexto, interessou-nos também reflectir sobre as cordas

cósmicas que são uma espécie de dobra no espaço e que se

configurariam como fios finos macios e esticados entre as galáxias.

Os dois modos de reconhecê-las assentariam no facto de, por um

lado, serem muito finas mas muito macias, de tal forma que quando a

luz as atravessa é deflectida e, por outro, mediante a radiação

gravitacional, dado que as ondas se movem e quando se

movimentam podem gerar ondas gravitacionais.

Fizemos notar que esta ideia foi defendida por Edward Witten que,

por sua vez, provocou um avanço na teoria das cordas ao introduzir

a ideia de planos de cordas que vibram e o interessante desta teoria

é que tenta resolver a oposição entre a gravidade e as forças

eléctricas magnéticas e nucleares, podendo ajudar a repensar a

actual noção de espaço e de tempo.

Como fomos demonstrando, as forças da natureza, na sua infinita

materialidade, possibilitam várias aproximações entre a máquina e o

Page 430: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

407

organismo, aproximação que a teoria das cordas também permite.

Aqui, os seres vivos e as coisas seriam completamente formados por

infinitas dobras, podendo o fractal e a dobra coincidir, uma vez que

ambas prevêem uma explicação para as formas desordenadas e

complexas.

Vimos como apesar deste tema das dobras e dos fractais não ser

recente na arquitectura, pois estas formas complexas e repetitivas

que se desdobram tinham já inspirado outros autores, como Piranesi

ou no século XX, Alvar Alalto e Peima Pietilä, mais recentemente,

este tema, tem surgido com uma certa frequência no discurso de

vários arquitectos, como Enric Mirralles, Rem Koolhaas, Daniel

Libeskind no Museu dos Judeus, e na equipa de Foreign Office

Architects, no terminal marítimo de Yokohama.

Percebemos, aliás como algumas formas fractais e dobras geradas

na natureza, por exemplo, o sistema sanguíneo e nervoso ou a seiva

das árvores, podem ser recriadas na arquitectura por processos de

concepção que se ajustam a fenómenos sistémicos.

Estes fenómenos parecem acompanhar os processos conceptuais da

disciplina de arquitectura pois continuam a manifestar-se no século

XXI, como é o caso da fachada do edifício da Citrohan, nos Campos

Elisíos, em que o símbolo da marca se vai desdobrando em prismas,

Page 431: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

408

imprevistos configurando pirâmides de vidro de dimensões variadas

ou o trabalho de Zaha Hadid, no Mediterranean Museum of Nuragic

and Contemporary Art, em que a forma orgânica recortada por

pequenas aberturas irregulares recupera a forma exterior que se

assemelha a um recife de corais em contraponto com o interior

desdobrado em múltiplos recortes internos, assemelhando-se a um

organismo marítimo: um híbrido entre a natureza e a máquina.

Ora, como temos vindo a provar, a arquitectura acompanha a

evolução técnica e cientifica e disso são exemplo as

transarquitecturas que preconizam uma arquitectura multifacetada

que se desenvolve entre a imaginação e a matéria, entre o virtual e o

real. O espaço adquire uma nova dimensão que não passa pelas

noções de cheio e vazio e que se pode qualificar de inteligente, pois

as construções possuem sensores que manipulam as características

visíveis do espaço.

E, no trabalho de Novak, tivemos oportunidade de perceber a

emergência de um novo paradigma com a noção de limite a ser

trabalhada de uma forma inovadora e com os espaços a deixarem de

ter limites definidos e passarem a desenvolver uma relação espacial,

intimamente relacionada com o corpo.

Nesta perspectiva, em que o corpo é o elemento determinante do

Page 432: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

409

espaço, destacámos o trabalho de Char Davies que explora a

aproximação entre a componente física e espiritual, e que reflecte a

antiga ideia de Steiner, no entanto, ajustada a uma nova sociedade

em que a interacção homem-máquina é já irreversível.

Mais em concreto, percebemos como o trabalho de Davies apresenta

um potencial de novos ambientes para a exploração de novos

espaços arquitectónicos, e como a procura de novos ambientes

virtuais vai encontrar novas maneiras de pensar a arquitectura

contemporânea, não apenas no sentido visual ou tridimensional do

espaço mas, também, criando novos conceitos.

Como temos tentado demonstrar é importante notar como as

questões naturais, numa época em que as alterações aos modos de

conceber e de construir arquitectura estão muito vinculados ao

desenvolvimento das tecnologias de informação e de comunicação e

aos programas informáticos para arquitectura, não têm sido

desprezadas em trabalhos recentes.

De facto, se arquitectura é determinada pelo acto de habitar o espaço

e, por conseguinte, o homem é o elemento natural por excelência, ele

será sempre o elemento principal da obra de arquitectura.

Esta investigação, como vimos, desenvolveu-se em torno do tema da

máquina que, tal como sustentámos inicialmente, proporcionou uma

Page 433: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

410

imensidão de análises e interpretações sobre novas formas de

entender a arquitectura e sobre as relações que se estabelecem

entre o natural e a máquina. Na verdade, percebemos que é

constante a emergência deste tema na arquitectura mas que não

existem respostas definitivas em relação ao paradoxo entre o natural

e a máquina, apenas se podem desbravar caminhos, pois mais

importante do que definir uma asserção é problematizar este assunto

para, assim, compreender melhor os aspectos relacionados com o

tema.

Inquestionavelmente, a máquina enquadra-se no conceito de

vanguarda que parece comportar em si uma certa temporalidade,

dado que se pode dizer que o conceito de vanguarda implica que o

que é pensado hoje é considerado de vanguarda, e que no futuro

pode tornar-se num clássico, contudo, como se percebeu neste

trabalho, a máquina não corre esse risco pois a execução de um

qualquer trabalho futuro em torno deste tema vai ser sempre original.

A história tem provado que a máquina tem como uma certeza a sua

própria evolução e, dependendo do desenvolvimento tecnológico de

determinada época, será sempre certo que terá uma componente de

vanguarda.

Page 434: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

411

1 0 . 1 . R E F L E X Õ E S F I N A I S

Neste trabalho, procurou-se fazer uma aproximação ao conceito de

máquina, tema assaz actual nesta nova época de transição, e a

escolha deste assunto, enquanto objecto de estudo, serviu tanto para

pôr a descoberto as novas práticas na arquitectura do século XX,

como para reflectir sobre algumas mais antigas e, sobretudo,

providenciou-nos a descoberta de outras facetas da cultura

arquitectónica. O interesse em questionar as práticas da arquitectura

na sociedade, nas suas vertentes humana e técnica, insere-se na

tentativa mais vasta e primordial de procurar perceber a evolução da

própria humanidade, reequacionando as eternas questões que

relacionam o homem com o espaço habitável.

As propostas avançadas neste estudo confirmam um cenário em que

tudo fica em aberto, não obstante, o futuro passará,

indubitavelmente, pela capacidade da arquitectura se adaptar ao

fenómeno técnico, e o maior desafio será, como sempre, a tentativa

de se ajustar ao fenómeno humano, mas insistir e fazer crença na

dimensão humana, que alguns dizem tão ameaçada, é proclamar um

acto de fé na capacidade de continuarmos a permutar experiências.

Sem dúvida que nenhum estudo pode substituir o trabalho de leitura

e de interpretação de uma qualquer obra de arquitectura, ou de um

Page 435: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

412

comentário, crítica de arte ou reflexão consistentes, todavia, um obra

como esta poderá contribuir, ao nível do ensino, para uma melhor

orientação dos alunos no dédalo dos conceitos inerentes ao léxico da

arquitectura, pois procurou-se apresentar uma perspectiva distinta do

modo como se interpreta um conjunto alargado de obras e de temas

de arquitectura do século XX. Com efeito, dadas as características

múltiplas do fenómeno arquitectónico, são também, múltiplos os

métodos de conhecimento com que se pode abordar a arquitectura,

nomeadamente, conforme se valoriza, mais ou menos, determinado

conceito. Como se percebe não existe um número limitado de

possibilidades de se reflectir sobre a disciplina de arquitectura. Por

nosso lado, não negamos a utilidade e interesse de todas estas

teorias, no entanto, parece-nos que nenhuma delas, isoladamente,

permite explicar e interpretar de uma forma completa a arquitectura,

pelo que acreditamos que a melhor abordagem ao fenómeno

arquitectónico passará por uma síntese holística de todas essas

possibilidades, elegendo em cada uma o princípio que melhor

esclareça determinada obra, em determinado tempo e em

determinado contexto.

De notar, também, que a relativamente recente pesquisa sobre

ambientes virtuais, pode estruturar novas maneiras de dialogar com

a arquitectura contemporânea e que ao invés de a entender,

Page 436: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

413

apenas, como uma projecção representacional do espaço, seria de

extrema importância entender a arquitectura digital como uma fonte

de possibilidades para o avanço teórico e prático da acção projectual,

mais concretamente como uma porta aberta para a inter

conectividade do corpo, para a realidade física e, acima de tudo, para

a imaginação.

E se houve épocas em que se pensava que uma forma de resolver

os problemas estava no homem considerado como ferramenta, e se

houve outras em que se pensava que as boas máquinas resolveriam

os problemas, na sequência deste trabalho acreditamos que os dois

factores são indissociáveis.

Assim, ter de dar por terminado este trabalho não significa pôr-lhe

fim, já que perante a consciência de que quanto mais se mergulha na

hermenêutica de um qualquer assunto, mais abordagens e

perspectivas se querem percorrer e fica a sensação de que

necessitaríamos de muito mais tempo para aprofundar este tema.

Tempo que pode ter sido longo na sua extensão mas que, afinal, foi

muito curto quando nos deparamos com a necessidade objectiva de

concluir, pois que temos, assertivamente, consciência de que o

conhecimento é efémero e que a todo o momento surgem novas

questões e reflexões que nos dão vontade de continuar a heurística

Page 437: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

414

da investigação.

Page 438: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

415

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Page 457: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

434

1 2 . Í N D I C E

O N O M Á S T I C O

Aalto, Alvar, 8, 231-259, 361, 387, 390-392, 407

Adorno Theodor, 261, 263, 416,

Agostinho, Santo, 293

Aicher, Olt, 65, 166, 368

Alberts, 114

Aquino, São Tomás de, 293

Argan, Carlo, 70,121-123, 168,171, 237,248, 376,377

Aristoteles, 19

Arvatov, Borís, 91

Ascher, M. C., 356

Ashbee, C., 45, 46, 47

Asplund, Gunnar, 234

Bacon, Francis, 293

Balla, Giacomo, 69, 70, 81

Banham, Peter Reyner, 114, 288

Bakema, Jacob Berend, 269

Barata, Ana Margarida, 40, 131

Baudrillard, Jean, 296, 395

Bayley, Stephen, 82

Bax,Marty, 107, 110, 116, 119, 135, 136, 138, 140

Behne, Adolf, 111-113,126,375

Behrens Peter, 140

Beistegui, Willy, 176

Bergson, Henri, 264-266

Berg, Max, 113

Benton, Tim, 194

Berkel, Ben Van, 361

Björk, 246

Blom, Piet, 273, 274

Boccioni, Umberto, 69-71, 73, 81

Bocgenski, J.M., 266

Bodegravan, Wim Van, 273

Boesiger, Willy, 154, 159, 163, 183, 196

Borgmann, Albert, 294

Boutroux, Émile, 265

Bragdon, Claude, 212

Bruggen, Coosje, 330, 331

Bruhn, Ada, 140

Bryggmam, Erick, 234

Buffon, 34

Burlyuk, David, 88

Burton, Decimus, 319

Busignani, Alberto, 120

Butlers, Samuel, 264

Candilis, Georges, 269

Page 458: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

435

Capek, Carel, 263

Carlyle, Thomas, 368

Carvalho, António Pinto, 266

Carrá, Carlo, 69, 71

Chaplin, Charlie, 262

Charly, Warren, 281

Chiattone, Mario, 71

Chtcheglov, (Gilles) Ivan, 277

Chu, Karl, 11, 336-341, 350, 398, 399

Chukovsky,Koney, 88

Clément, Elisabeth, 22

Clynes, Manfred, 352

Citröen, Paul, 113

Coignet, François, 32

Cole, K. C., 360

Collins, Peter, 34, 50, 57, 161, 167, 168

Colquhon, Alan, 67, 70, 74, 88, 90, 93, 110, 111, 112, 114, 115, 127, 151, 153-155

Corbusier, Le,(Jeanneret), 7, 9, 85, 92, 93, 122, 129, 130, 143-200, 211, 214, 268, 270, 275, 289, 306, 320, 332, 380-386, 394

Costa, Daciano, 246

Cook, Peter, 281, 286, 288

Crane, Walter, 39, 42, 45, 46

Crompton, Dennis, 281

Curtis, William, 144, 145, 148, 164, 165, 172, 173, 177-182, 185-188, 194

Daniele, Pauly, 193

Dalcroze, Emile, 140

David, Erik, 364

Davies, Char, 363, 364, 409

Day, John Sedding, 43, 44, 369

Day, Lewis , 43, 44, 369

Debord, Guy, 377

Decartes, Réne, 22, 24, 28, 53, 366

Deleuze, Gilles, 395

Doesburg, Theo van, 94, 127

Dreyfus, Hubert L., 295

Duc , Viollet- le-, 161, 166

Eichemberg, Teruya, 364

Eisenman, Peter, 335

Einstein, Albert, 357, 405

Engelmann, Erich, 62

Estaline, 92

Eyck, Aldo Van, 269

Fergusson, 161

Fiedler, Jeannine, 118

Fieger, Carl, 125, 377

Fischer, Theodor, 103

Flecher, John Gould, 226

Fleig, Carl, 231, 237, 241, 245, 255

Forbat, F, 116

Ford, Henry, 161, 362

Foster, Norman, 310

Page 459: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

436

Foucalt, Michael, 293

Frampton, Kenneth, 281

Francastel Pierre, 7, 29, 146, 268

Frazer, John, 11, 350, 403

Freitas, Marinela, 36

Fuller, Richard Buckminster, 270-272, 276, 310

Funi, Achille, 70, 71

Futoransky, Luisa, 296

Gabo, Naum, 94

Gehry, Frank, 11, 328-333, 397

Giedion, Siegfried, 128, 129

Gibson, William, 297

Green, Michael, 357, 405

Greene, David, 281

Ginkel, Sandy Van, 269

Glymph, 330

Goethe,Johann, 49, 50, 52, 217, 389

Greve, Hovens, 269

Grimshaw, Nicholas, 312, 314, 318, 396

Gropius, Walter, 6, 75, 106-132, 135, 148, 214, 237, 374, 375

Guatarri, Félix, 295, 353, 394

Guinzburg, Moïse, 86, 92

Gutmann, Rolf, 269

Hadid, Zaha, 361, 408

Hamzad, 322

Hartmann, Georg, 53

Hawking, Stephen, 338

Heidegger, Martin, 99

Henderson, Peter, 40

Henry, Charles, 151

Herron, Ron, 281

Hertzberger, Herman, 273

Hitchcock, Henry Russel, 214, 215

Hizume, Akio, 355-357, 405

Hoffmann, Georg, 218, 230

Hollein, Hans, 276

Holloway, Dennis, 316, 317

Hood, Raymond, 213, 214

Hoop, Emile, 72

Ingres, 151

Ito, Toyo, 334, 398

Itten, Johannes, 113

Ivan, Gilles, 277

Jeanneret, Charles, 144

Johnson, Philip, 214, 215

Jünger, Ernst, 99

Kandinsky, 91, 109

Kaufmann, Jr., 223

Khan, Aga, 321

Khan, Hasan-Uddin, 268

Klee, Paul, 109

Page 460: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

437

Klotz, Heinrich, 116

Koolhaas, Rem, 361, 407

Kujawski, Guilherme, 285

Kuningan, Graha, 302

Kurtzweil, Ray, 252

Kwinter, Samford, 340

Lachelier, Jules, 265

Lang, Fritz, 264

Lathi, 258

Ledeur, Cônego, 193

Legrault, Réjian, 153

Leibniz, Gottfried, 295

Lemos, André, 17

Lévy, Pierre, 295, 296, 365, 394

Libeskind, Daniel, 360

Linneo, 34

Liubetkin, 122

Lissitzky, El (Lazar Markovich), 90, 91, 94

Loewy, Raymond, 82

Loos, Adolf, 62

Luduvico, Alessandro, 363

Lupasco, Stephane, 293

Mackail, 40, 41

Machale, 271

Malevich, Kasimir, 86, 90

Malraux, André, 197

Mancebo, Agustin, 77

Mandelbrot, Benoît, 355, 404

Marinetti, Filippo Tommas, 67-69, 73,

372

Matteson, 38

Mattrie, La, 264

Mayakovsky, Vladimir, 88

Mayne, Tom, 304

McHarg, Ian, 321

Meadows, Fiona, 325

Melnikov, Konstantin, 93

Mendelsohn, Erich, 210

Mendonça, Carlos Camargos, 353

Mentessi, Guiseppe, 72

Merleau-Ponty, Maurice, 340

Meyer, Adolf, 116

Meyer, Da Costa, 72

Meyer, Hannes, 107, 131-138, 179, 378, 379

Miele, Chris, 40

Miralles, Enric, 361, 407

Moholy-Navy, 94, 109, 113, 114, 375

Mondrian, Pieter, 94

Montaner, J. M., 8, 30, 33, 34, 63, 65, 88, 93, 117, 201, 228, 243, 264, 273, 279, 288, 360, 361

Moore, Henry, 39, 323, 368,

Moravec, Hans, 352

Mork Knut, 424

Morris, May, 40

Morris, William, 36, 39-47, 201, 369, 373

Page 461: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

438

Moscovici, Serge, 17

Moss, Yudelle Eric, 323

Moussavi, Farshid, 361

Muche, Georg, 116, 126, 378

Mumford, Lewis, 7, 18, 146, 210-216, 219, 220, 223, 225-227, 229, 388

Müller, Fabio, 190-193, 195, 196, 249, 251, 253

Muñoz, M. Tereza, 223

Muthesius, Hermann, 5, 96-98, 100-102, 105, 106, 110, 111, 373, 375

Nantois, Frédéric, 325

Naumann, Friedrich, 98, 99

Neumann, J. B, 111

Neutra, Richard, 179

Nieuwenhuys, Victor E. (Constant), 277, 279

Novak, Marcos, 11, 363, 408

Obrist, Hermann, 98

Ojitóvich, Mijaíl, 92

Otlet, Paul, 183

Ozenfand, Amédée, 85, 147, 150, 152

Oud, J. Pieter, 214

Paccioli, Luca, 158

Paterson, 206, 209

Paulick, Richard, 126

Perrault, Auguste, 25, 26

Perret, Auguste, 153

Pevsner, Nicolaus, 39-47, 97-103,

105, 203, 205

Pfeiffer, Bruce, 208, 213, 216, 220, 223, 224, 226, 229

Piano, Renzo, 274

Pietilä, Peima, 234, 361, 407

Pinset, David, 60

Piranisi, Giovanni, 361, 407

Pirovano, 272

Polo, Zaera, 361

Poussin, 151

Prampolini, Eurico, 71

Raeburn; Michael, 192

Ramirez, Juan, 165

Ribeiro, 246

Richardson, H. H., 211

Rondchenko, Alexandre, 91, 94

Rodrigues, Jacinto, 50, 53, 55, 57, 58, 109, 117, 120, 125, 130, 133, 136, 137

Rohe, Mies van der, 6, 107, 127-129, 139-142, 214, 274, 279

Rogers, Richard, 274, 310

Rodelet, 31

Rotondi, Michael, 304, 306

Ruble, 323

Ruskin, John, 5, 36-38, 201, 368

Russel, Bertrand, 60,

Russolo, Luigi, 69

Page 462: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

439

Rüssler, Otto E., 352

Sant’Elia, Antonio, 71-77, 81, 83, 283,

372

Sauvage, Henri, 76

Schäfer, Wilhelm, 98

Schildt, Göran, 238, 241, 242, 247

Schindler, Rudolf, 140, 179

Schlegel, Friedrich, 161

Serres, Michael, 295

Severini, Gino, 69

Silva, Marcos, 344, 345-347, 349

Smithson, Alison, 269

Smithson, Peter, 269

Spencer, Herbert, 265

Spengler, Oswald, 99

Spinosi, Paola, 36

Spuybroek, Lars, 340, 350, 399, 400

Steele, James, 297, 304, 306, 309, 314, 331, 333, 335, 338-340, 342, 350, 351, 358, 360

Stevens, Clark, 304

Stiegler, Bernard, 1

Stigt, Joop Van, 373

Steiner, Rudolf, 5, 48-58, 109, 140, 314, 356, 371, 396, 397, 405, 409

Sterlac, 352

Stonborouhg, Margarethe, 62

Subirats, Eduardo, 28

Sullivan, Louis, 89, 210, 211, 227

Tange, Kenzo, 275, 276

Tati, Jacques, 261, 262

Tatlin, Vladimir, 87, 88, 94, 401

Taut, Bruno, 111, 147

Taylor, Frederich, 163, 382

Terragni, G., 82

Tisdall, Caroline, 73

Utzon, Jörn, 257

Velde, Henry Van de, 101, 105-107, 375

Vesnín, Alezandre, 85, 92, 93

Vieira, Fátima, 36

Virilio, Paul, 296, 394

Vitrúvio, Marco, 24, 25

Voelcker, John, 269

Wagner, Otto, 72, 76

Wahed, Abdel, 316

Walac, Mike, 221

Walter, Benjamin, 316

Webb, Michael, 281

Weizenbaum, Joseph, 294

Wijdeveld, Hendricus, 210

Wingler, H. M, 107, 126

Witten, Edward, 359, 406

Wittgenstein, Ludwig, 5, 48, 59-66, 132, 371, 404

Whitford, Frank, 117, 123

Page 463: Estética da máquina na arquitectura contemporânea

440

Wojtowicz, Robert, 213, 216, 220, 223, 224, 226, 227

Woods, Shadrach, 269

Wright, Frank Lloyd, 7, 210-230, 320, 387-390

Waldorf, 52

Yeang, Ken, 321, 322

Zaera, Alejandro, 330