Etapas de Pesquisa

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Leis e Teorias Waltz, Kenneth N. (2002), “Teorias das Relações Internacionais”, Editora Grádiva: Lisboa, pp.14-33 1. Leis e Teorias Escrevo este livro com três objectivos em mente: primeiro, examinar teorias das relações internacionais e abordagens à matéria que reclamam ter importância teórica; segundo, construir uma teoria das relações internacionais que remedeie os defeitos das actuais teorias; e terceiro, examinar algumas aplicações da teoria construída. O intróito requerido para o cumprimento destas tarefas é explicar o que são as teorias e expor os requisitos para as testar. I. Os estudiosos de relações internacionais usam o termo teoria” livremente, muitas vezes para abranger qualquer trabalho que se afaste de uma mera descrição e raramente para se referirem apenas a trabalhos que se inserem nos critérios da filosofia-da-ciência. Os objectivos que pretendo alcançar requerem que definições dos termos-chave teoria e lei sejam cuidadosamente escolhidas. Enquanto duas definições de teoria rivalizam por aceitação, uma simples definição de lei é largamente aceite. As leis estabelecem relações entre variáveis, estes conceitos que podem ter valores diferentes. Se a, então b, onde a representa uma ou mais variáveis independentes e b representa a variável dependente: no modelo, esta é a expressão de uma lei. Se a relação entre a e b é muito invariante, a lei é absoluta. Se a relação é muito constante, apesar de não invariante, a lei seria algo como: se a, então b com probabilidade x. Uma lei baseia-se não só numa relação que foi encontrada, mas numa que foi encontrada repetidamente. A repetição origina a expectativa de que se eu encontro A no futuro, então, com probabilidade específica, encontrarei também B.

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Leis, teorias científicas, racionalidade, pesquisa, métodos, relações internacionais

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Leis e TeoriasWaltz, Kenneth N. (2002), Teorias das Relaes Internacionais, Editora Grdiva: Lisboa, pp.14-331. Leis e TeoriasEscrevo este livro com trs objectivos em mente: primeiro, examinar teorias das relaes internacionais e abordagens matria que reclamam ter importncia terica; segundo, construir uma teoria das relaes internacionais que remedeie os defeitos das actuais teorias; e terceiro, examinar algumas aplicaes da teoria construda. O intrito requerido para o cumprimento destas tarefas explicar o que so as teorias e expor os requisitos para as testar.

I.

Os estudiosos de relaes internacionais usam o termo teoria livremente, muitas vezes para abranger qualquer trabalho que se afaste de uma mera descrio e raramente para se referirem apenas a trabalhos que se inserem nos critrios da filosofia-da-cincia. Os objectivos que pretendo alcanar requerem que definies dos termos-chave teoria e lei sejam cuidadosamente escolhidas. Enquanto duas definies de teoria rivalizam por aceitao, uma simples definio de lei largamente aceite. As leis estabelecem relaes entre variveis, estes conceitos que podem ter valores diferentes. Se a, ento b, onde a representa uma ou mais variveis independentes e b representa a varivel dependente: no modelo, esta a expresso de uma lei. Se a relao entre a e b muito invariante, a lei absoluta. Se a relao muito constante, apesar de no invariante, a lei seria algo como: se a, ento b com probabilidade x. Uma lei baseia-se no s numa relao que foi encontrada, mas numa que foi encontrada repetidamente. A repetio origina a expectativa de que se eu encontro A no futuro, ento, com probabilidade especfica, encontrarei tambm B. Nas cincias naturais, mesmo leis probabilsticas contm uma forte imputao de necessidade. Em cincias sociais, dizer que pessoas com rendimentos especficos votam nos democratas, com uma certa probabilidade, fazer uma afirmao tipo-lei. A palavra tipo implica um menor sentido de necessidade. Mesmo assim, a afirmao

ao no seria de todo uma lei, a no ser que a relao tivesse sido tantas vezes e to seguramente encontrada no passado, que a expectativa de se manter no futuro, com uma probabilidade comparvel, alta.

Segundo uma definio, teorias so compilaes ou conjuntos de leis caractersticas de um comportamento ou fenmeno particular. Adicionalmente ao rendimento, por exemplo, podem ser estabelecidas associaes entre, por um lado, a educao dos eleitores, a sua religio, e o comprometimento poltico dos seus pais; e a forma como eles votam, por outro. Se as leis probabilsticas assim estabelecidas forem tomadas em conjunto, correlaes mais altas so alcanadas entre as caractersticas dos eleitores (as variveis independentes) e a escolha do partido (a varivel dependente). As teorias so, ento, mais complexas do que as leis, mas apenas quantitativamente. Entre leis e teorias no aparecem diferenas de gnero.

Esta primeira definio de teoria apoia a aspirao desses muitos cientistas sociais que construiriam teoria compilando hipteses interrelacionadas cuidadosamente verificadas. A histria seguinte sugere a forma como a maioria dos cientistas polticos pensa a teoria.

Homero descreve as paredes de Tria como tendo dois metros e meio de espessura. Se o seu relato for verdadeiro, ento milnios depois poderamos encontrar essas paredes cavando com cuidado. Esta ideia ocorreu a Heinrich Schliemann em mido, e quando adulto sujeitou a teoria a teste emprico. Karl Deutsch usa esta histria como um exemplo de como teorias de novo estilo so testadas (1966, pp.168-169). Uma teoria nasce em conjectura e vivel se a conjectura for confirmada. Deutsch v as teorias simples do tipo se/ento como teorias especiais. Ele d ento outros exemplos e ao faz-lo muda de uma questo de sim ou de no para uma questo de quanto. Deveramos tentar descobrir que contribuio variveis diferentes do a um dado resultado (1966, pp.219-221).O que possivelmente til neste padro de pensamento, e o que no ? Todos sabemos que um coeficiente de correlao, mesmo elevado, no garante que uma relao causal exista. Pr o coeficiente ao quadrado, no entanto, permite-nos dizer, tecnicamente, que tomamos em considerao uma certa percentagem da variao. ento fcil acreditar que uma conexo causal real foi identificada e medida, pensar que a relao entre uma varivel dependente e uma independente foi estabelecida, e esquecer que algo foi dito apenas sobre pontos num pedao de papel e a linha de regresso desenhada sobre eles. Ser a correlao espria?

Isto sugere a questo certa sem mesmo se chegar a coloca-la. As correlaes no so nem esprias nem genunas; elas so meros nmeros que se obtm ao executar simples operaes matemticas. Uma correlao no nem falsa nem genuna, mas a relao que inferimos dela pode ser ambas. Suponhamos que algum prope uma lei, por exemplo, estabelecendo cuidadosamente a relao entre a quantidade de impulso aplicado a uma carroa e a quantidade do seu movimento. A relao estabelecida, se as condies se mantiverem constantes e a medio for cuidadosa, simplesmente uma questo de observao, uma lei que se mantm constantemente vlida. A explicao oferecida para essa relao de impulso e movimento, no entanto, radicalmente diferente, dependendo se consultamos Aristteles ou Galileu ou Newton. A aceitao acrtica de um nmero como indicador de que uma conexo prevalece o primeiro perigo de que temos de nos proteger. Faz-lo razoavelmente fcil. O proximo problema mais importante e mais difcil de resolver.Mesmo que estejamos satisfeitos por uma correlao apontar para uma conexo de confiana, ainda no conseguimos apreend-la no sentido de a termos explicado. Apenas a consideramos da forma e apenas da forma como a fsica de Aristteles considerou a relao entre impulso e movimento. De um ponto de vista prtico, o conhecimento da elevada correlao entre impulso e movimento muito til. Esse conhecimento descritivo pode sugerir indcios sobre os princpios do movimento.Pode ser, da mesma forma, enganador, como realmente se revelou. Os nmeros podem descrever o que passa no mundo. Mas por mais que reduzamos a descrio a nmeros, continuamos ainda sem explicar o que descrevemos. A estatstica no mostra como algo trabalha ou mesmo como se ajusta. As estatsticas so simples descries em forma numrica. A forma econmica porque a estatstica descreve um universo atravs da manipulao de amostras deles retirados.

A estatstica til devido variedade de operaes engenhosas que podem ser realizadas, algumas das quais podem ser usadas para verificar o significado de outras. O resultado, contudo, mantm-se uma descrio de alguma parte do mundo e no uma explicao dele. As operaes estatsticas no podem ligar o hiato entre descrio e explicao.

Karl Deutsch aconselha-nos a formular, ou reformular, uma proposio em termos de probabilidade e a dizer quanto do resultado pode ser explicado por um elemento e quanto do resultado pode ser explicado por outros elementos ou autnomo e livre. (1966, p.220).

Se seguirmos este conselho, comportar-nos-emos como os fsicos aristotlicos. Trataremos um problema como se fosse o de tentar dizer at que ponto que o movimento de uma carroa resulta por frices. Continuaremos a pensar em termos sequenciais e correlacionais. Fazendo-o, resultados que so uteis na pratica podem ser alcanados, se bem que os estudiosos de relaes internacionais tenham, infelizmente, dado poucas provas desses esforos, mesmo em termos prticos. E se informaes uteis fossem reveladas, a tarefa mais difcil de percebe o seu significado terico manter-se-ia.