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    4 PDPETRO, Campinas, SP 8.2.0459-2 - 121-24 de Outubro de 2007

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    EVOLUO DA INDSTRIA DO PETRLEO E GS NATURAL LUZ DAORDEM ECONMICA NA CONSTITUIO DE 1988

    Hlio Varela de Albuquerque Jnior (Acadmico do curso de Direito da UFRN; Bolsista do Programa de

    Recursos Humanos em Direito do Petrleo e Gs Natural, PRH-ANP/MCT n 36), Lucas Vale de Arajo(Acadmico do curso de Direito da UFRN; Bolsista do Programa de Recursos Humanos em Direito do Petrleoe Gs Natural, PRH-ANP/MCT n 36), Otaclio dos Santos Silveira Neto (Pesquisador-visitante do Programa deRecursos Humanos em Direito do Petrleo e Gs Natural, PRH-ANP/MCT n 36), Yanko Marcius de Alencar

    Xavier (Coordenador do Programa de Recursos Humanos em Direito do Petrleo e Gs Natural, PRH-ANP/MCT n 36)

    Rua Ataulfo Alves, 1877, Apto. 102, Candelria. Natal/RN, [email protected] Alameda das Margaridas, 1275, Apto. 9, Tirol. CEP: 59020-580. Natal/RN, [email protected]

    Atento ao progresso poltico-econmico e visando a adaptar-se s exigncias do modelo capitalista ora adotado,o Estado assume uma nova funo, qual seja, a de agente normativo e regulador da atividade econmica,calcando-se na busca por uma harmonia entre o progresso financeiro da nao e a proteo ao indivduo,

    suavizando, dessa forma, os impactos scio-econmicos oriundos das caractersticas inerentes a tal modelo.Neste diapaso, ostenta o Estado um papel imprescindvel pelo qual, analisando o contexto hodierno do pas,indicar sua poltica econmica e social, atuando, assim, ora negativamente, coadunando-se com os anseios doEstado liberal, ora de forma positiva, regulatria, aproximando-se do modelo social intervencionista. nestecontexto, de um Estado que integra dispositivos que definem um modelo econmico de bem-estar, com outros decunho neoliberal, que se inserem as modificaes ocorridas na Indstria do Petrleo e Gs Natural, sobretudocom o advento das reformas realizadas ordem econmica da Constituio Federal de 1988, muitasinfluenciadas, direta ou indiretamente, pelo Programa Nacional de Desestatizao. Nesse sentido, o objetivo dopresente trabalho consiste, em suma, em analisar, a partir de um enfoque constitucional, o atual cenrio dareferida indstria no Brasil, trazendo baila, para tanto, a evoluo de tal setor ao longo das cartas magnaspassadas, bem como as modificaes propiciadas pela Emenda Constitucional n 9/95, responsvel pelaflexibilizao do monoplio estatal sob a atividade petrolfera no pas. Destacaremos, ainda, os principais pontosda Lei do Petrleo, assim como a importncia da Agncia Nacional do Petrleo (ANP), instituda pelo referido

    diploma.Ordem econmica, Indstria do Petrleo, Emenda Constitucional n 9/95.

    1. INTRODUO

    O desenvolvimento econmico de um pas est intimamente ligado habilidade do Estado em adaptar suaspolticas pblicas s constantes variaes sofridas pela nao em sua conjectura scio-econmica. A partir desseraciocnio, observa-se que o modo pelo qual o Poder Pblico atua junto economia tem sido, ao longo dostempos, alterado em grau e intensidade, operando esse, assim, ora de maneira negativa, se abstendo, ora seportando positivamente, intervindo de forma marcante nas relaes econmicas. Assim, por meio dessaimprescindvel busca adaptativa, tem o Estado, no tocante a sua interao com o domnio econmico, assumido

    diferentes facetas que, como nos mostra a Histria, se alternam ciclicamente. Nesse sentido, a conhecidaevoluo mercantilismo liberalismo keynesianismo neoliberalismo corresponde constante necessidadeestatal de se amoldar ao contexto no s interno, mas tambm supranacional ao qual o pas est envolvido.

    Mencionar as diferentes feies que assume o Estado na conjuntura evolutiva de uma nao de fundamentalrelevncia. Partindo do entendimento da referente aluso, constataremos, ao longo da abordagem proposta acercada evoluo constitucional da Ordem Econmica nas constituies brasileiras a seguir, o papel atuador doEstado, facilitando, desta feita, a vislumbrarmos as repercusses ocorridas indstria do petrleo e gs natural.Preocupar-se- este estudo, por conseguinte, em examinar o contexto contemporneo do cenrio petrolferonacional, fazendo-se necessrio, para tanto, uma abordagem acerca do desenvolvimento do ambiente poltico-econmico do pas, dando nfase Emenda Constitucional (EC) n 9/95, tratando no s dos aspectos quelevaram sua concretizao, mas tambm, buscando identificar os efeitos que esta acarretou a Indstriapetrolfera.

    Destacaremos, por fim, os aspectos gerais da Lei n 9.478/97, a intitulada Lei do Petrleo, importante marco

    regulatrio garantidor das implicaes trazidas pela citada emenda, procurando demonstrar, sobretudo, qual aimportncia da Agncia Nacional do Petrleo (ANP), rgo nascido com a promulgao da referida lei.

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    2. EVOLUO CONSTITUCIONAL DA ORDEM ECONMICA E SEUS REFLEXOS NAINDSTRIA DE PETRLEO E GS NATURAL NO BRASIL

    2.1 A Constituio de 1824

    Mesmo norteada pelas inspiraes liberais e baseada na reduzida autonomia do Estado para imiscuir-se na

    atividade econmica, tal Carta imperial valia-se de conceitos abertos como o de segurana e sade dos cidados,bem como costumes pblicos, para delimitar a atividade privada, tendo como destaque entre seus dispositivos, oart. 179.1

    Entre os incisos dispostos neste artigo, merece ateno o inciso XXII relacionado ao regime de propriedadeadotado, o qual afirma: garantido o Direito de Propriedade em toda a sua plenitude. Se o bem pblicolegalmente verificado exigir o uso e emprego da propriedade do cidado, ser ele previamente indenizado dovalor dela. A lei marcar os casos em que ter lugar esta nica exceo, e dar as regras para se determinar aindenizao.

    Analisando tal inciso, constata-se que o carter pleno adotado est amparado pela influncia do liberalismoda poca, o qual tem garantido como um de seus fundamentos bsicos, o direito de propriedade. Nesteraciocnio, a plenitude consagrada baseia-se na idia de que prefervel o prejuzo trazido por algumaimprudncia do proprietrio do que a transgresso do seu livre domnio.2

    Apesar da preocupao constitucional quanto propriedade do subsolo (minas) s vir a ocorrer mais

    enfaticamente a partir da Constituio de 1891, influenciada pelo Cdigo de Minas de Napoleo de 1810, a Cartamaior em comento adotou o chamado sistema dominial (regaliano) de explorao das jazidas, no qual aexplorao do subsolo era realizada mediante outorga da Coroa Portuguesa atravs de concesso ao interessado.

    Neste diapaso, faz-se mister ressaltar o surgimento, poca do Governo do Segundo Reinado, dos primeirosapontamentos acerca da explorao de petrleo no pas, quando, por volta de 1864, iniciou-se, sobretudo naBahia, os estudos iniciais relacionados possibilidade de haver petrleo no territrio nacional.

    O Decreto n 3.352-A de 1864, apontado como o pioneiro dessa linha, tratou de conceder a Thomas DennySargent permisso para extrao de petrleo, bem como outros minerais, nas comarcas de Ihus e Camamu(BA)3. Primeiro de muitos, acarretou o mesmo em diversas reclamaes formais ao imperador por parte dosproprietrios locais, os quais reivindicavam pela excluso de suas terras da concesso, sendo mantido, porm, oprivilgio concedido exatamente pelo sistema dominial adotado.

    Todo este panorama acima alinhavado inverte-se com a promulgao da Constituio republicana de 1891,sendo modificadas radicalmente as condies legais da atividade mineral, como veremos a seguir.

    2.2 A Constituio de 1891

    Merece destaque na Constituio Republicana a preocupao mais aprimorada do direito de propriedade,principalmente no que tange a propriedade intelectual e a do subsolo, notando-se, em relao a essa ltima, umrompimento com o sistema dominial ora adotado no Imprio, sendo institudo o chamado sistema fundirio oudireito de acesso. Tal sistema atribua, a ttulo de propriedade acessria, a propriedade do subsolo e de suasriquezas ao proprietrio, pertencendo as minas aos proprietrios do solo, salvas as limitaes que foremestabelecidas em lei a bem da explorao deste ramo de indstria, conforme estabelecido no art. 72, 17.

    Desta forma, se manteve a plenitude da garantia da propriedade, mudando-se, quanto carta imperial de1824, apenas, o sistema de explorao do subsolo. Este novo cenrio torna-se marcado, portanto, pela gradualreduo da extenso de terras pblicas sob jurisdio da Unio exatamente, pela nova idia adotada em que apropriedade do solo inclui a do subsolo.4

    Perdurando por 43 anos, a Carta Republicana acompanhou a evoluo do pensamento poltico no decorrer dofinal do sculo XIX e conseqentemente, seus desdobramentos no panorama do direito constitucional. Nesteraciocnio, podemos afirmar que mesmo configurando-se em uma constituio de cunho nitidamente liberal, seaveriguou ao passar dos tempos, as primeiras linhas de um Estado com papel interventor.

    2.3 A Constituio de 1934

    Primeira das Leis Magnas do Brasil a instituir expressamente uma ordem econmica, de maneira apartada,em seu Ttulo IV, arts. 115 a 143, a Constituio de 1934, de cunho altamente intervencionista comparada scartas anteriores, apesar de breve vigncia, encampou o esprito da poca em que eram dados os primeiros passosno sentido de ampliar o Estado para dele fazer novo instrumento de promoo social.

    1 TOLEDO,Gasto Alves de.O Direito Constitucional Econmico e sua Eficcia

    . Rio de Janeiro: Renovar, 2004. p. 124.2 BUENO, Pimenta, apudTAVARES, Andr Ramos. DireitoConstitucional Econmico. So Paulo: Mtodo, 2006. p. 104.3 MINADEO, Roberto. Petrleo: A maior indstria do mundo? Rio de Janeiro: Thex, 2002. p. 77.4 MINADEO, Roberto. op. Cit. p. 79.

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    Neste nterim, trouxe como carro chefe desta nova viso de ingerncia, o disposto no seu artigo inicial (art.115), o qual afirmava que a ordem econmica instituda deveria teria por base os princpios da justia e asnecessidades da vida nacional possibilitando a todos uma existncia digna.

    Merece destaque, como artefato para o desenvolvimento do amplo espao interveno do Estado naEconomia, o art. 116, o qual afirmava que por motivo de interesse publico e autorizada em lei especial, poderia aUnio monopolizar determinada indstria ou atividade econmica, asseguradas as indenizaes devidas, ficando

    ressalvados os servios municipalizados ou de competncia dos poderes locais. Tal disposio nasceu, portanto,da preocupao do Estado com os rumos da economia do nosso pas, principalmente devido ao contexto de criseeconmica instaurado poca, decorrente do crash na Bolsa de Nova Iorque5.

    luz da Indstria Petrolfera, tal Carta rompeu com o sistema fundirio abraado pela Lex Legum de 1891,adotando o sistema da concesso, ficando previsto em seu art. 118 que as minas e demais riquezas do subsoloconstituam propriedade distinta da do solo para efeito de explorao ou aproveitamento industrial, dependendotal aproveitamento, de autorizao ou concesso federal, na forma da lei. Observa-se que atravs do disposto no1 do art. 119, estas autorizaes ou concesses seriam conferidas exclusivamente a brasileiros ou a empresasorganizadas no Brasil, cabendo ao proprietrio a preferncia na explorao ou co-participao nos lucros.

    Cumpre mencionar, por fim, a elaborao do primeiro Cdigo de Minas, por meio do Decreto n 24.642, e acriao da Companhia Petrleo Nacional S.A por dson de Carvalho e Monteiro Lobato , o que impulsionou oincio das perfuraes em Lobato, arrabalde de Salvador, na Bahia 6.

    2.4 A Constituio de 1937

    Conhecida como Constituio Polaca, foi marcada por um perodo frtil de decretos-leis, os quais eram asfontes efetivas das normas econmicas que vigoravam a poca da ditadura ento estabelecida. Neste contexto,nota-se uma ampla abertura para a interveno estatal, revelando-se, dessa forma, anseios extremamentenacionalistas, elevados ao patamar dos interesses do Estado.

    Quanto seara petrolfera, a Norma Fundamental de 1937 manteve o sistema para a explorao dos recursosdo subsolo adotado pela constituio anterior, realizando algumas alteraes ao texto de 1934, entretanto, ao nomais fazer referncia concesso, mas to somente autorizao para a explorao das minas pelos particulares.No mesmo sentido, vedou por completo, a participao de estrangeiros nesta atividade, coadunando-se com avertente nacionalista ora implantada, a qual teve suas bases reforadas com o incremento de novas polticasprotecionistas atravs da promulgao de um novo Cdigo de Minas, promulgado pelo Decreto-Lei n 1985, em1940.

    Cumpre destacar por fim, o surgimento da primeira regulamentao da Indstria do petrleo, o Decreto-Lein 395 de 29 de Abril de 1938, o qual, atravs do seu art. 4, veio a criar o Conselho Nacional do Petrleo (CNP),organismo autnomo subordinado diretamente ao Presidente da Repblica, que representou a primeira iniciativaconsistente do Estado Brasileiro de regulao do setor petrolfero. Tal decreto, ainda, nacionalizou, por meio doart. 3, a indstria da refinao, por entender ser esse um setor da maior relevncia para a segurana e odesenvolvimento nacional, bem como declarou de utilidade pblica as atividades da indstria petrolfera, seconfigurando como o primeiro ato normativo a disciplinar todas as etapas desta indstria existentes poca noBrasil7.

    2.5 A Constituio de 1946

    Fruto da redemocratizao do pas, tal Constituio se mostrou, em relao Ordem Econmica e Social,mais equilibrada que a de 1934, especialmente no que se refere ao acentuado nacionalismo nesta exposto. Ao

    restabelecer uma economia capitalista de mercado o que nem por isso afastou hipteses intervencionistas ,trouxe uma ordem econmica calcada nos princpios da justia social, conciliados com a liberdade de iniciativa ea valorizao do trabalho, conforme seu art. 145.

    A abertura poltica trazida em 1945 e a Carta de 1946 ensejaram um ambiente poltico que, se por um ladotinha como alvo o acelerado desenvolvimento econmico, por outro este no seria alcanado a no ser pelaatuao direta do Estado como seu propulsor. Neste sentido, fundado no art. 146, o qual autorizava apossibilidade da Unio de monopolizar determinada indstria ou atividade tendo por base o interesse coletivo,promoveu o Poder Pblico, a passos largos, a atuao estatal no campo econmico, o que se deu principalmente,atravs da proliferao de empresas publicas e sociedades de economia mista, cujo espectro multifacetado sefaria presente no cenrio nacional a partir das dcadas de 60 e 708.

    5 TAVARES, Andr Ramos.Direito Constitucional Econmico.

    So Paulo: Mtodo, 2006. p. 109.6 MINADEO, Roberto. Petrleo: A maior indstria do mundo? Rio de Janeiro: Thex, 2002. p.82.7 MENEZELLO, Maria DAssuno Costa. Comentrios Lei do Petrleo: lei federal n. 9.478, de 6-8-1997. So Paulo: Atlas, 2000. p.32.8 TOLEDO, Gasto Alves de. O Direito Constitucional Econmico e sua Eficcia. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. p. 149

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    Sobre o prisma da Indstria Petrolfera, cumpre notar a permanncia na Carta em estudo do regimeinstaurado em 1934 para os recursos minerais e do subsolo, sendo reprisado a redao constante mesma, jtratada alhures, extinguindo-se, porm, a participao do proprietrio nos lucros, restando conservado apenas odireito de preferncia deste em explorar atravs de concesso.

    Fato importante da interveno direta do Estado na economia, sob a forma monopolstica j prevista na Cartade 1934, foi a criao, em 1953, da Petrleo Brasileiro S.A - Petrobrs, que teve como supedneo jurdico o j

    mencionado art. 146 da Norma Fundamental em comento. Criada a partir da Lei Federal n 2004/53, a qual veioa instituir o monoplio da Unio Federal sobre todas as atividades correlatas indstria do petrleo, a Petrobrspassou a ter a atribuio de executar de forma exclusiva todas essas atividades obtendo, por conseqncia, o totaldomnio do mercado.

    2.6 A Constituio de 1967 e a Emenda Constitucional n 1/69

    Cuidou tal Constituio de tratar a Ordem econmica e Social em seu Ttulo III, merecendo destaque osprincpios da liberdade de iniciativa e da funo social da propriedade, contemplados no art. 160.

    O Principal dispositivo desta Carta o art. 163, o qual trata da interveno no domnio econmico, alm deprever a hiptese de monoplio de determinada atividade ou indstria, estabelecendo os limites que o Estadodeveria observar quando exercesse seu poder de interveno. Delimitou-se tal exerccio assim, atravs de doisparmetros: quando indispensvel por motivo de segurana nacional; ou para organizar setor que no possa ser

    desenvolvido com eficcia no regime de competio e de liberdade de iniciativa, havendo, assim, uma intensamargem de discricionariedade na mensurao destes obscuros parmetros9.Trazendo o enfoque para a atividade do petrleo, o monoplio desta veio a se tornar matria constitucional

    com a promulgao da Carta em apreo, que, em seu art. 162, estabeleceu que "a pesquisa e a lavra de petrleoem territrio nacional constituem monoplio da Unio, nos termos da lei"; vindo posteriormente a CartaOutorgada de 1969 a manter a mesma disposio em seu art. 169.

    Mesmo com a consagrao do monoplio, este no foi suficiente para diminuir o impacto ocasionado pelaCrise do petrleo no incio dos anos setenta quando ocorreu um vultoso aumento do preo do leo no mercadomundial. Para piorar a situao, tal fato infeliz coincide com o crescimento do consumo de petrleo no Brasil ecom o declnio da produo domstica agravada pela insuficincia das reservas nacionais uma vez que at ento,a poltica petrolfera no pas privilegiava as atividades downstream (revenda e distribuio), colocando aexplorao em segundo plano.

    A vulnerabilidade brasileira decorrente da falta de investimentos no setor de explorao e produo

    (upstream) levou a idia de se realizar "contratos de risco", que seriam acordos nos quais uma empresa privada,nacional ou at internacional, prestavam servios tcnicos operacionais e financeiros, sendo remuneradas pelosservios realizados atravs das condies preestabelecidas, sendo preservado a propriedade da Petrobrs sobre opetrleo descoberto. Possuam tais ajustes natureza jurdica de contratos de prestao de servios, estabelecidosentre a Petrobrs e empresas privadas detentoras de tecnologia e responsveis pelos estudos e trabalhosexploratrios10. Configurando-se uma tentativa do regime militar em atrair investimentos estrangeiros para osetor de petrleo e gs natural, significou a assinatura destes contratos o primeiro indcio das mudanas queviriam a ocorrer com o monoplio, a partir da EC n 9/95. A grosso modo, nestes instrumentos, o concessionrioassumia todos os riscos do empreendimento, sendo reembolsado, sem juros, das despesas da explorao e dodesenvolvimento dos campos pesquisados tendo, ainda, o direito de adquirir uma certa parte do petrleo ou dogs encontrado at o mximo equivalente ao valor de sua remunerao.

    Por fim, lembramos uma importantssima estratgia frente a esta vulnerabilidade na qual se encontrava ocenrio nacional com a crise de 73, que foi a implementao do Programa Nacional de lcool, conhecido como

    Prolcool. Institudo pelo Decreto Federal n 76.593, de 14 de Novembro de 1975, tinha por escopo precpuoincentivar a oferta do lcool no mercado, propondo uma modernizao das destilarias deste combustvel 11. Talprojeto, mesmo enfrentando diversos problemas de distribuio do produto poca de sua afirmao, comporta-se nos dias atuais, mais do que nunca, como de suma importncia para o desenvolvimento tecnolgico nacional,exercendo o lcool combustvel um importante papel na estratgia energtica para um desenvolvimentosustentado. A utilizao em larga escala da tecnologia dos motores flex fuel nos automveis nos do umadimenso do presente sucesso dessa investida.

    3. A INDSTRIA DO PETRLEO E GS NATURAL INSERIDA NA CONSTITUIO FEDERAL DE1988

    9 TOLEDO, Gasto Alves de. op. Cit.p. 154.

    10 MENEZELLO, Maria DAssuno Costa. Comentrios Lei do Petrleo: lei federal n. 9.478, de 6-8-1997 . So Paulo: Atlas, 2000. p.36.11 Ibid., p.37.

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    Uma vez tratada ao longo das Constituies Federais anteriores, optamos por analisar em tpico separado aindstria do petrleo e gs natural luz da ordem econmica de nossa atualLex Legum, haja vista o indiscutvelavano presenciado por tal setor em razo de alteraes feitas a referida Carta Magna.

    Elaborada sob o contexto histrico da redemocratizao do pas, a Constituio do Brasil de 1988 define ummodelo econmico capitalista, evidenciado atravs de uma srie de dispositivos, dentre os quais destacamos oart. 170 12. Esse sistema, porm, vem associado a uma poltica de bem-estar, que, embora consagre uma

    economia de mercado, de natureza capitalista, d prioridade aos valores do trabalho humano sobre todos osoutros 13, objetivando tal primazia orientar a interveno estatal na economia, no sentido de fazer com quem osprincpios sociais prevaleam sobre os demais. Esse novo modelo de Estado intervencionista se situaria,portanto, entre dois extremos, o liberalismo oitocentista, avesso a qualquer forma de interveno, e o dirigismoestatal. 14

    No tocante regulamentao das atividades relacionadas indstria do petrleo no pas, a Constituio de1988 sustentou a concepo estratgica do referido mineral, mantendo, assim, em seu texto original, basicamenteo mesmo modelo monopolista implementado pela Lei 2.004/53, posteriormente constitucionalizado pela CartaMagna de 1967, como j visto. Na verdade, o constituinte de 1988 foi ainda mais incisivo ao manter tal modelo,tendo transcrito, detalhadamente, no seu art. 177 as atividades prprias da indstria petrolfera, quais sejam,pesquisa (explorao), lavra (produo), refino, importao, exportao e transporte de petrleo e seusderivados, mais o gs natural 15. Nota-se, portanto, a discrepncia em termos de pormenores entre tal dispositivoe seu correspondente na Constituio anterior art. 169, que determinava, ipsis verbis:A pesquisa e a lavra de

    petrleo em territrio nacional constituem monoplio da Unio, nos termos da lei.A redao original do art. 177 da atual Constituio, atravs de seu pargrafo primeiro, ainda, proibia a

    Unio de celebrar os famigerados contratos de riscos, j mencionados nesse artigo.No entanto, o monoplio da Petrobrs sobre as atividades previstas nos incisos I ao IV 16 do supramencionado

    artigo, modelo introduzido constitucionalmente, como vimos, pela Lex Legum de 1967 e mantido pelassubseqentes, passa a ser objeto de contenda em razo das influncias neoliberais sofridas pelo Brasil e demaispases da Amrica Latina a partir dos anos 90, dando-se incio, portanto, a uma fase centrada principalmente nalegalizao e na regulao dos agentes econmicos.

    Em relao ao sistema de propriedade adotado, por fim, a Carta-cidad de 1988, atravs de seu art. 176,manteve o regime dominial, no qual a propriedade do solo distinta da do subsolo, permitindo, assim, a Unio,proprietria do ltimo, realizar contratos de concesso com empresas pblicas e privadas, nos moldes dopargrafo primeiro do referido artigo.

    3.1 Da poltica neoliberal e do Plano Nacional de Desestatizao: suas influncias ao processo deflexibilizao do monoplio estatal sob a indstria do petrleo e gs natural

    A partir da grande recesso econmica vivenciada pelos pases centrais adeptos ao modelo capitalista debem-estar, em meados da dcada de 70, ganham fora na Europa e nos Estados Unidos da Amrica osmovimentos ditos neoliberais. Centrados basicamente na crtica ao modelo keynesiano, os tericos dessa novacorrente poltico-econmica atribuam prtica do excessivo intervencionismo estatal a estagflao quecastigava com altos ndices de inflao as naes desenvolvidas e, em outro momento, as subdesenvolvidas, queadotaram tal modelo.

    Segundo eles, assim, os pssimos ndices econmicos alcanados eram resultado do poder demasiado fortedos sindicatos e da grande participao do Estado na economia, que impediam o crescimento do capital.Propunha os neoliberais, portanto, como medida para conter a grande recesso dos anos 70, (i) o fim daparticipao estatal na economia, (ii) diminuio do poder dos sindicatos, (iii) elevao das taxas de juros, (iv)

    privatizaes e (v) cortes nos gastos de bem estar social17

    .

    12 Art. 170. A ordem econmica, fundada na valorizao do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existnciadigna, conforme os ditames da justia social, observados os seguintes princpios: I soberania nacional; II propriedade privada; III funo social da propriedade; IV livre concorrncia; V defesa do consumidor; VI defesa do meio ambiente, inclusive mediantetratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e servios e de seus processos de elaborao e prestao; VII reduodas desigualdade sociais; VIII busca do pleno emprego; [...].13 SILVA, Jos Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 20. ed. rev. e atual. So Paulo: Malheiros, 2002. p. 764.14 REALE, Miguel apudGRAU, Eros Roberto. A ordem econmica na Constituio de 1988.8. ed. So Paulo: Malheiros, 2003. p. 161.15 MENEZELLO, Maria DAssuno Costa. op. Cit. p. 44.16 Art. 177: Constituem monoplio da Unio: I a pesquisa e a lavra das jazidas de petrleo e gs natural e outros hidrocarbonetos fluidos; II a refinao do petrleo nacional ou estrangeiro; III a importao e exportao dos produtos e derivados bsicos resultantes das atividadesprevistas nos incisos anteriores; IV o transporte martimo do petrleo bruto de origem nacional ou de derivados bsicos de petrleoproduzido no Pas, bem assim o transporte, por meio de conduto, de petrleo bruto, seus derivados e gs natural de qualquer origem; [...].17 FONSECA, Venilson Luciano B.

    Neoliberalismo e privatizaes: Os impactos scio espaciais da privatizao da Aominas nomunicpio de Ouro Branco, a partir da percepo de informantes chaves. 2001. Monografia de fim de curso (Bacharelado emGeografia). Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2001. Disponvel em: < http://br.geocities.com/madsonpardo/index.html>. Acesso em: 22 abr. 2007.

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    No Brasil, os ideais neoliberais desembarcam ao final da dcada de 80, fruto da crise fiscal do Estadovivenciada na chamada dcada perdida. Com o esgotamento do modelo de substituio de importaes,responsvel pelo processo de industrializao brasileiro, e a conseqente desacelerao de investimentospblicos e privados de longo prazo, a economia do pas entra em recesso, afetando, assim, no s a qualidadedos servios pblicos educao, segurana, sade etc. como tambm degradando de forma crescente a infra-estrutura econmica, necessria para o avano do projeto de industrializao 18.

    nesse cenrio de descontentamento poltico-econmico, somado s presses advindas de rgos como oBanco Mundial e o Fundo Monetrio Internacional (FMI), que o governo de Jos Sarney, de forma menosexpressiva, e posteriormente o de Fernando Collor de Melo do incio s reformas neoliberais ao Estadobrasileiro.

    Apesar das diferenas existentes entre o Brasil e os pases capitalistas centrais, as medidas tomadas visandoum plano de desenvolvimento neoliberal foram razoavelmente semelhantes, a saber, (i) aumento de taxa de

    juros, (ii) controle de gastos pblicos e das taxas de inflao, (iii) desregulao de mercados e (iv) um amploprograma de privatizaes19, o qual destacamos, haja vista sua direta contribuio mudana de paradigmaeconmico sofrida pelo pas no decorrer desses anos, o que de fato acabou por influenciar as alteraesrealizadas ao modelo de explorao e produo de petrleo no territrio brasileiro.

    No final dos anos 80, a herana deixada ao Brasil pela famigerada dcada perdida a de um pasendividado tanto interna quanto externamente. Com a interrupo de emprstimos pelas instituies bancriasamericanas, por volta de 1981, a uma srie de naes, dentre elas, o Brasil, esse se v diante de um estrondoso

    dficit pblico, tendo em vista os investimentos realizados a partir do planejamento da entrada futura dedinheiro, que, em virtude do mencionado corte, no veio a ocorrer. Os efeitos oriundos dessa dcada, assim,conduzem o pas a operar uma verdadeira reforma em seu planejamento econmico, no sentido de sanar asdvidas pblicas e reestruturar seu parque produtivo.

    Nesse sentido, a partir da eleio de Fernando Collor de Melo presidncia da repblica, em 1989, que oBrasil efetivamente encetou uma estratgia de desenvolvimento voltada tica neoliberal, tendo como um deseus principais instrumentos o Programa Nacional de Desestatizao.

    Atribuda sua gneses ao Programa Federal de Desregulamentao, institudo pelo Decreto 99.179 de 15 deMaro de 1990, o PND viabilizado no mesmo ano pela Lei n 8.031 como sendo a principal ferramenta dapoltica governamental no sentido de reordenar a estratgia econmica brasileira, transferindo iniciativaprivada atividades indevidamente exploradas pelo setor pblico, como expressamente previsto em seu artigoprimeiro, incido I. Partindo do princpio de que a manuteno de um Estado inchado e extremamente burocrticolevou o pas a uma crise fiscal, comprometendo sua capacidade de investimentos 20, os idealizadores do programa

    acreditavam que apenas uma redefinio da posio do Estado no setor econmico poderia fomentar umambiente propcio volta de investimentos internos e externos. Tais recursos financeiros seriam imprescindveis modernizao da infra-estrutura produtiva do pas, como tambm obteno de receita capaz de amortizar asdvidas pblicas.

    Dessa maneira, atravs de uma nova poltica econmica essencialmente direcionada privatizao deempresas estatais viabilizada pelo Programa Nacional de Desestatizao, o Estado brasileiro passa a mudar suaforma de atuao como agente produtor de bens e servios em determinados setores da economia,redirecionando sua posio, como anteriormente ressaltado, de agente normativo e regulador da atividadeeconmica.

    Apesar de no ter previsto nenhuma reforma na seara da indstria petrolfera, continuando tal atividade, ataquele momento, a ser explorada em regime de monoplio pela Petrobrs, a implementao do PND influencioudiretamente o processo de flexibilizao desse privilgio estatal, haja vista a expressiva guinada de paradigmavivenciada pela economia brasileira, sempre no sentido da desestatizao da economia, englobando tanto o

    afastamento do Estado da explorao direta de atividade econmica em sentido estrito, como tambm permitindoa participao da iniciativa privada na prestao de servios pblicos 21.

    18 SILVA, Csar Augusto Silva da. O direito econmico na perspectiva da globalizao: anlise das reformas constitucionais e dalegislao ordinria pertinente. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 133.19 FONSECA, Venilson Luciano B. op. Cit.20 MATOS FILHO e OLIVEIRA apudFONSECA, Venilson Luciano B. Neoliberalismo e privatizaes: Os impactos scio espaciais daprivatizao da Aominas no municpio de Ouro Branco, a partir da percepo de informantes chaves.2001. Monografia de fim decurso (Bacharelado em Geografia). Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2001. Disponvel em: . Acesso em: 22 abr. 2007.21 Na verdade, a Lei original que instituiu o PND previu unicamente o processo de privatizao de empresas estatais, nos levando a crerque o legislador equiparou, equivocadamente, tal conceito com o de estatizao. Perfilhando a doutrina majoritria, verifica-se que oprocesso de desestatizao diz respeito simplesmente retirada da presena estatal das atividades econmicas, deixando a cargo da iniciativaprivada o desenvolvimento de tal setor. Corresponderia, portanto, a um gnero do qual os fenmenos de privatizao e flexibilizao soespcies. A previso, no entanto, da faculdade concedida ao Estado de, mediante um contrato administrativo, ceder a um ente particular odireito de prestar um servio pblico, s inserida no PND em 1997, pela lei que alterou os procedimentos relativos ao programa Lei n.9.491.

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    Portanto, tido como parte de um projeto de modernizao da economia brasileira, o Programa Nacional deDesestatizao promoveu uma mudana do papel do Estado, permitindo a concentrao de seus recursos nasreas sociais prioritrias, e, a partir do investimento privado nas atividades desestatizadas, estimulando acompetio no mercado, vindo a acarretar, consequentemente, numa melhora dos servios e bens oferecidos populao22. Esse cenrio, pois, propiciou, mesmo que indiretamente, uma conjuntura favorvel flexibilizaodo monoplio estatal sob a indstria do petrleo e gs natural, uma vez que o incentivo concorrncia,

    proporcionado pela entrada de novos players nesse setor, permitiria uma maior explorao do imensurvelpotencial petrolfero brasileiro, invivel de ser realizado unicamente com receita pblica.

    3.2 A Emenda Constitucional n. 9/95 e o atual cenrio da indstria do petrleo e gs natural

    Conforme visto em mais de uma oportunidade ao longo de nossa exposio, o legislador constituinte de1988, em seu art. 177, manteve o monoplio estatal sobre quase todas as atividades referentes indstriapetrolfera nacional, salvo o setor de distribuio. No entanto, poca em que a atual Carta foi promulgada,enquanto o mercado interno continuava protecionista, fechado ao capital estrangeiro, grande parte do mercadointernacional de petrleo j se encontrava inserido em um modelo globalizado 23. Tendo em vista o relevantepotencial brasileiro no concernente s reservas de petrleo e gs natural, muitas foram as presses advindas dasgrandes corporaes petrolferas internacionais, no sentido da abertura do aludido setor aos seus investimentos.Assim, a partir da mudana de paradigma econmico sofrida pelo pas aps as eleies presidenciais de 1989,

    consubstanciada, entre outros fatores, na desestatizao e abertura da economia brasileira, so encaminhadospelo Poder Executivo ao Congresso Nacional vrios projetos de Emendas Constitucionais tipicamente liberais,dentre os quais o que daria origem a EC n 9/95.

    No dia 9 de novembro de 1995, assim, foi sancionada a EC que alterou a redao do pargrafo primeiro doart. 177 da CF, permitindo a Unio, dessa forma, contratar com empresas estatais ou privadas a realizao dasatividades de explorao, produo, refino, importao, exportao e transporte de petrleo, derivados e gsnatural. Faz-se imperioso ressaltarmos, entretanto, que a EC n 9/95 no retirou do ente pblico federal omonoplio sobre tais atividades. Houve, na verdade, uma flexibilizao desse privilgio estatal, maisrelacionado, nesse momento, a um monoplio de escolha do Poder Pblico, tendo em vista que apenas esse tem aprerrogativa de decidir, com exclusividade, quem poder exercer tal atividade.24

    A EC em anlise previu, ainda, a elaborao de uma lei ordinria que, de acordo com o pargrafo segundo daemenda em questo, deveria ter como contedo mnimo a garantia do fornecimento dos derivados de petrleo noterritrio nacional, as condies de contratao e a estrutura e atribuies do rgo regulador do monoplio da

    unio, qual seja, a Agncia Nacional do Petrleo (ANP). Assim, por se tratar a emenda de uma normaconstitucional dependente de complementao legislativa, versaremos a respeito da referida lei em tpicoposterior.

    No intuito de identificarmos as expectativas do Estado referentes emenda ora em exame, faz-se necessrio aanlise de um trecho da Exposio de Motivos25 n 39, a qual acompanhou o citado projeto. Observemos: [...]3. Tal flexibilizao permitir a atrao de capitais privados para determinadas atividades em que se requer aexpanso dos investimentos em volume insuscetvel de financiamento exclusivo por parte da Petrobrs. deconhecimento geral que as atividades relacionadas com a indstria do petrleo, principalmente no setor deexplorao e produo (upstream ou E&P), envolvem, alm de grande volume de capital, na casa dos bilhes dedlares, um elevado risco de insucesso exploratrio. Diante de tal cenrio, encontrou-se o Estado impossibilitadode, na ausncia do capital privado, mais notadamente o de origem estrangeira, explorar todo o potencialpetrolfero nacional, rogando-se, portanto, pela abertura do setor entrada de investimentos internacionais.

    Contudo, em virtude dos dois fatores mencionados, a saber, alta demanda de investimentos e elevado grau de

    risco exploratrio, seria invivel para as companhias interessadas nas atividades do setor de E&P desenvolv-lasde maneira individualizada. Tornou-se imprescindvel, assim, a formao de consrcios nos procedimentoslicitatrios de concesso de blocos, chamados dejoint ventures, fazendo com que o total de capital investido porcada empresa fosse compartilhado entre vrios esforos de explorao26. Portanto, alm de possibilitar ao Estadodividir com a iniciativa privada os riscos inerentes ao setor upstream, a flexibilizao do monoplio viabilizouum maior aproveitamento das reservas brasileiras de petrleo e gs natural, haja vista que, nesse novo panorama,os investimentos conjuntos de um grande nmero de empresas passaram a ser distribudos em vrios campos de

    22 SILVA, Csar Augusto Silva da. O direito econmico na perspectiva da globalizao: anlise das reformas constitucionais e dalegislao ordinria pertinente. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 177.23 MENEZELLO, Maria DAssuno Costa. Comentrios Lei do Petrleo: lei federal n. 9.478, de 6-8-1997 . So Paulo: Atlas, 2000. p.45.24 MORAES, Alexandre de. Regime jurdico da concesso para explorao de petrleo e gs natural. 2001 Disponvel em: . Acesso em: 22 abr. 2007.25Dirio do Congresso Nacional (Seo I), 15 mar. 1995, p. 3.247.26 MORAIS, Joaquim Maurcio Fernandes. Incentivo concentrao empresarial na ordem econmica constitucional: o caso do setor deupstream da indstria petrolfera. Revista Jurdica In Verbis, Natal, n. 18, p. 129-155, jan./jun. 2005.

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    explorao e produo. Com efeito, a partir da anlise do grfico exposto (Figura 1), verifica-se a evoluo daproduo de petrleo e gs natural no Brasil aps a abertura, em 1997, do setor entrada de novos players(agentes), tanto estatais quanto privados.

    Figura 1. Produo de Petrleo e Consumo de Derivados (Mil barris/dia).Fonte: Banco Central do Brasil

    Ademais, ao propiciar a entrada da Petrobrs em um regime de livre-concorrncia, a EC n 9/95 obrigou-a atorna-se mais gil, executiva, gerencial e financeira 27, otimizando, dessa maneira, seu j excelente desempenhono setor.

    Por fim, cumpre-nos lembrar que, uma vez que a estatal brasileira possui a mais avanada tecnologia offshore dentre todas as empresas que atuam no ramo em estudo, isto , tendo em vista deter essa o conhecimento ea infra-estrutura necessria explorao e produo de petrleo nas bacias martimas, particularmente em guasprofundas, constata-se que mesmo com a abertura do mercado a Petrobrs continua atuando numa espcie demonoplio de fato. Nesse diapaso, qualquer agente que pretenda produzir petrleo e gs natural em territriobrasileiro acaba tendo que firmar uma parceria com a petroleira nacional.

    4. ASPECTOS GERAIS ACERCA DA LEI N. 9478/97 (LEI DO PETRLEO) E O RELEVANTEPAPEL DA AGNCIA NACIONAL DO PETRLEO (ANP)

    Caracterizada como um pressuposto de vigncia e validade da EC n 9/95, trouxe a Lei 9.478/97 (Lei doPetrleo), a previso de que as atividades econmicas correlatas indstria petrolfera passariam a serdesenvolvidas atravs de um sistema de livre competio, onde a Petrobrs atuaria, no realizar destas atividades,em disputa com outras empresas, isto , inserida nas condies de mercado, almejando, entre outros fins, atrairinvestimentos na produo de energia e expandindo a competitividade do pas no mercado internacional.28

    Tal legislao, responsvel, ainda, pela revogao expressa da Lei n 2004/53 regulou em seu prprio texto,o regime jurdico da contratao com novos agentes daquelas atividades do setor petrolfero anteriormenteexploradas com exclusividade pelo Estado.

    Dispondo, mormente, sobre a poltica energtica nacional e as atividades relativas ao monoplio do petrleoe sua flexibilizao, instituiu a lei em comento o Conselho Nacional de Poltica Energtica e a ANP,estruturando, deste modo, um novo ramo no sistema jurdico nacional, calcado num conjunto de temas equestes do campo minerrio de acentuada especificidade econmica, o qual pode ser denominado de Direito

    Petrolfero.29

    No que tange Poltica Energtica Nacional, esta, segundo o art. 1 da lei em apreo, deve se orientar pelosprincpios e objetivos que estruturam o sistema jurdico para o adequado aproveitamento racional das fontes deenergia, com destaque para: a preservao do interesse nacional; a promoo do desenvolvimento, a ampliaodo mercado de trabalho e a valorizao dos recursos energticos; a proteo dos interesses do consumidor quantoa preo, qualidade e oferta dos produtos bem como do meio ambiente; a utilizao de fontes alternativas deenergia, mediante o aproveitamento econmico dos insumos disponveis e das tecnologias aplicveis; apromoo da livre concorrncia entre outros.

    Partindo da determinao da prpria EC 9/95, foi instituda pela lei em tela a Agncia Nacional do Petrleo,a qual, assim como outras agncias reguladoras, tem por fundamento de validade o efetivo exerccio do poder de

    27 SILVA, Csar Augusto Silva da. O direito econmico na perspectiva da globalizao: anlise das reformas constitucionais e da

    legislao ordinria pertinente.Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 155.

    28 Lei 9.478/97, artigo 1, incisos X e XI, e 61 pargrafo 1.29 MENEZELLO, Maria DAssuno Costa. Comentrios Lei do Petrleo: lei federal n. 9.478, de 6-8-1997 . So Paulo: Atlas, 2000. p.51.

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    polcia, visando a assegurar a predominncia do interesse pblico e o atendimento das necessidades dos usuriosdos servios. Apresenta como caractersticas bsicas, assim, natureza jurdica de autarquia federal de regimeespecial, conseqente independncia administrativa, ausncia de subordinao hierrquica, estabilidade de seusdirigentes e autonomia financeira.

    Tal Agncia veio a suprir as competncias do Departamento Nacional do Petrleo, o qual havia substitudo oConselho Nacional do Petrleo, ficando com a responsabilidade de fiscalizar e regulamentar as atividades

    relativas a Indstria do Petrleo e do Gs natural, desempenhando, neste diapaso, papel de vital importncia demodo a supervisionar as operaes da especfica atividade, treinando mo-de-obra especializada, estimulando eregulamentando o setor, de forma transparente e menos burocrtica30.

    Atribui a lei, apenas ANP, as funes regulatrias e fiscalizatrias e a promoo de certames licitatriospara outorga dos contratos de concesso, funcionando a autarquia como um vetor de desenvolvimentoeconmico ao passo que almeja, no realizar de suas funes, compatibilizar o desenvolvimento da indstriainterna do petrleo e gs natural s mudanas em curso na economia do pas.

    Dentro o rol dos incisos do art. 8 da lei do petrleo, o qual dita as atribuies especficas da Agncia,merecem destaque: a organizao e manuteno do acervo de informaes e dados tcnicos relativos satividades da indstria do petrleo; e o estimulo a pesquisa e adoo de novas tecnologias na explorao,produo, transporte, refino e processamento31.

    Depreende-se da simples observao da lista de competncias da Agncia, portanto, o grau deresponsabilidade conferido a essa nova autarquia, servindo a mesma de mecanismo propulsor de novas opes

    aos agentes econmicos, uma vez que o monoplio anteriormente institudo acabava por impedir, devido a suaprpria natureza, a difuso dos conhecimentos tcnicos e jurdicos pertinentes s atividades desenvolvidas pelaindstria petrolfera.

    5. CONSIDERAES FINAIS

    Ao longo da evoluo poltico-econmica brasileira, o modelo pelo qual as atividades relacionadas ao setorpetrolfero so exploradas foi palco de inmeras transformaes. Desde o momento em que o leo negro foiinicialmente encontrado em solo brasileiro, at o presente contexto na qual est inserida, a indstria do petrleonacional tem se desenvolvido sempre no sentido de se amoldar s aspiraes econmicas de cada poca.

    No decorrer de nossa explanao, buscamos demonstrar as principais fases presenciadas pela indstriapetrolfera, bem como explicitar de que maneira se dava sua relao com a Carta Constitucional a qual estavasubmetida. Dessa forma, notamos que, tendo em vista se tratar de uma atividade essencialmente estratgica ao

    Estado, de extrema relevncia, assim, soberania do pas, o referido setor foi explorado durante quase meiosculo em regime de monoplio pelo Poder Pblico, atravs da estatal Petrobrs.Entretanto, devido s influncias neoliberais que alastraram a Amrica Latina no final da dcada de oitenta, o

    Estado brasileiro direcionou-se no sentido de desenvolver inmeras mudanas ao cenrio econmico nacional, agrande maioria em harmonia com aquilo pregado pelo capital internacional. Assim, meio a essa tendncialiberal, que, como visto, tem retornado ciclicamente pauta do planejamento econmico estatal, aprovou oCongresso Nacional a Emenda Constitucional n 9/95, flexibilizando o aludido monoplio e prevendo aelaborao de uma lei que regulamentasse o setor em xeque. A partir de ento, assumiu a indstria do petrleo egs natural tupiniquim uma faceta indita, marcada primordialmente pela participao de agentes privados nacionais e internacionais naquelas atividades at o momento exploradas exclusivamente pelo Estado.

    Essa nova conjuntura, marcada pela formao das chamadas joint ventures, acarretou como visto, em umaotimizao da explorao e produo do leo e gs natural no pas, ao passo que viabilizou um maioraproveitamento do potencial petrolfero nacional, bem como estimulou o progresso da Petrobrs, que, a partir de

    ento, inserida em um regime de livre-concorrncia, teve que investir cada vez mais em pesquisa, tecnologia,recursos humanos etc.

    Neste raciocnio, o prosseguimento do sucesso contrado por esta nova estrutura se encontra vinculadoessencialmente legislao que a disciplina e, conseqentemente, capacidade organizativa do rgoresponsvel pela regulao do setor em estudo, assumindo, desta feita, a Lei do Petrleo e a ANP,respectivamente, papis de imensurvel relevncia para o sucesso da nova fase vivenciada pelo setor petrolferobrasileiro.

    6. REFERNCIAS

    30 SILVA, Csar Augusto Silva da. O direito econmico na perspectiva da globalizao: anlise das reformas constitucionais e da

    legislao ordinria pertinente.Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 158.

    31 MENEZELLO, Maria DAssuno Costa. Comentrios Lei do Petrleo: lei federal n. 9.478, de 6-8-1997 . So Paulo: Atlas, 2000. p.88.

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    BANCO CENTRAL DO BRASIL. Impacto do Preo do Petrleo sobre as Contas Externas. 2004.Disponvel em: http://www4.bcb.gov.br/pec/GCI/PORT/focus/X20040621-Impacto%20do%20Pre%C3%A7o%20do%20Petr%C3%B3leo%20sobre%20as%20Contas%20Externas.pdfAcesso em: 30 de Maio.

    BRASIL.Lei n. 9478, de 06 de agosto de 1997.Dispe sobre a poltica energtica nacional, as atividadesrelativas ao monoplio do petrleo, institui o Conselho Nacional de Poltica Energtica e a Agncia Nacional

    do Petrleo e d outras providncias.Lex: publicada no Dirio Oficial da Unia, seo I, p. 16925.BRASIL. Constituio (1988). Constituio da Repblica Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubrode 1988. Organizao do texto: Antonio De Paulo. 17. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2004.

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    2004.

    THE OIL AND NATURAL GAS INDUSTRY EVOLUTION UNDER THE VIEW OFCONSTITUTION OF 1988S ECONOMIC ORDER

    Paying attention to the political-economic progress and aiming to get adapted to the requirements of thecapitalist model adopted, the State Government takes a new function, as a normative and regulative agent of theeconomy, focusing on the search for an harmony between the financial progress of the nation and the protectionof the individual, therefore, minimizing the social-economic impacts brought up from the features related to suchmodel. In this circumstance, the State Government plays an essential role by which, analyzing the actual contextof the country, will indicate its social and economic politics, acting negatively, suiting with the desire of theliberal State, and also positively, in a regulatory way, being similar to the social interventionist model. Its insuch context, of a State that integrates points that define an economic model of well being, with others of neo-liberal parameter, that is inserted modifications occurred in the Petroleum and Natural Gas industry, specially,

    with the advent of reforms made to the economic order of the Federal Constitution of 1988, many of theminfluenced, direct or indirectly, by the Programa Nacional de Desestatizao (PND). Through this path, theobjective of this project consists of analyzing, with a constitutional view, the current scenario of the above-mentioned industry in Brazil, referring, for this matter, to the evolution of such sector trough the precedentbrazilian Constitutions, as well as the modifications provided by the Constitutional Amendment number 9/95,responsible for the flexibility of the State monopoly under an oil activity in the country. Its also highlighted themain point of the Oil Law, as well as the importance of theAgncia Nacional do Petrleo (ANP), created by thereported rule.

    Economic Order, Oil Industry, Constitutional Amendment n 9/95.

    Os autores so os nicos responsveis pelo contedo deste artigo.