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Evolução e Paleontologia

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Gabriel Marcos Domingues de SouzaMaurilio Cristiano Batista Bergamo

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Souza, Gabriel Marcos Domingues de

ISBN 978-85-8482-318-5

1. Paleontologia. 2. Evolução (Biologia). 3. Genética depopulações. I. Bergamo, Maurilio Cristiano Batista. II. Título.

CDD 560

de Souza, Maurilio Cristiano Batista Bergamo. – Londrina :Editora e Distribuidora Educacional S.A., 2016. 192 p.

S719e Evolução e paleontologia / Gabriel Marcos Domingues

© 2016 por Editora e Distribuidora Educacional S.A

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Sumário

Unidade 1 | Biologia Evolutiva

Seção 1 - Evolução Biológica1.1.1 | Como Funciona a Ciência?1.1.2 | Como Explicar a Herdabilidade1.1.3 | Lei e Teoria Científica1.1.4 | A Teoria Evolutiva Moderna

Seção 2 - Teorias Evolutivas1.2.1 | As Antigas Escolas Gregas e Europeias1.2.2 | As Escolas Nacionalistas Europeias1.2.3 | Darwin e a Evolução

Seção 3 - Seleção Natural e Seleção Sexual1.3.1 A Seleção Natural em Galápagos1.3.2 Estudando a Seleção Natural1.3.2.1 Seleção Sexual

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Unidade 2 | Genética de Populações

Seção 1 - Introdução à Genética de Populações2.1.1 | O Surgimento da Genética de Populações2.1.2 | Genética de Populações e sua Importância2.1.3 | População Natural

Seção 2 - Equilíbrio de Hardy-Weinberg2.2.1 | Aplicações do Equilíbrio de Hardy-Weinberg2.2.2 | Aprendendo Mais sobre as Frequências Alélicas2.2.3 | Equilíbrio de Hardy-Weinberg e Teste de X2

2.2.4 | Particularidades ao Usar o Teste de X2

2.2.5 | Fatores que Podem Alterar o Equilíbrio de Hardy-Weinberg2.2.6 | Exercícios resolvidos

Seção 3 - Deriva Genética ou Alélica2.3.1 | O Que É Deriva Genética?2.3.2 | Tamanho Populacional e Deriva Genética2.3.3 | As Relações entre Deriva Genética, Seleção Natural e Mutação2.3.4 | Os Gargalos de Garrafas2.3.5 | O Efeito do Fundador2.3.6 | Deriva Genética e Evolução Biológica

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Unidade 3 | Tempo Geológico, Rochas e Processos Geológicos

Seção 1 - O Planeta Terra e o Tempo Geológico3.1.1 | Origem do Planeta Terra3.1.2 | O Planeta Terra3.1.2.1 | Estrutura e Composição da Terra 3.1.2.1.1 | Crosta Terrestre3.1.2.1.2 | Manto3.1.2.1.3 | Núcleo

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3.1.3 | O Planeta Terra e o Tempo Geológico3.1.3.1 | O Tempo Geológico3.1.3.1.1 | Éon Hadeano3.1.3.1.2 | Éon Arqueano 3.1.3.1.3 | Éon Proterozoico3.1.3.1.4 | Éon Fanerozoico

Seção 2 - Minerais e Rochas3.2.1 Os Minerais3.2.1.1 Identificação dos Minerais3.2.1.2 Minerais Formadores de Rochas3.2.2 As Rochas3.2.2.1 O Ciclo das Rochas3.2.2.1.1 Rochas Ígneas3.2.2.1.2 Rochas Sedimentares3.2.2.1.3 Rochas Metamórficas

Seção 3 - Intemperismo e Pedogênese3.3.1 Intemperismo3.3.1.1 Intemperismo Físico ou Mecânico3.3.1.2 Intemperismo Químico3.3.1.3 Fatores que Influenciam o Intemperismo dos Minerais3.3.2 Pedogênese3.3.2.1 Classificação do Solo Quanto à sua Origem

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Unidade 4 | Sismicidade, Vulcanismo e Paleontologia

Seção 1 - Vulcanismo e Abalos Sísmicos4.1.1 | Vulcanismo4.1.1.1 | Lavas4.1.1.1.1 | Lavas Basálticas4.1.1.1.2 | Lavas Almofadas4.1.1.1.3 | Lavas Pahoehoe e aa4.1.1.1.4 | Lavas Riolíticas e Andesíticas4.1.2 | Gases Vulcânicos4.1.3 | Fumarolas4.1.4 | Gêiseres4.1.5 | Piroclastos4.1.6 | Estilos Eruptivos4.1.6.1 | Erupções Fissurais4.1.6.2 | Erupções Centrais4.1.7 | Terremotos

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Seção 2 - Introdução ao Estudo da Paleontologia4.2.2 | O que é Paleontologia? 4.2.3 | Estudando os Fósseis4.2.4 | Processos e Ambientes de Fossilização

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Apresentação

Apresentaremos, neste material didático, a base científica para a compreensão da vida e, principalmente, da diversidade dos seres vivos que existem em nosso planeta.

Essa base compreende o estudo da evolução e de todos os componentes ligados a esse processo, como a formação, estrutura e modificação do nosso planeta estudado em geologia e paleontologia, que por meio dos estudos dos fósseis fornece evidências do processo evolutivo na Terra.

Estudar evolução consiste em analisar as alterações ocorridas nos seres vivos ao longo do tempo, ou seja, entender que os organismos existentes hoje não são os mesmos que habitaram nosso planeta no passado. As espécies atuais são oriundas de um longo processo, em que fatores evolutivos atuaram de forma intensa para a formação desses indivíduos que tiveram a capacidade de se adaptar e perpetuar.

Para compreender todo esse processo, na primeira unidade deste livro, veremos como a Teoria da Evolução Biológica tem buscado explicar vários fenômenos importantes; estudaremos a definição de conceitos fundamentais para o entendimento da complexidade da teoria evolutiva moderna e das evidências da evolução biológica.

Quando falamos em evolução, é necessário percebermos que todos os estudos nesta área estão ligados à análise de vários indivíduos de uma mesma espécie. Portanto, não podemos associar o conceito de evolução a um único indivíduo, mas, sim, a populações de indivíduos da mesma espécie, em que as alterações, provocadas por fatores evolutivos possam ser transmitidas às próximas gerações.

Na Unidade 2 deste livro, abordaremos o conceito de genética de populações, desde as considerações iniciais até a definição do teorema de Hardy-Weinberg, que é a base para o estudo de populações naturais dentro da área da biologia evolutiva.

A credibilidade dos achados evolutivos se baseia nas evidências que relatam as variações dos organismos ao longo do tempo. Essas evidências surgem do esforço de vários campos da ciência, com o objetivo de entender como acontece a evolução.

A geologia e paleontologia são duas importantes áreas da ciência que

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colaboram para compreendermos o processo evolutivo. O conhecimento nessas áreas, entre outros fatores, permite o estudo comparativo de fósseis, encontrados em diferentes camadas geológicas, que podem revelar as transformações sofridas pelos seres vivos com o passar do tempo.

Na Unidade 3, vamos estudar as características básicas de nosso planeta. Por meio do estudo das características gerais da Terra e também dos eventos que aconteceram ao longo do tempo geológico, compreenderemos melhor os fenômenos que aconteceram ao longo dos últimos 4,5 bilhões de anos. Também, vamos estudar os minerais e as rochas por meio do estudo comparativo entre as rochas ígneas, sedimentares e metamórficas. Ao final desta unidade, estudaremos os eventos de intemperismo e pedogênese para entendermos como os solos foram formados.

Em nossa última unidade, estudaremos os eventos sísmicos e o vulcanismo, os quais são importantes agentes na formação da estrutura do Planeta. Também, na quarta unidade, vamos estudar os conceitos gerais de paleontologia e como essa ciência fornece elementos para os estudos evolutivos e geológicos.

Desejamos a todos um excelente estudo!

Prof. Gabriel Marcos Domingues de Souza

Prof. Maurilio Cristiano Batista Bergamo

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BIOLOGIA EVOLUTIVA

Nessa seção veremos como a Teoria da Evolução Biológica tem buscado explicar vários fenômenos importantes, desde a conservação da diversidade biológica até a dinâmica de transmissão de doenças. Estudaremos a definição de conceitos fundamentais para entender a complexidade da teoria evolutiva moderna e as evidências de evolução biológica.

Seção 1 | Evolução Biológica

Objetivos de aprendizagem: Esta unidade tem como objetivo apresentar a você os principais conceitos na área da biologia evolutiva. Iremos trabalhar com as bases da ciência e dos primeiros pensamentos sobre a possibilidade de existir evolução biológica nas espécies.

Ao longo da unidade, teremos condições de compreender o desenvolvimento da teoria evolutiva à luz dos conhecimentos científicos nas áreas da biologia, matemática, geologia, paleontologia etc.

Ao final, esperamos que você consiga entender quais são os fatores que corroboram para que a teoria evolutiva moderna seja de fato uma forma cientificamente consistente de explicar a transmutação das espécies nos seres vivos.

Gabriel Marcos Domingues de Souza

Unidade 1

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Charles Darwin, naturalista e autor do livro A origem das espécies (1859), é conhecido como o pai da evolução. A Teoria Evolutiva Moderna, de como surgiu a vida até o desenvolvimento do ser humano, tem como base o pensamento evolutivo de Darwin. Nessa seção veremos como os pensamentos de Darwin foram formados e como eles influenciaram os atuais conceitos sobre evolução.

Seção 2 | Teorias Evolutivas

A evolução por meio da seleção natural proposta por Darwin ocorre porque as adaptações encontradas nos organismos aumentam sua chance de sobrevivência e de reprodução. Outras características, como a reprodução sexuada, promovem a seleção sexual. Veremos nessa seção como as seleções natural e sexual atuam no processo evolutivo.

Seção 3 | Seleção Natural e Seleção Sexual

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Introdução à unidade

A evolução biológica não pode ser caracterizada levando em consideração apenas as mudanças ao longo dos anos. Muitas coisas mudam com o tempo: árvores perdem suas folhas, cordilheiras ascendem e erodem, mas esses não são exemplos de evolução biológica porque não envolvem descendência por meio de herança genética.

A ideia-chave para a evolução biológica é que toda a vida na Terra compartilha um mesmo ancestral, assim como você e seus primos compartilham a mesma avó.

Ao longo desta unidade, iremos buscar informações, conceitos, registros, experimentos que possam nos auxiliar na compreensão dos processos que fizeram um ancestral comum da vida na Terra dar origem à extraordinária diversidade que vemos documentadas nos registros fósseis e à nossa volta nos dias atuais.

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Seção 1

Evolução Biológica

Introdução à seção

A partir de agora veremos como a Teoria da Evolução Biológica tem buscado explicar vários fenômenos importantes, desde a conservação da diversidade biológica até a dinâmica de transmissão de doenças. Para isso devemos, inicialmente, compreender o processo de construção do pensamento científico e como utilizá-lo nas diferentes áreas das ciências biológicas. Estudaremos a definição de conceitos fundamentais para entender a complexidade da teoria evolutiva moderna e as evidências de evolução biológica.

1.1.1 Como Funciona a Ciência?

A ciência, a filosofia, assim como outras áreas do conhecimento, são instrumentos usados pelo homem com o intuito de dar sentido à vida e ao mundo que nos circunda. Iremos nos atentar, a partir de agora, ao modo como a ciência moderna trabalha para desvendar os fenômenos biológicos.

A análise científica começa com a observação de um fenômeno natural. Isso nos permite levantar algumas indagações sobre qual ou quais eventos seriam por ele responsáveis. Inicialmente, as possíveis explicações para esse fenômeno são estabelecidas na forma de hipóteses científicas, ou seja, de um conjunto estruturado de argumentos que possam servir de explicação para tais acontecimentos.

Um plano experimental é desenvolvido para testar a viabilidade de tais hipóteses. Após o planejamento, partimos para a experimentação. Um experimento científico deve ser planejado e conduzido em condições bem definidas a fim de poder ser repetido uma ou mais vezes pelo próprio pesquisador ou por outros cientistas interessados na explicação do fenômeno. Um experimento é considerado válido se durante sua repetição forem obtidos resultados semelhantes aos originalmente conseguidos. Se esses resultados concordam com a hipótese levantada, esta pode ser aceita pelo pesquisador. Quando confirmada uma hipótese ou um conjunto de hipóteses por observação ou experimentação, elas podem se transformar em uma tese científica.

Uma tese científica é a combinação de uma ou mais hipóteses com os dados

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experimentais que lhes dão o devido suporte. Porém, para ser aceita pela sociedade científica, o pesquisador precisa submeter suas descobertas, na forma de um trabalho científico, a uma revista especializada. Esse trabalho será revisado por especialistas da área de conhecimento em questão, os quais darão parecer sobre a relevância e a factibilidade daquilo que foi proposto, experimentado, analisado e interpretado pelo pesquisador.

Quando o trabalho é considerado consistente, ele é finalmente publicado. Caso não o seja, são feitas sugestões de alteração pelos pareceristas, por exemplo, a inclusão de novos experimentos ou abordagens metodológicas, ou então o trabalho é simplesmente rejeitado. Se a descoberta feita pelo pesquisador for inédita, outros cientistas terão a missão de colocá-la à prova, procurarão determinar se ela pode ser aplicada a outros sistemas ou procurarão responder a novas questões que agora, certamente, poderão ser levantadas.

O que precisamos entender é que, mesmo quando determinada hipótese ou tese é aceita pela comunidade científica, isso não implica que ela estará totalmente livre de novas provações. Se novas informações aparecem, explicações científicas podem ser revisadas e melhoradas ou, então, rejeitadas e substituídas.

E assim as explicações sobre os fenômenos naturais vão ganhando credibilidade e consistência. Porém, todo esse processo resulta em vantagens e desvantagens no uso da ciência: ao mesmo tempo que ela tem se mostrado cada vez mais eficiente para a explicação de uma série de fenômenos naturais, ela não pode ser aplicada em todas as áreas do conhecimento humano de maneira totalmente eficiente.

Figura 1.1 | Resumo de como os fenômenos naturais são analisados pela ciência

Fonte: O autor (2015).

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Em algumas situações ou eventos, não há possibilidade de se observar, medir, pesar, quantificar ou submeter algo a algum tipo de avaliação controlada para servir como objeto de comprovação ou refutação. Portanto, esses casos não podem fazer parte do conhecimento científico.

Existiria vida fora da Terra?Se fôssemos visitados por extraterrestres, os governos teriam provas disso?

Analisando os questionamentos apresentados, onde eles se encaixam com tudo o que foi discutido até agora? Tente associar conhecimentos científicos com a realidade das duas questões. Na primeira pergunta, podemos associar os conhecimentos em Astrobiologia, que procura descobrir se é possível a existência de vida fora da Terra. Os resultados de pesquisas nessa área são facilmente encontrados em revistas científicas especializadas.

Por sua vez, em relação à segunda indagação, se os governos realmente escondem provas de visitas extraterrestres e não disponibilizam esses dados para a comunidade científica, imagens desfocadas, depoimentos de pessoas que passaram por experiências estranhas, veredictos de renomados cientistas que nunca publicaram em revistas indexadas artigos tratando especificamente de tais assuntos, entre outras coisas, não podem ser consideradas provas irrefutáveis de contatos extraterrestres.

O que podemos concluir depois de tudo o que foi discutido é que a ciência não pode oferecer respostas completas a todas as questões levantadas pelos seres humanos, mas ela é uma obra em constante desenvolvimento. Portanto, a tendência, ao longo do tempo, é de sempre aumentar a quantidade de conhecimento sobre os fenômenos naturais.

1.1.2 Como Explicar a Herdabilidade

Em 1865, Gregor Mendel publicou seu trabalho relatando os padrões de herança simples em ervilhas de jardim. Nele, Mendel formulou uma série de hipóteses sobre a herança dos caracteres, tais como:

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• Os descendentes herdariam um fator de cada um de seus progenitores.

• Esses fatores seriam transmitidos ao longo das gerações sem sofrer modificações.

• Cada gameta carregaria somente um de dois fatores.

• Os organismos teriam um par de fatores que regulariam a manifestação de certo caráter nas ervilhas.

• Alguns desses fatores teriam a capacidade de mascarar o efeito de seus pares.

Podemos observar que cada uma das hipóteses formuladas por Mendel pode ser submetida à experimentação. No início do século XX, diferentes pesquisadores começaram a fazer estudos semelhantes aos de Mendel em diferentes organismos e, depois de algum tempo, acabaram por dar crédito ao seu trabalho. Porém, é importante salientar que demorou por volta de 35 anos para suas ideias serem difundidas e aceitas pela comunidade científica.

Isso aconteceu porque, antes das propostas de Mendel sobre como os caracteres eram herdados, existiam outras concepções de herança bastante sólidas entre os pesquisadores. Por exemplo, a Pangênese foi uma ideia aceita, durante muito tempo, para explicar a transmissão das características dos organismos de uma geração à outra. Segundo esse modelo, cada órgão ou parte do corpo de um organismo produziria pequenas partículas – chamadas gêmulas – que seguiriam para os órgãos reprodutivos, sendo então transmitidas aos descendentes no momento da concepção. Portanto, o novo ser seria construído a partir das gêmulas recebidas dos pais. Ela existe desde antes do período pré-socrático (470-399 a.C.), tendo sido aceita por vários cientistas – inclusive pelo próprio Darwin – até o início do século XX.

Na trilha da Pangênese podemos incluir, também, a Herança dos caracteres adquiridos, em que se acreditava que as modificações incorporadas aos indivíduos poderiam ser passadas a seus descendentes. Apesar de atribuída a Lamarck, ela existe desde antes de Platão – que viveu possivelmente entre 427 e 347 a.C. – e vigorou até o início de 1880. Nessa época, seria comum imaginar que, se os gametas eram formados pelas gêmulas e estas eram pequenas amostras oriundas de diferentes órgãos e tecidos, logo, tecidos e órgãos que ao longo da vida do indivíduo fossem modificados em resposta ao ambiente produziriam gêmulas modificadas, as quais, por sua vez, dariam luz a descendentes também modificados.

As interpretações iniciais feitas com o uso dos primeiros microscópios ajudaram a manter tais concepções por um bom período de tempo. Como visto em outras disciplinas, o pesquisador Anton van Leeuwenhoek (1632-1723) foi o primeiro a observar, em 1677, espermatozoides de mamíferos, moluscos, anfíbios, peixes e

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aves. No rastro de van Leeuwenhoek, dezessete anos depois, outro neerlandês chamado Nicolas Hartsoeker, ao se utilizar de um desses microscópios rudimentares, sugeriu a presença de pequenos “animálculos” no interior de espermatozoides humanos e de outros animais. Assim, por volta do século XVII, muitos cientistas acreditavam na Teoria Pré-formista. Para eles, haveria um homúnculo nos gametas dos homens. Portanto, às mulheres caberia apenas o papel de incubadoras dessas pequenas miniaturas humanas.

No século seguinte, estudos embriológicos, como os desenvolvidos por Kaspar Friedrich Wolff (1733-1794), mostraram que os órgãos de animais e de plantas se desenvolviam a partir de tecidos embrionários indiferenciados por meio de “forças vitais misteriosas”. Para o embriologista Karl Ernst von Baer (1792-1876), os organismos surgiriam por séries nas quais os tecidos tornavam-se cada vez mais especializados. O crescimento da citologia levou ao desenvolvimento da Teoria celular, apresentada por Matthis Jacob Schleiden (1804-1881) e Theodor Schwann (1810-1882) em 1839. Ela propunha que as células seriam a unidade fundamental dos organismos vivos e somente surgiriam a partir de células preexistentes. Essas descobertas no final do século XIX fizeram que a Pangênese e a Herança dos caracteres adquiridos perdessem força.

Francis Galton (1822-1911), primo de Darwin, foi um dos pesquisadores que ajudou a sepultar de vez a Teoria da Pangênese. Entre 1869 e 1871, ele realizou uma série de transfusões sanguíneas entre coelhos com diferentes padrões de coloração da pelagem e não encontrou nenhuma evidência de que o sangue transfundido transmitisse alguma característica aos descendentes. A lógica da experimentação de Galton era a seguinte: se essas teorias estivessem corretas, coelhos brancos que recebessem sangue de coelhos pretos teriam de produzir pelagem branca e preta, e vice-versa. Mas não era o que acontecia.

Por sua vez, Friedrich Leopold August Weismann (1834-1914), um dos grandes teóricos evolucionistas de sua época, ajudou a sepultar a herança dos caracteres adquiridos ao elaborar um experimento simples, mas engenhoso. Ele cruzou por 22 gerações consecutivas camundongos que tinham suas caudas amputadas experimentalmente logo após o nascimento. Apesar disso, estes continuavam a produzir filhotes com cauda.

Em 1885, esse mesmo cientista acabou lançando a Teoria de continuidade do plasma germinativo. Nela, ele sustentava que a rota germinativa seria separada da rota somática desde o começo do desenvolvimento. Deste modo, o que acontecesse nas células somáticas não poderia ser comunicado às células germinativas. Isso é aceito atualmente pela Ciência. Porém, ainda hoje, é muito comum encontrar pessoas que tentam explicar a evolução de determinadas características sem se atentarem ao fato de que, em organismos pluricelulares, o tecido somático é separado do tecido germinativo. E ainda existem muitos que confundem o papel do ambiente na

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evolução dos caracteres. Por exemplo, ele seria o agente que induz as mudanças nos organismos ou nas populações de organismos?

Uma população de inseto, praga resistente a um inseticida, teria surgido antes ou depois de o agricultor começar a utilizar o inseticida? Como você e seus colegas de sala explicariam isso?

Voltando ao tema deste tópico, um pouco antes de as hipóteses de Mendel serem difundidas, Francis Galton lançou a Lei da herança ancestral, segundo a qual cada característica hereditária provinha não só dos pais, mas também dos avós, bisavós etc., sendo transmitida em proporções definidas ao longo das gerações. Neste caso, os pais contribuiriam com cerca de 50%, os quatro avós com 25%, os bisavós com 12,5%, e assim por diante. Galton chegou a tal conclusão depois de realizar estudos em humanos e de analisar os resultados de experimentos de outros pesquisadores que mostravam que a prole poderia exibir características intermediárias a de seus progenitores.

Mais de 100 anos antes de Mendel, um experimento desenvolvido pelo botânico alemão Joseph Gottlieb Kölreuter (1733-1806), em 1760, mostrou que a primeira geração filial (F1) produzida a partir do cruzamento entre variedades altas e anãs de tabaco (Nicotiana sp) tinha tamanho intermediário ao de seus progenitores. E as plantas da segunda geração filial (F2) produzidas pelo acasalamento das plantas F1 apresentavam uma variação contínua de tamanho, que ia desde a altura do progenitor anão até a do progenitor alto.

Em 1918, o inglês Ronald Fisher (1890-1962) demonstrou que a altura nas plantas de tabaco era governada pelos mesmos fatores descritos por Mendel. Porém, neste caso, em vez de um único gene controlando o caráter, seriam muitos deles, cada um exercendo um pequeno efeito sobre o fenótipo do organismo. Por isso era possível produzir grande quantidade de fenótipos intermediários.

Caracteres como altura e produtividade estão sob controle de vários locos, sendo eles atualmente estudados por uma área da genética conhecida como biométrica ou quantitativa. Já a genética qualitativa procura estudar a herança de caracteres mendelianos convencionais, ou seja, aqueles controlados por um ou poucos locos. Portanto, vimos que o caminho foi longo e difícil até que as proposições feitas por Mendel se tornassem leis. Mas será que tudo o que

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descobrimos se transforma necessariamente em lei?

1.1.3 Lei e Teoria Científica

Veremos, a partir de agora, que as leis científicas são bastante específicas em sua concepção e muitas vezes não podem ser usadas para explicar fenômenos naturais mais complexos.

Ainda que as leis de Mendel tenham surgido de uma série de hipóteses levantadas originalmente por ele, nem toda hipótese precisa virar uma lei para ser aceita pela comunidade científica. Isso porque uma lei científica é a descrição de um fenômeno natural ou princípio que invariavelmente se mantém verdadeiro sob condições específicas e que deve ocorrer sob certas circunstâncias.

No início do século XX, depois de repetidos testes e da rejeição de todas as outras hipóteses sobre a hereditariedade que competiam com as de Mendel, foram aceitas pela comunidade científica em geral as hipóteses deste monge, tornando-as leis científicas. A primeira delas é a Lei da Pureza dos Gametas, ou Primeira Lei de Mendel, que considera que cada gameta portaria apenas um de dois alelos (os fatores mendelianos) de determinado caráter presente nos indivíduos. A segunda é a Lei da Segregação Independente, ou Segunda Lei de Mendel, que determina que genes/alelos relacionados a diferentes características seriam herdados independentemente.

Podemos observar que uma lei científica descreve um fenômeno bastante específico; por exemplo, se pegarmos a primeira e a segunda lei de Mendel, veremos que elas são válidas em condições bastante restritas:

• Os caracteres têm de ser governados por um único gene.

• Esses genes precisam estar presentes em cromossomos que são igualmente compartilhados por machos e fêmeas (isso porque a situação fica um pouco diferente para locos presentes nos cromossomos sexuais).

• Os genes não podem estar ligados de modo próximo em um mesmo cromossomo.

• Precisam ser transmitidos por espécies diploides – com dois conjuntos cromossômicos provenientes de seus progenitores – que se reproduzam sexuadamente.

Portanto, ainda que sejam leis, as regras de transmissão hereditária apresentadas por Mendel não são absolutamente universais. Elas são importantes para a construção das teorias científicas – as leis de Mendel e a genética são fundamentais

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dentro da teoria evolutiva moderna. Mas será que um dia as teorias científicas serão leis científicas?

A explicação para um fenômeno natural, na ciência, não pode ser chamada de teoria até que tenha sido confirmada por meio de diferentes experimentações independentes. Isso significa que as teorias devem conter mais certezas que as hipóteses e menos que as leis.

Como vimos anteriormente, as leis são bem mais restritas ao fenômeno que estas buscam explicar. Uma teoria é uma explanação coerente para uma coleção de fatos que ocorrem no mundo natural. Na verdade, a diferença entre fato e teoria é que o primeiro é aquilo que acontece no mundo físico e a segunda é a explicação que damos a ele. Logo, uma teoria precisa ser construída a partir de um fato, e não o contrário. O que seria então uma teoria científica?

Segundo definição do Dicionário Aurélio, teoria científica é: “Conjunto de conhecimentos não ingênuos que apresentam graus diversos de sistematização e credibilidade, e que se propõem explicar, elucidar, interpretar ou unificar um dado domínio de fenômenos ou de acontecimentos que se oferecem à atividade prática [...]”.

Outro aspecto importante do pensamento científico é que o fato sempre será superior à ideia que temos sobre ele. Isso significa que, com a observação e a interpretação de novos fatos, uma teoria científica poderá ser melhorada, modificada ou até mesmo substituída ao longo do tempo.

Existem algumas teorias tão bem fundamentadas e estabelecidas que é menos provável que algum dia elas venham a ser consideradas completamente equivocadas. É o caso da Teoria atômica, que vem sendo aperfeiçoada ao longo do tempo. Embora ainda exista muita coisa a ser descoberta sobre a matéria, graças ao conhecimento científico que acumulamos, podemos prever e realizar reações químicas específicas, produzir reações controladas de fissão atômica, combinar elementos para produzir energia, bem como criar equipamentos que dela se utilizem para realizar tarefas específicas, entre outras coisas. Graças a isso podemos, inclusive, determinar a composição química da matéria presente em planetas e sistemas solares longínquos, com a finalidade de descobrirmos como o Universo e a vida se originaram.

Deste modo, para muitas teorias científicas é mais provável que elas sejam reforçadas à medida que novas descobertas sejam feitas, novas hipóteses sejam levantadas e novas leis sejam estabelecidas. Ainda assim, uma teoria jamais poderá ser considerada a perfeita expressão da realidade; ela representará, no máximo, um modelo adequado que utilizamos para descrever e compreender aquilo que chamamos de real. E, por causa de sua complexidade, provavelmente as teorias científicas não deverão se transformar em leis, mas, ao longo do tempo, mais e

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mais leis científicas a elas serão incorporadas.

1.1.4 A Teoria Evolutiva Moderna

Podemos citar várias teorias científicas atualmente aceitas: Gravitação universal, Relatividade, Atômica, Tectônica de placas, Celular, Cromossômica, Evolução biológica etc. Para o biólogo Ernst Mayr (1904-2005), as teorias na biologia evolutiva são bastante peculiares, sendo em sua maior parte fundamentadas em conceitos, tais como seleção, competição, escolha de parceiros, sucessão, altruísmo etc. Esses conceitos, para serem aceitos e incorporados à teoria evolutiva, precisam passar pelo mesmo tipo de crivo científico ao qual são submetidas as hipóteses levantadas em outros campos da ciência. Já o filósofo norte-americano Elliot Sober relata que o termo “modelo” seria preferível a “conceito”, pois os modelos biológicos dizem o que pode acontecer se determinado conjunto de condições é satisfeito na natureza. Entretanto, eles não nos dizem quando, onde ou como essas condições são frequentemente satisfeitas nesta mesma natureza.

Podemos analisar como o modelo de seleção natural explica a evolução da resistência dos insetos aos inseticidas, algo bastante comum em países com grande tradição agrícola, como o Brasil. Mas ele não nos diz em que espécie de inseto praga, qual o tipo de inseticida e em qual região do país isso acontecerá. Afinal, as mutações que conferem resistência a determinado inseticida não têm hora nem local para acontecer.

Quando falamos sobre a teoria evolutiva moderna, precisamos entender que ela engloba uma série de informações provenientes de diferentes áreas, tais como a geologia, paleontologia, genética, biologia do desenvolvimento, bioquímica, anatomia e fisiologia comparadas, sistemática, biogeografia, ecologia, etologia etc. Por ser tão abrangente e complexa, ela também exige algum conhecimento de estatística, matemática, química, física, entre outras.

Para Ernst Mayr, a teoria evolutiva é, na verdade, um sistema de teorias que pode ser subdividido em cinco frentes:

• Inconstância das espécies: ao longo do tempo, a vida em nosso planeta sofreu modificações, sendo que muitas espécies desapareceram e outras foram surgindo nesse processo.

• Ancestralidade em comum: novas espécies surgem a partir de espécies ancestrais.

• Gradualismo: a evolução biológica ocorre de maneira lenta e gradual.

• Especiação: a variação dentro de espécie origina diferenças entre espécies.

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• Seleção natural: explica como ocorre a evolução das adaptações dos seres vivos.

Esse mesmo pesquisador relata que a inconstância das espécies e a ancestralidade em comum foram aceitas pela comunidade científica poucos anos após a publicação do livro A origem das Espécies, de Charles R. Darwin, o que ocorreu em 1859. Contudo, o gradualismo, a especiação e a seleção natural somente foram acatados após a década de 1940, com o desenvolvimento da Teoria Sintética da Evolução Biológica ou Teoria Moderna da Evolução Biológica.

As teorias da inconstância das espécies e da ancestralidade em comum foram aceitas mais rapidamente pela sociedade científica por diferentes fatores, entre eles, o conhecimento, naquele período, de vários fósseis de espécies que não mais existiam; dos dados geológicos que mostravam que a Terra era um ambiente em constante mudança e, sobretudo, bastante antiga; das informações provenientes da anatomia e da embriologia comparadas, entre outros.

Já com relação ao gradualismo, especiação e seleção natural é importante lembrar que até hoje existem intensos debates entre os cientistas sobre a importância e forma como esses componentes contribuem para o processo evolutivo.

No meio científico existem aqueles que consideram que a evolução ocorreria sempre de maneira lenta e gradual. Mas também há os que argumentam que esta poderia acontecer vagarosamente em alguns períodos e rapidamente em outros. É o que acontece, por exemplo, com a Teoria do Equilíbrio Pontuado, apresentada por Niles Eldredge e Stephen Jay Gould na década de 1970, baseada em dados fossilíferos que, muitas vezes, indicam longos períodos de constância das espécies, cortados por curtos períodos de ampla especiação. Assim, para alguns, o processo que dá origem a novas espécies engloba mecanismos diferentes daqueles normalmente observados na diferenciação das populações. Para outros, a especiação seria apenas um subproduto dessa diferenciação, não exigindo a participação de mecanismos que ainda não foram descobertos.

Há, ainda, os que defendem que a seleção natural seria o principal motor do processo evolutivo e há aqueles que defendem que outros fatores, como a deriva genética, também podem ter um papel preponderante nesse processo.

Este tipo de debate é absolutamente esperado dentro da ciência, e o aspecto mais importante a ser considerado é que os cientistas que defendem diferentes visões sobre o processo evolutivo não estão colocando em dúvida a existência ou não da evolução biológica, mas, sim, a forma como esta acontece. Tais discussões motivam o planejamento e a condução de novos experimentos e estudos, e, à medida que novas ideias são testadas, validadas ou rejeitadas, maior se torna nossa compreensão do processo evolutivo.

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O combustível da ciência é analisar evidências, ou seja, trabalhar com conjuntos de informações utilizados para confirmar ou negar uma hipótese, uma tese ou uma teoria científica. Os resultados dos experimentos científicos são utilizados como evidência para reforçar, modificar ou rejeitar a forma como interpretamos os fenômenos naturais. Normalmente, quando perguntamos às pessoas quais são os tipos de elementos que parecem reforçar a teoria evolutiva, uma das primeiras imagens produzidas é a dos fósseis. Porém, existem muito mais informações a esse respeito que trilobitas ou dinossauros. De acordo com Mahner e Bunge (1977), a evolução biológica é apoiada por evidências circunstanciais, diretas e históricas. Vamos então analisar cada uma delas.

As evidências circunstanciais são derivadas das informações que se tem sobre a extinção dos organismos, das falhas encontradas em muitas de suas adaptações ao meio ambiente e dos órgãos e estruturas vestigiais. Com relação às extinções, os registros fósseis mostram que a maior parte das espécies que circularam pelo nosso planeta não existe mais. Esse fato corrobora com a teoria evolutiva, em que a vida não é predeterminada nem minuciosamente planejada. Pelo contrário, por ser um evento sem nenhum objetivo ou causa final – nem de melhoria nem de aumento de complexidade –, somente sobrevivem espécies capazes de se adaptar a um ambiente que de maneira inevitável irá se alterar ao longo do tempo. Aquelas incapazes de se moldar às novas condições, pelo que demonstra o registro fossilífero, acabam extintas.

Uma série de características presentes nos seres vivos não representa estruturas exatamente perfeitas para sua sobrevivência e reprodução. Na verdade, elas muitas vezes parecem mais uma readequação de algo que já existia do que uma obra realmente preconcebida e planejada para cumprir com precisão uma finalidade específica. Um exemplo disso são os vasos deferentes dos machos de mamíferos. Eles saem dos testículos, contornam os ureteres dentro da cavidade abdominal e voltam em seguida para desembocar na uretra. Se pensarmos como um engenheiro hidráulico, seria muito mais coerente se eles simplesmente não fizessem uma volta tão grande. Mas, se considerarmos que os testículos nos ancestrais dos mamíferos ficavam dispostos internamente na cavidade abdominal e que, durante sua evolução, acabaram migrando para fora do abdome, a realidade de como essa estrutura é hoje faz mais sentido.

O processo evolutivo está sujeito primariamente à variação genética gerada pelas mutações que afetam a sequência de nucleotídeos do DNA (Ácido Desoxirribonucleico) de maneira totalmente aleatória; porém, não surgiu nada, nenhuma alteração genética que viesse a permitir o encurtamento do caminho percorrido pelos vasos deferentes dos machos durante a evolução dos mamíferos.

Outro grupo de evidências circunstanciais da evolução corresponde aos órgãos vestigiais retidos nos adultos ou que aparecem apenas durante o desenvolvimento

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embrionário. Vestígios de uma cintura pélvica em cetáceos ou ossos de membros posteriores vestigiais em cobras, todos homólogos* aos de outros tetrápodes, e que não são utilizados na locomoção, são exemplos de órgãos vestigiais. Ao mesmo tempo em que isso indica que tais estruturas estavam presentes nos ancestrais destas espécies, eles novamente reforçam a concepção de que os organismos não foram estabelecidos a partir de um projeto preconcebido.

(*) O termo homologia, em evolução, refere-se à situação em que duas espécies distintas

compartilham uma mesma estrutura que estava presente em seu ancestral comum.

Nas evidências diretas para a evolução biológica, há diferentes estudos de campo ou em laboratório que demonstram que as espécies evoluem ao longo do tempo; essa área de estudos é chamada de microevolução, responsável por avaliar pequenas mudanças que ocorrem dentro das populações naturais e que, necessariamente, não chegam a originar novas espécies.

Alterações morfológicas, produzidas pela seleção natural, no tamanho do bico dos tentilhões de Galápagos em resposta à oferta de alimento, a seleção de insetos resistentes a pesticidas pouco depois de sua utilização intensiva nas práticas agrícolas, ou de microrganismos resistentes a antibióticos, um problema de saúde pública cada vez mais presente, são exemplos bem documentados da realidade dos processos microevolucionários.

As mutações provocadas pela alta taxa de erro da transcriptase reversa do Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV), a evolução da resistência desse vírus a uma série de drogas antivirais, embora temível, está se tornando clássica. Pode surgir uma gama de variantes dentro de um mesmo hospedeiro, muitas das quais resistentes às drogas utilizadas em seu controle. Um indivíduo infectado pelo HIV que passe a tomar determinado antiviral terá inicialmente uma diminuição de sua carga viral, mas, em pouco tempo, podem ganhar espaço em seu organismo as variantes naturalmente resistentes a essa droga e que originalmente se encontravam em baixa frequência em sua circulação sanguínea.

Essa estratégia de utilizar simultaneamente uma série de drogas no controle do HIV nada mais é do que uma tentativa de burlar a alta taxa evolutiva desse retrovírus, pois, mesmo que variantes resistentes a drogas distintas tenham maior probabilidade de surgir por mutações independentes, variantes com mutações que confiram múltipla resistência são mais improváveis. Mesmo assim, o improvável não é sinônimo de impossível.

Outras evidências diretas do processo evolutivo são a homologia morfológica, embrionária e molecular entre diferentes estruturas. Exemplo disso são as asas dos morcegos, que, mesmo não sendo homólogas às das aves, no que se refere à habilidade de voo, os ossos que lhes dão sustentação o são. O mesmo se aplica aos ossos dos membros anteriores de todos os mamíferos, apesar de todas as

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suas diferenças morfológicas. Essas estruturas, embora bastante modificadas, ocupam uma mesma posição nos membros anteriores desses animais, quer seja no indivíduo adulto ou em seus respectivos embriões.

Confira no link a seguir uma comparação entre os ossos dos membros anteriores de alguns mamíferos.Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Evid%C3%AAncias_da_evolu%C3%A7%C3%A3o#/media/File:Gegenbaur_1870_hand_homology.png>. Acesso em: 1º ago. 2015.

Os estudos moleculares também fornecem evidências experimentais do processo evolutivo.

Como organismos tão distintos – bactérias, fungos, plantas e animais – podem compartilhar características-chave, como acontece com o código genético?

Para compreender como isso pode acontecer, é necessário relembrar que o código genético se refere à trinca de nucleotídeos no RNA (Ácido Ribonucleico) que determina a inclusão de certo aminoácido nos peptídeos. Por exemplo, a sequência AUG presente em determinado RNA mensageiro determina a colocação do aminoácido metionina no peptídeo nascente. Graças a esse compartilhamento de um código genético praticamente universal podemos, com algumas modificações, introduzir genes humanos em bactérias, fazendo que estas produzam determinados peptídeos de interesse farmacológico, como é o caso da insulina. As semelhanças entre diferentes proteínas já sequenciadas, tais como a hemoglobina dos vertebrados, também confirmam o modelo de evolução biológica.

Seres vivos de espécies mais próximas normalmente têm maior grau de semelhança na sequência de seus aminoácidos que espécies filogeneticamente mais distantes. Mas existem genes cujas sequências são bastante conservadas em

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linhagens evolutivas muito distintas.

Outro tipo de evidência direta do processo evolutivo provém dos resultados obtidos pela seleção artificial realizada desde que os humanos começaram a domesticar animais e a cultivar plantas, algo que se iniciou há mais de 10 mil anos. As modificações conseguidas durante esse processo mostram que existe variação genética suficiente nas espécies selvagens para que possa promover mudanças substanciais em características morfológicas, comportamentais, bioquímicas etc.

Na seleção artificial praticada pelo homem, algumas dessas modificações ocorreram somente para fins estéticos, como na produção de plantas ornamentais ou em algumas espécies de animais de criação. Em outras, elas têm finalidades consideradas mais nobres, como obter indivíduos mais produtivos ou resistentes a doenças, com comportamento mais dócil ou com determinadas habilidades mais aguçadas, como a capacidade de caça, de guarda etc.

Acesse o link e veja algumas das diferentes linhagens de pombos obtidas por melhoramento genético graças à diversidade genética existente nas populações naturais e por causa de algumas mutações ocasionais que acabam sendo selecionadas pelos criadores. Disponível em: <http://www.avelar-lobato.loftgest.com/>. Acesso em: 2 ago. 2015.

O melhoramento genético trabalha com muitas das características exibidas pelos seres vivos que são controladas por poligenes, e cada poligene pode ser representado por uma série de alelos que afetam em diferentes níveis de intensidade o fenótipo dos indivíduos. Assim, se determinados alelos são intencionalmente eliminados das populações, enquanto outros são estimulados a aumentar em frequência ao longo das gerações, podemos alcançar modificações fenotípicas significativas nas espécies submetidas à seleção artificial.

Estudos feitos com o milho (Zea mays subsp. mays) indicam que ele se originou de uma espécie selvagem do sudeste do México chamada teosinto (Zea mays subsp. mexicana e Zea mays subsp. parviglumis). O teosinto é uma gramínea alta, tolerante à seca, que produz vários colmos que perfilham a partir do solo, cada um com uma pequena quantidade de grãos em suas espigas (Figura 1.2). Seus grãos são pequenos e duros, sendo que cada um deles é envolto por uma forte cúpula. Por sua vez, o milho atualmente cultivado é uma planta que produz um único e

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grande colmo, espigas com uma quantidade muito grande de grãos que ficam aderidos ao sabugo, envoltas pela palha, o que dificulta sua dispersão natural, bem como o ataque por insetos e aves.

Dados arqueológicos mostram que o cultivo do teosinto teve início há milhares de anos, possivelmente depois que os nativos da América descobriram que esta era uma espécie comestível. Eles então começaram a selecionar as espigas das plantas próximas a seus lares, que ficavam perto de fontes de irrigação. Essas plantas selecionadas continuaram a ser desenvolvidas de maneira isolada do teosinto selvagem, que continuou a crescer nas florestas ao redor.

As espigas de milho mais antigas conhecidas, estimadas em 5.400 anos, foram encontradas nas terras altas de Oaxaca, no sudoeste do México. Bastante diferentes do teosinto, elas tinham de duas a quatro fileiras de grãos firmemente grudados na espiga e apenas 2,54 centímetros de comprimento. Nesse período, ele já tinha sido submetido à manipulação humana por pelo menos 2 mil anos. E, até hoje, os fazendeiros de Oaxaca continuam selecionando e melhorando as variedades de milho, que atualmente são estimadas em 85 mil.

Figura 1.2 | Espigas de teosinto (esquerda), do milho cultivado (direita) e, ao centro, do seu híbrido

Fonte: Disponível em: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File%3ATeosinte.png>. Acesso em: 2 ago. 2015.

A etapa decisiva no surgimento do milho parece ter sido justamente a liberação de suas sementes, que deixaram de ser cobertas por uma série de brácteas, o que facilitou sua utilização na alimentação humana. Devido à grande diferença morfológica entre o teosinto e o milho, vários estudos tiveram de ser feitos para que

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esta hipótese de origem única fosse aceita. Análises citogenéticas mostraram que o milho e o teosinto possuem cromossomos morfologicamente indistinguíveis. Nos híbridos produzidos via cruzamentos artificiais, esses cromossomos se pareiam normalmente, de tal modo que apresentam uma meiose normal e são completamente férteis.

Pesquisas em biologia molecular têm mostrado que as principais diferenças entre eles, tais como as que modulam a forma de crescimento e de proteção dos grãos, são decorrentes da ação de poucos genes, possivelmente cinco, que podem ter sido rapidamente selecionados pelos primeiros agricultores. Um gene, nessas duas gramíneas, difere-se significativamente, é o chamado tga1, que pertence a uma família de reguladores da transcrição e que regula a formação das brácteas. O mapeamento de uma região desse gene com 1 mil nucleotídeos de extensão mostrou apenas sete diferenças entre o milho e o teosinto. Uma delas envolve a substituição de um aminoácido e pode afetar a função desta proteína. As outras seis afetam potencialmente a regulação desse gene. É bem provável que os primeiros agricultores selecionaram positivamente indivíduos que apresentavam mutações nesta região durante a domesticação dessa gramínea.

Outro gene descoberto no cromossomo 1 de ambas as gramíneas, chamado tb1, está envolvido na mudança da arquitetura do teosinto para o milho. Se o alelo desse gene proveniente do milho é introduzido no teosinto a partir de cruzamentos dirigidos, obtêm-se plantas de teosinto com um único colmo. Desta forma, parece que o tb1 afeta a dominância apical dessas gramíneas. Embora os estudos moleculares tenham indicado que esse gene é virtualmente idêntico em sua sequência nucleotídica em ambas as plantas, a taxa com que ele é expresso no milho é muito superior à taxa no teosinto. Assim, possivelmente, a evolução do milho envolveu uma alteração na regulação do tb1, de tal forma que ele se tornou altamente expresso em diferentes partes dessa gramínea.

Quando falamos das evidências históricas do processo evolutivo, um dos achados mais contundentes da evolução biológica é o próprio registro fossilífero. A forma como os diferentes fósseis são encontrados nos permite confirmar que, ao longo de bilhões de anos, a vida passou por diferentes transformações em nosso planeta. Muitas vezes, há falta de um registro preciso para a maioria dessas mudanças, pois o processo de fossilização depende de condições bastante específicas para acontecer. Nos últimos anos, vários representantes de estágios evolutivos intermediários vêm sendo descobertos em diferentes grupos de organismos, que vão dos ancestrais das aves, dos mamíferos e, até mesmo, de nós, seres humanos.

Para compreender melhor, vamos avaliar alguns exemplos: considera-se que as baleias se originaram de um mamífero terrestre que retornou aos mares;

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neste processo, acabou perdendo as pernas e todo o seu sistema vital tornou-se adaptado a uma existência marinha. Alguns detalhes dessa história ainda não foram elucidados, mas diferentes fósseis deste grupo de organismos foram descobertos nas últimas décadas, o que permite traçar um bom esboço dessa evolução. Em 1978, o paleontólogo Phil Gingerich descobriu um crânio de 52 milhões de anos no Paquistão, que se assemelhava a fósseis dos creodontes – carnívoros do tamanho de lobos que viveram durante o Eoceno, entre 60 e 37 milhões de anos atrás. O crânio também tinha características em comum com os Archaeoceti, baleias mais antigas até então conhecidas. Esse fóssil, denominado Pakicetus (Figura 1.3A), provou ter características-chave transicionais entre mamíferos terrestres e as primeiras baleias verdadeiras. Uma das mais interessantes modificações está na região do ouvido. Nas baleias, este é modificado para a audição embaixo d’água. No Pakicetus, a região do ouvido é intermediária entre a encontrada nos animais terrestres e nos completamente aquáticos.

Um pouco mais recente, outra forma chamada Ambulocetus (Figura 1.3B) já consistia em um animal anfíbio. Seus membros eram equipados com dedos e pequenos cascos, mas suas patas posteriores eram adaptadas para natação. A análise funcional do seu esqueleto mostra que ele podia se locomover em terra, bem como nadar com o auxílio de suas patas traseiras e sua cauda, como os castores fazem atualmente.

Por sua vez, o Rhodocetus (Figura 1.3C), cujo fóssil foi datado em 47 milhões de anos, evidencia um aumento na adaptação a um ambiente marinho. Suas vértebras do pescoço eram mais curtas, o que lhe dava menor flexibilidade, mas o tornava mais estável – uma adaptação para o nado também vista em outros animais aquáticos, como o peixe-boi. A região do ouvido era mais especializada para a audição subaquática e suas pernas eram desenganchadas da pélvis, mostrando sua desconexão com a locomoção terrestre.

O Basilosaurus (Figura 1.3D), entre 40 e 37 milhões de anos atrás, era um animal com cerca de 18 metros, claramente adaptado ao ambiente aquático, que nadava pelos mares ancestrais, propalado por suas nadadeiras caudais e por seu longo e flexível corpo. Mesmo assim, este animal ainda retinha um pequeno par de membros posteriores.

E estes são apenas alguns dos fósseis já encontrados que apresentam algum grau de relacionamento filogenético com os cetáceos. Nenhum deles precisa ser necessariamente um ancestral direto das baleias atuais, uma vez que eles podem ser ramos laterais da linha evolutiva, mas eles mostram o acúmulo gradual de modificações adaptativas para o ambiente aquático que levaram ao surgimento das modernas baleias.

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Figura 1.3 | (A) Fóssil de Pakicetus, que viveu entre 60 e 37 milhões de anos atrás; (B) Fóssil de Ambulocetus, que viveu por volta de 46 milhões de anos atrás; (C) Representação de um Rhodocetus, cujo fóssil foi datado em 47 milhões de anos; e (D) Reconstrução do esqueleto de Basilosaurus, que viveu entre 40 e 37 milhões de anos atrás

Fonte: Disponível em: (A) <https://commons.wikimedia.org/wiki/File%3APakicetus_Canada.jpg>. Acesso em: 22 set. 2015.(B) <https://commons.wikimedia.org/wiki/File%3AAmbulocetusNatansPisa.JPG>. Acesso em: 22 set. 2015. (C) <https://commons.wikimedia.org/wiki/File%3ARhodocetus_BW.jpg>. Acesso em: 22 set. 2015. (D) <https://commons.wikimedia.org/wiki/File%3AGidley-1913-Basilosaurus-skeleton-reconstruction.JPEG>. Acesso em: 1º ago. 2015.

Sabemos que existe uma imensa diversidade genética presente nas populações naturais, e a maneira como o homem conseguiu moldar plantas e animais domésticos segundo seu desejo ou necessidade é uma evidência muito contundente de que as espécies são entidades maleáveis. Logo, é de se esperar que, dadas as condições adequadas, essas modificações também possam ser conduzidas naturalmente pelo processo evolutivo. Embora existam diferentes raças de animais e de plantas, não foram criadas nesse processo de seleção artificial espécies diferentes desses organismos.

Qual seria a definição de espécie?

O conceito mais tradicional é aquele que se baseia em características puramente morfológicas. Mas o conceito de espécie, bastante difundido entre os biólogos, concentra-se principalmente no comportamento reprodutivo: são considerados membros de uma mesma espécie organismos que se intercruzam e que produzem descendentes férteis. Levando estas duas definições em consideração, a seleção artificial já mostrou que é possível a obtenção de variantes fenotípicas tão contrastantes que um sistema tradicional desavisado poderia diferenciá-los facilmente em espécies ou até mesmo em gêneros diferentes. Algumas alterações são tão contundentes que podem dificultar ou mesmo impedir o acasalamento entre as linhagens que foram artificialmente modificadas; isso pode significar que

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nesse processo não houve nenhuma preocupação em selecionar indivíduos com comportamentos reprodutivos distintos e que limitassem o reconhecimento de parceiros em potencial.

Manter a habilidade de cruzamento é fundamental em programas de melhoramento para futuramente obter indivíduos recombinantes para novos caracteres. Mesmo acreditando que não, existem evidências de que novas espécies podem ser obtidas experimentalmente. Exemplos disso são algumas plantas ornamentais, produzidas a partir do cruzamento entre espécies distintas ou então via poliploidização. Inclusive, muitas espécies de plantas cultivadas, tais como a banana, o trigo, o café, a soja, o morango etc., evoluíram por processos naturais de poliploidização. Trabalhos na área da citogenética têm mostrado que o processo de poliploidização é um evento extremamente comum em plantas selvagens, tendo sido importante no processo evolutivo desse grupo.

Contudo, o próprio conceito de espécie exige, de alguma forma, a manutenção dos indivíduos dentro de algum tipo de categoria. Acontece que o processo evolutivo não é algo que simplesmente aconteceu no passado ou que ocorrerá no futuro. Ele é um evento que está em franco desenvolvimento, e existe na natureza uma série de exemplos em que o processo de especiação – a chamada mudança macroevolucionária – encontra-se em diferentes fases de conclusão.

Uma situação clássica em que o grau de diferenciação intraespecífica pode acabar se transformando em diferenciação interespecífica é observada naquilo que se convencionou chamar de especiação em anel, algo que vem sendo descrito em aves, peixes, salamandras etc. Neste caso, uma espécie começa a contornar uma grande barreira e, durante esse processo, vai sofrendo diferenciações genéticas, morfológicas, comportamentais etc. Entretanto, populações adjacentes conseguem produzir híbridos férteis em suas zonas de contato. Mas, no caso das populações do extremo oposto, quando colocadas em contato, por causa do aumento no nível do mar ou de alterações geológicas, as diferenças acumuladas ao longo dessa diferenciação ponto a ponto serão grandes o bastante para que estas não mais se reconheçam como pertencentes a uma mesma espécie.

Acesse o link e aprenda mais sobre a definição de espécie. Disponível em: <http://www.ib.usp.br/evosite/evo101/VA1BioSpeciesConcept.shtml>. Acesso em: 1º ago. 2015.Confira neste link um estudo que usa a especiação em anel como tema. Disponível em: <http://sites.ifi.unicamp.br/aguiar/publicacoes/simulando-a-evolucao-com-especies-em-anel/>. Acesso em: 1º ago. 2015.

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As diferenças entre o processo microevolutivo, que acontece dentro das populações, e o macroevolutivo, que origina novas espécies, gêneros, famílias etc., podem ser bastante sutis. Portanto, a origem de novas espécies parece não exigir necessariamente a ação de fatores ou de eventos evolutivos diferentes daqueles que promovem modificações dentro das populações, ou seja, os mesmos processos que explicam a evolução da resistência aos inseticidas dentro de uma população de coleópteros também explicam a diversidade de coleópteros do nosso planeta.

1. Quais tipos de evidências suportam a teoria evolutiva?

2. Por que as adaptações dos seres vivos não podem ser necessariamente vistas como estruturas perfeitas ou planejadas?

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Seção 2

Teorias Evolutivas

Introdução à seção

Charles Darwin, naturalista e autor do livro A origem das espécies (1859), é conhecido como o pai da evolução. A Teoria Evolutiva Moderna, de como surgiu a vida até o desenvolvimento do ser humano, tem como base o pensamento evolutivo de Darwin. Novos estudiosos em evolução conseguem provar, em parte, a teoria desenvolvida há muito tempo por ele e seus seguidores. No entanto, o que a história nos revela é que a teoria evolutiva proposta por Darwin teve raízes nas antigas escolas gregas e europeias, indo na contramão do que os filósofos daquela época divagavam sobre os seres vivos.

1.2.1 As Antigas Escolas Gregas e Europeias

A Grécia foi uma das civilizações antigas que mais influenciaram o modo de pensar no Ocidente. E, na chamada Escola Materialista, iniciada por Tales de Mileto (640?-546? a.C.)*, vemos alguns componentes da Teoria Evolutiva Moderna. O mundo físico, a matéria como base de tudo o que existe, era considerado a única coisa real no universo. Os materialistas acreditavam que mudanças físicas no corpo e no sistema nervoso causavam todos os processos mentais. Desta forma, eles negavam a existência de uma mente ou uma alma, tudo seria matéria. No entanto, Tales começou a elaborar as primeiras ideias sobre os processos evolutivos, considerando que “o mundo evoluiu da água por processos naturais”.

(*) Os pontos de interrogação representam a incerteza das datas nos registros.

Anaximandro (611?-547? a.C.), filósofo contemporâneo a Tales de Mileto, também acreditava que a vida surgiu na água, e foi além. Segundo ele, “os organismos mais complexos progrediram a partir das formas mais simples e que os humanos surgiram dos peixes, que deixaram os mares para viver em terra seca”, sendo por isso considerado o mais antigo evolucionista da história.

Como as escolas antigas contribuíram para o desenvolvimento da teoria evolutiva moderna?

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Outro filósofo que foi além dos pensamentos de Anaximandro foi Empédocles (494-434 a.C.). Ele dizia que o organismo apresentava combinações harmoniosas das diferentes partes do corpo e que eram essas combinações que faziam aquele organismo sobreviver. Além disso, dizia ele, essas combinações deveriam surgir ao acaso, depois de várias tentativas. Vemos aqui a primeira ideia do conceito que temos hoje de adaptação biológica.

Com o surgimento da Escola Clássica, os pensamentos criados na Escola Materialista foram esquecidos. O pensamento da Escola Clássica era muito complexo, teve mais adeptos e alcançou a Europa Ocidental, onde perdurou até por volta de 1700 d.C. Do ponto de vista da natureza, essa Escola enfatizava fundamentalmente a perfeição estática e final dos organismos vivos.

Platão (427?-347? a.C.) e Aristóteles (384-322 a.C.) foram os dois filósofos que criaram as bases para o classicismo, sendo Platão discípulo de Sócrates (470-399 a.C.) e mestre de Aristóteles. Sua filosofia tinha como base a Teoria das Formas ou das Ideias. Para ele, existiriam dois mundos distintos: o mundo perfeito das formas, que serviria de modelo exterior para todas as coisas presentes no mundo imperfeito, que é aquele onde vivemos. Cada ser, animado ou inanimado, seria uma cópia imperfeita do que era a verdadeira essência do que estaria no mundo das ideias. No momento em que o mundo foi criado, houve a materialização de todas as formas presentes neste mundo ideal. Assim, as diferenças entre os seres não teriam valor, por se tratarem de imagens imperfeitas. Esse reflexo imperfeito, segundo Platão, seria também invariável, considerando as variações encontradas dentro das espécies de uma manifestação imperfeita do que era o ideal.

Desta forma, a Escola Clássica grega alcançou a Europa por meio de Santo Agostinho (354-430 d.C.). Ele pregava que Deus havia criado tudo a partir do nada, pois estava escrito na bíblia, mas conseguiu amarrar sua crença às ideias de Platão quando disse que antes de Deus criar o mundo a “ideia” já estava na sua cabeça. E como tudo o que Ele criara Ele havia considerado bom e apropriado, nada poderia se modificar ou extinguir. Vemos aí novamente a ideia do imutável, do invariável dito por Platão.

Santo Agostinho conseguiu juntar a concepção platônica ao atribuir as ideias eternas a Deus, mas desta forma ele restringiu o pensamento livre na evolução ou na extinção dos seres vivos.

São Tomás de Aquino (1225-1274) conseguiu juntar o pensamento de Aristóteles com o Cristianismo, assim como Santo Agostinho havia feito com Platão. Para São Tomás havia uma Teologia Natural, fruto da razão e da observação, como pregava Aristóteles, e uma Teologia Revelada, dita por Deus diretamente na Bíblia. Estas duas verdades se sobrepunham, tornando-se possível concluir que as causas dos fenômenos ou eram pela vontade divina ou para um “propósito final” para que o evento ocorresse. Contudo, ao adotar este raciocínio, nenhuma ênfase poderia ser

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dada aos mecanismos que determinam a ocorrência dos fenômenos.

Aristóteles descrevia uma escada ascendente da vida, desde as plantas e os animais até o homem, chegando a um Deus que representaria o ápice da existência. São Tomás então acrescentou a essa escada os anjos e outros seres espirituais que ficariam alocados entre os homens e Deus. Séculos depois, Carolus Linnaeus (1707-1778) estabeleceu os rígidos critérios de classificação dos organismos, segundo esta Scala Naturae ou Grande Escala dos Seres. Uma vez que todos os elos fossem descobertos, toda a sapiência divina seria revelada e reconhecida. Linnaeus foi o pai da Taxonomia, escreveu os livros Systema Naturae (1735) e Species Plantarum (1753), além de ter estabelecido a nomenclatura binomial utilizada até hoje na designação das espécies. Ele também reconheceu três reinos distintos (Animalia, Plantae e Mineralia), que foram divididos hierarquicamente em classes, ordens, gênero e espécies. Seu trabalho representa o melhor da tradição clássica. Nele, cada espécie seria uma criação imutável de Deus, sendo reflexo de um tipo divino imutável.

1.2.2 As Escolas Nacionalistas Europeias

Descobertas no campo da astronomia, o ressurgimento da botânica, a Reforma Protestante e as Revoluções Francesa e Industrial contribuíram de maneira significativa para o fim da Escola Clássica Europeia. Após a Revolução Francesa, por ser um período conturbado, verificou-se o isolamento das ideias e o surgimento de duas novas e principais frentes de pensamento que substituiriam a Escola Clássica: a Escola Ambientalista na França e a Teologia Natural na Inglaterra.

Escola Ambientalista

Teve um papel fundamental de expandir o pensamento evolutivo e enfatizava a importância das influências ambientais sobre os organismos. A adaptação foi o foco principal dessa Escola, sendo que, especialmente no século XIX, foram propostos vários mecanismos adaptativos. Para os ambientalistas, o clima era o fator principal envolvido na resposta adaptativa.

Georges-Louis Leclerc, Conde de Buffon (1707-1778), em seu trabalho mais famoso Histoire naturelle, générale et particulière, publicado entre 1749 e 1778, considerava as similaridades entre os humanos e os grandes macacos, bem como a possibilidade de compartilharem uma ancestralidade em comum. Buffon foi também um dos primeiros a notar que os animais eram adaptados a seu ambiente e os via como produtos evolutivos do clima que eles experimentaram.

Jean-Baptiste Pierre Antoine de Monet – Cavaleiro de Lamarck (1744-1829) – foi discípulo de Buffon e escreveu importantes obras como Système des Animaux Sans Vertèbres (1801), Philosophie Zoologique (1809) e Histoire Naturelle des Animaux

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Sans Vertèbres (1815). Em seus estudos, Lamarck acreditava que ao longo de muito tempo as condições terrestres sofreram grandes transformações, de modo que os seres que a habitavam tiveram de se adaptar a essas mudanças. Sua ideia central era a de que a evolução seria obra da natureza, que utilizaria recursos infinitos para produzir as espécies. Além disso, os dois componentes principais envolvidos nesse processo seriam o tempo e as condições ambientais favoráveis, e os efeitos destes fatores determinariam a transformação progressiva dos organismos, que se fortaleceriam pouco a pouco, diversificando-se e dando lugar às mudanças a serem transmitidas à descendência.

Dois aspectos importantes podem ser levantados sobre a concepção de Lamarck. O primeiro deles está relacionado ao que hoje conhecemos sobre os mecanismos de mutação genética herdável. Lamarck afirmava existir uma força, um mecanismo interno desconhecido que levaria a espécie a produzir descendentes diferentes dele próprio. Embora Lamarck acreditasse que era obra da adaptação ao ambiente, hoje sabemos que esses mecanismos ocorrem totalmente ao acaso.

Lamarck também acreditava que as características seriam individuais e que seriam adquiridas durante o desenvolvimento da espécie: aquelas que seriam usadas plenamente pelo organismo seriam passadas aos descendentes e aquelas que não fossem úteis seriam perdidas.

Teologia Natural

Com base na filosofia aristotélica, esta Escola foi responsável por enfatizar o desígnio proposital da natureza como um todo, ou seja, afirmava que todo ser vivo não poderia ter surgido sem que tivesse havido uma intenção ou propósito. Assim, a natureza revelaria a existência de um projetista altamente benévolo, que teria criado todas as coisas de modo a funcionarem corretamente.

O Pensamento Teológico Atual

A teleologia relata que a natureza teria sido planejada por um agente que poderia internamente modelar ou imaginar vários futuros alternativos, ou seja, com intenção, propósito e previsão. Um movimento antievolucionista estadunidense, conhecido como planejamento inteligente, ou simplesmente ID (Intelligent Design), tem se utilizado de uma perspectiva semelhante ao argumento teleológico. Conhecido como princípio da irredutibilidade ou complexidade irredutível, afirma que um sistema complexo não pode funcionar sem suas partes, ou seja, algumas estruturas dos seres vivos não poderiam ter evoluído passo a passo a partir de antecessores mais simples.

As Escolas Catastrofistas e Uniformitaristas

Existiam duas correntes científicas principais que abordavam de maneira diferente a possibilidade de extinção das espécies, chamadas de Uniformitarismo e Catastrofismo.

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O Uniformitarismo, uma corrente de pensamento defendida pelo fazendeiro e cavalheiro escocês James Hutton (1726-1797), pregava que as taxas de mudanças geológicas eram constantes ao longo do tempo. Seus achados sobre o ritmo das erosões o haviam convencido de que os processos geológicos eram extremamente lentos, o que exigia que a Terra fosse muito velha para que eles fossem completados. Três obras principais foram escritas defendendo esta linha de raciocínio. Em 1788, Hutton publicou suas ideias no livro Teoria da Terra; em 1795, Teoria da Terra com Provas e Ilustrações, em dois volumes; em 1799, Princípios de Agricultura, que foi um breve e claro relato sobre a seleção natural.

Segundo a corrente Catastrofista, defendida pelo filósofo, naturalista, zoólogo e anatomista francês Georges Cuvier (1769-1832), a Terra era jovem e as taxas de mudanças no planeta tinham sido muito maiores nos períodos mais remotos de sua existência. Esse pesquisador, bem como seus seguidores, estudavam a anatomia dos animais visando descobrir o plano fixo fundamental pelo qual eles foram projetados. Cuvier acreditava que cada espécie tivera uma origem separada e assim permaneceu sem nenhuma mudança até se extinguir. Para Cuvier, os organismos não seriam conectados entre si por nenhuma transformação evolutiva. Portanto, as similaridades entre eles se relacionariam apenas às funções semelhantes, e não à existência de um ancestral em comum.

1.2.3 Darwin e a Evolução

Charles Robert Darwin nasceu em Shrewsbury, Inglaterra, em 12 de fevereiro de 1809. Filho de uma família tradicional, desde pequeno ele parece ter mostrado inclinação pela natureza e pela ciência, hábito este incentivado por seu pai e seu irmão mais velho, Erasmus. Em 1925, junto a esse irmão, foi estudar medicina em Edimburgo. Lá conheceu o zoólogo Robert Edmond Grant (1793-1874), que acabou se tornando seu mentor. Grant afirmava claramente sua crença de que as espécies descendiam de outras, aperfeiçoando-se à medida que iam sofrendo novas modificações. Foi Grant quem contou a Darwin sobre a existência dos naturalistas franceses, entre eles, Lamarck, que também acreditava na evolução das espécies.

Com o abandono do curso de medicina pela falta de talento, ele retornou à casa de sua família em 1827. Entretanto, de acordo com a preferência paterna, a segunda opção profissional para Darwin seria a de clérigo da Igreja Anglicana. Por isso, ele foi para a Universidade de Cambridge, onde seu interesse por história natural continuou a existir. Lá, entre os períodos de completa vadiagem, Darwin costumava buscar a companhia de professores que tinham uma orientação mais científica, acumulando conhecimentos nas conversas que mantinha com eles.

Em 1831, surgiu a oportunidade de Darwin. O capitão Robert Fitz Roy precisava de um indivíduo de família tradicional que pudesse bancar suas próprias despesas

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e que o acompanhasse em uma longa viagem ao redor do mundo, em seu navio de levantamento marinho, o H.M.S. Beagle. Henslow então recomendou Darwin como naturalista desta expedição. Como o atributo mais importante para a ocupação do cargo de naturalista desse navio era a origem social do pretendente, e não sua qualificação profissional, Darwin foi aceito.

O Beagle partiu de Plymouth em 27 de dezembro de 1831, retornando em 2 de outubro de 1836. Nessa viagem, que durou quase cinco anos, navegou pelo mundo, percorreu regiões como a costa atlântica e pacífica da América do Sul, algumas ilhas do Pacífico, Austrália etc. Em sua viagem, Darwin presenciou terremotos, encontrou fósseis de animais gigantes extintos e de animais marinhos a milhares de metros acima do nível do mar, notou a existência de um padrão de distribuição das espécies nas diferentes regiões do planeta, visitou ilhas vulcânicas, como as do arquipélago de Galápagos, entre outras coisas. Parece pouco, mas isso tudo acabou provocando uma mudança significativa em sua forma de enxergar a natureza.

Depois que voltou, Darwin enviou os fósseis e os espécimes coletados durante sua viagem para diferentes especialistas. Tempos depois, as respostas destas análises começaram a chegar. Foram essas respostas que instigaram Darwin a pensar na possibilidade de evolução das espécies.

O ornitólogo John Gould (1804-1881) ficou encarregado dos espécimes de aves coletados em Galápagos. Para Darwin, por causa das diferenças contrastantes no formato de seus bicos, esses animais deveriam pertencer a espécies muito distintas. Inclusive, ele supunha que várias espécies delas tivessem chegado a Galápagos a partir da América do Sul. Mas, para sua surpresa, de acordo com Gould, embora tivessem bicos diferentes, as aves coletadas por Darwin eram todas tentilhões.

Darwin começou a se perguntar: por que existiria tanta variação nessas aves em ilhas tão próximas e tão semelhantes? Ele então hipotetizou que, no passado, uma pequena população de pássaros deveria ter colonizado Galápagos a partir do Continente Sul-Americano. Essas populações se expandiram nesse novo hábitat e, subsequentemente, as subpopulações foram colonizando outras ilhas. Com o isolamento físico entre essas subpopulações, elas divergiram o bastante para se tornarem espécies distintas. Para Darwin, as semelhanças morfológicas e a distribuição de espécies relacionadas nas diferentes ilhas deveriam ser consequência lógica de uma descendência com modificação. Isso também poderia ter acontecido com as outras espécies de animais habitantes dessas ilhas, tais como tartarugas, iguanas e plantas. Talvez eles não tivessem sido criados em sua forma atual, mas, sim, tivessem evoluído!

Uma série de fatores fez que Darwin começasse a questionar sua própria concepção de uma natureza composta por espécies fixas e imutáveis – algo predominante na Inglaterra Vitoriana. Entre eles, vale destacar algumas ideias já lançadas em sua época.

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Por exemplo, no início de 1800, graças a Richard Owen e a Georges Cuvier, ocorreu o desenvolvimento da anatomia comparada e do conceito de homologia para o padrão de construção e posição de ossos e tecidos dos vertebrados. Além disso, nesse mesmo período, o francês Jean Louis Rodolphe Agassiz (1807-1873) havia feito observações sobre a similaridade entre os embriões de vertebrados, desde peixes até humanos, principalmente nos estágios iniciais de desenvolvimento.

Para esses pesquisadores, essa homologia era em razão do compartilhamento dos mesmos padrões de desenvolvimento. Fósseis de organismos marinhos haviam sido descobertos nos Andes da América do Sul, nos Alpes Europeus, no Grande Canion Americano etc., ou seja, em regiões não mais banhadas pelos oceanos. Isso indicava que a Crosta Terrestre sofrera modificações drásticas ao longo do tempo. Ele mesmo havia presenciado tais descobertas em sua viagem no Beagle.

Em 1801, Cuvier publicou uma lista de 23 espécies fósseis que não mais existiam ou que, pelo menos, não haviam sido encontradas vivas pelos cientistas que viajavam mundo afora. Em sua lista estavam os mastodontes e outras grandes criaturas, escavadas de rochas da bacia de Paris, que dificilmente passariam despercebidas caso ainda perambulassem por lá. Na época em que Darwin escrevia seu livro, várias espécies animais e vegetais estavam sendo encontradas em camadas de rochas formadas em diferentes tempos geológicos e lugares, indicando que espécies tinham sido extintas ou que linhagens haviam se modificado ao longo do tempo.

Inclusive, no início de 1800, William Clift, um paleontologista que trabalhou com marsupiais na Austrália, foi o primeiro a publicar a observação – depois confirmada e expandida por Darwin – de que os fósseis e os organismos vivos de uma mesma região geográfica eram mais relacionados entre si do que com os organismos encontrados em outras regiões.

A Hipótese de Darwin

Buscando uma forma de explicar como as espécies se modificavam, Darwin encontrou, em setembro de 1838, um ensaio sobre o crescimento populacional, escrito pelo vigário e economista inglês Thomas Malthus (1765-1834). De acordo com Malthus, se a população de um país não fosse contida pela fome e doença, em poucos anos poderia haver um crescimento populacional explosivo. Já a oferta de alimentos, mesmo considerando a possibilidade de expansão das áreas cultivadas, sempre cresceria em proporções aritméticas. Deste modo, a disponibilidade de alimentos ao longo do tempo poderia se tornar mais e mais escassa, enquanto o crescimento populacional descontrolado poderia resultar em fome, miséria e barbárie para a sociedade inglesa. Malthus também mostrou que componentes antagônicos, como fertilidade e desnutrição, que moldavam a espécie humana, poderiam ser aplicados aos animais e plantas.

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Como Darwin explicou a modificação das espécies?

Darwin se interessou pelas consequências que essas catástrofes poderiam originar nos diferentes integrantes das populações de plantas e de animais. Ele imaginou que os organismos mais bem adaptados a tais calamidades sobreviveriam e, com isso, teriam uma representação maior entre os progenitores da geração seguinte. Pela simples admissão da hipótese de que o semelhante dá origem ao semelhante, a prole desses sobreviventes superiores seria também superior, pelo menos por uma pequena margem de diferença. Havendo continuidade, geração após geração, essa “luta pela sobrevivência” resultaria na seleção natural dos descendentes mais aptos.

Uma analogia desse processo foi encontrada por Darwin na forma como os fazendeiros tratavam suas colheitas. Eles cultivavam suas plantas comparando a qualidade de cada pé ou árvore. E, então, escolhiam as sementes das melhores plantas para o próximo cultivo. Com o passar do tempo, essas plantas cultivadas se tornavam diferentes variedades, mais produtivas ou com outras características desejáveis. Contudo, a natureza não tem fazendeiros. Logo, a luta pela sobrevivência seria o fator que governaria as mudanças das espécies ao longo do tempo. Esta poderia ser representada pela disputa por água, espaço, luz, comida ou qualquer outro fator ambiental limitante.

A Hipótese de Darwin–Wallace

O aspecto principal da teoria evolutiva de Darwin-Wallace foi justamente desconectá-la completamente de qualquer intenção ou planejamento. De acordo com a hipótese desses cientistas, a evolução estaria ligada a dois fatores principais: à presença de variação herdável nas populações naturais e à sobrevivência e/ou ao sucesso reprodutivo diferencial de algumas dessas variantes. Com este raciocínio, não seria preciso recorrer a qualquer vontade externa para explicar a evolução dos organismos. Outra inovação importante foi a de que a variação encontrada dentro das espécies não poderia mais ser encarada como uma imperfeição, um defeito ou ruído, como concebia o pensamento platônico, mas, sim, como a matéria-prima para o processo evolutivo. Mais ainda, Darwin incorporou à evolução biológica a ideia de evolução via ancestralidade em comum, ou seja, as espécies iriam se ramificando e se modificando ao longo do tempo a partir de espécies ancestrais, um conceito bastante diferente daquele defendido por Lamarck.

Mesmo que tenha sido primordial para o desenvolvimento de uma nova forma de visão da natureza, a teoria Darwin–Wallace carecia de fundamentação básica sobre o mecanismo pelo qual a variação era produzida e herdada. Por exemplo, Darwin, bem como seus seguidores – que passaram a ser chamados

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de “Darwinistas” –, acreditava no Uniformitarismo. Como visto anteriormente, esta teoria propunha que as mudanças que ocorriam tanto na Terra como nas espécies eram gradativas, sem transições abruptas nem intervenção externa ou divina.

Alguns estudos daquele período sobre a hereditariedade de determinados caracteres mostravam que a herança ocorria de maneira contínua, ou seja, as diferenças entre os indivíduos também eram gradativas. Uma das principais consequências desta linha de raciocínio seria a de que, em poucas gerações, todos os indivíduos de uma mesma população seriam geneticamente idênticos. Para Darwin, isso era um problema muito sério, uma vez que um mínimo de variação herdável entre os indivíduos era requisito fundamental para que sua teoria de seleção natural fosse cientificamente sustentável.

Para explicar a variação presente nas espécies, Darwin se utilizou de duas teorias preexistentes, a Teoria da Pangênese e a Herança dos Caracteres Adquiridos, com o objetivo de explicar como a variação herdável seria reposta nas espécies. Esse foi um dos motivos que fizeram que, no final do século XIX, a teoria Darwin–Wallace fosse pouco aceita pelos cientistas. Não é que eles ainda refutassem a possibilidade de evolução biológica; na verdade, eles não conseguiam enxergar a seleção natural como a força motriz do processo evolutivo. Essa visão foi se modificar somente no século seguinte, como veremos a seguir.

O Neodarwinismo

Somente depois da virada do século XIX, quando a genética mendeliana, a genética de populações, a citogenética, entre outras áreas, começaram a ser mais bem compreendidas, é que a teoria da seleção natural voltou novamente a ser levada a sério.

Em 1908, o teorema desenvolvido por Godfrey Harold Hardy e Wilhelm Weinberg elucidou o comportamento dos genes nas populações, mostrando que as proporções dos alelos seriam preservadas ao longo das gerações. Isso significaria que, em condições naturais, não haveria uma tendência de perda da variação genética nem de favorecimento ou desfavorecimento de determinados tipos de alelos pelo fato de esses serem simplesmente dominantes ou recessivos, como alguns acreditavam na época. Isso fez com que muitos pesquisadores começassem a perceber que a única maneira conhecida de se alterar a frequência de um alelo em uma população é se ele sofresse a ação da seleção natural.

Entre 1936 e 1947, graças à contribuição de pesquisadores de diferentes áreas, surgiu a Moderna Teoria ou Teoria Sintética da Evolução ou, simplesmente, Neodarwinismo. E, ao longo do século XX, esta teoria foi sendo reforçada com novas ideias e descobertas. Atualmente, os principais aspectos que a fundamentam são:

A variação genética contínua tem a mesma base de herança mendeliana que a variação descontínua, e ambas estão sujeitas à ação dos mesmos fatores evolutivos.

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O fenótipo é resultante da interação do genótipo com o ambiente, e somente os caracteres herdáveis têm alguma importância evolutiva. Em organismos pluricelulares, as características adquiridas após a fecundação e que afetam apenas o tecido somático não são hereditárias e não estão sujeitas à evolução biológica.

A mutação no DNA e nos cromossomos é a fonte primária de toda a variação genética necessária à evolução. A recombinação genética promovida pela segregação cromossômica e pela permuta meiótica nos organismos pluricelulares são os mecanismos responsáveis pela ampliação da diversidade.

O nível de diversidade genética presente em determinada população também é dependente de outros fatores, tais como a reprodução sexuada e suas variantes (autogamia, alogamia etc.), o fluxo gênico, a transferência gênica horizontal etc.

A teoria de seleção natural de Darwin–Wallace é a responsável pela evolução de caracteres adaptativos, ou seja, que afetam diretamente a capacidade de sobrevivência e reprodução diferencial dos organismos. Entretanto, caracteres não adaptativos também podem evoluir por mecanismos estocásticos (casuais), conhecidos por deriva genética.

A seleção sexual possui papel importante na evolução de caracteres que, embora não sejam adaptativos em relação ao ambiente, o são em relação ao aumento na chance de sucesso reprodutivo de seus portadores.

As consequências da evolução podem envolver desde a pouca ou nenhuma diferenciação entre as populações, ou o surgimento de novas espécies e, até mesmo, a extinção.

Acesse o link e estude com detalhes tudo sobre evolução. Disponível em: <http://www.ib.usp.br/evosite/evohome.html>. Acesso em: 2 ago. 2015.

1. Quais são os dois principais aspectos da teoria evolutiva defendida por Lamarck?

2. O que dizia a hipótese de Darwin–Wallace?

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Seção 3

Seleção Natural e Seleção Sexual

Introdução à seção

A evolução por meio da seleção natural proposta por Darwin ocorre porque as adaptações encontradas nos organismos aumentam sua chance de sobrevivência e de reprodução. Por exemplo, são considerados adaptações a capacidade de fugir de predadores, os mecanismos envolvidos na habilidade de busca por alimento, a defesa contra parasitas, e assim por diante. Visto desta forma, o processo de evolução pela seleção natural se mostra bastante simples. Mas, como em toda teoria científica, há ideias que precisam ser bem compreendidas para que não corramos o risco de atribuir à seleção natural propriedades que esta não possui.

Há algumas características altamente dispendiosas presentes nos organismos que parecem não aumentar a adaptação de seus portadores ao ambiente físico e ecológico. É o que acontece, por exemplo, com a reprodução sexuada. Qual seria a vantagem evolutiva de uma característica que necessita do encontro de um macho e de uma fêmea para que sejam gerados descendentes que, devido à recombinação dos genes parentais, não terão exatamente o genótipo e o fenótipo deles? A reprodução sexuada é bastante comum entre os eucariotos pluricelulares, sendo a única forma de reprodução de boa parte deles. Portanto, alguma vantagem ela deve ter tido para se tornar tão comum quando comparada às conveniências inerentes à reprodução assexuada.

1.3.1 A Seleção Natural em Galápagos

Nas últimas décadas, o casal Peter e Rosemary Grant, assim como outros pesquisadores, tem realizado diferentes estudos com os tentilhões de Galápagos. Isso tem trazido contribuições importantes para a compreensão do papel da seleção natural na evolução desses animais.

O arquipélago de Galápagos está localizado no Oceano Pacífico, a aproximadamente 1.000 km do Equador, e é constituído por mais de 20 ilhas e ilhotas de diferentes tamanhos, compreendendo uma área total de cerca de 7.882 km2. Suas ilhas apresentam uma fauna composta por várias espécies endêmicas, porém seus habitantes mais famosos são os tentilhões. Existem 13 espécies de

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tentilhões nesse arquipélago, todas descendentes de uma espécie ancestral que deve ter emigrado do Continente Sul-Americano por volta de 2,3 milhões de anos atrás. Essas espécies apresentam diferenças significativas no formato e no tamanho do bico, o que está vinculado ao tipo de alimento ao qual estão adaptadas – larvas, insetos, aranhas, cupins e carrapatos, passando por folhas, frutos e sementes.

O casal Grant coletou uma série de informações sobre o tentilhão do solo (Geospizafortis), residente na pequena ilha de Dafne Maior. Nas análises feitas era possível notar diferenças morfológicas entre as aves amostradas. Será que haveria aí algum componente hereditário ou bicos maiores ou menores eram resultado apenas de fatores ambientais? Ao medirem a altura do bico dos progenitores e de seus descendentes, eles observaram uma correlação positiva. Quer dizer, aves de bicos maiores tinham, em média, descendentes com bicos maiores que as aves de bicos menores. Isso era um indicativo de que a altura do bico possuía um componente hereditário. Essa informação é importante pelo fato de que a evolução somente pode acontecer quando existe variação herdável nas populações naturais.

Sendo assim, a altura do bico nessa população de tentilhões preenche dois postulados de Darwin: o primeiro de que em cada espécie seriam encontradas diferenças entre os indivíduos; e o segundo de que essas diferenças teriam um componente hereditário.

Qual é a relação entre o tamanho do bico dos tentilhões e a evolução por seleção natural?

O formato e o tamanho do bico das aves permitem que estas lidem melhor com suas fontes de alimento. Podemos então considerar que o bico é uma ferramenta adaptativa importante para sua sobrevivência, como as mãos o são para os humanos. Estudos feitos com as diferentes espécies de tentilhões que se alimentam de sementes, como é o caso de G. fortis, mostraram que, de modo geral, as aves de bico grande comem sementes maiores e as de bicos pequenos, sementes menores. E a altura do bico está correlacionada ao seu tamanho – as de bico maior costumam ser mais altas, enquanto as de bico menor, mais baixas.

Os Grant mostraram que a proporção de aves com bico maior ou menor pode mudar ao longo das gerações. Em comparação a 1976, houve um leve deslocamento na quantidade de indivíduos com bico maior em relação aos de bico menor em 1978. Em 1976, foram amostrados 751 indivíduos nessa ilha, já em

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1978 sobraram apenas 90 aves desta espécie.

Estudos feitos pelo casal Grant mostraram que G. fortis apresentava uma baixa taxa de imigração/emigração. Portanto, a menor quantidade de tentilhões amostrados em 1978 estaria relacionada ao aumento da taxa de mortalidade ocorrida em 1977, provocada por uma grande seca que reduziu drasticamente a quantidade de alimento disponível em Dafne Maior.

Galápagos apresenta mudanças climáticas sazonais, alternando meses mais quentes e chuvosos com períodos mais frios e secos. Ao longo dos anos, também se observam modificações na taxa de precipitação de chuva, sendo observados anos mais chuvosos e outros mais secos.

Nas ilhas menores, como é o caso de Dafne Maior, isso acaba tendo uma grande influência sobre a oferta de alimento. Os tipos de sementes disponíveis para as aves mudam drasticamente durante os períodos de seca. As sementes menores, preferidas por esses pássaros, desapareceram rapidamente, sobrando apenas as sementes maiores de uma espécie conhecida como Tribuluscistoides. Essas sementes, além de não fazerem parte da dieta alimentar convencional de G. fortis, somente as aves com bico e corpo maiores conseguem comê-las com mais facilidade.

Desta forma, os Grant conseguiram mostrar que o desvio na proporção de sobreviventes com diferentes alturas de bico, conforme observado em 1978, não ocorreu por mero acaso. Um fator ambiental – a oferta de sementes – acabou selecionando as aves de bico maior em detrimento das de bico menor.

Portanto, os postulados 3 e 4 de Darwin podem ser aplicados a essa situação: a cada geração seria produzida uma quantidade muito grande de descendentes, e (4) a sobrevivência e a reprodução desses indivíduos não ocorreriam ao acaso – em média, teriam maior sucesso os portadores das variações fenotípicas mais favoráveis para as condições ambientais por eles enfrentadas.

Outros estudos feitos em Galápagos têm mostrado que, nos períodos em que a umidade é prolongada por mais tempo, as sementes pequenas se tornam mais abundantes. Com isso, observa-se um aumento significativo na proporção de aves de bico menor; assim, a variação climática natural observada nessa região, com alternâncias de períodos mais prolongados de seca ou de chuva, tem provocado oscilações evolutivas nas populações de G. fortis, graças à ação da seleção natural.

1.3.2 Estudando a Seleção Natural

Quando falamos de seleção natural é comum as pessoas acharem que ela provoca mudanças nos indivíduos. Entretanto, isso não é verdade, uma vez que os indivíduos nascem, crescem e morrem sem serem modificados pela seleção

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natural. Ao sermos concebidos, cada um de nós recebe material genético de nossos progenitores. Essa combinação genética que herdamos não será significativamente modificada ao longo de nossas vidas. Podemos até acumular mutações em nosso DNA, mas a maioria delas será em partes de tecidos ou de órgãos somáticos. Além disso, essas modificações ocorrerão por fatores meramente casuais e muito provavelmente não influenciarão nossa aptidão, já que a maioria delas ficará restrita às células afetadas.

Por exemplo, quando somos expostos à luz ultravioleta do Sol, podemos sofrer danos no DNA da nossa pele. Muitos desses danos serão revertidos, mas alguns deles poderão resultar em mutações que serão transmitidas para as células-filhas. De todas as células da nossa epiderme expostas à luz ultravioleta, apenas uma ou outra poderá ser afetada por uma mutação benéfica, por exemplo, uma que induza a uma maior produção de melanina. Porém, grande parte da superfície do nosso corpo continuará sofrendo os mesmos impactos da radiação ultravioleta. A exposição constante à radiação solar aumenta a chance de ocorrência de uma série de mutações nocivas. Em alguns casos, quando estas afetam o sistema de regulação do ciclo celular, podem desencadear um processo descontrolado de multiplicação dessas células, causando câncer. As mutações benéficas e as maléficas que afetam nossa epiderme não serão transmitidas aos nossos gametas. No máximo, nossos descendentes herdarão apenas a mesma capacidade que temos de sofrer mutações.

Se não são os indivíduos que mudam pela ação da seleção natural, o que muda então?

Até há pouco tempo se acreditava que a cor escura da pele humana havia evoluído em resposta ao câncer de pele. Entretanto, mutações provocadas pela luz ultravioleta que levam ao câncer normalmente têm efeito cumulativo, ou seja, são necessárias várias mutações seguidas para que um indivíduo o desenvolva. Portanto, pessoas normais de pele clara tendem a ter câncer de pele somente depois de muitos anos de exposição ao Sol. E isso costuma acontecer na velhice, depois que elas deixaram de se reproduzir.

Como veremos mais à frente, a seleção natural não tem a capacidade de operar sobre características desfavoráveis que se manifestam depois que passamos do nosso período reprodutivo. Por outro lado, estudos conduzidos por alguns pesquisadores mostraram que a luz ultravioleta pode afetar não só o nosso DNA, mas também uma substância conhecida como ácido fólico (ou folacina). O ácido

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fólico é fundamental tanto para a fertilidade de homens e mulheres como para o correto desenvolvimento dos fetos. Tanto que ele é comumente prescrito para mulheres grávidas.

Os pesquisadores Nina Jablonski e George Chaplin publicaram em 2000 um artigo sugerindo que a cor da pele deve ter evoluído. Há um tempo se sabe que as diferenças no tom de pele estão relacionadas a diferentes alelos de um ou mais locos envolvidos na produção do pigmento melanina em nossa pele. Então, suponha que em um ambiente tropical fossem encontrados humanos com diferentes tons de pele, indo da cor clara até a mais escura. Nesse ambiente, indivíduos de pele clara estariam mais expostos aos efeitos nocivos do Sol e apresentariam maior taxa de destruição do ácido fólico em seu corpo. Automaticamente, isso influenciaria sua fertilidade. Por outro lado, os indivíduos de pele mais escura estariam mais bem protegidos desses raios e não teriam afetada sua fertilidade. Assim, nesse ambiente, os indivíduos de pele escura teriam mais descendentes que os de pele clara.

Desta forma, na próxima geração haveria proporcionalmente maior quantidade de indivíduos portadores dos genes/alelos para pele escura e menor quantidade de indivíduos carregando os genes/alelos para pele clara. A ocorrência disso ao longo de várias gerações poderia levar ao desaparecimento de indivíduos de pele clara nesses grupos. É importante salientar neste exemplo que os pais de pele clara continuariam a produzir descendentes de pele clara e pais de pele escura, filhos de pele escura. A diferença, nesse caso, é que esses últimos iriam fazê-lo em maior proporção ao longo das gerações.

Sabemos que, embora o alvo da seleção sejam os indivíduos, seus efeitos são percebidos nas populações a partir de alterações que ocorrem nas frequências alélicas e genotípicas ao longo das gerações.

Por que indivíduos de pele clara foram favorecidos nas regiões com menor incidência de radiação solar?

Quando se fala de seleção natural, você já deve ter encontrado, em textos, frases como essas: “A espécie precisou se adaptar a uma nova condição ambiental” ou “O organismo teve de responder a uma nova situação”. Este é outro engano normalmente encontrado em alguns textos quanto ao motivo da ocorrência da seleção natural. Como vimos anteriormente, não mudamos nossa constituição genética de acordo com nossas necessidades ou desejos. Na África, o aumento na quantidade de indivíduos produtores de maior quantidade de melanina na pele ocorreu não porque

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isso foi necessário, mas porque indivíduos com essa característica deixaram uma maior quantidade de descendentes ao longo das gerações, ou seja, não houve nenhuma intenção de melhoria na adaptação desses indivíduos a um ambiente mais iluminado. Isso simplesmente aconteceu porque existia variação geneticamente herdável para uma maior ou menor produção de melanina e houve reprodução diferencial entre os indivíduos com essas características.

As pesquisas de Jablonski e Chaplin relatam que, quando alguns grupos humanos começaram a sair da África e a ocupar ambientes mais temperados, por volta de 70 mil a 100 mil anos atrás, isso provocou um processo evolutivo inverso. Ao mesmo tempo que a luz ultravioleta pode ser um problema de saúde, sua falta também o é. Uma pele muito escura bloqueia a luz do Sol necessária à síntese de vitamina D em nosso corpo. Esta vitamina é fundamental para a absorção de cálcio pelo nosso organismo, contribuindo para a formação dos ossos. Em um ambiente pobre em radiação solar, indivíduos de pele escura têm afetada a produção de vitamina D e, consequentemente, a formação de seus ossos e dos ossos de seus fetos.

Na situação apresentada, podemos concluir que indivíduos de pele clara são favorecidos em regiões com menor incidência de radiação solar pela capacidade de absorver energia luminosa e favorecer a formação dos ossos no organismo, ou seja, essa população de pele clara estará mais adaptada ao ambiente e poderá transmitir com maior eficiência seus caracteres à próxima geração. Porém, devemos imaginar que, ao longo do tempo, mutações ao acaso podem levar a um aumento ou a uma diminuição na produção de melanina na pele. Se alguma dessas mutações irá desaparecer ou aumentar em frequência vai depender do ambiente em que a mutação vai aparecer e da vantagem ou desvantagem que ela conferir.

Ao contrário do que muitos acreditam, a evolução pela seleção natural não leva essencialmente a uma perfeição adaptativa. Ter pele escura é vantajoso em um ambiente ensolarado, mas pode vir a ser um problema em uma região pobre em luminosidade. Ao longo do processo evolutivo, a seleção vai moldando os caracteres de acordo com a variação genética presente nas populações e as pressões exercidas pelo ambiente em que vive uma espécie. Por exemplo, a evolução do bipedalismo em nossa linhagem.

O bipedalismo foi uma solução interessante para a evolução dos hominínios, mas essa característica evoluiu de uma situação quadrúpede preexistente, ou seja, nossa postura não foi planejada, e por isso pagamos um preço bastante alto. As modificações que ocorreram na coluna, pelve, joelhos etc. dos nossos ancestrais e que permitiram o bipedalismo acabaram fazendo com que o peso de nosso corpo fosse distribuído sobre apenas duas pernas. Por esse motivo, a quantidade de indivíduos que sofrem de dores nas costas, de varizes, artrose etc. é bem maior que a esperada se continuássemos quadrúpedes. Portanto, a evolução para o bipedalismo não foi uma adaptação perfeita, como poderíamos ser levados a acreditar pelo fato de ela permanecer até hoje.

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As novas soluções adaptativas encontradas nas espécies não aparecem de maneira mágica. E, como vimos no tópico anterior, muitas vezes elas são mais parecidas com improvisações do que com arrojos de engenharia. Contudo, embora a seleção natural não seja consciente de suas escolhas, ao longo do tempo ela pode vir a produzir novos caracteres. Isso é possível porque, a cada geração, determinado conjunto de combinações gênicas será favorecido e irá se tornar predominante, enquanto outros passarão a ser raros ou mesmo desaparecerão. Desta forma, novas mutações que afetem os genes/alelos que restaram, embora sejam ao acaso, terão maiores chances de produzir determinados tipos de combinações que, antes da seleção, seriam mais improváveis de acontecer.

Com o passar do tempo é possível que um caráter selecionado em razão de certa condição ambiental e com o acúmulo de novas mutações favoráveis venha a se transformar em uma adaptação para uma nova situação, antes inexistente. O Continente Africano passou por intensas modificações geológicas nos últimos milhões de anos, provocando alterações climáticas significativas em algumas de suas regiões, atingindo de maneira diferente sua fauna e flora. O leste do continente foi uma das regiões mais afetadas, tornando-se mais seco com o passar do tempo, resultando em uma redução gradativa de sua cobertura florestal.

Tomando novamente o exemplo do bipedalismo, acreditou-se por muito tempo que essa característica evoluiu em nossa linhagem quando nossos ancestrais passaram a habitar um ambiente mais aberto, fora das florestas do leste africano. Mesmo sabendo que essa forma de locomoção tenha se mostrado altamente vantajosa, o que é comprovado pela grande quantidade de fósseis de hominínios bípedes encontrados a partir de 6 milhões de anos atrás, vimos há pouco que a seleção natural não atua dessa forma. São justamente os fósseis mais arcaicos de hominínios que comprovam a forma de ação da seleção natural. Os primeiros bípedes, que viveram por volta de 4-6 milhões de anos, ainda viviam em ambientes de floresta ou no que restou delas. Somente a partir de 2,5-2,0 milhões de anos é que uma dessas linhagens bípedes, justamente o gênero Homo, passou a viver em um ambiente totalmente aberto. Com isso, podemos perceber que a seleção natural não cria soluções para os problemas, ela apenas trabalha com as características que já estão disponíveis nas populações.

O processo de evolução pela seleção natural é algumas vezes caracterizado como um processo aleatório ou ao acaso, pelo fato de ela não ter um propósito ou um plano de longo prazo para os organismos que sofrem seu efeito. Vimos que a espécie G. fortis sofre pressões seletivas distintas para o tamanho do bico quando os anos são mais secos ou mais úmidos, de acordo com a oferta de alimento em Dafne Maior.

Se os indivíduos favorecidos pela seleção são aqueles mais bem adaptados ao ambiente, esse processo não pode ser ao acaso. E, se um caráter adaptativo aumenta em frequência com o passar do tempo, isso significa que a seleção natural é a

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responsável direta pela adaptação das espécies a seu ambiente. Então, nada é mais errado do que imaginar que a evolução pela seleção natural aconteça de maneira totalmente caótica ou imprevisível. Por este motivo, ela é frequentemente chamada de evolução adaptativa. Só precisamos entender que a seleção natural é adaptativa para as pressões evolutivas atuais, e não para as prováveis pressões evolutivas futuras.

No processo evolutivo pela seleção natural não existe uma predeterminação, também não podemos dizer que a evolução da vida seja progressiva no sentido de ela sempre caminhar em direção a um maior grau de sofisticação. Portanto, a “grande complexidade” encontrada nos vertebrados ou a famosa inteligência humana não evoluiu porque esses grupos de organismos estavam predestinados a serem assim. O fato de existir uma espécie no planeta capaz de ler e escrever não significa que esse seria o caminho evolutivo natural caso a vida voltasse ao seu estágio inicial de formação. Aliás, se houvesse alguma tendência inexorável de se aumentar paulatinamente a complexidade dos seres vivos, nosso planeta não continuaria sendo dominado por simples procariotos, fato que acontece desde a origem desses organismos, há mais de 3,5 bilhões de anos.

1.3.2.1 Seleção Sexual

Segundo Darwin, a seleção sexual seria a vantagem que certos indivíduos têm sobre outros indivíduos do mesmo sexo e espécie em relação à reprodução. Isso significa que a seleção sexual está diretamente associada a caracteres relacionados ao sucesso no acasalamento e na escolha de parceiros.

A seleção sexual afeta caracteres sexuais primários e secundários; permite a evolução de caracteres que diminuem a probabilidade de sobrevivência de seus portadores; em espécies em que há competição entre os sexos, tem como alvo predominante os machos e é mais frequente em espécies polígamas – em que um macho tem várias fêmeas. Os diferentes fatores que permitem a ocorrência da seleção sexual, ou seja, algumas das explicações atualmente existentes para o dimorfismo encontrado entre machos e fêmeas, bem como as formas mais sutis ou mais extravagantes que a competição entre indivíduos do mesmo sexo ou de sexos diferentes pode assumir, serão os assuntos tratados nesse tópico. Mas, antes, precisamos ter uma ideia de quando a reprodução sexuada apareceu.

A reprodução sexuada, segundo Stears e Hoekstra (2001), acompanhada de meiose e recombinação, parece ter surgido com os eucariotos unicelulares, entre 2 e 1,5 bilhão de anos atrás. Inicialmente, a troca de material genético entre as células não deveria exigir algum tipo de diferenciação entre elas, como acontece atualmente com os gametas femininos e masculinos dos animais. Além disso, elas seriam isógamas, ou seja, teriam o mesmo tamanho, como se observa atualmente em fungos, algas e protozoários ciliados. O acasalamento somente entre dois ou mais

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indivíduos distintos pode ter sido o primeiro passo para a diferenciação sexual. Os indivíduos somente poderiam se acasalar com outros que não fossem geneticamente idênticos. Isso seria possível graças a barreiras proteicas presentes na superfície dos gametas. O favorecimento evolutivo dessa forma de reprodução poderia ser explicado pela maior diversidade gerada por esse tipo de cruzamento, quando comparado à reprodução assexuada; pela seleção dependente de frequência; pelas desvantagens do endocruzamento em um ambiente em constante mudança, entre outros.

Com a ocorrência dos cruzamentos, a evolução pode ter seguido dois caminhos distintos: o surgimento de um número ilimitado de tipos acasalantes. Essa estratégia aumenta a chance de acasalamento entre os indivíduos, pelo fato de existir uma grande quantidade de parceiros sexualmente distintos. Outro caminho evolutivo possível seria a redução para apenas dois tipos de gametas, o que favoreceu a especialização de cada um deles.

Outro fato importante foi a especialização na produção de gametas de tamanhos diferentes. Esse foi o evento-chave que permitiu o surgimento da seleção sexual. Segundo Angus J. Bateman (1948) e Robert L. Trivers (1972), ovos ou gravidez são mais dispendiosos que ejaculação, uma vez que eles requerem mais tempo e energia de seus produtores. Como consequência, o sucesso reprodutivo potencial das fêmeas é relativamente menor que o dos machos. Quer dizer, seu sucesso está mais limitado ao número de ovos que elas possam produzir ou à quantidade de filhotes que sejam capazes de cuidar do que ao número de machos que elas possam convencer a com elas se acasalarem. Por sua vez, o sucesso reprodutivo potencial dos machos é relativamente alto e está mais limitado ao número de fêmeas que eles possam convencer a com eles se acasalarem do que ao número de ejaculações que possam ter. Isso significa que o acesso às fêmeas pode ser um fator limitante para os machos, mas o acesso aos machos não será um fator limitante para as fêmeas.

O sucesso reprodutivo das fêmeas não aumenta se elas cruzarem com um número maior ou menor de machos. Isso porque elas possuem uma quantidade máxima de ovos que podem botar e um único macho é capaz de fertilizar todos eles. Porém, o sucesso reprodutivo dos machos aumenta à medida que eles têm a oportunidade de copular com um número maior de fêmeas. Como consequência dessa assimetria na adaptação de machos e de fêmeas, temos que:

• Os machos precisam ser competitivos entre si, pois aqueles que conquistarem mais fêmeas conseguirão passar mais cópias de seus genes para as próximas gerações.

• Por outro lado, as fêmeas precisam saber escolher, pois, como seu investimento na prole é muito mais elevado, a cópula com parceiros pouco aptos pode comprometer significativamente seu sucesso reprodutivo.

Há algumas décadas, as características extravagantes presentes principalmente

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nos machos eram vistas como estruturas necessárias para o reconhecimento de indivíduos de uma mesma espécie, e não como um atributo que permitisse às fêmeas realizar uma escolha adequada de seus parceiros sexuais. Entretanto, diante de tantos efeitos desfavoráveis provocados por muitas dessas estruturas, a única maneira de se explicar por que elas evoluem seria pelo fato de que não se acasalar teria o mesmo peso evolutivo que morrer jovem. Logo, todos os mecanismos que envolvam o controle e a interpretação dos sinais enviados e recebidos por ambos os sexos são primordiais, simplesmente porque a escolha correta do parceiro é uma das decisões mais importantes a serem feitas pelos organismos que se reproduzem sexuadamente.

Podemos observar que, na natureza, existem diferentes estratégias e estruturas que evoluíram em resposta à seleção sexual. A teoria evolutiva moderna considera que essa evolução acontece em duas fronteiras distintas. Ela pode envolver a disputa entre machos para terem acesso às fêmeas, sendo esse tipo definido como seleção intrassexual, ou, então, ela pode acontecer em um nível intersexual, por meio da escolha feita pelas fêmeas por machos considerados, de alguma maneira, mais apropriados ou “atraentes”. É importante ressaltar que esses dois tipos de seleção podem ou não acontecer de maneira concomitante em uma mesma espécie. Por exemplo, a competição entre os machos por parceiras poderá ocorrer em conjunto com a escolha feita pelas fêmeas quando estas se utilizarem da habilidade competitiva dos machos como critério de escolha.

Acesse o link e aprenda mais sobre a seleção intra e intersexual. Disponível em: <http://cienciahoje.uol.com.br/colunas/cacadores-de-fosseis/cristas-chifres-e-selecao-sexual>. Acesso em: 1º ago. 2015.

É importante também entender que populações de uma mesma espécie que permaneçam isoladas por determinado período de tempo podem sofrer pressões evolutivas diferentes para caracteres ligados diretamente à reprodução. Isso acaba tendo um papel importante no processo de especiação. Por exemplo, se em uma população isolada existem fêmeas que escolhem machos com determinado ritual de corte, diferente daquele escolhido pelas fêmeas de outra população, isso pode iniciar o processo de diferenciação dessas copulações, que acabam divergindo quanto à forma de escolha de parceiros. Somando o isolamento reprodutivo ao acúmulo de mutações e modificações promovidas pela seleção natural e pela deriva genética, ao longo do tempo esses fatores podem intensificar o processo de diferenciação entre os organismos, tornando-os espécies distintas. Portanto, a seleção sexual também é um componente importante no processo que leva à origem de novas espécies.

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1. Qual é a influência do ácido fólico, segundo os pesquisadores Nina Jablonski e George Chaplin, na fertilidade de indivíduos de pele clara e escura?

2. Quais são as consequências geradas pela assimetria sexual entre machos e fêmeas?

Nesta unidade você aprendeu:

• O que é a ciência e como ela funciona.

• A diferença entre hipóteses, teses, leis e teorias científicas.

• A teoria evolutiva moderna e sua complexidade.

• As evidências circunstanciais, diretas e históricas da evolução biológica.

• Como acontece a seleção natural em Galápagos.

• A história do pensamento evolutivo.

• As escolas e suas influências no pensamento evolutivo.

• Charles Darwin e o desenvolvimento da teoria evolutiva.

• Neodarwinismo.

• Concepções corretas e incorretas sobre a seleção natural.

• Seleção sexual e origem da reprodução sexuada.

• As consequências da seleção sexual.

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Vimos até aqui como a Teoria da Evolução Biológica tem buscado explicar vários fenômenos importantes, desde a conservação da diversidade biológica até a dinâmica de transmissão de doenças. Avaliamos a construção do pensamento científico e como utilizá-lo nas diferentes áreas das ciências biológicas. Também, estudamos a definição de conceitos fundamentais para entender a complexidade da teoria evolutiva moderna e as evidências da evolução biológica.Entendemos por que Charles Darwin é conhecido como o pai da evolução. A Teoria Evolutiva Moderna, de como surgiu a vida até o desenvolvimento do ser humano, tem como base o pensamento evolutivo de Darwin. Compreendemos que a teoria evolutiva proposta por Darwin teve raízes nas antigas escolas gregas e europeias, indo na contramão do que filósofos daquela época divagavam sobre os seres vivos.Por fim, descobrimos que por meio da seleção natural proposta por Darwin ocorrem adaptações encontradas nos organismos que aumentam sua chance de sobrevivência e de reprodução. Vimos que a seleção sexual também é um processo determinante na evolução das espécies.

1. Avalie as afirmativas a seguir sobre a proposta de Ernst Mayr sobre as subdivisões da teoria evolutiva e marque V para a(s) verdadeira(s) e F para a(s) falsa(s).

( ) A teoria da inconstância das espécies explica como, ao longo do tempo, a vida em nosso planeta sofreu modificações, sendo que muitas espécies desapareceram e outras foram surgindo nesse processo.

( ) A teoria da ancestralidade em comum defende que novas espécies surgem a partir de modificações alimentares.

( ) O gradualismo explica que a evolução biológica ocorre de maneira rápida e gradual.

( ) A especiação acontece por meio da variação dentro de

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espécies, o que origina diferenças entre espécies.( ) A seleção natural esclarece como ocorre a evolução das

adaptações dos seres vivos.

Agora assinale a alternativa com a sequência CORRETA:

a) V - F - F - V - V.b) V - F - F - F - V.c) F - V - V - F - V.d) V - F - F - V - F.e) V - F - F - F - F.

2. Assinale a alternativa CORRETA sobre quais são as evidências diretas do processo evolutivo.

a) As diferenças de proteínas já sequenciadas, tais como a hemoglobina dos vertebrados, também confirmam o modelo de evolução biológica. b) Alterações morfológicas produzidas pela seleção manual no tamanho do bico dos tentilhões de Galápagos.c) Outro tipo de evidência direta do processo evolutivo provém dos resultados obtidos pela seleção artificial realizada desde que os humanos começaram a domesticar animais e a cultivar plantas.d) A seleção de insetos resistentes a antibióticos pouco depois de sua utilização intensiva nas práticas agrícolas.e) A seleção de bactérias sensíveis a antibióticos pouco depois de sua utilização intensiva nas práticas laboratoriais.

3. Sobre o Neodarwinismo, analise as afirmativas a seguir e marque V para a(s) verdadeira(s) e F para a(s) falsa(s).

( ) A variação genética contínua tem a mesma base de herança mendeliana que a variação descontínua, e ambas estão sujeitas à ação dos mesmos fatores evolutivos.

( ) Em organismos pluricelulares, as características adquiridas após a fecundação e que afetam apenas o tecido somático não são hereditárias e não estão sujeitas à evolução biológica.

( ) A mutação no DNA e nos cromossomos não promove a variação genética necessária à evolução.

( ) A recombinação genética promovida pela segregação cromossômica e pela permuta meiótica nos organismos pluricelulares corresponde aos mecanismos responsáveis

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pela ampliação da diversidade.( ) O nível de diversidade genética presente em determinada

população também é dependente de outros fatores, tais como a reprodução sexuada e suas variantes.

Assinale a alternativa com a sequência CORRETA:

a) V - V - F - F - V.b) V - V - F - V - V.c) V - F - V - F - V.d) F - F - V - V - V.e) F - V - V - V - V.

4. Assinale a alternativa CORRETA sobre a seleção natural:

a) A seleção natural provoca mudanças nos indivíduos.b) A combinação genética que herdamos será significativamente modificada ao longo de nossas vidas. c) Podemos acumular mutações em nosso DNA, mas a maioria delas será em partes de tecidos ou de órgãos reprodutores.d) Os indivíduos nascem, crescem e morrem sem serem modificados pela seleção natural. e) A seleção natural altera a molécula de DNA por meio de mutações.

5. A seleção sexual afeta caracteres sexuais primários e secundários; permite a evolução de caracteres que diminuem a probabilidade de sobrevivência de seus portadores. Sobre a seleção sexual, assinale a alternativa CORRETA:

a) O sucesso reprodutivo potencial das fêmeas é relativamente maior que o dos machos.b) O sucesso reprodutivo potencial dos machos é relativamente baixo e está mais limitado ao número de fêmeas que eles possam convencer a se acasalar.c) O sucesso reprodutivo das fêmeas diminui se elas cruzarem com um número maior ou menor de machos.d) O acesso às fêmeas pode ser um fator limitante para os machos, mas o acesso aos machos não será um fator limitante para as fêmeas. e) A seleção sexual promove maior aproximação entre as espécies.

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Nesta seção, aprenderemos algumas definições e conceitos gerais para entendermos como a genética de populações avalia a variação da frequência de genes, genótipos e alelos em uma população e qual fenômeno evolutivo pode estar envolvido nesse processo.

Seção 1 | Introdução à Genética de Populações

Objetivos de aprendizagem: Esta unidade tem como objetivo apresentar a você desde os primeiros conceitos que surgiram na área da genética de populações até os conceitos mais atuais, além de sua implicação dentro do processo evolutivo.

Ao longo desta unidade, você aprenderá como surgiu a genética de populações, seus primeiros passos e a consolidação do teorema de Hardy-Weinberg, que é a base para o estudo de populações naturais dentro da área da biologia evolutiva.

Ao final, esperamos que você consiga entender quais são os fatores evolutivos que podem alterar a frequência dos alelos em uma população e saiba diferenciá-los dos eventos que ocorrem totalmente ao acaso, segundo a deriva genética.

Gabriel Marcos Domingues de Souza

Unidade 2

GENÉTICA DE POPULAÇÕES

O teorema de Hardy-Weinberg é um modelo que pode avaliar a variação da frequência de um alelo em uma população. Nesta seção, veremos como podemos encontrar dados relevantes sobre a variação da frequência genotípica ou alélica de uma população e tentar relacionar essa informação a algum fenômeno evolutivo ou verificar se essa variação se deve apenas ao acaso.

Seção 2 | Equilíbrio de Hardy-Weinberg

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Todos os seres vivos estão sujeitos a sofrer acidentes, desde catástrofes naturais até emboscadas cometidas por um grupo de predadores. Esses fatores, que podem modificar a composição genética das populações ao longo das gerações, mas de forma totalmente imprevisível, é o tema da nossa terceira seção, conhecido por deriva genética ou alélica.

Seção 3 | Deriva Genética ou Alélica

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Introdução à unidade

Alguns fatores, como seleção natural, seleção sexual, migração, mutação, deriva genética, entre outros, podem modificar a frequência de genes e genótipos. Veremos que por meio do estudo da genética de populações podemos avaliar a variação da frequência desses genes, genótipos e alelos, além de verificar qual fenômeno evolutivo pode estar envolvido nesse processo.

Um modelo amplamente utilizado, o qual avalia a diferença da frequência de um alelo em uma população, é o teorema de Hardy-Weinberg. Por meio dele podemos encontrar subsídios relevantes de qual fenômeno evolutivo pode estar relacionado à variação da frequência genotípica ou alélica de uma população ou se essa variação se deve apenas ao acaso.

Para completar o estudo da genética de populações, entenderemos as influências da deriva genética sobre as populações naturais e como ela promove a perda da diversidade genética que existe dentro das populações.

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Seção 1

Introdução à Genética de Populações

Introdução à seção

Fatores como deriva genética, seleção natural e sexual, entre outros, são responsáveis pela variação da frequência de genótipos e alelos em uma população. Essa área promissora da biologia evolutiva, chamada de genética de populações, é responsável por estudar os fatores que promovem a modificação genética nas populações e inferir se tais modificações ocorrem por meio de fenômenos evolutivos ou por mero acaso.

2.1.1 O Surgimento da Genética de Populações

Desde que o pesquisador Gregor Mendel publicou seus trabalhos em 1865, a sociedade científica passou a contar com evidências claras de como os caracteres são passados de pai para filho ao longo das gerações, quando se tem conhecimento dos caracteres existentes nos progenitores e os cruzamentos acontecem de forma controlada.

Porém, os estudos de Mendel só ganharam força no começo do século XX, quando serviu como base para o desenvolvimento de uma nova área das ciências biológicas, conhecida como genética básica ou mendeliana. Neste período, ainda não se tinha informação de como seria possível prever a movimentação dos genes em populações naturais de reprodução sexuada que não sofriam nenhuma influência humana.

Ainda no século XX, o estatístico George Yule divulgou um trabalho mostrando que, se membros de uma população F2 que segregam para um par de alelos, B e b, se intercruzassem ao acaso, eles determinariam proporções semelhantes dos três tipos de indivíduos, BB, Bb e bb, nas próximas gerações. Apesar disso, o pesquisador acabou chegando a algumas conclusões equivocadas quando tentava explicar o que ocorreria se todos os representantes de um genótipo, por exemplo, BB, fossem eliminados da população.

Outro pesquisador, William Castle, descreveu o desenvolvimento de um fundamento simples, que relacionava as frequências dos genótipos em uma população ideal composta por indivíduos que se reproduziam sexuadamente e

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se cruzavam ao acaso. Mesmo trabalhando com o fato primordial para a genética de populações, Castle não conseguiu explicar de forma aplicável seu trabalho e acabou sendo deixado de lado. O estatístico Karl Pearson elucidou os resultados esperados para uma simulação em que p = q, sendo p a frequência do alelo A e q a do alelo a, com p + q = 1, em um caso onde não acontecesse a atuação da seleção (SOUZA, 2014).

Em 1908, após um discurso de Reginald Punnett sobre a herança mendeliana no homem, o pesquisador Yule protagonizou uma discussão sobre o comportamento de um gene dominante causador da braquidactilia ao longo do tempo. Essa discussão levou Punnett a buscar uma forma de provar que Yule estava errado. Foi então que ele procurou seu amigo matemático Godfrey Hardy, que já conhecia o trabalho de Pearson e que nesse mesmo ano concluíra um estudo que versava sobre as proporções mendelianas em uma população de reprodução sexuada. Em seu estudo, Hardy relatou que a frequência com que diferentes genótipos apareceriam na geração posterior estava sujeita excepcionalmente às frequências dos alelos presentes na geração anterior, seguindo um modelo simples de distribuição binomial. Outro fator importante dos achados de Hardy é o de que, se não ocorrer nenhuma interferência na transferência desses genes, as frequências alélicas e genotípicas permanecem inalteradas ao longo das gerações (SOUZA, 2014).

Qual é a relação entre a genética de populações e a evolução?

Depois de algum tempo, descobriu-se que outro pesquisador havia chegado às mesmas conclusões de Hardy. Esse pesquisador era o médico alemão Wilhelm Weinberg, que publicou um trabalho no mesmo ano que Hardy tratando de uma pesquisa sobre a herança da gemelaridade. Isso explica por que o teorema que rege os princípios da genética de populações foi intitulado “equilíbrio de Hardy-Weinberg” (SOUZA, 2014).

2.1.2 Genética de Populações e sua Importância

O principal objetivo da genética de populações é tentar encontrar quais fatores evolutivos podem atuar sobre as populações naturais. Logo, esse campo da ciência lança mão de modelos matemáticos e estatísticos que tentam desvendar de forma empírica ou por meio de experimentos e observações quais fenômenos,

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evolutivos ou não, estão atuando em uma população. Quando resultados obtidos nos estudos não estão de acordo com aqueles previstos, esses modelos podem ser alterados ou mesmo trocados.

O desenvolvimento da tecnologia tem ajudado muito na descoberta de novas informações e na geração de dados biológicos. E, assim que se tornam disponíveis, essas informações podem ser tratadas por meio de novos modelos, com equações mais complexas para tentar encontrar as respostas mais eficazes para um problema biológico analisado. Podemos exemplificar imaginando um modelo que determine a taxa de seleção natural em uma população, porém os alelos eliminados pela atuação desse fator evolutivo podem ser compensados por meio da migração de indivíduos de populações adjacentes.

Deste modo, entendida a taxa de migração nessas populações, ela será empregada para melhorar a acurácia do modelo escolhido anteriormente, com o objetivo de demonstrar os fenômenos evolutivos atuando nesse grupo. O que podemos ver é que a genética de populações trabalha com uma análise quantitativa e qualitativa dos eventos evolutivos, permitindo elaborar previsões e testar hipóteses. Contudo, a genética de populações é hoje uma das áreas mais promissoras da biologia evolutiva, e isso se deve ao grande número de modelos existentes para integrar dados e tratar os processos que promovem a evolução.

Você se lembra do teorema de Hardy-Weinberg? Qual é a importância desse fundamento para a genética de populações?

Ao estudar um pouco da origem da genética de populações, conseguimos notar que tudo começou com a estruturação do teorema de Hardy-Weinberg. Mas, somente depois do envolvimento de vários cientistas, no início do século XX até meados dos anos 1930, ocorreram melhoras relevantes no entendimento teórico deste campo de estudos.

Atualmente, o uso da tecnologia tem proporcionado um maior emprego da genética de populações no estudo de populações naturais. Primeiramente, por causa do surgimento de novas técnicas de estudo e análise molecular, responsáveis por uma identificação mais sensível e abrangente da variabilidade genética existente nos organismos, como os marcadores enzimáticos, de proteínas e também os marcadores moleculares que analisam a molécula de DNA. Além disso, a evolução dos computadores e o aumento da capacidade de produção, processamento e

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análise de dados biológicos têm contribuído muito para a aplicação de modelos evolutivos mais complexos.

Todos esses fatores aumentam a capacidade de determinar com maior precisão a taxa de migração entre populações isoladas, o quanto existe de diversidade dentro e entre populações ameaçadas ou não de extinção, de que forma as populações formadas por organismos da mesma espécie são estruturadas e também avaliar como um processo evolutivo passado pode alterar determinados grupos de organismos.

Para entendermos melhor tudo o que foi descrito, vamos exemplificar usando a espécie humana como modelo. Se pensarmos nos diferentes grupos étnicos existentes em nossa espécie e avaliarmos apenas a morfologia, podemos até acreditar na existência de uma variabilidade genética significativa entre os diferentes grupos. Mas, se fizermos uma busca sobre estudos moleculares desses grupos, veremos que os resultados não correspondem a altercações expressivas no genoma. O que realmente se sabe é que há maior variabilidade genética dentro de etnias do que entre elas. Deste modo, pensando nos fundamentos da genética de populações, a definição de raças para a espécie humana não tem nenhum embasamento científico.

Mas, em diferentes populações de animais, os baixos níveis de diversidade genética encontrados sugerem que algumas espécies passaram, em determinado momento do passado, por um decréscimo drástico no tamanho de sua população, aproximando-se da extinção. Por exemplo, os índices baixos de diversidade genética em elefantes e leões-marinhos se devem à interferência direta do homem, que quase dizimou essas espécies com a caça exaustiva ocorrida no século passado.

Já em humanos, as informações obtidas por meio de marcadores moleculares mostram que nossa extinção quase veio a acontecer, há cerca de 70 mil anos, quando nossos antecessores, ainda vivendo no Continente Africano, sofreram a ação de um fenômeno evolutivo chamado gargalo de garrafa, que estudaremos na Seção 3 desta unidade, junto a alterações drásticas no clima do continente, provocando o quase desaparecimento dos ancestrais dos humanos modernos.

Como podem ser utilizados os dados obtidos por meio da genética de populações?

Podemos notar que os dados avaliados pela genética de populações nos permitem inferir como e por quais mecanismos os organismos evoluem e

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também nos ajudam a traçar metodologias eficazes na preservação, manutenção e recuperação do meio ambiente.

2.1.3 População Natural

Antes de nos aprofundarmos no teorema de Hardy-Weinberg precisamos entender como ocorre o fluxo dos genes em uma população ideal, ou seja, diploide e de reprodução sexuada. Nessa população, os cruzamentos aconteceriam totalmente ao acaso, o tamanho dessa população seria infinito, seriam encontrados machos e fêmeas em proporções iguais, não existiria sobreposição entre as gerações, em que nenhum descendente teria condições de acasalar com indivíduos da geração anterior, e vice-versa, e nenhum fenômeno evolutivo estaria atuando nessa população.

Figura 2.1 | Eventos genéticos que acontecem em população com cruzamentos aleatórios

Fonte: O autor (2015).

Como demonstrado na Figura 2.1, uma população dessas envolveria um grupo de indivíduos que se acasalam e seus descendentes. Em uma população com essas características, os adultos diploides (2n) formariam gametas haploides (n). Esses gametas seriam os agentes responsáveis pela constituição do genoma da geração seguinte, e eles se juntariam ao acaso para constituir os zigotos (2n). Os zigotos se desenvolveriam e iriam compor a nova geração de adultos (2n).

Agora, se levarmos em consideração o teorema de Hardy-Weinberg, há dois itens fundamentais para entendermos a composição genotípica da geração posterior. Um deles é a frequência esperada de cada gameta que carrega um dos diferentes alelos existentes na geração parental, e o outro item se refere às probabilidades de encontros aleatórios entre esses gametas para a constituição da

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próxima geração (SOUZA, 2014).

Para compreendermos como os genes se comportam são feitas análises a partir de amostras de indivíduos nas populações naturais. Esses indivíduos são avaliados para os caracteres herdáveis, podendo ser molecular, enzimático ou morfológico, mas que possam demonstrar certo nível de variação.

Para demonstrar como se conduz um estudo de populações e correlacionar os eventos descritos na Figura 2.1 com o equilíbrio de Hardy-Weinberg, vamos criar a seguinte situação hipotética: em um rio, foi coletada uma amostra de 2 mil peixes de uma mesma espécie. Esses peixes tiveram avaliados os alelos de um lócus G, que determinava certa característica, e nossa população amostral resultou em 980 peixes de genótipo G1G1, 840 G1G2 e 180 G2G2. Estamos trabalhando, neste caso, com uma população amostral relativamente ampla, em que os encontros e cruzamentos entre o sexo oposto ocorrerão de maneira totalmente aleatória.

Para analisarmos essa situação hipotética, partiremos para a segunda seção desta unidade, na qual aprenderemos em detalhes as características do teorema de Hardy-Weinberg, assim como aprenderemos a aplicá-lo aos estudos de genética de populações.

Acesse o link, a seguir, e aprenda mais sobre a genética de populações. Disponível em: <http://www.cpafro.embrapa.br/media/arquivos/publicacoes/doc118_geneticadepopulacoes_.pdf>. Acesso em: 22 set. 2015.

1. Estudamos um pouco do histórico, das características e da consolidação da genética de populações. Com base nisso, descreva qual é a importância deste campo das ciências biológicas.

2. O objeto de pesquisa dessa área da biologia são as populações. Para isso, é importante reconhecer alguns dados importantes sobre elas. Neste contexto, responda: o que seria uma população ideal?

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Seção 2

Equilíbrio de Hardy-Weinberg

Introdução à seção

O principal objetivo desta seção é aplicar o teorema de Hardy-Weinberg ao estudo das populações e conseguir encontrar informações relevantes ao processo evolutivo das espécies. Vamos então retomar o exemplo da seção anterior: em determinado rio, foi coletada uma amostra de 2 mil peixes de uma mesma espécie. Esses peixes tiveram avaliados os alelos de um lócus G, que determinava certa característica, e nossa população amostral resultou em 980 peixes de genótipo G1G1, 840 G1G2 e 180 G2G2.

2.2.1 Aplicações do Equilíbrio de Hardy-Weinberg

Para começar nosso estudo sobre essa população amostrada, é necessário, primeiramente, estimarmos qual é a frequência relativa de cada um dos genótipos. Conseguimos fazer isso dividindo a frequência absoluta de cada grupo pelo número total de indivíduos analisados, conforme exemplificado na Tabela 2.1.

Tabela 2.1 | Frequências genotípicas absolutas e relativas

Genótipo Frequência absoluta Frequência relativa

G1G1 D = 980 d = 980/2000 = 0,49

G1G2 H = 840 h = 840/2000 = 0,42

G2G2 R = 180 r = 180/2000 = 0,09

Total N = 2000 n = 1,00

Fonte: Adaptada de Souza (2014).

Há uma maneira mais prática de se alcançar resultados iguais aos obtidos na Tabela 2.1, e veremos como fazer isso a seguir. Sabemos que uma população em equilíbrio de Hardy-Weinberg é composta a partir da combinação ao acaso dos gametas da geração anterior. Para chegar de forma mais eficaz aos mesmos resultados, utilizamos as frequências absolutas (D, H e R) ou as frequências relativas (d, h e r) dos diferentes genótipos para encontrarmos qual será a proporção de gametas que carregarão o alelo G1 ou G2 nesta população. Para interpretar os resultados, devemos analisá-los da seguinte forma: se na próxima geração

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nascerem 2.000 alevinos, é esperado que 980 (0,49 x 2.000) deles sejam G1G1, 840 sejam G1G2 e 180 sejam G2G2. Portanto, os resultados esperados são idênticos aos encontrados atualmente nesta população do rio (SOUZA, 2014).

O segundo passo consiste em usar as leis de probabilidade, particularmente a regra do produto, com o objetivo de encontrar as frequências com que os distintos casais poderão ser compostos, segundo a Tabela 2.2. Cada cruzamento irá formar uma prole de descendentes com distintos arranjos genotípicos (Tabela 2.3). Por meio do conhecimento da taxa de frequência dos acasalamentos e do tipo de descendência que cada um deles determina, é possível calcular a proporção de alevinos G1G1, G1G2 e G2G2 que nascerão na próxima geração (Tabela 2.4).

Tabela 2.2 | Frequências dos diferentes tipos de cruzamentos na população de peixes

Fêmea x Macho Frequência relativa Probabilidade

P(G1G1) x P(G1G1) = d x d = 0,49 x 0,49 = 0,240

P(G1G1) x P(G1G2) = d x h = 0,49 x 0,42 = 0,206

P(G1G1) x P(G2G2) = d x r = 0,49 x 0,09 = 0,044

P(G1G2) x P(G1G1) = h x d = 0,42 x 0,49 = 0,206

P(G1G2) x P(G1G2) = h x h = 0,42 x 0,42 = 0,176

P(G1G2) x P(G2G2) = h x r = 0,42 x 0,09 = 0,038

P(G2G2) x P(G1G1) = r x d = 0,09 x 0,49 = 0,044

P(G2G2) x P(G1G2) = r x h = 0,09 x 0,42 = 0,038

P(G2G2) x P(G2G2) = r x r = 0,09 x 0,09 = 0,008

Total = 1,00Fonte: adaptada de Souza (2014).

Tabela 2.3 | Frequências estimadas dos descendentes da população de peixes

Fêmea x MachoFrequência esperada nos descendentes:

A1A1 A1A2 A2A2

G1G1 x G1G1 = 1,0 - -

G1G1 x G1G2 = 0,5 0,5 -

G1G1 x G2G2 = - 1,0 -

G1G2 x G1G1 = 0,5 0,5 -

G1G2 x G1G2 = 0,25 0,5 0,25

G1G2 x G2G2 = - 0,5 0,5

G2G2 x G1G1 = - 1,0 -

G2G2 x G1G2 = - 0,5 0,5

G2G2 x G2G2 = - - 1,0

Fonte: adaptada de Souza (2014).

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Tabela 2.4 | Frequências dos diferentes genótipos dos descendentes da população de peixes

Fêmea x Macho ProbabilidadeFrequência dos descendentes:

p(A1A1) p(A1A2) p(A2A2)

P(G1G1) x P(G1G1) 0,240 x 1,00 = 0,240 - -

P(G1G1) x P(G1G2) 0,206 x 0,50 = 0,103 0,50 = 0,103 -

P(G1G1) x P(G2G2) 0,044 x - 1,00 = 0,044 -

P(G1G2) x P(G1G1) 0,206 x 0,50 = 0,103 0,50 = 0,103 -

P(G1G2) x P(G1G2) 0,176 x 0,25 = 0,044 0,50 = 0,088 0,25 = 0,044

P(G1G2) x P(G2G2) 0,038 x - 0,50 = 0,019 0,50 = 0,019

P(G2G2) x P(G1G1) 0,044 x - 1,00 = 0,044 -

P(G2G2) x P(G1G2) 0,038 x - 0,50 = 0,019 0,50 = 0,019

P(G2G2) x P(G2G2) 0,008 x - - 1,00 =0,008

Total 1,00 = 0,49 0,42 0,09

Fonte: adaptada de Souza (2014).

É importante ressaltar que os organismos analisados nessa população são diploides, portanto:

• indivíduos D ou d formarão somente gametas G1;

• indivíduos H ou h terão tanto gametas G1 como G2; e

• indivíduos R ou r formarão apenas gametas G2.

Utilizando o teorema de Hardy-Weinberg, podemos representar a frequência do alelo G1 pela letra p e a frequência do alelo G2 pela letra q. Vamos utilizar uma das seguintes equações para encontrar essas frequências.

e

Temos:

F(G1) = p = D + 1/2H/N = 980 + 420/2000 = 0,7

e

F(G2) = q = D + 1/2H/N = 180 + 420/2000 = 0,3

O resultado dessas equações dá as frequências relativas dos dois alelos do lócus G nesta população de peixes. Assim, podemos concluir que:

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Frequência dos gametasMasculinos

F(G1) = 0,7 F(G2) = 0,3

Fem

inin

os F(G1) = 0,7 F(G1G1) = 0,7 x 0,7 = 0,49 F(G1G2) = 0,7 x 0,3 = 0,21

F(G2) = 0,3 F(G2G1) = 0,3 x 0,7 = 0,21 F(G2G2) = 0,3 x 0,3 = 0,09

População Parental

Fenótipo/Genótipo: G1G1 G1G2 G2G2

Total de peixes: 980 840 180

Frequência genotípica: 980/2000 = 0,49 840/2000 = 0,42 180/2000 = 0,09

Número total de alelos nesta amostra:

A1 A1 A2 A2

(980 x 2) + 840 840 + (180 x 2)

Frequência alélica: A1 = 2800/4000 = 0,7 A2 = 1200/4000 = 0,3

F(G1) + F(G2) = 100% ou p + q = 1,0

No Quadro 2.1, estão os passos básicos utilizados para estimar a frequência dos alelos G1 e G2 nesta população de peixes. Em posse desses dados, temos condições de determinar as frequências com que esses dois gametas irão se encontrar para formar a próxima geração (SOUZA, 2014).

Quadro 2.1 | Como estimar as frequências alélicas de uma população de 2 mil peixes

Fonte: adaptada de Souza (2014).

Também podemos visualizar como se estima a frequência dos alelos G1 e G2 por meio do quadrado de Punnett (Quadro 2.2).

Quadro 2.2 | Quadrado de Punnett: representação do encontro entre os gametas

Fonte: Souza (2014).

Se aplicarmos agora o teorema de Hardy-Weinberg, conseguiremos encontrar os mesmos valores do Quadro 2.2 para as frequências dos diferentes genótipos, utilizando a expansão do binômio (p + q)2 = 1:

(p + q)2 = 1 → (p2 + 2pq + q2) = 1

Tomando as frequências alélicas do exemplo, teremos:

(0,7 + 0,3)2 = 1 → (0,49 + 0,42 + 0,09) = 1

Para concluir, podemos entender que, a partir do cruzamento ao acaso dos parentais, encontraremos na próxima geração:

• F(G1G1) = 0,49 ou 49%

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• F(G1G2) = 0,42 ou 42%

• F(G2G2) = 0,09 ou 9%

Se nessa população prevalecerem as principais características de uma população natural, em que os cruzamentos ocorrem aleatoriamente, e se nenhum processo evolutivo estiver agindo sobre o caráter do gene, é esperado que, na geração seguinte, de cada 2 mil alevinos nascidos, 980 sejam G1G1, 840 sejam G1G2 e 180 sejam G2G2. Podemos perceber que os resultados são idênticos aos conseguidos quando utilizamos as frequências dos diferentes tipos de encontros possíveis dos gametas para determinar o arranjo genotípico da próxima geração.

Mas, se outra população de peixes da mesma espécie tiver uma frequência de 60% de gametas transportando o alelo G1 e 40% carregando o alelo G2,

conseguimos estimar rapidamente:

(0,60 + 0,40)2 = 1 → (0,36 + 0,48 + 0,016) = 1

Avaliando os resultados obtidos, conseguimos visualizar que nesta população, em equilíbrio de Hardy-Weinberg, podemos estimar que nasçam 36% de alevinos G1G1, 48% de G1G2 e 16% de G2G2.

2.2.2 Aprendendo Mais sobre as Frequências Alélicas

Tudo o que estudamos até agora nos permite concluir que, se mantivermos as condições que deram origem a uma geração de indivíduos, por infinitas gerações, não encontraremos variações nas frequências de alelos nem de genótipos nessa população.

Normalmente, o modo como determinado gene e seus alelos se comportam não afeta o equilíbrio de Hardy-Weinberg se eles não alterarem a adaptação dos indivíduos. Portanto, não interessa se os alelos são dominantes, codominantes ou recessivos, pois a frequência desses alelos não irá se alterar, sendo eles dominantes ou recessivos. O fato de um alelo ter característica dominante não é critério para garantir que ele estará sempre presente e em maior quantidade em uma população. Um exemplo disso é pensar que olhos escuros serão sempre mais recorrentes que olhos claros, pelo simples fato de os olhos claros serem regidos por genes com alelos de efeito recessivo. Esse fato não tem muito sentido se estivermos estudando populações caucasianas de algumas regiões europeias.

Outro fato interessante no estudo de populações é saber que em uma população ampla, onde ocorram cruzamentos aleatórios, mas não se encontra em equilíbrio de Hardy-Weinberg, para restabelecer o equilíbrio é necessária somente uma geração de cruzamentos aleatórios de determinado lócus.

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Mas como isso é possível? Consideremos uma situação em que, em determinado momento, a população de peixes do exemplo anterior passe a sofrer a influência de um evento evolutivo que dizime uma grande parcela dos indivíduos G2G2. Quando analisamos novamente a população, depois de o fator evolutivo agir, vemos que a frequência de gametas contendo o alelo G1 elevou-se de 0,7 para 0,9. Assim, podemos inferir que a próxima geração de alevinos dessa população no equilíbrio de Hardy-Weinberg será constituída por:

0,81 (G1G1) + 0,18 (G1G2) + 0,01 (G2G2)= 1,0

Portanto, se esta nova geração não for atingida pelo mesmo fenômeno evolutivo que selecionou e eliminou os indivíduos G2G2 da geração anterior, as frequências dos genótipos no equilíbrio de Hardy-Weinberg serão mantidas nas gerações seguintes.

Já discutimos, no início desta unidade, que a genética de populações se consolidou com o teorema de Hardy-Weinberg. Nele, admite-se que por meio de uma única geração de acasalamentos aleatórios se definem as frequências genotípicas que seguirão as normas de uma distribuição binomial. Além disso, se nenhum fenômeno evolutivo atingir essas populações nem as frequências dos genótipos e alelos irão se alterar nas próximas gerações. A mesma premissa vale para lócus com mais de dois alelos. Vejamos um exemplo: para um lócus C que possua três alelos (C1, C2 e C3), suas frequências serão expressas da seguinte forma:

(p + q + r)2 = 1

Já a proporção dos genótipos será dada pela expansão do polinômio:

p2 + 2pq + 2pr + q2 + 2qr + r2 = 1

Se a característica que estamos analisando em uma população for regida por mais de um lócus, o equilíbrio de Harry-Weinberg irá acontecer da mesma maneira. Porém, neste caso, várias gerações de acasalamentos aleatórios serão necessárias para isso acontecer. Isso se deve à necessidade de ocorrer segregação independente e/ou permuta, e a quantidade de gerações necessária será tanto maior quanto maior for o número de loci envolvidos. Agora, quando falamos de genes ligados, estes podem demorar mais tempo para voltar a alcançar o equilíbrio. Como a ligação gênica está sujeita ao evento de permuta dos cromossomos para formar os arranjos, mais gerações são necessárias para restabelecer o equilíbrio desses loci (SOUZA, 2014).

2.2.3 Equilíbrio de Hardy-Weinberg e Teste de X2

O exemplo usado desde o início da seção nos permitiu analisar a população

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amostral de peixes e comprovar que suas frequências genotípicas esperadas e observadas no equilíbrio de Hardy-Weinberg eram exatamente as mesmas.

Mas, na prática dos estudos em genética de populações, isso dificilmente acontecerá, já que as amostras obtidas de uma população sofrem desvios ao acaso e não significativos que podem dificultar a análise dos resultados dos experimentos. Exemplificaremos agora esse tipo de caso: vamos supor que 600 peixes da população anterior, e não 2000, tivessem sido avaliados. Teríamos os seguintes valores para a frequência observada do lócus G, 294 exemplares para G1G1, o genótipo G1G2 com 240 peixes e o genótipo G2G2 com 66 indivíduos, totalizando 600 peixes.

Agora, temos de analisar, nessa amostra, se a população atual está em equilíbrio de Hardy-Weinberg para o lócus G. Para testarmos essa hipótese é necessário encontrarmos as frequências esperadas dos genótipos no equilíbrio de Hardy-Weinberg para a população amostral de 600 indivíduos. Primeiramente, vamos aferir as frequências dos alelos G1 e G2:

p = (294 + 1⁄2 x 240)/600 = 0,690

q = (66 + 1⁄2 x 240)/600 = 0,310

Se compararmos os resultados com a população maior, de 2000 peixes, veremos que as frequências estimadas de p e q foram ligeiramente diferentes, 0,7 e 0,3, respectivamente. Agora, com os dados das frequências de p e q disponíveis, temos condições de encontrar as taxas dos genótipos esperados no equilíbrio de Hardy-Weinberg:

p2 = (0,69)2 = 0,4761

2pq = 2 x 0,69 x 0,31 = 0,4278

q2 = (0,31)2 = 0,0961

Encontradas as proporções genotípicas, iremos agora ajustar esses valores e determinar a frequência esperada de indivíduos de cada genótipo, por meio da multiplicação da proporção genotípica pelo número total de indivíduos da população, como ilustrado a seguir:

• F(G1G1) = 0,4761 x 600 = 285,66

• F(G1G2) = 0,4278 x 600 = 256,68

• F(G2G2) = 0,0961 x 600 = 57,66

Na Tabela 2.5, estão dispostos os dados das frequências observadas e esperadas de cada genótipo para nos ajudar na visualização e comparação dos resultados.

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Tabela 2.5 | Comparação entre a frequência observada e esperada na população de 600 peixes

Genótipo Observado Esperado

G1G1 294 285,66

G1G2 240 256,68

G2G2 66 57,66

Total N = 600 600,00Fonte: adaptada de Souza (2014).

Analisando a Tabela 2.5, podemos detectar diferenças entre os valores esperados no equilíbrio de Hardy-Weinberg e aqueles observados na amostra. Se considerarmos o genótipo G1G2, temos 240 indivíduos, mas o valor esperado era de 256,68.

Essa discrepância entre os resultados esperados e observados pode acontecer simplesmente por um erro amostral. Fato que podemos entender se o compararmos ao erro que acontece ao lançarmos uma moeda 100 vezes e obtermos como resultado 57 caras e 43 coroas, uma vez que o esperado era obtermos 50 caras e 50 coroas, segundo o modelo probabilístico.

Porém, se essa população estiver sob a ação de algum fenômeno evolutivo – como o endocruzamento, que promove um aumento de indivíduos homozigotos e decréscimo de heterozigotos, ou a seleção natural, responsável por favorecer determinado(s) genótipo(s), como já visto –, os indivíduos homozigotos G1G1 e G2G2 serão encontrados em quantidades maiores que a esperada.

Como saber qual fator está provocando a diferença entre as frequências observadas e esperadas?

Agora, precisamos de uma estratégia para encontrarmos o fator associado à variação das frequências genotípicas na população. Para isso, é necessário que eliminemos da análise uma das possibilidades levantadas como a de desvio ao acaso pelo simples fato de ocorrer erro amostral versus o desvio devido a eventos evolutivos, como a seleção natural, ou endocruzamento ou a outro fator não aleatório. Para isso, usamos um teste estatístico apropriado para o caso, e uma das análises estatísticas mais comuns é o teste de qui quadrado de aderência ou, simplesmente, X2 (SOUZA, 2014).

Esse teste admite a comparação entre as frequências observadas de determinado

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experimento e as frequências teóricas, calculadas matematicamente, para o mesmo número de dados da amostra. Segue a equação usada no teste de X2:

Em que d é o valor do desvio encontrado entre os valores observados (o) e os esperados (e):

d = o – e

Se aplicarmos o teste de X2 para nossa amostra populacional de 600 peixes, teremos:

Tabela 2.6 | Valores dos desvios entre as frequências observadas (o) e esperadas (e) e do X2

Genótipo Observada (o) Esperada (e) Desvio (o-e) d2/e

G1G1 294 285,66 8,34 0,2434

G1G2 240 256,68 -16,68 1,0839

G2G2 66 57,66 8,34 1,2063

Total N = 600 600,00 0,00 2,5336

Fonte: adaptada de Souza (2014).

Para verificar a significância ou não do X2 obtido recorremos a uma tabela de contingência contendo os X2 críticos (representados por x2c) – Tabela 2.7. Habitualmente, é usado o nível de significância alfa de 0,055 (ou 5%). Outro valor a ser determinado no teste é o de graus de liberdade que usaremos nesta comparação de X2 (SOUZA, 2014).

O que é grau de liberdade?

O grau de liberdade representa o número total de classes de resultados menos o número de informações necessárias para se calcular os valores esperados dessas classes. Dessa forma, para as análises estatísticas do equilíbrio de Hardy-Weinberg, perdemos n (total de classes) - 1 (total de indivíduos amostrados) -x (total de alelos amostrados - 1) graus de liberdade (SOUZA, 2014).

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Portanto, o grau de liberdade no equilíbrio de Hardy-Weinberg é dado por:

gl = n -1 – x

Em que:

• gl é o grau de liberdade;

• n é o total de classes;

• -1 pelo total de indivíduos amostrados;

• x é o total de alelos -1.

Aplicando esse conceito no nosso exemplo, teremos:

• 3 classes (G1G1, G1G2 e G2G2), ou seja, n=3.

• Dois alelos (x = 2 - 1), ou seja, x = 1.

• Portanto, gl = n -1 – x = 3 -1 – 1 = 1 grau de liberdade.

Tabela 2.7 | Limite unilateral de X2

Para trabalhar com os dados obtidos, utilizamos a tabela de X2, com nível de significância, alfa = 5% (0,05) e na linha correspondente ao número de graus de liberdade = 1. Ao consultar a Tabela 2.7 com essas coordenadas, encontraremos o valor de X2c de 3,84. Esse valor apontado pela tabela indica que qualquer desvio de X2 igual ou superior a 3,84 tem probabilidade de apenas 5% de ser devido a fatores totalmente aleatórios (SOUZA, 2014).

Em nosso exemplo temos um valor para X2 de 2,5336, que é menor que o X2c (3,84). Com isso, podemos inferir com um grau de 95% de certeza que os desvios encontrados entre as frequências observadas e as esperadas para os três

Fonte: adaptada de Souza (2014).

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genótipos são provocados por fatores puramente eventuais, ou seja, as diferenças existentes se devem a erros amostrais. Portanto, assumimos que a população está em equilíbrio de Hardy-Weinberg para o lócus avaliado e que nenhum fenômeno evolutivo está atuando sobre o gene estudado.

É importante entendermos os resultados encontrados, pois isso nos permite sugerir apenas que esta amostra da população se encontra em equilíbrio de Hardy-Weinberg para o lócus testado. No entanto, não podemos garantir que em outros lócus do genoma desses animais esteja acontecendo o mesmo processo.

2.2.4 Particularidades ao Usar o Teste de X2

Em uma situação onde apenas 1 grau de liberdade está disponível para verificar a significância do ajuste do modelo, o teste de X2 só poderá ser aplicado em experimentos com um tamanho amostral maior que 40 indivíduos. Se a amostra tiver entre 20 e 40 indivíduos, o teste só poderá ser feito se as frequências esperadas em todas as classes avaliadas forem maiores ou iguais a 5. No caso de uma ou mais classes exibir uma frequência esperada menor que 5, ou se a amostra for menor que 20, indica-se trabalhar com o teste exato de Fisher.

Já nas situações em que exista mais de 1 grau de liberdade disponível, é importante lembrar que nenhuma das classes poderá ter valor menor que 1 e que o número de classes com valores esperados menores que 5 não poderá ultrapassar 20% do número total de classes. Se isso acontecer, é preferível reformular a tabela, somando, por exemplo, as classes vizinhas.

Quando analisamos lócus de efeito dominante, genes cujos alelos exibam codominância ou dominância incompleta indicam a possibilidade de associação dos genótipos heterozigotos e homozigotos a seus fenótipos. Esse fato admite estimar com maior acurácia as frequências de p e q. Com isso, sobram graus de liberdade suficientes para a aplicação do teste estatístico de aderência, no caso, o X2. Mas, quando a característica analisada é controlada por genes cujos alelos têm efeito dominante/recessivo, alguns fatores complicadores dificultam sua análise (SOUZA, 2014).

Aprenda mais sobre testes estatísticos práticos acessando o link a seguir:Disponível em: <http://www.forp.usp.br/restauradora/gmc/gmc_livro/gmc_livro_cap19.html>. Acesso em: 30 ago. 2015.

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Para ilustrar esse fato, vamos criar uma situação hipotética em que uma característica controlada por um alelo X dominante promova o surgimento da cegueira nos indivíduos, mas sua frequência é muito rara na população humana. Apesar disso, considere que, em uma população hipotética, foram obtidos os seguintes números:

Característica Genótipo Observado

Cegueira X_ 5

Visão normal xx 995

Total 1.000

Na situação demonstrada, temos apenas duas classes de fenótipos, pois há como diferenciar os cegos homozigotos dos heterozigotos. Esse fato dificulta medir as frequências dos alelos p e q. Apesar disso, é possível obter alguns dados sobre as frequências dos alelos e dos genótipos se analisarmos que:

• A população analisada está em equilíbrio de Hardy-Weinberg para a cegueira/visão normal.

• As informações das amostras não apresentam nenhum desvio ao acaso, e as frequências esperadas e observadas são as mesmas.

Se todas as premissas forem corroboradas, teremos as frequências observadas e esperadas, no equilíbrio, absolutamente idênticas, como descritas a seguir:

Característica Observado Esperado

Cegueira (H + D) 5 p2 + 2pq

Visão normal (R) 995 q2

Total (N) 1.000 1,0

Se observarmos este quadro, fica fácil perceber que os 995 indivíduos com visão normal são homozigotos recessivos. Podemos aplicar a fórmula usada para encontrar a frequência genotípica de xx, em que:

F(xx) = q2 → = R/N → = 995/1000 → = 0,995

Agora, usamos o resultado obtido da frequência do genótipo xx; neste caso, podemos obter a frequência do alelo q a partir da raiz quadrada de q2:

q = √q2 = √0,995 = 0,9975

E para a frequência do alelo p será:

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p = 1 – 0,9975 = 0,0025

Assim, as frequências dos indivíduos com cegueira homozigotos e heterozigotos serão:

F(XX) = p2 = (0,0025)2 = 0,0000063 ou 0,0006%

e

F(Xx) = 2pq = 2x0,0025x0,9975 = 0,00499 ou 0,499%

É importante lembrar que esta forma de estimar p e q somente deverá ser utilizada quando se estiver analisando características regidas por genes com efeito dominante/recessivo, atendendo aos pressupostos de que a população analisada esteja rigorosamente em equilíbrio de Hardy-Weinberg e de que não haja nenhum tipo de desvio, mesmo que casual, entre as frequências fenotípicas esperadas e observadas (SOUZA, 2014).

Caso essas premissas não sejam verdadeiras, será introduzido um erro nas estimativas de p e q e, consequentemente, as estimativas de p2, 2pq e q2 estarão comprometidas. Portanto, em casos em que é possível distinguir homozigotos de heterozigotos, recomenda-se trabalhar com o método tradicional de estimativa de p e q e aplicar o teste de X2 aos resultados obtidos.

2.2.5 Fatores que Podem Alterar o Equilíbrio de Hardy-Weinberg

Já foi dito anteriormente que o teorema Hardy-Weinberg funciona como uma ferramenta essencial na identificação dos fenômenos evolutivos, os quais podem estar atuando nas populações naturais. Ele também possibilita determinar como certa espécie se reproduz. Os dados obtidos podem ser usados não só pelos especialistas em evolução, mas também por outros profissionais da área, como ecologistas, conservacionistas, etologistas etc. Iremos descrever os diferentes eventos que podem modificar as frequências alélicas e genotípicas nas populações.

Migração

Quando ocorre a permuta com populações vizinhas, as frequências alélicas podem ser modificadas significativamente nas populações locais de uma espécie. Mas isso será possível se as populações que estão envolvidas na migração tiverem frequências alélicas distintas umas das outras ou se a migração dos indivíduos trouxer alelos diferentes.

Podemos notar essas diferenças em populações que se tornam parcial ou

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totalmente isoladas umas das outras por um longo período de tempo. Com isso, a migração muitas vezes se comporta como um mecanismo de atraso da evolução, pois, se em determinada condição ambiental um alelo é extinto pela ação da seleção natural, ou à deriva genética, ele pode ser reinserido na população pelos imigrantes que vieram de locais onde o alelo eliminado não tenha sofrido tal efeito.

Se fizermos uma análise comparativa, a migração é que promove a variabilidade, assim como a mutação, pois novos alelos podem ser integrados em uma população. Porém, em curto prazo, o processo migratório tem maior capacidade de modificar as frequências alélicas, visto que uma quantidade maior de alelos pode ser movimentada por esse processo.

Mutação

Como sabemos, a mutação é a base inicial para originar novas variantes alélicas em uma espécie. Isso acontece pelo fato de possíveis erros espontâneos acontecerem durante a replicação do material genético ou em razão da exposição a fatores ambientais externos, tal como a radiação, que pode induzir o evento da mutação. Sua ocorrência pode variar de acordo com o tipo de gene, organismo e espécie. Em eucariotos, a taxa de mutação média para determinado gene é muito baixa, e, por causa desses valores, em curto prazo, as mutações não possuem condições de alterar o equilíbrio de Hardy-Weinberg.

No entanto, associada a outros fatores evolutivos como a seleção natural e deriva genética, as mutações recém-introduzidas podem aumentar ou diminuir sua frequência em uma população natural.

Seleção natural

Quando um genótipo apresenta maior capacidade de transmitir seus genes para a próxima geração ocorre o crescimento do número de cópias de um alelo e decréscimo na quantidade de outro, até que os indivíduos com genótipo menos favorecido sejam abolidos da população, ou seja, se levarmos em consideração que, em uma população natural, o aparecimento de uma anomalia começa a dizimar, em iguais proporções, um maior número de indivíduos de genótipo D1D1 e D1D2 do que de indivíduos D2D2, teremos o aumento do número de cópias do alelo D2 e, consequentemente, de sua frequência ao longo das gerações. A seleção natural trabalha com o fato de os indivíduos divergirem na capacidade de se reproduzir, seja por viabilidade ou por fertilidade, contribuindo, assim, com quantidades diferentes de descendentes nas próximas gerações.

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Tamanho populacional

Os genomas dos indivíduos de populações naturais, onde ocorre reprodução sexuada, não são passados de uma geração para outra sem sofrer modificações. Como já estudado em outras disciplinas, os genomas são rearranjados nos gametas por meio da segregação independente e da permuta, em uma quantidade imensa de combinações que raramente se repetem. Neste caso, todos os genes passados de uma geração a outra serão sempre uma versão amostral daqueles existentes nos progenitores. Portanto, as frequências alélicas estarão submetidas à aleatoriedade de amostras existentes nas gerações posteriores.

Para entendermos melhor, imagine uma população de tamanho finito que, por puro acaso, não produzirá todas as combinações esperadas de gametas. E, mesmo que todos os tipos prováveis de zigotos sejam produzidos, nem todos chegarão à idade adulta e se reproduzirão, também por puro acaso. Assim, a geração posterior não conseguirá manter os mesmos valores das frequências alélicas e genotípicas da geração anterior por fatores puramente aleatórios. Portanto, quando tivermos uma quantidade baixa de parentais se acasalando e produzindo um menor número de descendentes, maior será a variação dessas frequências. Essas alterações, totalmente casuais, capazes de alterar a constituição genética de uma geração para outra em uma população natural, são provocadas por um processo evolutivo conhecido como deriva genética, tema que abordaremos com maior profundidade na próxima seção.

Sistemas de acasalamento

Em uma população onde as fêmeas escolhem cruzar com um tipo específico de macho ou um macho acasala com uma quantidade maior de fêmeas que seus concorrentes, neste caso, a seleção sexual está atuando como processo evolutivo. A implicação desse fenômeno na população pode modificar de forma intensa a segregação dos genes geração após geração, provocando o crescimento na frequência genotípica de homozigotos e o decréscimo dos heterozigotos.

Por meio dos experimentos de Mendel, podemos exemplificar essa situação: uma geração F1 foi submetida a sucessivas autofecundações. Os resultados desses eventos permitiram que Mendel detectasse que as taxas de heterozigotos caíam pela metade a cada geração. Vale lembrar que a autofecundação é um modelo de endocruzamento e, mesmo ocorrendo alteração nas frequências dos genótipos, provoca o desequilíbrio da população, e as frequências dos alelos permanecem as mesmas.

As frequências dos alelos de um lócus só poderão ser modificadas, por meio do endocruzamento, quando existirem alelos recessivos maléficos, os quais ficam camuflados nos indivíduos heterozigotos. Esse efeito do endocruzamento é conhecido como depressão endogâmica, pelo fato de ele levar ao surgimento de

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certa quantidade de indivíduos com baixa viabilidade e/ou fertilidade (SOUZA, 2014).

Acesse os links a seguir e entenda melhor o efeito da depressão endogâmica:Disponíveis em: <http://www.bespa.agrarias.ufpr.br/paginas/livro/capitulo%2014.pdf>. Acesso em: 28 ago. 2015.<http://www.ib.usp.br/evosite/relevance/IIIA1Inbreeding.shtml>. Acesso em: 28 ago. 2015.

2.2.6 Exercícios resolvidos

Elucidaremos, agora, em dois exercícios, como podemos utilizar os conhecimentos adquiridos nesta seção.

Exercício 1 – Em uma amostra de cães da raça Labrador, foram encontrados 120 indivíduos com pelagem preta (A1A1), 450 com pelagem marrom (A1A2) e 430 com pelagem caramelo (A2A2). Se considerarmos que o acasalamento entre esses animais ocorre totalmente ao acaso, determine as probabilidades para os diferentes casais formados, bem como a porcentagem de descendentes que surgirão para cada um desses encontros.

Para resolver esse exercício, vamos utilizar as tabelas para preencher passo a passo as informações e entender o que estamos fazendo.

Genótipo Frequência absoluta Frequência relativa

A1A1 D = 120 d = 120/1000 = 0,12

A1A2 H = 450 h = 450/1000 = 0,45

A2A2 R = 430 r = 430/1000 = 0,43

Total N = 1000 n = 1,00

Na tabela, a seguir, temos as probabilidades para os diferentes casais formados:

Fêmea x Macho Frequência relativa Probabilidade

P(A1A1) x P(A1A1) = d x d = 0,12 x 0,12 = 0,0144

P(A1A1) x P(A1A2) = d x h = 0,12 x 0,45 = 0,0540

P(A1A1) x P(A2A2) = d x r = 0,12 x 0,43 = 0,0516

P(A1A2) x P(A1A1) = h x d = 0,45 x 0,12 = 0,0540

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P(A1A2) x P(A1A2) = h x h = 0,45 x 0,45 = 0,2025

P(A1A2) x P(A2A2) = h x r = 0,45 x 0,43 = 0,1935

P(A2A2) x P(A1A1) = r x d = 0,43 x 0,12 = 0,0516

P(A2A2) x P(A1A2) = r x h = 0,43 x 0,45 = 0,1935

P(A2A2) x P(A2A2) = r x r = 0,43 x 0,43 = 0,1849

Total = 1,00

Fêmea x MachoFrequência esperada nos descendentes

A1A1 A1A2 A2A2

A1A1 x A1A1 = 1,0 - -

A1A1x A1A2 = 0,5 0,5 -

A1A1 x A2A2 = - 1,0 -

A1A2x A1A1 = 0,5 0,5 -

A1A2x A1A2 = 0,25 0,5 0,25

A1A2 x A2A2 = - 0,5 0,5

A2A2x A1A1 = - 1,0 -

A2A2 x A1A2 = - 0,5 0,5

A2A2 x A2A2 = - - 1,0

Nessa tabela temos a porcentagem de descendentes que surgirão para cada um desses encontros:

Fêmea x

MachoProbabilidade

Frequência dos descendentes

p(A1A1) p(A1A2) p(A2A2)

P(A1A1) x P(A1A1) 0,0144 x 1,00 = 0,0144 - -

P(A1A1) x P(A1A2) 0,0540 x 0,50 = 0,0270 0,50 = 0,0270 -

P(A1A1) x P(A2A2) 0,0516 x - 1,00 = 0,0516 -

P(A1A2) x P(A1A1) 0,0540 x 0,50 = 0,0270 0,50 = 0,0270 -

P(A1A2) x P(A1A2) 0,2025 x 0,25 = 0,0506 0,50 = 0,1012 0,25 = 0,0506

P(A1A2) x P(A2A2) 0,1935 x - 0,50 = 0,0967 0,50 = 0,0967

P(A2A2) x P(A1A1) 0,0516 x - 1,00 = 0,0516 -

P(A2A2) x P(A1A2) 0,1935 x - 0,50 = 0,0967 0,50 = 0,0967

P(A2A2) x P(A2A2) 0,1849 x - - 1,00 =0,1849

Exercício 2 – Utilizando as frequências fenotípicas observadas para a coloração da pelagem na amostra de cães da raça Labrador do Exercício 1:

a) Estabeleça as frequências dos alelos A1 e A2 desta amostra e as frequências genotípicas esperadas de animais com pelagem preta, marrom e caramelo no

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equilíbrio de Hardy-Weinberg.

Fenótipo/Genótipo: A1A1 A1A2 A2A2

Total de animais: 120 450 430

Frequência genotípica: 120/1000 = 0,12 450/1000 = 0,45 430/1000 = 0,43

Número total de alelos nesta amostra:

A1 A1 A2 A2

(120 x 2) + 450 450 + (430 x 2)

Frequência alélica: A1 = 690/2000 = 0,345 A2 = 1310/2000 = 0,655

A frequência alélica no equilíbrio de Hardy-Weinberg é dada por p + q = 1, em que p, que representa a frequência do alelo A1, é 0,345 e q, que demonstra a frequência do alelo A2, é 0,655, conforme observado no quadro apresentado ou usando a seguinte fórmula:

p = D + 1/2H/N e q = R + 1/2H/N

p = (120 + 1⁄2 x 450)/1000 = 0,345

q = (430 + 1⁄2 x 450)/1000 = 0,655

Agora, para encontrarmos a frequência genotípica dos animais com pelagem preta, marrom e caramelo no equilíbrio de Hardy-Weinberg, calculamos da seguinte forma:

p2 = (0,345)2 = 0,1190

2pq = 2 x 0,345 x 0,655 = 0,45195

q2 = (0,655)2 = 0,429025

Logo, devemos ajustar as frequências genotípicas esperadas para nossa amostra de 1000 indivíduos:

• F(A1A1) = 0,1190 x 1000 = 119 animais com pelagem preta.

• F(A1A2) = 0,45195 x 1000 = 451,95 animais com pelagem marrom.

• F(A2A2) = 0,429025 x 1000 = 429,025 animais com pelagem caramelo.

b) Determine, a partir de um teste de X2, se são ou não significativos os desvios obtidos entre as frequências genotípicas esperadas no equilíbrio de Hardy-Weinberg e aquelas observadas nesta amostra de animais:

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Genótipo Observado (o) Esperado (e) Desvio (o-e) d2/e

A1A1 120 119 1 0,00840

A1A2 450 451,95 -1,95 0,00845

A2A2 430 429,025 0,975 0,00221

Total N = 1000 ≃1000,00 0,00 0,01906

Os desvios não são significativos, pois o valor de X2 na amostra que estamos trabalhando de 0,01906 é menor que o X2c (3,84). Logo, podemos aceitar, com grau de 95% de certeza, que os desvios encontrados entre as frequências observadas e as esperadas para esses três genótipos são provocados por fatores meramente casuais.

1. O teorema de Hardy-Weinberg estabeleceu um modelo para estudar o comportamento dos genes nas populações naturais. Quando os valores das frequências gênicas observadas forem significativamente diferentes dos valores esperados, com base no uso do teorema, podemos concluir corretamente que:

a) A população avaliada é muito ampla e não possibilita a aplicação do teorema.

b) Fatores evolutivos não estão atuando na população, já que suas frequências não se alteraram.

c) A população está em equilíbrio de Harry-Weinberg, pois as frequências esperadas são similares às observadas.

d) A população está sofrendo a ação de algum fator evolutivo, pois as frequências sofreram alteração.

e) Os cruzamentos nessa população ocorrem totalmente ao acaso, e as fêmeas selecionam os machos para fecundar.

2. (MACK - Adaptada) A capacidade de sentir o gosto amargo, no caso do homem, deve-se a um gene autossômico dominante A e a insensibilidade, a seu alelo recessivo a. Em uma população de 1200 pessoas, as frequências dos genes A e a são, respectivamente, 0,8 e 0,2. Qual é o número

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esperado de pessoas sensíveis e de pessoas insensíveis, respectivamente, nessa população?

a) 1010 e 190.

b) 980 e 220.

c) 1152 e 48.

d) 762 e 438.

e) 960 e 240.

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Seção 3

Deriva Genética ou Alélica

Introdução à seção

A diversidade genética de uma espécie, que se origina primariamente pela mutação no material genético, é normalmente ampliada pela recombinação gerada pela reprodução sexuada e pela migração dos indivíduos ou de seus gametas entre populações. Por outro lado, ela é constantemente perdida pela ação de dois fatores distintos. O primeiro deles, não aleatório, é representado pela seleção natural. Neste caso, combinações genotípicas que afetem positivamente a sobrevivência e a reprodução de seus portadores aumentarão em frequência ao longo das gerações, enquanto as menos favoráveis acabarão tornando-se raras, podendo, até mesmo, desaparecer.

Mas nem sempre ter a melhor combinação genotípica é garantia de sucesso, pois, uma vez que estamos todos sujeitos a sofrer acidentes de percurso (uma tempestade violenta, enchentes ou o azar de não ter percebido uma emboscada feita por um grupo de predadores, entre outras coisas), isso pode selar o destino dos indivíduos mais promissores.

O segundo componente evolutivo que pode modificar a composição genética das populações ao longo das gerações, mas de maneira totalmente imprevisível, é o tema da nossa terceira seção, conhecido como deriva genética ou alélica.

2.3.1 O Que É Deriva Genética?

Por definição, a deriva genética é um evento aleatório casual ou, em termos genéticos, uma espécie de loteria mendeliana. Espera-se que ela aconteça em populações pequenas ou de tamanho finito, ou seja, sob sua ação, a transmissão dos alelos ao longo das gerações poderá sofrer a influência do acaso. Para entendermos como ela age, vamos usar um exemplo.

Considere uma população hipotética de tamanho infinito que não esteja sujeita a eventos estocásticos na transmissão dos genes ao longo das gerações – as frequências dos alelos A1 e A2 são, respectivamente, p = 0,5 e q = 0,5. Neste caso, é esperado que a próxima geração seja composta por p2 = 0,25 indivíduos A1A1, 2pq = 0,50 indivíduos A1A2 e q2 = 0,25 indivíduos A2A2. Nem mais nem menos.

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Porém, um criador credenciado tem apenas um casal desses animais, sendo ambos heterozigotos (A1A2). A frequência desses dois alelos nesses indivíduos é igual à da população em equilíbrio de Hardy-Weinberg. No nosso modelo, esse único casal produzirá apenas dois descendentes. Neste caso, podemos calcular a chance de as frequências dos alelos A1 e A2 se manterem iguais às da população original (p = q = 0,5).

A Tabela 2.8 resume quais seriam os possíveis genótipos desses dois descendentes e, por conseguinte, como ficariam as frequências desses dois alelos nessa prole. Por exemplo, os dois filhotes poderiam ser A1A1, e, desta forma, a frequência do alelo A1 seria de 100% e a do alelo A2 seria 0%, ou seja, ela seria diferente dos 50% esperados para A1 e A2, de acordo com o modelo de equilíbrio de Hardy-Weinberg. Por outro lado, se um nascesse A1A1 e o outro A2A2, essas frequências seriam mantidas.

Tabela 2.8 | Distribuição de probabilidade para as combinações dos dois filhotes produzidos por um casal heterozigoto para o lócus A

Filhote 1 Filhote 2 Probabilidade F(A1) F(A2)

A1A1 A1A1 1/4 x 1/4 = 1/16 1,00 0,00

A1A1 A1A2 1/4 x 1/2 = 2/16 0,75 0,25

A1A1 A2A2 1/4 x 1/4 = 1/16 0,50 0,50

A1A2 A1A1 1/2 x 1/4 = 2/16 0,75 0,25

A1A2 A1A2 1/2 x 1/2 = 4/16 0,50 0,50

A1A2 A2A2 1/2 x 1/4 = 2/16 0,25 0,75

A2A2 A1A1 1/4 x 1/4 = 1/16 0,50 0,50

A2A2 A1A2 1/4 x 2/4 = 2/16 0,25 0,75

A2A2 A2A2 1/4 x 1/4 = 1/16 0,00 1,00

Quando somamos todas as combinações que mantêm p = q = 0,5, ou seja, todas as probabilidades marcadas nas linhas mais escuras da Tabela 2.8, vemos que elas representam 37,5%. Portanto, a probabilidade de que essas frequências sejam alteradas é de 100 – 37,5 = 62,5%. Então, podemos concluir que é mais provável que as frequências dos alelos A1 e A2 sejam modificadas, e não mantidas, nos filhotes deste casal.

Outros casais iguais a este também poderão sofrer os efeitos dessa oscilação genética. Mesmo que o número de seus descendentes seja maior que dois, esse

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efeito ainda poderá ser observado ao longo das gerações. Isso porque nenhum casal é capaz de produzir um número infinito de descendentes. Em populações pequenas que tenham um número reduzido de indivíduos interacasalantes, também é o que se espera que aconteça com as frequências alélicas ao longo das gerações. Logo, é possível que, por puro acaso, as frequências alélicas oscilem para cima ou para baixo ao longo das gerações nessas populações.

Veja como a deriva genética pode alterar o equilíbrio de Hardy-Weinberg acessando o link a seguir:Disponível em: <http://www.sobiologia.com.br/conteudos/Evolucao/evolucao22.php>. Acesso em: 12 set. 2015.

No entanto, em populações infinitamente grandes, onde existam infinitas famílias iguais a deste exemplo, todas as combinações possíveis apresentadas na Tabela 2.8 serão preenchidas e essas oscilações individuais serão canceladas. Quer dizer, da mesma forma que existirão casais com dois filhotes A1A1, também serão esperados, em uma mesma proporção, casais com dois filhotes A2A2. Para os loci que não estejam sofrendo a ação da mutação, da migração e da seleção natural, o modelo de equilíbrio de Hardy-Weinberg deverá ser seguido.

Quando e onde, na natureza, uma espécie costuma ser composta por populações infinitamente grandes?

2.3.2 Tamanho Populacional e Deriva Genética

Vimos que em uma população de tamanho infinito a aleatoriedade na passagem dos genes de uma geração para outra não surtirá nenhum efeito nas frequências alélicas ao longo das gerações. Se um alelo não foi transmitido por determinado casal, isso será compensado por outro, que o transmitirá.

Contudo, na natureza, populações infinitamente grandes costumam não existir.

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Com isso, os efeitos da ação da deriva genética na maioria das espécies acabam sendo significativos. Por exemplo, em populações pequenas, alguns tipos de acasalamentos poderão gerar mais descendentes que outros, por puro acaso, e isso não será compensado por outros casais geneticamente semelhantes. Alguns alelos presentes nesses casais poderão ser passados em maior ou menor frequência, ou mesmo nem serem passados para a próxima geração, em razão da loteria mendeliana. Como não existe uma memória genética nas populações que as faça retornar às frequências alélicas originais, o resultado será uma geração de descendentes ligeiramente diferentes, em termos de frequências alélicas, da geração parental. E isso também acontecerá com as próximas gerações, indefinidamente, até que um, entre os vários alelos existentes, seja fixado naquela população.

Para compreendermos como o tamanho populacional influencia a transmissão dos genes ao longo das gerações, vamos retornar ao exemplo da Tabela 2.8. Considerando o casal de heterozigotos para o lócus A que produz dois filhotes, podemos perguntar qual seria a possibilidade de o alelo A1 ser fixado (p = 1,0) na próxima geração. Neste caso, basta usarmos as regras convencionais de probabilidade. A chance de um filhote desse casal nascer A1A1 é de 1/4 ou 25%. Deste modo, a probabilidade de os dois serem A1A1 é de (1/4)2 = 1/16 ou 6,25%. Mas, se esse casal tivesse 5 filhotes, a probabilidade de o alelo A1 ser fixado seria de (1/4)5 = 1/1024 ou 0,0977%. Portanto, quanto mais descendentes eles tiverem, menor será a chance de o alelo A1 ser fixado e, por conseguinte, de o alelo A2 ser perdido. Porém, entre a chance de os alelos A1 ou A2 serem fixados ou perdidos, existem infinitas possibilidades de frequências que estes poderão assumir.

Os pesquisadores Sewall Wright (1930) e Ronald A. Fisher (1931), dois dos principais responsáveis pelo desenvolvimento da genética de populações, desenvolveram um modelo que permite analisar o papel da deriva genética no processo de oscilação das frequências alélicas ao longo das gerações. O modelo é fundamentado na amostragem binomial para a realização de sorteios dos gametas a partir de uma população finita.

Mesmo que os indivíduos possam produzir um número infinito de gametas, cujas frequências alélicas serão iguais às das populações onde eles estejam inseridos, apenas 2N deles serão sorteados e unidos ao acaso para formar os zigotos da próxima geração. E, mesmo que os pressupostos sejam os mesmos do modelo de equilíbrio de Hardy-Weinberg vistos anteriormente, aqui consideraremos que as frequências alélicas poderão mudar ao longo das gerações por causa apenas da variação aleatória ocasionada pelo tamanho finito da população. Neste caso, descartamos a ação de qualquer outro componente do processo evolutivo.

Continuaremos com o lócus A e seus dois alelos, A1 e A2, em uma população diploide composta por N indivíduos, o que significa que teremos 2N cópias desses alelos, e as frequências iniciais de A1 e A2 serão p e q, respectivamente. Assim,

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caso não exista sobreposição de gerações, o número de cópias desses alelos na próxima geração derivará a partir da geração ancestral, de acordo com o modelo de distribuição binomial.

A fórmula de Wright-Fisher calcula a probabilidade de obtermos j cópias de um dos alelos que tinha frequência p na geração anterior:

Considerando que o casal A1A2 (com p = 0,5) terá N = 5 ou N = 10 descendentes, qual seria a chance de:

Termos j = 4 cópias do alelo A1 na próxima geração?

Termos j = 8 cópias do alelo A1 na próxima geração?

Aplicando a fórmula de Wright-Fisher para 2N = 5 indivíduos, teremos:

• P(4 cópias do alelo A1) = (10)! x 4!(10 – 4)! x 0,54 x 0,510 – 4 = 0,205078 ou 20,51%

• P(8 cópias do alelo A1) = (10)! / 8!(10 – 8)! x 0,58 x 0,510 – 8 = 0,0439453 ou 4,40%

E para 2N = 10 indivíduos:

• P(4 cópias do alelo A1) = (20)! / 4!(20 – 4)! x 0,54 x 0,520 – 4 = 0,0046206 ou 0,46%

• P(8 cópias do alelo A1) = (20)! / 8!(20 – 8)! x 0,58 x 0,520 – 8 = 0,120134 ou 12,01%

Antes de interpretarmos esses resultados, vale observarmos que, na população com 5 indivíduos, ou seja, 2N = 2 x 5 = 10 alelos, as 4 e 8 cópias propostas para o alelo A1 equivalerão a uma mudança de 0,5 para 4/10 = 0,4 ou 8/10 = 0,8, respectivamente. Porém, na população com 10 indivíduos (2N = 2 x 10 = 20 alelos), essa mudança será de 0,5 para 4/20 = 0,2 e 8/20 = 0,4. Dito isso, vemos que, na população composta por 5 indivíduos, existe maior probabilidade de a frequência do alelo A1 oscilar de 0,5 para 0,4 do que para 0,8. Isso é esperado porque variações mais drásticas, embora possíveis, são menos prováveis de acontecer que aquelas mais próximas dos valores encontrados na geração anterior.

Outro fator importante a ser considerado é que, na população maior, com 10 indivíduos, embora essas oscilações também aconteçam, elas deverão ser menos radicais. Logo, quanto mais aumentarmos o número de indivíduos acasalantes e o de descendentes suportados no ambiente, menores deverão ser as variações nas frequências gênicas provocadas pela deriva genética.

Consideramos no modelo anterior a oscilação ao acaso para alelos de efeito neutro, ou seja, que não afetam a aptidão dos indivíduos. Entretanto, mesmo os

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loci sob a ação da seleção natural poderão sucumbir com a aleatoriedade desse processo. Um alelo que confira maior aptidão em uma população pequena também pode ter sua frequência aumentada ou diminuída ao longo das gerações por puro acaso. Inclusive, durante esse processo, ele pode ser perdido ou então fixado em determinada população. Em cada população pequena e isolada a deriva é totalmente aleatória, em pouco tempo as populações poderão divergir em suas frequências alélicas até chegarem ao ponto de se tornarem geneticamente distintas. Por exemplo, considerando que em uma espécie existam cinco alelos diferentes para o lócus A (A1, A2, A3...), o processo de transmissão casual pode fazer que, depois de algumas gerações, o alelo A1 seja perdido em todas as populações, o alelo A2 seja fixado na população 3, o alelo A5 seja fixado na população 7, e assim por diante.

Quando a perda dessa diversidade não representa um problema imediato para a sobrevivência desses indivíduos, essas populações poderão continuar sobrevivendo por várias gerações e poderão continuar acumulando mais diferenças genéticas em seus genomas. Esse fato pode gerar uma diferenciação bioquímica, fisiológica, comportamental etc., ou seja, essa aleatoriedade na transmissão alélica em populações isoladas também é um dos fatores envolvidos no processo de especiação. Por outro lado, a perda de diversidade também pode apresentar muitos aspectos negativos. Se determinado alelo resulta em diminuição da aptidão de seus portadores quando em homozigose, sua fixação pode desencadear a extinção daquela população. Além disso, ter pouca diversidade genética pode ser um problema a longo prazo, se considerarmos que o ambiente comumente sofre modificações e que populações com baixa diversidade estão mais propensas a serem totalmente “riscadas da história”.

2.3.3 As Relações entre Deriva Genética, Seleção Natural e Mutação

A deriva aleatória não é limitada somente às espécies que produzem um número reduzido de descendentes a cada geração, como acontece com os primatas. Um peixe que produza milhares de alevinos ou uma planta que libere uma grande quantidade de sementes pode ter a maioria de seus descendentes devorados por predadores, antes que alcancem a idade adulta.

Mesmo que exista um componente genético envolvido na sobrevivência diferencial desses descendentes a esse predador, tais espécies continuarão sujeitas à ação da deriva genética. Para compreendermos o alcance desta afirmativa, vamos considerar a seguinte situação: o alelo A1 modifica o comportamento dos alevinos de tal forma que, quando detectam um predador, eles se escondem sob um substrato. Então, nessa população de peixes se espera que, pela ação direta da seleção natural, o alelo A1 aumente em frequência, enquanto os outros (A2, A3...) diminuam. Contudo, para o restante do genoma (loci B, C, D...) que não esteja

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envolvido com esse comportamento e que segrega independentemente do lócus A, seu processo de transmissão continuará sofrendo a ação da deriva genética.

Assim, tanto as mutações que alteram como as que não alteram a sequência e/ou o funcionamento dos peptídeos estão sujeitas à deriva genética. Quer dizer, mesmo um novo alelo que aumente a aptidão de seu portador e que, portanto, seria alvo da seleção natural pode ser perdido por fatores puramente casuais.

Novamente, vamos tratar desse assunto com um exemplo: em uma população composta somente por indivíduos de genótipo bb, surge um gameta mutante B (Figura 2.2). Esse gameta, ao ser fecundado por qualquer um dos indivíduos, dará origem necessariamente a um zigoto Bb. No nosso modelo, por conferir uma aptidão maior que os indivíduos bb, esse heterozigoto terá 3 descendentes, enquanto seus concorrentes bb terão em média apenas 2.

Figura 2.2 | Mutação que cria um alelo de efeito dominante e que seja mais vantajoso que os alelos recessivos aumentará automaticamente a aptidão de seu portador

bb bb bb bb bb

bb bb bb bb bb

bb bb Bb bb bb

bb bb bb bb bb

bb bb bb bb bb

bb x BBP(bb) = 1/2

P(Bb) = 1/2

Mutação dominante:

Probabilidade de o mutante passar tal alelo para seu descendente:

{Fonte: O autor (2015).

Contudo, o fato de B conferir maior aptidão não garante que esse alelo seja passado para todos ou ao menos para um desses três descendentes, por causa da loteria mendeliana. Novamente, usando as regras de probabilidade, vemos que a chance de todos os 3 descendentes serem bb é 1/2 x 1/2 x 1/2 = 1/8 ou 12,5%. Além disso, esse indivíduo (ou os descendentes que porventura tenham herdado o alelo B) pode ser pego de surpresa em uma tempestade, pode ser devorado por um predador ou, simplesmente, pode não passar esse novo alelo a seus descendentes. Portanto, quanto menor a quantidade de cópias do alelo B nesta população, maior será a chance de ele não estar presente na próxima geração.

Outra consequência importante da deriva genética é que ela torna impossível a tarefa de se fazer previsões sobre o futuro evolutivo das espécies, ou seja, mesmo que tivéssemos informações detalhadas sobre todas as questões relevantes que tratam dos genótipos e da interação desses com o ambiente, incluindo aí a própria seleção natural, não seria possível determinar com certeza onde ou como ela

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se encontraria no futuro. Esse é mais um dos motivos que tornam a evolução biológica um processo totalmente imprevisível.

2.3.4 Os Gargalos de Garrafas

Grandes desastres, tais como terremotos, inundações, erupções vulcânicas, meteoritos ou incêndios podem reduzir drasticamente o tamanho de uma população, dizimando as vítimas de maneira não seletiva e provocando uma guinada em seu futuro evolutivo de modo irreversível.

Entenda melhor o efeito gargalo de garrafa acessando o link a seguir:Disponível em: <http://www.ib.usp.br/evosite/evo101/IIID3Bottlenecks.shtml>. Acesso em: 22 set. 2015.

A deriva genética também se refere a esses eventos acidentais que alteram a frequência dos alelos. Nessas situações, é pouco provável que a população sobrevivente, por causa de seu tamanho reduzido, continue sendo uma amostra representativa da população original no que tange ao seu conjunto gênico. Por uma analogia óbvia, esse tipo de redução drástica no tamanho populacional é conhecido como efeito gargalo de garrafa (Figura 2.3).

Figura 2.3 | Esquema que demonstra a ação dos gargalos de garrafa: somente dois dos nove alelos que existiam para o lócus A permaneceram na população após tal evento

Fonte: O autor (2015).

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Muitos exemplos de gargalos de garrafa em populações naturais já foram deduzidos a partir de estudos de genética de populações. Um exemplo disso é a existência de uma pequena variação genética na população de chitas africanas. Os dados obtidos para esses animais indicam que essa espécie foi reduzida a uns poucos indivíduos há alguns milhares de anos. Outros exemplos são encontrados em espécies que foram quase dizimadas pelo homem, como é o caso dos elefantes-marinhos, focas, peixes-boi, bisões, tartarugas marinhas, ursos, pau-brasil, várias espécies de aves etc.

A história dos elefantes africanos, que também fazem parte desta lista, é bastante interessante. Durante muito tempo, eles foram caçados tão intensamente que, por volta de 1890, tinham sobrevivido menos de 20 animais. Atualmente, sua população é composta por mais de 30 mil indivíduos. Como predito pelo modelo de gargalo de garrafa e corroborado por estudos moleculares, há pouca variação genética nesse grupo de animais. Outra evidência de gargalo de garrafa foi observada por Hoelzel e cols. (2002), ao estudarem algumas sequências de genes mitocondriais, bem como lócus de microssatélites de diferentes populações de orcas (Orcinus orca). Embora a quantidade desses animais nos oceanos seja elevada, os níveis de diversidade genética das populações estudadas foram menores que os de duas espécies de golfinhos com as quais esses animais foram comparados.

2.3.5 O Efeito do Fundador

Se um novo ambiente for colonizado por poucos representantes de uma espécie, todos os genes desta nova população terão derivado primariamente desses indivíduos fundadores. Por exemplo, uma colônia fundada por um casal de indivíduos diploides pode ter no máximo quatro alelos por lócus – caso eles sejam heterozigotos –, muito embora, na população de onde eles vieram, esse número possa ser bem maior.

Assim, diferentes populações fundadas por poucos indivíduos podem apresentar uma divergência genética imediata quanto aos alelos que poderão se tornar exclusivos ou então compartilhados em frequências distintas. Isso pode resultar em diferenças bioquímicas, fisiológicas, comportamentais etc. em cada uma dessas populações. Assim quando os fundadores e seus descendentes imediatos são submetidos à seleção natural, a amplitude de resposta desse grupo será restringida pelos tipos de alelos presentes nesta população. Como consequência, se a seleção natural agir sobre duas ou mais populações pequenas e isoladas, o resultado final poderá ser bastante diferente caso elas tenham sido fundadas com amostras alélicas diferentes. E, se a migração entre elas for restrita, novas mutações, deriva genética, seleção natural disruptiva ou, até mesmo, a seleção sexual poderão fazer que elas divirjam ainda mais, desencadeando o processo de especiação.

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Teoricamente, basta que uma fêmea que tenha colonizado determinada parte da ilha e prefira um tipo específico de ritual de acasalamento de um macho para que tenha início o processo de especiação entre duas populações recém-fundadas e que estão ligeiramente isoladas entre si.

Há muitos casos estudados sobre efeito do fundador. Por exemplo, todo gado da Islândia é descendente de um grupo pequeno de animais que foram levados para aquela ilha há mais de mil anos. O conjunto genético do gado islandês é agora diferente de seus primos da Noruega, mas as diferenças observadas estão de acordo com aquelas preditas pela deriva genética.

De maneira semelhante, há muitas ilhas do Oceano Pacífico que foram colonizadas por pequenos números de representantes (talvez até por uma única fêmea), e a genética dessas populações é consistente com os modelos de deriva. Por exemplo, existe um ponto de intensa atividade magmática sob a placa tectônica onde se situa o Havaí. De acordo com Clague e Dalrymple (1987), as diferentes ilhas que compõem esse arquipélago foram surgindo à medida que a placa tectônica dessa região foi se deslocando em relação a esse ponto quente (hot spot). A idade dessas ilhas varia de 10,3 milhões (ilha Necker) a 375 mil anos (ilha Havaí). Embora esse arquipélago seja relativamente novo, ele abriga uma série de espécies endêmicas bastante características.

Um dos grupos que apresenta grande diversidade são as drosófilas. Somente nesta região são encontradas atualmente cerca de 800 espécies dessas moscas que ocupam nichos, que vão desde as florestas tropicais ao nível do mar até as pradarias subalpinas. Por causa do tamanho das ilhas e de seus tempos divergentes de surgimento não é possível, pela teoria convencional de evolução pela seleção natural, conceber tamanha diversidade. Mesmo porque no Havaí é possível encontrar espécies diferentes habitando nichos relativamente semelhantes.

Assim, o geneticista Hampton L. Carson propôs, na década de 1970, que um dos fatores que contribuíram para a especiação dessas moscas nesta região foi justamente o processo de dispersão e colonização de novos ambientes a partir dos ambientes antigos, como as novas ilhas que foram surgindo ao longo do tempo. Além disso, por se tratar de ilhas vulcânicas, populações locais podem ter sido extintas, sendo esses ambientes recolonizados ao longo do tempo. E todo esse processo de especiação teria sido acelerado pelo efeito do fundador, uma vez que ele estabeleceria mudanças instantâneas nas frequências alélicas dessas populações fundadoras em relação às populações originais. Corroborando essa hipótese, estudos moleculares têm mostrado uma estreita relação com as drosófilas das ilhas adjacentes, sendo possível observar que existe um padrão linear entre a diversificação das espécies e a formação dessas ilhas.

O efeito do fundador também é bastante conhecido pelos geneticistas que

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estudam populações humanas, graças às informações existentes sobre uma série de marcadores moleculares clássicos, bem como pelo padrão de distribuição de diferentes doenças hereditárias raras que afligem grupos étnicos, cujos padrões de migração são bem conhecidos. É o caso de algumas seitas, tais como os Dunkers e a Antiga Ordem Amish da América do Norte, que foram fundadas por um número pequeno de migrantes provenientes de congregações maiores da Europa Central. Esses grupos permaneceram por um longo período quase completamente isolados da população americana circunvizinha. Como resultado, as frequências dos genes para os grupos sanguíneos dessas populações são bastante diferentes daquelas hoje encontradas na Europa e no restante da América do Norte. Por exemplo, o grupo Amish do município de Lancaster é composto por 16-18 mil indivíduos, descendentes de aproximadamente uma dúzia de pessoas que migraram da Alemanha para a Pensilvânia durante os primórdios do século XVIII.

Durante os últimos 40 anos, nasceram 61 bebês com uma desordem genética fatal extremamente rara, conhecida como microcefalia, em 23 destas famílias Amish. Estudos genealógicos mostraram que todas as famílias afetadas pela microcefalia são descendentes de um único casal Amish que viveu há nove gerações. Eles foram os fundadores que contribuíram com o alelo para a microcefalia que hoje se manifesta nesta população. Estudos moleculares feitos por Rosenberg e colaboradores (2002) demonstraram que todos os indivíduos afetados dentro desse grupo são homozigotos para uma transversão G-C no par 530 do gene SLC25A19. Esse gene está localizado no cromossomo 17 e é responsável por uma proteína carreadora de desoxirribonucleotídeos na mitocôndria, chamada de DNC. Esses dados reforçam a hipótese de que um único indivíduo carregando essa mutação foi o responsável por transmiti-la a seus descendentes.

Outro exemplo envolve uma desordem degenerativa severa do sistema nervoso, geneticamente herdada, conhecida como doença de Huntington. Ela afeta normalmente 1 em cada 20 mil indivíduos que tenham ancestrais europeus. No Lago Maracaibo, região noroeste da Venezuela, somente durante a década de 1990, aproximadamente 150 pessoas manifestaram esta condição fatal e cerca de mil indivíduos apresentavam um alto risco de desenvolvê-la. Porém, a filogenia de todas as pessoas afetadas mostrou que elas tinham como ancestral comum uma mulher que se mudara para a região havia um século. O interessante é que ela teve um número exageradamente grande de descendentes, sendo, portanto, a “fundadora” dessa população para tal característica extremamente prejudicial.

Também, é possível observar indícios do efeito do fundador mesmo quando informações diretas sobre os antepassados são desconhecidas. Por exemplo, quase todos ameríndios da América Central e do Sul apresentam o tipo sanguíneo O. Como não se conhece nada na natureza que pareça exercer uma pressão de seleção tão intensa sobre o sistema ABO, é provável que a maioria destas pessoas seja descendente de um pequeno grupo de fundadores proximamente

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relacionados e que compartilhavam esse tipo sanguíneo. Estudos paleontológicos parecem indicar que os antepassados dos atuais ameríndios da América Central e do Sul devem ter chegado em um pequeno número de migrantes, via Estreito de Bering, durante o fim da última Idade de Gelo, há aproximadamente 10 mil anos.

2.3.6 Deriva Genética e Evolução Biológica

Atualmente, acredita-se que o papel desempenhado tanto pela seleção natural como pela deriva genética no processo evolutivo dependerá da interação de diferentes fatores. Se um caráter novo, surgido por mutação, conferir uma melhor adaptação a seus portadores, tal como um bico maior que facilite a alimentação, existe uma grande chance – mas não uma garantia absoluta – de este aumentar em frequência pela ação direta da seleção natural.

Por outro lado, alterações nas sequências nucleotídicas ou peptídicas que não atingem o funcionamento dos genes ou das proteínas podem aumentar ou diminuir em frequência graças ao comando cego da deriva genética, uma vez que esse tipo de caráter não tem como ser alvo da seleção natural. Isso significa que duas populações que evoluíram independentes e se transformaram ao longo do tempo em duas espécies distintas também poderão exibir diferenças em suas sequências de DNA ou em seus peptídeos por fatores meramente casuais.

O tamanho populacional também é um componente preponderante no equilíbrio de forças entre a deriva genética e a seleção natural. Isso porque, por se tratar de um evento estocástico, a deriva genética é muito mais eficiente em promover mudanças significativas em populações de tamanhos reduzidos. E como a maioria das espécies é subdividida em grupos pequenos de indivíduos intercruzantes, eles podem, por meio da deriva, divergir substancialmente por fatores absolutamente aleatórios. Então, esse mecanismo evolutivo também pode resultar em variação geográfica, que não terá necessariamente nenhuma associação com a resposta adaptativa a diferentes condições ambientais.

Ou seja, organismos de determinada localidade podem ter, por exemplo, mais cópias do alelo A e menos do alelo a, não porque isso é adaptativo, mas sim porque a deriva genética promoveu essa diferenciação. Mesmo espécies com ampla distribuição geográfica – e que, teoricamente, são representadas por um número muito grande de indivíduos – estão sujeitas à ação desse componente evolutivo. Isso porque os acasalamentos têm maior probabilidade de ocorrer entre os indivíduos circunvizinhos de uma mesma população.

Contudo, é importante salientar um efeito nocivo da deriva genética, bem como suas consequências: em qualquer população de tamanho reduzido, alelos seletivamente desfavoráveis poderão aumentar em frequência ou até mesmo

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ser fixados simplesmente pelo fato de que a intensidade de seleção pode não ser suficiente para superar a ação da deriva. Populações de reprodução cruzada são normalmente as mais prejudicadas pela redução no tamanho populacional, uma vez que isso leva a um aumento na taxa de acasalamento entre indivíduos aparentados. Por serem parentes, esses indivíduos possuem maior chance de compartilhar um mesmo alelo, o que eleva a taxa de surgimento de homozigotos em detrimento dos heterozigotos. Nesta situação, os alelos recessivos deletérios que ficavam mascarados nos heterozigotos não terão mais como ficarem escondidos, aumentando a quantidade de homozigotos com baixo valor adaptativo. Muitas vezes, a redução na aptidão dos indivíduos pode levar à extinção de uma população. Isso tem se tornado um problema bastante comum nas últimas décadas por causa da fragmentação de hábitats que vem ocorrendo em vários países agrícolas ou extrativistas como o nosso. Além do fato de o espaço reduzido poder levar a uma rápida extinção das espécies que necessitam de grandes áreas para sua sobrevivência, aquelas que conseguem se estabelecer nesses fragmentos isolados podem ter, a médio e longo prazos, sua diversidade genética comprometida.

1. Ter a melhor combinação genotípica nem sempre garante o sucesso de um indivíduo, pois uma tempestade violenta, enchentes ou não perceber uma emboscada feita por um grupo de predadores, entre outras coisas, podem definir o destino dos indivíduos mais promissores. Este fator evolutivo que pode modificar a composição genética das populações ao longo das gerações, mas de uma maneira totalmente imprevisível, é conhecido como deriva genética ou alélica. Como podemos definir deriva genética?

2. Em uma ilha isolada foi encontrada uma população de pássaros composta por indivíduos que manifestam uma característica normal dominante e indivíduos com uma característica recessiva, em uma proporção de 10:1, respectivamente. Porém, uma catástrofe ambiental extinguiu os indivíduos com a característica recessiva, modificando bruscamente a frequência desse gene recessivo na população da ilha.

a) Podemos afirmar que a frequência do gene recessivo será zero? Justifique sua resposta.b) Qual é o nome do processo que alterou de forma brusca a frequência gênica nessa população?

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Nesta unidade você aprendeu:

• Um breve histórico sobre a genética de populações.

• A importância da genética de populações.

• O que é uma população natural.

• A usar o equilíbrio de Hardy-Weinberg.

• Testar o Hardy-Weinberg com o X2.

• Algumas informações adicionais sobre esse teorema.

• Analisar lócus de efeito dominante.

• Os fatores que alteram o equilíbrio de Hardy-Weinberg.

• O que é deriva genética.

• A relação entre tamanho populacional e deriva genética.

• Gargalo de garrafa e deriva genética.

• Efeito do fundador e deriva genética.

• Evolução biológica e deriva genética.

Estudamos nesta unidade como a seleção natural, deriva genética, mutação, migração, seleção sexual etc. podem alterar a frequência de genes e de genótipos. Vimos que é por meio da genética de populações que avaliamos a variação da frequência desses genes, genótipos e alelos, assim como qual fenômeno evolutivo pode estar envolvido nesse processo.

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Aprendemos como aplicar o teorema de Hardy-Weinberg no estudo das populações para conseguirmos encontrar dados relevantes sobre qual fenômeno evolutivo pode estar relacionado à variação da frequência genotípica ou alélica ou se essa variação se deve apenas ao acaso.

E, por fim, analisamos os principais efeitos da deriva genética sobre as populações naturais: perda da diversidade genética que existe dentro das populações; divergência genética entre as populações por processos inteiramente ao acaso, e, uma vez que a deriva genética não é resultante da seleção natural, esta pode apenas, incidentalmente, aumentar o valor adaptativo de uma população.

1. Segundo a teoria de Hardy-Weinberg, em uma população em equilíbrio genético, as frequências dos alelos e dos genótipos são constantes ao longo das gerações. Assinale a alternativa CORRETA sobre o que é necessário para que isso ocorra:

a) É necessário que o tamanho da população seja reduzido, os encontros ocorram ao acaso e esteja sujeita a fatores evolutivos.b) É necessário que a população seja infinitamente ampla, os encontros ocorram ao acaso e não existam fatores evolutivos atuando.c) É necessário que a população seja infinitamente reduzida, os encontros ocorram de modo preferencial e existam fatores evolutivos atuando.d) É necessário que a população seja de tamanho reduzido, os encontros ocorram de modo preferencial e existam fatores evolutivos atuando.e) É necessário que a população seja de tamanho infinito, os encontros ocorram de modo preferencial e existam fatores evolutivos atuando.

2. Um cientista coletou dados de uma população em equilíbrio de Hardy-Weinberg, em que 40% dos indivíduos são GG, 40%

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são Gg e 20% são gg. Calcule a frequência do gene G nessa população e assinale a alternativa CORRETA:

a) 0,40b) 0,70c) 0,35d) 0,60e) 0,85

3. (UFRN – Adaptado) Com o teorema de Hardy-Weinberg é possível estimar a frequência de determinado par de alelos de uma população em equilíbrio. Imagine que, em uma população em equilíbrio, 16% dos indivíduos têm miopia e o restante tem visão normal, qual é a frequência de genes recessivos e dominantes para esse caráter nessa população, sabendo-se que a miopia é determinada por gene recessivo e a frequência do gene m é 0,4 e a do gene M é 0,6?

4. (Fuvest - 2001) Em uma população amostral, 1000 homens foram analisados e 90 eram daltônicos. Sabendo que o daltonismo é causado por um alelo recessivo de um gene localizado no cromossomo X, qual é a porcentagem esperada de mulheres daltônicas nessa população?

a) 4,5%.b) 9%.c) 16%.d) 0,81%. e) 83%.

5. (FCC – SP) Em uma população em equilíbrio Hardy-Weinberg, a frequência do alelo dominante para certo lócus autossômico é 0,6. Portanto, a frequência dos heterozigotos para este lócus será:

a) 0,48 b) 0,24c) 0,60d) 2,40e) 1,20

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TEMPO GEOLÓGICO, ROCHAS E PROCESSOS GEOLÓGICOS

Nesta seção, vamos estudar o Planeta Terra, analisando suas características. Vamos começar pelo processo de formação do planeta, estudando sua estrutura e dimensões. Por meio desse estudo, conseguiremos correlacionar esses fatores às características presentes no planeta em um panorama geral. Também, estudaremos o conceito de tempo geológico para entendermos como os pesquisadores estudam nosso planeta e conseguem correlacionar eventos de hoje com outros que aconteceram no passado.

Seção 1 | O Planeta Terra e o Tempo Geológico

Objetivos de aprendizagem: Olá, acadêmico!

Nesta unidade conheceremos mais sobre o Planeta Terra e suas características, pois vamos estudar as características da crosta terrestre, os minerais e rochas, suas classificações e características, assim como o intemperismo e a pedogênese. Também, vamos correlacionar as características das rochas à sua composição mineral, bem como aos processos envolvidos no ciclo das rochas. Veremos diversos processos que ocorrem em nosso planeta e como eles moldam a estrutura e composição da crosta.

Você está pronto? Então, vamos lá!

Maurilio Cristiano Batista Bergamo

Unidade 3

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Na segunda seção, vamos estudar os minerais e as rochas. Em um primeiro momento, vamos entender o conceito de mineral e como fazemos para identificá-lo por meio de suas propriedades. Depois, vamos estudar as rochas, que são agregados de minerais, entendendo o ciclo das rochas e as características das rochas ígneas, sedimentares e metamórficas.

Seção 2 | Minerais e Rochas

Durante a terceira seção vamos estudar dois processos geológicos: o intemperismo e a pedogênese. Veremos a diferença entre o intemperismo físico e o químico, assim como os fatores que o influenciam. Estudaremos a pedogênese e como os solos são classificados quanto à sua origem.

Seção 3 | Intemperismo e Pedogênese

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Introdução à unidade

Olá, estudante!

A partir de agora vamos começar nossos estudos sobre geologia. Os temas geológicos trabalhados nos darão base para assimilar o que estudaremos na próxima unidade sobre paleontologia. Estudar as rochas e os minerais de nosso Planeta nos permite compreender como foi o passado e os eventos que aconteceram e que levaram à formação do planeta que hoje conhecemos.

Na primeira seção, vamos estudar a origem do planeta Terra, suas características, estrutura, composição e tempo geológico. Na segunda, investigaremos as características das rochas e dos minerais, os critérios de classificação e o ciclo das rochas. Na terceira, vamos falar do intemperismo, das diferenças entre intemperismo físico e químico, além de destacar a origem do solo e seus tipos.

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Seção 1

O Planeta Terra e o Tempo Geológico

Introdução à seção

O planeta Terra ocupa dentro do tempo-espaço uma posição periférica em nossa galáxia (Via Láctea). Longe das regiões centrais, conturbadas e extremamente quentes, o ambiente terrestre está dentro de um sistema de um único Sol e em uma distância favorável, possibilitando o desenvolvimento de diversos ambientes naturais, chamados ecossistemas.

Ao longo desta seção, vamos estudar as características físicas do nosso planeta e também o tempo geológico para compreendermos como a geologia e a paleontologia utilizam essas informações para entender a formação do planeta Terra e suas características principais.

3.1.1 Origem do Planeta Terra

Nosso planeta está a uma distância média do Sol de 150 milhões de quilômetros e começou a ser formado há cerca de 4 a 5 bilhões de anos. O processo de formação do planeta teria se iniciado a partir da agregação de poeira cósmica em rotação em um processo chamado acreção, isto é, pequenos grãos se reúnem para formar grãos maiores, que se juntam para estruturar pedaços ainda maiores, e esse processo continua até a existência do planeta. Corpos menores, como cometas e asteroides, são formados pelo mesmo processo.

Durante o processo de acreção, a temperatura do planeta foi se elevando progressivamente. A energia resultante dos planetesimais (isto é, corpo sólido hipotético, de dimensões reduzidas, que teria surgido quando a nebulosa protossolar se fragmentou) foi sendo convertida em calor e foi se acumulando no planeta primitivo. Você pode até imaginar que parte dessa energia era consideravelmente perdida para o espaço, mas, com os seguidos impactos, na verdade, a temperatura ia aumentando, assim como a massa e o tamanho de nosso protoplaneta.

As altas temperaturas fizeram que silicatos, ferro e níquel atingissem seus pontos de fusão, dando início ao processo de diferenciação. Por causa das diferenças de densidade dos materiais, o ferro e o níquel migraram para o centro do planeta, formando o núcleo terrestre. Materiais de densidade mediana, tais quais os silicatos

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associados a ferro e níquel ocuparam as camadas médias do interior do planeta, isto é, originaram o manto terrestre. Os materiais menos densos, os silicatos pouco densos, atingiram seu ponto de solidificação e constituíram a crosta terrestre.

Ao longo desta unidade, voltaremos a discutir sobre as camadas da Terra. É importante que você tenha notado que a formação de nosso planeta passou pelos processos de acreção e diferenciação, resultando, portanto, em uma estrutura rochosa, em que a fusão dos materiais permitiu a formação das três grandes zonas litológicas (núcleo, manto e crosta).

A crosta foi a primeira camada a se resfriar e solidificar por causa do contato com o espaço e suas baixíssimas temperaturas. Antes da formação de nossa atmosfera, o planeta continuou a ser constantemente bombardeado por corpos celestes. Acredita-se que esses choques contra a fina crosta resultavam em intensos eventos vulcânicos que liberavam lava e vapor d’água, os quais formaram as primeiras chuvas que deram origem aos oceanos e à formação da atmosfera primitiva.

Antes de continuarmos a discutir sobre nosso planeta, vamos observar a formação de nosso satélite natural, a Lua. Ainda que apresente apenas 1,25% da massa da Terra, ela é um dos maiores satélites do Sistema Solar em comparação ao planeta. A Lua tem um diâmetro de 3.480 km e uma densidade média de 3,3 g/cm3, portanto, bem menor que a da Terra. Análises das rochas do solo lunar indicam que sua formação tem data muito próxima à da formação do Sistema Solar. Mas a comunidade científica não é unânime sobre a formação de nosso satélite natural. Existem três principais teorias:

• Coacreção: a Lua e a Terra se formaram ao mesmo tempo da Nebulosa Solar.

• Fissão: a Lua foi formada a partir de uma separação da Terra.

• Captura: a Lua foi formada em outro ponto do universo e capturada pela gravidade de nosso planeta.

A dificuldade de aceitar uma ou outra teoria reside nas grandes semelhanças e diferenças de nosso satélite e nosso planeta. Por isso, o modelo mais aceito atualmente é o de que a Lua teria se formado a partir da colisão de um grande corpo celeste, maior até que Marte, com a Terra, em que nosso satélite teria se formado a partir do material ejetado do impacto. Esse forte choque teria ocorrido nos estágios finais do período de acreção; dessa forma, a Terra já teria um tamanho próximo ao atual, e o núcleo metálico e o manto silicático já estariam diferenciados. O corpo impactante provavelmente também estaria diferenciado em núcleo metálico e manto silicático.

Ainda segundo este modelo, logo após o choque, o corpo que teria colidido e parte do manto terrestre estariam despedaçados e muitos compostos voláteis

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teriam sido vaporizados. O manto do objeto impactante teria uma grande parte ejetada para uma situação orbital, aglutinando-se rapidamente e formando nosso satélite parcial ou totalmente fundido. Parte do material nuclear do corpo que colidiu, por causa da densidade, teria sido incorporada à Terra.

Agora que conhecemos um pouco sobre a formação de nosso universo, Sistema Solar, satélite natural e planeta, vamos nos aprofundar nas características da Terra.

Como o conhecimento da estrutura e da formação da Terra pode ser importante para a compreensão das configurações atuais de nosso planeta?

3.1.2 O Planeta Terra

A Terra é o terceiro planeta em ordem de afastamento do Sol. Descreve uma órbita elíptica com duração de 365 dias, 6 horas e 4 minutos, por isso é necessário, a cada quatro anos, adicionar um dia ao nosso calendário, o chamado ano bissexto (6 horas x 4 anos = 24 horas). A velocidade média de deslocamento é de 29,8 km/segundo.

Além do movimento de translação ao redor do Sol, nosso planeta realiza um movimento ao redor de seu eixo no sentido oeste-leste, chamado rotação, que tem a duração de 23 horas e 56 minutos e origina as noites e os dias. A velocidade de rotação é de aproximadamente 1.666 km/h no Equador. Quanto maior a latitude, menor é a velocidade; por exemplo, no paralelo de 60° a velocidade é de 833 km/h.

Se traçarmos um plano em relação à órbita planetária, perceberemos que o eixo da Terra tem uma inclinação em relação ao plano do Equador de 23°27´ (23 graus e 27 minutos). A conjunção do eixo de inclinação com o movimento de translação origina as estações do ano.

A Terra não tem uma forma esférica como muitos pensam. Na verdade, nosso planeta é um esferoide, com os polos achatados e com o Equador dilatado. Se traçarmos o raio do centro do planeta a um dos polos teremos 6.357 km, mas se traçarmos do centro ao equador teremos 6.378 km. A circunferência polar é de 40.009 km, e a circunferência equatorial é de 40.076 km. Se a Terra fosse uma esfera, não teríamos essas diferenças entre os raios e as circunferências. Ignorando o achatamento e considerando a Terra perfeitamente esférica, com um diâmetro

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aproximado de 12.700 km, seu volume será de 1,08 bilhões de km3, com uma área total de 510 milhões de km2.

A massa total do planeta Terra é de aproximadamente 6 sextilhões de toneladas, e a densidade média indica que a Terra é 5,5 mais pesada que a água. As rochas superficiais têm uma densidade média variável entre 2,7 e 3,0; portanto, o interior é bem mais denso.

É difícil estudar a estrutura interna do planeta pelo fato de ser impossível ter acesso direto a essas partes. A maior perfuração já realizada pelo homem foi de apenas 12 mil metros, uma fração insignificante em relação ao raio terrestre. Para compreendermos como é o interior do planeta, são analisadas as ondas sísmicas que são registradas na superfície. Assim, é possível deduzirmos as várias características das partes internas da Terra.

Um terremoto transmite energia através da Terra na forma de ondas, as quais podem ser sentidas como abalos mesmo a grandes distâncias dos locais em que foram originadas. Todo movimento ondulatório comporta-se de maneira diferenciada em relação ao meio de propagação. Em um terremoto, são produzidos três tipos de ondas sísmicas:

• Onda Primária (P) – são ondas longitudinais, de pequena amplitude, semelhantes às ondas sonoras. Ao passar de uma camada de menor densidade para uma de maior densidade, sua velocidade aumenta. Estudando o comportamento dessa onda no interior da terra os cientistas perceberam que, quanto maior a profundidade, maior a velocidade. Ao chegar a uma área em estado líquido a velocidade diminui abruptamente. Sua velocidade varia em torno de 5,5 a 13,8 km/s.

• Onda Secundária (S) – são ondas transversais, de modo que cada partícula vibra transversalmente à propagação da onda. As ondas S não se propagam em meios líquidos. Sua velocidade varia de 3,2 a 7,3 km/s.

• Ondas Longas de Superfície (L) – são ondas de grande comprimento que se propagam na crosta terrestre quando as ondas P e S a atingem. Sua velocidade é menor em relação às outras, variando de 4 a 4,4 km/s.

As ondas P e S têm comportamentos diferentes conforme a profundidade aumenta. A partir disso, é possível especular a composição e o estado da matéria no interior do planeta. Essas informações sobre os comportamentos das ondas no interior do planeta são conseguidas em estações sismológicas espalhadas pela superfície da Terra em todos os continentes.

Voltaremos a discutir sobre essas ondas na próxima unidade, quando falaremos dos eventos sísmicos.

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3.1.2.1 Estrutura e Composição da Terra

Com o desenvolvimento da rede sismográfica mundial e dos métodos de observação e análise, foram encontradas as interfaces e as zonas de transição do interior terrestre (Figura 3.1). Com base em dados, a crosta, o manto e o núcleo são os grandes domínios terrestres, mas não são homogêneos. De acordo com a velocidade de propagação das ondas sísmicas é possível determinar subdivisões, para assim buscar a identificação das rochas presentes nessas camadas.

Figura 3.1 | Estrutura do Planeta Terra

Fonte: Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Terra#/media/File:Crosta-terrestre-corte-portugues.svg>. Acesso em: 10 set. 2015.

3.1.2.1.1 Crosta Terrestre

É uma camada relativamente fina na qual encontramos desde rochas sedimentares pouco alteradas até rochas metamórficas que foram submetidas a condições de alta temperatura e pressão. Apresenta também rochas magmáticas extrusivas e intrusivas. A crosta é dividida em duas: crosta continental e crosta oceânica.

A crosta continental tem profundidade variável de 30 a 40 km nas regiões sismicamente estáveis, podendo chegar à espessura de 60 a 80 km em áreas de cadeias de montanhas, como na Cordilheira dos Andes ou no Himalaia. Apresenta uma grande quantidade de rochas granitoides silicaluminosas, e por isso pode ser chamada de SIAL (Silício e Alumínio). É menos densa do que a porção oceânica da crosta.

A crosta oceânica é menos espessa que a continental, variando de 5 a 15 km de profundidade. É composta basicamente de rochas máficas, isto é, rochas compostas basicamente de magnésio e ferro, por exemplo, os basaltos e gabros. Sua composição pode ser chamada de SIMA (em referência à concentração de

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Silício e Magnésio), portanto, é mais densa que a crosta continental.

3.1.2.1.2 Manto

A segunda camada, em profundidade, da Terra é o Manto, que forma aproximadamente 80% de todo o volume do planeta. Pode ser dividido em Manto Superior e Manto Inferior. É importante destacar que entre o manto e a crosta encontramos uma faixa chamada de Descontinuidade de Mohorovicic (o nome é referente ao seu descobridor). Essa faixa, também chamada de Moho, é caracterizada por uma mudança brusca de velocidade das ondas sísmicas (ondas P mudam de 6,7-7,2 para 7,6-8,6 km/s). A profundidade do Moho é variável, conforme a forma do relevo, e vai de 5 a 10 km de profundidade nas áreas de crosta oceânica e de 30 a 80 nas áreas continentais.

O manto superior tem uma densidade de cerca de 3,4 e é essencialmente constituído por peridotitos (olivina e piroxênio) ou eclogito (granada e piroxênio). É o principal fornecedor de magma para a formação da crosta terrestre e se estende desde o Moho até por volta de 400 km de profundidade, incluindo a base da litosfera e a parte superior da astenosfera (camada situada de 60-100 a 250-400 km da superfície da Terra, com características plásticas distintas da litosfera, que é rígida).

Entre o manto superior e o manto inferior encontramos uma camada chamada de zona de transição ou manto transicional, situada entre 400 e 700 km de profundidade. O manto inferior, também chamado de manto interno, está situado entre 700 e 2.900 km de profundidade e tem uma densidade de 4,7, pois é formado por silicatos ferromagnesianos densos. A temperatura varia de 1.000o C até 3.000o

C, variando para mais conforme aumenta a profundidade.

Em profundidade de aproximadamente 2.600-2.900 km encontramos outra descontinuidade, a Descontinuidade de Gutenberg (chamada também de Zona D), que separa o núcleo externo do manto inferior.

3.1.2.1.3 Núcleo

A porção ao centro do planeta pode ser dividida entre: Núcleo Interno e Núcleo Externo. O núcleo externo é uma camada provavelmente líquida e constituída basicamente de Ferro e Níquel, por isso chamada de NiFe, com cerca de 1.600 km de espessura. Já o núcleo interno provavelmente é sólido em razão das altíssimas pressões que impedem a mudança de estado da matéria. Tem cerca de 1.300 km de diâmetro e é separado no núcleo externo por uma camada transicional de 550 km de espessura.

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As diferenças entre os estados da matéria do núcleo interno e externo são responsáveis pela geração do campo eletromagnético de nosso planeta, pois, em razão do movimento de rotação, esta camada acaba agindo como um gigantesco dínamo.

3.1.3 O Planeta Terra e o Tempo Geológico

O conceito de tempo geológico é utilizado por diversas ciências (geografia, oceanografia, geologia, paleontologia, entre outras) e consiste em uma tentativa do homem de explicar os processos que aconteceram no planeta e levaram à formação do ambiente que conhecemos hoje.

Com o notável desenvolvimento do meio científico nos últimos três séculos, o homem pôde desvendar diversas questões sobre o mundo em que vive. A geologia, centrada nos estudos das rochas, auxilia-nos na tarefa de entender fenômenos que aconteceram há milhares, milhões ou, até mesmo, há bilhões de anos, com base no registro geológico das rochas, fósseis e estruturas geológicas.

Para que pudéssemos ordenar e comparar eventos passados, os geólogos desenvolveram uma escala de tempo padronizada aplicada no mundo todo. Nesta aula, veremos como se divide o tempo geológico e como se estabelece a idade das rochas.

Se o tempo geológico foi determinado a partir das descobertas científicas dos últimos três séculos, o que os cientistas tomaram como base para determinar as divisões do tempo geológico?

3.1.3.1 O Tempo Geológico

A ideia de que a Terra poderia ser muito antiga só emergiu nos últimos dois séculos, em razão de dois grandes movimentos da cultura ocidental que consolidaram a Geologia como ciência. Durante o período do Iluminismo o homem substituiu as explicações sobrenaturais dos fenômenos da natureza por explicações que levavam em consideração explicações científicas, fruto de descobertas e observações de fenômenos naturais. Também durante a Revolução Industrial, a demanda por matéria-prima e recurso energético levou o homem moderno a compreender melhor as estruturas do Planeta.

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Se tomarmos como base o surgimento do homem dentro do tempo geológico, vamos descobrir que surgimos há bem pouco tempo dentro da evolução do planeta. Acesse o link para descobrir mais sobre nossa história dentro do planeta.Disponível em: <http://geoturismobrasil.com/REVISTA%20ARTIGOS/o%20tempo%20geol%C3%B3gico%20-%20Manzig.pdf>. Acesso em: 22 set. 2015.

O planeta Terra tem de 4 a 5 bilhões de anos e ao longo desse intervalo de tempo muitos acontecimentos moldaram a estrutura que conhecemos hoje. Para fins de estudo e entendimento da evolução da Terra, os cientistas dividiram o tempo geológico em intervalos de tempo menores, chamados de unidades cronoestratigráficas: éons, eras, períodos e idades (Tabela 3.1).

Os éons determinam um intervalo de tempo muito grande e indeterminado. A idade da Terra foi dividida em quatro éons: Hadeano, Arqueano, Proterozoico e Fanerozoico. Com exceção do Hadeano, os éons são divididos em eras. Uma era geológica determina o modo como os continentes e os oceanos se distribuíam ao longo do planeta e como os seres vivos se encontravam.

Uma era pode ser dividida em um período, que é a unidade fundamental na escala do tempo geológico. Apenas as eras do éon Arqueano não se dividem em períodos. Os períodos podem ser divididos em épocas, que são unidades menores de tempo dentro de um período. Os períodos do Proterozoico não se dividem em épocas.

A última divisão do tempo geológico é a idade, sendo esta a menor unidade de tempo dentro da escala geológica. Uma idade tem duração máxima de 6 milhões de anos, mas pode ter menos de 1 milhão. Somente as épocas mais recentes se dividem em idades.

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Tabela 3.1 | Tabela estatigráfica internacional - (International Commission on Stratigraphy - ICS) – Parte 1

Fonte: Adaptado de Carvalho (2010).

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Tabela 3.1 | Tabela estatigráfica internacional - (International Commission on Stratigraphy - ICS) – Parte 2

Fonte: Adaptado de Carvalho (2010).

3.1.3.1.1 Éon Hadeano

Esse éon marca o início do planeta Terra há 4,54 bilhões de anos. Houve o início da formação de todos os planetas do sistema solar. O final desse éon data de 3,85 bilhões de anos, quando apareceram as primeiras rochas. Embora esse

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éon não seja reconhecido pela União Internacional das Ciências Geológicas, que engloba esse intervalo de tempo ao éon Arqueano, a divisão Hadeano/Arqueano é aceita por diversos cientistas do campo das geociências.

3.1.3.1.2 Éon Arqueano

Teve início com a formação das primeiras rochas e terminou há 2,5 bilhões de anos. Durante esse éon, o interior da Terra era muito quente, com um fluxo de calor três vezes maior do que hoje. Na superfície as temperaturas não eram muito diferentes das que temos hoje no planeta, pois o Sol era 1/3 menos quente.

A vida surgiu no Arqueano, representada por seres procariontes, organismos unicelulares primitivos. Não há registro fóssil de eucariontes em rochas desse período, mas acredita-se que possam ter existido e não terem ficado preservados. Fósseis de tapetes de cianobactérias (estromatólitos – Figura 3.2) são encontrados por todo o Arqueano, tornando-se especialmente comuns mais tarde no éon, enquanto uns poucos fósseis prováveis de bactérias são conhecidos.

Figura 3.2 | Estromatólitos do Lago Thetis, na Austrália Ocidental, Oceania

Fonte: Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Estromat%C3%B3lito#/media/File:Lake_Thetis-Stromatolites-LaRuth.jpg>. Acesso em: 10 set. 2015.

3.1.3.1.3 Éon Proterozoico

O Proterozoico iniciou-se por volta de 2,5 bilhões de anos e se estendeu até 542 milhões de anos. Durante este tempo, o oxigênio se acumulou na litosfera, formando óxidos, principalmente de silício e ferro. Surgiram os primeiros eucariontes que se tem registro fóssil, e, há um bilhão de anos, muitos tipos de algas começaram a aparecer no planeta, elevando cada vez mais a concentração de oxigênio atmosférico.

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Há cerca de 900 milhões de anos os continentes estavam reunidos em uma única massa de terra, chamada de Rodínia (Figura 3.3).

Figura 3.3 | Supercontinente Rodínia

Fonte: Disponível em: <http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Rodinia_reconstruction.jpg>. Acesso em: 10 set. 2015.

3.1.3.1.4 Éon Fanerozoico

É o éon mais atual, seu início data de 542 milhões de anos. O termo Fanerozoico significa vida visível, pois nesse éon aconteceu a grande expansão da vida em nosso planeta.

Podemos dividir esse éon em três eras – Paleozoico, Mesozoico e Cenozoico –, e a maior parte das rochas e fósseis que encontramos data desse intervalo da história do planeta, sendo muito bem caracterizada pela quantidade de registros históricos.

Muitos estágios evolutivos ocorreram durante o tempo geológico do nosso planeta, e muitos deles não foram descritos aqui. Para aprofundar seu conhecimento, acesse os links indicados para ver toda a relação entre tempo geológico e evolução do planeta.Disponível em: <http://rhbjhistoria.blogspot.com.br/2009/09/periodos-geologicos.html>. Acesso em: 22 set. 2015.Disponível em: <http://paleontoevolucao.blogspot.com.br/2010/10/estagios-da-evolucao-da-vida-desde-o.html>. Acesso em: 22 set. 2015.

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1. A crosta terrestre é a mais fina das camadas terrestres e possui aspectos específicos em termos de composição e mineralogia, que variam conforme a localização geográfica e os níveis de profundidade.

Com base em suas composições, a crosta pode ser dividida em dois tipos:

a) Camada sima e camada sial.

b) Continental e oceânica.

c) Rochosa e mineral.

d) Litosfera e astenosfera.

e) Orgânica e fóssil.

(Fonte: Disponível em: <http://exercicios.mundoeducacao.com/exercicios-geografia/exercicios-sobre-crosta-terrestre.htm>. Acesso em: 22 set. 2015.)

2. O planeta Terra tem de 4 a 5 bilhões de anos e ao longo desse intervalo de tempo muitos acontecimentos moldaram a estrutura que conhecemos hoje. Para fins de estudo e entendimento da evolução da Terra, os cientistas dividiram o tempo geológico em intervalos de tempo menores, chamados de unidades cronoestratigráficas. A vida biológica surgiu no planeta em unidades cronoestratigráficas?

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Seção 2

Minerais e Rochas

Introdução à seção

O homem vem acumulando conhecimento sobre os minerais desde a origem da civilização, período Paleolítico ou Idade da Pedra. Ao longo do tempo, minerais e rochas foram utilizados na confecção de ferramentas, amuletos, pigmentos para pinturas rupestres, matéria-prima para cerâmica, fontes de metais e até medicamentos, isso porque quase toda a matéria sólida presente na natureza é composta por minerais. Ao longo desta seção, vamos estudar os minerais e sua importância na formação das rochas.

Os minerais são formados por átomos organizados em um arranjo periódico tridimensional denominado estrutura cristalina. Apesar de essa organização ocorrer em uma escala nanométrica, ela é capaz de produzir feições simétricas que podem ser vistas a olho nu.

As rochas são agregados consolidados desses minerais originadas por processos que ocorrem na dinâmica do planeta. Já materiais inconsolidados, como a areia presente em dunas ou cascalhos nos rios, não podem ser classificados como rochas, mas sim como sedimentos.

Os minerais e as rochas contêm o registro de nossa história mais remota, desde a origem de nosso planeta até o surgimento e a diversificação da vida. A ciência que estuda os minerais é a mineralogia, enquanto a ciência que estuda as rochas é a petrologia. As regras de nomenclatura e classificação da mineralogia e da petrologia seguem convenções internacionais que padronizam os nomes dos minerais e rochas, permitindo assim o estudo comparativo ao longo do mundo.

3.2.1 Os Minerais

Os minerais são caracteristicamente sólidos homogêneos, portanto não têm forma própria e não fluem espontaneamente. Essas características os diferenciam dos líquidos e gases. Eles são formados a partir de processos naturais, o que os separa das substâncias sintéticas ou artificiais, mesmo quando essas apresentam características muitas vezes equivalentes a seus representantes naturais. Um exemplo disso é o gelo encontrado nas geleiras, visto que podemos considerá-lo

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um mineral, diferentemente do gelo produzido nos refrigeradores de nossas casas, pois neste caso se trata de equivalente sintético do gelo natural.

Outra característica dos minerais é que eles são inorgânicos, o que exclui as substâncias cristalinas biogênicas. Um exemplo são as conchas que encontramos nas praias, pois essas, apesar de serem formadas por calcita (CaCO

3), não são

caracterizadas como minerais por sua origem orgânica.

A maioria dos minerais é formada pela combinação de diferentes elementos químicos em proporções fixas ou variáveis. Existem certos minerais que praticamente não aceitam elementos estranhos em sua estrutura cristalina, como o quartzo (SiO

2). Os minerais podem apresentar variações composicionais, em

que um ou mais sítios de sua estrutura cristalina pode ser ocupado por diferentes íons. Alguns minerais são compostos por um único elemento químico, como o diamante (C), o enxofre (S) e o ouro (Au).

Comumente, na biologia, ouvimos falar de “sais minerais”, entretanto nem todos os sais minerais têm origem mineral. Essa nomenclatura na maioria das vezes pode causar confusão, pois foi estabelecida levando em consideração uma linguagem cotidiana, e não científica. As embalagens de alimentos e cosméticos referem-se a “minerais” como ferro (Fe), potássio (K), lítio (Li), entre outros, de forma errada, pois na verdade eles são elementos químicos, e não minerais. Outro uso errado de um termo ligado aos minerais é o chamado “cristal”, que se refere a um material cristalino, ou seja, com arranjo organizado de seus átomos. Entretanto, muitos produtos chamados de “cristais” são na verdade vidros, e não cristais, pois apenas possuem um brilho que lembra o dos cristais por apresentarem alto índice de refração da luz.

A fala popular também não faz uma clara distinção entre mineral e minério. Minério é um conceito econômico e se refere tanto a minerais quanto a rochas que, quando extraídos da natureza, apresentam um alto valor econômico. No entanto, os minérios correspondem a um grupo especial de rochas e minerais que apresentam características específicas para determinadas utilizações.

Existe também um grupo de compostos que não satisfaz todas as condições do conceito formal de minerais, mas por causa de muitas semelhanças é classificado como mineraloide. Incluem-se nesse grupo materiais cristalinos naturais biogênicos, como as pérolas, o âmbar e os recifes de coral, além de materiais inorgânicos sem estrutura cristalina, como a opala e a obsidiana. A água mineral e o carvão mineral também não podem ser classificados como minerais, pois o primeiro é liquido à temperatura ambiente e o segundo tem origem de material biogênico, no entanto estão classificados como recursos naturais porque são extraídos da Terra para nosso uso.

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3.2.1.1 Identificação dos Minerais

A maioria dos minerais pode ser identificada por suas propriedades macroscópicas determinadas por meio de ensaios físicos simples. Aqui, nesta seção, vamos descrever alguns processos macroscópicos, sendo esses os mais importantes na classificação dos minerais:

• Hábito cristalino: é a forma habitual exibida pelos minerais em razão de sua estrutura cristalina. Essa é a aparência que o mineral exibe na natureza. Muitos minerais são facilmente caracterizados por sua forma, sendo facilmente identificados, já outros não apresentam hábito característico, por isso requerem outras características na identificação.

Acesse o link e saiba mais sobre os principais hábitos cristalinos e suas características. Disponível em: <http://files.gregem.com.br/200001218-bcb8dbdb31/H%C3%A1bito.pdf>. Acesso em: 22 set. 2015.

• Transparência: é a capacidade de um mineral de permitir a passagem da luz. Essa propriedade divide os minerais em dois grupos: translúcidos e opacos. Certos minerais apresentam-se opacos em porções macroscópicas e transparentes em lâminas delgadas observadas ao microscópio.

• Brilho: refere-se ao modo como o mineral reflete a luz e geralmente divide os minerais em brilho metálico e não metálico. Os minerais que refletem mais de 75% da luz que incide sobre eles são classificados como brilho metálico, e sua maioria é opaca. Os que não atingem essa porcentagem de reflexão têm brilho não metálico, e existem inúmeras subdivisões propostas, variando de acordo com a bibliografia consultada. Entre os tipos de brilhos não metálicos mais característicos estão o vítreo, o gorduroso e o sedoso.

• Cor: é resultado da absorção seletiva de comprimentos de onda da luz visível por causa da presença de elementos químicos de transição (Fe, Cu, Ni, Cr, V) ou de defeitos cristalinos. Os minerais que apresentam cores características são denominados idiocromáticos. São exemplos desses minerais a malaquita (verde), a azurita (azul), pirita (amarela), turquesa (azul-claro), peridoto (verde-amarelado) e a rodocrosita (rosada), entre outros. Os minerais que apresentam cores variadas são chamados de alocromáticos. São exemplos desses minerais a fluorita, o coríndon e o quartzo, que pode ser rosa, incolor

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(cristal-de-rocha), cinza (enfumaçado), amarelo a alaranjado (citrino), roxo (ametista), preto (mórion).

• Traço: a cor do pó obtido ao se riscar o mineral contra uma placa de porcelana é denominada traço. Esta propriedade é útil para se identificar minerais opacos, que, em geral, apresentam traço colorido. A maioria dos minerais translúcidos ou transparentes tem traço incolor, já minerais opacos tendem a ter traço colorido, de acordo com sua composição química.

• Dureza: é a resistência apresentada pelo mineral ao ser riscado. Para classificar um mineral segundo sua dureza, utilizamos a escala relativa de Mohs (Figura 3.4) com base na dureza de dez minerais utilizados como padrão. A sequência dos minerais na escala de dureza de Mohs não se refere à magnitude escalar dessa propriedade, mas indica que minerais de dureza maior riscam os minerais de dureza menor.

Figura 3.4 | Escala relativa de Mohs

Fonte: Disponível em: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Escala_de_mohs.png>. Acesso em: 10 set. 2015.

• Clivagem: os planos de fratura de notável regularidade refletem a presença de planos de fraqueza em determinadas direções na estrutura cristalina dos minerais (Figura 3.5). As superfícies de clivagem são nomeadas de acordo com sua orientação cristalográfica, levando em consideração um sólido geométrico formado por elas, como clivagem laminar, cúbica ou romboédrica.

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Figura 3.5 | Diferentes tipos de clivagem nos minerais

Fonte: Disponível em: <http://academic.brooklyn.cuny.edu/geology/grocha/mineral/images/cleavage.jpg>. Acesso em: 10 set. 2015.

• Fratura: assim como a clivagem, as superfícies de fratura são controladas pela estrutura atômica interna do mineral. As fraturas nos minerais podem ser do tipo irregular ou conchoidais (em forma de concha) (Figura 3.6).

Figura 3.6 | Fratura irregular (A) e Fratura conchoidal (B).

Fonte: Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Fratura_concoide#/media/File:Obsidiana_lasca.png> e <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/9/9d/PyrolusiteUSGOV.jpg/100px-PyrolusiteUSGOV.jpg> Acesso em: 10 set. 2015.

• Densidade: a densidade de um mineral pode ser dividida em densidade absoluta ou densidade relativa. A densidade absoluta é um valor escalar medido em g/cm³. A densidade relativa indica quantas vezes o mineral é mais pesado que o mesmo volume de água a 4°C. Como a densidade da água é próxima de 1 g/cm³, ambas as notações apresentam valores numéricos muito próximos. A densidade relativa da maioria dos minerais varia entre 2,5 e 3,3 g/cm³.

• Propriedades magnéticas: a magnetita (Fe3O

4) e a pirrotita (FeS) são os

únicos minerais atraídos pelo campo magnético de um ímã. Outros minerais

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podem apresentar magnetismo sutil perceptível apenas por equipamentos eletrônicos potentes, como os eletroímãs.

3.2.1.2 Minerais Formadores de Rochas

Dos diversos minerais conhecidos, apenas pouco mais de uma dezena pode ser considerado mineral formador de rochas, pois constitui a maioria das rochas abundantes da crosta terrestre. A crosta terrestre é composta quase em sua totalidade por apenas oito elementos químicos (Figura 3.7), sendo eles: oxigênio (46,8%), silício (27,8%), alumínio (8,2%), ferro (5,1%), cálcio (3,6%), sódio (2,8%), potássio (2,6) e magnésio (2,1%).

Figura 3.7 | Os elementos mais abundantes na crosta terrestre

Fonte: O autor (2015).

Mais de 70% da crosta terrestre é formada por oxigênio e silício (Figura 3.7), por isso a classe mais predominante de minerais na crosta terrestre corresponde aos silicatos, representando 90% de seu volume. Por esta razão os minerais são classificados em silicatos e não silicatos.

3.2.1.2.1 Silicatos

Os silicatos são os mais representativos minerais da crosta e do manto terrestre. Esses minerais são representados pelo radical aniônico sílica [SiO

4]-4, que apresenta

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forma tetraédrica, com um cátion de silício (Si4+) no centro do tetraedro e quatro íons oxigênio (O2-) em cada um dos vértices (Figura 3.8). A polimerização da sílica forma sete tipos diferentes de cadeias polimerizadas, que subdividem a classe dos silicatos de acordo com o tipo de polimerização (Figura 3.8). As diferentes subclasses apresentam aspectos estruturais, composicionais e morfológicos diferentes. Os principais silicatos formadores de rochas são: feldspatos, quartzo, olivinas, piroxênios, anfibólios, granadas e micas.

Figura 3.8 | Arranjo molecular dos silicatos

Fonte: Disponível em: <http://bibliotecadigital.ilce.edu.mx/sites/ciencia/volumen3/ciencia3/109/img/arc029.gif>. Acesso em: 10 set. 2015.

3.2.1.2.2 Não Silicatos

Os não silicatos representam apenas 10% em volume da crosta terrestre, mas mesmo assim têm grande importância científica e econômica. As principais classes de não silicatos são:

• Carbonatos – minerais com o radical (Co3)2-, como a calcita, aragonita

(polimorfos de CaCO3) e a dolomita (CaMg(CO

3)2). Os carbonatos são

importantes na fabricação de insumos minerais utilizados pelas indústrias para a fabricação de cimento e corretivos de solo.

• Sulfatos – apresentam o radical (So3)2-, como a anidrita (CaSO4), a barita

(BaSO4), e gipsita (CaSO

4.H

2O). São formados pela precipitação química a

partir de soluções aquosas, principalmente em ambientes marinhos.

• Sulfetos – compostos por metais combinados com o ânion S ou S2-. Os sulfetos são importantes minerais presentes em minérios como pirita (FeS

2),

calcopirita (CuFeS2), galena (PbS) e pentlandita [(Fe,Ni)

9S

8].

• Haletos – são classes de minerais que apresentam ânions halogênios (grupo 17 da tabela periódica). Os mais conhecidos são a fluorita (CaF

2), halita (NaCl)

e silvita (KCl).

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• Óxidos – minerais com o ânion O2. São importantes fontes de minerais

metálico como hematita (Fe2O

3), magnetita (Fe

3O

4), cromatita (Cr

2O

4),

espinélio (MgAl2O

4) e rutilo (TiO

2).

• Fosfatos – minerais com o ânion (PO4)3-. O mais comum é a apatita

(Ca5(PO

4)3(F,Cl,OH)), de onde é extraído o fosfato utilizado como fertilizante

na agricultura.

3.2.2 As Rochas

Como vimos por meio do estudo dos minerais, existem diversas semelhanças e diferenças entre eles. No caso das rochas, a diferenciação é mais simples. Para Press et al. (2006, p. 103), uma “rocha é um agregado sólido de minerais que ocorre naturalmente”. Leinz e Amaral (1978, p. 40-41) definem que rocha “é um agregado natural formado por um ou mais minerais (inclusive vidro vulcânico e matéria orgânica”. Mas, como vidro vulcânico e matéria orgânica não são considerados minerais, há divergências sobre a definição de Leinz e Amaral (1978).

Como veremos, as rochas são divididas em três grandes grupos: magmáticas, sedimentares e metamórficas. Está divisão é fundamentada no processo de formação das rochas.

Antes de entrarmos nas características particulares das rochas, precisamos entender que existe um ciclo das rochas, ou seja, as rochas estão em constante transformação. O ciclo das rochas representa as inúmeras possibilidades pelas quais, ao longo do tempo geológico, um tipo de rocha pode transformar-se em outro. Podemos considerá-lo um conjunto de processos permanentes que se sucedem.

3.2.2.1 O Ciclo das Rochas

As rochas se apresentam em constante processo de transformação em virtude da dinâmica interna e externa da Terra. Ao longo desta seção, vamos fazer uma abordagem detalhada de cada tipo de rocha, mas nesse momento precisamos entender como ocorre o processo de transformação nas rochas (Figura 3.9).

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Figura 3.9 | Processos envolvidos no Ciclo da Rochas

Fonte: O autor (2015).

A distribuição dos tipos de rocha ao longo da crosta indica que 95% do volume total corresponde a rochas ígneas e metamórficas e apenas 5% são rochas sedimentares. Considerando a distribuição dessas rochas em áreas de exposição rochosa superficial nos continentes e assoalhos oceânicos, os números se modificam para 75% de rochas sedimentares e apenas 25% de rochas ígneas e metamórficas.

Por que existe diferença quando comparamos o volume das rochas ao longo da crosta com o volume de exposição superficial?

As rochas ígneas ou magmáticas são originadas pela cristalização de magmas, que, na sua maioria, são silicatos líquidos, de alta temperatura, provenientes do interior da Terra. As rochas ígneas podem ocorrer em jazidas de vários metais, como ouro, platina, cobre ou estanho, e trazem à superfície do planeta importantes informações acerca de regiões profundas da crosta e do manto terrestre.

As rochas sedimentares são produtos originados da consolidação de sedimentos na superfície terrestre. Elas fornecem informações sobre as variações ambientais ao longo do tempo geológico. Os fósseis ficam preservados nessas rochas e são a chave para a compreensão da origem e evolução da vida. A importância econômica dessas rochas está diretamente ligada à extração de petróleo, gás

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natural e carvão mineral.

As rochas metamórficas são o produto da transformação de qualquer tipo de rocha quando exposta a um ambiente cujas condições de pressão e temperatura são muito diferentes daquelas encontradas nas rochas de que se originou. O estudo dessas rochas permite a identificação de grandes eventos geotectônicos ocorridos no passado, fundamentais para o entendimento da atual configuração dos continentes.

O ciclo das rochas representa diversas possibilidades de transformação de um tipo de rocha em outra. Essa cadeia de processos foi proposta por James Hutton na década de 1790. Os processos ígneos são geralmente colocados no início do ciclo das rochas, pois partem da consolidação e acreção da Terra, principalmente pela cristalização do magma.

As rochas que estão expostas à ação da atmosfera, hidrosfera e biosfera sofrem o processo de intemperismo, um processo natural que envolve fenômenos de oxidação, hidratação, solubilização, ataques de substâncias orgânicas, variações climáticas, entre outros. O intemperismo faz que as partículas da rocha percam coesão, desprendendo-se e sendo transportadas e depositadas em depressões. Após um processo de diagênese têm origem as rochas sedimentares.

A dinâmica interna da Terra também faz que as rochas formadas em determinados ambientes geológicos sejam levadas a ambientes muito diferentes, principalmente em relação à temperatura, pressão e composição química. Assim, as rochas sofrem transformações mineralógicas e texturais, tornando-se metamórficas. Quando as condições de metamorfismo são muito intensas, as rochas podem se fundir, gerando magmas que ao se solidificarem dão origem a rochas ígneas.

O ciclo das rochas existe desde os primórdios da história geológica da Terra e, por causa de sua ação, a crosta está em constante transformação e evolução.

3.2.2.1.1 Rochas Ígneas

As rochas ígneas são as mais representativas na crosta terrestre e refletem a composição do próprio magma que lhes deu origem por causa do processo de consolidação. Entre as rochas ígneas mais comuns na crosta terrestre estão os granitos e os basaltos. Outros tipos também estão presentes, mas ocorrem em sítios geológicos especiais, por exemplo, os carbonatitos, compostos de calcita e dolomita que são originados de magmas de composição carbonática, e não silicática, como a maioria das rochas ígneas.

A composição química de uma rocha pode ser estimada pela composição mineral constituinte e também pela proporção entre os diferentes minerais. Um

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dos parâmetros químicos mais importantes é o teor de sílica (Figura 3.10). De acordo com esse parâmetro, as rochas ígneas podem ser ácidas (teor de sílica superior a 66%), intermediárias (teor de sílica entre 66% e 52%), básicas (teor de sílica entre 52% e 45%) ou ultrabásicas (teor de sílica inferior a 45%).

Figura 3.10 | Relação entre índices de cor, teor de sílica, composição mineralógica e ambiente de cristalização para rochas ígneas

Fonte: Teixeira et al. (2009)

Nas rochas ácidas existe uma abundância de sílica que resulta na cristalização do quartzo (SiO

2), o qual representa a sílica não incorporada aos demais minerais

silicáticos. Em rochas básicas, os teores de sílica são reduzidos e estão presentes mais componentes químicos, como Mg, Fe e Ca. Isso resulta na abundância de silicatos ricos em olivina, piroxênios, anfibólios e biotita, que caracterizam rochas escuras. Em rochas ácidas e intermediárias predominam minerais félsicos, de cores claras, representados principalmente por feldspatos e feldspatoides, além do próprio quartzo.

A composição mineralógica das rochas ígneas é o quesito fundamental na nomenclatura e classificação petrográfica. Essa composição está diretamente ligada à composição do magma que as originou. As texturas e estruturas também auxiliam no processo de classificação das rochas ígneas.

Rochas que são formadas pela consolidação do magma em regiões próximas à superfície da crosta (vulcânicas) têm características diferentes daquelas consolidadas no interior da crosta. Quanto mais próxima da superfície da crosta mais rápida é a consolidação, o que diminui a formação de germes cristalinos ou o desenvolvimento adequado dos minerais, dando origem a um vidro vulcânico. Em rochas que se consolidam em profundidades maiores, de maneira mais lenta, a difusão dos elementos acaba sendo mais eficiente e desenvolvem-se minerais de dimensões maiores.

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Acesse o link e saiba mais sobre a nomenclatura e classificação das rochas ígneas. Disponível em: <http://motoki5.tripod.com/Ign/Ign2004_3.pdf>. Acesso em: 10 set. 2015.

3.2.2.1.2 Rochas sedimentares

Como vimos anteriormente, as rochas sedimentares representam 75% da cobertura do planeta. As rochas sedimentares são aquelas formadas a partir de material oriundo da destruição de outra rocha, seja ela ígnea, metamórfica ou mesmo sedimentar. Qualquer rocha originada de material proveniente de destruição erosiva de qualquer tipo de rocha, que foi transportado e posteriormente depositado em outro ambiente, é classificado como rocha sedimentar.

Veremos, na próxima seção, que o intemperismo age modificando as propriedades físicas e químicas dos minerais e rochas, podendo formar sedimentos. Esses sedimentos são arrastados pela erosão, por meio da ação de agentes como vento, água e gelo, para áreas mais baixas do relevo, onde essas partículas se depositam. Após o acúmulo de camadas sucessivas de sedimento, essas camadas passam por um processo de compactação e, por fim, há a diagênese, em decorrência do aumento da temperatura e pressão, além das reações químicas, transformando os sedimentos em rochas sedimentares.

É comum a utilização da palavra areia para se referir a qualquer tipo de sedimento; no entanto, a areia é um tipo de sedimento com tamanho granulométrico definido, podendo ser identificadas areias desde muito grossas até muito finas. A Tabela 3.2 mostra a escala de Udden-Wentworth, criada em 1922, para a classificação granulométrica dos sedimentos.

Tabela 3.2 | Escala granulométrica de Udden-Wentworth

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Fonte: adaptada de Melo e Giannini (2007).

Nem toda partícula desagregada de rochas é um sedimento. A partícula só é chamada sedimentar quando começa a sofrer um transporte mecânico. Durante o transporte, o sedimento pode passar por transformações químicas e físicas, alterando sua composição ou estrutura. Conforme o grão vai sendo carregado, a tendência é que ele fique cada vez mais arredondado, pois os ângulos do grão vão sendo destruídos pelo atrito e quebra.

O intemperismo físico produz fragmentos de rochas, enquanto o químico produz sólidos dissolvidos, e os produtos finais são agrupados em sedimentos clásticos, químicos e bioquímicos.

Acesse o link e veja mais sobre os sedimentos e as rochas sedimentares. Disponível em: <http://www.ufpa.br/larhima/Material_Didatico/Graduacao/Geologia_Geral/Sedimentos%20e%20Rochas%20sedimentares.doc>. Acesso em: 10 set. 2015.

3.2.2.1.3 Rochas Metamórficas

O processo de formação das rochas metamórficas ocorre na profundidade da crosta e pode acontecer de dezenas até uma centena de quilômetros. Portanto, para estudarmos as rochas metamórficas, temos de analisar suas feições quando elas são expostas à superfície ou, então, a partir de estudos laboratoriais.

Definimos como metamorfismo o conjunto de transformações com mudanças na estrutura, textura, composição mineralógica ou mesmo composição química,

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pelas quais uma rocha preexistente – chamada portolito – adapta-se a novas condições físico-químicas no interior da crosta. As mudanças mineralógicas resultam de reações no estado sólido.

No processo de metamorfismo nem sempre a composição mineralógica da rocha é alterada, mas a textura sempre se modifica. Pode ocorrer tanto a recristalização dos minerais preexistentes quanto a formação de novos minerais em razão de a estrutura cristalina ser exposta a novas condições de pressão, temperatura e/ou combinação química entre dois ou mais minerais, que formam um novo mineral compatível às novas condições.

Tanto a pressão quanto a temperatura de formação das rochas metamórficas são maiores que no processo de diagênese. Para termos uma ideia, a pressão para a formação de um diamante é de 40 kilobars (cada kilobar corresponde a mil atmosferas de pressão), pressão essa decorrente de se estar a 130 mil metros de profundidade. A maioria dos processos metamórficos ocorre nas margens de placas em contato convergente, ou seja, onde se desenvolvem as maiores cadeias de montanhas da Terra, como o Himalaia e os Andes.

Temos como fatores condicionantes do metamorfismo a natureza do protolito, a temperatura, a pressão, os fluidos e o tempo.

Existem diversos tipos de metamorfismos envolvidos no processo de formação das rochas metamórficas. Acesse o link para aprofundar esse conhecimento. Disponível em: <http://www.rc.unesp.br/museudpm/rochas/metamorficas/metamorficas1.html>. Acesso em: 22 set. 2015.

1. A crosta terrestre é a camada superior e sólida da Terra onde se encontram as rochas e as formas de relevo em geral. Os três tipos de rochas, classificadas conforme a gênese, que constituem essa camada são:

a) Ígneas, magmáticas e vulcânicas.

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b) Sedimentares, metamórficas e magmáticas.

c) Metamórficas, fósseis e minerais.

d) Litológicas, fraturadas e plásticas.

e) Superficiais, intrusivas e extrusivas.

(Fonte: Disponível em: <http://exercicios.mundoeducacao.com/exercicios-

geografia/exercicios-sobre-crosta-terrestre.htm>. Acesso em: 22 set. 2015.)

2. A distribuição das rochas ao longo da crosta é homogênea? Explique.

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Seção 3

Intemperismo e Pedogênese

Introdução à seção

O solo, camada mais superficial da litosfera ou crosta terrestre, é o substrato sobre o qual a vida se desenvolve, assim influenci as características da biosfera, além de ser modificado por ela em função dos processos interativos existentes entre o solo e os seres vivos.

Os solos se formam a partir de um processo de intemperismo da rocha matriz por ação de agentes como sol, fatores climáticos, ação dos seres vivos e agentes mecânicos como gelo e neve. Eles são constituídos em proporções variáveis de minerais, água, gases e húmus. Entretanto, o fator que mais influencia o tipo de solo de cada região é a rocha matriz, que fornece os minerais que o compõe.

A importância econômica e ambiental do solo é incalculável, entretanto, seu uso inadequado para fins econômicos, tais como agricultura, pecuária, mineração etc., tem provocado perdas anuais de toneladas de solos férteis que são levados pelas chuvas e rios, provocando vários problemas ambientais, com prejuízos econômicos para as atuais e futuras gerações.

3.3.1 Intemperismo

Ao serem expostas à atmosfera, as rochas sofrem a ação direta dos raios do sol, dos agentes biológicos (animais e plantas), dos fatores climáticos, entre outros. Assim, as características físicas, bem como a composição química dos minerais que as compõem, vão se alterando. Este processo contínuo de desagregação e decomposição da rocha, conhecido como intemperismo físico ou mecânico e químico, é o que dá origem ao solo. Sene e Moreira (1998) relatam que “em regiões tropicais úmidas são necessários, em média, 100 anos para a formação de apenas dois centímetros de solo. Em áreas de clima frio e seco, esse período é ainda maior”.

Percebe-se, portanto, que o processo de formação do solo ocorre ao longo de centenas de milhares de anos, e o uso inadequado faz perder vários centímetros de solos férteis por ano.

Como vimos, existem duas formas de intemperismo que alteram as rochas para dar origem aos solos: a física ou mecânica e a química (Figura 3.11). Ao longo desta

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seção, estudaremos essas duas formas, bem como os processos geológicos que estão relacionados.

Figura 3.11 | Cânion Guartelá em Tibagi-PR, resultante do desgaste geológico por ação de agentes físicos e químicos

Fonte: Disponível em: <http://www.sescpr.com.br/wp-content/uploads/2015/04/guartela.jpeg>. Acesso em: 22 set. 2015

3.3.1.1 Intemperismo Físico ou Mecânico

O intemperismo físico ou mecânico nada mais é do que a quebra ou fragmentação da rocha em partículas menores, realizada de maneira física pela ação da chuva, do vento, gelo, alteração de temperatura etc.

Vários processos estão envolvidos no intemperismo físico. A seguir, podemos ver algum deles:

• Ação térmica: a variação diária da temperatura entre o dia e a noite ou entre as diferentes estações do ano promove constantes dilatações e contrações da rocha, levando à sua desagregação.

• Erosão e deposição causadas pela água: ao atingirem o solo, as águas pluviais removem e transportam consigo grande quantidade de sedimentos, que são carreados aos rios e depositados em suas margens. Parte desses sedimentos é levada ao mar e oceanos, sendo depositada em praias, baías e fundos de mares.

• Erosão e deposição causada pelo vento ou eólica: os ventos exercem poder semelhante erodindo montanhas e criando formas como as de Vila Velha-PR ou, ainda, formando dunas como os Lençóis Maranhenses-MA por meio da remoção e deposição de sedimentos (Figura 3.12).

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• Formação de gelo: nas regiões do planeta onde as temperaturas são muito baixas, a água, ao penetrar nas fraturas e nos orifícios das rochas, expande-se após o congelamento, provocando sua desagregação.

• Cristalização de sais: o sal trazido pela maresia se cristaliza nas fraturas, desenvolvendo pressões que ampliam o efeito desagregador.

• Ação orgânica ou biomecânica: intemperismo causado pela ação mecânica das raízes de árvores, que atuam como força motriz, abrindo canais que permitem a entrada e ação de outros agentes que passam a atuar na desagregação. Algumas espécies de insetos, como formigas, também colaboram escavando as rochas de baixa dureza, além de vermes, roedores e alguns mamíferos que também contribuem para o processo de desintegração das rochas.

Figura 3.12 | Vila Velha-PR (A) e Lençóis Maranhenses-MA (B)

Fonte: Disponível em: A <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/2/20/Vila_Velha2.jpg>. Acesso em: 11 set. 2015. Fonte: Disponível em: B <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/9/97/Lencois_Maranhenses_8.jpg>. Acesso em: 11 set. 2015.

3.3.1.2 Intemperismo Químico

O intemperismo químico é a quebra ou fragmentação da rocha por meio da reação da água da chuva com alguns elementos minerais existentes nas rochas. Estes elementos minerais reagem com a água resultando em reações químicas que auxiliam no processo de quebra ou fragmentação da rocha sob uma fissura já existente.

A água proveniente da chuva, que infiltra até chegar às rochas, é levemente ácida, pois incorpora:

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• Gás carbônico, oxigênio e nitrogênio ao atravessar a atmosfera.

• Ácidos orgânicos e CO2 provenientes da transpiração e putrefação dos

organismos, em geral microrganismos, que existem em abundância nos poros da parte superior dos solos sobre as rochas.

As substâncias em solução, de grande mobilidade e grande atividade química, são capazes de realizar uma permuta de radicais básicos ou ácidos com minerais das rochas.

Da mesma forma, os coloides, que ocorrem também em suspensão nas águas de infiltração, apresentando fácil dispersão e íons na capa externa de água absorvida, podem reagir com os minerais das rochas.

Assim, o mecanismo do intemperismo químico consiste na troca lenta e gradual de íons, durante milhares (ou milhões) de anos entre os solutos e os coloides das águas de infiltração, de um lado, e os minerais das rochas, de outro lado.

O intemperismo químico depende, portanto, exclusivamente da água, predominando nos climas úmidos e sendo mínimo nos climas desérticos. Para que a decomposição química dos minerais se efetue, é necessário que haja um fornecimento contínuo de íons em solução e/ou coloides em suspensão pelas águas de infiltração, que percolam em direção à rocha.

Além da presença de água, as condições de pH do ambiente de decomposição contribuem para a velocidade do intemperismo e os minerais que serão formados, por exemplo: dependendo das condições de pH, o Fe pode se alterar para Fe+2 ou Fe+3.

Um exemplo clássico do intemperismo químico é a alteração que os minerais como feldspato e mica sofrem após a ação química da água, em que se transformam em argila. Outro exemplo são as formações das cavernas calcárias, como as cavernas de Botuverá-SC (Figura 3.13). Essas cavernas se formaram em regiões onde existe grande quantidade de calcário. A água, ao infiltrar-se na rocha, dissolve o calcário e cria fissuras, formando as cavernas ao longo de milhões de anos. O calcário dissolvido volta a solidificar-se em um mineral chamado calcita, por meio do processo de gotejamento, que dá origem às estalactites (teto) e estalagmites (colunas que sobem do solo).

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Figura 3.13 | Caverna de Botuverá-SC

Fonte: Disponível em: <http://www.botuvera.sc.gov.br/wp-content/gallery/parque-das-grutas/caverna-botuvera-9.jpg>. Acesso em: 10 set. 2015.

3.3.1.3 Fatores que Influenciam o Intemperismo dos Minerais

Vários fatores atuam diretamente no processo de intemperismo. As condições climáticas exercem influência preponderante nesse processo. Em climas onde há reduzida precipitação, existe uma predominância dos processos mecânicos de intemperismo, reduzindo o tamanho das partículas sem grandes alterações na composição química. Nas regiões de clima chuvoso, a umidade estimula tanto a ação química quanto mecânica, favorecendo a formação de novos minerais e produtos solúveis.

No clima temperado, entre os minerais que se formam está a argila; por esta razão, esse mineral está presente no solo agrícola das regiões sob o domínio desse clima. Geralmente, em climas quentes como o Equatorial, a intensidade do intemperismo é mais rápida, favorecendo a ação química no processo de decomposição dos minerais. Em regiões tropicais úmidas, os produtos mais resistentes do intemperismo químico, como hidróxidos de ferro e de alumínio, tendem a ser predominantes.

O clima exerce grande influência sobre o tipo de vegetação predominante. Deste modo, exerce ação indireta sobre as reações bioquímicas nos solos e, portanto, em seus efeitos sobre o intemperismo mineral. Por exemplo, os solos formados sob florestas coníferas, cujas agulhas possuem cátions metálicos em quantidades reduzidas, são geralmente mais ácidos que outros formados sob pradarias ou árvores caducifólias.

Do ponto de vista do intemperismo físico, o tamanho das partículas, a dureza e o grau de compactação constituem as três características físicas que agem sobre

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o intemperismo. Rochas formadas com grandes cristais de diferentes minerais favorecem a desintegração. Isto acontece porque há variação nos coeficientes de expansão e contração de cada mineral à medida que se modifica a temperatura. As tensões resultantes auxiliam o desenvolvimento de rachaduras e a dissociação das rochas em seus componentes minerais. Os materiais de granulação mais fina são aparentemente mais resistentes à dissolução mecânica.

A dureza e o grau de compactação exercem, ao que parece, influência sobre o intemperismo, basicamente em função da intensidade de desintegração em partículas suficientemente pequenas para possibilitar a decomposição. Assim, um quartzito denso ou um arenito firmemente compactado por outro mineral, quando submetido a intemperismo lento, resistirá à dissolução mecânica.

3.3.2 Pedogênese

As rochas, ao sofrerem o processo de intemperismo ao longo de milhões de anos, transformando-se em solo, deixam porosidades que permitem a penetração de água e ar, o que possibilita a formação de um ambiente favorável para o desenvolvimento de animais e plantas, que passam a agir com mais intensidade, aumentando o intemperismo e acrescentando ao solo matéria orgânica, o que melhora sua fertilidade.

O solo é formado pelos seguintes elementos:

• Minerais: por causa das rochas que lhes deram origem, apresentam partículas de tamanhos diferentes que recebem uma classificação com base no tamanho, do menor para o maior: argila, silte, areia fina, areia grossa e cascalho.

• Matéria orgânica: conhecido como húmus, é resultado do acréscimo ao solo de restos da decomposição de plantas e animais, por meio da ação de microrganismos.

• Água: tem o importante papel de fornecer nutrientes às plantas, tais como: sais minerais, oxigênio, gás carbônico. A água é retida temporariamente no solo, sendo reposta pela chuva ou, no caso de cultivo, pela irrigação artificial.

• Ar: ao ocupar os poros do solo não preenchidos pela água, o ar fornece oxigênio para as plantas que o absorvem através das raízes. O oxigênio presente em abundância no subsolo favorece a formação de húmus.

Quanto maior a quantidade de vida que se desenvolve sobre o solo, maior é sua riqueza. Entretanto, ao analisarmos o perfil do solo e as diferentes camadas que o formam, descobrimos que a profundidade de cada horizonte depende da origem da rocha matriz, do tempo em que esta se formou e também das condições

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climáticas de cada região.

Por exemplo, os solos da Mata Atlântica são formados por rochas muito antigas, geologicamente falando; além disso, a presença da umidade do mar traz chuvas constantes. Por isso, podemos dizer que esses solos são ricos em vida biológica nos horizontes A, B e parte do C, e a rocha matriz está até 30 ou 40 metros de profundidade.

Já o solo da caatinga, por exemplo, é raso, pedregoso e alcalino, e não armazena a chuva que cai. As altas temperaturas causam evaporação intensa e salinização do solo. Na estação seca, a temperatura do solo pode chegar a 60°C. O perfil do solo desenvolve-se simultaneamente ao processo de intemperismo da rocha, sendo que esse perfil é definido a partir da superfície até a rocha matriz (Figura 3.14).

Figura 3.14 | Perfil do solo e horizontes

Fonte: Disponível em: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/3/30/Soil_sci.jpg/220px-Soil_sci.jpg>. Acesso em: 11 set. 2015. Fonte: Disponível em: <http://images.slideplayer.com.br/7/1853818/slides/slide_9.jpg>. Acesso em: 11 set. 2015.

Ao analisarmos o corte vertical de um solo, que denominamos “perfil”, visível nas barreiras de estradas, é possível constatar a presença de diferentes camadas, em geral distintas, chamadas de horizontes.

Em um solo bem preservado, as camadas aparecem bem definidas, e o horizonte A possui coloração escura por causa da decomposição da matéria orgânica, que forma o húmus, atribuindo ao solo grande fertilidade. Para formar 30 centímetros de solo com húmus são necessários entre 40 e 60 anos. Entretanto, é a camada do solo mais exposta às intempéries a que mais sofre perdas em função do uso inadequado, principalmente na agricultura.

No horizonte A, o processo de meteorização ou intemperismo é mais intenso,

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em função de sua maior exposição tanto a agentes climáticos como orgânicos. Entre o horizonte A e o horizonte B existe deslocamento de materiais, tais como: água, argilas, sais e muitos outros componentes, por causa de um processo chamado lixiviação. O horizonte B, por receber materiais do horizonte A, é o mais compacto, entretanto ainda existe a presença de matéria orgânica, pois é o espaço destinado ao crescimento das raízes. No horizonte C, o processo de intemperismo da rocha não está completo, sendo possível visualizar pequenos blocos de rocha misturados ao solo. O horizonte R (rocha) constitui a rocha matriz consolidada.

3.3.2.1 Classificação do Solo Quanto à sua Origem

O solo é resultado da ação das várias forças da natureza promovendo o intemperismo das rochas e consequente formação do solo. Qualquer solo é formado a partir de uma rocha matriz e, portanto, está repousando em sua posição por séculos, milhares de anos ou pode ter sido transportado para longe de sua formação original.

Segundo a origem de sua formação, os solos podem ser classificados em quatro tipos principais, além de suas subdivisões:

1) Solos residuais: são formados a partir da desagregação da própria rocha onde se encontram; por esta razão também são conhecidos como “in situ”. Podem ser divididos em dois subtipos:

- Solo eluvial: é formado pela camada mais superficial do solo; por esta razão, é conhecido como solo residual ou maduro. Uma análise macroscópica identifica um solo mais homogêneo.

- Solo de alteração: possui a presença de elementos da rocha original, o que lhe atribui uma característica heterogênea, uma vez que está abaixo do solo eluvial.

2) Solos transportados: têm origem na erosão, transporte e deposição de solos preexistentes, provenientes de sedimentos recentes, principalmente do terciário e quaternário. Podem ter origem eólica, fluvial ou marinha. Os solos transportados podem ser dos seguintes tipos:

- Aluvião: formado por material erodido trabalhado e transportado por ação fluvial e depositado em leitos e margens, bem como em fundos e margens de lagoas e lagos.

- Coluvião: consiste em material solto ou decomposto, transportado e depositado no sopé de montanhas por ação da gravidade.

- Tálus: consiste na presença de blocos de rochas, transportados por gravidade e depositados no sopé de montanhas, resultado de solos poucos espessos.

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3) Solos coluvionais: consistem em solos com movimentação lenta da parte mais superficial, em função de agentes como a gravidade. Possuem aspecto homogêneo, não apresentando estratificação visível.

4) Solos orgânicos: consistem em solos ricos em matéria orgânica, além dos minerais que os compõem.

1. Qual é a diferença do intemperismo entre regiões onde existe grande pluviosidade e regiões secas?

2. Qual é a diferença entre o horizonte A e C do perfil do solo? Explique.

• O planeta Terra está a uma distância média do Sol de 150 milhões de quilômetros e começou a ser formado há cerca de 4 a 5 bilhões de anos. O processo de formação do planeta teria se iniciado a partir da agregação de poeira cósmica em rotação em um processo que é chamado de acreção.

• A crosta foi a primeira camada a se resfriar e se solidificar por causa do contato com o espaço e suas baixíssimas temperaturas. Antes da formação da atmosfera o planeta era constantemente bombardeado por corpos celestes. Acredita-se que esses choques contra a fina crosta resultavam em intensos eventos vulcânicos que liberavam lava e vapor d’água, que formaram as primeiras chuvas que deram origem aos oceanos e à formação da atmosfera primitiva.

• É difícil estudar a estrutura interna do planeta por ser impossível ter acesso direto a ela. No entanto, com o desenvolvimento da rede sismográfica mundial e dos métodos de observação e análise, foram encontradas as interfaces e zonas de transição do interior terrestre. Hoje sabemos que o interior terrestre é formado pelo manto e pelo núcleo.

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• Quase toda a matéria sólida presente na natureza é composta por minerais.

• Os minerais são formados por átomos organizados em um arranjo periódico tridimensional denominado estrutura cristalina.

• As rochas são agregados consolidados desses minerais, são originadas por processos que ocorrem na dinâmica do planeta e apresentam características ligadas à sua origem. Elas se apresentam em constante processo de transformação, em virtude das dinâmicas internas e externas da Terra.

• Ao serem expostas à atmosfera, as rochas sofrem ação direta dos raios do sol, dos agentes biológicos, tais como animais e plantas, dos fatores climáticos, entre outros. Assim, as características físicas, bem como a composição química dos minerais que as compõem vão se alterando. Este processo contínuo de desagregação e decomposição da rocha, conhecido como intemperismo físico ou mecânico e químico, é o que dá origem ao solo.

• Vários fatores atuam diretamente no processo de intemperismo. As condições climáticas exercem influência preponderante nele.

• As rochas, ao sofrerem o processo de intemperismo ao longo de milhões de anos, transformando-se em solo, deixam porosidades que permitem a penetração de água e ar, o que possibilita a formação de um ambiente favorável para o desenvolvimento de animais e plantas, que passam a agir com mais intensidade, aumentando o intemperismo e acrescentando ao solo a matéria orgânica, o que melhora sua fertilidade.

Caríssimos estudantes, ao longo desta unidade, pudemos compreender melhor como nosso planeta é constituído. Sabemos que a Terra apresenta inúmeros processos geológicos, mas, como vimos ao longo das seções, esses processos moldaram o planeta que temos hoje. O tempo geológico nos dá uma amostra de como nosso planeta foi se formando ao

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longo do tempo e de que ainda não terminou seu processo de transformação, basta analisarmos o ciclo das rochas e também os processos geológicos externos.

Compreender a estrutura interna e externa de nosso planeta nos abre caminhos para que nossos estudos avancem em direção à paleontologia, que será o objeto de estudo de nossa próxima unidade. Como futuros educadores, sabemos como a evolução e a paleontologia nos permitem compreender a vida que encontramos hoje no planeta, bem como as transformações que ela sofreu ao longo do tempo geológico.

Até nossa próxima unidade!

1. O planeta Terra tem 4,54 bilhões de anos e ao longo desse intervalo de tempo muitos acontecimentos moldaram a estrutura que conhecemos hoje. Sobre o tempo geológico, analise as assertivas a seguir:

I – Os éons são intervalos de tempo pequenos, geralmente marcados por eventos geológicos bem definidos.II – O período é a unidade fundamental do tempo geológico e pode ser dividido em épocas.III – A idade é a menor unidade de tempo dentro da escala geológica.

Assinale a alternativa CORRETA:

A) A assertiva I está correta. B) A assertiva II está correta. C) A assertiva III está correta. D) As assertivas I e II estão corretas. E) As assertivas II e III estão corretas.

2. O tempo geológico é basicamente dividido em quatro éons. O éon geológico mais atual, no qual nos encontramos hoje, é o:

A) Hadeano.

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B) Fanerozoico.C) Mesozoico.D) Arqueano.E) Proterozoico.

3. Sobre os minerais, assinale a alternativa INCORRETA:

A) Os minerais são sólidos homogêneos, ou seja, têm forma própria e não são fluidos como os líquidos e gases.B) Os minerais são de ocorrência natural, isso quer dizer que não podemos considerar os minerais substâncias sintéticas.C) Os minerais podem ser orgânicos e inorgânicos, de acordo com suas propriedades e ocorrência no Planeta.D) Os minerais são substâncias sólidas cristalinas, por isso precisamos sempre os tratar como sólidos.E) Os minerais têm composição química definida que varia dentro de limites definidos.

4. Sobre o Ciclo das Rochas, analise as afirmativas a seguir:

I - As rochas podem ser divididas em três grandes grupos: Magmáticas, Sedimentares e Metamórficas.II - O magma é um fluido viscoso e muito quente que, quando chega até a superfície, passa a se chamar lava, onde acaba solidificado, dando origem às rochas ígneas vulcânicas.III - O intemperismo altera as características físicas e químicas das rochas, quando expostas à superfície terrestre.IV - Ao longo do tempo, o sucessivo acúmulo de material leva ao processo de litificação dos sedimentos, ou seja, à formação de rochas magmáticas.

Com base nas afirmativas, assinale a alternativa CORRETA:

A) As afirmativas I e II estão corretas. B) As afirmativas I e III estão corretas. C) As afirmativas I, II e III estão corretas. D) As afirmativas I, II e IV estão corretas. E) As afirmativas I, III e IV estão corretas.

5. O que significa acreção?

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151Tempo Geológico, Rochas e Processos Geológicos

Referências

CARVALHO, I. S. Paleontologia – conceitos e métodos. 3. ed. Rio de Janeiro: Interciência Ltda., 2010, 756p.

LEINZ, Viktor; AMARAL, Sérgio Estanislau do. Geologia Geral. 7. ed. São Paulo: Nacional, 1978.

MELO, M. S.; GIANNINI, P. C. F. Sandstone dissolution landforms in the Furnas Formation, southern Brazil. Earth Surface Processes and Landforms, Bognor Regis, v. 32, p. 2149-2164, 2007.

POPP, José Henrique. Geologia Geral. 5. ed. Rio de Janeiro: LTC, 1998.

PRESS, Frank et al. Para entender a Terra. 4. ed. Porto Alegre: Bookman, 2006.

SENE, E. de; MOREIRA, J. C. Geografia Geral e do Brasil: Espaço Geográfico e Globalização. São Paulo: Scipione, 1998. 520p.

TEIXEIRA, Wilson et al. Decifrando a Terra. 2. ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2009.

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Nesta seção, vamos estudar os eventos geológicos relacionados ao vulcanismo e aos abalos sísmicos. Sabemos que os vulcões são importantes para a formação do relevo, pois suas lavas originam as rochas ígneas. Também, estudaremos as características das erupções vulcânicas e dos produtos gerados pelas atividades vulcânicas.

Sobre os abalos sísmicos, vamos entender o que é um terremoto, os locais onde eles podem ser originados e como podem interferir na dinâmica do planeta. Também, vamos estudar as ondas P e as ondas S, que são vibrações originadas pelos abalos sísmicos.

Seção 1 | Vulcanismo e Abalos Sísmicos

Objetivos de aprendizagem: Olá, acadêmico!

Nesta unidade, vamos estudar os conceitos geológicos ligados aos eventos sísmicos e ao vulcanismo. O vulcanismo é um importante agente modelador do relevo; no entanto, ao contrário do que muitos pensam, as lavas e as erupções não são todas iguais, visto que possuem características distintas conforme sua composição. Em relação a abalos sísmicos, vamos ver o que é um terremoto e como acontece a vibração das ondas produzidas por eles.

Também, nesta unidade, estudaremos conceitos relacionados à paleontologia, aos processos de fossilização e aprenderemos como acontece a preservação das partes moles e duras.

Você está pronto? Então, vamos lá!

Maurilio Cristiano Batista Bergamo

Unidade 4

SISMICIDADE, VULCANISMO E PALEONTOLOGIA

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Na segunda seção, vamos estudar os principais conceitos relacionados à paleontologia. Veremos como essa ciência é importante para outras áreas do conhecimento, como a evolução, geologia, genética, química, entre outras. Por meio dos estudos paleontológicos vamos compreender os fenômenos que originaram transformações ambientais e dos organismos que fazem parte da história evolutiva do planeta.

Seção 2 | Introdução ao Estudo da Paleontologia

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Introdução à unidade

A partir de agora vamos dar início aos nossos estudos sobre eventos sísmicos, vulcanismo e paleontologia. Sabemos que, ao longo do tempo geológico, nosso planeta sofreu diversas transformações para que fosse estabelecida a conformação atual da crosta terrestre. Essas transformações geraram o registro geológico e o solo do planeta.

Ao longo da primeira seção, vamos estudar os vulcões e veremos que, além da lava vulcânica, existem outros produtos originados pelas erupções vulcânicas. Também, estudaremos os abalos sísmicos e suas relações com as placas tectônicas. Deste modo, encerraremos nossos estudos geológicos.

Na segunda seção, estudaremos conceitos relacionados a uma ciência importante para compreendermos como as transformações ambientais interferiram na vida biológica do nosso planeta. Vamos ver como os fósseis são formados e quais são as principais partes dos organismos conservadas ao longo do processo de fossilização.

Bons estudos!

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Seção 1

Vulcanismo e Abalos Sísmicos

Ao longo desta seção, estudaremos dois processos geológicos importantes para o planeta Terra. O vulcanismo foi importante para a formação do relevo terrestre, pois forneceu elementos para a formação das rochas e dos solos. Já o abalo sísmico ou terremoto é um tremor da superfície terrestre produzido por forças naturais situadas no interior da crosta terrestre, a profundidades variáveis. O abalo é causado pelo choque de placas rochosas situadas a uma profundidade que vai de 50 km até 900 km abaixo do solo. Outros fatores considerados para sua ocorrência são deslocamentos de gases, como o metano, e atividades vulcânicas.

4.1.1 Vulcanismo

Os vulcões são importantes agentes formadores do relevo, por isso estudá-los nos fornece elementos para compreender como as rugosidades da crosta terrestre foram formadas.

Os vulcões podem ser considerados fontes de informações importantes sobre o interior da Terra, pois a lava, os gases e as cinzas fornecem valiosas informações sobre os minerais e a formação da crosta. É importante também para o conhecimento de como os ecossistemas no planeta se formaram, pois acredita-se que cerca de 25% de todo O

2, H

2, C, Cl e N

2 presente na biosfera seja

proveniente das atividades vulcânicas. Estudos apontam que a formação de nossa atmosfera está diretamente relacionada à atividade vulcânica. A água, que ocorre desde o início da existência de nosso planeta, também tem sua origem ligada à atividade vulcânica.

Os vulcões emanam produtos de diferentes estados, isto é, sólidos, líquidos e gasosos. Vamos aprender quais são os principais produtos vulcânicos e alguns elementos associados às áreas vulcânicas (lavas, gases vulcânicos, fumarolas, gêiseres, piroclastos) para posteriormente compreendermos os diferentes estilos eruptivos.

4.1.1.1 Lavas

Classificamos como lava o material rochoso fundido que extravasa a superfície. Devemos notar que, quando um vulcão está em estado eruptivo, não apenas a

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lava é lançada à superfície (Figura 4.1), mas também uma grande quantidade de gases é liberada. Assim, devemos nos atentar à terminologia: a lava, na verdade, é o magma que atingiu a superfície terrestre.

As lavas são importantes para a formação de rochas magmáticas. Sabemos que existem diferentes tipos de rochas magmáticas, então podemos deduzir que nem toda lava é igual.

Quais características diferenciam os principais tipos de lava?

Figura 4.1 | Erupção vulcânica do Monte Santa Helena (EUA) em 1980

Fonte: Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Vulc%C3%A3o#/media/File:MSH80_st_helens_eruption_plume_07-22-80.jpg>. Acesso em: 4 out. 2015.

Podemos ver a grande quantidade de gases e cinza lançados pelo vulcão. A seguir, serão apresentados os principais tipos de lavas e suas características.

4.1.1.1.1 Lavas Basálticas

As lavas basálticas apresentam coloração preta e atingem a temperatura de

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1.000°C a 1.200ºC (semelhante a do manto superior). Uma das mais importantes características desse tipo de lava é o fato de conter baixo nível de sílica (SO

2), o que

a torna muito fluida (Figura 4.2). Ao observarmos uma erupção de lavas basálticas, percebemos que o fluxo é pouco espesso e com alta velocidade de deslocamento do material rochoso fundido, podendo atingir grandes áreas. Esse tipo de lava foi emanado dos eventos vulcânicos que formaram as férteis terras roxas, como as que compõem a bacia do Rio Paraná, quando houve a separação da Pangeia.

Figura 4.2 | Lava basáltica da erupção do vulcão Kilauea no Havaí

Fonte: Disponível em: <http://www.astronoo.com/images/volcans/kilauea-hawaii.jpg>. Acesso em: 4 out. 2015.

4.1.1.1.2 Lavas Almofadas

O termo é a tradução literal do nome que recebe em inglês, pillow, que significa almofada. Esse tipo de lava ocorre em erupções vulcânicas submarinas que resultam na formação de acumulações de blocos com diâmetro de até um metro. O magma basáltico que escapa do vulcão entra em contato com a água fria do fundo oceânico e rapidamente é resfriado, formando uma película praticamente de forma instantânea, enquanto internamente o material rochoso continua em estado de fusão. A pressão interna aumenta com a chegada de mais lava e, então, essa película é rompida em um ponto, o que resulta novamente no escape de lava, formando assim mais um bloco com as mesmas características. Como a lava basáltica tem um comportamento plástico, resulta em acúmulos sucessivos de blocos (almofadas) (Figura 4.3).

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Figura 4.3 | Lavas almofadas

Fonte: Disponível em: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/7/7c/Nur05018.jpg>. Acesso em: 4 out. 2015.

4.1.1.1.3 Lavas Pahoehoe e aa

Esses termos têm origem na língua nativa falada no Havaí. Portanto, podemos deduzir que são lavas que ocorrem na formação desse arquipélago. As lavas pahoehoe também são conhecidas como lavas com estrutura do tipo corda (Figura 4.4). São pobres em material gasoso, e, quando em contato com o ar, há a formação de uma couraça; porém, abaixo dessa couraça ocorre a continuidade do movimento de lava, o que resulta no enrugamento da couraça. A viscosidade das lavas pahoehoe é parecida com a do mel, e não é rara a formação de túneis subterrâneos de lava, que variam de 1 a 10 metros de diâmetro.

Figura 4.4 | Lava pahoehoe produzida pelo vulcão Kilauea no Havaí

Fonte: Disponível em: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/1/12/Ropy_Pahoehoe_Lava_at_Kilauea_Volcano_in_Hawaii_20071209_A.jpg>. Acesso em: 4 out. 2015.

As lavas aa, também conhecidas como lavas em bloco, são formadas quando o escape dos gases dissolvidos causa um rápido aumento da viscosidade do material emanado do vulcão (Figura 4.5). Como a viscosidade é maior, a velocidade do fluxo é

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Figura 4.5 | Lava Aa avançando sobre a lava Pahoehoe

Fonte: Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Lava#/media/File:Aa_large.jpg>. Acesso em: 4 out. 2015.

4.1.1.1.4 Lavas Riolíticas e Andesíticas

Diferentemente das lavas até então estudadas, as lavas riolíticas e andesíticas têm uma concentração de sílica (SO

2) muito maior, o que confere a elas uma

característica diferenciada das demais, que é a viscosidade muito maior e uma fluidez muito menor. Sua composição mineralógica é mais complexa, e a rocha vulcânica posteriormente formada tem uma coloração clara e avermelhada.

As temperaturas são relativamente mais baixas, por volta de 800 a 1.000°C. Por causa da fluidez mais baixa, é muito comum o acúmulo de material rochoso, que pode alcançar dezenas ou, até mesmo, centenas de metros de altura. As lavas riolíticas são muito fluidas, libertando com facilidade os gases, não provocando explosões e, como tal, associadas a um vulcanismo efusivo (Figura 4.6).

Figura 4.6 | Lavas riolíticas

Fonte: Disponível em: <http://hvo.wr.usgs.gov/multimedia/archive/2007/Dec/20080111_jk_2547_L.jpg>. Acesso em: 4 out. 2015.

menor e a couraça formada tem uma espessura maior do que a das lavas pahoehoe. Desta forma, em erupções que têm esse tipo de lava, é comum que as lavas pahoehoe fiquem próximas ao vulcão, enquanto as lavas do tipo aa fiquem mais afastadas dele.

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4.1.2 Gases Vulcânicos

O material gasoso desprendido de um evento vulcânico pode ser muito grande. A maioria desse material é vapor de água (60% - 90%). Esse vapor pode ser proveniente de três zonas: água subterrânea, do próprio magma ou da reação entre o hidrogênio exalado do vulcão e o oxigênio contido no ar atmosférico. É importante notar que não apenas de vapor de água são formadas as colunas de gases que escapam dos vulcões, pois comumente também temos a presença de gases como CO

2, HCL, H

2S, NH

4, SO

2.

Os gases que escapam dos vulcões, ao reagirem com os gases presentes na atmosfera, formam ácidos que são extremamente nocivos à saúde humana, fauna e flora; assim, os vulcões podem ser responsáveis por grandes impactos ambientais negativos.

4.1.3 Fumarolas

Condutos de gases vulcânicos, fendas ou fissuras são chamados de fumarolas. As fumarolas são classificadas de acordo com a temperatura e os tipos de gases que são exalados. Elementos químicos, como o flúor, enxofre, cobre, prata, zinco, ouro, mercúrio, estanho, molibdênio, tungstênio, arsênio e urânio, podem se concentrar principalmente no veio da rocha. Portanto, essas fumarolas podem se constituir em pontos de interesse econômico para extração de minérios. No Alasca, próximo ao vulcão Katmai, há a presença de um vale com centenas de fumarolas, conhecido como The Thousand Smoke Valley.

Figura 4.7 | Fumarolas no Monte Redoubt no Alaska

Fonte: Disponível em: <https://en.wikipedia.org/wiki/Fumarole#/media/File:Mt_Redoubt_2009-03-21_1237756418_ak231.JPG>. Acesso em: 4 out. 2015.

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4.1.4 Gêiseres

Os gêiseres são formações que ocorrem próximas às áreas vulcânicas (Figura 4.8). Em intervalos regulares, jatos de água quente junto ao vapor de água são lançados com grande força, podendo atingir até mesmo mais de 100 metros de altura.

Figura 4.8 | Gêiser no Parque Nacional de Yellowstone

Fonte: Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/G%C3%A9iser#/media/File:Steam_Phase_eruption_of_Castle_geyser_with_double_rainbow.jpg>. Acesso em: 4 out. 2015.

Cada gêiser tem um intervalo de tempo diferenciado entre um jorro e outro de água e vapor, assim como a duração de um jorro é variável de um gêiser para outro. Esse fenômeno ocorre da seguinte forma:

• Em grandes profundidades, onde existem rochas a altas temperaturas, a água subterrânea é aquecida, produzindo vapores de água que tendem a subir pelas fissuras das rochas.

• A coluna de água acima da água aquecida pelas rochas impede a ascensão do vapor de água abaixo e o aumento do ponto de ebulição da água é observado.

• Existe um momento que o equilíbrio é rompido e o que se observa é a explosão da coluna de água que jorra com grande força. Quando isso ocorre, as fissuras das rochas ficam esgotadas de água e passam a ser preenchidas novamente, o que faz todo o processo se repetir.

As águas expelidas pelos gêiseres são ricas em minerais, e comumente encontramos depósitos de minerais, sobretudo sílica, ao redor da fissura por onde a água escapa.

A formação de lago aquecido próximo aos gêiseres também é comum, chamado de fonte termal. Nesses locais, podem ser observados tipos endêmicos

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de vida, muitos deles organismos extremófilos. É importante considerar que as fontes termais não ocorrem somente próximas aos gêiseres, podendo estar presentes isoladamente.

4.1.5 Piroclastos

Piros, em grego, quer dizer fogo e clastos significa quebrado. Os materiais piroclásticos são constituídos de materiais soltos ou mistura de cinzas vulcânicas, bombas, blocos e gases que são formados durante uma erupção. Nesses fragmentos consolidados, provenientes do subsolo, retirados das rochas ou mesmo do cone do vulcão (Figura 4.9), pode existir material sólido ou semissólido proveniente do magma. O tamanho desse material é muito variado, desde poeira vulcânica até blocos de 1 m3. As cinzas e a poeira vulcânica podem ser transportadas a quilômetros de distância pelos ventos e próximo aos vulcões podem formar espessos pacotes.

Figura 4.9 | Cone de materiais piroclásticos do vulcão dos Capelinhos, na Ilha do Faial, nos Açores. O cone é composto essencialmente por cinzas, bombas e alguma bagacina

Fonte: Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Piroclasto#/media/File:Lava-bomb-02.jpg>. Acesso em: 4 nov. 2015.

Durante uma erupção vulcânica, fragmentos semissólidos podem ser lançados a grandes alturas, chamados de bombas piroclásticas. Outro produto interessante é a pedra-pomes, que é o resultado da lava rica em gases que sofre um rápido resfriamento e resulta em uma rocha muito leve e cheia de pequenos orifícios.

4.1.6 Estilos Eruptivos

Quando pensamos em um vulcão, a primeira imagem que normalmente vem

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à mente é a de uma montanha com um formato cônico e uma cratera pela qual o material é expelido. Mas nem todos os vulcões têm essas características. As atividades vulcânicas podem ser de dois tipos: erupções centrais e erupções fissurais. Vamos observar as principais diferenças entre esses dois tipos de erupções.

4.1.6.1 Erupções Fissurais

Neste tipo de vulcanismo não há a formação de um cone vulcânico, como a maioria dos vulcões que nós conhecemos. O magma ascende por profundas fissuras que são formadas na crosta terrestre e por isso esse tipo de erupção recebe esse nome (Figura 4.10). Geralmente, a lava desse tipo de vulcão é do tipo básica, isto é, pobre em silício. Além de erupção fissural, pode ser chamada também de erupção de rift (abertura, fenda, fissura em inglês), pois é muito comum em rift-valleys (sistemas de falhamentos, como o que ocorre no “Chifre da África”).

Figura 4.10 | Erupção fissural, Kamoamoa, Havaí

Fonte: Disponível em: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File%3AKamoamoa_2011-03-08_spatter_rampart.jpg>. Acesso em: 19 nov. 2015.

Mesmo que o imaginário da população associe as erupções vulcânicas aos grandes cones formados por vulcões, como o Monte Santa Helena (EUA) ou Vesúvio (Itália), as erupções fissurais são as mais comuns do planeta Terra, correspondendo a cerca de 80% de toda a atividade vulcânica.

Contudo, é necessário relatar que grande parte das erupções fissurais ocorrem sob as águas do oceano. Desta forma, podemos deduzir que as cadeias de montanhas formadas nos oceanos são resultado das erupções fissurais em áreas de rift-valley. Mas elas ocorrem não apenas em áreas submersas. Nos continentes atualmente há esse tipo de erupção na Islândia e também no Havaí. O mais ativo de todos os vulcões é o Kilauea, no Havaí, que se encontra em atividade quase constantemente desde 1983.

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No Brasil, esse tipo de vulcanismo foi muito intenso há cerca de 130 milhões de anos. O mais volumoso de todos os eventos eruptivos que se tem registro aconteceu em decorrência da separação dos Continentes Sul-americano e Africano e cobre uma área superior a 1.200.000 km2, recobrindo áreas do Brasil, Argentina, Paraguai, Uruguai e algumas regiões a oeste do Continente Africano.

Sucessivos derramamentos de lavas basálticas chegaram a formar depósitos de mais de um quilômetro de espessura, conhecido como vulcanismo da Formação Serra Geral, e as ações do processo intempérico sobre a rocha basáltica resultaram na formação dos férteis solos de terra roxa.

4.1.6.2 Erupções Centrais

São estilos eruptivos em que há a formação de um edifício vulcânico. A lava desse tipo de vulcão é menos fluida do que a lava dos vulcões fissurais, isto é, mais viscosa. Essa característica da lava resulta em eventos vulcânicos mais perigosos, pois há o lançamento de muitos materiais piroclásticos (como cinzas e bombas).

Diversos registros históricos demonstram a capacidade destrutiva desse tipo de vulcanismo. Um dos mais famosos foi a erupção do Monte Vesúvio em 79 d.C., que destruiu a cidade de Pompeia (Itália).

Um vulcão pode entrar em atividade e, posteriormente, passar anos e a até mesmo séculos sem nenhuma atividade. É muito difícil (para não dizer impossível) prever quando haverá uma erupção vulcânica. Sabe-se que alguns fenômenos estão associados ao processo eruptivo, então, antes de entrar em atividade, um vulcão começa a “emitir sinais”, como soltar fumaça, além de sucessivos terremotos. Contudo, esses sinais não ocorrem de maneira ordenada, podendo perdurar por dias e, até mesmo, simplesmente o vulcão não entrar em erupção.

Quando há uma erupção, os materiais expelidos podem ser lançados a altas velocidades, o que impossibilita a evacuação da área. Não somente a lava é perigosa para a população, fauna e flora que se distribui nas proximidades de um vulcão, como também o são a cinza e os gases. No caso da tragédia de Pompeia em 79 d.C., uma gigantesca nuvem superaquecida de cinzas muito finas escureceu o dia e se expandiu encosta abaixo da montanha, a uma surpreendente velocidade de 200 km/h em direção à cidade, impossibilitando a fuga dos moradores. Ao final do evento, uma camada de seis metros de espessura foi formada.

Observe na Figura 4.11 a morfologia de um vulcão.

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Figura 4.11 | Corte transversal em um vulcão de erupção central

Fonte: Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Volcano_scheme.svg>. Acesso em: 1º nov. 2015.

4.1.7 Terremotos

Um terremoto nada mais é que a vibração da superfície da Terra produzida por forças naturais no interior da crosta terrestre. Assim como os vulcões, os terremotos estão associados às áreas de encontro de placas tectônicas. Contudo, os terremotos podem ocorrer no interior das placas, pois podem haver, por exemplo, acomodações de blocos de rochas que desprendem energia, formando, portanto, terremotos.

Acesse o link para saber mais sobre as placas tectônicas.Disponível em: <http://midia.atp.usp.br/impressos/lic/modulo02/geologia_PLC0011/geologia_top04.pdf>. Acesso em: 17 nov. 2015.

Os locais onde os terremotos ocorrem recebem o nome de hipocentro, ou foco, e a projeção do hipocentro na superfície terrestre recebe o nome de epicentro. A distância entre o hipocentro e o epicentro recebe o nome de profundidade focal. Essas informações são importantes para que você saiba que os terremotos podem ocorrer em diferentes profundidades.

Os terremotos podem, inclusive, ser causados por ações humanas, por exemplo a partir do uso de explosivos ou com a construção de barragens. Nestes casos, são

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chamados de sismos induzidos. A questão das barragens é interessante. Quando é feita essa obra de engenharia, uma grande quantidade de água é acumulada em um local que não estava preparado para receber todo o peso dela. Dessa forma, os blocos de rochas que estavam acomodados têm seu equilíbrio rompido e, portanto, passam a se reacomodar. Quando esses blocos passam pelo processo de acomodação há liberação de energia e, então, abalos sísmicos. Esses abalos costumam ser fracos, registrados apenas pelos sismógrafos (aparelhos que medem a intensidade dos sismos), ou seja, não são percebidos pela população. Mas no Brasil há o registro de casas que tiveram suas estruturas danificadas por sismos induzidos de barragens para a produção de energia elétrica.

Vamos compreender como vibra o chão em um episódio de terremoto. Imagine que uma parte da crosta esteja sofrendo compressão, com forças contrárias atuando em lados opostos. A continuidade desta pressão resulta, primeiramente, em uma deformação da rocha e posteriormente em um fraturamento de um ponto mais frágil, o que resulta em uma liberação extremamente rápida da energia que foi acumulada por causa da compressão.

Toda essa energia é liberada em forma de ondas que são propagadas em todas as direções. Há dois tipos de ondas principais que são percebidas em um abalo sísmico: as ondas P (primárias) e as ondas S (secundárias) (Figura 4.12).

Figura 4.12 | Representação esquemática das ondas P e ondas S

Fonte: Disponível em: <http://imgur.com/GrUFUpg>. Acesso em: 19 nov. 2015.

As ondas P são vibrações longitudinais, e as partículas do meio vibram paralelamente à direção de sua propagação; já as ondas S são transversais, e as partículas do meio têm vibrações de propagação e são perpendiculares. É importante saber que não apenas há vibrações de partículas do meio, mas também deformações como resultado da passagem das ondas.

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A velocidade das duas ondas não é a mesma. A onda P tem uma velocidade de propagação superior à da onda S. Dessa forma, quando há um abalo sísmico, as ondas P chegam primeiro, e as ondas S chegam depois, isto é, em segundo lugar (por isso o nome das ondas).

Essas ondas não se propagam da mesma forma em diferentes meios. As ondas S, por exemplo, apenas se propagam em meio sólido, isto é, desaparecem em meio líquido e gasoso, enquanto as ondas P se propagam em todos os meios, assim como o som. As ondas P têm um poder de destruição menor que o das ondas S. Essas diferenças de velocidade e comportamento das ondas P e S foram fundamentais para os estudos sobre o interior do planeta Terra.

Quando os terremotos acontecem na crosta oceânica a energia liberada atinge a camada de água que está sobre o epicentro. O resultado é a formação de gigantescas ondas que se deslocam a uma enorme velocidade de até 800 km/h. Contudo, em águas profundas, essas ondas têm um grande comprimento e uma pequena amplitude. Quando se aproximam da costa, a profundidade do mar se torna muito menor, então as ondas tendem a ter seu comprimento diminuído severamente ao mesmo tempo que sua amplitude é aumentada. Essas ondas então perdem velocidade rapidamente, e a coluna de água se ergue em decorrência da quantidade de água que vem em alta velocidade. Isso é o que chamamos de tsunamis.

Para ficar mais fácil a compreensão, imagine um comboio ferroviário viajando a 800 km/h e de repente uma força diminui bruscamente a locomotiva. A tendência é que os vagões que vêm atrás passem por cima da locomotiva.

1. Os vulcões, ao entrarem em erupção, liberam um substrato magmático composto pela lava vulcânica e também por materiais sólidos soltos, além de cinzas, blocos e outros elementos que são expelidos e emitidos à superfície graças à liberação da pressão interna. Esse material é chamado de:

A) Resíduos sólidos vulcânicos.

B) Rochas consolidadas.

C) Lavas solidificadas.

D) Resíduos internos maciços.

E) Depósitos piroclásticos.

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2. Qual é a diferença entre epicentro e hipocentro?

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Seção 2

Introdução ao Estudo da Paleontologia

Nesta seção, estudaremos os principais conceitos e objetivos da Paleontologia. Veremos a interação dessa ciência com outras áreas do conhecimento, como a biologia evolutiva, geologia, física, química etc., buscando compreender os fenômenos que deram origem às transformações ambientais e dos organismos na história geológica do nosso planeta.

4.2.2 O que é Paleontologia?

O termo Paleontologia foi usado pela primeira vez em 1834 a partir da união das palavras gregas: palaios = antigo, ontos = ser, logos = estudo. A origem do nome dessa ciência remete ao seu principal objeto de estudos, os fósseis, fossilis = extraído da terra (Figura 4.13), ou seja, a Paleontologia é a ciência responsável pelo estudo dos restos de animais e vegetais ou de evidências de suas atividades que ficaram preservados nas rochas ou em outros materiais como o gelo. Esses restos e evidências são chamados de fósseis (CARVALHO, 2010).

Figura 4.13 | Fóssil de Fagus sylvatica pliocenica (Sap.)

Fonte: Wikimedia Commons. Adaptado de: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Fagus_sylvatica_pliocenica_MHNT.PAL.VEG.2002.31.jpg>. Acesso em: 10 out. 2015.

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O que é Paleontologia? O que essa ciência estuda? Qual é sua relação com a Arqueologia?Acesse o link e aprofunde seus conhecimentos: <http://arqueologiaeprehistoria.com/o-que-e-arqueologia/paleontologia-o-que-e-onde-estudar/>. Acesso em: 4 out. 2015.

Como já comentado na introdução desta seção, as metodologias e os princípios usados em Paleontologia interagem diretamente com outras áreas do conhecimento, principalmente com a Geologia e a Biologia. Por meio das ciências biológicas, os paleontólogos buscam as bases para estudar e analisar os fósseis, levando em consideração que eles são restos de um antigo ser vivo. Por outro lado, a Paleontologia fornece aos biólogos dados sobre o tempo de existência dos diferentes ecossistemas e disponibiliza novas informações complementares às teorias evolutivas. Em Geologia, os fósseis são utilizados para determinar a ordem e a data das sequências sedimentares, assim como contribuem para a análise dos ambientes antigos de sedimentação e identificação das mudanças que aconteceram na superfície terrestre ao longo do tempo geológico (CARVALHO, 2010).

Qual é a importância dos fósseis para a Paleontologia?

Os estudos em Paleontologia podem ser abordados de duas formas. Uma delas tem aspecto mais descritivo e busca identificar os fósseis por meio de sua reconstituição e relações filogenéticas. A outra abordagem é chamada de Paleobiologia, pois tem o foco mais conceitual, com ênfase na identificação das leis que determinam o aparecimento da vida, a formação da biosfera, a extinção dos seres vivos e suas relações com a evolução dos organismos (CARVALHO, 2010).

Aprofunde seus conhecimentos sobre a Paleobiologia acessando o link a seguir: <http://webpages.fc.ul.pt/~cmsilva/Paleotemas/Paleobiologia/Paleobio.htm>. Acesso em: 4 out. 2015

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Na Paleobiologia, os pesquisadores focam os estudos em determinada área de concentração, como a Paleobotânica, Micropaleontologia, Paleontologia de Invertebrados, Paleontologia de Vertebrados e Paleoicnologia (CARVALHO, 2010).

Na Paleobotânica, o objeto de estudos são as plantas fósseis (Figura 4.13). Na maioria dos achados fossilíferos, apenas uma porção da planta fica preservada. Com isso, surge a necessidade da especialização de profissionais que estudam partes diferentes das plantas. Uns estudam apenas o lenho, outros somente as folhas, alguns somente pólens e esporos – que são excepcionalmente conservados e muito utilizados para datação. Esses materiais são estudados com maiores detalhes dentro da Micropaleontologia (Paleopalinologia), que veremos a seguir (CARVALHO, 2010).

A Micropaleontologia surgiu pela necessidade de se conhecer mais sobre os microfósseis usados na indústria petrolífera. Os microfósseis têm grande importância na datação e correlação das camadas existentes nas rochas sedimentares, por causa da grande variabilidade morfológica, abundância e rápida evolução desse tipo de rocha. Os microfósseis são pequenas partes de seres vivos encontradas nas rochas, como podemos observar na Figura 4.14.

Figura 4.14 | Microfósseis marinhos. Exemplos de diatomáceas, ostracoda, radiolária e espículas de esponjas

Fonte: Adaptada de Wikimedia Commons. Disponível em: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File%3AMarine-microfossils_hg.jpg>. Acesso em: 15 out. 2015.

Dentro da Micropaleontologia há um campo de pesquisa chamado de Paleopalinologia, responsável pelo estudo de pólens e esporos vegetais. Analisa os microfósseis de parede orgânica, que, por meio de suas características de preservação e variabilidade morfológica, permitem determinar informações sobre a paleoecologia, o paleoclima e também inferir a idade relativa das rochas.

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Quando pensamos na relação entre os registros fossilíferos e o estudo do comportamento dos seres vivos, entramos em outro campo da Paleobiologia, chamado de Paleoicnologia. Ela estuda os icnofósseis – estruturas formadas por meio da atividade dos seres vivos – ou seja, são as marcas deixadas pelos organismos durante sua vida, como pegadas, pistas, perfurações, escavações etc. (CARVALHO, 2010).

Como vimos até agora, a Paleontologia é um imenso campo de estudos da ciência. Além de cada ramo que vimos até aqui, dentro da Paleobiologia existem outras áreas de pesquisa. Uma delas é a Paleoecologia, responsável pela análise da relação entre os seres vivos e deles com o ambiente. Por meio dos registros da fauna e da flora, a Paleoecologia busca encontrar informações sobre as condições climáticas da época, concentração de oxigênio, salinidade, profundidade etc. (CARVALHO, 2010).

Outra área de estudos é a Tafonomia, responsável pelos estudos dos processos de preservação dos fósseis, desde a morte do organismo até sua descoberta pelos pesquisadores. Veremos com mais detalhes os estudos neste campo quando discutirmos os processos de fossilização.

As informações obtidas com os registros fósseis também podem ser utilizadas pela Sistemática, campo responsável por classificar e agrupar os seres vivos com base na avaliação e comparação de suas características.

Agora que conhecemos as diferentes abordagens utilizadas pela Paleontologia, podemos concluir que esse campo da ciência é responsável por fornecer informações relevantes para o desenvolvimento dos estudos sobre a evolução biológica dos seres vivos ao longo do tempo. Além disso, é possível estimar a datação relativa das camadas analisando os achados de animais e plantas fósseis ao longo da coluna cronoestratigráfica* (CARVALHO, 2010).

(*) Coluna cronoestratigráfica: é a subdivisão das rochas levando em consideração o registro de um intervalo específico de tempo geológico.

4.2.3 Estudando os Fósseis

Preservação dos Fósseis

O processo de fossilização é resultado da união de vários processos físicos, químicos e biológicos atuando em conjunto no ambiente de deposição do fóssil. A preservação dos organismos está geralmente associada à chance de suas partes serem biomineralizadas por carbonatos, silicatos, fosfatos ou por elementos orgânicos resistentes como a celulose e a quitina. Porém, muitos achados no registro geológico relatam preservações extraordinárias de partes moles (CARVALHO, 2010).

Sabemos que, após a morte, as partes moles dos seres vivos entram em processo de decomposição pela ação dos microrganismos, enquanto as partes duras ficam

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dispostas às condições do ambiente, podendo ser degradadas totalmente. Quando falamos em fossilização, estamos representando por meio desse processo a quebra do ciclo natural de decomposição dos organismos. Ao longo do tempo geológico, uma quantidade muito pequena das espécies que habitaram nosso planeta conseguiu romper com o ciclo natural da vida e se preservaram nas rochas. Muitas delas apareceram e sumiram sem deixar nenhum rastro de existência, por isso ainda hoje temos muitos buracos nos registros paleontológicos.

Quando pensamos na preservação dos fósseis, temos de levar em consideração a influência de vários fatores. Por exemplo, o soterramento acelerado após a morte, a não ocorrência da decomposição microbiológica, a constituição química e morfológica do esqueleto, o modo de vida e as condições ambientais são alguns fatores que podem determinar como acontece a fossilização.

Depois de formados, podemos imaginar que os fósseis já não correm mais o risco de se perder. Porém, após sua formação, outros fatores passam a influenciar em uma possível deterioração desse material, como os agentes erosivos, o vulcanismo, metamorfismo etc. Algo muito interessante sobre o estudo da preservação dos fósseis é justamente a relação direta com as condições ambientais, ou seja, as rochas onde eles se encontram indicam as características predominantes do ambiente habitado por esses organismos.

Tipos de Fossilização

Como vimos anteriormente, os fósseis podem se preservar de diferentes maneiras, pois dependem dos fatores ambientais influentes e das interações com as substâncias químicas existentes no local após a morte do organismo. Ao determinarmos os tipos de fossilização, podemos classificá-los em dois grupos – os restos e os vestígios. Os restos são considerados as partes dos organismos que permanecem conservadas, e os vestígios são apenas evidências indiretas de um ser vivo.

Grande parte dos restos é constituída das partes mais resistentes dos seres vivos, por exemplo, as conchas, os ossos e os dentes – denominadas partes duras. Porém, o desenvolvimento das pesquisas paleontológicas tem proporcionado o aumento de registros fossilíferos de partes moles preservadas, como pele, músculos, vísceras, vasos sanguíneos, auxiliando muito no entendimento da anatomia e fisiologia dos seres vivos que um dia habitaram a Terra (CARVALHO, 2010).

As chances de se fossilizarem são muito maiores para as partes duras por causa da natureza química de suas estruturas. Por exemplo, as espículas das esponjas são formadas por sílica (SiO

2), muito resistentes às intempéries; já as placas esqueléticas

dos equinodermas e conchas de moluscos são formadas de carbonato de cálcio (CaCO

3) na forma de calcita ou aragonita; a quitina é um polissacarídeo complexo,

muito resistente, que forma o exoesqueleto dos insetos.

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Nos vegetais, os restos são muito difíceis de serem estudados, pois se encontram geralmente muito fragmentados no registro fóssil. Isso não permite o estudo de uma planta por completo, pois folhas, caules, sementes e pólens são encontrados separadamente nos sedimentos (CARVALHO, 2010).

Preservação das Partes Moles

Já comentamos que o processo de decomposição dos organismos começa logo após sua morte. Portanto, imaginar a ocorrência da preservação das partes moles em registros fósseis é no mínimo entender que se trata de um evento extraordinário, pois é preciso romper com o ciclo natural da vida e não permitir que ocorra a degradação do material biológico.

Esse evento depende primeiramente do ambiente, que pode acelerar ou não a decomposição. Por exemplo, plantas e animais que vivem em florestas tropicais se decompõem com muita rapidez pela grande quantidade de água e oxigênio disponíveis neste tipo de ambiente, visto que aceleram esse processo. Mas, se ocorrer um soterramento rápido, pode ser que estes organismos se fossilizem. Em regiões onde as águas são ricas em cálcio, há neutralização dos ácidos dentro dos sedimentos, favorecendo a preservação das partes moles como músculos, pele e órgãos internos de vertebrados.

Existem relatos na literatura de organismos que se preservaram por completo, tanto as partes moles como as duras. Foram de tal forma protegidos pelo processo de fossilização que permanecem intactos até hoje.

Os registros de fósseis em nódulos de âmbar são bastante conhecidos. O âmbar é uma resina fóssil proveniente de várias espécies de gimnospermas e angiospermas que abriga insetos, aracnídeos, rãs e outros organismos, como podemos observar na Figura 4.15.

Figura 4.15 | Âmbar com inseto preservado em seu interior

Fonte: Adaptada de Wikimedia Commons. Disponível em: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/e/ed/R%C3%A1bago-El_Soplao_amber_sample_with_insect-_Cantabria%2C_Spain.JPG>. Acesso em: 16 out. 2015.

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Em regiões com condições climáticas glaciais, é excepcional a preservação de vertebrados como mamutes lanosos e rinocerontes, pois o clima extremo não permite a decomposição do organismo. Em muitos registros fósseis, a qualidade dos achados permitiu avaliar o tecido epitelial e muscular em perfeito estado de conservação. Além disso, a literatura relata que esses animais, congelados desde o Pleistoceno, há 45 mil anos, ainda tinham seu conteúdo estomacal intacto, permitindo aos pesquisadores conhecer os hábitos alimentares desses seres vivos (CARVALHO, 2010).

Na Patagônia, foram encontrados fósseis de preguiça com as partes moles conservadas por dessecação. Esse tipo de fossilização acontece em locais de clima seco e árido, onde os animais, depois de morrer, desidratam-se rapidamente evitando o ataque de microrganismos decompositores. Alguns autores chamam esse processo de fossilização por desidratação de mumificação. Já outros escritores utilizam esse termo para designar todos os organismos que se preservaram integralmente, como os mamutes no gelo e os insetos no âmbar (CARVALHO, 2010).

A mineralização dos carbonatos é a maior responsável pela preservação das partes moles nos fósseis. Exemplo disso é o Archaeopteryx (Figura 4.16), encontrado no calcário litográfico do Jurássico da Alemanha. Esse fóssil foi encontrado em excelente estado de conservação podendo ser observadas até as penas impressas (CARVALHO, 2010).

Figura 4.16 | Archaeopteryx lithographica, exemplar em exposição no Museu für Naturkunde em Berlim

Fonte: Wikimedia Commons. Disponível em: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Archaeopteryx_lithographica_(Berlin_specimen).jpg>. Acesso em: 16 out. 2015.

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Um dos melhores exemplos de fossilização com preservação das partes moles está no Folhelho Burgess, no Canadá. Algas, esponjas, animais vermiformes e artrópodes foram conservados nessa região.

Acesse o link e saiba mais sobre o Folhelho de Burgess, região considerada um sítio fossilífero: <http://expohistoriavida.blogspot.com.br/2014/10/a-fauna-de-burgess-shale.html>. Acesso em: 16 out. 2015.

Preservação das Partes Duras

A maioria dos fósseis encontrados nos registros geológicos consiste em partes biomineralizadas dos organismos, que chamamos de partes duras. Exemplos desses fósseis são conchas, carapaças, ossos e dentes. Esse tipo de material é encontrado até nas rochas mais antigas, com alta qualidade de conservação e sem alterações em sua composição química. Algumas conchas de moluscos estão tão conservadas que apresentam até traços de sua cor original (CARVALHO, 2010).

A preservação das partes duras pode ocorrer por meio de diferentes processos de fossilização, como incrustação, recristalização, permineralização, substituição e carbonificação. Na incrustação, as substâncias transportadas pela água se cristalizam na superfície da estrutura, formando uma camada de revestimento que preserva a parte dura. Esse processo ocorre em organismos que morreram ou foram arrastados para cavernas. Geralmente, os ossos dos animais são incrustados de carbonato de cálcio, mas outras substâncias podem compor esse processo, como a pirita, a limonita e a sílica (CARVALHO, 2010).

Já a permineralização é um tipo de fossilização muito comum. Ela acontece quando um mineral preenche os poros, canais ou as cavidades existentes no organismo. Os ossos e troncos de árvores são alvos comuns desse processo. Portanto, a sílica e o carbonato de cálcio, carregados pela água, penetram na cavidade dos organismos, permitindo a preservação de suas estruturas (CARVALHO, 2010).

Quando ocorre modificação na estrutura cristalina do mineral original, mas a composição química permanece a mesma, temos o processo de fossilização chamado de recristalização. Esse processo consiste no rearranjo cristalino dos minerais. Por exemplo, podemos citar a conversão da aragonita das conchas de moluscos em calcita (CARVALHO, 2010).

No caso da carbonificação, ocorre a perda gradual dos elementos voláteis da matéria orgânica como oxigênio, hidrogênio, nitrogênio que são liberados

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sobrando apenas o carbono. As estruturas constituídas por lignina, celulose, quitina e queratina são as que mais passam por esse processo de fossilização. Mesmo com a alteração química original, a preservação da microestrutura permite o estudo da anatomia de vegetais fósseis.

A substituição é um processo de fossilização em que ocorre, por exemplo, a substituição de um carbonato de cálcio, que constitui as conchas, por sílica, pirita ou limonita ou, até mesmo, por um novo carbonato de cálcio. Portanto, temos, neste caso, fósseis que são réplicas das conchas primitivas (CARVALHO, 2010).

Preservação dos Vestígios

Os vestígios são considerados evidências de organismos ou de suas atividades, ou seja, os animais e vegetais que originaram os fósseis não se preservaram. Por exemplo, uma concha, durante o soterramento, teve suas cavidades internas preenchidas por sedimentos. Após algum tempo, a concha foi dissolvida pelas águas percolantes, sobrando somente o espaço que era ocupado por ela. Nesse processo ficaram marcadas duas impressões: o molde externo, que é a moldagem da superfície externa, e o molde interno da concha, que revela a morfologia ou estrutura interna do organismo ou parte dele. Além disso, se ao longo do processo ocorre o preenchimento por outro mineral, forma-se uma réplica do original, chamada de contramolde (CARVALHO, 2010).

Portanto, os vestígios podem ser asas de insetos, folhas de vegetais, penas etc. que podem ficar impressos, marcados nas rochas, como podemos ver na Figura 4.17. O registro das atividades vitais dos seres vivos é frequente nos sedimentos e contribuem para inferências paleoambientais.

Figura 4.17 | Exemplo de vestígio fossilífero. Marca de uma pena

Fonte: Adaptada de Wikimedia Commons. Disponível em: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File%3AArchaeopteryx_(Feather).jpg>. Acesso em: 16 out. 2015.

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Os fósseis dessa natureza são denominados icnofósseis e são geralmente compostos por pistas, tubos e sulcos produzidos por invertebrados ou pegadas deixadas por vertebrados nos sedimentos. Outras atividades, como a reprodução e a nutrição, também são observadas nesses vestígios.

Os relatos sobre os hábitos alimentares são feitos pelo estudo dos excrementos fossilizados, chamados de coprólitos, produzidos tanto por invertebrados quanto por vertebrados. Outro vestígio encontrado refere-se aos gastrólitos – pedrinhas que as aves e alguns répteis possuem em seu aparelho digestivo para ajudar na digestão (CARVALHO, 2010).

Com relação ao processo reprodutivo, muitos ovos fossilizados são frequentemente encontrados, principalmente de répteis. Outros vestígios, como marcas de dentes em conchas, em ossos, sulcos feitos pelos bicos de aves nas rochas, ninhos fossilizados etc., são outras evidências que auxiliam nas inferências sobre o comportamento das espécies por meio do registro geológico.

Os processos de fossilização ocorrem normalmente em rochas sedimentares, porém já foram encontrados alguns registros em rochas metamórficas de baixo grau e em rochas ígneas eruptivas. Para serem classificados como fósseis, os restos e vestígios precisam ter mais de 11 mil anos, ou seja, o tempo calculado pela última glaciação, que é o tempo geológico em curso – Holocentro ou Recente (CARVALHO, 2010).

É importante também deixar claro que não é regra que um organismo fossilizado seja um ser extinto. Um número muito grande de seres vivos que estão presentes nos dias atuais também é encontrado no registro fossilífero.

Esses organismos vivos que também estão representados nos fósseis e que ao longo do tempo sofreram poucas modificações são chamados de fósseis vivos ou formas-relíquias. Por exemplo, o peixe celacanto (Latimeria chalumnae) e o vegetal Ginkgo biloba, demonstrados na Figura 4.18.

Figura 4.18 | O peixe Latimeria chalumnae e uma folha característica de Ginkgo biloba

Fonte: Wikimedia Commons. Disponíveis em: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File%3ACoelacanth1.JPG>; <https://commons.wikimedia.org/wiki/File%3AGinkgo_biloba_scanned_leaf.jpg>. Acesso em: 16 out. 2015.

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Como podemos classificar os restos e vestígios quando eles têm menos de 11 mil anos?

Esses registros com idade menor que 11 mil anos são denominados subfósseis. A literatura descreve alguns exemplos, como um bisão preservado em turfeira e um homem antigo, mumificado em depósitos de caverna. Também, há os sambaquis – acúmulos de ossos, carvão e conchas oriundos da atividade humana e muito frequentes no litoral brasileiro (Figura 4.19).

Figura 4.19 | Zoólitos (fósseis de origem animal) e vegetais encontrados em sambaquis do Rio de Janeiro

Fonte: Wikimedia Commons. Disponível em: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Zo%C3%B3litos_e_vegetais_encontrados_em_sambaquis_do_Rio_01.jpg>. Acesso em: 16 out. 2015.

Outros termos são utilizados na classificação desses materiais, como dubiofósseis – estrutura que pode ser de origem orgânica, mas não existe comprovação de sua origem – e pseudofósseis – cujas estruturas são comprovadamente inorgânicas, porém se assemelham a organismos, por exemplo, os dendritos de pirolusita, formados por óxido de manganês, lembram impressões de um vegetal (CARVALHO, 2010).

Parece mas não é! Acesse o link para ver exemplos de pseudofósseis: <http://www.cprm.gov.br/publique/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=2563&sid=129>. Acesso em: 16 out. 2015

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4.2.4 Processos e Ambientes de Fossilização

Neste tópico, apresentaremos alguns conceitos sobre o processo de preservação dos restos orgânicos no registro sedimentar e como esses processos alteram a qualidade dos fósseis. É importante saber que esse campo da ciência é chamado de Tafonomia, responsável pelos estudos dos processos de preservação dos fósseis, desde a morte do organismo até sua descoberta pelos pesquisadores. Esse termo tem origem grega, em que tafos = sepultamento e nomos = leis, ou seja, é o estudo das “leis” que determinam a trajetória dos restos orgânicos da superfície terrestre para os sedimentos.

Esse campo da Paleontologia surgiu da necessidade dos pesquisadores de compreender como os organismos chegaram à rocha e quais fatores atuaram nesse processo de fossilização. Com o avanço dos conhecimentos nessa área, notou-se a inviabilidade de se estabelecerem “leis” ou padrões para os diferentes tipos de fósseis encontrados nos registros geológicos. Com isso, a Tafonomia acabou se tornando um ramo importante da Paleontologia que interage com outras diferentes frentes de estudos nessa área, sempre com o objetivo de encontrar o máximo de informação sobre os processos que deram origem ao registro fóssil.

Origem do Registro Fóssil

Para entender como são abordados os estudos sobre a natureza dos fósseis, é necessário que sejam estabelecidos alguns conceitos. O primeiro deles é o retrato de morte usado para designar as tafocenoses – concentração de partículas biogênicas soterradas – ou as orictocenoses – concentrações fósseis. Já as biocenoses são as fontes dos materiais ou restos orgânicos que irão compor a assembleia de fósseis (CARVALHO, 2010).

As tafocenoses representam um tipo de retrato distorcido e cheio de tendenciamentos oriundos dos diversos processos e filtros tafonômicos. Entender esses processos é a principal motivação dos estudos nesse campo, de onde se originam os dados paleontológicos sobre a gênese do registro fóssil. A Figura 4.20 busca representar esquematicamente o processo de fossilização destacando os principais “filtros” que atuam nessa fase. Portanto, precisamos entender inicialmente quais são os fatores que atuam na formação do registro fóssil e como eles induzem distorções que afetam sua qualidade.

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Figura 4.20 | Representação esquemática do processo de fossilização desde a comunidade de vida (Biocenose) até a coleta (Orictocenose – Amostra fóssil)

Fonte: Adaptada de Carvalho (2010).

Há consenso geral na Paleontologia de que o registro fóssil é incompleto, pois durante sua formação fatores como a composição e microestrutura do esqueleto, taxas de sedimentação, pH da água intersticial influenciam diretamente na preservação dos restos orgânicos. Apesar de incompleto, o registro fossilífero é responsável pela resolução de muitos problemas geológicos e biológicos mais amplos. Além disso, os avanços científicos na área têm contribuído muito para ampliar a compreensão sobre a completude do registro fóssil (CARVALHO, 2010).

A partir de agora, vamos analisar os principais parâmetros relativos à origem do registro fóssil. Esses parâmetros são a completude, a mistura temporal e a mistura espacial. Eles refletem a qualidade do registro fóssil.

A completude se refere à representação de grupos taxonômicos no registro sedimentar. Diferentes táxons possuem distintas probabilidades de conservação e, como resultado, o registro paleontológico não é completo. Em determinados grupos taxonômicos existe uma maior representatividade do que em outros. Esse fato é claramente observado quando analisamos o escasso registro de fósseis de organismos desprovidos de partes duras mineralizadas. Já a preservação de organismos de corpo mole requer condições deposicionais geologicamente raras e sob condições ambientais muito particulares, por isso os táxons com partes biomineralizadas são mais bem representados no registro fóssil (CARVALHO, 2010).

Outro fator importante é o de que os processos operantes nos ambientes

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sedimentares são responsáveis pela diminuição da preservação de determinados táxons. Quando observamos grupos taxonômicos com partes biomineralizadas, as perdas durante o processo de fossilização são relativamente previsíveis e bem descritas pela literatura.

Um exemplo disso são os dados recentes sobre o estudo de moluscos bivalves, que mostram que os táxons faltantes no registro fóssil não ocorrem por simples aleatoriedade amostral dentro desse grupo. Dos 1.298 gêneros e subgêneros (taxa) de moluscos viventes, 308 não têm representantes no registro fóssil. Essa taxa faltante nos registros fossilíferos corresponde àqueles que possuem conchas muito pequenas e de fácil dissolução, são parasitas e comensais ou vivem em áreas marinhas profundas, tendo distribuição geográfica restrita. Os organismos com partes duras pequenas estão mais sujeitos à destruição por agentes químicos, físicos e biológicos, e o tamanho das populações também interfere, pois os táxons com populações grandes estão mais bem representados no registro de fósseis (CARVALHO, 2010).

A mistura temporal estuda as misturas de partículas bioclásticas – restos esqueletais de diferentes idades em uma única acumulação. Esse tipo de fenômeno é comum e inerente ao registro sedimentar que não pode ser removido ou eliminado pelas estratégias de coleta e análise dos dados em Paleontologia. Essa mistura temporal acontece principalmente pelo retrabalhamento dos substratos por agentes hidráulicos, como tempestades e ondas, sob a baixa taxa de sedimentação. Vale lembrar que isso não acontece periodicamente, ou seja, esses eventos são episódicos ao longo do tempo. Por isso, as taxas de sedimentação do dia a dia não têm a capacidade de individualizar camadas contendo indivíduos que viveram em uma mesma geração. Para que isso acontecesse seriam necessários soterramentos contínuos, individualizando as diferentes gerações em estratos únicos. Mas, como essas condições não existem nos ambientes sedimentares, as acumulações de restos esqueletais de organismos de diferentes gerações podem ser encontradas misturadas em um único estrado sedimentar ou concentração fossilífera (CARVALHO, 2010).

Existem sérias implicações paleoecológicas oriundas do fenômeno de mistura temporal. Uma delas é a das tafocenoses contendo mistura temporal, da ordem de centenas de milhares de anos, sendo dominadas por organismos de idades mais recentes, sendo os mais antigos menos representativos. Esse fato é até previsível, pois a destruição e alteração dos materiais biológicos ocorrem durante a fase de acumulação desses. Portanto, os materiais mais antigos estão mais sujeitos à ação dos agentes de destruição tafonômica do que os mais novos. Quanto mais susceptíveis à destruição e eliminação, menor a possibilidade de se juntar à tanatocenose, por isso os elementos biológicos mais antigos contribuem pouco para a formação da acumulação bioclástica final (CARVALHO, 2010).

A mistura espacial avalia as partículas biogênicas de organismos que ocupam diferentes ambientes sedimentares, mas se encontram em uma única acumulação

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bioclástica. Esse tipo de fenômeno também dificulta a compreensão dos pesquisadores ao tentarem reconstruir e interpretar as antigas comunidades e paleoambientes. Esqueletos biomineralizados mais robustos de muitos grupos taxonômicos ao longo do Fanerozoico os tornam mais susceptíveis à mistura temporal e também ao transporte e retrabalhamento após a morte.

Portanto, tafocenoses contendo restos esqueletais robustos e resistentes tendem a apresentar baixa representatividade para determinação espacial. Em contrapartida, os restos de organismos com partes esqueletais delgadas e frágeis estão menos sujeitos ao transporte ou a permanecer por prolongados períodos de tempo na interface água/sedimento. Em organismos com corpo mole ou mesmo os icnofósseis estão geralmente preservados no mesmo lugar onde viveram, apresentando alta representatividade para determinação espacial e correlações paleoambientais (CARVALHO, 2010).

Depois de estudar todos os conceitos apresentados até aqui em relação à qualidade do registro fóssil, tente responder: Quem possui melhor registro fóssil: os moluscos providos de partes biomineralizadas ou os órgãos vegetais frágeis, como as flores?

Para conseguirmos responder a essa pergunta precisamos lembrar os possíveis fatores diretos e indiretos que estão envolvidos na formação de um registro fóssil. A princípio, podemos imaginar que o melhor fóssil é o proveniente dos moluscos, pois eles são constituídos por conchas calcárias, resistentes e possuem melhor preservação. Já os restos de vegetais, como as flores, são frágeis e delicados, facilmente destruídos. É evidente que os órgãos vegetais têm menor potencial de preservação quando comparados aos elementos que compõem os esqueletos de vertebrados e invertebrados conchíferos. Mas responder a essa questão não é tão simples assim, pois a robustez das conchas favorece a mistura temporal e espacial dessas partículas. Isso provoca uma baixa resolução temporal e espacial desses organismos. Já a preservação dos órgãos frágeis, como as flores, só é possível em condições ambientais específicas, rápido soterramento, com pouco ou nenhuma exposição na interface água/sedimento. Portanto, apesar de serem raros os depósitos desse tipo de fóssil, tais ocorrências possuem elevada resolução espacial e temporal, possuindo, assim, maior qualidade do registro (CARVALHO, 2010).

Neste contexto, devemos retomar algumas observações relevantes referentes à natureza do registro fóssil:

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• Os organismos que possuem partes duras e biomineralizadas têm maior potencial de preservação.

• A preservação dos restos orgânicos é favorecida pelo soterramento rápido, especialmente por sedimentos finos e na ausência de decompositores.

• A perda de informação por processos tafonômicos nos diferentes ambientes é resultado do transporte e retrabalhamento por agentes hidráulicos e biológicos.

• A distribuição espacial e temporal dos organismos restrita provoca menor probabilidade de preservação.

Processos de Fossilização

Retomando a Figura 4.20, temos os estágios que conduzem à fossilização, a assembleia composta pelos elementos vivos, denominada biocenose, e seus elementos mortos, que compõem a tanatocenose. Os diferentes processos tafonômicos agem para formar a tafocenose, que é a assembleia de restos soterrados. A orictocenose é a assembleia fóssil encontrada pelo paleontólogo no jazigo fossilífero (CARVALHO, 2010).

Os processos de fossilização começam com os processos necrológicos envolvendo a morte e a decomposição dos organismos. Posteriormente, seguem os processos bioestratinômicos, como a desarticulação, o transporte/retrabalhamento dos restos esqueletais e o soterramento final. Por último, atuam os processos diagenéticos. Geralmente, na fase bioestratinômica predominam os processos biológicos e físicos e, em menor grau, os químicos. Depois do soterramento se iniciam os processos físico-químicos relativos à diagênese. É nessa etapa que ocorrem as alterações produzidas pelos processos tectônicos que alteram e expõem os estratos rochosos (CARVALHO, 2010).

A primeira etapa do processo de fossilização envolve a morte e decomposição dos tecidos de conexão orgânica pelos agentes decompositores. Aqui vale salientar que a morte não é pré-requisito para que os restos esqueletais dos organismos sejam incorporados aos sedimentos e preservados. Tanto os animais como os vegetais podem, em vida, perder partes de seus esqueletos que poderão ser incorporadas aos sedimentos sem que, necessariamente, a morte desses indivíduos tenha ocorrido. Exemplos disso são as folhas que durante o outono ou por fatores climáticos como fortes ventos ou chuvas se desconectam das plantas, assim como frutos e sementes, as mudas de determinados invertebrados, como a dos trilobites ou os dentes de mamíferos, podem ser incorporados ao registro fóssil (CARVALHO, 2010).

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Fonte: Wikimedia Commons. Disponível em: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Trilobites_-_Hydrocephalus_carens.JPG?uselang=pt-br>. Acesso em: 16 out. 2015.

Depois que ocorre a morte ou o descarte das partes esqueletais, começa a decomposição. Esse processo é muito importante para a preservação de qualquer organismo, pois é nessa etapa que ocorrerá o consumo dos tecidos orgânicos, promovendo a desarticulação das partes esqueletais.

A decomposição é um processo contínuo que, dependendo das condições ambientais, pode levar de horas a anos para ocorrer. Ao longo desse processo, diferentes estágios provocam alterações físicas nos indivíduos mortos. As características morfológicas, os hábitos de vida e o ambiente são os principais fatores que influenciam na necrólise. O processo de decomposição é geralmente rápido, e isso faz que as partes moles dos organismos fiquem preservadas em casos excepcionais. Portanto, somente as partes duras têm condições de se preservar, pois em sua constituição química existem grandes quantidades de elementos inorgânicos (CARVALHO, 2010).

Após a decomposição começamos a observar os processos bioestratinômicos. Eles atuam principalmente sobre as partes duras dos organismos. O transporte, a desarticulação – separação dos restos mortais após a necrólise, a fragmentação – quebra dos elementos esqueletais, a corrosão – abrasão mecânica e corrosão biogeoquímica das partes biomineralizadas e o intemperismo pela exposição ambiental dos ossos compõem os principais fatores dos processos bioestratinômicos que atuam nos restos esqueletais. Esses processos ocorrem em sequência, levando em consideração que os restos irão sofrer prolongada exposição na interface água/sedimento ou na superfície do solo (CARVALHO, 2010).

O estágio final do processo de fossilização é chamado de soterramento final, um passo importante e decisivo para que os restos orgânicos fiquem preservados

Figura 4.21 | Exemplo de trilobite. Hydrocephalus carens no National Museum (Prague)

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no registro geológico. Como vimos até aqui os restos esqueletais presentes no substrato estão sujeitos a uma série de fatores biológicos, físicos e químicos destrutivos. A Zona Tafonômica Ativa (ZTA) é a camada do substrato que incorpora os eventos de destruição das partículas bioclásticas. Essa região corresponde também à interface água/sedimento, ou seja, uma partícula bioclástica que reside na ZTA terá poucas chances de se fossilizar. Para ocorrer a fossilização, o soterramento deverá retirar essa partícula da ZTA transferindo-a para a Zona ou profundidade de Soterramento Final (ZSF) (CARVALHO, 2010). Quando a partícula atinge a ZSF, os processos diagenéticos passam a atuar de forma mais efetiva.

A diagênese divide-se em três fases: sindiagênese, anadiagênese e telodiagênese. A sindiagênese marca o início dos processos diagenéticos, em que ocorrem modificações importantes na geoquímica das águas intersticiais com pH mais alcalino. As modificações, dissoluções, que ocorrem nesse período se processam no substrato de 1 a 10 metros de profundidade, em uma escala temporal na ordem de 1.000 a 100.000 anos. A anadiagênese se processa nas rochas soterradas entre 10 e 10.000 metros de profundidade e sua duração está na ordem de 106 e 107 anos. Já a telodiagênese envolve processos diagenéticos como o soerguimento tectônico, intemperismo e erosão das rochas expostas à superfície terrestre (CARVALHO, 2010).

1. Com base no registro fóssil encontrado atualmente, podemos dizer que o registro fóssil está completo?

2. Qual é o objeto de estudo da paleobotânica? O que os profissionais desta área estudam?

• Os vulcões podem ser considerados importantes fontes de informações sobre o interior da Terra.• Eles emanam produtos de diferentes estados, isto é, sólidos, líquidos e gasosos.• Podemos classificar como lava o material rochoso fundido que extravasa a superfície.• As lavas são importantes para a formação de rochas magmáticas.

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• As lavas basálticas apresentam coloração preta e atingem a temperatura de 1.000 a 1.200°C.• As lavas almofadas ocorrem em erupções vulcânicas submarinas, que resultam na formação de acumulações de blocos com diâmetro de até um metro.• As lavas pahoehoe também são conhecidas como lavas com estrutura do tipo corda.• As lavas aa, também conhecidas como lavas em bloco, são formadas quando o escape dos gases dissolvidos causa um rápido aumento da viscosidade do material emanado do vulcão.• Os gases que escapam dos vulcões, ao reagirem com os gases presentes na atmosfera, formam ácidos que são extremamente nocivos à saúde humana, fauna e flora.• As atividades vulcânicas podem ser de dois tipos: erupções centrais e erupções fissurais.• Um vulcão pode entrar em atividade e, posteriormente, passar anos e até mesmo séculos sem nenhuma atividade.• Um terremoto nada mais é que a vibração da superfície da Terra produzida por forças naturais no interior da crosta terrestre.• Os terremotos liberam energia em forma de ondas que são propagadas em todas as direções.• A paleontologia é a ciência que estuda os fósseis.• Dentro da paleontologia existem vários campos de estudo.• Existem diferentes tipos de fossilização.• São vários os processos responsáveis pela preservação dos fósseis.

Ao longo desta unidade, nós estabelecemos diversos conceitos relacionados aos eventos geológicos ligados ao vulcanismo e aos terremotos. Vimos como os vulcões agem sobre o relevo e a atmosfera, por meio da liberação de lavas, gases, cinzas e outros produtos relacionados às erupções vulcânicas. Também, estudamos os terremotos e, por meio de suas ondas, como eles podem atuar na superfície do relevo.

Aprendemos também que a Paleontologia interage diretamente com outras áreas do conhecimento, principalmente com a Geologia e a Biologia. As ciências biológicas fornecem subsídios

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1. Uma manifestação geomorfológica resultante da consolidação do material magmático na superfície é:

A) A constituição de formas de relevo aplainadas.B) A maior atuação dos agentes exógenos do relevo.C) O reposicionamento das camadas sedimentares.D) A formação de rochas ígneas extrusivas.E) O desencadeamento de processos intempéricos.

2. Quais são as principais características das lavas basálticas?

3. Quais são as principais consequências dos terremotos?

4. Entre as diversas áreas da Paleontologia, a Tafonomia exerce um importante papel no estudo dos fósseis. Quais são os principais estudos da Tafonomia?

5. Como se chama o processo final de fossilização? Qual é sua principal importância?

para os paleontólogos estudarem e analisarem os fósseis, enquanto a Paleontologia fornece aos biólogos dados sobre o tempo de existência dos diferentes ecossistemas e disponibilizam novas informações complementares às teorias evolutivas. Em Geologia, os fósseis são utilizados para determinar a ordem e a data das sequências sedimentares, assim como para contribuir com a análise dos ambientes antigos de sedimentação e identificar as mudanças que aconteceram na superfície terrestre ao longo do tempo geológico.

Vimos também os processos responsáveis pela formação e preservação dos fósseis, bem como os tipos de registro fossilífero que podem ser formados de acordo com os processos de fossilização associando a natureza do registro paleontológico.

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Referências

BENTON, M. J. Vertebrate paleontology. London: Chapman & Hall, 1997. 452 p.

CARVALHO, Ismar de Souza. Paleontologia: conceitos e métodos 3. ed. Rio de Janeiro: Interciência, 2010.

IANNUZZI, Roberto; VIEIRA, Carlos E. L. Paleobotânica. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2005.

LEINZ, Viktor; AMARAL, Sérgio Estanislau do. Geologia geral. 7. ed. São Paulo: Nacional, 1978.

POPP, José Henrique. Geologia geral. 5. ed. Rio de Janeiro: LTC, 1998.

PRESS, Frank et al. Para entender a Terra. 4. ed. Porto Alegre: Bookman, 2006.

TEIXEIRA, Wilson et al. Decifrando a Terra. 2. ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2009.

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