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EXCELENTÍSSIMO SENHOR CORREGEDOR REGIONAL TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO RIO GRANDE DO SUL Distribuição por dependência ao processos cautelar nº 16.2006 (Classe 04). Relator: Desembargador Marcelo Bandeira Pereira – Corregedor Regional Eleitoral. Apensamento dos autos da supra-referida cautelar aos autos desta ação principal – CPC arts. 796 c/c 809. O MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, pelo Procurador Regional Eleitoral Substituto, no uso das suas atribuições legais, vem perante Vossa Excelência, forte no art. 14, §9º, da Constituição e nos arts. 19, 21, 22 e 23 da Lei Complementar nº 64/90, ajuizar AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (ação principal do processo cautelar nº 16.2006 - classe 04) em face de (1) DARCI POMPEO DE MATTOS, Deputado Federal e candidato reeleito nas eleições gerais do dia 1º/10/2006, pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT), já devidamente qualificado no Processo de Registro de Candidatura n.º 258.2006 (Classe 15); e (2) GERSON BURMANN, Deputado Estadual e candidato reeleito nas eleições gerais do dia 1º/10/2006, pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT), já devidamente qualificado no Processo de Registro de Candidatura n.º 318.2006 (Classe 15), pelas razões e fundamentos e nos termos em que passa a expor:

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR CORREGEDOR REGIONALTRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO RIO GRANDE DO SUL

Distribuição por dependência ao processos cautelar nº 16.2006 (Classe 04).Relator: Desembargador Marcelo Bandeira Pereira – Corregedor Regional Eleitoral.Apensamento dos autos da supra-referida cautelar aos autos desta ação principal – CPC arts. 796 c/c809.

O MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, peloProcurador Regional Eleitoral Substituto, no uso das suas atribuições legais, vemperante Vossa Excelência, forte no art. 14, §9º, da Constituição e nos arts. 19, 21, 22e 23 da Lei Complementar nº 64/90, ajuizar

AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL(ação principal do processo cautelar nº 16.2006 - classe 04)

em face de

(1) DARCI POMPEO DE MATTOS, Deputado Federal e candidato reeleito naseleições gerais do dia 1º/10/2006, pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT), jádevidamente qualificado no Processo de Registro de Candidatura n.º 258.2006(Classe 15); e

(2) GERSON BURMANN, Deputado Estadual e candidato reeleito nas eleiçõesgerais do dia 1º/10/2006, pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT), jádevidamente qualificado no Processo de Registro de Candidatura n.º 318.2006(Classe 15), pelas razões e fundamentos e nos termos em que passa a expor:

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IPRELIMINARES

1. Ação principal. Ação cautelar. Apensamento dosautos. A presente inicial inaugura Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) poruso indevido, desvio e abuso do poder econômico e de autoridade em benefício decandidato, a afetar a normalidade e legitimidade das eleições, já referidos na açãocautelar nº 16.2006 (Classe 04), cujos autos deverão ser apensados ao da presenteação principal, nos termos dos arts. 796 e 809 do Código de Processo Civil (CPC).

2. Representação pela infração do art. 41-A da Lei nº9.504/97. É de se referir também que os fatos aqui narrados deram causa arepresentação do MPE pela infração eleitoral do art. 41-A (captação de sufrágio) daLei nº 9.504/97 (Processo 300.2006 – Classe 16 – Rel. Juíza AuxiliarDesembargadora Federal Marga Inge Barth Tessler).

3. Competência e procedimento. A teor do art. 22 da LeiComplementar nº 64/90, a instrução e relatoria da AIJE é da competência doCorregedor Regional Eleitoral, conforme o procedimento ali indicado.

IIFATOS: OS ALBERGUES POUSADA PORTO ALEGRE E POUSADA IJUÍ

4. Os deputados e candidatos à reeleição DARCIPOMPEO DE MATTOS e GERSON BURMANN, fato público, notório, por elesdivulgado em suas propagandas eleitorais, criaram e mantêm em funcionamento doisalbergues denominados “Pousada Pompeo e Burmann”, ou mais especificamente, (a)Pousada Porto Alegre e (b) Pousada Ijuí, onde oferecem, sem contraprestaçãopecuniária, estadia e outras vantagens, tais como alimentação ou equipamentos paracozinhar, a pessoas de outros municípios ou da zona rural que se dirigem a PortoAlegre ou Ijuí (centros de referência em saúde no Estado) para, entre outrosobjetivos, comparecerem a consultas médicas ou prestarem exames clínicos noâmbito do Sistema Único de Saúde.

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5. Além de oferecerem e propiciarem vantagem em formade hospedagem aos eleitores em pleno período eleitoral através das referidas CasasSolidárias, os deputados veicularam nesses estabelecimentos ostensiva indicação deseus nomes e cargos, bem como propaganda eleitoral de suas candidaturas àreeleição aos cargos que ocupam junto ao Poder Legislativo, não deixando nenhumadúvida a vinculação que fizeram das vantagens concedidas aos eleitores com os seuscargos e, conseqüentemente, com suas campanhas eleitorais.

6. Na Pousada Porto Alegre, localizada na Rua SofiaVeloso, 80, os candidatos fixaram na fachada do albergue faixas e cartazes com aspropagandas típicas de suas campanhas 2006, semelhantes as que aparecem nospanfletos distribuídos ao eleitorado, contendo fotos, números de campanha (1221 -Deputado Pompeo de Mattos e 12312 – Deputado Gerson Burmann), os cargos paraos quais concorreram, conforme demonstram as fotos tiradas em 18 de setembro de2006 (fotos fls. 15-23 – toda indicação de folhas constante nesta inicial refere-seà numeração da apensa cautelar 16.2006).

7. Naquela mesma data – 18/09/2006 – foi efetivadaligação telefônica desta Procuradoria Regional para o telefone (51) 9999.4635,indicado como sendo da Pousada Porto Alegre tanto no cartão de visita como napropaganda eleitoral abaixo citados, sendo a ligação atendida pelo Sr. Edson (cujonome também consta no referido cartão), que confirmou a prestação do serviço dehospedagem, apenas ressaltando que não estava sendo oferecida alimentação e que,em decorrência da campanha eleitoral, estava suspenso o serviço de transporte darodoviária até a Pousada. (certidão – fl. 24.)

8. Na Pousada Ijuí, situada na Avenida 21 de Abril, n.º63, ou “próxima ao Hospital de Caridade” (conforme consta na propaganda eleitoraldos candidatos), em Ijuí, os candidatos inscreveram na parte superior da fachada, emletras garrafais, os dizeres “Pousada Ijuí Pompeo e Burmann – PDT 12”, sendo do

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conhecimento dos lá hospedados que o estabelecimento é mantido pelos deputados,bem como que o mesmo é administrado pela Sra. “Soila”, conforme certidões e fotoem anexo da Promotoria Eleitoral de Ijuí (23ª Zona Eleitoral) (fls.25-29).

9. Para não restar dúvidas sobre a utilização ostensiva emsuas campanhas eleitorais das ajudas, vantagens e serviços que prestamgratuitamente aos eleitores, os candidatos incluíram em suas propagandas eleitorais –conforme propaganda colhida em Ijuí pela Promotoria de Eleitoral daquela cidade,propaganda dos candidatos e um cartão de visita de Assessora Política (DialuzDilamar Bernardi) do Deputado Pompeo de Mattos – referência expressa às duaspousadas, seus telefones e pessoas para contato. Consta em uma das propagandas afoto do candidato Pompeo de Mattos na frente da Pousada, como que convidando oseleitores a utilizarem seus serviços gratuitos, e o seguinte texto (fls. 30-38):

POUSADA POMPEO / BURMANNDesde o ano de 2003 o Deputado POMPEO DE MATTOSmantém em parceria com o Deputado Estadual GERSONBURMANN, uma pousada localizada na Av. 21 de Abril(próximo ao Hospital de Caridade) e que pode ser contatadapelo fone (51) 9971.8380 com a Sra. SOILA, com capacidade dealojamento para 50 vagas, com a finalidade de acomodar aspessoas e seus acompanhantes com dificuldades financeiras quevem até Ijuí em busca de atendimento médico, de diversosmunicípios tais como, São Miguel das Missões, São Paulo dasMissões, Santo Antônio das Missões, Campina das Missões, SãoLuiz Gonzaga, São Pedro do Butiá, Palmeira das Missões,Panambi, Tenente Portela, Três Passos,, Santa Rosa, Tiradentes doSul, Humaitá, Bom Progresso, Horizontina, Porto Xavier, Guaranidas Missões, Santo Augusto, São Valério do Sul e outras tantascidades do nosso Estado.Também em Porto Alegre, o Deputado POMPEO DE MATTOSe o Deputado Estadual GERSON BURMANN, mantém umapousada com os mesmos objetivos situada na Rua Sofia Veloso,80 – Bairro Cidade Baixa e que pode ser contatada pelo fone(51) 9999.4635 com o Sr. EDSON.(grifos do original) (fl.31)

10. Ou seja, os candidatos não apenas prestaram vantagemaos eleitores na forma de hospedagem gratuita, tanto antes como depois do registrode suas candidaturas perante o TRE/RS, como também ofereceram o gozo de taisvantagens a todo o eleitorado através da divulgação ostensiva desses serviços em

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suas propagandas eleitorais distribuídas à população, com o objetivo lógico deangariar votos, desequilibrando a corrida eleitoral em face dos outros candidatos quenão lançaram mão de tais expedientes.

IIIBUSCA E APREENSÃO EFETUADA NAS REFERIDAS POUSADAS(CAUTELAR 16.2006) EM 19/09/06 – PRESENÇA DE HÓSPEDES NASCASAS – PROPAGANDA ELEITORAL E OUTROS DOCUMENTOSAPREENDIDOS

11. Em 19/09/06, em face de liminar (fls. 41-42) deferidanos autos da Ação Cautelar nº 16.2006, foi cumprido mandado de busca e apreensãonas duas pousadas dos investigados, cujos documentos anexos comprovam apresença naqueles locais de grande número de pessoas hospedadas (mesmo que às16h e na véspera do feriado do dia 20/09), quantidade significativa de propagandaeleitoral fixada na parte externa e interna (nas paredes, sobre as estantes) da pousada,inúmera propaganda depositada para distribuição (panfletos, adesivos, jornais, etc.)aos eleitores, bem como listas e cadernos com nomes de hóspedes, comprovantes degastos dos estabelecimentos em nome dos candidatos, cartazes, etc. (certidões e fotosfls. 53-62, bem como nas fotos registradas pelo Ministério Público e juntadas a partirda fl.).

12. Especificamente na Pousada Porto Alegre, conformeanexa certidão de cumprimento de referido mandado de busca e apreensão (fls. 56-62), certidão desta PRE que acompanhou a diligência (fl.), além da propagandaexterna acima referida, foi certificada a existência de 22 leitos, a presença de quatro(04) hóspedes naquela tarde véspera de feriado, residentes em diferentes municípiosdo Estado, a apreensão de inumerável propaganda eleitoral dos deputados Pompeo deMattos e Gerson Burmann no interior do estabelecimento, tanto fixada nas paredes (1faixa, 2 quadros, 5 cartazes, adesivos, etc.) como em cima de estante paradistribuição (aproximadamente 2.000 impressos/panfletos, 2.000 santinhos, 20posters, 50 jornais, etc.), todos com as referências eleitorais dos candidatos (nomes,números, fotos, cargos almejados, legendas, slogans de campanha, etc), bem como

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correspondência e documentos relacionados à hospedagem de pessoas no albergue(caderneta de endereços, listas de pessoas, agendamento de hospedagem,agradecimento de pessoas que passaram pela pousada, etc.), material impresso daAssembléia Legislativa (envelopes, folhas, cartões de visita, etc.), conformecertidões e fotos (fls. 53 e ss).

13. Já na Pousada Ijuí, também em cumprimento aoreferido mandado de busca e apreensão, além da propaganda externa já referida, foicertificado a presença de oito (08) hóspedes naquele momento (aproximadamente16h15min, em véspera de feriado), residentes em várias localidades (devidamentequalificados), grande quantidade de propaganda eleitoral na área interna da pousada(banners, cartazes, calendários, cartões, bandeiras, etc.), material relativo àhospedagem e às despesas do estabelecimento, material da Assembléia Legislativa(duas caixas com envelopes de correspondência), conforme certidão e fotos das fls.53-54 e documentos juntados pelo MPE a fls., bem como um cartaz manuscrito, comos seguintes dizeres (certificado na fl. 53):

“Senhores usários (sic) desta casa contamos com oreconhecimento de cada um de vocês para continuarmosajudando a todos. Portanto, pedimos a colaboração de cadaum para chegarmos juntos a mais uma VITÓRIA, no dia 01 deoutubro. Contém (sic) conosco.Deputado Federal 1221Deputado Estadual 12312”

14. Eis a relação das 12 pessoas certificadas comohospedadas nas Casas Solidárias em 19/09/06, mesmo que, por óbvio, considerandoque o mandado foi cumprido à tarde (aproximadamente 16h30), é de se concluir quegrande parte das pessoas lá hospedadas não se encontravam no local no momento,haja vista a própria natureza dos serviços prestados em hotéis, pousadas econgêneres, onde as pessoas normalmente durante o dia cumprem as tarefas que asfizeram viajar e retornam ao estabelecimento para dormir apenas no fim do dia:Pessoas hospedadas nas Pousadas dos Deputados Darci Pompeo de Mattos e Gerson Burmannem 19/09/2006 (mandado cumprido aproximadamente às 16h30, em véspera de feriado estadual- 20/09, Revolução Farroupilha):- Pousada Porto Alegre (Rua Sofia Veloso nº 80): 22 leitos. 04 hóspedes: 1. Lauderiano da Silva

(Ijuí/RS), 2. Nenir Beatriz dos Santos da Silva (Ijuí/RS), 3. Dirceu Dallepiase (Catuíbe/RS), 4.

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Maristela Emília Bracht Hahn (São Paulo das Missões) – qualificados (RG, endereço) na certidãodo oficial de justiça das fl. 59.

- Ijuí: (Rua Vinte e Um de Abril nº 63): 50 leitos. 08 hóspedes: 1. Eli Terezinha Berwanger, 2.Melita Cagliari (Salvador das Missões/RS), 3. Antonio Ereno Cagliari (Salvador dasMissões/RS), 4. Joaquim Moraes Gonçalves (Santo Antônio/RS), 5. Irmi Terezinha Kern Hilgirt(São Pedro do Butiá/RS), 6. Ana Eli Costa da Costa (Jacuizinho/RS), 7. Inácio Gonçalves (SantoAntonio das Missões/RS) e 8. Angela Vieira da Silva (Alvorada/RS) – qualificados (RG, CPF,endereço) na certidão do oficial de justiça das fls. 53-54.

IVABUSO DO PODER ECONÔMICO OU POLÍTICO EM DETRIMENTO DA

LIBERDADE DE VOTO – PROTEÇÃO DA NORMALIDADE ELEGITIMIDADE DAS ELEIÇÕES

(CONSTITUIÇÃO, LC nº 64/90 E L. nº 9.504/97)

15. A Constituição Brasileira define a República Federativado Brasil Estado Democrático de Direito (CF, art. 1º, caput) onde todo poder emana

do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos (art. 1º, parágrafo único),sendo que a soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto

direto e secreto (art. 14, caput), bem como determinou ao legislador a edição desalvaguardas à normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do podereconômico ou o abuso do exercício de função pública, nestes termos:

Constituição FederalArt. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universale pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nostermos da lei, mediante:§9º Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade

e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade

administrativa, a moralidade para o exercício do mandato,

considerada a vida pregressa do candidato, e a normalidade e

legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico

ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na

administração direta ou indireta.

16. Concretizando a nível legislativo o comandoconstitucional de preservar a normalidade e a legitimidade das eleições contra ainfluência do poder econômico, a Lei Complementar nº 64/90 estabeleceu,especialmente através da Ação de Investigação Judicial Eleitoral – AIJE, prevista em

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seu artigo 22, salvaguardas quanto ao abuso, uso indevido ou desvio de podereconômico, do poder de autoridade, ou utilização indevida de meios de comunicaçãosocial, em benefício de candidato ou partido:

Lei Complementar nº 64/90

Art. 19. As transgressões pertinentes á origem de valorespecuniários, abuso de poder econômico ou político, em detrimentoda liberdade de voto, serão apuradas mediante investigaçõesjurisdicionais realizadas pelo Corregedor-Geral e CorregedoresRegionais Eleitorais.Parágrafo único. A apuração e a punição das transgressõesmencionados no caput deste artigo terão o objetivo de proteger anormalidade e legitimidade das eleições contra a influência dopoder econômico ou do abuso do exercício de função, cargo ouemprego na administração direta, indireta e fundacional da União,dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ouMinistério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral,diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos eindicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura deinvestigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso depoder econômico ou do poder de autoridade, ou utilizaçãoindevida de veículos ou meios de comunicação social, embenefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinterito:

17. Com o mesmo desiderato constitucional de afastar adeturpadora influência do poder econômico das eleições, a legislação eleitoral proíbeos candidatos de oferecerem ou prestarem ajuda ou vantagem de qualquer natureza apessoas físicas ou jurídicas:

Lei nº 9.504/97

Art. 23. (...)§ 5º Ficam vedadas quaisquer doações em dinheiro, bem como detroféus, prêmios, ajudas de qualquer espécie feitas por candidato,entre o registro e a eleição, a pessoas físicas ou jurídicas.(parágrafo acrescentado pela Lei nº 11.300/06)

Art. 24. É vedado, a partido e candidato, receber direta ouindiretamente doação em dinheiro ou estimável em dinheiro,inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedentede:(enumera onze incisos com entidades vedadas de contribuir paraas campanhas, alguns acrescidos pela Lei nº 11.300/06)

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Art. 39. (...)§ 6º É vedada na campanha eleitoral a confecção, utilização,distribuição por comitê, candidato, ou com a sua autorização, decamisetas, chaveiros, bonés, canetas, brindes, cestas básicas ouquaisquer outros bens ou materiais que possam proporcionarvantagem ao eleitor.(parágrafo acrescentado pela Lei nº 11.300/06)

Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos,constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidatodoar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim deobter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza,inclusive emprego ou função pública, desde o registro dacandidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa demil a cinqüenta mil UFIR, e cassação do registro ou do diploma,observado o procedimento previsto no art. 22 da LeiComplementar no 64, de 18 de maio de 1990.(artigo acrescentado pela Lei nº 9.840/99)

Código Eleitoral (Lei 4.737/65)

Art. 237. A interferência do poder econômico e o desvio ou abusodo poder de autoridade, em desfavor da liberdade do voto, serãotolhidos e punidos.

Art. 243. Não será tolerada propaganda:V – que implique oferecimento, promessa ou solicitação dedinheiro, dádiva, rifa, sorteio ou vantagem de qualquer natureza.

18. A Constituição e a legislação que rege o processoeleitoral não possuem um preceito normativo que conceitue in abstracto condutasque caracterizem abuso de poder econômico ou político. Não obstante, aConstituição, no art. 14, §§ 9º e 10, e a LC n. 64/90, nos seus arts. 19 e 22,estabelecem que a coibição destas formas de abuso deverão observar as seguintesfinalidades: (a) a proteção da normalidade e legitimidade das eleições, (b) daliberdade do voto, (c) da probidade administrativa e (d) da moralidade para oexercício do mandato.

19. Desta forma, a identificação dos atos queconsubstanciem abuso de poder econômico deverá ser realizada a partir do casoconcreto – e não de condutas previamente tipificadas –, tarefa esta que, à luz dasnormas legais e constitucionais que regem a matéria, deverá ser norteada sempre

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pelas finalidades mencionadas, que derivam, em última análise, dos princípiosdemocrático e republicano.

20. O abuso de poder na seara eleitoral pode, a princípio,apresentar-se de duas formas: (a) ele pode consistir no uso indevido ou exorbitantede um direito que é conferido ao candidato; ou então (b) apresentar-se sob a forma deatos que, desde a origem, estão em desconformidade com o ordenamento jurídico.

21. No caso dos autos, a conduta dos investigadoscaracteriza abuso de poder econômico na medida em que apta para afetar anormalidade e legitimidade das eleições, pois praticada de forma permanente, poratos que desde a origem estão em desconformidade com o ordenamento jurídico, ealcançando expressivo contingente de eleitores, violando dispositivos expressos dalegislação eleitoral.

22. Primeiro, ao disponibilizar as Pousadas Porto Alegre e

Ijuí a eleitores durante o período eleitoral, os investigados violaram o supratranscrito§ 5º do art. 23 da Lei n. 9.504/97 que veda quaisquer doações em dinheiro, bem

como de troféus, ajudas de qualquer espécie feitas por candidato, entre o registro ea eleição, a pessoas físicas ou jurídicas.

23. Possivelmente também tenham infringido algum dosincisos do art. 24 da mesma lei, caso as referidas pousadas sejam vinculadas, mesmoque pro forma, a entidade beneficente ou religiosa ou organização civil de interessepúblico, instituições impedidas de direta ou indiretamente fazerem doação emdinheiro ou estimável em dinheiro a partido ou candidato, e, com muito mais razão,de servirem de instrumento de campanha eleitoral.

25. Infringiram com certeza o art. 41-A da Lei dasEleições, que estabelece que constitui captação de sufrágio o candidato doar,

oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ouvantagem pessoal de qualquer natureza inclusive emprego ou função pública, desde

o registro da candidatura até o dia da eleição, fato objeto do já referido processo300.2006 – Classe 16.

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26. Ao oferecerem aos eleitores hospedagem gratuita nasreferidas pousadas através de suas propagandas pessoais e eleitorais, como acimasobejamente demonstrado, violaram também o art. 243 do Código Eleitoral quedetermina que não será tolerada propaganda que implique oferecimento de

vantagem de qualquer natureza.

27. Ao manterem, inclusive após o registro decandidaturas, albergues em Porto Alegre e Ijuí, nos quais era oferecida hospedagemgratuita a pessoas que se dirigiam a estas cidades – via de regra, para realização detratamento de saúde –, os investigados indiscutivelmente entregaram benesses aeleitores, o que desequilibrou a igualdade entre os candidatos e afetou a liberdade desufrágio.

28. Ressalte-se, e isto merece destaque, que as hospedagensprestadas nas Pousadas Pompeo e Burmann começaram a desequilibrar a igualdadeentre os candidatos já em 2003, ano em que os investigados criaram as PousadasPorto Alegre e Ijuí e passaram a oferecer gratuitamente a referida vantagem, situaçãoque exponencializou seu nefasto potencial influidor nas eleições realizadas em1º.10.2006.

29. É ilustrativo desse desequilíbrio o fato do MinistérioPúblico já ter nestas eleições, até o presente momento, representado contra novedeputados em face da manutenção desses albergues. Como é fácil perceber que oscandidatos patrocinadores de albergues geralmente se elegem entre os mais votados,o vício parece vir multiplicando-se no Rio Grande do Sul, situação que torna urgentea devida repressão da conduta por parte do Estado-Juiz, sob pena de restarcomprometida não só a normalidade e a legitimidade dessas eleições de 2006 mastambém as dos próximos pleitos. Em sua edição de 04/10/06 o Jornal Zero Hora(p.04 – Reportagem Especial – A nova Assembléia, Times Reforçados) ao repercutira formação da Assembléia Legislativa eleita em 1º/10/2006 a divide em vários“times”, denominando um deles como “ALBERGUEIROS”, entre eles incluído odeputado investigado reeleito Gerson Burmann, com o seguinte texto: Os alberguesmantidos pelos oito deputados estaduais que tentavam a reeleição renderam a eles

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72.047 votos a mais neste ano do que em 2002. As instituições acolhem pacientes

que precisam se deslocar para tratamento em outra cidade e seus familiares. (doc.anexo).

30. As Pousadas Porto Alegre e Ijuí possuem capacidadepara atender até 72 pessoas diariamente, onde recebem gratuitamente hospedagem.Tais estabelecimentos estão localizados em Porto Alegre e Ijuí, capital e cidade-pólode sua região (indústria, comércio e serviços), centros universitários e de referênciamédica. O custo de tais imóveis (aluguel, compra), ressaltado pela sua área (percebe-se pela foto da fl. 29 que a Pousada Ijuí está instalada em amplo sobrado construídoem terreno de grandes dimensões) e localização, sua manutenção (impostos, pintura,serviços, limpeza, materiais, etc.), seus custos com água, luz, telefone, gás, etc., suamobília e equipamentos (camas, colchões, eletrodomésticos), salários de seuscolaboradores (administradores, empregados, etc.), não deixam dúvidas sobre o altocusto mensal do empreendimento, suportado exclusivamente pelos deputados, quedestacam esse fato em suas propagandas eleitorais impressa distribuídas aos eleitoresna campanha eleitoral de 2006 (fl. 31) e também transmitido aos usuários das casas eao público em geral pela ostensiva colocação do nome dos Deputados na fachadadesses estabelecimentos (fls. 15-23/Porto Alegre e fl. 28/Ijuí).

31. Para a configuração do abuso e uso indevido do podereconômico bastaria a comprovação de que, mesmo que de uma forma mais discreta esutil, fosse dado conhecer aos usuários das pousadas os nomes de seus benfeitores,ou seja, permaneceria a conduta desequilibradora do pleito mesmo que os Deputados,ad argumentandum tantum, não tivessem levado à cabo a acima referida ecomprovada ostensiva utilização das mesmas para as suas promoções pessoais eeleitorais, situações que no caso concreto se confundem.

32. Assim, não resta dúvida que os serviços prestados pelosDeputados aos eleitores nesses estabelecimentos, tanto antes como depois deregistradas suas candidaturas, teve como objetivo principal a obtenção de votos emseus benefícios, de modo a desequilibrar a corrida eleitoral em face dos candidatosque não lançam mão de tais expedientes, afetando dessa forma, sobremaneira, anormalidade e legitimidade dessas eleições de 2006, situação a ser devidamente

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tolhida e punida (Código Eleitoral, art. 237), sob pena de se legitimar a conduta,ratificar o desequilíbrio do pleito em prejuízo aos candidatos que não praticaram esseabuso, bem como desautorizar o cumprimento das regras eleitorais para os próximospleitos no Rio Grande do Sul.

33. A potencialidade da conduta influir no resultado dopleito. Um dos elementos para a caracterização do abuso de poder econômico é apotencialidade do ilícito afetar a normalidade e legitimidade das eleições. Não setrata de nexo de causalidade a exigir a demonstração de causa e efeito entre a ação eo resultado das urnas. Basta que o ato, tomando-se em consideração as circunstânciase a conjuntura em que foi praticado, seja apto a influir sobre a livre vontade popular.Daí falar-se em potencialidade e não em nexo de causalidade.

34. No caso, a potencialidade da conduta dos investigadoster desequilibrado a igualdade de oportunidades entre os candidatos é manifestadiante da magnitude do empreendimento, duas pousadas em duas das cidades maisimportantes do Estado, capacidade de atendimento de 72 pessoas diariamente,milhares de hospedagens mensais, devendo ainda ser somado a esses números oefeito multiplicador de familiares e amigos e a potencialização pelo fato da “ajuda”ser prestada a pessoas em momento de especial fragilidade pessoal: quando em busca

de atendimento na rede pública de saúde. O efeito eleitoral causado nos usuários doserviço de hospedagem e alimentação ofertados pelos candidatos nas Pousadas PortoAlegre e Ijuí é tão intenso quanto óbvio.

35. Quanto à desnecessidade de comprovação do nexo decausalidade entre a conduta abusiva e o resultado do pleito em favor do conceito depotencialidade, trazemos exemplificativamente as seguintes decisões do TSE:

RECURSO ORDINÁRIO. ELEIÇÃO 2002. AÇÃO DEINVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ABUSO DOPODER ECONÔMICO E USO INDEVIDO DOS MEIOS DECOMUNICAÇÃO. POTENCIALIDADE. NÃO-CARACTERIZAÇÃO. NEGADO PROVIMENTO.I - Segundo a jurisprudência desta Corte, alterada desde ojulgamento do REspe nº 19.571/AC, rel. Min. SepúlvedaPertence, DJ de 16.8.2002, na ação de investigação judicialeleitoral, deixou de se exigir que fosse demonstrado o nexo decausalidade entre o abuso praticado e o resultado do pleito,

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bastando para a procedência da ação a "indispensáveldemonstração - posto que indiciária - da provável influência doilícito no resultado eleitoral (...)".II - O TSE admite que os jornais e os demais meios impressos decomunicação possam assumir posição em relação à determinadacandidatura, sendo punível, nos termos do art. 22 da LC nº 64/90,os excessos praticados. Precedente.1

(destaquei)

Recurso Especial. Investigação Judicial(LC 64/90, arts. 1º, "d", 19,§ único, 22, XIV e XV e 24 c/c L. 9.504/97, art. 41-A) - Ausênciade prova e de nexo de causalidade.I. É certo bastar a potencialidade de influência no resultado dopleito para a procedência da investigação judicial: averificação dessa probabilidade, no entanto, pressupõe provacabal da existência dos fatos abusivos ou de captação ilícita desufrágios delatados.II. Impossibilidade de reexame e valoração do conjunto probatóriona via do recurso especial (Súmula 279 -STF).III. Fortes indícios de configuração, em tese, do crime decorrupção (Cód. El. art. 299): extração e remessa de cópia dosautos ao MPE para as providências cabíveis.IV. Recurso não conhecido.2

(destaquei)

36. Dessa forma, para a configuração do abuso de podereconômico não é necessário que a conduta ilícita alcance o resultado eleitoralpretendido, bastando que a mesma tenha potencialidade para influir no pleito. O bemprotegido é a legitimidade e a moralidade das eleições e o que se pune é a utilizaçãoindevida ou abusiva do poder econômico que afete esses valores com o objetivo defavorecer determinada candidatura. Ou seja, a ação resta cometida mesmo que nãoconsiga atingir seu objetivo, mesmo que o candidato não se eleja (restando, nessecaso, a punição de inelegibilidade), ou mesmo que obtenha votação inferior à obtidaem pleito anterior. Tal conclusão fica clara diante da possibilidade, perfeitamenteviável, da Justiça Eleitoral condenar candidato por abuso do poder econômicomesmo antes da realização do pleito, hipótese em que será cassado o registro de suacandidatura (LC nº 64/90, art. 22, XIV e XV).

1 RO n. 758, rel. Min. Francisco Peçanha Martins, j. 12.08.2004, DJ 03.09.2004, p. 108.2 RESPE n. 19.553, rel. Min. José Paulo Sepúlveda Pertence, j. 21.03.2002, DJ 21.06.2002, p. 244.

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37. Entretanto, mesmo assim, é de ressaltar que no caso doDeputado Gerson Burmann os indícios demonstram que os serviços prestadosgratuitamente aos eleitores nas Pousadas repercutiram positivamente nas eleições de2006, onde obteve 40.050 votos, o que importou em um acréscimo de 44% emrelação aos 27.812 votos obtidos para o mesmo cargo nas eleições de 2002, sem comisso, por óbvio, estar se afirmando que esses números decorrem prioritariamente daprática aqui combatida, até mesmo porque tal avaliação é imensurável face ànatureza do voto e, como já dito, irrelevante para a imputação jurídica aqui referida(docs. anexos).

38. Num tempo em que se proíbe a doação de qualquerbrinde feito por candidato a eleitor, quando a lei, de modo a não deixar dúvida,estabelece que ficam vedadas quaisquer doações em dinheiro, bem como de troféus,prêmios, ajudas de qualquer espécie feitas por candidato, entre o registro e a

eleição, a pessoas físicas ou jurídicas, parece-nos antes de tudo ofensivo à própriaadministração da justiça eleitoral, que mobiliza todo um universo de juízes,servidores, equipamentos e recursos públicos de toda espécie para garantir a lisura dopleito, que candidatos mantenham, inclusive durante a campanha eleitoral, alberguespara oferecerem e prestarem hospedagem gratuita a centenas ou até mesmo milharesde eleitores todo mês, e que, além de tudo, de tais fatos façam ostensiva publicidadeà comunidade Rio-Grandense.

39. Impressiona a sofisticação do sistema criado. Aspessoas são atendidas/visitadas nas pousadas pelos parlamentares e/ou por seusassessores, que, por vezes lá residem, como é o caso do assessor Edson Beltrão, quereside na Pousada Porto Alegre, na Rua Sofia Veloso nº 80 (Relatório de Diligênciasacostado aos autos pelo MPE à fl.). Os nomes e endereço dos usuários sãodevidamente cadastrados para, obviamente, terem sua memória reativada sobre adívida de gratidão que fica pelo serviço prestado. Durante a campanha eleitoral, oserviço prossegue normalmente, com a diferença que nesse período há largo materialde propaganda dos candidatos nos albergues, como demonstra o material láapreendido, ficando os usuários hospedados como que dentro de um comitê decampanha.

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40. Os albergues, a concessão de hospedagem, e por vezeso transporte de eleitores da rodoviária até esses locais, a utilização de servidorespúblicos na administração das casas, já é uma ação por si só notável a revelar umaaposta temerária na impunidade da conduta, ou, o que talvez seja ainda maispreocupante, um completo descaso pelas supracitadas normas constitucionais e legaisque regulam o processo eleitoral, bem como pelos poderes públicos constituídos parazelar pela sua regularidade.

41. Conforme antes referido, denotando a real finalidadedestas “casas de apoio”, a manchete de capa da edição Maio 2005 (Ano 10, número91) do Jornal Extra Classe, do SINPRO-RS (Sindicado dos Professores do EnsinoPrivado do RS), cuja edição eletrônica foi antes citada, ao se referir às “casas depassagem” mantidas por deputados em Porto Alegre, foi precisa ao captar a

finalidade de tais estabelecimentos: Trocam-se votos por favores – Oassistencialismo praticado nos albergues mantidos por deputados estaduais é umacampanha eleitoral permanente. A matéria jornalística apreende bem a situaçãoquando ressalta que o assistencialismo é uma prática medieval que sobrevive até osdias de hoje e funciona, na prática, como uma campanha eleitoral permanente com

uma relação custo-benefício comprovada. Os deputados que utilizam ou utilizaramessa ferramenta política não casualmente são ou foram também os mais votados nos

pleitos em que participaram (doc. anexo).

42. O Jornal Zero Hora, na edição de 19/09/2006 (ColunaPágina 10 – Rosane de Oliveira), ao se referir à pousada congênere mantida pelodeputado estadual Vilson Covatti (PP), também objeto de representação por estaPRE, nominou tais estabelecimentos como albergues eleitorais (doc. anexo).

43. O Tribunal Superior Eleitoral, julgado em 23/05/2006,dando provimento a recurso do Ministério Público Eleitoral, invalidou diplomaexpedido em nome de candidato eleito para o cargo de deputado estadual em virtudede abuso do poder econômico consubstanciado na apreensão de quinze cestas básicasna residência de um cabo eleitoral do candidato e que seriam distribuídas a eleitores,ou seja, por fato que, embora relevante, é muito menos expressivo e lesivo àlegitimidade e normalidade das eleições do que a manutenção confessa pelos

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deputados investigados, durante os 03 anos que separam as eleições de 2006 do anode 2003, quando foram criadas as Pousadas Pompeo e Burmann, de dois alberguesatravés dos quais ofereceram a todo o eleitorado e prestaram efetivamentehospedagem gratuita a milhares de cidadãos, sendo do amplo conhecimento dosusuários e do público em geral que tais estabelecimentos são por eles mantidos, fatoensejador de incomensurável desequilíbrio entre os candidatos:

RECURSO CONTRA EXPEDIÇÃO DE DIPLOMA.PRELIMINARES. AFASTADAS. MÉRITO. ABUSO DOPODER ECONÔMICO. POTENCIALIDADE. PROVIMENTO.1. Apontamento pelo Ministério Público do fato de terem

sido apreendidas quinze cestas básicas na residência de umcabo eleitoral do candidato, que seriam distribuídas aeleitores.

2. Apreensão ocorrida no Município de rio Branco, onde ocandidato obteve alta concentração de votos (77,30%), de umtotal de 3.304 votos.

3. O abuso de poder econômico foi reconhecido por decisãodeste Tribunal (RO nº 741, rel. Min. Gomes de Barros,julgado em 22.2.2005).

4. Verifica-se a potencialidade da conduta e o conseqüentecomprometimento do processo eleitoral.

5. Recurso provido para, nos termos do art. 262, IV, do CódigoEleitoral, invalidar o diploma expedido em nome de RobertoBarros filho.3

(destaquei)

44. No mesmo sentido a seguinte decisão do TribunalSuperior Eleitoral:

RECURSO ORDINÁRIO. Eleições 2002. Abuso do podereconômico. Captação ilegal de sufrágio. Configuração. Provimentonegado.Configurado o abuso do poder econômico, decorrente daprática de assistencialismo voltado á captação ilegal desufrágios, impõe-se a declaração da inelegibilidade, nos termos doart. 22, VI, da LC nº 64/90.4

(destaquei)

45. Por fim, destacamos o disposto no artigo 23 da LeiComplementar nº 75/93:

3 RCEd nº 616, rel. Ministro José Delgado, j.23.05.2006, DJ 23.082006, p. 107.4 RO nº 741, rel. Ministro Humberto Gomes de Barros, j. 22.02.2005, DJ 06.05.2005, p. 151.

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Art. 23. O Tribunal formará sua convicção pela livre apreciaçãodos fatos públicos e notórios, dos indícios e presunções e provaproduzida, atentando para circunstâncias ou fatos, ainda que nãoindicados ou alegados pelas partes, mas que preservem ointeresse público de lisura eleitoral”(destaquei)

46. Diante do exposto, configurada e comprovada a práticade abuso de poder econômico dos investigados pelos fatos acima narrados, é de serao fim julgada procedente a presente ação de investigação judicial eleitoral, comaplicação das penas referidas no inciso XIV do art. 22 da LC nº 64/90.

VI – PEDIDO

47. ANTE O EXPOSTO, o Ministério Público Eleitoral

requer:

(a) que a presente ação de investigação judicial

eleitoral seja recebida e processada;

(b) seja a mesma distribuída por dependência ao

processo cautelar nº 16.2006 (Classe 04), ação preparatória desta AIJE, sendo

aqueles autos apensados aos desta ação, até julgamento final, conforme arts. 796 e

809 do CPC, haja vista constar naqueles autos toda a prova formada em virtude da

busca e apreensão autorizada por Vossa Excelência, e, cujo objetivo, é instruir a

presente ação principal;

(c) que sejam notificados os investigados para,

querendo, oferecerem defesa no prazo legal;

(d) seja determinado aos investigados (d.1)

apresentarem demonstrativos das receitas e despesas em 2006, bem como os

respectivos livros fiscais, referentes aos dois estabelecimentos; (d.2) apresentarem

cópia da matrícula dos imóveis onde estão localizadas os dois estabelecimentos, bem

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como os respectivos contratos de locação;

(e) os depoimentos pessoais dos investigados, na

forma do art. 343 do CPC, constando do instrumento de intimação o disposto no seu

§ 1º; quando da designação da audiência referida no inciso V do art. 22 da LC nº

64/90;

(f) as seguintes diligências (art. 22, VI):

(f.1) sejam intimados o Presidente da Assembléia

Legislativa do Rio Grande do Sul, na Praça Marechal Deodoro, n. 101, CEP 90010-

300, nesta Capital, e o Presidente da Câmara dos Deputados, na Praça dos Três

Poderes, CEP 70160-900, em Brasília, para que informem, respectivamente, os

nomes de todos os assessores parlamentares do Deputado Estadual Gerson Burmann

e do Deputado Federal Darci Pompeo de Mattos nos últimos 12 (doze) meses;

(f.2) seja requisitado à empresa NOVOGRAF ME,

CNPJ n. 95.123.956/0001-97, com sede à Rua Oswaldo Arthur Hartz nº 811, Bairro

Canudos, em Novo Hamburgo, RS, para que remeta cópia de todo impresso

produzido para Darci Pompeo de Mattos no ano de 2006, inclusive dos impresso

juntados nas fls. 31-38 da cautelar em anexo, apresentando, ainda, cópia das

respectivas notas fiscais e informando o número de exemplares produzido de cada

impresso;

(f.3) seja requisitado às Prefeituras dos municípios de

Porto Alegre e Ijuí cópia do alvará de funcionamento das pousadas/albergues

denominadas Pousada Porto Alegre e Pousada Ijuí instaladas nos seguintes

endereços:

Porto Alegre: Rua Sofia Veloso, 80;

Ijuí: Rua 21 de Abril, 63;

(f.4) seja certificado nos autos pelo setor competente do

TRE a data do requerimento e do deferimento do registro de candidatura a deputado

estadual de Gerson Burmann (Processo 318.2006 Classe 15), bem como do registro

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de candidatura a deputado federal de Darci Pompeo de Mattos (Processo 258.2006

Classe 15);

(f.5) seja certificado nos autos, pelo setor competente

do TRE, juntando-se cópia das “certidões eleitorais” (Nome, endereço, CPF e Título

de Eleitor) das 08 pessoas (hóspedes em Porto Alegre e Ijuí) nominadas no item 14

desta representação;

(g) que sejam consideradas como desta ação todas

as provas juntadas na referida ação cautelar preparatória deste AIJE, com especial

destaque para o cartaz referido no item 13 desta representação, propagandas

eleitorais, listas de hóspedes, documentos das pousadas, agendas, etc.;

(h) que sejam ouvidas as testemunhas abaixo

arroladas, sendo facultado ao Ministério Público, caso não as apresente em

audiência, juntar seus depoimentos que venham a ser proferidos no Processo Classe

16 n. 300.2006, que cuida de Representação Eleitoral por Captação Ilícita de

Sufrágio ajuizada pelo Ministério Público Eleitoral contra os investigados, como

prova emprestada, juntando-se aos presentes autos cópias autenticadas:

- ANANIAS VANDERLEI OURIQUES, Oficial de Justiça (Ijuí/RS);

- CLEONICE RIBEIRO DE OLIVEIRA, Servidora do Ministério Público Eleitoral (Ijuí – fl. 88);

- ÉDEN PAULA DE PAULA, Servidor do Poder Judiciário (Oficial de Justiça “ad hoc”– fl. 56);

- JEANE MACHADO PETRUCCI, Servidora do Ministério Público Eleitoral (Porto Alegre);

- LUÍSA MARIA PILAU, Servidor do Poder Judiciário (Oficial de Justiça “ad hoc” – fl. 55);

- SHAIANE TASSI MOUSQUER, Servidora do Ministério Público Federal (fl. 63).

(i) que, ao final, seja julgada inteiramente

procedente a presente Ação de Investigação Judicial Eleitoral, reconhecendo-se a

responsabilidade dos investigados por abuso de poder econômico e cominando-lhes a

sanção de inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos 3 (três) anos

subseqüentes à eleição em que se verificaram os fatos, bem como para as demais

penas e providências previstas nos incisos XIV e XV do art. 22 da LC nº 64/90;

Protesta, por fim, pela produção de todos os meios de

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prova em direito admitidos.

Nestes termos, pede e espera deferimento.

Porto Alegre, 18 de outubro de 2006.

Vitor Hugo Gomes da CunhaProcurador Regional Eleitoral Substituto