EXCELENTISSIMO SENHOR DESEMBARGADOR … · “A unidade do juízo falimentar é ditada, segundo já...
Transcript of EXCELENTISSIMO SENHOR DESEMBARGADOR … · “A unidade do juízo falimentar é ditada, segundo já...
1
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
PROCURADORIA GERAL DE JUSTIÇA
EXCELENTISSIMO SENHOR DESEMBARGADOR
PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE
SÃO PAULO
Referência
Agravo de Instrumento n. 2027212.06.2016.8.26.0000 8ª Câmara de Direito Público
Relator Desembargador Ronaldo Andrade
O Ministério Público do Estado de São Paulo, na
pessoa da Procuradora de Justiça infra assinada, vem, nos
termos dos artigos 976 e 977 do Código de Processo Civil (Lei
13.105/2015) c.c. o artigo 32 do Regimento Interno do
Tribunal de Justiça do Tribunal de Justiça de São Paulo, nos
autos do agravo de instrumento de n.
2027212.06.2016.8.26.0000, suscitar o presente INCIDENTE
DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS, pelos
motivos a seguir expostos.
PRELIMINARMENTE
O Código de Processo Civil entrou em vigor um
ano após a sua publicação, por força do disposto no artigo
1045. Desse modo, as novas regras de admissibilidade
2
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
PROCURADORIA GERAL DE JUSTIÇA
recursal passaram a ser exigidas a partir de 18 de março de
2016, como preceitua o enunciado do Superior Tribunal de
Justiça:
Enunciado administrativo número 3
Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos
os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC.
Na hipótese que ora se analisa, a decisão
impugnada mediante agravo de instrumento foi publicada em
12 de abril de 2015 (fls. 52) e a Defensoria Pública intimada
pessoalmente em 5 de fevereiro de 2016 (fls. 53). Antes, pois,
do início da vigência do novo estatuto processual civil.
Não se aplicam, portanto, as restrições traçadas
no artigo 1015, que limita as hipóteses de cabimento de
agravo de instrumento.
Satisfeitos os requisitos de admissibilidade
recursal, verifica-se na repetição de processos da mesma
natureza um risco à isonomia e à segurança jurídica, o que
justifica a instauração do presente incidente.
DEMANDAS E RECURSOS REPETITIVOS
3
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
PROCURADORIA GERAL DE JUSTIÇA
A Defensoria Pública do Estado de São Paulo –
Regional de São José dos Campos ajuizou inúmeras ações
individuais de responsabilidade civil por danos materiais e
morais, visando a resguardar direitos de pessoas que
perderam suas posses em virtude de cumprimento de
mandado de reintegração de posse expedido em ação proposta
pela massa falida de Selecta Comércio Indústria S/A.
Em despacho inicial proferido pelo juízo da
Comarca de São José dos Campos, foi reconhecida a
incompetência absoluta, por força do disposto no artigo 7º,
§2º do Decreto-lei 7661/45 e determinada a remessa ao juízo
falimentar.
Inconformada com a decisão, a Defensoria
Pública, em cada uma das ações em que atua representando
os possuidores, interpôs agravo de instrumento, sob o
argumento de que se trata de quantia ilíquida e que, portanto,
estaria justificada a exceção à universalidade do juízo
falimentar.
Este Egrégio Tribunal proferiu uma série de
acórdãos negando provimento ao agravo de instrumento, por
reconhecer que a competência do juízo falimentar é absoluta.
Outros, por sua vez, acolhem a tese de que se trata de quantia
4
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
PROCURADORIA GERAL DE JUSTIÇA
ilíquida, o que embasaria a exceção prevista no artigo 24, §2º,
inciso II do Decreto-lei 7661/45.
Apenas para exemplificar a divergência e a efetiva
repetição de processos com controvérsia sobre a mesma
questão unicamente de mérito, anotem-se as ementas dos
dois acórdãos que se seguem:
AGRAVO DE INSTRUMENTO - PROCESSUAL CIVIL COMPETÊNCIA - JUÍZO UNIVERSAL DA FALÊNCIA - RESPONSABILIDADE CIVIL - PRETENSÃO ESCORADA EM
FATOS APONTADOS COMO ILÍCITOS PRATICADOS DEPOIS DE DECRETADA A FALÊNCIA DA EMPRESA AGRAVADA - IRRELEVÂNCIA NA HIPÓTESE A ILIQUIDEZ DA OBRIGAÇÃO PERSEGUIDA EM JUÍZO PARA FIXAR O JUÍZO COMPETENTE PARA CONHECER E JULGAR A CAUSA - COMPETÊNCIA DO
JUÍZO DA FALÊNCIA - DECISÃO QUE DECLINOU DA COMPETÊNCIA MANTIDA. AGRAVO DESPROVIDO. (Relator(a): Amorim Cantuária; Comarca: São José dos Campos; Órgão julgador: 3ª Câmara de Direito Público; Data do julgamento: 26/07/2016; Data de registro: 27/07/2016)
AI 2232424-58.2015.2015.8.26.0000
Neste sentido, tem sido a orientação da maioria
das decisões proferidas por este Egrégio Tribunal de Justiça
paulista1. Mas outros acórdãos há com posicionamento
diverso:
1 AI 2100691-32.2016.8.26.0000, 10ª Câmara de Direito Público TJSP, relator Des. Paulo
Galizia, j. 15-08-2016, AI 2231417-31.2015.8.26.0000, 12ª Câmara de Direito Público TJSP, relator Des. Venício Salles, j. 15-08-2016, AI 2100498-17.2016.8.26.0000, 12ª Câmara de Direito Público TJSP, relator Des. Venício Salles, j. 15-08-2016, AI 2020861-17.2016.8.26.0000, 12ª Câmara de Direito Público TJSP, rel. Des. Isabel Cogan, j. 15-08-2016, AI 2073146-84.2016.8.26.0000, 3ª Câmara de Direito Público TJSP, rel. Des. Camargo Pereira, j. 10-08-2016, AI 2035741-14.2016.8.26.0000, 8ª Câmara de Direito Público TJSP, rel. Des. Ronaldo Andrade, j. 09-08-2016, AI 2222015-23.2015.8.26.0000,
5
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
PROCURADORIA GERAL DE JUSTIÇA
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO PROMOVIDA CONTRA MASSA FALIDA, APÓS A DECRETAÇÃO DA QUEBRA. COMPETÊNCIA. DECISÃO AGRAVADA QUE DETERMINOU A SUA DISTRIBUIÇÃO AO JUÍZO UNIVERSAL DA FALÊNCIA. DESCABIMENTO. AÇÃO
COM VALOR ILIQUIDO QUE NÃO SE SUJEITA AO JUÍZO UNIVERSAL DA FALÊNCIA. INTELIGÊNCIA DO ART. 24, § 2º, DO Decreto 7661/45, c.c. ART. 6º, § 1º DA LEI 11.101/2005. PRECEDENTES DESTA C. CÂMARA JULGADORA E DO E. STJ. COMPOSIÇÃO DO POLO PASSIVO COM A FAZENDA PÚBLICA, O QUE ATRAI A COMPETÊNCIA DE UMA DAS
VARAS DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS. RECURSO PROVIDO. (Relator(a): Ferreira Rodrigues; Comarca: São José dos Campos; Órgão julgador: 4ª Câmara de Direito Público; Data do julgamento: 01/08/2016; Data de registro: 08/08/2016)
AI 2270185-26.2015.8.26.0000
Verificada a divergência sobre questão
exclusivamente de direito (exigida pelo Código de Processo
Civil), além da repetição de inúmeras demandas com o mesmo
objeto, ressalte-se que a perdurar a prolação de julgados em
diferentes sentidos sobre a matéria, haverá grave ofensa à
isonomia e à segurança jurídica, o que justifica a instauração
do incidente de resolução de demandas repetitivas
REQUISITOS PROCESSUAIS
Como preceituam os artigos 976 e 977 do
Código de Processo Civil, o Ministério Público pode requerer ao
12ª Câmara de Direito Público TJSP, rel. Des. Edson Ferreira, j. 08-08-2016, AI 2035752-43.2016.8.26.0000, 2ª Câmara de Direito Público TJSP, rel. Des. Carlos Violante, j. 05-08-2016, AI 2123525-29.2016.8.26.0000, 5ª Câmara de Direito Público TJSP, rel. Des. Marcelo Berthe, j. 01-08-2016, AI 2089290-36.2016.8.26.0000, 9ª Câmara de Direito Público TJSP, rel. Des. Décio Notarangelli, j. 04-08-2016.
6
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
PROCURADORIA GERAL DE JUSTIÇA
Presidente do Tribunal de Justiça instauração do Incidente de
Resolução de Demandas Repetitivas, uma vez constatados;
a) a repetição de processos; b) que apresentem controvérsia
sobre a mesma questão unicamente de direito; c) com risco de
ofensa à isonomia e à segurança jurídica.
Art. 976. É cabível a instauração do incidente de resolução de
demandas repetitivas quando houver, simultaneamente:
I - efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre
a mesma questão unicamente de direito;
II - risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica.
§ 1o A desistência ou o abandono do processo não impede o exame
de mérito do incidente.
§ 2o Se não for o requerente, o Ministério Público intervirá
obrigatoriamente no incidente e deverá assumir sua titularidade em
caso de desistência ou de abandono.
§ 3o A inadmissão do incidente de resolução de demandas
repetitivas por ausência de qualquer de seus pressupostos de
admissibilidade não impede que, uma vez satisfeito o requisito, seja
o incidente novamente suscitado.
§ 4o É incabível o incidente de resolução de demandas repetitivas
quando um dos tribunais superiores, no âmbito de sua respectiva
competência, já tiver afetado recurso para definição de tese sobre
questão de direito material ou processual repetitiva.
§ 5o Não serão exigidas custas processuais no incidente de
resolução de demandas repetitivas.
Art. 977. O pedido de instauração do incidente será dirigido ao
presidente de tribunal:
I - pelo juiz ou relator, por ofício;
II - pelas partes, por petição;
III - pelo Ministério Público ou pela Defensoria Pública, por petição.
7
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
PROCURADORIA GERAL DE JUSTIÇA
Parágrafo único. O ofício ou a petição será instruído com os
documentos necessários à demonstração do preenchimento dos
pressupostos para a instauração do incidente.
A questão que aqui se apresenta versa sobre
matéria exclusivamente de direito, prescindindo de dilação
probatória. E pelas suas características, pode ser aplicada a
qualquer situação análoga.
O tema de direito que se coloca em discussão é a
regra contida no artigo 7º, § 2º do Decreto-lei 7661/45.
Antes de passar à análise da questão
propriamente dita, importante destacar que a norma aplicável
à falência da Selecta é o hoje revogado Decreto-lei 7661/45.
Isso porque a quebra foi decretada em 1989, quando ele ainda
vigia.
A Lei 11.101/2005 entrou em vigor em 2005 e
preceitua, em seu artigo 192, que “não se aplica aos processos
de falência ou de concordata ajuizados anteriormente ao início de sua
vigência, que serão concluídos nos termos do Decreto-lei 7.661, de 21
de junho de 1945”
Desse modo, o sistema regente é o traçado no
decreto falimentar, a antiga Lei de Falências.
8
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
PROCURADORIA GERAL DE JUSTIÇA
O mencionado artigo 7º, § 2º coroa o princípio da
universalidade do juízo falimentar, que se consubstancia na
reunião de todos os feitos de interesse da massa, com o
intuito de garantir tratamento equânime a todos os credores:
Art. 7° É competente para declarar a falência o juiz em cuja
jurisdição o devedor tem o seu principal estabelecimento ou
casa filial de outra situada fora do Brasil.
...
§ 2º O juízo da falência é indivisível e competente para
todas as ações e reclamações sobre bens, interesses e
negócios da massa falida, as quais serão processadas na
forma determinada nesta lei.
Nesta seara, Rubens Requião, invocando os
ensinamentos de Jaeger, preceitua:
“Ora, para Jaeger, “tutelar adequadamente, e em
condições iguais, os credores, significa tornar possível o
crédito, e, em consequência, a atividade de produção e
troca. A exigência de justiça imporia que se não
disciplinassem de modo diverso os direitos e as ações
dos credores...”2
Mais à frente, o comercialista cuida dos efeitos da
decretação da falência para destacar a importância do
princípio da universalidade do juízo falimentar:
2 Curso de Direito Falimentar, 1º volume, 6ª edição, Saraiva, página 22
9
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
PROCURADORIA GERAL DE JUSTIÇA
“A unidade do juízo falimentar é ditada, segundo já
estudamos, pela natureza coletiva do processo de
falência e pelo princípio da par condicio creditorum.
Todos os credores que ocorrem ao processo de falência
devem se tratados com igualdade em relação aos
demais credores da mesma categoria. Somente a
unidade e a universalidade do juízo poderiam
assegurar a realização dessas regras”3
O instituto visa a garantir que todos os credores
titulares de direitos tenham o mesmo destino. Caso contrário,
violado estaria o princípio da par conditio creditorum,
dificultando até mesmo a satisfação dos interesses daqueles
que buscam individualmente o recebimento dos respectivos
créditos. A unidade garante que o maior número de credores
de uma mesma categoria seja satisfeito. A individualização da
cobrança não assegura a destinação de recursos suficientes
para o cumprimento de qualquer das obrigações. Para que
esse objetivo seja alcançado, há que se ter uma visão conjunta
do ativo e do passivo da massa falida.
Por isso mesmo, todas as ações propostas em face
da massa devem ser reunidas para o julgamento. Assim não
fosse, um mesmo fato gerador poderia resultar em decisões
conflitantes.
3 ob. cit., pág. 86
10
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
PROCURADORIA GERAL DE JUSTIÇA
O presente caso concreto retrata exatamente essa
situação. Cuida de pedido indenizatório decorrente de
cumprimento de mandado de reintegração de posse que teve
reflexo nos direitos de milhares de pessoas. A permitir o
prosseguimento no juízo de origem, cada uma das ações
poderá ter uma solução peculiar e individualizada,
contrariando frontalmente o princípio da igualdade entre
credores, sem poder garantir que ao menos parte da obrigação
possa ser suportada pela massa.
Foi com esse intuito que o artigo 7º, §2º do
Decreto-lei 7661/45 previu a reunião de todos os casos do
juízo falimentar para que o julgamento considere não somente
o direito individual do demandante, mas o tratamento
igualitário a todos os titulares de direitos com a mesma
origem. Ou ainda uma visão conjunta que permita que todos
os credores possam ser vistos sob um único enfoque: o da
pars conditio creditorum. Só assim todos receberão seus
créditos em proporções iguais, observadas as devidas
classificações. Só assim se fará justiça. Só assim poderão ser
minimizados os danos experimentados pelas pessoas que
perderam o direito de permanecer em suas terras quando do
cumprimento do mandado de reintegração de posse.
Eventual individualização dos créditos deve
considerar o tratamento igualitário, pois todos se originam de
um único fato. A visão globalizada é essencial para que todos
11
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
PROCURADORIA GERAL DE JUSTIÇA
tenham o mesmo tratamento. E isso só pode ser feito pelo
juízo falimentar. Essa análise é fundamental para atender aos
anseios sociais reclamados pelo fato ocorrido.
É o juízo falimentar quem pode aferir e sopesar os
interesses envolvidos. Quando se analisa um caso isolado a
visão é muito diferente da que se tem quando se debruça
sobre milhares de situações idênticas. Apenas a análise
conjunta poderá evitar que se instaure uma injustiça social.
Desse modo, a partir do momento em que a quebra
é decretada, qualquer reivindicação que envolva interesses da
massa, deve ser direcionada ao juízo universal.
Quando os julgados divergentes entendem que a
exceção se justifica porque se trata de dívida ilíquida,
baseiam-se na exceção prevista no artigo 24, §2º do Decreto-
lei 7661/45.
Este, no entanto, refere-se a demandas já iniciadas
quando da decretação da quebra. Nestas hipóteses, com a
superveniência da falência, o dispositivo prevê situações
excepcionais em que as ações podem prosseguir no juízo de
origem. É o caso das que demandam quantia ilíquida (§2º,
inciso II).
12
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
PROCURADORIA GERAL DE JUSTIÇA
O preceito legislativo visa a resguardar situações
colhidas de surpresa com a superveniência da falência, o que,
definitivamente, não é a hipótese da Selecta, que teve a
quebra decretada há mais de vinte anos.
Também não se cogite ter, a nova legislação
falimentar, cuidado da matéria de modo diverso. Na Lei
11.101/2005 também se excepcionam ações em andamento
quando da decretação da quebra. E mais uma vez não se exige
muito esforço interpretativo para concluir que a expressão
terá prosseguimento, aliada à alusão à suspensão das ações
(no caput), pressupõe litígio em curso. Não se suspende ou
deixa de suspender o que não se iniciou:
Art. 24. As ações ou execuções individuais dos credores,
sobre direitos e interesses relativos à massa falida,
inclusive as dos credores particulares de sócio solidário
da sociedade falida, ficam suspensas, desde que seja
declarada a falência até o seu encerramento.
...
§ 2° Não se compreendem nas disposições deste artigo,
e terão prosseguimento com o síndico, as ações e
execuções que, antes da falência, hajam iniciado:
...
II - os que demandarem quantia ilíquida, coisa certa,
prestação ou abstenção de fato.
13
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
PROCURADORIA GERAL DE JUSTIÇA
Ilustrativas as observações de José da Silva
Pacheco a respeito do dispositivo, ressaltando que o
tratamento é o mesmo anteriormente dispensado pela lei de
vigência:
“Vê-se, pois, que tanto antes como agora, sob a regência
da nova Lei, se o ajuizamento da ação e o respectivo
processo preceder à decretação da falência, a
superveniência desta: a) não suspende aquela ação
que demandar quantia ilíquida; b) não desloca a
competência do juízo; c) faculta reserva no juízo
falencial a pedido do juízo em que se promove a
liquidação; d) assegura a inclusão na classe própria,
desde que reconhecido líquido e certo o crédito”4
Não por outro motivo o Superior Tribunal de
Justiça já decidiu, em conflito de competência, que ação
proposta após a decretação da quebra não tem o condão de
afastar o juízo universal:
CONFLITO DE COMPETÊNCIA Nº 36.413 - RJ
(2002/0106394-9)
EMENTA
Competência. Conflito. Ação de cobrança.
Ajuizamento posterior à decretação da falência.
Interesse da Massa Falida. Inexistência de
hipótese de exceção. Juízo Universal.
- A competência universal do Juízo Falimentar
(art. 7º, 2º - Lei de Falências) decorre do
4 Processo de Recuperação Judicial, Extrajudicial e Falência, 3ª edição, Forense, pág. 60.
14
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
PROCURADORIA GERAL DE JUSTIÇA
imperativo de tratamento isonômico dos credores
da massa falida.
- Não se configurando hipótese de exceção, sendo
notório o interesse da massa, e tendo sido
interposta ação após a decretação da quebra,
não se vislumbra qualquer motivação a ensejar a
ruptura da sistemática própria da Lei de
Falências.
Conflito conhecido para declarar o Juízo da 2ª
Vara de Falências e Concordatas do Rio de
Janeiro competente para processamento e
julgamento da ação.
ACÓRDAO
Vistos, relatados e discutidos estes autos,
acordam os Ministros da SEGUNDA SEÇAO do
Superior Tribunal de Justiça, na conformidade
dos votos e das notas taquigráficas constantes
dos autos, por unanimidade, conhecer do
conflito e declarar competente a 2ª Vara de
Falências e Concordatas do Rio de Janeiro, nos
termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os
Srs. Ministros Antônio de Pádua Ribeiro, Barros
Monteiro, Humberto Gomes de Barros, Cesar
Asfor Rocha, Fernando Gonçalves e Jorge
Scartezzini votaram com a Sra. Ministra
Relatora. Ausentes, justificadamente, os Srs.
Ministros Castro Filho e Aldir Passarinho
Junior.
Brasília (DF), 13 de setembro de 2004 (data do
julgamento).
RELATORA: MINISTRA NANCY ANDRIGHI
VOTO
A falência é processo de execução coletiva, na
qual disputam os credores o pagamento de seus
créditos, por meio de concurso de preferência
sobre o produto da alienação da totalidade dos
bens da falida. Rege-se por normas e princípios
próprios, dentre os quais destaca-se a
competência universal do Juízo Falimentar (art.
7º, 2º - Lei de Falências), decorrente do
imperativo de tratamento isonômico de todos os
credores da massa falida.
Nada obstante, o próprio ordenamento jurídico
nacional, como também a jurisprudência deste
STJ reconhecem exceções à unidade e à
universalidade do juízo falimentar, tais como:
15
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
PROCURADORIA GERAL DE JUSTIÇA
hipóteses em que a massa falida for autora ou
litisconsorte em alguma ação de seu interesse;
ou em que haja cobrança judicial de crédito
tributário, a qual, em razão de determinação do
CTN, não está sujeita ao concurso de credores
ou habilitação em falência; ou nas ações em que
a União for autora ou ré, em que participar a
massa falida, quando a competência privativa
para dirimir a questão fica a cargo da Justiça
Federal; ou, ainda, em situações em que a ação
foi proposta antes da declaração de falência,
situação que atrai o art. 24 da referida Lei.
Na hipótese dos autos, contudo, situada a
massa falida no pólo passivo da ação, fica
afastada, de pleno, a exceção prevista no
parágrafo 3º, do art. 7º da Lei de Falências. E
certo que a ação de cobrança foi interposta
depois de decretada a quebra da empresa e,
ainda,5 que a dívida cobrada decorre de
contrato firmado entre as partes, sendo notório
o interesse da massa, não se vislumbra
qualquer motivação a ensejar a ruptura da
sistemática própria da Lei de Quebras.
Inafastável, portanto, a competência do Juízo
falencial para o julgamento da ação de cobrança
interposta por ROGÉRIO MIRANDA contra a
antiga Casas Pernambucanas.
Forte em tais razões, conheço do presente
conflito de competência e declaro o Juízo da 2ª
Vara de Falências e Concordatas do Rio de
Janeiro competente para processamento e
julgamento da ação supracitada.
Nas hipóteses que se repetem em todos os feitos,
as ações de indenização são posteriores à decretação da
quebra e foi exatamente o que norteou as decisões que estão
sendo questionadas. Em todas as demandas figura no pólo
passivo a massa falida da Selecta Comércio Indústria S/A.
5 grifei
16
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
PROCURADORIA GERAL DE JUSTIÇA
Logo, tratam-se de ações posteriores, às quais não se aplica
o disposto no invocado artigo 6º, § 1º da Lei 11.101/2005.
Ressalta-se que há uma grave insegurança
jurídica que se caracteriza pela existência de decisões
conflitantes proferidas por esta Egrégia Corte de Justiça, o
que torna viável a instauração do incidente.
Em se tratando de instituto novo, ainda
embrionário, mas já regulamentado no Regimento Interno
deste Egrégio Tribunal, verifica-se que a instauração do
incidente pressupõe a existência de processo pendente no
respectivo tribunal. Por este motivo, o requerimento de
instauração é feito com fundamento nos autos do presente
agravo de instrumento, que ainda pende de julgamento.
Observa-se, ainda, estar satisfeito o requisito
traçado no §4º do artigo 976 do Código de Processo Civil, que
se refere à inexistência de incidente de resolução de demandas
repetitivas oriundo de recurso especial ou recurso
extraordinário afetado, o que se pode constatar por consulta
aos sites eletrônicos do Superior Tribunal de Justiça e do
Supremo Tribunal Federal.
Anexo ao presente, cópias do agravo de
instrumento paradigma (n. 2027212.06.20168.26.0000)
17
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
PROCURADORIA GERAL DE JUSTIÇA
interposto por José Luiz Vieira, contendo a inicial, a certidão
de intimação da Defensoria Pública e do despacho proferido
pelo ilustre relator (doc 1), dos dois acórdãos supra citados6
(doc 2 e 3), além de iniciais de outros dois processos7 (doc 4 e
5) que comprovam a existência de demandas repetitivas.
Assim, diante do exposto, requer a instauração
do incidente de resolução de demanda repetitiva,
determinando-se, de imediato, a suspensão deste e de todos
os processos que versem sobre a mesma matéria, nos termos
do artigo 982 do Código de Processo Civil.
São Paulo, 5 de setembro de 2016.
Maria da Glória Villaça Borin Gavião de Almeida
Procuradora de Justiça
6 AI 2232424-58.2015.2015.8.26.0000 e AI 2270185-26.2015.8.26.0000
7 De autoria de So9naldo Barbosa da Silva e Renata Sinopole de Moraes Oliveira