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1 EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA 13ª VARA FEDERAL CRIMINAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DE CURITIBA-PR. "Sendo o direito uma ciência, o meio justifica o fim, e não o fim, o meio. Abandono por completo as ideias maquiavélicas e, pouco importando - porque há de se pagar um preço por se viver em um Estado Democrático de Direito e esse preço é o respeito irrestrito à ordem jurídica, principalmente à ordem jurídica constitucional (...)" 1 Ação Penal nº 5063130-17.2016.4.04.7000 LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA (“Primeiro Defendente”) e MARISA LETÍCIA LULA DA SILVA (“Segunda Defendente), qualificados, respectivamente, nos eventos 10 e 11 dos autos da ação penal que, por esse douto Juízo e afeta secretaria, lhes intenta promover o Ministério Público Federal por suposta realização da conduta abstrata versada no preceito primário do art. 317, caput e § 1º, c/c art. 327, § 2º, todos do Código Penal (por nove vezes), e, em continuidade delitiva, no art. 1º c/c o art. 1º, § 4º, da Lei nº 9.613/98 (por noventa e três vezes) e, também no art. 1º c/c o art. 1º, §4º, da Lei nº 9.613/98 (por uma vez), para o Primeiro Defendente e no art. 1º c/c o art. 1º, § 4º, da Lei nº 9.613/98 (por uma vez) à Segunda Defendente, inobstante não reconhecerem a competência e a imparcialidade de Vossa Excelência para processar e julgar o presente feito, vêm, por seus advogados que abaixo subscrevem (Doc. 01), com o devido respeito, à presença de Vossa Excelência para, estando em termos e no prazo da lei, oferecer, tempestivamente, sua RESPOSTA À ACUSAÇÃO o que fazem com supedâneo nos artigos 396 e 396A do Código de Processo Penal e nos demais normativos de regência, tudo pelas razões de fato e direito a seguir expostas. 1 STF, Ministro Marco Aurélio, HC 83.515.

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA 13ª VARA

FEDERAL CRIMINAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DE CURITIBA-PR.

"Sendo o direito uma ciência, o meio justifica o fim, e não o fim, o meio. Abandono por completo as ideias maquiavélicas e, pouco importando - porque há de se pagar um preço por se viver em um Estado Democrático de Direito e esse preço é o respeito irrestrito à ordem jurídica, principalmente à ordem jurídica constitucional (...)"1 Ação Penal nº 5063130-17.2016.4.04.7000

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA (“Primeiro Defendente”) e

MARISA LETÍCIA LULA DA SILVA (“Segunda Defendente”), qualificados,

respectivamente, nos eventos 10 e 11 dos autos da ação penal que, por esse douto Juízo

e afeta secretaria, lhes intenta promover o Ministério Público Federal por suposta

realização da conduta abstrata versada no preceito primário do art. 317, caput e § 1º, c/c

art. 327, § 2º, todos do Código Penal (por nove vezes), e, em continuidade delitiva, no

art. 1º c/c o art. 1º, § 4º, da Lei nº 9.613/98 (por noventa e três vezes) e, também no art.

1º c/c o art. 1º, §4º, da Lei nº 9.613/98 (por uma vez), para o Primeiro Defendente e no

art. 1º c/c o art. 1º, § 4º, da Lei nº 9.613/98 (por uma vez) à Segunda Defendente,

inobstante não reconhecerem a competência e a imparcialidade de Vossa Excelência

para processar e julgar o presente feito, vêm, por seus advogados que abaixo

subscrevem (Doc. 01), com o devido respeito, à presença de Vossa Excelência para,

estando em termos e no prazo da lei, oferecer, tempestivamente, sua

RESPOSTA À ACUSAÇÃO

o que fazem com supedâneo nos artigos 396 e 396­A do Código

de Processo Penal e nos demais normativos de regência, tudo pelas razões de fato e

direito a seguir expostas. 1 STF, Ministro Marco Aurélio, HC 83.515.

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– I – SÍNTESE DO PROCESSADO

A Polícia Federal instaurou, em 15.03.2016, dois procedimentos

investigatórios (Inquérito 290/2016 e 1034/2016) a fim de apurar possível cometimento

do delito de lavagem de capitais (Artigo 1º da Lei 9.613/98), tendo como objeto dois

imóveis.

Os inquéritos mencionados tramitaram de forma oculta, sem o

conhecimento da defesa, até o dia 29.11.2016, data que a autoridade policial expediu

ofício requerendo esclarecimentos do Primeiro Defendente. Logo após, em

14.12.2016, foi oferecida denúncia pelo Ministério Público Federal.

Com base nas investigações da Operação Lava­Jato, aduz o

Parquet que o Primeiro Defendente, ex­Presidente da República, teria participado

conscientemente da empreitada criminosa que forjava as licitações da Petrobras por

meio de pagamentos de propinas dirigido a agentes políticos e seus respectivos partidos.

Nessa esteira, os atos que justificariam o papel central do

Primeiro Defendente no esquema delituoso foram assim descritos:

"a) No período em que estruturados os crimes em detrimento da Petrobrás, cabia a LULA prover os altos cargos da Administração Pública Federal. Por meio do Decreto nº 4.734/2003, o ex-Presidente da República delegou parte desses poderes a JOSÉ DIRCEU, seu 'braço direito'; b) para angariar o apoio de partidos que não compunham a base de seu Governo, LULA indicou nomes ligados ao PMBD e ao PP para ocupar altos cargos da Administração Pública Federal, assim agindo em relação às mais importantes diretorias da Petrobras; c) O 'Mensalão', esquema criminoso de compra de apoio político por meio de recursos ilícitos, levou à condenação de integrantes do PT com os quais LULA manteve contato por anos dentro do partido e que ocuparam cargos de relevância na sua campanha presidencial e no seu Governo. Além disso, foram condenados por corrupção líderes dos partidos que o apoiavam; d) Diversos cargos de corrupção semelhantes aos revelados no 'Mensalão' e na 'Lava Jato', notadamente envolvendo a ELETRONUCLEAR, A CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, o MINISTÉRIO DA SAÚDE e o MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO, desenvolveram-se no âmbito da alta cúpula do Poder Executivo Federal, e seus benefícios convergiram, direta e indiretamente, ao vértice comum de todos eles, no qual se encontrava LULA; e) o viés partidário dos esquemas criminosos esteve assentado na formação e manutenção da base aliada do Governo LULA, com a negociação do apoio do

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PMDB e PP, especialmente, envolvendo a distribuição de cargos da alta Administração Pública Federal que visavam arrecadar propinas destinadas a agentes e partidos políticos; f) O quadro de corrupção sistêmica aprofundou-se mesmo após a saída de JOSÉ DIRCEU do cargo de Ministro-Chefe da Casa Civil, perdurando durante todo o Governo LULA e mesmo após seu encerramento; g) LULA recebeu da ODEBRECHT, direta e indiretamente, mediante deduções do sistema de caixa geral de propinas do Partido dos Trabalhadores, vantagens indevidas durante e após o término de seu mandato presidencial; h) LULA agiu para a instituição e a manutenção do esquema criminoso, além de ter sido o agente que dele mais se beneficiou: (i) Fortaleceu-se politicamente, de forma ilícita, ampliando e mantendo a base aliada no poder federal. (ii) ampliou indevidamente a sustentação econômica de seu grupo político, garantindo vitória nas eleições seguintes, beneficiando, ainda, campanhas eleitorais de outros candidatos de sua agremiação; (iii) auferiu para si vantagens financeiras, conforme será visto no capítulo IV.2 e V desta exordial; i) LULA atuou diretamente na nomeação e na manutenção de PAULO ROBERTO COSTA, RENATO DUQUE, NESTOR CERVERÓ e JORGE ZELADA nas Diretorias de Abastecimento, Serviços e Internacional da Petrobrás, com ciência acerca do uso dos cargos para a arrecadação, junto a empresários com contratos públicos, de propinas para distribuição a agentes e partidos políticos; j) LULA atuou diretamente para que NESTOR CERVERÓ fosse nomeado Diretor Financeiro da BR DISTRIBUIDORA, após este ser substituído por JORGE ZELADA na Diretoria Internacional da Petrobrás, em reconhecimento por ter angariado nessa Diretoria vantagens ilícitas de grande valia para o Partido dos Trabalhadores.”

Nesse contexto, a denúncia do Ministério Público Federal acusa

Luiz Inácio Lula da Silva, aqui Primeiro Defendente, pela prática do crime de

corrupção passiva qualificada e lavagem de dinheiro; bem como Marisa Letícia Lula da

Silva, ora Segunda Defendente, pela prática do crime de lavagem de dinheiro, nos

seguintes termos:

(i) o Primeiro Defendente é acusado de corrupção passiva qualificada,

por 8 vezes, em concurso material (art. 317, caput e §1º, c/c art. 327, §2º,

do CP), entre o início do ano de 2010 e 24.11.2010, por ter solicitado e

aceitado de Marcelo Odebrecht promessa de vantagem indevida

consistente em um imóvel para a instalação do Instituto Lula

(R$12.422.000,00);

(ii) o Primeiro Defendente é acusado do cometimento do delito de

lavagem de dinheiro majorada, por 93 vezes (art. 1º c/c art. 1º, §4º, da Lei

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9.613/98), entre o início de 2010 e 30.05.2014, em concurso e unidade de

desígnios com Antonio Palocci, Branislav Kontic, Marcelo Bahia

Odebrecht, Paulo Melo, Demerval Gusmão, Glaucos da Costamarques e

Roberto Teixeira, porque, supostamente, teriam dissimulado e ocultado a

origem, a movimentação, a disposição e a propriedade de R$

12.422.000,00 provenientes dos crimes de organização criminosa, cartel,

fraude à licitação e corrupção praticados pelos executivos do Grupo

Odebrecht em detrimento da Petrobras, por meio da aquisição, em favor

do Primeiro Defendente, mediante sucessivas transações concebidas

com o auxílio de Roberto Teixeira, com a interposição de Glaucos da

Costamarques e da empresa DAG Construtora Ltda., do imóvel

localizado na Rua Dr. Haberbeck Brandão, n.º 178, São Paulo/SP, com

vistas à instalação da sede de espaço institucional em que o Primeiro

Defendente armazenaria e exporia os presentes e demais itens recebidos

durante seus mandatos presidenciais, bem como desempenharia suas

atividades após deixar a Presidência da República.

(iii) Ambos os Defendentes são acusados da prática do crime de lavagem

de dinheiro majorada, por uma vez, conforme previsto no art. 1º c/c o art.

1º §4º, da Lei nº 9.613/98, pois segundo o Parquet, o Primeiro, em

concurso e unidade de desígnios com Glaucos da Costamarques, Roberto

Teixeira e a Segunda Defendente, pelo menos desde 11 de agosto de

2010 até a data da denúncia, teriam dissimulado e ocultado a origem, a

movimentação, a disposição e a propriedade de R$ 504.000,00

provenientes dos crimes de organização criminosa, cartel, fraude à

licitação e corrupção praticados pelos executivos do Grupo Odebrecht,

em detrimento da Petrobras, da aquisição em favor dos aqui

Defendentes, do apartamento localizado na Avenida Francisco Prestes

Maia, nº 1501, em São Bernardo/SP, assim como pela manutenção em

nome de Glaucos da Costamarques do referido apartamento.

A denúncia em questão foi recebida em 16.12.2016, sustentando o

MM. Juízo o seguinte:

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(i) Em relação ao imóvel da Dr. Haberbeck Brandão, n.º 178, São Paulo/SP, haveria indícios de sua destinação para sede do Instituto Lula, em razão de ter sido objeto de reuniões e comunicações entre os também denunciados Antônio Palocci, Marcelo Bahia Odebrecht, Brasilav Kontic e Roberto Teixeira. Ademais, foram encontrados documentos referentes a este imóvel no sítio de Atibaia, o qual seria utilizado pelo ex-Presidente, e as planilhas retratariam pagamentos ilícitos para aquisição do imóvel em questão. (ii) Quanto ao imóvel da Av. Francisco Prestes Maia, nº 1.501, em São Bernardo do Campo, sustenta o juízo que Glauco da Costamarques não tomou providências para registrá-lo em seu nome. Ademais, nos procedimentos investigatórios, não foram identificados, registros de recebimento dos aluguéis por Glauco da Costamarques. Sustentou ainda que os depoimentos prestados por Glauco da Costamarques foram divergentes.

Não há respaldo mínimo que possa lastrear as acusações

lançadas pelo órgão acusador. De fato, o processo em questão constitui apenas

mero formalismo, com o exclusivo objetivo de disfarçar, em trajes de processo

criminal, a perseguição política em face do Primeiro Defendente, conforme será

abaixo exposto.

– II – O PROCESSO PENAL USADO COMO ARMA DE GUERRA CONTRA O INIMIGO: LAWFARE

II.1 – ACUSAÇÕES FRÍVOLAS

Lawfare é o termo utilizado para se conceituar o condenável

expediente autoritário consubstanciado no uso do Direito e dos procedimentos

jurídicos como instrumentos e armas de guerra ou, ainda, como meio de atingir

resultados políticos e até econômicos, em qualquer nível de interação social.

Presentemente, entre outros, usam esse método os Estados Unidos da América para

complementar a arrecadação do Tesouro americano (erodido por tantas guerras

patrocinadas no Planeta e outros projetos globais de hegemonia, levando à exaustão o

contribuinte que a tudo provê), impondo (inclusive através de plea bargaining) na

Justiça penal galácticas sanções pecuniárias a pessoas – físicas e jurídicas – máxime as

estrangeiras.

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“Law is becoming an incresingly powerful and prevalent weapon

of war”2 (“A lei está se tornando, gradativamente, uma poderosa e prevalente arma de

guerra” – em tradução livre), define ORDE F. KITTRIE3, autoridade mundial em lawfare.

SUSAN TIEFENBRUN, outrossim, afirma que “Lawfare is a weapon designed to destroy

the enemy by using, misusing, and abusing the legal system and the media in order to

raise public outcry against the enemy” (“Lawfare é uma arma destinada a destruir o

inimigo, utilizando, mal utilizando, e abusando do sistema legal e da mídia, em vistas

de conseguir o clamor público contra o inimigo” – em tradução livre).

As estratégias lawfare ordinariamente envolvem também

manipulação da opinião pública através da mídia, visando (além do apoio coletivo) ao

prejuízo moral – ou à eliminação conceitual – de um oponente, como elemento de

legitimação da violência por meio (enforcement) da lei ou de procedimentos legais.

O caso presente é exemplo acabado desse perfil, ajustando­se com

perfeita adequação ao seu modelo conceitual.

Parte dos agentes públicos envolvidos na Operação Lava Jato

abriu uma verdadeira — e notória — guerra contra o Primeiro Defendente e contra o

projeto político que ele representa para o País e passou a se utilizar da persecução penal

extra judicium e, agora, do procedimento penal in judicium, para combatê­lo e, mais que

isso, eliminá­lo da vida pública.

A leitura da denúncia assim o demonstra; nela, buscou­se fazer

uma tosca releitura da História recente do País, com narratio facti totalmente

comprometida por uma deturpada ideologia, divorciada da realidade, que chega a

desafiar até mesmo a coisa julgada, ou seja, quer rever — como argumento suasório —

feito já definitivamente julgado pela mais alta Corte do País, qual seja, a AP 470/STF (o

chamado “Mensalão”).

2 KITTRIE, Orde F. Lawfare: Law as a weapon of war. Oxford University Press, p. 1. 3 Semiotic Denifition of Lawfare.

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Nessa senda, a vestibular acusatória apresenta­se repleta de

acusações vagas, indefinidas, intangíveis, e de especulações genéricas, sem lastro em

elementos indiciário­probatórios mínimos. Conforme se demonstrará, são imputações

frívolas, que desafiam a lógica e o próprio Direito.

Mas isso é de somenos na Denúncia; o que conta para a sanha

persecutória é o aparelhamento da acusação e um mecanismo processual para fazer

processá­la, seguindo, é claro, a lógica do lawfare.

Nesse desígnio, a lei e o processo servem apenas para salvar as

aparências, para conferir o make up legalista ao arbítrio praticado sem peias. O

resultado a advir é previamente conhecido e foi pré­estabelecido pelos agentes do

Estado envolvidos nessa conflagração paramilitar. Basta ver que os órgãos de imprensa

que se alinham nas fileiras da infantaria desse front já anunciam, sem qualquer recato ou

cerimônia, o fatal desfecho, louvados nas ininterruptas interlocuções que mantêm com

suas “fontes” secretas.

Na presente denúncia, o mesmo subterfúgio fora utilizado: boa

parte da exordial se ocupa de narrar – sob a ótica do Ministério Público Federal e sem

qualquer verossimilhança e respaldo probatório – todo o período em que o Primeiro

Defendente ocupou o cargo de Presidente da República, atribuindo­lhe o comando de

um gigantesco esquema de corrupção incrustado na principal estatal do país.

Não faltaram expressões muito próprias da ambiência castrense

como “comandante”, "controle supremo desempenhado por Lula" ou que "para se

eleger ao cargo de Presidente da República e garantir maioria parlamentar, LULA

formulou um arranjo partidário que marcou a estrutura administrativa federal e que

culminou em um esquema voltado à corrupção, fraude a licitações e lavagem de

dinheiro", dentre outras, tudo, insista­se, na lógica da guerra e do lawfare.

E o pior: grande parte da denúncia trata da existência de uma

suposta organização criminosa que não corresponde à pretensão punitiva deduzida na

peça acusatória que agora se criva. Mesmo porque esses fatos estão sob investigação

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conduzida pelo Procurador Geral da República, na esfera do Supremo Tribunal

Federal.

Muito tempo faz que a tarefa alcunhada Lava Jato já elegeu seu

inimigo: Lula. Para destruí­lo, os agentes nela envolvidos não medem esforços nem se

importam com os limites das garantias; perpetram os mais diversos acintes, negam a lei

e a liturgia procedimental. Em suma, desafiam o Estado Democrático de Direito

brasileiro. As páginas e as denúncias de arbítrios contidos nestes autos não ficam

registrados apenas para a jurisdição, mas, seguramente, para a História, que será visitada

pelas gerações futuras.

O Primeiro Defendente, ex­Presidente da República Federativa

do Brasil, foi submetido por essa “Operação” às mais inomináveis truculências, tais

como: (i) privação de liberdade por meio de “condução coercitiva” que não tem

previsão legal; (ii) interceptação de terminais telefônicos de seu uso, de seus familiares

e colaboradores; (iii) interceptação ilícita dos terminais telefônicos de seus advogados

— além da linha celular de um deles, houve a interceptação do principal ramal de um

dos escritórios que atuam em sua defesa, com monitoramento de diálogos profissionais

de 25 advogados de seus quadros; (iv) divulgação de suas interlocuções privadas, até

mesmo aquelas envolvendo cliente e defensor; (v) buscas e apreensões em sua

residência, de seus filhos e colaboradores; (vi) acusações e assacadilhas levadas a efeito

perante o Supremo Tribunal Federal — oficializando a figura do juiz-acusador,

antítese perfeita da justiça serena, imparcial e equidistante.

Ah, mas agora temos mais uma ação penal que a tudo legitima,

que cobre as perseguições com o aparente manto da legalidade do devido processo

legal, poder­se­ia dizer.

Cabe denunciar, porém, que não se está diante de um processo

penal legítimo e que observa as garantias do due process of law.

O que existe nos autos, pede­se vênia para sublinhar, é uma

tentativa de legitimar, por meio de um processo judicial artificial, uma perseguição

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desenfreada, verdadeira guerra decretada por agentes da autoridade estatal, com apoio

de setores da mídia tradicional, contra o Primeiro Defendente.

Estudo científico aqui anexado (Doc. 02) mostra, com hialina

clareza, que certos setores da imprensa, para dar sustentação às arbitrariedades da

Operação Lava­Jato desencadeadas contra o Primeiro Defendente, estão dedicando

parte substancial do espaço físico das suas respectivas publicações para lhe enxovalhar a

honra e a reputação. Somente no período entre janeiro e agosto de 2016, por exemplo, o

noticiário Jornal Nacional, da Rede Globo de Televisão, dedicou cerca de treze (13)

horas para veicular reportagens negativas, atacando­o — ou seja, cerca de onze por

cento ( 11%) de toda aquela programação.

Por isso que necessário, nesse contexto e desde logo — sem

prejuízo do enfrentamento específico de cada imputação lançada na peça vestibular —,

esclarecer que:

(a) o Primeiro Defendente jamais comandou ou participou de um

“esquema delituoso de desvio de recursos públicos destinados a

enriquecer ilicitamente, bem como visando à perpetuação criminosa no

poder, a comprar apoio parlamentar e a financiar caras campanhas

eleitorais”; não há qualquer prova indiciária que permita afirmação desse

jaez, mas o que há é apenas a descompromissada “convicção” dos

subscritores da peça acusatória — que confessam formar uma “equipe”,

um “time”, de que faz parte e a integra quem deveria exercer em nome do

Estado o controle de legalidade de todos os atos relativos às apurações4;

(b) jamais teve conhecimento de qualquer esquema de corrupção

instalado na Petrobras, assim como não o tiveram qualquer Órgão de

controle interno ou externo (inclusive as empresas de auditoria), a CGU,

4 O Procurador da República Deltan Dallagnol, um dos subscritores da Denúncia, afirmou em entrevista concedida à Rádio Bandeirantes, em julho, que ele e o juiz da 13ª. Vara Federal Criminal do Paraná são “símbolos de um time” (Disponível em: <http://terceirotempo.bol.uol.com.br/noticias/um­dos­responsa­veis­pela­a­operaa­a­o­lava­jatoa­deltan­dallagnol­participa­do­a­domingo­esportivoa> Acesso em: out. 2016).

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o TCU, a Polícia Federal e o Ministério Público — tanto assim que

jamais produziram qualquer relatório ou acusação a respeito; a propósito,

oportuno lembrar que, desde 2006, este Juízo monitora o “doleiro”

Alberto Youssef e até 2014 não tomou – ao que se saiba – qualquer

providência quanto ao suposto esquema ilícito no âmbito da Petrobras

por ele regido, possivelmente por desconhecê­lo (o esquema) a despeito

de todos os instrumentos invasivos postos à sua disposição;

(c) não lhe cabia, enquanto Presidente da República, nomear qualquer

diretor ou gerente da Petrobras; esses atos competiam ao Conselho de

Administração da Companhia, conforme dispõem seus Estatutos;

(d) não “negociou” ou “distribuiu” cargos no governo federal; como

ocorre em qualquer governo de coalização, aconteciam indicações dos

partidos da base, as quais eram discutidas nos escalões responsáveis pela

articulação política e, finalmente, encaminhadas à Casa Civil apenas para

eventuais providências relativas à nomeação quando essa era de

competência da Presidência da República e com a observância de todos

os procedimentos e verificações previstos em lei;

(e) não determinou atos para a “manutenção” de qualquer diretor da

Petrobras, uma vez que essa situação deveria ser avaliada pelo Conselho

de Administração da Companhia, nos termos do seu Estatuto;

(f) não participou da reunião indicada na página 111 da denúncia ou de

qualquer outra com o mesmo objetivo;

(g) inexiste qualquer elemento concreto que possa revelar a existência de

um “caixa geral de propinas” no Partido dos Trabalhadores para um

projeto de “perpetuação criminosa no poder” e muito menos ciência,

participação ou benefício pessoal do Primeiro Defendente;

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(h) não é o Primeiro Defendente “próximo” de qualquer empresa; seu

governo realizou 84 missões empresariais exteriores e nunca privilegiou

qualquer empresa ou setor;

(i) ainda, são os Defendentes locatários do apartamento situado na

Avenida Francisco Prestes Maia, 1501, apartamento 121, conforme o

contrato de locação firmado entre Glaucos da Costamarques e a Segunda

Defendente. Não há qualquer lastro em atribuir uma oculta propriedade

do imóvel aos Defendentes;

(j) Já quanto ao imóvel localizado na Rua Dr. Haberbeck Brandão, nº

178, oportuno salientar que o Primeiro Defendente esteve presente uma

única vez no imóvel juntamente com membros da diretoria do Instituto

Cidadania5, ocasião em que decidiu recusar a compra do imóvel. O que

ocorreu com o imóvel após tal data não resguarda qualquer relação com

os Defendentes;

(j) Nessa esteira, não há qualquer fundamento fático/probatório para

atribuir a destinação ou oculta propriedade dos dois imóveis ­ de alegada

origem ilícita ­ aos Defendentes, ao certo que nem mesmo a denúncia

logrou apontar uma só conduta por ele praticada em relação a esse tema;

logo, não pode ele ser responsabilizado criminalmente ao fundamento de

que seria o proprietário oculto dos imóveis, pois isso configura

responsabilidade penal objetiva, estranha ao Direito Penal.

As acusações, portanto, não têm suporte em base real. São

frívolas. Foram construídas, pede­se vênia para repetir, sobre “convicções” fervorosas

daqueles que o elegeram como inimigo em um cenário de guerra, com o claro desígnio

de eliminá-lo, bem como tudo que ele representa, sob o dossel da aparente legitimação

conferida pela persecução penal em juízo. O fim ilegítimo é fazê-lo desaparecer do

5 Nesse sentido, é imperioso salientar que o Primeiro Defendente não é – e jamais foi – proprietário do Instituto Lula.

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processo político brasileiro — objetivo que jamais seria alcançado pela via

democrática do sufrágio popular.

É esse o contexto em que a denúncia se insere e deve ser

analisada.

Mas não é só.

Parte substancial da denúncia tratou da existência de uma suposta

“organização criminosa”, que sequer tem correspondência com os pedidos formulados.

Sem prejuízo, pede­se vênia, desde logo, antes mesmo das preliminares, para enfrentar

esse fictício enredo ponto a ponto.

II.2 – ANÁLISE CRÍTICA SOBRE A “ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA”

Utilizando­se dos mesmos moldes da denúncia anteriormente

ofertada em face dos Defendentes6 perante este Juízo, o Ministério Público Federal

narrou fatos e fez acusações que, além de não possuírem relação com os crimes

imputados e prescindirem de qualquer lastro probatório, se encontram sob a

competência do Supremo Tribunal Federal.

O procedimento que tramita perante a Suprema Corte é de

titularidade exclusiva do Procurador­Geral da República e ainda se encontra em fase

investigatória.7

Indaga­se, então: Como os ilustres Procuradores da "Lava­Jato"

acusam – com toda veemência e "convicção" – o que ainda é investigado pelo seu chefe

máximo e, cuja eventual procedência será futuramente analisada pelo Supremo Tribunal

Federal? Como a “convicção” dos subscritores de tal denúncia pode afirmar o que ainda

é apurado pela instância superior?

6 Ação Penal 5046512­94.2016.4.04.7000/PR. 7 Supremo Tribunal Federal, Inq. 3989, Relator: Ministro Teori Zavascki.

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No que tange às acusações inerentes ao comando da organização

criminosa – descabidas e fora da alçada de competência dos Procuradores da “Lava

Jato” – críticas não faltaram. O Eminente Ministro da Suprema Corte — o saudoso

Teori Zavascki, então relator de todos os procedimentos referentes à “Lava Jato”

perante aquela Corte, assim se manifestou:

“Mas foi também requerida e aberta, aqui no Supremo Tribunal Federal, uma investigação a respeito desse ‘esquema’ em seu conteúdo mais abrangente. É o inquérito n. 3989, em que se investiga crime de quadrilha, corrupção passiva, lavagem de ativos financeiros, e que envolve não apenas pessoas com prerrogativa de foro, como também pessoas sem prerrogativas de foro [...] Essa investigação, com a devida vênia, não foi delegada a qualquer outro juízo. Não existe investigação com essa abrangência em outro juízo. Se houver ou se tiver sendo feito em outro juízo esse exame abrangente, certamente haverá problema de competência, porque se estará usurpando uma competência do Supremo Tribunal Federal”.8 ­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­

“[...] Lá em Curitiba, se deu notícias sobre organização criminosa, colocando o presidente Lula como líder da organização criminosa, dando a impressão, sim, de que se estaria investigando essa organização criminosa, mas o objeto da denúncia não foi nada disso. Essa espetacularização do episódio não é compatível nem como objeto da denúncia nem com a seriedade que se exige na operação desses fatos”.9

Mas não é só.

Os Procuradores que ofertaram a presente denúncia atribuem o

comando do "Mensalão" ao Primeiro Defendente, a despeito do referido episódio e a

sua suposta participação terem sido descartados pela CPMI dos Correios e pela

Procuradoria­Geral da República e posteriormente pela nossa mais alta Corte. Todavia,

a "convicção" dos Membros do Ministério Público de Curitiba parece ter maior valia em

detrimento de decisão definitiva do Pretório Excelso.

Interessante rememorar neste ponto que o então Procurador Geral

da República ANTÔNIO FERNANDO DE SOUZA, à época acusador máximo no caso

8 Voto do Ministro Teori Zavascki na Questão de Ordem no Inq. 4130 perante o Supremo Tribunal Federal. 9 Manifestação do Ministro Teori Zavascki no julgamento do AgRg na Rcl 25.048. As críticas do Eminente Ministro também se referiram ao comportamento dos Procuradores da “Lava Jato” na indevida publicação e nas descabidas imputações feitas ao Primeiro Defendente na ação penal 5046512­94.2016.4.04.7000.

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“Mensalão”, afirmou em entrevista que concedeu à imprensa, o seguinte:10

“Em toda a denúncia, se teve o cuidado de que cada imputação a cada uma das pessoas fosse firmada em provas existentes nos autos. Sempre que há referência a um fato, há um pé de página com documento, um laudo específico, laudo e testemunhos. Não havia, durante o período em que eu era procurador-geral, nenhum depoimento que atestasse participação de Lula no esquema. E mesmo o depoimento do Roberto Jefferson era no sentido contrário. Não tínhamos nenhum depoimento contando a participação do presidente Lula no episódio. A denúncia está lastreada naquelas pessoas que realmente atuaram nesse episódio. Não havia provas, eu não podia inventar. Aquele não é um processo político, é um processo judicial. O Ministério Público tem responsabilidade não somente de afirmar, mas também de provar. Se eu desejava fazer uma denúncia consistente e não uma denúncia de natureza política, não um ato político, evidentemente que só poderia fazer imputações a pessoas citadas naquele episódio. Não havia indício contra o ex-presidente Lula. Eu vi o advogado do Roberto Jefferson, e ele deve ter falado em nome próprio ao afirmar que Lula é o mandatário do mensalão porque o próprio Jefferson nunca disse isso. A denúncia não se faz pelo que a gente pensa que a pessoa pode ter feito ou não. A gente só pode fazer a denúncia constatando que há elementos que me permitem confirmar que o que eu estou afirmando é verdadeiro." (destacou­se)

Acaso pretendem rever a decisão do Pretório Excelso?

De outro vértice, estariam os subscritores da denúncia atribuindo

ao ex­Procurador Geral da República conduta prevaricadora? Inadmissível!

Para a Acusação, não há mesmo limites!

Fala­se na existência de um esquema criminoso para “garantir a

governabilidade” entre 2003 a 2010. Segundo a peça vestibular, foi necessário

“comprar apoio parlamentar” — logrando­se que 15 partidos figurassem na base do

governo. Essa “compra” teria permitido o aumento de Deputados Federais que

apoiavam o governo — de 254 para 376 ou cerca de 73% da Câmara Federal.

Indaga­se: quem seriam os deputados “comprados”?

Personagens sem rosto e sem nome? Mas seriam membros do Congresso Nacional!

Uma parcela majoritária (73% da Câmara dos Deputados) entre 2003 e 2010 era

10Disponível em <http://g1.globo.com/politica/mensalao/noticia/2012/08/processar­lula­seria­ato­politico­diz­procurador­que­denunciou­mensalao.html> Acesso em dez. 2016.

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formada por corruptos? Convém, então, apontar e, sobretudo, individualizar. Quais os

elementos concretos que estariam a indicar para essa gravíssima acusação? Só

“convicções”?

Como atribuir o mínimo de credibilidade a tal acusação,

considerando que a alegada origem dos atos ilícitos imputados ao Primeiro Defendente

foi descartada definitivamente pelo Supremo Tribunal Federal e, no que concerne a

participação – e, portanto, o seu papel de comando – no suposto conluio criminoso que

vilipendiou a Petrobras ainda se encontra em fase investigatória conduzida pelo

Procurador­Geral da República?

Os atos imputados pelo Órgão acusador – que caracterizariam a

participação central do Primeiro Defendente no cenário criminoso – não encontram

elementos que o corroborem. Válido apontar:

­ A indicação dos diretores da Petrobrás ocorria através de seu Conselho

de Administração e sua nomeação e posse após criteriosa análise de

órgãos internos e externos à empresa, como, por exemplo, o Gabinete de

Segurança Institucional e o Ministério da Casa Civil. Tais escolhas não

tinham a interferência do Presidente da República. Ademais, era

imprescindível que o indicado possuísse além de capacidade técnica,

lisura ética e profissional para assunção do cargo;

­ Os diretores mencionados na denúncia já trabalhavam na Petrobras há

muitos anos, ocupando anteriormente cargos de direção e gerência, o que

atesta sua aptidão técnica e profissional para ocupar tal ofício de direção;

­ Paulo Roberto Costa e Nestor Cerveró negaram qualquer conversa ou

participação do ex­presidente Luiz Inácio Lula da Silva11 no afirmado

11 Depoimento nos autos da ação penal 5046512­94.2016.4.04.7000/PR. Na mesma oportunidade, Paulo Roberto Costa também desmentiu em seu depoimento na ação penal que o ex­presidente Lula o chamava por "Paulinho", alcunha que segundo o depoente, só recebia de sua família.

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esquema criminoso. Renato Duque exerceu o seu direito constitucional

ao silêncio em todas as ações penais em seu desfavor12.

­ O ex­deputado Pedro Corrêa, arrolado como testemunha pelo Parquet

mesmo após sofrer condenação na Ação Penal 470 e por este Juízo —

teve seu acordo de colaboração premiada rejeitado pelo Eminente

Ministro Teori Zavascki, que considerou que suas informações não

apresentaram provas e nem mesmo indícios mínimos de veracidade das

acusações13. Curiosamente, o ex­parlamentar aceitou antecipar seu

depoimento para que este fosse utilizado em denúncia oferecida e

posteriormente aceita por este Juízo contra os Defendentes14.

­ Em depoimento prestado perante este Juízo15, Pedro Corrêa admitiu ter

sido informado antecipadamente da existência de denúncia contra o ex­

Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da sua convocação para ser ouvido

como testemunha, razão pela qual teria sido chamado para complementar

suas declarações em relação ao Primeiro Defendente.

­ Delcídio do Amaral também informou que nunca tratou do recebimento

de valores indevidos com o Primeiro Defendente16.

­ Alberto Youssef e Fernando Soares, tidos como os maiores operadores

do esquema delituoso, também negaram qualquer envolvimento do

Primeiro Defendente com o recebimento de valores espúrios.

12 Ações Penais 501233104.2015.4.04.7000/PR, 504524184.2015.4.04.7000/PR e 5036528­23.2015.4.04.7000/PR. Outrossim, em depoimento prestado ao Ministério Público Federal em 17.11.2014, Renato Duque esclareceu que todos os diretores da estatal são indicados pelo conselho de administração. Ressalta-se que o próprio documento (Anexo 109) juntado pelo órgão acusador desmente sua tese. Demonstra-se: "Que indagado sobre quem o indiciou para o cargo de diretor da Área de Serviços da PETROBRÁS, afirma que todos os Diretores da PETROBRÁS são indicados pelo CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO da companhia; QUE não se recorda dos nomes dos membros do conselho que indicou o declarante à época (...)". 13 http://oglobo.globo.com/brasil/ministro­do­stf­devolve­acordo­de­delacao­de­pedro­correa­20364775 14 Depoimento de Pedro Côrrea na Ação penal 5046512­94.2016.4.04.7000/PR 15 Idem. 16 Depoimento de Delcídio do Amaral nos autos da ação penal nº 5046512­94.2016.4.04.7000.

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A verdade é que as 27 testemunhas de acusação arroladas pelo

Ministério Público Federal em outra ação – dita – conexa, inclusive os próprios

delatores citados na denúncia que deflagrou esta ação penal, negaram

peremptoriamente as imputações feitas aos Defendentes.

Conclui­se, então, que a tese acusatória utiliza­se de “fatos”: (i)

dos quais não possui provas; (ii) que foram decididos de forma definitiva pela Suprema

Corte, contrariamente à sua convicção; (iii) que se encontram sob atribuição do

Supremo Tribunal Federal; e (iv) que foram cabalmente desmentidos pelas testemunhas

acusatórias, inclusive durante a instrução da ação penal 5046512­94.2016.4.04.7000.

Todavia, se o entendimento do Juízo nestes autos for idêntico ao

da ação penal 5046512­94.2016.4.04.7000, tudo é válido, já que constitui parte do

"contexto", que aparentemente possui maior significado que todas as normas legais e os

princípios constitucionais inerentes.

– III – PRELIMINARES

III.1 DA NULIDADE DO PROCEDIMENTO INVESTIGATÓRIO - SUA CONDUÇÃO POR

AUTORIDADES SUSPEITAS E TEMERÁRIO DESRESPEITO ÀS GARANTIAS FUNDAMENTAIS

DOS DEFENDENTES

Os inquéritos que originaram a acusação ora debatida foram

instaurados no dia 15.03.2016. O IPL 290/2016 (5011592­94.2016.4.04.7000) se refere

ao apartamento nº 121, situado na Avenida Francisco Prestes Maia, 1501, São Bernardo

do Campo/SP. Já o IPL 1034/2016 (5034964­72.2016.4.04.7000) apurou possíveis atos

delituosos concernentes ao terreno situado na Rua Haberbeck Brandão 178, São

Paulo/SP.

Ambos os procedimentos tramitaram de forma oculta até o dia

29.11.2016, data em que a autoridade policial solicitou esclarecimentos do Primeiro

Defendente (doc. 03).

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O Primeiro Defendente peticionou naqueles autos requerendo

que o Delegado de Polícia Federal Márcio Anselmo se declarasse suspeito para

condução das investigações e que fossem delimitados os fatos a serem esclarecidos

através da formulação de quesitos (doc. 04).

O pedido de reconhecimento da suspeição da autoridade policial

foi motivado por manifestações públicas daquele delegado em sua página pessoal da

rede social “Facebook”, onde este manifestou todo o seu escárnio, desprezo e aversão

ao Primeiro Defendente, chamando­o de "anta", o que certamente atesta a sua

suspeição e, portanto, incapacidade de conduzir as investigações envolvendo o

Primeiro Defendente com isenção e impessoalidade17.

Contudo, a autoridade policial apresentou os quesitos

considerados pertinentes, omitindo-se em relação ao pedido de suspeição suscitado

pela Defesa. Concedeu, ainda, o exíguo prazo de 02 dias para os referidos

esclarecimentos, em total descompasso com os princípios constitucionais da

proporcionalidade e da ampla defesa (doc. 05).

Quem assinara o referido ofício? O delegado Felipe Hille Pace,

que é réu em ação de indenização promovida pelo Primeiro Defendente, em vista da

indevida – e leviana – menção ao seu nome em relatório final de inquérito cujo objeto

jamais resguardou qualquer relação com o Primeiro Defendente, inexistindo, portanto,

qualquer elemento probatório que pudesse atestar a indevida acusação.

O Primeiro Defendente, então, requereu dilação de prazo,

considerando a complexidade das informações requisitadas pela autoridade policial e

requerendo, à luz da norma procedimental penal18 e dos princípios da legalidade e da

impessoalidade, o reconhecimento por parte do Delegado Filipe Hille Pace da sua

17 Nesse sentido, ver: “Delegados da Lava­Jato exaltam Aécio e atacam PT na rede.” Disponível em: <http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,delegados­da­lava­jato­exaltam­aecio­e­atacam­pt­na­rede,1591953> Acesso em: jan. 2017. 18 Art. 107. Não se poderá opor suspeição às autoridades policiais nos atos do inquérito, mas deverão elas declarar-se suspeitas, quando ocorrer motivo legal.

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suspeição em face dos elementos demonstrados. Também requereu manifestação19 do

Delegado Márcio Anselmo acerca do pedido de suspeição a ele dirigido, considerada a

sua anterior omissão.

Ato contínuo, o Delegado de Polícia Federal Márcio Anselmo

prolatou despacho no dia 09.12 no qual rechaçou o pedido de suspeição e, ainda,

indeferiu o pleito de dilação de prazo sob a alegação de que os esclarecimentos

requeridos eram simples e que constavam em procedimento dos quais a Defesa tinha

plena ciência.

Demonstrando sua boa­fé, bem como interesse em elucidar

quaisquer dúvidas presentes na instrução, o Primeiro Defendente apresentou resposta

aos quesitos formulados no dia 09.12.2016 às 20:36 horas (sexta­feira). Contudo, no

primeiro dia útil subsequente – Segunda­feira, dia 12.12.2016, às 16:54 horas – foi

surpreendido com a notícia de que a autoridade policial havia relatado ambos os

procedimentos investigatórios em documento com 142 páginas.

Inevitável concluir que os esclarecimentos prestados pelos

investigados não passaram de mera falácia, sendo indiferente o conteúdo informado. O

direcionamento e a conclusão das investigações já estavam previamente definidos. O

objetivo dos procedimentos não era a impessoal elucidação dos fatos e sim a

criminalização do Primeiro Defendente.

Senão, como a autoridade policial conseguiria analisar os

esclarecimentos prestados pelos investigados e finalizar um extenso relatório de 142

laudas em menos de um dia útil?

Verifica­se, com hialina clareza, que os referidos procedimentos

investigatórios transcorreram à margem da norma constitucional, especialmente no

tocante aos princípios da dignidade da pessoa humana, impessoalidade,

imparcialidade, contraditório e da ampla defesa.

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Não se desconhece que durante a fase investigatória não se

entende pela incidência máxima do contraditório e da ampla defesa. Todavia, em

respeito à dignidade da pessoa humana e, considerando todos os efeitos de índole moral,

social e ética que incidem sobre aquele que recai a grave condição de investigado – o

que se denota ainda mais injurídico no caso em concreto, visto a execração pública em

face dos Defendentes –, deve ser propiciado ao investigado o exercício de garantias

constitucionais, com a exposição de sua versão dos fatos e também a oportunidade de

requerer diligências à autoridade policial20.

Sob a égide constitucional, é incabível o procedimento

tramitar ocultamente por mais de oito meses e ser concluído um dia depois do

investigado prestar seus esclarecimentos! Onde ocorrera o mínimo de respeito às

garantias fundamentais dos investigados? Como atribuir impessoalidade a tal

investigação?

A impossibilidade de exercer o direito de defesa, mesmo na fase

investigatória, constitui repugnante desrespeito ao Estatuto Constitucional e descabida

interpretação restritiva do artigo 5º, LV da Carta Magna21, o que não pode ser admitido.

O Supremo Tribunal Federal definira que o devido processo legal

e o direito de defesa abrangem toda espécie de procedimento, o que se comprova com

os julgados abaixo:

“CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. SUSPENSÃO DE BENEFÍCIO. PROCESSO ADMINISTRATIVO. DEVIDO PROCESSO LEGAL. ALEGADA OFENSA AO ART. 5º, XXXV,LIV e LV. OFENSA REFLEXA. I - A jurisprudência da Corte é no sentido de que a alegada violação ao art. 5º, XXXV, LIV e LV, da Constituição pode configurar, quando muito, situação de ofensa reflexa ao texto constitucional, por demandar a análise de legislação processual ordinária. Precedentes. II - Como tem consignado o Tribunal, o princípio do devido processo legal, de acordo com o texto constitucional, também se aplica aos procedimentos administrativos. Precedentes. III -

20 Artigo 14 do Código de Processo Penal: O ofendido, ou seu representante legal, e o indiciado poderão requerer qualquer diligência, que será realizada, ou não, a juízo da autoridade. 21 Art. 5.º, LV, Constituição Federal: aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;

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Agravo regimental improvido” (RE nº 552.057/MG-AgR, Relator: Ministro Ricardo Lewandowski, Primeira Turma, DJe de 5/6/09). ------------------------------------------------------------------------------------------------ “Agravo regimental em recurso extraordinário. 2. Restabelecimento de benefício previdenciário pelo Tribunal de origem, sob o fundamento de inobservância do contraditório e da ampla defesa quando do procedimento administrativo que o suspendera. Violação verificada. A garantia do direito de defesa contempla, no seu âmbito de proteção, todos os processos judiciais ou administrativos. Precedentes. 3. Agravo regimental a que se nega provimento” (RE nº 425.406/RN-AgR, Relator: Ministro Gilmar Mendes, Segunda Turma, DJe de 11/10/07).

Diversa não é a posição doutrinária. Nesse sentido é o brilhante

magistério de AURY LOPES JR22:

"É lugar-comum na doutrina a afirmação genérica e infundada de que não existe direito de defesa e contraditório no inquérito policial. Está errada a afirmação, pecando por reducionismo. Basta citar a possibilidade de o indiciado exercer no interrogatório policial sua autodefesa positiva (dando sua versão dos fatos); ou negativa (usando seu direito de silêncio). Também poderá fazer-se acompanhar de advogado (defesa técnica) que poderá intervir no final do interrogatório. Poderá, ainda, postular diligências e juntar documentos (art. 14 do CPP). Por fim, poderá exercer a defesa exógena, através do habeas corpus e do mandado de segurança(...) O ponto crucial nessa questão é o art. 5º, LV, da CB, que não pode ser objeto de leitura restritiva. A postura do legislador foi claramente protetora, e a confusão terminológica (falar em processo administrativo quando deveria ser procedimento) não pode servir de obstáculo para sua aplicação no inquérito policial, até porque o próprio legislador ordinário cometeu o mesmo erro ao tratar como 'Do Processo Comum', 'Do Processo Sumário', etc., quando na verdade queria dizer 'procedimento'. Tampouco pode ser alegado que o fato de mencionar acusados, e não indiciados, seja um impedimento para sua aplicação na investigação preliminar". (destacou­se)

Oportuno também mencionar a inegável conexão entre o

contraditório e o direito de defesa, conforme preciosa lição de ADA PELLEGRINI

GRINOVER23:

"Defesa e contraditório estão indissoluvelmente ligados, porquanto é do contraditório (visto em seu primeiro momento, da informação) que brota o exercício da defesa; mas é esta - como poder correlato ao de ação - que garante o contraditório. A defesa, assim, garante o contraditório, mas também por este se manifesta e é garantida. Eis a íntima relação e interação da defesa e do contraditório". (destacou­se)

22 LOPES JR, Aury, Direito Processual Penal, 12ª edição, 2015, p. 170. 23 PELLEGRINI GRINOVER, As Nulidades no Processo Penal, 2. ed. São Paulo, Malheiros, 1992, p. 63.

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A repulsa a direitos fundamentais de investigados já foi objeto de

debate no Supremo Tribunal Federal. Oportuno colacionar julgado com a inigualável

lavra do Ministro Decano Celso de Mello:

PERSECUÇÃO PENAL INSTAURADA EM JUÍZO OU FORA DELE. REGIME DE SIGILO. INOPONIBILIDADE AO ADVOGADO CONSTITUÍDO PELO INDICIADO OU PELO RÉU. DIREITO DE DEFESA. COMPREENSÃO GLOBAL DA FUNÇÃO DEFENSIVA. GARANTIA CONSTITUCIONAL. PRERROGATIVA PROFISSIONAL DO ADVOGADO (LEI Nº 8.906/94, ART. 7º, INCISOS XIII E XIV). OS ESTATUTOS DO PODER NÃO PODEM PRIVILEGIAR O MISTÉRIO NEM COMPROMETER, PELA UTILIZAÇÃO DO REGIME DE SIGILO, O EXERCÍCIO DE DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS POR PARTE DAQUELE QUE SOFRE INVESTIGAÇÃO PENAL OU ACUSAÇÃO CRIMINAL EM JUÍZO. CONSEQÜENTE ACESSO AOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS JÁ DOCUMENTADOS, PRODUZIDOS E FORMALMENTE INCORPORADOS AOS AUTOS DA PERSECUÇÃO PENAL (INQUÉRITO POLICIAL OU PROCESSO JUDICIAL). POSTULADO DA COMUNHÃO OU DA AQUISIÇÃO DA PROVA. PRECEDENTES (STF). DOUTRINA. MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA.- A pessoa que sofre persecução penal, em juízo ou fora dele, é sujeito de direitos e dispõe de garantias plenamente oponíveis ao poder do Estado (RTJ 168/896-897). A unilateralidade da investigação penal não autoriza que se desrespeitem as garantias básicas de que se acha investido, mesmo na fase pré-processual, aquele que sofre, por parte do Estado, atos de persecução criminal.- O sistema normativo brasileiro assegura, ao Advogado regularmente constituído pelo indiciado (ou por aquele submetido a atos de persecução estatal), o direito de pleno acesso aos autos de persecução penal, mesmo que sujeita, em juízo ou fora dele, a regime de sigilo (necessariamente excepcional), limitando-se, no entanto, tal prerrogativa jurídica, às provas já produzidas e formalmente incorporadas ao procedimento investigatório, excluídas, consequentemente, as informações e providências investigatórias ainda em curso de execução e, por isso mesmo, não documentadas no próprio inquérito ou processo judicial. (...) O caso ora em exame põe em evidência, uma vez mais, situação impregnada de alto relevo jurídico-constitucional, consideradas as graves implicações que o regime de sigilo - necessariamente excepcional - impõe ao exercício, em plenitude, do direito de defesa e à prática, pelo Advogado, das prerrogativas profissionais que lhe são inerentes (Lei nº 8.906/94, art. 7º, incisos XIII e XIV).O Estatuto da Advocacia - ao dispor sobre o acesso do Advogado investido de mandato aos procedimentos estatais que tramitam em regime de sigilo - assegura-lhe, como típica prerrogativa de ordem profissional, o direito de examinar os autos, sempre em benefício de seu constituinte, e em ordem a viabilizar, quanto a este, o exercício do direito de conhecer os dados probatórios já formalmente produzidos no âmbito da investigação penal, para que se possibilite a prática de direitos básicos de que também é titular aquele contra quem foi instaurada, pelo Poder Público, determinada persecução criminal. Nem se diga, por absolutamente inaceitável, considerada a própria declaração constitucional de direitos, que a pessoa sob persecução penal (em juízo ou fora dele) mostrar-se-ia destituída de direitos e garantias. Esta Suprema Corte jamais poderia legitimar tal entendimento, pois a razão de ser do sistema de liberdades públicas vincula-se, em sua vocação protetiva, a amparar o cidadão contra eventuais excessos, abusos ou arbitrariedades

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emanados do aparelho estatal. Cabe relembrar, no ponto, por necessário, a jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Federal em torno da matéria pertinente à posição jurídica que o indiciado - e, com maior razão, o próprio réu - ostenta em nosso sistema normativo, e que lhe reconhece direitos e garantias inteiramente oponíveis ao poder do Estado, por parte daquele que sofre a persecução penal: "INQUÉRITO POLICIAL - UNILATERALIDADE - A SITUAÇÃO JURÍDICA DO INDICIADO. - O inquérito policial, que constitui instrumento de investigação penal, qualifica-se como procedimento administrativo destinado a subsidiar a atuação persecutória do Ministério Público, que é - enquanto ''dominus litis'' - o verdadeiro destinatário das diligências executadas pela Polícia Judiciária. A unilateralidade das investigações preparatórias da ação penal não autoriza a Polícia Judiciária a desrespeitar as garantias jurídicas que assistem ao indiciado, que não mais pode ser considerado mero objeto de investigações. O indiciado é sujeito de direitos e dispõe de garantias, legais e constitucionais, cuja inobservância, pelos agentes do Estado, além de eventualmente induzir-lhes a responsabilidade penal por abuso de poder, pode gerar a absoluta desvalia das provas ilicitamente obtidas no curso da investigação policial."(RTJ 168/896-897, Rel. Min. CELSO DE MELLO) Não custa advertir, como já tive o ensejo de acentuar em decisão proferida no âmbito desta Suprema Corte (MS 23.576/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO), que o respeito aos valores e princípios sobre os quais se estrutura, constitucionalmente, a organização do Estado Democrático de Direito, longe de comprometer a eficácia das investigações penais, configura fator de irrecusável legitimação de todas as ações lícitas desenvolvidas pela Polícia Judiciária, pelo Ministério Público ou pelo próprio Poder Judiciário. A pessoa contra quem se instaurou persecução penal - não importa se em juízo ou fora dele - não se despoja, mesmo que se cuide de simples indiciado, de sua condição de sujeito de determinados direitos e de senhor de garantias indisponíveis, cujo desrespeito só põe em evidência a censurável (e inaceitável) face arbitrária do Estado, a quem não se revela lícito desconhecer que os poderes de que dispõe devem conformar-se, necessariamente, ao que prescreve o ordenamento positivo da República. Esse entendimento - que reflete a própria jurisprudência do Supremo Tribunal Federal construída sob a égide da vigente Constituição - encontra apoio na lição de autores eminentes, que, não desconhecendo que o exercício do poder não autoriza a prática do arbítrio, enfatizam que, mesmo em procedimentos inquisitivos instaurados no plano da investigação policial, há direitos titularizados pelo indiciado, que simplesmente não podem ser ignorados pelo Estado (...). Impende destacar, de outro lado, precisamente em face da circunstância de o indiciado (e com maior razão, o réu em juízo criminal) ser, ele próprio, sujeito de direitos, que o Advogado por ele regularmente constituído (como sucede no caso) tem direito de acesso aos autos da investigação (ou do processo) penal, não obstante em tramitação sob regime de sigilo, considerada a essencialidade do direito de defesa, que há de ser compreendido - enquanto prerrogativa indisponível assegurada pela Constituição da República - em perspectiva global e abrangente (...) .A oponibilidade ao defensor constituído esvaziaria uma garantia constitucional do indiciado (CF, art. 5º, LXIII), que lhe assegura, quando preso, e pelo menos lhe faculta, quando solto, a assistência técnica do advogado, que este não lhe poderá prestar se lhe é sonegado o acesso aos autos do inquérito sobre o objeto do qual haja o investigado de prestar declarações. O direito do indiciado, por seu advogado, tem por objeto as informações já introduzidas nos autos do inquérito, não as relativas à decretação e às vicissitudes da execução

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de diligências em curso (cf. L. 9296, atinente às interceptações telefônicas, de possível extensão a outras diligências); dispõe, em consequência, a autoridade policial, de meios legítimos para obviar inconvenientes que o conhecimento pelo indiciado e seu defensor dos autos do inquérito policial possa acarretar à eficácia do procedimento investigatório."(grifei) (...) Os eminentes Advogados ALBERTO ZACHARIAS TORON e ALEXANDRA LEBELSON SZAFIR, em recentíssima obra - que versa, dentre outros temas, aquele ora em análise ("Prerrogativas Profissionais do Advogado" , p. 86, item n. 1, 2006, OAB Editora) -, examinaram, com precisão, a questão suscitada pela injusta recusa, ao Advogado investido de procuração (Lei nº 8.906/94, art. 7º, XIII), de acesso aos autos de inquérito policial ou de processo penal que tramitem, excepcionalmente, em regime de sigilo, valendo rememorar, a esse propósito, a seguinte passagem: "No que concerne ao inquérito policial há regra clara no Estatuto do Advogado que assegura o direito aos advogados de, mesmo sem procuração, ter acesso aos autos (art. 7º, inc. XIV) e que não é excepcionada pela disposição constante do § 1º do mesmo artigo que trata dos casos de sigilo. Certo é que o inciso XIV do art. 7º não fala a respeito dos inquéritos marcados pelo sigilo. Todavia, quando o sigilo tenha sido decretado, basta que se exija o instrumento procuratório para se viabilizar a vista dos autos do procedimento investigatório. Sim, porque inquéritos secretos não se compatibilizam com a garantia de o cidadão ter ao seu lado um profissional para assisti-lo, quer para permanecer calado, quer para não se auto-incriminar (CF, art. 5º, LXIII). Portanto, a presença do advogado no inquérito e, sobretudo, no flagrante não é de caráter afetivo ou emocional. Tem caráter profissional, efetivo, e não meramente simbólico. Isso, porém, só ocorrerá se o advogado puder ter acesso aos autos. Advogados cegos, ''blind lawyers'', poderão, quem sabe, confortar afetivamente seus assistidos, mas, juridicamente, prestar-se-ão, unicamente, a legitimar tudo o que no inquérito se fizer contra o indiciado." (grifei) (...) Por conclusão, os princípios da verdade real e da igualdade das partes na relação jurídico-processual fazem com que as provas carreadas para os autos pertençam a todos os sujeitos processuais, ou seja, dão origem ao princípio da comunhão das provas.(...)" (destacou-se) (STF - HC: 93767 DF, Relator: Min. CELSO DE MELLO, Data de Julgamento: 12/02/2008, Data de Publicação: DJe-027 DIVULG 15/02/2008 PUBLIC 18/02/2008)

No presente caso, contudo, o cenário de desrespeito às normas

legais se torna ainda mais temerário diante do fato de que a autoridade policial que

conduzira as investigações não se reveste da necessária imparcialidade e impessoalidade

para tal.

Os inquéritos ora em comento foram conduzidos pelos Delegados

Márcio Anselmo e Filipe Hille Pace. O primeiro, conforme já demonstrado, externou

através de sua página pessoal no Facebook todo o escárnio e desprezo que possui em

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relação ao Primeiro Defendente24. Já o segundo, no ofício de condutor das

investigações concernentes à Operação Ometà, mencionou o nome do Primeiro

Defendente no relatório final do IPL 2255/2015­4 SR/DPF/PR, acusando­o de ser

recebedor de valores ilícitos da empresa Odebrecht:

"Há] respaldo probatório e coerência investigativa em se considerar que o 'AMIGO' das planilhas 'POSICAO –ITALIANO310712MO.xls ' e 'POSICAO - ITALIANO 22 out 2013 em 25 nov.xls' faça referência a LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA”

Ocorre que o Primeiro Defendente sequer constava como

investigado ou fora anteriormente mencionado em tal procedimento, o que nitidamente

demonstra o intento de criminalizar e ferir a sua honra, imagem e reputação e execrá­lo

perante a opinião pública.

A consequência prática de se haver uma autoridade suspeita

presidindo uma investigação é precisamente aduzida pela doutrina de GUILHERME DE

SOUZA NUCCI25:

"Diz-se que o inquérito é meramente informativo ao promotor, embora se constate, na prática, muitos juízes levando em consideração o que foi lá produzido. Há casos em que o magistrado, baseando-se no princípio da livre convicção, na avaliação das provas, acredita muito mais na versão oferecida por uma testemunha na fase policial, do que o alegado pela mesma testemunha em juízo. E mais: uma autoridade suspeita pode fraquejar na investigação, para que nada seja descoberto contra determinado indiciado ou pode buscar provas exclusivamente contra certo indiciado, abandonando outros suspeitos, cujos nomes lhe chegam ao conhecimento, somente para prejudicar o desafeto". (destacou­se)

Consideradas as peculiaridades do caso em questão – de

imensurável apelo social e midiático –, tal possibilidade se mostra ainda mais insipiente,

visto que a investigação não vislumbrou a impessoal apuração dos fatos, mas sim a

tentativa de produzir provas incriminadoras em desfavor dos Defendentes.

Atesta­se a presença de três vícios gravíssimos ocorridos durante

a investigação preliminar, quais sejam:

24 < http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,delegados­da­lava­jato­exaltam­aecio­e­atacam­pt­na­rede,1591953 > 25 GUILHERME DE SOUZA NUCCI, Código de Processo Penal Comentado 15ª edição, 2016, p. 318.

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­ A tramitação oculta do procedimento investigatório, a despeito das

normas legais26 que garantem o acesso e conhecimento do investigado

acerca de procedimento em seu desfavor;

­ Condução da investigação por autoridades manifestamente suspeitas

para tal, prescindindo de qualquer resquício de imparcialidade e/ou

impessoalidade para aclaração dos fatos supostamente delituosos;

­ Desrespeito às garantias constitucionais da dignidade da pessoa

humana, do contraditório e do direito de defesa com a concessão

desproporcional de prazo para os devidos esclarecimentos dos

investigados e conclusão do caderno investigatório no dia útil

subsequente, em relatório de 142 páginas, o que permite concluir que a

participação dos Defendentes no inquérito não passou de mero

formalismo.

No que concerne aos vícios ocorridos durante a investigação

preliminar e sua consequência na ação penal dele originada, pertinente é o ensinamento

de AURY LOPES JR27:

"Dentro desse panorama, que é a nossa realidade, se os juízes entendem que as peças do IP podem ser valoradas na sentença (ainda que sob a fórmula de 'cotejada com a prova judicializada1, para não violar o disposto no art. 155 do CPP), estão com isso, logicamente, reconhecendo que o IP é parte integrante do processo. Logo, se integra o processo, é para todos os efeitos, inclusive para contaminar as provas processuais, que de alguma forma derivem ou tenham por base os elementos do inquérito".

26 Constituição Federal, Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei. Lei 8.906/1994ª Art. 7º São direitos do advogado: (...) XIV - examinar, em qualquer instituição responsável por conduzir investigação, mesmo sem procuração, autos de flagrante e de investigações de qualquer natureza, findos ou em andamento, ainda que conclusos à autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos, em meio físico ou digital; Súmula Vinculante número 14: "É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa". 27 Lopes Jr, AURY, Direito Processual Penal, 12ª edição, 2015, p. 950.

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O Egrégio Superior Tribunal de Justiça brilhantemente decidira

que eventuais nulidades ocorridas no Inquérito Policial contaminam a futura ação penal.

PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. OPERAÇÃO SATIAGRAHA. Participação irregular, induvidosamente comprovada, de dezenas de funcionários da agência brasileira de informação (ABIN) e de ex-servidor do sni, em investigação conduzida pela polícia federal. Manifesto abuso de poder. Impossibilidade de considerar-se a atuação efetivada como hipótese excepcionalíssima, capaz de permitir compartilhamento de dados entre órgãos integrantes do sistema brasileiro de inteligência. Inexistência de preceito legal autorizando-a. Patente a ocorrência de intromissão estatal, abusiva e ilegal na esfera da vida privada, no caso concreto. Violações da honra, da imagem e da dignidade da pessoa humana. Indevida obtenção de prova ilícita, porquanto colhida em desconformidade com preceito legal. Ausência de razoabilidade. As nulidades verificadas na fase pré-processual, e demonstradas à exaustão, contaminam futura ação penal. Infringência a diversos dispositivos de lei. Contrariedade aos princípios da legalidade, da imparcialidade e do devido processo legal inquestionavelmente caracterizada. A autoridade do juiz está diretamente ligada à sua independência ao julgar e à imparcialidade. Uma decisão judicial não pode ser ditada por critérios subjetivos, norteada pelo abuso de poder ou distanciada dos parâmetros legais. Essas exigências decorrem dos princípios democráticos e dos direitos e garantias individuais inscritos na constituição. Nulidade dos procedimentos que se impõe, anulando-se, desde o início, a ação penal.28

Diante de todos os elementos aqui suscitados, não há dúvidas

de que os procedimentos investigatórios que originaram a ação penal debatida são

nulos de pleno direito, pois eivados de ilegalidades e desrespeitos a garantias de

caráter fundamental. E procedimento conduzido por autoridades suspeitas é nulo!

Impõe­se, assim, a anulação de todo o procedimento em questão,

desde a sua fase preliminar, e o desentranhamento de todos os elementos probatórios

coligidos durante a investigação.

Caso esse não seja o entendimento deste Juízo, devem ser

novamente produzidas as provas levantadas em sede dos procedimentos investigatórios,

incluindo todos os laudos e análises financeiras realizadas.

28 STJ, HC 149250. Relator: Min. Adilson Vieira Macabu (Desembargador Convocado do TJ/RJ) – QUINTA TURMA, julgado em 05.09.2011.

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Acerca de tal necessidade, novamente se menciona o grande

processualista AURY LOPES JR29:

"A única forma de sanar um ato delituoso do inquérito é repetindo o ato no processo; caso contrário, não só aquela diligência é nula (ineficácia e desentranhamento) como também contaminará a sentença que valorar esse ato de investigação nulo".

E, mesmo que não se vislumbre qualquer nulidade no

procedimento investigatório, hipótese que se levanta apenas pela condescendência

dialética, a ação penal ofertada em face dos Defendentes não possui os elementos legais

para seu prosseguimento, o que será abaixo esmiuçado.

III.2 – DO CERCEAMENTO DE DEFESA: AUSÊNCIA DE TRADUÇÃO JURAMENTADA E

NÃO CONCESSÃO DE ACESSO À DEFESA AOS AUTOS DA MEDIDA CAUTELAR 5042689-

15.2016.4.04.7000

Em 14.12.2016, o Ministério Público Federal ofereceu denúncia

em face dos Defendentes pela suposta prática dos crimes de corrupção passiva e

lavagem de dinheiro. Para a complementação da exordial acusatória, foram juntados

309 documentos anexos pelo Parquet.

Ocorre que, entre os referidos documentos anexos à denúncia,

constam dois contratos da Petrobras em língua inglesa (anexos 201 a 205), os quais não

estão acompanhados das devidas traduções juramentadas.

Tal fato representa obstáculo a uma análise minuciosa dos

elementos probatórios trazidos pelo Ministério Público Federal e, consequentemente,

impede o exercício da ampla defesa, garantido pela égide constitucional. Em relação a

este princípio indispensável ao processo penal, vale destacar o que afirma GUILHERME

DE SOUZA NUCCI:

“Envolve todos os estágios procedimentais onde se colha prova definitiva acerca da culpa de alguém, preferido acolhe-la em excesso, em lugar de restringi-la por cautela. A ampla defesa jamais pode ser constituída de ato

29 Lopes Jr, AURY, Direito Processual Penal, 12ª edição, 2015, p. 951.

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formal, sem substância e eficiência, pois se cuida de interesse indisponível do indivíduo, merecendo integral contemplação estatal.” (Destaquei)30

Ademais, tal óbice, ao colocar a Defesa em posição de

desvantagem, fere o equilíbrio processual entre as partes, de modo a violar a garantia da

paridade de armas, outra fundamental garantia inserida no devido processo legal.

Sobre o tema, lecionam PEDRO HENRIQUE DEMERCIAN E JORGE ASSAF MALULY:

“(...) no autorizado magistério de Ada Pellegrini Grinover (1990b, p. 07), a paridade de armas ou par conditio pressupõe o equilíbrio de situações entre os ofícios da acusação e da defesa, numa situação de reciprocidade e não apenas de mera igualdade formal. Deve ser resguardado o equilíbrio de forças entre as partes, traduzido “na necessidade de lhes garantir a possibilidade de desenvolverem plenamente a defesa de suas próprias razões”. 31

Dessa forma, os referidos documentos – sem a devida tradução

juramentada – não podem ser utilizados como elemento de prova na ação penal. Este é o

entendimento dos Tribunais Superiores, como demonstra os seguintes julgados:

“DIREITO INSTRUMENTAL - ORGANICIDADE. As balizas normativas instrumentais implicam segurança jurídica, liberdade em sentido maior. Previstas em textos imperativos, hão de ser respeitadas pelas partes, escapando ao critério da disposição. INTIMAÇÃO PESSOAL - CONFIGURAÇÃO. Contrapõe-se à intimação pessoal a intimação ficta, via publicação do ato no jornal oficial, não sendo o mandado judicial a única forma de implementá-la. PROCESSO - TRATAMENTO IGUALITÁRIO DAS PARTES. O tratamento igualitário das partes é a medula do devido processo legal, descabendo, na via interpretativa, afastá-lo, elastecendo prerrogativa constitucionalmente aceitável. RECURSO - PRAZO - NATUREZA. Os prazos recursais são peremptórios. RECURSO - PRAZO - TERMO INICIAL - MINISTÉRIO PÚBLICO.” (destacou­se)32 ­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­ “Ementa: RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. RITO DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS. PRERROGATIVA DE INTIMAÇÃO PESSOAL DOS OCUPANTES DE CARGO DE PROCURADOR FEDERAL (ART. 17 DA LEI Nº 10.910/2004). INAPLICABILIDADE. PRINCÍPIO DA PARIDADE DE ARMAS. CONTRADITÓRIO (ART. 5º, LV, DA CRFB). ACESSO À JUSTIÇA (ART. 5º, XXXV, DA CRFB). SIMPLICIDADE DO PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO (ART. 98, I, DA CRFB). ART. 9º DA LEI Nº 10.259/01. AGRAVO

30 NUCCI, Guilherme de Souza. Princípios Constitucionais Penais e Processuais Penais. 4ª ed., ver. E atual. Rio de Janeiro: Forense, 2015. 31 DEMERCIAN, Pedro Henrique, MALULY, Jorge Assaf. Curso de Processo Penal, 9ª edição. Forense, 01/2014 32 STF, HC 83.255/SP, Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 12/03/2004.

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CONHECIDO E RECURSO EXTRAORDINÁRIO DESPROVIDO. 1. A isonomia é um elemento ínsito ao princípio constitucional do contraditório (art. 5º, LV, da CRFB), do qual se extrai a necessidade de assegurar que as partes gozem das mesmas oportunidades e faculdades processuais, atuando sempre com paridade de armas, a fim de garantir que o resultado final jurisdicional espelhe a justiça do processo em que prolatado.(destacou-se)”33 ------------------------------------------------------------------------------------------------ “EMENTA: PENAL. RECURSO ORDINÁRIO. PEDIDO DE EXTENSÃO DE EXTRADIÇÃO. DOCUMENTOS NECESSÁRIOS. DECRETO PREVENTIVO. NÃO OBRIGATORIEDADE. PRISÃO PREVENTIVA. REQUISITOS. ART. 312 DO CPP. FATO NOVO. SUPERVENIÊNCIA DE EXTRADIÇÃO. EXECUÇÃO DE PENA POR OUTRO PROCESSO. EXCESSO DE PRAZO. DOCUMENTAÇÃO EM LÍNGUA ESTRANGEIRA. INADMISSIBILIDADE. PROVIMENTO PARA RELAXAR A PRISÃO. 1. Decreto preventivo não é documento necessário para instruir o pedido de extensão de extradição, conforme se depreende do art. 18, item 4, do Acordo de Extradição entre Estados Partes do Mercosul (Decreto n. 4.975/2004). 2. O Juiz de primeira instância apontou concretamente a presença dos vetores contidos no art. 312 do Código de Processo Penal, indicando motivação suficiente para justificar a necessidade de colocar o paciente cautelarmente privado de sua liberdade, pois ressaltou o alto risco de o recorrente evadir-se, bem como a necessidade do decreto preventivo para viabilizar a extensão da extradição. 3. A superveniência de extradição para o território nacional e cumprimento de pena por outro processo alteram o contexto fático, de modo a suprimir, no caso, o periculum libertatis, consistente no risco de evasão. 4. Em que pese a complexidade do feito, a prisão preventiva foi decretada em 28/11/2013 e, desde então, a ação penal não teve andamento, pois aguarda o trâmite do procedimento de extensão de extradição, cuja mora configura excesso de prazo. 5. Não pode ser utilizado como prova documento em língua estrangeira desacompanhado de tradução juramentada. 6. Recurso ordinário provido para relaxar a prisão do recorrente.” (destacou­se)34

Assim, mostra­se indispensável que o Parquet junte aos autos

tradução elaborada por tradutor público ou pessoa idônea a ser nomeada, como dispõe o

art. 236 do Código de Processo Penal35, sob pena de nulidade por cerceamento de

defesa.

Nesse sentido, é o entendimento do Tribunal Regional da 4ª

Região:

“PENAL. PROCESSO. DOCUMENTOS EM LÍNGUA ESTRANGEIRA. PEDIDO DE TRADUÇÃO DEFERIDO. DESCUMPRIMENTO DA DETERMINAÇÃO JUDICIAL. PREJUÍZO PARA A ACUSAÇÃO. NULIDADE

33 STF, Recurso Extraordinário com Agravo E 648629, Relator Min. Luiz Fux 34 Recurso Ordinario Em Habeas Corpus n. 201501151779, 6ª Turma, Relator Des. Rogério Schietti Cruz, j. 15.03.2016. 35 Art. 236. Os documentos em língua estrangeira, sem prejuízo de sua juntada imediata, serão, se necessário, traduzidos por tradutor público, ou, na falta, por pessoa idônea nomeada pela autoridade.

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CONFIGURADA. INEXISTÊNCIA DE PRECLUSÃO. - A hipótese é de nulidade pois considerável seria o prejuízo para a acusação caso não pudesse se valer dos documentos cuja tradução deixou de ser providenciada em face da omissão da secretaria do juízo. - Impossível falar-se em preclusão porquanto a parte observou os momentos próprios para o requerimento de diligências, ressaltando que o prazo para a apresentação das alegações finais não se presta para tal fim.” (Grifei).36

Destaque­se, ainda, o que sustenta GUILHERME DE SOUZA NUCCI:

“A decisão [acerca da tradução] ficará a critério do juiz que, entretanto, deve providenciá-la sempre que qualquer dos envolvidos no processo assim deseje”. 37 (destacou­se)

O cerceamento de defesa e o desrespeito à garantia fundamental

da ampla defesa também ocorreu na falta de acesso à defesa aos autos da medida

cautelar 5042689­15.2016.4.04.7000, trazida na peça acusatória a fim de alicerçar as

imputações lançadas em face dos Defendentes.

O acesso da defesa se limita aos andamentos processuais, e,

embora imprescindível para o devido exercício da ampla defesa, não há possibilidade de

visualizar todos os elementos colhidos naquela medida acauteladora.

À luz da par conditio tal impedimento se mostra temerário, já que

deve ser franqueado à defesa dos Defendentes o acesso integral aos autos da quebra de

sigilo ora mencionada.

Dessa forma, entendendo a Defesa pela necessidade da tradução

dos anexos que instruem a peça acusatória, de rigor que o Ministério Público Federal

providencie sua juntada aos autos, à luz dos princípios da ampla defesa e da paridade de

armas, incorrendo em gravoso cerceamento de defesa, e, por consequência, em nulidade

processual.

36 Apelação Criminal n. 200204010108801, 7ª Turma, TRF­4, Relatora Des. MARIA DE FÁTIMA FREITAS Labarrère, j. 23.11.2003. 37 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado. 13ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014.

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Requer­se também acesso integral aos termos do pedido de

quebra de sigilo de dados e/ou telefônico 5042689­15.2016.4.04.7000, à luz dos

princípios constitucionais da ampla defesa, do contraditório e da paridade de armas.

III.3 – DA INVIABILIDADE DA AÇÃO PENAL

Ainda que não se entenda pela nulidade absoluta dos

procedimentos que embasaram esta ação penal, importa ressaltar que no presente caso

não há suporte probatório/indiciário mínimo que respalde a denúncia oferecida em

relação aos Defendentes. Por tal razão, se postula sua pronta rejeição, nos termos do

artigo 395, incisos I e III, do Código de Processo Penal, visto que:

a) A denúncia é inepta, pois:

Não individualiza a conduta dos Defendentes; não expõe

concretamente os fatos a eles imputados e, ainda, não

descreve comportamento típico — violando, assim, as

garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa.

Há profunda confusão entre as condutas indicadas como atos

de corrupção passiva ou de lavagem de dinheiro, sendo

impossível indicar contra qual delito a tese defensiva deve se

voltar. A inépcia formal gera perplexidade defensiva.

Considerando­se que parte dos atos imputados é anterior ao

ano de 2012 e à alteração da Lei 9.613/98, que continha rol

taxativo dos crimes antecedentes à lavagem de capitais, não

foi apontado nem especificado sobre a qual inciso se ajusta a

conduta incriminada secundária.

A versão acusatória busca a responsabilização objetiva do

Primeiro Defendente, a despeito de sua pacífica vedação no

direito penal.

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b) Não há justa causa para a ação penal, uma vez que: (i) inexistem

indícios razoáveis de autoria e materialidade do delito; (ii) a denúncia

está baseada única e exclusivamente em depoimentos de delatores, um

deles sequer homologado e o outro cancelado; (iii) houve indevida

inversão do ônus da prova.

Relembre­se, ainda, que a apreciação da alegação de inépcia e

carência de justa causa da peça acusatória não se limita ao momento processual do

recebimento ou rejeição da denúncia, sendo possível que o magistrado, se convencido

da ausência de tais elementos após a apresentação da defesa, reconsidere sua decisão e

rechace o prosseguimento da ação penal.

De fato, constitui dever legal do magistrado analisar, após a

exposição dos argumentos defensivos e consideradas, ainda, as graves implicações

que um processo criminal faz incidir sobre o indivíduo, se este encontra o respaldo

probatório apto a ensejar a sua continuidade.

A jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça

confirma esse entendimento, como se verifica, exemplificativamente, nos julgados

abaixo:

“Verificada, após a apresentação das defesas preliminares, a inépcia da exordial acusatória pela ausência da descrição individualizada das condutas de cada Denunciado, ao Juiz é lícito reconsiderar o recebimento da denúncia, quer por permissão legal, quer por uma questão de coerência com os anseios do legislador, impulsionadores da reforma do Código Adjetivo Penal, tendentes a um processo célere e fecundo. Inteligência do art. 396-A do Código de Processo Penal.” (STJ, AgRg no AREsp 82.199/AL, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, 5ª. T., 17.12.2013.) (destacou­se) --------------------------------------------------------------------------------------------- RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL PENAL. DENÚNCIA. RECEBIMENTO. RESPOSTA DO ACUSADO. RECONHECIMENTO. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. POSSIBILIDADE. ILICITUDE DA PROVA. AFASTAMENTO. INVIABILIDADE. ACÓRDÃO RECORRIDO. FUNDAMENTO EXCLUSIVAMENTE CONSTITUCIONAL. DECRETO REGULAMENTAR. TIPO LEGISLATIVO QUE NÃO SE INSERE NO CONCEITO DE LEI FEDERAL (ART. 105, III, A, DA CF) 1. O fato de a denúncia já ter sido recebida não impede o Juízo de primeiro grau de, logo após o oferecimento da resposta do acusado, prevista nos arts.

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396 e 396-A do Código de Processo Penal, reconsiderar a anterior decisão e rejeitar a peça acusatória, ao constatar a presença de uma das hipóteses elencadas nos incisos do art. 395 do Código de Processo Penal, suscitada pela defesa. 2. As matérias numeradas no art. 395 do Código de Processo Penal dizem respeito a condições da ação e pressupostos processuais, cuja aferição não está sujeita à preclusão (art. 267, § 3º, do CPC, c/c o art. 3º do CPP). 3. Hipótese concreta em que, após o recebimento da denúncia, o Juízo de primeiro grau, ao analisar a resposta preliminar do acusado, reconheceu a ausência de justa causa para a ação penal, em razão da ilicitude da prova que lhe dera suporte. (STJ, REsp 1318180/DF, 6ª Turma, Relator: Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, 16/05/2013.) (destacou­se)

Outro não é o sentir do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:

“PENAL E PROCESSO PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. DENÚNCIAINICIALMENTE ADMITIDA À LUZ DO ART. 43 do CPP. LEI 11.719/08. REFORMA PROCESSUAL PENAL. PROCESSO EM CURSO. ARTIGOS 395 e 397 do CPP. NOVA ANÁLISE DA JUSTA CAUSA APÓS A RESPOSTA PRELIMINAR. POSSIBILIDADE. REJEIÇÃO DA EXORDIAL ACUSATÓRIA. CABIMENTO. Com o advento da Lei 11.719, de 20 de junho de 2008, o Denunciado somente será submetido a persecutio criminis in judicio quando houver plausibilidade da acusação, a qual, vale dizer, deverá estar lastreada, ao menos, na prova da existência de infração penal, sob pena de constrangimento ilegal. Nessa linha, a partir das alterações processuais produzidas pela aludida Lei, após o oferecimento da peça acusatória, não sendo causa de rejeição liminar (art. 395), cabe ao juiz propiciar a apresentação de resposta por escrito, oportunidade em que o Denunciado poderá alegar tudo o que interesse à sua defesa (art. 396 e 396-A). Dessa forma, os fatos narrados na peça incoativa passam a ser examinados em cotejo com os argumentos apontados pela defesa (art. 397) para, somente assim, sob os auspícios do contraditório e da ampla defesa, aferir o julgador se, efetivamente, há justa causa para a ação penal, iniciando-a, se for o caso, com o recebimento da denúncia. Portanto, não há mácula na decisão que, após a apresentação das respostas preliminares, realiza novo juízo de prelibação para, revendo decisão anterior, concluir pela ausência de justa causa ao exercício da ação penal. Até porque, inexiste utilidade no prosseguimento do feito quando não evidenciado um suporte probatório mínimo acerca da autoria e da materialidade delitivas atribuídas aos ora recorridos. (TRF 4ª Região, SER 2009.71.02.000450­0, Relator Tadaqui Hirose.) (destacou­se)

Essa exegese é a que melhor se coaduna com o princípio da

celeridade, economia processual e ao ius dignitatis do acusado, visto que se o

magistrado entender, após a apresentação da defesa preliminar, que o iter persecutório

não possui as condições de regular e hígido desenvolvimento, deve o feito ser extinto

por decisão terminativa.

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35

É exatamente a situação do caso em comento, conforme será

demonstrado.

III.4 – INÉPCIA DA DENÚNCIA

A longa denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal, a

qual contém 188 páginas e 308 anexos, não sucedeu em demonstrar de forma clara e

pormenorizada quais as condutas perpetradas pelos Defendentes que incorreriam nos

tipos legais imputados.

As ações humanas pressupõem as dimensões de tempo e de

espaço que caracterizam todos os fenômenos naturais e sociais, porque existem em

determinado momento histórico e acontecem em determinado lugar do mundo físico.

Por isso, uma norma do processo penal brasileiro determina que o ato processual da

denúncia, de modo necessário e obrigatório, “conterá a exposição do fato criminoso,

com todas as suas circunstâncias” (art. 41, CPP), cuja violação implica nulidade

absoluta da denúncia.

Como se vê, a norma processual destaca dois conceitos: primeiro,

o conceito de fato criminoso; segundo, o conceito de circunstâncias que caracterizam o

fato criminoso. Apesar da referência em norma processual penal, a natureza desses

conceitos pertence à teoria do fato punível, porque ambos integram o substrato

material do conceito de crime, objeto de investigação do processo penal, assim

definidos:

a) o conceito de fato criminoso (ou fato punível) é constituído (i)

do tipo de injusto e (ii) da culpabilidade: 1) o tipo de injusto, como objeto de

imputação da denúncia, é configurado por uma ação típica e antijurídica concreta:

nesta fase processual, a Defesa examina apenas esta dimensão do fato punível; 2) a

culpabilidade, como juízo de reprovação sobre o tipo de injusto, é configurada pela

imputabilidade, o conhecimento do injusto e a exigibilidade de comportamento diverso;

b) o conceito de circunstâncias do fato criminoso compreende os

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relevantes detalhes de tempo, de lugar, de meio e de modo de execução que conferem

às ações humanas características próprias que permitem sua identificação concreta.

O exame da imputação de fato contra o Primeiro Defendente

revela, do ponto de vista do tipo objetivo e do tipo subjetivo graves problemas

processuais, como indica a simples leitura da narrativa da denúncia: (fl. 80):

“Em datas ainda não estabelecidas, mas compreendidas entre 25/11/2004 e 23/01/2012, LULA, de modo consciente e voluntário, em razão de sua função e como responsável pela nomeação e manutenção de RENATO DE SOUZA DUQUE e PAULO ROBERTO COSTA nas Diretorias de Serviços e Abastecimento da Petrobras, solicitou, aceitou promessa e recebeu, direta e indiretamente, para si e para outrem, inclusive por intermédio de tais funcionários públicos, vantagens indevidas, as quais foram de outro lado e de modo convergente oferecidas e prometidas, direta e indiretamente, por MARCELO BAHIA ODEBRECHT, na condição de gestor do Grupo ODEBRECHT, para que os seguintes consórcios, integrados pela empresa CONSTRUTORA NORBERTO ODEBRECHT S.A, obtivessem benefícios em contratação com a Petrobras i) o CONSÓRCIO CONPAR, contratado pela Petrobras para a execução das obras de ISBL da Carteira de Gasolina e UGHE HDT de instáveis da Carteira de Coque da Refinaria Getúlio Vargas – REPAR; ii) o CONSÓRCIO REFINARIA ABREU E LIMA, contratado pela Petrobras para a execução da terraplenagem da área destinada à construção e montagem da Refinaria do Nordeste – RNEST; iii) o CONSÓRCIO TERRAPLANAGEM COMPERJ, contratado pela Petrobras para a execução de serviços de terraplenagem, drenagem e anel viário da área do futuro Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro – COMPERJ; iv) o CONSÓRCIO ODEBEI, contratado pela Petrobras para a execução das obras de construção e montagem da Unidade de Processamento de Condensado de Gás Natural II – UPCGN II e seus off-sites, e da ampliação dos Sistemas de Compressão, Ar Comprimido e de Água de Resfriamento do Terminal de Cabiúnas – TECAB; v) o CONSÓRCIO ODEBEI PLANGÁS, contratado pela Petrobras para a execução dos serviços de Implementação da Unidade de Processamento de Gás Natural (UPCGN III), seus Offsites, Interligações e Utilidades (Torre de Resfriamento e Sistema de Ar Comprimido) do Terminal de Cabiúnas – TECAB; vi) o CONSÓRCIO ODEBEI FLARE, contratado pela Petrobras para a construção e montagem do novo sistema de Tocha do tipo Ground Flare e suas interligações no Terminal de Cabiúnas – TECAB; vii) o CONSÓRCIO ODETECH, contratado pela TRANSPORTADORA ASSOCIADA DE GÁS S.A – TAG, subsidiária integral da Petrobras GÁS S.A, para a execução das obras de construção e montagem do gasoduto GASDUC III – Pacote 1; e viii) o CONSÓRCIO RIO PARAGUAÇU, contratado pela Petrobras para a construção das plataformas de perfuração autoelevatórias P-59 e P-60. As vantagens foram prometidas e oferecidas, direta e indiretamente, por MARCELO BAHIA ODEBRECHT a LULA, RENATO DUQUE, PAULO ROBERTO COSTA e PEDRO JOSÉ BARUSCO FILHO para determiná-los a, infringindo deveres legais, praticar e omitir atos de ofício no interesse dos referidos contratos.

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Ainda neste mesmo período, entre 25/11/2004 e 23/01/2012, MARCELO ODEBRECHT, gestor do Grupo ODEBRECHT, de modo consciente e voluntário, direta e indiretamente, ofereceu e prometeu vantagens indevidas a LULA, PAULO ROBERTO COSTA, RENATO DUQUE e PEDRO BARUSCO, para determiná-los a, infringindo deveres legais, praticar e omitir atos de ofício no interesse dos contratos relativos aos empreendimentos citados. Tais vantagens indevidas consistiram em recursos públicos desviados no valor de, pelo menos, R$ 75.434.399,44, oferecidos e prometidos para LULA e que seriam usados não só para enriquecimento ilícito dos envolvidos, mas especialmente para alcançar governabilidade e financiar com recursos públicos desviados a permanência no poder.

Se essa é a denúncia do MPF contra o Primeiro Defendente,

então a acusação inicial não contém, do ponto de vista do tipo objetivo do crime

imputado, nenhuma “exposição do fato criminoso”, omitindo o principal requisito legal

do ato processual inaugural, assim expresso: “a denúncia ou a queixa conterá a

exposição do fato criminoso ...” (art. 41, CPP).

No caso concreto, a denúncia se reduz à reprodução de algumas

palavras da definição legal do tipo de crime imputado, mas não contém nenhuma

descrição do fato criminoso correspondente ao tipo legal imputado.

As ações imputadas de solicitar, ou de aceitar promessa, ou de

receber (vantagens indevidas) não possuem momento histórico determinado de

realização material ou de configuração concreta como fato criminoso: a denúncia não

delimita a dimensão de tempo em que teriam ocorrido as ações imputadas – aliás, como

diz a própria denúncia: “em datas ainda não estabelecidas, mas compreendidas entre

em 25/11/2004 e 23/01/2012”. Em outras palavras: as “datas ainda não estabelecidas”

deveriam se inserir em um período de tempo de 8 anos e 2 meses e, assim, poderiam ter

ocorrido em um dia qualquer de um lapso temporal de 2.980 dias!

Como se vê, a descrição da denúncia contém falha irremediável:

não situa o fato imputado em um momento determinado, definível como a “menor

unidade de tempo observável”, dentro da sequência histórica desse “continuum

homogêneo partilhável (...), em cuja sequência temporal é atribuída a cada realidade

sua posição ou recorte”.38 Em suma, parece impossível maior indeterminação do

38 REGENBOGEN, Arnim; MEYER,Uwe. Wörterbuch der Philosophischen Begriffe. Hamburg: Felix Meiner Verlag, 2013, verbete “Zeit”.

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tempo de existência de um fato, cuja historicidade concreta exige delimitação

temporal, sem a qual nenhum fato pode existir no mundo real.

Mas a falha da denúncia é ainda maior, porque as mesmas ações

imputadas de solicitar, ou de aceitar promessa, ou de receber (vantagens indevidas)

não possuem lugar físico determinado de concretude espacial como fato criminoso: a

denúncia não delimita o lugar, no continuum homogêneo do espaço tridimensional

euclidiano de altura, de largura e de profundidade que teria sido preenchido pelo ou em

que teria acontecido o fato criminoso imputado.39 Logo, existe somente um conteúdo

psíquico desprovido da forma ectoplasmática de aparição/existência fenomênica.

A consequência prática dessa indeterminação temporal ou

espacial do fato imputado é trágica, do ponto de vista processual, porque atribui ao

acusado uma prova negativa impossível: nos termos da denuncia, o acusado deve

realizar a absurda prova negativa da conduta imputada – ou seja, de não ter solicitado,

ou de não ter aceito promessa, ou de não ter recebido vantagem indevida em nenhum

daqueles 2.980 dias do lapso temporal de 8 anos e 2 meses.

Ao contrário, se a denúncia tivesse determinado o tempo e o

lugar do fato imputado, como exige a lei processual, então a necessidade probatória do

acusado se reduziria a demonstrar que, no tempo e no espaço determinados na exordial

acusatória, não poderia ter realizado o fato imputado, porque estaria (a) no exterior do

País, ou (b) em plena campanha no Nordeste, ou (c) internado na UTI de um hospital,

ou (d) o mesmo teria acontecido com quem teria oferecido, ou teria pago, ou a quem

teria sido solicitada a vantagem indevida etc. A lógica do argumento dispensa

qualquer comentário.

Enfim – e por incrível que pareça – a denúncia contém falhas

ainda maiores, porque as ações imputadas de solicitar, ou de aceitar promessa, ou de

receber (vantagens indevidas) constituem ações abstratas, desprovidas das

particularidades que informam os acontecimentos reais, designadas sob o significante

jurídico expresso na lei sob o nome de circunstâncias, cuja presença real atribui

39 REGENBOGEN, Arnim; MEYER,Uwe. Wörterbuch der Philosophischen Begriffe. Hamburg: Felix Meiner Verlag, 2013, verbete “Raum”.

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especificidade histórica a todo e qualquer fato concreto: além de não descrever o

tempo e o lugar dos fatos imputados, a denúncia não descreve nem os meios, nem os

modos pelos quais essas hipotéticas ações teriam sido realizadas pelo Primeiro

Defendente – ou seja, a descrição do fato é carente não apenas das circunstâncias

agravantes ou atenuantes genéricas (ou circunstâncias legais), que caracterizam a

especificidade concreta do fato como acontecimento histórico, ampliando ou reduzindo

o conteúdo do tipo de injusto e/ou a reprovação de culpabilidade do autor,40 mas

também é carente de toda e qualquer circunstância concreta que configuraria a

realidade histórico­social do fato imputado.

Logo, é impossível saber:

a) se a ação de solicitar teria sido realizada pela fonética da

palavra falada, ou pela forma gráfica de um texto escrito, ou por simples gestos ou

expressões corporais de mímica significativa;

b) se a ação de aceitar promessa teria sido comunicada pelo

discurso falado ou pela forma escrita, ou também por meio de gestos ou expressões

inequívocas; ou

c) se a ação de receber teria por objeto dinheiro em espécie, ou

dação em pagamento, ou depósito bancário, ou créditos etc.

Por outro lado, o exame da imputação de fato do ponto de vista

do tipo subjetivo do crime revela problemas igualmente graves: a singela descrição da

atitude pessoal atribuída ao Primeiro Defendente, no suposto papel de autor da ação

incriminada, definida como realizada “de modo consciente e voluntário” (Denúncia, fl.

80), constitui simples rótulo burocrático privado do conteúdo psíquico correspondente

ao conceito de dolo – e, portanto, insuficiente para descrever a existência do elemento

subjetivo do dolo, que caracteriza o tipo de crime imputado.

Ou, dito de forma didática: em lugar de etiquetas formais

destituídas de significado real, a Denúncia deveria descrever (a) a forma pela qual o

40 CIRINO DOS SANTOS, Juarez. Direito Penal – Parte Geral. Florianópolis: Empório do Direito, 7a edição, 2017, p. 532 s.

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autor teria tido consciência dos elementos objetivos do tipo de crime imputado, que

configura o elemento intelectual do dolo, e (b) de que modo os elementos objetivos do

tipo objetos da consciência teriam sido abrangidos pela vontade do autor, para formar a

estrutura psíquica do dolo, como vontade consciente de realizar o tipo objetivo de um

crime,41 nas formas diferenciadas e excludentes de dolo direto ou de dolo eventual. A

Denúncia não faz nada disso!

A consequência inevitável das falhas essenciais da narrativa do

fato imputado é a inépcia da denúncia.

E mais. Ainda ao que concerne o delito de corrupção passiva, o

Parquet acusa o Primeiro Defendente de ter praticado atos ilícitos no período

compreendido entre 25.11.2004 e 23.01.2012 da seguinte maneira:

a) de modo consciente e voluntário, manteve RENATO DUQUE e PAULO ROBERTO COSTA nas diretorias de Serviços e Abastecimento da Petrobrás, ciente do uso dos cargos para a arrecadação, junto a empresários com contratos públicos, de propinas para distribuição a agentes e partidos políticos; b) Solicitou, aceitou promessa e recebeu, direta e indiretamente, vantagens indevidas oferecidas e prometidas por executivos do Grupo ODEBRECHT. A solicitação, aceitação de promessa e recebimento indireto já restaram esclarecidos quando foram evidenciadas, nos tópicos anteriores, tais condutas por parte de PAULO ROBERTO COSTA, ALBERTO YOUSSEF, RENATO DUQUE e PEDRO BARUSCO. A solicitação, aceitação e recebimento direto, em um regime de 'caixa geral', restam comprovados pelo próprio pagamento de vantagens indevidas por meio de expedientes de dissimulação, conforme será especificado no capítulo V desta denúncia; c) solicitou, aceitou promessa e recebeu vantagens indevidas em razão de sua função e como responsável pela nomeação e manutenção dos Diretores da Petrobrás. Como demonstrado acima, enquanto Presidente da República, LULA tinha poder para orquestrar o esquema. Tanto foi assim que, após deflagrada a "Operação Lava Jato", temendo pela revelação de seu envolvimento, LULA tentou impedir que um dos antigos Diretores participantes do esquema de propinas, NESTOR CERVERÓ, firmasse acordo de colaboração premiada com o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, conforme será destacado a seguir. Além disso, diversas pessoas do círculo de confiança de LULA estiveram envolvidas em casos de corrupção e, apesar de saírem do Governo, os escândalos de desvio de recursos públicos continuaram a acontecer, inclusive relacionado à RNEST, cujas obras despertaram especial interesse no ex-Presidente da República, conforme destacado a seguir; d) Pelos benefícios obtidos pelo Grupo ODEBRECHT junto à Petrobras, recebeu vantagens indevidas oferecidas e prometidas por MARCELO

41 CIRINO DOS SANTOS, Juarez. Direito Penal – parte geral. Florianópolis: Empório do Direito, 2017, 7a edição, p. 132­133.

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ODEBRECHT. A relação de proximidade com esse executivo e de outras empreiteiras envolvidas na Operação Lava Jato, reforça a ciência de LULA acerca da origem espúria dos recursos que lhe eram destinados, inclusive por meio dos aportes milionários nas instituições que levam o seu nome, como é o caso do INSTITUTO LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA e a L.I.L.S PALESTRAS, EVENTOS E PUBLICAÇÕES LTDA, conforme será descrito a seguir.

A acusação se lastreia – exclusivamente – no fato do Primeiro

Defendente, ocupando o mais alto cargo do poder executivo, ser o responsável por

nomear e manter Paulo Roberto Costa, Nestor Cerveró e Renato Duque no cargo de

diretores da Petrobrás para fins ilícitos.

Todavia, nunca foi atribuição do Presidente da República a

indicação e nomeação dos diretores da referida estatal, o que dependia da aprovação do

presidente e do conselho diretor da empresa, após rígido processo que passava por

outros órgãos de controle, tais como o Gabinete de Segurança Institucional e o

Ministério da Casa Civil.

Ademais, Paulo Roberto Costa esclareceu, em depoimento

prestado perante este Juízo42, que fora indicado pelo ex­deputado federal José Janene. Já

Nestor Cerveró esclareceu em seu acordo de colaboração premiada que sua indicação a

diretoria da Petrobrás ocorreu por indicação do ex­senador Delcídio do Amaral e Zeca

do PT. Renato Duque informou, em depoimento prestado junto ao MPF, não saber

quem o havia indicado para a diretoria de serviços da estatal.

Qual teria sido o ato de solicitar ou receber vantagens

indevidas, inerentes ao delito de corrupção?

O órgão acusador simplesmente aduz que o Primeiro

Defendente solicitou e recebeu vantagens concernentes a oito contratos firmados

pela empreiteira Odebrecht com a Petrobrás. NÃO HÁ QUALQUER MENÇÃO

OU DEMONSTRAÇÃO DO ATO OU CONDUTA QUE, EFETIVAMENTE,

SOLICITOU E/OU RECEBEU AS VANTAGENS ESPÚRIAS!

42 Depoimento de Paulo Roberto Costa nos autos da ação penal nº 5046512­94.2016.4.04.7000, em trâmite perante este Juízo.

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SE TAL IMPUTAÇÃO NÃO É VAGA E GENÉRICA,

NENHUMA MAIS O SERÁ!

Também no que tange ao crime de lavagem a imputação se

demonstra demasiadamente superficial.

A acusação se baseia na aquisição de dois imóveis, um situado na

Rua Haberbeck Brandão, que seria destinado ao Instituto Lula43, onde se teria utilizado

como pessoas interpostas a DAG CONSTRUTORA e o senhor Glaucos da

Costamarques, já que o Primeiro Defendente seria o real destinatário do imóvel,

supostamente arcado pela ODEBRECHT, em contraprestação aos atos corruptos

atribuídos ao ex­presidente.

Nessa transação, imputa­se ao senhor Glaucos Da Costamarques

o recebimento do valor de R$ 800 mil reais, montante do qual teria utilizado R$

504.000,000 para aquisição de imóvel situado na Avenida Francisco Prestes Maia nº

1.501, apartamento 121, São Bernardo do Campo/SP. Nessa nova aquisição, novamente

o Sr. Glaucos teria servido como interposta pessoa a fim de mascarar a suposta operação

de lavagem de capitais.

No contexto apresentado, o réu Glaucos teria agido em prol do

Primeiro Defendente para arcar com o custeio do imóvel e, desse modo, aparentar

licitude à aquisição dissimulada.

Já a Segunda Defendente teria celebrado contrato de locação –

alegadamente dissimulado pelo Parquet – com o réu Glaucos, o que, segundo a égide

acusatória, comprovaria a sua intenção de ocultar a real propriedade do bem, já que

supostamente adquirido por ordem e em benefício de seu marido.

CONTUDO, NÃO É POSSÍVEL AFERIR QUAIS SERIAM AS

43 Novamente cumpre ressaltar que o Primeiro Defendente não é – e jamais foi – proprietário do Instituto Lula. Decisões acerca de sua sede institucional cabiam – unicamente – à Diretoria da Instituição.

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CONDUTAS TÍPICAS QUE CARACTERIZAM OS CRIMES IMPUTADOS. OS

ATOS APONTADOS NA DENÚNCIA CARECEM DE QUALQUER ELEMENTO

INDICIÁRIO!

Impossível exercer o direito de defesa!

Seria de rigor a plena correspondência da denúncia aos requisitos

(a) de exposição do fato criminoso, (b) informado com todas as suas circunstâncias,

como exige o art. 41 do Código de Processo Penal.

No entanto, a realidade mostra que a acusação lançada em

desfavor dos Defendentes se limitou a imputações sobremaneira genéricas, sem a

indicação – de forma concreta e individualizada – das condutas delitivas imputadas.

A exordial acusatória – lacônica, genérica e superficial – afronta

de maneira acintosa o artigo 41 do Código de Processo Penal, bem como oblitera

qualquer possibilidade dos Defendentes exercerem a ampla defesa e o contraditório,

constitucionalmente garantidos.

Denúncia que não descreve o fato criminoso imputado,

limitando­se a reproduzir palavras da definição jurídica do fato, infringe não somente o

art. 41, do CPP, mas também viola o art. 5o, inciso LV, da Constituição Federal, que

garante os princípios do contraditório e da ampla defesa aos acusados em geral.

A descrição do fato criminoso na denúncia constitui,

simultaneamente, (a) a base sobre a qual se edifica o princípio do contraditório

processual e (b) o objeto sobre o qual se exerce o princípio da ampla defesa, no

processo penal. Assim, a tese acusatória deve constituir o fundamento do

contraditório penal e, ao mesmo tempo, o objeto de referência de produção da prova e

de construção dos argumentos da ampla defesa, assegurados aos acusados, em geral (art.

5o, LV, CF).

Mais: denúncia que, além de não descrever o fato criminoso –

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reduzido à reprodução da definição jurídica do fato imputado –, também não delimita o

momento histórico de configuração concreta do fato criminoso, reconhecendo,

expressamente, que teria ocorrido “em datas ainda não estabelecidas, mas

compreendidas entre 25/11/2004 e 23/01/2012” – ou seja, dentro do período de tempo

de 8 anos e 2 (dois) meses, ou em um dia qualquer de um lapso temporal de 2.980

dias – retira do fato criminoso a dimensão de tempo sem a qual não pode existir e,

consequentemente, destrói a realidade fenomênica do suposto fato criminoso imputado,

reforçando a infringência do art. 41, do CPP, assim como a lesão do art. 5o, inciso LV,

da Constituição Federal, que garante os princípios do contraditório e da ampla defesa

aos acusados em geral.

E ainda mais: denúncia que (a) não descreve as ações imputadas,

(b) não delimita o momento histórico do fato criminoso – que teria ocorrido em dia

indeterminado de um calendário de 8 anos e 2 (dois) meses, ou de 2.980 dias,

cancelando a dimensão de tempo do fato criminoso –, também (c) não indica o lugar,

no continuum do espaço tridimensional euclidiano, que teria sido preenchido pelo ou

em que teoria acontecido o fato criminoso imputado, igualmente retira do fato

criminoso a dimensão de espaço sem a qual também não pode existir e, portanto,

elimina a possibilidade de existência do fato criminoso imputado, reduzido a um nada

fenomênico e processual, ratificando, definitivamente, a lesão do art. 41, do CPP e a

violação do art. 5o, inciso LV, da Constituição Federal, que garante os princípios do

contraditório e da ampla defesa aos acusados em geral.

A lesão irreversível dos princípios do contraditório e da ampla

defesa, não só aniquila o devido processo legal assegurado pelo art. 5o, inciso LIV, da

Constituição Federal, mas determina a inépcia da denúncia, como peça incapaz de

iniciar uma ação penal válida.

Não há indicação pormenorizada das condutas que seriam

debitáveis aos Defendentes, o que faz impossível a identificação dos fatos que devem

ser efetivamente impugnados pela defesa.

Das 188 páginas – e 309 anexos – que compõem a peça inicial da

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acusação, grande parte se limita a uma narrativa fática truncada e impenetrável – que

remete ao ano de 2003 – na qual parece ser atribuída ao Primeiro Defendente a posição

de “comandante máximo” de um amplo esquema de corrupção.

Depara­se uma infindável gama de adjetivações em relação ao

Primeiro Defendente, inexistindo o mais fundamental a uma peça acusatória válida: os

verbos relativos aos núcleos dos tipos penais chamados à colação que, ao fim,

traduziriam a configuração dos arquétipos apontados na classificação jurídica deduzida,

tanto para o Primeiro Defendente, quanto à Segunda Defendente.

A excrescente extensão da denúncia visa – indubitavelmente – a

disfarçar a fragilidade das teses acusatórias lá expostas (expostas?), mas não a faz se

revestir dos pressupostos essenciais de validade.

Aqui, abre­se um parêntese para reiterar que quem redigiu o texto

contido na denúncia parece ser expert em ciência política e estratégia de

administração pública, pois emite conceitos e opiniões sobre temas como

“governabilidade”, perpetuação criminosa no poder” e afirmando que o Primeiro

Defendente “se tornou forte politicamente com o esquema que supostamente teria

chefiado”. Algum subscritor da presente exordial possui algum efetivo

conhecimento do funcionamento do Poder Legislativo ou, novamente, a

"convicção" é suficiente?

Sequer do ponto de vista lógico a acusação guarda coerência:

como imputar a alguém o comando de um estratagema corrupto que teria desviado 42

bilhões de reais44 se o seu suposto “chefe, arquiteto, comandante máximo e maior

beneficiário” teria aferido aproximadamente R$ 13 milhões de reais (sendo que

concernem de terreno que jamais foi utilizado pelo Primeiro Defendente e o outro foi

alugado, conforme contrato de locação em nome da Segunda Defendente)? Apenas o

gerente Pedro Barusco devolveu cerca de R$ 100 milhões de dólares no acordo que

celebrou...

44 Segundo dados da Polícia Federal e descrito na denúncia

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E como se pretender a restituição de R$ 75.434.399144 de quem

teria — segundo a tese acusatória — recebido o benefício de R$ 13 milhões? O

paradoxo é evidente.

Ainda em termos de incongruências, as imputações delituosas se

mostram em aberto conflito até com a deficitária narrativa fática veiculada na denúncia.

Centra­se a acusação na tese de que teria sido criado um “caixa

geral” de propina no âmbito do Partido dos Trabalhadores (PT), que teria também

beneficiado o Primeiro Defendente. Prova indiciária? Nenhuma! É a estratégia, na

lógica da guerra do lawfare. Sem qualquer materialidade, promove-se a acusação.

Qual, afinal, a tese acusatória?

Os oito contratos apontados como origem dos afirmados valores

ilícitos? Ou o “conjunto da obra”?

Não há como se defender em face de tamanha ambígua e

contraditória imputação.

Utiliza­se também a denúncia, em diversas passagens, de

referência a “datas ainda não estabelecidas”.

Examinem­se, a título exemplificativo, os trechos abaixo:

“Com efeito, em datas ainda não estabelecidas, mas compreendidas entre 25/04/2004 e 23/01/2012, LULA, de modo consciente e voluntário, em razão de sua função e como responsável pela nomeação e manutenção de RENATO DE SOUZA DUQUE [RENATO DUQUE] e PAULO ROBERTO COSTA nas Diretorias de Serviços e Abastecimento da PETROBRAS, solicitou, aceitou promessa e recebeu, direta e indiretamente, para si e para outrem, inclusive por intermédio de tais funcionários públicos, vantagens indevidas (...)” (p. 3). “Com efeito, em datas ainda não estabelecidas, mas compreendidas entre 25/04/2004 e 23/01/2012, LULA, de modo consciente e voluntário, em razão de sua função e como responsável pela nomeação e manutenção de RENATO DE SOUZA DUQUE [RENATO DUQUE] e PAULO ROBERTO COSTA nas Diretorias de Serviços e Abastecimento da PETROBRAS, solicitou, aceitou

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promessa e recebeu, direta e indiretamente, para si e para outrem, inclusive por intermédio de tais funcionários públicos, vantagens indevidas (...)” (p 80).

Portanto, o MPF não especificou sequer o momento em que

teriam ocorrido os fatos penalmente relevantes de sua tese acusatória. Chega a

apresentar, entre atos, intervalos de até 08 anos, tudo no campo das elucubrações!

Como seria possível à defesa técnica, por exemplo, comprovar eventuais álibis se

datas não são especificadas?

Em que pese a formação da opinio delicti ser privativa do

dominus litis, como corolário de sua independência funcional, o oferecimento de

denúncia precisa conter e explicitar os elementos formadores da opinio delicti, inclusive

apontando os indícios de autoria e a certeza da materialidade.

Embora seu munus institucional seja exercer o papel acusatório, o

Parquet deve postular o arquivamento da investigação criminal diante da ausência de

elementos que suportem qualquer pretensão punitiva.

Em análise de tal temática, AURY LOPES JR. leciona:

“(...) Quanto à clara exposição do fato criminoso, além da necessidade de plena compreensão por parte do juiz e da defesa (como se defender de uma acusação incompreensível?), exige-se, ainda, que em caso de concurso de agentes e/ou crimes exista uma clara definição de condutas e agentes. Ou seja, inadmissível uma denúnciagenérica que não faça a individualização da conduta principal por cada réu”. 45

Obviamente, a peça acusatória não precisa conter elaborada e

microscópica descrição fática, especialmente no momento inaugural da persecução

penal em juízo. Todavia, a exposição do fato criminoso, com todas as suas

circunstâncias, é condição sine qua non da viabilidade da denúncia.

Se não, o libelo inaugural estratifica imputação genérica – e, por

isso, inepta – impedindo o pleno exercício da defesa, tudo conforme exige o art. 41 do

codex procedimental criminal.

45 AURY LOPES JR, Direito Processual Penal, 12ª edição, 2015, p 203.

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Outra questão a ser levantada é: se o delito de organização

criminosa está em investigação ainda inconclusa perante o Supremo Tribunal Federal,

sob a condução do Procurador Geral da República, como pode a denúncia aqui embasar

todo o plexo acusatório na existência dessa mesma e hipotética organização criminosa?

Como, se sequer existem indícios mínimos do aperfeiçoamento de tal figura delituosa?

A jurisprudência é pacífica ao reconhecer como inepta a denúncia

que não oferece elementos suficientes ao exercício do contraditório e da ampla defesa.

Confiram­se os seguintes julgados do Supremo Tribunal Federal:

INQUÉRITO. IMPUTAÇÃO DOS CRIMES PREVISTOS NOS ARTS. 171 E 333

DO CÓDIGO PENAL E NOS ARTS. 19, PARÁGRAFO ÚNICO, E 20 DA LEI 7.492/1986. INDÍCIOS DE AUTORIA E MATERIALIDADE DEMONSTRADOS. SUBSTRATO PROBATÓRIO MÍNIMO PRESENTE. INÉPCIA PARCIAL DA INICIAL ACUSATÓRIA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS SUFICIENTES QUANTO À EXISTÊNCIA DO CRIME DE CORRUPÇÃO ATIVA. DENÚNCIARECEBIDA EM PARTE. 1. É indispensável que a inicial acusatória contenha descrição clara, lógica e coerente, de modo a permitir ao acusado entender a imputação e exercer seu direito de defesa, o que não ocorreu em relação ao crime de corrupção ativa. Nesse ponto específico, a denúncia, por insuficiência narrativa, deve ser tida como inepta por deixar de indicar elementos suficientes sobre a existência da suposta corrupção de funcionário público, em relação à qual, além disso, não se acha indícios suficientes para a instauração da persecução penal. 2. Todavia, quanto à imputação dos crimes previstos no art. 171 do Código Penal e nos arts. 19, parágrafo único, e 20 da Lei 7.492/1986, a denúncia contém adequada indicação da conduta delituosa imputada ao acusado e aponta os elementos indiciários mínimos aptos a tornar plausível a acusação, o que permite o pleno exercício do direito de defesa. 3. Denúncia recebida em parte. (Inq 2973, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, julgado em 10/02/2015, 19­03­2015)

No julgamento do HC 73.271, o decano CELSO DE MELLO

sabiamente ponderou:

“PERSECUÇÃO PENAL – MINISTÉRIO PÚBLICO – APTIDÃO DA DENÚNCIA. O Ministério Público, para validamente formular a denúncia penal, deve ter por suporte uma necessária base empírica, a fim de que o exercício desse grave dever-poder não se transforme em instrumento de injusta persecução estatal. O ajuizamento da ação penal condenatória supõe a existência de justa causa, que se tem por inocorrente quando o comportamento atribuído ao réu ‘nem mesmo em tese constitui crime, ou quando, configurando uma infração penal, resulta de pura criação mental da acusação’ (RF 150/393, Rel. Min. Orozimo Nonato). A peça acusatória deve conter a exposição do fato delituoso em toda a sua essência e com todas as suas circunstâncias. Essa narração, ainda que sucinta, impõe-se ao acusador

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como exigência derivada do postulado constitucional que assegura ao réu o pleno exercício do direito de defesa. Denúncia que não descreve adequadamente o fato criminoso é denúncia inepta.” (destacou­se)

Nos autos do HC 86.034, o Ministro GILMAR MENDES

sacramentou que “Denúncias genéricas, que não descrevem os fatos na sua devida

conformação, não se coadunam com os postulados básicos do Estado de Direito. Não

é difícil perceber os danos que a mera existência de uma ação penal impõe ao

indivíduo. Daí a necessidade de rigor e prudência por parte daqueles que têm o poder

de iniciativa nas ações penais e daqueles que podem decidir sobre o seu curso”

(destacou­se).

Vagueza é a palavra que qualifica adequada e perfeitamente a

acusação formulada pelo Ministério Público Federal nestes autos. Pelo entendimento do

Juízo, todavia, tudo é abrangido pelo contexto!

Sobre os requisitos da denúncia, focando­se especialmente na

imputação, leciona o Professor JOSÉ FREDERICO MARQUES:

“O que deve trazer os caracteres de certa e determinada, na peça acusatória, é a imputação. Esta consiste em atribuir à pessoa do réu a prática de determinados atos que a ordem jurídica considera delituosos; por isso, imprescindível é que nela se fixe, com exatidão, a conduta do acusado descrevendo-a o acusador, de maneira precisa, certa e bem individualizada. Uma vez que no fato delituoso tem o processo penal o seu objeto ou causa material, imperioso se torna que os atos, que o constituem, venham devidamente especificados, com a indicação bem clara do que se atribui ao acusado. A denúnciatem de trazer, de maneira certa e determinada, a indicação da conduta delituosa, para que em torno dessa imputação possa o juiz fazer a aplicação da lei penal, através do exercício de seus podêres jurisdicionais” 46 (destacou­se)

Destoante não é a doutrina de TORNAGHI:

“Refere-se o Código à exposição minuciosa, não somente do fato infringente em lei, como também de todos os acontecimentos que o cercam; não apenas de seus acidentes, mais ainda das causas, efeitos, condições, ocasião, antecedentes e consequentes.” (destacou­se) -----------------------------------------------------------------------------------------------.

“Levando em conta que o acusado é parte no processo e exatamente a parte fraca, contra a qual se pede a aplicação da lei, as ordenações amantes da

46 JOSÉ FREDERICO MARQUES, Elementos de Direito Processual Penal. Volume II. Companhia Editora Forense. São Paulo – Rio de Janeiro. 1961. Página 153).

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justiça procuram cercá-lo de todas as garantias. Não se trata apenas de liberalismo e muito menos de liberalidades; por isso não falei em ordenações liberais e sim em ordenações que prezam a justiça, porque o Estado não poderá estar certo de haver feito justiça e, por isso mesmo, não tranquilizara o homem de bem, se não der ao acusado a maior e mais ampla, a mais ilimitada possibilidade de defender-se. Entre as grandes conquistas da humanidade, inscritas nas Constituições modernas figura essa.”47 (destacou­se)

E, ainda, as exímias colocações de GIACOMOLLI:

"A admissibilidade de imputações genéricas, indeterminadas, obscuras, vagas, sem individualização da conduta de cada imputado representa um retrocesso material e processual à época da culpabilidade objetiva, com ofensa ao devido processo. (...) Além de apontar o autor, descrever o fato, com todas as suas circunstâncias, e fazer a devida adequação jurídica, a completude imputacional exige enunciação dos meios, seu direcionamento espacial e temporal. Isso tudo com densidade concreta e não genérica, pois não há como haver defesa efetiva contra enunciações etéreas, lançadas a esmo, sem vinculações fáticas e jurídicas, ou desprovidas das conexões relacionais entre fatos e sujeitos."48 (destacou­se) ­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­ "Quando a descrição fática é alternativa, genérica, contraditória, obscura ou com outros vícios não permissíveis da compreensão, resta prejudicado o amplo e pleno exercício defensivo, implicando ausência ou deficiência da defesa. A garantida da ampla defesa exige descrição objetiva, clara e delimitada da matéria fática, com qualificação jurídica pertinente, de modo a possibilitar a contraposição ampla e plena."49 (destacou­se)

O Ministro Celso de Mello, ao votar no HC 99.459, assim decidiu

com sua habitual propriedade:

“que o sistema jurídico vigente no Brasil impõe ao Ministério Público, quando este deduzir determinada imputação penal contra alguém, a obrigação de expor, de maneira individualizada, a participação das pessoas acusadas da suposta prática de infração penal, a fim de que o Poder Judiciário, ao resolver a controvérsia penal, possa, em obséquio aos postulados essenciais do direito penal da culpa e do princípio constitucional do “due process of law” e sem transgredir esses vetores condicionantes da atividade de persecução estatal, apreciar a conduta individual do réu, a ser analisada, em sua expressão concreta, em face dos elementos abstratos contidos no preceito primário de incriminação.Cumpre ter presente, desse modo, que se impõe ao Estado, no plano da persecução penal, o dever de definir, com precisão, a participação individual dos autores de quaisquer delitos." (destacou­se)

47 HELIO TORNAGHI. A relação processual penal. São Paulo: Saraiva, 1987 e Curso de Processo Penal, volume 1, p. 43. 48 NEREU JOSÉ GIACOMOLLI. O devido processo penal. Abordagem conforme a Constituição Federal e o Pacto de São José da Costa Rica. São Paulo: Atlas, 2014, p. 128. 49 Ibidem, p. 129.

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Na mesma linha são as decisões do Superior Tribunal de Justiça,

como se verifica no precedente abaixo:

“A inexistência absoluta de elementos hábeis a descrever a relação entre os fatos delituosos e a autoria ofende o princípio constitucional da ampla defesa, tornando inepta a denúncia, motivo pelo qual deve o Parquet repensar a questão, porque o Supremo Tribunal Federal tem decidido que denúnciagenérica não é escudo para que se escondam, em relação ao agente, fatos que não são devidamente descritos na peça inicial“ (Voto­vista do Min. GILSON DIPP, HC 41.452/RS, Relator Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, Quinta Turma, julgado em 03.05.2005). (destacou­se)

Sobre a acusação pertinente ao crime de corrupção passiva,

provindo de um suposto estratagema criminoso de monumental proporção, que,

segundo o Parquet foi comandado pelo Primeiro Defendente, vale lembrar que tal

imputação – não desconsiderando o fato da incompetência desta instância para tal – se

lastreia exclusivamente no cargo ocupado pelo Primeiro Defendente no poder

Executivo Federal.

Desse modo, não há dúvidas que o Parquet busca a

responsabilização objetiva do Primeiro Defendente, a despeito desta ser unanimemente

afastada pela doutrina e jurisprudência dentro do Direito Penal.

Tal vedação é corroborada pelos Tribunais Superiores:

Ementa: Processo Penal. Ação Penal. Questão de Ordem. Denúncia Recebida na Instância de Origem. Manifestação do Procurador-Geral da República pelo Trancamento. Peculato. Indisponibilidade da Ação Penal. Ausência de Justa Causa. Habeas Corpus Concedido de Ofício. 1. Nos termos da orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal a partir do julgamento do INQ 571, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, a alteração da competência inicial em face de posterior diplomação do réu não invalida os atos regularmente praticados, devendo o feito prosseguir da fase em que se encontre, em homenagem ao princípio tempus regit actum (Inq 1459, Rel. Min. Ilmar Galvão). 2. O regular oferecimento e recebimento da denúncia perante o juízo natural à época dos atos desautoriza o pedido de arquivamento formulado nesta fase processual, em homenagem ao princípio da obrigatoriedade da ação penal. 3. Não demonstrado pela acusação o dolo do acusado na autorização da despesa e incluído no polo passivo exclusivamente em razão de sua posição hierárquica, fica evidenciada a ausência de justa causa para o prosseguimento da ação penal. 4. Habeas corpus concedido de ofício.50

50 STF, AP 905 QO, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 23/02/2016

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------------------------------------------------------------------------------------------------ PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. CRIME CONTRA A RELAÇÃO DE CONSUMO. INÉPCIA DA DENÚNCIA. NULIDADE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. OCORRÊNCIA. AUSENTES OS REQUISITOS DO ART. 41, DO CPP. RECURSO PROVIDO. I - A alegação de inépcia da denúncia deve ser analisada de acordo com o que dispõe os art. 41, do CPP, e o art. 5º, LV, da CF/88. A peça acusatória deve conter a exposição do fato delituoso em toda a sua essência e com todas as suas circunstâncias. Denúncias genéricas, que não descrevem os fatos na sua devida conformação, não se coadunam com os postulados básicos do Estado de Direito (HC 86.000/PE, Segunda Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJU de 2/2/2007). A inépcia da denúncia caracteriza situação configuradora de desrespeito estatal ao postulado do devido processo legal. II - In casu, a inicial acusatória não preenche os requisitos exigidos pelo art. 41 do CPP. O simples fato de o recorrente exercer o cargo de gerente de produção não possui o condão de autorizar a imediata subsunção ao preceito primário, ante a ausência da narrativa do elemento objetivo do tipo. (Precedente). III - Trata-se, na espécie, de responsabilização objetiva, visto não haver a descrição do nexo causal exigido pelo art. 41, do CPP. Deveria o Parquet estadual ter evidenciado qual foi, in casu, a contribuição do recorrente na cadeia produtiva, circunstância esta apta a caracterizar, em tese, o delito em questão, sob pena de inépcia da denúncia, como de fato ocorreu. Recurso ordinário provido.51 ­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­ PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. 1. INÉPCIA DA DENÚNCIA. DESCRIÇÃO INSUFICIENTE DOS FATOS. NULIDADE ABSOLUTA. OCORRÊNCIA. PREJUÍZO À AMPLA DEFESA FLAGRANTE. 2. CRIMES SOCIETÁRIOS. MERA QUALIDADE DE SÓCIO. NÃO DEMONSTRAÇÃO DE NEXO DE CAUSALIDADE MÍNIMO. IMPOSSIBILIDADE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. 3. ORDEM CONCEDIDA. 1. Não tendo sido expostos os fatos imputados à paciente de forma suficiente, em atendimento aos requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal, e causando flagrante prejuízo à ampla defesa, é se reconhecer a nulidade absoluta da denúncia. 2. Mesmo em se tratando de crimes societários, é indispensável a indicação de uma conduta que se ligue minimamente ao resultado, não bastando a referência à condição de sócio, sob pena de responsabilização de caráter objetivo. 3. Ordem concedida para anular o processo, desde a denúncia, dando oportunidade para que outra seja proferida, com a adequada exposição do fato.52

51 STJ, RHC 37.864/BA, Relator: Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 17/03/2015. 52 STJ, HC 50.804/SP, Relatora: Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 11/11/2008.

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Ainda sobre o tema, oportuno o seguinte excerto do voto do

Ministro Luis Roberto Barroso no procedimento acima colacionado, no qual se assentou

que "Permitir que o acusado seja submetido a processo exclusivamente pela posição

hierárquica superior que ocupava, no caso chefe do DEOESP, viola as regras quanto

à autoria e participação que regem o direito penal brasileiro. Deve haver indícios de

que o acusado atuou com dolo, o que não se verifica no caso dos autos. Ademais, o

mero dever de saber não é suficiente para uma condenação em razão de ensejar uma

responsabilização objetiva. Não cabe presunção in malan partem, ante o princípio da

não culpabilidade (art. 5º, LVII da Constituição Federal)".

A vedação à analogia in malan partem também é corroborada

pela doutrina53:

"A atribuição de significados fundados no espírito da lei encobre a criação judicial de direito novo, mediante juízos de probabilidade da psicologia individual, assim resolvidos no Direito Penal: se o significado concreto representar prejuízo para o réu, constitui analogia proibida; se o significado concreto representar benefício para o réu, constitui analogia permitida".

O entendimento no direito comparado não diverge. Válido citar

o magistério de GIUSEPPE BETTIOL:

“Para que se possa formar um juízo de culpabilidade sob forma de reprovação é necessário que subsista entre o agente e o fato um nexo psicológico, que assume a forma normal do dolo ou a excepcional da culpa ou da preterintenção (...). Punir sem voluntariedade do evento lesivo parece contrastar com as mais elementares exigências éticas das quais o direito penal sempre emana”54

Como dito, a denúncia necessita ser clara, contendo a completa

descrição da(s) conduta(s) típica(s), com todas suas circunstâncias, fazendo a

"enunciação dos meios e seus direcionamentos espacial e temporal".

Não se pode conceber que a narração dos fatos imputados se

mostre de tal forma indigente, que sequer permita aos Defendentes compreender do que

– e o porquê – é acusado. Inexiste, evidentemente, uma narrativa clara, lógica e

53 CIRINO DOS SANTOS, Juarez, Direito Penal Parte Geral, Ed. Empório do Direito, 7ª edição, 2017, p. 23/24. 54 BETTIOL, Giuseppe. Direito Penal, Ed. RT, Volume II, p. 133.

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coerente que permita aos Defendentes compreender a tese acusatória e exercer

adequadamente o seu direito à ampla defesa.

Tais exigências são impostas pelo artigo 41 do Código de

Processo Penal, visando a resguardar o contraditório e a ampla defesa, princípios –

insista­se – inegavelmente desatendidos, pois a acusação reclama dos Defendentes a

adivinhação da conduta que lhe está sendo imputada.

Logo, a deficiência indicada desencadeia a inépcia da inicial,

tendo em vista não ter a exordial plena aptidão para produzir efeitos jurídicos.

Nesse contexto, ao ofertar denúncia sem a necessária descrição da

conduta referente ao ilícito penal e ausentes indícios de autoria e materialidade, o Órgão

Ministerial impossibilita aos Defendentes o regular – e devido – exercício de sua

defesa.

Em suma, a acusação é absolutamente especulativa, sem

baldrame fático. São imputados crimes aos Defendentes, sem, todavia, a especificação

das condutas supostamente criminosas na denúncia.

Em progressiva sintonia, não deve prosperar o possível

entendimento de que a formulação do exercício da defesa, pela resposta à acusação,

faria convalescer a inépcia da peça acusatória.

Tal premissa nulificaria o fato de que a denúncia oferecida nestes

autos – flagrantemente inepta e carente de justa causa – sequer deveria ter sido

recebida.

Os Defendentes, considerando ser esta sua única alternativa,

elaboram a resposta à acusação da melhor forma que conseguem. Todavia, o exercício

da defesa – indevidamente restrito – não significa uma coadunação com a deficiência

da exordial acusatória, tampouco ratifica as transgressões ao artigo 41 do Código de

Processo Penal.

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III.4.1. – OS CONTRATOS ORIGINÁRIOS DAS VANTAGENS INDEVIDAS

As pretensas ofertas, as promessas e os recebimentos das

vantagens indevidas teriam ocorrido dentro do lugar­comum de um amplo esquema

criminoso – um rótulo que representa o máximo de concretização alcançável pela

denúncia – de corrupção ativa imputável aos executivos das empresas cartelizadas, e

de corrupção passiva imputável aos funcionários públicos, responsáveis pelo zelo dos

interesses das empresas cartelizadas e dos partidos políticos, no âmbito da

administração pública, segundo a denúncia (fl. 81).

Os atos de corrupção, nas formas ativa e passiva, teriam ocorrido

nos seguintes contratos celebrados pela PETROBRAS e os Consórcios (i) da CONPAR,

(ii) da REFINARIA ABREU E LIMA, (iii) da COMPERJ, (iv) da ODEBEI, (v) da

ODEBEI PLANGÁS, (vi) da ODEBEI FLARE, (vii) da ODETECH e (viii) do RIO

PARGUAÇU, a seguir analisados (fls. 82 s).

III.4.1.1 – O CONSÓRCIO CONPAR

No contrato do Consórcio CONPAR, para execução de obras na

Refinaria Getúlio Vargas – REPAR (Araucária, PR), com procedimentos licitatórios

conduzidos por PEDRO BARUSCO e por RENATO DUQUE (Serviços), em conjunto

com PAULO ROBERTO COSTA (Abastecimento), realizados em 26/10/2006, os

dados iniciais eram os seguintes: a) valor sigiloso de R$1.475.523.355,8; b) proposta

vencedora da ODEBRECHT, no valor de R$2.079.593.082,66, desclassificada por

exceder o máximo permitido; c) negociação direta autorizada pela Diretoria Executiva,

conduzida por PEDRO BARUSCO, com contrato celebrado pelo valor de

R$1.821.012.130,93 (com 13 aditivos posteriores), em 31/08/2007, apesar da CIA da

PETROBRAS indicar irregularidades (i) de alteração substancial das condições

contratuais, (ii) de proposta acima da faixa de admissibilidade e, por consequência, (iii)

de não recomendação pelo Departamento Jurídico (fls. 82­3).

A omissão dos deveres de ofício. Nessas condições – ou “nessa

senda”, segundo o chavão da denúncia –, MARCELO ODEBRECHT teria oferecido

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ou prometido vantagem indevida (a) a RENATO DUQUE, PEDRO BARUSCO e

PAULO ROBERTO COSTA, para omitirem deveres de ofício permitindo a escolha

interna do cartel para execução da obra, e (b) o Primeiro Defendente, que se

beneficiava da manutenção do esquema e da permanência dos diretores nos respectivos

cargos (fl. 84).

As mágicas vantagens ilícitas no interesse do Primeiro

defendente. Formalizada a contratação, MARCELO ODEBRECHT (através dos

subordinados Rogério Araújo, Márcio Faria e César Rocha) teria realizado o repasse das

“vantagens ilícitas no interesse de LULA”, correspondentes a 3% (2% para Diretoria de

Serviços e 1% para Diretoria de Abastecimento) sobre o valor de R$2.331.785.556

(fl.84­5).

A imputação parcial. A imputação parcial dos tipos legais de

corrupção ativa e de corrupção passiva está equacionada na denúncia, discorrendo

que MARCELO ODEBRECHT teria oferecido, teria prometido e teria pago

“vantagens ilícitas no interesse de LULA” (e de RENATO DUQUE, PEDRO

BARUSCO E PAULO ROBERTO COSTA), referentes às taxas de 2% para a Diretoria

de Serviço, no valor de R$23.785.55,21 e de 1% para a Diretoria de Abastecimento, no

valor de R$11.892.778,10 – correspondentes à participação de 51% da ODEBRECHT

no Consórcio CONPAR (fl. 85).

III.4.1.2. – CONSÓRCIO REFINARIA ABREU E LIMA

No contrato do Consórcio REFINARIA ABREU E LIMA, para

execução de obras de construção e montagem da RNEST, os procedimentos licitatórios

foram conduzidos por PEDRO BARUSCO e por RENATO DUQUE (Serviços),

realizados em 03/05/2007, com a assinatura de um contrato no valor de R$

429.207.776,71, com ajustes ilícitos antes, durante e depois dos procedimentos

licitatórios (segundo a delação premiada AUGUSTO RIBEIRO, nota 265) (fls. 87­

89).

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A omissão dos deveres de ofício. Nessa “senda” – para seguir o

chavão da denúncia –, MARCELO ODEBRECHT teria oferecido ou prometido

vantagem indevida (a) a RENATO DUQUE, PEDRO BARUSCO e PAULO

ROBERTO COSTA, para omitirem deveres de ofício permitindo a escolha interna do

cartel para execução da obra, bem como (b) o Primeiro Defendente, que se beneficiava

da manutenção do esquema e da permanência dos diretores nos respectivos cargos (fl.

87­88).

A imputação e as supostas vantagens ilícitas no interesse do

Primeiro Defendente. A imputação parcial dos tipos legais de corrupção ativa e de

corrupção passiva está equacionada na denúncia, discorrendo que MARCELO

ODEBRECHT, no período compreendido entre 03/05/2007 e 01/04/2011 – portanto,

no lapso temporal de 3 anos e 11 meses –, teria oferecido, teria prometido e teria pago

“vantagens ilícitas no interesse de LULA”, referentes às taxas de 2% para a Diretoria

de Serviço, no valor de R$2.670.859,31 e de 1% para a Diretoria de Abastecimento, no

valor de R$1.335.429,65 – correspondentes à participação de 25% da ODEBRECHT no

Consórcio Abreu e Lima (fl. 89).

III.4.1.3. – CONSÓRCIO COMPERJ

No contrato do Consórcio COMPERJ, para execução dos

serviços de projeto e execução de obras de terraplenagem, drenagem e anel viário do

Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro, comandado por PAULO ROBERTO

COSTA (Abastecimento), os procedimentos licitatórios foram iniciados perante

PEDRO BARUSCO e RENATO DUQUE (Serviços), realizados em 20/12/2007, com a

assinatura de um contrato no valor de R$ 429.207.776,71, com ajustes ilícitos antes,

durante e depois dos procedimentos licitatórios (segundo a delação premiada de

AUGUSTO RIBEIRO, nota 272) (fls. 90). A observação curiosa é a seguinte, segundo

a Denúncia: o conluio das empresas não significa preço superior à estimativa sigilosa

da PETROBRAS, fixada em R$1.100.043.832,86, enquanto a proposta do consórcio

foi de R$819.800.000,00 – ou seja, 37% menor – e, apesar da diferença superior à

permitida, a empresa teria sido contratada por ser uma das maiores do País.

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A omissão dos deveres de ofício. Nessa “senda” – conforme o

chavão da Denúncia –, executivos da ODEBRECHT teriam prometido e pago propinas

a PEDRO BARUSCO, RENATO DUQUE e PAULO ROBERTO COSTA, para

omitirem deveres de ofício, permitirem a escolha interna do cartel para execução da

obra e tomarem as medidas necessárias para a contratação (fl. 92).

A imputação e as supostas vantagens ilícitas no interesse do

Primeiro Defendente. A imputação parcial dos tipos legais de corrupção ativa e de

corrupção passiva está equacionada na denúncia, discorrendo que MARCELO

ODEBRECHT, no período compreendido entre 20/12/2007 e 08/09/2010 – portanto,

no lapso temporal de 2 anos e 9 meses –, teria oferecido, teria prometido e (através dos

subordinados Rogério Araújo, Márcio Faria e Cesar Rocha) teria efetivamente pago

“vantagens indevidas no interesse de LULA”, referentes às taxas de 2% para a

Diretoria de Serviço, no valor de R$7.864.848,90 e de 1% para a Diretoria de

Abastecimento, no valor de R$3.932.424,45 – correspondentes à participação de 33%

da ODEBRECHT no Consórcio COMPERJ (fl. 92).

III.4.1.4. – CONSÓRCIO ODEBEI

No contrato do Consórcio ODEBEI, para execução das obras de

construção e montagem da Unidade de Processamento de Condensado de Gás Natural II

(além de outros trabalhos), os procedimentos licitatórios foram realizados em

20/12/2007 e conduzidos por PEDRO BARUSCO e RENATO DUQUE (Diretoria de

Serviços), com a assinatura de um contrato no valor de R$ 192.208.462,65, com ajustes

ilícitos antes, durante e depois dos procedimentos licitatórios (segundo a delação

premiada de AUGUSTO RIBEIRO, nota 286) (fl. 93).

A omissão dos deveres de ofício. Nessas condições, executivos

da ODEBRECHT teriam prometido e pago propinas a PEDRO BARUSCO e

RENATO DUQUE, para omitirem deveres de ofício, permitirem a escolha interna do

cartel para execução da obra e tomarem as medidas necessárias para a contratação (fl.

95).

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59

A imputação e as supostas vantagens ilícitas no interesse do

Primeiro Defendente. A imputação parcial dos tipos legais de corrupção ativa e de

corrupção passiva está equacionada na denúncia, discorrendo que MARCELO

ODEBRECHT, no período compreendido entre 25/11/2004 e 26/12/2007 – portanto,

no lapso temporal de 3 anos e 1 mês – teria oferecido, teria prometido e (através dos

subordinados Rogério Araújo e Márcio Faria) teria efetivamente pago “vantagens

indevidas no interesse de LULA”, referentes às taxas de 2% para a Diretoria de

Serviço, no valor de R$1.681.943,41 – correspondentes à participação de 42,5% da

ODEBRECHT no Consórcio ODEBEI (fl. 96).

III.4.1.5. – CONSÓRCIO ODEBEI PLANGÁS

No contrato do Consórcio ODEBEI PLANGÁS, para execução

dos serviços de Implementação da Unidade de Processamento de Gás Natural (e outros

trabalhos), os procedimentos licitatórios foram realizados em 24/08/2006 e conduzidos

por PEDRO BARUSCO e RENATO DUQUE (Diretoria de Serviços), com valor

estimado de R$386.683.598,18, mas contrato celebrado no valor de R$ 453.507.494,00

em face da inviabilidade fática de novo contrato em tempo hábil (fls. 96­97).

A omissão dos deveres de ofício. Nessas condições, executivos

da ODEBRECHT teriam prometido e pago propinas a PEDRO BARUSCO e

RENATO DUQUE, para omitirem deveres de ofício, permitirem a escolha interna do

cartel para execução da obra e tomarem as medidas necessárias para a contratação (fls.

97­98).

A imputação e as supostas vantagens ilícitas no interesse do

Primeiro Defendente. A imputação parcial dos tipos legais de corrupção ativa e de

corrupção passiva está equacionada na denúncia, discorrendo que MARCELO

ODEBRECHT, no período compreendido entre 24/08/2006 e 28/05/2009 – portanto,

no lapso temporal de 2 anos e 9 meses – teria oferecido, teria prometido e (através dos

subordinados Rogério Araújo e Márcio Faria) teria efetivamente pago “vantagens

indevidas no interesse de LULA”, referentes às taxas de 2% para a Diretoria de

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Serviço, no valor de R$4.539.511,67 – correspondentes à participação de 50% da

ODEBRECHT no Consórcio ODEBEI PLANGÁS (fl. 98).

III.4.1.6. – CONSÓRCIO ODEBEI FLARE

No contrato do Consórcio ODEBEI FLARE, para construção do

novo sistema de Tocha do tipo Ground Flare e interligações no Terminal Cabiúna, os

procedimentos licitatórios foram realizados em 02/08/2007 e conduzidos por PEDRO

BARUSCO e RENATO DUQUE (Diretoria de Serviços), com ajustes ilícitos antes,

durante e depois da licitação (cf. delação premiada de AUGUSTO RIBEIRO, nota

312) e contrato no valor de R$142.098.697,71 (fl. 99).

A omissão dos deveres de ofício. Nessas condições, executivos

da ODEBRECHT teriam prometido e pago propinas de 2% do valor do contrato a

PEDRO BARUSCO e RENATO DUQUE, para omitirem deveres de ofício, permitirem

a escolha interna do cartel para execução da obra e tomarem as medidas necessárias

para a contratação (fl. 100).

A imputação e as supostas vantagens ilícitas no interesse do

Primeiro Defendente. A imputação parcial dos tipos legais de corrupção ativa e de

corrupção passiva está equacionada na denúncia, discorrendo que MARCELO

ODEBRECHT, no período compreendido entre 02/08/2007 e 11/12/2009 – portanto,

no lapso temporal de 2 anos e 4 meses – teria oferecido, teria prometido e teria

efetivamente pago “vantagens indevidas, no interesse de LULA”, referentes às taxas de

2% para a Diretoria de Serviço, no valor de R$1.423.997,73 – correspondentes à

participação de 50% da ODEBRECHT no Consórcio ODEBEI FLARE (fl. 100).

III.4.1.7. – CONSÓRCIO ODETECH

No contrato do Consórcio ODETECH, para execução das obras

de construção e montagem do gasoduto GADUC II – Pacote 1, os procedimentos

licitatórios foram iniciados em 31/01/2008 e conduzidos por PEDRO BARUSCO e

RENATO DUQUE (Diretoria de Serviços), com ajustes ilícitos antes, durante e depois

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da licitação (cf. delação premiada de AUGUSTO RIBEIRO, nota 320, Anexo 49) e

contrato reduzido, após negociação, para o valor de R$639.400.000,00 (fl. 102).

A omissão dos deveres de ofício. Nessas condições, executivos

da ODEBRECHT teriam prometido e pago propinas de 2% do valor do contrato a

PEDRO BARUSCO e RENATO DUQUE, para omitirem deveres de ofício, permitirem

a escolha interna do cartel para execução da obra e tomarem as medidas necessárias

para a contratação (fl. 103).

A imputação e as supostas vantagens ilícitas no interesse do

Primeiro Defendente. A imputação parcial dos tipos legais de corrupção ativa e de

corrupção passiva está equacionada na denúncia, discorrendo que MARCELO

ODEBRECHT, no período compreendido entre 31/01/2008 e 15/07/2010 – portanto,

no lapso temporal de 1 ano e 6 meses – teria oferecido, teria prometido e (através dos

subordinados Rogério Araújo e Marcio Faria) teria efetivamente pago “vantagens

indevidas, no interesse de LULA”, referentes às taxas de 2% para a Diretoria de

Serviço, no valor de R$7.569.921,43 – correspondentes à participação de 50% da

ODEBRECHT no Consórcio ODETECH (fl. 103).

III.4.1.8. – CONSÓRCIO RIO PARAGUAÇU

No contrato do Consórcio RIO PARAGUAÇU, para construção

das plataformas de perfuração autoelevatórias P­59 e P­60, os procedimentos licitatórios

foram iniciados em 21/06/2007 e conduzidos por PEDRO BARUSCO e RENATO

DUQUE (Diretoria de Serviços), com contrato celebrado no valor de

US$351.789.000,00 para cada plataforma (valor estimado de US$288.000.000,00) (fl.

105).

A omissão dos deveres de ofício. Nessas condições, executivos

da ODEBRECHT teriam prometido e pago propinas de 2% do valor do contrato a

PEDRO BARUSCO e RENATO DUQUE, para omitirem deveres de ofício, permitirem

a escolha interna do cartel para execução da obra e tomarem as medidas necessárias

para a contratação (fl. 106).

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A imputação e as supostas vantagens ilícitas no interesse do

Primeiro Defendente. A imputação parcial dos tipos legais de corrupção ativa e de

corrupção passiva está equacionada na denúncia, discorrendo que MARCELO

ODEBRECHT, no período compreendido entre 21/06/2007 e 03/08/2011 – portanto,

no lapso temporal de 4 anos e 2 meses –, em conjunto com Marcio Faria e Rogério

Araújo, teria oferecido, teria prometido e teria efetivamente pago “vantagens indevidas,

no interesse de LULA”, relativas às taxas de 2% para a Diretoria de Serviço, no valor

de US$4.816.980,35 (ou R$8.737.128,56) – correspondentes à participação de 33,33%

da ODEBRECHT no Consórcio RIO PARAGUAÇU (fl. 106).

III.4.1.9. – CONSIDERAÇÕES

Em todos os consórcios, o Parquet tenta de forma frustrada

imputar que o Primeiro Defendente, de modo consciente e voluntário, e em razão da

função, como responsável pela nomeação e pela manutenção de RENATO DUQUE e

de PAULO ROBERTO COSTA, teria solicitado, teria aceito e teria recebido de forma

direta e indireta, vantagens indevidas para si e para outrem, também por intermédio

dos funcionários citados.

Coloca, também, que PAULO ROBERTO COSTA, RENATO

DUQUE, que “contavam com LULA para sua manutenção nos cargos”, além de

PEDRO BARUSCO, todos “cientes do macroesquema partidário de corrupção

comandado por LULA”, também aceitaram e receberam, para si e para outrem, as

vantagens indevidas pagas pela ODEBRECHT.

Análise da imputação. Novamente, considerando o padrão de

imputação da denúncia em relação a cada contrato – e também deixando de lado, pelas

razões indicadas, as óbvias insuficiências e insanáveis defeitos das imputações contra

os demais acusados –, subsistem as mesmas insuperáveis objeções preliminares em

relação à imputação contra o Primeiro Defendente, que precisam ser reproduzidas,

por necessidades do contraditório processual e da própria defesa técnica do ex­

Presidente da República, existem objeções preliminares insuperáveis.

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A definição das vantagens ilícitas que teriam sido oferecidas, ou

prometidas, ou pagas por MARCELO ODEBRECHT, como sendo “no interesse de

LULA”, é gratuita ou frívola e, por isso, inteiramente abusiva: constitui uma

hipótese acusatória que, por razões políticas óbvias, os agentes da Força Tarefa

atuantes na Operação Lava Jato pretendem fazer prevalecer sobre os fatos, na linha

de conhecidas tendências paranoico­repressivas do capitalismo neoliberal.

A atribuição subjetiva do fato, contida no clichê de ofício da

expressão “de modo consciente e voluntário”, é imprestável do ponto de vista dos

requisitos da descrição típica da denúncia, como fundamento e como objeto do

contraditório e da ampla defesa no processo penal:

a) a denúncia não descreve o modo pelo qual o acusado teria tido

consciência do fato imputado, como representação psíquica dos elementos objetivos do

tipo legal de corrupção passiva – por exemplo, como teria sido representada no

psiquismo do agente a ação de solicitar, ou a ação de receber, ou a ação de aceitar

promessa de vantagem indevida, necessária para configurar o dolo como vontade

consciente de realizar um tipo de crime;55

b) a denúncia não descreve o modo pelo qual o acusado teria tido

vontade de realizar o fato imputado, no sentido de projeção de energia psíquica dirigida

à lesão do bem jurídico (fundada na representação psíquica dos elementos objetivos do

tipo de injusto), consistente na ação de solicitar, ou de receber, ou de aceitar promessa

de vantagem indevida, que constitui o dolo do tipo de crime imputado.56

E a questão central em qualquer denúncia: a atribuição objetiva

do fato é imprestável do ponto de vista dos requisitos da descrição típica da denúncia –

como fundamento e como objeto do contraditório e da ampla defesa no processo penal

–, porque as ações reais de solicitar, ou de receber, ou de aceitar promessa, cuja

concretude fenomênica são perceptíveis pelos sentidos e descritíveis pela linguagem,

55 CIRINO DOS SANTOS, Juarez. Direito Penal – parte geral. Florianópolis: Empório do Direito, 2017, 7a edição, p. 132­133. 56 CIRINO DOS SANTOS, Juarez. Direito Penal – parte geral. Florianópolis: Empório do Direito, 2017, 7a edição, p. 133­134.

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não são indicadas nem mesmo sob a forma inútil de clichês de ofício – tão ao gosto dos

órgãos de acusação – na lacunosa e inepta denúncia do MPF.

No âmbito do tipo objetivo aparecem as questões decisivas da

denúncia, do ponto de vista da descrição do fato imputado – e, portanto, as questões

centrais da dogmática penal, do ponto de vista da estrutura do tipo de crime – como,

por exemplo: a) a ação ou omissão, que constituem a causa do crime, sem a qual o

resultado não pode ocorrer; b) o resultado – de que depende a existência do crime –

imputável ao autor da ação ou da omissão, como causas do crime; c) e, finalmente, a

relação de causalidade entre a ação ou omissão e o resultado de lesão do bem jurídico.

Esses são os fundamentos teóricos e práticos da principal regra do moderno Direito

Penal, definida na abertura do Título II (DO CRIME), do Código Penal, sob a rubrica

relação de causalidade:

Art. 13. O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido.

A denúncia ignora completamente a norma fundante do Direito

Penal para qualquer imputação penal:

a) não descreve a forma de realização das ações reais de solicitar,

ou de receber, ou de aceitar promessa, cuja concretude fenomênica, perceptível pelos

sentidos, deveria ser descrita pela linguagem da denúncia e, assim, é impossível saber

(i) se a ação de solicitar teria sido realizada pela fonética da palavra falada, ou pela

forma gráfica de um texto escrito, ou por simples gestos ou expressões corporais de

mímica significativa, (ii) se a ação de aceitar promessa teria sido comunicada pelo

discurso falado ou pela forma escrita, ou também por meio de gestos ou expressões

mímicas e, enfim, (iii) se a ação de receber teria por objeto dinheiro em espécie, ou

dação em pagamento, ou depósito bancário, ou créditos etc.;

b) não descreve a produção do resultado típico, (i) de natureza

formal nas modalidades de solicitar ou de aceitar promessa e (ii) de natureza material

na modalidade de receber, mas sempre é preciso indicar como se produz o efeito

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psíquico da ação de solicitar no sujeito passivo, ou da ação de aceitar promessa no

funcionário público, ou como se materializou a ação de receber a vantagem indevida

em relação ao autor de corrupção passiva.

c) e, finalmente, não descreve a relação de causalidade entre

ação e resultado típicos, essencial em todas as modalidades típicas previstas no crime

de corrupção passiva e, assim, é impossível saber (i) como, (ii) ou de que modo, (iii)

ou quando a ação imputada ao acusado determinaram a produção do resultado típico

de lesão do bem jurídico.

Essa é a denúncia da Força Tarefa do MPF atuante na Operação

Lava Jato: além de temerária, leviana e abusiva, como demonstrado, se limita a

reproduzir as palavras da lei penal.

Para verificar a extensão do disparate acusatório da Denúncia do

MPF, basta imaginar, por exemplo, crimes de homicídio, ou de lesões corporais, assim

imputados: X, de modo consciente e voluntário, matou Y; ou Z, de modo consciente e

voluntário, ofendeu a integridade corporal de outrem.

Uma denúncia assim formulada, que se limita a reproduzir as

palavras da lei, seria considerada inepta, porque: não indica (a) a ação realizada pelo

autor, com as circunstâncias (i) de tempo (quando), (ii) de lugar (onde), (iii) de modo

de execução (como), (iv) de meios utilizados (instrumentos), assim como não indica

(b) o resultado produzido, como consequência causal da ação realizada (natureza e

local das lesões no corpo da vítima), bem como não demonstra (c) a relação de

causalidade entre a ação e o resultado típico.

Em consequência, inviabiliza o princípio do contraditório e da

ampla defesa, que se fundamenta na ou que tem por objeto a exposição do fato

criminoso, com todas as suas circunstâncias (art. 41, CPP).

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III.4.2 – A HIPOTÉTICA “AÇÃO CRIMINOSA DE LULA”

O capítulo intitulado “a ação criminosa de LULA” constitui um

longo e confuso discurso regido pela lógica que caracteriza a Operação Lava Jato,

desde o seu infausto nascedouro: a lógica do discurso repressivo neoliberal fundado na

prevalência da hipótese sobre os fatos no sistema penal. Essa é a lógica da pregação

moralista que subordina a realidade concreta do mundo da vida aos imperativos

idiossincráticos das crenças pessoais, messiânicas e conservadoras, próprias de

intelectuais orgânicos do capital, na fase atual de reorganização neoliberal da economia

mediante emprego crescente dos aparelhos repressivos do Estado. Em suma, a lógica do

discurso midiático da Força Tarefa do MPF atuante na Operação Lava Jato, sintetizada

na expressão: não temos provas, mas temos convicção!

III.4.2.1 – AS HIPÓTESES DO DISCURSO ACUSATÓRIO

A lógica da denúncia aparece em certas hipóteses simplistas da

teoria do domínio do fato, claramente produzidas pela necessidade político­criminal­

partidária de viabilizar uma argumentação processual condenatória, mas ao preço

absurdo de subordinar a complexidade do real dentro dos limites de proposições

voluntaristas, que podem ser assim sintetizadas:

i) O Primeiro Defendente teria o domínio da empreitada

criminosa, porque ocupava o cargo público de maior

hierarquia, com plenos poderes para decidir sobre sua

prática, interrupção e circunstância (fl. 107);

ii) A ação coordenada pelo Primeiro Defendente na

engrenagem criminosa, mediante nomeação de Diretores

da Petrobras comprometidos com o desvio de recursos

públicos, teria o objetivo de realizar as metas (i) de

enriquecer ilicitamente, (ii) de obter recursos para um

projeto político­partidário de poder e (iii) de garantir

governabilidade (fl. 107).

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Essas hipóteses do discurso acusatório, aplicadas em toda a

narrativa da denúncia, aparecem claramente no seguinte trecho introdutório do capítulo:

“Nesse contexto de atividades delituosas praticadas em prejuízo da Petrobras, LULA dominava toda a empreitada criminosa, com plenos poderes para decidir sobre sua prática, interrupção e circunstâncias. Nos ajustes entre diversos agentes públicos e políticos, marcado pelo poder hierarquizado, LULA ocupava o cargo público mais elevado e, no contexto de ajustes partidários, era o maior líder do Partido dos Trabalhadores. Nessa engrenagem criminosa, marcada pela fungibilidade dos membros que cumpriam funções, a preocupação primordial dos agentes públicos corrompidos não era atender ao interesse público, mas sim atingir, por meio da corrupção, o triplo objetivo de enriquecer ilicitamente, obter recursos para um projeto de poder e garantir a governabilidade. Os atos de LULA, quando analisados em conjunto e em seu contexto, revelam uma ação coordenada por ele, desde o início, com a nomeação de agentes públicos comprometidos com o desvio de recursos públicos para agentes e agremiações políticas, como foi o caso dos Diretores da Petrobras, até a produção do resultado, isto é, a efetiva corrupção para atingir aquelas três finalidades.

LULA decidiu em última instância e em definitivo acerca da montagem do esquema e se beneficiou de seus frutos: (a) governabilidade assentada em bases espúrias; (b) fortalecimento de seu partido – PT –, pela formação de uma reserva monetária ilícita para abastecer futuras campanhas, consolidando um projeto, também ilícito, de perpetuação no poder; (c) enriquecimento com valores oriundos de crimes. Todas essas vantagens indevidas estiveram ligadas ao desvio de recursos públicos e ao pagamento de propina a agentes públicos e políticos, agremiações partidárias, e operadores financeiros. Aquelas três finalidades foram contaminadas pelo método espúrio empregado para atingi-las, a corrupção. (denúncia, fls. 107­108)

III.4.2.2 – A DENÚNCIA: DESCRIÇÃO DE AÇÕES OU DE HIPÓTESES

IDIOSSINCRÁTICAS?

Todo o discurso acusatório do MPF está estruturado em torno

dessas hipóteses gerais, construídas como esquemas psíquicos para representar ou

para interpretar alguns trechos da realidade factual, mas claramente inúteis para a

função processual atribuída à denúncia no processo penal: a descrição de ações

criminosas. É o que se demonstra a seguir.

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Referir a posição central do Primeiro Defendente em ação

criminosa indeterminada, com o poder de prover altos cargos na administração

pública – inclusive, com delegação de poderes a José Dirceu, seu braço direito –

(denúncia, fl. 108, a), pode indicar aspectos dos poderes constitucionais de um

Presidente da República, mas não significa descrever as ações típicas do crime de

corrupção passiva, consistentes nas ações de solicitar, ou de receber, ou de aceitar

promessa de vantagem indevida.

Indicar nomes do PMDB e do PP para altos cargos da

administração pública – inclusive da Petrobras – (denúncia, fl. 108, b), constitui

atividade normal e regular de qualquer Presidente da República, em qualquer tempo e

lugar – embora os nomes tenham sido indicados pelos próprios partidos políticos e

nomeados por outras instâncias do Poder Executivo – mas, seja como for, tais

atribuições não tem nada a ver com as ações típicas do crime de corrupção passiva.

Manter contatos, com outros partidários do PT, que ocuparam

cargos de relevância no Governo, mas que foram condenados por corrupção no

controvertido processo do “Mensalão” (denúncia, fl. 108, c), não é definido como

crime na legislação penal e, afinal, a responsabilidade penal é pessoal, como deve saber

o MPF.

Falar de casos de corrupção – semelhantes aos do “Mensalão” e

da “Lava Jato”, relacionados à Eletronuclear, à Caixa Econômica e aos Ministérios da

Saúde e do Planejamento, que teria se desenvolvido na alta cúpula do Poder Executivo,

cujos benefícios convergiram para o vértice comum de todos eles, no qual se encontrava

LULA, em processos criminais sem condenação transitada em julgado (denúncia, fl.

108, d), constitui imputação irresponsável e abusiva, que lesiona a honra do Primeiro

Defendente e infringe o princípio da presunção de inocência, sem qualquer relação

com a hipótese concreta dos autos

Mencionar o viés partidário dos esquemas criminosos, que

envolveria a distribuição de cargos para arrecadar propinas distribuídas a agentes e

partidos políticos (denúncia, fls. 108, e), é permanecer no nível das hipóteses não

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demonstradas do imaginário repressivo da Força Tarefa do MPF atuante na Lava Jato,

sem qualquer relação com as ações incriminadas no tipo de corrupção passiva

imputado de forma leviana e temerária ao Primeiro Defendente.

A ideia de um quadro de corrupção sistêmica que existiria

durante todo Governo do Primeiro Defendente e mesmo após seu término (denúncia,

fl. 108, f) é um dos lugares comuns da retórica difamatória dos signatários da denúncia,

distante dos pressupostos típicos do fato imputado ao Primeiro Defendente.

Reafirmar que o Primeiro Defendente recebeu da

ODEBRECHT, mediante deduções do sistema de caixa geral de propinas do PT,

supostas vantagens indevidas, durante e após o mandato (denúncia, fl. 108, g), é recair

nas hipóteses de um discurso panfletário, construído sobre a premissa fascista de que

uma mentira repetida torna­se verdade.

Repetir que o Primeiro Defendente seria o beneficiário de um

esquema criminoso que teria instituído e mantido (a) para fortalecimento político ilícito

mediante ampliação da base aliada do poder, (b) para ampliar a sustentação econômica

do grupo político e garantir vitorias eleitorais e (c) para auferir para si vantagens

financeiras (denúncia, fl. 108, h), fatos não provados no exame dos contratos

específicos (itens IV.1.1.1 a IV.1.1.8, acima), mas prometendo, de forma leviana, essa

verificação para o espaço deslocado dos capítulos IV.2 e V da exordial, é reconhecer a

impotência probatória de uma denúncia temerária e retomar a proposição hitleriana

das verdades construídas pela repetição de mentiras despudoradas.

O refrão, repetido à náusea pelo MPF, de que o Primeiro

Defendente teria atuado diretamente para nomeação e manutenção de PAULO

ROBERTO COSTA, de RENATO DUQUE, de NESTOR CERVERÓ e de JORGE

ZELADA nas Diretorias de Abastecimento, de Serviços e Internacional da Petrobras,

com ciência de uso dos cargos para arrecadação de propinas e distribuição entre

agentes e partidos políticos (denúncia, fl. 108, l), constitui o sonho probatório da

Força Tarefa atuante na Operação Lava Jato, jamais alcançado neste ou em outros

processos marcados pelo mesmo discurso monocórdio reverberado na mesma caixa de

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ressonância judicial­midiático­conservadora, além de ignorar que a atribuição

administrativa por tais nomeações pertence a outras esferas do Poder Executivo – no

caso, o Conselho de Administração da Petrobras.

A surrada tese da atuação direta do Primeiro Defendente para

nomeação de NESTOR CERVERÓ para a Diretoria Financeira da BR Distribuidora,

como suposto reconhecimento por vantagens ilícitas para o Partido dos Trabalhadores

(denúncia, fl. 109, j), além da recidiva nas indemonstradas hipóteses que informam os

processos psíquicos viciados da Força Tarefa do MPF atuante na Operação Lava Jato,

reincide no equívoco de atribuir ao Presidente da República atos administrativos de

outras instâncias do Poder Executivo – e que também não possuem relação com a

hipotética ação típica de corrupção passiva imputada ao Primeiro Defendente.

III.4.2.3. – AS IMPUTAÇÕES HIPOTÉTICAS INDEMONSTRADAS DA DENÚNCIA

O persistente artifício discursivo de imputar ao Primeiro

Defendente um papel central na estrutura criminosa contra a Administração pública só

encontra similar no descaso visceral da denúncia em demonstrar os componentes

objetivos e subjetivos do crime de corrupção passiva imputado, limitando a imputação

à inútil reprodução abstrata das palavras da lei, absolutamente insuficientes para

fundar o contraditório processual e viabilizar a ampla defesa garantidas pela

Constituição em processos judiciais.

Reafirmar a hipótese simplória de que o Primeiro Defendente,

de modo consciente e voluntário, teria mantido RENATO DUQUE e PAULO

ROBERTO COSTA nas Diretorias respectivas da Petrobras, com ciência do uso dos

cargos para arrecadar propinas de empresários para distribuir a agentes e partidos

políticos (denúncia, fl. 109, letra a), sem demonstrar como essas irresponsáveis

imputações ter-se-iam configurado nos processos psíquicos do acusado, tem o

mesmo significado processual que dissertar sobre a influência da lua no serpenteio da

jararaca – ou seja, não possui nenhum significado processual.

Reproduzir hipóteses indemonstradas no espaço adequado da

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denúncia (itens IV.1.1.1 a IV.1.1.8, acima) – para efeito de compensar a falta de prova

processual pela repetição neurótica de palavras rituais, como em cerimônias religiosas

–, com o objetivo de engendrar a convicção de que o Primeiro Defendente solicitou,

aceitou promessa e recebeu, direta e indiretamente, vantagens indevidas, que teriam

sido oferecidas e prometidas por Executivos da ODEBRECHT, concluindo que as

ações imputadas, (a) na modalidade indireta estariam esclarecidas pelas condutas de

PAULO ROBERTO COSTA, de ALBERT YOUSSEF, de RENAT DUQUE e de

PEDRO BARUSCO, e (b) na modalidade direta estariam comprovadas pelo regime do

“caixa geral”, através do expediente de dissimulação que seria demonstrado no

capítulo V, que trataria de outra igualmente hipotética imputação de outro crime – ou

seja, o suposto crime de lavagem de capitais (denúncia, fl. 109, letra b) –, significa, no

primeiro caso (além de ignorar o princípio constitucional da pessoal responsabilidade

penal), reconhecer formalmente que não existe nenhuma prova das imputações,

como demonstrado cabalmente no exame do capítulo respectivo (itens IV.1.1.1 a

IV.1.1.8, acima) e, no segundo caso, significa a tentativa ilegal, regida pela má-fé

acusatória, ou pelo embuste processual de substituir a prova real da tipicidade de um

crime (no caso, o suposto crime de corrupção passiva) pela futura prova ideal de da

tipicidade de outro crime (no caso, o também hipotético crime de lavagem de capitais),

imputado levianamente no Capítulo V. Essa é a verdadeira natureza embromadora da

denúncia.

Retomar os conteúdos psíquicos carentes da forma material do

concreto tipo de injusto de corrupção passiva, repetindo as fórmulas rituais viciosas de

que o Primeiro Defendente teria solicitado, teria aceito promessa, teria recebido

vantagens indevidas em razão de sua função e como responsável pela nomeação e

manutenção dos diretores da Petrobras, porque (a) teria o poder de orquestrar o

esquema como Presidente da República, como demonstraria a tentativa de impedir que

NESTOR CERVERÓ firmasse acordo de colaboração premiada com o MPF, ou

porque (b) com a saída do Governo de pessoas do circulo de confiança do acusado,

teria continuado o escândalo do desvio de recursos públicos, deslocando a

demonstração das hipóteses dadas (com a expressão “conforme será destacado a

seguir”) para momento posterior indeterminado e, de fato, nunca efetivado ou cumprido

(denúncia, fl. 109, letra c), merece a seguinte repulsa:

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i) primeiro, reaparece o frequente embuste processual de

transferir a prova para outra seção ou capítulo da

Denúncia e, nessa sempre indeterminada seção ou

capítulo, sem qualquer pudor ou sentimento de

desconforto, usar expressões embromadores do tipo

“como já demonstrado”, ou “como provado em capítulo

anterior”, com o propósito óbvio de induzir em erro os

órgãos jurisdicionais;

ii) segundo, assume como verdadeira a imputação leviana

do MPF, sobre a suposta tentativa do Primeiro

Defendente de impedir que NESTOR CERVERÓ

firmasse acordo de colaboração premiada com o MPF –

uma imputação radicalmente contestada na Resposta à

acusação (na Ação Penal n. 40755­27.2016.4.01.3400, da

10a Vara Federal Criminal de Brasília, ainda pendente de

julgamento), em que a Defesa (a) não só nega a autoria

do fato, mas (b) afirma a própria inexistência do fato;57

iii) terceiro, o poder de orquestrar um esquema criminoso

pode, do ponto de vista abstrato ou geral, ser atribuído

não só ao Presidente da República, mas a qualquer

pessoa em posição de poder no sistema político do

Estado (como, por exemplo, os próprios membros da

Força Tarefa do MPS atuantes na Operação Lava Jato),

ou no sistema econômico­financeiro­empresarial da

sociedade civil, mas o que seria necessário demonstrar,

ao contrário, é a manifestação desse poder de orquestrar

um esquema criminoso do ponto de vista concreto,

57 Ver, entre outros, o seguinte trecho daquela Resposta à acusação (fl. 145): Ou, ainda, outro trecho da mesma Defesa preliminar: “Se a tese de defesa é definida pela declaração do Peticionário, que nega ter participado ou ter sabido de pagamentos de honorários para comprar o silêncio de NESTOR CERVERÓ, então temos não apenas (a) uma negativa de autoria do fato, mas também (b) uma afirmação de inexistência do fato de pagamento de honorários para comprar o silêncio de NESTOR CERVERÓ.”

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identificando não só o conteúdo geral abstrato das ações

imputadas, mas a forma concreta de sua materialização

no mundo da vida, com todas as circunstâncias de tempo,

de lugar, de modo e de meio de execução, de objeto

material, de resultado e de relação de causalidade, do

ponto de vista objetivo, além dos elementos psíquicos do

dolo, nos seus componentes conceituais de consciência

(dos elementos objetivos do tipo) e de vontade (como

energia psíquica projetada para realizar a ação típica), do

ponto de vista subjetivo. Essa demonstração a denúncia

não faz, em momento algum de sua longa e tediosa

narrativa.

Dizer que o Primeiro Defendente (a) recebeu vantagens

indevidas (oferecidas e prometidas por MARCELO ODEBRECHT) pelos benefícios

obtidos pelo Grupo ODEBRECHT da Petrobras, ou (b) que a relação de proximidade

com aquele executivo e de outras empreiteiras reforçaria a ciência da origem espúria

dos recursos, inclusive dos aportes milionários do Instituto LULA e da LILS Palestras,

Eventos e Publicações Ltda. (denúncia, fl. 109, letra d), merece o mais veemente

repúdio da Defesa, porque:

a) no primeiro caso, prevalece uma lógica de botequim, que

se limita a juntar as supostas vantagens indevidas (do Primeiro Defendente) aos

benefícios obtidos na Petrobras (pelo Grupo ODEBRECHT), sem demonstrar a relação

de causalidade material entre os polos dessa suposta relação, somente possível pela

descrição das formas concretas dos comportamentos respectivos;

b) no segundo caso, a denúncia pressupõe a possibilidade de

absorção psíquica de informações sigilosas pela proximidade física dos corpos, como

se o Primeiro Defendente incorporasse um bluetooth eletrônico capaz de reeditar

façanhas do famoso “Homem de um milhão de dólares” do cinema hollywoodiano.

Essas são as hipóteses indemonstradas de uma denúncia leviana

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e temerária!

III.4.2.4. – A MESMICE RETÓRICA ATRAVÉS DA FONÉTICA VARIÁVEL DE UM

CONTEÚDO MONOCÓRDIO

O resto do capítulo sobre a hipotética ação criminosa atribuída ao

Primeiro Defendente pode ser definido como a mesmice retórica repetida na fonética

variável de formas linguísticas diferentes, segundo a lógica fascista de transformar

versões mentirosas em fatos verdadeiros – mas, apenas na representação

desinformada de destinatários ingênuos. Para comprovar a afirmação basta acompanhar

a reprodução sintética da obsessiva retórica acusatória da Força Tarefa do MPF atuante

na Operação Lava Jato.

Os atos materiais do Primeiro Defendente, como ocupante do

maior cargo no Poder Executivo, teriam feito a arquitetura corrupta da administração

pública perdurar (por muitos anos) e se desenvolver por vários setores (denúncia, fl.

109) – mas não descreve os atos materiais que teriam determinado a perduração e

desenvolvimento dessa arquitetura corrupta, nem demonstra a relação de causalidade

entre aqueles abstratos e genéricos atos materiais e o resultado de perduração e de

desenvolvimento da aludida arquitetura corrupta.

A atuação do Primeiro Defendente, como Chefe do Poder

Executivo teria sido decisiva para a escolha e a manutenção de Diretores da Petrobras

comprometidos com a arrecadação de vantagens indevidas em contratos da Petrobras

com empreiteiras, porque, segundo o delator DELCÍDIO DO AMARAL (a) a

nomeação de Diretores da Petrobras dependia do aval do Presidente da República, (b) o

Primeiro Defendente conversava com as bancadas e teria a última palavra sobre os

nomes de Diretores, (c) as indicações políticas se refletiam em doações ilícitas e lícitas

para os partidos políticos e (d) o Primeiro Defendente sabia “como as coisas

funcionavam” (denúncia, fls. 109­110).

Primeiro, a nomeação de diretores é atribuição do Conselho de

Administração da Petrobras – e não do Presidente da República, que pode,

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eventualmente, influir na escolha deste ou daquele diretor, mas não responde, em

nenhuma hipótese, pelas infrações penais dos funcionários públicos nomeados –

exceto em hipóteses de coautoria ou de participação, que não é o caso da Denúncia –,

por mais elevados os cargos e mais relevantes as funções, por força do princípio da

responsabilidade penal pessoal (por dolo ou culpa) que exclui toda e qualquer forma

de responsabilidade penal objetiva.

Segundo, a temerária hipótese de comprometimento dos Diretores

com a arrecadação de vantagens indevidas não admite comunicabilidade por osmose,

mediante absorção psíquica de constelações neurônicas pela proximidade física dos

corpos, nem por sistemas corporais de bluetooth eletrônico, cujos pressupostos

cibernéticos ainda não foram implantados no Primeiro Defendente, segundo o

protótipo cinematográfico referido.

Terceiro, adotar como prova a delação premiada de um

mentiroso como DELCÍDIO DO AMARAL (Anexo, 47), cuja inconfiabilidade

probatória já foi demonstrada pela Defesa do Primeiro Defendente em outras ações

penais (por exemplo, na resposta à acusação da Ação Penal n. 5063130­

17.2016.4.04.7000), representa admitir a insuperável fragilidade das hipóteses

acusatórias.

Quarto – e mesmo no âmbito das delações mentirosas de

DELCÍDIO DO AMARAL –, parece claro o seguinte: a) a dependência do aval do

Presidente da República para nomeação de Diretores da Petrobras, em nível

administrativo, pode até ser normal em determinados casos, mas jamais implica

responsabilidade penal por ação ou omissão do funcionário público nomeado; b) as

conversas de LULA com as bancadas e a retenção da última palavra sobre nomes de

Diretores, são atividades normais de Governo, e não determinam responsabilidade penal

exceto naquelas hipóteses de coautoria e de participação, com as necessárias

dimensões objetivas e subjetivas do tipo de injusto comum imputado; c) os reflexos

das indicações políticas em doações ilícitas e lícitas para os partidos políticos somente

podem implicar responsabilidade penal nos termos do art. 29, §§ 1o e 2o do Código

Penal, excluídas do caso concreto; d) e a opinião de que o Primeiro Defendente sabia

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“como as coisas funcionavam” é apenas um palpite pessoal sem eficácia probatória,

cuja maliciosa verbalização não ultrapassa o enunciado genérico dos símbolos

linguísticos utilizados, porque saber como as coisas funcionavam não descreve o modo

concreto do funcionamento das coisas, sem o qual nenhuma imputação pode ser feita.

A suposta decisão de nomeação de PAULO ROBERTO COSTA

para resolver problemas de obstrução da pauta de votação na Câmara pertence ao

âmbito concreto do exercício do Poder político, que integra regulares gestões de

Governo de qualquer Estado contemporâneo; o reconhecimento de Zé Dirceu de que

tinha feito tudo que podia (para a nomeação), que somente o Primeiro Defendente

poderia resolver, não tem o efeito de engendrar responsabilidade penal para ninguém; e

a pretensa reunião no Gabinete presidencial – da qual o Primeiro Defendente não

participou –, entre agentes políticos e agentes públicos para decidir a nomeação de

PAULO ROBERTO COSTA, ignora as atribuições legais exclusivas do Conselho de

Administração da Petrobras para o ato de nomeação, independentes em face do Chefe

do Poder Executivo.

A ingerência do Primeiro Defendente na nomeação de NESTOR

CERVERÓ para a Diretoria Financeira da BR Distribuidora é uma hipótese leviana

para viabilizar a imputação temerária, extraída à fórceps da delação premiada de

NESTOR CERVERÓ, que teria dito ter sido informado que (a) “LULA informou que o

cargo estaria disponível para o depoente, caso tivesse interesse” e que também (b) “foi

informado que essa nomeação seria em retribuição ao fato de ter liquidado a dívida da

SCHAHIN através do contrato de operação da VITORIA 10.000”. (denúncia, fl. 112,

Anexos 211 e 62) – aliás, segundo tese de Defesa apresentada desde a primeira Ação

Penal nº 5063130­17.2016.4.04.7000, um acordo de delação premiada inteiramente

inválido, prestado sob a coação insuportável da tortura da prisão e sem as garantias

constitucionais do contraditório e da ampla defesa.

A hipótese de que parcela substancial de valores espúrios teria

sido destinada pela Diretoria de Serviços ao Partido dos Trabalhadores, pelo qual o

Primeiro Defendente se elegeu e da qual é cofundador, (denúncia, fl. 112), também é

leviana:

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a) primeiro, proviria dos delatores PAULO ROBERTO DUQUE

e PEDRO BARUSCO, em acordos de colaboração premiada igualmente inválidos,

porque prestados sob a coação insuportável da tortura da prisão e sem as garantias

constitucionais do contraditório e da ampla defesa;

b) segundo, supõe a extensão de uma responsabilidade penal

objetiva a todo e qualquer membro fundador do partido ou eleito pelo partido,

independente de contribuições para o fato nas dimensões objetivas e subjetivas do tipo

de injusto respectivo, exigidas pelo art. 25 e §§ do Código Penal.

O retorno à delação premiada do mentiroso DELCÍDIO

DO AMARAL (a) para confirmar a hipótese do esquema de corrupção nas Diretorias

da Petrobras e vincular a Diretoria de Serviços ao Partido dos Trabalhadores e (b)

para dizer que o Primeiro Defendente, além de plena consciência do esquema de

repasse de propinas, também sabia que havia arrecadação de um percentual do valor

das obras (denúncia, fl. 113), depõe contra a credibilidade das teses acusatórias e a

lealdade processual do órgão de acusação:

a) de início, representa carimbar a leviandade de imputações

caluniosas, porque somente uma denúncia leviana atribuiria relevância à opinião

gratuita de um delator desesperado, claramente impelido pela ideia mesquinha de

autoproteção processual, motivada pelo processo egoísta desprezível de comprar a

própria impunidade pela entrega covarde de pessoas inocentes;

b) somente uma denúncia leviana, formulada por uma Força

Tarefa politicamente partidarizada e obcecada pelo projeto ensandecido de destruir

inimigos políticos e, de cambulhada, prostrar a democracia formal e arrasar a

economia real do país, além da crueldade de pôr-de-joelhos a população brasileira,

poderia dar crédito a testemunhas que, em vez de descrever o que viram ou, o que

ouviram – como os olhos e os ouvidos do Juiz, segundo se diz no processo judicial –,

emitem opiniões e formulam juízos admitidos, afinal, como verdades absolutas por um

determinado segmento do Ministério Público Federal, aparentemente incapaz de pensar

segundo princípios jurídicos fundamentais.

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A hipótese de que o Primeiro Defendente admitiu ter

conhecimento sobre a prática de “caixa dois” no financiamento de campanhas

políticas”, extraída de “diversas matérias publicadas na época” (denúncia, fl. 113 e

nota 363,) – na verdade, um clichê repetido nesta e em outras denúncias do MPF contra

o ex­Presidente LULA – é emblemático da atitude desleal da Força Tarefa do MPF na

Operação Lava Jato (montada para destruição política do Primeiro Defendente),

porque apresentada sem a necessária ressalva de que o Primeiro Defendente, na

época da notícia (que o texto da Denúncia não indica), de fato e realmente, “negava a

existência do Mensalão” e criticava o papel de Roberto Jefferson, que “trouxe à tona

o caixa dois do PT em parte de suas campanhas eleitorais” – ou seja, das campanhas

dele, Roberto Jefferson –, o que Primeiro Defendente classificou como uma ação

“contra a história do próprio partido” (publicado na FOLHA DE SÃO PAULO, em

08/11/2005) e, assim, contar uma meia-verdade, como faz a denúncia, significa

introduzir uma mentira total no processo penal.

O registro de que o Primeiro Defendente declarou à Polícia

Federal que recebia os nomes dos diretores a partir de acordos políticos firmados, não

autoriza as conclusões de que o Primeiro Defendente (a) sabia das doações eleitorais

por fora das empresas, (b) ou conhecia a motivação dos pagamentos de “caixa 2”, (c)

ou as razões da voracidade pelos cargos da Petrobras, (d) ou sobre a vinculação entre

um fato e outro (denúncia, 113), que são criações cerebrinas tenebrosas de uma

denúncia cavilosa: afinal, a declaração do Primeiro Defendente enuncia, apenas e

exclusivamente, o recebimento de nomes a partir de acordos políticos – e mais nada –,

um conhecimento que todo Presidente da República deve possuir e precisa respeitar,

por razões óbvias de consenso político-institucional entre poderes da República – mas

as ilações capciosas subsequentes sobre conhecer (a) as doações eleitorais “por fora”,

(b) a motivação do “caixa 2”, (c) a voracidade pelos cargos, ou (d) a vinculação entre

“b” e “c”, são impertinentes, gratuitas e absurdas.

O retorno ao discurso interminável e entediante do papel

decisivo do Primeiro Defendente na nomeação de diretores, como peça central do

esquema recebendo vantagens indevidas da engrenagem de cartelização e pagamento de

propinas etc. (denúncia, fl. 113), sem mostrar a gênese concreta dos componentes

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objetivos e subjetivos do tipo de injusto imputado, revela a natureza maníaco­

obsessiva de uma denúncia patológica que se exaure na tentativa frustrada de fazer

prevalecer a hipótese sobre os fatos.

Em momento de fugaz consciência a denúncia reconhece que,

pela envergadura do cargo, o Primeiro Defendente não podia requerer diretamente as

vantagens, mas imediatamente recai no refrão vicioso das hipóteses alucinadas,

cerebrinas e ardilosas do discurso acusatório, invocando os funcionários RENATO

DUQUE e PAULO ROBERTO COSTA, que estariam em posições de oferecer

benefícios e de aceitar a solicitação (seria de vantagens indevidas?), agora com

expressa referência aos contratos da REPAR, RNEST, COMPERJ, Terminal Cabiúnas,

GASDUC III e às Plataformas P­59 e P­60 (denúncia, fl. 113) – como se as dimensões

objetivas e subjetivas do tipo de injusto de corrupção passiva tivessem sido

demonstradas no capítulo respectivo (Capítulo IV.1.1. Os contratos originários das

vantagens indevidas), enquanto a denúncia permanece, também aqui e como sempre, no

nível abstrato dos conteúdos genéricos, desprovidos das formas concretas de

manifestação do comportamento humano no mundo da vida, marcados pelos

referidos detalhes de tempo, lugar, modo e meio de execução da ação, a produção do

resultado e a relação de causalidade entre ação e resultado, no tipo objetivo, e as

formações psíquicas da consciência e da vontade na constituição do dolo, elemento

nuclear do tipo subjetivo dos crimes dolosos. Mas essas questões, como demonstra toda

a alienada narrativa acusatória, não são relevantes para a denúncia do MPF.

Enfim, lentamente, de modo quase sub­reptício, como a

consequência natural de uma narrativa estruturada em clichês formais, em refrães

burocráticos, em rótulos genéricos, eis que a Força Tarefa do MPF atuante na

Operação Lava Jato – o mecanismo judicial­midiático­conservador de guerra política

executada para destruir o Primeiro Defendente e o Governo legítimo da Presidente

Dilma Rousseff –, considera chegado o momento de consolidação processual da

prevalência das hipóteses sobre os fatos, ao afirmar, de modo embromador e com

toda desfaçatez, o seguinte:

“Dessa forma, considerando o papel essencial desempenhado por LULA no

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revelado esquema criminoso, sobretudo pela nomeação e manutenção nos cargos dos Diretores RENATO DUQUE e PAULO ROBERTO COSTA, para que estes atendessem aos interesses espúrios de arrecadação de vantagens indevidas para agentes e partidos políticos, verificou-se que, em relação aos contratos referidos nos itens IV.1.1.1 a IV.1.1.8 acima, LULA solicitou indiretamente e recebeu, direta e indiretamente, as vantagens indevidas pagas pela ODEBRECHT.

(...) As vantagens indevidas foram pagas pelo Grupo ODEBRECHT de forma contínua ao longo do período de execução dos referidos contratos.” (Denúncia, fls. 114­115, grifamos)

Eis o resultado de uma talvez inconsciente, mas intrínseca

deslealdade processual, de uma quiçá patológica, mas direcionada patranha legal, de

uma certamente compulsiva, mas objetiva mentira artificial, urdida nos espaços

confortáveis dos gabinetes da moderna ditadura repressiva­judicial­midiática­

conservadora – que substituiu os antigos porões da ditadura militar de tenebrosa

memória – para tentar destruir a maior liderança política da história da República

brasileira e, assim, frustrar as esperanças das grandes massas populares ainda

marginalizadas do mercado de trabalho e dos direitos de cidadania, para submetê­las ao

massacre social impiedoso do capital financeiro internacional na era da reorganização

neoliberal das relações econômicas e políticas globalizadas. Assim definido o sistema

macro, é possível retornar ao sistema micro do processo penal, para perguntar, ainda

perplexo:

a) onde, quando, ou de que modo verificou-se que, nos

contratos referidos nos itens IV.1.1.1 a IV.1.1.8, o Primeiro Defendente teria

solicitado, indiretamente, e teria recebido, direta e indiretamente, as tais vantagens

indevidas pagas pela ODEBRECHT?

b) em que signos linguísticos foram descritas as ações de

solicitar, ou de receber, ou de aceitar promessa de vantagem indevida imputadas ao

Primeiro Defendente?

c) por que meios, por quais modos, onde e quando as

vantagens indevidas foram pagas pelo Grupo ODEBRECHT ao Primeiro Defendente?

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Por economia processual, a resposta é uma só: em nenhum

espaço da denúncia!

E assim prossegue o discurso acusatório hipotético, repetitivo e

enfadonho da Denúncia, por exemplo:

a) de novo a hipótese de um “caixa geral”, abastecido também

após o término do mandato, de modo que a garantia do esquema dos contratos

fraudados determinaria vantagens indevidas durante toda execução dos contratos

(denúncia, fl. 114): onde a prova do “caixa geral”, ou das vantagens indevidas pagas ao

Primeiro Defendente?

b) de novo a hipótese da obstrução da justiça tentada em relação

à suposta tentativa do Primeiro Defendente de impedir o acordo de delação premiada

de NESTOR CERVERÓ (denúncia, fl. 115), contestada na Resposta à acusação

(Ação Penal n. 40755­27.2016.4.01.3400, da 10a Vara Federal Criminal de Brasília,

pendente de julgamento), em que a Defesa (a) não só nega a autoria do fato, mas (b)

afirma a própria inexistência do fato;58

c) de novo a hipótese geral da estrutura criminosa de uma década,

com pessoas e partidos em posição central, ou a estrutura hierarquizada como forma

de obter dinheiro ilícito e implementar um projeto político de poder, com a

fungibilidade dos integrantes da engrenagem criminosa, como ZÉ DIRCEU, NESTOR

CERVERÓ, DELÚBIO SOARES e o evidente controle superior do Primeiro

Defendente sobre os atos de corrupção (denúncia, fl. 116) – o máximo de teoria do

domínio do fato que a precária informação teórica da Força Tarefa do MPF parece

alcançar;

58 Ver, entre outros, o seguinte trecho daquela Resposta à acusação (fl. 145): Ou, ainda, outro trecho da mesma Defesa preliminar: “Se a tese de defesa é definida pela declaração do Peticionário, que nega ter participado ou ter sabido de pagamentos de honorários para comprar o silêncio de NESTOR CERVERÓ, então temos não apenas (a) uma negativa de autoria do fato, mas também (b) uma afirmação de inexistência do fato de pagamento de honorários para comprar o silêncio de NESTOR CERVERÓ.”

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d) de novo a hipótese indemonstrada do interesse do ex­

Presidente LULA na Refinaria Abreu Lima – RNEST, que não seria pela reduzida

política de Governo, mas sim pelas vantagens financeiras ilícitas de um projeto

bilionário para perpetuação no poder do PT e partidos da base aliada – diz a denúncia

do MPF, que demonstra tanta obsessão pelas hipóteses esquizofrênicas, quanto

desprezo pela prova dos fatos reais.

e) o argumento irrelevante do relacionamento do Primeiro

Defendente com executivos de empreiteiras, especialmente MARCELO

ODEBRECHT, ou a referência ridícula a documentos apreendidos sobre eventos, ou

jantares, ou reuniões com grupos de empresários, com escandalosas (?) discussões ou

negociações sobre empreendimentos entre empresários e funcionários públicos, que

demonstrariam a aproximação do Primeiro Defendente com executivos (Denúncia, fl.

117), como se um Presidente da República devesse levar vida monástica no interior dos

gabinetes do Palácio do Planalto – afinal, em que mundo esquizofrênico vivem os

agentes do MPF signatários da denúncia?

f) mas o simples ridículo avança para o caricato (a) no exame do

apreendido celular de MARCELO ODEBRECHT, onde o nome “LULA” seria

referência constante, aparecendo, muitas vezes, na sintomática forma interrogativa

“LULA?”, geralmente ao lado de outras figuras e políticos, ou (b) no HD externo

apreendido na casa de MARCELO, que documenta um jantar na residência que teria

sido a pedido de LULA, com empresários convidados, como JUVANDIA MOREIRA

LEITE, administradora da EDITORA GRÁFICA ATITUDE – sugerindo a pergunta

irresistível: a proximidade do Primeiro Defendente em face da empresária JUVANDIA

seria mais comprometedora do que a relação quase simbiótica do ilustre Juiz SÉRGIO

MORO com o delatado AÉCIO NEVES, na famosa foto de premiação da ISTO É?

Enfim, a suma das hipóteses indemonstradas aparece no final do

capítulo: o Primeiro Defendente (a) seria o responsável pela nomeação de Diretores da

Petrobras comprometidos com arrecadação de propinas e teria plena consciência dos

valores angariados nos contratos, (b) cuja consequência seria a governabilidade, não

como alinhamento ideológico, mas como compra de apoio pelo desvio de recursos

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públicos, (c) destinados (i) para campanhas eleitorais do projeto ilícito de poder e (ii)

para o próprio ex-Presidente LULA, no valor final de R$75.434.399,44, fixado por uma

lógica matemática imponderável, muito semelhante à demonstração dos caracteres

típicos objetivos e subjetivos do tipo de injusto imputado pela denúncia.

III.4.3. – CORRUPÇÃO ATIVA E CORRUPÇÃO PASSIVA NA AQUISIÇÃO DO IMÓVEL DO

INSTITUTO LULA

III.4.3.1. – A IMPUTAÇÃO TÍPICA

A denúncia imputa também ao Primeiro Defendente a prática de

novo crime de corrupção passiva, que teria sido cometido com o auxílio de ANTONIO

PALOCCI e de BRANISLAV KONTI, porque teria solicitado, teria aceito e teria

recebido promessa de vantagem indevida, consistente em imóvel para instalação do

Instituto LULA, que teria sido oferecido e prometido por MARCELO ODEBRECHT

(denúncia, fl. 121). A imputação do fato está assim descrita na denúncia:

Efetivamente, como se passa a descrever, no período compreendido entre o início do ano de 2010 e 24 de novembro de 2010, MARCELO ODEBRECHT, de modo consciente e voluntário, praticou o delito de corrupção ativa qualificada, pois ofereceu e prometeu, direta e indiretamente, vantagem indevida a LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, em valor equivalente, à época, à quantia aproximada de R$ 12.422.000,00, consistente em um imóvel para a instalação do Instituto Lula. Por seu turno, LULA, de modo consciente e voluntário, em razão de sua função e como responsável pela nomeação e manutenção de RENATO DE SOUZA DUQUE e PAULO ROBERTO COSTA nas Diretorias de Serviços e Abastecimento da Petrobras, praticou o delito de corrupção passiva, pois, não apenas solicitou e aceitou tal promessa de vantagem indevida, para si e para outrem, direta e indiretamente, como efetivamente a recebeu, contando com o relevante auxílio de ANTÔNIO assessor BRANISLAV KONTIC, os quais, de modo consciente e voluntário e em unidade de desígnios com LULA, incorreram no delito de corrupção passiva.” (denúncia, fl. 121­122)

Mais uma vez, a denúncia diz o seguinte: “no período

compreendido entre o início do ano de 2010 e 24 de novembro de 2010 ... – ou seja, em

datas indeterminadas distribuídas no período de 11 (onze) meses, ou 270 dias –,

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foram realizadas as ações típicas de solicitar, de receber e de aceitar promessa de

vantagem indevida, do tipo de injusto de corrupção passiva, por um lado, e as ações

típicas convergentes de oferecer ou de prometer vantagem indevida a funcionário

público, do tipo de injusto de corrupção ativa, por outro lado.

Essa é a narrativa da denúncia em relação aos crimes de

corrupção passiva e de corrupção passiva imputados.

III.4.3.2. – ANÁLISE PRELIMINAR DA IMPUTAÇÃO DA DENÚNCIA: A IMPUTAÇÃO DE UM

FATO INDETERMINADO.

Igualmente, a primeira e mais importante tese de Defesa, que

estrutura toda a argumentação técnica da presente Resposta à acusação, é definida

por uma necessária negativa geral: o Primeiro Defendente jamais solicitou, nem

nunca aceitou, menos ainda recebeu, direta ou indiretamente, para si ou para outrem,

e de nenhum modo possível ou imaginável, quaisquer vantagens indevidas capazes de

configurar o tipo legal de corrupção passiva, definido na legislação penal.

Estabelecida esta premissa, é possível iniciar a análise das

imputações da denúncia.

As ações humanas são realizadas no tempo e no espaço, como

todos os fenômenos naturais e sociais, porque existem em determinado momento

histórico e acontecem em determinado lugar do mundo real. Por isso, a lei processual

penal determina que o ato processual da denúncia “conterá a exposição do fato

criminoso, com todas as suas circunstâncias” (art. 41, CPP), cuja violação implica

nulidade da denúncia.

Os conceitos destacados pela norma são o de fato criminoso e o

de circunstâncias, que caracterizam a historicidade dos fatos humanos. Esses conceitos,

como indicado em capítulo anterior, pertencem à teoria do fato punível, como

componentes do conceito de crime, assim definidos:

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a) o fato criminoso é constituído (i) de tipo de injusto e (ii) de

culpabilidade: 1) o tipo de injusto é configurado por uma ação típica e antijurídica

concreta: nesta fase processual, a Defesa examina apenas esta dimensão do fato

punível; 2) a culpabilidade é configurada pela imputabilidade, o conhecimento do

injusto e a exigibilidade de comportamento diverso;

b) as circunstâncias do fato criminoso compreendem os detalhes

de tempo, de lugar, de meio e de modo de execução que conferem às ações humanas

características próprias.

O exame da imputação de fato contra o Primeiro Defendente

revela, do ponto de vista do tipo objetivo e do tipo subjetivo graves problemas, como

indica a leitura da narrativa da denúncia: (fl. 122):

Como se vê, a acusação inicial não contém, do ponto de vista do

tipo objetivo do crime, nenhuma “exposição do fato criminoso”, porque omite o

principal requisito legal do ato processual inaugural, assim expresso: “a denúncia ou a

queixa conterá a exposição do fato criminoso ...” (art. 41, CPP).

As ações imputadas de oferecer ou de prometer vantagem

indevida a funcionário público (corrupção ativa) ou de solicitar, ou de aceitar

promessa, ou de receber vantagem indevida (corrupção passiva) não possuem

momento histórico determinado de realização material ou de configuração concreta

como fato criminoso: a denúncia não delimita a dimensão de tempo em que teriam

ocorrido as ações imputadas.

Logo, a descrição da denúncia contém falha irremediável: não

situa o fato imputado em momento determinado, definível como a “menor unidade de

tempo observável”, dentro da sequência histórica desse “continuum homogêneo

partilhável (...), no qual é atribuída a cada realidade sua posição ou recorte.”59Parece

impossível maior indeterminação do tempo de existência de um fato, cuja historicidade

59 REGENBOGEN, Arnim; MEYER,Uwe. Wörterbuch der Philosophischen Begriffe. Hamburg: Felix Meiner Verlag, 2013, verbete “Zeit”.

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concreta exige delimitação temporal, sem a qual nenhum fato pode existir no mundo

real.

Mas a falha é ainda mais grave, porque as mesmas ações

imputadas a MARCELO ODEBRECHT de oferecer ou de prometer vantagem

indevida a funcionário público, ou as ações imputadas ao Primeiro Defendente de

solicitar, ou de aceitar promessa, ou de receber (vantagens indevidas) não possuem

lugar físico determinado de concretude espacial como fato criminoso: a denúncia não

delimita o lugar, no continuum homogêneo do espaço tridimensional euclidiano de

altura, de largura e de profundidade que teria sido preenchido pelo ou em que teria

acontecido o fato criminoso imputado.60 Logo, existe somente um conteúdo psíquico

desprovido da forma de aparição/existência fenomênica do fato.

A consequência prática da indeterminação temporal ou espacial

do fato imputado é grave, porque atribui ao acusado uma prova negativa impossível: o

acusado deve realizar a absurda prova negativa da conduta imputada – ou seja, de não

ter solicitado, ou de não ter aceito promessa, ou de não ter recebido vantagem

indevida, ou de não ter oferecido ou não ter prometido vantagem indevida em nenhum

daqueles 270 dias do lapso temporal de 11 meses.

Ao contrário, se a denúncia tivesse determinado o tempo e o

lugar do fato imputado, como deveria ter feito, então a necessidade probatória do

acusado se reduziria ao tempo e ao espaço determinados na Denúncia, podendo

demonstrar que não poderia ter realizado o fato imputado, porque estaria (a) no

exterior do País, ou (b) em plena campanha no Nordeste, ou (c) internado na UTI de um

hospital e assim por diante. A lógica do argumento é óbvia.

Por último, a denúncia contém falhas ainda maiores, porque as

ações imputadas constituem ações abstratas, desprovidas das particularidades que

informam os acontecimentos reais, designadas sob o nome de circunstâncias, cuja

presença concreta atribui especificidade histórica a todo e qualquer fato concreto:

60 REGENBOGEN, Arnim; MEYER,Uwe. Wörterbuch der Philosophischen Begriffe. Hamburg: Felix Meiner Verlag, 2013, verbete “Raum”.

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além de não descrever o tempo e o lugar dos fatos imputados, a denúncia não descreve

nem os meios, nem os modos pelos quais essas hipotéticas ações teriam sido realizadas

pelos autores respectivos – ou seja, é carente de toda e qualquer circunstância

concreta que configuraria a realidade histórico­social do fato imputado.

Logo, é impossível saber:

a) se as ações de solicitar, de receber e de aceitar promessa,

teriam sido realizadas pela fonética da palavra falada, ou pela forma gráfica de um texto

escrito, ou por simples gestos ou expressões corporais de mímica significativa etc.

b) se as ações de oferecer ou de prometer vantagem indevida

teria sido comunicada pelo discurso falado ou pela forma escrita, ou também por meio

de gestos ou expressões inequívocas.

Também o exame da imputação de fato do ponto de vista do tipo

subjetivo do crime revela problemas igualmente graves: a singela descrição da atitude

pessoal atribuída ao Primeiro Defendente, no suposto papel de autor da ação

incriminada, definida como realizada “de modo consciente e voluntário” (denúncia, fl.

121­122), constitui simples rótulo burocrático privado do conteúdo psíquico

correspondente ao conceito de dolo – e, portanto, insuficiente para descrever a

existência do elemento subjetivo do dolo, que caracteriza o tipo de crime imputado.

Ou, dito de forma didática: em lugar de etiquetas formais

destituídas de significado real, a denúncia deveria descrever (a) a forma pela qual o

autor teria tido consciência dos elementos objetivos do tipo de crime imputado, que

configura o elemento intelectual do dolo, e (b) de que modo os elementos objetivos do

tipo objetos da consciência teriam sido abrangidos pela vontade do autor, para formar a

estrutura psíquica do dolo, como vontade consciente de realizar o tipo objetivo de um

crime,61 nas formas diferenciadas e excludentes de dolo direto ou de dolo eventual. A

denúncia não faz nada disso!

61 CIRINO DOS SANTOS, Juarez. Direito Penal – parte geral. Florianópolis: Empório do Direito, 2017, 7a edição, p. 132­133.

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Em face do exposto, em razão das falhas essenciais da narrativa

do fato imputado, exibe­se de rigor a rejeição da denúncia por sua manifesta inépcia, à

luz do preceituado no artigo 395, II, do Código de Processo Penal.

III.5 – DA AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA

Em respeito ao princípio da eventualidade, caso não se decida

pela inépcia da denúncia oferecida, deve ela ser rejeitada por manifesta ausência de

justa causa que justifique o prosseguimento da ação penal, na trilha das razões a seguir

expostas.

Com efeito, a denúncia não apresenta substrato empírico mínimo

para o prosseguimento da presente persecução penal.

Tanto é que a exordial acusatória:

(a) estabelece como pressuposto das imputações a existência de uma

organização criminosa e de uma posição de líder do Primeiro

Defendente que está sob a atribuição do Procurador Geral da

República — não sendo possível, portanto, neste momento, afirmar a

sua existência e muito menos qualquer participação do Primeiro

Defendente;

(b) usa de termos vagos das narrativas de delatores — uma das

delações sequer foi homologada e outra foi cancelada por este mesmo

Juízo, como será exposto com mais detalhes abaixo —, que, por isso

mesmo, não têm qualquer valor probatório;

(c) Pretende atribuir o Primeiro Defendente como destinatário oculto

de terreno cuja aquisição foi estudada pelo Instituto Cidadania e

rejeitada por sua diretoria; também se intenta atribuir aos

Defendentes a propriedade de um bem imóvel do qual são locatários

– conforme contrato anexo – e que está devidamente registrado em

nome do senhor Glauco da Costamarques;

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O uso de delações premiadas na tentativa de dar sustentação à

tese acusatória merece considerações específicas sobre o tema. A denúncia se apoia nos

termos de colaboração premiada de criminosos confessos e a maioria deles já

condenados como: Pedro da Silva Corrêa de Oliveira Andrade Neto; Delcídio do

Amaral Gomez; Fernando Antônio Falcão Soares; Pedro Barusco Filho; Milton

Pascowitch; Ricardo Ribeiro Pessoa; Walmir Pinheiro; Fernando Antônio Guimarães

Hourneaux de Moura; Augusto Ribeiro Mendonça; Eduardo Hermelino Leite; Mario

Frederico de Mendonça Goes; Antonio Pedro Campello de Souza Dias; Flávio Gomes

Machado Filho; Otavio Marques de Azevedo; Paulo Roberto Dalmazzo; Rogerio Nora

de Sá; Nestor Cuñat Cerveró; Paulo Roberto da Costa; e Dalton dos Santos Avancini.

O próprio despacho de recebimento da denúncia proferido por

este Juízo coloca em dúvida a idoneidade probatória da delação premiada: "Certamente,

tais elementos probatórios são questionáveis, mas nessa fase preliminar, não se exige

conclusão quanto à presença da responsabilidade criminal, mas apenas justa causa."

(pg. 06, destacou­se).

Na verdade, mais que questionável meio de prova62, a delação

premiada não possui qualquer valor probatório.

FREDERICO VALDEZ PEREIRA63, nessa linha, leciona que:

“Mesmo estando dotadas de lógica narrativa e coerência interna, as informações obtidas pela efetivação da colaboração premiada não se podem constituir em meio de prova suficiente para desmerecer a presunção de inocência dos acusados” (destacou­se).

O Excelso Supremo Tribunal Federal, ao interpretar o disposto no

art. 4º, da Lei nº 12.850/2013, assentou que a delação premiada não é prova, mas, sim,

“meio de obtenção de prova” (STF, Inq. 4.130­QO, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe

62 EUGÊNIO ZAFFARONI leciona com propriedade:“A impunidade de agentes encobertos e dos chamados ‘arrependidos’ constitui uma séria lesão à eticidade do Estado, ou seja, ao princípio que forma parte essencial do Estado de Direito: (...) O Estado está se valendo da cooperação de um delinquente, comprada ao preço da sua impunidade para ‘fazer justiça’, o que o direito penal liberal repugna desde os tempos de Beccaria” (Crime Organizado, uma categoria frustrada, ano 1, p.45. – destacou­se). 63 FREDERICO VALDEZ PEREIRA, Delação Premiada, Legitimidade e Procedimento, 2013, p. 141.

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03/02/2016) 64 65 66 67 68.

Esse entendimento, aliás, está há muito tempo sedimentado no

Supremo Tribunal Federal, como se verifica no seguinte trecho do r. voto condutor

proferido pelo Eminente Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE no julgamento do HC 84.517­

7­SP:

“(...) não se trata somente de uma fonte de prova particularmente suspeitosa (o que, dado o princípio da livre convicção do juiz seria insuficiente para justificar a regra cogitada), mas de um ato que, provindo do acusado, não pode, mesmo para certos efeitos, fingir que provenha de testemunha. O acusado, não apenas não jura, mas pode até mentir impunemente em sua defesa (...) e, portanto, suas declarações, quaisquer que sejam, não podem assimilar ao testemunho, privadas como estão das garantias mais elementares desse meio de prova... O conteúdo do interrogatório, que não é testemunho com respeito ao irrogado, tampouco pode vir a sê-lo a respeito dos demais, porque seus caracteres seguem sempre os mesmos. O que se designa como chamada de corréu não é mais d que uma confissão, que além de ser o fato próprio, o é do fato alheio, e conserva os caracteres e a força probatória dos indícios e não do testemunho (...)” (destacou­se).

Portanto, uma denúncia baseada fundamentalmente em delação

premiada, como se verifica no vertente caso, não pode ensejar a deflagração de ação

64 GIUSEPPE DI CHIARA vai além:“As declarações incriminadoras do co-imputado não podem ser consideradas nem meio de prova, nem indício: são unicamente uma notitia criminis, utilizável na fase pré-processual, e constituem uma indicação preciosa para ulteriores atividades dos órgãos de investigação” (Chiamata di correo, garantismo colletivo e diritto de difesa, cit., p. 253­254). 65 Na mesma linha: HC 127.483/PR, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe 04/02/2016. 66 No direito português, tal posição também é adotada, conforme se extrai da lição de TERESA PIZARRO: “No conjunto de normas jurídico-processuais em sede de prova quanto ao depoimento de arguidos em processo-crime, o valor probatório do depoimento de um co-arguido no que aos restantes diz respeito é legítimo objeto de assaz diminuída credibilidade” (O Valor Probatório do depoimento do co­arguido no processo penal português, Revista do Ministério Público, Lisboa, v. 19, n. 74, p. 47, abr/jun 1998). 67 Nos Estados Unidos, a imputação a terceiros sempre foi vista com muita ressalva, razão pela qual se faz necessária a “cross examination” e a garantia da “corroboration”, que versa a imprescindibilidade de se cruzarem as declarações do colaborador com os demais elementos de prova e que suas acusações sejam submetidas ao contraditório durante os debates orais. O “right of confrontation”, ou seja, o direito que o imputado tem de se confrontar com seu acusador, com a finalidade de comprovar a regularidade do testemunho veda a admissibilidade em juízo, como meio de prova, do testemunho direto do accomplice, o que impede que as declarações fora do contraditório sejam valoradas pelos jurados como provas aptas para condenação. 68 Na doutrina espanhola a necessidade da existência de outros elementos probatórios que possam respaldar as imputações do colaborador também é exigida. Oportuno trazer a lume os seguintes julgados da Suprema Corte Espanhola:“Las declaraciones incriminatorias de los coimputados, cuya valoracion es legítima desde la perspectiva constitucional, dado su carácter testimonial, carecen de consistência plena como prueba de cargo cuando, sendo únicas, no resultam minimamente corroboradas por outras pruebas” (STC 147/2004).

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penal, pois os elementos decorrentes daquele acordo processual, definitivamente, não

possuem valor probatório mínimo.

E, consoante aqui já exposto, os próprios colaboradores

desmentiram a tese acusatória, desconhecendo qualquer ciência ou participação do

Primeiro Defendente no amplo esquema de corrupção narrado na denúncia69.

A versão acusatória, além de inepta – cujo laconismo e

superficialidade já restaram demonstrados –, não apresenta base empírica idônea em

relação aos delitos imputados.

A acusação pertinente ao crime de corrupção passiva se lastreia,

conforme já exaustivamente demonstrado, em fatos ainda em fase investigatória no

âmbito do Supremo Tribunal Federal. Novamente, inquire­se: se a participação do

Primeiro Defendente ainda é apurada, como atribuir­lhe o comando do esquema

delituoso?

O cerne da questão – e que indubitavelmente ceifa a enunciação

acusadora – reside na suposta responsabilidade do Primeiro Defendente na nomeação e

manutenção de Paulo Roberto Costa, Nestor Cerveró e Renato Duque para ocupação de

ofícios diretivos na Petrobrás. Ademais, tais pessoas já teriam assumido tal posição com

o exclusivo intuito de arrecadação ilícita.

A lunática versão ministerial ainda afirma que o Primeiro

Defendente recebeu, indiretamente, vantagens indevidas através dos referidos diretores

da estatal.

O cenário exposto na denúncia, todavia, não se sustenta:

69 Nesse sentido são os depoimentos de Paulo Roberto Costa, Nestor Cerveró, Pedro Barusco, Dalton dos Santos Avancini, Augusto Ribeiro de Mendonça Neto, Eduardo Hermelino Leite, Alberto Youssef, Fernando Soares, Milton Pascowitch nos autos da ação penal 5046512­94.2016.4.04.7000 . Os colaboradores, unanimemente, negaram qualquer envolvimento do Primeiro Defendente nos delitos supostamente praticados em detrimento da Petrobrás.

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1) Os próprios diretores rechaçaram a interferência do Primeiro

Defendente na sua nomeação e manutenção nas diretorias da Petrobrás e

afirmaram que jamais trataram de assuntos indevidos com o ex­

presidente70. Não há qualquer elemento que possa aferir o recebimento de

vantagens de forma indireta através dos três diretores;

2) A escolha de um cargo diretivo da Petrobras passava por um criterioso

processo interno e externo à empresa. Oportuno mencionar novamente

que Paulo Roberto Costa, Nestor Cerveró e Renato Duque já integravam

o quadro da Petrobrás há muitos anos, ocupando anteriormente diversos

cargos de gerência e direção. Sua capacidade profissional era

incontestável!

3) A responsabilização do Primeiro Defendente caracteriza temerária e

indiscutível responsabilização objetiva, pacificamente rechaçada no

direito penal.

Sobre o crime de lavagem de capitais, também não se constata a

presença de elementos mínimos, aptos a cogitar a intenção de ocultar ou dissimular a

propriedade dos dois imóveis ora debatidos.

Quanto ao terreno localizado na Rua Haberbeck Brandão, a base

documental trazida na denúncia demonstra o descabimento da imputação. Vê­se,

claramente, que a aquisição do terreno para a instalação da sede do Instituto Cidadania

(hoje Instituto Lula) foi cogitada e descartada pelos membros de sua diretoria. O

Primeiro Defendente esteve uma única vez no local, ocasião da recusa de tal terreno. A

real sede do Instituto Lula, cujo terreno pertence à instituição desde 1990, está

localizada na Rua Pouso Alegre, 121, Ipiranga/SP.

70 Depoimentos de Paulo Roberto Costa e Nestor Cerveró na ação penal 5046512­94.2016.4.04.7000/PR

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Neste ponto merece desde logo um registro do absurdo: como

poderia qualquer membro do Instituto Cidadania ter solicitado um imóvel que foi

recusado —, como exposto acima?

Prosseguindo com o enredo de convicções e acusações

descabidas, o Parquet afirma que o réu Glauco da Costamarques, utilizado como pessoa

interposta no imóvel supramencionado, recebeu de forma dissimulada a quantia de R$

800.000,00. Desse valor, utilizou R$ 504.000,00 para adquirir o apartamento situado na

Avenida Francisco Prestes Maia, 1501, apartamento 121, São Bernardo do Campo/SP, o

que teria feito em favor do Primeiro Defendente, servindo, novamente como pessoa

interposta e designada a dissimular a propriedade oculta do imóvel, atribuída aos

Defendentes. Um detalhe fático, todavia, dizima qualquer credibilidade à acusação: O

Senhor Glaucos da Costamarques adquiriu o apartamento situado em São Bernardo do

Campo no dia 09.08.2010 e só recebeu o valor de R$ 800.000,00, referente à Cessão de

Direitos do terreno da Rua Haberbeck Brandão, no dia 20.12.2010;

Ademais, olvida­se o fato do imóvel já ser utilizado, mediante

locação, pelos Defendentes antes do senhor Glaucos da Costamarques adquirir o

imóvel. Deu­se apenas a troca de proprietários, sendo inalterado o intento dos

Defendentes: a locação do imóvel, agora pertencente ao réu Glaucos.

Qual seria o ato inerente ao desígnio de ocultação ou

dissimulação de vantagens indevidas?

O caso é de manifesta ausência de justa causa!

Ao analisar o tema, AURY LOPES JR. considera que

“A justa causa identifica-se com a existência de uma causa jurídica e fática que legitime e justifique a acusação (e a própria intervenção penal). (...)A acusação não pode ser leviana e despida de um suporte probatório suficiente para, à luz do princípio da proporcionalidade, justificar o imenso constrangimento que representa a assunção de condição de réu.”71 (destacou­se)

71 LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal, 12ª edição, 2015, p.195

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Distinto não é o entendimento de NUCCI, cuja doutrina aduz:

“se inexistir motivo fundamentado para o processo seguir seu curso, pois, na esfera criminal, é sempre um constrangimento grave ser acusado formalmente da prática deu uma infração penal, deve o juiz rejeitar a denúnciaou queixa.” 72 (destacou­se)

Veja­se, ainda, GUSTAVO BADARÓ, em equivalente posição:

“a noção de justa causa evoluiu, então, de um conceito abstrato para uma ideia concreta, exigindo a existência de elementos de convicção que demonstrem a viabilidade da ação penal(...) A ausência desse lastro probatório ou da probable cause autoriza a rejeição da denúnciae, em caso de seu recebimento, faltará justa causa para a ação penal”.73

Tais conceitos se imbricam à necessária proteção contra o

abuso do direito de acusar arbitrariamente, protegendo o cidadão de excrescências

acusatórias, em observância aos direitos consagrados na Lei Máxima.

Em decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, o decano

Ministro CELSO DE MELLO sabiamente pontificou que “a liquidez (ou

incontestabilidade) dos fatos constitui requisito indispensável ao exame da

ocorrência, ou não, de justa causa para efeito de legítima instauração da ‘persecutio

criminis’”.74

Em outra decisão exarada também pela Suprema Corte, o

Eminente Ministro disseca a relação entre o abuso do poder de acusar e a falta de justa

causa:

HABEAS CORPUS - ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA A PERSECUÇÃO PENAL - INOCORRÊNCIA - PRETENDIDA APLICAÇÃO DO SURSIS PROCESSUAL AO PROCESSO PENAL MILITAR - FATO ANTERIOR À EDIÇÃO DA LEI Nº 9.839/99 - POSSIBILIDADE - PEDIDO DEFERIDO, EM PARTE. O ABUSO DO PODER DE ACUSAR E A POSSIBILIDADE DE SEU CONTROLE JURISDICIONAL. - A imputação penal não pode ser a expressão arbitrária da vontade pessoal do órgão acusador. A válida formulação de denúncia penal supõe a existência de base empírica idônea, apoiada em prova lícita, sob pena de o exercício do poder de acusar -

72 NUCCI,Guilherme de Souza, Manual do Processo Penal e Execução Penal, 12ª edição, 2015, p. 146. 73 BADARÓ, Gustavo. Processo penal. 3. ed., rev. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015. pg. 163 74 HC 86423, HC 80.748.

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consideradas as graves implicações de ordem ético-jurídica que dele decorrem - converter-se em instrumento de abuso estatal. Precedentes. A discussão em torno da ausência de justa causa para a persecução penal depende, essencialmente, quando suscitada em sede de habeas corpus, da incontestabilidade dos fatos subjacentes à acusação criminal. Esse debate, no âmbito processual do remédio heróico, não se viabiliza, sempre que se registre dúvida fundada a propósito dos fatos alegados. É que a liquidez dos fatos constitui requisito inafastável na apreciação da justa causa penal, pois o remédio processual do "habeas corpus" não admite dilação probatória, não permite o exame aprofundado de matéria fática e nem comporta a análise valorativa de elementos de prova. Precedentes. APLICABILIDADE, AO PROCESSO PENAL MILITAR, DO INSTITUTO DO SURSIS PROCESSUAL (LEI Nº 9.099/95, ART. 89), NOS CRIMES MILITARES PRATICADOS ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 9.839/99 - ULTRATIVIDADE DA LEI PENAL BENÉFICA - IMPOSIÇÃO CONSTITUCIONAL (CF, ART. 5º, XL). - A Lei nº 9.839/99 (lex gravior) - que torna inaplicável à Justiça Militar a Lei nº 9.099/95 (lex mitior) - não alcança, no que se refere aos institutos de direito material (como o do sursis processual, p. ex.), os crimes militares praticados antes de sua vigência, ainda que o inquérito policial militar ou o processo penal militar sejam iniciados posteriormente. Precedentes do STF. (HC 80.542/MG, Relator: Celso de Mello, 2ª Turma.) (destacou­se)

A razão – e a indubitável imprescindibilidade – da existência da

justa causa para a ação penal se fundamenta na necessidade de se evitar que denúncias

filhas do arbítrio e sem factibilidade – como a ora vergastada – possam, indevida e

odiosamente, impor constrangimento e estigmatização ao indivíduo, lesando seu status

dignitatis.

Definitivamente, mostra­se de rigor a rejeição da denúncia,

ausente na espécie um substrato mínimo de adminículos aptos a indicar a certeza de

materialidade dos delitos e plausibilidade de sua autoria. Que se a rejeite, pois, nos

termos do que preceitua o artigo 395, III, do Código de Processo Penal.

III.6 – QUESTÃO PREJUDICIAL HOMOGÊNEA: NECESSÁRIO SOBRESTAMENTO DO FEITO

Caso não se decida pela inviabilidade da ação penal, seja em

virtude da inépcia da denúncia, seja em virtude da ausência de justa causa, o que

somente se admite a título de argumentação, impõe­se o conhecimento de questão

prejudicial homogênea a justificar o sobrestamento do feito.

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Com efeito, as imputações dirigidas ao Primeiro Defendente

baseiam­se — sem qualquer lastro probatório — na afirmação de que ele ocuparia

posição de comando em organização criminosa que agiu em detrimento da Petrobras.

No entanto, como já exposto acima, a questão relativa à existência

— ou não — de uma organização criminosa e, ainda, a hipotética participação do

Primeiro Defendente, é objeto de apuração nos autos do Inquérito nº 3.989 que

tramita perante o Supremo Tribunal Federal.

Se o Procurador Geral da República requereu a instauração do

citado Inquérito nº 3.989 no Supremo Tribunal Federal, é porque não dispõe de provas

em relação ao Primeiro Defendente e, também, em relação ao suposto crime de

organização criminosa.

Aliás, a exposição de motivos do Código de Processo Penal

registra que a instauração de inquérito policial tem por objetivo evitar “apressados e

errôneos juízos”:

“É nele [o inquérito policial] uma garantia contra apressados e errôneos juízos, formados quando ainda persiste a trepidação moral causada pelo crime ou antes que seja possível uma exata visão do conjunto dos fatos, nas suas circunstâncias objetivas e subjetivas. Pro mais perspicaz e circunspecta, a autoridade dirige a investigação inicial, quando ainda perdura o alarma provado pelo crime, está sujeita a equívocos ou a falsos juízos a priori, ou a sugestões tendenciosas” (destacou­se).

Não se mostra possível, nesse contexto, — diante da existência de

um inquérito não concluído no STF —, presumir a participação do Primeiro

Defendente em uma organização criminosa, como fez a denúncia.

Considere­se que haja uma conclusão negativa da Excelsa Corte

sobre a ocorrência desse delito ou, ainda, sobre a participação do Primeiro Defendente.

Como ficariam as imputações aqui deduzidas?

Carecendo­se de informações essenciais – imprescindíveis para

caracterização dos crimes ora atribuídos, conforme, inclusive, reconhecido por esse

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Juízo –, faz­se necessário e indispensável que se aguarde o término do apuratório no

Inquérito 3.989 sobre possível participação do Primeiro Defendente na apontada

organização criminosa.

Dessa forma, caso não acolha o juízo as nulidades alevantadas ou,

ainda, a inviabilidade da ação penal pela inépcia da denúncia ou pela manifesta carência

de justa causa, o que se cogita ad argumentandum tantum, imperioso se faz o

sobrestamento do presente feito até a conclusão do Inquérito 3.989, em trâmite

perante nossa Excelsa Corte, por materializar questão prejudicial homogênea, na forma

do art. 93, do Código de Processo Penal.

É o que se pleiteia.

— IV— DA ATIPICIDADE DAS CONDUTAS

DA VERDADEIRA VERSÃO DOS FATOS DETURPADOS PROPOSITADAMENTE PELO

PARQUET

A primeira e mais importante tese de Defesa, que estrutura toda a

argumentação técnica da presente Resposta à acusação, é definida por uma

necessária e urgente negativa geral: o Primeiro Defendente jamais solicitou, nem

nunca aceitou, menos ainda recebeu, direta ou indiretamente, para si ou para outrem,

e de nenhum modo possível ou imaginável, quaisquer vantagens indevidas capazes de

configurar o tipo legal de corrupção passiva, definido na legislação penal.

Estabelecida esta premissa processual, é possível iniciar a

análise técnico­jurídica das imputações da denúncia, onde serão rechaçados ao

fundamento de que na espécie verifica­se a atipicidade de conduta, a impor absolvição

sumária dos Defendentes, nos precisos termos do art. 397, inciso III, do Código de

Processo Penal.

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IV.1. DO IMÓVEL DA RUA HABERBECK BRANDÃO, Nº 178:

Segundo a ótica disparatada da acusação, o Primeiro Defendente

teria cometido os hipotéticos delitos de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, entre

os anos de 2010 a 2014, por ter supostamente solicitado e aceitado de Marcelo

Odebrecht promessa de vantagem indevida consistente em um imóvel para a instalação

do Instituto Lula.

Afora o fato de a acusação basear­se completamente em

imputações genéricas, a realidade dos fatos é completamente diversa.

Primeiramente de se registrar que não se pode confundir a figura

da pessoa física do Primeiro Defendente com a figura jurídica do Instituto que leva o

seu nome. O INSTITUTO LULA, associação civil sem finalidade econômica, tem por

finalidade, dentre outras coisas, promover congressos, seminários, debates,

conferências, estudos e encontros de natureza política, jurídica, social, econômica e

financeira, indispensáveis à análise, compreensão, encaminhamento e solução de

problemas relacionados ao desenvolvimento nacional e à redução de desigualdades.

À época, o Instituto de Pesquisa e Estudos de Cidadania – IPEC,

antiga denominação do INSTITUTO LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA (“INSTITUTO

LULA”) procurava um imóvel que permitisse a criação do “Memorial da Democracia”,

que seria um museu para a exposição de vídeos, fotografias e documentos com o

objetivo de “colocar à disposição de todos os brasileiros conteúdos dinâmicos sobre a

longa caminhada, do Brasil Colônia ao século 21, em busca de democracia com justiça

social” (http://institutolula.org/memorial).

Nessa perspectiva, o INSTITUTO LULA idealizou a implantação

do “Memorial da Democracia” na Capital do Estado de São Paulo com as seguintes

características:

“(...)

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Esse gigantesco acervo documental, organizado e aberto a consulta pública por intermédio de equipamentos digitais, será o cerne de uma pioneira elaboração museológica que apresentará aos milhares de visitantes – jovens, crianças, estudantes e cidadãos em geral – uma educativa síntese sobre a longa caminhada do povo brasileiro até chegar ao sentimento otimista vivido pela Nação neste início de século 21, como fruto de sua consolidação democrática” (fls. 23).

Referido “Memorial da Democracia”, segundo o projeto

desenvolvido, deveria contar, em síntese, com a seguinte organização setorial:

(i) Área de Exposição Permanente;

(ii) Área de Exposições Temporárias, Café Temático,

Midiateca e um Auditório Multimídia com cinema para

200 (duzentas) pessoas;

(iii) Centro de Pesquisa e Documentação;

(iv) Centro de formação.

O “Memorial da Democracia”, ainda segundo o projeto

concebido, também deveria oferecer:

(i) acesso gratuito aos estudantes da rede pública mediante

agendamento oficial entre a direção do estabelecimento de ensino

e o memorial;

(ii) amplo acesso das instituições públicas de âmbito municipal

estadual e federal a todo acervo documental do memorial;

(iii) cota de 20% (vinte por cento) das turmas isentas de taxa para

estudantes da rede pública de educação municipal, estadual e

federal nos cursos de formação promovidos pelo memorial.

Realmente, à época da idealização do “Memorial da

Democracia”, o citado imóvel situado na Rua Haberbeck Brandão, nº 178 foi oferecido

para venda ao Instituto de Pesquisa e Estudos de Cidadania – IPEC.

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Na oportunidade, mais especificamente no dia 26.07.2011, o

arquiteto Marcelo Carvalho Ferraz acompanhou visita ao imóvel da Rua Dr:

Haberbeck Brandão, nº 178, a convite do Instituto, tendo considerado o referido imóvel

inadequado para a instalação do Memorial da Democracia.

O Sr. Marcelo Carvalho Ferraz narrou esse fato em depoimento

prestado aos Procuradores da República da Força Tarefa da “Operação Lava Jato”, em

data de 28.10.2016 (anexo 249 da denúncia):

(...)

(...)

Por essa razão, após mencionada visita ao local pela sua

diretoria, acompanhada do referido arquiteto Marcelo Carvalho Ferraz, levando em

conta sua opinião técnica, houve decisão pela não aquisição do imóvel eis que o

mesmo não se prestaria aos fins perseguidos.

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Tanto não havia interesse naquele imóvel da Rua Haberbeck

Brandão, nº 178 que o Instituto requereu à Prefeitura de São Paulo (doc. 06), logo

depois, em 02 de dezembro de 2011, a cessão de uso de um imóvel consistente em área

pública de 4.432m² no bairro da Luz, centro da cidade de São Paulo, para o fim

específico da implementação do “Memorial da Democracia”.

Ato seguinte foi instaurado no âmbito da Prefeitura do Município

de São Paulo o Processo Administrativo nº 2011­0.348.066­5, no qual o projeto do

“Memorial da Democracia” foi analisado por diversas Secretarias Municipais

(doc. 07).

O projeto obteve dos órgãos técnicos aprovação unânime quanto

ao mérito, tendo sido salientado, nas manifestações apresentadas, o interesse público

envolvido e, ainda, a sua compatibilidade com o projeto Nova Luz, em execução pelo

Município (doc. 08).

Posteriormente, o tema foi encaminhado à Câmara Municipal de

São Paulo através do Projeto de Lei nº 29/2012, o qual foi convertido na Lei Municipal

nº 15.573/2012, que foi sancionada pelo Exmo. Sr. Prefeito em 31/05/2012 (doc. 09).

No entanto, em 17.01.2014 o Ministério Público do Estado de

São Paulo ajuizou Ação Civil Pública em face da Prefeitura Municipal de São Paulo e

do INSTITUTO LULA, decorrente de instauração de Inquérito Civil ex officio pela 5ª

Promotoria do Patrimônio Público e Social da Capital, através da Portaria PJPP­CAP nº

95/2012, com o fito de anular a Lei Municipal nº 15.573/2012 e, por conseguinte,

impedir a celebração do contrato de cessão de bem imóvel objetivando a construção do

“Memorial da Democracia” em área pública de 4.432m² no bairro da Luz, na cidade de

São Paulo.

Frise­se que na referida ação foi requerida pelo Parquet

concessão de liminar ou tutela antecipada, para abstenção dos lá Réus de efetivação da

concessão de uso do imóvel ou do seu uso para o “Memorial da Democracia”, sob pena

de multa diária por descumprimento.

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Em 10.02.2014 foi proferida decisão judicial naqueles autos

deferindo a antecipação dos efeitos da tutela, o que impediu a instalação do “Memorial

da Democracia” naquela localidade (doc. 10).

Assim, resta claro que o “Memorial da Democracia” apenas não

foi instalado no imóvel cedido pela Prefeitura Municipal de São Paulo com base na lei

antes referida porque o Ministério Público de São Paulo obteve medida liminar que

suspendeu a eficácia daquele ato normativo.

Pelas razões expostas resta claro que jamais houve interesse,

solicitação, recebimento, posse, utilização ou propriedade do imóvel situado na

Rua Haberbeck Brandão, nº 178, quer por parte do INSTITUTO LULA e, muito

menos, por parte do Primeiro Defendente. Tanto é que o INSTITUTO LULA

funciona até hoje no endereço que foi comprado em 1990 pelo Instituto de Pesquisa e

Estudos do Trabalhador (IPET), na Rua Pouso Alegre, nº 21 – Ipiranga – SP.

IV.2. DO APARTAMENTO 121 DA AVENIDA FRANCISCO PRESTES MAIA, Nº 1501, SÃO

BERNARDO DO CAMPO/SP:

O imóvel localizado na Avenida Francisco Prestes Maia, 1501,

121 – São Bernardo do Campo/SP fora locado pela União à época em que o Primeiro

Defendente exercia o cargo de Presidente da República (Processo nº

00185.001695/2007­19, contrato nº 128/2007, datado de 18 de Setembro de 2007 (doc.

11), figurando como locador o Sr. Augusto Moreira Campos). O contrato de locação foi

sub­rogado pela União a favor do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da

República, através do “Termo Específico de Sub­rogação do Contrato 128/2007”,

firmado em 04.09.2008 e aditado através do “Termo Aditivo nº 01 ao Contrato de

Locação de Imóvel que, entre si, fazem a União, por intermédio da Presidência da

República, e a Senhora Elenice Silva Campos”.

Em 15.09.2009, por meio do “Termo Aditivo nº 02 ao Contrato

de Locação de Imóvel que, entre si fazem a União, por intermédio da Presidência da

República, e a senhora Elenice Silva Campos”, a vigência do contrato foi prorrogada até

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o dia 17.09.2010. Registre­se que a subcláusula única da cláusula primeira do referido

Termo Aditivo previa a extensão da vigência do contrato por iguais e sucessivos

períodos, limitados a vinte e quatro meses.

Contudo, no segundo semestre de 2010, o Gal. Gonçalves Dias,

ex­chefe de segurança do Primeiro Defendente e membro do Gabinete de Segurança

Institucional (GSI) – recebeu “NOTIFICAÇÃO QUANTO AO DIREITO DE

PREFERÊNCIA DO LOCATÁRIO”, no qual constava como Notificante a Sra. Elenice

Silva Campos e como notificado o GABINETE DE SEGURANÇA INSTITUCIONAL

DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA (doc. 12), com os seguintes termos:

“(...) Pelo presente, em atendimento ao que dispõe o artigo 27, da Lei 8.245/91, estou dando ciência da minha intenção de vender o imóvel atualmente locado pelo Notificado, situado na Avenida Francisco Prestes Maia n. 1501, apto 121 (cobertura), Condomínio Hill House, Centro, em São Bernardo do Campo – SP, informando-o (a) da existência de interessado(a), que oferece o preço de R$ 550.000,00 (QUINHENTOS E CINQUENTA MIL REAIS) à vista, já com os honorários da Intermediadora, podendo ainda, ser estudada proposta quanto a forma de pagamento.”

Em virtude da notificação acima, e por questões de segurança,

para evitar compra da unidade por uma terceira pessoa, possivelmente alheia às relações

pessoais do então Presidente da República e eventualmente motivada por razões

políticas (considerando que no mês de outubro daquele ano ocorreriam as eleições

presidenciais), constou­se a necessidade de encontrar uma solução para que o imóvel

não fosse oferecido à venda para qualquer pessoa. Neste momento, tanto os agentes

responsáveis pela segurança do então Presidente da República, aqui Primeiro

Defendente, como pessoas próximas a ele entenderam que a melhor solução seria

apresentar referido imóvel a terceiro interessado em investimentos imobiliários e

que pudesse manter a locação em vigor.

Esclareça­se que os Defendentes não tiveram qualquer

participação nessa solução. Apenas tiveram conhecimento de que havia um novo

proprietário e que a locação do imóvel seria prorrogada – o que efetivamente acabou

ocorrendo por meio de um contrato particular de locação firmado entre o novo

proprietário e a Segunda Defendente.

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A relação entre os Defendentes e o imóvel em tela, portanto,

decorre de um contrato de locação, de índole estritamente privada.

A verdade, portanto, que os Defendentes jamais foram

beneficiados por qualquer dos dois imóveis indicados na denúncia e muito menos

receberam qualquer vantagem indevida proveniente de contratos firmados pela

Petrobras.

V – DA CORRUPÇÃO PASSIVA

O tipo legal de corrupção passiva (art. 317, caput e §1o, c/c art.

327, §2o, CP), imputado ao Primeiro Defendente não se caracteriza, como se

demonstra, em síntese, a seguir:

(a) o Primeiro Defendente não realizou as ações de solicitar, ou

de aceitar promessa, ou ainda de receber, direta ou

indiretamente, para si ou para outrem, ainda que por

intermédio de terceiro, vantagens indevidas de qualquer

natureza, oferecidas e/ou prometidas por Marcelo Odebrecht,

ou por qualquer outra pessoa física ou jurídica;

(b) considerando tratar­se de crime de simples atividade, segundo

a opinião dominante, se não existe ação realizada pelo

acusado não pode existir o crime por ausência de relação de

causalidade entre (a) ações realizadas pelo acusado;

O tipo subjetivo do crime de corrupção passiva também não se

caracteriza porque:

(a) o dolo, como consciência dos elementos objetivos do tipo, e

como vontade de realizar as ações de solicitar, ou de receber,

em razão da função, vantagem indevida, ou de aceitar

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promessa dessa vantagem, jamais existiu no psiquismo do

acusado;

(b) a intenção especial, como característica psíquica expressa na

conjunção subordinativa para si ou para outrem, existente em

conjunto com o dolo, jamais integrou o psiquismo do acusado.

É o que se passa a demonstrar com mais vagar.

V.1. – DA NÃO CONCRETIZAÇÃO DOS NÚCLEOS TÍPICOS SOLICITAR, RECEBER OU

ACEITAR PROMESSA DE VANTAGEM INDEVIDA

Aqui, importa relembrar o preceito insculpido na norma penal

incriminadora:

Art. 317 - Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 10.763, de 12.11.2003)

Trata­se de crime cujo tipo apresenta múltiplas condutas:

solicitar, receber ou aceitar promessa de vantagem indevida. Solicitar é pedir, procurar,

buscar, rogar, induzir, manifestar o desejo de receber. Pode a solicitação ser expressa,

calara, indubitável, como velada, insinuada. Receber é tomar, obter, acolher, alcançar,

entrar na posse. Aceitar promessa de vantagem é consentir, concordar, estar de acordo,

anuir ao recebimento. Na solicitação, a iniciativa é do agente; no recebimento e

aceitação da vantagem é do extraneus, com a concordância do funcionário.

Nas palavras de ROGERIO GRECO75:

O delito de corrupção passiva pode se consumar em três momentos diferentes, dependendo do modo como o crime é praticado. Na primeira modalidade, o delito se consuma quando o agente, efetivamente, solicita, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, vantagem indevida, que, se vier a ser entregue, deverá ser considerada mero exaurimento do crime.

75 Greco, Rogério. Código Penal: comentado – 10. Ed. – Niteroi, RJ: Impetus, 2016. Pg. 1075

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Por meio da segunda modalidade prevista no tipo, ocorrerá a consumação quando o agente, sem que tenha feito qualquer solicitação, receber vantagem indevida. O último comportamento típico diz respeito ao fato de o agente tão somente aceitar promessa de tal vantagem.

Nas lições de BENTO DE FARIA

76, trata­se de “tráfico da função

pela qual se estabelece uma relação ilícita entre o funcionário indigno e o terceiro que,

valendo-se da sua venalidade, sujeita-o às iniciativas da sua vontade.”

Para MIRABETE77, é indispensável para a caracterização do ilícito

“que a prática do ato tenha relação com a função do sujeito ativo (ratione oficii).

Prossegue o ilustre doutrinador dizendo que o ato ou abstenção a que se refere a

corrupção deve ser da competência do funcionário, isto é, deve estar compreendido

nas suas especificadas atribuições funcionais, porque somente nesse caso se pode

deparar com o dano efetivo ou potencial ao regular funcionamento da administração.

Além disso, o pagamento feito ou prometido deve ser a contraprestação de ato de

atribuição do sujeito ativo. Não se tipifica a infração se a vantagem desejada pelo

corruptor não é da atribuição e competência do funcionário” (destacou­se).

Os conceitos trazidos são relevantes na medida em que, caso não

sejam indicados e comprovados os requisitos tipológicos do delito de corrupção, a

suposta conduta poderia ser adequada, em tese, a fattispecie criminale distinta daquela

debuxada pela acusação na inicial.

Ademais, a denúncia adota um método anormal: ousa deslocar a

prova (a) da imputação do crime de corrupção passiva, apresentada no capítulo IV.2,

intitulado “A corrupção ativa e passiva na aquisição de imóvel para instalação do

Instituto Lula” (Denúncia, fls. 121­137), para (b) o capítulo da prova da imputação do

crime de lavagem de dinheiro, apresentada no capítulo V.2, intitulado “A lavagem de

dinheiro na aquisição de imóvel para instalação do Instituto Lula” (Denúncia, fls. 139­

172).

76 Faria, Bento de . Código Penal brasileiro. 2. Ed. Rio de Janeiro: Record, 1959. V. 7, pg. 101. 77 Mirabete, Julio Fabrini, Manual de direito penal, volume 3: parte especial, Arts. 235 a 361 do CP – 30 ed. re., atual. e ampl. – São Paulo: Atlas, 2016. Pg. 303.

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Ou, em outras palavras, (a) a prova dos elementos típicos do

crime de corrução passiva é transferida (b) para a prova dos elementos típicos do crime

de lavagem de dinheiro; ou, ainda de outra forma, segundo a Denúncia, a prova da

tipicidade do crime de corrupção passiva depende da prova da tipicidade do crime de

lavagem de dinheiro.

Como se vê, é inconcebível maior disparate processual!

Pois bem.

Comumente, o Ministério Público, ao imputar a prática de um

delito tipicamente definido com múltiplos núcleos, utiliza todos, de forma mecânica até,

sem qualquer especificação ou fundamento em relação a cada núcleo.

Oportuno, neste passo, analisar cada verbo nuclear objeto da

denúncia — para evidenciar a não configuração da infração penal em exame.

Sobre o núcleo do tipo “solicitar”, é importante destacar, ab

initio, que a acusação, em momento algum, indica período ou circunstância que referida

conduta teria sido praticada pelo Primeiro Defendente.

Já no verbo nuclear “receber” do tipo penal de corrupção passiva

há grande confusão de parte da acusação. Como dito, há verdadeira co­incidência deste

tipo penal com o do crime de lavagem de capitais, não decidindo os membros do

Parquet se o afirmado teria sido realizado para exaurir o crime de corrupção passiva ou

lavar capital.

Escolha de Sofia?

Prima facie, o núcleo do tipo exige efetivo recebimento das

vantagens indevidas para restar configurado. Não existe – dentre todas as 188 páginas e

308 Anexos juntados à denúncia – qualquer prova ou mesmo indício de recebimento de

vantagem indevida pelo Primeiro Defendente. Ao contrário, a todo instante apenas se

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alude ao caixa geral direcionado ao Partido dos Trabalhadores ou ao chamado “núcleo

operacional”.

O que exatamente vem a ser “Caixa­Geral”? A conclusão é

sempre no mesmo sentido: na hipótese de não se conseguir encontrar fatos para vesti­los

em um molde arquetípico, a acusação se utiliza de ilações (ou “convicções”) sem

qualquer respaldo factual.

A verdade é que além de não haver elementos mínimos para a

configuração desse “Caixa-Geral”, não há nada — absolutamente nada — que

permita concluir que o Primeiro Defendente tenha recebido qualquer vantagem

oriunda das operações que foram expressamente indicadas na peça acusatória.

Anote­se, por relevante, que de forma diversa dos demais núcleos

– promessa e solicitação de vantagem indevida, que configuram delitos formais (una

actio perficiuntur) –, o núcleo “receber” é material (fracionável, porque pressupõe um

iter) reclama resultado para se aperfeiçoar. Os outros, com o dito, traduzem delitos

formais.

Portanto, não há qualquer elemento concreto que permita

sustentar, ainda que de forma indiciária, a existência de valor repassado ou obtenção de

vantagem indevida pelo Primeiro Defendente de modo a caracterizar delito de

corrupção passiva.

O núcleo do tipo “Aceitar Promessa” parte de ilação de que

Marcelo Odebrecht teria supostamente oferecido vantagem indevida; o momento da

aceitação, o ato praticado para tanto, enfim, este verbo é imposto totalmente de forma

genérica, sem qualquer documento ou elemento que sustente a argumentação. Ainda, a

acusação insiste em apontar que o Primeiro Defendente teria o liame subjetivo,

sabendo de toda a suposta “propina” aceita por terceiros.

Absurdo!

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Evidentemente, nenhum elemento concreto foi apresentado para

amparar tal afirmação.

Outrossim, a narrativa acusatória logrou – mesmo que não

fundamentada no âmbito dogmático – em uma distorcida aplicação da teoria do domínio

do fato, contrariando frontalmente o conceito de autoria e participação no direito penal,

e imputando, ainda, os fatos descrevendo ações de terceiros.

Aqui é preciso dizer, de forma radical e solene: O Primeiro

Defendente jamais solicitou ou recebeu vantagens indevidas, direta ou

indiretamente (nem de modo consciente e voluntário, nem mesmo de modo

inconsciente e involuntário) para si ou outrem, em nenhum momento de sua vida

pública e privada, conhecida por todos os brasileiros.

V.2 - A IMPUTAÇÃO DO FATO COMO DESCRIÇÃO DE AÇÕES DE OUTRAS PESSOAS

A denúncia descreve uma hipótese mirabolante, que pode ser

assim resumida: para recompensar ilicitamente o Primeiro Defendente pelo

funcionamento e manutenção do esquema criminoso, MARCELO ODEBRECHT teria

determinado que o valor de R$12.422.000,00 fosse destinado para aquisição de um

imóvel onde seria instalado o Instituto LULA; por seu lado, para manter o esquema

ilícito em operação, o Primeiro Defendente teria solicitado a destinação daquele valor

para os fins indicados, porque no final do segundo mandato na Presidência da

República, teria concebido a ideia do Instituto como espaço (a) de atuação pessoal e (b)

de armazenamento e exposição de presentes recebidos como Presidente da República

(denúncia, fl. 122).

O imóvel escolhido, conforme as especificações indicadas,

situado na Rua Dr. Haberbeck Brandão, 178, São Paulo, SP, de propriedade de ASA –

Agência Sul Americana de Publicidade e Administração Ltda., teria sido adquirido

formalmente pela DAG CONSTRUTORA LTDA., que teria atuado como anteparo do

Grupo ODEBRECHT, com a interposição de GLAUCOS DA COSTAMARQUES e

sob a orientação do advogado ROBERTO TEIXEIRA, tudo para benefício direto do

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Primeiro Defendente, em ato de lavagem de dinheiro narrado no item V.2, da

denúncia.

A substituição da demonstração das hipóteses pelas convicções

sobre as hipóteses nos processos psíquicos dos signatários da denúncia principia na

afirmação de que “não existe nenhuma dúvida de que o imóvel em apreço esteve

destinado à instalação de espaço institucional de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA.”

(denúncia, fl. 124).

A hipótese teria sido comprovada pela arrecadação no Sítio Santa

Bárbara, em Atibaia, SP, de um documento arquivado em pasta com o nome da

Segunda Defendente, contendo um projeto arquitetônico de reforma de imóvel com

dimensões e características correspondentes ao imóvel acima descrito, admitido como

compatível com a instalação de um espaço institucional, segundo análise da Polícia

Federal. (denúncia, fl. 125).

A denúncia menciona, com todo destaque, por um lado, (a) que

JOSÉ CARLOS BUMLAI, referido como amigo do Primeiro Defendente teria

assumido a responsabilidade de gerenciar o espaço institucional (i) escolhendo

MARCELO ODEBRECHT como a primeira pessoa para falar sobre o projeto, enquanto

(ii) ROBERTO TEIXEIRA teria se incumbido de procurar um terreno adequado para o

instituto (nas proximidades do Aeroporto de Congonhas, em São Paulo); mas, por outro

lado, a denúncia (b) omite uma informação importante, que poderia explicar algumas

coincidências que parecem impressionar ou desorientar a acusação, consistente na

determinação da Segunda Defendente (em cuja pasta teria sido encontrado o projeto

arquitetônico de reforma do imóvel, cf. item 4.2, acima), de não comunicar o fato ao

Primeiro Defendente, referida por JOSÉ CARLOS BUMLAI, nestes termos:

“QUE havia determinação de MARISA para que tal assunto não fosse levado a LUIS INÁCIO LULA DA SILVA pelo DECLARANTE e por outras pessoas até que o tema fosse tratado diretamente por ela com o ex-Presidente.” (denúncia, fls. 122-3, Anexo 226, Depoimento de JOSÉ CARLOS BUMLAI) (grifamos).

A informação é importante, porque (a) a eventual iniciativa da

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Segunda Defendente sobre o imóvel não possuiria relevância típica, do ponto de vista

do crime de corrupção passiva, mas (b) o desconhecimento de eventual compra do

imóvel por parte do Primeiro Defendente – como, aliás, este tem sempre afirmado –,

possui toda relevância típica, do ponto de vista do tipo de corrupção passiva, cuja

natureza dolosa excluiria toda e qualquer imputação.

A hipótese acusatória começa a adquirir contornos teratológicos

quando a denúncia afirma, de modo peremptório, o seguinte: o imóvel acima descrito

(a) teria sido recebido pelo Primeiro Defendente no dia 29 de setembro de 2010, data

em que o imóvel teria sido colocado à sua disposição, (b) porque a DAG

CONSTRUTORA LTDA., definida na narrativa da inicial como formal compradora do

imóvel, nesse dia 29 de setembro de 2010, teria efetuado o pagamento do preço à antiga

proprietária ASA – Agência Sul Americana de Publicidade e Administração Ltda.,

mediante Escritura Pública de Compra e Venda.

Assim, segundo a lógica peculiar da narrativa acusatória – ou

seja, segundo a lógica das convicções dos signatários da denúncia – o Primeiro

Defendente ter-se-ia tornado proprietário de um imóvel urbano objeto de escritura

pública de compra-e-venda entre a empresa-vendedora ASA – Agência Sul

Americana de Publicidade e Administração Ltda., representada por DEMERVAL

GUSMÃO, e a empresa-compradora DAG CONSTRUTORA LTDA., representada

por GLAUCOS DA COSTAMARQUES. Dito de outro modo, segundo a lógica

estranha da denúncia, a tradição ou transferência da propriedade imóvel não se

opera pela transcrição da Escritura Pública no Cartório de Registro de Imóveis

competente, mas no momento e que o imóvel é colocado à disposição de alguém,

como na locação, no comodato etc. É desnecessário continuar.

Segundo a lógica desvirtuada da denúncia, o efetivo pagamento

do preço do imóvel teria sido feito pelo Grupo ODEBRECHT, como cumprimento da

oferta ou da promessa de vantagem ilícita feita por MARCELO ODEBRECHT,

correspondente à solicitação ou aceitação da promessa de vantagem ilícita formulada

pelo Primeiro Defendente, tudo com a indefectível intermediação de ANTONIO

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PALOCCI, convenientemente incumbido da “gerência” de uma suposta “caixa geral” de

propina do Partido dos Trabalhadores perante o Grupo ODEBRECHT, além do auxílio

eficiente de BRANISLAV KONTIC. (denúncia, fls. 126­126)

E, para registrar os chamados repasses espúrios destinados à

aquisição do imóvel, segundo a denúncia, MARCELO ODEBRECHT teria criado, no

Setor de Operações Estruturadas da contabilidade da empresa ODEBRECHT, uma

planilha chamada “Programa Especial Italiano”, contendo a rubrica “Prédio (IL)” e a

consignação do número 12.422, seguido da expressão algébrica “((3*1057) + 8217 +

1034”), que indicariam os valores destinados ao pagamento de propina, que teria sido

autorizada por MARCELO ODEBRECHT e operacionalizada por ANTONIO

PALOCCI, com o auxílio de BRANISLAV KONTIC. (denúncia, fl. 126)

V.3 - A SUPOSTA COMPROVAÇÃO DA HIPÓTESE DA DENÚNCIA

Segundo a denúncia, no curso das investigações teria sido

comprovado que o valor de R$ 12.422.000,00, indicado na planilha “Programa Especial

Italiano” do Setor de Operações Estruturadas da contabilidade da ODEBRECHT, fora

empregado para compra do imóvel, constando DAG CONSTRUTORA LTDA., como

adquirente formal, mediante a interposição de GLAUCOS DA COSTAMARQUES,

que atuaria em sucessivas transações, conforme concepção, na linha da lógica

esquizofrênica da denúncia, atribuída ao Advogado ROBERTO TEIXEIRA.

Para demonstrar a hipótese objeto das convicções da Força Tarefa

atuante na Operação Lava Jato, de que o Primeiro Defendente seria o proprietário do

imóvel indicado, a denúncia apresenta uma série de e­mails e outras comunicações

eletrônicas, assim resumidas:

A planilha do “Programa Especial Italiano” contendo o signo “Prédio

(IL)”, a consignação do número 12.422, seguido da expressão algébrica

“((3*1057) + 8217 + 1034”), como indicação de valores que comprovam a

transação, segundo as convicções idiossincráticas dos signatários da denúncia

(denúncia, fl. 129);

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E­mails de MARCELO ODEBRECHT dirigidos a Paulo Melo, João

Lovera (executivo da ODEBRECHT), BRANISLAV KONTIC e ROBERTO

TEIXEIRA, apresentados pela denúncia como evidência das tratativas para

aquisição do imóvel, os quais teriam, pelas referidas comunicações eletrônicas,

(i) pleno conhecimento da compra do imóvel por ODEBRECHT, (ii) de sua

destinação para instalação do Instituto LULA, através da intermediação de

DAG CONSTRUTORA LTDA., implementando­se, assim, (iii) o

oferecimento e o pagamento de vantagem indevida ao Primeiro Defendente,

com (iv) a adesão e participação de ANTONIO PALOCCI e de BRANISLAV

KOTIC na conduta do Primeiro Defendente (denúncia, fls. 128­129);

Troca de e­mails entre Darci Luz (secretária) e MARCELO

ODEBRECHT, em que (i) a secretária informa sobre reunião com ROBERTO

TEIXEIRA e PALOCCI, marcada para o dia 03/09/2010, (ii) MARCELO

ODEBRECHT responde dizendo estar ciente da reunião (cuja realização teria

sido confirmada pela Agenda de MARCELO) e sugere que poderia almoçar

com Demerval Gusmão, sem indicar data, (iii) informando­se PAULO MELO

da referida reunião: a denúncia concluiu, sob a forma leviana e temerária que

a caracterizam, que a interlocução desses personagens seria a evidência da

compra do imóvel para o Instituto (denúncia, fl. 129)

A conclusão da denúncia seria corroborada por e­mail de ROBERTO

TEIXEIRA com (i) listagem dos custos finais da compra, (ii) solicitação a

PAULO MELO dos pagamentos respectivos, (iii) encaminhada em seguida a

JOAO LOVERA, (iv) novo encaminhamento a DMERVAL GUSMÃO, que

teria efetuado o pagamento como “interposta pessoa” , com o destaque (v) do

pagamento “por fora” (que teria sido solicitado através de ROBERTO

TEIXEIRA) a EDNA CASTRO (corretora do imóvel), de preferência em

dinheiro, no valor de R$191.978,12, segundo análise da Polícia Judiciária

(denúncia, fl. 129);

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Quebra de sigilo bancário de DAG CONSTRUTORA LTDA.

confirmaria (i) cheque administrativo de R$191.978,12 – estornado por

pagamento em dinheiro e (ii) cheque administrativo de R$408.021,97, entregue

à corretora como o valor avençado da compra (denúncia, fl. 130);

E­mail de ROBERTO TEIXEIRA, com a minuta da escritura, para

Nelson Júlio César e Edna Castro, também encaminhados a João Lovera e

Mariana Gusmão, sócia de DEMERVAL GUSMÃO (fl. 131);

E­mail de PAULO MELO a empregado da ODEBRECHT com minuta

de escritura, com resposta do empregado solicitando cópia atualizada do

contrato social de ASA, e a réplica de PAULO MELO de que teriam sido

“eximidos” dessa análise pelo cliente, acrescentando que a preocupação não

seria o risco da aquisição, mas o prejuízo do comprador” (denúncia, fl. 132);

Troca de e­mails, de conteúdo irrelevante, entre MARCELO

ODEBRECHCT e BRANISLAV KONTIC (Denúncia, fl. 132), seguida de

outra troca de e­mail entre PAULO MELO (dizendo que “quer falar

pessoalmente” para “atualizar a respeito do assunto instituto”) e MARCELO

ODEBRECHT (que diz estar nos EUA e que, “se for pessoalmente, só na

semana que vem”) (denúncia, fl. 134).

É inacreditável, mas o Ministério Público Federal assume, com a

célebre convicção de suas manifestações públicas sobre a referida intervenção de guerra

no cenário político­institucional brasileiro, que as informações irrelevantes, os dados

precários ou inseguros ou as opiniões inconcludentes dos e­mails e outras interlocuções

eletrônicas são suficientes para funcionar como evidências ou provas capazes de

fundamentar uma gravíssima imputação de corrupção passiva (e ativa), como indica o

item seguinte.

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V.4 - A INSÓLITA FUNDAMENTAÇÃO DA IMPUTAÇÃO DA DENÚNCIA

Além das interlocuções dos e­mails e outras comunicações

eletrônicas indicadas, a denúncia afirma que a compra do imóvel também seria

demonstrada:

Pelos valores da planilha “Programa Especial do Italiano”, com as

inscrições simbólicas do “Prédio (IL)” e do número 12.422, seguido da

expressão algébrica “((3*1057) + 8217 + 1034”);

Pelo “detalhado no item V.2” (denúncia, p. 134­135), relativo ao

capítulo posterior intitulado “A lavagem de dinheiro na aquisição de

imóvel para instalação do Instituto Lula” (denúncia, fls. 139­160).

Sobre a letra b), acima, a denúncia adota um método anormal:

ousa deslocar a prova (a) da imputação do crime de corrupção passiva, apresentada no

capítulo IV.2, intitulado “A corrupção ativa e passiva na aquisição de imóvel para

instalação do Instituto Lula” (denúncia, fls. 121­137), para (b) o capítulo da prova da

imputação do crime de lavagem de dinheiro, apresentada no capítulo V.2, intitulado “A

lavagem de dinheiro na aquisição de imóvel para instalação do Instituto Lula”

(denúncia, fls. 139­172).

Ou, em outras palavras, (a) a prova dos elementos típicos do

crime de corrução passiva é transferida (b) para a prova dos elementos típicos do

crime de lavagem de dinheiro; ou, ainda de outra forma, segundo a denúncia, a

prova da tipicidade do crime de corrupção passiva depende da prova da tipicidade

do crime de lavagem de dinheiro.

Como se vê, é inconcebível tamanho disparate processual!

As incongruências das conclusões também são perceptíveis nas

adaptações forçadas de elementos demonstrados com as convicções pessoais dos

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signatários da denúncia, por exemplo:

A discrepância entre (a) os valores simbólicos da planilha do “Programa

Especial do Italiano” e (b) o custo total da aquisição do imóvel é superada por

uma “penada”, como correspondência “praticamente exata” – como se fosse

um problema numérico de equações matemáticas objetivas e não um problema

jurídico de valores humanos (denúncia, fl. 135);

O problema reaparece na comparação (a) do número simbólico 12422, da

planilha do “Programa Especial do Italiano”, com (b) o valor de R$

12.411.349,38, correspondente à despesa total de aquisição do imóvel por

DAG CONSTRUTORA LIMITADA, superado da mesma forma leviana pela

denúncia, definindo como “absolutamente próxima” a diferença – valendo os

mesmos argumentos da alínea anterior (denúncia, fls. 135­136);

E, de novo, nos defrontamos com a transferência da prova para o

“detalhado no item V.2” (denúncia, p. 135­136), deslocando a prova do

capítulo IV.2 (“A corrupção ativa e passiva na aquisição de imóvel para

instalação do Instituto Lula”) (denúncia, fls. 121­137), para o capítulo V.2

(“A lavagem de dinheiro na aquisição de imóvel para instalação do Instituto

Lula”) (denúncia, fls. 139­160), com as mesmas observações críticas: o

procedimento anormal da denúncia desloca a prova (a) da imputação do crime

de corrupção passiva, apresentada no capítulo IV.2, para (b) o capítulo da

prova da imputação do crime de lavagem de dinheiro, apresentada no capítulo

V.2 (denúncia, fls. 139­172).

Ou, em outras palavras, (a) a prova dos elementos típicos do

crime de corrução passiva é transferida (b) para a prova dos elementos típicos do

crime de lavagem de dinheiro; ou, ainda de outra forma, segundo a denúncia, a

prova da tipicidade do crime de corrupção passiva depende da prova da tipicidade

do crime de lavagem de dinheiro.

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E assim, de incongruência em incongruência, ou de disparate

em disparate prossegue a denúncia extravagante e ilegal da Força Tarefa do MPF

atuante na Operação Lava Jato.

Então, aparece verbalizada a grande convicção da denúncia, no

sentido de que (a) a ODEBRECH seria a verdadeira responsável pela aquisição do

imóvel, (b) que teria sido adquirido com recursos da “caixa de propinas” do PT,

contabilizada na famosa planilha do “Programa Especial do Italiano”, (c) em transação

na qual a empresa DAG CONSTRUTORA LIMITADA teria funcionado como

anteparo para dissimular a participação da ODEBRECHT no negócio jurídico, (d) tudo

com o objetivo de instalação do Instituto Lula no imóvel, (e) que representaria a

vantagem indevida (i) oferecida por MARCELO ODEBRECHT e (ii) solicitada pelo

Primeiro Defendente, (f) com a participação de ANTONIO PALOCCI e de

BRANISLAV KONTIC no negócio jurídico, com plena ciência da compra do terreno,

como forma de ocultar a participação do Primeiro Defendente, como o maior

beneficiário da vantagem indevida. (denúncia, fl. 136)

Assim, a verbalização da convicção final surge sob a forma de

um silogismo capenga, porque erigido (a) exclusivamente sobre a premissa maior

(que abriga as convicções dos signatários da denúncia), mas carente inteiramente da

premissa menor, porque estão ausentes os elementos de prova da tipicidade do fato

imputado, como demonstrado.

V.5 – DA DISFARÇADA – PORÉM EQUIVOCADA – APLICAÇÃO DA TEORIA DO DOMÍNIO

DO FATO

Em princípio, para imputar os hipotéticos fatos espalhados na

imensa e teratológica denúncia, os agentes da Força Tarefa “Lava Jato” parecem utilizar

os conceitos de autoria e de participação, conforme desenvolvidos pela moderna teoria

do domínio do fato – embora, de modo estranho, a narrativa da denúncia evite enfrentar

os referidos conceitos, o que pode significar, por um lado, insegurança teórica em

relação aos mesmos e, assim, poderia explicar, por outro lado, a obviamente equivocada

ou inadequada aplicação desses conceitos ao caso concreto.

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V.5.1 - O DOMÍNIO DO FATO COMO CRITÉRIO DOS CHAMADOS DELITOS GERAIS

Para demonstrar a diferença entre os conceitos de autoria e de

participação, parece útil retomar a obra de CLAUS ROXIN, que produziu uma

revolução na dogmática penal com a publicação de Täterschaft und Tatherrschaft

(1963), introduzindo o conceito de domínio do fato (Tatherrschaft) como critério

científico para distinguir entre autor e partícipe, impossível com as teorias (a) unitária,

(b) restritiva ou (c) subjetiva de autor. Hoje, graças ao professor de München, sabemos:

“A ideia básica para distinguir autor e partícipe da teoria do domínio do fato é a realização da ação típica: o autor domina a realização do tipo de injusto, controlando a continuidade ou a paralisação da ação típica; o partícipe não domina a realização do tipo de injusto, não tem controle sobre a continuidade ou paralisação da ação típica”78.

Mas, é preciso esclarecer: segundo ROXIN, a teoria do domínio

do fato é capaz de diferenciar autores e partícipes somente nos delitos de autoria geral,

que podem ser realizados por qualquer pessoa – a maioria dos delitos, chamados

Herrschaftsdelikte –, em que o autor domina a realização do tipo e o partícipe apenas

influencia o acontecimento típico; nos delitos de dever (os chamados Pflichtsdelikte),

somente o portador do dever jurídico (por exemplo, o funcionário público) pode ser

autor – os demais podem ser partícipes; nos delitos de mão própria (os chamados

eigenhändigen Delikte), o autor realiza o tipo pelas próprias mãos – os demais somente

podem ser partícipes79.

Assim, naqueles delitos gerais, a teoria do domínio do fato parece

adequada para definir todas as formas de realização ou de contribuição para realização

do tipo de injusto, compreendidas nas categorias de autoria e de participação, assim

concebidas:

1) autoria, sob as modalidades (a) direta, como realização pessoal do tipo

78 ROXIN, Strafrecht, 2003, v. II, § 25, n. 10. 79 ROXIN, Strafrecht, 2003, v. II, § 25, n. 13­15.

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de injusto, (b) mediata, como utilização de outrem para realizar o tipo de injusto,

e (c) coletiva, como decisão comum e realização comum do tipo de injusto;

2) participação, sob as formas (a) de instigação, como determinação dolosa

a fato principal doloso de outrem, e (b) de cumplicidade, como ajuda dolosa a fato

principal doloso de outrem.” 80

Não obstante, nada melhor do que utilizar as palavras do próprio

ROXIN, no recente Volume II de seu famoso Strafrecht Allgemeiner Teil, para

esclarecer a questão:

“Na maioria dos delitos, segundo uma teoria hoje completamente dominante e pela primeira vez trabalhada de modo abrangente por mim, o domínio do fato é o ponto de vista decisivo para a autoria: figura central do processo delitivo é quem domina o acontecimento conducente à realização do delito, enquanto o partícipe, na verdade, também influencia, mas não configura de modo decisivo a sua execução. Eu falo aqui de “delitos de domínio”. Em delitos gerais, como homicídio, lesões corporais, dano, furto e outros, autor é sempre a figura central e, com isso, quem tem o domínio do fato, sozinho ou com outros.” (Tradução livre)81

Na verdade, a teoria de ROXIN classifica, do ponto de vista da

autoria, os delitos em três grandes categorias:

a) os delitos gerais, regidos pelo domínio do fato (os chamados

Herrschaftsdelikte), em que o autor domina a realização do tipo,

enquanto o partícipe apenas influencia o acontecimento típico;

b) os delitos de dever (os Pflichtsdelikte), em que somente o portador

do dever (de fidelidade do funcionário público) pode ser autor,

80 CIRINO DOS SANTOS, Juarez. Direito Penal: Parte Geral. Florianópolis, 2017, 7ª edição, p. 348­349. 81 ROXIN, Claus. Strafrecht Allgemeiner Teil. München: BECK, vol. II, 2003, § 25, p. 9­10, número marginal 13. “Bei den meisten Delikten ist nach einer heute ganz herrschenden und von mir erstmals umfassend ausgearbeiteten Lehre die „Tatherrschaft“ der für die Täterschaft entscheidende Gesichtspunkt: Zentralgestalt des Deliktsvorganges ist, wer das zur Deliktsverwirklichung führende Geschehen beherrscht während die Teilnehmer auf das Geschehen zwar ebenfalls Einfluss nehmen, seine Ausführung aber nicht massgeblich gestalten. Ich spreche hier von „Herrschaftsdelikten“. Bei Allgemeindelikten wie Tötungen, Körperverletzungen, Sachbeschädigungen, Diebstahl, usw. ist Zentralgestalt und damit Täter immer der, der allein oder mit anderen die Tatherrschaft hat.“

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enquanto o não portador do dever (o chamado extraneus) só pode ser

partícipe;

c) os delitos de mão-própria (ou Eigenhändigendelikte), em que o autor

realiza o tipo com as próprias mãos (falso testemunho, por exemplo),

enquanto terceiros, que podem influenciar o acontecimento, somente

podem ser partícipes.82

Como se vê, os delitos de domínio (Herrschaftsdelikte), que

constituem a grande maioria dos crimes, estão circunscritos aos delitos gerais, que

podem ser realizados por qualquer pessoa (homicídio, furto, estelionato etc.), nos quais

o critério do domínio do fato (Tatherrschaft) é essencial para distinguir entre autores e

partícipes; ao contrário, o critério do domínio do fato não se aplica aos delitos de dever

– os delitos do funcionário público, por exemplo, imputados ao Primeiro Defendente,

aos Diretores da Petrobras e demais funcionários públicos referidos na Denúncia –

para identificar a autoria. Mais uma vez, explica ROXIN com sua famosa clareza

didática:

“Também existem delitos nos quais somente aquele que lesionou um dever especial, não adequado a qualquer um, está no centro de uma realização típica. Estes delitos eu denomino delitos de dever. Assim, por exemplo, no tipo de peculato (§ 266), a ação típica não é descrita como nos delitos de domínio, através de determinados modos de comportamento exterior, mas através da lesão de um dever de cuidado do patrimônio. Nestes casos é autor (= figura central do acontecer típico) quem (de qualquer modo) produz o resultado através de uma lesão de dever especial típico específico dele, enquanto alguém, que não é alcançado por este dever (portanto, por exemplo, não tem nenhum dever de cuidado especial em relação à vítima), de modo inteiramente independente da importância de sua contribuição exterior, somente pode ser partícipe.” (Tradução livre)83

82 ROXIN, Claus. Strafrecht Allgemeiner Teil. München: BECK, vol. II, 2003, p. 9­10, n. 13­15. 83 ROXIN, Claus. Strafrecht Allgemeiner Teil. München: BECK, vol. II, 2003, p. 10, n. 14. “Es gibt aber auch Delikte, bei denen im Zentrum einer Tatbestandsverwirklichung nur derjenige steht, der eine besondere, nicht jedermann treffende Pflicht verletzt hat. Diese Delikte nenne ich Pflichtdelikte. So wird z. B. beim Tatbestand der Untreue (§ 266) die Tatbestandshandlung nicht wie bei den Herrschaftsdelikten durch bestimmte äussere Verhaltensweisen, sondern durch die Verletzung einer Vermögensfürsorgepflicht beschrieben. In diesen Fällen ist Täter (= Zentralgestalt des Deliktsvorganges), wer den Erfolg (auf welche Weise auch immer) durch eine Verletzung seiner tatbestandsspezifischen Sonderpflicht verletzt, während jemand der von dieser Pflicht nicht getroffen wird (also z. B. keine Vermögensfürsorgepflicht gegenüber dem Opfer hat), völlig unabhängig vom Gewicht seines äusseren Tatbeitrages immer nur Teilnehmer sein kann.“

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V.5.2 - AS FORMAS DE DOMÍNIO DO FATO NOS DELITOS DE DOMÍNIO

No âmbito dos delitos de domínio – ou seja, nos delitos de autoria

geral –, ROXIN distingue, ainda, três modalidades de domínio do fato, assim definidas:

a) domínio da ação, mediante realização pessoal do tipo (autoria direta);

b) domínio da vontade (ou seja, domínio da vontade do instrumento),

mediante realização do tipo com utilização de alguém como instrumento

(as hipóteses de coação, de erro ou de emprego de aparelhos de poder

organizado, como formas de autoria mediata);

c) o domínio funcional (ou coletivo) do fato comum, como forma

específica de coautoria.84

V.5.3 - O IMPOSSÍVEL DOMÍNIO DO FATO EM DELITOS DE DEVER

A ideia geral que fundamenta a imputação do crime de corrupção

passiva ao Primeiro Defendente, apesar da linguagem tosca no tratamento do tema,

parece ser a teoria do domínio do fato, cuja aplicação na jurisprudência brasileira é

carregada de equívocos, como ficou registrado na Ação Penal 470, do Supremo

Tribunal Federal.

A leitura da denúncia mostra que a teoria do domínio do fato se

esparrama por toda a narrativa acusatória, sedimentada em conceitos de poder, ou de

hierarquia, ou de controle e semelhantes, como alternativa para compensar a

insuficiência ou, melhor, a inexistência de provas de realização pessoal das ações típicas

variáveis do crime imputado.

Essa verificação pode começar pela primeira imputação

abrangente da denúncia:

84 ROXIN, Claus. Strafrecht Allgemeiner Teil. München: BECK, vol. II, 2003, § 25, p. 19­122, números marginais 38­310.

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“Como explicitado acima, a prova colhida evidenciou que LULA, pelo menos entre 2003 e 2010, na condição de Presidente da República, e depois na condição de líder partidário com influência no governo vinculado ao seu partido e de ex-Presidente em cujo mandato haviam sido assinados contratos e aditivos que tiveram sua execução e pagamento prolongados no tempo, autorizou a nomeação e manteve, por longo período de tempo, Diretores da Petrobras comprometidos com a geração e arrecadação de propinas para a compra do apoio dos partidos de que dependia para formar confortável base aliada, garantindo o enriquecimento ilícito dos parlamentares dessas agremiações, de si próprio, dos detentores dos cargos diretivos da estatal e de operadores financeiros, e financiando caras campanhas eleitorais em prol de uma permanência no poder assentada em recursos públicos desviados.” (Denúncia, fl. 75)

Uma clara tentativa de exprimir uma posição de domínio do fato

aparece em estribilho que marca cada contrato entre empreiteiras e Petrobras descrito na

denúncia, a começar pelo primeiro deles (CONPAR, item IV.1.1.1.):

“Por sua vez, PAULO ROBERTO COSTA, RENATO DUQUE, funcionários de alto escalão da Petrobras que contavam com LULA para a sua manutenção nos cargos, e PEDRO BARUSCO, cientes do macroesquema partidário de corrupção comandado por LULA, aceitaram e receberam, para si e para outrem, as vantagens indevidas pagas pela ODEBRECHT em razão do aludido contrato firmado com a PETROBRAS e respectivos aditivos.” (Denúncia, fl. 86)

Imputações equivalentes aparecem nos itens IV.1.1.2 (ABREU E

LIMA, fl. 89), IV.1.1.3 (COMPERJ, fl. 92), IV.1.1.4. (ODEBEI, fl. 96), IV.1.1.5

(ODEBEI PLANGÁS, fl. 98), IV.1.1.6. (ODEBEI FLARE, fl. 100), IV.1.1.7.

(ODETECH, fl. 104) e IV.1.1.8 (RIO PARAGUAÇU, fl. 106).

No Capítulo IV.1.2., intitulado “A ação criminosa de LULA”, a

narrativa da denúncia emprega palavras específicas para definir o domínio do fato,

como se observa:

“Nesse contexto de atividades delituosas praticadas em prejuízo da Petrobras, LULA dominava toda a empreitada criminosa, com plenos poderes para decidir sobre sua prática, interrupção e circunstâncias. Nos ajustes entre diversos agentes públicos e políticos, marcado pelo poder hierarquizado, LULA ocupava o cargo público mais elevado e, no contexto de ajustes partidários, era o maior líder do Partido dos Trabalhadores. Nessa engrenagem criminosa, marcada pela fungibilidade dos membros que cumpriam funções, a preocupação primordial dos agentes públicos corrompidos não era atender ao interesse público, mas sim atingir, por meio da

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corrupção, o triplo objetivo de enriquecer ilicitamente, obter recursos para um projeto de poder e garantir a governabilidade. Os atos de LULA, quando analisados em conjunto e em seu contexto, revelam uma ação coordenada por ele, desde o início, com a nomeação de agentes públicos comprometidos com o desvio de recursos públicos para agentes e agremiações políticas, como foi o caso dos Diretores da Petrobras, até a produção do resultado, isto é, a efetiva corrupção para atingir aquelas três finalidades.” (denúncia, fl. 107)

No trecho transcrito, ao falar da “fungibilidade dos membros que

cumpriam funções”, no contexto da hipotética “engrenagem criminosa”, a denúncia

parece derivar para a tese de autoria mediata pelo domínio da vontade do instrumento,

na modalidade de emprego de aparelhos de poder organizado – aliás, a proposta original

de ROXIN –, mas a hipótese de uso de aparelhos de poder organizado, como forma de

domínio da vontade do instrumento, marcado precisamente pela fungibilidade do

instrumento, embora circunscrita ao Estado (não se aplica a empresas privadas, por

ausência de fungibilidade do instrumento), é incompatível com os delitos de dever,

como os delitos do funcionário público, em geral, porque construída para a área dos

delitos de domínio, como explica ROXIN (ver acima, item 8).

No mesmo capítulo IV.1.2. são também atribuídas ao Primeiro

Defendente qualidades características do domínio do fato, como se vê:

“Nessa toada, LULA, mantendo contato próximo com diversos executivos das empreiteiras que fraudaram as licitações da Petrobras e tendo papel decisivo na nomeação de Diretores responsáveis por garantir o sucesso das escolhas do cartel, era peça central do esquema, recebendo, direta e indiretamente, as vantagens indevidas dele decorrentes.” (denúncia, fl. 113)

Se a denúncia imputa o crime de corrupção passiva ao

Primeiro Defendente, fundada na teoria do domínio do fato, mas se a ciência do

Direito Penal informa – inclusive ROXIN, o fundador da teoria –, que a teoria do

domínio do fato é incompatível com os delitos de dever – como é o delito de

corrupção passiva –, erigidos para proteger a fidelidade do funcionário público em

face do Estado, então a denúncia está enredada numa contradictio in adjecto,

porque a categoria científica invocada para legitimar a imputação, não se aplica ao

fato imputado. Logo, o fato de corrupção passiva não pode ser imputado com base na

categoria de domínio do fato, mas somente sob a categoria de delito de dever, que

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pressupõe a realização pessoal da lesão do dever, excluída das ações reais imputadas ao

Primeiro Defendente.

V.6 – INEXISTÊNCIA DA CAUSA DE AUMENTO DE PENA (ART. 317, §1º, DO CP) –

AUSÊNCIA DE ATO DE OFÍCIO

O art. 317, §1º, do Código Penal, assim dispõe:

Art. 317, § 1º - A pena é aumentada de um terço, se, em conseqüência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional.

A modalidade majorada do crime de corrupção passiva exige que

o funcionário retarde ou deixe de praticar ato de ofício ou o pratica infringindo dever

funcional.

O ato de ofício “É aquele que se compreende nas atribuições do

funcionário, ou em sua competência, ou seja, ato administrativo ou judicial”85

(destacou­se).

Sobre o tema, a acusação afirma que o Primeiro Defendente

teria incorrido na prática de crime de corrupção porque — segundo a narrativa da

denúncia — teria ele indicado diretores da Petrobras ciente de que eles iriam desviar

recursos da companhia e, por conseguinte, da Administração Pública Federal.

Nada mais absurdo!

Primeiramente, ressalte­se que o Primeiro Defendente não

indicou os três diretores da Petrobras que foram citados na denúncia, como já

esclarecido em depoimentos prestados tanto ao Ministério Público Federal, como à

Polícia Federal.

85 E. Magalhães Noronha in Celso Delmanto, Código penal comentado, Ed. Renovar, RJ, 6ª ed., pág. 637

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Muito menos o Primeiro Defendente teve qualquer participação

na sua nomeação para tais cargos — uma vez que se trata de ato privativo do Conselho

de Administração da Companhia, conforme dispõe o seu Estatuto.

Facilmente perceptível, portanto, que o Primeiro Defendente não

praticou ou deixou de praticar qualquer ato de ofício que pudesse contribuir para com o

suposto esquema criminoso narrado na peça vestibular.

A estrutura organizacional do Estado é realizada de forma que

cada braço ou segmento setor tenha sua hierarquia e possa gerir as situações que lhe

couberem. Seria insano supor ser o Presidente da República responsável por todo e

qualquer ato da administração nos escalões inferiores — para responsabilizá­lo na

hipótese da prática de um ilícito86.

E a Petrobras sequer integra a Administração Pública Federal

direta! É pessoa física de direito privado, com a presença de um comitê responsável

pelas licitações, dotada de Conselho Fiscal, auditada por empresas independentes e que

tem as contas examinadas pela CGU e pelo TCU!

Volta­se ao conceito de responsabilidade penal objetiva — e no

seu sentido mais alargado — já fartamente detalhado em tópico específico da presente

Defesa.

De forma a contribuir com o elenco de conceitos trazidos,

interessante colacionar o conceito correspondente ao de cargo público, na expressão do

art. 3º, da Lei n. 8.112/90, “é o conjunto de atribuições e responsabilidades previstas na

estrutura organizacional que devem ser cometidas a um servidor.” (destacou­se).

Nessa toada, prestigiando a segurança jurídica, a jurisprudência

do STF e do STJ tem firme o seguinte entendimento:

86http://www2.planalto.gov.br/acesso­a­informacao/institucional/presidencia/estrutura­organizacional/organograma.jpg/view

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“Denúncia: Deve descrever a relação entre a ‘vantagem econômica’ recebida ou aceita e a prática ou omissão de fato inerente à função pública do agente, sob pena de trancamento da ação penal por falta de justa causa” (Inq. 785­4 DF, STF, rel. Min. Ilmar Galvão, j. 8.11.95, mv, DJU 7.12.00) (Celso Delmanto, obra citada, pág. 635 – destacou­se). -----------------------------------------------------------------------------------------------

“Ato de ofício: Para a configuração da corrupção passiva deve ser apontado ato de ofício do funcionário, configurador de transação ou comércio com o cargo então por ele exercido.” (STF, Pleno, mv, APn 307­3 –DF, rel. Min. Ilmar Galvão, DJ 13.10.95 ­ destacou­se). ----------------------------------------------------------------------------------------------- “Para a configuração do delito de corrupção passiva é necessário que o ato de ofício em torno do qual é praticada a conduta incriminada seja da competência ou atribuição inerente à função exercida pelo funcionário público (Precedentes do STJ e do STF) (STJ, REsp. 825340/MG, Rel. Min. Felix Fischer, 5ª T., DJ 25/9/2006, p. 305 – destacou­se).”

Assim, conforme entendimento assentado pelos Tribunais

Superiores, para a configuração da corrupção passiva, na figura majorada (§ 1º, art. 317,

CP), há que ser apontado “o ato de ofício do funcionário, configurador de transação

ou comércio com o cargo então por ele exercido87’’, sob pena de não ser conhecida tal

majorante, como no caso vertente.

Registre­se, adicionalmente, que a peça acusatória faz referência a

datas e períodos em que o Primeiro Defendente sequer exercia o cargo de Presidente

da República — insistindo, mesmo assim, de forma absolutamente estranha à técnica­

jurídica, na forma majorada do delito em questão!

Com efeito, há diversas passagens na peça acusatória que

referem datas posteriores a 31 de dezembro de 2010, último dia em que o Primeiro

Defendente exerceu o cargo de Presidente da República.

Ora, se a denúncia não aponta qualquer ato de ofício por ele

praticado durante o cargo que possa configurar o delito de corrupção imputado, quanto

menos é possível promover­se uma acusação juridicamente idônea em relação a fatos

87 STF, Pleno, mv., APn 307­3 DF, rel. Min. Ilmar Galvão, mv., DJ 13.10.95). No mesmo rumo: STJ, APn 224 SP, un., rel. Min. Fernando Gonçalves, DJ 23.10.08; TRF 1ª R., ACR 2013.34.00.033828­8 DF, un., rel. Des. Federal Tourinho Neto, DJF1 08.02.13

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ocorridos após o Primeiro Defendente haver deixado a função — quando ele não

poderia praticar qualquer ato de ofício!

A acusação elenca atos legítimos praticados pelo Primeiro

Defendente sob o argumento de que se amoldariam ao delito de corrupção, sem,

contudo, ter êxito, pois todas as condutas indicadas não configuram crime.

Quanto ao tipo legal de corrupção passiva (art. 317, caput e §1o,

c/c art. 327, §2o, CP), imputado ao Primeiro Defendente não se caracteriza, como se

demonstra, em síntese, a seguir:

VI – DAS IMPUTAÇÕES RELATIVAS AO DELITO DE LAVAGEM DE CAPITAIS

As fases relativas ao crime de Lavagem de Dinheiro, aceitas pela

doutrina, não foram delimitadas pela denúncia. A peça vestibular não apontou com as

circunstâncias necessárias a colocação, a simulação, estratificação ou transformação

ou, ainda, a integração, inexistindo, portanto, os tipos penais do delito previsto na Lei

9.613/98.

Vejamos.

VI.1 – INEXISTÊNCIA DOS TIPOS PENAIS

No caput do art. 1º da Lei 9.613/98, o legislador utiliza os verbos

ocultar e dissimular como descritivos do núcleo essencial do comportamento criminoso.

Ocultar significa, numa primeira acepção, não deixar ver, esconder, subtrair às vistas,

mas também pode significar sonegar, calar, não revelar e até mesmo dissimular. Este

último significa, em suas diversas acepções, disfarçar, suprimir a aparência, não dar a

perceber, não deixar aparecer, encobrir e, também, esconder ou ocultar.

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As condutas incriminadas vêm sendo analisadas pela doutrina

como distintas e, por isso, constitutivas de um tipo penal de ação múltipla ou de

conteúdo variado.88

Seria inadequado, apesar da considerada distinção dos verbos do

tipo penal pela doutrina, utilizar o mesmo raciocínio aos verbos ocultar e dissimular.

Isto porque, não são diferentes. No entendimento de CEZAR ROBERTO BITENCOURT89

ambos os verbos são empregados com um significado análogo:

“No nosso entendimento ambos os verbos, a rigor, são empregados com um significado análogo, para descrever o comportamento criminoso de quem marcara a realidade para dar uma aparência distinta ao produto de uma infração penal. Nestes termos, o verbo ocultar utilizado no caput do art. 1º não deve ser interpretado simplesmente como esconder, pois esse comportamento seria, isoladamente, insuficiente para caracterizar a lavagem com as especificidades que justificam a sua criminalização autônoma”.

Pois bem.

A denúncia afirma que foram praticados crimes contra a

Administração Pública Federal, através da aceitação, por funcionários do alto escalão da

Petrobras — que é pessoa jurídica de direito privado — de promessa de vantagens

indevidas do Grupo Odebrecht, com a finalidade de gerar valores para uso em fins

escusos.

A acusação carece de informações precisas sobre o(s) crime(s)

que teria(m) antecedido a suposta lavagem de dinheiro condizente à hipotética

aquisição de imóvel localizado na Rua Haberbeck Brandão, nº 178, bem como

locação, alegadamente dissimulada pelo Parquet, do apartamento de nº 121,

situado na Av. Francisco Prestes Maia, nº 1501, em São Bernardo do Campo/SP.

A verdade é que não havendo a efetiva prova do crime

antecedente não se pode cogitar da efetiva transformação da natureza, origem,

88 BARROS, Marco Antônio de ­ Lavagem de capitais e obrigações civis correlatas, p. 64­65; Gustavo Henrique Badaró e Pierpaolo Cruz Bottini, Lavagem de Dinheiro, p. 63. 89 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal econômico, volume 2 – São Paulo: SARAIVA, 2016, Pg. 459.

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localização, disposição, movimentação ou propriedade do produto da infração penal. Ou

seja, não se pode cogitar do crime de lavagem de dinheiro.

Nesse sentido se posiciona BITENCOURT90:

Se, na análise de um caso concreto, não houver prova da transformação da natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade do produto da infração penal antecedente, não será possível afirmar que houve ocultação ou dissimulação.

Pela ótica do Ministério Público Federal, chegar­se­ia ao absurdo

de concluir que qualquer atividade do Grupo Odebrecht envolveria a utilização de

valores oriundos de crime praticado no âmbito da Petrobras.

Na hipótese dos autos, os atos de corrupção teriam sido praticados

pelo Grupo ODEBRECHT, em contratos celebrados com a Petrobras no valor de R$

34.648.811.860,94, e o Primeiro Defendente seria o elemento comum, definido pela

denúncia como comandante do esquema de corrupção, beneficiário das empreiteiras

cartelizadas, inclusive da ODEBRECHT, cujas vantagens ilícitas teriam criado créditos

ilícitos para si, com pagamentos diferidos para depois do mandato, em contratos de

longa duração ajustados durante o mandato, originando um “caixa geral” alimentado por

créditos de contratos fraudados. A ideia de um “caixa geral”, cuja existência não seria

novidade, segundo a denúncia, porque objeto de acusação e de condenação na Operação

Lava Jato – ou seja, uma situação incomum em que acusação e julgador produzem a

jurisprudência que reproduz as condenações nas quais estão interessados –, como os

casos de PAULO ROBERTO COSTA (propina de empreiteiros após sair da Petrobras)

e JOSÉ DIRCEU (contratos de consultoria declarados falsos por sentença, após sair do

Governo). Assim, benefícios econômicos indevidos teriam ingressado na

ODEBRECHT, determinados pelo esquema de corrupção, que ampliava os lucros sem

concorrência, misturando nos cofres das empresas lucros lícitos e ilícitos, de onde

saíam, também, como propinas. Essa é a base da proposição acusatória sob a rubrica de

lavagem de dinheiro. (denúncia, fl. 138)

90 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal econômico, volume 2 – São Paulo: SARAIVA, 2016, Pg. 462.

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Ainda sobre a hipótese indemonstrada da denúncia, o Primeiro

Defendente teria comandado e garantido o esquema de contratos de licitação fraudados

e, assim, teria obtido vantagens indevidas pagas continuamente pela ODEBRECHT,

através de um “caixa geral” alimentado com vantagens ilícitas da corrupção. E,

reproduzindo hipótese rejeitada na imputação de corrupção passiva, retoma a ideia

trôpega de que o Primeiro Defendente não estaria vinculado a contratos específicos,

mas a uma hipotética viabilização do esquema geral, pelo qual a ODEBRECHT

direcionaria recursos para o Primeiro Defendente, originários de lucros criminosos de

cartel, de fraudes à licitação, de organização criminosa e outros, conforme um surrado

discurso estruturado em clichês midiáticos e lugares comuns do punitivismo

contemporâneo. (denúncia, fl. 139)

A atual hipótese acusatória retoma a tese indemonstrada em

segmento anterior da denúncia, de que valores recebidos da ODEBRECHT, originários

de licitações fraudadas, teriam sido usados para pagar propinas ao Primeiro

Defendente, mediante transferências realizadas com o anteparo de DAG

CONSTRUTORA LTDA., empresa ligada ao Grupo ODEBRECHT. Estamos, mais

uma vez, diante de outra operação judicial­midiático­conservadora de uso do sistema

legal como arma de guerra contra determinados inimigos internos, como define o

conceito sociológico contemporâneo de lawfare.91

VI.2 - IMEDIATA NEGAÇÃO DE AUTORIA E DA PRÓPRIA EXISTÊNCIA DO FATO

Aqui também é preciso dizer, de forma radical e solene: O

Primeiro Defendente jamais dissimulou ou ocultou (nem de modo consciente e

voluntário, nem mesmo de modo inconsciente e involuntário) a origem, a

propriedade, a disposição ou a propriedade de quaisquer bens, direitos ou valores

– e, muito menos, do valor de R$ 12.422.000,00 imputados pela denúncia –,

provenientes ou não provenientes de crimes, em nenhum momento de sua vida

pública e privada, conhecida de todos os brasileiros.

91 GOLDSTEIN, Brooke. Lawfare: Reat Threat ou Illussion? (05 November, 2010).

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VI.2.1 - DO ATO DE LAVAGEM INERENTE AO IMÓVEL DA AVENIDA FRANCISCO PRESTES

MAIA, SÃO BERNARDO DO CAMPO/SP

A última hipótese da denúncia tem por objeto novo crime de

lavagem de dinheiro, imputado a “LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, em concurso e

unidade de desígnios com MARISA LETÍCIA LULA DA SILVA, GLAUCOS DA

COSTAMARQUES e ROBERTO TEIXEIRA”, deste modo:

“LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, de modo consciente e voluntário, no contexto das atividades do esquema criminoso exposto, em concurso e unidade de desígnios com MARISA LETÍCIA LULA DA SILVA, GLAUCOS DA COSTAMARQUES e ROBERTO TEIXEIRA, pelo menos desde 11/08/2010 até a presente data, dissimularam e ocultaram a origem, a movimentação, a disposição e a propriedade de R$ 504.000,00 (quinhentos e quatro mil reais) provenientes dos crimes de cartel, fraude à licitação e corrupção praticados pelos executivos do GRUPO ODEBRECHT em detrimento da Administração Pública Federal, notadamente da PETROBRAS, conforme descrito nesta peça, por meio da aquisição, em favor de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, com a interposição de GLAUCOS DA COSTAMARQUES, do apartamento n. 121 do Residencial Hill House, bloco 1, localizado na Avenida Francisco Prestes Maia, n. 1.501, em São Bernardo do Campo/SP, que supostamente teria sido alugado por MARISA LETÍCIA LULA DA SILVA.” (denúncia, fl. 172)

A denúncia, remontando ao descrito no item V.2, explica que o

fato se originaria da operação simulada de cessão de direitos do imóvel da Rua

Haberbeck Brandão, onde teria ocorrido repasse de R$ 800.000,00 a GLAUCOS DA

COSTAMARQUES, como parte da propina do Primeiro Defendente, originária do

caixa geral do PT na ODEBRECHT, cujo valor ter­se­ia fragmentado assim: a) R$

119.952,00, como tributos da dita simulada cessão de direitos; b) R$ 504.000,00, para

lavagem de dinheiro mediante a aquisição dissimulada do Ap. 121, do Residencial Hill

House, com a suposta interposição de GLAUCOS DA COSTAMARQUES; c) R$

176.048,00, como hipotética compensação financeira a GLAUCOS DA

COSTAMARQUES, por ter funcionado como interposta pessoa nas transações do

imóvel (i) da rua Haberbeck Brandão e (ii) do imóvel do Ap. 121, do Residencial Hill­

House. (denúncia, fl. 172)

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Em busca e apreensão realizada no Ap. 122, residência dos

Defendentes e sede de LILS Palestras, o síndico do prédio informou que o Ap. 121, do

mesmo prédio, também era utilizado pelos Defendentes. Medida de busca domiciliar no

imóvel, que teria sido autorizada pela Segunda Defendente, mostrou estar mobiliado,

limpo, aparentemente frequentado pelos dois, além de uma conexão direta entre os

apartamentos. O apartamento teria sido alugado pelo PT, no primeiro mandato do

Primeiro Defendente, cf. notícia jornalística; o portal da transparência da Presidência

da República informa que o imóvel foi alugado pela Presidência da República, durante o

segundo mandato do Primeiro Defendente; após o término do mandato, em fevereiro

de 2011, o imóvel teria sido alugado pela Segunda Defendente, após ter sido adquirido

por GLAUCOS DA COSTAMARQUES, segundo concepção atribuída pela denúncia

ao advogado ROBERTO TEIXEIRA. (denúncia, 175)

Conforme dados da matrícula, o Ap. 121 era propriedade de

Augusto Moreira Campos e Elenice S. Campos (esposa), alugado ao PT de 2003 a 2007,

e à Presidência da República de 2008 a 2010. Falecido o proprietário em 04/02/2009,

foi aberto inventário na 2a Vara de Família, sendo requerente/meeira Elenice S. Campos

e herdeira Tatiana de Almeida Campos.

Nesse contexto, ocorreu cessão de direitos hereditários e de

meação entre Elenice S. Campos, como cedente, e GLAUCOS COSTAMARQUES,

como cessionário, em 20/09/2010. A denúncia, com sua habitual visão distorcida dos

fatos da vida real, estranha que ROBERTO TEIXEIRA, como representante judicial de

GLAUCOS, (a) teria peticionado na ação de inventário apenas em 17/03/2011, juntando

procuração, sem mencionar, contudo, a “transação, que já havia sido realizada” – como

se a intervenção processual pudesse ocorrer sem legitimação para o processo,

mediante procuração, e sem legitimação para a causa, como titular de direitos em

discussão judicial, o que está pressuposto ou implícito na atuação judicial de

ROBERTO TEIXEIRA – e (b) que somente em 01/07/2016 tenha requerido a

adjudicação do apartamento 121 – como se a parte processual devesse consultar o

MPF sobre o conteúdo e a oportunidade de seus requerimentos judiciais (denúncia,

fl. 174).

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Assim, em 01/02/2011, e com toda legitimidade, GLAUCOS DA

COSTAMARQUES, como cessionário de direitos e como locador, celebrou contrato de

locação do imóvel com a Segunda Defendente, como locatária, que a denúncia insiste

em definir como “simulado contrato de locação”, na sua indefectível compreensão

defeituosa dos fatos (denúncia, fl. 174­175).

A denúncia, no esforço obsessivo para viabilizar a exótica tese

acusatória, precisa continuar a distorcer a realidade dos fatos como, por exemplo, (a)

definir como simulado o ato jurídico legítimo do contrato de locação acima referido,

assim como precisou definir como simulada a legítima cessão de direitos do imóvel da

Rua Haberbeck Brandão, em favor de DAG CONSTRUTORA LTDA.

Na sequência, a denúncia apresenta depoimentos de GLAUCOS

DA COSTAMARQUES em (a) procedimento fiscal e (b) na Polícia Federal, nos quais

explica em detalhes as razões do investimento no imóvel da Rua Haberbeck Brandão –

aos quais a Denúncia, naquela compulsiva ação de distorcer a realidade dos fatos,

acrescenta o comentário de que a atividade de negócios de GLAUCOS não teria apoio

em dados concretos porque, como investidor em imóveis, o Ap. 121 seria a única

propriedade de GLAUCOS, segundo a Receita Federal – mas fora do município de sua

residência (Campo Grande­MS)”, diz o órgão. (denúncia, fl. 176)

O mesmo afã obsessivo de demonstrar a pretensa natureza

simulada dos contratos de GLAUCOS DA COSTAMARQUES aparece no exame de

declarações à autoridade policial, em 07/10/2016, e perante o próprio MPF, em

17/11/2016 – portanto, 6 (seis) anos depois dos fatos –, sobre a forma de pagamento do

aluguel do Ap. 121, contra os quais a denúncia formula a mesma crítica: não teria

apresentado comprovação documental de suas explicações – como se todos fôssemos

obrigados a carregar todos os documentos dos fatos vida passada – no caso, 6 anos

passados –, para demostrar à Polícia Federal ou ao MPF, quando solicitado, a licitude de

nossos atos – aliás, dotados de presunção de licitude, só excluída mediante prova em

contrário, não produzida pela denúncia.

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De novo, a pretensa prova de autoria é um sumário de hipóteses

idiossincráticas ou de clichês burocráticos distribuídos pelo texto da insana narrativa

acusatória, todos sobejamente conhecidos e devidamente destruídos ou desmascarados

pela defesa no curso da Resposta à acusação.

Assim, por exemplo, “LULA seria o grande beneficiário” da

aquisição do Ap. 121, porque (a) era vizinho do apartamento, (b) teria determinado a

compra com interposição de GLAUCOS e auxílio de ROBERTO TEIXEIRA, (c) o

preço teria sido pago com vantagens ilícitas originárias da transação do imóvel da Rua

Haberbeck Brandão, provenientes da hipotética caixa geral do PT perante a

ODEBRECHT, (c) com a indefectível locação simulada para escamotear a verdadeira

propriedade do imóvel etc. (denúncia, fl. 180). Em síntese: a prova do fato não existe

como demonstração lógica de relações objetivas, mas como aquela mesma

sequência de hipóteses, de conclusões idiossincráticas, nesse “achismo” desvairado

que caracteriza a denúncia.

A aquisição do apartamento por GLAUCOS DA

COSTAMARQUES seria simulada, porque (a) teria sido feita com a intermediação de

ROBERTO TEIXEIRA e (b) a corroboração da suposta simulação consistiria no fato de

ROBERTO TEIXEIRA – e outros profissionais de seu escritório de advocacia – terem

representado GLAUCOS no processo de inventário; além disso, à semelhança do

imóvel da Rua Haberbeck Brandão, (c) GLAUCOS não teria comprovado interesse na

aquisição do apartamento, porque (i) sua atividade de negócios seria incompatível com

a renúncia dos alugueis da Presidência da República, que representariam grande

prejuízo e (ii) o registro da escritura do imóvel teria ocorrido 6 anos após a

adjudicação, com a manifesta intenção de ocultar a propriedade do imóvel (denúncia,

fls. 180 e 180­1). Em síntese: a prova aparece como relações hipotéticas ou como

ilações patéticas inconfundíveis com a demonstração científica da lógica interna de

relações objetivas do mundo real – ou seja, a suposta prova é a suma das hipóteses

idiossincráticas que marcam a desconexa denúncia da Força Tarefa “Lava Jato”.

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Igualmente descabidas são as imputações inerentes à inexistente

aquisição do imóvel da Rua Haberbeck Brandão para o Instituto Luiz Inácio Lula da

Silva, como antes exposto e será a seguir fundamentado.

VI.2.2 - A SUPOSTA AQUISIÇÃO DO IMÓVEL PARA O INSTITUTO LULA

A denúncia imputa a hipótese de suposta aquisição de imóvel

situado na Rua Haberbeck Brandão, 178, para instalação do Instituto LULA, que (a)

ROBERTO TEIXEIRA teria definido como interessante para o espaço institucional (cf.

e­mail apreendido na residência do Primeiro Defendente) e (b) EDNA CASTRO,

corretora do imóvel, em mensagem eletrônica dirigida a ROBERTO TEIXEIRA, teria

informado, entre outras coisas, um valor de venda de R$ 10.000,00, (c) mensagem

eletrônica de ROBERTO TEIXEIRA teria informado (i) sobre procedimento judicial

sobre o imóvel e (ii) sobre os débitos tributários do imóvel, enquanto JOSÉ CARLOS

BUMLAI, amigo do Primeiro Defendente, representado por ROBERTO TEIXEIRA,

assinou uma opção de compra, cuja cópia teria sido encontrada na residência do

Primeiro Defendente.

O interesse no imóvel como espaço institucional apareceria (a) na

opção de compra de JOSÉ CARLOS BUMLAI, que teria garantido contra negociação

com terceiros, (b) mas o imóvel foi adquirido por GLAUCOS DA COSTAMARQUES

– e não por JOSÉ CARLOS BUMLAI – mediante composição amigável, com posterior

cessão de direitos em favor de DAG CONSTRUTORA LTDA., que a denúncia supõe

ter sido orientada por ROBERTO TEIXEIRA (denúncia, fl. 145).

A empresa DAG CONSTRUTORA LTDA teria pago o preço, as

dívidas tributárias, as despesas e a corretagem mediante cheque administrativo de

20/09/2010, tendo posterior quebra de sigilo bancário da empresa identificado

pagamento de R$ 7.289.056,82, com saldo de apenas R 4.283,10, suplementado com

ingressos de recursos da ODEBRECHT em 20/09/2010, além de ingressos de outras

contas. Laudo pericial criminal federal teria identificado três pagamentos da

ODEBRECHT para DAG, na época da aquisição do imóvel, no valor integral de R$

7.600.000,00, que teriam sido contabilizados de forma atípica, porque sem a prestação

de serviços correspondente. (denúncia, fls. 145­146).

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Segundo a denúncia, as três operações indicadas teriam sido

realizadas para dificultar o rastreamento de valores obtidos ilicitamente por

ODEBRECHT e, assim, dissimular a origem, disposição, movimentação e propriedade

de R$ 7.600.000,00, que seriam provenientes, direta ou indiretamente, de crimes de

organização criminosa, de cartel, de fraude à licitação e de corrupção, praticados por

executivos da ODEBRECHT contra a administração federal. Entretanto, arquivo

eletrônico arrecadado identificou minuta de confissão de dívida da DAG em favor de

ODEBRECHT, no valor de R$ 7.274.735,16, garantido por duas Notas Promissórias

emitidas por DAG, uma no valor da dívida confessada e outra no valor de

R$2.182.420,55 (para cobrir a mora futura), com vencimento em 30/12/2011, além de

cláusulas dizendo (a) que o credor teria provido recursos para o devedor adquirir o

imóvel da Rua Haberbeck Brandão, 178 e (b) que na hipótese de não pagamento da

dívida, haveria dação em pagamento do imóvel à ODEBRECHT. A denúncia conclui

que a minuta apreendida corroboraria a intenção de dissimular os sujeitos da compra­e­

venda do imóvel e a origem dos valores da transação, com o objetivo de conferir

aparência de regularidade às transferências. (denúncia, fls. 147/148)

Enfim, o imóvel foi alienado pela ASA à DAG, mediante

compromisso de compra­e­venda de 24.11.2010, no valor de R$6.876.686,27, levado a

registro na matricula do imóvel em 10/12/2011. Considerando outros pagamentos, a

denúncia conclui que o imóvel teria sido adquirido pelo valor total de R$ 8.116.687,70,

pagos em 18 operações para dificultar o rastreamento de valores ilícitos obtidos por

ODEBRECHT, além de 71 operações posteriores, no valor total de R$ 1.120..602,03,

correspondentes a serviços de vigilância, energia elétrica e IPTU, que também teriam o

objetivo de dificultar o rastreamento de valores ilícitos da ODEBRECHT. A denúncia

conclui que teriam sido realizadas 90 operações para ocultar e dissimular a origem,

movimentação, disposição e propriedade de R$ 12.412.000,00, tendo realizado um

rastreamento do valor de R$ 12.411.349,40, conforme informação n. 148/16 da ASSPA.

(denúncia, fls. 151­153)

A apressada interpretação da denúncia conclui que o imóvel teria

sido posto à disposição (?) do Primeiro Defendente desde 29/09/2010, embora

reconheça que o imóvel foi vendido por DAG para a ODEBRECHT, por escritura

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pública lavrada em 28/09/2012, levada em registro em 30/05/2014, com o seguinte

comentário destacado na narrativa:

“Neste interregno em que o imóvel permaneceu colocado à disposição de LULA, persistiram as intenções de instalar o espaço institucional de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA no imóvel da Rua Dr. Haberbeck Brandão, que estava reservado para esta finalidade e colocado à disposição do ex-presidente da República.”

Essa conclusão, que sintetiza os fundamentos da imputação do

tipo legal de lavagem de dinheiro ao Primeiro Defendente, não esclarece:

a) qual o interregno em que o imóvel teria permanecido à disposição o

Primeiro Defendente?

b) como, ou por que tipo de mágica, o imóvel teria permanecido à

disposição do Primeiro Defendente?

c) qual método de investigação psíquica teria verificado que persistiram

as intenções de instalar o espaço institucional no imóvel – e, se existente

o método, qual a pessoa em cujo aparelho psíquico o método teria sido

aplicado?

d) o que autoriza a convicção – embora a Força Tarefa do MPF da

Operação Lava Jato seja especialista em matéria de convicções – de que

o referido imóvel estava reservado para esta finalidade?

Estas e outras são perguntas que precisariam ser respondidas

antes de qualquer imputação leviana contra o Primeiro Defendente. Afinal, e

definitivamente, não basta dizer que seriam ilustrativos alguns e­mails comuns,

apreendidos no Instituto LULA, entre Paulo Okamoto, Clara Ant e outros.

No dia 26 de julho de 2011, os Defendentes, em conjunto com

dirigentes do Instituto da Cidadania e outros, realizaram visitação ao imóvel com o

objetivo de verificar a possibilidade de instalação do “Memorial da Democracia”, para

armazenamento/exposição de presentes e outros objetos recebidos durante o mandato

presidencial. Essa visita, também referida pelo arquiteto MARCELO FERRAZ (Anexo

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249), é descrita textualmente pelo Primeiro Defendente, em resposta escrita à Polícia

Federal, reproduzida no Anexo 273, na qual informa (a) que esteve no imóvel uma vez,

acompanhado de dirigentes do Instituto da Cidadania e (b) que a compra do imóvel foi

recusada, assim reproduzida na denúncia:

“Respondendo por escrito a quesitos formulados pela Polícia Federal, LULA confirmou que esteve no imóvel, em uma oportunidade, acompanhado por dirigentes do ainda Instituto Cidadania (posteriormente transformado em Instituto Lula), mas que a compra do imóvel pelo instituto teria sido recusada.” (denúncia, fl. 157)

Neste ponto, o comentário final sobre o conjunto do fato é digno

da leviandade da denúncia:

a) após criar a ideia alucinada de que o Primeiro Defendente pretendia

adquirir o imóvel para instalar um espaço institucional – e, por isso, a

Força Tarefa do MPF atuante na Lava Jato imaginou, de forma obsessiva,

a ação fantasmagórica de que este teria solicitado, ou recebido, ou aceito

promessa de vantagem indevida (do tipo legal indemonstrado de

corrupção passiva), consistente na aquisição do imóvel da Rua

Haberbeck Brandão;

b) mas como alguns traços da realidade sempre conseguem penetrar nos

processos psíquicos patológicos de qualquer esquizofrenia ou paranoia, a

inevitável percepção de que o imóvel da Rua Haberbeck Brandão não foi

adquirido para instalação do Instituto LULA, nem o Instituto LULA foi

instalado no imóvel, determinou o deslocamento da acusação obsessiva

para as emoções de processos neurônicos do psiquismo do Primeiro

Defendente que conteriam desejos de adquirir o imóvel, ou por onde

transitariam impulsos aquisitivos conscientes ou inconscientes – afinal

frustrados pelo desencadeamento da Operação Lava Jato;

c) esse deslocamento para as emoções dos processos neurônicos do

Primeiro Defendente, onde pulsariam intenções ou desejos ocultos de

adquirir o imóvel da Rua Haberbeck Brandão, teria sugerido aos agentes

do MPF atuantes na Operação Lava Jato a hipótese genial da aquisição

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psíquica do imóvel, em que a satisfação do impulso aquisitivo

representaria a vantagem indevida da corrupção passiva e a dissimulação

ou ocultação desse bem ou valor nos insondáveis processos subjetivos da

vida psíquica constituiria a mais refinada modalidade de lavagem de

capitais arquitetada pelo cérebro humano.

Talvez por isso – é difícil trabalhar com hipóteses delirantes – o

discurso da denúncia termina o capítulo deste modo: a) os crimes de corrupção passiva e

de lavagem de dinheiro imputados teriam sido praticados e consumados independente

da instalação do espaço institucional do Primeiro Defendente; b) a cronologia dos

fatos mostra que, “ainda no ano de 2010”, Primeiro Defendente “decidiu pela criação

do espaço institucional” – portanto, para a Força Tarefa, os fatos reais são irrelevantes;

c) e nesse momento, embora o “modelo do espaço institucional não tivesse sido

definido em todas as suas especificidades, já havia sido adquirido e colocado à

disposição” do Primeiro Defendente, com “recursos ilícitos do caixa geral de

propinas” do PT junto ao Grupo ODEBRECHT, com a “intermediação de PALOCCI e

seu assessor parlamentar BRANISLAV KONTIC,” tudo conforme a planilha do

“Programa Especial Italiano”; d) por isso, “neste momento” – ou seja, no ano de 2.010 –

, “já haviam se concretizado todas as operações de dissimulação e ocultação da

propriedade do imóvel adquirido por LULA, com recursos provenientes dos crimes ...”

(denúncia, fls. 157­158).

Por último, a denúncia revela os seguintes negócios jurídicos

relacionados ao imóvel da Rua Haberbeck Brandão: a) teria sido vendido por DAG para

ODEBRECHT em 28/09/2012, com registro imobiliário em 30/05/2014; b) a

ODEBRECHT teria alienado o imóvel para MIX Empreendimentos e Participações

Ltda., em 05/06/2013; c) finalmente, em 27/08/2012, a concessão administrativa do

Poder Público Municipal de uma área central na cidade de São Paulo, para instalação do

“Memorial da Democracia”, com as funções de museu e de exposição de presentes e

objetos recebidos pelo Primeiro Defendente, no exercício dos mandatos presidenciais.

Meros indícios ou simples coincidências como provas?

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O pretensioso capítulo intitulado “A prova de autoria” é um

sumário das hipóteses indemonstradas ou idiossincráticas, dos chavões genéricos, dos

clichês burocráticos distribuídos pelo texto da narrativa acusatória, devidamente

destruídos ou desmistificados pela Defesa no curso desta Resposta à acusação.

1. A hipótese principal: O Primeiro Defendente seria o maior

interessado no espaço institucional, com atuação direta (?) para compra

do imóvel da Rua Haberbeck Brandão, mediante emprego de vantagem

indevida proveniente do caixa geral do PT junto à ODEBRECHT;

2. A opção de compra de BUMLAI (representado por ROBERTO

TEIXEIRA), encontrada na residência dos Defendentes;

3. A intermediação da compra por GLAUCOS, um parente de BUMLAI,

com relação próxima da família do Primeiro Defendente;

4. As tratativas de ROBERTO TEIXEIRA – suposto responsável por

buscar um imóvel – com BUMLAI e com GLAUCOS, sobre o imóvel;

5. Os custos da compra do imóvel, repassados por DAG

CONSTRUTORA LTDA., representada por DEMERVAL GUSMÃO,

para a ODEBRECHT, conforme o suposto esquema de corrupção

capitaneado pelo Primeiro Defendente;

6. E­mail sobre tratativas do imóvel, entre ROBERTO TEIXEIRA e

EDNA CASTRO, encontrado na residência do Primeiro Defendente;

7. A famosa rubrica “Prédio (IL)”, da planilha “Programa Especial

Italiano”, cujos signos algébricos são interpretados como valores de

vantagens ilícitas gerenciadas por PALOCCI e originárias do suposto

caixa­geral de propinas do PT na ODEBRECHT;

8. O projeto arquitetônico de reforma do imóvel, que seria compatível

com o espaço institucional, encontrado em pasta da Segunda

Defendente, no Sítio Santa Bárbara;

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9. A visita do Primeiro Defendente no imóvel, com dirigentes do

Instituto LULA, além de MARISA, LOVERA e MARCELO FERRAZ,

em 26/07/2011;

10. As respostas do Primeiro Defendente aos quesitos da PF, (i) sobre

oferecimento e recusa do imóvel ao e pelo Instituto da Democracia, (ii)

sobre negativa de contato com empregados da ODEBRECHT e (iii)

sobre desconhecimento da participação de ROBERTO TEIXEIRA na

negociação do imóvel – com o comentário gratuito da denúncia, de que

as declarações não coincidem com os elementos da investigação;

11. Apreensão na residência do Primeiro Defendente de (i) e­mail

trocado entre ROBERTO TEIXEIRA e EDNA CASTRO, (ii) de novo, a

opção de compra do imóvel do amigo BUMLAI;

12. O Primeiro Defendente acompanhava de perto as tratativas de

compra do imóvel, como mostra a visita ao imóvel, em 07/10/2011 – e a

discussão não poderia ser sobre a compra do imóvel pelo Instituto da

Cidadania, porque tinha sido vendido à DAG, no dia anterior: então, o

Instituto da Cidadania (que, segundo a Denúncia, se transformaria no

Instituto LULA) não poderia comprar, mas o Instituto LULA poderia?

13. As supostas determinações do Primeiro Defendente, PALOCCI e

MARCELO ODEBRECHT a ROBERTO TEIXEIRA para procurar um

imóvel e atuar nas tratativas de compra;

14. O desinteresse na compra do imóvel por BUMLAI, ou por

GLAUCOS, ou por DAG/Demerval;

15. A suposição leviana (i) de plena ciência de ROBERTO TEIXEIRA

sobre a origem dos recursos da caixa geral do PT junto à ODEBRECHT

– como se o que não existe pudesse ser objeto de conhecimento –, que

(ii) atuaria sob o suposto comando do Primeiro Defendente e a

coordenação PALOCCI e MARCELO, além (iii) da pretensa

inconsistência das respostas escritas aos quesitos da PF, que

“transparecem plena consciência” da irregularidade da transação – tudo

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segundo a “interpretação” (?) da denúncia, que aprecia os superlativos:

plena (consciência), máxima (participação), total (responsabilidade) etc.

16. A hipótese de que escolha de GLAUCOS e de DEMERVAL (DAG)

para atuar na compra não seria aleatória, pelas relações de GLAUCOS

com a família do Primeiro Defendente e as de DEMERVAL com

MARCELO ODEBRECHT – como se amizade ou parentesco

constituísse critério de autoria de corrupção passiva ou de lavagem

de capitais;

17. Novamente, MARCELO ODEBRECHT e (i) a troca de e­mails com

PAULO MELO, (ii) o arquivo sobre o “edifício docx” e (iii) e as outras

trocas de e­mails com Darci Luz (secretária) e BRANISLAV KONTIC;

18. Os enfadonhos e repetitivos comentários sobre (i) a atualização

constante de PALOCCI sobre as novidades da aquisição do espaço

institucional, (ii) sobre a ansiedade de MARCELO no e­mail para

garantir o “paper” para PALOCCI, em Brasília, (iii) sobre o valor

atribuído aos números da planilha do “Programa Especial do Italiano” e

sua correspondência “quase exata” com os custos da DAG na aquisição

do imóvel;

19. E, mais uma vez, a insistência neurótica na suposta participação de

ROBERTO TEIXEIRA no estratagema criminoso, com hipotética

ciência (i) da aquisição do imóvel, (ii) da ocultação e dissimulação da

origem, disposição, movimentação e propriedade do valor empregado na

aquisição, proveniente de infrações penais etc. etc.

20. E mais uma vez GLAUCOS e sua suposta atuação consciente na

aquisição do imóvel para ocultação e dissimulação da origem, etc. (tudo

igual ao item 1.18, acima).

Finalmente, como se o conjunto de dados irrelevantes, ou se a

sequência de informações inconcludentes, ou se o rosário de argumentos pífios de um

discurso processual esquizofrênico, do ponto de vista psicológico, mas usado como

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arma de guerra, do ponto de vista político, representasse a mais reles ou desprezível

prova de autoria, aparece a conclusão:

“Dessa maneira, LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, MARCELO ODEBRECHT, PAULO MELO, ANTONIO PALOCCI e BRANISLAV KONTIC também atuaram com consciência de que a aquisição do imóvel configurava a ocultação e a dissimulação da origem, disposição, movimentação e propriedade dos valores empregados na compra, provenientes das infrações penais expostas no item V.1, pois tinham conhecimento de que, na compra, efetivada exclusivamente no interesse de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, mediante a interposição de GLAUCOS DA COSTAMARQUES e da participação da DAG CONSTRUTORA LTDA. como interposta pessoa do Grupo ODEBRECHT, foram empregados valores que tinham como origem o caixa geral de propinas do Partido dos Trabalhadores junto ao Grupo ODEBRECHT, gerenciado por ANTONIO PALOCCI. Assim é que, ao serem efetuadas as 93 (noventa e três) operações com o intuito de dificultar a identificação e rastreamento de valores ilicitamente obtidos pelo Grupo ODEBRECHT, especialmente pela CONSTRUTORA NORBERTO ODEBRECHT, conforme narrado nesta exordial, LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, ANTONIO PALOCCI, MARCELO ODEBRECHT e DEMERVAL GUSMÃO, em conluio e unidade de desígnios com BRANISLAV KONTIC, PAULO MELO, GLAUCOS DA COSTAMARQUES e ROBERTO TEIXEIRA, dissimularam a origem, disposição, movimentação e propriedade de R$ 12.422.000,00, provenientes, direta e indiretamente, dos crimes de organização criminosa, cartel, fraude à licitação e corrupção praticados pelos executivos do Grupo ODEBRECHT em detrimento da Administração Pública Federal, notadamente da Petrobras, incorrendo por 93 (noventa e três) vezes na prática do crime de lavagem de capitais, violando o disposto no art. 1o c/c o art. 1o § 4o, da Lei no 9.613/98.” (denúncia, fl. 172)

Se (i) o ônus da prova é da acusação, ou se (ii) a prova penal deve

ser além de qualquer dúvida, ou se (iii) domina no processo penal o princípio in dubio

pro reo, corolário do princípio constitucional da presunção de inocência, então os dados

irrelevantes, as informações inconcludentes, ou os falsos indícios amontoados nessa

teratológica denúncia, podem constituir uma espécie de algaravia jurídica enfadonha ou

tediosa, mas são inteiramente inválidos como prova criminal, sob quaisquer dos

modelos de prova criminal admitidos na literatura: o modelo argumentativo, o modelo

narrativo e o modelo misto – cuja discussão crítica será realizada no momento

adequado.

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VI. 3 – AUSÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO DA SUPOSTA LAVAGEM DE DINHEIRO

Caso a alegação se volte para o preenchimento de todas as etapas

impostas para a caracterização do delito, há de ser considerada, pelo princípio da

eventualidade, a ausência do dolo específico de lavar dinheiro por parte dos

Defendentes.

Como é sabido, o crime de lavagem de capitais somente é punível

em sua modalidade dolosa, o que requer por parte do agente conhecimento e vontade de

realizar o comportamento descrito na norma penal.

Nesse sentido é a jurisprudência, como se verifica,

exemplificativamente, nos julgados abaixo, do Colendo Superior Tribunal de Justiça e

do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:

PENAL. RECEBIMENTO DE DINHEIRO DECORRENTE DE CRIME DE PECULATO. "LAVAGEM" OU OCULTAÇÃO DE VALORES (LEI 9.613/98, ART. 1º, § 1º).ESPECIAL ELEMENTO SUBJETIVO: PROPÓSITO DE OCULTAR OU DISSIMULAR A UTILIZAÇÃO. AUSÊNCIA. CONFIGURAÇÃO DE RECEPTAÇÃO QUALIFICADA (CP, ART. 180, § 6º). EMENDATIO LIBELLI. VIABILIDADE. DENÚNCIA PROCEDENTE. 1. No crime de "lavagem" ou ocultação de valores de que trata o inciso II do § 1° do art. 1º da Lei 9.613/98, as ações de adquirir, receber, guardar ou ter em depósito constituem elementos nucleares do tipo, que, todavia, se compõe, ainda, pelo elemento subjetivo consistente na peculiar finalidade do agente de, praticando tais ações, atingir o propósito de ocultar ou dissimular a utilização de bens, direitos ou valores provenientes de quaisquer dos crimes indicados na norma incriminadora. Embora seja dispensável que o agente venha a atingir tais resultados, relacionados à facilitação do aproveitamento ("utilização") de produtos de crimes, é inerente ao tipo que sua conduta esteja direcionada e apta a alcançá-los. Sem esse especial elemento subjetivo (relacionado à finalidade) descaracteriza-se o crime de ocultação, assumindo a figura típica de receptação, prevista no art. 180 do CP. 2. No caso, não está presente e nem foi indicado na peça acusatória esse especial elemento subjetivo (= propósito de ocultar ou dissimular a utilização de valores), razão pela qual não se configura o crime de ocultação indicado na denúncia (inciso II do § 1º do art. 1º da Lei 9.613/98). Todavia, foram descritos e devidamente comprovados os elementos configuradores do crime de receptação (art. 180 do CP): (a) a existência do crime anterior, (b) o elemento objetivo (o acusado recebeu dinheiro oriundo de crime), (c) o elemento subjetivo (o acusado agiu com dolo, ou seja, tinha pleno conhecimento da origem criminosa do dinheiro) e (d) o elemento subjetivo do injusto, representado no fim de obter proveito ilícito para outrem. Presente, também, a qualificadora do § 6º do art. 180 do CP, já que o dinheiro recebido pelo acusado é produto do crime de peculato,

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praticado mediante a apropriação de verba de natureza pública. 3. Impõe-se, assim, mediante emendatio libelli (art. 383 do CPP), a modificação da qualificação jurídica dos fatos objeto da denúncia, para condenar o réu pelo crime do art. 180, § 6º do Código Penal. 4. Nesses termos, é procedente a denúncia. (APn 472/ES, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, Corte Especial, julgado em 01/06/2011, DJe 08/09/2011) (Destacou­se) -----------------------------------------------------------------------------------------------­ EMENTA: PENAL. PROCESSO PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE. ART. 334 DO CP. ART. 22 DA LEI 7.492/86. INCISOS V E VI DO ART. 1º, § 1º, I E § 2º, I, DA LEI Nº 9.613/98. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. ABSORÇÃO DO CRIME DE EVASÃO DE DIVISAS PELO DELITO DE LAVAGEM DE DINHEIRO. POSSIBILIDADE. LAVAGEM DE DINHEIRO. ELEMENTO SUBJETIVO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. 1. Crime contra o sistema financeiro nacional que teria se consumado em momento anterior ao delito de descaminho, em face da exigência de diversos exportadores, para que recebessem, de forma antecipada, um percentual, ou mesmo a totalidade do valor correspondente ao pagamento das mercadorias importadas, feito através de depósitos em contas abertas em bancos internacionais sediados no exterior. 2. Branqueamento de capitais que se iniciou pela dissimulação da origem dos valores ilícitos, obtidos através do crime antecedente de descaminho, por meio da dispersão dos valores em diversas contas de pessoas físicas e jurídicas, que funcionavam, muitas vezes, como testas-de-ferro ou de fachada. 3. Quantias que foram empregadas para a realização de outras importações e pagamento dos fornecedores localizados no exterior, através do crime de evasão de divisas, procurando dar a elas uma aparência de licitude, razão pela qual se constituiu numa das etapas para emprestar efetividade ao delito de lavagem de dinheiro, sendo por este absorvido. 4. Hipótese em que não restou devidamente evidenciado nos autos o dolo de corréu quanto ao delito previsto na Lei 9.613/98, não se podendo presumir que ele soubesse da elevada probabilidade da natureza e origem criminosas dos bens, direitos e valores envolvidos, em face de ter sido condenado pelo crime contra o sistema financeiro nacional. (TRF4, ENUL 2000.71.00.041264-1, Quarta Seção, Relator TADAAQUI HIROSE, D.E. 10/02/2010). (Destacou­se)

Outrossim, a consciência elementar do dolo deve ser atual e

efetiva.

Sucede que não há qualquer base na denúncia para afirmar que os

Defendentes tenham agido com dolo, a fim de ocultar ou dissimular a natureza, origem

ou propriedade de bens ou valores, provenientes, direta ou indiretamente, de infrações

penais.

Logo, os fatos narrados na peça vestibular também são atípicos

em virtude de não estar evidenciada qualquer intenção dos Defendentes de lavar

dinheiro, sendo de rigor, também sob esse enfoque, a absolvição sumária de ambos.

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É o que fica postulado.

—VII —

DOS REQUERIMENTOS

Ex positis, em virtude das especificidades e peculiaridades do

presente caso quanto aos Defendentes, requer­se o quanto segue:

a) Seja reconhecida a inépcia da denúncia ou, ainda, a ausência

de justa causa, com a reconsideração do despacho recebedor e

a consequente rejeição da exordial acusatória;

b) Seja reconhecida a nulidade dos inquéritos 290/2016 e

1034/2016 e a exclusão de todas as provas lá produzidas;

c) Caso não se entenda pela anulação dos referidos

procedimentos investigatórios, requer­se, em caráter

subsidiário, a repetição de todas as provas produzidas na

investigação, incluindo laudos, análises e pareceres técnicos;

d) Subsidiariamente, seja determinado o sobrestamento do

presente feito até o deslinde no Inq. 3989 no STF, tendo em

vista existir patente questão prejudicial homogênea;

e) Sejam os Defendentes absolvidos sumariamente, nos termos

do artigo 397, inciso III, do Código de Processo Penal, em

virtude dos fatos a eles atribuídos evidentemente não

constituírem crimes e, ainda, pela ausência de mínimo suporte

probatório;

f) Por fim, caso não se decida pelos fundamentos preliminares

ou, ainda, pela absolvição sumária, mostra­se de rigor, após

regular processamento, a prolação de sentença absolutória em

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relação aos Defendentes.

Ainda, na remota hipótese de ser necessária a realização de fase

de instrução, requerem os Defendentes a produção de todos os meios de prova em

direito admitidos, em especial:

(i) Seja determinado ao MPF que providencie a juntada das

traduções juramentadas referentes aos anexos 201 a 205;

(ii) Seja franqueado à Defesa acesso integral aos autos da medida

cautelar 5042689­15.2016.4.04.7000, à luz da ampla defesa e da

paridade de armas;

(iii) Seja determinado ao MPF: que anexe a estes autos (i) cópia de

todas as propostas de delação premiada e eventuais alterações ou

modificações apresentadas pelos Senhores: Pedro da Silva Corrêa

de Oliveira Andrade Neto; Delcídio do Amaral Gomez; Fernando

Antônio Falcão Soares; Pedro Barusco Filho; Milton Pascowitch;

Ricardo Ribeiro Pessoa; Walmir Pinheiro; Fernando Antônio

Guimarães Hourneaux de Moura; Augusto Ribeiro Mendonça;

Eduardo Hermelino Leite; Mario Frederico de Mendonça Goes;

Antonio Pedro Campello de Souza Dias; Flávio Gomes Machado

Filho; Otavio Marques de Azevedo; Paulo Roberto Dalmazzo;

Rogerio Nora de Sá; Nestor Cuñat Cerveró; Paulo Roberto da

Costa; e Dalton dos Santos Avancini; (ii) a íntegra dos termos de

colaboração firmados com os citados delatores e, ainda, eventuais

depoimentos complementares (todos); (iii) todos os áudios e

vídeos relativos às delações premiadas celebradas com os citados

colaboradores, inclusive de eventuais depoimentos

complementares; (iv) que traga aos autos o acordo de delação

premiada firmado com Sérgio Machado e todos os seus anexos,

depoimentos, vídeos, uma vez que o material foi mencionado no

item III.1.4 (fl 26) da Denúncia mas não instruiu a peça; (v) sejam

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anexados aos autos os termos de colaboração premiada — com

todos os anexos e declarações — firmados com os seguintes

colaboradores, que foram referidos na denúncia mas não

instruíram aquele petitório: Pedro da Silva Corrêa de Oliveira

Andrade Neto, Fernando Antônio Falcão Soares, Pedro José

Barusco Filho, Milton Pascowitch, Ricardo Ribeiro Pessoa,

Walmir Pinheiro, Fernando Antônio Guimarães Hourneaux de

Moura, Augusto Ribeiro de Mendonça Neto, Eduardo Hermelino

Leite, Mario Frederico de Mendonça Goes, Flávio Gomes

Machado Filho, Otavio Marques de Azevedo, Paulo Roberto

Dalmazzo, Rogerio Nora de Sá, Julio Gerin de Almeida Camargo,

Antonio Pedro Campello de Souza Dias e Dalton do Santos

Avancini;

(iv) Seja oficiado à Procuradoria Geral da República para que junte

a este processo cópia integral dos autos do termo de colaboração

premiada de Pedro Corrêa e, ainda, para que informe qual o

estágio dessa colaboração premiada após a devolução realizada

pelo Eminente Ministro Teori Zavascki;

(v) Seja determinado à PETROBRAS que encaminhe para estes

autos (i) cópia de todas as atas de reuniões ordinárias e

extraordinárias do Conselho de Administração e do Conselho

Fiscal da Petrobrás, incluindo eventuais anexos, no período

compreendido entre 1º/01/2003 a 30/05/2014; (ii) cópia de todas

as atas de reuniões ordinárias e extraordinárias da Comissão de

Licitação da Companhia no mesmo período e, ainda, de pareceres

e manifestações emitidos pelo órgão nesse período; (iii) cópia

integral dos processos administrativos relativos aos oito contratos

indicados na denúncia92; (iv) o histórico funcional completo,

92 Os contratos se referem, segundo consta, i) REPAR: contrato celebrado com o CONSÓRCIO CONPAR para a execução das obras de ISBL da Carteira de Gasolina e UGHE HDT de instáveis da Carteira de Coque da Refinaria Getúlio Vargas – REPAR; ii) RNEST: contrato celebrado com o CONSÓRCIO REFINARIA ABREU E LIMA 228, para a execução da terraplenagem da área destinada à

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incluindo, mas não se limitando, a informações sobre a data de

admissão e forma de admissão, todos os cargos ocupados, e

órgãos envolvidos na designação de cada cargo exercido na

Companhia pelas seguintes pessoas: Delcídio do Amaral Gomez,

Nestor Cuñat Cerveró, Paulo Roberto da Costa e Pedro Barusco;

(v) todos os elementos relativos aos pagamentos realizados pela

Companhia ao Grupo Odebrecht em relação aos oito contratos

indicados na denúncia, incluindo, mas não se limitando, aos

respectivos comprovantes de pagamento, com a indicação das

datas, locais e meios usados para a realização de tais pagamentos.

Desse modo pugna­se pela intimação da PETROBRAS, na

pessoa do responsável por tal atribuição, no seguinte endereço:

Av. Nilo Peçanha, 151, Edifício Castelo, Centro, Rio De Janeiro,

RJ, CEP 20020­100;

(vi) Seja determinado à PETROBRAS que encaminhe para estes

autos cópias de eventuais auditorias financeiras e jurídicas

relativas aos oito contratos indicados na denúncia;

(vii) Caso este Juízo entenda pelo indeferimento da pretensão acima

postulada, o que se mostra indevido à luz da garantia fundamental

da paridade de armas, requer seja oficiado à PETROBRAS o

construção e montagem da Refinaria do Nordeste – RNEST; iii) COMPERJ: contrato celebrado com o CONSÓRCIO TERRAPLANAGEM COMPERJ, para a execução de serviços de terraplenagem, drenagem e anel viário da área do futuro Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro – COMPERJ; iv) TECAB: contrato celebrado com o CONSÓRCIO ODEBEI, para a execução das obras de construção e montagem da Unidade de Processamento de Condensado de Gás Natural II – UPCGN II e seus off­sites, e da ampliação dos Sistemas de Compressão, Ar Comprimido e de Água de Resfriamento do Terminal de Cabiúnas – TECAB; v) TECAB: contrato celebrado com o CONSÓRCIO ODEBEI PLANGÁS, para a execução dos serviços de Implementação da Unidade de Processamento de Gás Natural (UPCGN III), seus Offsites, Interligações e Utilidades (Torre de Resfriamento e Sistema de Ar Comprimido) do Terminal de Cabiúnas – TECAB; vi) TECAB: contrato celebrado com o o CONSÓRCIO ODEBEI FLARE, para a construção e montagem do novo sistema de Tocha do tipo Ground Flare e suas interligações no Terminal de Cabiúnas – TECAB; vii) GASDUC III: contrato celebrado com o CONSÓRCIO ODETECH, contratado pela TRANSPORTADORA ASSOCIADA DE GÁS S.A – TAG, subsidiária integral da Petrobras GÁS S.A, para a execução das obras de construção e montagem do gasoduto GASDUC III – Pacote 1; e viii) P-59 e P-60: contrato celebrado com o CONSÓRCIO RIO PARAGUAÇU, para a construção das plataformas de perfuração autoelevatórias P­59 e P­60.

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envio de todas as atas de reuniões realizadas pelas Diretorias

supracitadas que façam referência aos oito contratos indicados na

denúncia;

(viii) Seja oficiado aos respectivos Juízos competentes e promovida a

juntada a estes autos de cópia integral das ações penais citadas na

exordial acusatória (Página 44), à luz da garantia constitucional

da ampla defesa e da paridade de armas, a saber: (i) Ação Penal

5044464­02.2015.4.04.7000, proposta perante a Justiça Federal

do Rio de Janeiro); (ii) Ação Penal 5023121­47.2015.4.04.7000,

proposta perante este Juízo; (iii) Ação Penal 0009462­

81.2016.4.04.7000, proposta perante a Justiça Federal de São

Paulo;

(ix) Seja determinado ao CONGRESSO NACIONAL que (i)

informe o status de todos os projetos de lei apresentados pela

Presidência da República entre os anos de 2003 a 2010,

constando, dentre outras coisas, as emendas apresentadas e

eventual quórum de aprovação. Desse modo, insiste a defesa no

requerimento, pugnando­se pela intimação do CONGRESSO

NACIONAL, na pessoa do responsável por tal atribuição, no

seguinte endereço: Câmara dos Deputados, Praça dos Três

Poderes, CEP 70160­900, Brasília/DF; e Senado Federal, Praça

dos Três Poderes, CEP 70165­900, Brasília/DF;

(x) Caso o pleito acima requerido seja indeferido, o que não se

mostra adequado em virtude da garantia constitucional da ampla

defesa e da paridade de armas, requer seja determinado à

CÂMARA DOS DEPUTADOS cópia integral dos

procedimentos relativos às 17 medidas provisórias mencionadas

na denúncia (Página 110). Desse modo, insiste a defesa no

requerimento, pugnando­se pela intimação da CÂMARA DOS

DEPUTADOS na pessoa do responsável por tal atribuição, no

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seguinte endereço: Câmara dos Deputados, Praça dos Três

Poderes, CEP 70160­900, Brasília/DF;

(xi) Seja determinado ao TCU, que encaminhe para estes autos (i)

cópia de todos os procedimentos relativos às contas e auditorias

da Petrobras relativos ao período compreendido entre 1º/01/2003

a 30/05/2014, com eventuais pareceres dos auditores e decisões

proferidas nesses procedimentos. Desse modo, insiste a defesa na

intimação do TCU, na pessoa responsável por tal atribuição, no

seguinte endereço: SAFS Quadra 4, Lote 1, CEP 70042­900,

Brasília/DF;

(xii) Caso o pedido elencado no item acima seja indeferido, o que não

se mostra adequado em virtude da garantia constitucional da

ampla defesa e da paridade de armas, requer­se, subsidiariamente,

cópia ao TCU dos procedimentos relativos aos oito contratos

questionados na denúncia, com eventuais pareceres dos auditores

e decisões proferidas nesses procedimentos;

(xiii) Seja determinado à CGU que encaminhe para estes autos (i)

cópia de todos os procedimentos relativos às contas e auditorias

da Petrobras relativos ao período compreendido entre 01/01/2003

a 30/05/2014, com eventuais pareceres dos auditores e decisões

proferidas nesses procedimentos. Desse modo, insiste a defesa na

intimação da CGU, na pessoa responsável por tal atribuição, no

seguinte endereço: SAS, Quadra 01, Bloco A, Edifício Darcy

Ribeiro, Brasília/DF ­ CEP: 70070­905;

(xiv) Caso não se acolha o quanto requerido acima, o que não se mostra

adequado em virtude da garantia constitucional da ampla defesa e

da paridade de armas, requer­se, subsidiariamente, seja

determinado à CGU cópia dos procedimentos relativos aos oito

contratos questionados na denúncia, com eventuais pareceres dos

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auditores e decisões proferidas nesses procedimentos;

(xv) Sejam determinados o acesso e o cadastro da Defesa no EPROC

nos procedimentos mencionados na denúncia (Página 6),

utilizados a fim de alicerçar a pretensão acusatória em face dos

Defendentes, a saber:

5049597­93.2013.4.04.7000, 5027775­48.2013.4.04.7000,

5007992­36.2014.4.04.7000, 5001446­62.2014.4.04.7000,

5014901­94.2014.4.04.7000, 5021466­74.2014.4.04.7000,

5010109­97.2014.4.04.7000, 5049557­14.2013.4.04.7000,

5073475­13.2014.4.04.7000, 50085114­28.2014.4.04.7000,

5075022­88.2014.4.04.7000, 5013906­47.2015.4.04.7000,

5024251­72.2015.4.04.7000, 5071379­25.2014.4.04.7000

(xvi) Seja determinado à empresa ERNEST & YOUNG que informe

se durante a realização de auditoria na Petrobras identificou

algum ato de corrupção ou qualquer ato ilícito com a efetiva

participação do Primeiro Defendente e, na hipótese de resposta

positiva, para que encaminhe a estes autos o eventual trabalho

correspondente, bem como todo o material de apoio. Desse modo,

insiste a defesa na intimação da ERNEST & YOUNG, na pessoa

responsável por tal atribuição, no seguinte endereço: Rua Antônio

de Albuquerque, nº 156, 11º Andar, Belo Horizonte/MG, CEP

30112­010;

(xvii) Seja determinado à empresa KPMG que informe se durante a

realização de auditoria na Petrobras identificou algum ato de

corrupção ou qualquer ato ilícito com a efetiva participação do

Primeiro Defendente e, na hipótese de resposta positiva, para

que encaminhe a estes autos o eventual trabalho correspondente,

bem como todo o material de apoio. Desse modo, insiste a defesa

na intimação da KPMG, na pessoa responsável por tal atribuição,

no seguinte endereço: Rua Doutor Renato Paes De Barros, nº 33,

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8º Andar, Itaim Bibi, São Paulo/SP, CEP 04.530­904;

(xviii) Seja determinado à empresa

PRICEWATERHOUSECOOPERS que informe se durante a

realização de auditoria na Petrobras identificou algum ato de

corrupção ou qualquer ato ilícito com a efetiva participação do

Primeiro Defendente e, na hipótese de resposta positiva, para

que encaminhe a estes autos o eventual trabalho correspondente,

bem como todo o material de apoio. Desse modo, insiste a defesa

na intimação da PRICEWATERHOUSECOOPERS, na pessoa

responsável por tal atribuição, no seguinte endereço: Av.

Francisco Matarazzo, nº 1400, São Paulo – SP, CEP 05001­903;

(xix) Seja determinada a realização de prova pericial multidisciplinar a

fim de identificar (i) se houve desvio de recursos da Petrobras em

favor de seus agentes em relação aos oito contratos indicados na

denúncia; (ii) quem seriam os beneficiários dos recursos

desviados; e, ainda, (iii) se houve algum tipo de repasse desses

eventuais recursos desviados em favor dos Defendentes;

(xx) Seja determinada a realização de prova pericial econômico­

financeira a fim de apurar (i) se a ODEBRECHT utilizou

diretamente de recursos eventualmente ilícitos oriundos dos oito

contratos firmados com a Petrobras indicados na denúncia para a

suposta aquisição do imóvel situado na Rua Haberbeck Brandão

nº 178; (ii) os prejuízos eventualmente causados à UNIÃO em

virtude dos eventuais desvios verificados em relação a esses oito

contratos indicados na denúncia; (iii) se a ODEBRECHT vendeu

a terceiros o imóvel situado na Rua Haberbeck Brandão, nº 178;

e, ainda, se (iv) se a ODEBRECHT teve prejuízo ou lucro nessa

venda;

(xxi) Seja determinada realização de laudo pericial contendo os

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seguintes quesitos: i) Qual o valor dos contratos firmados por

empresas do GRUPO ODEBRECHT e consórcios dos quais

tenham participado junto a Petrobras no período de 2004 a 2014?;

(ii) É possível identificar transações financeiras entre tais

empresas/consórcios e agentes públicos, partidos políticos (atuais

e da época dos fatos) ou quaisquer pessoas físicas ou jurídicas

ligadas aos mesmos?; (iii) Com base nos dados disponíveis,

sobretudo contábeis e financeiros, há pagamentos feitos a partir

de empresas do GRUPO ODEBRECHT e consórcios dos quais

tenham participado em favor de empresas ou operadores

apontados na Operação Lava Jato como tendo promovido a

transferência dissimulada de recursos e/ou lavagem de dinheiro?

Se positiva a resposta ao quesito anterior, é possível identificar os

destinatários finais dos recursos empregados em tais

pagamentos?; (iv) Outros dados julgados úteis pelos peritos.

(xxii) Seja determinada prova pericial referente ao imóvel situado na

Rua Haberbeck Brandão, nº 178 ­ São Paulo/SP (Anexo 269 da

denúncia) com os seguintes quesitos: (i) Descrição do material;

(ii) Quais são os últimos três titulares do imóvel?; (iii) Qual o

valor das transações?; (iv) As plantas referem­se a obras de

reformas/ampliação ou construção de um novo prédio? É possível

estimar o valor?; (v) Qual a situação atual do bem?; (vi) O imóvel

objeto da documentação em anexo possui vinculação com os

investigados da Operação Lavajato?; (vii) Outros esclarecimentos

a critério dos peritos;

(xxiii) Seja determinada prova pericial com os seguintes quesitos: (i)

Informar se há registros, no sped contábil do GRUPO

ODEBRECHT, de pagamentos à empresa DAG

CONSTRUTORA LTDA (02.903.203/0001­13) detalhando­os;

(ii) É possível apontar fluxo financeiro para as pessoas de

GLAUCOS DA COSTAMARQUES BUMLAI (004.022.651­49),

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MATEUS CLAUDIO GRAVINA BALDASSARI (769.065.318­

91), REGINA CONCEIÇÃO BALDASSARI (011.771.978­12) e

FERNANDO CARLOS GRAVINA BALDASSARI

(056.819.958­87)?

(xxiv) Seja determinado a DAG CONSTRUTORA o envio de cópia de

todos os contratos de serviços prestados no período compreendido

entre 2009 e 2016. Desse modo, insiste a defesa na intimação da

DAG CONSTRUTORA, na pessoa responsável por tal

atribuição, no seguinte endereço: Rua Doutor José Peroba, nº 149,

Sala 601, Stiep, Salvador/BA, CEP 41770­235;

(xxv) Na hipótese de indeferimento do quanto acima pugnado, requer­

se envio pela DAG CONSTRUTORA de cópias de eventuais

serviços prestados junto à PETROBRAS.

Postula-se, ainda, a intimação das testemunhas qualificadas

no anexo rol, mediante a expedição de cartas precatórias e rogatórias.

Requerem, por fim, que todas as intimações e informações

relativas ao processo sejam em nome do advogado Cristiano Zanin Martins,

OAB/SP nº 172.730, sob pena de nulidade absoluta do ato.

Termos em que,

Pedem deferimento.

De São Paulo a Curitiba, 26 de Janeiro de 2017.

VALESKA TEIXEIRA Z MARTINS

OAB/SP 153.720

CRISTIANO ZANIN MARTINS

OAB/SP 172.730

JUAREZ CIRINO DOS SANTOS

OAB/PR 3.374

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ROL DE TESTEMUNHAS

1) José Renan Vasconcelos Calheiros, brasileiro, Senador da República, com

endereço na Praça dos Três Poderes, Senado Federal, Anexo I, 15º Andar, CEP

70160­900, Brasília/DF;

2) Romero Jucá, brasileiro, Senador da República, brasileiro, casado, economista,

portador do documento de idade RG nº 1.952.722SSP/PE, com endereço na Praça

dos Três Poderes, Senado Federal, Prédio Principal, Ala Antônio Carlos

Magalhães, CEP 70160­900, Brasília/DF;

3) Gilberto Carvalho, brasileiro, ex­chefe de gabinete ex­presidente Lula, inscrito

no CPF sob o n.º 200.989.609­20, portador do RG 30678989­9, com endereço na

SQN 111, Bloco E, apto. 505. CEP 70754­050, Brasília/DF;

4) Jaques Wagner, brasileiro, aposentado, inscrito no CPF sob o n.º 264.716.207­

72, portador do RG n.º 0153297557 SSP/BA, em endereço na Avenida Sete de

Setembro, 2224, apto. 1302, Edifício Victory Tower, CEP 40080­02,

Salvador/BA;

5) José Mucio Monteiro Filho, brasileiro, Ministro do Tribunal de Contas da

União, inscrito no CPF sob o n.º 050.590.894­87, portador do RG n.º 659.497

SSP/PE, com endereço na SQS 309, Bloco D, apto. 202, CEP 70362­040,

Brasília/DF;

6) Henrique de Campos Meirelles, brasileiro, engenheiro civil, com endereço na

SAS Quadra 6, Bloco O – Ed. Órgãos Centrais, CEP 70070­917, Brasília/DF;

7) Henrique Fontana Júnior, brasileiro, casado, médico, inscrito no CPF sob o n.º

334.105.180­53, portador do documento de idade nº 7012558495, com endereço

na Rua Dolores Duran nº 2210, Porto Alegre/RS e 302 Norte, Bloco G, apto. 501,

CEP 70723­070, Brasília/DF;

8) Luiz Fernando Furlan, brasileiro, empresário, com endereço na Av. Brigadeiro

Faria Lima, 2.277, 11º andar, Jardim Europa, CEP 01452­000, São Paulo/SP;

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9) José Sergio Gabrielli, brasileiro, divorciado, economista, inscrito no CPF sob o

nº 042.750.395­72, portador da cédula de identidade RG nº 00693342­42

SSP/BA, com endereço na Avenida República do Chile, 65, Centro, CEP 20031­

912, Rio de Janeiro;

10) Silvio Pettengill Neto, brasileiro, ex­Diretor Jurídico da Petrobras, com endereço

na Av. Afonso Pena, 4444, Vila Cidade, CEP 79020­001, Campo Grande/MS;

11) Mariana Fernandes da Silva, brasileira, casada, advogada, portadora de

identidade OAB/RJ 113.07, inscrita no CPF sob o nº 051.763.027­30, residente e

domiciliada na Rua Lopes Quintas 100, Bloco 01 – 108, Jardim Botânico, CEP

22460­010, Rio de Janeiro/RJ;

12) Cláudio Lemos Fonteles, brasileiro, inscrito no CPF sob o n.º 008615881­34,

portador do RG 106.272 SSP/DF, com endereço na SHIN QI 09, Conjunto 4,

casa 2, Lago Norte, CEP 71.525­090, Brasília/DF;

13) Antonio Fernando Barros e Silva de Souza, brasileiro, advogado, inscrito na

OAB/PR nº 4.931 e na OAB/DF nº 17.761, com endereço profissional na Rua

SAFS Quadra 02, Lote 02, Edifício Via Office, Conjunto 107, CEP 70.070­600,

Brasília/DF;

14) Jorge Hage Sobrinho, brasileiro, advogado e professor, inscrito no CPF sob o

n.º 000.681.015­20, portador do RG n.º 808.778 SSP/BA, com endereço na SQS

113, Bloco C, apto. 101, Asa Sul, CEP 70 376­030, Brasília/DF;

15) José Aldo Rebelo Figueiredo, brasileiro, casado, inscrito no CPF sob o n.º

164.121.504­63, portador do RG nº 299.549.549 SSP/SP, com endereço na Rua

SHIS QI 27, Conjunto 5, Casa 4, CEP 71675­050, Brasília/DF;

16) Alexandre Padilha, brasileiro, médico, inscrito no CPF sob o n.º 131.926.798­

08, portador do documento de idade nº 17.346.675­8 SSP/SP, com endereço na

Rua Avanhandava, 115, CEP 01306­001, São Paulo/SP;

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17) Ricardo José Ribeiro Berzoini, brasileiro, bancário, inscrito no CPF sob o n.º

007.529.128 ­28, portador do RG 12.470.268, com endereço na SHIN QL 7,

Conjunto 1, Casa 8, Lago Norte, CEP 71515­015, Brasília/DF e na Rua Teodósio

Nobre, 186, CEP 04401­140, São Paulo/SP;

18) Arlindo Chignalia Junior, brasileiro, médico, Deputado Federal, inscrito no

CPF sob o n.º 068.211.461­87, portador do RG n.º 4.626.765, com endereço na

Rua José Janarelli, 210, apto. 132, Vila Progresso, CEP 05615­000, São

Paulo/SP e na Praça dos 3 Poderes, Câmara dos Deputados, Gabinete Ala A Ed.

Principal – Anexo I, CEP 70160­900, Brasília/DF;

19) Valmir Moraes da Silva, brasileiro, 1º Tenente do Exército Brasileiro (EB);

inscrito no CPF sob o n.º 481.109.141­87, portador do RG n.º 099963943­8 M.

Def. EB, com endereço na Av. Getúlio Vargas, 319, apto. 31, bloco B, bairro

Baeta Neves, CEP 09751­250, São Bernardo do Campo/SP;

20) General Marco Edson Gonçalves Dias, brasileiro, inscrito no CPF sob o n.º

421.525.007­25, portador do RG n.º 02602.554.1­9 Ministério da Defesa, com

endereço no Condomínio Mônaco, Quadra 23, casa 19, Km 2 da Rodovia DF

140, Lago Sul, CEP 71680­601, Brasília/DF;

21) Coronel Geraldo Corrêa de Lyra Junior, brasileiro, inscrito no CPF sob o n.º

050.877.478­09, portador do RG n.º 428347­ Comando da Aeronáutica, com

endereço na Avenida Dom Pedro I, 100, CEP: 01552­000, Cambuci, São

Paulo/SP;

22) Brigadeiro Rui Chagas de Mesquita, brasileiro, Comandante da Aeronáutica,

inscrito no CPF n.º 105.519.132­15, portador do RG n.º 357988, com endereço

na SHIS QL 6, conjunto 02, Casa 15, CEP 71620­025, Brasília/DF;

23) Malu Gaspar, brasileira, jornalista, podendo ser encontrada na Redação da

Revista Piauí, com endereço na Rua Aníbal de Mendonça, n.º 151, Ipanema, CEP

22410­050, Rio de Janeiro/RJ;

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24) Embaixador Marcos Leal Raposo Lopes, brasileiro, inscrito no CPF sob o nº

610.875.217­34, portador da MRE­5073, com endereço na Embaixada do Brasil

no Peru, Rua Jose Pardo, 850, Miraflores 15074, Lima, Peru;

25) Embaixador Paulo Cesar de Oliveira Campos, brasileiro, embaixador, inscrito

no CPF sob o n.º 410.190.087­68, MRE 6464, com endereço na Embaixada do

Brasil na França, 34 Cours Albert 1er, 75008, Paris 8, França;

26) Walfrido Mares Guia, brasileiro, empresário, inscrito no CPF sob o n.º

006.900.906­68, portador do RG n.º 16.000.749, com endereço na Rua Vicente

Racioppi, 164, CEP 30210­290, Belo Horizonte/MG;

27) Tarso Fernando Herz Genro, brasileiro, casado, advogado, inscrito no CPF sob

o nº 131.926.798­08, portador do documento de idade RG nº 1000567287, com

endereço na Rua Coronel Aurélio Bitencourt, 150, Rio Branco, CEP 90430­080,

Porto Alegre/RS e Rua Manoelito d’Ornellas, 198, conjunto 502, CEP 90110­

230, Porto Alegre/RS;

28) Paulo Lacerda, brasileiro, ex­Diretor Geral da Polícia Federal, brasileiro,

casado, inscrito no CPF sob o nº 274.700.167­61, portador do RG nº 2.768.085,

com endereço na SAIS Quadra 7, Lote 23, Setor Policial Sul, CEP 70610­902,

Brasília/DF;

29) Luiz Fernando Correa, brasileiro, ex­Diretor Geral da Polícia Federal, com

endereço na SAIS Quadra 7, Lote 23, Setor Policial Sul, CEP 70610­902,

Brasília/DF;

30) Eurico Antônio Gonzalez Cursino dos Santos, brasileiro, professor

universitário e consultor legislativo do Senado Federal, portador do RG n.º

583275 (SSP­DF), com endereço na SQS 314, bloco H, apto. 304, CEP 70383­

080, Brasília/DF;

31) Coronel Francisco Alberto Aires Mesquita, brasileiro, inscrito no CPF sob o

n.º 050.877.478­09, portador do RG n.º 428347 ­ Comando da Aeronáutica, com

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endereço na Avenida Dom Pedro I, 100, CEP 01552­000, Cambuci, São

Paulo/SP;

32) José Orcírio Miranda dos Santos, brasileiro, casado, Deputado Federal,

portador da cédula de identidade RG n. 1169300 – SSP/MS, inscrito no CPF/MF

sob o n. 040.649.921­72, residente e domiciliado na Rua Padre João Crippa,

1065, 3º andar, Galeria Rio Negro, CEP 79002­380, Campo Grande/MS; e Praça

dos 3 Poderes ­ Câmara dos Deputados, Gabinete 860, Anexo IV, CEP 70160­

900 ­ Brasília – DF;

33) José Paulo Assis, brasileiro, engenheiro mecânico, inscrito no CPF sob nº

167.249.849­04, com endereço na Rua Paulo Setúbal, 1486, Boqueirão, CEP

81670­130, Curitiba/PR;

34) Helio Shiguenobu Fujikawa, brasileiro, advogado, CPF 012.708.938­15, RG

3.573.875/SSP/SP, com endereço na Rua Fala Amendoeira, 348, apto. 1502,

Barra da Tijuca, CEP 22.793­580, Rio de Janeiro/RJ;

35) Alan Kardec Pinto, CPF 034.530.657­00, podendo ser encontrado na sede da

Petrobras, com endereço na Av. República do Chile, nº 65, 4º andar, Centro, CEP

20031­912, Rio de Janeiro/RJ;

36) Mário Márcio Castrillon de Aquino, brasileiro, inscrito no CPF sob o n°

370.752.177­04, com endereço na Rua Francisco Juglair, s/n, apto. 102,

Mossungue, CEP 81200­230, Curitiba/PR;

37) Fernando Almeida Biato, CPF 329.803.107­00, podendo ser encontrado na sede

da Petrobras, com endereço na Av. República do Chile, nº 65, 4º andar, Centro,

CEP 20031­912, Rio de Janeiro/RJ;

38) Marcelino Guedes Ferreira Mosqueira Gomes, portador da cédula de

identidade nº 47.921.648, expedida pelo IFP/RJ e do CPF nº 793.109.077­20,

podendo ser encontrado na sede da Petrobras, com endereço na Av. República do

Chile, nº 65, 4º andar, Centro, CEP 20031­912, Rio de Janeiro/RJ;

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39) José Lima de Andrade Neto, brasileiro, casado, engenheiro químico, portador

da carteira de identidade nº 198.768 SSP/SE, inscrito no CPF/MF sob o nº

102.994.085­15, podendo ser encontrado na sede da Petrobras, com endereço na

Av. República do Chile, nº 65, 4º andar, Centro, CEP 20031­912, Rio de

Janeiro/RJ;

40) Paulo Cesar Farah Muniz, brasileiro, inscrito no CPF sob o número

528.388.467­87, residente e domiciliado na Rua Gil Vicente, 130, Jardim

Carioca, CEP 21920­235, Rio de Janeiro – RJ;

41) Marcos da Cunha Henriques, podendo ser encontrado na sede da Petrobras,

com endereço na Av. República do Chile, nº 65, 4º andar, Centro, CEP 20031­

912, Rio de Janeiro/RJ;

42) Tarcísio Rossêto, podendo ser encontrado na sede da Petrobras, com endereço

na Av. República do Chile, nº 65, 4º andar, Centro, CEP 20031­912, Rio de

Janeiro/RJ;

43) Paulo Marcelo de Figueiredo Montes, podendo ser encontrado na sede da

Petrobras, com endereço na Av. República do Chile, nº 65, 4º andar, Centro, CEP

20031­912, Rio de Janeiro/RJ;

44) Alexandre Lugtenburg de Garcia, podendo ser encontrado na sede da

Petrobras, com endereço na Av. República do Chile, nº 65, 4º andar, Centro, CEP

20031­912, Rio de Janeiro/RJ;

45) Nilo Victor de Oliveira, podendo ser encontrado na sede da Petrobras, com

endereço na Av. República do Chile, nº 65, 4º andar, Centro, CEP 20031­912,

Rio de Janeiro/RJ;

46) Rômulo de Miranda Coelho, podendo ser encontrado na sede da Petrobras, com

endereço na Av. República do Chile, nº 65, 4º andar, Centro, CEP 20031­912,

Rio de Janeiro/RJ;

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47) Paulo Tarciso Okamotto, administrador; CPF: 767.248.248­34; RG: 7.906.164

SSP/SP, podendo ser encontrado na Rua Pouso Alegre, 21, Ipiranga, CEP 04261­

030, São Paulo/SP;

48) Clara Levin Ant, brasileira, arquiteta, divorciada, portadora do RG n.º

3580421X, inscrita no CPF n.º 646.409.658­34, com endereço na Rua Brigadeiro

Galvão, 153, apto. 231, Barra Funda, CEP 01151­000, São Paulo/SP;

49) Celso Oliveira Marcondes de Faria, brasileiro, casado, jornalista, portador do

RG n.º 5900578, inscrito no CPF n.º 007.257.988­90, com endereço na Rua

Pamplona, 969, casa 01, Cerqueira César, CEP 01405­200, São Paulo – SP;

50) Luiz Soares Dulci, brasileiro, professor, CPF nº 405.627.197­68, com endereço

na Rua Castro Alves, 744, apto. 33, Aclimação, CEP 01532­001, São Paulo/SP;

51) Paulo de Tarso Vanucchi, brasileiro, jornalista, inscrito no CPF sob o nº

872.345.138­68, portador de RG 4.317.816, com endereço na Alameda Casa

Branca, 327, apto. 202, CEP 01408­001, São Paulo/SP;

52) Marcelo Carvalho Ferraz, brasileiro, portador do RG 8782254 SSP/SP,

inscrito no CPF/MF sob nº 003.668.788­08, residente na Rua Ubiracica, 153,

Boacava, CEP 05.470­020, São Paulo/SP;