EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ FEDERAL DA VARA ÚNICA … · 2015-11-20 · ... III, "e", e art. 6º,...
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EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ FEDERAL DA VARA ÚNICA DA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA
DE ITAITUBA
Os defensores dos Direitos Humanos são homens e mulheres que acreditamque podem fazer a diferença, baseando-se nos princípios e valoresproclamados na Declaração Universal de Direitos Humanos. Lutam contra oterror e a miséria social, econômica e política, contra a ameaça à dignidadehumana de todas as pessoas. Os defensores lutam para proteger os maisfracos e punir o abuso de poder ameaçador e perigoso1.
Símbolo da luta pelos direitos humanos, Dorothy Stang, missionária daCongregação Notre Dame e reconhecida defensora das causas ambientais edos agricultores sem-terra contra madeireiros e fazendeiros que recebeu,em 2004, da Assembléia Legislativa do Estado do Pará o título de CidadãParaense e o prêmio “José Carlos Castro”, outorgado pela Ordem dosAdvogados do Brasil. Irmã Dorothy, que trabalhava no Pará desde 1966,morreu em 2005, aos 73 anos, assassinada com seis tiros, numaemboscada, quando caminhava por uma estrada de terra na companhia dedois trabalhadores rurais2.
O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e o MINISTÉRIO PÚBLICO
ESTADUAL, pelas signatárias abaixo identificadas, com suporte no art. 129, XI, da
Constituição Federal; art. 5º, III, "e", e art. 6º, XII, ambos da Lei Complementar nº
75/93 (Lei Orgânica do Ministério Público da União), art. 82, I, da Lei n. 8.078/90;
bem como do art. 1º, incisos II e IV, da Lei 7.347/1985, vêm, perante Vossa
Excelência, propor a presente:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA
(COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA)
em face da:
UNIÃO (Secretaria Especial de Direitos Humanos), pessoa jurídica de direito público
interno, representada pela Procuradoria Seccional da União em Santarém-PA
PSU/SRM - AGU, que deverá ser citada na pessoa de seu Advogado-Chefe, com
endereço na Travessa Moraes Sarmento, 480 - Centro, Santarém - PA, 68005-360 e
1. Amnistia Internacional. Defensores de los derechos humanos en Latinoamérica. EDA:Madrid, 1997. pp. 9-10.2. MJ MPOG SEDH 00191 2008 Programa de Proteção aos Defensores dos Direitos HumanosAmeaçados, disponível em: www.camara.gov.br/sileg/integras/702658.pdf, acesso em 19.11.2015.
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ESTADO DO PARÁ, pessoa jurídica de direito público interno, representado para
esse fim pela Procuradoria-Geral do Estado, com endereço à Rua dos Tamoios,
1671, CEP: 66.025-540, bairro Batista Campos, Belém/PA;
pelos motivos de fato e de direito que a seguir passa a expor:
1 DO OBJETO DA PRESENTE AÇÃO.
A demanda visa a obtenção de provimento jurisdicional para que a
União, através da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, e o
Estado do Pará promovam a efetiva implementação das medidas de proteção aos
defensores de direitos humanos que se opõem ao desmatamento, ao desequilíbrio
ambiental, a destruição de modos de vida comunitário provocados por
madeireiros, fazendeiros e grileiros que pretendem se instalar nos projetos de
assentamento da reforma agrária na região Oeste do Pará.
2 DOS FATOS
A Presidência da República, há mais de uma década, no ano de 2004,
institutiu o Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos – PPDDH e
tem como objetivo a adoção e articulação de medidas que possibilitem garantir a
proteção de pessoa que estejam em situação de risco ou ameaça em decorrência
de sua atuação na promoção ou defesa dos direitos humanos.
O programa visa a adoção não só de medidas de proteção àqueles
que estejam em situação de risco ou ameaça em decorrência de sua atuação na
promoção desses direitos, como também visa superar as causas que geram a
instabilidade social.
O Decreto 6.044, de 12 de fevereiro de 2007, que institui o Plano
Nacional de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos – PNPDDH prevê,
dentre as diretrizes gerais, o fortalecimento do pacto federativo buscando uma
atuação conjunta e articulada com as demais esferas de governo através da
instituição de uma rede de proteção aos defensores de direitos humanos.
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No Estado do Pará tem a maior concentração das áreas públicas
destinadas a reforma agrária, sendo palco de intensos conflitos fundiários que tem
origem nas frentes de invasão de madeireiros, fazendeiros e grileiros de terras que
pretendem ali se estabelecer e que encontram resistência dos assentados.
Na região de jurisdição desta Subseção, especificamente no município
de Trairão/PA, há de se atentar para dois projetos de assentamentos que
protagonizam ações criminosas de grilagem de terra e desmatamentos com
constantes ameças aos defensores dos direitos humanos na região, quais sejam o
Projeto de Assentamento Areia, localizado entre os municípios de Trairão e
Itaituba, e o Projeto de Assentamento Ypiranga, no município de Trairão/PA.
O PA Areia foi criado em 1998 e consolidado em 2002 sem a devida
conclusão dos investimentos de obras de infraestrutura e políticas públicas
mínimas por parte do INCRA, motivos que levaram o Ministério Público Federal a
recomendar a revogação da consolidação do assentamento, o que até então não
se tem informação concreta se houve o acolhimento pela autarquia agrária.
Nos lotes de terra que receberam financiamento, os conflitos se
intensificaram com a atuação de grileiros que controlam o acesso à área utilizam-
no como entrada para a retirada ilegal de madeira em unidades de conservação
adjacentes – como a Floresta Nacional do Trairão e Reserva Extrativista Riozinho
do Anfrísio – por meio de uma extensa rede de estradas ilegais abertas no meio da
floresta.
Neste cenário, os assentados resistem as intimidações e ameaças dos
que praticam ilícitos dentro dos projetos e ao modelo de desenvolvimento
contrário a reforma agrária na região. As lideranças desse território, que tem
atuação mais incisiva contra a invasão e a prática de atividade ilícitas estão
inclusas no Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos da
Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, exatamente por
denunciarem a grilagem e a exploração ilegal de madeira no PA. Este cenário se
reproduz no contexto de outros projetos como é o caso do PA Ypiranga.
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O PA Ypiranga abriga conflitos agrários deflagrados por famílias
produtoras rurais, sem perfil de beneficiários de Reforma Agrária e que não
residem na área do assentamento, mas possuem cadastro junto ao INCRA e
utilizam os lotes para criação de gado e exploração ilegal de madeira.
Os grileiros lançam mão de ações judiciais na Justiça Estadual,
requerendo reintegração de posse, sem a indicação da Autarquia Fundiária(INCRA),
visando retirar os próprios assentados da área sempre com investidas
ameaçadoras, conforme adiante narrar-se-á.
Como forma de proteger as lideranças e garantir a continuidade do
trabalho por eles desenvolvidos, as vítimas são incluídas no PPDDH com o
requerimento inicial direto à Secretaria Nacional de Direitos Humanos que realiza
avaliação e promove a integração ao programa. Contudo, a efetividade das
medidas de proteção depende da articulação com os órgãos e entidades públicas
do Estado que, em contrapartida, devem oferecer, basicamente, saúde e
segurança diferenciadas.
2.1 Das lideranças no Pará
Conforme narrado alhures, na região de jurisdição da Subseção de
Itaituba/PA, especificamente nos municípios de Itaituba e Trairão, há duas
lideranças que, atualmente, sofrem investidas intimidatórias graves em razão da
resistência às atividades desenvolvidas ilicitamente nas comunidades.
A) O.M.M.A.P
Desde 2013 O., liderança do PA Areia, recebe ameaças de morte em
razão do desenvolvimento de trabalho, realizado pela ONG IPAM, voltado para a
gestão florestal do assentamento com medidas sustentáveis e de mínima
intervenção ambiental.
O primeiro episódio relatado informa que, em novembro de 2013, O.
foi procurada por um grupo de 14 homens armados que pretendiam suborná-la
para não denunciar a retirada ilegal de madeira do assentamento. Na ocasião,
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recusando imediatamente a proposta, o chefe dos homens, alcunhado por “ARI”,
disse que “pobre só ganhava dinheiro quando morria”.
Exatamente, em razão da atividade que desenvolve e das
informações que possuem, O. é vista pelos madeireiros com uma ameaça a
continuidade das atividades ilícitas, ensejando, assim, sua inclusão no PPDDH.
B) E.R.C.S
E. é Presidente da Associação dos Moradores da Comunidade Arco Íris
e promove constantes comunicações ao INCRA informando a existência de
ocupações irregulares e atividades de exploração ilegal de madeira no
Assentamento Ypiranga.
Em razão das diversas ameaças que vem sofrendo, especialmente,
de Ivo Eduardo Welter – contra quem fora instaurado inquérito policial na Polícia
Federal de Santarém, a Comissão Pastoral da Terra – CPT requereu a inclusão de E.
no PPDDH, estando pendente de análise.
Em março de 2015, após reunião da Comissão Nacional de Combate
à Violência no Campo em Santarém, ocasião em que relatou os conflitos no PA
Ypiranga e a omissão da Polícia Civil de Trairão, E. foi abordado em via pública, por
uma pessoa que se disse policial militar e que afirmou que temia pela sua vida e
segurança, em tom intimidador.
Adiante, em abril de 2015, a CPT informou ao MPF que E. não está
incluído na lista do Programa da Defensores, mesmo o requerimento tendo sido
realizado em abril e o único acompanhamento que recebeu foi através de contato
telefônico recebido somente quando de sua ida a cidade, uma vez que na
comunidade onde reside não possui cobertura de sinal telefônico.
Informações mais recentes demonstram que as ameaças são
constantes e atuais. Em 27 de outubro de 2015, a Comissão Pastoral da Terra
informou que, após compromisso do então Superintendente do INCRA em iniciar os
trabalhos de campo no local dos assentamentos para regularizar a situação
fundiária, os defensores E. e O. passaram a sofrer mais intimidações e ameaças.
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O mesmo documento informa, ainda, que, no caso de E., os
comentários na região eram de que “ele só iria parar quando levasse um tiro”
(sic). Já em relação a O. as informações são de que pistoleiros estão comentando
que ela será assassinada, independente da atuação do INCRA.
Há de se ressaltar que as lideranças ameaçadas não encontram
segurança na polícia civil e militar no município de Trairão, uma vez que por
diversas vezes lhe foi negado o registro de boletim de ocorrência em razão das
constantes ameaças recebidas.
2.1 Da omissão do Estado
É cediço que o desenvolvimento do Programa de Proteção aos
Defensores dos Direitos Humanos, de acordo com o Plano Nacional previsto no
Decreto 6.044/2007, depende necessariamente da articulação com órgão e
entidade públicas locais que, em contrapartida, devem oferecer saúde e
segurança diferenciadas.
Conforme se infere dos documentos encaminhados pela CPT e dos
relatos das lideranças ameaçadas, o acompanhamento promovido pelo programa
é precário e nada eficiente no atingimento de suas finalidades.
O mero atendimento via contato telefônico pelo PPDDH e a falta de
apoio pelas polícias civil e militar às lideranças – representando muito mais um
incremento as ameaças sofridas – evidenciam a vulnerabilidade de tais lideranças
e a completa ineficácia do programa no Estado do Pará que se socorre na falta de
orçamento para assumir o programa.
Quanto a falta de estrutura do programa no Pará, o Ministério Público
do Estado formalizou demandas para inclusão no Plano Plurianual verba para
aplicação na defesa das lideranças ameaçadas, como é exemplo, a necessidade de
instalação de uma delegacia especializada para promover a segurança pessoal e a
investigação dos crimes relacionados e, ainda, o atendimento psicológico
especializado desvinculado do serviço ordinário local, serviços não oferecidos pelo
Estado do Pará.
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Por fim, registre-se que na data de ontem foi realizada reunião entre
vários Órgãos, sociedade civil Organizada e lideranças ameaçada, contudo nem o
Secretário de Justiça e Direitos Humanos do Pará, nem a Coordenadora do Pró-Paz,
nem representante das forças policiais estaduais e ainda a Secretária de
Defensores dos Direitos Humanos da Secretaria Nacional de Direitos Humanos da
Presidência da República se fizeram presentes no ato.
3 DO DIREITO
3.1 Da normatividade
A República Federativa do Brasil tem como fundamento a “dignidade
da pessoa humana” (art. 1º, III, CF) e como objetivo “promover o bem estar de
todos” (art. 3º, IV, CF), afirmando o “direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança” (art. 5º, caput, CF) como direitos fundamentais.
Não obstante o reconhecimento constitucional, os direitos à vida,
integridade física e liberdade são direitos humanos com atributos de
irrenunciabilidade, inalienabilidade, imprescritibilidade e universalidade.
No artigo 129, inciso II, a Constituição Federal determinou ser função
institucional do Ministério Público: “zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos
e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição,
promovendo as medidas necessárias a sua garantia”.
O administrador público deve orientar-se pelos princípios da
eficiência, da autotutela, da indisponibilidade, da segurança jurídica (boa-fé
objetiva e proteção à confiança), razoabilidade, proporcionalidade e, notadamente
no presente caso, da continuidade dos serviços públicos.
A Política Nacional de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos
- PNPDDH, aprovada pelo Decreto n. 6.044/2007, define em seu art. 2º
“defensores dos direitos humanos” como todos os indivíduos, grupos e órgãos da
sociedade que promovem e protegem os direitos humanos e as liberdades
fundamentais universalmente reconhecidos. A proteção visa a garantir a
continuidade do trabalho do defensor, que promove, protege e garante os direitos
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humanos, e, em função de sua atuação e atividade nessas circunstâncias,
encontra-se em situação de risco ou vulnerabilidade ou sofre violação de seus
direitos.
A violação caracteriza-se por toda e qualquer conduta atentatória à
atividade pessoal ou institucional do defensor dos direitos humanos ou de
organização e movimento social, que se manifeste, ainda que indiretamente, sobre
familiares ou pessoas de sua convivência próxima, pela prática de homicídio
tentado ou consumado, tortura, agressão física, ameaça, intimidação, difamação,
prisão ilegal ou arbitrária, falsa acusação, atentados ou retaliações de natureza
política, econômica ou cultural, de origem, etnia, gênero ou orientação sexual, cor,
idade entre outras formas de discriminação, desqualificação e criminalização de
sua atividade pessoal que ofenda a sua integridade física, psíquica ou moral, a
honra ou o seu patrimônio.
O art. 4º, IV, da PNPDDH, fixa como uma das diretrizes gerais a
estruturação de rede de proteção aos defensores dos direitos humanos,
envolvendo todas as esferas de governo e organizações da sociedade civil, e como
uma das diretrizes específicas de proteção a implementação de medidas
preventivas nas políticas públicas, de maneira integrada e intersetorial, nas áreas
de saúde, educação, trabalho, segurança, justiça, assistência social, comunicação,
cultura, dentre outras (art. 5º, I).
Como diretrizes específicas de atenção aos defensores dos direitos
humanos que se encontram em estado de risco ou vulnerabilidade, o art. 7º da
Política Nacional elenca: I - proteção à vida; II - prestação de assistência social,
médica, psicológica e material; III - iniciativas visando a superação das causas que
geram o estado de risco ou vulnerabilidade; IV - preservação da identidade,
imagens e dados pessoais; V - apoio para o cumprimento de obrigações civis e
administrativas que exijam comparecimento pessoal; VI - suspensão temporária
das atividades funcionais; e VII - excepcionalmente, a transferência de residência
ou acomodação provisória em local sigiloso, compatível com a proteção.
A atuação do Programa não está voltada apenas à proteção da vida e
da integridade física dos defensores, mas também e principalmente na articulação
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de medidas e ações que incidam na superação das causas que geram as ameaças
e as situações de risco.
O Programa Federal é coordenado pela Secretaria de Direitos
Humanos da Presidência da República, com implementação nas unidades da
federação, dentre elas o Estado do Pará.
Ademais, referido programa decorre de obrigação do Estado Brasileiro
na ordem internacional, e de acordo com a Constituição Federal os tratados e
convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada
Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos
respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. ( Art. 5 o ,
parágrafo 3 o i ncluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
3.2 Da legitimidade do Judiciário no controle da legalidade do serviço público
(“políticas” públicas) e não no mérito/discricionariedade administrativo
A tese de impossibilidade de intervenção judicial na discricionariedade
administrativa não se aplica ao presente caso. O socorro à atuação judicial se deu
diante da inefetividade dos réus em prestarem um serviço de proteção aos
defensores dos direitos humanos minimamente aceitável. Caso não houvesse
omissão e prestação do serviço aquém da necessidade, não haveria a presente
ação.
Como acima evidenciado, o serviço público consistente na proteção
dos defensores dos direitos humanos não oferece condições dignas, humanas e
eficazes, ou seja, o serviço público não está funcionando bem.
A União e o Estado do Pará não possuem discricionariedade em realizar
ou não o serviço de proteção aos defensores dos direitos humanos. Têm obrigação
legal. Há vinculação. Ademais, as normas do artigo 5o têm aplicação imediata, in
verbis:
Art. 5o - § 1º As normas definidoras dos direitos e garantiasfundamentais têm aplicação imediata.
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Trata-se de controle de legalidade, para o qual possui o Poder
Judiciário legitimidade. Não se está discutindo a conveniência e oportunidade em
tratar os defensores. Ou seja, se se tratasse de escolha, esta já foi feita pelo
Estado. Em outras palavras, o Estado já julgou conveniente e oportuna a existência
de serviço de proteção aos defensores dos direitos humanos, pelo que não há
qualquer ingerência do MPF em obrigar o Estado a realizar algo diverso de sua
vontade. A possível alegação de intervenção em “políticas” públicas se trata de
mero argumento contraditório do Estado.
Note-se que é tendencioso o comum uso da expressão “políticas”
públicas, justamente para reforçar o falacioso argumento de que o Judiciário está
atuando na política – judicialização da política. Nada disto ocorre aqui. Trata-se de
serviço público, sendo perfeitamente possível ao Judiciário realizar o controle de
legalidade.
Ademais, não se está substituindo o administrador no seu mister de
gerir a máquina estatal, mas sim se busca garantir o mínimo existencial,
consistente na proteção das pessoas protegidas pelo programa de proteção aos
defensores dos direitos humanos. Não há discricionariedade quanto ao “mínimo”
legal. É dever pôr em prática, além do papel, o piso de exercício de cidadania.
Enfatizando, a proteção da vida, integridade física e liberdade fazem
parte do mínimo existencial, não havendo discricionariedade e aplicação da
reserva do possível quanto a este mínimo existencial. A discricionariedade toma
lugar quando há zona de liberdade de escolha. Aqui, não há escolha: a garantia da
vida, integridade física e liberdade dos protegidos é imperativa. Ou seja, não pode
o Estado alegar conveniência e oportunidade, ainda que por suposta falta de
recursos financeiros (reserva do possível), para não garantir estes direitos. A
discricionariedade deve ser exercida em campo mais amplo, com a realocação de
recursos menos prioritários (como os recursos destinados a publicidade [milhares
de reais], festas, eventos, programação cultural) para a presente causa.
Em síntese: possui o Poder Judiciário legitimidade para o controle de
legalidade dos atos administrativos, não havendo, no presente caso, conveniência
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e oportunidade em prestar serviço de proteção aos defensores dos direitos
humanos aquém do patamar mínimo.
3.3 Separação de poderes. inexistência de violação. inafastabilidade da jurisdição
Pela presente demanda, não há violação do princípio da separação
funcional dos poderes. Por isto, não se justifica a tese de insindicabilidade dos atos
da Administração Pública por parte do Poder Judiciário no que tange à
implementação de políticas públicas, com fulcro no princípio da separação dos
poderes.
Com efeito, conforme dito, a moderna teoria dos direitos
fundamentais tem assegurado que não se insere no âmbito da discricionariedade
do administrador a decisão de adotar ou não determinadas políticas públicas
quando sua omissão implicar violação a direitos assegurados pela Constituição da
República. A discricionariedade do administrador lhe permite determinar como
serão executadas as políticas públicas exigidas pela Constituição, mas não para
determinar se elas serão prestadas ou, pior, para determinar que elas não serão
executas.
A Constituição da República é a norma jurídica central do sistema,
vinculando a todos dentro do Estado, sobretudo os Poderes Públicos. Assim, a
efetivação dos direitos e garantias nela assegurados não configuram juízo de
conveniência e oportunidade dos administradores públicos, senão dever jurídico-
constitucional que, caso violado, submete-se ao controle do Poder Judiciário, nos
termos do artigo 5º, inciso XXXV. A insubordinação ao controle judicial das
omissões na adoção de políticas públicas que visem a implementar direitos
fundamentais acaba por esvaziar o conteúdo normativo da garantia de acesso ao
Poder Judiciário, uma vez que presente lesão ou ameaça a direito.
Importa destacar, no ponto, precisa lição de Ana Paula de Barcellos:
Se a Constituição contém normas nas quais estabeleceu finspúblicos prioritários, e se tais disposições são normasjurídicas, dotadas de superioridade hierárquica e decentralidade no sistema, não haveria sentido em concluir quea atividade de definição de políticas públicas – que irá, ou não,realizar esses fins – deve estar totalmente infensa ao controle
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jurídico. Em suma: não se trata da absorção do político pelojurídico, mas apenas da limitação do primeiro pelo segundo.3
No mesmo sentido são os ensinamentos de Gilmar Ferreira Mendes:
Apesar de que, muitas vezes, é tarefa demasiado complicadaprecisar os limites que separam uma questão política de outrade natureza jurídica ou não política, tal fato não deve servir desubterfúgio para que o Poder Judiciário se abstenha documprimento de seu dever constitucional na defesa dosdireitos fundamentais. 4
No caso do serviço de proteção aos defensores de direitos humanos,
qualquer alegação apoiada sobre o argumento da discricionariedade
administrativa deve ser repelida com veemência ainda maior, pois se trata de
política pública de obrigação indiscutível, de observância obrigatória. Assim, já não
há mais qualquer espaço para a deliberação discricionária do administrador
público.
O Poder Judiciário pode e deve determinar ao Executivo a
implementação de prestações positivas se esse Poder agir de modo irrazoável ou
neutralizando a eficácia dos direitos fundamentais (como é o caso em apreço).
Pode-se dizer que esta atuação do Poder Judiciário está em consonância com o
sistema de freios e contrapesos, ínsito ao princípio da separação de poderes desde
sua formulação por Montesquieu.
Nesse sentido é o acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça
no REsp n.º 429.570-GO, relatora a Min. Eliana Calmon (DJ de 22.03.2004):
ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA –OBRAS DE RECUPERAÇÃO EM PROL DO MEIO AMBIENTE – ATOADMINISTRATIVO DISCRICIONÁRIO. 1. Na atualidade, aAdministração pública está submetida ao império da lei,inclusive quanto à conveniência e oportunidade do atoadministrativo. 2. Comprovado tecnicamente serimprescindível, para o meio ambiente, a realização de obrasde recuperação do solo, tem o Ministério Público legitimidadepara exigi-la. 3. O Poder Judiciário não mais se limita aexaminar os aspectos extrínsecos da administração, pois podeanalisar, ainda, as razões de conveniência e oportunidade,
3 In Direitos Fundamentais: Estudos em homenagem ao professor Ricardo Lobo Torres. Organizadores Daniel Sarmento e Flávio Galdino. Ed. Renovar, 2006. p. 43.
4 Curso de Direito Constitucional. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p.552.
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uma vez que essas razões devem observar critérios demoralidade e razoabilidade. 4. Outorga de tutela específicapara que a Administração destine do orçamento verba própriapara cumpri-la. 5. Recurso especial provido.
Destarte, o princípio da separação de poderes não confere imunidade
jurisdicional às escolhas feitas pelo Poder Executivo. Logo, a intervenção do
Judiciário no acatamento dos presentes pedidos não importa em violação à
separação funcional de poder.
3.4 Reserva do possível. Inaplicabilidade
Reiterado argumento das defesas de entes públicos é a teoria da
reserva do possível, segundo a qual, a efetivação destes direitos fundamentais se
encontra na dependência fática da efetiva disponibilidade de recursos por parte do
Estado, que, além disso, deve dispor da capacidade jurídica de dispor, ou seja,
existência de autorização orçamentária, portanto legislativa, para o Estado
despender os respectivos recursos.
Entretanto, não há, no presente caso, insuficiência orçamentária.
Desafia a proporcionalidade e a razoabilidade um Governo Federal
arcar com mais de R$8.300.000.000,00 (oito bilhões e trezentos milhões de reais)
em estádios de futebol, gastar mais de R$2.300.000.000,00 (dois bilhões e
trezentos milhões de reais) somente em propaganda, mais de R$213.000.000,00
(duzentos e treze milhões de reais) em festividades e solenidades, adiar o corte de
mais de 3.000 cargos comissionados (entre mais de 22.000 de livre nomeação), e
no âmbito do Governo Estadual, gastos de R$170.000.000,00 (cento e setenta
milhões) em viagens, notadamente internacionais, mais de R$110.000.000,00
(cento e dez milhões de reais) em propaganda, e ao mesmo tempo alegar falta de
dinheiro para assegurar o básico e necessário serviço de proteção aos defensores
dos direitos humanos ameaçados.
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Não se está criticando os gastos acima. Tratam-se de escolhas
políticas, cabendo ao povo (através do voto, de ações populares, etc), e não a
membros do Judiciário ou MP aprová-los ou não. O que se está demonstrando,
objetivamente, matematicamente, serenamente, sem paixões, é a
insustentabilidade do argumento de que não há dinheiro, de que não há verba
pública. Assim, a análise não é política – é matemática.
A omissão em tela não encontra justificativa razoável em suposta
ausência de recursos públicos ou prioridade na execução de outros serviços. A
discricionariedade do Administrador afigura-se limitada, notadamente em face dos
preceitos constitucionais.
Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal afasta a escusa da
escassez de recursos como óbice à concretização de direitos fundamentais,
interpretando a cláusula da reserva do possível em conformidade com a
Constituição:
É que a realização dos direitos econômicos, sociais e culturais– além de caracterizar-se pela gradualidade de seu processode concretização – depende, em grande medida, de uminescapável vínculo financeiro subordinado às possibilidadesorçamentárias do Estado, de tal modo que, comprovada,objetivamente, a incapacidade econômico-financeira dapessoa estatal, desta não se poderá razoavelmente exigir,considerada a limitação material referida, a imediataefetivação do comando fundado no texto da Carta Política.
Não se mostrará lícito, no entanto, ao poder Público, em talhipótese – mediante indevida manipulação de sua atividadefinanceira e/ou político administrativa – criar obstáculo artificialque revele o ilegítimo, arbitrário e censurável propósito defraudar, de frustrar e de inviabilizar o estabelecimento e apreservação, em favor da pessoa e dos cidadão, de condiçõesmateriais mínimas de existência.
Cumpre advertir, desse modo, que a cláusula da ‘reserva dopossível’ – ressalvada a ocorrência de justo motivoobjetivamente aferível – não pode ser invocada, pelo Estado,com a finalidade de exonerar-se do cumprimento de suasobrigações constitucionais, notadamente quando, dessaconduta governamental negativa, puder resultar nulificaçãoou, até mesmo, aniquilação de direitos constitucionaisimpregnados de um sentido de essencial fundamentalidade.
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(STF. ADPF 45 MC/DF – Informativo do STF nº 345) –destacamos.
3.5 O judiciário e os recursos públicos.
Em 09 de setembro de 2015, o Supremo Tribunal Federal, em sede de
Medida Cautelar na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 347,
determinou à União adequação orçamentária para o descontingenciamento das
verbas existentes no Fundo Penitenciário Nacional - FUNPEN, a fim de assegurar
recursos para construção/reformas nas penitenciárias, tendo por base “estado de
coisas inconstitucional” de violação de direitos fundamentais dos presos.
Segundo o Supremo, pelo voto condutor do Ministro EDSON FACHIN, a
omissão do Poder Executivo e do Poder Legislativo legitimam a atuação do Poder
Judiciário, que não estaria extrapolando suas atribuições, mas sim assegurando o
respeito a direitos fundamentais, por vezes contramajoritários. Assim, não se
trata de intervenção na política, mas sim de atuação natural, ínsita, jurídica do
Poder Judiciário.
Colaciona-se os seguintes excertos:
“A ADPF 347 trata dos direitos mais fundamentais da pessoahumana. Não me refiro apenas à dignidade da pessoahumana (art. 1,III, CRFB/88), mas ao direito fundamental àintegridade física e moral dos encarcerados (art. 5, XLIX,CRFB). É um direito fundamental expressamente previsto quecontem, assim, uma faceta objetiva (integra a base doordenamento jurídico e é um vetor de eficácia irradiante a serseguido pelo Poder Público e pelos particulares) e outrasubjetiva (correspondente à exigência de uma prestaçãopositiva ou negativa por parte do Estado ou dos particulares).
A guarda da Constituição pelo STF pode e deve ser provocadapor aqueles assim legitimados pela Constituição (art. 103,CRFB). A legitimação de partido político (art. 103, VIII) existepara possibilitar que os representantes do povo acessem eprovoquem o STF a exercer a guarda da Constituição.
Essa legitimação de partido político é importante porquepermite que tanto a representação majoritária (maiorias)quanto à representação minoritária (minorias) tenham acesso
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ao STF. Ou seja, possibilita que as maiorias provoquem o STF,mas também propicia que as minorias se façam presentes eaudíveis.
As questões atinentes ao sistema penitenciário nacional hámuito não encontram espaço fértil ou adequado detratamento pelos poderes Executivo e Legislativo. Os direitosdos encarcerados não encontram qualquer espaço na criação eimplementação de políticas públicas (Executivo) e tampoucoem qualquer atuação legislativa (Legislativo).
Nesses casos em que a política democrática majoritária nãorealiza por inteiro o seu papel de efetivação de direitos,sobretudo direito fundamentais, ainda que se reconheça sereste o espaço adequado para as conquistas dos direitosdeclarados no texto, não caberia justamente aosrepresentantes da minoria (partido político com baixarepresentatividade numérica, como o é o Partido Políticoautor) provocar a atuação do Poder Judiciário como últimatrincheira de guarda desses direitos mais básicos àsobrevivência digna? O que há na presente ADPF 347, emverdade, não trata de usar o Poder Judiciário e o STF comoespaço constituinte permanente, mas sim como um Poder queatua contramajoriatamente para a guarda da Constituição e aproteção de direitos fundamentais que vem sendosistematicamente violados pelos Poderes que lhes deveriamdar concretude.
Pondero que este caso demonstra justamente que aseparação entre os Poderes e a política democrática muitasvezes são invocados como escusas para impedir a atuação, emespecial diante da inércia intencional e sistemática dos demaisPoderes, de quem deve guardar a Constituição. Não creio quea ADPF 347 esteja sendo utilizada para fazer do STF umespaço de debate constituinte permanente ou para tencionarum uso indevido de sua competência. Ao contrário, quando osdireitos de minorias excluídas são sistematicamente violados, éo Poder Judiciário o último guardião desses direitos e oSupremo Tribunal Federal deve deles fazer a sua morada.
(…)
Já em relação ao pedido contido na alínea “h”, verifica-se queo Fundo Penitenciário Nacional- FUNPEN, criado pela LeiComplementar 79, de 07 de janeiro de 1994, regulamentadapelo Decreto 1.093, de 03 de março de 1994, tem porfinalidade proporcionar recursos e meios para financiar eapoiar as atividades e programas de modernização eaprimoramento do Sistema Penitenciário Brasileiro. Seusrecursos encontram-se previstos no disposto no art. 2º, da Lei
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Complementar 79, bem como art. 45, § 3º e art. 49, ambos doCódigo Penal, ao passo que a aplicação deve observar odisposto no art. 3º, da Lei Complementar 79, e art. 2º, doDecreto 1.093/94, mediante convênio, acordos ou ajustes, nostermos do disposto no art. 3º, § 1º, da Lei Complementar 79, eart. 6º, do Decreto 1.093. Observa-se uma tentativa deracionalizar o uso dos recursos em detrimento da efetivaçãodos direitos fundamentais.
(…)
“”Chama a atenção saber que boa parte do orçamento destefundo não é executada. Ante a atual situação de precariedadedo nosso sistema prisional, não há como se admitir que,havendo recursos disponíveis, não sejam utilizados, o que seconstata pelo frequente contingenciamento das dotaçõesorçamentárias do Funpen, que já vem de longa data[7].
Põe por terra eventuais argumentações pela aplicação dateoria da reserva do possível como justificativa para o nãoatendimento das necessidades do setor, não somente emrazão da evidente prioridade ante as situações de flagranteviolação do princípio da dignidade humana, como tambémpela impossibilidade de se alegar falta de recursos que estãocontemplados no orçamento público.”
A situação dos estabelecimentos prisionais não é outra senãoa bem descrita pela petição inicial. Em tudo a descrição secoaduna com a realidade. A conjuntura do sistema prisionalbrasileiro demonstra o descaso anos a fio com a efetividadedas normas alhures enumeradas que, se observadas, teriam ocondão de afastar o quadro caótico que assola os diversosestabelecimentos prisionais país afora. A questão, então, nãoé de eficácia normativa da legislação nacional, mas sim deefetividade. É imperativo que se reconheça a ineficiência doEstado em garantir a dignidade dos presos para queefetivamente se proteja a dignidade dos presos. Talineficiência legitima a concessão da cautelar.
O papel do Judiciário, ao concedê-la, presentes seus requisitos– fumus boni iuris e periculum in mora- nas hipóteses alhuresdiscorridas, possui antes de tudo um caráter simbólico,pedagógico e de reconhecimento da inadequada proteção dosdireitos fundamentais. Destarte, a decisão a ser tomada, nestemomento processual, deve reafirmar o compromisso do Brasilcom a tutela de tais direitos e servir como mote de ampliaçãodas medidas protetivas e de cessação da situação violadora.(…)
Diante do exposto, concedo, nos seguintes termos, a cautelarpara:
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(…)
3 – determinar o descontigenciamento das verbas existentesno FUNPEN, devendo a União providenciar a devidaadequação para o cumprimento desta decisão em até 60 dias,a contar da publicação do acórdão (alínea “h”)”.
Não é outra a situação vivida na presente ação, em que os defensores
dos direitos humanos são protegidos deficientemente, estando expostos a uma
situação de vulnerabilidade e, por isso, de risco de vida, diante da falta de
aplicação de recursos públicos.
É legítima a atuação do Judiciário, no presente caso, determinando a
aplicação de verbas públicas, como forma última de garantir a efetivação de
direitos humanos fundamentais. A ADPF nº 347, STF, corrobora este entendimento.
3.6 O bloqueio judicial/sequestro de verbas públicas
União e Estado não cumpriram espontaneamente seus deveres de
proteger condignamente defensores dos direitos humanos ameaçados.
Nesta ação, pede-se ao Judiciário que determine à União e Estado que
recursos emergenciais sejam disponibilizados, sob pena de multa.
Excelência, caso, mesmo a base de multa, União e Estado não
disponibilizem recursos, necessário se faz, como medida última, o bloqueio judicial
das verbas públicas.
O Superior Tribunal de Justiça, ressaltando o caráter excepcional da
medida, permite o bloqueis de verbas públicas:
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL.adoção de medida necessária à efetivação da tutela específicaou à obtenção do resultado prático equivalente. art. 461, § 5o.do cpc. bloqueio de verbas públicas. possibilidade conferida aojulgador, de ofício ou a requerimento da parte. recurso especialprovido. acórdão submetido ao rito do art. 543-c do cpc e daresolução 08/2008 do stj.
1. tratando-se de fornecimento de medicamentos, cabe aojuiz adotar medidas eficazes à efetivação de suas decisões,podendo, se necessário, determinar até mesmo, o sequestro
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de valores do devedor (bloqueio), segundo o seu prudentearbítrio, e sempre com adequada fundamentação.
2. recurso especial provido. acórdão submetido ao regime doart. 543-c do cpc e da resolução 08/2008 do stj (resprepetitivo nº 1.069.810-RS) – destacamos.
A decisão acima transcrita foi proferida sob a sistemática dos
recursos repetitivos, prevista no art. 543-C, do Código de Processo Civil,
pacificando assim a questão há anos divergente, mesmo no STJ.
Por registro histórico, antes mesmo desta decisão, pela possibilidade
de bloqueio de verbas públicas: STJ, 1ª Turma, REsp 828.202, Rel. Min. Francisco
Falcão, DJ de 29/05/06; STJ, 1ª Turma, REsp 811.552, Rel. Min. Luiz Fux, DJ de
29/05/06; STJ, 2ª Turma, REsp 857.502, Rel. Min. Humberto Martins, DJ de
30/10/06; STJ, 1ª Seção, AEREsp 796.509, Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 30/10/06; STJ, 2ª
Turma, AGA 747.806, Rel. Min. Herman Benjamin, DJ de 18/12/07.
Convém mencionar que o próprio ministro Teori Albino Zavacki
modificou seu anterior entendimento transcrito acima, como se extrai dos autos do
REsp nº 827.133, DJ de 29/05/06, no que foi acompanhado também por outros
ministros daquela Corte.
O Supremo Tribunal Federal também admite o bloqueio de verbas
públicas:
Fornecimento de medicamentos. possibilidade de bloqueio deverbas públicas para garantia. ratificação da jurisprudênciafirmada por esta suprema corte. existência de repercussãogeral. (stf. re 607.582. rel. min. ellen gracie. publicado no djde 26/08/2010). (…)
Ademais, verifico que a matéria já se encontra pacificado noâmbito desta corte, no sentido da possibilidade do bloqueio deverbas públicas para garantir o fornecimento demedicamentos. cito os seguintes julgados: ai 553.712-agr, rel.min. ricardo lewandowski, 1ª turma, dje 4.6.2009; ai 597.182-agr, rel. min. cezar peluso, 2ª turma, dj 6.11.2006; re580.167, rel. min. eros grau, dje 26.3.2008; ai 669.479, rel.min. dias toffoli, dje 17.12.2009; re 562.528, de minharelatoria, dj 6.10.2005; ai 640.652, rel. min. joaquim barbosa,dj 27.11.2007; e ai 724.824, rel. min. cármen lúcia, dje23.9.20008.
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Desse modo, entendo que, com o reconhecimento daexistência da repercussão geral e havendo entendimentoconsolidado da matéria, os tribunais de origem e as turmasrecursais podem, desde logo, com fundamento no § 3º docitado art. 543-b, aplicar a citada orientação anteriormentefirmada por este supremo tribunal federal” - destacamos.
Não procede o argumento de que não há base legal. O Código de
Processo Civil privilegia a tutela específica da obrigação, em detrimento de sua
conversão em indenização e autoriza o juiz a utilizar de meios coercitivos para
obrigar o devedor a cumprir in natura sua obrigação, vejamos:
Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento deobrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutelaespecífica da obrigação ou, se procedente o pedido,determinará providências que assegurem o resultado práticoequivalente ao do adimplemento.
(…)
§ 5o Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção doresultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou arequerimento, determinar as medidas necessárias, tais comoa imposição de multa por tempo de atraso, busca eapreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento deobras e impedimento de atividade nociva, se necessário comrequisição de força policial.
Note-se que o legislador estabeleceu uma cláusula aberta para os
meios coercitivos a disposição do juiz para efetivação da tutela específica, o que é
externado por meio da expressão “tais como”, indicativa de exemplo, ilustração,
de caráter não exauriente.
Deste modo, Excelência, caso União e Estado, mesmo sem se
estimularem com a fixação de multa, não efetivarem medidas de proteção aos
defensores de direitos humanos, em caráter emergencial, e não adotem ações
para assegurar que não haja futura descontinuidade das medidas de proteção,
necessário se fará, e como medida última e excepcional, o bloqueio/sequestro de
verbas públicas, a fim de garantir o respeito aos direitos de dignidade, vida e
segurança dessas pessoas.
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4 DANO MORAL COLETIVO
A indenização por danos morais está prevista no art. 5º, V da
Constituição da República. Não há restrição constitucional quanto à natureza
individual ou coletiva do dano para ser passível de indenização.
A Lei da Ação Civil Pública (lei nº 7.347/85) determina:
Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo daação popular, as ações de responsabilidade por danos morais epatrimoniais causados: (…)
IV - a qualquer outro interesse difuso ou coletivo. (…)
Art. 13. Havendo condenação em dinheiro, a indenização pelodano causado reverterá a um fundo gerido por um ConselhoFederal ou por Conselhos Estaduais de que participarãonecessariamente o Ministério Público e representantes dacomunidade, sendo seus recursos destinados à reconstituiçãodos bens lesados.
Para Carlos Alberto Bittar Filho (Do Dano Moral Coletivo no Atual
Contexto Jurídico Brasileiro. Revista de Direito do Consumidor n. 12. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1994, p. 55), dano moral coletivo é: “a injusta lesão da
esfera moral de uma dada comunidade, ou seja, é a violação antijurídica de um
determinado círculo de valores coletivos. Quando se fala em dano moral coletivo,
está-se fazendo menção ao fato de que o patrimônio valorativo de uma certa
comunidade (maior ou menor), idealmente considerado, foi agredido de maneira
absolutamente injustificável do ponto de vista jurídico; quer isso dizer, em última
instância, que se feriu a própria cultura, em seu aspecto imaterial”.
O Superior Tribunal de Justiça encampou o reconhecimento do dano
moral coletivo, como se ilustra com o voto da eminente Min. Nancy Andrighi (REsp
636.021/RJ):
A lesão a um bem difuso ou coletivo corresponde a um danonão-patrimonial e, por isso, deve encontrar umacompensação, permitindo-se que os difusamente lesadosgozem de um outro bem jurídico. (…). por tudo isso, deve-sereconhecer que nosso ordenamento jurídico não exclui apossibilidade de que um grupo de pessoas venha a ter uminteresse difuso ou coletivo de natureza não patrimoniallesado, nascendo aí a pretensão de ver tal dano reparado.
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nosso sistema jurídico admite, em poucas palavras, aexistência de danos extrapatrimoniais coletivos, ou, nadenominação mais corriqueira, de danos morais coletivos.
Ressalte-se que o dano moral coletivo deve ser percebido pelo seu
aspecto objetivo e não subjetivo. Em outras palavras: o dano moral coletivo não se
relaciona, necessariamente, com dor moral, sentimento, lesão psíquica, mas sim
com lesão à ordem jurídica, pela contrariedade da ação ou omissão do infrator aos
interesses coletivos da sociedade legalmente protegidos. É o caso típico, por
exemplo, do dano ambiental, no qual não há, necessariamente, dor, sentimento.
Ou seja, o dano moral deve ser interpretado e aplicado de acordo com as
peculiaridades dos bens jurídicos transindividuais. Nesse sentido, REsp
1.057.274/RS, Min. Eliana Calmon. Veja-se:
ADMINISTRATIVO - TRANSPORTE - PASSE LIVRE - IDOSOS –DANO MORAL COLETIVO - DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DA DOR E DE SOFRIMENTO - APLICAÇÃOEXCLUSIVA AO DANO MORAL INDIVIDUAL - CADASTRAMENTODE IDOSOS PARA USUFRUTO DE DIREITO - ILEGALIDADE DAEXIGÊNCIA PELA EMPRESA DE TRANSPORTE - ART. 39, § 1º DOESTATUTO DO IDOSO - LEI 10741/2003 VIAÇÃO NÃOPREQUESTIONADO.
1. O dano moral coletivo, assim entendido o que étransindividual e atinge uma classe específica ou não depessoas, é passível de comprovação pela presença de prejuízoà imagem e à moral coletiva dos indivíduos enquanto síntesedas individualidades percebidas como segmento, derivado deuma mesma relação jurídica-base.
2. O dano extrapatrimonial coletivo prescinde da comprovaçãode dor, de sofrimento e de abalo psicológico, suscetíveis deapreciação na esfera do indivíduo, mas inaplicável aosinteresses difusos e coletivos.
3. Na espécie, o dano coletivo apontado foi a submissão dosidosos a procedimento de cadastramento para o gozo dobenefício do passe livre, cujo deslocamento foi custeado pelosinteressados, quando o Estatuto do Idoso, art. 39, § 1º exigeapenas a apresentação de documento de identidade.
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4. Conduta da empresa de viação injurídica se considerado osistema normativo.
5. Afastada a sanção pecuniária pelo Tribunal que considerouas circunstancias fáticas e probatória e restando semprequestionamento o Estatuto do Idoso, mantém-se a decisão.
6. Recurso especial parcialmente provido”. (destacamos).
No mesmo sentido decisão de 22 de outubro de 2015, do STJ, o
relator, ministro Humberto Martins, que reiterou:
PROCESSO COLETIVO E CONSUMIDOR. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.JOGOS DE AZAR. BINGOS, CAÇA-NÍQUEIS E AFINS. SÚMULAVINCULANTE 2/STF. VEDAÇÃO PELA LEI 9.981/2000.INEXISTÊNCIA, POR ORA, DE LEGISLAÇÃO QUE AUTORIZE AATIVIDADE. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL COLETIVO.CABIMENTO.
1. Na origem, o Ministério Público Federal e a Uniãopromoveram ação civil pública contra casas de bingos, caça-níqueis e demais jogos de azar, pleiteando a condenação emobrigações de fazer e não fazer atinentes à interdição daatividade, além de indenização por dano moral coletivo a serrevertida para o Fundo de Defesa dos Direitos Difusos.
(…)
8. O dano moral coletivo prescinde da comprovação de dor, desofrimento e de abalo psicológico, pois tal comprovação,embora possível na esfera individual, torna-se inaplicávelquando se cuida de interesses difusos e coletivos.
Nesse sentido: REsp 1.410.698/MG, Rel. Ministro HUMBERTOMARTINS, SEGUNDA TURMA, DJe 30/06/2015; REsp1.057.274/RS, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDATURMA, DJe 26/02/2010.
Para Xisto Tiago de Medeiros Neto (Dano Moral Coletivo. 2004, p.
298), “o dano moral coletivo corresponde à ‘injusta lesão da esfera moral de uma
dada comunidade’, constituindo a ‘violação antijurídica de um determinado círculo
de valores coletivos’”. Os elementos necessários ao surgimento do dever de
reparar o dano moral coletivo não guardam diferenças de relevo em comparação
com o dano moral individual. Para este último autor citado (2004, p. 298), tais
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elementos são os seguintes: (a) a conduta antijurídica (ação ou omissão) do
agente, pessoa física ou jurídica; (b) a ofensa significativa e intolerável a interesses
extrapatrimoniais, identificados no caso concreto, reconhecidos e inequivocamente
compartilhados por uma determinada coletividade (comunidade, grupo, categoria
ou classe de pessoas titular de tais interesses protegidos pela ordem jurídica); (c)
a percepção do dano causado, correspondente aos efeitos que, ipso facto,
emergem coletivamente, traduzidos pela sensação de desvalor, de indignação, de
menosprezo, de repulsa, de inferioridade, de descrédito, de desesperança, de
aflição, de humilhação, de angústia ou respeitante a qualquer outra consequência
de apreciável conteúdo negativo; (d) o nexo causal observado entre a conduta
ofensiva e a lesão socialmente apreendida e repudiada (In: Apontamentos Sobre
Dano Moral Coletivo. Fausto Kozo Kosaka. Cadernos de Direito, Piracicaba, v. 9(16-
17): 75-91, jan.-dez. 2009).
No presente caso, resta patente a omissão e ação deficiente da União
e d o Estado do Pará na prestação do serviço público de proteção aos defensores
de direitos humanos ameaçad o s, gerando vulnerabilidade , condições indignas e,
sobretudo, risco de v i da, causando, indubitavelmente, dano moral coletivo.
Há responsabilidade objetiva da administração pública, como regra. E
mesmo que não houvesse, no presente caso há omissão a ensejar
responsabilidade subjetiva por parte do Estado. Ocorre a culpa do serviço (faute
du service) quando este não funciona ou, devendo funcionar, funciona mal ou
funciona atrasado.
Em se tratando de violação de interesses coletivos, a condenação por
dano moral se justifica tão somente pela sua violação, ou seja, decorre da própria
situação de fato criada pela conduta do agente – danos in re ipsa –, o que torna
desnecessária a prova do efetivo prejuízo, na medida em que se presume em face
da própria lesão aos direitos extrapatrimoniais da coletividade.
Por fim, necessário se faz que os recursos provenientes da
indenização por danos morais coletivos sejam revertidos em favor da sociedade,
através da aplicação do valor da condenação em favor do Programa de Proteção aos
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Defensores de Direitos Humanos, sem que esse valor substitua a aplicação
orçamentária ordinária.
De forma subsidiária, caso não seja este o entendimento de Vossa
Excelência, requer-se seja recolhido sob o código de Guia de Recolhimento da
União (GRU) nº 13920-3, com o título “MPF – Recuperação de Recursos – Combate
à Corrupção e Proteção de Outros Direitos Difusos”.
Diante de todo o exposto, ponderando (a) as diversas ilegalidades e
irregularidades acima relatadas, de repetição desnecessária; (b) o caráter
generalizado das irregularidades, não sendo pontuais, a evidenciar a gravíssima
omissão e ação deficiente dos réus; (c) a reiteração prolongada das condutas
ilegais, eis que severos problemas na proteção aos defensores de direitos
humanos ocorre repetidamente há anos; (d) a lesão à dignidade humana, a
gravidade das violações de direitos humanos; (e) a necessidade de adequação,
razoabilidade e proporcionalidade da indenização; (f) a necessidade de não se
causar enriquecimento sem causa aos beneficiados, e nem de outra banda, a ruína
dos condenados; (g) o caráter punitivo-pedagógico da indenização; (h) o caráter
preventivo da indenização, com o fito de inibir os réus a reiterarem futuramente as
condutas ilegais; (i) o caráter compensatório da indenização, de modo a
proporcionar benefícios ao Programa de Proteção aos Defensores dos Direitos
Humanos que no passado foi preterido em seus direitos; requer-se a condenação
dos réus, de forma solidária (art. 942, in fine, do Código Civil), ao pagamento de
indenização por danos morais coletivos no importe mínimo de R$3.000.000,00 (três
milhões de reais).
5 ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA
A fundamentação acima indica para a necessidade de invocação dos
artigos 273, I, c/c art. 461 do Código de Processo Civil, de modo a requerer a Vossa
Excelência a antecipação dos efeitos da tutela com o fim de (I) determinar o
cumprimento, por parte da União e Estado do Pará a efetivar medidas de proteção
aos defensores de direitos humanos, em caráter emergencial, imediato, e
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solidário; e (II) implementar prioridade e agilidade no trâmite para aprovação do
Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos no Pará.
Com efeito, a prova inequívoca da verossimilhança da alegação está
presente em razão da demonstração, pelos documentos acostados, de que os
defensores dos direitos humanos estão submetidos a vulnerabilidade, e assim a
risco de vida, em decorrência do serviço público que vem sendo prestado de modo
severamente deficiente e ineficiente, caótico e improvisado.
No que concerne ao perigo de dano irreparável ou de difícil reparação,
este decorre da situação crítica a que se submetem os defensores dos direitos
humanos, de repetição desnecessária, remetendo-se o leitor ao capítulo “2 - DOS
FATOS”, cujas irregularidades de natureza urgente, cujo caráter basilar e
fundamental não permite mais prorrogação, dilação temporal, merecendo reparo
imediato.
Por outro lado, não há que se falar em perigo de irreversibilidade do
pedido, pois o que se requer é nada mais do que a regularização de uma situação
ilegal. O que se demanda é condição material básica para proteção dos líderes
ameaçados, sendo qualquer argumento de irreversibilidade mero exercício de
retórica dilatória no processo para deixar de efetivar o que é de fundamentalidade
patente. Pelo contrário, há perigo de irreversibilidade inverso/reverso, eis que a
postergação no tempo do atendimento dos pedidos, ligados diretamente a bens
jurídicos como a vida e segurança, causarão a continuidade da lesão a esses
direitos. O tempo corre em favor d as previsíveis mortes e atentados, tragédias
anunciadas, contra os defensores dos direitos humanos . Ademais, a alegação de
falta de recurso pode ser sanada com as diretrizes que podem ser incluídas no
Plano Plurianual do Estado está com prazo fatal de votação de 30.11.2015
Posto isso, requer-se, a concessão de medida liminar, em sede de
antecipação da tutela, que determine à União e Estado do Pará:
a(1) efetivar medidas, em caráter emergencial, imediato, e solidário,
para a proteção dos defensores de direitos humanos no Pará, assegurando escolta e
rondas policiais no mínimo duas vezes por semana aos defensores de direitos
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humanos ameaçados, bem como atendimento à saúde, psicológico e jurídico, e
meios de comunicação eficaz; e
(2) implementar, com prioridade e agilidade, os convênios e/ou termos
de cooperação técnica necessários para a efetivação do Programa de Proteção dos
Defensores dos Direitos Humanos, sob pena de imposição de multa diária de
R$10.000,00 (dez mil reais) [art. 461, §4º do CPC], multa esta a ser revertida em
investimentos diretos no Programa de Proteção dos Defensores dos Direitos
Humanos, sem que esse valor substitua a aplicação orçamentária ordinária; e caso
assim não entenda Vossa Excelência, subsidiariamente, a ser recolhido sob o
código de Guia de Recolhimento da União (GRU) nº 13920-3, com o título “MPF –
Recuperação de Recursos – Combate à Corrupção e Proteção de Outros Direitos
Difusos”; e após ultrapassado tempo razoável, não tendo os réus cumprido a
determinação judicial, como medida última e excepcional, o bloqueio/sequestro de
verbas públicas.
E que determine ao ESTADO DO PARÁ: (1) conste na proposta das
diretrizes e metas do Plano Plurianual, destinação de recursos prioritários a
eficácia do Programa de Proteção dos Defensores dos Direitos Humanos, sob pena
de imposição de multa diária de R$10.000,00 (dez mil reais) [art. 461, §4º do
CPC], multa esta a ser revertida em investimentos diretos no Programa de
Proteção dos Defensores dos Direitos Humanos, sem que esse valor substitua a
aplicação orçamentária ordinária; e caso assim não entenda Vossa Excelência,
subsidiariamente, a ser recolhido sob o código de Guia de Recolhimento da União
(GRU) nº 13920-3, com o título “MPF – Recuperação de Recursos – Combate à
Corrupção e Proteção de Outros Direitos Difusos”; e após ultrapassado tempo
razoável, não tendo os réus cumprido a determinação judicial, como medida
última e excepcional, o bloqueio/sequestro de verbas públicas.
6 DOS PEDIDOS
Ao final, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL requer:
1. A concessão dos pedidos liminares;
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2. A citação dos Requeridos, na pessoa de seus
representantes legais, para, querendo, contestarem a presente ação no prazo
legal;
3. Em sede de cognição definitiva, a confirmação da liminar
deferida e o julgamento de procedência de todos os pedidos ordenando aos réus
que adotem as ações para efetivar o Programa da Proteção aos Defensores dos
Direitos Humanos;
4. Por fim, a dispensa do pagamento das custas,
emolumentos e outros encargos, em vista do disposto no artigo 18 da Lei nº
7.347/85.
Dá-se à causa, para efeitos legais, o valor de R$ 3.000.000,00 (três
milhões de reais).
Santarém/PA, 19 de novembro de 2015.
JANAINA ANDRADE DE SOUSAProcuradora da República
IONE MISSAE DA SILVA NAKAMURAPromotora de Justiça
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