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Faculdade Meridional IMED Escola de Saúde Curso de Psicologia Relatório de Pesquisa Trabalho de Conclusão de Curso Adoção tardia e suas implicações para a família adotante Driéli de Fátima Cavalheiro Grigolo Orientador: Tatiana Gassen Rodrigues Passo Fundo 2018

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Faculdade Meridional – IMED

Escola de Saúde

Curso de Psicologia

Relatório de Pesquisa

Trabalho de Conclusão de Curso

Adoção tardia e suas implicações para a família adotante

Driéli de Fátima Cavalheiro Grigolo

Orientador: Tatiana Gassen Rodrigues

Passo Fundo

2018

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Driéli de Fátima Cavalheiro Grigolo

Adoção tardia e suas implicações para a família adotante

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à

Escola de Psicologia, da Faculdade Meridional

- IMED, como requisito parcial para obtenção

do grau de Bacharel em Psicologia, sob a

orientação da professora Tatiana Gassen

Rodrigues.

Passo Fundo

2018

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Adoção tardia e suas implicações para a família adotante

Resumo e Palavras-chave

A adoção é um dos mecanismos mais eficazes para inserir crianças e

adolescentes no âmbito familiar, garantindo-lhes um desenvolvimento saudável e a

efetivação de todas as suas garantias. No que diz respeito a esse instituto, surge a

modalidade da adoção tardia como uma das suas formas, ainda não praticada

plenamente por causa de mitos e preconceitos. O presente estudo pretende analisar, por

meio de pesquisa bibliográfica, as principais características da adoção tardia,

averiguando acerca dos mitos, preconceitos e medos existentes em relação à mesma e

quais as implicações psicológicas existentes nos participantes do processo nos casos em

que a adoção se mostra exitosa e quando não funciona, através de uma revisão não

sistemática da literatura.

Palavras-chave: Adoção Tardia. Mitos. Preconceitos. Implicações Psicológicas.

Introdução

A adoção é um dos mecanismos mais eficientes para garantir às crianças e

adolescentes, que não possuem um responsável de origem que as assumam, um

convívio familiar saudável e feliz, auxiliando no seu desenvolvimento pessoal. Uma das

modalidades é a adoção tardia, onde crianças maiores de dois anos podem ser adotadas

(Camargo, 2005).

Para tornar-se pai e mãe, não é necessariamente preciso que seja do modo

biológico, nem que tenha a vontade emocional de gerar uma criança, para a adoção deve

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haver da parte dos adotantes um desejo de se ligar emocionalmente com outro ser que

represente a continuidade se suas histórias familiares (Riede & Sartori,2013).

A adoção tem como finalidade inserir a criança em uma nova família, após a

criança ser destituída por uma família sem recursos ou deixada em um abrigo. Para isso

acontecer, é preciso que seja um ambiente totalmente benéfico para a criança e para o

seu desenvolvimento saudável (Riede & Sartori, 2013).

Ainda segundo Riede & Sartori (2013), a adoção não deve ser compreendida

como uma lamentação por uma criança ter sido abandonada pelos pais biológicos, nem

ser apenas uma solução para problemas do casal como uma infertilidade, mas sim com o

propósito de oferecer à esta criança um lar saudável, aonde esta possa se sentir aceita e

amada, sabendo que ali estará segura. A adoção não é para atender as necessidades de

paternidade/maternidade, e sim para suprir as da criança.

Quem decide adotar terá de entender que por mais que o desejo venha deles de

ter um filho, vai ser a criança ou o adolescente adotado que será protegido, perante leis.

são eles que precisam ocupar um lugar nesta nova família, sendo que estes novos pais

devem compreender então, que estes não poderão ser usados como objetos para

solucionar suas frustrações por não serem pais de modo biológico (Riede & Sartori,

2013)

Contudo, esse modelo de adoção ainda é pouco praticado. Na sociedade

brasileira há muitos preconceitos e medos com relação a essa forma de adoção,

potencializados por diversos mitos que são espalhados e reforçam o imaginário das

pessoas. Trata-se, pois, de um problema cultural (Magalhães et al., 2017).

O presente estudo pretende analisar, por meio de pesquisa bibliográfica, as

principais características da adoção tardia, averiguando acerca dos mitos, preconceitos e

medos existentes em relação à mesma e quais as implicações psicológicas existentes nos

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participantes do processo nos casos em que a adoção se mostra exitosa e quando não

funciona. (Queiroz & Brito, 2013)

Neste trabalho, pretende-se analisar através de uma revisão não sistemática da

literatura, o porquê que na adoção tardia ocorrem determinados casos onde dá certo e há

outros casos onde criança é devolvida, assim vindo a causar implicações psicológicas

nelas e nos pais que estão adotando.

Discussão

Adoção Tardia

A adoção é o mecanismo legalmente habilitado que proporciona a uma criança

ou adolescente a inclusão em uma nova família, passando a ser considerado como filho,

irrevogavelmente. Trata-se da possibilidade de estender o convívio familiar a esses

menores, após terem sido esgotadas todas as possibilidades de permanência na família

de origem (Bicca & Grzybowski, 2014).

Adotar é o ato de inserção de uma família, de caráter definitivo e com toda a

vinculação própria da filiação, prevista em lei. A criança ou adolescente passa a ser

filho, sendo que a adoção é um ato realizado por meio da justiça, estabelecendo-se

relações iguais à da filiação biológica, dispondo-se de todos os direitos e deveres a ela

inerentes (Baumkarten, Busnello & Tatsch, 2013).

Em seus estudos, Ebrahim (2001), relata que algumas das principais

características dos pais que decidem pela adoção tardia são: o altruísmo, a maturidade e

a estabilidade emocional. Ainda segundo o autor, o altruísmo é uma característica que

se refere a disponibilidade de uma pessoas a priorizar as necessidades de outro,

colocando as necessidades deste que precisa à frente das suas. A estabilidade emocional

seria a capacidade de um individuo tem de enfrentar e resistir as suas frustrações, que é

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o que pode ocorrer numa adoção tardia, mas assim sendo enfrentada em prol da criança.

Quando o autor fala de maturidade, ele se refere à maturidade emocional. O individuo

que a possui terá maior facilidade de manter o equilíbrio ao passar por dificuldades sem

desistir do processo (Ebrahim, 2001).

Sob um aspecto emocional, a adoção é considerada como um ato de amor

incondicional, tendo em vista que a prática desse ato gera a superação de preconceitos

sociais e culturais, dando uma nova configuração pessoal ao adotante e ao adotado. A

adoção, nesse sentido, é uma oportunidade de reconstrução conjunta de vidas e histórias

(Barbosa, 2006).

É possível considerar tardia a adoção quando a criança a ser adotada tiver mais

de dois anos. Essas crianças foram abandonadas pelas mães, por motivos diversos

(pessoais ou socioeconômicos); ou mesmo foram retiradas do poder dos pais por parte

do Poder Judiciário, que os considerou incapazes de mantê-las sob seu pátrio poder

(Baumkarten, 2013). Utiliza-se também, como nomenclatura “adoção de crianças

maiores” para tentar ressaltar que não existe um tempo, uma idade certa para a adoção,

parecendo ser tarde demais para a criança (Bicca & Grzybowski, 2014).

Sobre a conceituação acerca da adoção tardia:

“Tardia” é um termo utilizado para designar a adoção de crianças que já

conseguem se perceber diferenciada do outro e do mundo, a criança que não é

mais bebê, que tem uma certa independência do adulto para satisfação de suas

necessidades básicas. Ou seja, anda, fala, não usa mais fralda, se alimenta

sozinha (Barbosa, 2006, p. 29).

No Brasil, a procura de crianças mais velhas para adoção é bem reduzida, sendo

que o número de pretendentes a adoção é de 44.718 cadastrados. Destes, 8.368 aceitam

crianças até 3 anos, e apenas 715 aceitam crianças a partir de 10 (CNJ, 2014). Ainda

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segundo esses dados retirados do Cadastro Nacional de Adoção, há 9.132 crianças á

espera de fazer parte de uma nova família, essas 4.964 crianças possuem idades entre 10

e 17 anos (CNJ, 2014).

A adoção no Brasil ainda está relacionada como uma solução para problemas de

infertilidade, sendo que por este motivo a maior procura é por crianças recém nascidas.

Crianças de até três anos são as que mais conseguem ser inseridas nas famílias

brasileiras, sendo que a adoção passa a ser mais difícil após essa idade (Ebraim, 2001).

Ainda segundo este autor, a adoção tardia torna-se difícil pelo receio dos pais de que a

criança mais velha não aceite as regras estabelecidas pelos novos pais, pois já teria

iniciado seu desenvolvimento social.

A legislação no Brasil, nos últimos tempos, expandiu a ideia da adoção,

concebendo-a como uma medida necessária à efetivação das garantias da criança e do

adolescente a uma convivência familiar e social. Todavia, é necessário que haja uma

materialização social desses direitos, já que entre a definição da lei e a forma como

todos os atores envolvidos no processo vão viver o mesmo, podem existir múltiplas

resistências, haja visto ser uma questão complexa (Queiroz & Brito, 2013).

Na atualidade, a adoção tem por objetivo a garantia de condições plenas para o

desenvolvimento saudável, em um círculo familiar onde se preze pelo amor e pelo

respeito, possibilitando que a criança tenha sua condição psicossocial garantida. Este

instituto visa, primordialmente, atender ao princípio da proteção integral (Arnold,

2011).

Segundo os artigos previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA),

podem adotar: pessoas maiores de 21 anos, sendo livre o estado civil. O adotante só

deve ter pelo menos 16 anos a mais que o adotado, mas que não seja parente ascendente

(avô ou avó) ou irmão, nestes casos é possível que haja a concessão da guarda. Se a

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adoção for conjunta, por um casal, é imprescindível que os adotantes sejam casados no

civil ou mantenham uma união estável, podendo confirmar a estabilidade familiar

(ECA, 2015).

As pessoas que optam pela adoção tardia, geralmente possuem um nível sócio

econômico mais baixo, pois estas não fazem tantas exigências nas adoções. As

exigências também não são feitas por adotantes que já possuem filhos e querem

aumentar a família, mas sem passar por uma nova gestação, e pessoas sozinhas, que não

dispõem de tanto tempo no seu dia a dia para cuidar das necessidades de um recém

nascido (Ebrahim, 2001).

Sob uma ótica psicológica, a fundamentação da adoção é encontrada no

pressuposto de que a integração a uma nova família proporciona uma reconstrução de

identidade à criança. Os pais adotantes têm nas mãos a possibilidade de garantir um

porto seguro para o desenvolvimento das potencialidades do adotado, possibilitando a

satisfação de suas necessidades emocionais e de constituição identidade psíquicas mais

primitivas (Silva, 2009).

A contribuição da psicologia para a adoção, é que como esta tem como objetivo

o estudo do comportamento humano, pode ajudar nos desenvolvimentos das relações

nesta nova família, nos vínculos a serem criados, e preparar os pais para a parentalidade

(Weber referido em Souza, 2012).

Entre o sonho e a realidade: mitos, medos e preconceitos sobre adoção

tardia.

Existe muito temor na adoção de uma criança com mais de dois anos de idade.

Isso se deve ao receio dos possíveis adotantes sobre o passado da criança, as condições

de sua antiga criação e as consequências do abandono sobre ela. Nesse sentido, pode-se

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citar um dos fatores, como o medo de que a criança possa ter mágoas e ressentimentos

(Arnold, 2011).

Isso tudo ocorre, pois há ainda muitos preconceitos sobre a adoção. São medos e

crenças que impossibilitam uma maior aproximação entre as partes envolvidas no

processo, fazendo com que os adotantes escolham crianças mais novas ou mesmo

recém-nascidas (Silva, 2009).

Nas palavras de Camargo (2005, p. 87):

Os mitos acerca da adoção (mito do laço de sangue, mito da revelação, mito da

paternidade e maternidade ideais, mito da mãe boa, etc.) são exemplos de uma

inconsciente tentativa de manutenção e reforço da atual cultura da adoção, que

envolve conceitos importantes como “maternidade”, “paternidade” e “filiação”.

Mas são também exemplos de uma forma de expressão do pensamento coletivo

que, embora carregados de sentido, porque exprimem e sintetizam experiências

verdadeiramente vivenciadas, representam paralelamente a imprecisão

interpretativa e racional daqueles que atuam em suas formulações.

A sociedade possui um mito muito arraigado de que a adoção é uma forma

diferenciada de filiação, excepcional, cuja ação deve ser estimulada ou evitada,

conforme o momento social. Isso tudo, pois a norma universal versa sobre a filiação

consanguínea, genética, sendo que a adoção representa um desvio da mesma (Barbosa,

2006).

A representação dada como ideal de maternidade e paternidade valoriza o

vínculo com o filho biológico. Dessa forma, os pais que pensam em adotar uma criança,

podem relutar na adoção de uma criança maior, por acreditarem que a mesma já tenha

um caráter formado, enquanto um bebê ou uma criança pequena apresenta a

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possibilidade de inserir a própria imagem de pai e mãe, ou seja, de nela incutir a própria

história (Dugnani, 2009).

Há ainda um preconceito muito forte na adoção de crianças maiores, como se

adotar apenas bebês fossem garantia de sucesso. Outros fatores que faz com que muitas

pessoas declinem da adoção desse tipo de criança é que estas carregam consigo um

passado e, consequentemente, algumas marcas que o tempo não apaga (Silva, 2009).

A cultura brasileira apresenta diversos impedimentos no que concerne à adoção

de crianças maiores, tendo em vista que reproduz idéias negativistas, sobretudo a idéia

da dificuldade de adaptação em uma nova família, ou mesmo a crença de que a criança

já teria personalidade formada. Ou seja, há uma distância entre o imaginado e o real,

gerando um choque aos possíveis adotantes, pois os mesmos desejam uma adoção que

seja absolutamente tranquila (Magalhães et al., 2017).

Ainda segundo os autores, outras dificuldades obstacularização a concretização

da adoção tardia:

“O medo de que a criança adotada, principalmente a de idade igual ou superior a

dois anos, por ter permanecido durante um demorado processo de adoção ou ter

transitado entre diferentes famílias traga consigo uma serie de “vícios”, como

“má educação”, “ falta de limites” e “ dificuldades de convivências”;

crenças na impossibilidade de criar um vínculo afetivo entre os adotantes e a

criança, tendo em vista que a criança saiba que não pertence à família biológica

e sim uma adotiva;

o mito de que a criança no futuro possa querer descobrir quem é sua família

biológica comprometendo sua relação com a família adotiva, gerando conflitos e

culminando em revolta e/ou fuga do filho adotivo;

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o tempo de espera nas filas de adoção podem ser longos e burocráticos e se

apresenta como um forte obstáculo difícil de ser superado tendo em vista as

exigências a serem cumpridas pelo bem-estar da criança (Magalhães et al., 2017,

p. 5).

Considerando que o filho desejado, por ser adotado, já não terá os laços de

sangue com a família, é comum pensar na adoção de crianças menores como uma forma

de facilitar o convívio entre adotantes e adotado. Há a crença de que esse tipo de criança

menor possibilitaria que houvesse mais chance de impressão de sua marca na criança,

seus sonhos e desejos, neutralizando as supostas influências trazidas da genética

(Barbosa, 2006).

Quando o desejo vem de aumentar a família, ou seja, os pais já possuem filhos

biológicos, geralmente haverá a preferência por crianças mais velhas, pois estes já terão

passado pelos primeiros momentos de vida de uma criança, já passaram pelo processo

de aprendizagem de serem pais. Tendo filhos, irá prepará-los para a chegada do novo

irmão, pois este novo membro da família, pode a vir a causar ciúmes nos irmãos, sendo

que pode ocorrer uma distinção e agressão a esse novo membro. (Souza, 2012).

A adoção tardia envolve um aspecto mais profundo do que a simples definição

acerca da idade que as crianças apresentam quando adotadas. Envolve, muitas vezes, o

abandono por parte de famílias cujas circunstâncias pessoais ou socioeconômicas eram

degradantes, demonstrando uma característica social e cultural que precisa ser superada

no Brasil (Camargo, 2005).

Quando a adoção não se efetiva

Ainda que já há algum tempo a mentalidade acerca da adoção venha se

transformando no Brasil, buscando atender às necessidades básicas de uma criança no

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que diz respeito à sua introdução em uma nova família, o drama vivenciado pela criança

se intensifica quando a mesma não corresponde aos requisitos requeridos pelos

adotantes (Dias et al., 2008).

Os adotantes precisam compreender que a partir da sentença que um juiz dá ao

conceder a adoção, as suas vidas, a da criança e de todos os envolvidos estaria apenas

começando, tendo em vista que a da criança também começou em seu nascimento e que

trará junto de si uma bagagem histórica. Sendo assim os pais podem ter criado algumas

expectativas desse novo filho, as quais ao não serem atendidas, pode torna-se um

descontentamento e levar a devolução desta criança para o sistema de adoção (Riede &

Sartori,2013).

Na adoção existe a interrupção e a devolução, sendo a interrupção da mesma o

ato em que adotantes, no meio do processo, antes de adoção em si ser atingida

legalmente eles desistem. Já a devolução é o mais grave, sendo que ocorre depois do

processo ser legalizado e a criança entregue aos pais, tendo um maior sofrimento para

todos, principalmente para o adotado (Weber referido em Souza, 2012). Sendo que

ainda de acordo com a autora quando há devolução de uma criança ao sistema, ela

perderá novamente a família, podendo perder as esperanças de ser adotada novamente,

além de que a devolução deverá ficar em seu histórico, sendo ela rotulada, podendo a

vir a afetar uma próxima adoção (Weber referido em Souza, 2012).

Quando acontece a devolução, fica a pergunta de como será o sofrimento desta

criança, e o que será feito para amenizar essa dor. Em casos como esse, caberá a um juiz

fazer algo, e geralmente é dada uma sentença de indenização (Souza, 2012). A autora

ainda se refere aos artigos do Código Civil 186 e 927, que falam que se dano for

causado a outro, tenha sido ele causado por negligência, imprudência ou omissão

voluntária, o que sofreu este dano tem que ser indenizado (Souza, 2012).

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Em seus estudos, Riede & Sartori (2013), relatam um caso em que o Juizado

teve de intervir e aplicar uma sentença de indenização após o pedido de devolução da

criança. O caso é de um menino que foi adotado na data de 09 de março de 1999 com 5

anos, e devolvido em 06 de julho de 2001 com 7 anos. Segundo os relatos que os

autores tiveram acesso, o menino era rejeitado e agredido pelos pais adotivos. A

sentença foi dada em 23 de abril de 2009, sendo que o juiz atribuiu aos pais o

pagamento de uma indenização por danos moral e material no valor de 15.000,00,

alegando negligência por parte dos pais adotivos, que feriram a criança

psicologicamente criando a expectativa de um lar que o aceitaria para o resto de sua

vida. Na sentença também foi fixado uma pensão alimentícia de 15% de salário mínimo

ate a criança atingir 24 anos de idade, ou ser adotada e ainda o adolescente ao completar

18 anos, se estiver estudando e fazendo um curso superior, não precisara sair do abrigo

e ainda deverá receber um auxilio financeiro dos pais adotivos.

O dano que a devolução teve para a criança foi de que este passou a apresentar

comportamento agressivo, desobediência constante e começou a passar por dificuldades

de aprendizagem, causando-lhe atraso no desenvolvimento escolar (Riede & Sartori,

2013)

Uma família quando decide adotar, estará assumindo um compromisso com esta

criança, sendo que ao optarem pela devolução, por qualquer motivo que seja, uma das

indenizações é que estes arquem com os custos de um tratamento psicológico. O ato de

desistir poderá causar mais uma ferida na criança, e já que intuito da adoção é sempre

priorizar o interesse da criança e não dos pais, esta terá de ser atendida levando em

conta que teve de passar por um novo abandono familiar (Souza, 2012).

Pessoas que optam pela adoção tardia e que o seu motivo pode a ser por pena da

criança abandonada, e sem ter alguma informação antecipada sobre esta, acabam as

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vezes decidindo pela devolução, alegando que esperavam que a criança em algum

momento viesse a se tornar grata a eles pela a oportunidade de ter uma nova família, e

pelo cuidado que tiveram com ela, mas que a criança não corresponde a entrega qual

fizeram a ela, dizendo que pode ser um comportamento herdado de seus pais biológicos

(Levy, Pinho & De Faria, 2009).

Segundo Riede & Sartori (2013), a criança quando devolvida volta a integrar o

sistema de adoção e tem de voltar ao abrigo em que residia antes. E uma vez ter passado

por esse novo abandono, já que o primeiro foi de sua família de origem, trará mais

implicações psicológicas que poderão ser de grande sofrimento que deixará marcas para

o resto de suas vidas, sem poder ter a reparação necessária.

Quando a adoção é concretizada

Quando a adoção tardia é concretizada, necessita-se um período de adaptação

para que mesma logre êxito. Quando os pretendentes a esse tipo de adoção assumem a

guarda, inicia-se o chamado estágio de convivência que dura até o instante da

homologação da sentença de adoção (Bicca & Grzybowski, 2014).

Tomando por base todos os aspectos a ela inerentes, é possível entender que a

adoção tardia é um processo delicado a todos os envolvidos, tendo em vista que

promove a reconstrução familiar por inteiro. Há uma transformação sensível dos

costumes, da conduta e da vida pessoal em geral, formando situações que exigem um

preparo psicológico muito forte e é por isso que esta modalidade de adoção ainda

caminha a passos vagarosos no Brasil (Ayala, 2014).

Para a adoção tardia, um dos principais fatores para ser concretizada é a

motivação, que neste caso é o uma vontade de exercer a maternidade e paternidade.

Sendo imprescindível à vontade e disponibilidade de aceitar uma criança mais velha,

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compreendendo e a aceitando como é. Esta motivação torna-se um aspecto para que a

adoção tardia tenha êxito, que ira gerar uma conquista de um desejo, de um sonho

(Souza, 2012).

Segundo pesquisas realizadas por Gondim et al (2008) os principais motivos

para uma adoção, considerando adoções de bebês até adoções tardias, são os seguintes:

formar uma família, vontade de ter um filho, ajudar uma criança e dificuldade para

engravidar. Os autores destacam que para a adoção tardia os fatores que mais aparecem

são: a morte de um filho, a vontade de ter filhos, mas já ter passado da idade em que

seria possível engravidar, ou até mesmo por não querer passar pelo processo de

gravidez. Ainda se aponta que o contato com outras crianças que desperte a vontade de

ser mãe e pai, etc. Essa pesquisa conclui que dentre todos os motivos apresentados a

maior motivação é a de não poder ter filhos biológicos.

Adaptação

As pesquisas de Costa & Rossetti-Ferreira (2007) relatam que o período de

adaptação pode se tornar frágil, pois é neste momento que os vínculos estarão sendo

construídos, a criança adotada já vem com uma postura mais intensa, podendo mexer

com dinâmica da família na qual esta sendo inserida. A criança já possui um jeito de

pensar e agir formado, então este estágio de adaptação pode ser marcado por

dificuldades, que podem levar à devolução, caso os pais não tiverem o devido apoio.

Consta no Estatuto da Criança e do Adolescente (Brasil, 1990), no artigo 197 - C

§1º:

É obrigatória a participação dos postulantes em programa oferecido pela Justiça

da Infância e da Juventude preferencialmente com apoio dos técnicos

responsáveis pela execução da política municipal de garantia do direito à

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convivência familiar, que inclua preparação psicológica, orientação e estímulo à

adoção inter-racial, de crianças maiores ou de adolescentes, com necessidades

específicas de saúde ou com deficiências e de grupos de irmãos.

Na adoção tardia, haverá da parte das crianças uma maior tentativa de confrontar

e avaliar os novos pais, sendo um modo de perceberem se serão aceitas. Na maioria das

vezes são crianças e adolescentes que não tiveram afeto e atenção de famílias anteriores

ou de suas famílias de origem. Estes confrontos e testes são atos inconscientes destas

crianças. (Souza, 2012).

Outros comportamentos que podem aparecer nas crianças, para testar e se

proteger de um possível novo abandono, são: o seu ritmo de desenvolvimento e sua

maturidade podem ser baixos, podem se recusar a aprender coisas novas, especialmente

na escola (Bicca & Grzybowski, 2014).

Para os pais adotantes, é necessário proporcionar uma adaptação com mais

tempo, tendo em vista que o ato de adotar os afeta, às vezes, muito mais que as próprias

crianças. Paciência e empenho são elementos fundamentais na construção dos vínculos

familiares entre adotantes e adotados. Os novos pais têm como missão mostrar e ensinar

novas formas de viver, criando uma vinculação, assim a criança passará a ter estes como

um novo modelo (Souza, 2012).

Neste caso, em que a adoção é de crianças mais velhas, não é necessário que

haja a revelação deste segredo, entretanto a criança poderá querer saber os motivos que

seus pais biológicos a abandonaram ou o motivo de ser retirada de sua família de

origem. Apesar de que algumas das famílias adotivas e todos os envolvidos neste

processo (avós, tios, primos, etc.), prefiram não comentar sobre o passado da criança,

pois algumas crianças podem ter sofrido com abandono e violências em suas antigas

casas ou abrigos nos quais residiam antes da adoção (Costa & Rossetti-Ferreira, 2007).

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Para ocorrer uma melhor adaptação, Costa & Rossetti-Ferreira (2007), dizem

que é importante conhecer o passado da criança, para que os pais possam ter

informações das rotinas antigas destas crianças. Assim podendo inseri-las numa nova

rotina familiar que esteja mais adaptada a criança. Ainda segundo os autores, os

adotantes podem facilitar conversas com as crianças sobre seu passado, de um modo

que não seja defensivo, incentivando a criança a construir suas próprias narrativas e não

se sentindo traindo os pais biológicos nem os pais adotantes. Nesses momentos de

conversas as crianças preenchem espaços que ficaram em suas memórias de sua própria

história, começar achar respostas para perguntas antes não respondidas, e agora com a

ajuda de seus novos pais, que são pessoas significativas e de quem tem o afeto e

preocupação com o seu bem estar (Costa & Rossetti-Ferreira, 2007)

Quando há uma adoção tardia e de irmãos, demanda que os pais adotivos tenham

um pouco mais de paciência, para poder atender de melhor forma as exigências de

crianças de diferentes idades. Os irmãos geralmente são muito unidos, sendo que os

mais velhos terão a tendência de assumirem o papel de pais, devido as suas histórias,

assim protegendo os irmãos mais novos (Costa & Rossetti-Ferreira, 2007).

Considerações Finais

Através desta pesquisa pode-se perceber que a busca de pais que optam assim

pela adoção tardia, ou seja, de crianças acima de dois anos e adolescentes, tendem a

priorizar aquela criança que de alguma forma carrega em si certa carga do que para elas

pode-se chamar até de “rejeição”. Mas rejeição do que? Do genitor que lhe abandonou

ainda no ventre de sua mãe biológica, e desta que por sua vez, como na maioria dos

casos lhe deixa no próprio hospital em que lhe deu a luz, ou até mesmo em um local frio

e escuro. Pais altruístas são assim, vão a busca de crianças que necessitam do seu alento,

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cuidados e afeto, priorizando as necessidades destas, também demonstram a maturidade

essencial para lidar com uma criança de personalidade formada ou em formação diante

de todas as dificuldades que já tenha passado até o momento do “novo” na inserção de

sua nova família.

É importante entender que a adoção é um ato de amor, e que a partir do

momento em que uma família ou apenas uma pessoa decide adotar uma

criança/adolescente, tem que ter a consciência das possíveis dificuldades que poderá

enfrentar, desde o preconceito de terceiros, até conflitos internos familiares. Estando

preparados para ouvir “mas ele/ela não tem o seu sangue”, “você tem certeza que quer

se incomodar com um filho que não é seu?”. Estando preparado para esses comentários

sarcásticos, o adotante só terá em mente que a criança/adolescente é sim seu filho, que é

como se estivesse no seu convívio à vida inteira, e que só poderá fazer o melhor de si

para uma interação parental entre as partes, ou seja, adotante e adotado, nada poderá

abalar esta relação.

O adotante deve compreender que a criança/adolescente, também possui seus

medos, pois esta passou um tempo esperando por sua família acolhedora e que durante

certo tempo passará pela sua cabeça os questionamentos de se esta agradando seus

novos pais se será tratada como os demais membros da família, igual aos irmãos quando

os tiver e sem duvidas a principal: “Será que posso ser devolvida?”. Daí que é

importante o trabalho em equipe, onde todos os envolvidos terão que trabalhar juntos,

construindo um ambiente de compreensão, disciplina e respeito. Ainda neste âmbito,

existirá a resistência da parte da criança adotada, onde ela irá criar situações de conflitos

para ter a certeza de que não será abandonada novamente.

É importante saber que em qualquer caso de adoção existe toda uma preparação,

onde os candidatos passam por um processo, inclusive psicológico, em que são

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avaliados, podendo estar aptos ou não a adotar. A família que estiver apta a efetivar a

adoção necessitará entender que se trata de um ato responsável e que se decidiram

receber o presente que é ter uma criança em sua vida, deverá zelar e cuidá-la, sempre

priorizando o seu bem estar. Caso os pais não se adaptarem a este novo membro da

família, deverão estar cientes que no caso de devolvê-la estará novamente ocasionando

uma perda imensurável, com um abalo emocional gigantesco, fazendo-a se sentir mais

uma vez abandonada, tendo também que arcar com todos os custos de tratamentos

psicológicos.

No caso da adoção tardia faz-se necessário um tempo de adaptação maior, tendo

em vista que às vezes as situações não são previsíveis, causando um impacto para todas

as partes envolvidas, devendo todos aprender a viver e conviver de uma forma baseada

no respeito, assim como uma interação do passado e futuro tanto dos adotantes quanto

do adotado, dessa forma saber falar de como era, do que foi e do que será a contar

daquele momento.

Em casos de adoção que dão certo porque as partes acabam por se entender e

apreenderem juntos todas as diversidades do amor, na dimensão tanto paternal quanto

fraternal, com paciência e determinação de saber o que se quer o que se espera e aonde

se pretende chegar. Já em outros casos em que isso não acontece e a adoção acaba por

não se efetivar, fazendo com que os pais desistam ainda durante o processo, talvez por

se deparar com um cenário de incertezas ocorrendo a interrupção ainda durante o

processo, sendo menos prejudicial à criança do que uma devolução após ser efetivada a

adoção, entretanto as duas formas de desistência de uma criança acabará acarretando

uma perda de esperança e criando uma afirmação de que ninguém a queira.

Qualquer ato de adoção tardia ou não, nada mais é que dar amor a alguém que

não nasceu de você, ensinar quem te ensina dia a dia, aceitar a si e ao próximo, é

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respeitar e ser respeitado, cuidar e ser cuidado, preparar e estar preparado, e

principalmente amar incondicionalmente alguém que a vida lhe apresentou para chamar

de filho.

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