FGV - Poder Judiciário e Gestão Eficiente

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  • Diretor ExecutivoDiretor Tcnico

    Diretor de ControleVice-Diretor de Projetos

    Vice-Diretor de Estratgia e Mercado

    Editor-ChefeCoordenador Editorial

    Coordenadora de ComunicaoDesigner Assistente

    Jornalista ResponsvelRevisoras Lingusticas

    TradutoraCopidesque

    Projeto Grfi co Impresso

    TiragemFotos

    Sede

    Primeiro Presidente Fundador

    Presidente

    Vice-Presidentes

    Carlos Ivan Simonsen Leal

    Sergio Franklin Quintella, Francisco Oswaldo Neves Dornelles e Marcos Cintra Cavalcante de Albuquerque

    Armando Klabin, Carlos Alberto Pires de Carvalho e Albuquerque, Ernane Galvas, Jos Luiz Miranda, Lindolpho de Carvalho Dias, Manoel Pio Correa Jnior, Marclio Marques Moreira e Roberto Paulo Cezar de Andrade

    Alfredo Amrico de Souza Rangel, Antonio Monteiro de Castro Filho, Cristiano Buarque Franco Neto, Eduardo Baptista Vianna, Jacob Palis Jnior, Jos Ermrio de Moraes Neto, Jos Julio de Almeida Senna, Marcelo Jos Baslio de Souza Marinho e Nestor Jost

    Presidente

    Vice-Presidentes

    Vogais

    Suplentes

    Carlos Alberto Lenz Csar Protsio

    Joo Alfredo Dias Lins (Klabin Irmos e Cia)

    Alexandre Koch Torres de Assis, Anglica Moreira da Silva (Federao Brasileira de Bancos), Carlos Moacyr Gomes de Almeida, Celso Batalha (Publicis Brasil Comunicao Ltda), Dante Letti (Souza Cruz S.A), Edmundo Penna Barbosa da Silva, Heitor Chagas de Oliveira, Hlio Ribeiro Duarte (HSBC Investment Bank Brasil S.A - Banco de Investimento), Jorge Gerdau Johannpeter (Gerdau S.A), Lzaro de Mello Brando (Banco Bradesco S.A), Luiz Chor (Chozil Engenharia Ltda), Marcelo Serfaty, Marcio Joo de Andrade Fortes, Mauro Srgio da Silva Cabral (IRB-Brasil Resseguros S.A), Raul Calfat (Votorantim Participaes S.A), Romeo de Figueiredo Temporal (Estado da Bahia), Ronaldo Mendona Vilela (Sindicato das Empresas de Seguros Privados, de Capitalizao e de Resseguros no Estado do Rio de Janeiro e do Esprito Santo) e Srgio Ribeiro da Costa Werlang Aldo Floris (Brascan Brasil Ltda), Gilberto Duarte Prado, Luiz Roberto Nascimento Silva, Ney Coe de Oliveira, Nilson Teixeira (Banco de Investimentos Crdit Suisse S.A), Olavo Monteiro de Carvalho (Monteiro Aranha Participaes S.A), Patrick de Larragoiti Lucas (Sul Amrica Companhia Nacional de Seguros), Pedro Aguiar de Freitas (Cia. Vale do Rio Doce), Pedro Henrique Mariani Bittencourt (Banco BBM S.A), Rui Barreto (Caf Solvel Braslia S.A) e Srgio Lins Andrade (Andrade Gutierrez S.A)

    Presidente

    Vice-Presidente

    Vogais

    Suplentes

    Publicao peridica da FGV Projetos. Os artigos so de responsabilidade dos autores e no refl etem, necessariamente, a opinio da FGV.

    Cesar Cunha CamposRicardo SimonsenAntnio Carlos Kfouri AidarFrancisco Eduardo Torres de SSidnei Gonzalez

    Sidnei GonzalezCarlos Augusto Costa Melina BandeiraMaria Joo Pessoa MacedoMariana MeirelesGabriela Costa e Petruska PerrutElitza BachvarovaGabriela Costa

    Dulado Design | www.dulado.com.brGrfi ca Nova Brasileira4.000 exemplareswww.shutterstock.com | Gil Ferreira | Nelson Jr

    Praia de Botafogo, 190, Rio de Janeiro RJ, CEP 22250-900 ou Caixa Postal 62.591CEP 22257-970, Tel (21) 3799-5498, www.fgv.br

    Luiz Simes Lopes

    Carlos Ivan Simonsen Leal

    Sergio Franklin Quintella, Francisco Oswaldo Neves Dornelles e Marcos Cintra Cavalcante de Albuquerque

    CONSELHO CURADOR

    CONSELHO DIRETOR

    FGV PROJETO

    S

    Esta edio est disponvel para download no site da FGV Projetos:www.fgv.br/fgvprojetos

    Instituio de carter tcnico-cientfi co, educativo e fi lantrpico, criada em 20 de dezembro de 1944 como pessoa jurdica de direito privado, tem por fi nalidade atuar, de forma ampla, em todas as matrias de carter cientfi co, com nfase no campo das cincias sociais: administrao, direito e economia, contribuindo para o desenvolvimento econmico-social do pas.

    EXPEDIENTE

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    Editorial

    Entrevista

    Cesar Cunha Campos06

    Ministro Gilmar Mendes08

    Indicadores de desempenho do Judicirio:

    como so produzidos e qual a sua fi nalidade

    Luciana Cunha41

    O Poder Judicirio e gesto efi ciente

    Jos Bento Amaral Jr.32

    A busca de maior vitalidade da gesto nas

    organizaes do Poder Judicirio

    Armando Cunha46

    Revendo estrategicamente as organizaes do

    Poder Judicirio: uma perspectiva gerencial

    Paulo Motta24

    Os resultados do projeto CNJ/FGV: aplicao do BSC no

    Judicirio brasileiro

    Pedro Paulo Gangemi e Janana Fernandes

    63

    A nova cultura por resultados no Poder Judicirio Nacional

    Emilia Zouain72

    O desdobramento da estratgia atravs do Balanced

    Scorecard: lies da experincia no Poder Judicirio Nacional

    Reinaldo Manzini

    53

    Artigos

    DepoimentoO juiz como gestor

    Desembargador Elton Leme20

  • EDITORIAL

    Cesar Cunha Campos

    Editorial

    [email protected]

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    urante muitos anos, o Poder Judicirio foi visto pela sociedade como sin-

    nimo de lentido e inoperncia. Esta realidade, no entanto, vem mudan-

    do muito rapidamente e de modo perceptvel.

    Diante da constatao da defi cincia do modelo institucional de administrao at

    ento adotado, no qual o juiz acumula a posio de julgador e de gestor, uma srie

    de iniciativas foram implementadas a fi m de suprir a carncia de capacitao e instru-

    mentalizao do magistrado e dos quadros tcnicos de pessoal dos tribunais brasileiros.

    Tais iniciativas traduzem a busca contnua por uma prestao jurisdicional mais clere

    e efi ciente.

    Com a promulgao da emenda 45 e a criao do Conselho Nacional de Justi-

    a, a gesto do Judicirio vem sendo profi ssionalizada e modernizada. Bons resultados

    vm sendo obtidos por meio de aes de planejamento estratgico, estabelecimento

    de metas, indicadores de desempenho e produo de estatsticas.

    Somam-se tambm a este quadro diversas iniciativas bem-sucedidas do Con-

    selho Nacional de Justia, entre as quais podemos destacar as metas plurianuais para

    serem cumpridas at 2014, que tm por objetivo reforar o compromisso do Poder

    Judicirio com a sociedade, tornando-o mais gil, transparente e integrado.

    Esta edio do Cadernos FGV Projetos traz uma entrevista indita com o Minis-

    tro Gilmar Mendes, que presidiu o Supremo Tribunal Federal e o Conselho Nacional de

    Justia nos ltimos dois anos, alm de artigos de professores e especialistas em gesto

    pblica. Os artigos abordam temas correlatos ao processo de transformao e mo-

    dernizao do Poder Judicirio, como a aplicao da metodologia do Balanced Score-

    card (BSC), que norteou o planejamento estratgico desenvolvido pelo CNJ e pela FGV

    Projetos; as aes que o Poder Judicirio Nacional vem realizando, com o intuito de

    melhorar a prestao dos servios sociedade; e os desafi os estratgicos e obstculos

    administrativos que afetam a gesto das organizaes do Poder Judicirio.

    Esperamos que esta publicao revele aos leitores o quanto o Poder Judicirio

    est de fato empenhado em mudar sua imagem com iniciativas capazes de reverter o

    antigo cenrio, ao oferecer sociedade brasileira uma melhor prestao jurisdicional

    e contribuir para o fortalecimento do Poder Judicirio Brasileiro.

    Boa leitura!

    D

  • Bachelors and Masters degrees in Law at the University of

    Brasilia; Masters degree and Doctorate from Westflische

    Wilhelms-Universitt Mnster, Germany. Prior to becoming

    the Presiding Chief Justice of the Supreme Court of Brazil

    and of the National Justice Council, he held the offi ce

    of Attorney General, was Legal Advisor to the General

    Secretariat of the Presidency of the Republic; Technical

    Advisor to the Special Rapporteur of the Chamber of

    Deputies Constitutional Review; Technical Advisor to the

    Ministry of Justice; Deputy Chief of Legal Affairs to the

    Chief of Staff Cabinet of the Brazilian Presidency; held the

    Offi ce of Solicitor General of Brazil; Justice of the Supreme

    Electoral Court and President of the Supreme Electoral

    Court. He is currently teaching Constitutional Law at the

    undergraduate and graduate levels at the University of

    Brasilia Law School, and at Instituto Brasiliense de Direito

    Pblico IDP (Brazilian Institute for Public Law). He is also

    member of editorial boards specialized in legal issues. For

    the past two years he presided over the Supreme Federal

    Court and the National Justice Council.

    Gilmar Mendes

    Graduado em Direito e mestre em Direito e Estado pela

    Universidade de Braslia, concluiu tambm mestrado e

    doutorado na Westflische Wilhelms-Universitt Mnster, na

    Alemanha. At chegar a Presidncia do Supremo Tribunal

    Federal e do Conselho Nacional de Justia, foi Procurador

    da Repblica, consultor jurdico da Secretaria Geral da

    Presidncia da Repblica, Assessor Tcnico na Relatoria da

    Reviso Constitucional na Cmara dos Deputados, Assessor

    Tcnico do Ministrio da Justia, Subchefe para Assuntos

    Jurdicos da Casa Civil, Advogado-Geral da Unio, Ministro do

    Tribunal Superior Eleitoral e Presidente do Tribunal Superior

    Eleitoral. professor de Direito Constitucional de graduao

    e ps-graduao da Faculdade de Direito da Universidade de

    Braslia e do Instituto Brasiliense de Direito Pblico (IDP).

    membro de conselhos editoriais especializados na rea do

    Direito. Nos ltimos dois anos presidiu o supremo Tribunal

    Federal e o Conselho Nacional de Justia.

    Entrevista com o Ministro Gilmar MendesFGV Projetos

    ENTREVISTA

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    RESUMO

    Como Presidente do Supremo Tribunal Fe-

    deral e do Conselho Nacional de Justia

    (CNJ), o Ministro Gilmar Mendes esteve

    est frente de todo o processo de re-

    estruturao e modernizao do Poder

    Judicirio. No comando do Conselho Na-

    cional de Justia, ele promoveu a criao

    de um sistema integrado de gesto dos

    tribunais. Esse sistema estabeleceu metas

    de nivelamento para que o Judicirio, um

    poder nacional, tenha a mesma qualidade

    de servios de prestao jurisdicional em

    todo o pas. Nesta entrevista, o Ministro

    avalia o projeto de planejamento estra-

    tgico coordenado pelo CNJ, fala sobre a

    importncia das bases estatsticas para a

    defi nio de estratgias e metas, explica

    os motivos da lentido da Justia e como

    mudar este quadro, cita quais so os de-

    safi os do Poder Judicirio para o cumpri-

    mento das metas estabelecidas at 2014,

    as aes tomadas para treinamento e ca-

    pacitao de servidores e, por fi m, a ava-

    liao das conquistas do Poder Judicirio

    nos ltimos dois anos.

    ABSTRACT

    As Chief Justice of the Supreme Federal

    Court of Brazil and the National Justice

    Council (CNJ), his Honor, Gilmar Mendes,

    had been at the forefront of the whole

    process of restructuring and modernizing

    the Brazilian Judiciary. President of the

    CNJ, he championed the creation of an

    integrated court management system.

    This system set up goals for the Judi-

    ciary, i.e., the third main branch of the

    national government, to ensure the same

    quality of legal services across the coun-

    try. In this interview, the Chief Justice

    makes an assessment of the strategic

    planning project coordinated by CNJ;

    discusses the importance of statistical

    data bases in determining strategies and

    objectives; explains the reasons for the

    slowness of the judicial process and how

    to change this picture; cites what are

    the challenges ahead for the Judiciary

    in order to meet its targets by 2014, the

    actions taken to train personnel and up-

    grade their professional qualifi cation;

    and, fi nally, offers an assessment of the

    achievements of the Judiciary for the

    past two years.

  • ENTREVISTA

    FGV PROJETOS - Como o senhor avalia os ltimos dois

    anos da poltica do Conselho Nacional de Justia na co-

    ordenao de aes positivas no mbito do Poder Ju-

    dicirio Brasileiro, buscando aproximar a sociedade do

    Poder Judicirio, e garantir assim uma prestao juris-

    dicional compatvel com as necessidades do cidado?

    Min. Gilmar Mendes - Estamos fazendo estudos e ba-

    lanos e, em geral, os resultados que apresentamos so

    altamente positivos. Creio que o Judicirio brasileiro

    passou por um signifi cativo choque de gesto, introdu-

    zimos ideias de um planejamento estratgico, de neces-

    sidade de uma administrao gerencial, de mudana do

    perfi l do juiz a fi m de que ele tambm tivesse noes de

    gesto, seja um juiz gestor de sua comarca, de sua vara.

    Acredito que isso tenha contribudo para as mudanas

    que a comunidade jurdica e a comunidade em geral j

    esto percebendo. Introduzimos a ideia de metas de ges-

    to e a necessidade de que essas metas sejam cumpridas

    e de que os resultados sejam apresentados e avaliados. A

    atuao do Judicirio fez sentir a necessidade de reviso

    de conduta de comportamento de outros setores, como,

    por exemplo, o Ministrio Pblico, que um protagonis-

    ta importante das cenas do Judicirio, e as defensorias

    pblicas. Eles sentiram a necessidade de reviso de seu

    prprio afazer e tambm esto trabalhando com a ideia

    de planejamento estratgico.

    FGV PROJETOS - Em sua gesto como Presidente do

    CNJ, o senhor promoveu a criao de um sistema inte-

    grado de gesto no Poder Judicirio Nacional. O que o

    motivou a propor este desafi o?

    Min. Gilmar Mendes - Primeiro, a percepo de que o

    Poder Judicirio um poder nacional. Isso decorre do

    prprio modelo constitucional, e embora a Constitui-

    o defi na ramos da Justia e tenha tambm defi nido

    como uma competncia mais ampla a Justia Estadual,

    ns temos pelo prprio modelo desenhado, pelo sistema

    de recurso, um poder Judicirio de abrangncia nacio-

    nal. Da a necessidade de que esse servio tenha uma

    qualidade bsica nacionalmente avaliada e avalivel. Por

    isso, ento, ns trabalhamos com as chamadas metas de

    nivelamento. preciso que esse Judicirio, que institu-

    cionalmente pensado como um poder nacional, na pr-

    tica tambm tenha a mesma qualidade do Oiapoque ao

    Chu, que algum bata s portas da Justia Federal, do

    Trabalho ou Estadual, e tenha o mesmo servio bsico de

    prestao jurisdicional. Foi esse o pensamento que nos

    levou a realizar, em agosto de 2008, em Braslia, o pri-

    meiro Encontro Nacional do Judicirio. At ento nunca

    havia tido uma reunio nacional dos presidentes. Reu-

    nimos 93 presidentes de Tribunais de Justia, Tribunais

    Regionais, de Unidades Judicirias do Brasil e fi xamos a

    ideia das metas, que nortearam o trabalho de 2009. Cla-

    ro que a criao do Conselho Nacional de Justia permitiu

    transformar essa viso institucional em realidade, porque

    o Conselho deu os instrumentos necessrios para uma

    poltica de planejamento nacional das atividades do Ju-

    dicirio. Foi exatamente esse quadro institucional, ago-

    ra baseado na Emenda Constitucional 45, de dezembro

    de 2004, que nos permitiu a consolidao do Conselho,

    que ensejou esse modelo de gesto muito mais integrado

    e pr-ativo.

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    FGV PROJETOS - E qual a sua avaliao dessa primeira

    fase do projeto de Planejamento Estratgico do Poder

    Judicirio Brasileiro, sob a coordenao do CNJ?

    Min. Gilmar Mendes - Acho que tem sido um aprendiza-

    do. Alguns tribunais j vinham fazendo um planejamento

    estratgico, mas eram iniciativas isoladas, embora dig-

    nas de elogios, eram atividades autnomas. Agora ns

    procuramos fazer um planejamento estratgico nacional

    partindo dos dados fornecidos pelos prprios tribunais.

    Temos hoje uma base estatstica nacional que est so-

    frendo a toda hora aperfeioamentos, correes, mas j

    h alguns anos estamos consolidando essa ideia da Jus-

    tia em nmeros, e isso nos permite tambm dialogar

    com os tribunais sobre os seus sucessos, seus defi cits,

    seus problemas. Por isso, ns conseguimos estabelecer

    esse planejamento estratgico e aquelas primeiras me-

    tas de nivelamento. Aprovamos uma resoluo de pla-

    nejamento estratgico no CNJ e orientamos os tribunais

    a fazerem o mesmo. Praticamente todos os tribunais

    cumpriram essa meta, analisaram o estgio em que se

    encontravam e estabeleceram um plano de gesto estra-

    tgica. Esta uma mudana de postura, porque supera

    o nosso modelo de descontinuidade bienal. Como temos

    a sucesso na direo dos tribunais a cada dois anos,

    muitas vezes as polticas administrativas desenvolvidas

    no tinham continuidade. Ento, desenvolvemos a ideia

    de continuidade administrativa e inserimos no apenas

    em um plano plurianual, mas em um plano nacional. O

    tribunal tem que prestar contas a sua comunidade, dizer

    o que est fazendo, mas tambm tem que revelar qual

    o resultado que ele est obtendo perante o CNJ. Ns

    temos esse duplo controle, o resultado bastante satis-

    fatrio, as metas em geral foram cumpridas em um alto

    ndice. A mdia nacional de cumprimento da Meta 011

    foi de 98,6%. Em relao Meta 022 ns tivemos resulta-

    dos auspiciosos, alguns menos satisfatrios, mas fi camos

    numa mdia acima de 60% de cumprimento. As metas

    permitiram tambm traar um diagnstico concreto da

    situao do Judicirio. Por exemplo, em relao Meta

    02 em muitos tribunais ns verifi camos que os proces-

    sos estavam parados por falta de percia. No tem pe-

    rcia porque em geral se tratam de partes pobres que

    dependem da assistncia do Estado e o Estado no tem

    condies, muitas vezes no tem dotao para pagar as

    percias requeridas. Estamos buscando novos meios para

    resolver essa questo.

    FGV PROJETOS - Por que houve nfase nessas duas Me-

    tas especfi cas?

    Min. Gilmar Mendes - Por razes bsicas. Primeiro, por-

    que precisvamos realmente ter um planejamento estra-

    tgico, tnhamos muitas aes importantes, iniciativas

    pioneiras em muitos estados que sequer eram conheci-

    das em outras unidades e que podiam ser descontinuadas

    na sucesso administrativa em exerccio. Era preciso de

    fato introduzir essa ideia de um planejamento estrat-

    gico, fi xar em que estgio estamos, que metas devemos

    atingir num dado prazo e quais so os meios adequados

    para atingir essas metas. Outro problema bsico o da

    morosidade, todos reclamam do Judicirio, muitos elo-

    giam porque temos um Judicirio independente e forte,

    1 A Meta 01 uma das 10 Metas Nacionais de Nivelamento para o Poder Judicirio

    em 2009 estabelecidas no Planejamento Estratgico defi nido pela FGV Projetos

    em parceria com o Conselho Nacional de Justia e tem por objetivo: Desenvol-

    ver e /ou alinhar planejamento estratgico plurianual aos objetivos estratgicos

    do Poder Judicirio, com aprovao no Tribunal Pleno ou rgo Especial.

    2 A Meta 02 tem por objetivo: Identifi car os processos judiciais mais antigos

    e adotar medidas concretas para o julgamento de todos os distribudos at

    31/12/2005 (em 1 , 2 grau ou tribunais superiores).

  • ENTREVISTA

    mas na experincia cotidiana as pessoas dizem no queira ir Justia, porque em

    geral entra-se num processo sem volta, nunca se tem a soluo para os seus casos, h

    uma percepo geral da sociedade de que a Justia demorada. A Justia lenta por-

    que ela muito demandada, temos um acmulo de processos e s vezes m alocao

    de recursos, tudo isso precisa ser visto. Estabelecemos a ideia ousada de tentar encer-

    rar os processos que entraram at uma determinada data, e descobrimos processos at

    do sculo anterior, mais do que isso, processos ainda do sculo XIX em tramitao, por-

    que os processos mais antigos iam sendo postergados e, s vezes, as respostas se davam

    em relao aos processos mais novos. Este fato levou os juzes a se preocuparem com

    essa prestao jurisdicional associada ao tempo, isto ocorreu em todas as comarcas,

    Daqui a pouco (...) teremos a tranquilidade de saber que a prestao jurisdicional est se fazendo dentro de um devido tempo e vamos at poder estimar quanto tempo dever durar um processo Ministro Gilmar Mendes

    inclusive nos nossos gabinetes. Ao invs de nos preocuparmos em dar resposta pronta

    para os processos que chegam, ns fomos vasculhar os armrios e gavetas, para ver os

    processos mais antigos. Isso foi uma resposta muito positiva e nos ajudou, inclusive, a

    projetar as novas metas que foram recentemente estabelecidas. Ento, as razes so

    simples: a necessidade de organizao e planejamento e de dar resposta a esse quadro

    de morosidade, e de preparar realmente o Judicirio para esses desafi os do sculo 21.

    Daqui a pouco certamente ns vamos dizer que j no temos mais processos de 2005,

    2006, os processos mais velhos na Justia brasileira so do ano de 2006, teremos a tran-

    quilidade de saber que a prestao jurisdicional est se fazendo dentro de um devido

    tempo e vamos at poder estimar quanto tempo dever durar um processo.

  • 12 | 13

    FGV PROJETOS - A Viso 2014 do Poder Judicirio Na-

    cional aponta para o reconhecimento do Poder Ju-

    dicirio pela sociedade como instrumento efetivo de

    Justia, Equidade e Paz Social. Em sua opinio, quais

    os desafi os do Poder Judicirio para o cumprimento da

    Viso 2014?

    Min. Gilmar Mendes - Temos muitos desafi os. Percebe-

    mos que a sociedade reconhece o valor e a independn-

    cia do Judicirio, tanto assim que por vrias razes ela

    recorre ao Judicirio. Temos muitos processos tramitan-

    do na Justia, um ndice bastante elevado se conside-

    rarmos os ndices mundiais de litigiosidade. Isto se deve

    tambm ao fato de o sistema ter credibilidade. Mas ns

    temos tambm uma sociedade muito desigual e a reali-

    zao de um modelo mnimo de justia social depende

    da interveno judicial. Vamos citar um pequeno exem-

    plo, os Juizados Especiais Federais, que atendem as pe-

    quenas demandas, o teto de 60 salrios mnimos contra

    a previdncia social, e tambm para aqueles pleitos liga-

    dos assistncia social, como pessoas idosas e defi cien-

    tes que carecem da assistncia social do Estado. Temos

    nos Juizados Especiais Federais algo em torno de dois

    milhes de processos, so pleitos em geral de pessoas

    pobres que pedem algum tipo de auxlio, ou a correo

    de uma penso, uma aposentadoria nesses valores bsi-

    cos. Isto signifi ca muito, signifi ca que os Juizados Espe-

    ciais Federais, criados em 2001 e 2002, j tm a metade

    dos processos da Justia Federal como um todo. Se ns

    considerarmos que at a criao dos Juizados Especiais

    tnhamos apenas 180 mil, 200 mil processos tramitando,

    a propsito desse assunto, ento, descobrimos que havia

    um tipo de demanda recnica, pessoas que no estavam

    protegidas pelo Sistema, que no vieram ao Judicirio

    e passaram a vir por conta do modelo mais facilitado,

    que dispensa advogado, muito menos formal. Isso re-

    vela tambm que temos uma demanda que ainda no

    descobrimos, pessoas que certamente tm pleitos para

    formular na Justia e por difi culdades do Sistema no

    conseguem formular. A entram todas as reclamaes

    sobre abuso de autoridade, as questes de assistncia

    social, entre outras. Temos o grande desafi o de tornar o

    Judicirio mais acessvel. Para isso, temos que melhorar

    o servio do Judicirio, o conhecimento quanto ao que

    o Judicirio pode fazer pelo cidado, melhorar os servi-

    os de assistncia ao Judicirio, envolvendo at mesmo

    a advocacia voluntria, os servios ligados ao Ministrio

    Pblico. Eu acredito que estamos cumprindo esse papel,

    mas precisamos nos estruturar mais, melhorar a forma de

    aplicao dos recursos. O uso de tecnologia precisa ser

    ampliado e estamos progredindo bastante, hoje j h um

    grande ndice de informatizao. Investimos fortemente

    no processo eletrnico, que de fato um instrumento de

    facilitao, ele acelera a dinmica processual, simplifi ca

    a tramitao do processo. Hoje j temos os chamados

    malotes eletrnicos, estamos dispensando o modelo an-

    tigo das cartas precatrias, extremamente formais. Tudo

    isso vai reduzir o tempo do processo e vai tornar muito

    mais presente o Judicirio na vida do cidado. E acre-

    dito que v mudar tambm essa cultura da litigiosidade

    com relao ao retardo na realizao dos direitos, como

    tambm a negativa de que se faz necessrio o reconhe-

    cimento do direito para que o sujeito v Justia, e se o

    direito vier a ser reconhecido ser depois de tantos anos.

    Vamos mudar essa cultura de litigiosidade manipulada. O

    devedor no paga e deixa que o dbito v para a Justia.

    Acredito que um Judicirio mais dinmico muda essas re-

    laes perversas que se estabeleceram na relao entre

    o cidado e o Estado e entre os cidados em geral. Outro

    efeito benfi co que imagino do Judicirio mais dinmico

    vai acontecer no mbito de uma cultura menos judicia-

    lista. Signifi ca dizer que, se percebemos que o Judicirio

    dinmico e vai reconhecer o direito com a brevidade

    devida, ento por que eu no reconheo desde logo o di-

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  • ENTREVISTA

    reito? Ento, possvel haver um quadro de acesso ao di-

    reito sem necessariamente ter ocorrido acesso Justia.

    Essa a viso que eu espero que ns possamos realmente

    consolidar em 2014.

    FGV PROJETOS - Ainda no processo de desdobramento

    da estratgia nacional, foi identifi cada a necessidade

    de desenvolvimento de competncias em servidores e

    magistrados? Poderia descrever as aes tomadas nes-

    te sentido?

    Min. Gilmar Mendes - Esse um dos notveis apren-

    dizados que tivemos. Detectamos inmeras falhas no

    processo de prestao jurisdicional e vimos que, muitas

    vezes, essas falhas decorriam de falta de aparelhamen-

    to tcnico por parte dos servidores do Judicirio. Muitas

    vezes, falta estrutura, temos alguns defi cits nessa rea,

    estamos buscando compensar, o Conselho tem distribu-

    do material de informtica, ajudando na informatizao

    dos tribunais. Uma das metas, inclusive, melhorar a

    comunicao entre o tribunal sede e as varas e as comar-

    cas e tambm entre os tribunais e o Conselho Nacional

    de Justia. Temos grandes problemas no que diz respeito

    a recursos humanos, defi cits de formao dos funcion-

    rios, s vezes falta funcionrios profi ssionais, no entanto

    h excesso de funcionrios terceirizados ou comissio-

    nados, e falta de servidores efetivos. Temos combatido

    isso, e temos sentido a necessidade de treinamento e

    de capacitao do pessoal do Judicirio. Estamos ten-

    tando estabelecer uma poltica de capacitao, no s

    dos servidores como tambm dos juzes, e agora mesmo,

    por exemplo, implementamos o Programa Integrar, que

    auxilia o Judicirio dos Estados a adotar boas prticas

    de gesto. Comeamos pelo Piau, levamos vrios juzes

    e servidores de vrios estados do Brasil para cooperar

    na melhoria da prestao dos servios jurisdicionais. Te-

    mos feito essa cooperao tcnica at no plano da ges-

    to administrativa. Em Alagoas, por exemplo, levamos

    pessoas para contriburem para uma melhor gesto dos

    recursos no mbito do tribunal. Acho fundamental que

    possamos dar continuidade a essa poltica e, por isso,

    estamos criando um centro de capacitao tcnica que

    permita multiplicar esses conhecimentos, padronizar

    determinadas prticas e contribuir continuadamente na

    melhoria dos recursos humanos disponveis no mbito dos

    diversos tribunais. claro que numa poltica de longo

    prazo precisamos ter uma profi ssionalizao completa

    desses quadros.

  • 14 | 15

    FGV PROJETOS - Como o senhor avalia o cumprimento nas Metas Nacionais de Nive-

    lamento de 2009?

    Min. Gilmar Mendes - Acredito que avanamos bem nas metas, os ndices so muito

    satisfatrios e tambm estamos aprendendo a analisar as eventuais respostas negati-

    vas. Se no conseguimos cumprir a meta 02 ou se um determinado Tribunal fi cou muito

    aqum da mdia no cumprimento da meta 02, qual a razo? O que precisamos fazer?

    Faltam juzes? Falta estrutura? Falta percia? fundamental que haja um referencial

    em relao a isto. Creio que o no cumprimento das metas, em alguns casos, tambm

    tenha esse efeito positivo, de permitir um diagnstico mais preciso sobre a situao,

    os problemas existentes em uma determinada unidade judicial. Mas eu acredito que as

    metas contriburam decisivamente para que em dois anos tivssemos um outro quadro

    no Judicirio Nacional e, sobretudo, ns temos medidores, critrios de aferio, sabe-

    mos em que estgio estamos. Por outro lado, com relao s metas tambm estamos

    prestando contas, declarando como os recursos da sociedade esto sendo investidos

    no mbito do Judicirio. Acredito que todos esses elementos propiciam uma anlise

    bastante positiva do cumprimento das metas nacionais de nivelamento de 2009 e j

    permitem que ns trabalhemos no cumprimento das metas de 2010, com a obrigao

    que fi cou estabelecida pelos prprios Tribunais de que as metas que no foram cumpri-

    das tero que ser cumpridas como metas adicionais.

    FGV PROJETOS - Ento esse seria o plano de ao para as metas no cumpridas?

    Min. Gilmar Mendes - Existe um plano de ao que foi aprovado solenemente no ter-

    ceiro Encontro Nacional do Judicirio, realizado em fevereiro deste ano, em So Paulo.

    A parte no cumprida das metas continua como meta em 2010, atuamos nesse sentido

    e muitos Tribunais esto fazendo um grande esforo. Claro que, em muitos casos, isso

    depende de auxlio externo, por exemplo, em questes de informatizao, s vezes,

    depende de recursos que sero providos pelos prprios poderes. A questo, por exem-

    plo, de modernizao do quadro de pessoal, profi ssionalizao do quadro, realizao

    de concursos, tudo isto precisa ser realmente estabelecido dentro dos padres que a

    prpria ordem constitucional exige.

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  • ENTREVISTA

    FGV PROJETOS - Aps o processo de desdobramento da

    Estratgia Nacional, como o senhor percebe a apro-

    ximao institucional entre os segmentos da Justia?

    Min. Gilmar Mendes - Eu tenho a impresso de que ga-

    nhamos muito em termos de unidade do Judicirio com

    essa ideia do planejamento estratgico nacional, a ideia

    de um Poder Judicirio de fato nacional, com metas de

    nivelamento para aproximao. No so poucos os ju-

    zes, especialmente os juzes da Justia Estadual, que

    agora dizem que j no se sentem discriminados, porque

    se olharmos o quadro geral, veremos que os investimen-

    tos e os gastos so maiores no mbito da Justia Federal

    e, s vezes, h um sentimento de abandono por parte

    de determinados Tribunais de Justia, especialmente de

    estados menos favorecidos. Eles percebem agora que h

    essa preocupao de unidade. Inclusive isso est propi-

    ciando modelos de maior integrao, de compartilha-

    mento de utilizao de estruturas no interior da Justia

    Estadual pela Justia Federal, pela Justia do Trabalho.

    Estamos at pensando em um fundo comum de moder-

    nizao para ajudar aquele elo mais fraco da corrente.

    Acho que ns temos ganhos signifi cativos em prol do Ju-

    dicirio e da prpria comunidade, que a destinatria

    dos servios.

    FGV PROJETOS - Em sua avaliao, quais as principais

    conquistas do Poder Judicirio, a partir do processo de

    planejamento estratgico liderado pelo CNJ?

    Min. Gilmar Mendes - A conquista de fato ter esse

    poder, que formalmente era um poder nacional, agora

    transformado em um servio pblico que h de ter uma

    mesma qualidade no plano nacional. Isso certamente re-

    verte para a populao, o indivduo saber que na me-

    dida do possvel a qualidade do servio judicial em So

    Paulo ser igual a que prestada em Roraima, o que se

    obtm na Justia do Trabalho tem a mesma qualidade do

    que se obtm na Justia Estadual do Rio ou do Piau. Esse

    o nosso objetivo. E havendo um Judicirio independen-

    te no plano nacional, o desrespeito a um eventual direito

    ser corrigido dentro de um prazo razovel. Parece que

    so conquistas que permitem que andemos no proces-

    so civilizatrio, que estabeleamos um outro patamar

    civilizatrio. As pessoas vo se sentir mais prximas de

    padres elevados de cidadania, essa uma conquista

    importante. Em relao ao cumprimento da meta 02,

    recebemos muitas manifestaes, como por exemplo de

    pessoas que diziam que acompanhavam um inventrio de

    uma tia h muitos anos e que queriam apenas cumprir o

    ltimo desejo dessa pessoa, que era destinar um aparta-

    mento para uma entidade de caridade, no entanto, no

    conseguiam concluir o inqurito, sentindo-se ento vin-

    culadas quela hipoteca moral. Uma juza nos escreveu

    dizendo: as minhas oraes de fi m de ano vo para as

    pessoas que inventaram a Meta 02. Quando vamos aos

    mutires de conciliao e vm pessoas com o ttulo da

    casa prpria dizendo que fi nalmente agora so donas,

    depois de 30 anos, constatamos que essas demandas so

    realmente transformadoras. A sociedade est perceben-

    do essas transformaes, at mesmo na rea penal, com

    o trabalho que estamos realizando nos mutires carcer-

    rios, no reconhecimento dos direitos dos presos. Estamos

    exigindo respeito a essas pessoas quando desativamos

    presdios e evitamos a superlotao, e estamos exigin-

    do o cumprimento dos prazos processuais para que as

    pessoas no fi quem presas alm do tempo. Ou quando

    estamos criando condies de informatizao das varas

    de execuo penal, tudo isso vem em prol da cidadania e

    est inserido nesse contexto de reforma.

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    FGV PROJETOS - O senhor incentivou e investiu no processo de consolidao das

    informaes e estatsticas do Judicirio brasileiro. Isto contribuiu para uma melhor

    viso sobre o Judicirio?

    Min. Gilmar Mendes - Hoje ns j temos dados mais slidos, embora ainda caream de

    aperfeioamento, verifi camos que h inconsistncias nos dados. Os prprios Tribunais

    inicialmente no tinham um bom servio de estatstica, o que prejudicava enormemen-

    te o seu planejamento e organizao. Hoje ns temos um quadro muito mais avanado.

    Se olharmos o Justia em Nmeros3, ser possvel termos uma viso de como o Judici-

    rio aplica os seus recursos numa dada unidade, quanto se investe em pessoal, quanto

    se gasta com informtica, qual a produtividade do juiz. Conseguimos, portanto, fazer

    uma avaliao razovel daquela unidade judiciria e fazer comparaes quanto ao

    aproveitamento dos recursos materiais e humanos envolvidos. Precisamos aprimorar a

    anlise desses dados. Hoje temos um departamento de pesquisa judiciria, uma estru-

    tura autnoma dentro do CNJ, que foi criado na lei que estruturou o CNJ e que vem

    se incumbindo muito bem da elaborao desses dados e da leitura, porque a tarefa de

    interpretao desses nmeros cada vez mais sofi sticada. Acho extremamente impor-

    tante que possamos dar continuidade a esse trabalho e aprimorar continuadamente

    esse servio, porque ele fundamental para o planejamento estratgico, para a fi xa-

    o de metas e tambm para a prestao de contas, para mostrar o que alcanamos e

    o que podemos melhorar.

    A conquista de fato ter esse poder, que formalmente era um poder nacional, agora transformado em um servio pblico que h de ter uma mesma qualidade no plano nacional. Isso certamente reverte para a populao (...)Ministro Gilmar Mendes

    3 O Justia em Nmeros um sistema que visa ampliao do processo de conhecimento do Poder Judicirio por meio da

    coleta e da sistematizao de dados.

  • ENTREVISTA

    FGV PROJETOS - O senhor deixou a presidncia do STF e do CNJ no ms de abril e

    notrio o avano obtido no posicionamento da instituio Poder Judicirio Brasilei-

    ro. Qual sua avaliao desses ltimos dois anos?

    Min. Gilmar Mendes - Eu fao uma avaliao bastante positiva do trabalho realizado,

    ns logramos um salto de qualidade em termos de gesto graas a esses novos instru-

    mentos e adeso que tivemos dos mais diversos setores do Judicirio e tambm ao

    apoio do Poder Executivo e do Poder Legislativo. Avanamos muito na modernizao

    das leis processuais, celebramos o chamado Pacto Republicano n 2, havia o n 1 ainda

    com o ministro Nelson Jobim. Aprovamos leis importantes de modernizao de aper-

    feioamento institucional, defensoria pblica, lei de mandado de segurana, a pr-

    pria lei que criou agora o departamento de monitoramento do sistema de fi scalizao

    do sistema prisional, que um departamento que j foi instalado e vai funcionar no

    prprio CNJ, para acompanhar todos os eventos do sistema prisional. Portanto, um

    instrumento de gesto e de direitos humanos tambm. Lanamos projetos importan-

    tes, como o de gesto estratgica, planejamento estratgico de modelo gerencial de

    gesto, mutires carcerrios, o projeto Comear de Novo, que prope a ressocializa-

    o dos presos. Este ano estamos enfatizando a necessidade de dar ateno Justia

    criminal, que envolve aspectos de direitos humanos e tambm de segurana pblica.

    Desenvolvemos esse projeto de assistncia tcnica, o projeto Integrar, cobramos for-

    temente a regularizao da situao dos cartrios no Brasil, que um tema muito

    sensvel, uma herana que vem da poca colonial e no se resolve bem a exigncia de

    que haja concursos regulares nos cartrios. Isso signifi ca tambm uma melhoria dos

    servios judiciais em sentido estrito, criamos fruns importantes para discutir questes

    bsicas do Judicirio como a fundiria. Todos esses problemas dos confl itos agrrios,

    dos confl itos fundirios urbanos esto sendo discutidos e se v busca de melhoria.

    Criamos o Frum de Sade, para discutir temas muito importantes ligados poltica

    judicial de sade, como as pessoas que no obtm tratamento digno no SUS e buscam

    medicamentos no Judicirio. Isto agora discutido em um ambiente geral, os juzes

    esto tendo essa participao. Procuramos melhorar toda a poltica de informatizao

    do Judicirio, criamos as Casas de Justia e Cidadania, que so instituies voltadas

    para aproximar a Justia do cidado, em geral elas esto situadas em locais acessveis

    nas grandes cidades, s vezes se integram nesses servios que o estado ou a muni-

    cipalidade coloca disposio do cidado, esses centros de prestao de servios.

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    No local, permanece um quiosque do Judicirio prestan-

    do informaes, orientando as pessoas sobre o que pre-

    cisam fazer quando querem ter um direito reconhecido.

    Iniciamos a ideia republicana de prestao de contas,

    com a criao de um sistema chamado CIAF JUD, inspira-

    do no CIAF federal4, para que todos os Tribunais se inte-

    grem neste modelo, e que contas dos Tribunais estejam

    na internet para que todos possam conhec-las e eventu-

    almente reclamar quanto aplicao dos recursos. Creio

    que fi zemos realmente um grande trabalho, tanto de es-

    truturao do Judicirio quanto de melhoria dos servios

    judiciais. Acredito tambm que a melhoria dos servios

    judiciais ou a reforma do Judicirio uma parte impor-

    tante da reforma do Estado brasileiro. Ao fazermos essa

    reforma mais profunda do Judicirio, estamos mudando

    realidades no elogiveis do Estado brasileiro, essa ideia

    do patrimonialismo. Quando adotamos um modelo mais

    transparente de gesto no Judicirio Estadual, isso h de

    produzir tambm efeitos no mbito de outros poderes.

    Por que a Assembleia Legislativa tambm no vai atu-

    ar assim? Por que o Tribunal de Contas Estadual no vai

    atuar assim? Eu brinco dizendo que a contaminao do

    bem. Essa a nossa contribuio. Quando somos mais c-

    leres na prestao jurisdicional, certamente quebramos

    o ndice de aproveitamento naquele estado retardatrio

    na prestao de servios, do estado caloteiro. Creio que

    aqui ns estamos realmente contribuindo para a reforma

    do Estado brasileiro. E de alguma forma haver uma mu-

    dana na prpria cultura desenvolvida pela sociedade, e

    essa aposta no retardo, a ideia de que os compromissos

    no precisam ser cumpridos ser colocada em xeque.

    Acredito que tudo isso efeito dessa reforma realizada.

    4 O Sistema Controle da Impresso e Autenticao de Documentos e Livros Fiscais (CIAF) foi implantado em 1 de agosto de 1994, pela Instruo Normativa n.

    165/94-GSF, com o objetivo de controlar, por meio de processamento eletrnico de dados, a confeco e a utilizao dos documentos e livros fi scais utilizados pelos

    contribuintes deste Estado.

  • DEPOIMENTOS

    RESUMO

    Em seu depoimento, o desembargador Elton Leme expli-

    ca porque foi necessrio o choque de gesto no Judicirio

    brasileiro, que conferiu ao juiz o papel de administrador.

    A burocracia interna dos tribunais, que por sua vez era

    mal administrada, impedia que os julgamentos aconte-

    cessem de forma clere e efi ciente. Alm da ampliao

    das funes do juiz, o Judicirio tomou outras medidas

    de gesto, como utilizao da informtica de forma mais

    efi ciente, investimentos na capacitao de funcionrios

    e a implantao do Justia em Nmeros, um sistema

    que visa ampliao do processo de conhecimento do

    Poder Judicirio por meio da coleta e da sistematizao

    de dados. A criao do Conselho Nacional de Justia

    citada pelo desembargador como medida fundamental

    para aumentar a responsabilidade do Judicirio perante

    a sociedade.

    ABSTRACT

    In his statement, Judge Elton Leme explains that the

    Brazilian Judiciary has been in dire need of drastic

    administrative reforms that end up conferring on the

    judge the role of a manager. Mismanaged, the inter-

    nal bureaucracy of the courts has been an obstacle to

    a speedy and effi cient execution of legal proceedings.

    In addition to expanding the scope of responsibilities of

    judges, the Judiciary has adopted other administrative

    measures, such as the more effi cient use of informa-

    tion technology; staff training and upgrading; and the

    creation of Justice in Numbers, a system aimed to

    promote the public awareness of the Judiciary through

    data collection and systematization. The creation of the

    National Justice Council is cited by the judge as key to

    improving the Judiciarys social accountability.

    Holds a Law Degree from the University of the State of Rio

    de Janeiro and a graduate degree in Environmental Law

    from the Catholic University at Louvain, Belgium. Member

    of the Judiciary since 1992, currently holds the position

    of Justice of the Court of the State of Rio de Janeiro.

    In Braslia, served as Cabinet member of the Federal

    Supreme Courts Extraordinary Institutional Affairs Offi ce

    and as Auxiliary Justice to the Presidency of the National

    Justice Council. He is currently a professor at EBAPE

    (Brazilian School for Public and Business Administration of

    Fundao Getulio Vargas).

    Desembargador Elton Leme

    Graduado em Direito pela Universidade do Estado do Rio

    de Janeiro e ps-graduado em Direito Ambiental pela

    Faculdade Catlica de Direito da Universidade de Louvain,

    Blgica. Ingressou na Magistratura, em 1992, e atualmente

    ocupa o cargo de Desembargador do Tribunal de Justia do

    Estado do Rio de Janeiro. Em Braslia, atuou como membro

    do Gabinete Extraordinrio de Assuntos Institucionais do

    Supremo Tribunal Federal e tambm como Juiz Auxiliar da

    Presidncia do Conselho Nacional de Justia. Atualmente,

    professor da Escola Brasileira de Administrao Pblica e

    de Empresas da Fundao Getulio Vargas (EBAPE).

    O juiz como gestorDesembargador Elton Leme

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    O conceito de gesto profi ssional no Poder Judicirio

    brasileiro muito recente. Nos anos 90, o Judicirio co-

    meou a perceber que no era mais possvel atender a

    demanda da sociedade com o modelo amadorstico de

    gesto que possua. No me refi ro, obviamente, tarefa

    de julgar em si, mas sim disfuno da burocracia nos

    trmites cartorrios, que deveriam ser viabilizadores da

    distribuio rpida e efi ciente de Justia, contudo ape-

    nas contribuam para o retardamento dos julgamentos.

    A funo precpua do Judicirio julgar, e isso, como se

    pode comprovar historicamente, sempre fez muito bem.

    No entanto, nos dias atuais, no basta ao Judicirio ape-

    nas julgar. preciso que o julgamento se faa de modo

    efi ciente, com resultados efetivos e em tempo social-

    mente justo.

    Verifi cou-se que o Judicirio precisava sair da

    clausura na qual ele mesmo havia se inserido, visto que

    o juiz somente se encarregava do ato de julgar, e de-

    legava a tarefa que considerava menos nobre, menos

    expressiva, para a burocracia interna do Tribunal. Essa

    burocracia interna era improvisada, no preparada para

    responder a contento as novas demandas impostas pela

    sociedade.

    O juiz, na sua posio pouco interativa de querer

    apenas se encarregar dos julgamentos, confi ava a tare-

    fa de gesto da mquina judiciria a administradores

    amadores, que geralmente eram funcionrios antigos,

    sem capacitao especfi ca ou mesmo comprometi-

    mento com a prpria funo do Judicirio, no sentido

    mais amplo. Esses funcionrios cumpriam aquela tare-

    fa burocrtica, oramentria, de gesto de pessoas, de

    material, com razovel discricionariedade, sem que os

    juzes, que representam a cpula do Judicirio, mani-

    festassem nimo para interferir nesse processo.

    Essa modalidade de gesto se renovava man-

    dato a mandato. Os funcionrios antigos dominavam

    o conhecimento dessa burocracia interna e, assim, se

    perpetuavam, eram, portanto, imprescindveis, num

    sistema fechado. A burocracia atendia prpria buro-

    cracia, deixando de cumprir, como atividade-meio, a

    fi nalidade de viabilizar a atividade-fi m.

    Com a introduo da informtica, comeou-se

    a buscar instrumentos e mtodos mais geis de traba-

    lho, pois essa burocracia arcaica j havia se tornado

    incompatvel com a evoluo institucional do Poder Ju-

    dicirio. Os juzes comearam a perceber que sua fun-

    o no mais poderia se restringir ao ato de julgar, mas

    deveriam tambm assumir a tarefa de bem adminis-

    trar. Se o Poder Judicirio uma instituio do Estado,

    os juzes, que representam a cpula dessa instituio,

    precisavam escolher os melhores caminhos da gesto.

    Neste momento, compreendeu-se que a gesto

    precisava ser profi ssionalizada. No s os funcionrios

    do Judicirio precisavam ser capacitados profi ssio-

  • DEPOIMENTOS

    nalmente na rea de gesto, mas tambm os prprios

    magistrados, que conduzem os destinos superiores da

    instituio, deveriam estar mais bem preparados para o

    exerccio de suas funes administrativas, para expres-

    sar, sem redundncia, os comandos de gesto. Os juzes,

    por exemplo, revelavam apatia na elaborao oramen-

    tria do Tribunal, o que contribua para que uma parcela

    signifi cativa de receitas fosse consumida pela burocracia

    interna, em desprestgio da atividade-fi m.

    Diante de novos paradigmas administrativos e

    valendo-se de indicadores de gesto, novas tecnologias

    e mtodos gerenciais, alm de muita inovao, os juzes

    passaram a promover uma verdadeira reforma silen-

    ciosa da Justia. A partir deste ponto, foi fortalecida

    a opo poltica brasileira de no contratar um gestor

    externo, terceirizado, alheio aos quadros do Judicirio,

    para administrar a Justia do pas, devendo o juiz ser o

    gestor de sua prpria instituio. E a partir da, come-

    ou-se a valorizar e profi ssionalizar a gesto, que passou

    a dirigir seu foco atividade-fi m, fornecendo os meios

    pelos quais possvel servir efi cientemente jurisdio.

    No fi nal dos anos 90, este cenrio alcanou um

    patamar universalizado. Alguns tribunais logo percebe-

    ram os novos rumos do Judicirio e se anteciparam. O

    Tribunal de Justia do Rio de Janeiro, por exemplo, em-

    preendeu um grande projeto, em parceria com a Fun-

    dao Getulio Vargas, para a racionalizao de funes

    e do quadro de pessoal, extinguindo os Tribunais de Al-

    ada, eliminando caminhos burocrticos, que, ao longo

    dos anos, perderam a razo de existir, promovendo com

    isso uma completa reestruturao administrativa. Tudo

    isso s foi possvel mediante a adoo de um conceito

    moderno de gesto.

    Por meio dessa reestruturao, houve uma nova pers-

    pectiva na utilizao da informtica que, com todo o seu

    potencial tecnolgico e de funcionalidades, pde garan-

    tir o acesso imediato informao, conferindo maior

    transparncia e democratizando o acesso aos dados acu-

    mulados. Assim, a tarefa de fi scalizar a prpria atividade

    tornou-se muito mais fcil, alm de possibilitar a tomada

    consciente de deciso para suprir carncias presentes e

    futuras com base em pesquisas, ndices estatsticos de

    produtividade e indicadores gerenciais de tendncias.

    A gesto passou a ser algo primordial para que o

    juiz pudesse continuar a julgar bem, com rapidez e efi -

    cincia diante da imensa demanda que se apresentava.

    Nesse universo de acontecimentos, h vezes em que o

    prprio sucesso da iniciativa judiciria constitui, mais

    frente, a causa dos novos problemas que se apresentam.

    Um exemplo disto foi a criao dos Juizados Especiais,

    que facilitaram o acesso Justia de uma imensa gama

    de pessoas que no tinha a quem recorrer para solucio-

    nar questes do cotidiano. O sucesso trouxe aos Tribunais

    uma multido vida por cidadania e justia, muito alm

    da capacidade prevista para atender a demanda, acarre-

    tando um novo colapso que agora tentamos solucionar.

    Esses so, portanto, em linhas gerais, os desa-

    fi os da gesto profi ssional nos Tribunais, que obrigam o

    incessante pensar sobre as solues, para responder aos

    desafi os impostos por uma sociedade dinmica e a cada

    dia mais exigente. No podemos enfrentar o agigantado

    universo atual de demandas e de confl itos com uma pro-

    porcional hipertrofi a da estrutura judiciria.

    Por meio da gesto efi ciente, deve-se buscar

    mecanismos que atendam com a devida efetividade as

    pessoas que procuram o Judicirio e que, de outro lado,

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    tambm concorram para solucionar na origem a razo de existir do prprio confl ito.

    Nessa linha de viso, o Judicirio deve atuar somente naqueles casos em que a socie-

    dade no conseguiu neutralizar as suas pendncias. Para isso, precisa estar inserido em

    um campo mais amplo de atuao, administrando a prpria conciliao e os meios de

    mediao de confl itos. Todas essas aes esto relacionadas gesto, necessidade

    de compreender o processo que est acontecendo e busca por mecanismos gerenciais

    que atendam a essas necessidades, que so muito dinmicas.

    A criao do Conselho Nacional de Justia, com a Emenda Constitucional 45,

    que trouxe uma srie de outras responsabilidades, colocou o Judicirio num novo pata-

    mar, no que diz respeito s suas responsabilidades perante a sociedade. O CNJ, como

    rgo defi nidor de polticas gerais de gesto e de controle, tem desempenhado um

    papel relevante para uniformizar a atuao gerencial dos Tribunais do Pas, que sempre

    foi muito desigual.

    Para desempenhar essa tarefa, foi preciso conhecer com profundidade toda a

    realidade do Judicirio no Pas. Como atividade inicial, temos em curso um grande pro-

    jeto, intitulado Justia em Nmeros, que tem por objetivo reunir numa nica base

    de dados informaes estatsticas de toda a Justia brasileira. Para administrar bem,

    preciso conhecer bem.

    No se pode negar que o juiz exerce uma atividade hbrida: precisa gerenciar

    bem seu meio de trabalho para que possa cumprir sua misso fi nal de distribuir a justi-

    a, o que exige uma vocao profi ssional mais ampla. Esse o novo paradigma do Poder

    Judicirio, a grande mudana que hoje testemunhamos ativamente.

  • Revendo estrategicamente as organizaes do Poder Judicirio: uma perspectiva gerencial

    Paulo Motta

    Doctorate and Masters degrees in Administration from

    the University of North Carolina - USA. Tenured Professor

    at EBAPE (Brazilian School for Public and Business

    Administration of Fundao Getulio Vargas), Visiting

    Professor at The National Institute of Administration

    (Portugal) and at the Otto-von-Guericke-University

    Magdeburg (Germany); and Project Coordinator at

    FGV Projetos.

    Paulo Roberto Motta

    Doutor e Mestre em Administrao pela Universidade

    de Carolina do Norte EUA. Professor Titular da Escola

    Brasileira de Administrao Pblica e de Empresas da

    Fundao Getlio Vargas (EBAPE); Professor Visitante

    do Instituto Nacional de Administrao (Portugal) e da

    Otto-von-Guericke-Universidade Magdeburg (Alemanha); e

    Coordenador de Projetos da FGV Projetos.

    RESUMO

    Por caractersticas singulares que afetam toda a sua

    gesto, mais do que outras organizaes, as do Poder

    Judicirio precisam de uma viso mais integrada na re-

    construo dos seus processos de trabalho e no seu de-

    senvolvimento gerencial. Para tanto, necessitam vencer

    obstculos administrativos tradicionais, sobretudo os de-

    correntes da separao excessiva entre o que se compre-

    ende por rea tcnica e rea administrativa. A sustenta-

    bilidade da efi cincia e efi ccia organizacionais depende

    da capacidade de moldar o futuro em funo dos novos

    conhecimentos, tecnologias e alteraes sociais.Torna-se

    necessria uma nova prtica contraditria com um coti-

    diano administrativo mais voltado para o presente. Assim,

    pretende-se a insero de uma perspectiva estratgica

    centrada em menos ferramentas administrativas e mais

    no desenvolvimento de novas formas de pensar e agir.

    ABSTRACT

    Due to the uniqueness of its characteristics that bear on

    all management aspects, the Judiciary, more than other

    organization, requires a more integrated approach to

    reformulating its work processes and managerial devel-

    opment. Thus, it is necessary to overcome long-standing

    administrative obstacles, especially those arising from

    the much too great separation between the technical

    and the administrative areas. Sustainable organization-

    al effi ciency and effectiveness depend on the capacity

    to shape the future in light of new knowledge, technolo-

    gies and social change. New practices are needed which

    may run counter to extant administrative routines,

    poorly suited to a future-oriented outlook. Thus, the

    intention is to introduce a strategic perspective focused

    less on administrative tools and more on developing new

    ways of thinking and acting.

    ARTIGO

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    INTRODUO

    A relevncia social do Poder Judicirio normalmente reconhecida mais pelo seu es-

    toque de recursos morais e de saberes jurdicos do que pela sua capacidade de res-

    posta clere s demandas externas, apesar dos esforos. Altamente fundamentadas na

    competncia e no conhecimento de seu corpo tcnico-profi ssional, as organizaes do

    Poder Judicirio possuem caractersticas singulares, que afetam toda a sua gesto. No

    entanto, como todas as organizaes contemporneas, as judicirias enfrentam igual-

    mente presses de mudanas.

    Anuncia-se o reforo sustentabilidade, qualidade e celeridade dos sis-

    temas de atendimento, alm de garantia de maior incluso social pelo acesso aos

    servios. Para tanto, pretende-se ampliar a capacidade das instituies do setor, pela

    introduo de novas conquistas e inovaes administrativas.

    O processo de inovar complexo, pois, alm de anlises e escolhas entre op-

    es valiosas, envolve modifi car prticas administrativas associadas a um passado de

    imagens institucionais relevantes. Signifi ca, em parte, desistir de algumas crenas e

    prticas tradicionais.

    Pela amplitude do conhecimento e de presses para inovar, o mundo contempo-

    rneo oferece solues novas e variadas, tornando as escolhas mais difceis, mas, por

    outro lado, mais atraentes.

    Com o aumento das demandas sobre o Poder Judicirio, foi-se acentuando a

    carga de trabalho dos magistrados e dos funcionrios administrativos, com pouca revi-

    so das formas tradicionais de gesto. Aos poucos surgiram presses internas e externas

    para uma nova concepo de gesto.

  • ARTIGO

    DESAFIOS ESTRATGICOS E OBSTCULOS ADMINISTRATIVOS

    H vrios desafi os: desde os estratgicos, como as novas formas de insero das orga-

    nizaes judicirias na sociedade, at o desenho de novos processos de trabalho, com

    dimenses mais integradoras das diversas atividades.

    Por processos de trabalho diferentes e decises independentes, profi ssionais da

    magistratura e funcionrios administrativos exercem suas funes com alto grau de au-

    tonomia. Cria-se uma separao excessiva entre o que se compreende por rea tcnica

    e rea administrativa, desenvolvendo-se confl itos latentes entre as reas e impedindo

    a prtica de formas mais participativas e efi cazes de gesto.

    Magistrados respondem s demandas da sociedade por meio de anlises indivi-

    duais, gerando a tendncia ao trabalho isolado e autnomo, o que aumenta a distncia

    entre pares e fortalece a crena na independncia de suas tarefas. No cotidiano admi-

    nistrativo, tendem a ver tanto seus superiores quanto seus subordinados como pessoas

    encarregadas de simplesmente ajud-los no seu desempenho individual. Por vezes, ten-

    dem a ter pouca conscincia sobre o trabalho diretivo, pois percebem deles o dever de

    controlar seu prprio trabalho e de determinar a qualidade do servio a ser prestado.

    Por outro lado, a chamada rea administrativa maneja importantes recursos de po-

    der organizacional fi nanceiros, humanos, materiais e simblicos e acaba por cons-

    tituir-se em um grupo capaz de desenvolver uma autonomia prpria. Nesse sentido, as

    organizaes do Poder Judicirio possuem naturalmente laos frgeis de coordenao e

    controle, pois seus profi ssionais agem e progridem motivados menos por interesses co-

    muns e mais por interesses particulares de suas prprias tarefas. Essa separao exces-

    siva cria difi culdades imensas na remodelao administrativa, alm de gerar crenas

    falsas de que a mera introduo de novos instrumentos administrativos seria sufi ciente

    para modernizar a instituio.

  • 26 | 27C

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    Promover a remodelao isolada da rea administrativa pode resultar simplesmente

    em racionalizao do erro, ou seja, pode torn-lo mais efi ciente. Prticas estrutural-

    mente disfuncionais, quando inefi cientes, emperram menos exatamente por serem ine-

    fi cientes. Se tornadas mais efi cientes, sem alterao de suas fi nalidades, emperrariam

    muito mais. Alm disso, vale notar que, em um contexto de percepo global de inefi -

    cincia, unidades administrativas com imagem de efi cincia, mesmo que disfuncionais

    ao todo, adquirem defensores, e as resistncias para transform-las so mais intensas.

    A modernizao administrativa se constitui mais numa conquista gradual da

    instituio, pela introduo de novas formas de pensar e agir, e menos pela mera intro-

    duo de novas ferramentas administrativas.

    Por serem menos questionveis em sua relevncia, as prestaes de servios ju-

    risdicionais tendem a ser mais confl itantes quanto a mtodos de implementao admi-

    nistrativa, concorrendo para maior dissociao entre deciso e ao. A necessidade de

    garantir alguma consistncia leva aceitao de estruturas burocrticas mais estveis,

    complexas e menos adaptveis.

    Como as estruturas no so facilmente adaptveis, a maior parte das inovaes

    acaba por resultar no na introduo do inusitado, e sim numa simples variao do

    status quo administrativo. Muitas vezes, os recursos tendem a ser canalizados para a

    manuteno dos padres correntes, conservando problemas administrativos que difi cul-

    tam a introduo rpida de novidades. Difi culdades administrativas para a introduo de

    mudanas podem ser encontradas, por exemplo, dentre outros, nos seguintes fatores:

  • ARTIGO

    1) Obstculos administrativos constituem-se em preos no monetrios a se pagar

    pela difi culdade em atender demanda. Difi culdade de recursos normalmente gera

    aumento de entraves administrativos. Na prtica, quanto maior a escassez de recur-

    sos, maior a presso para disciplinar e racionalizar o acesso aos servios existentes

    tanto internos quanto externos. Se no h condio de atender demanda (externa

    ou entre as unidades internas), com rapidez e qualidade, e no se pode cobrar pelos

    servios, criam-se alguns obstculos administrativos que funcionam como preos no

    monetrios. Aumentando-se os entraves (preos no monetrios), reduz-se o acesso.

    Portanto, os entraves no so facilmente removveis por simples alterao das ferra-

    mentas administrativas.

    2) Constatao ou sentimento de impossibilidade geram justifi cativas para a acomo-

    dao e inrcia. Em meio enorme demanda, as presses para mudanas e a escassez

    de recursos, dirigentes e gestores se veem limitados ou quase impotentes perante um

    jogo poltico e administrativo cujos fatores mais crticos lhes escapam ao controle.

    Por se sentirem obstados em suas aes, por difi culdade de recursos e outros entraves

    burocrticos, muitos dirigentes anunciam a soluo de problemas como possveis so-

    mente em longo prazo e dependentes de fatores externos, fora do alcance imediato da

    direo. Reduzem-se, assim, as possibilidades de curto prazo, facilitando-se, portanto,

    as justifi cativas para a acomodao e a inrcia. Somente com o desenvolvimento de

    novas vises estratgicas sobre a instituio, de forma envolvente e participativa, e

    no por meio de imposies burocrticas, se torna possvel mobilizar as pessoas para

    novas conquistas de inovao organizacional.

    3) Acomodaes tradicionais contaminam o todo e levam gestores e funcionrios alta-

    mente competentes a aceitarem de si prprios comportamentos de inefi cincia, refor-

    ando o imobilismo institucional. As difi culdades, inclusive de recursos, para valorizar

    carreiras por competncias administrativas estratgicas, aliadas ao desempenho, fa-

    vorecem a criao de frustraes e de pessimismos individuais. pouco til alterar

    somente as dimenses humanas das carreiras, mesmo com o aumento de benefcios.

    Em contexto de pessimismo e de frustraes, os funcionrios tendem a ver qualquer

    benefcio como algo j devido, que afetar muito pouco ou quase nada o desempenho.

    As dimenses humanas devem ser pensadas e analisadas em conjunto e de forma inte-

    grada, desde os primeiros momentos do pensamento estratgico.

    Programar de forma contnua e sistemtica a prpria transformao no s torna-

    ria as organizaes judicirias mais efi cazes e sustentveis, como tambm evitaria o imo-

    bilismo interno, gerador da degradao das relaes entre as instituies e seu pblico.

  • 28 | 29

    Vale notar o esforo atual das organizaes judicirias em se preparar para enfren-

    tar novas demandas e a expanso dos servios jurisdicionais. Ao iniciarem uma nova

    prtica de gesto estratgica, comeam a conceder maior ateno s anlises sobre o

    futuro, aprimorando o controle sobre seus destinos. Como resultado, as decises sobre

    o futuro tendem menos a pequenas melhorias nas condies existentes e mais visua-

    lizao de alternativas de direcionamento estratgico.

    Se, de um lado, novas demandas tendem a ressaltar problemas administrativos,

    fazendo as unidades prestadoras de servios parecerem subdimensionadas e incapazes

    de atender sociedade, por outro, incitam os dirigentes a novas anlises e busca de

    alternativas estratgicas.

    Por se inserirem em um sistema social e econmico maior, as organizaes

    judicirias so tanto entidades autnomas e independentes quanto partes de redes

    complexas em constante alterao. Apesar de rupturas bruscas no ocorrerem com

    frequncia, h um processo cotidiano e incremental de mudanas afetando objetivos

    e metas j programados: aes e consensos so provisrios e sujeitos ao dinamismo

    organizacional.

    Por exemplo, novas demandas trazidas ao Poder Judicirio refl etem situaes

    problemticas variadas, experimentadas por uma diversidade de grupos populacionais.

    Mesmo problemas de grande visibilidade, e de soluo aparentemente fcil, so de

    implementao difcil, em razo de as diferenas sociais e as formas de agregao de

    interesses infl uenciarem as decises sobre distribuio de recursos. Ademais, a maior

    conscincia sobre os direitos de cidadania e de acesso leva no s ao crescimento da

    demanda como tambm maior expectativa sobre a qualidade dos servios.

    Sistemas criados para a proteo de saberes, pessoas, regras e padres tradicio-

    nais de conduta no so facilmente modifi cveis por conta de novos padres de unifor-

    midade administrativa. Conhecer situaes problemticas importante, mas preciso

    avaliar tambm a capacidade de resposta e at que ponto ela se encontra danifi cada

    por tradies e prticas locais arraigadas.

    H limites e desafi os para se atingir o melhor; nem tudo pode ser aprimorado

    rapidamente, tampouco os fatores cruciais que levam a grandes inovaes so total-

    mente controlveis ou infl uenciveis por decises internas de cada organizao do se-

    tor. Alm do mais, o ambiente de mudanas rpidas faz qualquer ideal de inovao se

    tornar altamente vulnervel a fatores totalmente incontrolveis pelos condutores do

    processo. Nesse contexto, todas as organizaes, inclusive as judicirias, se tornam

    vulnerveis a variaes signifi cativas de crescimento ou mesmo reduo das possibi-

    lidades de atendimento.

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    CONSIDERAES FINAIS: A RECONSTRUO

    ADMINISTRATIVA PELA PERSPECTIVA

    ESTRATGICA

    Se o retrato do mundo hoje o de transformaes rpi-

    das, o aviso que haja preparao para um ritual con-

    tnuo de mudanas. A sustentabilidade da efi cincia e

    efi ccia organizacionais depende da capacidade de mol-

    dar o futuro em funo dos novos conhecimentos, tecno-

    logias e alteraes sociais.

    No entanto, para a maioria dos dirigentes, gesto-

    res e funcionrios, o cotidiano administrativo tende a ser

    pouco voltado para o futuro e quase nada proativo: na

    prtica diria, as pessoas detectam problemas e reagem

    com base em referncias produzidas por suas concep-

    es e experincias.

    Percepes acentuadas sobre defi cincias ad-

    ministrativas fazem as pessoas tornarem-se crticas da

    realidade e frustrarem-se diante da impossibilidade das

    solues que julgam necessrias, mas tambm provocam

    nelas a busca de alternativas para o melhor desempenho

    de suas tarefas.

    As pessoas reconstroem continuamente sua viso

    de problemas e de solues medida que compreendem

    novas dimenses produzidas por novos dados. Nessas

    reaes individualizadas, surgem percepes contradi-

    trias sobre a soluo de problemas, nem sempre com

    tempo e espao para reconciliaes harmoniosas. Adiam-

    se consensos e a possibilidade de se aumentarem confl i-

    tos de natureza estratgica.

    As difi culdades de harmonizar vises estratgicas

    no cotidiano administrativo so imensas e, por vezes, in-

    superveis. Para se proteger de potenciais confl itos, a

    maioria dos gestores protege-se igualmente das possibili-

    dades de progresso organizacional, acentuando a prtica

    administrativa de comunicaes restritas e cautelosas.

    A discordncia e o dissenso, antes de serem ma-

    les a evitar, so momentos positivos de pensamento e

    interao construtiva. Na tentativa de harmonizao,

    provocam-se vises, alternativas e novos signifi cados

    para a organizao. Harmonizar diferenas de interpre-

    taes toma tempo: requer alguma ao planejada, em

    momento apropriado e especfi co, para reforar dilogos

    mais autnticos e desenvolver novas maneiras de pen-

    sar e agir administrativamente, por parte de magistrados

    e funcionrios.

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    Por isso, pensar estrategicamente um exerccio singu-

    lar de cada organizao, para melhor conhecer as de-

    mandas e as respectivas capacidades de resposta. Trata-

    se de um processo educacional coletivo, capaz de mudar

    o signifi cado de cada pessoa na sua prtica cotidiana.

    Novos signifi cados criam novas interdependncias e inte-

    raes e, assim, facilitam a introduo do inusitado nos

    processos de trabalho.

    Reativar o pensamento estratgico signifi ca de-

    senvolver nova compreenso sobre a forma de insero

    das organizaes do Poder Judicirio na sociedade: re-

    quer mudanas mais radicais na forma de pensar e agir

    administrativamente.

    A viso estratgica pode signifi car o incio de uma

    grande transformao administrativa: traz uma dimen-

    so de globalidade, integrao e ao direcionada para

    um longo prazo; requer novas habilidades de gesto, pois

    exige anlises e aes sobre fatores que, na sua quase

    totalidade, no esto sob o controle de uma nica unida-

    de administrativa.

    Problemas de intensidade de novas demandas ra-

    ramente podem ser resolvidos de forma independente:

    exigem perspectivas estratgicas e globalistas capazes

    de agregar maior apoio poltico e maior possibilidade de

    comprometimento de novos recursos.

    Alm disso, um sentido de direo claro e expec-

    tativas realistas despertam a criatividade de funcion-

    rios e usurios dos servios, no sentido de colaborarem

    com sua qualidade e efi ccia.

    Refl exo estratgica signifi ca a utilizao em

    menor escala de ferramentas e preenchimento de for-

    mulrios e exercitar mais o repensar coletivo sobre os

    objetivos institucionais e as formas de insero da orga-

    nizao na sociedade. Trata-se de um processo de libe-

    rar o potencial criativo e de concretizao existente nas

    pessoas. Valorizar essa capacidade humana de construir

    e reconstruir valorizar o processo de aperfeioar a ins-

    tituio judiciria, e no de domin-la em um esque-

    ma analtico restrito, apesar de sua aparente retido e

    sofi sticao. Investir algum tempo em conhecer melhor

    o caminho e o futuro torna o cotidiano mais efi ciente

    e esperanoso.

  • ARTIGO

    Degree in Civil Engineering at the So Jose dos Campos

    Engineering School, Masters of Science degree by the

    Institute of Aeronautical Technology; Ph.D. in Social

    Science from the Catholic University of So Paulo; a

    former executive of several companies (Danone, Suzano

    Papel e Celulose, Audits & Survey Latin America, BMC

    Bank). He is presently a Professor at the EAESP (So Paulo

    School of Business Administration of Fundao Getulio

    Vargas), and a Project Coordinator at FGV Projetos.

    Jos Bento Carlos Amaral Junior

    Engenheiro Civil pela Faculdade de Engenharia de So Jos

    dos Campos; Mestre em Cincias pelo Instituto Tecnolgico

    de Aeronutica; Doutor em Cincias Sociais pela Pontifcia

    Universidade Catlica de So Paulo; Ex-executivo de

    empresas (Danone, Cia. Suzano de Papel e Celulose,

    Audits & Survey Latin America, Banco BMC); atualmente

    Professor da Escola de Administrao de Empresas de So

    Paulo da Fundao Getulio Vargas (EAESP) e Coordenador

    de Projetos da FGV Projetos.

    O Poder Judicirio e gesto eficienteJos Bento Amaral Jr.

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    RESUMO

    O objetivo deste artigo apresentar al-

    gumas das aes que o Poder Judicirio

    vem realizando, sobretudo acerca de seu

    Planejamento Estratgico, com o intuito

    de melhorar a prestao jurisdicional.

    Para tanto, so apresentados o contexto

    e os desafi os que envolvem essas aes;

    o projeto realizado pelo CNJ em parce-

    ria com a FGV Projetos para construo e

    anlise de cenrios prospectivos; e a im-

    plementao do planejamento estratgi-

    co nos tribunais. Os principais resultados

    revelam que as aes do Poder Judicirio

    so convergentes com produtos dos cen-

    rios prospectivos e que as correes mais

    expressivas que esse Poder deve realizar,

    na fi gura do CNJ, recaem sobre aspectos

    operacionais e administrativos.

    INTRODUO

    Esse artigo tem por objetivo apresentar o contexto e os desafi os que o Poder Judicirio

    tem enfrentado nos ltimos anos, destacando a execuo do projeto do CNJ realizado

    junto com a FGV Projetos, especialmente, a construo e anlise de cenrios pros-

    pectivos que podero impactar esse Poder ao longo do tempo. Os resultados visam um

    melhor planejamento estratgico, caracterizado pela busca da excelncia na prestao

    jurisdicional.

    ABSTRACT

    The aim of this paper is to present some

    of the actions undertaken by the Judi-

    ciary, particularly in relation to its Stra-

    tegic Planning, in order to improve court

    services. The context and the challenges

    related to these actions are detailed.

    The project undertaken by CNJ (National

    Justice Council) in partnership with FGV

    Projetos for the elaboration and analy-

    sis of future scenarios as well as for the

    implementation of strategic planning in

    the courts is also discussed. The main

    results show that the Judiciarys policies

    converge to the outcomes of the future

    scenarios and that the more signifi -

    cant changes that must be undertaken,

    through CNJ, have to focus on operation-

    al and administrative issues.

  • ARTIGO

    CONTEXTO DO PLANEJAMENTO ESTRATGICO NO PODER JUDICIRIO

    So notrias as intensas e signifi cativas mudanas que vm ocorrendo no mundo, provo-

    cando uma constante adaptao por parte das organizaes para conviverem com esse

    contexto. Novos desafi os e novas demandas sociais surgem a todo instante, solicitando

    respostas adequadas e rpidas das organizaes. A postura simplesmente reativa s

    demandas geradas por tais mudanas no pode mais ser sustentada em uma sociedade

    informacional interligada pelas facilidades tecnolgicas e de multirrelacionamento.

    Aes estratgicas devem ser tomadas com rapidez e norteadas por essas mudanas.

    Tal cenrio de instabilidade leva a atividade de planejamento, sobretudo o es-

    tratgico, a ser de fundamental importncia para as organizaes e elaborada de forma

    fl exvel, engajada e participativa com os servidores da organizao, tende, portanto, a

    ser uma ferramenta gerencial indispensvel. Com o cenrio futuro traado e as aes

    disseminadas, os riscos da postura empresarial reativa e o consequente no cumpri-

    mento de seus objetivos fi cam mitigados. As organizaes passam a ter condies de se

    adaptar diante das mudanas e agilizar o seu processo de tomada de deciso.

    O DESAFIO

    Diante desse cenrio e por recomendao do Tribunal de Contas da Unio TCU, em

    seu acrdo n 1.603/2008 Plenrio, essencial que o Poder Judicirio Brasileiro,

    na fi gura do Conselho Nacional de Justia CNJ, promova aes visando disseminar a

    importncia do Planejamento Estratgico e induza os rgos de Justia a efetuarem

    medidas para a elaborao, implementao e aperfeioamento do planejamento es-

    tratgico institucional.

    Por outro lado, o CNJ tem como propsito a realizao da gesto estratgica e o

    controle administrativo do Poder Judicirio e da atuao de seus membros, com o intui-

    to de integrar e aperfeioar a prestao jurisdicional, elaborando aes participativas

    e alinhadas com as necessidades prementes do Poder Judicirio. Essas aes precisam

    estar contidas em um planejamento estratgico que oriente o processo de tomada de

    decises, segundo o contexto global apresentado acima, em atuao proativa de seus

    gestores e abarcando as ameaas e as oportunidades latentes.

    Criar um sistema integrado de gesto e o planejamento estratgico um de-

    safi o que levou o CNJ a fi rmar, em 25 de agosto de 2008, uma Carta do Judicirio

    com os rgos desse Poder presentes no Encontro Nacional realizado naquela data em

    Braslia. Esta iniciativa foi um marco do projeto de planejamento estratgico nacional

    coordenado pelo CNJ. A Resoluo n 70 CNJ, de 18 de maro de 2009, formalizou e

    institucionalizou o Planejamento Estratgico do Poder Judicirio Brasileiro.

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    Essas medidas enfatizaram o desejo e a preocupao

    com o planejamento, execuo de forma compartilhada,

    do conjunto de aes voltadas ao aperfeioamento do

    Poder Judicirio e efetividade da prestao jurisdicio-

    nal. Basicamente, foram evidenciadas as necessidades

    de criar mecanismos que facilitassem e simplifi cassem a

    prestao jurisdicional, visando a:

    ampliar o acesso Justia e aos meios de alcance

    informao processual;

    aprimorar a comunicao interna e externa e o

    atendimento ao pblico;

    aproveitar, de forma racional e criativa, os recur-

    sos humanos e materiais;

    valorizar e qualifi car o corpo funcional;

    aperfeioar os instrumentos de tecnologia da in-

    formao; e

    otimizar o uso dos recursos oramentrios.

    Para o alcance desses objetivos, foi imperativa a cria-

    o de um modelo integrado de gesto para o Judicirio,

    conforme recomendado pelo TCU e ofi cializado pela Re-

    soluo n 70 CNJ.

    A AO

    Para cumprir esta etapa, o CNJ desenvolveu seu plane-

    jamento estratgico baseado na metodologia do Balan-

    ced Scorecard BSC. Nesse contexto, a FGV Projetos, em

    conjunto com o CNJ, elaborou e implementou um Modelo

    de Gesto Estratgica, com base no BSC, integrado para

    o Poder Judicirio Nacional, alinhando as estratgias dos

    Tribunais Superiores e Conselhos, a saber: Supremo Tri-

    bunal Federal STF; Superior Tribunal de Justia STJ;

    Tribunal Superior do Trabalho TST; Tribunal Superior

    Eleitoral TSE; Superior Tribunal Militar STM; Conselho

    Nacional de Justia CNJ; Conselho da Justia Federal

    CJF; e Conselho Superior da Justia do Trabalho CSJT.

    Alm desses rgos, o desdobramento da estra-

    tgia se deu, simultaneamente, nos 24 (vinte e quatro)

    Tribunais Regionais do Trabalho; 27 (vinte e sete) Tribu-

    nais de Justia Estaduais; 27 (vinte e sete) Tribunais Re-

    gionais Eleitorais; 5 (cinco) Tribunais Regionais Federais;

    e 3 (trs) Tribunais de Justia Militar.

    As atividades que envolveram a participao da

    FGV Projetos nessa empreitada foram estas:

    I - desdobramento do mapa estratgico do Poder

    Judicirio para os Tribunais Superiores e Conselhos;

    II -treinamento e nivelamento de conhecimentos

    sobre a metodologia BSC, para mais de 90 (noventa) ges-

    tores dos tribunais;

    III - ofi cinas de trabalho para construo dos ma-

    pas estratgicos dos tribunais, seus indicadores, metas

    estratgicas, defi nio dos objetivos estratgicos;

    IV - suporte e assessoria tcnica in loco e dis-

    tncia para a realizao das ofi cinas de trabalho;

    V - validao no Pleno dos Tribunais do Planeja-

    mento Estratgico;

    VI - elaborao do modelo integrado de gesto

    estratgica; e

    VII - construo e anlise de cenrios prospectivos.

    O PROJETO

    Com o intuito de construir e analisar os cenrios pros-

    pectivos, que de certa forma impactam ou impactaro o

    Poder Judicirio e, desse modo, constituem-se em pea

    imperativa na gesto estratgica e no prprio planeja-

    mento estratgico do Judicirio Nacional, a FGV Projetos

    utilizou a seguinte abordagem metodolgica:

    Na fase de planejamento, foram construdos os

    cenrios mediante a realizao de um seminrio e, como

    consequncia, os respectivos instrumentos de coleta de

    dados para a aplicao da pesquisa.

  • Os cenrios prospectivos focaram os temas pr-selecionados, a saber:

    I - tecnologia da informao;

    II - meio ambiente;

    III - aspectos legais;

    IV - empresarial; e

    V - econmico:

    relaes interpessoais;

    relaes do trabalho;

    necessidade de conhecimento;

    As descries de cada um dos cenrios so as que se apresentam a seguir:

    CENRIO DE TECNOLOGIA DA INFORMAO

    A informtica est revolucionando as relaes comerciais, profi ssionais, pessoais etc.

    Sua infl uncia ser cada vez maior e mais defi nidora. As pessoas tero acesso a toda in-

    formao que quiserem, em qualquer parte do mundo, a qualquer hora e de forma ime-

    diata. As fronteiras, da forma como conhecemos hoje, defi niro muito pouco as trocas

    e relaes, uma vez que a globalizao ser uma realidade conquistada virtualmente.

    Os deslocamentos de pessoas, papis e coisas fsicas diminuiro e podero ser evitados

    pelo uso de videoconferncias, convergncia de servios pelo celular, assinatura digital

    etc. As fraudes de todos os tipos e os crimes, sobretudo fi nanceiros, realizados virtual-

    mente, aumentaro e sero a maioria, exigindo novos mecanismos e instrumentos de

    segurana, defesa e julgamento.

    CENRIO DE MEIO AMBIENTE

    O Brasil um dos pases mais visados quando se fala em responsabilidade pelo meio

    ambiente, tambm por isso a populao ter que se formar e se informar para lidar de

    forma responsvel com os recursos naturais. As instituies governamentais, empre-

    sariais e sociais devero ter participao ativa nessa conscientizao e mudana de

    hbitos. Estaremos vivenciando o desafi o de compatibilizar crescimento econmico e

    sustentabilidade ambiental.

    CENRIO DE ASPECTOS LEGAIS

    Todos os campos de atividade mercantil e todas as atividades sociais esto se integran-

    do mundialmente, gerando novos conhecimentos, novas experincias, novos produtos,

    novos servios, novas demandas e novas oportunidades. Pela prpria evoluo do Brasil,

    nos ltimos anos, e por sua integrao e liderana global, o Poder Judicirio brasileiro

    ter que ser outro, com novos instrumentos, novos procedimentos, novas estruturas etc.

    ARTIGO

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    CENRIO EMPRESARIAL

    O Brasil viver, nos prximos anos, um perodo de grande atividade empresarial, com

    entrada maior de empresas internacionais, com importantes fuses de grandes em-

    presas nacionais para enfrentar a nova concorrncia e com alto volume de entrada de

    capital estrangeiro. A participao dos negcios internacionais tambm aumentar de

    forma signifi cativa. Alm disso, haver o impulso que a construo civil ganhar com

    a proximidade da Copa do Mundo de futebol no Brasil e da Olimpada 2016, no Rio de

    Janeiro. Com esta nova realidade, o cidado comum melhorar sua condio de renda,

    com maior oferta de crdito e maiores condies e necessidade de se informar e se

    formar, tcnica e culturalmente.

    CENRIO ECONMICO

    RELAES INTERPESSOAIS - O pas est mudando o perfi l de sua populao e de suas re-

    laes interpessoais. A mdia da populao est fi cando mais velha, com as mulheres

    tendo uma taxa de fertilidade menor, assim tendo menos fi lhos, e famlias vm-se cons-

    tituindo em variados formatos, como uma mulher e um fi lho, um homem e um fi lho,

    duas mulheres, dois homens, casais separados com fi lhos do primeiro casamento e com

    fi lhos em comum etc. As estruturas de previdncia social, jurdica, servios a idosos,

    sade, educao etc. devero se adaptar a essa nova realidade.

    RELAES DE TRABALHO - As pessoas esto cada vez m