Flexibilidade será suficiente?

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O agregador da advocacia 22 Junho de 2011 www.advocatus.pt Julgamos ser preciso imprimir flexibilidade na organização das empresas e dos tempos de trabalho, que permitam fazer face aos picos de actividade sem acréscimos significativos de custos com mão-de-obra, e, ao mesmo tempo, permitam libertar temporariamente os trabalhadores “Com todas as alterações previstas, teoricamente para facilitar o despedimento, cabe perguntar se as medidas que também constam do Memorando de promoção da flexibilidade laboral serão suficientes para dinamizar efectivamente o mercado de trabalho” “O Memorando impõe a revisão das compensações para os novos contratos, a termo e sem termo, diminuindo-as relativamente ao valor actualmente previsto na lei e estabelecendo limites máximos, hoje inexistentes” Inês Reis É sócia fundadora da pbbr, dedicando- se em especial ao Direito do Trabalho, da Segurança Social e Employee Benefits, Direito Bancário e Contencioso. Licenciou-se em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Lusíada em 1994 e em 1996 completou uma pós-graduação em Gestão e Fiscalidade pelo Instituto de Estudos Superiores Financeiros e Fiscais Flexibilidade será suficiente? No Memorando de Entendimento assinado entre Portugal e a UE, o BCE e o FMI (adiante apenas Me- morando) indicam-se, sob a epígrafe “Mercado de Trabalho e Educação” uma série de pontos, nestas áreas, que deverão ser objecto de interven- ção, definindo-se os princípios que a deverão nortear e que se poderão resumir do seguinte modo: 1. Rever o sistema de protecção no desemprego, e, ao mesmo tem- po, reforçar a rede de protecção social; 2. Reforçar a legislação na vertente da protecção no emprego, enco- rajar a criação de emprego e fa- cilitar a transição de trabalhado- res entre profissões, empresas e sectores; 3. Flexibilizar a organização dos tempos de trabalho, de modo a poder fazer face às flutuações de ciclo, a acomodar melhor as diferenças de padrões de tra- balho nos diversos sectores de actividade e aumentar a compe- titividade das empresas; 4. Promover um custo do trabalho consistente com a criação de emprego e com uma maior com- petitividade; 5. Assegurar boas práticas e re- cursos adequados às políticas activas do mercado de trabalho, de modo a melhorar a emprega- bilidade dos grupos menos favo- recidos e equilibrar as diferenças do mercado de trabalho; 6. Aumentar a qualidade do capital humano, lidando com o proble- ma do abandono escolar preco- ce e melhorando a qualidade do ensino e da formação. Os pontos que acima resumimos es- tão bastante detalhados no Memo- rando, incluindo os trimestres nos quais, em concreto, o novo governo terá de legislar, bem como os termos em que o deverá fazer. Por limitações de espaço, optámos por analisar, de modo necessaria- mente breve, apenas as medidas relacionadas com o desemprego, questão que, por motivos óbvios, assume importância central para empregadores e trabalhadores. Relativamente à diminuição do valor das compensações a pagar por des- pedimento imposta no Memorando, embora, ao contrário de muitos, não nos pareça o ponto fulcral para a di- namização do emprego em Portugal, não podemos deixar de manifestar a nossa discordância por se tratarem os actuais trabalhadores de modo distinto – mais favorável – dos novos trabalhadores que, teoricamente, são os que se pretende fazer ingres- sar no mercado de trabalho. Com efeito, o Memorando impõe a revisão das compensações para os novos contratos, a termo e sem ter- mo, diminuindo-as relativamente ao valor actualmente previsto na lei e estabelecendo limites máximos, hoje inexistentes. Não obstante distinguir entre actuais e futuros trabalhadores, o Memoran- do faz referência a que, no 4.º trimes- tre de 2011, o Governo deve apre- sentar uma proposta para alinhar os diversos direitos ao pagamento de compensações para os actuais tra- balhadores, em linha com a reforma para as novas contratações, mas sem reduzir os “direitos adquiridos”, sem que se compreenda inteiramen- te o que tal significa. O Memorando impõe, ainda, que a legislação para este efeito deverá ser submetida ao Parlamento no 1.º trimestre de 2012. Ainda no âmbito dos despedimen- tos, o Memorando prevê o alarga- mento da figura do despedimento por inadaptação e a eliminação do critério da antiguidade no despe- dimento por extinção do posto de trabalho, desde que o emprega- dor apresente critério alternativo e não discriminatório, à semelhança do que actualmente já sucede no despedimento colectivo. Com todas as alterações previstas, teoricamente para facilitar o des- pedimento, cabe perguntar se as medidas que também constam do Memorando, de promoção da flexi - bilidade laboral, designadamente em termos de horários e de pagamento de trabalho suplementar, serão sufi- cientes para dinamizar efectivamen- te o mercado de trabalho. Julgamos ser preciso imprimir, de forma efectiva, flexibilidade na orga- nização das empresas e dos tempos de trabalho, que permitam fazer face aos picos de actividade sem acrés- cimos significativos de custos com mão-de-obra, e, ao mesmo tempo, permitam libertar temporariamente os trabalhadores noutros momen- tos, pois só deste modo será possí- vel aumentar a competitividade das empresas portuguesas. Trabalho

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O agregador da advocacia22 Junho de 2011

www.advocatus.pt

Julgamos ser preciso imprimir flexibilidade na organização das empresas e dos tempos de trabalho, que permitam fazer face aos picos de actividade sem acréscimos significativos de custos com mão-de-obra, e, ao mesmo tempo, permitam libertar temporariamente os trabalhadores

“Com todas as alterações previstas,

teoricamente para facilitar o despedimento,

cabe perguntar se as medidas que

também constam do Memorando de promoção da

flexibilidade laboral serão suficientes para dinamizar efectivamente o

mercado de trabalho”

“o Memorando impõe a revisão das compensações para os novos contratos,

a termo e sem termo, diminuindo-as relativamente ao valor actualmente previsto

na lei e estabelecendo limites máximos, hoje

inexistentes”

inês Reis

É sócia fundadora da pbbr, dedicando-se em especial ao Direito do Trabalho,

da Segurança Social e Employee Benefits, Direito Bancário e Contencioso.

Licenciou-se em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Lusíada em

1994 e em 1996 completou uma pós-graduação em Gestão e Fiscalidade

pelo Instituto de Estudos Superiores Financeiros e Fiscais

Flexibilidade será suficiente?

No Memorando de Entendimento assinado entre Portugal e a UE, o BCE e o FMI (adiante apenas Me-morando) indicam-se, sob a epígrafe “Mercado de Trabalho e Educação” uma série de pontos, nestas áreas, que deverão ser objecto de interven-ção, definindo-se os princípios que a deverão nortear e que se poderão resumir do seguinte modo:1. Rever o sistema de protecção no

desemprego, e, ao mesmo tem-po, reforçar a rede de protecção social;

2. Reforçar a legislação na vertente da protecção no emprego, enco-rajar a criação de emprego e fa-cilitar a transição de trabalhado-res entre profissões, empresas e sectores;

3. Flexibilizar a organização dos tempos de trabalho, de modo a poder fazer face às flutuações de ciclo, a acomodar melhor as diferenças de padrões de tra-balho nos diversos sectores de actividade e aumentar a compe-titividade das empresas;

4. Promover um custo do trabalho consistente com a criação de emprego e com uma maior com-petitividade;

5. Assegurar boas práticas e re-cursos adequados às políticas activas do mercado de trabalho, de modo a melhorar a emprega-bilidade dos grupos menos favo-recidos e equilibrar as diferenças do mercado de trabalho;

6. Aumentar a qualidade do capital humano, lidando com o proble-ma do abandono escolar preco-ce e melhorando a qualidade do ensino e da formação.

Os pontos que acima resumimos es-tão bastante detalhados no Memo-rando, incluindo os trimestres nos quais, em concreto, o novo governo

terá de legislar, bem como os termos em que o deverá fazer.Por limitações de espaço, optámos por analisar, de modo necessaria-mente breve, apenas as medidas relacionadas com o desemprego, questão que, por motivos óbvios, assume importância central para empregadores e trabalhadores.Relativamente à diminuição do valor das compensações a pagar por des-pedimento imposta no Memorando, embora, ao contrário de muitos, não nos pareça o ponto fulcral para a di-namização do emprego em Portugal, não podemos deixar de manifestar a nossa discordância por se tratarem os actuais trabalhadores de modo distinto – mais favorável – dos novos trabalhadores que, teoricamente, são os que se pretende fazer ingres-sar no mercado de trabalho.Com efeito, o Memorando impõe a revisão das compensações para os novos contratos, a termo e sem ter-mo, diminuindo-as relativamente ao valor actualmente previsto na lei e estabelecendo limites máximos, hoje inexistentes. Não obstante distinguir entre actuais e futuros trabalhadores, o Memoran-do faz referência a que, no 4.º trimes-tre de 2011, o Governo deve apre-sentar uma proposta para alinhar os diversos direitos ao pagamento de compensações para os actuais tra-balhadores, em linha com a reforma para as novas contratações, mas sem reduzir os “direitos adquiridos”, sem que se compreenda inteiramen-te o que tal significa. O Memorando impõe, ainda, que a legislação para este efeito deverá ser submetida ao Parlamento no 1.º trimestre de 2012.Ainda no âmbito dos despedimen-tos, o Memorando prevê o alarga-mento da figura do despedimento por inadaptação e a eliminação do

critério da antiguidade no despe-dimento por extinção do posto de trabalho, desde que o emprega-dor apresente critério alternativo e não discriminatório, à semelhança do que actualmente já sucede no despedimento colectivo.Com todas as alterações previstas, teoricamente para facilitar o des-pedimento, cabe perguntar se as medidas que também constam do Memorando, de promoção da flexi-bilidade laboral, designadamente em termos de horários e de pagamento de trabalho suplementar, serão sufi-cientes para dinamizar efectivamen-te o mercado de trabalho.Julgamos ser preciso imprimir, de forma efectiva, flexibilidade na orga-nização das empresas e dos tempos de trabalho, que permitam fazer face aos picos de actividade sem acrés-cimos significativos de custos com mão-de-obra, e, ao mesmo tempo, permitam libertar temporariamente os trabalhadores noutros momen-tos, pois só deste modo será possí-vel aumentar a competitividade das empresas portuguesas.

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