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23 FLOR... O vento ensaia seus passos de dança sobre aquele imenso mar que avança. O sol surge do ventre daquelas águas num espetáculo a abrasar as mágoas. Pés fincam pensamentos profundos na areia mansa a amassar os mundos. Olhar aberto, a mulher em luz se fecha. Arqueira, atira-se dos sonhos em flecha. Costura onda por onda com afiada ponta. Ama. Grita. Sangra e cai. Aos deuses conta seu fel! Metida na boca do algoz traiçoeiro pensa secar as gotículas do úmido nevoeiro... Garganta na boca vê seu futuro ser engolido por inteiro. Morre. Some nesse mar sacudido, revolvido... Revolvida inda em vida e amor ergue-se, eis que renasce do asfalto a flor...

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FLOR...

O vento ensaia seus passos de dança

sobre aquele imenso mar que avança.

O sol surge do ventre daquelas águas

num espetáculo a abrasar as mágoas.

Pés fincam pensamentos profundos

na areia mansa a amassar os mundos.

Olhar aberto, a mulher em luz se fecha.

Arqueira, atira-se dos sonhos em flecha.

Costura onda por onda com afiada ponta.

Ama. Grita. Sangra e cai. Aos deuses conta

seu fel! Metida na boca do algoz traiçoeiro

pensa secar as gotículas do úmido nevoeiro...

Garganta na boca vê seu futuro ser engolido

por inteiro. Morre. Some nesse mar sacudido,

revolvido... Revolvida inda em vida e amor

ergue-se, eis que renasce do asfalto a flor...

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COCHICHAR COM A LUA...

Pus-me nua a cochichar com a lua...

Reclamo aquele amor que jejua.

Passa nova, passa cheia e crescente,

vem a minguante, como fica a gente?

Pus-me nua a cochichar com a lua...

curiosa de você segui tua luz na rua.

Do Cometa vi o rastro mas não o astro.

Ah, difícil figurinha... um dia enquadro!

Pus-me nua a cochichar com a lua...

Cochilei! Sonhei estar viva na vida tua

e assim como as estrelas sorriem no céu

fomos felizes juntos sonhando ao léu.

Ah, pus-me nua a cochichar com a lua...

o tempo se esvai... vivemos meia lua!

Luas e luas segredei você aquietada

até te roubar inteiro em noite gelada.

Basta! Basta de cochichar nua com a lua.

Visto todos os meus versos onde o luar extenua

o chamego, o dengo com que você me acarinha

ao ouvir o canto da tua voz: - “Oi, Poetinha.”

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DIZ SIM...

Quero outras luas,

luas outras quero.

Nada de se esvair

e em nuvens fugir.

Queres o céu? Pega

minha boca e peca.

Queres a lua? Prega

você em mim e rega.

Teu querer é fiança,

mira no não e lança.

Baixa flecha e arpão,

deixa dizer o coração!

Sim, canta teu olhar

Sim, o beijo a arfar

Sim, os corpos luz

Sim, livres sem tabus.

Ah, diz sim só pra mim...

vamos vestir um brim,

ouvir Beatles e malucar

de tanto amar ao luar.

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MAESTRO

m úsica à primeira vista

a ma cantar, eis a pista.

n ina os meus sonhos

o mbros caem risonhos.

E namora timidamente

l ivre homem ardente.

A justa cordas e notas

n ão dá dicas e rotas.

i nvento um sequestro

s igo a lua e o maestro

i nvado seu esquema

o fereço meu poema.

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KAIRÓS

E mergulhada em mim

encontrei você sem fim.

Costurei dias e horas...

poente, bordei auroras.

Outras noites a sonhar

vinha você a cantarolar

estrelas em minh´alma.

O brilho seu fez rumo meu,

a voz sua fez palavras nuas,

soltas nas páginas do vento,

vivas a ler a vida e o tempo.

Haverá um amanhã? Não sei...

vivo você e em poemas verso,

cante Kairós o tempo do universo.

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HISTÓRIAS DE AMOR

Duas histórias escritas,

tintas, idas e vindas...

do borrão ao alvo papel

a vida esparramou fiel.

Duas histórias lindas

vividas nas berlindas

das línguas do dia a dia,

magia de se ter ousadia!

Duas histórias orbitando

à espreita do tempo brando

onde os olhos sossegados

beijam os lábios enamorados.

Duas histórias conversando,

rememorando e futurando

de riso rasgado sobre o tálamo

dizem: meu amor, assim eu gamo!

Duas histórias, encanto de livraria,

ao menor toque a alma se inebria.

Ela, convida a lua pra ser feliz.

Tua boca tem vida própria - ele diz.

Duas histórias entrelaçadas

a andarilhar e marcar as calçadas

da rua, da cidade e da estrada

aberta em amor à lua prata.

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TEMPO ROUBADO

A madrugada canta o agitar dos meus pensamentos

naufragados no mar doce a salgar meus tormentos.

Medo que a vida negue, sonegue e de mim te leve

no mesmo soprar do meu pensar que te rouba breve.

Ah, tempo algoz! Subtrai em seu uso e abuso,

corre e não socorre o tempo de amar, por isso te acuso.

Deixa-me perder nos braços do meu amor sem tempo!

Minha é a existência. Vê se deixa de ser sofrimento...

Larga-me à deriva em Kairós o tempo da oportunidade

e permite-me morrer mais fêmea por toda a eternidade.

Exijo todos os segundos passados ao largo do meu amor!

Guarde a certeza da cobrança vil a ti por minha dor...

Pobre tempo que vive a acertar horas - morra em desacerto!

Viaja longe no pé do vento e o tempo em tempo estará liberto

para meu maestro e eu evolarmo-nos entre os extras das horas,

libertos pela poesia musicada em amor, em tons auroras...

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AMOR RETRÔ

Vozes e mais vozes velozes

ziguezagueiam as neuroses

difusas, obtusas, permeáveis

no homem de idéias imutáveis.

Debruçado, ele fala à gélida atonia

sobre a estranheza e não sintonia

ao novo lugar, o não lugar de gente

com passado roubado não presente.

Ontem a vida era! Ontem reverbera.

Viver só os prós? Ah, quem nos dera!

Sucumbir, extinguir aqueles contras

e buscar o amanhã de malas prontas,

assim, preto no branco e cara a cara,

a saudade deixará de ser dor e sara.

Vem amor, futurar a vida num bistrô

e lavrar de nanquim esse amor retrô.

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MEU PRESENTE

Meu presente tem forma, cor, cheiro...

Humm, e que cheiro tem ele... meu presente!

Assume espaços em mim, eis a sua forma,

subverte as cores do arco íris e transforma

os sons, os tons. Pinta a melodia na poesia,

embala meus sonhos doces como ambrosia.

Rio navegando a gargalhar pelas entranhas,

solta, livre pela moleca que me acompanha.

Meu presente tem força, humor e calor...

ah, e que calor tem ele... meu presente!

É sol. É luz a incendiar-me de norte a sul,

desapressados madrugamos no mundo azul

encantados e desamarrados, cheios de bobices,

coisa de gente feliz e donos das próprias tolices.

Coisa de gente aprendiz, a bisbilhotar a vida pura

cutucando e experimentando a existência madura.

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BELA DUPLA

Eu não sei namorar

você não sabe casar,

taí uma bela dupla.

Faça uma moda

nessa sua viola

nessa sua viola

faça uma moda

namorante

casante

apaixonante...

Eu não sei namorar

você não sabe casar,

taí uma bela dupla

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a compor versos

a pintar reversos

em vinho tinto

muito bem vindo.

Eu não sei namorar.

Você não sabe casar.

Assim a vida nos uniu,

poxa a vida nos pariu!

Eu vou aprender a namorar

e você vai aprender a casar...

Ich, isso vai desencontrar

o namorante

a casante

os apaixonantes.

Ah, pegue essa sua viola

faça mudas de modas

e plante meus versos

em suas cordas.

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AINDA AGORA...

Ainda agora estava a gastar o dia,

o riso, o olhar e meus beijos debruçados,

nessa tua boca aguada de rios doces...

Ainda agora estava a guardar tuas mãos

nas minhas... Elas totalmente protetoras

aninharam sedução e calor nas minhas.

Ainda agora dançava na magia da tua voz

a evocar em mim asas de bem-te-vi

disparando todos os meus sentidos por ti.

Ainda agora pontilhava o infinito na vida.

Desenhei-me eterna em ti só pra te amar

sem rascunho, sem medida ou despedida.

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NÓS

As palavras dormem

presas em nãos: Nós...

Nós a torcer o homem

afastado de mim, nós...

Nós a torcer, eu mulher

pertinho de ti: Nós...

Doce de leite na colher,

beijo açucarado, nós...

Juntinhos o tempo cala,

seja dia, seja noite: Nós...

n´outros, fecha a mala

e a porta tranca, nós...

O cabelo solto cacheado

desprega cachos: Nós...

Achado no corpo suado

o fio fica a espalhar, nós...

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BOM DIA!

Vejo toda a rua esperta.

O sol me chama moleca

chega a hora que aperta,

desgruda e a alma se nega

a partir por querer mais rir.

Por querer mais a ti falar

coisas tolas e você ouvir

pronto pra me abraçar,

apertar e logo dizer algo

maluco, surpreendente,

com seu humor fidalgo

a contemporizar ardente

o ar, a vida e toda a gente

que sentir o perfume indo

desse nosso amor presente,

a sorrir ao bom dia vindo...

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?

Vamos fazer comidinhas madrugando?

Fartar a mesa do nosso riso namorando

o olhar, a boca, nosso jeito incomum

e ver que onde eram dois agora nasce um?

Vamos segurar os ponteiros das horas?

Apertá-los contra o tempo a fazer molas

esticando o sono a deitar com quem se ama

inebriando toda nossa nudez exposta na cama?

Vamos bicicletear nas ruas e costurar toda a gente?

Desde o chegar do dia até o deitar do sol poente.

Olharmo-nos demoradamente e nos deixar entrar

um n´outro a pedalar esse amor que quer amar?

Vamos nos render ao Universo que nos inventou?

E em amor e desejo nosso corpo despertou,

fiando nosso tempo de cada dia lá do tear do mundo,

cujo ponto é: vamos casar, ter filho e morar junto?

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CANÇÃO PRA ELIANE

Manoel Anisio M. Moscalewski

quero você pra mim

tenho você pra mim

te amo assim

cochichamos com a lua

e esse amor não mais jejua

eu não sabia te precisar tanto assim

lindo anjo meu

e entre Cronos e Kairós

saiu o Eu, surgiu o Nós

estrada de sol, poema mar

abençoaram-nos a sós

quero você pra mim

tenho você pra mim

te preciso sim

amor retrô tanto esperou

chegou tão suave e se instalou

linda Poetinha, aos teus cuidados

um menestrel se entregou

“and when I touch you I feel happy inside.

it's such a feeling that my love

i can't hide, I can't hide.”

quero você pra mim

tenho você pra mim

te quero assim...

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FENIX

Inexistente

Intermitente

Exercício

Ofício

O vício

Fênix ensina,

ave peregrina:

entrega-se à morte

ganha a vida por sorte.

Outrora vive,

outrora morre.

se morre pra aprender

se aprende pra viver.

Nesta linha dual

o mediano é vital

a definir elos

a explorar egos

Infinitos

Unidos

Amor

Cria...dor

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EU NÃO SABIA...

Eu não sabia da minha existência existir na tua,

Intuitivamente procurei-te ao caminhar na rua.

Ao ver-te, algo explodiu em mim (espiritualizo),

senti meu corpo vibrar e abri um mar de riso.

Ao certo não entendia aquele sentimento.

Colocada no leme do vento vivi à deriva

por caprichoso destino, talvez meu invento,

intento de partir quando na cara a vida borrifa

gotículas inteiras, justiceiras para desaportar

do porto seguro instalado lá no colo do mar...

Em mim o debate! Em mim a ti o amor abriu.

Nua, fui pra lua ouvir seu canto e versei febril.

Eu não sabia que tudo em mim dizia te adorar!

Pouco ainda sabia de mim mesma e quem era,

lembro apenas de te seguir e persistir em sonhar

com teu olhar e beijo - meu adeus à longa espera.

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AMOR DESPERTADO

Que privilégio o despertar do sono meu ao som do violão teu!

O que fizera eu para merecer tal proveito? “Pro ventos”...

brisas vindas do coração desse universo de eixo transverso,

bem planejado e arquitetado por tempo vivido no reverso

véu de fios invisíveis onde o nosso amor se viu despertado

daquele sono por não haver compreendido, já de muito antes,

que nascia ao morrer naquele teu abraço de suave compasso,

seguido do teu beijo quente entregue ao meu rosto largado

no teu. Quando nossos braços se interpunham, um oásis floria

ruas em mim! De alma adocicada deixava-me açucarar nas

águas tuas. Surpreendida naquele amasso, perguntava o prazer

que eu tinha ao mergulhar nesse teu abraço bem agarradinha,

bem Poetinha...

Por fim, hoje rogo em saber por que tenho esse merecimento de

anjo? Trazida do sono nesta manhã de domingo, levitei nas

cordas do arcanjo a dedilhar o sol em mi por todo meu

universo com tuas mãos cantantes, musicando sons e tons a

despertar o amor entre os abraços namorantes.

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VULCÃO E ROSA

Linda. Majestosa e viçosa,

chegou em mim a rosa.

Rubra em fogo e paixão,

na pétala brotou o vulcão.

Revolvo o vulcão e beijo a rosa...

Teima e queima a palavra espinhosa.

Madrugada adentro, sono pra fora,

revolvo o vulcão e beijo a rosa...

Desfolhei o príncipe escrito

e na florescência desse amor lido

renasci nos braços do homem

onde meus sonhos dormem.

Lá é meu lugar. Lá sou bela e fera,

como aquela pétala a dobrar-se na espera

do seu cair, no quente do chão que enterra

o beijo florido no vulcão bem na boca da terra.

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ARRANJARAM TEU SUMIÇO

Quem arranjou esse tempo sem você, meu amor?

Assim como arranjaram o frio sem o cobertor

e aquele mundo de buraco espalhado pelo mar

a incomodar a curiosidade da menina a brincar

na vida com perguntas órfãs de respostas simples,

feitas pela criança que sabe ver e viver outra vez

a magia da descoberta do momento primeiro

em que sentir significa o toque, o olhar, o cheiro

natural e animal, essencialmente humano e limpo

das armadilhas dos odores vindos lá do olimpo

do ego humano, onde o homem sem mais porquê

cessa suas perguntas embalado em, sei lá! Pra quê?

Hoje a chuva brinca em você e te faz correr pela rua,

vejo teu rosto molhado e beijado pelo pingo que te acua.

Chega de brincar com a chuva. É pique esconde, é isso,

meu amor? Nessa tarde arranjaram teu sumiço: que dor!

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DI´VERSO

espelho avesso

calor travesso

imagem refletida

silhueta prometida

corpos dançam

olhos namoram

olhar invertido

amor despido

braço trastejado

alaúde gotejado

melodia besunta

lençol inunda

silêncio amassado

espírito inalado

amor avança

poema descansa.

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INSPIRAÇÃO

Hoje pego a rima e jogo no lixo.

Meu espírito queima, vira bicho,

mas que coisa rima maldita -

larga-me a poetar sem tua dita!

Não quero nada mais!

Sentir, arder em ais...

Ah, lá vem a palavra rimada

Impregnada e apaixonada...

Ouça, ouça eu xingar

e tantos palavrões falar

pra você rima vilã

fel na boca poeta-irmã.

Sai, sai de mim! Plim!

Vira-me em avesso ruim

fonte de inspiração a doer

e no verso faz morrer.

Rimas (imãs) – irmãs de minh´alma!

Deixem-me solitária e calma.

O que preciso fazer pra não mais ter

essa dor rimada que inspira meu ser?

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POETA DAS RUAS

Paulo Gomes é tão bom

que a vida não deixou pra depois

fez logo dois:

pai, filho e quiçá espírito santo

é Paulo, é Poeta a desenhar em versos as ruas.

Nada escapa do seu olhar singelo,

captura o momento e faz sentimento em elo

daquele sim, daquele não, daquele nada,

costura as emoções pelo fio da canetada.

Paulo Gomes é tão bom

que a vida não deixou pra depois,

chove em poesia, em benção,

igual chuva de arroz!

Casado com seu caderno, ama a Paula.

Mas é no berço amigo que nascem as poesias suas

fruto de pura inspiração capturada pelo Poeta das Ruas.

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CANANÉIA

No fio do

Linho

eu

teci o

Mar...

Rio!

Na luz do

Sol

balandrana

bordei.

Na malha

a rede,

na renda

a Rosa.

Vesti

mar.

Vesti

Noel.

Vesti

amigos

em

Cananéia.

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PALAVRAS

palavra falha

pouco fala das

nossas cavernas

hibernam eras...

pobres palavras!

poucas e ocas

saltam no vazio

do grito frio

hiber – nada!

cortada...

abortada...

a palavra

no homem

dorme...

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CÉU

Valeu viver em ti

ao sabor do amor

morri, nasci, fugi.

A vida leu. Percorreu

linhas minhas lindas

e em curvas, choveu!

História de cinema.

Pó, poeira, poema,

explosão arde o ar.

É dia, é noite e meia

solta na cama, solta

no tempo “sem hora”,

beijada contigo sem

perigo a unir umbigo.

Que fiz eu

pra merecer o céu?

“Que te fez todinho mel?”

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VAZIO

dor absurda

surda

boca muda

gruda

grito vazio

vadio

escuro muro

urro!

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LETRAS AO CENTRO DE LETRAS

(ao centenário do Centro de Letras do Paraná)

Letras em palavras salteiam...

vindas do ventre d´alma ateiam

o livre fogo na esteira do criar,

reunidas neste berço de pensar.

Elas vivem por anos luz incontáveis,

crescendo e lendo os seres aves.

Inteligentes em seus voos solos

ou em bandos, tecem no céu, colos.

Palavra, irmã palavra... Lavras

o tempo d´ouro no espelho d´agua,

pingas escrevendo fios sem travas

e a pena irisada em tintas deságua

melodiosas letras e decanta eras! Adentra

ao centro e se faz arte, e fecunda a pedra

e fecunda Homens. Decanta centenários

e letra gerações guardadas na memória

maiúscula da palavra voejante, mestra

dos amigos e dos amantes em oratória.

Toda a letra tem ao centro uma história

ou toda história tem ao centro uma Letra?

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LUA NO SOL

Quanto mais te tenho

mais te quero.

Não espero.

Venta, eu verbo.

Quanto mais te tenho

mais te quero

afogo-me no quente da tua boca e

lentamente me põe louca...

Quanto mais te tenho

mais te quero.

O sol diz à lua: sobe,

e encanta e decanta

e descansa todo o céu...

Dona do sol gotejante

a lua incensa o amor da gente.

Quanto mais te tenho

mais te quero...

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PARA

Para. Chega teu ouvido

na ponta viva desse lápis

canta...dor, grita...dor...

Para. Dos olhos faz pregas,

acomoda e acoca as pedras

mortas vivas, inertes e inverte

toda vida calada na verve.

Para. Pega teu coração e deita

no coração desse lápis e sente

o veio pulsante de gente

a ser cuidado por mão quente.

Para. Dispara a inércia num soco só

e o que era pedra na mão se faz pó!

Cintila. Espreguiça. Despreguiça pó_eta,

no lápis nasce seiva do umbigo à caneta.

Para...

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NADA

Você não sente aí

mas dói... aqui... !

Você não enxerga daí

mas vejo tudo daqui.

Grudada no teu peito

sou flor amorosa que chora.

Nado no tálamo alagado,

afogada, morro e choro.

Você não sente aí

ah, mas como dói

bem aqui em mim

teu anjo querubim

a subir por tua encosta

entregue porque gosta

e gosta e aperta e goza...

e você? Você não sente

nada aí... Toca ausente

em nada e tudo é nada.

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SEIS E MEIA DÚZIA

Sou seis, você meia dúzia,

tão iguais nos desiguais...

minh´alma nascia, a tua já luzia.

Andei por beiras e você por vitrais.

Maluquei e debulhei meus dias

ao bel prazer dos meus sentidos.

Buli no ar e pulei as sombras frias,

bamboleio da paixão, fio dos destinos:

um canção, outro poesia

a compor novo cenário e melodia.

Hoje, prá lá do alto mar sem fim,

chega nova vida a florir em mim.

Sou seis, você meia dúzia,

tão iguais nos desiguais...

cada um é cada um

somamos dois igual a um.

Um vive no passado presente

outro vive no futuro passado,

dois avessos da hora presente

a dobrar o tempo evaporado.

Sou seis, você meia dúzia,

tão iguais nos desiguais..

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PALAVRA ESCRITA

Escrever. Escrever. Escrever...

Maldição ditosa em teu ser

Paga luas, estrelas e sóis,

gasta tempo nesse mundo atroz.

Finca a palavra estendida

e ali na folha ganha vida.

Sentença vil da poeta

que morre, vive e peca.

Conta e reconta a vida a tantos

entoada na magia dos cantos.

Faz doçuras na boca do azedo,

versa letras e colori a vida a dedo.

Versa, versa, linda Poetinha,

veste a palavra e solta a linha!

Caminha e deita tua mão escrava

e na cava do poema teu sentir lavra

o dia, a noite’inda na prega da madrugada

larga tua alma, larga a escrita alada.

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ENGANO

É meu o recado

nesse poema sem recato.

Voo alto e salto no meu

abismo aloucurado...

Costuro no roto da

madrugada a miragem.

Saio sem destino com

a incerteza na bagagem.

Enganos? Dano meu.

Vi o mito – prometeu.

Valeu o não valor,

vinguei minha dor!

E daí? Nada! Nova é a lua

a convidar toda a luz da rua

dourando a noite descontente

a fritar o passado na sua lente.

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EU

eu sorri...

vi!

eu alegre...

ergue!

eu lembro...

tento!

eu imploro...

doro!

eu chateio...

ateio!

eu pardo...

ardo.

eu algema...

gema!

eu seminua...

lua!

eu inconclusa...

obtusa!

eu invento...

vento!

eu poetizo...

ando!

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50TINHA

Lá vem ele...

sem perguntas

nem respostas.

Soma caminhos

multiplica futuros

nasce em novidades.

Novaidade!

nos cabelos fio a fio

o branco sorriu...

Dobro a vaidade,

vivo na complexidade

da vida, da ...ida.

Lá vem ele

dono de mim

anjo querubim!

Venha 50tinha!

sou Poetinha...

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SONHO DE MÃE

Busquei construir este poema

no colo poético de mãe morena.

Impossível! Sou mãe loura

desenho a poesia de mãe caloura.

Mães e filhos vão pra lá e pra cá

nos poemas aqui ou acolá.

Na transcendência dos papéis

entre as gerações somos fiéis.

Escancaramos bem na cara do real

uma trajetória de vida chamada-ideal.

Colocamos nossos filhos na manjedoura

e, logo assumimos o papel de Senhoura.

Ah, doce mentira...

Chega a realidade abrupta e atira

no peito de mãe que alimenta

toda a magia que se reinventa

crescente e cheia na luz da lua

acompanhando o filho pela rua,

livre, de todos os males imagináveis

a desfrutar de felizes dias incontáveis.

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DIREITO ALADO

Pequenina menina

em flor se fez fruto,

colheu a mulher.

Menina, fique mais!

Deita o tempo nas nuvens

a trançar teus louros fios.

O ruge da tua face

cola no friso da face mãe

demoradamente...

Sei, tens que ir.

É teu Direito

conquistado,

direito alado...

LISI

Ouço teu sorriso brincando

na boca tua o batom dizendo

bem alto aos teus pés em salto:

- acelera a vida, Lisi, lá do teu auto!

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VEJO

Vejo teus louros cabelos esquecidos

ali nos travesseiros, adormecidos...

Vejo o rubor do teu semblante

feminino a descansar, amante...

Vejo tudo o que dá pra lá do olhar

vejo teu contorno molhado de mar.

Linda! Exubera em naturalidade

o frescor e o viço da maturidade.

Segue, querida! Segue mais e mais...

aporta forte e arrisca-te em outros cais.

FE+LISI

que venham as idades

que venham os saberes

que venham os amores:

‘Felisidades!’

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MAR CÉU

Ah, dia, o que acontece?

Meu peito aperta e padece.

Não entendo o teu recado

o mar em céu vive ao meu lado.

A vaga enorme o desacomoda

e a incerteza é convite à marola.

- Vai até o arco-íris e diz ao céu

que o mar em pico descansa no véu

fino do vento e entre curvas assobia

o canto livre a marolar noite e dia.

Em viagem e sonhos o mar céu

solto no leme, solto em si, ergue o chapéu

num levante à natureza - a sua natureza

inquieta na busca da vida em sua boniteza.

Meu mar céu! Meu menino inconcluso...

veleiro na linha do horizonte a seu uso.

CAMILLA

Irisada luz a pousar no meu jardim

refletindo o mar do céu de mim

tantas vezes intocado namorado

hoje é farol na trilha de Camilla...

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LINDA ARIANA

Oi, doce alma perfumada

a descortinar a vida alada.

Segue, segue e enfrenta

o outono que se apresenta

em vinte e uma vidas existentes

do jardim à escola de tratar dentes,

da menina à exuberante mulher

que do amor extrai seiva se quiser.

Segue. Segue aprendendo linda ariana.

Lá do zodíaco o fogo por ti chama

e em chamas ardentes a Vida clama

teu crescer, teu florir em quem te ama.

LUZ

Vezes e vezes mais me apraz te agradecer!

Vezes e vezes mais você desdobra meu cais,

seja pelo navegar em novos horizontes mais,

ou por aportar-me viajante em meus vitrais.

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BOM DIA! SERÁ?

Pesadelo, ai! Meu sono feneceu...

peito apertado e em apelo o dia nasceu.

Então saí cedo com a alma dormente

pra respirar, ver, me procurando gente.

Vi o louco solto em si e o bêbado

a gritar que podia dirigir no feriado.

No passo da liberdade vi a ginga da capoeira

e os jovens de malas prontas fazendo zoeira.

Vi gente e gente mal encarada

senti medo d’alma irmã camarada.

Vi a prostituta indo embora,

senhora de si: sem hora...

Vi a sempre aberta Confeitaria das Famílias,

lá os namorados olhavam-se em ilhas...

Na porta a mulher parou e me encarou:

pedinte de beijo lhe ofereci um pão de queijo.

Vi a linda Catedral toda acordada

a acolher sua gente - eu a vi inaugurada!

Na adormecida Universidade fui breve,

coitada, vazia de gente e cheia de greve.

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Como eu, sem papel e lápis ela vaga na cidade,

vácuo de si mesma em essência e em verdade.

Ah, uma vontade de me escrever me invade!

Sento. Ando. Saio à procura de tudo e de nada.

Encontro o bom dia sem saber pra onde vai...

Vejo as flores e os amores, vejo a vida em ai.

MARCO

Sorriso de gato

hum, cheiro de mato...

ah, teu olhar irisado

a colorir o amor alado.

No astral leio e releio

e tuas palavras boleio.

Brincas, brincas sim.

Beija-me sem fim

entre as palavras

nuas sem travas...

Vôo no céu em arco

ali escrevo e marco.

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TEU PENSAMENTO

Teu pensamento não é meu,

há um mundo de amor só teu.

Meu desejo de saber e viver em ti

te acorrenta, pesa e me dispersa.

Teu dia, ah, teu dia que não é meu!

Há tanto a falar, ver e sentir só teu.

Meu pensar só sabe pensar em ti

te clama em poema – meu tema!

Teu passo não é meu.

Há todo um caminho só teu,

meu norte gira, gira e gira em ti.

Tropeço. Desconserto. Berro.

Teu dizer não é meu.

O mel escorre do lábio teu

a adoçar a flor que vive em ti.

Meu oceano seca, minh’alma disseca.

Teu florir vive num futuro que não é meu

e o perfume de toda flor se faz buquê teu!

Ah, sonhar poetinha! Encastela bela poesia em ti

a “enlaçar galhos e criar raízes”, à la Helena Kolody.

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AMOR

Sobre o amor dia a dia escrevi,

disforme, como pinceladas de Dali.

Sobre o amor dia a dia eu vivi

inteira! Não do sensual visto por aí.

Ai, amor, ai! Como você dói

e n’alma lentamente corrói

os dias e as noites também

sempre reclamando alguém.

Às vezes você se exibe e faz peripécia,

perfuma e enfeitiça toda a inércia.

Outras vezes é cego, surdo e burro

por não ver, ouvir e sentir o sussurro

bem ao pé do ouvido, bem na gota d’olhar

plantado bem no coração pra ama-durar...

Ei, amor! Vê se ouve e sente o toque da poesia,

quase prece de louvor que ama sem heresia.

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TEAR

nas relações de viver tecemos os teares

nas experiências tantas tecemos as cores

nas tramas benditas tecemos as formas

nos fios dos pensamentos tecemos as luzes

assim,

do concreto para o abstrato

do macro para a micra

vamos tecendo nosso extrato

e o humano à alma migra...

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D

E

CANTO

Decanto a cada dia...

O fruto farto fenece

e bem deitadinho fica

nesse amor em prece.

Se apresse! Se apresse!

Teu canto é decanto meu

separa e mistura a gente

destil’amor n’aguardente.

Dá-me um gole, peço!

E de soco olhe de uma só vez

o lugar, o meu lugar no canto

apertado, funilado pelo pranto

que sufoca e limita meu passo

a passo nesse teu olhar de aço.

Sei bem tens teu canto! E eu

D

E

CANTO

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CONSTANTINOPLA

Está difícil de desdoer.

Dor de Constantinopla,

vem, e lá n’alma acopla

a queda do meu dizer...

Dizer de amor e de paixão

absoluta que não mais luta,

e sem força vai ao chão,

tomada e tombada é nula.

Ah, minha Constantinopla!

Arte e canção. O doce d’ontem,

amarga hoje a tua obra

nesse vai e vem de ninguém...

Terra. Minha terra, meu porto

nada seguro. Busquei a muralha!

Busquei descanso em teu horto

e lá dormi o sono que agasalha.

Terra falha. Fala comigo, fala!

Vive uma vez mais no bizantino

mar e faz desdoer por Alá,

esse amor Presente, meu destino.

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ARTISTA

És flor que desabrocha

em fortaleza de rocha.

Tuas pétalas a desfolhar são sementes a plantar

o amor de fazer gente...

E mais gente, bem quente!

Livre, escolheu fazer o que ama.

N’alma desenha a vida e chama

e inflama toda a artista tua

pondo-te no colo nu da rua,

da vida crua e nua, toda pura,

desenhada pra você crescer sua.

ANA NISIO

Teu nome é desenho

de artístico engenho.

Tu'alma é só sorriso,

pra arte o paradiso!

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TENSA

Fico aqui pensando em uma rima pra tensa.

Verso no vazio na minha cabeça que pensa,

pensa e pensa tensa na minh’alma de criança

que pede pra crescer e entender esta pujança

que vive no seio do riso frio, escarpado pelo mentir,

que de tanto existir, assalta a verdade na boca do sorrir

e mente à mente pra assaltar o amor na boca do falar,

onde tudo vira ar sem aderência, sem a coerência do amar.

Fiquei tensa! Ou, estou tensa, não sei mais,

você sabe? Não de mim, mas de você! Sabe?

Confuso? Pois é assim esse (i) mundo – bruto,

acho que tensa é verbo e rima bem com luto.

- Ah, que diferença faz pra gramática

eu ficar ou estar tensa tendo o olhar poente?

- A mentira no seu uso abuso é enfática,

chega na mente e diz à verdade que é semente...

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SER POETA

Precisei ficar bem poeta pra compreender

a vida que veio viver em mim .

Precisei ficar bem espertinha

pra esmiuçar a alma e ver o que tinha.

Descobertas fiz e desfiz e nesse vai e vem

de ver prá lá e pra cá de doido bem doído

me vi viva pra morrer bem zé ninguém!

- Ser na vida alguém. Quem?

Desse lugar não lugar quero distância,

porque vai indo, vai indo, há distancia!

Por tanto viver a vida e vê-la mudar

nesse pique-esconde de brincar de amar

precisei ficar poeta pra padecer e crescer.

Assim também é com você que pensa viver

e viver pensa... repensa vai! Dobre-se mais

em seus ais, seja poeta! Seja paz...

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DOIS AN.J.OS

O tempo viaja no vagão dos anos.

Vagão nada! Veleiro de anjos...

Abarca cem tempos a viagem

e tudo mais é bagagem...

VIDA EM TEMPO

Fui até o tempo te buscar

e cheguei a tempo

de viver meu invento:

- tento...

- tento... - tento...

.

.

.

agüento

não,

perdão!

BRINCADEIRA!

A vida, a vida abrincalha com a gente!

Toda céu abre a boca e rebola e em umbigos

faz nascer, e como enrola... oras bolas!

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JANSKE

"Ídala"

Agradeço ver, ouvir e sentir teu amor...

Agradeço ter, ser e escrever teu "EU".

Que fiz eu pra merecer estar - bem estar,

nesse teu mundo todo culto - oculto?

Nossas mãos versam e em sincronia

deslizam, escorregam toda a poesia.

Nem minha, nem tua, porque como

o filho que nasce, ela vai pra rua...

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INVENTO

Janske Niemann Schlenker – “Idala”

Eliane Martins – “Elianídala”).

O tempo passa e vão passando os anos:

ao embalar meus sonhos levianos,

o antigo amor, eu penso que 'inda cresce.

Talvez um dia você traga rosas;

na espera, invento frases carinhosas

que eu gostaria que você dissesse...

Invento! Invento e tenho

você bem aqui a tempo

daquele beijo airado

prometido e anunciado

na boca e n'alma ardendo

todas aquelas frases dizendo

nossos segredos de amor

lábio a lábio a brotar a flor.

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VOU REMANDO

Janske Niemann Schlenker – “Idala”

Eliane Martins – “Elianídala”

Singro as águas limpas e tranquilas,

as tormentas, eu não quero ouvi-las.

Vou remando, qual brisa fosse

num amor que é cada vez mais doce,

este amor, que é tudo o que restou

na canoa que não naufragou...

Singro mais e mais e de cais em cais

alço minha fria âncora encharcada...

Chorada por mais querer outra margem.

Por mais querer amar você inda assim

em névoa, em tormenta, vida e fim

a singrar nosso tinto buquê além mar...

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TEU SONO

Janske Niemann Schlenker – “Idala”

Eliane Martins – “Elianídala”

Amo esse teu sono profundo

porque te deixa indefeso.

Amo a inocência desse sono

que te torna inatingível.

Saber-te inatingível

não me deixa triste

porque nessa hora

não és de ninguém,

nem meu...

meu sono também já se foi

mas o que é importante é

que permaneça o amor.

Ah, brincadeira de criança!

Roubo a inocência e cuido

de ti, ali tão somente teu,

sem pecado e sem malícia

tudo a tua volta é carícia.

Brigo com nada, silencio,

faço guerra, aceno o lenço.

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A paz precisa estar dormindo

dentro da gente. Assim quando

precisar, ela estará por perto

e nesse instante me faço verbo:

Porque nessa hora

não és de ninguém,

nem meu meu bem

e meu mau também.

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MARGEM

Eis que chego na margem

visto então minha passagem.

Diz ela entre e fique a vontade

ou, vai-se embora a vontade...

Inspirações outras tantas

vi travessias e esperanças

hoje é minha a passagem

temo eu na outra margem...

Temo eu? Sim e não. Esquisito!

E´ mesmo assim e meio duvido

do inicio enfim. Maluca passagem

nem pé nem cabeça, só margem...

Melhor mesmo é singrar sem cortar.

Melhor mesmo é voar sem volatizar.

Atravessar sem machucar o margear

e rimar e remar e amar sem sangrar.

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VOCE SEMPRE

Você sempre inventando moda

e ainda moda com viola.

Fica aí me tecendo princesa,

você é sempre luz acesa...

Você sempre é lago

abre teu sorrir largo

pra princesa ou plebeia

voce é sempre platéia...

Você sempre aplaudindo

- entusiasta curtindo -

é poeta e brinca de barão,

você sempre é mais irmão!

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ABRAÇO JANGADEIRO

Solta na paisagem lá de fora

olho para o tempo que doura

os minutos findos para partir

do ponto onde estou e seguir.

Rouba-me desse instante um eco

a barulhar ao longe e logo perto,

o santo, santo desatino de mulher

a vestir-se nua-crua porque quer...

Grita, grita mais e explode teus ais!

Senta aqui e ocupa o vazio de mim.

Em calma cala em meu abraço cetim

e aquece tal qual tua poesia e haicais.

Ai! Tempo de mim a esbarrar em vidas...

Tão rápido. Tão intenso. Tão verdadeiro.

Abruptas amigas nesse abraço jangadeiro,

s igamos viagem, velas erguidas e absolvidas...

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HOMOTEOCÁRDIO

Lindo!

Homoteocárdio

!odniL

Lindo!

Homem<Deus>Coração

!odniL

Homoteocárdio:

Homem que liga Deus ao coração.

Lindo! . !odniL

.

.

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é....

a vida ajeita as entrelinhas, nos faz costurar

sentidos e sentimentos escolhendo a linha:

- Pena que para tanto seja imperativo ferir...

é...

a vida nada simples, nos faz trovejar,

chovendo ebulições pra desaguar:

- Pena que para tanto seja imperativo parar...

é...

a vida culpada de tudo, inocente de nada,

Ilumina e apaga e na multidão é vaga...

- Pena que para tanto seja imperativo morrer...

pra viver...

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QUERO

Fim de ano melancólico:

alcoólico! Doente coração

sente na linha fina o fim.

E onde fica a festa? Nesta,

quero gritar embriagada,

abrir essa boca malcriada,

minha boca antes beijada

hoje morre travada de raiva.

Morrem as palavras de amor.

Morrem os risos doídos, bem

vindos lá dos fundos da barriga,

que vibra, ama e goza...

Quero dizer e nada digo, quero

sentir nada; mas sinto! Quero

o amor malucando na avenida,

quero desse avesso o começo.

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de repente o escuro,

o nada...

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de repente a luz,

a palavra...

TIC TAC TIC TAC

Talvez no começo do começo eu encontre o meu avesso.

Talvez no começo prá lá do começo, o meu eu travesso desnude

e inunde todo o meu ser. Sei lá, o todo é sempre entre um

segundo, um minuto, uma hora, uma vida – um novo começo...

O fim de mim começa já... tic tac tic tac tic tac...

Deixo o tempo dizer-me. Deixo tudo fluir da mente para

meu corpo inerte - posto neste papel doando e doendo a minha

mão acocada neste lápis, abraçada aos meus dedos largados,

numa única vez, num único som de escrever.

Um minuto passa... Um minuto nessa gélida e solitária

madrugada bordada na fina renda da vida, assim como essa

minha mente que pede para abrir-se e escrever, escrever e

descrever esses derradeiros minutos de tempo – já sem tempo...

Os carros discutem lá fora entre as ruas e as vielas

nervosas com seus motores barulhentos. O universo é briguento

e quer dizer a todo tempo que é paz e silêncio. Ah, mentira

absoluta! Resoluta mentira dessa luta!

Fora de mim corro pra dentro de mim, dó de mim. Meu

eu pensa sobre o nada... Corre com os cabelos chicoteando o

vento e clamando por paz e pela alegria que finda e cerra meus

lábios. Meus músculos dantes jovenzinhos, relaxados e suaves,

hoje marcam caminhos profundos nesse meu rosto impactado...

reencaminhando vezes e vezes o tempo e a vida.

Falo, falo, e falho. Corro nessa ponta de lápis

desapontada... Corro solta na vida e da vida. Ela quer viver-me

nesse convite diário e temporário... Ela me manda aprender a

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transformar meus pensamentos num amadurar florido, como

delicioso fruto e oferecer-me doce em sabor ao vigor e rigor do

tempo para durar mais tempo – ela sem hora, eu, hora à hora:

tic tac tic tac...

Amadurar. Amadurar não tão somente no seio do mel

mas também aos pés do fel. Amadurar. Amadurar neste tempo

e espaço, neste corpo aceso ao compasso do cansaço. Ouço meu

passo amadurar na marola do mar, na troca do abraço, no

alvoroço das areias...

Sempre e sempre amadurar - é lei! É rei em seu destino

donde o maior desatino é: a-ma-du-rar (amar e durar). Seja

na loucura do amar, no despertar do olhar ou no riso do fartar

na boca que engole o tempo e mastiga as horas incorrendo ou

correndo pra mim ou pra você. Ah, é certo, lá estará a vida

ditando:

- AMADURAR!

Ouço nesse instante o acolhimento de mim. Ouço o

recolhimento deste lápis descrito no cansaço desse meu tempo

de amadurar eternamente in natura.... tic tac tic tac tic TAC.

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Meu beijo estacionado paira...

Sigo viagem

eliane MARtins

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