“Foram os livros que escrevi que me fizeram O espaço ... · PDF file 2...
date post
28-Jan-2019Category
Documents
view
220download
0
Embed Size (px)
Transcript of “Foram os livros que escrevi que me fizeram O espaço ... · PDF file 2...
1
PONTIFCIA UNIVERSIDADE CATLICA DO RIO GRANDE DO SUL FACULDADE DE LETRAS
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM LETRAS
Foram os livros que escrevi que me fizeram
O espao autobiogrfico de Jos Saramago
Paloma Esteves Laitano
Prof. Dr. Noelci Fagundes da Rocha
(Sissa Jacoby)
Orientadora
Instituio depositria:
Biblioteca Central Irmo Jos Oto
Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul
Porto Alegre
2014
2
FORAM OS LIVROS QUE ESCREVI QUE ME
FIZERAM.
O espao autobiogrfico de Jos Saramago
Paloma Esteves Laitano
Tese apresentada como requisito parcial para obteno do
ttulo de Doutor pelo Programa de Ps-Graduao em
Letras, na rea de concentrao de Teoria da Literatura, da
Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul.
Prof. Dr. Noelci Fagundes da Rocha
Sissa Jacoby
Orientadora
Porto Alegre
2014
3
L185f Laitano, Paloma Esteves Foram os livros que escrevi que me fizeram. O espao
autobiogrfico de Jos Saramago / Paloma Esteves Laitano / Porto Alegre, 2014.
185f. Tese (Doutorado em Letras) Faculdade de Letras, Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul, PUCRS Orientadora: Prof Dr Noelci Fagundes da Rocha 1. Teoria Literria. 2. Literatura Portuguesa. I. Fagundes da Rocha, Noelci. II. Ttulo.
CDD 801.869
4
AGRADECIMENTOS
minha famlia, por me apoiar e por compreender os
momentos de ausncia.
minha orientadora, professora Dr. Sissa Jacoby,
pela orientao e amizade e por me acompanhar e
incentivar h tantos anos, na vida acadmica e fora
dela.
Aos meus amigos, pelo apoio constante e por, mesmo
longe, estarem sempre to presentes.
Aos colegas do doutorado, pela troca de experincias.
professora Dr. Ana Paula Arnaut, pela orientao
durante o doutorado-sanduche.
Ao CNPq, pela bolsa no perodo 2010/2013.
CAPES, pela bolsa de doutorado-sanduche.
5
Trabalho que se comea, acaba-se,
a chuva molha, mas ossos no parte.
(Jos Saramago, As pequenas memrias)
6
RESUMO
O presente estudo buscou delimitar o espao autobiogrfico de Jos
Saramago atravs da identificao da manifestao da subjetividade presente
em suas crnicas, seu livro de memrias (literatura confessional) e seus
romances (literatura ficcional). A anlise dos textos que compem o corpus
privilegiou passagens de cada uma das obras, relacionadas com trs ncleos
temticos que nortearam o trabalho: homem/ideologia, homem/passado e
homem/literatura. Com base, especialmente, nas formulaes tericas de
Paul Ricoeur e Javier del Prado Biezma, o estudo identificou campos
temticos recorrentes nas narrativas e marcas estruturais deixadas pelo Eu
nos textos. Esses aspectos possibilitaram o rastreamento da presena do
sujeito que se expressa atravs da escrita e, assim, a definio de um espao
autobiogrfico saramaguiano.
PALAVRAS-CHAVE
Jos Saramago; Crnica; Memrias; Romance; Espao autobiogrfico
7
ABSTRACT
This study aims to define the Jos Saramagos autobiographical space by
identifying the expression of subjectivity present in his chronicles, his
memoir (confessional literature) and his novels (fictional literature) of the
portuguese writer. The analysis of the texts that make up the corpus has
privileged, from each one of the texts, which can be related with three
themes: man/ideology, man/past and man/literature. Based on the
theoretical formulations, especially the ones by Paul Ricoeur and Javier
del Prado Biezma, this study demonstrates the identification of recurrent
thematic fields in the narrative and structural marks left by the Self in the
texts. These aspects made it possible to trace the presence of the subject that
is expressed through writing and also the definition of a Saramagos
autobiographical space.
KEYWORDS
Jos Saramago; Chronicle; Memories; Novel; Autobiographical space
8
LISTA DE SIGLAS
AMRR O ano da morte de Ricardo Reis
BV A bagagem do viajante
CV A caverna
DMO Deste mundo e do outro
ESC Ensaio sobre a cegueira
ESJC O Evangelho segundo Jesus Cristo
ESL Ensaio sobre a lucidez
HD O homem duplicado
HCL Histria do cerco de Lisboa
IM As intermitncias da morte
JP A jangada de pedra
LC Levantado do cho
MC Memorial do convento
MPC Manual de pintura e caligrafia
PM As pequenas memrias
TN Todos os nomes
TP Terra do pecado
VE A viagem do elefante
9
SUMRIO
1 CADA LIVRO LEVA UMA PESSOA DENTRO ....................................... 10
1.1 Eu vivo desassossegado, escrevo para desassossegar....................................... 16
1.2 O que eu quero saber, no fundo, o que isto de ser-se um ser humano ......... 37
2 A GENTE, NA VERDADE, HABITA UMA MEMRIA.............................. 49
2.1 O homem mais sbio que conheci em toda a minha vida no sabia nem ler
nem escrever ...................................................................................................... 63
2.2 As memrias pequenas de quando fui pequeno, simplesmente......................... 91
2.3 A literatura o resultado de um dilogo de algum consigo mesmo............... 113
3 H IMAGENS QUE FICAM......................................................................... 127
3.1 Ns somos o que somos mas tambm somos aquilo que fazemos.................. 128
3.2 As falsas memrias no existem..................................................................... 142
3.3 Cada livro escreve sempre o mesmo autor..................................................... 150
4 O ESPAO AUTOBIOGRFICO SARAMAGUIANO ............................... 165
5 REFERNCIAS................................................................................................. 177
10
1 CADA LIVRO LEVA UMA PESSOA DENTRO
sempre foram caladas as minhas alegrias, e por
isso no soltei os gritos que me estavam no
peito, que at hoje no pude deixar sair
Jos Saramago
Philippe Lejeune, ao declarar que um autor no uma pessoa, e sim
uma pessoa que escreve e publica, dialoga com a fala de Jos Saramago,
que d ttulo a este captulo. A relao entre as duas sentenas nos permite
corroborar a afirmao de que o autor uma pessoa real e socialmente
responsvel (LEJEUNE, 2009:23), que est implicada no discurso por ele
produzido.
Essa implicao do Eu-autor no texto norteia as discusses de Lejeune
sobre a relao existe entre autobiografia e fico. Em O pacto
autobiogrfico de Rousseau internet, ao refletir sobre a questo de qual
texto seria mais verdadeiro no que tange ao testemunho da vida do sujeito,
Lejeune faz referncia a uma verdade pessoal, ntima do autor (2008:42).
Partindo da anlise das obras de Andr Gide e Franois Mauriac e das
declaraes de ambos os autores sobre seus textos autobiogrficos e
ficcionais, Lejeune conclui que no possvel definir qual texto mais
11
verdadeiro autobiografia ou romance, pois autobiografia faltariam a
complexidade, a ambiguidade (2008:43) e, por outro lado, ao romance, a
exatido. Assim, para Lejeune,
O que revelador o espao no qual se inscrevem as duas
categorias de textos, que no pode ser reduzido a nenhuma
delas. Esse efeito de relevo obtido por esse processo a
criao, para o leitor, de um espao autobiogrfico
(2008:43).
a partir do dilogo entre dois ou mais textos de um mesmo escritor
que Lejeune fala da criao de um espao autobiogrfico, no qual possvel
vislumbrar a produo de uma imagem do Eu-autor. Lejeune, no entanto,
no explicita como esse espao se configura, mas apresenta o conceito e
oferece elementos a partir dos quais outros estudiosos buscam construir uma
definio, exerccio que se configura especialmente importante para o nosso
estudo.
Javier del Prado Biezma, em Autobiografa y modernidad literria,
parte do pacto autobiogrfico de Lejeune para definir o que, no seu
entendimento, constitui o espao autobiogrfico. Segundo Prado Biezma,
uma determinada obra pode compor esse espao quando estabelecido, entre
leitor e autor, o pacto autobiogrfico, ou seja, o pacto de leitura. No entanto,
esse contrato apresenta-se de forma diferente daquela proposta por Lejeune,
uma vez que
12
Aqu ya no se exige que est explcito, ni siquiera implcito,
sino que basta que est supuesto o, para ser ms precisos,
basta con que sea virtual, es decir, con que pueda llegar a
establecerse, si el lector acepta como signos de identidad de
las tres instancias (autor, narrador, personaje pr