Formação de leitor de textos literários

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Formação de leitor de textos literários Carmem Eliana Garcia 1 Neusa Helena Mantovani Baldissera 2 Resumo: Neste artigo apresentamos uma visão panorâmica a respeito da formação de leitor de textos literários, partindo da compreensão e reflexão sobre o letramento literário e sua influência no trabalho com a leitura nas escolas, destacando o contributo desse tipo de leitura na formação de um aluno leitor e relevando a importância de um professor também leitor. Para além, trazemos algumas noções de gênero literário, por meio de um breve percurso histórico, ressaltando as marcas constitutivas dos gêneros e de que forma se apresentam como construção de sentidos dos textos. Discutimos a importância dessas noções na didatização da ação do professor de leitura literária. Encerramos com uma pequena abordagem a respeito das orientações contidas nos documentos oficiais acerca do trabalho com a literatura escolar. Palavras-chave: letramento literário; aluno/professor leitor; gêneros literários; orientações oficiais. Introdução A leitura tem sido um dos principais objetos de estudo no foco educativo, havendo uma notável preocupação com a redefinição das políticas educativas na sociedade contemporânea. Embora reconheçamos a potencialidade das inúmeras investigações sobre a relevância da leitura, sob as 1 Professora da rede estadual e da E.M. Parque São Carlos. Mestranda PROFLETRAS/UFMS/CPTL 2 Professora da rede estadual e da E.M. Prof. Odeir Antônio da Silva. Mestranda PROFLETRAS/UFMS/CPTL

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Neste artigo apresentamos uma visão panorâmica a respeito da formação de leitor de textos literários, partindo da compreensão e reflexão sobre o letramento literário e sua influência no trabalho com a leitura nas escolas, destacando o contributo desse tipo de leitura na formação de um aluno leitor e relevando a importância de um professor também leitor. Para além, trazemos algumas noções de gênero literário, por meio de um breve percurso histórico, ressaltando as marcas constitutivas dos gêneros e de que forma se apresentam como construção de sentidos dos textos. Discutimos a importância dessas noções na didatização da ação do professor de leitura literária. Encerramos com uma pequena abordagem a respeito das orientações contidas nos documentos oficiais acerca do trabalho com a literatura escolar

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Formao de leitor de textos literrios

Formao de leitor de textos literrios

Carmem Eliana Garcia

Neusa Helena Mantovani Baldissera

Resumo:

Neste artigo apresentamos uma viso panormica a respeito da formao de leitor de textos literrios, partindo da compreenso e reflexo sobre o letramento literrio e sua influncia no trabalho com a leitura nas escolas, destacando o contributo desse tipo de leitura na formao de um aluno leitor e relevando a importncia de um professor tambm leitor. Para alm, trazemos algumas noes de gnero literrio, por meio de um breve percurso histrico, ressaltando as marcas constitutivas dos gneros e de que forma se apresentam como construo de sentidos dos textos. Discutimos a importncia dessas noes na didatizao da ao do professor de leitura literria. Encerramos com uma pequena abordagem a respeito das orientaes contidas nos documentos oficiais acerca do trabalho com a literatura escolar.

Palavras-chave: letramento literrio; aluno/professor leitor; gneros literrios; orientaes oficiais.

Introduo A leitura tem sido um dos principais objetos de estudo no foco educativo, havendo uma notvel preocupao com a redefinio das polticas educativas na sociedade contempornea. Embora reconheamos a potencialidade das inmeras investigaes sobre a relevncia da leitura, sob as mais diversas formas de trabalho - livros, artigos, teses, dissertaes, percebemos que muito ainda h de se fazer. Antunes (2003) diz que o trabalho com a leitura no contexto de sala de aula ineficaz, as atividades de leitura so centradas apenas na decodificao, desvinculadas dos usos sociais, ou seja, so escolarizadas; a compreenso centra-se apenas no co-texto, no sendo capaz de suscitar a compreenso de sua funcionalidade. Por outro lado, Bordini e Aguiar (1993, p.15) clarificam que a formao do leitor de literatura no pode ser idntica a do leitor genrico ou pragmtico. Isso porque ao decifrar os sentidos de um texto literrio eles (os sentidos) no revelam assunto pacfico entre emissor e receptor, podendo haver, com isso, diferenas de entendimento do texto na sua produo e recepo". (BORDINI; AGUIAR, 1993, p. 15).

Assim, a leitura reconhecida como a responsvel pelo desenvolvimento de nossas capacidades intelectuais e de linguagem, mas a leitura literria a responsvel pela ampliao de nossa viso de mundo e da nossa personalidade, podemos afirmar que a leitura literria ao mesmo tempo uma forma de aprendizagem e um "elemento humanitrio" pessoal, pois o trabalho sobre a linguagem o trabalho sobre o homem. (BAMBERGER, 1977, p. 12). Entretanto, o trabalho com a leitura literria no simples, ao contrrio, complexa e implica diversas operaes e um vasto conjunto de conhecimentos estando subjacente a processos cognitivos de vrias ordens, que vo da decodificao e compreenso, ampliando-se a cada etapa do desenvolvimento humano e a cada experincia literria.

Embora reconheamos a importncia da leitura de modo geral, importa, neste trabalho, a leitura de textos literrios. Bamberger (1977) j reconhecia em Como incentivar o hbito da leitura que o interesse pela tecnologia, os estmulos visuais de revistas ilustradas, as imagens pelo meio de comunicao de massas poderiam levar regresso da linguagem. Os pressupostos desse autor parecem se concretizar diante da tecnologia que vem caracterizando o mundo contemporneo. Na nsia de se adequar s novas exigncias frente a um mundo globalizado, profissionais dos mais diversos ramos do conhecimento procuram atualizao constante. No mbito da educao, a busca por mudanas promovidas pelos avanos tecnolgicos contrapem-se busca pela formao do elemento humanitrio. O professor, diante de diversos recursos miditicos, ocupa-se da multimodalidade, no como um aspecto a mais na formao de seu aluno, mas como um aspecto que lhe tira o direito de desenvolver suas capacidades intelectuais e espirituais e que poderiam ajud-los a dominar os problemas ticos, morais, sociais, polticos da vida, desenvolvendo a personalidade e levando os jovens a estabelecerem um conceito global do mundo (BAMBERGER, 1977, p. 13). O que s possvel pela leitura de textos literrios. A literatura literria , para esse autor, uma busca alm da realidade, a procura do significado interno, o reconhecimento do tpico no acontecimento cotidiano. Quando pensamos num bom leitor, acode-nos a mente o leitor literrio, para o qual a leitura uma experincia esttica (BAMBERGER, 1977, p. 45).

Na dcada de 1990, a expresso letramento literrio surge para dar conta da importncia do ato de ler livros literrios, a fim de se formar e cultivar tanto no aluno quanto no professor a descoberta de sentidos somente oferecidos pela leitura da literatura, j que o letramento literrio uma prtica social, portanto, responsabilidade da escola. Lajolo (1994) se refere ao ensino da Literatura na escola como uma atividade que vise a escolarizar sem descaracterizar numa referncia ao papel da escola na formao de leitores de textos literrios. Essa formao, no entanto, s se concretizar se a escola estabelecer o vnculo entre a cultura de seu aluno e o texto literrio, para isso necessrio que o professor seja um leitor capaz de promover essa mediao (leitor-texto-autor), considerando, inicialmente, os interesses do aluno, para, a partir do domnio do objeto a ser ensinado, adotar uma metodologia adequada a esses interesses.

De importncia fundamental o estudo da problemtica dos gneros literrios, pois os pensamentos literrios revelados pela histria do suporte compreenso atual, revelando suas marcas na construo de sentidos dos textos, apesar dos estudos controversos no se pode negar que ao longo dos sculos a tradicional tripartio: lrica, pica ou drama, ou se altera ou d origem a novas formas, ou seja, acompanham a evoluo humana e social.

1 Letramento sob o enfoque da Literatura: letramento literrio Para compreender o que o letramento literrio, baseamo-nos no pensamento de Cosson (2009) a respeito da concepo de linguagem. Para este autor, somos uma mistura de vrios corpos que precisam ser exercitados. Refere-se o autor aos corpos linguagem, sentimento e imaginrio, que se unem ao corpo fsico, fazendo-nos humanos, sendo o corpo linguagem aquele que tem um funcionamento especial, pois por meio dele que o homem se reconhece como ser humano e medida que o exercita, seja por meio da fala ou da escrita, exercita a sua linguagem.

Para Cosson (2009), a linguagem a expresso do mundo, assim, o modo e a proporo com que a exercitamos demonstram o nosso ser; conforme mais ela se amplia maior o meu corpo linguagem e, por extenso, maior o meu mundo. (COSSON, 2009, p.16). A ao de cada ser depende da intensidade com que a linguagem exercitada por meio das palavras. Essas palavras esto presentes na sociedade da qual todos fazemos parte, portanto no pertencem a ningum em especial. No entanto, dentre as diversas possibilidades de se usar a linguagem, h uma que ocupa papel central a escrita. Ao registrar a palavra pelo cdigo escrito, ou seja, transformar em palavras o que foi provocado por palavras (LAJOLO, 1994), temos documentada e conservada a expresso do contedo de conscincia humana individual e social de modo cumulativo.

Isso implica dizer que o corpo linguagem, por meio da palavra e da escrita encontra na Literatura o seu mais perfeito exerccio (COSSON, 2009, p.16), sendo a palavra a constituio material da Literatura e a escrita seu veculo predominante. A Literatura, dessa forma, passa a ser a explorao das potencialidades da linguagem, pois seja pela leitura ou pela escritura, leva-nos a dizer o mundo; trata-se, portanto, de uma prtica fundamental que desvela a arbitrariedade das regras impostas pelos discursos padronizados da sociedade letrada e se constri um mundo prprio de se fazer dono da linguagem, que sendo minha de todos. (COSSON, 2009, p. 16). dessa forma que se ampliam nossos conhecimentos, permitindo-nos compreender nosso papel como sujeitos sociais e histricos.

Isso ocorre porque a Literatura tem vrios artifcios, segundo Bordini e Aguiar (1993): guarda em si o presente, o passado e o futuro da palavra, trazendo em seu mbito amplas funes - rompe com os limites do tempo e do espao, pois ao decifrar o texto, o leitor estabelece elos com as manifestaes socioculturais que lhe so distantes no espao e no tempo; leva-nos a renunciar nossa prpria identidade, pois no dilogo estabelecido entre leitor e produtor, o sujeito obriga-se a descobrir sentido e a tomar posies, efetivando-se uma socializao por meio da obra lida; uma experincia a ser realizada, pois o leitor penetrar na obra de diferentes maneiras, explorando-a sob os mais diferentes aspectos; desenvolve a explorao de diferentes seres e culturas, medida que estabelecem vnculos entre o leitor e os outros homens; incentiva-nos a expressar o mundo por ns mesmos, j que um sistema vivo que age sobre ns, cabendo-nos decifr-la, aceitando-a, rejeitando-a ou deformando-a, revela, enfim, o que pensamos e o que somos. A Literatura assim, humanizadora, socializadora e formadora. (CNDIDO, 1995).

Formadora, porque ao promover a interao mediada pela linguagem, receptiva e criadora, essa troca entre leitor e produtor favorece a formao literria, ordenando o pensamento humano no presente, passado e futuro; socializadora, porque favorecem trocas comunicativas entre grupos sociais, com diferentes leituras e diferentes avaliaes, unificando e aproximando o homem no tempo e no espao; humanizadora, porque pe em circulao o sentido humano, desenvolvendo em ns a quota de humanidade na medida em que nos torna mais compreensivos e abertos para a natureza, a sociedade, o semelhante. (CNDIDO, 1995, p. 249). Contudo, para que a Literatura cumpra suas funes, necessrio promover o letramento literrio, mudando os rumos da escolarizao na formao de leitores de textos literrios. A escola tem demonstrado preocupao com a leitura de modo geral, mas o texto literrio que o faz de forma mais abrangente, levando-nos a uma tomada de conscincia do mundo concreto que se caracteriza pelo sentido humano, dado a esse mundo por um determinado autor, e a sua ausncia nos programas escolares conduzem-na a um sentido negativo, distanciando os valores literrios e desconstruindo a identidade escolar da literatura, seja como prtica social, formadora ou humanizadora.

Dessa forma, conforme Bordini e Aguiar (1993, p. 14) medida que ouve ou l, cada leitor cria sua prpria regra comunicativa, estabelecendo um pacto entre ele e o autor, onde a presena do contexto dispensvel. Estabelece-se a um jogo no qual o leitor entra, pe sua realidade de lado e passa a viver imaginativamente todas as vicissitudes das personagens. Aceita o mundo criado como um mundo possvel para si, no qual os objetos e processos nem sempre apacerem totalmente delineados. Esse mundo envolve lacunas que sero preenchidas pelo leitor, conforme sua experincia

Na escola, a leitura literria tem a funo de nos ajudar a ler melhor, no apenas porque possibilita a criao do hbito de leitura ou porque seja prazerosa, sim, e sobretudo, porque nos fornece, como nenhum outro tipo de leitura faz, os instrumentos necessrios para conhecer e articular com proficincia o mundo feito de linguagem (COSSON, 2009, p. 30).

E inegvel que a leitura de modo geral muito importante, mas a leitura literria a nica capaz de mobilizar intensamente a conscincia do leitor, despreendendo-o do cotidiano. Por outro lado, o leitor, ao participar da construo das informaes trazidas pelo texto literrio, levado a reexaminar sua prpria viso da realidade. Considerando que a escola uma instituio de letramento, deve haver nela prticas que envolvam a leitura de textos literrios e que situem o aluno a compreender o mundo literrio por meio da experincia esttica e noes de literariedade. E isso uma importante funo do docente. Cabe a ele formar leitores, que [...] necessitam descobrir e respeitar o outro, conscientizando-se da importncia das diferenas e da diversidade como elementos constuidores do quadro das relaes sociais (OLIVEIRA, 2010, p. 24).

No entanto, nenhum professor ser capaz de desenvolver em suas aulas um trabalho sistemtico de leitura de textos literrios, voltados formao de leitores, se ele mesmo no for um leitor, no tiver conhecimento fundamentado capaz de aliar coerentemente teoria e prtica de leitura literria.2. O papel do professor na formao de alunos leitores de textos literrios

Ao pensarmos no mbito da escolarizao e do ensino da Literatura na escola, devemos considerar alguns elementos h muito elencados como prioritrios para o ensino e aprendizagem eficazes da Literatura. Segundo Bordini e Aguiar (1993) so os seguintes elementos: uma biblioteca com amplo acervo na rea da Literatura, inclusive com bibliotecrios capazes de fomentar o ato de ler; professores leitores, com slida fundamentao terica e metodolgica e um programa de ensino que valorize a Literatura. Conhecedores da realidade, com excees que deveriam ser a regra, acreditamos que o papel do professor , sem dvida, a essncia no sentido de formar alunos leitores. Se o professor tiver o conhecimento cientfico do objeto e da prtica que nortearo seu trabalho, grande parte do caminho na formao de alunos leitores j est estabelecido.

No ensino fundamental, o que se v a leitura por meio dos gneros textuais ou excertos literrios. Considera-se a que a Literatura parece no oferecer parmetro nem para a lngua padro nem para a formao do leitor, pois no explorada em sua significao cultural. Trechos dos mais variados gneros textuais so utilizados para atividades voltadas para o estudo da lngua.

No ensino mdio, limita-se historicidade do estilo de poca. Surgem trechos literrios focados no aspecto estrutural. Ou seja, o aluno, tanto no ensino fundamental como no ensino mdio, no levado leitura de textos literrios. Alm disso, h ainda os extremos: aqueles que consideram que o importante que o aluno leia, no importa o que nem como. Essas situaes so consideradas por Cosson (2009) como a falncia da literatura, pois como vem sendo aplicada nos limites escolares, no garante suas primordiais funes. E para garanti-las, deve-se, necessariamente, passar pela construo e reconstruo da palavra, permitindo que a leitura literria seja exercida sem abandono do prazer, mas com o compromisso de conhecimento que todo saber exige. (LAJOLO, 1994). A execuo da tarefa de formar alunos leitores depende da concepo de leitura como uma atividade propiciadora de uma experincia nica com o texto literrio. (ZILBERMAN, 1990, p.18).

Isso significa que se se tem em mente a formao de leitor de textos literrios, devem ser considerados alguns aspectos, tais como, conhecer, inicialmente quais so os interesses e motivaes do aluno diante da leitura, pois Se quisermos cultivar a leitura literria precisamos lembrar-nos de que a literatura oferece possibilidades suficientes para que cada leitor recorra a ela de acordo com suas necessidades e seus mtodos, e que devemos ser cautelosos ao ajudar o leitor a descobrir seu mtodo. (BAMBERGER, 1977, p.46). Outro fator essencial que a leitura seja efetiva e sistemtica, ou seja, que a leitura seja promovida em todos os nveis de escolaridade, segundo uma ordenao sequencial, planejada e organizada adequadamente a cada etapa, partindo da mais simples a mais complexa; os livros selecionados devem levar em conta a realidade do leitor, considerando na atividade a idade da leitura, contedo e tema, numa relao leitor-obra-autor, que se realiza sempre a partir de um horizonte de expectativas. (BORDINI; AGUIAR, 1993, p. 31).

Outro fator importante a proposta metodolgica adotada pelo professor, que, respaldada em uma teoria, no restrinja o estudo da literatura a ela mesma, como universo fechado, mas que reafirme a dimenso ldica do ato de ler o texto literrio aliado ao compromisso do conhecimento. Esses aspectos levam a formao do letramento literrio.

A formao escolar do leitor passa pelo crivo da cultura em que se enquadra. Se a escola no efetua esse vnculo entre cultura grupal ou de classe e o texto a ser lido, o aluno no se reconhece na obra, porque a realidade representada no lhe diz respeito. (BORDINI; AGUIAR, 1993, p. 16).

A formao de um aluno leitor de textos literrios s ocorrer se o professor for tambm

leitor. Para Lajolo (1994, p. 21) esse professor

deve estar familiarizado com uma leitura bastante extensa de literatura, particularmente da brasileira, da portuguesa, da africana de expresso portuguesa. Frequentador assduo dos clssicos, sua opo pelos contemporneos, pelas crnicas curtas ou pelos textos infantis deve ser, quando for o caso, mera preferncia. Em outras palavras: [...] pode no gostar de Cames nem de Machado de Assis. Mas precisa conhec- los, entende-los, ser capaz de explic-los.

Eis, pois, a complexidade de seu papel: ser leitor para transformar seu aluno em um aluno leitor, entendendo terica e metodologicamente de que modo isso deve ocorrer, conforme sejam os interesses do aluno, isto , deve atender s expectativas de seus alunos, fomentando-as e ampliando-as, deve ter domnio do objeto a ser ensinado, deve optar por uma metodologia respaldada em uma teoria que v ao encontro desses interesses.

A histria revela a problemtica dos gneros literrios, desde a Antiguidade at os dias atuais, entende-la importante porque revelam as transformaes do texto literrio ao longo do tempo. Contudo, o trabalho com a leitura da literatura deve ultrapassar a normatizao dos textos e considerar o papel do leitor. Aspectos como a linguagem, traos estilsticos, valor esttico, todo o processo hermenutico independem do gnero. 3 As marcas constitutivas dos gneros literrios da Antiguidade aos dias atuais O estudo e a reflexo sobre os gneros literrios tm um extenso caminho revelado pela histria. Das primeiras vises, na Antiguidade Clssica contemporaneidade, ora aceitando-o, ora negando-o, ora reformulando-o; o certo que permanecem muitas controvrsias sobre a existncia ou no de marcas constitutivas dos gneros literrios. Costa (2008) diz que a concepo de gneros literrios encontra-se ligada aos seguintes aspectos: discurso, estrutura, finalidade e efeitos no leitor, no entanto, nem sempre esses elementos so capazes de normatizar ou restringir o gnero literrio, mas clarifica o estudioso que o estudo dos gneros, independente da posio que se adote, consiste em um contributo "que permite distinguir o quanto o autor se aproxima ou afasta dos modelos, ou a valorizar a conscincia crtica do autor em relao ao gnero em que sua obra venha a se situar." (COSTA, 2008, p. 26). Sem a pretenso de sermos exaustivos, traamos um breve percurso histrico de elementos constitutivos dos gneros literrios responsveis por defini-los como pertencente a uma modalidade.

A discusso em torno dos gneros literrios remonta antiguidade helnica e permanece na atualidade. Alm da necessidade de categorizao das obras literrias, o problema envolve questes da literatura como o que pode ser considerado particular ou universal, atrelado viso de mundo e s formas artsticas, e existncia ou no de regras para criao das obras. No havendo entre os autores unanimidade sobre sua existncia e classificao.

Baseando-nos em Aguiar e Silva (1976) e Costa (2008) propomo-nos a apresentar, em perspectiva diacrnica, uma breve descrio das abordagens relativas aos gneros literrios ao longo dos sculos, pois parece haver uma necessidade de categorizao das formas literrias, como vemos comumente explicitados nas capas dos livros de literatura algumas nomeaes: romance, conto, crnica, poema; a crtica literria, por sua vez, costuma tambm fazer distino entre gnero e subgnero.

Plato, no livro III da Repblica (428 a.C. - 347 a.C.), faz a primeira referncia aos gneros, separando a poesia em mimtica (dramtica), no mimtica (lrica) e a mista (pica). Porm, no livro X denomina toda poesia de mimtica. As razes, embora desconhecidas, so entendidas como a procura de captar a universalidade e a unicidade da arte, desprezando a arte como poikilia, isto , como multiplicidade e diversidade. (AGUIAR E SILVA, 1976, p. 341).

A Potica de Aristteles no apenas foi uma reflexo mais profunda sobre a existncia e caractersticas dos gneros literrios, como permanece ainda hoje um dos textos fundamentais sobre esse tema. Falaremos da Arte Potica em si e das suas modalidades, do efeito de cada uma delas, do processo de composio a adotar, se se quiser produzir uma obra bela, e ainda do nmero e qualidade das suas partes. (ARISTTELES apud AGUIAR E SILVA, 1976, p. 342). E estabelece os gneros Segundo os meios diversos com que se realiza a mimese; Segundo os objetos diversos da mimese; Segundo os diversos modos da mimese (ARISTTELES, apud AGUIAR E SILVA, 1976, p. 342-343).

Outro filsofo a tratar do assunto foi Horcio (65 a.C. - 8 a.C.) em sua Epistula ad pisones, que exerceu influncia na potica e na retrica dos sculos XVI, XVII e XVIII. Para Horcio, o gnero literrio corresponde a uma tradio formal e determinado por um tom, ou seja, um metro e contedo especfico. Cria a regra da unidade de tom, segundo a qual o poeta escolhe o assunto e o enquadra conforme a mtrica ou a estilstica, amplamente aceita no classicismo francs e na esttica neoclssica.

Horcio foi deste modo conduzido a conceber os gneros como entidades perfeitamente distintas, correspondendo a distintos movimentos psicolgicos, pelo que o poeta deve mant-los rigorosamente separados, de modo a evitar, por exemplo, qualquer hibridismo entre o gnero cmico e o gnero trgico (AGUIAR E SILVA, 1976, p. 347)

Segundo Costa (2008), em relao ao perodo medieval, poucas complementaes so feitas, exceo de Dante Alighieri em Epistola a Can Grande Della Scala, que classifica o estilo em nobre, mdio e humilde. Considera nobres a epopeia e a tragdia, mdio a comdia e humilde a elegia. Esta ltima anuncia a entrada do gnero lrico como texto verbal, no acompanhado de msica. A mesma autora lembra que Massaud Moiss ao enfatizar que h poucos estudos sobre a Idade Mdia, aponta variedades formais novas, na poesia so feitas novas organizaes de rimas, estrofes e mtrica; surge o romance em prosa e o teatro se moderniza. O que faz ver alguns avanos no perodo conhecido como Idade de trevas.

No Renascimento, a partir do sculo XVI, houve a normatizao das ideias da Antiguidade Clssica pelos humanistas, influenciados especialmente por Aristteles e Horcio, teoria foram acrescentadas reflexes prprias. No geral, entendiam os gneros como formulas fixas, sustentadas por doutrinas e regras inflexveis, s quais os criadores de arte deveriam obedecer cegamente. (COSTA, 2008, p. 23 apud MOISS, 1997, p.242)

Embora no haja uma unidade do pensamento romntico acerca dos gneros literrios, os pr-romnticos alemes no sculo XVIII no movimento Tempestade e mpeto, Sturn und Drang, reagem ao racional e normativo do Renascimento, defendem o carter mutvel dos gneros nos sucessivos perodos histricos (COSTA, 2008, p. 24).

No encontramos uma soluo unitria, embora se possa apontar como princpio comum a todos romnticos a condenao da teoria clssica dos gneros literrios, em nome da liberdade e da espontaneidade criadoras, da unicidade da obra literria, etc. Todavia, a atitude radicalmente negativa do Sturm und drang no foi em geral aceita pelos romnticos, que, se afirmavam por um lado o carter absoluto da arte, no deixavam de reconhecer, por outro, a multiplicidade e a diversidade das obras artsticas existentes. (AGUIAR E SILVA, 1976, p. 360)

Observou-se em alguns a busca por novas teorias com bases intrnsecas e filosficas. Vitor Hugo, por exemplo, condena a unicidade dos gneros, pois considera que a arte expresso em nome da vida. O romance substitui o pico, e permite subdivises: gtico, histrico; surge o drama como comparao com o real. No Romantismo, o gnero no se limita, no prescreve regras, gneros tradicionais se mesclam com clssicos, como na tragicomdia. Esto presentes as noes de acrscimo e reduo (enriquecimento e pureza). O prazer da obra est ao mesmo tempo na novidade e no reconhecimento. O espirito romntico na criao literria, se espalha, portanto, para a crtica dos gneros literrios (COSTA, 2008, p. 24)

Nos sculos XIX e XX, aps o perodo romntico, destaca-se o crtico francs Brunetire (1849-1906), para o qual os gneros literrios so vistos como entidades substancialmente existentes, apresentando-os como espcies biolgicas (nascem, desenvolvem-se, envelhecem, morrem ou se transformam), desaparecem por surgirem outros mais vigorosos. Croce (1886-1952) como reao a essa doutrina defende que a arte uma atividade teortica, intuio, oposta, pois, ao conhecimento lgico. Para ele, a literatura vincula-se ao imaginrio, ao conhecimento individual. A intuio uma forma de expresso a obra potica, consequentemente, una e indivisvel porque cada expresso uma forma nica. (AGUIAR E SILVA, 1976, p. 367, grifos do autor). Desta discusso surgiram duas interpretaes:

1. Realista, pressupe que os gneros semelhana das ideias platnicas, constituem realidade nica, perene e pr-existente; 2. Nominalista, encara as ideias e os gneros como simples denominaes da verdadeira realidade, as obras literrias. (COSTA, 2008, p.25)

Na crtica literria contempornea, Emil Staiger, na obra Grundbegriffe der Poetik (1952), destaca a necessidade de apoio na tradio formal concreta e histrica da literatura, retomando lrica, pica e drama por conceitos estilsticos lrico, pico e dramtico para representar a essncia humana: emocional, intuitivo e lgico.

Luckcs, na Teoria do Romance (1914-1915), distingue a narrativa e a lrica, a narrativa e o drama, o romance e a epopeia. No O romance histrico, diferencia o romance e o drama. Para o autor, a diferenciao se deve por se tratar de vises diferentes da realidade, diversidade de contedo e forma e ainda por fatores de ordem sociolgica ou sociocultural. Em Esttica, tratou da continuidade e descontinuidade e da questo histrico-social, que pode extinguir alguns gneros e fazer nascer outros. (AGUIAR E SILVA, 1976, p. 383)

Com os formalistas russos aprofundou-se o conceito de que as obras literrias tm caractersticas prprias que permitem reconhec-las e classific-las por sua literariedade. Bakhtin (1979) trouxe contribuies ao estudo dos gneros, reconhecendo as expectativas do leitor em relao obra, que se altera conforme o contexto histrico; os gneros se relacionam com o sistema da literatura, com o momento scio histrico e com os valores culturais.

No Estruturalismo, procura-se definir os gneros a partir dos elementos constitutivos das respectivas estruturas lingusticas. Roman Jakobson relacionou as particularidades dos gneros literrios com as funes da linguagem, a funo potica (dominante) e as outras funes, referencial, emotiva e apelativa. Em uma relao assim orientada: a pica, centrada sobre a terceira pessoa, envolve a funo referencial da linguagem; a lrica, orientada para a primeira pessoa, prende-se estreitamente com a funo emotiva; a dramtica implica a segunda pessoa com funo apelativa (AGUIAR E SILVA, 1976, p. 373).

Na atualidade, Costa (2008, p. 26) afirma que Northrop Frye em Anatomia da Crtica (1957) distingue quatro gneros: lrica, pica, dramtica e a fico, esta episdica, uma unio de quadros mais ou menos independentes, a fico divide-se em romanesco, romance, romance confessional e stira. Conforme a autora, essa classificao no encontrou eco na crtica literria recente e a questo do gnero vem sendo ainda discutida devido crescente diversidade no mundo ps-moderno.

Para Costa (2008, p. 26) estudos com gneros permitem verificar as produes ao longo dos tempos, verificando o que se mantm e o que se renova de acordo com os padres de cada poca. Segundo a autora, na contemporaneidade h duas vertentes: uma que nega toda e qualquer forma pr-estabelecida; e outra em que o leitor reconhece ou no o gnero a que a obra faz referncia e avalia a importncia dessa relao.

A esttica da recepo trata o gnero literrio como uma das possibilidades de estabelecimento de marcos histricos da literatura, ou seja, com reflexos na prpria localizao dos autores na histria da literatura, alm de valorizar o que o leitor reconhece no momento de interpretao e valorizao do que l. (COSTA, 2008, p.26).

Entender a evoluo dos gneros literrios, refletir sobre as formas como so postos ao longo do tempo possibilita ao professor a ampliao de seu repertrio acadmico, portanto, mais segurana no ensino.Estamos, entretanto, diante de um momento em que se pretende a formao de leitor de textos literrios integrais e essa formao deve se sobrepor aos aspectos externos da obra, tais como aspectos lingsticos, histricos, mercantilistas. Devemos ter como meta privilegiar a literatura enquanto arte, criao, cultura. Os aspectos externos no podem ser negados, mas formar leitor implica leitura, discusso, pontos de vista variados, construo de sentidos. Despido de conhecimento, o professor no ter xito em sua atividade de leitura.

3.2. A construo de sentidos nos gneros literrios

Nos gneros encontramos marcas lingusticas que se constituem como dotadas de caractersticas que contribuem com os sentidos dos textos. Para discutir sobre os sentidos, tentando relacion-los com os gneros literrios, comecemos por diferenciar significado de sentido com base em Eugnio Coseriu (1993). Para o autor, a literatura representa a plenitude da linguagem e no se pode separar o ensino da linguagem do ensino da literatura.

Todo discurso tem designao, significado e sentido, pois por trs do discurso h uma inteno. As intenes atribuem sentidos ao discurso. Os textos literrios se apresentam como construo de sentido que dada ao texto literrio com base em uma viso de mundo. O sentido pode ser entendido como um nvel de contedo superior, no est nem na designao, nem no significado, mas no contedo a que se refere o saber expressivo.

(...) na literatura, a linguagem no apenas instrumento, mas constitui a finalidade, o objetivo, enquanto construo de sentido. E, portanto, na literatura, a linguagem no se minimiza; muito pelo contrrio, determinadas possibilidades da linguagem se atualizam, se fazem reais, funcionam e, neste sentido, necessrio referir-se a elas no ensino. (COSERIU, 1993, p.40)

O ser humano tem necessidade de dar sentido ao mundo e a si mesmo e a literatura favorece a construo desses sentidos, visto que o plano de significao conseguido pelos smbolos lingusticos permite uma tpica viso da existncia humana. (BORDINI; AGUIAR, 1993, p.13-14)Os gneros literrios diferem dos demais gneros textuais por serem trabalhados intencionalmente, seu processo de criao se d por meio da palavra que se torna responsvel pelas sensaes causadas ao leitor possibilitando-lhe vrias leituras diante da ambiguidade das palavras que remetem a vrias interpretaes.

Na leitura literria privilegiamos critrios estticos e promovemos o conhecimento por meio da fruio que, segundo Barthes (2003, p.21-22) aquele capaz de desconfortar e desequilibrar as bases histricas, culturais e psicolgicas do leitor e a consistncia de seus gostos, de seus valores e at de suas lembranas. O valor da palavra como expresso do eu e do mundo pode ser observado atravs da leitura literria.

Todos os gneros literrios possuem marcas que constituem suas especificidades de gnero e de obra literria. A experincia literria s possvel por meio do contato efetivo com o texto,

S assim ser possvel experimentar a sensao de estranhamento que a elaborao peculiar do texto literrio, pelo uso incomum de linguagem, consegue produzir no leitor, o qual, por sua vez, estimulado, contribui com sua prpria viso de mundo para a fruio esttica. A experincia construda a partir dessa troca de signicados possibilita, pois, a ampliao de horizontes, o questionamento do j dado, o encontro da sensibilidade, a reexo, enm, um tipo de conhecimento diferente do cientco, j que objetivamente no pode ser medido. (BRASIL, p.55).

4. Orientaes dos documentos oficiais em relao formao do leitor de literatura

Nas aulas de literatura quase sempre o que se v o ensino da histria da literatura, dos perodos literrios ou atividades de estudos lingusticos superficiais e descontextualizados. Talvez, por isso, tanto crianas, adolescentes e jovens no se interessem pela leitura de textos literrios.

Segundo Vieira (2008, p. 3) o texto literrio obra de arte e passa a matria de ensino e isso traz algumas consideraes, pois os documentos oficiais, expressando o posicionamento terico de seus autores e o contexto histrico e social em que foram elaborados, ora a consideram uma disciplina autnoma, ora a incluem na disciplina Lngua Portuguesa. Na tentativa de refletir sobre o ensino da Literatura, faremos um levantamento das orientaes dos documentos oficiais.

A Lei 5692/71 tinha como princpio o ensino profissionalizante, para satisfazer as demandas da sociedade em processo de industrializao. Coube aos estados da federao formular orientaes pedaggicas s diversas reas do conhecimento. O estado de So Paulo elaborou, em 1977, a Proposta curricular de Lngua Portuguesa para o 2 grau. Em 1978, essa proposta foi complementada com a edio de oito volumes para subsidiarem-na, no entanto, a introduo desse documento salienta que so apenas um guia, cabendo a cada professor ajustar sua programao. H um avano nessa proposta, tanto em relao autonomia do professor quanto s orientaes do ensino da Literatura, privilegiando o texto. No entanto, a diviso fragmenta o ensino da lngua e no ocorrem na prtica docente.Com a publicao da Lei 9394/1996, o MEC buscou dar outro significado ao ensino, a contextualizao e a interdisciplinaridade so sugeridas como meio de incentivar o raciocnio e a capacidade de aprender, desfavorecendo a memorizao. As quatro premissas: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver, aprender a ser, aprender a aprender, postuladas pela Unesco, so norteadoras da proposta curricular para o ensino mdio, agrupado em trs reas: Linguagens e Cdigos e suas Tecnologias, Cincias da Natureza e Matemtica e suas Tecnologias e Cincias Humanas e suas Tecnologias.

Nesse perodo, foram elaborados os Parmetros Curriculares Nacionais PCNs para o ensino fundamental e Parmetros Curriculares para o Ensino Mdio PCNEM. O problema dos PCNs que defendem o estudo literrio vinculado ao estudo dos gneros discursivos e da leitura, no norteando o trabalho especfico da Literatura. Foram elaborados, ento, os Parmetros em ao: ensino mdio em 2001 e o PCN+ em 2002. Para a literatura escreve-se alm de sua especfica constituio esttica, um campo riqussimo para investigaes histricas realizadas pelos estudantes, estimulados e orientados pelo professor, permitindo reencontrar o mundo sob a tica do escritor de cada poca e contexto cultural. (Brasil, 2002, p.19)

Se por um lado h a preocupao com a investigao histrica, por outro o aspecto esttico da Literatura no discutido. Um dado positivo que a Literatura deva ser aliada leitura, pois h a preocupao com a formao do leitor, havendo a abordagem implcita da Esttica da Recepo, pois pode-se resgatar a importncia da contextualizao da obra e de seu autor, o momento histrico de sua apario e o papel do leitor na concretizao da obra (VIEIRA, 2008, p. 452)

Nos trs documentos, Parmetros Curriculares Nacionais do Ensino Mdio PCNEM , PCN+ e Parmetros em Ao, no se encontram o conceito de literatura, nem critrios que sirvam de base para caracterizar o texto literrio como forma peculiar de representao e estilo em que predominam a fora criativa da imaginao e a inteno esttica, como se afirma nos Parmetros Curriculares do Ensino Fundamental (Brasil, 2002) Vieira (2008, p. 453)

As Orientaes curriculares para o ensino mdio, publicadas pelo MEC (2006), dedica o primeiro volume rea de Linguagens, Cdigos e suas Tecnologias, j na organizao sinaliza uma separao entre o ensino de lngua e o de literatura, vista sob o enfoque da arte ou do fazer que a literatura, assim como outras formas de expresso artstica, vital ao homem e no pode ser privilgio de alguns em detrimento de grande parte dos alunos que no tem acesso a ela em seus lares. (VIEIRA, 2008, p.454)

A seo Conhecimentos de Literatura se constitui dos seguintes itens:

1. Por que a literatura no ensino mdio? 2. A formao do leitor: do ensino fundamental ao ensino mdio. 3. A leitura literria. 4. A importncia do leitor. 5. Que leitores somos. 6. Formao do leitor crtico na escola. 7. Possibilidades de mediao. 8. O professor e a seleo de textos. 9. O professor e o tempo. 10. O leitor e o espao. (BRASIL, 2006)

Esses itens demonstram que a formao de leitores de textos literrios representa o ponto central das preocupaes dos autores, que tambm defendem a leitura de textos cannicos. H ou no intencionalidade artstica? A realizao correspondeu inteno? Quais os recursos utilizados para tal? Qual o seu significado histrico-social? Proporciona ele o estranhamento, o prazer esttico? (Brasil, 2006, p.57)

H a preocupao de propiciar: a leitura de obras diversos gneros, de tradio ou atuais, mas desde que tenham sido reconhecidas pelo seu valor esttico; a formao de alunos leitores, que devem ler obras literrias e textos sobre literatura (letramento literrio).

No documento, apresenta-se uma discusso terica, so dadas orientaes aos professores de como atingir os objetivos propostos, oferecem-se critrios para a escolha das obras. Alm de discutir as peculiaridades regionais, o livro didtico adotado e o vestibular, ainda trata da formao de leitores de poesia dentro e fora da escola, propondo-se a explorao dos efeitos de sentido produzidos pelos recursos fonolgicos, sintticos, semnticos, na leitura e na releitura de poemas (Brasil, 1999a, p.74).

A histria da literatura seria uma decorrncia da leitura das obras vistas em seu contexto histrico-social e cultural. Para Vieira (2008) o documento traz contribuies importantes para a prtica pedaggica e, principalmente, para a formao de alunos leitores de textos literrios, mas considera que a escola consiga atingir esse propsito se elaborar um projeto poltico pedaggico para os trs anos do ensino mdio.

Como vimos, as discusses sobre o ensino de Literatura no so novas, pois as questes que o envolvem so complexas, o prprio conceito de literatura depende da teoria adotada, assim no existe um consenso sobre a concepo de literatura; o cnone literrio se modifica, alguns textos antes no literrios passam a ser vistos como literrios, existem os que se mantm como clssicos, e os escritores regionais. Portanto, ao estabelecer uma leitura literria para o ensino da literatura, esses aspectos devem ser considerados. A contextualizao, ou seja, a incluso da literatura nos estudos da linguagem, em situaes significativas de aprendizagem (leitura de textos literrios) pode ser um avano, para que se alcance o objetivo principal: a formao do leitor.Essa formao e importante, porque

O texto literrio prope uma ao na esfera imaginativa, criando uma nova relao entre situaes reais e situaes de pensamento, ampliando, assim, o campo de significados e auxiliando na formao dos planos da vida real. Lida com necessidades de imaginao e fantasia, onde se criam e se seguem regras voluntrias para satisfao do desejo; um meio de se atingir prazer mximo, fornecendo estruturas bsicas para a mudana de necessidades e conscincia que propiciem avanos nos nveis de desenvolvimento. (MORTATTI, s.a., 104).

Resta saber se na maioria da escolas brasileiras essas sugestes esto servindo de parmetros para o ensino de Literatura. No ensino fundamental, fica a critrio do professor a seleo dos textos literrios, que quase sempre so selecionados para exerccios de interpretao e anlise lingustica. O valor esttico do texto literrio no considerado, a leitura como fruio quase no contemplada nas escolas. No ensino mdio, no raro encontrar o ensino fragmentado dos perodos literrios, a leitura descontextualizada de trechos de textos nos livros didticos. Ento, o objetivo principal das atuais propostas, a formao de alunos leitores, fica grandemente comprometido.

Consideraes finais Neste trabalho, trouxemos uma abordagem acerca da concepo de letramento literrio e as prticas de leitura legitimadas pela escola e comunidades de leitura; destacamos a importncia de se formar professor/aluno leitor de textos literrios; elencamos alguns pontos breves, porm relevantes sobre o papel dos gneros literrios e suas marcas constitutivas na construo de sentidos dos textos e quais as orientaes dos documentos oficiais em relao a formao do leitor de literatura. Diante do que foi exposto, conclumos que seja necessrio uma renovao no trato com o ensino e aprendizagem da leitura de textos literrios, que deva ser entendido como uma forma de aprimorar a aprendizagem, a linguagem e a personalidade aliando-os ao prazer, ou seja, o "elemento humano" aliado ao aspecto cognitivo, que somente a leitura literria permite.

No atual cenrio educacional brasileiro o que se observa pelos resultados das avaliaes externas e internas o baixo ndice de desenvolvimento no que diz respeito a aquisio da lngua, o que se comprova pelo nmero crescente de analfabetos funcionais. Paralelamente, assistimos ao culto tecnologia em uma sociedade capitalista, onde a literatura passou a ocupar lugar no privilegiado pela maioria da populao.

Est presente uma contradio: por um lado, o crescimento tecnolgico e industrial em que predomina a razo, por outro, o crescimento de barbries e da decadncia do ser humano. O ser em oposio ao ter vem perdendo lugar na humanidade.

inegvel a importncia da leitura no desenvolvimento de competncias e habilidades essenciais para desenvolvermos atividades que envolvam o uso da lngua oral e escrita, mas ainda maior a contribuio da literatura na formao do indivduo. Muito se tem discutido sobre o papel da leitura, procura de solues para melhor ensinar a ler e escrever nas escolas. Fala-se no estudo dos gneros, do ensino da lngua que privilegie situaes reais de uso, a fim de que se desenvolva o letramento literrio dos educandos. Acreditamos que todas as formas de leitura so importantes, cumprem algum propsito especfico, mas a leitura literria que nos leva a descobrir os sentidos de forma ampla, levando-nos a conscientizao do mundo concreto, resultado da relao interativa entre leitor-obra-autor, sendo um grande contributo na formao de cidados, na escola e na vida. O conhecimento enciclopdico, antes prioridade na escola, vem deixando de ser a nica preocupao. A formao para a cidadania tambm um objetivo da escola, pois ela tem ocupado o lugar da famlia na vida de inmeras crianas e adolescentes, especialmente das classes menos favorecidas economicamente, que na maioria das vezes s tem acesso a bens culturais, como a literatura, na escola.

Por meio da leitura literria, o professor, torna-se mediador tanto no desenvolvimento do hbito de leitura, como contribui com a formao da personalidade, do desenvolvimento esttico e da capacidade crtica, possibilitando a reflexo dos seus valores e crenas, bem como os da sociedade a que pertence.

As literaturas infantil e infanto-juvenil tm capacidade formativa, no por seu carter pedaggico, mas por meio das possibilidades vividas na linguagem literria, a troca de experincias de vida na leitura, na qual sentimentos, sensaes, atitudes podem ser vivenciados. Pode-se criar, assim, pessoas mais humanas, mais fortes e ao mesmo tempo, mais sensveis.

Assim, as escolhas para leitura literria em sala de aula no necessitam ter, prioritariamente, carter pedaggico. Precisa-se considerar o aluno-leitor como parte dessa leitura, o que pode toc-lo, ou despertar-lhe o interesse por algum motivo; o valor esttico da obra, o trabalho com a linguagem, a arte; e o mtodo, ou seja, como levar a leitura aos alunos de modo que no se torne mais um exerccio corriqueiro de decodificaoReferncias:

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CANDIDO, Antonio. O direito literatura. So Paulo: Duas Cidades, 1995.

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SILVA, Vitor Manuel de Aguiar. Teoria da Literatura. Coimbra: Livraria Almedina, 1992.

VIEIRA, Alice. Formao de leitores de literatura na escola brasileira: caminhadas e labirintos. Cadernos de Pesquisa, v. 38, n. 134, p. 441-458. Biblioteca Digital da Produo Intelectual - BDPI, Universidade de So Paulo: 2008.

Professora da rede estadual e da E.M. Parque So Carlos. Mestranda PROFLETRAS/UFMS/CPTL

Professora da rede estadual e da E.M. Prof. Odeir Antnio da Silva. Mestranda PROFLETRAS/UFMS/CPTL

A expresso Letramento Literriofoi usada inicialmente, no Brasil, pelos estudiosos do CEALE Centro de Alfabetizao Leitura e Escrita da Faculdade de Educao da Universidade Federal de Minas Gerais UFMG, no incio da dcada de 1990, e difundida pelo GPELL Grupo de Pesquisas do Letramento Literrio, pertencente ao mesmo Centro. Atualmente a temtica tem sido objeto de estudo de vrias instituies e pesquisadores de Literatura.

I Reflexes Preliminares; II Recepo de Textos; III Produo de Textos;IV Variao Lingstica e Norma Pedaggica; V Estrutura da Lngua Portuguesa; VI Historia da Lngua Portuguesa e da Literatura; VII Reviso de Automatismos; VIII Coletnea de Textos.