Fundamentos Da Improvisação I - Lupa Santiago

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LUIZ EÇA (Luiz Mainzi da Cunha) (03/04/1936 - 25/05/1992) Estudos Conhecido no meio musical como Luizinho Eça, o pianista, arranjador e compositor carioca iniciou seus estudos musicais aos 5 anos de idade e aos 10 anos já estudava também Teoria Musical. Em 1958, com 22 anos de idade, mudou-se para Viena, Áustria para estudar música erudita, com uma bolsa de estudos concedida pelo governo brasileiro. Teve aulas, entre outros, com o renomado professor Friedrich Gulda. Juventude na Noite No início dos anos 50 Luizinho começa a frequentar a noite musical carioca, tanto para ouvir como para atuar como pianista dessas casas. Era figura presente em encontros musicais da época, como os que aconteciam na casa de Paulo Moura. Ainda adolescente, Luizinho estava tomado pelo jazz e se apresentava regularmente na Cantina do Cesar, do famoso radialista Cesar de Alencar, tocando standards de Jazz. Nesse período o radialista Manuel Barcelos e o compositor Humberto Teixeira (parceiro de Luiz Gonzaga em Asa Branca e outras) fundaram o Clube da Chave. A idéia inicial era ser um clube fechado para 50 sócios, onde cada um teria uma chave para ter acesso à sua garrafa de whisky. Porém o bar tomou grandes proporções na boêmia carioca, tornando-se o paraíso das canjas onde se apresentava o que havia de mais moderno na música brasileira, intercalado com convidados de Humberto que apresentavam a música nordestina. Ainda menor de idade Luizinho costumava frequentar o clube e se escondia no banheiro quando aparecia a fiscalização do Juizado de Menores. Uma de suas primeiras apresentações para grandes músicos, foi no Clube da Chave, tocando acordeon. Em 1953, o então jovem de apenas 17 anos substituía o consagrado pianista da noite da Boate Plaza (que por estar muitas vezes com poucos clientes propiciava liberdade Fundamentos da Improvisação I - Lupa Santiago Luiz Augusto Buff de Souza e Silva

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LUIZ EÇA (Luiz Mainzi da Cunha)(03/04/1936 - 25/05/1992)

EstudosConhecido no meio musical como Luizinho Eça, o pianista, arranjador e compositor carioca iniciou seus estudos musicais aos 5 anos de idade e aos 10 anos já estudava também Teoria Musical.

Em 1958, com 22 anos de idade, mudou-se para Viena, Áustria para estudar música erudita, com uma bolsa de estudos concedida pelo governo brasileiro. Teve aulas, entre outros, com o renomado professor Friedrich Gulda.

Juventude na NoiteNo início dos anos 50 Luizinho começa a frequentar a noite musical carioca, tanto para ouvir como para atuar como pianista dessas casas. Era figura presente em encontros musicais da época, como os que aconteciam na casa de Paulo Moura.

Ainda adolescente, Luizinho estava tomado pelo jazz e se apresentava regularmente na Cantina do Cesar, do famoso radialista Cesar de Alencar, tocando standards de Jazz.

Nesse período o radialista Manuel Barcelos e o compositor Humberto Teixeira (parceiro de Luiz Gonzaga em Asa Branca e outras) fundaram o Clube da Chave. A idéia inicial era ser um clube fechado para 50 sócios, onde cada um teria uma chave para ter acesso à sua garrafa de whisky. Porém o bar tomou grandes proporções na boêmia carioca, tornando-se o paraíso das canjas onde se apresentava o que havia de mais moderno na música brasileira, intercalado com convidados de Humberto que apresentavam a música nordestina. Ainda menor de idade Luizinho costumava frequentar o clube e se escondia no banheiro quando aparecia a fiscalização do Juizado de Menores. Uma de suas primeiras apresentações para grandes músicos, foi no Clube da Chave, tocando acordeon.

Em 1953, o então jovem de apenas 17 anos substituía o consagrado pianista da noite da Boate Plaza (que por estar muitas vezes com poucos clientes propiciava liberdade

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de execução aos músicos), Johnny Alf, precursor da Bossa Nova, tendo introduzido elementos oriundos do jazz tanto no acompanhamento como na improvisação. Ao seu lado lá estavam Ed Lincoln no contrabaixo e Paulo Ney na guitarra. Posteriormente, com a saída de Paulo Ney, se juntaram ao grupo o acordeonista João Donato, o baterista Milton Banana e a Crooner Claudette Soares, figuras importantíssimas da história da Bossa Nova e Sambajazz.

Ao lado de Candinho (violão) e Jambeiro (contrabaixo) Eça trabalhou na Radio Mayrink Veiga, fomrando o Trio Penumbra, inspirado em Nat King Cole.

Bossa NovaAo voltar de Viena, Luiz Eça acompanhou Maysa e Leny Andrade, e passou a se relacionar com os principais músicos da cena nacional, como Tom Jobim, João Gilberto, Luiz Carlos Vinhas, Roberto Menescal, entre outros.

O batismo da Bossa Nova aconteceu num show realizado em 1958 no Grupo Hebraico do Rio de Janeiro. Lá havia um quadro negro escrito à giz: “Hoje Sylvinha Telles e um grupo bossa nova”, foi a primeira vez que a expressão foi usada vinculada à forma dos músicos tocarem, e ao piano estava Luiz Eça.

Marco de suma importância do início da Bossa Nova é a gravação do LP Chega de Saudade, de João Gilberto, lançado pela gravadora Odeon. Tom Jobim, a fim de dar maior atenção ao obstinado João Gilberto, pediu que Luizinho o substituísse no registro de algumas músicas. Consta que devido a tantas repetições da mesma música, pelo perfeccionismo de João Gilberto, Eça abandonou o estúdio no meio de uma das gravações.

Luiz Eça também participou de outras gravações de grandes nomes da chamada primeira fase da Bossa Nova, entre 1958 e 1962, Além de se apresentar nas mais importantes casas noturnas da época.

Entre o final da década de 1950 e início de 1960 houve um saudável intercâmbio entre a música que acontecia no Brasil e nos Estados Unidos.

A tradicional formação jazzistíca de Trio (piano, baixo e bateria) estava cada vez mais em voga no Brasil, assim como a execução instrumental de canções consagradas, sofisticando suas harmonias e executando improvisos, principalmente nas boates e casas noturnas da noite do Rio de Janeiro. Os discos de músicos americanos eram trazidos por instrumentistas brasileiros que viajavam para o exterior para tocar, como Luizinho Eça.

Em contrapartida os músicos do West Coast Jazz e Hard-Bop, também passaram a se interessar pela divisão ritmíca e sofisticação harmônica da Bossa Nova. Diversos músicos americanos estiveram no Brasil em 1961, como Tony Bennett e sua banda, que contava com Don Payne no baixo, para quem Eça preparou detalhadamente, por

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escrito, uma longa explicaçao da divisão rítmica da Bossa Nova. Outros músicos como Coleman Hawkins, Kenny Dorhan, Herbie Mann, Zoot Sims, Charlie Byrd, entre outros que saíram carregados de discos. Dizzy Gillespie incluiu Desafinado em seu repertório, após ouvir o LP de João Gilberto, lançado nos Estados Unidos.

SambajazzFruto desse intercâmbio, e principal nome de uma ramificação da Bossa Nova, chamada Sambajazz, foi o Tamba Trio, fundado em 1962 por Luiz Eça (voz, piano e arranjos), Bebeto (voz, contrabaixo e flauta) e Helcio Milito (voz, bateria e percussão).

O Tamba Trio surgiu na noite do Beco das Garrafas, como um trio que rejeitando o papel secundário de acompanhar crooners tomaram a frente se utilizando de harmonia vocal e um forte e enfático suporte instrumental. O grupo atingiu reconhecimento internacional com longas turnes nos Estados Unidos, e Argentina, por exemplo. Por problemas de relacionamento o grupo rompeu em 1964 e retomaram contato 10 anos depois trazendo mais novidades, com menor ênfase dos complexos arranjos vocais, dando lugar a busca de sons instrumentais diferentes como guitarra com distorção e modernos sintetizadores.

Embora tenha sido um dos principais grupos do início dos anos 60, o Tamba se recusou, desde o princípio, a participar do antológico show da Bossa Nova no Carnegie Hall, devido as “armações” tramadas pelo produtor Sidney Frey.

Após o surgimento do Tamba, foram diversos os trios que foram surgindo, no Rio e em São Paulo, como o Jongo Trio, Zimbo Trio, Som 3, Bossa 3, Sambalanço Trio, entre outros

Aproveitando a projeção enorme alcançada pela música brasileira no exterior, Eça muda-se para a Califórnia, nos Estados Unidos, no final dos anos 60. Ao retornar para o Brasil formou o grupo a Sagrada Familia, com quem permaneceu durante uma temporada no México. Gravou e compos para diversos artistas, acompanhando cantores, pianistas, formou o Quinteto Villa lobos, fez discos para piano e cordas, firmando uma extensa carreira de sofisticação musical ao lado dos principais intrumentistas do Brasil e do mundo.

TécnicaLuiz Eça sempre teve seu estilo calcado pela improvisação, pois desde cedo se interessava pelos grandes improvisadores do jazz. Altamente técnico por ter tido sólida formação erudita, podia facilmente transitar de sons pesados e swingados para estilos mais calmos e introspectivos. Entre amigos era comum se apresentar imitando a linguagem dos grandes pianistas de jazz, como sua grande inspiração, Nat King Cole, porém profissionalmente era conhecido pelo seu estilo.

Desenvolveu um vocabulário único, que inspirou muitos pianistas que vieram em seguida, misturando as tradições rítmicas brasileiras com as harmonias avançadas vindas do campo erudito.

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Em seus improvisos é perceptível o uso de diversas técnicas, destacando a interpretação e o desenvolvimento da melodia, mas também por vezes há um distanciamento da melodia, para improvisos mais inspirados no jazz. Percebe-se claramente a influência da música erudita no desenvolvimento melódico. O Estilo de acompanhar é oriundo do jazz aplicado ao swing brasileiro, sincopando, porém não tocando todos os acordes, o tempo inteiro com um ritmo definido, como antes se fazia no Brasil.

Suas composições revelam todos os atributos típicos dos compositores da Bossa Nova. Seus arranjos sempre bastante elaborados e altamente sofisticados para a época

Luiz Eça era um pianista que dominava altamente as técnicas do seu instrumento lançando mão de diversos recursos que colaboraram para o desenvolvimento de uma maneira de tocar que influenciou gerações no Brasil e no Mundo.

Audição1- Desafinado Tamba Trio (Coletânea Novo Millenium) -arranjos vocais, mudança de compasso, acompanhamento, solo interpretação da melodia “erudito”, frase bop, retomada melodia.

2- Só Danço Samba com Tamba Trio (Coletânea Novo Millenium) -Improviso, contraponto com o baixo, desenvolvimento de motivos

3- Imagem com Tamba Trio e Cordas (Classics) -composição Luiz Eça, acompanhamento, desenvolvimento da melodia, notas de passagem

4- O Morro Não tem Vez com Tamba Trio (Novo Millenium) -Introdução, modulações, dobradas e desdobradas, técnica erudita, arranjo elaborado, sofisticação para época5- Stella by Starlight com Luiz Eça (Serie Bis Bossa Nova) -Piano Solo, desenviolvimento da melodia, harmonia sofisticada, improvisação sai e aproxima novamente do tema.

BibliografiaALBIN, Ricardo Cravo - Dicionário Houaiss de Música Brasileira - Rio de Janeiro: Editora ParacatuCABRAL, Sérgio - Antonio Carlos Jobim: Uma Biografia- Rio de Janeiro: Ed. LumiarCASTRO, Ruy - Chega de Saudade - São Paulo: Cia. das LetrasDOMINGUES, André - Os 100 melhores cds da MPB - São Paulo: Sá EditoraLYRA, Carlos - Eu e a Bossa - Rio de Janeiro: Casa da PalavraMELLO, Zuza Homem de - Música nas Veias: Memórias e Ensaios - São Paulo: Ed. 34

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