GAROTOS DE PENSÃO - PDF

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1 Gerinelson Oliveira Dantas, 2006 TODOS OS DIREITOS RESERVADOS – Nos termos da lei que resguarda os direitos autorais, proibida a reproduo total ou parcial deste documento, sem permisso, por escrito, do autor. Di Dante, Geri D555g Garotos de penso / Geri Di Dante. – Aracaju: Ed. do do Autor, 2006. 123p. 1. Literatura brasileira – Teatro – Drama. 2. Literatura adulto. I. Dantas, Gerinelson Oliveira. II. Ttulo. CDU 821.134.3(81)-2 Documento registrado na forma da lei. Comunicao com o autor: E-mail: [email protected] [email protected]

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� Gerinelson Oliveira Dantas, 2006

TODOS OS DIREITOS RESERVADOS – Nos termos da lei que resguarda os direitos autorais, � proibida a reprodu��o total ou parcial deste documento, sem permiss�o, por escrito, do autor.

Di Dante, GeriD555g Garotos de pens�o / Geri Di Dante. – Aracaju: Ed. do

do Autor, 2006.123p.

1. Literatura brasileira – Teatro – Drama. 2.Literatura adulto. I. Dantas,

Gerinelson Oliveira. II. T�tulo.

CDU 821.134.3(81)-2

� Documento registrado na forma da lei.

Comunica��o com o autor:

E-mail: [email protected]@rocketmail.com

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Quando se escreve com amor, at� mesmo a mais vil das acusa��es perde o sabor de fel!

O Autor

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ARGUMENTO DE “GAROTOS DE PENS�O”

Dona C�lia, propriet�ria de pens�o, aluga quarto para tr�s jovens: Lucas, estudante de direito; Pedro, empregado de ind�stria, e Tavico, jovem que trabalha em casa noturna.

Com a chegada de Juca, jovem t�mido, vindo do interior para estudar na cidade. A vida desses garotos, especialmente a de Tavico n�o mais ser�o as mesmas.

Emocionante e instigador, Garotos de Pens�o, � uma hist�ria sobre sonhos, amizades verdadeiras e um grande e proibido amor.

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Personagens

TavicoLucasPedroJuca

FaxineiraM�dico

Av� de JucaVoz do Apresentador

TaxistaVoz do Pit Boy 1Voz do Pit Boy 2

Vozes dos Pit BoysVoz do Policial 1Voz do Policial 2Voz do M�dico

Voz da EnfermeiraVoz da Central de Emerg�ncia

***

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(O quarto de pens�o tem dois beliches. Uma emparelhada � outra. Uma delas se apresenta bem

arrumada. As demais apresentam os len��is desarrumados, cuecas e camisas enfiadas nas

cabeceiras. Uma pequena c�moda, e espelho, um guarda-roupa, uma escrivaninha, com alguns livros

em cima, uma pequena agenda aberta, na parte central, al�m de um estojo de l�pis, no lado direito. Em uma das paredes, h� um pequeno quadro, cujo motivo � um barco na beira da praia, completando o

cen�rio. Entra em cena, um rapaz aparentando vinte anos de idade, corpo escultural, protegido com

uma toalha em volta da cintura. A luz � central.)

TAVICO

(Cantarolando) Tchu... Tchu... Tchu... (Arriscando um passo de dan�a. Neste momento entra a m�sica. Dirige-se assoviando ao guarda-roupa, pega uma cueca e veste, pega uma cal�a jeans surrada e uma camiseta, bem cavada. Pega um velho par de t�nis, tamb�m surrado. Senta-se na cadeira da escrivaninha. Fica pensativo por alguns instatintes. Veste a cal�a. � interrompido pelas batidas na porta.) Entre! (Vestindo a camiseta)

(Entra a faxineira, de ar saliente, trajando vestido curto e avental.)

FAXINEIRA

Ol� Tavico! (Observando o quarto)

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TAVICO

(Olhando para ela) O que veio fazer aqui, gostosa? (Levanta-se, ajeitando a camiseta dentro da cal�a, torna a sentar) Nossa, que cheiro bom. Que perfume � esse? (Cal�a o t�nis)

FAXINEIRA

Foi meu namorado quem me deu. (Supervisionando o quarto) Como voc�s conseguem viver nesta bagun�a?! (Pausa)

TAVICO

(Com um riso ir�nico, aproxima-se dela e toca-lhe o queixo) Vivendo, gostosa. Vivendo... Fazer o qu�?!(Olhando firmemente, para ela) A cada dia que passa essa sua bunda... (Toca) fica mais excitante...

FAXINEIRA

(Decidida) Deixe de ironia, seu cara de pau! (Aproxima-se de uma das camas vazias, por�m quase arrumada. Inclina-se e passa a m�o de forma suave, na tentativa de ajeitar algumas dobras.)

TAVICO

(Ajeitando a genit�lia) E a�, gostosa, em vez de acariciar uma cama vazia, n�o prefere acariciar o gostos�o, aqui?!

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FAXINEIRA

(Desdenha) Deixe de ser metido a gostoso.(Aproximando-se dele)

TAVICO

Olha que estou dispon�vel, aproveite!FAXINEIRA

Euzinha, aqui, jamais...

TAVICO

At� agora nunca recebi nenhuma reclama��o. (Pega a toalha e estende na cabeceira da cama)

FAXINEIRA

(Desdenha) H� gosto pra tudo.TAVICO

(Curvando-se, em rever�ncia) O que deseja, ent�o?!

FAXINEIRA

(Ironizando) A fofa aqui, veio apenas dar um recado da Dona C�lia.

TAVICO

Ent�o fale! (Ajeita os cabelos diante do espelho da c�moda)

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FAXINEIRA

J� vai pra farra?

TAVICO

(Aproxima-se dela) N�o. (Tenta dar um beijo na boca dela)

FAXINEIRA

(Reage com firmeza) Nem pensar! Essa boquinha est� reservada exclusivamente para uma pessoa muito especial... (Ironizando) E voc� n�o � essa pessoa! Bem, Dona C�lia mandou avisar que vai chegar um sobrinho dela, que morava com o av� no interior, mas ele morreu. A� ele ficou sozinho... E dona C�lia � a �nica parente dele. Bem, o recado j� foi dado... (Saindo, d� uma �ltima olhada para traz. Fecha a porta.)

TAVICO

(desapontado, sussurra) Se eu pego esta gostosa... (Ajeitando a genit�lia. Vai procurar algo no guarda-roupa.)

(Entra Lucas, rapaz aparentando dezenove anos, sorridente, usa traje esporte. Na cabe�a, uma boina

preta. Em uma das m�os, carrega alguns livros.)

LUCAS

Oi! (Deposita os livros na escrivaninha)

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TAVICO

(Volta-se para o amigo) E a� Lucas, como foi a aula?!

LUCAS

(Com ar de felicidade) Tavico, fiz uma prova de lascar, mas respondi a todas as quest�es. Acho que tenho boas chances de conseguir a bolsa de est�gio na Su��a. (D� um salto, acompanhado de um gritinho) Uh!

TAVICO

� isso a� guri! (Abra�a) E a�, tu n�o t� a fim de curtir essa noite?!

LUCAS

N�o, eu n�o posso! Amanh� cedinho tenho que procurar emprego, o dinheiro que meus pais me enviam j� est� acabando e n�o est� dando para as minhas despesas... A mensalidade da faculdade vai aumentar e eles n�o poder�o arc�-lo.

TAVICO

Est� bem, ent�o! (D� uma �ltima olhada no espelho da porta do guarda-roupa, pega a mochila que est� na cabeceira da cama) Tchau! (Saindo)

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LUCAS

Tchau! (Tira a boina, os sapatos e os coloca embaixo da cama, retira toda a roupa e coloca tudo no cabide, em seguida p�e no guarda-roupa. Fica somente de cueca. Assoviando, cal�a o chinelo, pega o roup�o que est� sobre a cama e veste, em seguida pega a toalha que se encontra estendida na cabeceira da cama e a p�e no ombro. Pega a cueca que est� num cantinho da cama, d� uma leve cheirada, aprova-a e sai.)

(Em seguida, entra Pedro, rapaz, aparentando vinte anos, usa um pequeno bigode e �culos de grau. Vestindo-se de maneira mais formal. Porta uma

pequena valise)

PEDRO

Boa noite, graciosa!

FAXINEIRA

Boa noite, gato!

(Pedro entra e fecha a porta. Deposita a valise e os �culos em cima da c�moda e em seguida senta-se na cama. Levanta-se, pega uma caneta e o jornal,

na valise, volta a sentar-se na cama, e abre o jornal na coluna de empregos. Circula alguns an�ncios.)

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LUCAS

(Retornando) E a� Pedr�o, tudo bem?! (Estende a cueca e a toalha na cabeceira da cama)

PEDRO

Estou um pouco cansado, andei o dia inteiro. (Fecha o jornal e guarda-o de volta e retorna para a cama)E o seu dia, como foi? (Tira os sapatos e deixa ali mesmo, tira as meias, d� uma leve cheirada e as coloca dentro dos sapatos, empurrando-os para baixo da cama. Massageia os p�s.)

LUCAS

Um tanto cansativo (Abre o guarda roupa e ajeita os cabelos diante do espelho)

PEDRO

E a prova?

LUCAS

(Para Pedro, sorridente) Carinha, eu fiz uma �tima prova! Pe1o visto, sou um forte candidato � bolsa.

PEDRO

(Levanta-se, tira as cal�as, ficando somente de cueca e camisa) Que bom! Parab�ns! (para si

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mesmo) Como gostaria de fazer uma viagem dessas... seria uma grande guinada na minha vida.

LUCAS

E o trabalho?! (Tira o roup�o e estende na cabeceira da cama, ficando de cueca, em seguida pula na cama)

PEDRO

T� no maior cansa�o de tanto andar. Hoje s� peguei clientes chatos. (Tira a camisa e joga na cama)Preciso arranjar outro emprego... que pague melhor. Trabalho feito um condenado e, no fim dom�s, uma mis�ria! N�o d� nem pra mandar um pouco pra minha m�e... (Pega a toalha na cabeceira da cama e p�e em volta da cintura) T� podre... Vou tomar um banho e depois comer alguma coisa. (Vai saindo, mas retorna. Pega uma cueca na gaveta da c�moda.) At� j�! (Sai)

(Lucas deita e pega no sono. Pedro retorna com um copo de leite e um sandu�che em uma das m�os, e na outra traz a cueca, coloca o copo e o sandu�che

em cima da escrivaninha; p�e a toalha e a cueca na cabeceira da cama e vai lanchar. Em seguida, deita. A luz se fecha por completo e reacende lentamente acompanhando o despertar de Lucas que se prepara

para o banho. Em seguida, Pedro acorda.)

LUCAS

Bom dia Pedro!

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PEDRO

(Surpreso) Que novidade � essa, Lucas?!

LUCAS

(Procura algo no guarda-roupa) Vou procurar emprego.

PEDRO

(Senta-se) Mas assim, t�o cedo?! (Espregui�a-se) Procurar emprego?! E o dinheiro que seus pais mandam?!

LUCAS

J� n�o d� mais... (Ajeitando o cabelo diante do espelho da c�moda))

PEDRO

Ent�o pe�a mais... (Levanta-se)

LUCAS

N�o d�, carinha, eles j� me mant�m com muito sacrif�cio. (Procurando algo no guarda-roupa)

PEDRO

E que tipo de emprego voc� est� procurando? (Aproxima-se de Lucas)

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LUCAS

(Decidido) Qualquer coisa! No momento eu aceito o que pintar... (Acha uma cueca)

PEDRO

Por que n�o tenta um est�gio?! (Abre uma das gavetas da c�moda) Ser� que voc� n�o consegue uma coloca��o em um desses escrit�rios de advocacia?! (Pega uma camisa, uma cal�a social, um cinto e um par de meias e os p�e em cima da cama) Eu sempre vejo an�ncios, procurando por estagi�rios...

LUCAS

Mas � um tanto dif�cil, eu s� curso o terceiro semestre, geralmente eles pegam a partir do quarto, mas eu vou tentar. (Pega a cal�a e a camisa e estende em cima da cama) Bem, vou tomar banho. At� j�, Pedro. (Pega a toalha, no lugar de sempre, veste o roup�o e pega a cueca. Faz um gesto e sai bocejando.)

TAVICO

(Entra, parecendo um zumbi, deposita a mochila na cabeceira da cama) Ol� Pedr�o! (Boceja)

PEDRO

(Em tom de zombaria) Pelo visto a noitada foi boa! (Senta-se na cama, ainda sonolento)

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(Tavico, sonolento, afirma com um sorriso, tira a cal�a e sobe no beliche de cima e cai no sono. Em seguida, Pedro levanta, pega uma cueca na gaveta

da c�moda, senta-se na cadeira junto � escrivaninha e se debru�a sobre ela.)

LUCAS

(Retornando do banho. D� um tapinha no ombro de Pedro) Pode ir Pedro, j� acabei!

PEDRO

(Levanta, sonolento. Olha para Tavico e comenta.) Esse � que � sujeito de sorte, n�o t� nem a� pra vida e vive nadando em dinheiro... (D� um risinho, p�e a toalha, sai em seguida)

(Ouvem-se batidas na porta, Lucas vai atender)

LUCAS

(Abrindo a porta) Bom dia graciosa!FAXINEIRA

(� porta, observando o lado de dentro) Bom dia Lucas! Posso entrar?

LUCAS

Claro! Entre!

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FAXINEIRA

(Entra com cautela, faz um sinal com a cabe�a. Dirige o olhar para Tavico, comenta.) Sujeito folgado! N�o sei como aguenta, tanta farra e chegar todos os dias a essas horas da manh�! (Voltando-se para Lucas) Bem, Lucas, vai chegar, hoje, pela manh�, Juca, um sobrinho de Dona C�lia, ele � do interior e vivia com o av�, mas ele morreu e Dona C�lia mandou chamar ele pra c�. Ele vai ficar nesse quarto com voc�s.

LUCAS

(Receptivo) Claro, graciosa! Diga a Dona C�lia que pode contar conosco.

FAXINEIRA

Ela vai contar mesmo. Mais tarde eu venho arrumar o quarto. Se � que isso pode ser chamado de quarto. Coitado do menino! At� mais. (Saindo)

LUCAS

At�, graciosa, diga a Dona C�lia que n�o se preocupe, trataremos o rapaz como se fosse nosso irm�o.

PEDRO

(Entrando) O que graciosa queria t�o cedo?

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LUCAS

(Veste a cal�a) Veio avisar que teremos companhia � um rapaz do interior. Ele vai ficar aqui conosco.

PEDRO

Que bom! (Veste a cal�a) Vou acabar de me vestir pra irmos tomar caf�. (Vestindo a camisa, olhando para Tavico) Como ele ag�enta chegar t�o tarde, todos os dias?

LUCAS

(Cal�a as meias e os sapatos) O que a farra n�o faz?!

PEDRO

(Ajeitando os cabelos) Como ele consegue ter tantodinheiro? (Cal�a as meias e os sapatos. Saindo, volta para pegar os �culos)

LUCAS

Est� bem, vamos deixar o Tavico de lado e vamos tomar caf�. (Sai se ajeitando)

(As luzes se apagam e reacendem com um foco em penumbra sobre Tavico. De repente ouvem-se vozes. Lucas e Pedro retornam, pegam os seus

pertences e saem em seguida. Ouvem-se passos e vozes vindos do lado de fora do quarto. A porta se

abre. A faxineira entra acompanhada do jovenzinho,

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Juca, um rapazola, de apar�ncia p�bere. Traja-se elegantemente, de boina na cabe�a, al�m de um sobre-tudo escuro, �s costas. Traz consigo uma

grande mala e uma bolsa � tira-colo.)

FAXINEIRA

(Apresentando o ambiente) Bem, meu querido, esta � a sua cama! A escrivaninha voc� pode dividir com os outros garotos. Voc� pode usar uma parte do guarda-roupa, acho que d� pra voc� guardar as suas coisas, apesar de uma bagagem t�o grande. (Ri)

TAVICO

(Acorda e senta-se na cama) Ol�! Novo inquilino?! (Sorri)

JUCA

(envergonhado) Ol�!

FAXINEIRA

(Tomando a frente) Tavico ele � parente de Dona C�lia. Veio do interior. Ele vai ser colega de quarto de voc�s.

TAVICO

(Desce da cama com um pequeno pulo e aproxima-se de Juca e lhe estende a m�o) Ol�! Seja bem-vindo!

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JUCA

(Fica paralisado diante do rapaz. Por�m, tamb�m estende a m�o. Com voz tr�mula.) Oi! (Baixa os olhos)

TAVICO

(Prontamente) Hei! (M�o no queixo de Juca) N�o seja t�o envergonhado.

FAXINEIRA

(Interv�m) N�o assuste o menino. Ele acabar� se acostumando. D� um tempo a ele.

TAVICO

(Risos) Desculpe gurizinho, s� estava brincando. (Tocando no ombro, encorajando-o) Eu prometo que seremos grandes amigos. Deixa eu guardar isso. (Tenta arrancar a bolsa do ombro do jovem, mas n�o consegue) Vamos, eu guardo isso pra ti.

JUCA

(Reluta, mas acaba cedendo �s vontades de Tavico)Est� bem!

FAXINEIRA

Bem, agora que voc�s j� se conhecem, eu vou deixar voc�s � vontade.

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TAVICO

(Riso ir�nico) Claro, graciosa! (Passa a m�o nas n�degas da faxineira)

FAXINEIRA

Ai, n�o me pegue com essas m�os bobas.

TAVICO

Pode deixar o guri comigo. (Conduz a faxineira at� � porta e retorna para perto de Juca) Acho que est� faltando alguma coisa, n�o?

JUCA

(T�mido) O qu�?

TAVICO

(Prontamente em tom de brincadeira) Tu saber quem eu sou, e eu saber quem � tu.

JUCA

(Deixa escapar um riso) Meu nome � Juca.

TAVICO

O meu � Tavico, mas pode me chamar de Vico, muito prazer. (Estende a m�o e segura por algum tempo) Tu n�o deve se preocupar com nada. (Conduz Juca ao guarda-roupa) Tu guarda tuas

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coisas nesta parte. Ah! Pode usar a escrivaninha, tamb�m. Estou aqui pro que der e vier, ok?!

JUCA

Est� bem, obrigado! (Tira o sobre-tudo e o coloca na cadeira)

TAVICO

Agora v� tomar um banho, voc� deve estar muito cansado.

JUCA

Eu vou, sim.

TAVICO

(Pega um short que est� em cima da cama e veste)Eu vou tomar um cafezinho, at� mais. Ah! Se quiserdar um rol�, tu pode contar comigo. (Saindo)

JUCA

(Prontamente) Um o qu�?!

TAVICO

(Na porta) � como os guris daqui da cidade falam, pra dizer uma volta... um giro pela cidade. (Sai)

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JUCA

Obrigado. (Enquanto Tavico est� fora do quarto, Juca abre a mala. Pega a toalha, o roup�o, o chinelo e uma

cueca, tipo samba-can��o. Senta-se � escrivaninha, tira os sapatos e as meias, coloca-os ao lado do

guarda-roupa. Cal�a o chinelo. Debru�a-se sobre a mesinha e cochila ali mesmo.)

TAVICO

(Entra silenciosamente e se aproxima de Juca) O que houve, desistiu do banho?

JUCA

Eu?! (Sem a��o por alguns instantes. Sai e retorna, na porta) Onde fica o banheiro?

TAVICO

No fim do corredor, na �ltima porta � direita.

JUCAObrigado. (Sai)

(Tavico aproveita a aus�ncia de Juca, e veste o sobre-tudo e ensaia alguns passos de dan�a. Ouve-

se uma m�sica dan�ante, em seguida gritos e aplausos. Juca retorna e o surpreende.)

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TAVICO

(Justificando-se) S� estava provando, eu nunca tive um casaco desses. Mas aqui voc� s� vai usar de vez em quando... aqui n�o faz tanto frio. (Retira-o e p�e de volta)

JUCA

(Com as roupas no bra�o) N�o tem problema. (Senta-se na cama, dobra as roupas e as deixa ali)

TAVICO

Agora � minha vez de tomar banho. (Tira o short, ficando somente de cueca, cal�a o chinelo que est� embaixo da cama, pega a toalha e segue em dire��o � porta)

JUCA

(Enf�tico) Voc� vai assim?!

TAVICO

Assim, como?JUCA

Assim... s� de cueca?!

TAVICO

(Cinicamente) Ah! N�o tem problema. (Ri. Envolve-se com a toalha e sai.)

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(Juca veste-se e sai em seguida para tomar caf�. As luzes se apagam e reacendem com a entrada da

faxineira. De ar saliente, porta um balde, um escov�o, espanador e roupas de cama. Inicia a

tarefa.)

FAXINEIRA

(Muda os len��is, dobra as roupas, mas as mant�m nos mesmos lugares. Pega algumas cuecas com as pontas dos dedos, d� uma leve cheirada em uma delas. Prontamente) Que horror. �! (P�e a m�o no nariz e finge-se desmaiar, em seguida p�e no saco pl�stico. Resmungando.) Garotos mais desleixados iguais a estes n�o h� em nenhum lugar dessa cidade. (Passa o escov�o no piso, abandona em seguida. Continua a tarefa, cantarolando.) Lava roupa todo dia... Que cheiro de macaco apanhando! �! Que horror! (Pega um bom-ar no balde e o aperta. D� mais uma apertada e guarda. Continua a cantarolar.) Que agonia... na quebrada da soleira... (� interrompida com a chegada de Tavico)

TAVICO

(Com a cueca na m�o. Aproximando-se da faxineira, agarra-a por tr�s.) Que coisinha mais gostosa do papai.

FAXINEIRA

(Correspondido momentaneamente. Se dando conta.) Olha aqui, cara de siri... se voc� pensa que eu sou dessas, est� totalmente enganado, viu?!

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JUCA

(Na porta) Posso entrar?

FAXINEIRA

(Tentando escapar) Me largue! Seu, seu, tarado! (Escapa) Me respeite!

(Juca entra pega uma pequena n�cessaire e sai em seguida)

TAVICO

(Zombando) Meu chuchuzinho! D� um beijinho aqui no gostosinho, d�! (segura-a pelo bra�o)

FAXINEIRA

(Escapa) Se voc� fizer isso novamente, vou contar pro meu namorado, ai meu filho... (Faz sinal de cortar as genit�lias, recolhe o material. Faz careta. Saindo, na porta. D� l�ngua.)

TAVICO

(Zombaria) Vai amorzinho, vai... (Veste-se e coloca perfume)

JUCA

(Retornando) Vai sair? (Pega alguns livros da mala e os deposita na escrivaninha. Senta-se.)

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TAVICO

Vou resolver algumas paradas e de l�, vou � faculdade.

JUCA

(Surpreso) Voc� faz faculdade?! Qual o curso?

TAVICO

Qual o curso?! (Hesita. Olha-se.) Educa��o F�sica.

JUCA

Que legal! Eu pretendo fazer vestibular para l�ngua e literatura.

TAVICO

(Surpreso) O qu�?! Literatura?

JUCA

�! Literatura.

TAVICO

Pretende ser poeta?!JUCA

N�o exatamente!

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TAVICO

Bem, estou indo, sen�o vou chegar atrasado. (Pega a mochila na cabeceira da cama, ajeita-a �s costas) Tchau! Poeta.

JUCA

Tchau!

(Com a sa�da de Tavico, Juca Transfere todos os pertences da mala para o guarda-roupa. Senta-se �

escrivaninha pega um dos livros e come�a a ler. Pouca luz. J� sonolento, fecha o livro e debru�a ali

mesmo. Entra Pedro. Juca acorda.)

PEDRO

(Portando a valise, deposita-a ao p� da escrivaninha.) Voc� � o mais novo companheiro de quarto?

JUCA

Sim, e voc�, quem �?

PEDRO

Desculpe, eu sou Pedro. (Estende a m�o)

JUCA

E eu, Juca.

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PEDRO

Seja bem-vindo!

JUCA

Obrigado.

PEDRO

O que pretende fazer aqui na cidade?

JUCA

Vou fazer um cursinho e prestar vestibular.

PEDRO

Bem que eu gostaria de estar no seu lugar. Eu tive de parar os estudos, precisava trabalhar. Ajudar a fam�lia, essas coisas. Mas um dia eu voltarei para concluir. (Senta-se na cama)

JUCA

Voc� vai conseguir.

PEDRO

O que achou da cidade? (Tira os sapatos e as meias)

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JUCA

Meu av� tinha toda raz�o. Aqui � realmente uma cidade maravilhosa.

PEDRO

Ela � realmente linda. Bem, Juca, vou tomar banho. Voc� j� rangou?

JUCA

Ainda n�o. Que horas s�o?

PEDRO

J� passa do meio dia.JUCA

J�?!

PEDRO

Ent�o me espere pra irmos juntos, ok?

JUCA

Est� bem. Fique � vontade. (Levantando)

PEDRO

N�o vou demorar. (Tira toda a roupa e se envolve numa toalha) At� j�. (Sai)

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LUCAS

(Entrando) Ol�, tudo j�ia? (Deposita os livros na escrivaninha)

JUCA

Tudo bem.LUCAS

Ent�o voc� � o Juca? Eu sou Lucas.

JUCA

Muito prazer.LUCAS

Seja bem-vindo, Juca. (Estende a m�o)

JUCA

(Tamb�m estende a m�o) Obrigado.

LUCAS

Voc� perdeu o seu av� recentemente?

JUCA

Ele morreu faz pouco tempo... Eu morava com ele desde que meus pais morreram, faz cinco anos... n�o tinha com quem ficar l� na minha cidade, a� minha tia C�lia pediu que eu viesse para c�... Vou tentar refazer a minha vida, agora sem ele... Vou

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fazer um cursinho para prestar o vestibular no ano que vem.

LUCAS

Pode contar com todos n�s, viu? (D� um abra�o) Essa sua decis�o de fazer letras tem a ver com o seu gosto pela literatura?

JUCA

Eu gosto da nossa l�ngua e principalmente de nossa literatura.

LUCAS

Voc� gosta de escrever ent�o! Que legal! J� escreveu algo?

JUCA

Sim, tenho alguns poemas, qualquer dia desses eu lhe mostro.

LUCAS

Olha que vou lhe cobrar hein! (Tira os sapatos e as meias, e as coloca dentro, e p�e ao p� da cama. Cal�a o chinelo.)

JUCA

Eu prometo que mostrarei.

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LUCAS

O que achou da cidade? (Tira toda a roupa e veste o roup�o)

JUCA

Ela � bel�ssima! � muito grande, nossa!

PEDRO

(Retornando do banho) E a�, Lucas?! Gostou da novidade? Bacana, o Juca, n�o?

LUCAS

Bacana, mesmo. Ser� um grande prazer conviver com um carinha t�o inteligente quanto ele.

JUCA

(Envergonhado) Que nada, voc�s � que s�o legais.

PEDRO

Pelo visto o �nico menos letrado aqui sou eu.

JUCA

Mas voc� pode mudar isso, � s� querer.

LUCAS

� verdade, Pedr�o.

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PEDRO

Quem dera poder voltar a estudar.

LUCAS

Saiba que nem tudo est� perdido.

JUCA

S� depende de voc�. Se voc� se esfor�ar vai conseguir. Existem v�rias escolas noturnas que oferecem cursos para jovens e adultos que n�o tiveram chance de estudar. A decis�o � sua.

PEDRO

Um dia quem sabe! (Pausa) E voc� Lucas, conseguiu emprego? (No guarda-roupa, pega uma cal�a, uma camisa e uma cueca)

LUCAS

(Apresentando sinal de cansa�o) N�o. Andei a manh� inteira... pura perda de tempo. Est� muito dif�cil, a falta de vagas est� em todos os setores. Uma coisa absurda!

PEDRO

N�o fique chateado, amanh�, quem sabe, voc� tem mais sorte.

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LUCAS

�! Quem sabe. (Pausa) Voc�s j� rangaram?

PEDRO

N�o, e voc�?

LUCAS

Eu tamb�m n�o. V�o voc�s. Eu farei um lanche na rua... Vou tomar banho e sairei em seguida. Vou visitar um escrit�rio onde um amigo trabalha, quem sabe terei sorte. Vou tomar banho e sairei em seguida. (Tira o t�nis e as meias)

JUCA

Quem sabe voc� consegue.

(Os dois saem. Em seguida entra Tavico. P�e a mochila na cadeira.)

TAVICO

E a�, guri, tudo bem?

LUCAS

Tudo bem! Que novidade � essa, Tavico, aqui a essas horas?!

Page 35: GAROTOS DE PENSÃO - PDF

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TAVICO

Vou descansar um pouco. (Tira toda a roupa e veste um short e pula na cama)

(Juca e Pedro retornam do almo�o)

JUCA

(Para Tavico) Pensei que voc� fosse ficar fora o dia inteiro?

PEDRO

(Desdenha) A gente nunca sabe a que horas ele volta pra casa.

TAVICO

Que � que foi?! Ser� que n�o posso descansar?

LUCAS

Companheiros! Vou tomar banho... (Sai)

PEDRO

Bem amigos, tenho que ir agora. (Pega a valise) At� � noite (Saindo)

TAVICO

Juca, vamos dar um rol�, logo mais � tardinha? Pra voc� ir se acostumando com o ritmo da cidade.

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JUCA

(Prontamente) Claro!

TAVICO

Vou tirar um cochilo!

JUCA

Est� bem... (Senta-se � escrivaninha e cochila ali mesmo)

(Lucas retorna do banho, troca de roupa e sai. As luzes v�o se apagando lentamente e reacendem em

seguida.)

TAVICO

(Pula da cama. Aproxima-se de Juca) Guri... Guri acorda!

JUCA

(Acordando) Oi...

TAVICO

Vou comer alguma coisa e volto pra gente sair, ok?

JUCA

Estarei pronto, logo, logo...

Page 37: GAROTOS DE PENSÃO - PDF

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(Juca troca de roupa. Tavico retorna e veste-se. Ambos saem. As luzes se apagam por completo

reacendendo em seguida. Lucas e Pedro se preparam para deitar. Blackout por alguns

instantes. As luzes reacendem, Juca entra, despe-se e p�e o roup�o e vai para o banho. Lucas e Pedro

continuam dormindo. Juca retorna; pega um pijama e veste. Deita. N�o consegue dormir, tenta v�rias posi��es. Levanta e senta-se � escrivaninha, abre um livro, mas acaba pegando no sono ali mesmo. luz em penumbra. J� � madrugada, entra Tavico, sorrateiramente e se aproxima de Juca, d�-lhe um

toque no ombro. Ele acorda assustado.)

TAVICO

(Sussurrando) O que houve?! V� pra cama. (Rindo)Isso � hora de guri estar fora da cama?! (Conduz Juca at� � cama, cobre-o carinhosamente) At� amanh�. (Sobe no beliche e deita)

JUCA

(Bocejando) At�, Tavico...

(As luzes se apagam. O dia amanhece, luz em penumbra. Pouco a pouco os garotos despertam do

sono. Pedro � o primeiro a levantar. Seguido de Lucas. Ambos saem para o banho. Juca e Tavico continuam dormindo. Pedro e Lucas retornam

minutos depois, vestem-se, pegam seus pertences e saem. Juca desperta, ainda de olhos fechados, espregui�a-se, levantando em seguida. Pega a toalha, o chambre, p�e o chinelo e vai para o

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banho. Tavico continua dormindo. Momentos depois Juca retorna com o pijama na m�o, se aproxima de Tavico, receoso, nota que ele continua dormindo.

Em seguida, troca de roupa e vai tomar caf�. Com a sa�da de Juca, o quarto escurece totalmente

voltando a se iluminar com o despertar de Tavico, que, ainda sonolento, tento levantar-se, mas em v�o. Volta a dormir. Em seguida, Juca retorna,

portando um copo de leite e um p�o envolvido no guardanapo e deposita na escrivaninha. Pega a

pequena bolsa � tira-colo, olha para Tavico e sai. Tavico acorda, agora, mais disposto, p�e a toalha

em volta da cintura e sai, retornando em seguida. A luz � central.)

TAVICO

(Chateado) Droga de pens�o, n�o sobrou nada do caf�! (Dirige-se � escrivaninha e percebe o copo de leite e o p�o. Sem muita cerim�nia, pega o copo leva-o � boca, depois o p�o. Ap�s o lanche, retorna � cama e pega no sono novamente.)

(As luzes voltam � penumbra. Entra Juca, percebendo que Tavico ainda dorme, tenta n�o fazer barulho, deposita a bolsa na escrivaninha. Pega o copo da refei��o de Tavico, leva para a

cozinha. Tavico acorda senta-se na cama e olha a si pr�prio, numa verdadeira adora��o narcis�stica. Ao

retornar, Juca v� aquela cena, baixa a cabe�a, envergonhado. Senta-se � escrivaninha, pega um pequeno livro de poesia e folheia-o. Percebendo a

atitude de Juca, Tavico, pula da cama e se aproxima dele. D�-lhe um abra�o por tr�s.)

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JUCA

(Irritado) Larga-me! Ficou maluco?!

TAVICO

Desculpe guri, s� estava brincando! S� queria agradecer pelo caf� da manh�. Foi voc� quem fez essa gentileza, n�o foi?! (Afasta-se)

JUCA

(Sem olh�-lo) Eu s� quis fazer-lhe um favor.

TAVICO

E eu agrade�o muito, t� bem?! (Sorridente)

JUCA

Amanh�, voc� poderia mostrar-me a cidade? Eu adorei o passeio de ontem. Eu preciso ver um cursinho. Voc� poderia ir comigo?

TAVICO

Amanh�, eu n�o posso, guri, desculpa, t�. Tenho que sair... vou estudar com um colega, tenho prova � noite. Fica pra outro dia, ok?! (Tira a cueca, pega a toalha e coloca em volta da cintura)

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JUCA

(Desapontado) Tudo bem... (Pega alguns livros na bolsa e come�a a folhear)

TAVICO

(Cantarolando, procura algo no guarda-roupa. Acha uma cueca. Continua procurando, numa atitude indecisa.) Tu tem uma camiseta legal? (Pega uma cal�a)

JUCA

Camiseta?! (Levanta-se e vai � procura da pe�a) Esta serve?

TAVICO

(Sorridente) Claro! Valeu! (Pega a camiseta e a coloca na cama. Ajeita a toalha e sai.)

(Juca torna a sentar e retoma a leitura. Minutos depois, Tavico retorna do banho, cantarolando e

arriscando alguns passos de dan�a.)

JUCA

(Sorri) Voc� � muito engra�ado...

TAVICO

(Como se dan�asse para o amigo) New York... New York...

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JUCA

(Volta-se para Tavico, sorridente, em aprova��o � atitude do colega) Viu passarinho verde?!

TAVICO

(Aproximando-se de Juca) Vi, gurizinho... (Abra�a-o, docemente)

JUCA

(Desconcertado) O que deu em voc�?! (Volta aos livros)

TAVICO

Estou apenas feliz! N�o posso?! (Canta e dan�a. Puxa a toalha e gira em torno do corpo. Nesse momento ouvem-se gritos e assovios. Joga a toalha na cabeceira da cama.)

JUCA

(Fascinado com o ato do colega) Voc� � muito engra�ado, Tavico. (Ri)

LUCAS

(Entrando) Ol�! Juca... Tavico. (Depositando os livros na escrivaninha)

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JUCA

(Prontamente) Como foi, conseguiu emprego?

LUCAS

Nada.

JUCA

Amanh� voc� ter� mais sorte.

TAVICO

(Entrando na conversa, ironicamente) Vem trabalhar comigo... (Continua a vestir-se)

LUCAS

(Sem dar import�ncia a Tavico) Engra�adinho. E voc� o que tem feito? Deu uma sa�da?

JUCA

Bem. Eu j� dei uma sa�da, mas n�o vi muita coisa, a cidade � muito grande.

LUCAS

E do pouco que viu, o que achou? (Aproximando-se do guarda-roupa)

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JUCA

A cidade � linda. Visitei algumas livrarias e outras coisas mais.

LUCAS

Que �timo! (Quase dentro do guarda-roupa)

JUCA

Amanh� irei � procura de um cursinho.

LUCAS

Existem bons e baratos, � s� procurar.

JUCA

J� conversei com alguns alunos do cursinho, aqui no final da rua. Mas n�o gostei do m�todo.

TAVICO

(Interrompendo) O gurizinho vai arrebentar, olha a�! (Risos) N�o gostei do m�todo...

LUCAS

Ent�o pretende ser um literato? (Aproxima-se de Juca)

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JUCA

(Encabulado) Eu gosto de literatura, pretendo dar aulas. (Sem largar o livro)

LUCAS

Est�, bem, poeta... (Orgulhoso) Eu estou satisfeito com o curso de Direito. (Tira os sapatos e as meias, d� um cheirinho nelas e as coloca dentro deles. Deixa ali.)

JUCA

Legal.

LUCAS

(Como se estivesse sonhando) Pretendo fazer concurso para Juiz... (Empurra os sapatos para baixo da cama)

JUCA

Eu lhe desejo boa sorte...

LUCAS

Eu vou precisar de muita sorte. (Desanimado)

TAVICO

(Terminando de se arrumar) Bem, guris, vou � luta. (Pega a mochila e sai)

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JUCA

Tchau, Tavico. (Pausa) Voc� est� com algum problema, Lucas?

LUCAS

(Recompondo-se) O que est� pegando � a grana. Estou aqui gra�as aos meus pais, tudo que eles ganham da aposentadoria eles enviam para mim. E quase n�o d�... Para piorar a situa��o, a mensalidade da faculdade vai aumentar, da� o meu desespero, tenho que encontrar emprego o mais r�pido poss�vel. (Tirando as cal�as, e em seguida a camisa ficando somente de cueca. Procura o chinelo embaixo da cama, encontra-o e cal�a.)

JUCA

Eu sinto muito. Mas voc� n�o deve se desesperar continue procurando. Se voc� precisar de algum dinheiro � s� falar... N�o tenho muito, mas se precisar, pode contar comigo.

LUCAS

Obrigado, voc� � um cara legal! (Senta-se na cama)

JUCA

Estou pensando em pedir ao Tavico para ajudar-me a procurar um cursinho.

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LUCAS

Isso mesmo, ele pode lhe ajudar. Ent�o, amig�o vamos � luta! Seja bem--vindo ao quarto de pens�o! (Pega a toalha, p�e em volta da cintura e sai)

(Enquanto isso, assoviando, Juca veste um pijama e arruma a cama. Em seguida, Pedro entra,

carregando a valise.)

PEDRO

Boa noite, Juca.

JUCA

Boa noite, Pedro. (Volta a sentar-se � escrivaninha, e pega um livro)

PEDRO

(Deposita a valise junto � escrivaninha) Como foi o seu dia, Juca? (Tira a camisa)

JUCA

Foi bom. Estive visitando algumas livrarias e fui tentar ver um cursinho, mas ainda n�o escolhi.

PEDRO

O que n�o falta nesta cidade � cursinho. (Senta-se na cama e tira os sapatos e as meias)

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JUCA

�, ainda n�o deu para decidir, mas estou empenhado nessa tarefa.

PEDRO

� bom procurar o melhor, mesmo, pois aqui, o vestibular � muito concorrido.

LUCAS

(Entra com a cueca na m�o, tomando a palavra) Ele vai pedir a ajuda do Tavico e logo, logo eles encontrar�o o melhor cursinho, tenha certeza disso. (Estende a toalha e a cueca na cabeceira da cama. Pega um short no guarda-roupa e veste.)

PEDRO

Com certeza. Tavico � a melhor pessoa para essa tarefa. (Tira as cal�as, ficando somente de cueca)

LUCAS

(Para Juca) Tavico � quem mais tem tempo para dar um passeio pela cidade. Aproveite!

JUCA

Ele � um cara legal!

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PEDRO

Isso mesmo. Pe�a a ele para lhe ajudar em tudo que precisar, ele conhece toda a cidade. Inclusive voc� pode at� pedir para ele te levar no trabalho dele. (Pega a toalha e p�e em volta da cintura)

JUCA

O que h� de especial com o trabalho de Tavico?

LUCAS

(Olha para Pedro com reprova��o, desconversando)E hoje, aonde voc� foi?

JUCA

Estive vendo mais livrarias, o que n�o falta aqui. Na minha cidade s� existe uma, e � uma dificuldade enorme para se encontrar o livro que procuramos.

LUCAS

Ent�o, meu amigo, aqui voc� n�o ter� esseproblema.

JUCA

Tem toda raz�o. (Mudando de assunto) Pedro por que Tavico chega t�o tarde?

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PEDRO

Deve ser por causa do trabalho dele.

JUCA

O que ele faz?! Que tipo de trabalho?

PEDRO

(Desconversando) Coisas do Tavico! Bem, se precisar de algo, n�o se acanhe, eu s� n�o posso ajudar com rela��o ao cursinho, n�o conhe�o nenhum, mas outros assuntos, pode contar comigo. (Pega uma cueca)

JUCA

Obrigado, voc� tamb�m pode contar comigo.

LUCAS

Pode contar comigo, tamb�m, ok?

JUCA

Agrade�o aos dois.

PEDRO

(� porta, para Lucas) E a�, carinha, conseguiu algo?

(Lucas responde negativamente com a cabe�a)

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PEDRO

Que pena. (Sai)

LUCAS

Vamos jantar, Juca? (Veste a camiseta)

JUCA

Vamos. (Levanta-se e p�e o roup�o por cima do pijama)

(Ambos saem juntos. As luzes apagam, reacendendo com o retorno dos dois. Pedro j�

deitado.)

JUCA

N�o vai jantar, Pedro?

PEDRO

N�o, carinha, estou com muito sono... (Cobre-se totalmente)

JUCA

Voc� quer um copo de leite?

PEDRO

(Descobre s� a cabe�a) N�o. N�o se preocupe, obrigado. Boa noite pra voc�s.

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JUCA

Boa noite Pedro, durma bem!

LUCAS

Vou deitar, estou morrendo de sono, boa noite. (Deita-se)

JUCA

Boa noite. (Senta-se � escrivaninha)

LUCAS

Voc� n�o vai deitar, Juca?

JUCA

Agora, n�o. Vou ler um pouco.

LUCAS

Vai ler o qu�?

JUCA

Poemas.

LUCAS

Ent�o vou ficar um pouco com voc�. (Levanta-se da cama, pega o travesseiro e deita-se no ch�o, ao lado de Juca)

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(Foco de luz sobre os dois)

JUCA

Voc� gosta de poemas?

LUCAS

Sim, gosto muito!

JUCA

Qual o seu poeta predileto?

LUCAS

Gosto de Fernando Pessoa, Oscar Wilde. Federico Garcia Lorca. E de tantos outros.

JUCA

Fernando Pessoa � um dos meus favoritos.

LUCAS

Ele foi incr�vel!

JUCA

Voc� tem toda raz�o.

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LUCAS

E voc�, tem algo escrito?

JUCA

Sim. Quer ouvir?

LUCAS

Claro!

JUCA

(Pega um pequeno caderno, folheia-o e inicia a leitura)Ao entardecer...(Em Play-Back)De um belo dia de ver�oO Sol estava a se esconder...Num verdadeiro esbanjar de coresNum verdadeiro narcisismo.Aquele Sol...Era diferente,N�o sei explicar,Nem me pergunte.Decerto n�o saberia responderS� sei que ele estava l�.Mostrando-se pra mimComo se quisesse me desafiar.Esperto, ele.Quando percebiEntrei no jogo.Seria bobo se n�o aceitasse,

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Pois quem lucrou fui eu.Fiquei a contemplarTanta beleza.Que Jamais deixaria escapar...

LUCA

Lindo!

JUCA

O t�tulo � "P�r do sol".

LUCAS

Leia outro, por favor!

JUCA

Claro! (Folheia o caderno mais uma vez e encontra)O titulo deste � "Recordar � Viver". (Inicia a leitura)(Em Play-Back)Se para alguns recordar � sofrerPobre � aquele que n�o tem saudadesPara sentir.Se para alguns a lembran�aFaz entristecer...Pobre � aqueleQue n�o experimenta conhecer.Se para algunsA amizade � menos importante,Pobre � aqueleQue n�o tem amigos com quem viver.Se a saudade em alguns

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Faz sofrerA saudade em mim � viver.Porque faz parte de mim,Um dia, sentirei saudades de voc�.Mas n�o sofrerei tanto assim.Essa lembran�a ser� leve,T�o leve quanto o frescor do orvalho da noite.Sentirei tamb�mO frescor dessa saudade,Que me nutrir� e far� continuar...O sofrimento n�o ser� t�o intenso...Ainda que a dist�ncia seja imensa.Lembrar-me-ei de voc�Como um sonho,Que me far� viver.

LUCAS

(Demonstrando sinal de cansa�o) Leia mais um.

JUCA

(Folheia mais uma vez. Inicia a leitura.) Voc� ficoudistante de mim.

(Em Play-Back)Mas n�o h� motivosPara tanta indiferen�a.Sei que sua vida mudouMas n�o precisaEsquecer-me.N�o precisaFicar t�o distante.Creio que nossas vidas

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N�o mais ser�o as mesmas, eu sei.Mas podemos ser felizes.Voc� parece n�o querer verN�o precisa se afastar desse jeitoN�o podemos viver juntos, eu sei.Se for assim eu aceito.Sem cobran�as, eu prometo.N�o posso dizer adeus,N�s somos velhos amigos.E isso n�o pode ser desfeitoNossa amizadeN�o tem pre�o.N�o pode ser jogadaAo vento desse jeito.N�o h� problemaSe n�o podemos viver juntos.N�o h� motivo para tanta indiferen�aApesar de suas promessasQue jamais me deixaria...E eu tolo, acreditei.

LUCAS

Gostei, Juca, voc� � realmente um poeta. Vou dormir, estou muito cansado. (Levanta-se e vai deitar)

JUCA

At� amanh�. (Bocejando) Vou ficar um pouco mais. Boa noite!

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LUCAS

Boa noite!

(Juca pega no sono. Tavico entra sorrateiramente e se aproxima de Juca.)

TAVICO

(Quase sussurrando) Ei, amig�o!

JUCA

(Sonolento) Ol�, Tavico!

TAVICO

(P� de ouvido) Pelo visto voc� tem p�ssimo h�bito, seus pais n�o te disseram que dormir sentado � prejudicial � sa�de?! (Sorri)

JUCA

Eu estava lendo, acabei pegando no sono.

TAVICO

(Conduz Juca at� � cama. P�e a mochila no ch�o, despe-se e deita. Olha para baixo e sorridente, sussurra para Juca.) Psiu! Gurizinho!

JUCA

(Abre os olhos) Oi...

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TAVICO

(Sussurrando carinhosamente) N�o fa�a mais isso, t�?!

(As luzes se apagam e reacendem em seguida. Pedro e Juca despertam, um a um vai para o banho.

Os dois retornam, vestem-se, pegam seus pertences e saem. Em seguida sai Tavico. Lucas que continuou deitado, desperta, sai e volta em seguida, com um copo de leite. Veste-se e sai em seguida.Blackout. Durante o blackout entra uma m�sica

suave. Abre-se um foco de luz sobre Lucas que se encontra sentado � escrivaninha.)

LUCAS

(Em Play-Back, enquanto escreve) Meus queridos pais. J� se passaram v�rios meses desde a minha chegada nesta cidade. Como as coisas s�o diferentes agora com a chegada do Juca. Parece que o ciclo se completou com a chegada de um simples garoto do interior. Formamos hoje uma grande fam�lia. Eu continuo estudando e trabalhando. Em rela��o aos meus sonhos, de um dia chegar a ser Juiz, continuo a persegui-los. Tomara que eu consiga. Quanto a Pedro, este mudou de emprego, � chefe de vendas de uma grande multinacional francesa no ramo de tecidos finos. Encontra-se, atualmente, em viagem de neg�cios por conta do novo emprego creio que em breve nos deixar�, pois a vida dele tomar� novos rumos. O Tavico leva a mesma vida de sempre, pois n�o parece almejar grande intento. O Juca, esse,

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cada dia mais fascinado pela poesia. Passou no vestibular t�o desejado, est� feliz com o curso e portudo nesta cidade. Com o decorrer do tempo se tornaram amigos insepar�veis. Ambos est�o passando as f�rias na cidade natal de Juca. Despe�o-me com muito carinho e com a esperan�a de um at� breve.

(Black-out. M�sica suave. A luz reacende. Tavico e Juca retornam das f�rias. Entra Tavico, trazendo

consigo uma grande sacola e p�e pr�xima � escrivaninha, e volta para ajudar Juca com o

restante da bagagem composta de uma bolsa � tira-colo e um pacote.)

TAVICO

(Sorridente) Pesadas, n�o?!

JUCA

(Rindo) S�o!

TAVICO

(Deposita os objetos ao lado da sacola. Aproximando-se do amigo.) Guri, estas f�rias foram �timas. Tu precisava retornar, mesmo?

JUCA

(Sorridente, mas contido) � o in�cio do semestre, eu n�o poderia ficar mais tempo...

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TAVICO

� verdade. (Aceitando, ainda que com reprova��o)

JUCA

Al�m do mais voc� tamb�m n�o poderia ficar por muito tempo, esqueceu a sua faculdade?!

TAVICO

(Fingindo surpresa, com um tapinha na pr�pria testa) Tu tem raz�o... (Ajeita a bagagem e se aproxima de Juca) Gurizinho, quero que saiba uma coisa: Estas foram as f�rias mais felizes de toda a minha vida. Ou melhor, voc� foi a melhor coisa que me aconteceu, viu?! (Toca-lhe o rosto, suavemente)

(S�o interrompidos pelas batidas na porta. Juca vai atender.)

JUCA

(Abrindo a porta) Bom dia, graciosa! (Vai pegar um pacote)

FAXINEIRA

(Entrando com um envelope preso � cintura) Bom dia meninos pelo visto as f�rias foram boas, est�o rosados...

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JUCA

(Sorridente) Foram sim.

FAXINEIRA

Resolveu tudo por l�, Juca?

JUCA

Sim... (Pega um pequeno pacote na sacola) Eu lhe trouxe isto. (Entrega-a)

FAXINEIRA

(Recebendo com entusiasmo) Ah! Obrigado, voc� � uma gracinha. (Saindo, mas retorna em seguida) Ia esquecendo. Dona C�lia pediu pra lhe entregar isso... (Pega o pequeno envelope) � de Pedro, eleest� na Fran�a, s� retorna quando estiver pr�ximo da data do casamento dele.

JUCA

Ah! Obrigado. (Abre o envelope) Meu caro Juca...

(Revers�o de luz para Pedro, trajando roupas de inverno)

PEDRO

Caro amigo Juca. A melhor coisa que me aconteceu foi t�-lo conhecido. N�o fossem os teus conselhos n�o teria a oportunidade que tenho agora. Foi

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gra�as a voc� que, em uma das minhas visitas � f�brica de tecidos conheci a linda Marie Berg. Ela � uma bela jovem e estamos pensando em nos casar e morar aqui na Europa. S�o pretens�es nossas! Quanto a Paris, voc� est� cheio de raz�o quando disse que ela � a mais sedutora de todas as cidades. Estou vivendo este sonho, apesar das dificuldades que ainda tenho com a l�ngua francesa, estou tentando superar e viver esses momentos e estou vivendo por voc�, caro amigo. Espero nos encontrarmos em breve. Aceite um grande abra�o do seu amigo Pedro, e da minha Marie Berg, que, apesar de n�o conhec�-lo, nutre por ti uma doce ternura. At� breve, meu amigo.

JUCA

(Emocionado. Sussurrando) Voc� merece, meu amigo.

TAVICO

(Para Juca) Algum problema com o Pedro? (Enxugando a l�grima que escorre no rosto do amigo)

JUCA

(Envergonhado) N�o, s�o apenas boas not�cias...

FAXINEIRA

Que bom, Pedro � um bom garoto. Eu vou deixar voc�s... Voc�s precisam descansar. (Saindo)

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TAVICO

(Acompanha a faxineira at� � porta) Tchau, saborosa!

JUCA

(Abre a sacola e retira a toalha, o chinelo, a cueca e o roup�o) Eu vou tomar banho. (Saindo)

TAVICO

Depois eu irei. (Despe-se, ficando apenas de cueca. Deita-se e pega no sono.)

(As luzes se apagam e reacendem em seguida. Juca retorna com as roupas �s costas, se aproxima e fica

a contemplar o amigo que dorme. Lucas o surpreende.)

JUCA

(Percebe a presen�a do colega) Oi Lucas! (Nervoso, dobra as roupas e as p�em na cama)

LUCAS

(Discreto. Coloca a valise em cima da c�moda.)Venha, d�-me um abra�o!(Tira os sapatos e as meias) E a�, companheiro, como foi de viagem?!

JUCA

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(Desconsertado) Fui bem. E voc�, o que fez durante as f�rias?

LUCAS

Trabalhando, companheiro. Arranjei uma boa grana, mandei a metade para os meus pais. Eles est�o vindo me visitar. (Tira a cal�a)

JUCA

Que bom, Lucas! Fico feliz por voc�.

LUCAS

Obrigado. Mas me conte. Como foi por l�? O Tavico deu trabalho? (Olhando-o) Voc� est� diferente. Est� mais corado. Conte--me as novidades. (Tira a camisa, ficando somente de cueca. Pega a toalha e envolve na cintura.)

JUCA

(Olhar obliquo, como se quisesse escapar �s indaga��es do amigo) Bem, nossas f�rias foram �timas, Tavico � um grande companheiro.

LUCAS

(Insiste) Isso eu sei, mas me conte as novidades.

Page 65: GAROTOS DE PENSÃO - PDF

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JUCA

Nos divertimos muito. (Tirando as coisas da sacola e pondo-as no guarda-roupa)

LUCAS

(Seguindo-o) Que bom. E os poemas, voc� tem escrito?

JUCA

Sim, alguns.

LUCAS

Depois gostaria de v�-los. Conversaremos mais tarde, ok? (Pega uma cueca e sai)

(Juca se reaproxima de Tavico, cautelosamente. H� um momento em que ele parece acordar. Se afasta, mas continua a observar o companheiro. Ouvem-se passos. Juca, pega a sacola e a coloca em cima do

guarda-roupa.)

LUCAS

(Entrando com uma cueca na m�o) N�o vai deitar?

JUCA

Estou sem sono. (Tira o roup�o, veste o pijama e senta-se � escrivaninha)

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LUCAS

Eu gostaria de ouvir os novos poemas, mas estou com muito sono. (Estende a toalha no lugar de sempre, pega um short e veste, em seguida, deita) Boa noite, carinha!

(Foco de luz sobre Juca)

JUCA

(Sentado � escrivaninha. Voltando-se para o colega)At� amanh�! (Pega uma folha de papel e uma caneta e come�a a escrever. Escreve as primeiras palavras, amassa a folha e joga-a fora. Pega outra e tenta mais uma vez.) Terra... (Olha para Tavico e torna a escrever)

(Simultaneamente � escrita, entra o flash-back com a voz de Juca)

Terra,Terra vida. Terra querida.Terra que brota a vida,Terra que brota a �gua,Terra que brota o amor.Terra,Terra vida,Terra que me d� luz.Terra que me conduz.Terra,Terra alegria.Terra que me faz sorrir,

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Terra que me faz sonhar.Terra que me faz pensar.Terra,Terra ainda que perto, distante est�...Terra,Terra vida,Terra querida.Raz�o do meu querer,Raz�o do meu fazerRaz�o do meu sofrer.Raz�o do meu viver...Terra,Terra, querida.Se um dia eu morrerJuro jamais te esquecer...

(Finaliza o Play-Back)

(Bocejando) Que sono! (Fecha o caderno e vai deitar)

(A luz se apaga e reacende. Lucas desperta cantarolando, pega a toalha e sai para o banho,

retornando em seguida, veste-se, pega os pertences e sai. Foco de luz sobre a escrivaninha. Somente Tavico e Juca est�o deitados. Tavico desperta,

espregui�a-se, levantando em seguida. P�e a toalha em volta da cintura. Vai ao guarda-roupa, pega uma cueca e sai retornando ap�s o banho. Juca continua deitado, por�m acordado, fingindo dormir, observa

atentamente todos os passos do amigo.)

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TAVICO

(Observando Juca) Psiu! (Mexe na axila de Juca) B�h! Que gurizinho dorminhoco. (Senta-se ao lado de Juca e mexe no nariz) Acorda, Tch�!

JUCA

(Encolhendo-se com as c�cegas) O que deu em voc�?!

TAVICO

(Carinhosamente) N�o t� com fome?!

JUCA

Estou, sim! (Risos, com as c�cegas que o amigo faz de vez em quando.)

TAVICO

(Voz dengosa) Ent�o, levanta! (Faz c�cegas)

JUCA

(Dengoso) Eu quero ficar um pouco mais. (Encolhe-se)

TAVICO

(Intensifica as c�cegas. Voz mimada e cantada.)Gurizinho pregui�oso. Pregui�oso! (Intensificando ainda mais as c�cegas) Vamos acordar.

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(Novamente, voz cantada) O gurizinho, n�o quer levantar! Levantar!

JUCA

(Revidando) Voc� n�o me deixa dormir. N�o me deixa dormir.

(Em meio � brincadeira a toalha de Tavico se desprende. Juca tenta escapar. Ambos caem no ch�o e rolam um sobre o outro. Juca est� em dec�bito dorsal. Tavico ajoelhado sobre ele.

Paralisam, se dando conta da situa��o. As luzes v�o se apagando suavemente.)

TAVICO

(Sussurra) Eu gosto tanto de ti! (Forma um murro, carinhosamente.)

JUCA

Espere! N�o, por favor!

TAVICO

Psiuu! Eu n�o vou ti machucar! T� bem, gurizinho? Meu gurizinho. (Sussurrando) Calma!

JUCA

N�o, por favor!

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TAVICO

(Carinhoso) Calma! Confie em mim...

JUCA

(Temeroso) N�o me machuque, por favor!

(Blackout por alguns instantes, mas ainda ouvem-se sussurros. A luz reabre em penumbra. Os tr�s est�o deitados. Juca desperta e senta-se na cama. Lucas boceja, se levanta e abre o guarda-roupa, pega o roup�o e sai sonolento, acenando para Juca, que olha para o amigo, como se quisesse dizer algo. Levanta-se e vai procurar algo no guarda-roupa, sem sucesso. Vai at� � escrivaninha, senta-se na

cadeira, pega o poema que comp�s um outro dia e l�. Vai ao guarda-roupa, pega algumas roupas e sai

para o banho. Lucas retorna, veste-se e sai em seguida. Juca retorna, veste-se e sai. Tavico levanta, se veste e sai. As luzes se apagam suavemente e reacendem com a entrada da

faxineira.)

FAXINEIRA

(Entrando com o material para limpeza) Al�, al�, responde... responde com toda sinceridade... (Pega um pano e passa nos m�veis, passa o escov�o no ch�o, aperta o bom-ar) Como esses garotos conseguem viver dessa maneira. (Continua com a tarefa, recolhe o restante das roupas. Arrisca uma leve cheirada em uma das cuecas de Tavico) Ai que horror! (Recolhe os restantes das roupas e p�e no

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saco pl�stico) Ufa! Terminei... (Recolhe o material, d� um giro e sai.)

(Revers�o de Luz para a cal�ada)

(Juca porta uma sacola. Depara-se com um grande cartaz contendo o seguinte an�ncio: “A Companhia O Grande Le�o apresenta esta noite o Show com os

mais belos GoGo Boys da temporada com a participa��o do Guri do Rio Gua�ba”e, ao lado, a foto

de Tavico. Juca entra na casa de show, que est� lotada, onde todos, num verdadeiro frenesi, gritam

e assoviam. Em seguida, ouve-se a voz do apresentador em Play-back.)

VOZ DO APRESENTADOR

Boa noite! Agora, o momento mais esperado desta noite. Ele, o mais belo GOGOBOY. O Guri do Rio Gua�ba.

(Entra Tavico usando m�scara de zorro, trajando roupas pretas e uma t�nica vermelha. Neste

momento as pessoas entram em del�rio, os gritos e assovios se intensificam. Juca, ali no canto. Tavico

tira pe�a por pe�a e a plat�ia responde a todo instante, num verdadeiro del�rio. Neste momento, Juca procura um cantinho para n�o ser visto, em

seguida sai. Tavico somente de sunga parcialmente retirada do corpo, segura por uma das m�os

protegendo a genit�lia e sai.)

(Revers�o de luz para o quarto de pens�o)

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(No quarto de pens�o, Lucas dorme. Juca est� deitado, com a entrada de Tavico, finge-se dormir. Tavico despe-se, pega uma toalha, p�e na cintura e

sai em seguida. Juca abre os olhos e olha em dire��o � porta. Ouvem-se passos. Com o retorno

de Tavico, Juca volta a fechar os olhos. Tavico retira a toalha e veste um shorte e deita. As luzes se

apagam e reacendem em seguida. Lucas desperta e vai para o banho. Em seguida Tavico acorda e

levanta-se.)

TAVICO

(Sorridente, cutuca Juca) Bom dia, gurizinho!

JUCA

(Abre os olhos) Bom dia. (Vira-se para o outro lado)

TAVICO

(Vai em dire��o ao guarda-roupa. Pega uma cueca. Olha para Juca, e se aproxima.) Ei, guri, n�o vai levantar? J� � tarde, hein!

JUCA

(Olhar firme) Tavico, onde voc� trabalha? Voc� nunca me convida para ir l�, por qu�?

LUCAS

(Entrando) Bom dia.

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JUCA

Bom dia Lucas.

LUCAS

Sobre o que voc�s est�o conversando?

JUCA

Sobre o trabalho de Tavico.

TAVICO

(Retrucando) Voc� n�o ir� gostar, faz muito barulho, sabe como � discoteca, muito barulho, fuma�a de cigarro, gente muito chata, al�m do mais voc� n�o gosta de cigarro, bebida, sabe como �!

LUCAS

� isso, com certeza Juca n�o gostar� do ambiente. (Veste-se)

JUCA

Voc� me leva qualquer dia desses?!

TAVICO

Claro! Levo sim.

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JUCA

Que tal hoje � noite?

(Lucas e Tavico se olham)

TAVICO

Hoje � noite?! N�o! N�o d�! Marquei com uma gata, sabe, n�?! N�o posso falhar, sen�o o que ela vai pensar de mim?

JUCA

Amanh�, ent�o!

TAVICO

Sim, amanh�.

JUCA

Est� bem, amanh�!

TAVICO

(Acabando de se vestir) Vou resolver uma paradinha, s� volto � noite. At� mais.

LUCAS

Espere um momento, vou com voc�.

(Ambos saem juntos)

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JUCA

(Sussurrando) Ser� que ele ter� coragem de me levar at� aquela casa? Vamos esperar pra ver! (Torna a deitar)

(Black-out por alguns instantes. As luzes reacendem. Juca se levanta e troca de roupa e

senta-se � escrivaninha. Pega no sono ali mesmo. Em seguida Lucas entra.)

LUCAS

(Deposita os pertences na cama e dirige-se a Juca)Juca. Juca! (Tentando acord�-lo) Amig�o, perdeu a hora? Aonde vai, assim t�o bem vestido?!

JUCA

(Esfregando os olhos) Que horas s�o?

LUCAS

J� passa das onze e meia.

JUCA

Cad� Tavico?

LUCAS

Tavico? Bem... ele deve estar trabalhando.

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JUCA

Trabalhando?! Mas ele prometeu...

LUCAS

Esqueceu que ele s� chega tarde? O que est� havendo?

JUCA

Fiquei aqui o dia inteiro, esperando. Ele prometeu me levar onde ele trabalha. (Desolado)

LUCAS

Onde ele trabalha?! Que papo � esse?! Explique-me!

JUCA

Pelo visto ele me enganou.

LUCAS

O que est� havendo, Juca? Onde ele trabalha?! � isso? Mas voc� sabe onde, o que faz?!

JUCA

N�o, n�o sei. Mas ele me prometeu que hoje me levaria, ser� que aconteceu alguma coisa?

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LUCAS

� poss�vel. Voc� n�o quer tirar a roupa e deitar? Amanh� voc�s conversam, est� bem? Voc� j� jantou?

JUCA

N�o. � melhor deitar, estou morrendo de sono.

LUCAS

N�o quer comer alguma coisa, antes de deitar?

JUCA

N�o. N�o estou com fome.

(Juca troca de roupa e vai para a cama. Lucas se despe e vai para o banho. Retorna, e senta-se �

escrivaninha. Entra Tavico.)

TAVICO

Que novidade � essa, acordado a essa hora?

LUCAS

(Irritado) Cara, voc� � louco, que hist�ria � essa de levar Juca onde voc� trabalha? Ele � menor, ou voc� esqueceu? Voc� est� louco?!

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TAVICO.

(Baixo) Claro que eu n�o vou levar!

LUCAS

� bom mesmo, que pense assim. (Baixo) Mas que id�ia maluca foi essa de deix�-lo esperando? Ele estava todo arrumado, esperando por voc�. O pobrezinho ficou o dia inteiro aqui no quarto, sem sequer fazer as refei��es. Que esp�cie de amigo � voc�?!

TAVICO

Calma carinha! (Baixo) Eu sinto muito por tudo isso. Eu n�o tive outra sa�da, juro. N�o sei porque ele insiste tanto em ir no meu trabalho!

LUCAS

Como voc� vai fazer, ent�o? N�o pense que ele desistir� da id�ia.

TAVICO

Eu sei, mas terei que encontrar uma sa�da.

LUCAS

Essa eu quero ver. (Deita-se)

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TAVICO

(Sussurrando) E agora?! (despe-se e deita)

(As luzes apagam e reacendem. Lucas vai para o banho. Juca acorda, sai e volta em seguida, senta-se � escrivaninha. Lucas retorna. Tavico continua

dormindo.)

LUCAS

Ol� Juca? (Estende a toalha na cabeceira da cama)

JUCA

Bom dia Lucas. Tavico ainda n�o acordou.

LUCAS

Vai ver ele teve algum problema. (Pega a cal�a e veste)

JUCA

� o que eu quero saber.

LUCAS

Voc� n�o vai � universidade? (Vestindo a camisa)

JUCA

Irei mais tarde.

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LUCAS

Tenho que ir � luta. (Terminando de cal�ar os sapatos. Olha-se no espelho, pega a valise) Ent�o at� mais.

JUCA

At�, Lucas!

(Lucas sai. Juca continua sentado � escrivaninha e ali mesmo pego no sono.)

TAVICO

(Levanta e se aproxima de Juca, tentando acord�-lo) Guri... guri, acorda!

JUCA

(Acordando) O que houve? Esperei a noite inteira.

TAVICO

(Explicando-se) Desculpe gurizinho. � que tive problemas na faculdade, para n�o me atrasar, fui direto pro trabalho, a� n�o deu pra voltar aqui, pra lhe buscar, mas n�o se preocupe, um dia desses eu levarei voc�, prometo.

JUCA

Promete, mesmo?

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TAVICO

Claro! Eu n�o iria negar isso a um amig�o como voc�.

JUCA

Eu vou cobrar, hein?

(Black Out por alguns instantes. As luzes reacendem vagarosamente. Entra a faxineira e

realiza a sua tarefa em off. Com a sa�da da faxineira as luzes se apagam e reacendem com a entrada de

Lucas e Tavico.)

LUCAS

Tavico, e aquela hist�ria de levar o Juca na boate?

TAVICO

Ainda bem carinha, ele nunca mais pediu pra ir. Est� sendo um al�vio. (Depositando a mochila na cabeceira da cama)

LUCAS

Ser� que ele esqueceu ou se cansou de tantas mentiras que voc� contava para ele?

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TAVICO

N�o sei, mas o importante � que ele nunca mais insistiu no assunto.

LUCAS

Por que ser�? Ele estava t�o decidido.

TAVICO

Ele anda muito ocupado com as novas atividades que assumiu, n�o v� que ele chega sempre tarde.

LUCAS

Vai ver que � isso mesmo. H� meses ele j� n�o tem tempo para as nossas noitadas po�ticas. Mudando de assunto, sabe que dia � amanh�?

TAVICO

N�o, por qu�?

LUCAS

� o anivers�rio do Juca.

TAVICO

(D� um tapinha na testa) Como pude esquecer, carinha?!

Page 83: GAROTOS DE PENSÃO - PDF

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LUCAS

Temos que fazer uma surpresa para ele.

TAVICO

Que tal fazer a comemora��o l� na boate?

LUCAS

Nem pensar, est� louco?!

TAVICO

Brincadeirinha.

LUCAS

Vamos preparar uma festinha para ele.

TAVICO

�tima id�ia. Vou providenciar agora mesmo. Amanh� ele ter� uma grande surpresa. (Sai)

(As luzes se apagam e reacendem vagarosamente at� que o ambiente fique pronto para a festa. H� m�sica suave ao fundo. Entram Lucas e Tavico.)

TAVICO

Ficou uma beleza, n�o foi? S� falta o dono da festa. Mas por que Juca est� demorando tanto?

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LUCAS

Estranho, nas quartas-feiras ele chega cedo.

TAVICO

Deve ser o �nibus.LUCAS

Mas ele vem � de t�xi.

TAVICO

N�o pensei nisso. Voc� acha que aconteceu alguma coisa?

LUCAS

Espero que n�o. Mas j� estou ficando preocupado.Que horas s�o?

TAVICO

Quase meia noite. Vamos esperar mais meia hora, caso n�o apare�a a gente vai procurar por ele.

LUCAS

Vamos aguardar um pouco mais.

(Ouvem-se muito barulho no corredor. Tavico e Lucas v�o at� � porta. Entra um homem carregando Juca. Tavico ajuda. P�e-no na cadeira. Em seguida

entra a faxineira, aflita.)

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FAXINEIRA

O que aconteceu com ele?

TAVICO

Este mo�o trouxe Juca nesse estado.

LUCAS

Onde o senhor o encontrou?

TAXISTA

Na boate, onde pego ele todas as noites.

(Todos se olham interrogativos)

LUCAS, TAVICO E A FAXINEIRA

(Ao mesmo tempo) Na boate? Que boate?!

TAXISTA

Na boate, onde pego ele. (Para si mesmo) � estranho, dia de hoje ele n�o vai l�! Eu tava no ponto quando ele entrou, mas n�o vi sair. A� resolvi entrar. Ele tava l� no canto... uma outra coisa estranha, ele s� tomava refrigerante, mas hoje, tomou um porre daqueles. Nunca vi esse garotinho t�o triste, e olhe, eu pego ele h� mais de um ano, e ele sempre apareceu na hora marcada. Hoje ele deve t� muito triste, pra tomar um porre desse tamanho.

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FAXINEIRA

(Para Tavico) Isso deve ser obra sua, n�o?

TAVICO

Capaz! N�o tenho nada a ver com isso graciosa. A gente tinha preparado uma surpresa pra comemorar o anivers�rio dele. Veja!

LUCAS

(Intercedendo) Eu sou testemunha, graciosa. Tavico n�o fez nada do que voc� est� pensando.

FAXINEIRA

O que t� acontecendo? O que vou dizer a Dona C�lia? (Abra�a-o)

LUCAS

Para tudo h� uma explica��o. Amanh� conversaremos, a� tudo se esclarecer�.

FAXINEIRA

(Irritada) Se voc� Tavico, tiver alguma coisa a ver com isso, pode ir preparando as suas coisas porque Dona C�lia vai botar voc� pra fora daqui. Ah se vai!(Sai)

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TAXISTA

Bem, j� fiz a minha parte, vou tentar ganhar alguns trocados.

TAVICO

Ele pagou a corrida?

TAXISTA

N�o se preocupe. Ele sempre paga no final do m�s, e olha, nesses meses todos, nunca falhou. Bom menino. (Sai)

TAVICO

Obrigado mo�o. (Fecha a porta)

LUCAS

Tavico, Tavico, o que � que voc� tem a ver com essa hist�ria?! Voc� n�o seria t�o vil, seria?

TAVICO

Capaz! Lucas! N�o tenho nada a ver com isso.

LUCAS

Ent�o como ele foi parar na boate?

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TAVICO

E eu sei! E se n�o for a mesma boate? Vamos esperar at� amanh�...

(Ambos tentam levantar Juca, mas ele resiste)

JUCA

Voc�s est�o me olhando com essas caras por qu�?

TAVICO

O que aconteceu, guri?

JUCA

Voc...Voc� n�o sa... be, n�o sabe. Eu Estava l� todas as noites. Vendo o mais belo Go... Go... Boy do Rio Gua�ba. (Imita passos de dan�a, mas cambaleia, ambos o seguram)

LUCAS

O que voc� est� falando Juca?

JUCA

De quem eu estou falando... Estou falando do Go, Go Boy. Quem � o Go, Go Boy do Rio Gua�ba? Ele, o Go Go Boy exclusivamente ele. Tavico...

(Ambos se olham interrogativos)

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LUCAS

Como voc� descobriu?

JUCA

Eu vi. H� muito tempo que eu sei. Todas as noites, por todo esse tempo. L� no cantinho. Vendo voc�, se mostrando. Seu depravado. De-pra-va-do!

TAVICO

Me perdoe meu amigo.

JUCA

Perdoar. Perdoar nada! Seu traidor. Ainda diz que � meu amigo. Judas!

TAVICO

Meu amigo, n�o fale assim. (Tenta toc�-lo)

JUCA

N�o toque em mim, seu traidor. Seu vendido, seu depravado. Eu tenho nojo de voc�. (Chora)

LUCAS

Vamos Tavico, Juca precisa descansar... amanh� tudo ser� diferente. (Leva-o para a cama)

(Black Out por algum tempo. Um foco de luz se abre suavemente sobre a escrivaninha. Tavico est�

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sentado velando o sono de Juca. Lucas acorda, vai tomar banho e retorna em seguida, troca de roupa e sai. Tavico continua ali mesmo. Juca acorda, mas

continua deitado.)

TAVICO

Meu amigo...

JUCA

(Choroso, vira-se para o amigo) Pensei que nossa amizade jamais pudesse ser maculada. Sei que seria dif�cil transpor algumas barreiras. As regras s�o severas ou n�s as tornamos assim. Elas n�o me permitem viver plenamente o que ora sinto. Talvezas coisas pudessem ser diferentes, caso eu entendesse o que est� se passando, mas n�o tenho for�as. Pois me sinto enfraquecido a cada dia.Esperava que o sentimento que nutro por voc� pudesse continuar, apesar de tudo. Mas agora j� n�o sei mais... Sinto um grande vazio no peito. Vontade de dormir para sempre. Neste momento sinto o ch�o se abrir numa escurid�o sem fim.

TAVICO

(Ajoelha-se ao p� da cama) Oh! Grande amigo. Meu bom amigo. Voc� precisa me perdoar. O que ser� de mim se voc� n�o me perdoar? Ser� que conseguirei sobreviver com essa culpa?

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JUCA

Espero que voc� sobreviva. Eu sei que as lembran�as me far�o sofrer. Tentarei me nutrir dessa saudade que poder� me fazer continuar, quem sabe... Me lembrarei de voc� como um sonho. Que me far� viver ou morrer...

TAVICO

Ent�o meu amigo... vamos esquecer o que houve. Vamos p�r uma pedra em cima do que aconteceu...

JUCA

Isso j� n�o mais ser� poss�vel.

TAVICO

(Lamentando-se) Por que voc� faz isso comigo, gurizinho... Meu gurizinho. Por qu�? (Chora)

JUCA

Saia daqui e me deixe com a minha tristeza... (Vira-se para o outro lado)

(Black-out por algum tempo. Juca se encontra deitado, enfermo, de aspecto p�lido e quase inerte,

trajando um surrado pijama. Entra a faxineira, acompanhada de um m�dico.)

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FAXINEIRA

(Aflita) Doutor, qual � o problema do Juquinha? Ele n�o quer comer, n�o sai do quarto. Est� sempre com febre. Parece que o mundo acabou. (Ajoelha-se ao p� da cama) Na semana passada Dona C�lia levou ele no pronto socorro, os m�dicos fizeram v�rios exames, mas eles n�o dizem nada. (Pega os exames que est�o na gaveta da escrivaninha e entrega para o medico)

M�DICO

(Observando os exames) Realmente, pelos exames... No momento � o que posso dizer para a senhora.

FAXINEIRA

(Esperan�osa) Como assim?! Ele n�o come... t� desanimado, t� sem sangue, ainda assim n�o t� doente? Como pode?!

M�DICO

� verdade... (Pensativo) Ele est� precisando de outro especialista. (Senta-se na cama) Um psiquiatra ... (Fazendo ausculta pulmonar)

FAXINEIRA

Logo agora que Dona C�lia est� viajando... esse pepino veio cair justamente nas minhas m�os.

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M�DICO

Quem � Dona C�lia?

FAXINEIRA

A dona da pens�o. Ela � parenta dele. O pobrezinho n�o tem mais ningu�m por ele. Ele s� pode contar com ela e com a gente.

LUCAS

(Entrando) Ele n�o melhorou? (p�e os pertences na escrivaninha) E a� doutor, como ele est�? O que ele tem?

M�DICO

Pelo visto est� tendo alguma dificuldade. Um problema e n�o est� conseguindo lidar com ele. Juca � muito jovem. E os jovens passam por transforma��es... por mudan�as � vezes cru�is. Algumas pessoas se fragilizam diante dessas mudan�as. Isso � natural. E nesse momento ele est� precisando de ajuda, de muita ajuda. Ele precisa de um psiquiatra ou um psic�logo.

FAXINEIRA

Isso � culpa de Tavico, aquele c�o danado...

M�DICO

O que ele fez?

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LUCAS

(Para a faxineira) Ora graciosa... (Para o m�dico)Doutor ele teve uma discuss�o com um dos nossos colegas de quarto.

FAXINEIRA

Discuss�o n�o... foi uma grande trai��o.

M�DICO

(Pausa) Eu vou receitar um antit�rmico. (Arrumando o material)

JUCA

(Delirando, balbucia algumas palavras) Vic... Vic!

FAXINEIRA

(Comentando) Ele sempre fala estas palavras... M�DICO

(Pensativo) No momento � o que posso fazer. A febre vai passar. Pense no que eu disse. Leve-o aoprofissional o mais r�pido poss�vel.

LUCAS

Um profissional?

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FAXINEIRA

Depois eu lhe explico.

M�DICO

Bem, tenho que ir agora, preciso visitar outros pacientes. Qualquer coisa podem me chamar. Tenham um bom dia. (D� uma �ltima olhada em Juca. Saindo.)

FAXINEIRA

Eu vou levar o senhor at� � porta, Doutor. Lucas fique ai com ele que eu volto j�.

(A faxineira retorna)

LUCAS

Que profissional � esse que o m�dico falou?

FAXINEIRA

Ele disse que Juquinha precisa de um psiquiatra ou um psic�logo. Ser� que Juquinha t� doente da cabe�a?

LUCAS

Ora, graciosa, n�o fale bobagem. Amanh� mesmo vou providenciar isso.

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FAXINEIRA

Tudo culpa daquele c�o danada... Mas quando Dona C�lia chegar, ela vai ver o que � bom pra tosse.

JUCA

(Balbuciando) Vov�... vov�.

FAXINEIRA

Coitadinho, vive chamando o av�, quando n�o, fica repetindo Vic... Vic.

LUCAS

Ele est� delirando... � por causa da febre. (Toca a testa do amigo)

FAXINEIRA

Lucas, fique com ele vou ter que limpar os outros quartos. (Saindo)

TAVICO

(Entrando) Ol�, gostosa!

FAXINEIRA

N�o toque em mim, seu c�o danado. (Sai)

TAVICO

Como ele est�, Lucas?

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LUCAS

N�o est� nada bem. O m�dico pediu que a gente o levasse a um psic�logo. Voc� sabe porque ele est� assim, n�o sabe?

TAVICO

At� voc� Lucas? J� n�o basta a goza��o da graciosa, com aquela hist�ria de c�o danado?

LUCAS

Fique com ele, eu vou ver se consigo marcar com um psic�logo. Vou tentar resolver isso antes de minha viagem.

TAVICO

V� Lucas, v�! E n�o se preocupe eu pago.

LUCAS

Eu n�o vou demorar. (Sai)

TAVICO

(Senta-se, junto � Juca) Gurizinho eu n�o entendo. Por que?! Por qu�?! (Toca na cabe�a de Juca)

(As luzes v�o diminuindo. Juca continua deitado.Tavico pega no sono. O quarto est� em sil�ncio total, que � quebrado pela entrada da faxineira

trazendo um copo d’�gua numa bandeja.)

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FAXINEIRA

(Empurrando Tavico com o p�) Acorda, c�o danado, traidor!

TAVICO

L� vem voc� com esse c�o danado. T� quase de saco cheio.

FAXINEIRA

Ai que meda! Sai da� que eu quero dar o rem�dio pra Juquinha!

TAVICO

Sua chata.

(A faxineira faz careta. Tavico se levanta e vai sentar-se � escrivaninha e fica ali observando. Pega

o caderno de poema de Juca e folheia-o)

FAXINEIRA

Juquinha, Juquinha... Tome o seu rem�dio, tome.

(Juca acorda)

JUCA

N�o quero...

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FAXINEIRA

Vai tomar sim.. Ou quer morrer?

JUCA

(Se vira para o outro lado) Prefiro morrer...(A faxineira desiste e sai)

TAVICO

Guri... (Volta para perto de Juca) Meu guri. Meu gurizinho! (Abra�a-o, fortemente)

JUCA

(Em prantos, abra�a-o) Tavico...

TAVICO

(Rindo. Segurando os ombros de Juca.) Ei! Eu estou aqui...

JUCA

Eu sei... Eu sei...

TAVICO

Meu gurizinho! O que est� havendo, por que n�o me d� a chance de explicar?!

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JUCA

Por que voc� nunca me contou? Por que voc� trabalha naquele lugar?! Voc� se prostitui. Se vende, n�o �? Voc� � garoto de programa...

TAVICO

Calma, n�o � assim como voc� est� pensando.

JUCA

Como n�o � assim? E aquilo que voc� faz naquela casa, � o qu�?!

TAVICO

Eu dan�o, sim. Eu sou dan�arino... � a minha profiss�o.

JUCA

Dan�arino?! (Ri) Voc� � Strip!

TAVICO

� o meu trabalho, eu sobrevivo dele. Entenda, � um trabalho como outro qualquer.

JUCA

Voc� sabe que n�o � s� isso...

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TAVICO

(Pausa) A maioria das pessoas tem preconceito acerca dos dan�arinos de boate, mas fazer o qu�!

JUCA

(Balbuciando) N�o � s� por isso. (En�rgico) Pensa que eu n�o via, voc� saindo com aquelas pessoas... Vender o pr�prio corpo! N�o existe nada mais deprimente que isso... Isso � uma viol�ncia contra se mesmo... (En�rgico) Ser� que voc� n�o percebeo que est� fazendo?!

TAVICO

(Levanta-se e afasta-se de Juca) Eu sei disso, mas � a vida que tenho pra viver. Quanto ao que fa�o, � apenas uma das poss�veis formas de se vender. Quando voc� trabalha dando a sua pr�pria vida por um �nfimo sal�rio, n�o seria tamb�m uma forma de se prostituir, meu caro? Tudo � uma quest�o de ponto de vista. O meu trabalho, � como outro qualquer. A gente ganha o suficiente pra viver e n�o precisa ter um diploma ou experi�ncia. Voc� pensa que eu n�o tentei fazer outras coisas? Tentei sim... Voc� n�o imagina a dureza que foi a minha vida no in�cio. At� p�o com banana eu comi pra n�o morrer de fome. Implorando um emprego, mas n�o, ningu�m me abria as portas. Voc� n�o imagina o quanto sofri, quando cheguei aqui. Estava cheio de sonhos, como voc�. Mas n�o tive a mesma sorte. Foram v�rias tentativas, mas nada! Um dia eu estava num banco da pra�a quando se aproximou

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uma senhora, me olhava como se quisesse me devorar... vendo o meu corpo ela logo me ofereceu trabalho. Era pra dan�ar pra turistas em f�rias. Imediatamente aceitei e tudo parecia fant�stico. Eram roupas caras, sapatos... carteira sempre com dinheiro. Um mundo que me deixava fascinado. Mas com o passar do tempo, aquilo que parecia um sonho, pouco a pouco foi se tornando um pesadelo. Aquela doce senhora foi assassinada por um desses fregueses que bebiam e ficavam violentos. Logo em seguida mais um amigo foi tragicamente assassinado. (Aproxima-se e volta a ajoelhar-se pr�ximo � cama de Juca) Da� em diante as coisas come�aram a mudar, as dificuldades, o medo de tamb�m virar presunto, era um fantasma que me atormentava a todo momento. Alguns dos meus colegas, com medo retornaram pra suas cidades. Alguns foram embora com os seus casos. Outros foram tirados de l� por alguma madame apaixonada, com a promessa de dias melhores. Quantas e quantas vezes sonhava por uma chance. Por algu�m que me oferecesse uma oportunidade. Algo diferente da vida que levo. Mas esse dia nunca chegou.

JUCA

Voc� n�o pode continuar nessa vida... tente procurar algo melhor.

TAVICO

(As palavras saem espremidas) E voc� acha que eu n�o tentei?! (Mais contido) Mas as coisas se

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tornaram dif�ceis. (Pausa) Logo ap�s aqueles acontecimentos, fui convidado pra trabalhar em outra casa noturna. Depois outra e outra at� parar onde estou atualmente. Mas as coisas continuaram da mesma forma, o perigo � constante. Quando o show acaba, h� sempre algu�m � nossa espera. �s vezes homens, �s vezes mulheres... N�o podemos escolher. Tudo para tentar sobreviver. N�o quero que voc� pense que eu fa�o programa nas ruas, nunca fiz! J� perdi v�rios amigos que trabalhavam nessas condi��es.

JUCA

E a sua dignidade, isso n�o conta?

TAVICO

Voc� acha que eu gosto?! Voc� acha que amo fazer isso?! N�o! N�o gosto. �s vezes o meu est�mago embrulha, �s vezes penso em deixar, mas para fazer o qu�?! (Choroso) Estou cansado disso, meu amigo... (Chora)

JUCA

(Abra�a-o) Voc� n�o precisa se vender dessa maneira! Precisa deixar essa vida, Tavico. (Tosse)

TAVICO

(Retruca) Pra viver de qu�?! (Levanta-se)

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JUCA

(Tosse mais uma vez) Voc� pode arranjar um emprego, dar aulas. �, dar aulas! Voc� faz faculdade de Educa��o F�sica. Tente arranjar um emprego numa dessas academias.

TAVICO

Faculdade... Faculdade nada! Eu nem sequer tirei o prim�rio. Eu nunca tive chance, eu sempre trabalhei feito um condenado, sempre sendo explorado. Meus pais, coitados morreram muito cedo, numa vida de explora��o, fui praticamente criado por uma tia e um tio que bebia o tempo todo. A� decidi tentar a vida na cidade grande, na esperan�a de conseguir algo melhor, mas veja, olhe pra mim, o que v�? Nada, n�o �?! O que sou na vida?! Nada! Um trapo apenas!

JUCA

(Tentando levantar) N�o diga isso! (Tomba)

TAVICO

(Segura-o) Juca! Voc� n�o pode levantar! Venha deitar.

JUCA

(Ofegante) Tavico, voc� precisa mudar de vida.

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TAVICO

Mudar de vida, como? Pra qu�?

JUCA

Tente descobrir voc� mesmo. Somente voc� poder� encontrar o seu caminho...

TAVICO

(Ajoelha-se ao lado do amigo) Juca, quantas vezes pensei em abandonar tudo isso, mas n�o tenho for�as! Como eu gostaria de ter uma outra vida. Sem ter que me vender dessa forma. (Chora no colo do amigo) Me ajude meu amigo... Sozinho eu jamais conseguirei me reencontrar... J� tentei v�rias vezes, tudo em v�o.

JUCA

Meu querido, como gostaria de ajud�-lo. Como v� no momento, preciso eu, de ajuda. (Demonstrando sinal de cansa�o)

TAVICO

Eu cuidarei de voc�. Ou melhor, eu cuido de tu... e tu cuida de mim. Que tal?

JUCA

�! Meu bom amigo... (Passa a m�o no rosto de Tavico)

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TAVICO

Vamos embora daqui, s� n�s dois. Pra bem longe.

JUCA

Como gostaria de ser o vento que, sem temor, vai ao longe em busca de emo��es... (Sentando-se na cama) Eu n�o posso, estou muito doente. � tarde demais para n�s dois... (Chora) N�o h� mais tempo para mim. Sinto-me t�o fraco. (Tosse)

TAVICO

Psiiiu! N�o fale assim. (Acalentando o amigo)

(Entra a faxineira com um prato de sopa)

FAXINEIRA

Juquinha, eu trouxe uma sopinha pra voc�. (Para Tavico) Pegue a cadeira pra mim seu imprest�vel!

JUCA

Eu n�o quero, n�o estou com fome. (Virando-se para o outro lado)

FAXINEIRA

Nada disso, voc� vai tomar nem que seja um pouquinho. Voc� quer morrer de fome?

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JUCA

N�o quero!

TAVICO

Toma, Guri!

FAXINEIRA

(Desistindo) Desse jeito, voc� n�o vai levantar mais, vai morrer a� mesmo. (Para Tavico) Seu mal-feitor desgra�ado... tudo culpa sua. Mas a sua batata t� assando... deixa estar! (Saindo com a bandeja, na porta. Para Tavico) Seu bandoleiro imprest�vel. (Sai)

TAVICO

(Aproximando-se de Juca) Por que n�o tomou, gurizinho? Assim voc� n�o vai conseguir levantar.(Sai)

(As luzes se apagam e reacendem vagarosamente. Juca est� no quarto sozinho. Entra a faxineira, olha-o por alguns instantes e sai. Aparece o espectro do

av� de Juca, um senhor de idade j� avan�ada.)

JUCA

(Percebe o av�.) Vov�?! � o senhor mesmo?

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AV�

(Aproxima-se e abra�a-o) Ei! O que est� acontecendo?

JUCA

(Choroso) Vov�, vov�... Eu acho que vou morrer...(Chora intensamente) Sinto uma tristeza t�o grandeque me consome a alma. Tenho vontade de morrer. Ajude-me, por favor!

AV�

Meu netinho querido. O que est� acontecendo, h�n?

JUCA

Eu n�o sei, vov�... eu n�o sei. (Intensifica o choro)N�o sei o que est� acontecendo comigo.

AV�

Vamos, meu netinho, me diga o que est� acontecendo.

JUCA

(Mais contido) Na verdade, vov�... nem eu mesmo sei como come�ar.

AV�

Voc� precisa se abrir...

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JUCA

Como � dif�cil falar disso, vov�. Eu...

AV�

Tente falar, isso vai lhe fazer bem.

JUCA

(Recuperando-se) Eu sinto um enorme vazio nopeito, algo que me consome a cada dia. Quando eu cheguei aqui, tive muito medo, pois estava sozinho, mas os garotos foram legais comigo, principalmente Tavico, esse � o meu melhor amigo... Com ele conheci todos os cantos dessa cidade maravilhosa. Com o passar dos dias, dos meses nos tornamos grandes amigos. Tudo que eu fazia era sempre incluindo Tavico. Quando estava ao lado dele, eu me sentia muito feliz. Tudo era motivo de alegria, ele dizia que gostava do meu jeito, me chamava de guri, meu gurizinho. Quando n�s n�o est�vamos juntos eu me sentia desamparado, perdido, muito triste, mas quando ele chegava tudo voltava a ser radiante. Sei que � algo muito forte, que me toma o f�lego... Passado algum tempo as coisas foram mudando... passei a sentir alegria e tristeza ao mesmo tempo. Uma necessidade louca de estar perto e ao mesmo tempo uma enorme vontade de fugir dele. Mas de nada adiantava. Agora o que me resta � um enorme aperto no peito, um vazio. Sensa��o que insiste em me consumir. (Chora) Que coisa � essa? Por que estou sentindo isso, vov�? Ajude-me, eu imploro!

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AV�

(Abra�a-o fortemente) Meu querido voc� n�o tem nada pra se envergonhar. Voc� n�o pode se punir dessa maneira... Meu netinho, voc� precisa reagir.

JUCA

Reagir, como vov� se eu me sinto t�o fr�gil, diante dessa coisa que me consome a cada dia.

AV�

Isso que voc� est� sentindo por esse rapaz, e que tem tanto medo, chama-se amor... Esse sentimento s� brota em pessoas especiais, pessoas de bom cora��o. Esse � o mais nobre dos sentimentos.

JUCA

Mas vov�, como poderei am�-lo? Jamais permitir�o...

AV�

Eu sei meu querido... eu sei. Mas voc� n�o pode permitir que impe�am isso... Voc� precisa se fortalecer. Voc� precisar� de for�as para enfrentar as dificuldades. Coragem, meu netinho. Voc� precisar� enfrentar com muita coragem e sabedoria. Essa luta ser� �rdua... eu sei, mas se voc� n�o tiver coragem para enfrentar, de nada valer� ter vivido... por isso meu querido, j� est� na hora de voc� sair dessa cama e recome�ar. Lutar pelo seu amor. S�

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voc� poder� fazer isso. (Agasalha Juca e d�-lhe um beijo na testa)

JUCA

Obrigado, vov�... Eu te amo.

AV�

Eu tamb�m te amo, meu querido.

(Black-out. O av� de Juca sai. As luzes reacendem vagarosamente)

FAXINEIRA

(Entrando, euf�rica) Juca! Juca! (Senta na cama)

JUCA

(J� mais disposto) O que foi?!

FAXINEIRA

(Mostra os envelopes) Chegaram agorinha!

JUCA

Leia-as, para mim.

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FAXINEIRA

(Abre a carta. Olha o remetente.) Essa foi Pedro que mandou. � um convite de casamento. Ele est� lhe convidando pra ser padrinho. Xi... N�o entendi neca de nada... Que endere�o mais doido. Veja, Juca! (Entrega o envelope. Contente.) Voc� vai, n�o vai?!

JUCA

Eles v�o se casar em Paris.

FAXINEIRA

Nossa, que chique! Se casar em Paris, igual a gente famosa. Quem te viu, quem te v�. (Abre a outra. Olha o remetente.) Esta aqui � de Lucas.

(O foco de luz no quarto de Juca diminui. Outroreabre sobre Lucas, trajando roupas de clima muito

frio.)

LUCAS

(L� a carta) Caro amigo. Fiquei muito triste ao deix�-lo naquelas condi��es, mas espero que agora voc� j� tenha superado e que estes olhinhos voltem a brilhar novamente. Sinto saudades de suas poesias e das nossas noites de leituras. Voc� foi algo maravilhoso que aconteceu em nossas vidas. O Pedro vai se casar em breve com a francesinha, voc� j� deve estar sabendo. Talvez eu v� ao casamento. Ele sempre agradece, pois diz que foi

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gra�as a voc� que a vida dele mudou. Como est� Tavico? Voc� j� o perdoou? Pois tamanha amizade nunca foi vista. A saudade que sinto de voc�s �grande demais. Amig�o, voc� precisa reagir e ficar forte para quando eu retornar fazermos as nossas noitadas po�ticas. Bem, estou escrevendo para lhe dizer que aqui na Su��a est� tudo bem. Estoutentando resolver a barreira da l�ngua. Ficarei por aqui at� o final de janeiro. A� companheiro, quando retornar, hei de v�-lo com a mais perfeita sa�de. Despe�o-me saudosamente.

(A luz sobre Lucas apaga ao final da leitura. Juca est� em prantos.)

FAXINEIRA

N�o fique assim, n�o, Juquinha... (Abra�a-o)

(Blackout mais longo. Fundo musical melanc�lico. Acende um foco de luz sobre a escrivaninha, vazia.

A luz continua fixa naquele ponto. Entra Tavico, portando um copo de leite. Vai ao guarda-roupa, procura algo, mas n�o encontra. Olhar vazio por

algum tempo. Senta-se na cadeira da escrivaninha. Juca entra.)

TAVICO

Ol�, gurizinho! (Enf�tico) Eu n�o aguento mais esse seu sil�ncio... isso t� acabando comigo, guri. Ser� que tu n�o tem cora��o? Ser� que eu tenho que me ajoelhar e te pedir perd�o?! N�o fique a� com esse seu sil�ncio... como se eu n�o existisse... (abra�a-

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o) Meu guri... Fale comigo! N�o me deixe assim. (D� um beijo na boca de Juca)

JUCA

(Indiferente momentaneamente) Tavico. Tavico...

TAVICO

Meu querido... pensei que fosse te perder pra sempre. Meu gurizinho querido. (Beija-o) Prometa que nunca mais vai ficar de birra comigo... prometa! (Beija mais uma vez)

JUCA

Eu prometo Tavico...

TAVICO

E promete nunca mais ficar doente, promete?

JUCA

Eu prometo... Eu prometo. (Abra�a-o)

TAVICO

Voc� ta melhor, ta?

JUCA

(Faz sinal de mais ou menos) Mas vou melhorar.

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TAVICO

Vai, sim. (D� outro abra�o em Juca)

(Blackout com m�sica suave. As luzes v�o reacendendo. Tavico e Juca est�o no parque. Juca come algod�o doce e Tavico come pipoca. Est�o radiantes. Cinco jovens se aproximam dos dois.)

VOZ DO PIT BOY 1

Ora, ora... como os dois pombinhos est�o felizes.

(Os rapazes cercam os dois)

TAVICO

Deixa dessa mano... Qual � a de voc�s?

PIT BOY 1

Qual � a nossa?! (Desdenha) A bichona � corajosa... Olha a�, meu.

(Tavico � imobilizado por tr�s deles)

TAVICO

Me solte! O que deu em voc�s?

PIT BOY 1

O que deu em n�s?! Voc� vai ver, o que deu em n�s... Vamos mostrar pra ele pessoal...

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(Blackout longo. Toda a cena de viol�ncia dever� ocorrer durante o blackout, e em play-back.)

JUCA

(Intercede) N�o fa�am isso com ele!

VOZ DO PIT BOY 1

Veja! A bichinha ta defendendo a outra. Quem � o marido, hein? Qual das duas � a mulherzinha?! Suas bichas.

TAVICO

Deixe ele em paz!

VOZ DO PIT BOY 1

O viado ta defendendo a namoradinha. Veja o que fa�o com bichinhas. (Esmurra Juca)

TAVICO

Por favor, n�o fa�am nada com ele!

VOZ DO PIT BOY 1

Vai ser dif�cil n�o fazer nada... N�o � mesmo, companheiros?

VOZES DE TODOS OS PIT BOYS

� isso a�!

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VOZ DO PIT BOY 1

Vamo l�, gente! Vamo fazer a festa...

(Mais socos e pontap�s. Som de viatura policial se aproximando.)

VOZ DO PIT BOY 1

Galera, sujou! Agora � cada um por si... Vamo d� no p�!

VOZ DO POLICIAL 1

(Persegue um dos Pit Boys) Parado a�! (Captura) H� muito tempo que eu estava querendo pegar voc�s. Dessa vez n�o escapam, seu marginal.

VOZ DO PIT BOY 2

Me largue! Voc� n�o sabe com quem est� se metendo.

VOZ DO POLICIAL 1

Quem n�o sabe com quem se meteu foram voc�s.

VOZ DO PIT BOY 2

Voc� pirou, cara?! Voc� � um policial de merda!

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VOZ DO POLICIAL 1

Merda � voc�, esc�ria da sociedade... Voc� � que n�o � nada, seu lixo.

VOZ DO POLICIAL 2

(Para o policial um) Um dos garotos, est� muito mal... Vou ter que chamar a ambul�ncia. (Pelo r�dio) Precisamos de uma ambul�ncia com urg�ncia... aqui para a Pra�a Centen�rio. Jovem aparentando dezesseis anos est� muito ferido e desacordado. O outro est� ferido, mas est� consciente. Ok?!

CENTRAL DE EMERG�NCIA

Entendido. Ambul�ncia a caminho...

VOZ DO POLICIAL 2

Ok! No aguardo.VOZ DO PIT BOY 2

Me largue! Eu vou chamar meu pai.

VOZ DO POLICIAL 1

E voc� tem pai?

VOZ DO PIT BOY 2

(Desdenha) Engra�adinho.

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(Ouve-se som de ambul�ncia)

VOZ DO POLICIAL 2

Doutor tem dois feridos, mas o jovenzinho n�o sei, n�o... est� sangrando muito.

VOZ DO M�DICO

Vamos ver... O que houve, aqui?

VOZ DO POLICIAL 1

Foram os malditos Pit Boys... A esc�ria da cidade.

VOZ DO M�DICO

(Cuidando de Juca) Como puderam fazer isso com voc�?

VOZ DO POLICIAL 1

Doutor, n�s vamos lavrar o flagrante e em seguida iremos ao hospital.

VOZ DO M�DICO

Est� bem.

(Os policiais conduzem o Pit Boy dois at� a viatura. Ouve-se som de sirene se afastando do local.)

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VOZ DA ENFERMEIRA

A coisa est� muito feia, doutor?

VOZ DO M�DICO

Muito feia. Esmagaram todos os ossos da face.

VOZ DA ENFERMEIRA

E o outro doutor?

VOZ DO M�DICO

N�o � grave. Mas este aqui... Vamos coloc�-lo na maca com cuidado!

TAVICO

Juca, doutor, como ele est�?

VOZ DO MEDICO

O seu amigo? Ele foi ferido gravemente.

TAVICO

Ele vai sobreviver, n�o vai, doutor? A�, d�i muito doutor. Doutor o senhor n�o me disse, ele vai ficar bem, doutor?

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VOZ DO M�DICO

Enfermeira, mais atadura. (Para Tavico) O caso dele � grave, mas vamos aguardar o resultado das radiografias, para termos certeza sobre o estado do seu amigo. (Pausa) Pode andar?

TAVICO

Acho que sim. Ai..

VOZ DO M�DICO

Ent�o vamos para a ambul�ncia.(A ambul�ncia sai levando os feridos. As luzes v�o

reacendendo suavemente, na boate.)

VOZ DO APRESENTADOR

Boa noite, ap�s tr�s meses longe dos palcos, vitimado de ataques de Pit Boys, eis o mais sensual GoGo Boy! O melhor! Ele, o Guri do Luar do Rio Gua�ba!

(Entra Tavico, vestido numa grande t�nica p�rpura, com detalhes em fios de ouro, cal�a preta e

camiseta branca. Dan�a. Gritos, fleches e aplausos tomam conta do ambiente. Total del�rio da plateia.

Entra Lucas, se aproxima de Tavico.)

LUCAS

(Alto) Tavico, estou vindo do hospital...

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TAVICO

(Alto) E ent�o? Juca j� teve alta? J� vai pra casa?

LUCAS

N�o Tavico... O nosso Juca acaba de morrer.(Tavico continua dan�ando e chorando. Entra oPlay-Back, com a voz dele, enquanto faz strip-

tease.)

TAVICO

(Play-Back) Essa dor que dilacera o meu corpo, que corr�i minha alma. Este vazio que sinto parece me sucumbir, � meu querido amigo, tu n�o sabe o tamanho do meu sofrimento. Fui tomado pela escurid�o, pois tu levaste a minha luz! Qu�o ego�sta foste me deixando nas trevas. Por que n�o deixaste algo para que me guiasse? A sua partida transformou a minha vida em algo sem luz... Sem brilho. Por que n�o deixou o brilho da sua presen�a? (Chora) � querido amigo, se eu pudesse fazer voltar o tempo, mas somente tu conhecia este segredo. Com a tua presen�a o tempo parecia n�o existir. Tudo era duradouro e reluzente � tua volta. Tu que como ningu�m soube fazer felizes as pessoas que o cercavam. Nem este legado tu deixaste. Somente tu, com o teu jeito puro, soube me amar, capacidade que eu perdi h� muito tempo, mas tu soubeste reacender em mim. � meu gurizinho, me perdoe, somente agora percebo como fui tolo perdendo tanto tempo. Eu em minha cegueira, em n�o me permiti ver o belo sentimento que tu nutria

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por mim. Meu amigo, que dor eu sinto no peito. (Secando as lagrimas) Se isto lhe serve de consolo, meu amado, reconhe�o agora o quanto fui tolo. Mas � tarde demais para n�s dois.

(Enquanto as luzes se apagam suavemente, ouve-se a voz de Juca em Play-back)

... Desejaria ser o Vento que conduz a folha ao longe, em busca de emo��es.

Cai o pano.