GEO-Brasil O Recursos Hídricos Brasil Recursos... · 2011. 10. 28. · ORDEM E PR O G R E S S O...

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Brasil Recursos Hídricos Componente da série de relatórios sobre o estado e perspectivas do meio ambiente no Brasil Resumo Executivo

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  • ORDEM E PROGRESSO

    Brasil

    GEO-Brasil Com

    ponente da Série de relatórios sobre o estado e perspectivas do meio am

    biente no BrasilRecursos Hídricos

    O relatório GEO Brasil Recursos Hídricos é o primeiro da Série GEO Brasil e se propõe contribuir, dentro das possibilidades abertas pela metodologia GEO, para uma avaliação compreensiva e integrada dos conceitos e fundamentos, do aparato organizacio-nal e legal e dos instrumentos de gestão das águas que integram o Sistema Nacional de Gerenciamento dos Recursos Hídricos (SINGREH). O lançamento deste documento adquire um signi-ficado especial neste ano em que se comemora os 10 anos da promulgação da Lei n° 9.433, de 8 de janeiro de 1997 – a Lei Nacional das Águas do Brasil.

    Brasil

    Recursos Hídricos Componente da série de relatórios sobre o estado e perspectivas do meio ambiente no Brasil

    Ministério do Meio Ambiente

    Resumo Executivo

  • GEO BrasilRecursos Hídricos

    Componente da Série de Relatórios sobre o Estado e Perspectivas do Meio Ambiente no Brasil

    Resumo Executivo

  • República Federativa do BrasilLuiz Inácio Lula da SilvaPresidente

    José Alencar Gomes da SilvaVice-Presidente

    Ministério do Meio Ambiente

    Marina SilvaMinistra

    Cláudio LangoneSecretário-Executivo

    João Bosco SenraSecretário de Recursos Hídricos

    Volney Zanardi JúniorDiretor do Departamento de Articulação Institucional

    Agência Nacional de Águas – ANADiretoria ColegiadaJosé Machado – Diretor PresidenteBenedito BragaOscar de Morais Cordeiro NettoBruno PagnoccheschiDalvino Troccoli Franca

    Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente – PNUMAAchim SteinerDiretor Executivo

    Ricardo Sanchez-SosaDiretor Regional para América Latina e Caribe

    Cristina MontenegroCoordenadora do Escritório do Brasil

  • AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUASMINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE

    PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O MEIO AMBIENTE

    Agência Nacional de Águas – ANABrasília – DFJaneiro/ 2007

    GEO BrasilRecursos Hídricos

    Componente da Série de Relatórios sobre o Estado e Perspectivas do Meio Ambiente no Brasil

    Resumo Executivo

  • Agência Nacional de Águas – ANASetor Policial – Área 5 - Quadra 3 – Bloco LCEP 70610 - 200 – Brasília-DFPABX: (61) 2109 5400http://www.ana.gov.br

    Ministério do Meio Ambiente – MMAEsplanada dos Ministérios – Bloco BCEP 70068 - 901 – Brasília-DFPABX: (61) 4009 1000http://www.mma.gov.br

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    Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente – PNUMASetor Comercial Norte – SCN Quadra 2 – Bloco A - Ed. Corporate Financial Center 110 andar - Módulo 1.101CEP 70712 - 901 – Brasília-DFPABX: (61) 3038 9233http://www.pnuma.org/brasil

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    Projeto Gráfico: TDA - Desenho & Arte Ltda.www.tdabrasil.com.br

    Todos os direitos reservados.É permitida a reprodução de dados e de informações contidos nesta publicação, desde que citada a fonte.

    Isenção de responsabilidade.O conteúdo desta publicação não reflete, necessariamente, as opiniões ou políticas do PNUMA e do Governo Brasileiro.

    Este documento foi submetido ao conselho editorial da ANA.

    A342g GEO Brasil : recursos hídricos : resumo executivo. / Ministério do Meio Ambiente ; Agência Nacional de Águas ; Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente. Brasília : MMA; ANA, 2007.

    60 p. : il. (GEO Brasil Série Temática : GEO Brasil Recursos Hídricos)

    ISBN: 000-00-00000-00-0

    1. Recursos Hídricos. 2. Gestão de Recursos Hídricos. 3. Relatório. I. Ministério do Meio Ambiente. II. Agência Nacional de Águas (Brasil). III. Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente.

    CDU 556.18 (81) (047.32)

    Catalogação na fonte – CEDOC – Biblioteca

  • GEO BrasilRecursos Hídricos

    Componente da Série de Relatórios sobre o Estado e Perspectivas do Meio Ambiente no Brasil

    Coordenação Geral:

    Ministério do Meio AmbienteVolney Zanardi Júnior

    Diretor do Departamento de Articulação InstitucionalSecretaria Executiva

    Agência Nacional de ÁguasBruno Pagnoccheschi

    Diretor da Área de Informação

    Programa das Nações Unidas para o Meio AmbienteCristina Montenegro

    Coordenadora do Escritório do Brasil

    Grupo de Supervisão TécnicaEvandro Mateus Moretto – DAI/SECEX/MMA

    Marco José Melo Neves – SRH/MMAMaria Bernadete Ribas Lange – PNUMA/ROLAC/Escritório do Brasil.

    Marly Santos Silva – DAI/SECEX/MMAKakuko Nagatani Yoshida – PNUMA/Divisão de Avaliações e Alerta Antecipado

    Grupo de Pesquisa e ProduçãoAntonio Eduardo Leão Lanna

    Francisco José Lobato da Costa – EditorGilberto Valente Canali

    Maria de Fátima Chagas Dias CoelhoUlisses Lacava

    Coordenação Executiva: Regina Gualda - ANA

  • Colaboradores (em ordem alfabética)

    Ana Lucia Dolabella

    Antonio Félix Dominguez

    André Trigueiro

    Antonio Luitgards Moura

    Augusto Franco Malo da Silva Bragança

    Carlos Motta Nunes

    Cláudia Enk

    Claúdia Ferreira Lima

    Danielle Bastos Serra de Alencar Ramos

    Déa Solange Fernandes

    Eduardo Felipe Cavalcante de Correa Oliveira

    Eldis Camargo

    Emiliano Ribeiro de Souza

    Fábio Feldmann

    Fabrício Bueno da Fonseca Cardoso

    Francisco Lopes Viana

    Gisela Damm Forattini

    Herman Antunes Laurindo dos Santos

    Hilda Verônica Kessler

    Hidely Grassi Rizzo

    Horácio da Silva Figueiredo Junior

    Humberto Cardoso Gonçalves

    Hypérides Macedo

    Jerson Kelman

    João Bosco Senra

    João Climaco Soares de Mendonça Filho

    João Gilberto Lotufo Conejo

    Joaquim Guedes Correa Gondim Filho

    John Briscoe

    José Edil Benedito

    Luis André Muniz

    Luiz Augusto Bronzatto

    Luiz Correa Noronha

    Lupércio Ziroldo Antonio

    Marcelo Pires da Costa

    Magaly Gonzáles de Oliveira

    Maria Cristina de Sá Oliveira Matos de Brito

    Maria Leonor Baptista Esteves

    Maria Manuela Martins Alves Moreira

    Mário Edson Vieira de França

    Marley Caetano de Mendonça

    Marco Alexandro Silva André

    Marcos Airton de Souza Freitas

    Maria do Socorro Lima Castello Branco

    Maurício Andrés

    Moisés Pinto Gomes

    Ney Maranhão

    Ninon Machado de Faria Leme Franco

    Paulo Augusto Cunha Libânio

    Paulo R. Haddad

    Raimundo Alves de Lima Filho

    Rodrigo Flecha Ferreira Alves

    Rosana Garjulli

    Rubem La Laina Porto

    Sergio Augusto Barbosa

    Valdemar Santos Guimarães

    Vaneide Ramos de Lima

    Vera Maria da Costa Nascimento

    Vicente Paulo Pereira BarbosaVieira

    Wilde Cardoso Gontijo Junior

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  • Há quinze anos, na Conferência das Nações Uni-

    das sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, foi

    aprovada a Agenda 21, em que se afirmava a inevi-

    tabilidade da adoção do planejamento e do manejo

    integrado dos recursos hídricos. Enfatizava-se ali o

    escasseamento progressivo do recurso água em escala

    global e as limitações que essa realidade impunha ao

    desenvolvimento dos países. Dizia, enfim, a Agenda

    21: “O manejo holístico da água doce como um re-

    curso finito e vulnerável e a integração de planos e

    programas hídricos setoriais aos planos econômicos e

    sociais nacionais são medidas de importância funda-

    mental para a década de 90 e o futuro”.

    O Relatório sobre Desenvolvimento Humano

    (PNUD, 2006), ao ao estabelecer um paralelo entre as

    oito Metas do Milênio aprovadas em 2000 e as neces-

    sidades de água e saneamento, mostrou cabalmente

    a indissociabilidade entre o cumprimento daquelas

    metas e o trato adequado dos recursos hídricos. Lem-

    bra, sobre a meta de erradicar a pobreza extrema e a

    fome, que uma em cada cinco pessoas nos países em

    desenvolvimento não tem acesso à água de boa qua-

    lidade, as famílias mais carentes pagam até dez vezes

    mais pela água do que as famílias ricas e a crescente

    transferência de água da agricultura para a indústria

    ameaça aumentar a pobreza rural.

    Estima-se, segundo essas avaliações, que até o ano

    2025 o número de pessoas que vivem em países sub-

    metidos a grande pressão sobre os recursos hídricos

    passará dos cerca de 700 milhões atuais para mais

    de três bilhões. Mais de 1,4 bilhões de pessoas vivem

    atualmente em bacias hidrográficas onde a utilização

    de água excede os níveis mínimos de reposição, con-

    duzindo assim à dissecação dos rios e ao esgotamento

    das águas subterrâneas. A insegurança da água e as

    alterações climáticas ameaçam aumentar, até 2080,

    de setenta e cinco para 125 milhões, o número de

    pessoas subnutridas em todo o mundo.

    Desde o lançamento da Agenda 21, a realidade

    do planeta permanece sendo a descrita no relatório

    do PNUD, acima. De qualquer forma, apesar de os

    problemas não terem sido solucionados, aprende-

    mos algo sobre complexidade, tempo, processos e

    a necessidade de mudar modelos mentais para lidar

    com dinâmicas e questões que se recriam continua-

    mente. E que exigem soluções igualmente dinâmicas,

    capazes de combinar condições adversas presentes e

    utopia. Certamente estamos em um ponto em que se

    desenham, com muito maior nitidez, os caminhos e

    os instrumentos que nos levem ao tipo de desenvolvi-

    mento humano justo que buscamos.

    Dificilmente haverá um eixo que demonstre com

    maior nitidez os impasses, os riscos e os ganhos dessa

    trajetória do que o uso dos recursos hídricos, sujeito

    ao paradoxo de vivermos num planeta com 70,8% de

    sua superfície coberta de água e termos disponíveis

    para consumo apenas 0,3% dos escassos 2,2% de

    água doce existente.

    Cabe a nós, brasileiros, uma tarefa expressiva.

    Ocupando quase metade da área da América do Sul, o

    Brasil detém 60% da bacia amazônica, que escoa cerca

    de 1/5 do volume de água doce do mundo. Este é um

    diferencial importante em tempos de escassez planetária

    de água e traz consigo a responsabilidade de gestão es-

    tratégica desse patrimônio. E também responsabilidades

    de liderança e protagonismo no encaminhamento global

    da problemática dos recursos hídricos.

    Dentro do próprio país vivemos o paradoxo de ter,

    de um lado, a exuberante disponibilidade hídrica na

    Amazônia e, de outro lado, áreas críticas de indispo-

    nibilidade. A solução para enfrentar esses extremos

    passa pela integração dos instrumentos de atuação

    pública, a articulação de todas as políticas de governo

    ligadas a essa matéria, o aperfeiçoamento dos meca-

    nismos de participação social na tomada de decisão,

    Apresentação

  • na implementação de ações, na fiscalização e na ava-

    liação permanentes de todo o processo.

    A gestão dos recursos hídricos no Brasil realizou

    um salto de qualidade nos primeiros anos da década

    de 1980, quando começou a prevalecer o enfoque de

    triplo direcionamento: inserção em um quadro de sus-

    tentabilidade ambiental, social e econômica; a busca

    de um marco regulatório e de espaços institucionais

    compatíveis; e a formulação de conceitos apropriados

    para descrever e operar os novos arranjos políticos e

    pactos sociais correspondentes à progressiva capilari-

    zação da visão integrada, compartilhada e participati-

    va das políticas públicas.

    O Sistema Nacional de Gerenciamento dos Recur-

    sos Hídricos – SINGREH (Constituição Federal de 1988

    e Lei n° 9.433, de 8 de janeiro de 1997) é um marco

    dessa fase. Hoje ele articula os esforços multissetoriais

    para sua plena implementação e é um protagonista im-

    portante, juntamente com o Sistema Nacional do Meio

    Ambiente - SISNAMA, da mudança de compreensão da

    política sócio-ambiental, que é o cerne da atuação do

    Ministério do Meio Ambiente no atual governo, benefi-

    ciado pelos avanços alcançados em gestões anteriores

    da Pasta e pela atuação dos segmentos ambientalistas e

    sócio-ambientalistas brasileiros.

    As dificuldades a superar ainda são enormes e há

    deficiências estruturais a serem corrigidas, a exemplo

    de um certo travamento do avanço sócio-ambiental nos

    processos produtivos, em prejuízo da prevalência do in-

    teresse público na gestão dos recursos hídricos. Por outro

    lado, há a consciência de que vivenciamos um momen-

    to importante da caminhada em direção aos cenários

    sustentáveis desejados para o país e para o planeta.

    A construção de instrumentos de planejamento

    estratégico – entre os quais se inclui este GEO Brasil:

    Recursos Hídricos - faz parte do esforço que busca

    alcançar a situação de sustentabilidade que esses

    cenários contemplam. É preciso aceitar, com cora-

    gem e determinação, as tarefas que este relatório nos

    coloca. Uma delas, talvez a maior, diz respeito aos

    compromissos que estão implícitos nesta publicação,

    para além das escolhas técnicas. Trata-se do esforço

    de mobilizar e capacitar a sociedade brasileira para

    que ela assuma a sua cidadania com responsabilidade

    sócio-ambiental. Esta é a sustentabilidade real, a que

    dá amparo e razão de ser às nossas esperanças.

    O Ministério do Meio Ambiente sente-se gratifi-

    cado, nas pessoas de sua titular e dos seus dirigentes,

    por ter integrado - juntamente com a Agência Nacio-

    nal de Águas e o Programa das Nações Unidas para

    o Meio Ambiente – PNUMA, instituição internacional

    que nos é muito cara – a parceria que gerou este do-

    cumento, retrato honesto das nossas potencialidades,

    dos obstáculos a superar e das alternativas de futuro

    que podemos alcançar.

    Marina SilvaMinistra de Estado do Meio Ambiente

  • O Brasil é, reconhecidamente, donatário de um dos patrimônios hídricos mais importantes do pla-neta. A magnitude desse patrimônio dá também a medida da responsabilidade dos brasileiros quanto a sua conservação e uso sustentável, em nosso próprio benefício, do equilíbrio ecológico planetário e da so-brevivência da humanidade.

    Desde a década de 1930, no impulso de desen-volvimento industrial e de urbanização acelerada daquele período, o Brasil tem buscado – a partir da decretação do Código de Águas, de 1934, e da cria-ção de uma agência federal, o Departamento Nacio-nal de Águas e Energia Elétrica - DNAEE, encarre-gada da sua aplicação – adotar modelos adequados de gestão racional dos seus recursos hídricos, con-dicionados, naturalmente, ao nível de desenvolvi-mento tecnológico prevalecente, à cultura político-institucional, às prioridades sociais e aos padrões de sustentabilidade internacionalmente aceitos nessa área em cada época.

    O modelo praticado durante mais de sessenta anos tornou-se claramente insuficiente diante do estilo e do ritmo oscilante de desenvolvimento na-cional nas últimas décadas do século passado, do descompasso entre a intensidade do uso recurso água e o volume do investimento em sua conserva-ção, da ampliação de problemas antigos e do surgi-mento de novos problemas ambientais, antes pouco percebidos socialmente ou negligenciados em face da abundância de recursos naturais pelo País. De qualquer modo, esse modelo centralizador e de es-cassa participação social, plantou as bases da or-ganização do Estado para a gestão dos recursos hí-dricos, propiciou o desenvolvimento de uma massa crítica de profissionais de alta qualidade, consoli-dou estruturas de capacitação e desenvolvimento tecnológico e gerou um acervo de conhecimentos e de informações fundamentais para o planejamento estratégico do setor.

    ApresentaçãoA emergência da questão ambiental a partir dos

    anos 70, a difusão dos princípios do desenvolvimento sustentável nos 80 e 90, a constatação do escassea-mento progressivo do recurso água em escala plane-tária, levaram o Brasil a realizar uma revisão completa das estratégias e do aparelho governamental voltados para a gestão integrada dos recursos hídricos.

    São marcos dessa mudança fundamental: a inserção na Constituição Federal de 1988, dentre as competên-cias da União, da obrigação de instituir-se um sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos; a re-gulamentação e a institucionalização do próprio Siste-ma Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos – SINGREH, com seu arranjo administrativo, e seus ins-trumentos de gestão (Lei 9.433/97); a criação da Agên-cia Nacional de Águas, entidade federal de implemen-tação da Política Nacional de Recursos Hídricos e de coordenação do SINGREH e o lançamento, em 2006, do Plano Nacional de Recursos Hídricos – que além de atender ao compromisso internacional do Brasil com as Metas do Milênio, com o estabelecimento de ações e programas até o ano 2020, representa um importante instrumento de governança.

    A Agência Nacional de Águas, por seus dirigen-tes, sente-se amplamente recompensada do esforço empregado na produção deste GEO BRASIL Recursos Hídricos, resultado de uma parceria bem sucedida que envolveu a própria Agência, o Ministério do Meio Ambiente e o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente – PNUMA.

    Este documento - especialmente oportuno ao se co-memorar o 10º aniversário da Lei 9.433/97 - amplia a vi-sibilidade internacional da gestão dos recursos hídricos no Brasil e, com suas análises e propostas, certamente contribuirá para a plena implantação do Sistema Nacio-nal de Gerenciamento dos Recursos Hídricos, tornan-do-o mais descentralizado e participativo, portanto mais transparente, democrático e socialmente eficaz.

    José MachadoDiretor-Presidente da Agência Nacional de Águas

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  • Um aspecto marcante do nosso tempo é a cres-cente pressão sobre ecossistemas como florestas, áreas úmidas e solos, responsável por desencadear mudanças amplas e sem precedentes nos sistemas de suporte à vida da Terra.

    Soluções inovadoras são necessárias para de-safios complexos. Uma das principais respostas do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) para tais desafios é o processo GEO (Global Environmental Outlook). Trata-se de uma abordagem abrangente e integrada de análise, registro e avaliação das condições ambientais relacionadas a determina-do espaço geográfico ou tema, que permite operar nas mais variadas escalas, da municipal à global.

    Um aspecto central do GEO é o apoio a toma-dores de decisão ao redor do mundo, por meio do fornecimento da melhor, mais atualizada e confiável informação disponível, capaz de fomentar a elabora-ção de políticas públicas integradas e sustentáveis. O processo GEO, além de estar em constante evolução, é também uma plataforma adaptável e versátil, que pode ser aplicada às necessidades específicas de cada unidade geográfica considerada.

    O Brasil tem adotado o processo GEO, associando-se ao seu desenvolvimento, e utilizando seus resultados para construir uma base de conhecimento e capacida-de de gestão ambiental sustentável. É o que evidencia este novo informe, o GEOBrasil, que foi produzido pelo Ministério do Meio Ambiente do Brasil, pela Agência Nacional de Água (ANA) e por um conjunto expressivo de instituições e especialistas brasileiros em parceria com o escritório brasileiro do PNUMA e com o apoio técnico da Divisão de Avaliações e Alerta Antecipado do PNUMA (DEWA-LAC).

    Este é o primeiro de uma série de relatórios temáti-cos sobre o estado e as perspectivas do meio ambiente no Brasil. Esta série dá seqüência e atualiza o trabalho iniciado com o GEO Brasil I, lançado na Conferência Mundial sobre o Desenvolvimento Sustentável reali-zada em Johannesburgo, em 2002.

    A opção de dar continuidade ao processo GEO na forma de uma série de relatórios sobre o Brasil, com foco em gestão ambiental, reconhece não apenas a diversidade e a extensão do país, mas também que o Brasil reúne as condições políticas, técnicas e insti-

    Apresentaçãotucionais necessárias para avançar na administração efetiva de seus recursos naturais.

    O foco na gestão de recursos hídricos - talvez o recurso mais vital e estratégico para um futuro susten-tável – reflete a importância do tema, a magnitude dos recursos existentes e a complexidade da gestão destes recursos num país como Brasil – seja pelo seu tamanho continental, seja pelo fato de ser possuidor de um dos maiores patrimônios hídricos disponíveis no mundo.

    Outra característica inédita deste trabalho é que ele vai além da análise do estado, da disponibilidade e qualidade dos recursos hídricos, e inclui a constru-ção de cenários que projetam as perspectivas futuras para o ano 2020. O relatório aprofunda a análise das questões de planejamento e instrumentos de gestão em uso no país; além disso, trata dos aspectos de gestão participativa e instrumentos econômicos de maneira a oferecer recomendações para torná-los ferramentas cada vez mais efetivas na construção de políticas voltadas à conservação e manejo sustentável das águas no Brasil.

    Este relatório considera efetivamente a importân-cia da água em seu espectro mais amplo e como in-sumo para inúmeras atividades econômicas, variando de suporte vital para a vasta biodiversidade do país até seu uso para melhorar a qualidade de vida e per-mitir o desenvolvimento em todos os níveis.

    Além de ser o primeiro país latino-americano a elaborar seu Plano Nacional de Recursos Hídricos, o Brasil possui hoje instituições ambientais maduras e uma capacidade instalada à altura dos desafios en-frentados. Isso coloca o país em condições de avançar sistematicamente no cumprimento das Metas do De-senvolvimento do Milênio, particularmente aquelas fundamentais para o combate à pobreza e a amplia-ção do acesso à água potável e ao saneamento.

    A água não é somente um recurso crítico em ter-mos de segurança humana e ambiental, mas oferece também grandes oportunidades para novos avanços em termos de desenvolvimento sustentável. Assim, como no caso dos demais temas que serão abordados pela série GEO Brasil e consolidados no relatório GEO Brasil II, espera-se, com este relatório, oferecer os sub-sídios para que o Brasil possa alcançar plenamente suas necessidades de desenvolvimento sustentável.

    Achim SteinerDiretor Executivo do PNUMA

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  • Apresentações 9

    Introdução 17

    Marco Conceitual GEO 18

    I – Estado dos Recursos Hídricos no Brasil 19

    II – Pressão e Impactos 29

    III – Respostas 33

    III.1 –Perspectivahistórica 33

    III.2 –Mudançadeparadigma:oSINGREH 37

    IV – Cenários 52

    V – Recomendações 55

    ListasGráficos

    1. Distribuição da água doce superficial no mundo 20 2. Distribuição da água doce superficial no continente americano 20 3. Superfície (1.000 km2) 22 4. População (mil habitantes) 22 5. Densidade demográfica (hab./km2) 22 6. Taxa de urbanização (%) 22 7. Vazões médias 23 8. Vazões específicas 23 9. Disponibilidades hídricas com permanência de 95% 23 10. Disponibilidades hídricas específicas, com permanência de 95% 23 11. Reservas subterrâneas explotáveis (m3/s) 23 12. Reservas subterrâneas explotáveis específicas (l/s/km2) 23 13. Retirada total de água (m3/s) 24 14. Retirada total de água – porcentagem da disponibilidade com 95% de garantia 24 15. Retirada total de água – porcentagem da vazão média 24 16. Retirada total de água por área (l/s km2) 24 17. Retirada total de água por habitante (l/hab./dia) 25 18. Distribuição dos usos da água nas regiões 26 19. Cobertura de serviços de saneamento básico nas áreas urbanas das regiões hidrográficas brasileiras 27 20. Carga de DBO5 (t DBO5/dia) 29 21. Vazões outorgadas por finalidade de uso 42 22. Investimentos em esgotamento sanitário até 2020 para alcance da meta de universalização dos serviços por região hidrográfica 54

    Mapa

    1. As 12 regiões hidrográficas e a divisão político administrativa do Brasil 21

    Boxes

    1. Bacia Amazônica 30 2. Redes Hidrometereológia Nacional 44 3. Bases Territoriais e o “Mapa de Gestão” dos Recursos Hídricos 51

    Tabelas

    1. Fontes da matriz de geração de energia elétrica do Brasil 34 2. Investimentos em sistemas de água e esgotos até 2020, para alcance da meta de universalização dos serviços por região hidrográfica (em milhões de reais) 53

    Figuras

    1. Estrutura geral do SINGREH 38 2. Níveis de agregação de informações do PNRH. (A) Brasil, (B) Divisão Hidrográfica Nacional e (C) 56 unidades de planejamento 41

    Quadro

    1. Instrumentos de gestão de recursos hídricos nas Unidades Federadas 45

    Sumário

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  • O Brasil detém parte significativa dos recursos hídri-cos do planeta, o que lhe confere uma responsabilidade especial no que diz respeito à conservação e adequado manejo de tal patrimônio.

    Neste sentido, o País tem participado ativamente dos mais importantes fóruns e iniciativas internacionais que tratam dos recursos hídricos, tais como a universalização do acesso à água, a conservação e gestão dos recursos frente aos problemas ambientais que os afetam, a impor-tância econômica e, principalmente, o papel desses recur-sos nas políticas de desenvolvimento.

    Além disso, o Brasil é signatário das mais importan-tes convenções e declarações internacionais que tratam direta ou indiretamente da questão dos recursos hídricos, dentre as quais a Declaração do Milênio, a Agenda 21, a Convenção das Nações Unidas sobre Diversidade Bioló-gica, a Convenção de Ramsar, a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima e a Conven-ção das Nações Unidas de Combate à Desertificação.

    Em âmbito sul-americano, o Brasil tem buscado con-tribuir para uma análise mais ampla dos problemas e de-safios da gestão dos recursos hídricos, visando uma efetiva articulação e integração em benefício mútuo dos países.

    Tais compromissos se inserem nos princípios adota-dos pelo Brasil na sua Política Nacional de Recursos Hí-dricos, que contempla o Sistema Nacional de Gerencia-mento de Recursos Hídricos (SINGREH) e um conjunto de estratégias e instrumentos inovadores desenvolvidos e adotados pelo País na última década, que oferecem à sociedade e aos gestores públicos o estado da arte em termos de gestão integrada e participativa dos recursos hídricos nacionais. Insere-se nesse contexto o Plano Na-cional de Recursos Hídricos, aprovado em 2006.

    Por sua vez, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente – PNUMA conduz, desde 1995, um am-bicioso projeto global de avaliações ambientais denomi-nado GEO (Global Environment Outlook) que enfocam diversos escopos geográficos e temáticos. No Brasil, esse processo vem se organizando no âmbito do Sistema Na-cional de Informações sobre o Meio Ambiente (SINIMA) sob a forma de uma Série Temática que busca disponibi-lizar informações consistentes e análises integradas que permitam o contínuo aperfeiçoamento dos processos de gestão ambiental no País.

    O GEO Brasil Recursos Hídricos vem se somar a esse esforço, sendo o primeiro número da Série GEO Brasil. Ao longo de suas 264 páginas, o GEO Brasil Recursos

    Hídricos se propõe a contribuir, dentro das possibilida-des abertas pela metodologia GEO, para uma avaliação abrangente e integrada dos conceitos e fundamentos, do aparato institucional e legal, bem como dos instrumentos de gestão das águas que hoje integram o Sistema Nacional de Gerenciamento dos Recursos Hídricos (SINGREH).

    Este Resumo Executivo é parte integrante da publica-ção GEO Brasil Recursos Hídricos e traz uma síntese das informações e conclusões apresentadas na versão com-pleta, que, por sua vez, está disponível na página web da Agência Nacional de Águas (www.ana.gov.br); por se tratar de um material destinado a um público mais amplo e não especializado, este Resumo apresenta, em alguns de seus capítulos, linguagem didática e exemplos adicio-nais que não constam da versão completa.

    Este volume da Série GEO Brasil sistematiza e apre-senta um conjunto de informações e recomendações fundamentais para a formulação e implementação de políticas públicas voltadas para o cumprimento das me-tas estabelecidas em termos de acesso sustentável, con-servação e gestão dos recursos hídricos do País, visando aprimorar a governabilidade do sistema e a efetividade de sua gestão.

    Entre outras funções, o GEO Brasil Recursos Hídricos terá o papel de oferecer insumos para as ações e políticas necessárias ao cumprimento das metas relativas às águas dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, acordados por 189 países na Cúpula do Milênio das Nações Unidas, ocorrida em setembro de 2000.

    Neste cenário, os recursos hídricos têm papel funda-mental no desenvolvimento socioeconômico, de modo geral, e na busca do cumprimento de quatro dos oito Objetivos da Cúpula do Milênio, de modo particular: Objetivo 4 – reduzir a mortalidade infantil; Objetivo 5 – melhorar a saúde materna; Objetivo 6 – combater o HIV/AIDS, a malária e outras doenças; e, Objetivo 7/Meta 10 – reduzir pela metade, até 2015, a proporção da população sem acesso permanente e sustentável a água potável e esgotamento sanitário.

    Ao se constituir em uma referência sobre a questão dos recursos hídricos, o GEO Brasil Recursos Hídricos certamente contribuirá para que o País possa aperfeiçoar as políticas e instrumentos existentes, permitindo uma gestão mais sustentável dos recursos hídricos e contri-buindo para iniciativas regionais e globais que garantam a proteção desses recursos, tanto na esfera das agências do Sistema das Nações Unidas, como no âmbito das re-lações bilaterais com outros países.

    Introdução

  • 18

    GEO Brasil | Recursos Hídricos | Componente da série de relatórios sobre o estado e perspectivas do meio ambiente no Brasil

    Marco conceitual do processo GEO

    O Programa das Nações Unidas para o Meio Am-biente – PNUMA conduz, desde 1995, um projeto de avaliações ambientais integradas denominado GEO (Global Environment Outlook). O processo GEO pode ser aplicado a diferentes espaços geográficos, sejam eles definidos por limites naturais - bioma, ecorregião, continente etc. - ou determinados pela sociedade hu-mana – cidades, estados, países e regiões.

    Cientificamente embasado, o GEO adota o enfo-que estado-pressão-impacto-resposta (EPIR) seguido da projeção de cenários futuros e de propostas e re-comendações. Os componentes são interativos e, ao mesmo tempo, refletem a dinâmica das relações entre os ambientes naturais e a sociedade humana.

    Com base nesta análise integrada da realidade é que se efetua a etapa subseqüente do processo GEO: a projeção de cenários, para definir e embasar deci-sões de gestão ambiental e a formulação de políticas.

    O processo de desenvolvimento de cenários en-volve a seleção do espaço temporal, a definição dos temas, variáveis e indicadores a serem considerados, as análises das relações de causa-efeito e a constru-ção de modelos matemáticos e/ou narrativos.

    Assim, perguntas orientam cada um dos compo-nentes do processo de análise:

    • O que está ocorrendo com o meio ambiente? (estado) – analisa o estado do meio ambiente, abordando a situação qualitativa e quantitativa atualmente observada em um espaço geográfico definido ou em um setor;

    • Por que está ocorrendo? (pressão) - análise dos fatores antrópicos que alteram as condições naturais e equili-bradas do meio ambiente no espaço e no tempo;

    • Qual é o impacto disto? (impacto) - análise do efeito imediato e mediato, no ambiente e na qua-lidade das vidas humanas, decorrentes das pres-sões – mudanças em indicadores qualitativos e quantitativos;

    • Quais são as políticas adotadas para solucionar os problemas ambientais? (respostas) - análise das intervenções humanas - políticas, ações, pro-gramas, respostas adaptativas etc. - adotadas atu-almente frente aos problemas enfrentados, suas causas e conseqüências;

    • O que acontecerá no futuro se não atuarmos hoje? (cenários futuros) - projeção de possíveis futuros frente à realidade atual observada e aos impactos decorrentes da mesma; e

    • O que fazer para reverter os problemas atuais? (propostas e recomendações) - propostas e reco-mendações para que se atinja o futuro desejável.

    A etapa de conclusão de um ciclo do processo GEO compreende a construção de propostas e reco-mendações que deverão obedecer aos princípios de exeqüibilidade técnico-científica, política, econômica e sócio-cultural, e que buscam contribuir ao processo de tomada de decisão.

    É importante destacar que o processo GEO está sob contínuo monitoramento, avaliação e aper-feiçoamento. Assim, ao longo de sua década de apli-cação, foi aperfeiçoado e adaptado às diferentes reali-dades, escalas de análise e disponibilidade de dados e informações. A cada ciclo de aplicação o processo GEO acumula lições aprendidas e reforça a criação de capacidades para a gestão sustentável dos recursos naturais e do desenvolvimento.

  • 19

    Resumo Executivo

    I – Estado dos Recursos Hídricos no Brasil

    Contexto Geográfico e AmbientalO Brasil é um país reconhecido por suas dimen-

    sões físicas, que atingem números expressivos sob os mais variados critérios de análise. Com uma área de pouco mais de 8,5 milhões de km², ocupa a quinta posição mundial em termos de tamanho,1 represen-tando 47,7% do território da América do Sul.

    Além da dimensão, outras características marcan-tes do País são a diversidade de paisagens e a riqueza em recursos naturais – o que inclui importante parcela dos recursos hídricos do planeta.

    Em termos climáticos, o Brasil apresenta uma pre-dominância de climas quentes (92% do território está localizado na zona intertropical, com médias de tem-peratura superiores a 20ºC). Apesar disso, o País apre-senta seis tipos de climas com características bastante distintas, variando do equatorial, com temperaturas médias que chegam aos 40ºC e chuvas abundantes (mais de 2.500 mm/ano), predominante na região amazônica, ao clima semi-árido, presente no interior da região nordeste, que apresenta baixa pluviosidade (inferior a 1.000 mm/ano, com longos períodos de es-tiagem e média de três meses de chuvas ao ano). A es-ses extremos soma-se, por exemplo, vastas áreas sob influência de climas tropicais e suas variações (tropi-cal de altitude e tropical atlântico), além de uma zona subtropical que ocorre ao sul do Trópico de Capricór-nio, onde se registra a maior amplitude térmica anual do País, que oscila de verões quentes a invernos com baixas temperaturas, inclusive nevascas ocasionais.

    O clima e seu regime de chuvas são fatores cha-ve para os recursos hídricos brasileiros, propiciando uma rede hidrográfica extensa e formada por rios de grande volume de água. Com exceção das nascentes do rio Amazonas, que recebe águas provenientes do derretimento de neve das geleiras andinas, a origem das águas de todos os rios brasileiros são as chuvas. A maioria dos rios é perene; apenas na região semi-árida nordestina existem rios temporários.

    Quanto ao relevo, o Brasil apresenta altitudes em geral modestas, com apenas um ponto superando os três mil metros de altitude - o pico da Neblina (3.014 m),

    próximo à fronteira com a Venezuela. No mais, predo-minam variações de planaltos, planícies e depressões, compatíveis com um território constituído basicamente de estruturas geológicas bastante antigas (do Paleozói-co ao Mesozóico), mas que possui também bacias de sedimentação recente - que correspondem aos terrenos do Pantanal mato-grossense, parte da bacia Amazônica e trechos do litoral nordeste e sul do País.

    Tais características contribuíram para tornar a bio-diversidade brasileira uma as mais ricas e variadas do mundo. O Brasil apresenta seis biomas continentais - Amazônia, Cerrado, Caatinga, Mata Atlântica, Pan-tanal e Pampa, cada qual com sua cobertura vegetal e espécies animais próprias. Entre eles destaca-se o Bioma Amazônia, considerado a maior reserva de diversidade biológica do mundo; a Amazônia é tam-bém o maior bioma brasileiro em extensão e ocupa quase metade do território nacional (49,29%). Áreas igualmente ricas em biodiversidade, como a Mata Atlântica e o Cerrado, enfrentam as maiores pressões antrópicas, especialmente a Mata Atlântica - região que concentra atualmente as maiores densidades de-mográficas do País. Enquanto a Caatinga, localizada na região nordeste, se caracteriza pela vegetação com poucas folhas, decorrente da escassez de água, o Pan-tanal e o Pampa apresentam vastas áreas alagadiças.

    Recursos HídricosO Brasil tem posição privilegiada no mundo, em

    relação à disponibilidade de recursos hídricos. A va-zão média anual dos rios em território brasileiro é de cerca de 180 mil metros cúbicos por segundo (m3/s); para efeito de comparação, tal volume de água é equi-valente ao conteúdo somado de 72 piscinas olímpi-cas fluindo a cada segundo. Este valor corresponde a aproximadamente 12% da disponibilidade mundial de recursos hídricos, que é de 1,5 milhões2 de m3/s. Se forem levadas em conta as vazões oriundas de território estrangeiro e que ingressam no país (Amazônica, 86.321 mil m3/s; Uruguai, 878 m3/s e Paraguai, 595 m3/s), a vazão média total atinge valores da ordem de 267 mil m3/s (ou seja, cerca de 18% da disponibilidade mundial).

    1 Os quatro maiores paíeses são Rússia, Canadá, China e Estados Unidos2 Fonte: Shiklomanov, 1988

  • 20

    GEO Brasil | Recursos Hídricos | Componente da série de relatórios sobre o estado e perspectivas do meio ambiente no Brasil

    Austrália e Oceania6%

    Europa7%Ásia

    32%

    África9%

    Américas46%

    Brasil12% do Total

    Gráfico 1: Distribuição da água doce superficial no mundo

    Fonte: Adaptado de UNESCO

    Gráfico 2: Distribuição da água doce superficial no continente americano

    Fonte: Adaptado de UNESCO

    Em termos de distribuição per capita, a vazão mé-dia de água no Brasil é de aproximadamente 33 mil metros cúbicos por habitante por ano (m3/hab/ano); este volume é 19 vezes superior ao piso estabelecido pela ONU, de 1.700 m3/hab/ano, abaixo do qual um país é considerado em situação de estresse hídrico.

    Nem toda a vazão média dos rios está efetivamen-

    te disponível ao longo de todo o ano, o que faz com que a estimativa de disponibilidade hídrica efetiva no Brasil seja menor: cerca de 92 mil m3/s. Mesmo assim, tal volume de recursos hídricos é suficiente para aten-der cerca de 57 vezes a demanda atual do País, e po-deria abastecer uma população de até 32 bilhões de pessoas, quase cinco vezes a população mundial3.

    3 Tal número foi calculado a partir de um consumo médio de 250 litros por habitante por dia.

    América do Sul60%

    América do Norte34%

    América Central6%

    Brasil28% do Total

  • 21

    Resumo Executivo

    Mapa 1: As 12 regiões hidrográficas e a divisão político administrativa do Brasil

    Regiões HidrográficasPara efeito de planejamento e gerenciamento, o

    Brasil adotou, no seu Plano Nacional de Recursos Hí-

    dricos, uma divisão do país em 12 Regiões Hidrográfi-cas, organizadas segundo a localização das principais bacias hidrográficas do País.

    RO

    MT

    MS

    PR

    SC

    RS

    MG

    SP RJ

    ES

    BA

    TO

    GO

    PA

    AC

    AP

    MA

    PI

    CERN

    PB

    PE

    ALSE

    DF

    RR

    AM

    RH Amazônica

    RH Atlântico Nordeste Oriental

    RH Atlântico Nordeste Ocidental

    RH Atlântico Leste

    RH Atlântico Sudeste

    RH Atlântico Sul

    RH São Francisco

    RH Parnaíba

    RH Tocantins–Araguaia

    RH Uruguai

    RH Paraguai

    RH Paraná

  • 22

    GEO Brasil | Recursos Hídricos | Componente da série de relatórios sobre o estado e perspectivas do meio ambiente no Brasil

    Gráfico 3: Superfície (1.000 km2)

    Gráfico 4: População (1.000 habitantes)

    Gráfico 5: Densidade demográfica (hab./km2)

    Gráfico 6: Taxa de urbanização (%)

    A maior região hidrográfica é a Amazônica, com 3.870 km², enquanto a mais povoada é a do rio Para-ná, com população de quase 55 milhões de pessoas. Pelo critério de densidade demográfica, contudo, a re-gião que apresenta maior índice é a Atlântico Sudeste, com 118 habitantes por km²; no extremo oposto está a região Amazônica, com apenas 2 hab/km².

    Apesar da baixa densidade, a região Amazônica apresenta uma taxa de urbanização de 67%, estando próxima da média nacional, que é de 81% de urbaniza-ção - um efeito da migração campo-cidade e do proces-so de industrialização registrado nos últimos 60 anos.

    Os gráficos a seguir demonstram as características de cada região hidrográfica:

    0% 20% 40% 60% 80% 100%

    Amazônica

    Tocantins - Araguaia

    A. Nord. Ocidental

    Parnaíba

    A. Nord. Oriental

    São Francisco

    Atlântico Leste

    Atlântico Sudeste

    Atlântico Sul

    Uruguai

    Paraná

    Paraguai

    0 20 40 60 80 100 120

    Amazônica

    Tocantins - Araguaia

    A. Nord. Ocidental

    Parnaíba

    A. Nord. Oriental

    São Francisco

    Atlântico Leste

    Atlântico Sudeste

    Atlântico Sul

    Uruguai

    Paraná

    Paraguai

    0 10.000 20.000 30.000 40.000 50.000 60.000

    Amazônica

    Tocantins - Araguaia

    A. Nord. Ocidental

    Parnaíba

    A. Nord. Oriental

    São Francisco

    Atlântico Leste

    Atlântico Sudeste

    Atlântico Sul

    Uruguai

    Paraná

    Paraguai

    0 1.000 2.000 3.000 4.000

    Amazônica

    Tocantins - Araguaia

    A. Nord. Ocidental

    Parnaíba

    A. Nord. Oriental

    São Francisco

    Atlântico Leste

    Atlântico Sudeste

    Atlântico Sul

    Uruguai

    Paraná

    Paraguai

    Em termos de disponibilidade hídrica superfi-cial, mais uma vez se destaca a região hidrográfica Amazônica, com vazão média de quase 132 mil m³/s; em contraste, aparece com menor vazão a re-

    gião Parnaíba, com 753 m³/s. No caso das reservas subterrâneas explotáveis específicas, a região com maior disponibilidade hídrica é Uruguai, com 1,85 l/s/km2.

  • 23

    Resumo Executivo

    4 Com garantia de 95% do tempo5 Com garantia de 95% do tempo

    0 0,5 1,0 1,5 2,0

    Amazônica

    Tocantins - Araguaia

    A. Nord. Ocidental

    Parnaíba

    A. Nord. Oriental

    São Francisco

    Atlântico Leste

    Atlântico Sudeste

    Atlântico Sul

    Uruguai

    Paraná

    Paraguai

    0 2 4 6 8 10

    Amazônica

    Tocantins - Araguaia

    A. Nord. Ocidental

    Parnaíba

    A. Nord. Oriental

    São Francisco

    Atlântico Leste

    Atlântico Sudeste

    Atlântico Sul

    Uruguai

    Paraná

    Paraguai

    0 10.000 30.00020.000 40.000

    Amazônica

    Tocantins - Araguaia

    A. Nord. Ocidental

    Parnaíba

    A. Nord. Oriental

    São Francisco

    Atlântico Leste

    Atlântico Sudeste

    Atlântico Sul

    Uruguai

    Paraná

    Paraguai

    0 10 20 30 40

    Amazônica

    Tocantins - Araguaia

    A. Nord. Ocidental

    Parnaíba

    A. Nord. Oriental

    São Francisco

    Atlântico Leste

    Atlântico Sudeste

    Atlântico Sul

    Uruguai

    Paraná

    Paraguai

    0 20 40 60 80 100 120 140

    Amazônica

    Tocantins - Araguaia

    A. Nord. Ocidental

    Parnaíba

    A. Nord. Oriental

    São Francisco

    Atlântico Leste

    Atlântico Sudeste

    Atlântico Sul

    Uruguai

    Paraná

    Paraguai

    Gráfico 7: Vazões médias (1.000 m3/s)

    Gráfico 8: Vazões específicas (l/s/km2)

    Gráfico 9: Disponibilidades hídricas 4 (m3/s)

    Gráfico 10: Disponibilidades hídricas específicas5 (m3/s)

    0 500 1000 1500 2000

    Amazônica

    Tocantins - Araguaia

    A. Nord. Ocidental

    Parnaíba

    A. Nord. Oriental

    São Francisco

    Atlântico Leste

    Atlântico Sudeste

    Atlântico Sul

    Uruguai

    Paraná

    Paraguai

    Gráfico 11: Reservas subterrâneas explotáveis (m3/s)

    Gráfico 12: Reservas subterrâneas explotáveis específicas

    (l/s/km2)

  • 24

    GEO Brasil | Recursos Hídricos | Componente da série de relatórios sobre o estado e perspectivas do meio ambiente no Brasil

    Usos MúltiplosCom relação à utilização de suas águas, o Brasil

    registra retiradas totais de 1.568 m³/s para diferentes usos, ou 3,4% da vazão com 95% de garantia; este volume equivale a 38 piscinas olímpicas por minuto. Desse total, cerca de 840 m³/s são efetivamente con-sumidos, não retornando às bacias hidrográficas.

    A região hidrográfica que mais utiliza o recur-so é a do Paraná, com 478 m³/s, o que representa 30% da retirada e 23% do consumo do País. Por outro lado, a região em situação mais crítica é a

    do Atlântico Nordeste Oriental, onde as retiradas superam a disponibilidade hídrica, inferior a 1.200 m3/hab/ano em média, devido à intermitência de seus cursos de água.

    Em termos de média de consumo de água em re-lação à população, incluindo aqui todos os tipos de uso, destaca-se a região do Uruguai, com 3.353 litros por habitante por dia, frente a uma média nacional de 799 l/hab/dia. Já as retiradas em relação à área da região são maiores no Atlântico Sul, com 1,26 l/s/km2, para uma média nacional de 0,18 l/s/km2.

    0% 5% 10% 15% 20% 25%

    Amazônica

    Tocantins - Araguaia

    A. Nord. Ocidental

    Parnaíba

    A. Nord. Oriental

    São Francisco

    Atlântico Leste

    Atlântico Sudeste

    Atlântico Sul

    Uruguai

    Paraná

    Paraguai

    0 100 200 300 400 500

    Amazônica

    Tocantins - Araguaia

    A. Nord. Ocidental

    Parnaíba

    A. Nord. Oriental

    São Francisco

    Atlântico Leste

    Atlântico Sudeste

    Atlântico Sul

    Uruguai

    Paraná

    Paraguai

    Gráfico 13: Retirada total de água (m3/s) Gráfico 15: Retirada total de água (% da vazão média)

    Gráfico 14: Retirada total de água (% da disponibilidade

    com 95% de garantia)

    0% 100% 200% 300% 400% 500% 600%

    Amazônica

    Tocantins - Araguaia

    A. Nord. Ocidental

    Parnaíba

    A. Nord. Oriental

    São Francisco

    Atlântico Leste

    Atlântico Sudeste

    Atlântico Sul

    Uruguai

    Paraná

    Paraguai

    Gráfico 16: Retirada total de água por área (l/s km2)

    0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 1,2

    Amazônica

    Tocantins - Araguaia

    A. Nord. Ocidental

    Parnaíba

    A. Nord. Oriental

    São Francisco

    Atlântico Leste

    Atlântico Sudeste

    Atlântico Sul

    Uruguai

    Paraná

    Paraguai

  • 25

    Resumo Executivo

    A distribuição do uso da água por tipo de deman-da indica que, na média nacional, o consumo huma-no (urbano e rural) equivale a pouco menos de 1/3 do total, enquanto o consumo para atividades produtivas (irrigação, industrial e criação animal) responde pelo restante. O maior consumo brasileiro está na irriga-ção, que utiliza 46% do total de recursos hídricos retirados; a cifra é coerente com o destacado papel

    econômico do agro-negócio no Brasil (ver Pressão e Impactos). Em segundo lugar aparece o consumo hu-mano urbano, com 27%, ficando o uso industrial em terceiro, com 18% do total.

    Na distribuição do uso pelas regiões, a do Paraná (que consome mais) supera as demais em todos os tipos de uso, com exceção da irrigação, onde se des-tacam as regiões do Atlântico Sul e do Uruguai, espe-cialmente devido ao arroz irrigado por inundação. A região do Atlântico Sudeste apresenta usos relevantes no abastecimento humano urbano e industrial, devido a suas grandes metrópoles. Atlântico Sudeste e Para-ná, por sinal, são as únicas regiões em que a indústria baseada no uso da água prepondera sobre as demais atividades econômicas, com a irrigação apresentando intensidade próxima. A região do Atlântico Nordeste Ocidental apresenta um considerável uso humano, indicando um menor nível das atividades econômicas usuárias de água. Por sua vez, a região do Paraguai é a única em que a atividade de criação animal se so-bressai em relação aos demais, indicando a força da agropecuária local.

    1.5000 500 1.000 2.000 2.500 3.000 3.500

    Amazônica

    Tocantins - Araguaia

    A. Nord. Ocidental

    Parnaíba

    A. Nord. Oriental

    São Francisco

    Atlântico Leste

    Atlântico Sudeste

    Atlântico Sul

    Uruguai

    Paraná

    Paraguai

    Gráfico 17: Retirada total de água por habitante (l/hab/dia)

    Pant

    anal

    /MS

    – Fo

    to: A

    rqui

    vo T

    DA

  • 26

    GEO Brasil | Recursos Hídricos | Componente da série de relatórios sobre o estado e perspectivas do meio ambiente no Brasil

    Humana urbana Humana rural Industrial Irrigação Animal

    0%

    10%

    20%

    30%

    40%

    50%

    60%

    70%

    80%

    90%

    100%A

    maz

    ônic

    a

    Toca

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    s - A

    ragu

    aia

    A. N

    ord.

    Oci

    dent

    al

    Parn

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    A. N

    ord.

    Ori

    enta

    l

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    o

    Atlâ

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    ntic

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    e

    Atlâ

    ntic

    o Su

    l

    Uru

    guai

    Para

    Para

    guai

    30%

    25%

    50%

    32%

    25%

    18%

    40%

    46%

    14%

    15%

    33% 28%

    2%

    3%

    46%

    24%

    7%

    1%

    5%

    1%

    12%

    71%

    2%

    2%

    26%

    23%

    3%

    8%

    8%

    33%

    11%

    3%

    5%

    4%

    9%

    2%

    7%

    3%

    12%

    16%

    5%

    11%

    17%

    39%

    29%

    6%

    29%

    27%

    22%

    2%

    33%

    10%

    64%

    60%

    47%

    4%

    4%

    7%

    3%

    86%

    Gráfico 18: Distribuição dos usos da água nas regiões

  • 27

    Resumo Executivo

    O significativo consumo humano urbano na mé-dia nacional está relacionado à alta taxa de urbaniza-ção e ao percentual de cobertura do abastecimento de água - que atinge 89% na média nacional e supe-ra os 90% nas regiões mais urbanizadas do Paraná, São Francisco, Uruguai e Atlântico Sul. A coleta de

    esgotos, entretanto, não atinge o mesmo patamar, fi-cando em 54% dos domicílios na média brasileira. As regiões com maiores coberturas - Paraná e Atlânti-co Sudeste - não atingem o índice de 70%, enquanto no outro extremo, a região do Paranaíba, oferece 4% de coleta de esgoto.

    O Brasil encontra-se em situação bastante favorá-vel em relação ao seu patrimônio hídrico, que poderá se tornar uma grande vantagem competitiva interna-cional caso venha a ser bem gerenciado.

    Apesar da grande disponibilidade, a distribuição dos recursos hídricos no Brasil é bastante desigual em termos geográficos e populacionais. Embora a Amazônia possua 74% da disponibilidade de água, a Bacia Hidrográfica Amazônica é habitada por menos de 5% da população brasileira, o que explica a baixa média de utilização do recurso.

    Oferta e consumo apresentam relativo equilíbrio nas demais regiões com exceção da região Nordes-te, que apresenta um quadro de insuficiência quan-titativa no semi-árido. Essa insuficiência se faz sentir especialmente na região hidrográfica do Atlântico Nordeste Oriental, única considerada em situação crítica quanto ao balanço hídrico. Em algumas bacias da região Atlântico Nordeste Oriental são registradas disponibilidades menores que 500 m3/hab/ano, o que indica um quadro de escassez.6 Destacam-se ainda, na condição de regiões com pouca disponibilidade relativa, algumas bacias das regiões hidrográficas

    Atlântico Leste, Parnaíba e São Francisco. Na porção semi-árida dessas regiões, onde o fenômeno da seca tem repercussões mais graves, a água é um fator críti-co para as populações locais. A presença dos açudes para o armazenamento de água e regularização das vazões dos rios intermitentes é fundamental e estraté-gica para o abastecimento humano, dessedentação de animais, irrigação e demais usos.

    Quanto ao uso, a maior parte dos recursos hídri-cos empregados no Brasil vão para atividades pro-dutivas, com destaque para a irrigação. Por causa da boa oferta desse recurso no Centro-Oeste, por exem-plo, a região transformou-se em importante frontei-ra agrícola do País. Nas regiões Sudeste e Sul, onde se encontram as maiores concentrações urbanas e industriais brasileiras, as deficiências encontradas são, sobretudo, de qualidade das águas, como de-monstrado no capítulo Pressão e Impactos a seguir. Essa questão está relacionada, entre outros fatores, ao perfil do saneamento básico; assim como muitos países, o Brasil está mais próximo de atingir a meta de universalização do abastecimento de água que da coleta de esgotos.

    6 Segundo classificação da ONU, a situação de escassez se configura nos casos em que a vazão é inferior a 1.000 m3/ha/ano.

    Abastecimento de água Coleta de esgotos

    0% 20% 40% 60% 80% 100%

    Amazônica

    Tocantins–Araguaia

    A. Nord. Ocidental

    Parnaíba

    A. Nord. Oriental

    São Francisco

    Atlântico Leste

    Atlântico Sudeste

    Atlântico Sul

    Uruguai

    Paraná

    Paraguai

    Gráfico 19: Cobertura de serviços de saneamento básico nas áreas urbanas das regiões hidrográficas brasileiras

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    GEO Brasil | Recursos Hídricos | Componente da série de relatórios sobre o estado e perspectivas do meio ambiente no Brasil

    II – Pressão e impactos sobre os Recursos Hídricos no Brasil

    Com uma economia dinâmica e diversificada, alta taxa de urbanização e forte demanda por ener-gia, entre outros fatores, o Brasil vem enfrentando um conjunto variado de pressões sobre os recursos hídricos disponíveis. Essas pressões causam impac-tos sobre a oferta presente e futura de tais recursos, bem como sobre sua qualidade e sua capacidade de prestação de serviços ambientais. O País também passa por mudanças sócio-econômicas importantes, que convergem para uma redução das desigualdades econômicas regionais e, conseqüentemente, eventual deslocamento das pressões de consumo para novas regiões hidrográficas.

    Segundo projeções para 2005, o País abriga uma população de 184,2 milhões de habitantes, o que cor-responde a uma densidade demográfica de 22 hab/km2. Ao longo dos últimos anos, o crescimento demo-gráfico tem diminuído o ritmo, devido à urbanização (81% dos brasileiros vivem em cidades) e à industria-lização, além de incentivos à redução da natalidade. Em termos de Índice de Desenvolvimento Humano, o País ocupava em 2004 a 69ª posição em 177 países, com um IDH de 0,792.

    A distribuição populacional do país é bastante de-sigual, havendo uma concentração histórica da popu-lação nas zonas litorâneas, especialmente do Sudeste, da Zona da Mata nordestina e da região Sul. As áreas de menor densidade populacional situam-se nas re-giões Norte e Centro-Oeste. Como mencionado an-teriormente, também se observa forte tendência para a urbanização, com formação de grandes centros ur-banos, inclusive em regiões mais afastadas do litoral; mais de 50% dos brasileiros vivem atualmente em ci-dades com população superior a cem mil habitantes.

    Em termos produtivos, o Brasil alcançou em 2005 um Produto Interno Bruto a preços de mercado de R$ 1.9 trilhão; o País responde por três quintos da pro-dução industrial da economia sul-americana e partici-pa de diversos blocos econômicos e políticos como o Mercosul, o G-22 e o Grupo de Cairns, que trata de produtos agrícolas. Um setor dos mais dinâmicos da economia é precisamente o de agro-negócio, que re-

    presenta 34% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional, 37% dos empregos e 43% das exportações nacionais.7

    O Brasil comercia regularmente com mais de uma centena de países, sendo que 74% dos bens exporta-dos são manufaturados ou semimanufaturados, indi-cando o grau de desenvolvimento do parque indus-trial e tecnológico instalado.

    A concentração populacional no Sudeste se refle-te também na atividade econômica e na renda: com 11% do território brasileiro, a região concentra cerca de 43% da população e 56% do poder de compra do país, enquanto a região Norte, que corresponde a 45% do território nacional, detém 8% da população brasileira e apenas 4,5% do poder de compra. Toda-via, essa concentração tem se reduzido nos últimos anos, com o PIB brasileiro tendo registrado cresci-mento mais acelerado nas regiões Norte e Nordeste, sendo que a primeira possui os maiores volumes de recursos hídricos disponíveis, e a segunda os meno-res, que são utilizados muitas vezes em níveis críticos. Tal descentralização das atividades produtivas poderá afetar também os fluxos migratórios, alterando os per-fis demográficos existentes.

    Mesmo com rendimentos econômicos relativa-mente elevados em termos nacionais, sua distribuição desigual impede que a cobertura dos serviços de sa-neamento no Brasil seja elevada entre as populações pobres, que proporcionalmente pagam mais pela água potável: segundo o Relatório do Desenvolvi-mento Humano 2006 do PNUD, no Brasil a parcela de 20% da população mais rica goza de um acesso à água e saneamento em níveis comparáveis aos dos países ricos, enquanto os 20% dos mais pobres regis-tram taxas de cobertura mais baixas do que no Viet-nam. Se há uma correlação entre cobertura e inclusão social, as perspectivas futuras são positivas, já que o País vem registrando nos últimos anos uma redução na desigualdade, como resultado dos programas so-ciais adotados pelo governo. A perspectiva de inclu-são de novos consumidores significa maior utilização de recursos hídricos maior geração de efluentes, entre outros impactos.

    7 Fonte: Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

  • 29

    Resumo Executivo

    Os quadros críticos relacionados à qualidade de água no país estão relacionados aos esgotos de ori-gem urbana e aos efluentes industriais, de atividades intensivas de criação animal e de atividades extensi-vas da agricultura.

    Ainda são poucas as estimativas de carga de poluentes lançadas nos corpos hídricos brasileiros, o que dificulta a apresentação de um panorama abrangente. É possível, contudo, estimar a poluição de origem doméstica: no Brasil, a carga orgânica gerada pelos esgotos domésticos é calculada em 6.392 toneladas de DBO (Demanda Bioquímica de Oxigênio) por dia.8 Esse volume representa cerca de 150 vezes a carga orgânica gerada pelos esgotos domésticos de uma cidade do porte de Campinas (SP), que tem uma população de aproximadamente um milhão de habitantes. Em relação à vazão mé-dia nacional, o índice de poluição doméstica atinge 0,41 g DBO5/m³.

    As cargas de poluição orgânica doméstica variam bastante entre as regiões hidrográficas, com o desta-que para as regiões mais densamente povoadas do Paraná e do Atlântico Sudeste.

    A partir do contexto apresentado, o GEO Recursos Hídricos examinou um conjunto de recortes por tipo-logia de problemas em território brasileiro:

    8 Isto significa que, para oxidar a matéria orgânica presente nos esgotos, são necessários, diariamente, 6.392 toneladas de oxi-gênio presente nos corpos d’ água brasileiros.

    0 500 1.000 1.500 2.000 2.500

    Amazônica

    Tocantins - Araguaia

    A. Nord. Ocidental

    Parnaíba

    A. Nord. Oriental

    São Francisco

    Atlântico Leste

    Atlântico Sudeste

    Atlântico Sul

    Uruguai

    Paraná

    Paraguai

    Gráfico 20: Carga de DBO5 (t DBO5/dia)

    Recursos Hídricos na Região AmazônicaA região se caracteriza pelas baixas densidades po-

    pulacionais, com problemas de contaminação hídrica pontuais, localizados em cidades (esgotos domésticos em Belém e Manaus) e em empreendimentos de ex-tração mineral (contaminação por mercúrio) e florestal (erosão). A importância dos recursos hídricos está ba-sicamente relacionada à pesca e navegação, com os cursos d’água constituindo-se como os principais cor-redores de transporte e comunicação da região. Possui expressivo potencial de aproveitamento hidrelétrico, estimado em 40% do total do país, mas contribui com apenas 1% da geração de energia, o que torna rele-vante o debate sobre o aproveitamento desse potencial remanesceste, particularmente em decorrência da te-mática de preservação ambiental da região. Apresenta ainda problemas com vetores de doenças tropicais que dependem da água em pelo menos uma de suas fases de desenvolvimento (malária, entre outras).

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    GEO Brasil | Recursos Hídricos | Componente da série de relatórios sobre o estado e perspectivas do meio ambiente no Brasil

    Recursos Hídricos na Bacia do Alto Paraguai e no Pantanal

    A bacia do Alto Paraguai abriga a maior área úmida continental do Planeta, caracterizada pelo represamen-to e pelo grande tempo de retenção das águas. O bio-ma, com biodiversidade singular, é considerado frágil e bastante dependente das alterações nos fluxos e na qualidade das águas afluentes à planície pantaneira. A região oferece grande potencial paisagístico e turís-tico, mas sua economia está baseada na agropecuária extensiva, principalmente a cultura de grãos e a pecu-ária de corte (mais de 30 milhões de cabeças), o que determina a demanda sobre os recursos hídricos. Os principais problemas apontados são o impacto da ex-pansão da fronteira agrícola no planalto nas nascentes dos rios que formam a bacia do Alto Paraguai, da po-luição doméstica e o garimpo, a remoção da vegetação ciliar e a pisoteamento das margens pelo gado e as alte-rações na dinâmica quali-quantitativa das águas sobre os ecossistemas pantaneiros. Futuros projetos de infra-estrutura como diques, um pólo siderúrgico e obras para a Hidrovia do Alto Paraguai exigirão uma gestão mais aprofundada dos recursos hídricos da região.

    Recursos Hídricos nos Cerrados do Brasil Central

    A área do bioma Cerrado, que ocupa grande parte do planalto central do território brasileiro, é caracte-rizada por apresentar precipitação média de 1.660 mm anuais, sujeita a variações sazonais importantes (período pronunciado de chuvas intensas e estiagens severas, com 4 a 5 meses de duração) o que gera re-lativa baixa na disponibilidade de recursos hídricos.

    O Cerrado possui relevo plano que facilita a expansão de novas fronteiras agrícolas, em especial de cultu-ras mecanizadas como soja e milho. Estes cultivos se apóiam na larga utilização das reservas hídricas regio-nais; por ocasião das estiagens sazonais, essa sobre-exploração tem resultado em conflitos de uso com o abastecimento público de água nas cidades da região. Por outro lado, quando ocorrem chuvas intensas, sur-gem problemas de assoreamento e contaminação por agro-químicos, agravados pela retirada sistemática da vegetação ciliar. Há ainda problemas de poluição ur-bana, especialmente em cidades localizadas em di-visores de águas e nascentes; como a região está a montante dos principais rios brasileiros, os problemas mencionados podem impactar outras regiões do País.

    Recursos Hídricos no Semi-Árido BrasileiroCom precipitação anual média na casa dos 900

    mm, chegando próxima a 400 mm em alguns casos, o semi-árido brasileiro apresenta uma rede hidrográfica com rios intermitentes no interior, que assumem corpo e volume já próximos de seu deságüe no litoral. São li-mitadas as possibilidades de extração de águas subterrâ-neas, bem como armazenamento em açudes e reserva-tórios, neste caso pela elevada evaporação, que supera os 2.000 mm anuais. A exceção é o rio São Francisco, com uma bacia de contribuição de 638.000 km²; o São Francisco atravessa toda a região e atinge uma vazão da ordem de 1.850 m³/s, permitindo múltiplos usos, como irrigação e geração de energia. Apesar das adversidades, persiste uma população de quase 48 milhões de habi-tantes na região, 1/3 dos quais espalhados na zona rural.

    A Bacia Amazônica ocupa 2/5 da América do Sul e 5% da superfície terrestre. Sua área, de aproximadamente 6,5 milhões de quilômetros quadrados, abriga a maior rede hi-drográfica do planeta, que escoa cerca de 1/5 do volume de água doce do mundo. Sessenta por cento da Bacia Amazôni-ca se encontra em território brasileiro.

    A Amazônia possui uma enorme mas frágil biodiversidade, assentada numa planície sedimentar dotada de camada orgâni-ca delgada e superficial, dependente da manutenção da cober-tura vegetal para sua auto-reprodução e estabilidade dos solos. Sua importância está associada aos “serviços ambientais” pres-tados ao Planeta Terra, em termos climáticos, principalmente pela reserva e difusão de umidade pela floresta, e de captura de gás carbônico, ambos com repercussões globais.

    Reconhecida como uma das regiões mais úmidas do mundo, a Bacia tem uma enorme importância na dinâmica

    climática e no ciclo hidrológico do planeta, contribuindo para o regime de chuvas e evapotranspiração da América do Sul e demais regiões. A ação antrópica, principalmente a conversão de mais de 600.000 km² de florestas tropicais em pastagens e culturas agrícolas, associada a mudanças regionais e glo-bais têm provocado alterações no clima e na hidrologia da Amazônia. As alterações estão relacionadas, entre outros, à aceleração do degelo dos Andes e à ocorrência de fenôme-nos de alteração da temperatura do mar (conhecidos como El Niño e La Niña). Este fenômeno, registrado em 2005, alterou as massas de ar úmidas da Amazônia e resultou numa seca de extrema gravidade, que afetou mais de 167 mil habitantes somente no Estado do Amazonas. Estudar e compreender me-lhor tais cenários será fundamental para definir futuros riscos hidrológicos e antecipar medidas de adaptação conjunturais e estruturais de gestão da água.

    Box 1: Bacia Amazônica

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    Resumo Executivo

    Os problemas dos recursos hídricos no semi-árido brasi-leiro exigem o gerenciamento da oferta, insuficiente para imprimir dinâmica à economia regional, bem como da demanda dispersa, que dificulta o ordenamento dos ser-viços públicos como o saneamento básico.

    Recursos Hídricos no Litoral e Zona da Mata do Nordeste Brasileiro

    A situação do semi-árido leva, em primeiro lugar, à migração da população da zona rural para as grandes regiões metropolitanas do próprio Nordeste, resultando em sérios problemas ambientais urbanos, associados à concentração de pobreza em favelas e ocupações ir-regulares, notadamente em áreas de risco, tais como alagados, encostas, várzeas e margens de rios e cór-regos. As disponibilidades hídricas ficam comprometi-das pela poluição urbana e industrial, bem como por cheias periódicas, amplificadas pela impermeabiliza-ção crescente do solo urbano. Tal quadro compromete a balneabilidade de certas praias e impacta no poten-cial turístico do litoral nordestino, uma alternativa im-portante para o desenvolvimento da região.

    Recursos Hídricos em Aglomerados Urbanos e Regiões Metropolitanas

    As regiões Sul e Sudeste contam com boas disponi-bilidades de água, razoavelmente bem distribuídas ao longo do ano. Apesar disso, enfrentam problemas de-correntes das características do processo de rápida ur-banização do Brasil. Estima-se que as cidades brasileiras aumentaram sua população em 110 milhões de pessoas nos últimos 60 anos, sendo que a metade dos moradores urbanos está concentrada em apenas 23 regiões metro-politanas; estes aglomerados urbanos tendem a manter seus impactos sobre os recursos hídricos mesmo no atual cenário, de redução da taxa anual de crescimento urbano do País. As pressões caracterizam-se pela sobre-posição de problemas como poluição doméstica e in-dustrial; ocupação irregular de encostas, alagados, vár-zeas e beiras de rios; e enchentes em cidades de grande e médio porte. O resultado é o comprometimento dos mananciais de abastecimento, com escassez de disponi-bilidade hídrica em qualidade adequada.

    Recursos Hídricos na Zona Costeira do Sul e do Sudeste

    Os problemas da zona costeira do Sul e do Sudeste reproduzem as deficiências de infra-estrutura sanitária

    já citadas e recorrentes na malha urbana do país. Essas regiões apresentam, todavia, algumas peculiaridades, como o elevado fluxo sazonal nos finais de semana e períodos de férias, que multiplica em até 20 vezes a população residente; tal sazonalidade implica em al-ternância de ociosidade e sobrecarga no sistema. As repercussões são conhecidas: perda de potencial turís-tico, cheias urbanas e insuficiências no atendimento a serviços de abastecimento de água (colapso freqüente nas temporadas), coleta e tratamento dos esgotos do-mésticos (línguas negras e odor nas praias), coleta e disposição de resíduos sólidos, dentre outros.

    Recursos Hídricos afetados por Atividades Agropecuá-rias Extensivas e em Áreas Intensivas em Agro-negócios

    Graças às características hidrometeorológicas fa-voráveis e solos férteis, os estados do Sul e Sudeste contam com uma agricultura dinâmica, moderna e diversificada: grãos, em geral (soja, milho e trigo), café, cana-de-açúcar, algodão e fruticultura. O fator determinante dos problemas de recursos hídricos observados na zona rural do Sul e Sudeste é o esgo-tamento das fronteiras de expansão agrícola dessas regiões. Predominam os impactos de plantios até a beira dos cursos d’água, com remoção quase comple-ta da cobertura vegetal, inclusive da mata de preser-vação ciliar. Há elevada mecanização, uso intensivo de agro-químicos (pesticidas e fertilizantes) e colhei-tas sazonais sucessivas, sem que sejam considerados devidamente os impactos ambientais, que incluem: perdas anuais de até 15 toneladas por hectare das camadas superficiais dos solos, com o conseqüente assoreamento dos cursos d’água; poluição das águas por agro-químicos e dejetos de animais in natura. O resultado é a elevação dos custos do aproveitamento dos recursos hídricos, para abastecimento doméstico ou insumo industrial.

    Gerenciamento de Águas SubterrâneasEstima-se que o Brasil possua uma disponibilidade

    hídrica subterrânea explotável da ordem de 4.000 m3/s,

    alimentando a existência de mais de 400 mil poços que suprem diversas finalidades como abastecimen-to público, irrigação, indústria e lazer. Mais de 15% dos domicílios brasileiros utilizam exclusivamente água subterrânea para seu suprimento, permitindo o atendimento de comunidades pobres ou distantes das redes de abastecimento público em geral, sendo

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    GEO Brasil | Recursos Hídricos | Componente da série de relatórios sobre o estado e perspectivas do meio ambiente no Brasil

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    estratégica para as comunidades rurais do semi-árido nordestino. Na porção Centro-Sul do Brasil localiza-se o Sistema Aqüífero Guarani, uma das maiores re-servas de água doce do planeta; o aqüífero extrapola as fronteiras nacionais e alcança parte dos territórios do Paraguai, Uruguai e Argentina. A qualidade das águas subterrâneas tem sido comprometida signifi-cativamente em alguns aqüíferos pelas atividades an-trópicas nas últimas décadas; há também carência de estudos sistemáticos sobre os aqüíferos em contextos regionais e sobre a qualidade química e microbioló-gica de suas águas.

    O panorama geral descrito anteriormente indica que existem grandes contrastes entre as regiões, em termos de balanços hídricos, tipos de usos de água e problemas constatados. Vale observar, porém, que a divisão do País em extensas regiões hidrográficas que agregam várias bacias e sub-bacias, com características

    e contextos próprios, não permite identificar todas as situações críticas, pressões e impactos que ocorrem.

    Esta constatação permite concluir que a divisão apresentada, em regiões hidrográficas, embora consi-ga retratar espacialmente a variabilidade hidrológica do país, não é suficiente para o enfrentamento dos problemas de gestão de recursos hídricos, dadas as suas extensas dimensões geográficas e a diversidade de situações específicas e desafios que encerram. Sendo assim, estão sendo traçados outros recortes espaciais para unidades de planejamento e para a gestão dos recursos hídricos, inclusive, com variações geográficas que contemplem, para além das variáveis hidrológicas, a tipologia dos problemas a enfrentar, os aspectos ambientais, a dinâmica socioeconômica e fatores de cunho político e institucional, todos inter-venientes sobre a gestão dos recursos hídricos. Estes temas serão tratados no capítulo Respostas, a seguir.

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    Resumo Executivo

    III – Respostas adotadas pelo Brasil em relação aos recursos hídricos

    III.1 – Perspectiva HistóricaA ação do setor público brasileiro no que se refere

    aos recursos hídricos não é um fenômeno recente na história brasileira, exigindo a atuação dos governantes e despertando o interesse da iniciativa privada por so-luções coletivas desde o século XVIII – data de 1723 a construção da primeira obra pública de abasteci-mento, o Aqueduto da Lapa, no Rio de Janeiro. Com o crescimento dos núcleos urbanos e os primórdios da industrialização, no século XIX, surge o interesse no fornecimento público de água e no aproveitamento do potencial hidráulico para a geração de eletricidade; tais atividades foram, desde o início, assumidas pela iniciativa privada, notadamente de capital estrangeiro.

    Até o início do século XX, é pequena a presen-ça do Estado nesse segmento, seja na prestação de serviços, seja na regulação ou fiscalização. Porém, a insatisfação da população quanto à qualidade dos serviços, na década de 1920, leva ao início de um ciclo de estatizações dos serviços de saneamento.

    O primeiro passo no sentido de se construir um marco legal para os recursos hídricos no Brasil ocorre no contexto da Constituição Federal de 1934, quando também é aprovado o Código de Águas. O Código consagra o papel do poder público no controle e in-centivo ao aproveitamento do recurso, lançando as bases para a institucionalização dos instrumentos de gestão e regulação do uso múltiplo das águas; ao mes-mo tempo, confere um enfoque setorial à questão, pri-vilegiando a geração de energia: enquanto dedica um artigo para assegurar o uso da água para as “primeiras

    necessidades da vida”, o Código traz 65 artigos regu-lando a utilização das águas pela incipiente indústria da eletricidade.

    Nos anos 1940 inicia-se a comercialização dos serviços de saneamento, a partir de investimentos es-tatais; surgem as primeiras experiências de uso múl-tiplo integrado para energia, navegação e irrigação. O enfoque setorial persiste, e inspira um conjunto de políticas para cada área específica.

    Geração de energiaCom a criação do Ministério das Minas e Energia,

    em 1960, avança a estruturação do setor elétrico bra-sileiro. Em 1968 é criado o Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica (DNAEE), sucessor, res-pectivamente, do DNPM/Serviço de Águas do Depar-tamento Nacional de Produção Mineral e do Conse-lho Nacional de Águas e Energia Elétrica. O DNAEE fica encarregado da gestão dos usos das águas e dos serviços de energia elétrica em âmbito federal até sua extinção, em 1997, com a estruturação da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL).

    As primeiras preocupações com o meio ambien-te surgem com a promulgação do Código Florestal – Lei nº 4.771, de 1965 – que cria as áreas de preservação permanente e, indiretamente, protege a vazão e a quali-dade das águas ao determinar a preservação das flores-tas e das matas ciliares situadas ao longo dos cursos de água, nascentes, lagos, lagoas ou reservatórios. Ambas visões, a ambiental e a econômica, passam a conviver de maneira mais próxima e a enfrentar o desafio da bus-ca do equilíbrio entre os respectivos enfoques.

    A Constituição de 1967 atribui ao governo federal duplo papel: de um lado, o de poder concedente e regu-lador; e de outro, o de investidor - empreendedor, por-tanto sujeito à própria regulação. O setor elétrico con-tinuou em expansão com perfil estatizante até meados dos anos 90; o símbolo desse período é a Usina Hidre-létrica de Itaipu, projeto binacional que envolveu Brasil e Paraguai e se tornou a principal unidade geradora do sistema. Em pouco tempo, o Brasil viria a desenvolver um complexo sistema de produção, transmissão e dis-tribuição de energia elétrica de fonte hídrica, que ocupa posição central na matriz energética do País.

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    GEO Brasil | Recursos Hídricos | Componente da série de relatórios sobre o estado e perspectivas do meio ambiente no Brasil

    Fonte: www.aneel.gov.br – atualizado em 09/11/2006

    Tabela 1: Fontes da matriz de geração de energia elétrica do Brasil

    Potenciais instalados

    TipoCapacidade Instalada.

    %N° de usinas (kW)

    Hidrelétricas 625 73.361.927 70,28

    Gás 102 10.851.916 10,40

    Petróleo 570 4.680.510 4,48

    Biomassa 270 3.709.785 3,55

    Nuclear 2 2.007.000 1,92

    Carvão mineral 7 1.415.000 1,36

    Eólica 14 186.850 0,18

    Importação 8.170.000 7,83

    Total 1.590 104.382.988 100

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    Resumo Executivo

    Apesar da predominância do uso das águas para a geração de eletricidade, tal opção gera benefícios in-clusive para outros setores usuários, como a formação de recursos humanos capacitados, produção de co-nhecimentos científicos e tecnológicos (especialmente a sistematização de dados e informações hidrológicas sobre as principais bacias brasileiras) e a regulação de caudais e níveis de grandes rios, decorrente da insta-lação dos reservatórios das hidrelétricas.

    SaneamentoNo setor de saneamento, estimava-se, em 1967,

    que 45% da população urbana brasileira era atendida por sistema de abastecimento de água, enquanto ape-nas 24% possuía acesso à rede coletora de esgotos. Numa tentativa de reverter esse quadro, o governo federal institui em 1970 o Plano Nacional de Sanea-mento (PLANASA), responsável por mudanças signifi-cativas na prestação dos serviços de saneamento.

    O Plano destina recursos para o setor e fortale-ce as companhias estaduais públicas de saneamento; tais empresas passam a conviver com entidades mu-nicipais que antes se encarregavam do abastecimento de água e coleta de esgoto, por meio de contratos de concessão, o que faz surgir uma questão de titularida-de sobre a prestação desse tipo de serviço que persiste até os dias de hoje.

    Entre outras conquistas, o PLANASA possibilita o domínio sobre sistemas integrados em algumas regi-ões metropolitanas; o planejamento do uso de manan-ciais em escala regional, com o controle da qualidade da água; a cobrança dos serviços prestados com base em critérios normalizados; e o desenvolvimento de tecnologias de controle de perdas. Apesar dos avan-ços do Plano e do aumento da cobertura (89% dos domicílios com abastecimento de água e 54% com coleta de esgoto), o Brasil ainda apresenta um passi-vo ambiental relacionado a esgotos domésticos sem coleta e sem tratamento. Com o esgotamento da ca-pacidade de investimento do PLANASA, no final dos anos 1980, o país permanece sem um marco institu-cional e financeiro para o saneamento até janeiro de 2007, quando é sancionada a Lei Federal nº 11.445 com o objetivo de revigorar o setor. A nova lei dispõe sobre os serviços de saneamento básico, formas de regulação e de prestação regionalizada desses servi-ços, exigências de planejamento, aspectos técnicos, econômicos e sociais, além de estabelecer formas de

    controle social. Sob essas condições, pode-se prever maiores incentivos à investimentos privados, notada-mente em função da melhor regulamentação do setor e garantias asseguradas mediante contratos de con-cessão, acrescidas de estudos de viabilidade técnica, econômica e financeira.

    IrrigaçãoEm 1979 é instituída a Política Nacional de Irriga-

    ção, através da Lei nº 6.662, que serve de base para o Programa Nacional de Irrigação e para o Programa de Irrigação do Nordeste. As iniciativas, tanto gover-namentais como privadas, que já haviam permitido a duplicação da área de agricultura irrigada na década de 1960, resultam em nova duplicação nos anos 1980, quando a área irrigada atinge cerca de 1.600.000 ha – um total ainda modesto para as necessidades do País.

    Nessa primeira fase, as ações ocorrem de modo desarticulado, sem logística produtiva e de transpor-te, bem como sem assistência técnica e políticas de comercialização da produção irrigada. Tais avanços só ocorrerão mais tarde, num contexto de forte parti-cipação privada, voltada ao abastecimento interno e à exportação de produtos agrícolas.

    Navegação InteriorEmbora seja o meio de transporte de menor custo

    operacional, o setor da navegação interior é, entre os vários setores, o que menos se desenvolve. Isso ocorre parte em função de algumas condições geográficas e topográficas desfavoráveis, parte pela forte concorrên-cia imposta pela rápida expansão da malha rodoviária que se verifica durante boa parte do século XX. Há também ocorrências de falta de articulação interse-torial, como a construção de barragens em cursos de água navegáveis sem a correspondente implantação de estruturas de transposição dos desníveis.

    A implantação de obras se faz lentamente e concen-trada em algumas hidrovias, como é o caso da Tietê-Pa-raná, iniciada nos anos 1970 e concluída somente no final dos anos 1990, e da Taquari-Jacuí, no Rio Grande do Sul; esta hidrovia respondeu, na década passada, por grande parte do volume de cargas transportadas em todo o sistema de hidrovias interiores do país.

    Gestão por Bacias HidrográficasAo longo do século XX, a administração federal

    brasileira experimenta vários modelos de gestão de re-

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    GEO Brasil | Recursos Hídricos | Componente da série de relatórios sobre o estado e perspectivas do meio ambiente no Brasil

    cursos hídricos, entre opções centralizadoras ou des-centralizadas, estatizantes ou liberais, nacionalistas ou abertas aos investimentos estrangeiros, segundo o contexto político de cada época. Nestes movimentos fica claro a necessidade de articulação institucional, intersetorial e nas três instâncias federativas – União, Estados e Municípios -, como resposta às restrições institucionais e legais, bem como de financiamento, para o setor de recursos hídricos.

    Em 1978 surge a primeira experiência de supe-ração do tradicional enfoque setorial, focada no uso das bacias hidrográficas como unidade de gestão: a criação do Comitê Executivo de Estudos Integrados de Bacias Hidrográficas (CEEIBH), constituído conjunta-mente pelos Ministérios de Minas e Energia e do Inte-rior. Mais de dez comitês de rios federais são criados, responsáveis pela “classificação dos cursos de água da União, o estudo integrado e o acompanhamento da utilização racional dos recursos hídricos das ba-cias hidrográficas dos rios federais, o aproveitamento múltiplo dos cursos de água e a mitigação de conse-qüências nocivas à ecologia da região”.

    Apesar da proposta inovadora, esses comitês ti-nham participação exclusiva de técnicos do Estado, praticamente sem inserção de Municípios e da socie-dade civil organizada. Enfrentaram ainda a falta de embasamento legal e de recursos financeiros, que le-varam à sua posterior paralisação, permanecendo em funcionamento apenas o Comitê do rio São Francisco (CEEIVASF). Mas a iniciativa tem o mérito de mostrar a consistência do conceito de bacia hidrográfica como unidade de planejamento e gestão, o que viria a ser retomado em modelos posteriores.

    Sob a mesma perspectiva de abordagem territorial é estruturada no País, nos anos 1980, a área de meio ambiente, com enfoque de proteção e disciplina-mento das atividades produtivas com impacto sobre os recursos naturais. Em 1981 é aprovada a Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938), que cria o Sistema Nacional de Meio Ambiente (SISNAMA) e lança as bases para a busca do desenvolvimento sus-tentável; a Política institui instrumentos como o Estu-do de Impacto Ambiental (EIA) e respectivo Relatório de Impacto Ambiental (RIMA).

    A nova legislação também cria, no âmbito fede-ral e dos Estados, órgãos e instituições dedicadas à gestão do meio ambiente, responsáveis pelo licen-ciamento e fiscalização de atividades produtivas

    potencialmente poluidoras, além de áreas de espe-cial interesse ambiental. Os instrumentos adotados pelo setor ambiental têm a natureza de “Comando e Controle” e são baseados na capacidade do Esta-do de definir limites de emissão e fiscalizar o seu cumprimento.

    Nesse contexto, o uso dos recursos hídricos pas-sa a ser submetido a controles crescentes: em 1986, por exemplo, o Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA) adota a exigência de estudos de impacto ambiental para novas hidrelétricas, além de estabe-lecer uma minuciosa classificação das águas doces, salinas e salobras do País e definir limites para subs-tâncias nos corpos de água, determinando critérios de qualidade para o recurso