Gestão, Saúde e Sociedade--módulo 6

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MATERIAL DIDÁTICO GESTÃO, SAÚDE E SOCIEDADE UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES CREDENCIADA JUNTO AO MEC PELA PORTARIA Nº 1.282 DO DIA 26/10/2010 Impressão e Editoração 0800 283 8380 www.ucamprominas.com.br

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MATERIAL DIDÁTICO

GESTÃO, SAÚDE E SOCIEDADE

U N I V E R S I DA D E

CANDIDO MENDES

CREDENCIADA JUNTO AO MEC PELA PORTARIA Nº 1.282 DO DIA 26/10/2010

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SUMÁRIO

UNIDADE 1 - A SAÚDE ENQUANTO ASPECTO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL ....................... 3

UNIDADE 2 - A SAÚDE NO CENÁRIO GLOBALIZADO: TRANSFORMAÇÕES ECONÔMICAS E

OS ORGANISMOS INTERNACIONAIS ............................................................................................... 11

UNIDADE 3 - O SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE NO CONTEXTO ATUAL: AVANÇOS E PERCALÇOS

............................................................................................................................................................... 22

UNIDADE 4 - GESTÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS E PARTICIPAÇÃO SOCIAL: PREVENÇÃO E

DESENVOLVIMENTO DE AÇÕES LOCAIS ........................................................................................ 41

UNIDADE 5 - CAPITALISMO E SAÚDE PRIVADA: AS AÇÕES EM SAÚDE NO SISTEMA

PRODUTIVO ......................................................................................................................................... 57

REFERÊNCIAS ..................................................................................................................................... 70

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UNIDADE 1 - A SAÚDE ENQUANTO ASPECTO DO

DESENVOLVIMENTO SOCIAL

O entendimento das Políticas de Saúde implementadas pelo Governo em

resposta às demandas da sociedade, pressupõe uma cuidadosa reflexão sobre o

caráter social do processo saúde e doença e do conceito desse binômio. Essa

reflexão é importante porque, se a relação entre saúde e doença for apontada

apenas sobre o ponto de vista biológico causal e não de uma maneira sistêmica, que

considere a relação dos processos de saúde/doença com o contexto no qual se

inserem, teremos uma visão parcial e, portanto, limitada do fenômeno. Em

consequência, não se poderá abranger todos os fatores explicativos para as

condições que determinam as formas individuais e coletivas de adoecer e morrer.

Tais condições são criadas e transformadas no espaço social, gerando tanto os

meios de vida quanto as demandas por ações de saúde. Fatores como as condições

de saneamento básico e higiene são os aspectos mais evidentes dessa relação,

assim como os fatores relacionados as condições de emprego, renda, segurança

urbana, nível educacional e acesso à informação, também exercem grande

influência sobre as condições de saúde e os processos de doença de uma

população. Dessa maneira, as reflexões e linhas de ação implementadas, tanto no

contexto amplo da gestão em saúde representado pelos organismos internacionais e

pelas ações de governo, quanto no âmbito das organizações e redes de saúde

privadas devem considerar sua inserção num determinado meio social.

Tradicionalmente, a conceituação da doença tem tido como base uma

referência biológica individual. Essa acepção está apoiada sobre um modelo

científico que procura isolar um aspecto estudado de seu objeto, investigando

relações de causa e efeito. Tal perspectiva gera um modelo médico-clínico e um

discurso sobre a saúde pública, predominante até os dias atuais, que opera com

base em dados estatísticos, cuja análise desconsidera a história do indivíduo e da

sociedade a que este pertence. Assim, tal modelo torna-se insuficiente para explicar

os perfis epidemiológicos de diferentes países e classes sociais. No caso brasileiro,

por exemplo, os dados estatísticos sobre a saúde pública não se mostram

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explicativos por si mesmos, mas se articulam profundamente com o quadro de

desigualdade social presente em nosso país.

Além disso, ao se considerar apenas dados estatísticos e reduzir o fenômeno

da doença a uma relação causal determinada biologicamente, desconsiderando a

história do indivíduo e seu meio social, corre-se o risco de imputar unicamente ao

indivíduo a responsabilidade por problemas de saúde, cuja ocorrência muitas vezes

opera com grande influência das condições sociais, culturais, econômicas e

ecológicas de vida. Contrariamente, os processos de saúde e doença contemplados,

a partir do contexto social em que se inserem, levam em conta que a sociedade

comporta diversos aspectos em interação e, desse modo, uma perturbação por

vezes considerada pequena pode gerar graves efeitos. Isso ocorreu, por exemplo,

com a situação do mercado imobiliário americano, de caráter local, que acabou por

gerar uma crise econômica mundial de grandes proporções a partir de 2008.

Neste caso, tal como em outros fenômenos sociais, o modelo matemático,

embora legítimo, pode não ser suficiente para analisar de maneira profunda os

conflitos e correlações, enfim, a dinâmica de um sistema. Nesse sentido, é preciso

considerar não apenas o conhecimento científico tradicional sobre um tema, mas as

realidades, forças, relações, tensões e direcionamentos dos grupos sociais

envolvidos no desenrolar de um dado fenômeno social. A resolução de problemas e

tomada de decisões, nesta perspectiva, considera componentes desses dois

aspectos distintos, além dos interesses comerciais ou corporativos que muitas vezes

interferem nos resultados das decisões ou os avaliam, buscando construir uma

análise mais ampla dos problemas.

No campo da saúde, podemos encontrar um exemplo na situação da

tuberculose. Como aponta Vendramini:

A análise da situação da tuberculose em nível mundial revela que a doença está ligada à pobreza, à má distribuição de renda e à urbanização acelerada e necessita de medidas urgentes de controle. A epidemia da síndrome da imunodeficiência adquirida e a emergência de focos de tuberculose multirresistente têm mobilizado o mundo para a questão da tuberculose e alertado as autoridades de saúde para a necessidade de revitalização de seu controle, com o emprego de medidas enérgicas, eficazes e suficientes.(VENDRAMINI, 2005, p.238)

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Por meio desse exemplo, é possível observar como fatores, como acesso ao

sistema de saúde, grau de informação, compreensão do problema e adesão ao

tratamento, influenciam as condições de saúde. Por sua vez, as relações de uma

população com as ações de saúde está vinculada com as condições

socioeconômicas de vida, tais como ocupação e nível de escolaridade. No entanto,

segundo Vendramini (2005), os índices de avaliação de condições de vida podem

variar entre si conforme os fatores que consideram, gerando quadros, até certo

ponto, diversos sobre as reais condições de vida da população e certos instrumentos

podem ser construídos de modo a se observar taxas maiores de desenvolvimento

nos níveis socioeconômicos mais baixos em comparação com outros índices.

No que concerne à saúde no Brasil, um exemplo da necessidade de

correlação de dados epidemiológicos aos contextos sociais, nos quais ocorrem,

pode ser encontrado no perfil epidemiológico brasileiro, em que doenças

relacionadas à pobreza convivem com aquelas típicas das sociedades

industrializadas e desenvolvidas. Entre as primeiras, pode-se citar as chamadas

doenças tropicais, associadas às condições de higiene, infraestrutura e controle

ambiental, tais como esquistossomose, malária, dengue, doença de Chagas, febre

amarela, verminoses, bem como aquelas cujo controle é relacionado à

implementação de políticas sociais e de saúde pública (campanhas informativas e

de vacinação, por exemplo), como sarampo e hanseníase. Todas essas doenças,

bem como a fome/desnutrição e as doenças delas decorrentes, dependem de ações

em políticas públicas, voltadas à melhoria do contexto social e da qualidade de vida

da população para que sua frequencia endêmica seja diminuída ou erradicada. Entre

as doenças relacionadas ao desenvolvimento econômico, encontram-se aquelas de

forte influência cultural do capitalismo tardio, como obesidade, AIDS, doenças

profissionais, psicoses, neuroses, acidentes de trânsito, doenças cardiovasculares,

ou problemas de saúde decorrentes da violência urbana.

Esse perfil epidemiológico diversificado, ao mesmo tempo em que revela as

condições de desigualdade presentes no contexto social, demonstra a grande

influência de fatores econômicos, ecológicos, culturais, educacionais, de hábitos

sociais, de distribuição de renda, entre outros, construindo uma rede complexa de

interações. Um exemplo dessa mútua influência pode ser encontrado em estudos

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sobre a vulnerabilidade (risco de infecção) ao HIV. Além da vulnerabilidade

biológica, há uma importante realidade epidemiológica relacionada às

ações/comportamentos adotados pelos indivíduos que possuem caráter

determinante do risco de infecção pelo HIV. Tais comportamentos estão

fundamentalmente inseridos numa rede social: neste contexto, exercem grande

influência fatores como o acesso às informações sobre a contaminação, a

percepção do risco por parte do indivíduo, a acessibilidade do indivíduo a serviços,

suprimentos e equipamentos necessários à prevenção e controle do risco (tais como

exames, preservativos, seringas, etc.), e a segurança social do indivíduo nas

diferentes situações de risco para assumir comportamentos seguros. Assim,

cenários sociais relacionados ao sentimento individual de degradação (como a

ausência de moradia), à humilhação social (como a prostituição) ou à dificuldade de

percepção de risco (como no uso de drogas) podem dificultar para o indivíduo a

assunção de comportamentos seguros.

Neste contexto, pode-se ainda articular a ocorrência de muitas demandas em

saúde mental na infância e na adolescência à convivência em ambientes

extremamente inóspitos (favelas, cortiços, rua, etc.), dificuldades econômicas

(desemprego, falta de dinheiro para medicação regular), alcoolismo, drogadicção e

problemas e sofrimentos relativos aos demais membros da família, ausência de

perspectiva de vida, de infraestrutura de lazer e de acesso a atividades

profissionalizantes ou de reabilitação, atendimento médico, social e psicológico nos

ambulatórios, Hospitais e Centros de Convivência que contemplem as necessidades

dessa população. Assim, a ação terapêutica deve também voltar-se para a

assistência no tocante aos direitos constitucionais, aos serviços públicos de

promoção do bem-estar da população, e aos momentos nos quais se deflagra a

necessidade de seguridade social, tais como falecimento, adoecimento, etc. Além

disso, é preciso atentar para a educação em saúde, considerando que são

frequentes, no atendimento, situações de desinformação e dificuldades referentes ao

acesso a direitos e recursos públicos.

As aparentes contradições nos quadros expostos – a combinação de doenças

do atraso e do desenvolvimento no perfil epidemiológico brasileiro, o panorama de

infecção pelo HIV e o cenário da saúde mental na infância – podem ser analisadas

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de modo mais amplo e aprofundado por meio do entendimento dos processos de

saúde e doença como historicamente determinados. Pires e Demo (2006) ilustram a

vinculação dessas condições à concepção adotada sobre as políticas sociais.

Ressaltando a relação entre essas políticas e a dinâmica econômica, os autores

afirmam que:

as contradições inerentes ao conflito entre capital e trabalho, as múltiplas correlações de forças e as determinações estruturais que permeiam a luta política constituem elementos centrais para a análise das políticas sociais. Este é um campo onde se torna necessário considerar a conjuntura em que são produzidas as relações sociais produtivas, tendo em vista sua intrínseca dinamicidade. Longe do extremismo recorrente em considerar as políticas sociais como expedientes da acumulação capitalista, ou como direito redistributivo conquistado pelos trabalhadores, cabe reafirmar que é na totalidade desses processos que as realidades sociais e econômicas se fundem. As políticas sociais sintetizam a contradição entre modo e relações de produção nas sociedades capitalistas, conformando-se historicamente a partir das correlações de forças estabelecidas na arena política.

Considerando as ações em saúde, enquanto políticas sociais, podemos

inseri-las no contexto do processo político pelo qual tais programas e ações são

produzidos. Assim, o panorama social não apenas influi nos processos de

saúde/doença, mas também na formulação de ações promotoras de saúde na forma

de políticas sociais. Desse modo, a vulnerabilidade em saúde se relaciona, em

geral, à própria vulnerabilidade social de indivíduos, grupos sociais e países. Como

apontam Palma e Matos (2001, p. 577):

uma rede de interações entre pobreza, saúde e educação se inter-relacionam de tal modo que os baixos salários, a má educação, a dieta pobre, a habitação e as condições de higiene insalubres e o vestuário inadequado se influenciam mutuamente.

As ideias de vulnerabilidade em saúde e vulnerabilidade social se encontram,

desse modo, relacionadas à noção de “exclusão social”. Embora essa noção esteja

fortemente vinculada à ideia de exclusão econômica e pobreza, e as condições

econômicas sejam um fator de grande influência no fenômeno da exclusão social,

destaca-se o aspecto político e social do problema, marcado pela perda do senso de

pertencimento e das condições mínimas de cidadania, que possibilitam até mesmo

reivindicar melhores condições de vida. Arendt (1998) denomina essa perda das

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condições de cidadania como perda do “direito a ter direitos”, denotando a

incapacidade do indivíduo para reagir em tais condições, demonstrando que a perda

de legitimidade política e social ocorre nesse processo. Essa perda de legitimidade

pode ocorrer tanto pela exclusão à cidadania (no caso, por exemplo, de refugiados

que assumem a condição de expatriados, fato comum no Oriente Médio nas últimas

décadas), quanto pela degradação da imagem e do espaço social de determinados

grupos (como ocorre, por exemplo, na criminalização de certos movimentos sociais

que, ao serem considerados ilegítimos, perdem o direito de reivindicar), além de

outros meios de deslegitimação de grupos sociais. Assim, como apontam Palma e

Mattos (2001, p.574) “O cerne da questão passa pela precariedade da cidadania (...)

os ‘excluídos’ são tratados como estranhos, aos quais foram negados os recursos

de contrução da identidade e, por conseguinte, os instrumentos da cidadania”.

Abordando a relação entre cidadania e exclusão no contexto contemporâneo,

Bauman (2001) aborda as transformações estruturais do capitalismo tardio ou

capitalismo financeiro, comparando-as com o capitalismo industrial anterior à década

de 80. Enquanto a preocupação desse período era com o desemprego, que

denotava, portanto, uma situação transitória, a crescente preocupação com os

excluídos já desvela uma dificuldade estrutural do sistema capitalista atual em

abranger todos os grupos sociais na condição de cidadania.

Dessa maneira, as alterações ocorridas na economia internacional nas

últimas décadas, que aumentaram os índices de desemprego estrutural, estão

fortemente associadas aos atuais processos de exclusão social. Parece haver certo

consenso na literatura que o Estado de bem-estar social instalou-se nos países de

capitalismo central após a Segunda Guerra Mundial. O Estado de bem-estar não se

tratava de assistência individual, mas de direitos de cidadania que constituíam uma

forma de “seguro coletivo”, que se articulava ao poder econômico do chamado

“capitalismo fordista”, baseado na produção industrial em fábricas e empresas

associadas a determinados territórios.

A partir, principalmente, da década de 80, uma nova organização do

capitalismo, que pode ser denominada, conforme Harvey (1992), de “acumulação

flexível” ou, segundo Bauman (2001), “modernidade líquida”, passa a se organizar a

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partir de uma diretriz neoliberal, que considera o Estado e suas intervenções como

obstáculo à economia e ao desenvolvimento social. Para os autores, citados

anteriormente, essa nova organização do capitalismo reestrutura os processos de

produção, de informação e de consumo e cria novos setores e serviços financeiros,

tornando o jogo econômico cada vez mais rápido, intensificando a inovação

tecnológica e desestabilizando os antigos regimes e contratos de trabalho que se

tornam mais instáveis, trazendo menos garantias aos cidadãos quanto a seu futuro.

É no contexto dessas transformações, no regime de acumulação capitalista,

que se insere o processo de globalização, marcado pela desregulação dos

mercados financeiros, pelo aumento do fluxo de comércio internacional, pela

diminuição do poder do Estado e das barreiras protecionistas, pelo deslocamento da

produção, pelas empresas transnacionais para locais onde haja maiores vantagens

comparativas e por rápidas transformações nos valores socioculturais.

De acordo com Bauman (2001) e Dupas (1999), o processo de globalização

vem sendo apontado como importante condutor da maior vulnerabilidade dos grupos

desprivilegiados, pois funciona como agente de concentração do poder econômico.

Além disso, é um agente de influência para o descomprometimento do Estado com o

bem-estar social, já que reorienta a função do Estado para a regulamentação do

mercado e diminui seu poder de ação em nível local, visto que, os Estados muitas

vezes fazem concessões em relação aos aspectos sociais para conservar as

unidades de empresas transnacionais em seus territórios.

Diante disso, as situações de exclusão e vulnerabilidade estão articuladas à

dependência crescente dos indivíduos em relação ao poder econômico, com poucas

garantias em relação à estabilidade futura. Tais situações não podem ser

solucionadas apenas pelo fornecimento de meios econômicos ou de implementação

de políticas de “tolerância” que permitem o convívio temporário, mas não legitimam

as reivindicações, necessidades e posições dos grupos excluídos no espaço social.

Como afirmam Palma e Mattos (2001), “Tolerar significa expressar que o outro está

em desacordo, equivocado, mas permite aceitá-lo por um determinado tempo”.

Destarte, a intervenção nas atuais situações de exclusão deve considerá-las a

partir do processo social no qual foi gerada, permitindo a conscientização, pelos

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grupos excluídos, de que sua situação foi gerada num processo de injustiça social.

Desse modo, a diminuição da vulnerabilidade e a possibilidade de emancipação dos

excluídos não passa apenas pelo caminho da política e da economia, mas está

inserida no jogo de tensões, alianças e articulações entre grupos sociais, perfazendo

um caminho que é também individual, social e cultural. A vulnerabilidade se

relaciona, nesse contexto, tanto com as chances de ocorrência de um evento,

quanto inversamente, com a capacidade de informação, comunicação e reação de

um grupo social.

A partir dessa nova perspectiva, o papel da saúde pública e dos profissionais

de saúde também necessita ser ampliado, abrangendo as funções histórico-políticas

de resgatar os processos de construção social da saúde, de promover a educação

em saúde pela produção e transmissão de conhecimento científico-tecnológico e

ainda de favorecer as ações de luta pela cidadania entre os grupos sociais em que

atuam. A utilização do conhecimento como instrumento de denúncia articula a

promoção da saúde ao exercício da cidadania, promovendo a mobilização social

para a transformação das condições de vida em direção à saúde. Assim, a

incorporação da sociedade na pauta das discussões sobre saúde pública, a

implementação de políticas de equidade e a superação do discurso exclusivamente

biológico em favor de uma compreensão biopsicossocial dos processos de saúde e

doença configuram os aspectos de destaque para a gestão em saúde.

Por outro lado, as ideias de saúde e doença também devem ser consideradas

a partir do processo histórico, social e cultural no qual estão inseridas. Nesse

sentido, as representações sociais e percepções sobre saúde e doença se

transformam de acordo com o contexto histórico e social, estando vinculadas aos

valores, aos diferentes grupos sociais, às ideias dominantes e ao modo de

organização de uma sociedade em uma determinada época. No panorama atual, as

transformações ocorridas com a globalização geraram, na esfera internacional, uma

série de mudanças nas organizações e agências internacionais de saúde.

Considerar esse pano de fundo é fundamental para uma análise abrangente do

contexto da saúde no Brasil.

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UNIDADE 2 - A SAÚDE NO CENÁRIO GLOBALIZADO:

TRANSFORMAÇÕES ECONÔMICAS E OS ORGANISMOS

INTERNACIONAIS

A partir da compreensão da relação entre saúde e sociedade, têm sido

desenvolvidas as linhas estratégicas de ação de saúde, desde a formulação do

Estado de bem-estar social, na Europa no período do pós-guerra, até o

estabelecimento de parâmetros internacionais de saúde em nossos dias. A

reorganização econômica, no setor da saúde, foi ainda influenciada por três fatores

estruturais. Em primeiro lugar, as mudanças demográficas demonstravam um

envelhecimento da população e perspectiva de diminuição da população

economicamente ativa, demandando o aumento da utilização dos serviços de saúde

e do seguro social. Nesse aspecto, mesmo nos países como o Brasil, em que a

população passa a se inserir na faixa adulta, e não idosa, ocorre um aumento de

gastos médicos, já que o aumento do desemprego e subemprego e das condições

de trabalho insalubres impostas pela flexibilidade e instabilidade das vagas

oferecidas com a reestruturação capitalista tendem a piorar a saúde física e mental

da população.

Em segundo lugar, os ajustes financeiros macroeconômicos gerados pela

fase pós-industrial do capitalismo vêm determinando cortes no financiamento e a

redução da capacidade de intervenção estatal, diminuindo a oferta de condições de

vida para a população, principalmente em países do capitalismo periférico, de

acordo com Silva:

submetidas a um passado inflacionário desastroso que, a despeito de terem obtido condições de estabilidade da moeda, o fizeram através de estratégias macroeconômicas antagônicas à viabilização de etapas posteriores de desenvolvimento econômico sustentado, dificultando as condições de ajuste do setor público e com custos sociais elevados. (SILVA, 2003)

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Finalmente, o desenvolvimento de novas tecnologias para a saúde tem

disponibilizados novos cuidados na área, porém tem também aumentado

significativamente seu custo.

As transformações decorrentes dessa nova ordem econômico-social podem

ser observadas nas diretrizes de ação da Organização Mundial de Saúde (OMS), em

que se observa um processo de “globalização da saúde pública”, no qual as ações

em saúde também passam por transformações oriundas do processo de

globalização. Ao analisar os termos “saúde internacional”, utilizado

preferencialmente pela OMS, até meados da década de 80, e “saúde global”, que

vem ganhando espaço crescente desde os anos 90, Brown, Cueto e Fee (2006,

p.624) afirmam que:

Saúde 'internacional' era um termo usado com considerável frequência já no final do século XIX e no início do século XX, e referia-se especialmente a um foco no controle de epidemias ultrapassando fronteiras entre nações, ou seja, 'internacionalmente'. 'Intergovernamental' se refere às relações entre governos de nações soberanas, neste caso, com relação às políticas e práticas de saúde pública. Saúde 'global', em geral, indica a consideração das necessidades de saúde da população de todo o planeta, acima dos interesses de nações em particular. O termo 'global' também é associado à crescente importância de atores para além de agências e organizações governamentais e intergovernamentais – por exemplo, a mídia, fundações influentes internacionalmente, corporações transnacionais.

Desse modo, pode-se perceber uma reformulação do conceito de saúde e do

próprio papel da Organização Mundial de Saúde por meio de uma redefinição da

inserção da saúde frente a um novo contexto social, no qual o Estado deixa de ser o

agente hegemônico do controle e cuidado social dos processos de saúde e passa a

sofrer maior influência de instituições e organizações transnacionais, como

organismos de mídia, empresas multinacionais de medicamentos, rápida divulgação

de descobertas científicas, entre outros, além de haver maior interdependência em

relação a outros países, por exemplo, com a disseminação mundial facilitada de

doenças infecciosas.

Considerando a saúde como “responsabilidade compartilhada que pressupõe

um acesso equitativo aos cuidados essenciais e a defesa coletiva contra as

ameaças transnacionais”, a Organização Mundial de Saúde estabelece um

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programa que considera o desenvolvimento, a infraestrutura – por meio da

segurança sanitária – e a informação como pontos essenciais para a promoção da

saúde nos diferentes contextos sociais. Tal abordagem expressa a relação entre

saúde, dinâmica econômica e desenvolvimento social em um contexto capitalista,

como é o caso de nossa sociedade. Ao considerar o desenvolvimento econômico

como força motriz das ações sociais, inclusive das ações em saúde, esta diretriz

privilegia a ação e a organização econômica, procurando se alinhar às

transformações estruturais de diretriz neoliberal que ocorreram no sistema social,

principalmente, a partir de meados da década de 80. Tais transformações

assinalaram um papel cada vez maior do Banco Mundial para o financiamento de

Ações Internacionais em Saúde, o que significou uma dispersão dos recursos em

áreas de interesse dos grupos financiadores (países doadores de recursos,

empresas multinacionais em saúde, entre outros) em detrimento de áreas de

interesse social ou áreas mais necessitadas.

Compreender a conjuntura dos processos de gestão ocorridos no interior da

Organização Mundial de Saúde, é importante para aprofundar o entendimento da

gestão em saúde brasileira, já que esse panorama nos oferece tanto as diretrizes de

influência sobre o cenário brasileiro quanto o pano de fundo socioeconômico sobre o

qual as ações em saúde foram forjadas, tanto em nível local quanto em nível global.

Nesse contexto, é importante ressaltar que o processo de globalização, já analisado

anteriormente, representou também um realinhamento das agendas de ação dos

estados em nível global. Desse modo, as ações dos Estados seguem cada vez mais

uma mesma diretriz, marcada pelo capital internacional, de privatização de todos os

serviços, no qual o Estado não garante direitos essenciais à população, mas apenas

regula relações privadas de interesse econômico. As transformações na agenda dos

organismos internacionais, notadamente, da Organização Mundial de saúde, nos

servirá como parâmetro para a compreensão dessas mudanças globais.

Nesse resgate histórico, observa-se que, segundo Bhagwait (1977) e

Rothstein (1979), durante as décadas de 1960 e 1970, as ações da OMS foram

bastante influenciadas por um contexto político, no qual as nações africanas recém-

descolonizadas, a disseminação de movimentos nacionalistas e socialistas e as

teorias de desenvolvimento pressionavam por um direcionamento das intervenções

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voltado à equidade social, enfatizando o crescimento socioeconômico integral de

longo prazo em detrimento da intervenção tecnológica de curto prazo. Essas

pressões ocorreram por meio de organizações, tais como o Movimento dos Países

Não-Alinhados e a Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o

Desenvolvimento – Unctad, e mobilizavam-se para a adoção de condições mais

justas no comércio e por financiamentos mais generosos para o desenvolvimento.

Conforme relatam Brown, Cueto e Fee (2006, p. 628):

(...) Esse contexto político em transformação refletiu-se em mudanças correspondentes no interior da OMS. Nos anos 60, a OMS reconheceu que a criação e a melhoria na infra-estrutura de saúde, especialmente no campo, era pré-requisito para o sucesso dos programas de controle da malária, especialmente na África.

Essa visão da saúde voltada a uma atenção integral e articulada às condições

de desenvolvimento social, em geral, perdurou até o final da década de 70,

estabelecendo alguns dos parâmetros relativos à articulação saúde-sociedade,

como o conceito de atenção primária em saúde, que buscava privilegiar a

prevenção, a educação, e o favorecimento de condições mínimas de higiene,

infraestrutura e desenvolvimento social, como formas de promoção de saúde, bem

como as noções de desenvolvimento intersetorial e “tecnologia apropriada” que

buscavam articular uma abordagem transdisciplinar voltada para a universalização

das ações em saúde. Conforme Brown, Cueto e Fee (2006, p.629):

A "Declaração de Atenção Primária à Saúde" e a meta "Saúde para todos no ano 2000" defendiam uma abordagem "intersetorial" e multidimensional para a saúde e o desenvolvimento socioeconômico, enfatizavam o uso de "tecnologia apropriada", quer dizer, não custosa e adaptada ao meio social onde seria implementada, e instavam pela ativa participação comunitária no

atendimento à saúde e na educação de saúde em todos os níveis.

De acordo com o World Bank (1987), é a partir da década de 1980, que a

crescente influência do Banco Mundial passa a interferir nas diretrizes e ações da

OMS. Essa instituição criada, em 1946, para apoiar a reconstrução da Europa,

posteriormente, expandiu seu mandato para oferecer empréstimos, subvenções e

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assistência técnica a países em desenvolvimento. O Banco favorecia mercados

livres e minimizava o papel dos governos nacionais. Tal abordagem do Banco

mundial, alinhada com uma concepção neoliberal de desenvolvimento, que

desprivilegiava a equidade social, passou a direcionar diversas ações no âmbito da

saúde internacional, baseadas em empréstimos oferecidos de forma direta aos

países e instituições. Assim, o Banco Mundial promovia ações em saúde de modo

disperso e local, desprivilegiando uma visão articulada e integral, voltada à justiça

social e à igualdade de acesso.

Conforme World Bank (1987), na medida em que o Banco Mundial começou a

fazer empréstimos diretos para serviços de saúde, fez também exigências em

relação ao uso eficaz dos recursos disponíveis. Com suas requisições, o Banco

Mundial acabou por levar parâmetros empresariais de funcionamento aos serviços

financiados e levantou a discussão sobre o papel dos setores público e privado no

financiamento do atendimento à saúde. O Banco Mundial buscava, assim, responder

à nova política econômica internacional estruturada em torno de abordagens

neoliberais quanto à economia, comércio e política, o que significava uma maior

abertura ao capital e aos interesses privados, desprivilegiando da ação do Estado na

promoção de direitos básicos de cidadania. Nessa perspectiva, o Banco Mundial

argumentava que os sistemas de saúde existentes, frequentemente, causavam

desperdício de recursos financeiros e humanos, eram ineficientes e ineficazes. Em

nome desta suposta ineficiência do Estado, o Banco defendia uma maior presença

do setor privado na provisão de atenção à saúde, com a redução do envolvimento

público no oferecimento de serviços de saúde, privilegiando assim aqueles que

poderiam pagar pelos serviços prestados.

Com as subvenções do Banco Mundial realizadas diretamente a serviços de

saúde, essa instituição passou a ser um grande ator das ações em saúde no cenário

internacional. Por outro lado, uma mudança estrutural semelhante acabou ocorrendo

na Organização Mundial de Saúde, na década de 80. O orçamento da organização

era composto por dois fundos: o fundo regular – obtido da contribuição dos Estados

membros, baseada em tamanho da população e PIB – e os fundos

extraorçamentários – resultantes de doações de agências multilaterais ou países

'doadores' para programas específicos. Nessa época, o orçamento passou a

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depender cada vez mais do segundo tipo de recursos, que vinha crescendo

significativamente, fragmentando a ação da OMS. Como observam Walt (1993),

Em 1986 e 1987, fundos extra-orçamentários de 437 milhões de dólares quase haviam atingido o montante do orçamento regular, de 543 milhões de dólares. No início da década de 1990, fundos extra-orçamentários haviam ultrapassado em 21 milhões de dólares o orçamento regular, contribuindo assim com 54 por cento do orçamento total da OMS. Imensos problemas surgiram para a Organização em virtude dessa mudança orçamentária. Prioridades e políticas eram pretensamente definidas pela Assembléia Mundial da Saúde, composta por todos os países membros, mas esta, então numericamente dominada por países pobres e em desenvolvimento, tinha autoridade somente sobre o orçamento regular, congelado desde o início dos anos 80. Países doadores ricos e agências multilaterais, como o Banco Mundial, podiam ter amplo controle sobre o uso dos fundos extra-orçamentários com os quais contribuíam. Assim, com efeito, estes últimos criaram vários programas 'verticais' mais ou menos independentes do restante dos programas da OMS e da estrutura de tomada de decisões.

Desse modo, os fundos extra-orçamentários, embora ampliassem o

orçamento da OMS, não permitiam uma ação coordenada e conjunta, provocando

uma submissão dos projetos da organização Mundial de Saúde a organismos e

países que possuíam seus próprios interesses. Como analisou Walt (1993, p. 129)

sobre esses fundos: "eles aumentam as dificuldades de coordenação e

continuidade, causam imprevisibilidade financeira, e uma grande dependência da

satisfação de doadores específicos".

Nesse contexto, segundo Stenson & Sterky (1994, p. 242), a OMS começou a

remodelar-se na coordenação, no planejamento estratégico e na liderança de

iniciativas de 'saúde global'. No início de 1992, a Assembléia Mundial da Saúde

decidiu nomear um "grupo de trabalho" com o objetivo de sugerir estratégias para

que a OMS fosse mais eficaz no trabalho de saúde internacional à luz da "mudança

global" que rapidamente tomava conta do mundo. O relatório foi finalizado em 1993,

e recomendou algumas estratégias centrais: 1) que a OMS reformulasse sua gestão

dos programas global, regional e por país, fragmentária até então; 2) que a

Organização diminuísse a competição entre programas do orçamento regular e

extra-orçamentários; 3) principalmente, que a OMS, aumentasse a ênfase nos temas

de saúde global e no papel da OMS de coordenador nesse âmbito.

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No período anterior à confecção do relatório de 1993, havia poucas

utilizações da expressão 'saúde global'. Ainda assim, essa expressão ocorria mais

em meios exteriores à OMS e se relacionava ao ambiente acadêmico,

principalmente de orientação política esquerdista. Por exemplo, alguns artigos

científicos, do início da década de 90, apresentaram o tema da saúde global. Em

1990, G. A. Gellert abordava em seu artigo a interdependência global em saúde e

Milton e Ruth Roemer apud Brow, Cueto e Fee (2006) defendiam em seu artigo a

expansão de serviços em saúde para a conquista de avanços na “saúde global”.

Além disso, a expressão “saúde global” vinha sendo disseminada pelo movimento

ambientalista, que correlacionava a degradação ambiental mundial e o aquecimento

global a diversos problemas de saúde, como a epidemia pelo vírus Ebola e os casos

de tuberculose ressurgente e resistente aos medicamentos tradicionais,

argumentando sobre a existência de uma ameaça concreta de doença global.

Segundo Brow, Cueto e Fee (2006), a partir desse redirecionamento que

buscava ampliar a influência da OMS e reposicionar seu papel como protagonista

das decisões e do monitoramento de ações no panorama global, houve também a

mudança de gestão da OMS, em 1998, buscando “restaurar a credibilidade da

organização e trazer-lhe uma nova visão”. Nessa gestão, algumas medidas

transformaram profundamente a ação da OMS. Entre elas, figurou a criação da

Comissão sobre Macroeconomia e Saúde, que incluía, de acordo com os mesmos

autores, “ex-ministros de finanças e funcionários do Banco Mundial, Fundo

Monetário Internacional, Organização Mundial do Comércio e Programa das Nações

Unidas para o Desenvolvimento, assim como lideranças da saúde pública”, que

publicou um relatório, argumentando ser essencial a melhoria da saúde para o

crescimento econômico dos países em desenvolvimento e identificando um conjunto

de prioridades relativas a doenças que requeriam intervenção específica. Essa

articulação entre saúde e desenvolvimento econômico marca mudanças na

compreensão das relações entre saúde e contexto social. Se nos anos 60 este

vínculo havia sido abordado com ênfase na igualdade social e garantia coletiva de

condições mínimas de vida, a OMS agora privilegiava cada vez mais o aspecto

econômico da estrutura social, com uma ênfase maior no montante de recursos do

que em sua distribuição. Essa ênfase, que permanece até hoje, tende a diminuir a

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importância dos aspectos políticos para atrelar todas as ações às decisões

econômicas, desprivilegiando os argumentos e prioridades dos países menos

desenvolvidos.

Outra importante mudança de gestão se referiu à organização financeira da

OMS. Por meio do estabelecimento de parcerias em projetos específicos que

reuniam ‘cotistas’ (doadores privados, governos e agências nacionais e

internacionais), a OMS buscou ampliar os fundos com os quais atuava. Se, por um

lado, esta ação representou um aumento substancial do montante financeiro gerido

pela OMS, ela também representou a legitimação de ações fragmentadas e

desvinculadas de um projeto integrado e igualitário de saúde. Em poucos anos,

foram criadas por volta de 70 ‘parcerias de saúde global’ e essa solução foi adotada

amplamente no mundo, inclusive no Brasil. Tais parcerias, segundo Brow, Cueto e

Fee (2006, 629), “eram programas semi-autônomos, aportando fundos externos

substanciais, frequentemente na forma de parcerias público-privadas”. Assim, os

autores complementam que:

(...) os críticos das parcerias público-privadas argumentavam que as colaborações com o setor comercial poderiam subordinar os valores e a missão da OMS, modificar as prioridades organizacionais, recriar programas verticais desarticulados entre si em meio a sistemas de saúde fragmentados e afastar-se da abordagem compreensiva dos serviços de saúde, caminhando para um foco mais restrito em "doenças prioritárias" (...). Outra crítica à proliferação das parcerias público-privadas era que elas tendiam a fragmentar a estrutura financeira e de governança da saúde internacional, criando duplicação em determinadas áreas e nenhuma atenção em outras. (BROW, CUETO e FEE, 2006, p. 630).

No atual programa de ação da Organização Mundial de Saúde, pode-se

observar o direcionamento das políticas a partir desse contexto de transformação

das forças socioeconômicas do cenário internacional. Assim, o programa ressalta a

ação da OMS “em um contexto cada vez mais complexo e em rápida

transformação". Por um lado, a OMS reconhece a organização sistêmica das

questões de saúde, relacionando-as a outros setores da sociedade, que teriam “uma

incidência sobre as possibilidades e os resultados sanitários”. Por outro lado, o

programa em seis pontos formulado pela instituição ressalta a promoção do

desenvolvimento econômico como agente de melhoria da saúde. Segundo a OMS,

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os seis pontos do programa se referem “a dois objetivos sanitários, duas

necessidades estratégicas e duas abordagens operacionais” sendo eles: promover o

desenvolvimento, favorecer a segurança sanitária, reforçar os sistemas de saúde,

explorar a pesquisa, a informação e os dados factuais, reforçar as parcerias e

melhorar o desempenho.

Além da promoção do desenvolvimento figurar como primeiro item do

programa da OMS, tanto a priorização das parcerias com “organizações

internacionais, doadores, a sociedade civil e o setor privado” quanto “o

aprimoramento do desempenho, no qual a OMS prevê seu orçamento e suas

atividades no contexto de uma gestão fundada nos resultados”, demonstram o

direcionamento da organização para uma lógica econômico-empresarial. Assim, a

OMS descreve suas relações com as parcerias através da oferta de ideias, na qual

os dados factuais são utilizados para o apoio dos “parceiros” na elaboração e

execução de projetos no interior dos países, ressaltando o aspecto técnico das

intervenções em detrimento do aspecto político, embora considere também “as

prioridades estabelecidas pelos países”.

Esse destaque ao desenvolvimento econômico, em detrimento das ideias

anteriores de justiça social, está alinhado com as influências do Banco Mundial e

das pressões econômicas sofridas pela agência. Embora a OMS ressalte a

promoção da saúde da mulher e da saúde na África como suas prioridades, os

modos de organização das políticas descrevem uma compreensão da relação entre

saúde e sociedade, na qual preponderam os fatores de ordem econômica, com a

influência cada vez maior do setor privado e dos países de maior poder econômico

no direcionamento das políticas públicas em nível mundial. Por outro lado, a

formulação das políticas centra-se nos dados gerados em pesquisas, a partir das

quais instituições como a OMS e o Banco Mundial realizam prescrições de ordem

generalizante sobre as políticas de saúde em diferentes países, por vezes

desconsiderando os contextos locais e frequentemente condicionando o

financiamento à adoção do modelo prescrito. Nessa conjuntura, é preciso analisar

com Sá (2001) que:

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(...) sem desconhecer a importância do instrumental teórico-metodológico disponível no campo da saúde pública, o que é preciso reconhecer é a insuficiência das propostas prescritivas que costumam ser formuladas com o objetivo de mudar a realidade de nossos serviços de saúde, calcadas exclusivamente na racionalidade técnico-científica da epidemiologia e das teorias sistêmico-estratégicas de planejamento e gestão. Nenhuma dessas abordagens é suficiente, isoladamente, para fazer face, por exemplo, ao cinismo generalizado contido no tratamento do outro como um evento estatístico ou burocrático e no predomínio da racionalidade instrumental na relação entre os sujeitos no interior dos serviços de saúde.

Desse modo, o contexto socioeconômico mais amplo de desregulamentação

do mercado, de privatizações em nível mundial e da absoluta falta de estabilidade

econômica e social decorrentes desses processos, se reflete, na saúde, pelo

direcionamento das ações de agências internacionais como a OMS e o Banco

Mundial para uma lógica do mercado privado em saúde. Essa mesma lógica

influencia as ações públicas dos países, tanto pelos processos sociais de

enfraquecimento da dimensão política e fortalecimento dos grandes agentes

econômicos quanto pela ação dessas próprias agências, que muitas vezes

condicionam empréstimos e programas nos países à adoção de uma política pública

alinhada com o pensamento neoliberal.

No caso do Brasil, esse projeto voltado à privatização da saúde contradiz em

muitos aspectos aos princípios do SUS, estabelecidos na constituição de 1988, com

base em uma ampla discussão da sociedade no contexto do processo de

redemocratização do país. Tais princípios, que se norteiam pela ideia de que a

saúde é “direito de todos e dever do estado”, colocam o Estado, e não agências

privadas ou pequenos núcleos da sociedade civil, como ator central das ações de

saúde, cuja regulamentação caberia à sociedade por meio dos Conselhos de Saúde,

do qual participariam representantes das comunidades locais. Em contrapartida, o

modelo de gestão destacado internacionalmente pela OMS e pelo Banco Mundial

coloca a saúde a cargo da iniciativa privada, delegando ao Estado apenas as áreas

em que os tratamentos não seriam rentáveis. Nesse modelo de gestão, o Estado

assumiria o papel de regulamentação e a sociedade não participaria de forma direta,

mas por meio dos agentes de Estado eleitos (prefeitos, governadores, presidentes,

vereadores, deputados, etc).

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Frente às diferenças entre esses dois modelos, o Estado Brasileiro acaba por

situar-se em uma posição ambígua: por um lado, não pode distanciar-se de um

modelo estabelecido em sua constituição. Por outro lado, não pode ignorar as

pressões e influências do capital internacional e das agências internacionais. Assim,

ao mesmo tempo em que impõe, sobre as organizações públicas, um projeto de

reforma administrativa cujos eixos centrais são a privatização e a modernização

gerencial, o Estado acaba por não garantir as condições suficientes de

financiamento e operação para as suas organizações. Assim, de acordo com Sá:

(...) nossas organizações públicas vivem processos de angústia e sofrimento derivados da alta incerteza quanto às suas possibilidades de sobrevivência. Ao lado de questões de ordem política e social mais ampla - como a inegável contradição entre os princípios da reforma sanitária e o avanço do projeto neoliberal no dia-a-dia das ações governamentais - colocam-se limites de ordem teórico-técnica, como a insuficiência dos conhecimentos acumulados sobre o planejamento e a gestão em saúde para dar conta das múltiplas dimensões e contradições determinantes da atual situação dos serviços de saúde no país. (SÁ, 2001, p.)

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UNIDADE 3 - O SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE NO CONTEXTO

ATUAL: AVANÇOS E PERCALÇOS

Como abordado anteriormente, a partir do final da Segunda Guerra Mundial,

as políticas sociais foram tomadas como síntese do conflito entre capital e trabalho

nos países centrais, em especial na Europa, e se operacionalizam a partir das ideias

e práticas do capitalismo monopolista de Estado. Como apontam Pires & Demo

(2006), isso significava a adoção das chamadas políticas keynesianas, que se

pautavam pela intervenção do Estado na produção e reprodução das relações

sociais capitalistas em prol da cidadania, ou seja, o controle e regulação da

economia, das leis trabalhistas, das garantias sociais de direitos e a ação estatal

dominante nas áreas sociais, tais como saúde, educação, habitação, previdência,

etc. Essas ações promoveram a implantação do Estado de Bem-Estar Social, que se

estendeu até a década de 70.

De acordo com Behring (2002), fatores como a crise do petróleo, a

reestruturação e maquinização da produção de modo a diminuir a necessidade de

trabalhadores, a transnacionalização dos mercados e desregulamentação das

garantias sociais esgotaram o Estado de Bem-Estar Social e conduziram à fase

atual do capitalismo, denominado avançado, financeiro ou tardio. Assim, segundo

Pires e Demo (2006), “para entender a discussão sobre crise do Estado de Bem-

Estar, cabe um aprofundamento sobre a conformação das políticas sociais no

estado capitalista, tendo como palco privilegiado a arena política do Estado, tensa

em disputas entre o mercado e a sociedade organizada (cidadania)”.

É no contexto de transformações nas relações econômicas, políticas e

institucionais, nacionais e internacionais, ocorridas a partir do final da década de 80,

rumo ao enfraquecimento do Estado de Bem-Estar Social, que devemos situar as

ações do governo brasileiro na gestão das políticas públicas, inclusive no setor de

saúde. Nesse sentido, a compreensão dos temas que dizem respeito aos problemas

e desafios atuais do SUS e aos avanços conceituais e metodológicos na área passa

pelo conhecimento histórico-social da formulação das políticas de saúde brasileiras

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e da constituição do SUS. No que se refere a esse tema, cabe ressaltar que, apesar

dos esforços galgados no sentido da democratização da saúde, o Estado Brasileiro

tem privilegiado intervenções marcadas pela o modelo médico-clínico com medidas

puramente assistenciais, mostrando um direcionamento político atrelado à

compreensão do processo saúde-doença como determinado hegemonicamente por

aspectos biológicos que devem ser abordados sob uma ótica curativa.

Tal acepção, que desprivilegia a prevenção e desconsidera a importância de

fatores do desenvolvimento social (tais como habitação, educação e saneamento),

tem estado presente como política de saúde desde a criação das caixas de

Aposentadorias e Pensão, em 1923, mantidas por empresas a seus funcionários,

passando pela criação dos I.A.P.S. (Institutos de Aposentadorias de Pensão), na

década de 30, até constituição do M.P.A.S. ,em 1974, e a unificação dos serviços de

seguridade social através do INPS (Instituto Nacional da Previdência social), em

1967. Na década de 70, essa tendência se intensificou e se agregaram a ela

diretrizes de articulação das ações públicas com o setor privado, que se evidenciam

pelas novas características no perfil das Políticas de Saúde dominantes até os anos

80. Nesse período, a criação do INAMPS (Instituto Nacional de Assistência Médica

da Previdência Social), em 1978, privilegiou políticas como a compra de serviços e a

reserva de ações não lucrativas ao setor público, como as de cunho preventivo,

concorreram para uma organização dos serviços que fortaleceu o setor privado.

O INAMPS era marcado pela centralização das ações na esfera federal, que

privilegiava ações hospitalares em detrimento de ações integradas, inseridas no

contexto social e que considerassem aspectos como a prevenção, educação e

promoção da saúde. A organização do sistema de saúde era fragmentada, não

havendo integração das intervenções promovidas por federação, estados e

municípios, ou das assistências prestadas pelo governo e por instituições privadas

ou filantrópicas conveniadas ao sistema público, configurando dimensões de

assistência sem comunicação entre si. Não havia mecanismos de controle social e

de participação da população no financiamento, gestão e controle de qualidade do

sistema, tampouco preocupação com a regionalização do sistema e a consideração

das condições locais.

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Além disso, a assistência ocorria de forma desigual, pois o atendimento

prestado pelo INAMPS destinava-se aos trabalhadores com vínculo empregatício

formal, não abrangendo a totalidade da população e os serviços concentravam-se

em certas regiões (grandes cidades, Sul e Sudeste do país), com baixa ou nenhuma

oferta em outras (pequenas e médias cidades, Norte e Nordeste). Por fim, a

assistência ocorria de forma fragmentada entre vários sub-setores e instituições, o

que impedia o funcionamento em rede do sistema, o que impedia um bom

aproveitamento, tanto dos recursos financeiros, quanto das ofertas de assistência do

próprio sistema. Em consequência desse quadro, uma crise generalizada no setor

de saúde caracterizou no final dos anos 70, intensificada pela crise política e

econômica gerada pela ditadura militar (1964-1985). Essa crise, que ocorria tanto no

aspecto financeiro dos altos custos no setor, quanto na falta de eficácia do sistema,

que não contemplava grande parte dos problemas de saúde da população, gerou

iniciativas de reforma no sistema.

Primeiramente, surge a proposta do PIASS (Programa de Interiorização das

Ações de Saúde e Saneamento), a qual formulou como diretrizes a hierarquização,

regionalização, integração dos serviços e participação comunitária. Esse projeto não

avançou, pois, entre outras razões, possuía um caráter verticalizante e abrigava

contradições entre a proposta de regionalização e a persistência da centralização,

além de conceber a participação comunitária como elemento meramente formal.

Porém, no interior do PIASS, e paralelo a este, inicia-se um movimento de oposição

que defende um projeto voltado para a efetiva descentralização dos serviços e a

inclusão dos usuários na definição das políticas, buscando combater a

mercantilização pelo fortalecimento do setor público e por meio de ações vinculadas

às reais necessidades da população. Esse movimento se dissemina na área de

saúde e lança as bases precursoras do SUDS (Sistema Unificado e Descentralizado

de Saúde).

O SUDS não promoveu a efetiva descentralização administrativa para os

municípios e desconsiderou a questão da participação popular, elemento

imprescindível para o sucesso das reformas propostas. Porém, ainda que não

provocasse mudanças radicais de serviços, nem no modelo assistencial, em razão

da conjuntura em que foi constituído e dos entraves políticos, burocráticos e

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financeiros de governo, o SUDS já incorporava o pensamento do Projeto da

Reforma Sanitária, elaborado na VIII Conferência Nacional de Saúde de Brasília, em

1986, que apontava para um Sistema Único de Saúde e foi um importante passo

para a construção do SUS. Isso porque o movimento social gerado na luta pela

Reforma Sanitária influenciou a aprovação do capítulo da saúde na Nova

Constituição, na qual se introduz um conceito ampliado de saúde garantido por

Políticas Sociais e Econômicas e se contemplam os princípios defendidos na VIII

Conferência de Saúde para a construção de um Sistema Único, regionalizado, e

hierarquizado com acesso universal igualitário, organizado de acordo com as

diretrizes de descentralização com direção em cada esfera de governo, atendimento

integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços

assistenciais e participação da comunidade.

Superaram-se, assim, no plano jurídico, os principais entraves ao

enfrentamento dos problemas de saúde de uma forma abrangente, contemplando

ações preventivas, curativas e de promoção de saúde, garantindo a participação de

representantes dos usuários na elaboração das políticas de saúde. Esses pontos

foram detalhados na Lei Orgânica da Saúde 8.080 de 10/9/90 e Lei N° 8.149 de

28/12/90 que dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do SUS. A

participação social ocorreria através das Conferências Nacionais de Saúde, que

congrega os diversos setores (governos, profissionais e sociedade civil) e dos

Conselhos Nacionais de Saúde, instâncias colegiadas que fariam a avaliação da

situação de saúde e a proposição das diretrizes para formulação de políticas de

saúde É neste contexto jurídico-político que acontece a IX Conferência Nacional de

Saúde, no momento em que o processo de municipalização se debate com

inúmeros obstáculos. A questão do financiamento do SUS que exige melhor

definição e direcionamento e a participação popular é dificultada pela crise

econômico-financeira. Essa participação é mais do que nunca necessária para

garantir a concretização dos avanços inscritos na lei e no plano do discurso teórico e

da vontade do chamado Partido Sanitário. Segundo Macedo (2005), no início dos

anos 90, proliferaram-se Conselhos de Saúde no país, sendo criados dois mil, entre

1991 e 1993. Pela avaliação da descentralização do SUS, a IX Conferência Nacional

de Saúde, de 1992, buscou ampliar a descentralização para além do repasse de

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verbas pela gestão municipal da saúde, visando a participação social e o respeito a

diferenças regionais.

A reforma do sistema público e a constituição do SUS, formulada nesse

contexto, estruturou-se por eixos alinhados com as concepções democráticas

presentes nesses movimentos sociais, configurados nos princípios de universalidade

no atendimento, descentralização, participação da sociedade, equidade no custeio e

uniformidade de benefícios. No entanto, sua implementação vem enfrentando

diversos dilemas e obstáculos. Em primeiro lugar, há as dificuldades provenientes

das transformações rumo ao capitalismo financeiro, que orienta as ações sociais

para o mercado e não se mostra favorável à democratização e fortalecimento

público do sistema de saúde. Em seguida, ocorrem dificuldades provenientes do

próprio processo histórico e cultural das políticas brasileiras, no qual práticas como o

clientelismo e o autoritarismo continuam presentes em diversas regiões. Como

apontam Pires e Demo:

o cenário econômico mundial transnacionalizado, com a consequente exigência de flexibilização das garantias sociais que o capital financeiro vem impondo aos Estados-nações, traz sérias repercussões estruturais para países em desenvolvimento ou periféricos, como o Brasil, pondo em risco a implementação dos princípios e diretrizes do SUS. (PIRES e DEMO, 2006).

Por outro lado, as condições político-sociais próprias do país também são

determinantes na má qualidade de vida e de saúde da população, já que o

panorama da saúde se vincula aos modos de organização social, incluindo fatores

como depende a forma de produção e distribuição da riqueza, as condições

desenvolvimento social e as condições de vida. É importante destacar que os

determinantes sociais têm forte inter-relação, uma vez que são produto da estrutura

social e nela se reforçam, mantém as relações de propriedade, garantem a

acumulação e produzem a desigualdade. Assim, a compreensão das especificidades

da sociedade brasileira amplia a compreensão sobre a pertinência e a organização

das ações em saúde no país. No Brasil, fatores como os diferentes níveis de

desenvolvimento regional, o confisco salarial das classes trabalhadoras e a

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concentração de terra, uma das mais aviltantes entre países de potencialidade e

tradição agrícolas da população, interferem negativamente nas condições de saúde.

No contexto do quadro epidemiológico brasileiro, analisamos anteriormente a

complexidade das ações de saúde num contexto que articula doenças relacionadas

à pobreza e falta de condições mínimas para a qualidade de vida da população e

doenças relacionadas ao desenvolvimento econômico-industrial. Este cenário gera

uma demanda diversificada junto aos serviços de saúde, que se volta para a

prevenção, tratamento e recuperação tanto de problemas de saúde como

parasitoses e desnutrição quanto obesidade e diabetes.

A concentração da terra em grandes latifúndios e a escassez de incentivos

agrícolas aos pequenos produtores acaba por provocar o êxodo rural, com o

consequente crescimento desordenado da cidade e a instalação de condições

precárias de habitação para grande parte da população. A ausência de saneamento,

educação, infraestrutura nas residências, acesso à água potável, entre outros, gera

uma perda da qualidade de vida, comprometendo as condições de saúde. Por outro

lado, os migrantes encontram nas cidades a forte presença do desemprego

estrutural, em que a oferta de mão-de-obra é muito superior à oferta de empregos.

Além disso, há uma grande parcela de subempregos, em que os baixos salários e as

precárias condições de trabalho podem muitas vezes contribuir para o agravamento

das condições de saúde. Mesmo para aqueles que conseguem empregos no

mercado formal, o arrocho salarial, ou seja, o aumento dos salários frequentemente

inferior a inflação, que acaba reduzindo o poder de compra dos trabalhadores no

longo prazo, pode impedir ou limitar o acesso a muitos bens essenciais ou a

melhorias concretas nas condições de vida.

Nas regiões Norte e Nordeste, muitas vezes, esses problemas se agravam,

pois a maior desigualdade social num quadro de menor desenvolvimento econômico

eleva ainda mais o nível de corrosão salarial e subemprego, e dificulta ainda mais o

acesso a direitos sociais mínimos, tais como saneamento e educação. Tais fatores

levam a piores condições de saúde, o que pode ser demonstrado pelos indicadores

dessas regiões: no Norte e no Nordeste, os índices de desnutrição e de mortalidade

infantil são em média, duas vezes maiores do que os índices verificados no Sul e no

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Sudeste do país. Em algumas localidades das regiões Norte e Nordeste, a

esperança de vida ao nascer pode chegar a ser trinta anos inferior àquela

encontrada em certos locais do Sul e do Sudeste.

Assim, a conjuntura brasileira em saúde guarda contradições, tanto em sua

epidemiologia, decorrente de um processo social desigual, que combina alta

tecnologia em determinados setores e escassez de recursos em outros, quanto em

sua conjuntura político-econômica de gestão, na qual diretrizes democratizantes

galgadas pelos movimentos sociais e estabelecidas na formulação do SUS, desde o

final dos anos 70 até o final da década de 80, têm convivido com direcionamentos

voltados para os interesses do poder econômico e do setor privado, principalmente a

partir da década de 90, influenciados tanto por agentes internacionais quanto por

agentes nacionais de grande poder econômico. Essas contradições do próprio país,

aliadas às contradições nos rumos das políticas de saúde, ajudam a compreender

os obstáculos e insucessos das políticas de saúde implantadas no Brasil.

Assim, por um lado, os temas que vêm sendo abordados nas nas

Conferências Nacionais de Saúde, realizadas durante os últimos 10 anos (1992,

1996 e 2000), demonstram um prosseguimento das discussões caras à

implementação do SUS, no sentido de buscar uma prática de saúde que se

configure como “direito de todos e dever do Estado”. Alguns desses temas

demonstram a preocupação com a transparência e o controle social do sistema, bem

como com a manutenção de uma organização participativa e socialmente vinculada:

a descentralização da gestão do SUS e redefinição das competências de cada

esfera de governo; o financiamento, as fontes de recursos e mecanismos de

transferências intergovernamentais; a mudança dos modelos de atenção à saúde,

visando à consolidação de modelos de gestão alternativos aos hegemônicos; a

implantação de sistemas de auditoria, controle e avaliação dos serviços de saúde;

os mecanismos de controle social sobre a gestão do sistema de saúde; o

gerenciamento de sistemas de informação como suporte ao processo de tomada de

decisões em saúde e como garantia do acesso público às informações referentes à

gestão e ao financiamento do sistema.

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Na perspectiva de desenvolver os princípios de universalidade e participação

social, diversos programas de atenção à saúde, especialmente os programas cujo

foco é a atenção primária, ou seja, as ações de prevenção e promoção da saúde,

buscam vincular suas práticas e políticas ao contexto social mais amplo. Assim, as

ações são desenvolvidas a partir de uma participação dos agentes no cotidiano da

população, de modo integrar as ações nas dinâmicas de relações de uma família ou

comunidade e a transformar as práticas de saúde em práticas sociais. No plano da

gestão, esse direcionamento das políticas se evidencia pelo Piso de Atenção Básica

(PAB), criado em 1998. Esse piso tem dois objetivos: em primeiro lugar, garantir um

mínimo de recursos destinados à promoção e prevenção em saúde; em segundo

lugar, garantir a equidade, já que a transferência de recursos aos municípios passa

a ser proporcional à população municipal, permitindo mais estabilidade na

elaboração das ações locais de saúde e fortalecendo a vinculação dos programas às

especificidades de vida de cada cenário social.

Porém, mesmo articulando a descentralização do sistema de saúde aos eixos

de integração social, foco na atenção básica e participação da população, os

processos de descentralização ocorreram de modo desigual e paulatino. Isso porque

tais processos dependeram de negociações e da adesão dos municípios, gerando

níveis de gestão heterogêneos. Para que essas negociações ocorressem, cabe

destacar o papel das Comissões Ingestores Tripartites e Bipartites, das quais

participavam representantes de esferas de governo diversas (municipais, estaduais

e federais), permitindo um diálogo e o estabelecimento de acordos no financiamento

e gestão do sistema. O processo de descentralização apenas se dinamizou com o

final da década de 90, com a X Conferência Nacional de Saúde, na qual a busca de

negociações para os conflitos nos vários níveis de gestão possibilitou que, em 2000,

98% dos municípios participassem da gestão descentralizada. Nesse processo,

diversos programas passaram a vincular-se aos municípios, acompanhando as

mudanças na transferência de recursos. Entre esses programas, observa-se uma

ênfase na atenção primária e na saúde integrada, caso dos programas de vigilância

sanitária e epidemiológica, de controle de doenças transmissíveis e de ações como

o Programa de Saúde da Família (PSF) e o Programa de Agentes Comunitários

(PACS). Esses programas visam também redirecionar o modelo de saúde, saindo do

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modelo biomédico e assistencialista, centrado na intervenção mecânica para um

modelo focado na atenção biopsicossocial, de modo a integrar ações preventivas na

relação cotidiana entre agentes de saúde e população.

Todavia, segundo Gerschman (2004), esse sistema ainda enfrenta enormes

dificuldades no tocante à participação democrática da população, já que os

Conselhos de Saúde, órgãos destinados a congregar representantes da população

na gestão e controle do financiamento e qualidade de serviços, não possuem

orçamento próprio e, em muitas localidades, acabam possuindo um caráter

meramente figurativo ou mesmo politicamente influenciado por governantes e

representantes do Estado. Além disso, de acordo com Ribeiro (1997), alguns

municípios formularam leis que retiram o caráter deliberativo dos conselhos de

saúde formados pela população, transformando-os em órgãos consultivos ou

formais e esvaziando sua capacidade decisória. Como apontam Coelho e Paim:

No caso do setor saúde, constata-se uma participação maior do capital financeiro ao tempo em que a descentralização dos serviços permite aos municípios movimentarem fundos e negociarem esquemas com os produtores privados. (...) Dessa maneira, a sociedade perderia a capacidade de influir na definição das políticas de saúde, pois as privatizações ofereceriam uma "livre escolha" condicionada pela oferta e pela capacidade econômica de cada usuário. Parte da negociação torna-se assim, limitada, uma vez que é difícil estabelecer um pacto que inclua a participação dos usuários na tomada de decisões e na gestão de estabelecimentos privados.(COELHO e PAIM, 2005, p.1374).

Em meio a essas contradições, a prática de gestão do Sistema Único de

Saúde, em qualquer nível do sistema (federal, estadual ou municipal), coloca aos

seus participantes a problemática de identificar e selecionar conhecimentos,

métodos e instrumentos tecnicamente adequados para a implementação de

programas e ações de saúde e ao mesmo tempo analisar a conjuntura político-social

para o direcionamento das políticas, de modo a considerar as transformações de

longo prazo no campo da saúde, que dependem da vinculação das ações ao

conjunto mais amplo das relações e práticas sociais.

O enfrentamento dessas dificuldades exige, no processo de gestão, um

esforço de articulação entre as informações tecnicamente relevantes e a análise do

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cenário social no qual serão utilizadas para o desenvolvimento de ações ao mesmo

tempo eficazes e pertinentes ao contexto social nas instituições, órgãos e programas

em que se efetivam as políticas de saúde. No aperfeiçoamento do processo de

planejamento e gestão do sistema, em todos os níveis, é necessário não apenas,

segundo Teixeira e Vilasboas (2004), “o acesso a informações de natureza técnico-

científica e político-institucional que contribuam para a incorporação de

conhecimentos e tecnologias de formulação, implementação e avaliação de

políticas, planos, programas, projetos, destinados a intervir sobre o estado de saúde

da população e sobre o próprio sistema de serviços de saúde”, como também a

compreensão sistêmica no emprego dessas informações, de modo a construir uma

visão articulada das diferentes esferas de atuação das ações de saúde, dos

diferentes campos com os quais a saúde está articulada – tais como educação,

habitação, saneamento e condições de vida, meio ambiente, organização urbana,

entre outros – e dos diversos entrecruzamentos que tornam os programas e ações

de governo capazes de promover transformações a longo prazo. Essa perspectiva

sistêmica só é possível mediante uma articulação de governo e de uma

compreensão histórico-social não apenas dos processos de saúde e doença, mas

também do próprio processo de gestão e articulação dos sistemas de saúde.

Nesse contexto, os diversos temas de planejamento e gestão são geralmente

apresentados como de ordem teórico-metodológica. Embora as informações

técnicas sejam relevantes, a perspectiva exclusivamente metodológica possui

importantes desdobramentos sociais e políticos que podem incidir negativamente

sobre as práticas e programas de saúde, bem como sobre a possibilidade ou não de

participação social nas ações de saúde. Assim, alguns temas de gestão serão

apresentados e discutidos, visando a compreensão da articulação política e social

dos processos de gestão.

Em primeiro lugar, a discussão sobre as metodologias para a formulação de

ações e programas em saúde pode ser bastante diversificada e está diretamente

relacionada à concepção de saúde e ao enfoque dado às políticas. Algumas

metodologias empregadas no Brasil focalizaram, por exemplo, o uso eficiente e

normativo de recursos (caso do método CENDES), a gestão estratégica de

planejamento em saúde, a gestão hospitalar integral, a ideia de planejamento

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adaptativo (caso do método elaborado pelo CPPS). Tais técnicas de descrição dos

perfis epidemiológicos e identificação de necessidades em saúde privilegiam,

frequentemente, determinados aspectos dos processos de saúde e doença, tais

como a visão biológica, a perspectiva econômica dos gastos em saúde ou as

questões sociais envolvidas na gestão.

A análise dos métodos e a escolha das propostas a serem utilizadas

necessitam da reunião de conceitos e informações de diversas áreas (geografia,

demografia, antropologia, biomedicina, sociologia, etc.) para que as propostas de

planejamento e gestão possam efetivamente contribuir na melhoria das condições

de saúde. As prioridades em saúde serão por meio da escolha do enfoque de

planejamento e gestão e da visão integrada das diversas esferas em que os

programas de saúde irão atuar. Por exemplo, um estudo epidemiológico aliado a

informações sobre as condições sociais de uma população pode determinar o

enfoque em determinadas doenças, bem como a adoção de algumas ações em

detrimento de outras.

Os dados demográficos, as características orçamentárias, a avaliação das

condições de educação e emprego, por exemplo, podem ser informações úteis para

determinar a programação de necessidades e a oferta de serviços, bem como a

elaboração de projetos. Isso porque, por meio dessas informações, é possível

elaborar uma estimativa do crescimento de uma população e de seu

desenvolvimento econômico e social, orientando as ações de saúde, principalmente,

aquelas que possuem caráter preventivo. Além disso, a construção dos cenários

sociais que serão palco das ações de saúde e a identificação dos diversos atores

sociais implicados na efetivação das propostas (população, profissionais de saúde,

agentes políticos participantes do processo, etc.) permitirá conhecer a viabilidade

das propostas, bem como as necessidades de adaptação e as possibilidades de

negociação que permitam integrá-las aos espaços sociais sem descaracterizá-las.

O conhecimento das especificidades locais e regionais também é importante,

pois influenciará a vinculação dos atores socais nas ações de saúde, na medida em

que essas são pertinentes ao seu território em maior ou menor grau. Assim,

diferentes regiões priorizarão problemas diversos, havendo também diferentes

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formas de expressar e compreender problemas comuns a mais de uma região.

Podem também ser encontrados, em regiões distintas, diferentes fatores de

influência para problemas que se apresentam de modo semelhante, necessitando de

ações diversas em seu enfrentamento.

Assim, por exemplo, pesquisa de Ribeiro realizada a partir do Projeto Saúde

2004, que reuniu interlocutores do governo e da sociedade de diferentes regiões

brasileiras, demonstra que os participantes abordaram os problemas de saúde de

modo diverso em cada região do país. Segundo a autora,

os interlocutores da região Norte elegeram um único problema como principal: a falta de resolutividade do SUS na sua região; os da região Nordeste, destacaram dois: o desrespeito ao papel do controle social e a baixa resolutividade da atenção básica. Para os interlocutores da região Centro–Oeste, os principais problemas de sua região correspondiam à precariedade do atendimento e à inadequação da oferta de serviços; para os da região Sudeste, a falta de atenção integrada e humanizada aos pacientes, associada à baixa resolutividade do sistema, era o problema mais importante. O desconhecimento dos usuários de seus direitos e dificuldades na operacionalização da atenção integral foram os problemas que mais mobilizaram os interlocutores da região Sul. (RIBEIRO, 2007, p.1529).

Desse modo, de acordo com Ribeiro (2007, p. 1530), a gestão em saúde

implica também a “necessidade de se focar os problemas de saúde em seus

vínculos territoriais — geográficos, políticos, federativos, comunitários, culturais, na

produção de ações governamentais orientadas pelo objetivo de assegurar o direito

universal à saúde.” Nessa concepção de vinculação ao território, é importante

compreender não apenas o espaço físico, mas a esfera sociocultural de ação e de

relações de certa população, que implica em diferentes modos de construção do

cotidiano.

Essa perspectiva para a avaliação das decisões em gestão procura abranger

uma diversidade de olhares sobre o território para construir uma visão mais

aprofundada e abrangente de uma realidade e identificar alternativas de ação em

saúde, que sejam ao mesmo tempo diversificadas, pertinentes aos problemas

encontrados e construídas coletivamente. Assim, tal visão mostra-se, em muitos

pontos, contrária a algumas diretrizes adotadas internacionalmente pela influência

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de agentes econômicos, como aquelas que procuram encontrar soluções

universalizantes que devam ser aplicadas igualmente em todos os países.

Frente a essa dicotomia, a gestão pública tem de lidar com as diferentes

tendências do cenário social, enfrentando o desafio de construir políticas que

preservem as ações cidadãs em saúde em meio às pressões oriundas do sistema

econômico. Torna-se então necessário questionar e atualizar o papel do Estado,

construindo uma visão clara sobre as funções públicas e sua importância social. É

preciso ainda articular as concepções de saúde e as ações delas decorrentes, tanto

no eixo intersetorial de governo, quanto nos eixos interdisciplinar (relativo aos

conhecimentos de diferentes áreas) e de integração regional (referente à atuação

em territórios diversos). Nessa empreitada, a qualidade da formação dos

profissionais de saúde e dos gestores na área é fundamental, permitindo construir

novos processos de planejamento e gestão e aperfeiçoar os processos já utilizados

para adaptar as intervenções aos contextos de atuação, permitir a participação

social e construir modos de regulamentação e controle social no interior do próprio

sistema.

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Texto de Apoio

O texto a seguir aborda questões relativas à gestão do SUS, e é extraído do artigo

científico Serviços de saúde: os dilemas do SUS na nova década, de Pedro Luiz Barros Silva,

publicado na revista São Paulo em Perspectiva.

A reforma do setor saúde esteve muito em moda, no plano internacional, na década

de 90. A partir de distintos pontos de partida, consolidou-se um conjunto de pressões sobre

os governos nacionais para alterar o perfil das políticas públicas setoriais.(...) Todo esse

contexto (...) aponta uma tendência convergente de orientação nas modificações das políticas

públicas e privadas para o setor. De um lado, países que centravam, de forma quase

exclusiva, a organização de serviços nas regras de mercado passam a utilizar instrumentos

de planejamento e de regulação, mais visíveis até então nas práticas administrativas do setor

público. De outro lado, países com forte tradição de organização estatal dos serviços –

ênfase em mecanismos de planejamento, avaliação e controle centralizados – passam a

utilizar cada vez mais os instrumentos administrativos e gerenciais, que permitem a

introdução de formas administradas de competição no interior do sistema de atenção à

saúde, e mecanismos de regulação que diminuem as formas diretas de intervenção do setor

público na operação dos serviços. (...) ainda se buscam intensamente novos instrumentos de

política que superem a dicotomia Estado x Mercado e consigam integrar as capacidades

públicas (estatais e não-estatais) e privadas de forma sinérgica, o que ainda não foi obtido

com pleno sucesso por nenhuma experiência nacional.

(...) Como já é conhecido, o Sistema Único de Saúde (SUS), estabelecido pela

Constituição Federal de 1998, ao induzir o processo de descentralização da atenção

sanitária, buscou implantar um modelo assistencial que revertesse o perfil de intervenção

governamental nesse setor. (...) A partir de 1988, foi consolidada e formalizada na Carta

Constitucional uma tendência de reconhecimento da atenção à saúde como um direito social,

processo que se inicia no princípio dos anos 80. A Constituição buscou, explicitamente,

assegurar o acesso universal e igualitário – sem restrições e discriminações derivadas de

posições diferenciadas na heterogênea e complexa estrutura social brasileira – às ações

(políticas e programas) e serviços de promoção, proteção e prevenção da saúde.

Tal definição constitucional, para que fosse viabilizada de fato, envolvia a definição e

implantação de uma estrutura de atenção que abrangesse todos os brasileiros e operasse

dentro dos princípios de máxima equidade, alterando, consequentemente, as principais

características do perfil de política de atenção à saúde, forjado durante a situação autoritária

que vigorou no país por três décadas e prevaleceu no Brasil até meados dos anos 80. (...)

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A estruturação de um sistema único de saúde procurou ampliar os níveis de

responsabilidade da gestão local e regional para solucionar, simultaneamente, questões

referentes à melhora da eficácia do gasto público e à ampliação do acesso aos serviços. (...)

Mais de dez anos após o início desse processo e a despeito de avanços inequívocos tanto

dos indicadores de saúde quanto da eficiência do atendimento em diversos Estados e

municípios brasileiros, verifica-se que o Brasil ainda apresenta padrões de morbidade e

mortalidade precários. A realidade sanitária brasileira revela padrões que mesclam distintas

etapas do processo de transição epidemiológica, combinando a presença de doenças

verificadas em sociedades pré-industriais, industriais e pós-industriais. Em parte, essa

realidade é resultante da permanência de problemas de cobertura assistencial, financiamento

setorial, resolutividade sistêmica e equidade no acesso e na utilização dos serviços (...) nota-

se que a atenção à saúde continua sendo operacionalizada através de um sistema

segmentado e desarticulado.

(...) Estimativas indicam que o SUS teoricamente estaria atendendo, atualmente, de

forma exclusiva, 114,6 milhões de pessoas. Um segmento de medicina supletiva ao SUS

(SMS) tem cobertura estimada de 45 milhões de pessoas, operando através de planos de

saúde contratados pelos indivíduos ou por empresas, em organizações de medicina de

grupo, cooperativas médicas, seguradoras do ramo saúde e planos auto-administrados, nos

quais se incluem os empregados das empresas estatais e privadas de grande porte. Um

segmento de prestadores de serviço que é remunerado através do desembolso direto de

seus usuários (SDU) e abrange, teoricamente, a população com mais alto poder aquisitivo.

A despeito dessa multiplicidade de formas de atendimento, estima-se que uma parte

ponderável da população, em torno de 10% das pessoas, esteja à margem até do

atendimento prestado pelo SUS. Isso significa que cerca de 16 milhões de pessoas estejam

sem acesso a nenhum serviço, podendo-se concluir que, de forma exclusiva, o SUS deve

cobrir cerca de 99 milhões de brasileiros

(...) A implantação do SUS enfrenta, nesse campo, obstáculos complexos (...). A

primeira observação importante a ser feita é que foram significativamente modificadas as

fontes de financiamento (...). Em 1995, contabilizando-se o gasto realizado nas três esferas

de governo, chega-se a um gasto total de quase 25 bilhões de dólares, um aumento

significativo quando comparado acerca de 14 bilhões de dólares alcançados, em 1989.

Estudo detalhado realizado por Biasoto et al. (1998) sobre o gasto público em saúde

no Brasil, em 1995, chega às seguintes conclusões: "Nos últimos anos, as discussões em

torno das questões do gasto público em saúde no Brasil têm se concentrado no

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financiamento. O cenário de incerteza, quanto às fontes de recursos, que se repete a cada

ano, vem impedindo um exame mais detalhado da qualidade das ações de governo,

contribuindo para o empobrecimento do debate. A análise, em caráter preliminar, das

características do financiamento e do dispêndio governamental com a função, no Brasil,

permite reunir as seguintes conclusões:

- O patamar do gasto no Brasil já é bastante elevado, da ordem de 3,5% do PIB. O

gasto por habitante/ano, de R$ 146,00. em 1995, já alcança o volume considerado padrão

por especialistas do setor.

- Gasto de Estados e municípios já supera o da União. A aplicação de recursos

próprios/não vinculados aos repasses do Ministério da Saúde, da ordem de R$ 10,4 bilhões

anuais, é uma demonstração inequívoca do comprometimento de prefeitos e governadores

com as ações de saúde.

- As aplicações são tipicamente de custeio. As despesas de "Pessoal", adicionadas a

"Outras Correntes" concentram cerca de 82% do orçamento nacional, ou R$ 21 bilhões. Os

gastos em investimento são, ao contrário, muito baixos. Do valor total investido, em 1995, de

R$ 446 milhões, cerca de 72% se concentra nos municípios, que vêm ampliando sua

responsabilidade com a gestão da função saúde.

- Quanto aos programas de trabalho, destaca-se a rubrica "Assistência Médica e

Sanitária", na qual se registram os gastos na operação do sistema, com R$ 18,3 bilhões ou

74% do total. Estados e municípios praticamente não participam das ações de prevenção,

concentradas na União.

- Do valor total transferido pelo SUS, em 1995, destaca-se a participação dos

prestadores privados conveniados, que já equivale ao somatório dos repasses às unidades

próprias de Estados e municípios. A rede privada predomina em quase todo o país, salvo em

alguns Estados da Região Norte, onde a baixa renda e a densidade populacional ainda não

garantem retorno para a atividade privada.

- As transferências do SUS têm um caráter regressivo, função dos critérios de repasse

baseados na produção de serviços. As unidades mais pobres do Norte e do Nordeste

recebem menos recursos por habitante do que o Sul/Sudeste, onde a base econômica

garante maior capacidade de geração de recursos fiscais próprios.

- As aplicações de Estados e municípios atingem cerca de 15% de sua receita

disponível, mas em termos per capita existe uma profunda disparidade entre regiões pobres e

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ricas. O gasto subnacional por habitante é de R$ 106 no Sul/Sudeste contra apenas R$ 60 no

Norte/Nordeste.

- É indiscutível o avanço da municipalização no país. Entretanto, ela vem ocorrendo

de forma desigual, graças às disparidades de renda entre os municípios e também ao

esquema de transferências do SUS, que não apresenta qualquer função de redistribuir

recursos às unidades mais pobres. Cerca de 79% do gasto municipal em saúde e

saneamento se concentra no Sul/Sudeste, onde reside 57% da população.

- Em termos médios, os municípios das regiões mais desenvolvidas respondem por

quase dois terços dos gastos subnacionais em saúde e saneamento, contra apenas 40% no

Norte/Nordeste/Centro-Oeste. Destaca-se o avanço da municipalização nos Estados do Rio

de Janeiro, São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul.

- Quanto ao gasto estadual, há grande variância até mesmo entre Estados da mesma

região. Os governos estaduais financiam a maior parte dos gastos nos Estados do Acre,

Roraima, Amapá, Tocantins, Piauí, Sergipe e Bahia.

- A divisão das despesas por categoria econômica e programa de trabalho, pelos

governos estaduais das várias unidades da federação, tende a concentrar-se no custeio em

geral e na assistência médica, respectivamente. Entretanto, os dados apontaram algumas

distorções nas aplicações administrativas, especialmente nas unidades do Norte, Centro-

Oeste e no Rio de Janeiro. Os investimentos apresentaram patamar bastante baixo, como era

de se esperar, diante da crise dos Estados e do avanço da municipalização".

O Ipea, na sua avaliação dos "Gastos Sociais das três esferas de governo, 1995"

(Fernandes et al., 1998), também chegou a resultados bastante similares ainda que com uma

metodologia distinta de consolidação das informações.

(...) As informações disponíveis permitem apontar alguns progressos no campo do

acesso, ainda que continuem sendo verificadas, no Brasil, fortes disparidades na utilização

de serviços, tanto entre regiões quanto entre segmentos sociais. Tomando-se um novo

estudo de Travassos et al. (1998) verifica-se que: houve uma diminuição nos diferenciais de

utilização entre as Regiões Nordeste e Sudeste e, na primeira, as melhorias relativas foram

mais acentuadas. (...) No que diz respeito à utilização de serviços, propriamente dita, o

estudo mostra que:

- há maior participação relativa da utilização de postos e centros de saúde no

Nordeste, em relação à maior participação de clínicas e consultórios privados na Região

Sudeste;

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- há aumento expressivo de hospitais como locus de consumo de serviços de saúde

nas duas regiões, particularmente no Nordeste;

- as pessoas de maior renda utilizam mais consultórios particulares e clínicas,

enquanto as de menor renda, principalmente postos e centros de saúde;

- em ambas as regiões, os indivíduos de renda mais alta utilizam proporcionalmente

mais serviços ambulatoriais, enquanto os serviços hospitalares tendem a aumentar com a

diminuição da renda.

Estudo de Campino et al. (1998), também analisado por Piola em NEPP (1999),

utilizando os dados da PPV, fornece outras informações importantes sobre a utilização e a

demanda por serviços, segundo pessoas em diferentes estratos de renda.

(...) As diferenças começam a se tornar mais evidentes quando a pesquisa verifica a

utilização de acompanhamento médico: enquanto 54,7% dos indivíduos mais pobres têm

acompanhamento médico em decorrência de problema crônico de saúde, no estrato mais alto

82,9% dos indivíduos declaram ter acesso a esse tipo de serviço.

(...) Os mais ricos também fazem exames periódicos com maior frequência: a

realização de exames periódicos em decorrência do problema crônico de saúde é

progressivamente maior, conforme o estrato de renda: 60,9% dos indivíduos do primeiro

quintil e 82,5% do último.

A procura por atendimento médico nos últimos 30 dias também é progressivamente

maior à medida que a renda cresce: 47,2% dos indivíduos no estrato de mais baixa renda

buscaram algum tipo de atendimento médico, percentual que se eleva para 68,9% entre os

indivíduos do último quintil de renda.

A procura por atendimento derivada de outro motivo, exceto doença crônica, também

é maior entre os indivíduos mais ricos: 13,5% dos indivíduos de maior renda procuraram

atendimento, enquanto entre os mais pobres o percentual encontrado foi de 7%. É relevante

notar que entre os motivos da procura, a realização de check-up, portanto uma atividade

típica de prevenção, corresponde a 28,5% entre os mais ricos e apenas 13,9% entre os mais

pobres.

(...) As questões indicadas nos itens anteriores, que examinam diferentes aspectos da

realidade do atendimento à saúde no Brasil após uma década de implantação do SUS,

mostram que é preciso avançar na implementação de alterações estruturais nas formas de

organização, gestão, regulação, controle e avaliação da oferta de serviços. Algumas medidas

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já estão sendo tomadas e vários desafios sendo enfrentados, sem que, entretanto, possa se

visualizar uma agenda completa e consistente de intervenção do Poder Público.

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UNIDADE 4 - GESTÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS E

PARTICIPAÇÃO SOCIAL: PREVENÇÃO E DESENVOLVIMENTO DE

AÇÕES LOCAIS

De acordo com Pollitt e Bouckaert (2000), as ideias e reformas prescritas

pelos ideais neoliberais formularam o programa denominado Nova Gestão Pública

(NGP), que proliferou principalmente a partir da década de 90, alimentando

processos de mudança em diversos países. O discurso de atribuir os problemas no

atendimento em saúde à gestão de Estado, que seria fatalmente marcada, de

acordo com Sano e Abrucio (2008) pela “ineficiência relacionada ao excesso de

procedimentos e controles processuais, e a baixa responsabilização dos burocratas

frente ao sistema político e à sociedade” influiu para direcionar para o capital privado

a atuação em diversas áreas voltadas aos direitos de cidadania, dificultando os

processos de participação social nas políticas públicas.

A argumentação da Nova Gestão Pública considerou problemáticos tanto o

volume dos investimentos em saúde, julgado alto demais, quanto a organização do

atendimento, tida como ineficiente quando comparada à reestruturação produtiva da

nova fase do capitalismo, na qual, muitas vezes, o mesmo trabalho passou a ser

realizado nas empresas por um número significativamente menor de funcionários.

Para solucionar essa pretensa ineficiência estrutural do Estado, a proposta de

reforma estatal buscou direcionar os direitos sociais para o setor privado,

restringindo a administração pública à regulamentação de mercado e ao controle de

determinadas áreas, argumentando de que essa estratégia aumentaria a

responsabilização governamental.

As ideias da Nova Gestão Pública se estabeleceram no Brasil no primeiro

governo Fernando Henrique Cardoso, em 1995, quando foi criado o Ministério da

Administração e Reforma do Estado (Mare), sob o Plano Diretor da Reforma do

Aparelho do Estado, que seguiu muitas das linhas básicas dessa concepção de

gestão. Além disso, vários governos estaduais adotaram, posteriormente, essa

diretriz para sua gestão, repassando a administração de equipamentos sociais de

saúde, como hospitais, UBS e centos de referência, para entidades filantrópicas,

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instituições privadas e organizações da sociedade civil. Foi nesse contexto que

ocorreu o aumento de organizações sociais e organizações não governamentais em

diversos setores, inclusive na saúde. Conforme relatam Sano e Abrucio:

As primeiras organizações sociais foram criadas pelo governo federal em 1997. O estado de São Paulo foi o ente federativo em que essa forma de gestão mais proliferou. Em pouco tempo, foram qualificadas nove entidades como OS na área da Saúde, responsáveis pelo gerenciamento de 16 hospitais – além dessas, outras nove organizações tiveram o mesmo destino na área da Cultura (SANO e ABRUCIO, 2008, p.65).

O primeiro mecanismo considerado fundamental na concepção da nova

gestão pública foi a adoção de uma administração com foco em resultados,

aproximando a gestão pública da organização e dos objetivos administrativos das

empresas capitalistas. A seguir, mecanismos como a contratualidade, ou seja, a

contratação, pelo Estado, de serviços de saúde no setor privado, a adoção de metas

e indicadores de desempenho, disponibilizadas por meio da divulgação transparente

dos dados à população, foram considerados capazes de garantir o controle dos

cidadãos sobre o Estado, que não se daria por meio da participação direta, mas por

sua atuação enquanto consumidores de produtos de mercado regulados pelo

Estado.

No entanto, algumas premissas desSa organização administrativa sobre o

funcionamento do mercado (que garantiriam a liberdade de escolha do consumidor)

não ocorrem no serviço de saúde, em particular nos serviços públicos prestados por

empresas privadas. Essa organização administrativa pressupõe, por um lado, a

presença de diversas entidades não governamentais provendo o serviço público em

condições igualitárias de concorrência, situação que não ocorre na maioria das

vezes, já que em diversos setores existem empresas dominantes e que de muitas

formas agentes estatais podem se associar a atores privados com interesses

próprios que ultrapassam o interesse genuinamente público. Ademais, para que haja

um controle estatal eficiente do setor privado são necessários mecanismos

institucionais de controle, o que implica no funcionamento eficiente da organização

pública, já contestado nos próprios pressupostos desse tipo de gestão. As condições

da própria estrutura econômica demonstram, portanto, que seus agentes possuem

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interesses próprios na gestão do setor de saúde, que não podem ser

desconsiderados. Como analisam Coelho e Paim:

As reformas no modelo de gestão dos sistemas de saúde que propõem maior eficiência por meio da retirada do Estado na prestação de serviços tendem a desconsiderar os interesses cristalizados no setor que determinam, em última análise, a forma de organização dos serviços de saúde, os modelos assistenciais, a formação dos recursos humanos e o desenvolvimento científico e tecnológico. A "indústria da saúde", cujos centros de decisão estão fora do país, teria movimentado em 1993, 6,4 bilhões na assistência médica supletiva, enquanto a indústria de medicamentos faturado 8,2 bilhões de dólares, em 1995. Nesse mesmo período, a indústria de equipamentos biomédicos movimentou cerca de um bilhão de dólares. (COELHO e PAIM, 2005, p.1373).

Assim, uma concepção de que a gestão do Estado seria inerentemente ruim

serviu de justificativa para argumentar em favor da ampliação da participação

privada no setor de saúde, na qual o envolvimento da população nos processos de

gestão e na eleição de prioridades em saúde é menor, dado o caráter particular das

instituições.

Simultaneamente, nas duas últimas décadas, foram estabelecidas

modificações nas relações entre as três esferas de governo brasileiras,

determinando-se novas funções e privilegiando a transferência de competências aos

municípios na construção do Sistema Único de Saúde (SUS). EsSe processo de

descentralização e autonomia dos municípios foi pautado por diretrizes contidas na

Constituição de 1988 (Brasil, 1988), nas leis 8.080/90 e 8.142/90 e nas Normas

Operacionais Básicas do Ministério da Saúde. EsSas instruções legais prevêem a

organização do SUS baseada nos princípios da universalidade, equidade e

integralidade da assistência à saúde, bem como na participação da sociedade na

gestão do sistema de saúde nas diferentes esferas de governo.

As diretrizes legais promulgadas na constituição de 1988 instituem uma

concepção da participação que buscava promover a democracia através de

instrumentos variados, baseados na integração de diversos setores da população,

em conjunto com o Estado, para o delineamento das políticas de saúde e para o

controle de sua implementação, incluindo tanto aspectos humanos quanto aspectos

financeiros. Os textos legais privilegiam a participação direta da população por meio

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de órgãos deliberativos e de debate, instituídos com esSe objetivo, como é o caso

dos Conselhos de Saúde e Conferências de Saúde, por exemplo.

Essa nova forma de controle social soma-se ao controle social tradicional,

realizado de modo indireto através dos representantes eleitos da sociedade para

cargos do Estado. Portanto, a reorganização do sistema de saúde não modifica o

formato de participação, mas ampliava suas possibilidades, introduzindo a

participação direta e mantendo os canais institucionais tradicionais de articulação

entre Estado e sociedade. A integração da população na gestão do SUS constituiu-

se como elemento central do planejamento e gestão das políticas de saúde, pois

procurava alinhar as ações de saúde aos problemas identificados e às necessidades

percebidas pela população, adequando as propostas aos cenários sociais. Como

analisam Vázquez, Silva, Campos, Arruda, Diniz, Veras e Pereira (2003, p. 581):

A participação da sociedade na gestão do sistema de saúde, nas diferentes esferas do governo, é uma das políticas promovidas na construção do Sistema Único de Saúde no Brasil. O sucesso na implementação de qualquer nova política depende de diversos elementos, entre eles, os interesses e opiniões dos atores principais envolvidos e que nem sempre são considerados.

Desse modo, as transformações do SUS não se dirigiam a um processo de

privatização, mas sim uma concepção democrática da atuação do Estado, na qual a

população estaria presente e atuante nas decisões de gestão tomadas nos próprios

municípios. Porém, como discutido anteriormente, o processo de reforma do Estado,

que no Brasil gerou a diminuição da ação estatal em diversos setores, foi

concomitante, na área da saúde, às tentativas de implantação e implementação das

mudanças propostas na Constituição de 1988. Como apontam Coelho e Paim:

no início dos anos 90, o setor saúde no Brasil foi atravessado pelos efeitos sucessivos de dois grandes conjuntos de reformas: a de Estado, iniciada com o desmantelamento de seu aparelho pelo governo Fernando Collor e reforçada no governo Fernando Henrique Cardoso, e a Reforma Sanitária, concebida no processo de democratização. (COELHO e PAIM, 2005, p.1373).

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A condução dessas duas reformas ocorreu com diversos obstáculos, pois

ambas possuíam objetivos que se contradiziam nos seus pontos principais:

enquanto a Reforma Sanitária buscava implantar o SUS e fortalecer o papel do

Estado e a participação popular na gestão em saúde, a reforma de Estado baseada

nas ideias da Nova Gestão Pública visava enfraquecer a ação do Estado, atribuindo-

a a agentes privados e atribuir à população o papel de consumidores de serviços, e

não de gestores de um bem público comum. Além das dificuldades geradas pela

ambiguidade da convivência dessas duas diretrizes divergentes para a gestão

pública, há ainda os percalços relacionados à tradição autoritária brasileira, marcada

pelas ações de Estado executadas de modo hierarquizado e pela cultura de

privilégio do saber médico na área da saúde, considerado mais legítimo do que o

saber de outros profissionais e do que a experiência da população.

A correlação desses fatores nas ações de saúde acaba constituindo

descompassos e hiatos entre os avanços alcançados no plano legal com a

constituição e a implementação dos programas e políticas de saúde, já que o

cotidiano dos serviços de saúde muitas vezes apresenta ainda um caráter autoritário

e centrado no modelo médico-biológico. Nesse contexto, ocorrem diversas

interpretações da noção de participação social, algumas das quais distorcem o

vínculo entre democracia e participação da população. Assim, algumas definições de

participação utilizadas no contexto de saúde brasileiro compreendem que a

participação da sociedade é um meio, segundo Cohn (2000); Côrtes (2002),

“utilizado para alcançar objetivos definidos pelas instituições, como uma alternativa

estratégica emergencial ou de intervenções prioritárias, para completar os recursos

institucionais”.

A ideia de que a população deve participar disponibilizando seu trabalho e

seus recursos para fins definidos pela instituição, sem que a população tomasse

parte, caminha lado a lado com a tradição histórica brasileira de regimes políticos

autoritários e poucos períodos democráticos, criando uma cultura da ausência de

direitos para a massa da população, em que falta informação sobre os direitos

constitucionais, percepção da legitimidade desses direitos e consequentemente

obstáculos para a sua concretização, conforme Bosi & Affonso (1998, p. 360),

“assim como a percepção da marcante divisão de poder presente na sociedade".

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Essa concepção de participação tem suas origens no percurso histórico das

políticas públicas brasileiras, nas quais durante muitas décadas, o governo solicitou

a participação da população nos serviços públicos e ações de responsabilidade

governamental, através de doações em dinheiro e trabalho voluntário,

principalmente, nas regiões periféricas e com maior nível de pobreza. Diversas

pesquisas relatam essa prática, como a de Valla (1998) na área da saúde, que relata

a solicitação de auxílio à população em áreas pobres, por meio de trabalho

voluntário em campanhas de vacinação e de trabalho e auxílio financeiro “na

recuperação de estruturas físicas das unidades e programas de controle de

endemias”. Patto (1994) relata essa prática na área da educação, com a exigência,

pelas escolas públicas, do pagamento de taxas pelos pais junto às diretorias,

visando realizar melhorias na escola e havendo, inclusive, situações de

discriminação de alunos cujas mães não puderam pagar tais taxas.

Analisando a adesão da população a essas práticas, Valla (1998) comenta

que esse tipo de participação da comunidade muitas vezes se torna um imperativo

para sua sobrevivência. A dependência do auxílio comunitário para o acesso às

condições mínimas de saúde e educação, principalmente entre a população mais

pobre, faz com que essa participação se apresente como única alternativa. Apesar

dessas estratégias resultarem em benefícios, tais como construção de casas,

escadarias, recuperação de unidades de saúde, do ponto de vista ético, considera-

se uma penalização injusta às populações mais pobres. Por um lado, porque, de

acordo com Briceño-León (1998); González (1996), com empregos e salários mais

dignos, alguns desses problemas poderiam estar solucionados, e por outro, também

permite ao Estado repassar suas obrigações e responsabilidades a outros

segmentos da sociedade. A participação, desse modo, deixa de ser uma ação cívica

e solidária para se transformar em obrigação, não em direito, pois expressa uma

necessidade dos indivíduos de colaborar com o Estado, descaracterizando o

aspecto voluntário e democrático.

Tal concepção de participação, embora presente em muitas experiências

brasileiras, apresenta inúmeros problemas. Além de a contribuição financeira e o

trabalho gratuito da população, nos serviços de saúde públicos, ser eticamente

duvidoso, ele implica sérias consequências metodológicas políticas e econômicas.

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No plano metodológico, a organização emergencial das ações e sua realização fora

de um planejamento mais amplo geram uma inevitável distorção dos programas de

saúde. No plano político, esse auxílio popular distorce a noção de participação

democrática e pode implicar no acirramento de relações autoritárias, que podem

contaminar até mesmo o processo político de escolha dos representantes de

governo. Na esfera econômica, o auxílio da população num setor em que esta já

contribuiu com impostos, pode resultar na diminuição do poder de compra ou da

inserção de membros da população no mercado de trabalho, quando esta é levada a

atuar frequentemente nos serviços de saúde com vistas ao cuidado dos próprios

familiares e amigos. Do ponto de vista da eficácia, como a população é chamada a

atuar para cobrir as deficiências do Estado, sua ação pode impedir a adoção de

ações adequadas e planejadas em políticas públicas, bem como mascarar a solução

real dos problemas.

Um exemplo dessa noção de participação pode ser encontrado na pesquisa

realizada por Vázquez et al. (2003), que identifica entre a população entrevistada de

usuários de serviços de saúde diversos discursos que expressavam a ideia de que a

participação seria uma responsabilidade, e não um direito. Tais narrativas apontam

uma compreensão de participação em saúde como um dever dos cidadãos no

auxílio, inclusive financeiro, para o funcionamento dos aparelhos de saúde do

Estado, enfraquecendo a noção de participação na saúde como um direito de

decisão e controle das ações públicas.

Em contrapartida, a acepção de participação como direito não considera a

inserção popular como instrumento ou meio para a ação dos serviços, mas como

uma finalidade em si mesma, voltada à atuação democrática junto aos mecanismos

públicos de garantia de direitos de cidadania, reconhecendo “o direito da população

a participar nas decisões que afetam sua vida cotidiana” e promovendo-a “como

espaço democrático para o controle social das instituições”. De acordo com Vázquez

et al. (2002), essa concepção está presente na maioria dos programas de prevenção

e atenção primária à saúde, que pressupõe a ação social para sua completa eficácia

e disseminou-se no processo histórico de reforma dos sistemas de saúde na

América Latina, tal como acorreu no Brasil com a constituição de 1988 e a formação

do SUS.

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Assim, a gestão pública embasada na participação social busca, por um lado,

promover o aprofundamento das informações sobre o espaço social, de modo que

essas possam ser utilizadas nas decisões administrativas, inclusive na investigação

de soluções e inovações sociais que se configurem como possibilidades de

implementação contextualizada das ações de saúde. Por outro lado, a integração da

sociedade em diversas formas de participação além daquelas instituídas

tradicionalmente pode contemplar as diversidades regionais marcadas por situações

heterogêneas e por questões específicas, aumentando a adequação e a efetividade

das ações, maximizando o aproveitamento dos recursos e a capacidade de

intervenção dos atores sociais nos contextos de saúde.

No entanto, a efetivação da inserção da população nos processos de gestão

depende da transformação da cultura autoritária nas decisões sobre as ações e

bens públicos, ampliando a consciência popular sobre os direitos de cidadania e da

construção de mecanismos diversos de debate e decisão. No panorama brasileiro,

diversas pesquisas desvelam as dificuldades de implementação da participação

popular, demonstrando que em muitas organizações populares voltadas para a

garantia de direitos, os participantes destacam, segundo Vázquez et al. (2003, p.

589), “uma necessidade de mobilização, organização e reivindicação por parte da

sociedade na tentativa de assegurar direitos sociais. Esta forma de expressar a

participação parece revelar a fragilidade do reconhecimento das pessoas como

cidadãos”.

Essas dificuldades demonstram, por um lado, que a construção do SUS é um

processo, no qual o aprendizado e a conquista da cidadania ocorrem no seu próprio

exercício. Por outro lado, a fragilidade da cultura e dos instrumentos de participação

instituídos pode transformar a inserção popular em uma participação meramente

simbólica e suscetível à manipulação e ao clientelismo. Assim, para a promoção de

uma participação democrática, é preciso considerá-la como processo histórico-

social, que depende da implementação de políticas voltadas para esse fim e da

transformação de concepções historicamente constituídas. Como lembra Vázquez et

al. (2003):

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As políticas que promovem a participação social foram introduzidas nos sistemas de saúde ao longo do tempo de formas diversas, em momentos diferentes e com distintas filosofias. Em que pese as diversas interpretações e aplicações do conceito, considera-se que a participação social é um processo, e, como tal, admite diversas modalidades e diferentes escalas de atuação. (VÁZQUEZ et al., 2003, p. 579)

Nesse contexto, é importante destacar o papel dos profissionais e agentes de

saúde, bem como dos gestores nos vários níveis de governo para a promoção de

uma gestão democrática em saúde. As dificuldades de construir uma relação

democrática, autônoma e pautada pelo diálogo, muitas vezes, se iniciam na própria

estruturação do cotidiano de atendimento, em que a rotina de tarefas a cumprir não

prevê espaços de discussão do cotidiano de trabalho entre os profissionais de

saúde. Os limites institucionais da atuação profissional chegaram a ser apontados,

em pesquisa de Ribeiro (2007) com a expressão “o sistema também não olha para o

outro lado da mesa”, demonstrando assim a necessidade de participação social dos

próprios profissionais de saúde para uma boa integração do sistema, principalmente,

no que se refere ao diálogo com gestores, atores sociais e outros profissionais, no

sentido de conhecer outras experiências e refletir sobre soluções para os problemas

sanitários encontrados.

As ações e intervenções instituídas de forma externa aos profissionais, muitas

vezes, podem perder sua pertinência, sendo muito mais difíceis de executar do que

aquelas que foram apropriadas como resultado da participação e reflexão dos

próprios agentes de saúde. Assim, do mesmo modo que a culpabilização individual

do discurso liberal pode situar a doença exclusivamente no indivíduo, ela é também

vivida pelos profissionais de saúde, quando colocados como únicos agentes

encarregados de executar uma tarefa que não foi decidida com sua participação,

mas cujos resultados serão considerados de sua responsabilidade.

A desconsideração da experiência dos profissionais de saúde, principalmente

os não-médicos, na relação cotidiana com a população, bem como os

procedimentos e recursos administrados de modo hierarquizado e desconsiderando

as necessidades apontadas pelos agentes de saúde no interior das instituições,

provocam entraves a uma gestão democrática e distanciam os profissionais de

saúde de uma vivência autônoma de seu trabalho. Nesse embate, as ações de

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saúde são muitas vezes impostas aos profissionais que se veem na necessidade de

implantá-las e adequar-se sem uma boa preparação para tanto, sem serem

considerados os seus próprios problemas no cotidiano de trabalho, sem reflexões e

avaliações profundas ou acompanhamento de resultados.

Tal conjuntura dificulta a compreensão da participação comunitária enquanto

eixo do sistema de saúde, já que a participação dos próprios agentes e profissionais

não é considerada. Assim, mesmo quando uma compreensão técnica ou teórica

poderia contribuir para a promoção de saúde, sua adoção no interior das instituições

é vivida com autoritarismo e arbitrariedade, o que mão apenas intensifica o

sofrimento das próprias equipes de saúde como também dificulta, na prática a

adoção de novas práticas e modelos. Num contexto em que o diálogo com a

consideração dos diversos pontos de vista sobre a gestão e o planejamento em

saúde não é favorecido, há mais obstáculos na transição para modelos de saúde

que considerem diversos saberes além do saber biológico já estabelecido – se nem

mesmo o saber dos profissionais de saúde é considerado, é difícil para os

profissionais considerarem os saberes locais da população. Desse modo, a pesquisa

de Ribeiro (2007) aponta a “dificuldade, vivenciada pela população que precisa de

cuidado e frequentemente reportada nas oficinas, de se estabelecer no Sistema

Único de Saúde uma perspectiva integral e integradora do paciente no atendimento”.

Além da dificuldade de compreender e estruturar a participação social como

fator importante para a transformação do modelo exclusivamente médico e técnico

para um paradigma mais abrangente da concepção de saúde, baseado na visão

biopsicossocial do ser humano, a ausência de transformações profundas na

formação de muitos profissionais, que abarquem uma visão integral e multidisciplinar

das questões de saúde, agrava o problema. Segundo ribeiro (2007), a formação de

muitos profissionais de saúde ainda possui um caráter fragmentário, que tende a ver

o paciente como objeto no qual se insere a doença, tratando o processo, e não a

pessoa. Além disso, muitas vezes essa compreensão fragmentária do paciente, visto

como um corpo ou um órgão doente, pode camuflar preconceitos e discriminações

referentes à orientação sexual, ao gênero ou à condição social, presentes, por

exemplo, na associação de muitos profissionais entre pobreza e higiene individual

precária, havendo mesmo, conforme Ribeiro (2007), “situações que resultaram na

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não detecção de doenças instaladas e na saída dos pacientes do SUS sem o devido

tratamento”.

Embora muitos desses problemas estejam presentes na saúde brasileira,

desde os anos 70, quando já críticas ao modelo de formação em saúde, o tema

permanece atual e presente no cotidiano do trabalho em saúde, exigindo e

fundamentando, de acordo com Ribeiro (2007), “as propostas da medicina integral

de revisão estrutural do ensino e da prática do modelo biomédico hegemônico, a

partir de uma concepção ampliada de saúde e da compreensão do adoecimento

como processo socialmente determinado”.

Tal fenômeno pode ser observado nas pesquisas sobre a implantação dos

Centros de Assistência Psicossocial em substituição ao modelo hospitalar em Saúde

Mental. Embora a proposta inicial vise a integração social dos usuários,

desenvolvendo uma abordagem terapêutica e preventiva e contrapondo-se ao

modelo de segregação, na prática, a lógica hospitalar muitas vezes acompanha a

implantação das instituições por estar presente na cultura de muitos profissionais de

saúde, nos próprios usuários e familiares e na hierarquia do próprio sistema de

gestão em saúde, transformando os CAPS em “hospitais na prática”, que, embora

não possuam internação, podem, por exemplo enfatizar a medicação em detrimento

das terapias e da elaboração de um projeto de vida.

O trabalho com a comunidade deve considerar seus espaços de socialização

e subjetivação como importantes espaços de atuação e basear-se na realidade

local, construindo um fazer consistente que parta dos recursos comunitários para a

promoção de bem-estar. Nesse sentido, é fundamental a constituição de estratégias

de investigação e conhecimento da comunidade, que podem se dar em conjunto

com a intervenção, voltando-se para a real necessidade da população em termos

de promoção da saúde, buscando uma desconstrução voltada para o social. Assim,

é preciso refletir e construir metodologias de interação com a comunidade,

analisando suas demandas, para a implantação de um programa eficiente de

atenção em saúde, considerando o acompanhamento da comunidade no longo

prazo, fomentando o autocuidado e práticas de vida comprometidas com a saúde.

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Nesse ínterim, o trabalho com famílias possui uma perspectiva própria,

enquanto acompanhamento multidisciplinar com múltiplas intervenções e ações que

se valem da dinâmica da família de modo transformador. O trabalho com famílias se

desenvolve pela compreensão multirelacional, tanto da dinâmica familiar quanto de

suas interações no contexto social e econômico mais amplo: redes de relações e

apoio fora do âmbito familiar, relações de trabalho de membros da família, outras

instituições que participam de seu cotidiano (escola, creche, associações de bairro e

instituições de saúde, entre outras). A família, enquanto importante espaço de

socialização e instituição de grande influência nos processos de subjetivação dos

indivíduos, mostra-se um foco tão importante de atenção e cuidado quanto o próprio

indivíduo alvo do atendimento em saúde.

As ações relacionadas à prevenção e saúde da família podem assim ser

consideradas como uma via de integração do usuário ao seu contexto de vida e de

promoção da autonomia e da cidadania. As intervenções preventivas nas quais se

estabelecem laços com a população, baseadas no acolhimento e oferecimento de

orientações e informações referentes ao funcionamento da assistência em saúde,

acesso à medicação, altas e encaminhamentos a centros de assistência em Saúde,

Justiça, lazer, convivência, entre outros, possibilitam o resgate de um pertencimento

social, no qual as necessidades de cada um, como cidadão, podem ser legitimadas.

É por meio desse resgate, do pertencimento social e do fortalecimento dos laços

com as instituições de saúde, que os usuários podem construir um sentido para sua

participação nas ações de saúde, tornando-a efetiva.

As pesquisas sobre a Estratégia Saúde da Família – ESF – identificam muitos

problemas a serem superados para sua efetiva implantação e para a resolutividade

de suas ações, bem como a reprodução de alguns obstáculos dos programas

tradicionais. Os principais problemas centram-se em aspectos como a falta de

experiência e formação multidisciplinar dos profissionais, a concepção tradicional da

estrutura familiar, a não fixação do médico na comunidade, o risco de invasão da

privacidade domiciliar, a dificuldade de perceber e lidar com a violência doméstica e

o descompromisso político com a proposta. A despeito dessas dificuldades, a

literatura aponta que a ESF alcançou alto grau de internalização social e aceitação

para a reorganização do cuidado em saúde e que a vinculação territorial na

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identificação de problemas e na proposição de soluções constitui um caminho

pertinente e efetivo para a construção de programas de saúde. É na concretude que

assumem as dificuldades no território, vivido como local de moradia, de trabalho, ou

como comunidade, que ocorre a transversalidade dos problemas, das distintas

identidades sociais e das políticas de saúde.

Para possibilitar a discussão e transformação de atitudes perante situações

de atenção ao bem-estar físico, psíquico e social dos usuários, a educação em

saúde deve considerar as informações que a comunidade traz, valorizando os

conteúdos expressos de modo explícito ou velado e respeitando os caminhos e

soluções presentes na experiência da população. Muitas vezes, alguns

procedimentos não são possíveis por falta de possibilidades financeiras, por

inadequação às circunstâncias familiares ou outras razões, e será preciso buscar

soluções alternativas. A discussão e percepção de valores, referências e relações,

bem como a abertura de espaços de expressão dos usuários, permite encontrar

recursos pertinentes, que muitas vezes não são reconhecidos por não serem os

tradicionais. Porém, esses recursos podem criar novas estratégias para o

aprimoramento das ações em saúde de modo articulado à experiência comunitária,

o que facilita a adesão às propostas.

A realização de grupos de educação em saúde abertos à comunidade pode

possibilitar a discussão em torno da promoção de bem-estar, articulando de modo

mais amplo o trabalho de atendimento realizado pela unidade de saúde e

prevenindo o desenvolvimento de demandas ainda em seu início, de modo simples e

otimizado. Esses grupos devem ter realização periódica, envolvendo o diálogo

aberto sobre questões de saúde da comunidade. Tais objetivos podem ser

alcançados através de uma ampla gama de instrumentos interventivos. Segundo

Mairesse e Fonseca (2002), atividades como a cartografia, da área de abrangência

da instituição de saúde, visitas domiciliares às famílias e visitas a instituições e

órgãos de direitos de cidadania da comunidade e a fromação de uma rede de apoio

em saúde, podem articular a atuação entre os serviços de saúde e a comunidade,

permitindo uma integração entre as diversas ações sociais e a população.

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A cartografia da comunidade e do núcleo familiar constitui um importante

método clínico, que permite reconhecer relações, compreensões e percepções da

família, buscando vias de passagem e construção de soluções. Pode-se, assim, de

acordo com Szymanski (2004), partindo da intervenção e escuta clínica dos

problemas relativos a certo tema, resgatar recursos negados socialmente. A enquete

clínica, apresentada por Lévy (2001), por sua vez, permite conhecer profundamente

vivências e representações sociais de grupos e indivíduos, sendo útil na

investigação de obstáculos, facilitações e motivações da família para a aderência às

ações em saúde.

As visitas familiares são um instrumento fundamental para o conhecimento da

população e o reconhecimento de suas reais necessidades em saúde. O diálogo em

situações de doença ou conflito exige atenção do profissional para perceber

sentimentos e articulações de sentido que o grupo manifesta. Por outro lado, a

consideração dos recursos e discursos da família e da comunidade, bem como de

parâmetros e crenças, sobre os quais deve trabalhar o profissional, permite o

planejamento pertinente do trabalho, além do engajamento e participação da

população nas ações de saúde. Desse modo, as visitas domiciliares podem atuar de

forma múltipla, como investigação e cartografia em saúde da região, na educação

primária em saúde, atuando na formação de multiplicadores e na vinculação da

população ao atendimento em atenção primária. As visitas familiares poderão ser

realizadas por psicólogos e assistentes sociais, a fim de compreender as condições

psico-sociais em que vivem as famílias.

Já as visitas a outras instituições visam integrar a atenção primária em saúde

aos diversos órgãos e instituições de assistência à cidadania (conselhos tutelares,

associações de bairro, conselhos de saúde, abrigos, etc.), de modo a promover

ações coletivas, bem como articular ações em que se mostre a necessidade de

atuação conjunta. Realizadas conforme a necessidade do cotidiano de atenção

primária ou de tais instituições, podendo ocorrer ainda a visita de membros desses

órgãos à instituição de saúde e o desenvolvimento de ações de saúde no médio e

longo prazo. Tais visitas também permitem a formação de uma rede de apoio em

saúde, com o cadastro dos serviços de saúde disponíveis à comunidade e a

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manutenção do contato com profissionais de referência em cada instituição, de

modo a agilizar os encaminhamentos e garantir o atendimento efetivo da população.

Outra importante metodologia em saúde são as reuniões de equipe

multidisciplinar e supervisões abertas à equipe de saúde, que visam promover a

integração dos agentes de saúde primária, bem como o aprimoramento profissional

e a discussão coletiva das ações em saúde, e desse modo, deve ser uma atividade

periódica e aberta a todos os profissionais das equipes de saúde. A partir da

discussão conjunta, pode-se formar um corpo integrado de trabalho, no qual o

diálogo acerca das diversas experiências possibilita a articulação de um

conhecimento autoapropriado e específico ao contexto no qual se desenrola. Além

disso, a integração dos profissionais intensifica o processo de formação da rede de

encaminhamentos em saúde de modo a agilizar as transferências de serviços,

quando necessárias.

Essas metodologias podem também auxiliar na elaboração de programas

específicos, de acordo com os problemas e temas de saúde mais relevantes no

contexto de uma comunidade, tais como grupos de discussão sobre educação em

saúde, grupos de orientação sobre problemas de saúde específicos, como saúde

mental, violência física e sexual na infância, programas preventivos e grupos de

discussão sobre doenças endêmicas, campanhas de esclarecimento sobre DSTs,

programas individualizados de reabilitação psicossocial e de apoio à integração

social, encaminhamento acompanhado a outras instituições de saúde, etc.

Paralelamente às modalidades e estratégias de ação em saúde, é também

importante o incentivo do desenvolvimento de grupos de ajuda mútua e associações

familiares, possibilitando a constituição de redes comunitárias de apoio que atuem

no nível profilático e legitimando as ações coletivas de participação social.

As estratégias de atuação comunitária e participação popular representam,

assim uma oportunidade para a gestão governamental trabalhar o direito à saúde

articulada ao exercício mais amplo da cidadania, por meio da construção e do apoio

ao debate e às reflexões coletivas, que permitem traçar alternativas políticas e

programáticas contextualizadas e articuladas a outras instituições e setores de

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direitos de cidadania, vinculando as ações de saúde ao exercício do direito à vida e

ao amparo em circunstâncias de doença e morte.

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UNIDADE 5 - CAPITALISMO E SAÚDE PRIVADA: AS AÇÕES

EM SAÚDE NO SISTEMA PRODUTIVO

De acordo com Eibenschutz (1995), na América Latina, a privatização setorial

foi considerada como um dos fatos mais característicos na evolução recente dos

sistemas de saúde. Essas modificações são resultado da disseminação de políticas

neoliberais que buscavam o ajuste financeiro do Estado, criando paradigmas de

reforma da Seguridade Social baseados na diminuição do investimento público e das

ações de Estado na área social. Esse contexto também gerou modificações na

organização dos serviços privados de saúde, alterando as características da gestão,

as tecnologias utilizadas e os modos de financiamento na produção de serviços. Em

muitos países da região, o setor privado passou a ser hegemônico, deslocando o

setor público para um segundo plano.

De modo concomitante a esse processo, o modelo médico, anteriormente

baseado na clínica liberal, em que o médico centralizava as funções de saúde,

exercendo a profissão como profissional liberal, passou cada vez mais a se

organizar em torno de instituições privadas que vendem uma gama de produtos de

saúde no formato securitário. Desse modo, o médico e outros profissionais de saúde

passam a ser, em sua maioria, trabalhadores ou servidores autônomos de empresas

capitalistas prestadoras de serviços em saúde. Esse processo também favoreceu as

empresas de saúde, tornando o modelo de convênios e seguros de saúde

praticamente hegemônico no setor privado.

Segundo Braga e Goes de Paula (1981), no Brasil, o setor privado tem

desempenhado papel relevante na prestação de serviços de saúde nas últimas três

décadas. Nos anos 60 e 70, verificou-se expansão das empresas médicas

lucrativas, financiadas fundamentalmente com recursos públicos, o que

correspondeu a um processo de capitalização setorial. De acordo com Eibenschutz

(1995), a expansão do setor privado em saúde tem ocorrido tanto na Argentina,

Chile e México (quanto em países europeus e asiáticos). Na América Latina, esse

fenômeno vem sendo patrocinado pelo Estado de duas formas: diretamente, seja

por meio de legislação específica protetora das seguradoras, seja através do

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financiamento público de planos de saúde privados para trabalhadores, e

indiretamente, em decorrência das políticas de ajuste neoliberais que têm asfixiado o

setor público nesses países.

No caso brasileiro, a legislação define a responsabilidade pública pela saúde

da população no artigo 196 da Constituição Federal de 1988. Ao mesmo tempo, o

artigo 199 garante espaço para empresas privadas, afirmando que "a assistência à

saúde é livre à iniciativa privada". Porém, a constituição sujeita o setor ao controle e

fiscalização do Estado, já que a saúde é considerada uma área de 'relevância

pública' (art. 197), ou seja, com exceção das deduções do imposto de renda de

despesas privadas com saúde, não há um favorecimento do setor privado na

legislação específica da saúde em vigor. Esse favorecimento ocorre, outrossim,

pelas características da administração estatal na área da saúde pública, que não

permite um atendimento de qualidade a toda população, levando grande parcela

desta a utilizar serviços privados.

Em geral, segundo Noronha e Ugá (1995), a análise da questão da saúde

centra-se no debate sobre as características de gestão, financiamento e controle

que ele deveria assumir. Alguns autores consideram que o setor privado é um

obstáculo a ser superado e o progresso do sistema de saúde implica o

gerenciamento público de todo setor, que deve ser buscado por meio do

aprimoramento dos princípios da Reforma Sanitária. Já outros autores, analisam que

o sistema público não tem condições de garantir a mesma eficiência do sistema

privado e que os custos com a saúde de todos os cidadãos seriam um ônus

demasiado para o Estado e, portanto, este deveria se responsabilizar apenas pela

saúde da população mais pobre num plano privado de saúde. Essas ideias estão

presentes no debate político sobre o tema, em que representantes da sociedade civil

defendem o sistema público e representantes das empresas defendem o sistema

privado. A experiência de outros países pode contribuir para a análise das

implicações de cada sistema. Dentre os países desenvolvidos, os Estados Unidos

tornaram-se referência de um sistema de saúde inteiramente baseado pelo setor

privado, tendo como modelo o seguro saúde stricto sensu. O sistema americano tem

sido criticado em diversos trabalhos como excludente e pouco eficiente.

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Vários países da Europa oriental e central, como Rússia, Bulgária, Polônia,

Tchecoslováquia, passaram por reformas recentes em seus sistemas de saúde,

visando introduzir o sistema de seguro saúde privada. De acordo com Banoob

(1994), as rápidas privatizações do sistema sanitário demonstraram um

desempenho inferior dos indicadores de saúde quando comparados a sistemas

geridos pelo Estado, como os da Alemanha, França e Bélgica, mesmo havendo um

elevado número de médicos e leitos/habitante. Nos países da Europa ocidental, a

saúde é inteiramente administrada pelo Estado, embora possa haver uma parcela de

contribuição individual da população, como é o caso da França.

De acordo com Angus et al. (1995), a experiência de Quebec também aponta

para a possibilidade de boa organização de um sistema inteiramente administrado e

financiado pelo Estado por meio do seguro saúde pública. Mesmo havendo no

Canadá uma pressão para reformas de Estado e a criação de um sistema privado,

principalmente oriunda da classe médica, a maioria da população apóia a

manutenção exclusiva do sistema público, diversos indicadores de saúde mostram a

eficiência do sistema e várias propostas buscam introduzir novas formas de

prestação dos serviços que aumentem a eficiência, diminuam custos e reestruturem

a forma de remuneração dos serviços.

No entanto, a convivência de um sistema de saúde universal com coberturas

privadas, divididas conforme critérios de status sócio-ocupacional, torna o sistema

de saúde brasileiro diferente, tanto de sistemas orientados predominantemente pelo

mercado, quanto daqueles baseados no financiamento público. Como no Brasil

dominam formas híbridas de organização da saúde, faltam argumentações que

discutam as fronteiras nas relações entre os dois sistemas. Por exemplo, a ideia de

que o setor privado diminui os gastos do setor público, pode ser refutada quando se

atenta para a utilização de fontes públicas de financiamento pelos planos de saúde,

para a utilização, por clientes de planos, de instalações, recursos físicos e humanos

constituídos e reproduzidos com dinheiro público e para as franquias para que

dirigentes de empresas privadas assumam cargos públicos. As políticas de saúde

precisam assim ser examinadas em seu conjunto, pois constituem uma relação

híbrida e competitiva de financiamento e regulação que organiza simultaneamente o

SUS e o mercado privado.

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No contexto brasileiro, as principais modalidades privadas de saúde são a

medicina de grupo e o seguro saúde stricto sensu, a composição do campo da

prestação de serviços, no que se refere a gastos, número de beneficiários, porte,

entre outros aspectos, demonstra uma atuação do setor privado bastante diversa da

atuação pública. Analisando esse panorama da saúde, estudo de Silva et al. (1997)

mostra que a grande maioria das instituições de saúde de Salvador possui finalidade

lucrativa (86,2%) e centra-se no atendimento ambulatorial (95,4%), com pouco

investimento na assistência a casos mais graves e de maior custo: apenas 21,8%

oferecem leitos para internação e 32,9% dos serviços oferecem atendimento de

urgência. Desse modo, os serviços estudados demonstram o direcionamento dos

serviços privados para os setores nos quais as chances de lucro são maiores e que

seriam menos onerosos para o Estado. Além disso, uma boa parcela dos

estabelecimentos (36,5%) é conveniada ao SUS, sendo que em 24,7% do total de

empresas, a participação do SUS corresponde a uma proporção na assistência

maior que 50% do total. Esses dados contradizem a argumentação de que os

investimentos privados em saúde servem de suporte a um menor investimento

governamental na área. Além disso, os seguros privados de saúde apresentam uma

distribuição mais ampla de gastos, pois as companhias de seguro privado, além dos

custos administrativos e marketing, também auferem lucros. Por isso, o custo do

prêmio do seguro tem que ser maior que o custo efetivo com possíveis cuidados de

saúde que o segurado venha a necessitar. Ou seja, os segurados arcam com outras

despesas, além daquelas relacionadas com cuidados de saúde, que concordam em

pagar para se garantirem contra a possibilidade de incorrer em grandes perdas

financeiras em caso de doença.

Um outro fator importante para a caracterização dos serviços privados de

saúde é a proporção de convênios de empresas em comparação com o seguro

saúde stricto sensu (individual ou familiar), revelando que apenas uma pequena

proporção da saúde brasileira opera com base em planos individuais de saúde, o

que pode ser explicado pelo elevado custo que este tipo de convênio representa

para a maioria da população, o que torna inevitável a organização da maioria dos

serviços de saúde de modo coletivo, seja na forma de planos privados seja no uso

dos serviços públicos. Mesmo considerando esses convênios, é importante ressaltar

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que o crescimento da saúde privada foi concomitante ao processo neoliberal de

diminuição do investimento público na área social, que no Brasil ocorreu a partir do

governo Collor (1990-1994) e continuou no governo Fernando Henrique Cardoso

(1994-2002). Como apontam Silva et al.:

a expansão deste segmento da atenção à saúde parece relacionar-se fundamentalmente com o colapso do financiamento público setorial verificado a partir de 1989 (Medici, 1994 e 1995). A deterioração progressiva dos serviços públicos acentuou o deslocamento da clientela usuária do SUS para as diversas modalidades de seguro privado. Esse movimento de mercantilização dos serviços de saúde vem sendo promovido pelo Estado através do desfinanciamento da seguridade social, quer diretamente através do corte nos gastos públicos, quer indiretamente através da política salarial e de emprego (SILVA et al., 1997, p.708)

Além dos problemas relacionados ao crescimento desordenado do mercado

de saúde, algumas especificidades do setor merecem ser analisadas ao se

considerar os serviços de saúde nos moldes do mercado capitalista. Segundo

Castro (2002), o processo ideal de organização do mercado capitalista, o

consumidor, dotado de informações completas e abrangentes sobre os produtos e

serviços disponíveis no mercado, escolhe livremente entre pequenas empresas que

competem em situação de igualdade, sem poder para influenciar o mercado. Nesse

contexto, a opção do consumidor será influenciada por fatores como o custo dos

serviços e sua qualidade. Quando há elementos que interferem nas condições de

perfeita concorrência, pode haver as denominadas “falhas de mercado”, que

comprometem o sistema. No caso do setor de saúde, muitas das particularidades de

sua organização suscitam essas falhas, tornando justificável e inevitável a

intervenção do Estado para alcançar a otimização na alocação e na distribuição dos

recursos, já que, conforme Donaldson e Gerard (1993), “nenhuma das condições de

perfeita competição está presente”.

As falhas mais comuns no mercado de saúde são as deseconomias de

escala, a seleção adversa e o risco moral. A economia de escala ocorre quando a

maior produção garante a diminuição no custo por unidade de produto, embora

exista a desvantagem de diminuição da concorrência, o que pode resultar numa

tendência à formação de monopólios que determinem determinar sozinhos o preço

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do mercado. O processo contrário ocorre no mercado de seguro-saúde: a

deseconomia de escala, em que diversas pequenas companhias competem entre si,

cada qual com custos diferentes, aumentando o custo final do seguro-saúde para o

consumidor.

A falha que ocorre no processo de seleção adversa leva à exclusão de certos

grupos do acesso ao seguro-saúde. Num mercado de competição perfeita, as

companhias de seguro não possuem informações sobre os riscos de saúde para

cada potencial consumidor e calculam o valor do seguro a partir de uma estimativa

média de risco. Porém, o consumidor, conhecendo suas condições de saúde,

escolhe não participar do seguro ao perceber que seu risco é menor do que o risco

médio, o que encarece o seguro para os que nele permanecem, já que a média de

risco aumenta. Assim, pode ocorrer um ciclo vicioso em que aqueles que possuem

menor risco do que a média tendem a sair do seguro e encarecê-lo para aqueles

que permanecem.

Para contornar esse processo, as companhias criam questionários de risco,

baseados em estatísticas médias, que calculam os riscos individuais considerando

história pessoal e familiar, idade, região de moradia, entre outros, cobrando valores

diferentes para cada indivíduo. O aumento do valor do prêmio entre os indivíduos de

maior risco (crônicos, idosos) dificulta e até mesmo impede sua participação no

seguro. Desse modo, ocorre a exclusão de dois grupos: os indivíduos de baixo risco,

que optam por sair do seguro, e aqueles de alto risco, que não podem arcar com as

despesas do seguro calculado com base no risco individual. No contexto atual da

saúde, em que diversos processos e inovações tecnológicas tornaram mais caro o

tratamento, isso significou, muitas vezes, o aumento dos custos de planos de saúde,

especialmente para os idosos.

O "risco moral" ocorre quando há tendência a ocorrer um excesso de

demanda quando as despesas são completamente cobertas, seja no seguro privado

ou no público. Nesses casos, o consumidor (paciente) e o produtor da demanda

(médico e profissionais de saúde) mudam sua avaliação em relação à utilização dos

cuidados em saúde com base na garantia da cobertura de despesas. Por exemplo, o

paciente pode estender os cuidados de saúde para além do necessário na

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prevenção e manutenção habitual de sua condição saudável ou, ao contrário,

preocupar-se menos com a possibilidade de ficar doente, cuidando menos de sua

saúde e aumentando os riscos de adoecer.

Do mesmo modo, um médico pode marcar mais consultas do que faria

habitualmente ou pedir uma gama maior de exames, se esses fossem

absolutamente necessários, já que o paciente poderá se utilizar livremente dos

serviços de saúde. Isso ocorre tanto por haver uma avaliação mais distante dos

custos, que não afetam diretamente o paciente, quanto porque certos sistemas

adotam o mecanismo de pagamento por procedimento, o que torna financeiramente

vantajoso para instituições e profissionais de saúde a produção de um grande

volume de demandas (exames, medicamentos, consultas, etc.). E, também, porque

o médico atua em duas posições: do lado da demanda e do lado da oferta dos

serviços de saúde. Por um lado, ele produz a demanda enquanto agente do

paciente, que possui a informação sobre aquilo que o paciente-consumidor deverá

consumir, já que este não possui formação suficiente para realizar essa avaliação

sozinho. Por outro lado, é também o médico que presta o serviço e recebe por ele,

sendo de seu interesse financeiro o consumo de seu serviço pelo paciente. Como,

além disso, as despesas serão pagas por um terceiro agente, a avaliação do custo

para o paciente (na forma de seguro-saúde ou impostos) é muito indireta,

dificultando para que médico e paciente moderem no consumo.

Desse modo, a falha de mercado presente no sistema de saúde consiste na

diferença do grau de informação entre o consumidor (paciente) e o produtor da

demanda (médico). Como não é possível comprar no mercado de saúde a melhoria

da condição de saúde, o consumidor na verdade compra cuidados de saúde

baseados no conhecimento que o médico (produtor) detém. São os procedimentos

baseados nesse conhecimento que possibilitarão a melhoria da saúde, o que

significa que o mercado não informa plenamente o consumidor sobre a relação entre

determinada ação e o seu futuro estado de saúde. O consumidor dependerá do

médico que o orientará a optar por determinado cuidado, o que coloca o médico na

posição de agente, produzindo a oferta e orientando o consumo da demanda.

Devido a essa posição dupla, os médicos podem elevar o volume de cuidados para

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aumentar os custos e a consequente remuneração ou prescrever cuidados

inapropriados se houver efeitos no sistema de remuneração.

Dessa maneira, mesmo em sistemas privados, é necessário que o Estado

intervenha, regulamentando o mercado, seja no estabelecimento de barreiras na

oferta (por exemplo, regulamentação e controle dos licenciamentos para atuação

profissional, restrições no número de consultas, exames, natureza das patologias

assistidas, etc), seja no estabelecimento de regras quanto à informação dos

serviços, à orientação de tratamentos e à sanção profissional em caso de

descumprimento. Além disso, do ponto de vista da implementação dos preceitos

constitucionais relacionados com a organização de um Sistema Único de Saúde, o

crescimento desordenado de estabelecimentos prestadores de serviços entra em

contradição com as necessidades da planificação voltada para a resolução de

problemas de saúde. Entre analistas de sistemas de saúde, é reconhecida a

importância do papel do Estado na regulação e no financiamento das ações de

saúde para assegurar tanto a eficácia, quanto a equidade. Mesmo quando não se

trata de excluir o produtor privado da prestação de serviços, é necessário

regulamentá-lo e controlar a sua qualidade.

Atividade Complementar

Leia a seguir o texto extraído do artigo “Família em situação de risco e sua

inserção no programa de saúde da família: uma reflexão necessária à prática

profissional”, de Darielli Gindri RestaI e Maria da Graça Corso MottaII , publicado

na revista científica Texto e Contexto – Enfermagem, que discute participação e

vulnerabilidade no Programa de Saúde da Família. A seguir, elabore uma reflexão

baseada no texto, que articule suas ideias ao processo de formação do SUS.

A reflexão sobre a temática da família e sua inserção no cuidado à saúde

proporcionado pelo Programa de Saúde da Família (PSF) é uma oportunidade de

se buscar alternativas que aproximem os profissionais de saúde do núcleo

familiar. As famílias possuem muitas fragilidades e susceptibilidades, levando-as

a apresentarem diferentes necessidades de saúde; suas diversas

vulnerabilidades e riscos que caracterizam-nas, concomitantemente, como

singulares e plurais. O PSF surge como uma possibilidade de se visualizar a

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família como parte do processo de reorientação do modelo de saúde, buscando

construir ações de saúde a partir de seu contexto e necessidades. (...).

A atividade de cuidar das famílias em seus contextos de vida, e de forma

coerente com suas necessidades, possibilita a visualização de muitos aspectos

que as tornam vulneráveis, permitindo que sejam evidenciadas características

importantes para o cuidado de saúde, assim como as diferentes situações de

risco que determinada família possa estar vivendo. O PSF vem com a proposta de

aproximar os profissionais destes conhecimentos e criar as oportunidades para

que as famílias, que vivem em situações de risco possam receber e, também,

construir o cuidado congruente com a necessidade sentida. (...)

A partir do vivido na prática, surgem algumas reflexões (...). É evidente

que, para muitos destes questionamentos não existem respostas fáceis e

totalmente corretas, mas pressupõe-se ser fundamental para o planejamento da

equipe de saúde refletir e (re)planejar suas ações com base na família (...) a partir

da interação entre famílias e profissionais, ocorre a construção do saber/fazer em

saúde, possibilitando a equipe de PSF extrair a riqueza dos aprendizados

decorridos do planejamento coletivo das ações de saúde. Nesse encontro são

fortalecidos os caminhos para a construção do novo paradigma de saúde,

criando-se um espaço para a participação da família.

(...) O compartilhamento de saberes e tarefas, voltados para a perspectiva

de se diminuir os riscos enfrentados pelos sujeitos, bem como a (in)visibilidade

das diferentes vulnerabilidades, podem constituir-se em uma atividade e uma

alternativa no caminho de muitos profissionais e usuários para se construir um

novo olhar da saúde.

(...) O PSF propõe uma nova dinâmica para a estruturação dos serviços de

saúde na comunidade e entre os diversos níveis de complexidade assistencial.

Assume o compromisso de prestar assistência universal, integral, equânime,

contínua e acima de tudo resolutiva à população na unidade de saúde e no

domicílio, sempre de acordo com suas reais necessidades, identificando os

fatores de risco aos quais ela está exposta e neles intervindo de forma

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apropriada.

Nessa direção, o PSF (...) se caracteriza por um modelo centrado no

usuário, dentro de seu contexto de vida, enfocando, prioritariamente, a família

como sujeito de ação, com diferentes potenciais e necessidades. Tal proposta

demanda da equipe a incorporação de discussões acerca da família, da

necessidade de se planejar as atividades em saúde com base nas experiências,

nos contextos de vida dos sujeitos e nos saberes familiares.

(...) Em decorrência disso, as ações em saúde precisam ser pensadas com

base na família, no intuito de se conhecer o que ela sabe e pratica em relação ao

cuidado de seus membros. Esse exercício (...) é um desafio para os profissionais,

uma vez que esta abordagem contextualizada do cuidado exige uma formação

profissional pautada neste paradigma. Observa-se, frequentemente, que a

formação desses profissionais, por vezes é dicotomizada e compartimentalizada,

tornando-os mecanicistas e biologicistas, visualizando o indivíduo como objeto de

seu saber. Essas concepções são fortalecidas em determinados ambientes de

trabalho quando os profissionais de saúde se deparam com o modelo

hegemônico que foge da perspectiva da família e do coletivo socioeconômico-

cultural.

Em um estudo desenvolvido na intenção de se conhecer os modos de

cuidado da enfermagem com famílias, pôde-se constatar que já existe uma certa

articulação entre as estratégias do Ministério da Saúde e os projetos pedagógicos

dos cursos de graduação. Evidenciou-se, também, a compreensão do conceito de

saúde como qualidade de vida, a interdisciplinaridade, o desenvolvimento de

ações sociais através da participação das pessoas, famílias e comunidades, entre

outros. Nesse sentido, a família vem conquistando espaços nas ações de cuidado

dos profissionais de saúde, com necessidades de cuidá-las em todas as situações

de risco.

(...) O principal desafio do profissional que atua em PSF é refletir com sua

equipe as concepções acerca do que é família, qual a contribuição da mesma

diante do trabalho da equipe, e como ela se organiza no cuidado a seus

membros. Ao conhecer essas particularidades, o profissional aproxima-se mais da

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família com um vínculo intenso e com a liberdade de intervir no processo

saúde/doença. Também, a partir desse conhecimento, pode evidenciar as

diferentes situações de risco enfrentadas pelas famílias e traçar estratégias de

cuidado à saúde.

(...) Nesse processo de conhecimento da família, o profissional precisa ter

uma visão das relações que a família mantém com vizinhos e demais parentes. A

rede de suporte social, mantida pela família, é evidenciada, principalmente,

quando as famílias estão passando por algum momento difícil com seus membros

ou quando estão vivendo uma situação de risco. O cuidado familiar é enriquecido

pelas relações sociais formadas por parentes, amigos e vizinhos. Para as famílias

em situação de crise e, mesmo no cotidiano da vida familiar, as pessoas próximas

e significativas desenvolvem um papel importante oferecendo ajuda em várias

situações.

As famílias acompanham o crescimento e desenvolvimento dos seus

integrantes durante as suas diferentes etapas evolutivas. Por meio do cuidado

familiar, os saberes são compartilhados entre os membros na busca de propiciar

um ambiente educativo que problematize as dúvidas e as curiosidades próprias

da vida humana. A interação da equipe do PSF com esses aprendizados vividos

no mundo familiar permite o agir adequado em relação às situações de cada

contexto e evidencia os diferentes riscos que perpassam o universo familiar. A

experiência de cada família é singular e indica diferentes possibilidades no

cuidado à saúde, pois os riscos enfrentados adquirem contornos e significados de

acordo com a visão do grupo familiar.

(...) A ênfase a diversidades cultural de cada contexto familiar e as

diferentes percepções acerca do processo saúde/doença é uma tarefa necessária

frente aos avanços almejados pelos profissionais de saúde que desejam trabalhar

com um novo modelo de saúde. Essa reflexão precisa ultrapassar os limites de

uma abordagem linear e trazer para a discussão uma abordagem circular em que

todos se sintam sujeitos e interajam da mesma maneira e na mesma intensidade.

Por muitas vezes os profissionais da saúde integram as atividades de

trabalho com condutas fragmentadas que desfavorecem o crescimento e o

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desenvolvimento de um novo modelo de saúde, pautado em um cuidar coletivo e

comprometido com a construção de uma sociedade melhor. Com a vivência

diária, cada vez mais, percebe-se que o trabalho com famílias não é uma

metodologia que se encontra pronta, mas está se construindo nas ações

cotidianas por meio da pluralidade e das possibilidades que são mostradas no

convívio familiar, elucidando-se as diferentes situações de risco.

(...) Para isso, é necessária uma constante capacitação dos profissionais

no intuito de provocar uma reflexão acerca das múltiplas faces do cuidado e suas

repercussões no mundo familiar. Desse modo, é preciso que os mesmos

compreendam a família como unidade de cuidado de seus membros, assumindo

importante papel na construção e efetivação do novo paradigma de saúde.

Nessa direção, é fundamental que a formação dos profissionais de saúde

crie espaços para a discussão e a vivência com famílias, instigando-os com

inquietações e reflexões, impulsionadas no decorrer da graduação, o que talvez

permita um avanço significativo na luta por melhores estratégias de ações em

saúde, considerando uma melhor compreensão da relação saúde-doença na

realidade de cada família.

Outro aspecto de destaque nesse processo trata da compreensão das

diferenças culturais, dos valores e das práticas de cada grupo familiar. As ações

de cuidado devem estar conectadas à realidade vivida pelas famílias, focalizando

as reais necessidades enfrentadas por elas. Assim, o profissional precisa

conhecer a família em todas as suas dimensões, mantendo fortalecido o vínculo

de confiança, de forma a permitir a troca de conhecimentos e práticas de cuidado

que contemplem as características esperadas na construção de um novo modelo

de saúde. É importante, também, evidenciar as diferentes situações que expõem

as famílias a circunstâncias de risco. O conhecimento dessas situações por parte

dos profissionais de saúde é uma ferramenta imprescindível para traçar as ações

de cuidado que visualize as diversas manifestações de risco.

(...) A reflexão e a instrumentalização permitem a percepção de que a

família deve ser entendida como um todo e com diversas possibilidades de

experimentar situações de risco. (...). A reflexão sobre a inserção da família na

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prática dos profissionais do PSF pode provocar um encontro dessas esferas que

evidenciem as diversas possibilidades, necessidades e riscos vividos pelas

famílias. Nesse encontro as alternativas de cuidado ganham cores e contornos

diversos. Assim, é válido enfatizar que todos se deixem encantar pela curiosidade

de conhecer o mundo familiar e ter a oportunidade de (re)significar as práticas de

cuidado à saúde.

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