Guia de estudos - O Lugar da Africa na PEB

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O Lugar da África na Política Externa Brasileira Introdução ao problema: A política externa brasileira em relação à África tem tido várias mudanças desde as primeiras iniciativas brasileiras de se aproximar do continente africano. A evolução da inclusão africana na agenda brasileira aconteceu de forma gradativa e foi acompanhada pela crescente importância da África nas relações internacionais desde o começo das descolonizações no continente após a Segunda Guerra Mundial. A construção dos novos Estados Independentes na África criou condições favoráveis para que o Brasil buscasse, cada vez mais, relações diretas com o continente africano (SARAIVA, 1996). Histórico das relações diplomáticas entre Brasil e África: A iniciativa de aumentar as linhas de cooperação entre Brasil e África originou- se no começo dos anos 60 com o governo de Jânio Quadros sob a Política Externa Independente – PEI –, a qual procurou promover uma abertura brasileira maior para a África (VARGEM, 2008). Todavia, com o golpe de 1964, os moldes da política brasileira para com a África tomaram novas delineações mais baseadas na geopolítica da Guerra Fria. Foi somente com o segundo governo da ditadura militar que a política africana do Brasil foi redefinida em padrões semelhantes aos da PEI (SARAIVA, 1996). Entre os anos de 1967 e 1979, a política africana do Brasil viveu seus “anos dourados” (SARAIVA, 1996, p. 128) e teve cinco características principais: expansão capitalista e modernização econômica; procura de novos mercados; influência pacífica no Atlântico; manutenção da ideia de identidade cultural comum entre Brasil e África; e busca de decisões próprias, diferentes das de Portugal, dentro das relações com os países africanos. A década de 1980, entretanto, trouxe mais cautela nas relações entre Brasil e África devido à fragilidade econômica de ambos. Foi nesse período, porém, que as representações diplomáticas do Brasil no continente africano se estenderam a 45 países com a construção de 21 novas embaixadas (SARAIVA, 1996). Contudo, nos década de 1990, ocorreu um notável declínio nas relações entre Brasil e África. O Brasil optou por seguir três linhas diplomáticas diferentes neste período: reforçar a cooperação com África do Sul e com Angola, em detrimento de uma política continental; retomar a operacionalização da Zona de Paz e Cooperação do

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O Lugar da África na Política Externa Brasileira

Introdução ao problema:

A política externa brasileira em relação à África tem tido várias mudanças desde

as primeiras iniciativas brasileiras de se aproximar do continente africano. A evolução

da inclusão africana na agenda brasileira aconteceu de forma gradativa e foi

acompanhada pela crescente importância da África nas relações internacionais desde o

começo das descolonizações no continente após a Segunda Guerra Mundial. A

construção dos novos Estados Independentes na África criou condições favoráveis para

que o Brasil buscasse, cada vez mais, relações diretas com o continente africano

(SARAIVA, 1996).

Histórico das relações diplomáticas entre Brasil e África:

A iniciativa de aumentar as linhas de cooperação entre Brasil e África originou-

se no começo dos anos 60 com o governo de Jânio Quadros sob a Política Externa

Independente – PEI –, a qual procurou promover uma abertura brasileira maior para a

África (VARGEM, 2008). Todavia, com o golpe de 1964, os moldes da política

brasileira para com a África tomaram novas delineações mais baseadas na geopolítica

da Guerra Fria. Foi somente com o segundo governo da ditadura militar que a política

africana do Brasil foi redefinida em padrões semelhantes aos da PEI (SARAIVA, 1996).

Entre os anos de 1967 e 1979, a política africana do Brasil viveu seus “anos

dourados” (SARAIVA, 1996, p. 128) e teve cinco características principais: expansão

capitalista e modernização econômica; procura de novos mercados; influência pacífica

no Atlântico; manutenção da ideia de identidade cultural comum entre Brasil e África; e

busca de decisões próprias, diferentes das de Portugal, dentro das relações com os

países africanos. A década de 1980, entretanto, trouxe mais cautela nas relações entre

Brasil e África devido à fragilidade econômica de ambos. Foi nesse período, porém, que

as representações diplomáticas do Brasil no continente africano se estenderam a 45

países com a construção de 21 novas embaixadas (SARAIVA, 1996).

Contudo, nos década de 1990, ocorreu um notável declínio nas relações entre

Brasil e África. O Brasil optou por seguir três linhas diplomáticas diferentes neste

período: reforçar a cooperação com África do Sul e com Angola, em detrimento de uma

política continental; retomar a operacionalização da Zona de Paz e Cooperação do

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Atlântico Sul; e a criação da Comunidade dos Países da Língua Portuguesa.

(SARAIVA, 1996). Todavia, no governo de Fernando Henrique Cardoso, a atuação no

Mercosul foi priorizada e vários postos e embaixadas na África foram fechadas. Ao

passo que, no atual governo Lula, a cooperação no âmbito Sul-Sul tem tomado novos

rumos, principalmente em relação ao continente africano (VARGEM, 2008).

Posição do Brasil:

O Brasil sob o governo Lula busca uma maior integração sul-americana com a

África e tem procurado criar políticas de aprofundamento e fortalecimento do diálogo

político e da integração econômica entre Brasil e África. A diversidade da atuação do

Brasil, nesses últimos anos, tem se mostrado nas diversas linhas de cooperação com os

países do continente africano. Além disso, doze novas embaixadas brasileiras foram

inauguradas na região e o número de missões diplomáticas africanas em Brasília passou

de 16 (em 2003) para 24 (CAMPOS, 2008).

Na área da saúde o Brasil tem atuado em diversos países africanos no combate à

malária; em parcerias para o tratamento da AIDS; e em fornecimento de remédios e

vacinas a preços mais baratos. No plano econômico o Brasil tem sua ação voltada para a

participação em obras de infraestrutura viária, urbana e energética por empreiteiras

brasileiras; a ampliação da capacidade de crédito para o comércio; a criação de linhas

especiais de financiamento a partir do perdão de dívidas bilaterais; e a busca de

diversificação nas exportações africanas ao Brasil. Mais um aspecto importante da

cooperação entre Brasil e África é a presença da Petrobras em sete países da região –

Nigéria, Angola, Guiné Equatorial, Líbia, Tanzânia, Moçambique e Senegal -, que atua

com empresas locais e estrangeiras na prospecção em águas profundas e no segmento de

exploração e produção (CAMPOS, 2008).

Já no âmbito da ONU, o Brasil busca conseguir suporte africano para pleitear

um assento no Conselho de Segurança. A visão do governo brasileiro é de que uma

reforma na ONU e em seu Conselho de Segurança é necessária para que haja a devida

representação da Ásia, África e América Latina como membros permanentes do

Conselho de Segurança. Convém lembrar ainda que a África do Sul e o Brasil fazem

parte do IBAS, fórum de diálogo entre Índia, Brasil e África do Sul que conta com

iniciativas práticas para a solução de problemas desses países, como o fundo de combate

à fome e à pobreza, em parceria com o PNUD (CAMPOS, 2008).

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Contudo, cabe ainda ressaltar que a política do governo Lula para com a África

relembra os moldes da década de 1990: ainda existem as preferências por certas áreas e

países – como a África do Sul – e não há uma política continental para a região como

havia nos “anos dourados” da política africana. A posição marginal que a África ainda

possui no cenário internacional traz também questões sobre as reais oportunidades e

funcionalidade de uma política brasileira ativa para o continente africano (SARAIVA,

2002). O benefício de tal política também é questionável por alguns, tendo em vista o

desenvolvimento econômico e social do continente como um todo.

Posição dos atores principais:

União Europeia

O bloco não pode intervir de maneira direta nos Estados africanos, assim,

através de seu departamento específico ECHO (European Comission Humanitarian Aid

Office) dá assistência nas áreas de Desenvolvimento e Ajuda Humanitária. O ECHO

reverte 60% de seu orçamento para o continente africano, através de financiamentos de

ONGs, providência recorrente ou imediata de alimentos, medicamentos, abrigo e

financiamento para ajuda de reconstrução de áreas atingidas por desastres. A União

ainda promove uma política de alíquotas zero para importações provenientes dos países

mais pobres do globo e assinou em 2007 uma parceria estratégica com a África para

livre mercado no intuito de acelerar o desenvolvimento econômico da região africana e

erradicar a difusão do vírus HIV.

Estados Unidos

A política mais atual em relação à África vem do governo do presidente Barack

Obama, apontada num dossiê lido em 2009. O presidente defende a autodeterminação

dos povos africanos, os convidando a clamar por seu próprio futuro, num discurso

eloquente, o presidente chama o continente de um dos grandes parceiros de um novo

mundo. O discurso defende a necessidade de cooperação no continente, através dos

blocos de integração e da União Africana. A promessa de ajuda nas áreas de segurança,

principalmente na área subsaariana, onde atores não-estatais e forças ilegais operam

aparte do olho da mídia e do conhecimento comum. O presidente ainda informa do

envio de técnicos consultores para órgãos específicos dentro da União Africana,

ECOWAS (Economic Community of West African States). O ponto principal do dossiê,

todavia, é o destaque que o presidente Barack Obama dá à remilitarização dos Estados

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africanos, e os críticos respondem dizendo ser um discurso que se baseia na busca de

novos mercados para os armamentos bélicos produzidos no país.

Japão e China

O Japão, desde a década de 1990, vem mudando suas políticas em relação ao

financiamento de países em desenvolvimento, e na atualidade seus esforços se

concentram no continente africano. O governo japonês, seguindo a opinião pública do

país, que enfrenta duras crises financeiras e um mercado tendencioso, cortou muitas

verbas de assistência internacional nos últimos anos. Anfitrião das Conferências de

Tóquio pelo Desenvolvimento da África, o Japão clama pelo desenvolvimento

sustentável do continente e pela recriação de cenários econômicos estáveis para que se

possa promover o crescimento econômico da região. Mais ativamente o país promove

alíquotas zero para vários países africanos, e ajuda direta no financiamento de mercados

e reconstruções. Por sua vez a China, se apóia num discurso sobre a promoção da

igualdade, busca mercados na África, com tarifas zero, e promoção de acordos de troca,

como petróleo e commodities por armamentos e eletrônicos de todo tipo.

África do Sul

A África do Sul, como país com maior crescimento econômico e

desenvolvimento social da África subsaariana, tem os Estados africanos muito presentes

em sua política externa. Parceiro do Brasil no Fórum IBAS, que coliga o eixo do sul dos

países em desenvolvimento (África do Sul, Brasil e Índia), o país ainda em

desenvolvimento não pode atuar muito no continente diretamente com ajudas

financeiras. Promovendo políticas de capacitação dos povos africanos, a África do Sul

envia consultores nas áreas de agricultura e pecuária para os países africanos. Sendo o

maior produtor, muito de seu mercado está também no continente, por isso se declara

grande líder do processo de integração da União Africana, e da NEPAD (New

Partnership for Africa’s Development), buscando acordos de livre comércio e redução

de tarifas, mediação de acordos de paz, além das políticas para o futuro propostas para

firmar o crescimento do mercado africano.

CPLP

A Comunidade de Países de Língua Portuguesa, formada por Brasil, Portugal,

Angola, Cabo Verde, Moçambique, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste,

conta com cinco Estados africanos. Sua importância vem de aproximar mais de 200

milhões de pessoas com cultura e passado em comum em uma comunidade. A CPLP

ajudou a resolver alguns pequenos focos de tensão no continente africano, em São Tomé

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e Príncipe e Guine-Bissau, mediou os acordos no evento de golpes de Estados,

promovendo a democracia e o crescimento econômico. Também traz ajuda nas áreas

técnicas, no sentido de ajudar o crescimento econômico dos países, enviando

consultores financeiros aos países. O grande papel do Brasil e de Portugal na CPLP é a

promoção da educação e da difusão do idioma português. Como nos Estados africanos

muitas crianças nascem em áreas rurais e afastadas de possibilidade de educação nos

grandes centros, acabam nunca aprendendo o português, assim, numa parceira entre os

dois, o Instituto Camões reúne professores voluntários e os envia a áreas rurais dos

países-membros para promover o ensino da língua portuguesa, para que essas crianças

possam se enquadrar na sociedade das áreas urbanas lusófonas. Também, em pequena

medida promovido pelo Brasil, e um tanto negligenciado por Portugal, estão os

intercâmbios culturais na CPLP, trazendo e enviando estudantes dos países membros

para estudar e compartilhar a cultura dos companheiros lusófonos.

Portugal

O país mantém uma política externa associada à União Europeia na maioria das

matérias em relação ao continente africano. Porém se declara detentor do título da

aproximação dos dois continentes em suas parcerias, o país intermediou o dialogo entre

a União Europeia e a recém-criada União Africana em 2007, buscando alinhar com os

Estados africanos políticas de alíquotas reduzidas e livre comércio, tendo sido inscrita

como uma das prioridades da presidência portuguesa da U.E. em 2007. Portugal age

pela CPLP, principalmente na matéria de saúde, auxiliando os países africanos no

processo de erradicação de algumas doenças e vírus como o cólera, dengue, HIV, entre

outros. Bilateralmente, o país age através da SAS (Direção de Serviços da África

Subsaariana) e colabora por meio de acordos e financiamentos no evento de necessárias

reconstruções nos países africanos com quem mantém maior aproximação (Magrebe e

países de língua portuguesa).

Principais pontos para debate:

-Como o fórum IBAS, onde o Brasil é parceiro da África do Sul, pode intensificar a

relação de nosso país com o continente africano?

-Como os medicamentos genéricos podem beneficiar as parcerias entre o Brasil e os

países africanos no tratamento ao HIV/AIDS?

-Como as pesquisas de extração de petróleo em águas profundas, conduzidas pelo Brasil

em vários países africanos, podem contribuir para a inserção estratégica do continente?

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-Como a ajuda africana poderia contribuir para a escolha do Brasil como membro

permanente do Conselho de Segurança da ONU?

-O que mais o Brasil, como um país em desenvolvimento e por sua vez com muitos

problemas internos, poderia fazer para ajudar mais o continente africano?

-Sua posição como um dos principais atores da nova política internacional pode mudar

com mudanças na política externa em relação à África?

Referências adicionais para pesquisa

Livros e artigos:

CAMPOS, Diego Araújo. A África na Política Externa Brasileira. 2008. Disponível

em: http://mundorama.net/2008/04/08/a-africa-na-politica-externa-brasileira-por-diego-

araujo-campos/

SARAIVA, José Flávio Sombra. O Lugar da África: A dimensão atlântica da política

externa brasileira (de 1946 a nossos dias). Brasília: Ed. Universidade de Brasília, 1996.

SARAIVA, José Flávio Sombra. Política exterior do Governo Lula: o desafio

africano. 2002. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sciarttext&pid

=S0034-73292002000200001&lng=en&nrm=iso

VARGEM, Alex André. A Política Externa Brasileira para a África no Governo

Lula. 2008. Disponível em: http://www.pucsp.br/ponto-e-virgula/n4/artigos/

pdf/2_Alex.pdf

Web sites:

Ministério das Relações Internacionais dos Estados Unidos: http://www.state.go

v/p/af/rls/rm/2009/117326.htm

Ministério de Relações Exteriores do Japão: http://www.mofa.go.jp/region/

africa/ticad/index.html

Ministério de Relações Exteriores Chinês: http://www.fmprc.gov.cn/eng/zxxx/t

230615.htm

Ministério de Negócios Exteriores de Portugal: http://www.mne.gov.pt/mne

/pt/infopolitica/polexternas/

Departamento de Política Externa da África do Sul: http://www.dfa.gov.za/fore

ign/Multilateral/africa/index.html