HIDRAS- RESUMO FINAL

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Padrões de mortalidade sugerem a inexistência de Senescência nas Hidras

Daniel E. Martínez

Antes de mais, é necessário explicar o que é a senescência. Esta designação é de um processo deteriorativo que aumenta a probabilidade de morte de um organismo com o aumento da sua idade cronológica, e muitos biólogos têm sugerido que a Hidra pode escapar a este envelhecimento através da constante renovação dos tecidos do seu corpo. Para testar a (não) existência de envelhecimento nas hidras, vamos estudar as taxas reprodutivas e as taxas de mortalidade de três conjuntos de Hidras que foram analisadas durante um período de 4 anos. Podemos desde já dizer que os resultados não revelam nenhuma evidência de envelhecimento em hidras, dado que as taxas de mortalidade permaneceram extremamente baixas e não há nenhum sinal de aparente declínio da capacidade reprodutiva. As hidras podem, de facto, ter escapado à Senescência e serem potencialmente imortais.

Introdução

A POTENCIAL imortalidade das Hidras tem gerado perto de 100 anos de controvérsia. No entanto, o consenso geral entre os pesquisadores modernos parece apoiar a inexistência de envelhecimento nesta espécie devido à constante renovação do seu organismo .

A hidra tem um organismo simples, constituído por um tubo com uma cabeça numa ponta e um pé/disco basal noutra. A cabeça consiste de duas partes: a região da boca rodeada por uma zona de tentáculos a partir da qual emergem 6 tentáculos. Já a parede corporal é composta por duas camadas epiteliais separadas por uma membrana basal sem células, designada mesoglea. Além disso, a hidra tem apenas 20 tipos de células diferentes que estão organizadas em 3 linhagens de células: duas epiteliais e uma intersticial, sendo que cada linhagem consiste numa população de células estaminais com uma infinita capacidade de auto-renovação e vários produtos de diferenciação. As células epiteliais dos tentáculos, na ponta da cabeça e no pé, são o produto de diferenciação de células epiteliais que não se dividem, existentes na coluna corporal. Os neurónios, nematocistos, células secretoras e gâmetas são o resultado da diferenciação de células intersticiais.

Uma das espantosas características da Hidra é a dinâmica dos seus tecidos, pois as células epiteliais da sua coluna corporal estão sempre no ciclo mitótico. Esta contínua produção de células epiteliais na coluna corporal é compensada pela morte de células pré-existentes, enquanto que o resto é libertada para fora do corpo a partir da ponta dos tentáculos ou do disco basal. O resultado desta dinâmica faz com que as células epiteliais estejam deslocadas em gomos em desenvolvimento.

Devido a este comportamento uma célula individual não existe muito tempo no corpo da Hidra. Células diferenciadas que não se dividem de todas as 3 linhagens são mortas por deslocamento da coluna corporal a cada 20 dias. Além disso, as células estaminais da linhagem intersticial têm um ciclo celular de 18-30h, enquanto células estaminais

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da linhagem epitelial têm um período ciclo celular de 3 a 4 dias. Assim, as células ou estão em constante renovação através de divisão celular ou são perdidas pelo animal num curto espaço de tempo. Principal razão para justificar a afirmação de que as Hidras são imortais.

Materiais e Métodos

Para testar a presença ou ausência de senescência na Hidra, foram analisadas os padrões de mortalidade de quatro grupos de indivíduos Hydravulgaris. Um conjunto de 45 animais foi capturado no Lago Swan, em Dezembro de 1991. Foram mantidos como grupo de controlo apesar das suas idades serem desconhecidas. Três grupos derivados do grupo de controlo, através de reprodução assexuada, foram separados em Dezembro de 1991 (Grupo 1: 50 animais), Janeiro de 1992 (Grupo 2: 30 animais) e Março de 1993 (Grupo 3: 20 animais). Estes seres foram mantidos numa câmara ambiental a uma temperatura constante e com 8h de luz por dia. Foram mantidos individualmente em meios de cultura em Placas de Petri e alimentados com seres recentemente eclodidos da espécie Artemiasp. (5 a 15 larvas por hidra). Aproximadamente 6 a 10h após serem alimentadas, as hidras foram transferidos para novas Placas de Petri com um meio de cultura novo. Os descendentes foram contados e descartados nessa altura.

Várias abordagens têm sido utilizadas para determinar a presença ou ausência de senescência em animais. Um método clássico é calcular o logaritmo da probabilidade de sobrevivência de um grupo (Ix) vs. Idade, e visualmente inspeccionar a forma da curva do gráfico. Uma curva “diagonal” indicaria taxas de mortalidade constantes e a inexistência de Senescência. A decisão se uma curva é diagonal ou não é bastante subjectiva, logo este método irá sempre gerar muita controvérsia. O parâmetro importante não é a parte da população original que chega a uma certa idade x, mas sim a probabilidade de sobrevivência da idade x para a idade x+1, ou seja, a probabilidade de sobrevivência Px para uma idade específica. Se a senescência estiver presente, espera-se observar um aumento na mortalidade com o aumento da idade. No próximo quadro são apresentados os resultados da experiência com Hidras e comparados com as taxas de mortalidade de outras espécies.

Resultados

-TAXA DE MORTALIDADE

Resultados apurados num período de 4 anos. Os resultados obtidos estão expressos na figura 1.

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Na figura 1 estão representadas as taxas de mortalidade de várias espécies (e três grupos de Hidras + grupo de controlo) que também atravessam o processo de Senescência, pelo que, podem por isso e pela sua longevidade, ser comparadas com as Hidras.

Enquanto todas as éspecies revelam um aumento da taxa de mortalidade ao longo dos 4 anos, a Hidra manteve a sua mortalidade sempre perto de zero.

EXPLICAÇÕES PARA A BAIXA TAXA DE MORTALIDADE DAS HIDRAS:

Ideia de que as Hidras não envelhecem. O período de vida das Hidras pode ser muito mais extenso que 4 anos, pelo que

a experiência estaria a estudar Hidras muito jovens, que seria normal terem uma baixa taxa de mortalidade.

-Para a escolha da hipótese mais correcta deverá ler-se a Discussão de Resultados.

Idade ou tempo (dias)

Taxa d

e M

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ali

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Mort

ali

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Fig.1- Taxas de mortalidade por Idade. Animais que foram acidentalmente mortos durante tratamentos foram excluídos da contagem final.

Inexistência de Envelhecimento nas hidras

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-TAXA DE REPRODUÇÃO

A Fig.2 mostra as taxas de gemulação por idade, em valores médios. São aí apresentados, em separado, o gráfico enquanto as Hidras estavam na Universidade de Nova Iorque e o gráfico enquanto estavam na Universidade da Califórnia. Uma redução nas taxas de gemulação é esperada que ocorra no período da Universidade de Califórnia, visto que, devido às menores temperaturas e menor frequência de alimentação, as hidras crescem menos e, consequentemente, gemulam menos.

Idade ou tempo (dias)

FIG.2-Valores medianos da Taxa de Reprodução por idade. Calculado para cada individuo durante períodos de 20 dias através do número de descendentes produzidos nesses 20 dias a dividir por 20.As idades dos indivíduos do grupo de controlo eram desconhecidas, logo, as taxas foram calculadas a cada 20 dias a partir do inicio da experiência.

U.Nova Iorque U.Califórnia

Taxa

s de

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o

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Discussão

Taxas reprodutivas

A senescência é por vezes acompanhada por um declínio nas taxas reprodutivas. Todas as hidras incluídas nesta experiência poder-se-iam reproduzir sexuada ou assexuadamente. No entanto, como as Hidras estavam isoladas, não ocorreu reprodução sexuada, não podendo esta, assim, ser analisada. Ainda assim, é possível concluir que a idade não afectou a capacidade de reprodução sexuada nas hidras, visto que, passados 4 anos, os machos ainda tinham vários testículos e as fêmeas continuavam a produzir óvulos.

Do mesmo modo, a reprodução assexuada parece não ter sido afectada pela senescência: em média, cada Hidra, durante a experiência, produziu 448 descendentes. No entanto, na fig.2, existe um ligeiro declínio das taxas de gemulação. Poder-se-ia rapidamente concluir que isto é a consequência dos efeitos da senescência: no entanto, esta afirmação seria precoce, pois parece mais provável que o declínio tenha sido causado por factores ambientais e não pela idade das hidras. No grupo 1 e 2, por ex., a diminuição das taxas reprodutivas durante o 1º ano deverão ter sido a consequência da sua adaptação a um meio ambiente com diferentes condições. Para além disso, as grandes descidas durante o período da Universidade da Califórnia coincidiram com mudanças nas frequências alimentares nas Hidras. Tudo isto, aliado ao facto de todos os grupos apresentarem padrões de flutuações nas taxas reprodutivas semelhantes, independentemente da sua diferença de idades, aponta para que tenham sido os factores ambientais que causaram a diminuição das taxas e não a senescência.

QUADRO 1. Correlações entre as taxas de reprodução de diferentes grupos agrupados de acordo com a data (acima da diagonal) ou idade (abaixo da diagonal). Todos os coeficientes são significamente diferentes de zero (p<0.01)

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Para provar esta teoria, comparou-se os valores das taxas reprodutivas dos diferentes grupos para as mesmas idades, e também para as mesmas datas de recolha. Observou-se, assim, que existia uma maior semelhança de valores quando comparadas as taxas reprodutivas calculadas para a mesma data (uma semelhança de 0.93) do que para a mesma idade (0.54). Isto prova, novamente, que foram mudanças ambientais que ocorreram nessas datas, e não a senescência, responsável pelos declínios nas taxas reprodutivas.

Taxas de mortalidade

Durante a experiência, as taxas de mortalidade mantiveram-se bastante baixas, o que apoia a inexistência de senescência. No entanto, pode-se argumentar que 4 anos não é suficiente e que, se as análises durassem 10 anos, observar-se-iam subidas nas taxas de mortalidade.

Perante esta afirmação, o autor defende que 4 anos bastam para analisar os resultados. Ele argumenta isto ao afirmar que a senescência é o resultado de acumulações de mutações genéticas defeituosas. Como o preço a pagar por estas mutações é mais alto no início da vida do organismo do que mais tarde, todas as espécies que existem evoluíram de modo a que as consequências do envelhecimento aparecessem mais tarde na vida, nomeadamente após o início da reprodução, de modo a evitar que genes defeituosos passassem à descendência. Assim, quanto mais precoce for a idade da 1ª reprodução menor é a esperança média de vida de uma espécie. Para uma espécie que inicia a reprodução passados apenas 10 dias, as Hidras apenas deveriam viver um máximo de 3 meses, tendo em conta o gráfico 2. No entanto, o facto de muitos indivíduos terem sobrevivido os 4 anos da experiência mostra que estas já atingiram um tempo de vida 20 vezes superior ao esperado e sem nenhum sinal de deterioração. O autor sugere, assim, que 4 anos é suficiente tempo para as hidras mostrarem (se alguma vez os vierem a ter) sinais de senescência e a ausência de tais sinais sugere que a hidra não sofre senescência e é potencialmente imortal.

A possível imortalidade não se restringe ás hidras, tendo sido também estudada noutras espécies. No entanto, escapar ao envelhecimento parece estar restrito a seres com corpos mais simples e dinâmicos, que possam estar em constante renovação. Dada a dinâmica dos tecidos da Hidra, ao longo dos 4 anos da experiência, estas renovaram todo o seu corpo, pelo menos, 60 vezes. Mas evolução de organismos mais complexos, com sistemas de órgãos especializados, poderá ter tido como consequência (ou quem sabe, como requisito), a perca da capacidade de renovação dos tecidos, levando assim ao aparecimento da senescência.