Histologia e Caracterizacao Histoquimica Do Tubo Gastrintestinal

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Histologia e caracterização histoquimica do tubo g. intestinal

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    Iheringia, Sr. Zool., Porto Alegre, 97(4):411-417, 30 de dezembro de 2007

    Histologia e caracterizao histoqumica do tubo gastrintestinal...

    Histologia e caracterizao histoqumica do tubo gastrintestinal dePimelodus maculatus (Pimelodidae, Siluriformes) no reservatrio de

    Funil, Rio de Janeiro, BrasilClarice M. Santos1,2, Silvana Duarte1,3, Tatiana G. L. Souza2, Thatiana P. Ribeiro2,

    Armando Sales2 & Francisco G. Arajo3

    1. Programa de Ps-Graduao em Biologia Animal, Instituto de Biologia, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, RJ.([email protected])

    2. Laboratrio Histologia e Embriologia Animal, IB/DBA, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Km 47 da Antiga Rodovia Rio -So Paulo, 23851-970 Seropdica, RJ. ([email protected])

    3. Laboratrio de Ecologia de Peixes, IB/DBA, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, RJ. ([email protected])

    ABSTRACT. Histology and histochemical characterization of the digestive tract of Pimelodus maculatus (Pimelodidae,Siluriformes) in Funil reservoir, Rio de Janeiro, Brazil. Histological structures of the digestive traits of Pimelodus maculatus LaCepde, 1803, in the Funil reservoir (2230- 2235S; 4435- 4440W) were described using haematoxilin-eosin (HE), trichomeGomori, periodic acid Schiff (PAS) and alcian blue (AB) pH 2.5 techniques. The main aim of this study was to detect the levels ofglycoproteins (GPs) in the mucous tunic based in histochemical techniques and to characterize eventual alteration in the digestive tractof this species in a polluted system. Fifty-four adult individuals collected between April-2003 and July-2004 (TL=19-38 cm) wereexamined. The mucosa showed longitudinal folds in the buccopharyngeal cavity, with a stratified squamous epithelium. The oesophagusshowed epithelium similar to buccopharyngeal cavity, with a predominance of mucous cells, which reacted strongly with the usedmethods. The stomach showed three regions: cardic, fundic and pyloric. The mucous tunic is continuously revested by a single cylindricalepithelium which showed positive reaction to AB and PAS only at the apical cells surface. The proper tunic has tubular glands that ramifygradatively, being a cellular type named oxyntopeptic, related to chloridric acid and pepsinogenic cells synthesis. The intestine showedvilosities, with the mucous tunic revested by a single cylindrical epithelium with striated planure and caliciform cells. The duodenumsubmucosa layer was located at the coledocum opening, as a single cylindrical epithelium lacking caliciforms cells, reacting positively withboth PAS and AB. The eutrophic environment of Funil reservoir did not seem to influence morphologic patterns of the structures(oesophagus, stomach and intestine) and no modification was observed in the mucous cells activity.

    KEYWORDS. Morphology, glycoproteins, fishes, Pimelodidae.

    RESUMO. As estruturas teciduais do trato gastrintestinal de Pimelodus maculatus La Cepde, 1803, do reservatrio de Funil (2230-2235S; 4435- 4440W) foram descritas atravs das tcnicas de hematoxilina-eosina (HE), tricmico Gomori, cido Peridico deSchiff (PAS) e alcian blue (AB) pH 2,5. Objetivou-se a deteco de glicoprotenas (GPs) na mucosa atravs de uma anlise histoqumicae caracterizao de possveis alteraes ao longo do trato digestrio destes peixes neste sistema de elevado grau de alterao. Cinqentae quatro indivduos adultos, coletados entre abril de 2003 e julho de 2004 (CT=19-38 cm) foram utilizados. Na cavidade bucofarngea, amucosa apresenta-se com pregas longitudinais e o epitlio do tipo estratificado pavimentoso. O esfago apresenta o mesmo tipo deepitlio da cavidade bucofarngea, destacando-se a predominncia de clulas mucosas que tiveram forte reao aos mtodos utilizados. Oestmago foi diferenciado em regio crdica, fndica e pilrica. A mucosa continuamente revestida por um epitlio simples cilndricoque apresentou reao positiva ao AB e PAS somente na superfcie apical das clulas; a lmina prpria possui glndulas tubulares que seramificam gradativamente e consistem de um tipo celular denominado oxinticoppticas, relacionadas com a sntese de cido clordrico epepsinognio. O intestino apresenta vilosidades revestidas por um epitlio simples cilndrico com planura estriada e clulas caliciformes.Na camada submucosa do duodeno foi observada a abertura do coldoco, sendo o epitlio do tipo simples cilndrico sem clulas caliciformes,positivo tanto ao PAS quanto ao AB. O ambiente eutrfico do reservatrio de Funil no parece influenciar os padres morfolgicos dasestruturas (esfago, estmago e intestino) e no foram observadas modificaes nas atividades das clulas mucosas.

    PALAVRAS-CHAVE. Morfologia, glicoprotenas, peixes, Pimelodidae

    A morfologia e histologia do trato gastrintestinaltm sido descritas em vrias espcies de peixes (KHANNA& MEHROTRA, 1971; HARDER, 1975; KAPOOR et al., 1975;TIBBETS, 1997), despertando considervel interesse pelasamplas variaes tanto na morfologia quanto nasfunes, como reflexo da elevada diversidade deste grupozoolgico e suas diferentes posies na cadeia trfica.Apesar das diferenas interespecficas no tratogastrintestinal, semelhanas estruturais bsicas socomuns dentro do grupo (DIAZ et al., 2003). Em algumasespcies as diferenas esto proximamente relacionadascom a natureza do hbito alimentar, tamanho do corpo esexo (KAPOOR et al., 1975; SMITH, 1989).

    Pimelodus maculatus La Cepde, 1803 um peixede couro que habita o fundo dos ambientes aquticos etem ampla distribuio geogrfica nas baciashidrogrficas da Amrica do Sul (FOWLER, 1954; BASILE-MARTINS et al., 1986b; ALMEIDA et al., 2003). uma espcieeminentemente onvora (HAHN et al., 1998; BASILE-MARTINS et al., 1986a; CALLISTO et al., 2002) que possuiuma dieta variada, constituda por larvas de insetos, algas,moluscos, peixes e fragmentos de vegetais (BASILE-MARTINS et al., 1986a; LLIS & ANDRIAN, 1996; LOBN-CERVI & BENNEMANN, 2000; CALLISTO et al., 2002) fazendouso dos mais diferentes recursos alimentares disponveisno ambiente aqutico (BASILE-MARTINS et al., 1986a,b;

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    HAHN et al., 1998). A deteco do alimento por esta espcie auxiliada pela presena de dois pares de barbilhesmaxilares (ALVES & POMPEU, 2001), uma estrutura de tatodo substrato e de auxlio a seus hbitos noturnos.

    MENIN & MIMURA (1992) compararam a anatomiafuncional de trs espcies neotropicais onvoras,incluindo uma do gnero Pimelodus, tendo classificadoo estmago como sendo do tipo cecal e em J,correlacionando as pregas espessas da regio crdica efndica funo de armazenamento de grandes volumesde alimentos. Estes autores consideraram o intestino detamanho intermedirio. GODINHO et al. (1970)caracterizaram a histologia do trato digestrio dePimelodus maculatus em um ambiente oligotrfico, tendorelacionado a estrutura do aparelho digestrio com ohbito alimentar.

    Os peixes entram em contato mais estreito comagentes poluidores de vrias maneiras, principalmentepela superfcie de epitlios como a do intestino (FANTA,1991). A ocorrncia de clulas mucosecretoras umacaracterstica comum na superfcie de epitlios do tratodigestrio de telesteos; com as mucosubstnciassecretadas diferindo ao longo do canal alimentar dospeixes. A presena de glicoprotenas (GPs) correlacionada com diferentes funes, comolubrificao, degradao proteoltica e inibio demicrorganismos (REID et al., 1988). Neste escopo, asdescries da histologia do trato digestrio so deespecial interesse visando dar informaes maiscompletas sobre todos os tipos de interferncia nofuncionamento de organismos vivos.

    O presente trabalho visa caracterizar a histologiado trato gastrintestinal de P. maculatus do reservatriode Funil atravs de uma anlise histoqumica, bem comocaracterizar possveis alteraes na secreo demucosubstncias pelas clulas mucosas ao longo dotrato digestrio destes peixes, por estarem vivendo emestado de alterao ambiental.

    MATERIAL E MTODOSExemplares de P. maculatus foram capturados no

    reservatrio do Funil, Rio de Janeiro (2230- 2235S;4435- 4440W). um ambiente com rea de 40 km2, ondeo gradiente espacial rio-remanso pode ser observadodevido forma relativamente alongada do reservatrio,em concordncia com a geomorfologia do rio barrado. Oreservatrio se encontra sob forte presso antrpica,servindo como um decantador natural de materiais emsuspenso que o rio Paraba recebe montante,principalmente de efluentes urbano-industriais notratados de grandes cidades (e.g. So Jos dos Campos,Taubat) (MALM et al., 1989). Apesar destas condies,coletas recentes tm demonstrado a ocorrncia depopulaes estveis de P. maculatus neste reservatrio.

    Coletas trimestrais foram realizadas entre abril de2003 e julho de 2004, tendo sido capturados 54 exemplaresadultos com redes de emalhar. A dissecao foi realizadaem campo, com os peixes tendo sido sacrificados porhipotermia. Aps a tomada de peso corpreo e docomprimento padro, ocorreu a imediata remoo do tratodigestrio. Fragmentos da cavidade bucofarngea,esfago, estmago e intestino foram fixados por 8 horasem lquido de Bouin. Os tecidos foram desidratados emconcentrao crescente de etanol, clarificados em xilol e

    embebidos em parafina. Seces de 5 m foram coradasem hematoxilina-eosina (HE), tricrmico de Gomori, cidoperidico e reativo de Schiff (PAS) e alcian blue (AB) pH2,5, visando identificar clulas secretoras deglicoprotenas. O trato digestrio foi analisado atravsde cortes transversais e longitudinais.

    RESULTADOS

    Cavidade bucofarngea. A parede composta detnica mucosa, submucosa, muscular e serosa. Acavidade bucofarngea apresenta a tnica mucosa compregas longitudinais (Fig. 1). Seu epitlio do tipoestratificado pavimentoso, tendo sido observada aexistncia de clulas claviformes e mucosecretoras (Fig.2). A lmina prpria composta por um tecido conjuntivorico em fibras colgenas. No existem diferenasconspcuas da tnica mucosa para a submucosa, sendoesta ltima composta por um tecido conjuntivo frouxo,podendo ser observadas as placas dentrias (Fig. 3). Asclulas mucosas revelaram intensa reao positiva aosmtodos histoqumicos do PAS e AB, diferentemente doencontrado nas clulas claviformes, que no reagiram aestes mtodos.

    Esfago. A tnica mucosa do esfago, similarmente da cavidade bucofarngea, apresentou pregaslongitudinais e o seu revestimento feito por um epitliodo tipo estratificado pavimentoso. O elemento compredominncia neste epitlio foram as clulasmucosecretoras, as quais se dispuseram de formahomognea ao longo de todo o epitlio (Fig. 4). Na regiocranial do esfago a estratificao do epitlio maisnotada, com maior nmero de pregas longitudinais eclulas claviformes quando comparado com a regiocaudal. A lmina prpria formada por tecido conjuntivofrouxo. O mtodo de colorao tricrmico de Gomoriindicou ausncia da muscular da mucosa e presena dasfibras conjuntivas da lmina prpria e submucosa. Acamada muscular compreendida por duas camadas defibras musculares estriadas, uma longitudinal interna e aoutra circular externa. A serosa fina, composta porepitlio simples pavimentoso. Os testes histoqumicosrevelaram uma intensa reao das clulas mucosecretorasao PAS (Fig. 5) e em menor extenso ao AB. A transiodo esfago para estmago claramente percebida atravsda abrupta mudana do epitlio estratificado pavimentosopara o epitlio simples cilndrico (Fig. 6).

    Estmago. dividido em regies crdica, fndica epilrica (Figs. 7-9), sendo a tnica mucosa continuamenterevestida por um epitlio simples cilndrico (Fig. 7). Sualmina prpria possui glndulas tubulares constitudaspor clulas chamadas de oxinticoppticas, as quais seabrem nas criptas das pregas da mucosa (Fig. 8), sendopredominantes na poro fndica e tornando-se escassasna regio pilrica.

    A transio entre a lmina prpria e a tnicasubmucosa demarcada pela presena de uma muscularda mucosa (Fig. 9). A tnica muscular na regio crdica efndica contm duas camadas de msculo liso: umacircular interna e outra longitudinal externa. Na regiopilrica observaram-se trs camadas, sendo uma oblquamais internamente. Externamente, o estmago recobertopor uma serosa. Os testes histoqumicos revelaram umaforte reao positiva ao AB e PAS apenas na superfcieapical das clulas epiteliais (Fig. 7).

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    Intestino proximal, mdio e distal. A mucosa apresentavilosidades (Fig. 10). O epitlio simples cilndrico complanura estriada e clulas caliciformes mais numerosas noduodeno. Estas clulas se apresentam fortemente coradas

    tanto pelo mtodo do PAS quanto AB (Fig. 11). No duodeno,abre-se o canal do coldoco cuja mucosa revestida por umepitlio simples cilndrico sem clulas caliciformes, seguidopor uma lmina prpria e uma camada muscular bem definida

    Figs. 1-6. Fotomicrografias de cortes transversais da cavidade bucofarngea (1-3) e esfago (4-6) de Pimelodus maculatus La Cepde,1803. 1, Pregas longitudinais (PL), epitlio estratificado pavimentoso (EP), Hematoxilina-Eosina; 2, Epitlio com clulas mucosecretoras( ), claviformes ( ) e lmina prpria (LP), Tricrmico de Gomori; 3, Epitlio estratificado pavimentoso (EP), placa dentria (PD) elmina prpria (LP); 4, Epitlio estratificado com clulas claviformes ( ) e lmina prpria (LP), Tricrmico de Gomori; 5, Reaointensa das clulas mucosecretoras ( ), e ausncia de marcao nas clulas claviformes ( ) cido Peridico de Schiff; 6, Abrupta transiodo epitlio estratificado esofgico () para o cilndrico simples do estmago (*), Hematoxilina-Eosina. Barras, 50 m.

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    (Fig. 12). Em todo o intestino observou-se a presena deuma muscular da mucosa separando a lmina prpria dasubmucosa. A camada muscular composta por uma camada

    circular interna e outra longitudinal externa de msculo liso.A serosa est presente em todo o intestino, consistindo deuma camada de mesotlio.

    Figs. 7-12. Fotomicrografias de cortes transversais do estmago (7-9) e intestino (10-12) de Pimelodus maculatus La Cepde, 1803.7, Regio crdica, epitlio simples cilndrico com intensa reao na superfcie da clula (EP), lmina prpria (LP) e submucosa (SM),cido Peridico de Schiff; 8, Regio fndica, lmina prpria com glndulas tubulares ramificadas (GT), lmen gstrico (L), Hematoxilina-Eosina; 9, Regio pilrica com fossetas pronunciadas ( ), lmina prpria (LP), Hematoxilina-Eosina; 10, Vilosidades intestinais (VL)e lmina prpria (LP), Hematoxilina-Eosina; 11, Vilosidades intestinais (VL), epitlio simples cilndrico com clulas caliciformesfortemente marcadas ( ), Alcian Blue; 12, Canal do coldoco (CC) com epitlio simples cilndrico sem clulas caliciformes e camadamuscular (CM), Tricrmico de Gomori. Barras, 50 m.

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    DISCUSSOO padro anatmico da mucosa da cavidade

    bucofarngea de Pimelodus sp. foi descrito por MENIN &MIMURA (1992), tendo os autores inferido que este grupode peixes se alimenta de material de origem animal comtendncia ictiofagia, deglutindo os itens sem preparaopr-digestiva. Observaes de campo feitas noreservatrio de Lajes, RJ, tm confirmado este padro,com P. maculatus funcionando como uma espcieeminentemente onvora, porm com forte tendncia carnivoria (ARAJO et al., 2005). O epitlio do tipoestratificado pavimentoso funciona como uma importantecamada protetora contra agresses mecnicas e invasobacteriana (HUMBERT et al., 1984). Os testes histoqumicosdeste estudo mostraram forte reao das clulas mucosasda cavidade bucofarngea s tcnicas do PAS e ABevidenciando a presena de glicoprotenas (GPs) cidase neutras, o que indica o funcionamento regular destasclulas.

    O esfago curto e, como na maioria dos peixesestudados, contm todas as camadas caractersticas deum rgo tubular do sistema digestrio dos vertebrados:camada mucosa, submucosa, muscular e uma serosa(GODINHO, 1967; GODINHO et al., 1970; GARRIDO et al., 1993;TIBBETS, 1997; ALBRECHT et al., 2001; DIAZ et al., 2003). Atnica mucosa caracterizou-se pela presena de pregaslongitudinais menos proeminentes do que aquelasencontradas em peixes marinhos como Engraulisanchoita Hubbs & Marini, 1935 (DIAZ et al., 2003), umprovvel efeito da diferenciao na dieta destas espcies,com esta ltima sendo filtradora planctfaga. O epitlio do tipo pavimentoso estratificado com clulasmucosecretoras e claviformes. Segundo RALPHS &BENJAMIN (1992), as clulas claviformes, facilmentedistinguidas das clulas mucosas, so glndulas grandese unicelulares, secretoras de um ferormnio que induz areao de fuga dos peixes. Este padro pode ser umacaracterstica do gnero, que se diferenciou do padroencontrado para outras espcies onvoras, comoLeporinus friderici Bloch, 1794 e Leporinustaeniofasciatus Britski, 1997 (ALBRECHT et al., 2001) eOreochomis niloticus Linnaeus, 1958 (MORRISON &WRIGHT-JR, 1999), nas quais estas clulas claviformes estoausentes. As clulas mucosecretoras tambm chamadasde globosas so contnuas e abundantes. O mucosecretado por elas facilita a passagem de alimentos aolongo do trato, fato observado nos onvoros L. fridericie L. taeniofasciatus (ALBRECHT et al., 2001) que, assimcomo P. maculatus, ingerem escamas, espinhos denadadeiras, fragmentos de coluna vertebral de outrospeixes e fragmentos queratinizados de insetos. Asdiferenas encontradas na regio cranial e caudal doesfago provm do fato que estas exercem diferentesfunes. A regio cranial funciona como rea de proteoe a caudal est envolvida com seletividade inica eabsoro de alimentos (HUMBERT et al.,1984).

    As glndulas esofagianas j foram relatadas nalmina prpria de telesteos (BLAKE, 1930; VEGAS-VELEZ,1972), porm em P. maculatus no se observou a presenadestas estruturas. A ausncia da lmina muscular damucosa, tambm no encontrada em telesteos como

    Oreochromus mikiss Linnaeus, 1758 (EZEASOR, 1984) e E.anchoita (DIAZ et al., 2003), facilita a passagem doalimento para o estmago, bem como a mistura deste aocido gstrico. Os testes histoqumicos neste estudorevelaram maior presena de glicoprotenas com hidroxilasvicinais do que glicoprotenas carboxiladas, devido marcao mais intensa ao mtodo do PAS. Estas GPsjunto ao epitlio estratificado conferem proteo aoesfago.

    As anlises demonstraram a ocorrncia de umaabrupta mudana do epitlio estratificado esofgico parao epitlio simples cilndrico do estmago. Esta passagemgastresofgica foi tambm descrita por GODINHO (1967) epor CACECI et al. (1997). O estmago o rgo do sistemadigestrio que mais chama ateno quando est repleto,ocupando mais da metade da cavidade abdominal -denotando a ampla elasticidade deste rgo, que dividido em regies crdica, fndica e pilrica, similaraos de mamferos. No mandi-branco (Pimelodus sp.) oestmago apresenta a regio pilrica poucodesenvolvida, situada ventralmente regio crdica edispondo-se linearmente regio fndica, ao longo doplano sagital mediano. As regies crdica e fndicapossuem pregas espessas que tm a funo de armazenargrande volume de alimento digerido (MENIN & MIMURA,1992). No presente estudo tambm foi confirmada aexistncia destas regies, assim como uma tnica muscularbastante desenvolvida na regio pilrica, caracterizadapor trs camadas musculares (o que facilita oesvaziamento gstrico e a expulso do alimento para ointestino anterior). Para STROBAND & VAN DER VEEN (1981),as principais funes do estmago so o armazenamentode alimentos e a defesa contra microorganismos pelaproduo de cido clordrico; a digesto protica emambiente de baixo pH seria de importncia secundria. Aausncia desta funo digestria foi associada aostelesteos sem estmago, que absorvem por pinocitosee digerem intracelularmente protenas no intestino, numprocesso similar ao descrito em mamferos recm-nascidos.

    A mucosa do estmago apresentou-se revestidapor epitlio simples cilndrico composto de clulas comncleo basal e glndulas gstricas tubulares na lminaprpria. As glndulas gstricas so compostas porclulas oxinticoppticas que, assim como as clulasprincipais e parietais em mamferos, relacionam-se com asntese de cido clordrico e pepsinognio. Tais glndulasforam relacionadas ao hbito alimentar (MOHSIN, 1962) eatividade enzimtica (MEDEIROS et al., 1970) de outrasespcies de telesteos tendo sido, inclusive, usadas paraclassificao taxonmica (KONFAN, 1966). No presenteestudo no se observou reao destas glndulas com ostestes histoqumicos utilizados. Os testes revelaram apresena de GPs neutras e cidas no tero superior dasclulas cilndricas superficiais. Estas GPs, produzidaspelas clulas epiteliais, podem proteger a mucosa do cidocontido no estmago (SCOCCO et al., 1996; MORRISON &WRIGHT-JR., 1999).

    O intestino curto, tpico de peixes carnvoros,com o epitlio intestinal sendo do tipo simples cilndricocom planura estriada e clulas caliciformes. Este padrodiferenciou-se do reportado por GODINHO et al. (1970)

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    para P. maculatus, onde o epitlio intestinal foi do tipoestratificado prismtico. As clulas caliciformes produzemintensa lubrificao, o que pode estar associado aopequeno tamanho do intestino e tendncias ictiofagiada espcie, uma caracterstica observada por MENIN &MIMURA (1992) em Pimelodus sp.

    As clulas rodlet cells caracterizam-se porapresentar uma forma arqueada e j foram observadas noepitlio intestinal de O. mikiss (BIELEK, 2002), L. friderici(ALBRECHT et al., 2001) e Gambusia affinis Baird & Girard,1853 (BULLOCK, 1967), cuja funo est associada amecanismos de defesa. De acordo com Leino (1996) apudDIAZ et al. (2005), a proliferao de rodlet cells noepitlio de peixes est associada funo de proteo eparece ser induzida por produo de substncias comoresultado de injrias teciduais (parasitas, vrus) e fatoresassociados (fatores populacionais, concentrao de onsna gua). FIJAN et al. (2003) relataram a reao das rodletcells como um raro achado histolgico em Cyprinuscarpio Linnaeus, 1758 afetado por ulceraes intestinaise enterotoxemia. Tais clulas, entretanto, no foramobservadas no epitlio intestinal de P. maculatus. Istopode ser uma indicao da ausncia de alteraes noepitlio intestinal ou a no existncia destas clulas nestaespcie.

    Na camada submucosa do duodeno foi observadaa abertura do coldoco, sendo seu epitlio do tipo simplescilndrico sem clulas caliciformes, positivo tanto ao PASquanto ao AB, o que indica a presena de uma secreolocal. Externamente pode ser observada uma disposiode fibras musculares constituindo um esfncter.

    Os resultados do presente trabalho baseados namorfologia do trato digestrio indicam que P. maculatusapresenta um padro caracterstico de espcie que praticaa onivoria e que o ambiente marcadamente eutrfico doreservatrio de Funil no parece ter influenciado o padromorfolgico do esfago, estmago e intestino.Igualmente, foi preservada a secreo das clulasmucosecretoras quando comparados com a literaturadisponvel para esta e outras espcies. No foi observadoqualquer indcio de injria tecidual, tais como infiltradosinflamatrios, rodlet cells, lceras ou leses teciduaisque pudessem ser atribudos diretamente exposio apoluentes. Estudos em outros rgos poderiam serrealizados no sentido de identificar possveis alteraesmorfolgicas que possam ser associadas s influenciasambientais nesta espcie.

    Agradecimentos. A Ilza Lucas Coelho Meirelles peloauxlio nas tcnicas laboratoriais no Laboratrio de Histologia eEmbriologia do Instituto de Biologia da UFRRJ. Ao Sr. DirceuMarzulo, Paulo Srgio Formagio, Marcos Antonio Evangelista eMaria das Neves, da Estao de Hidrobiologia e Piscicultura deFurnas, pelo suporte tcnico de infra-estrutura. A FURNAS CentraisEltricas S/A pelo apoio financeiro atravs do Projeto de Pesquisa& Desenvolvimento (P&D)/contrato no 016206. Fundao deAmparo Pesquisa do Rio de Janeiro FAPERJ pela concessode Bolsa de Doutorado segunda autora e CAPESCoordenaode Aperfeioamento de Pessoal de Nvel SuperiorMEC, pelaconcesso de Bolsa de Mestrado primeira autora no Programade Ps-Graduao em Biologia Animal.

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    Recebido em agosto de 2005. Aceito em junho de 2007. ISSN 0073-4721Artigo disponvel em: www.scielo.br/isz