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HISTÓRIA DE LUTA DAS MULHERES NO CENÁRIO ESPORTIVO: pesquisa comparada entre Brasil e Estados Unidos Carla Loyana Dias Teixeira Acadêmica do Curso de Licenciatura Plena em Educação Física – UEPA [email protected] Emerson Duarte Monte Docente do Curso de Licenciatura em Educação Física – UEPA [email protected] Resumo: O estudo analisa comparativamente os processos históricos de evolução da participação das mulheres no fenômeno esportivo brasileiro e estadunidense. Metodologicamente, pauta-se na pesquisa bibliográfica, tendo como referencial teórico- metodológico o Materialismo Histórico Dialético e como método de análise dos dados, a análise comparativa. Os resultados encontrados revelam que, apesar dos enormes ganhos ao longo dos anos, o envolvimento “delas” ainda se encontra prejudicado em relação aos homens, especialmente no cenário brasileiro. Conclui que em ambos os países, os avanços quantitativos não indicam uma mudança de comportamento no trato com o gênero. Palavras-chave: Gênero. Esporte. Cultura Esportiva. INTRODUÇÃO: Historicamente consideradas frágeis para a prática de atividades físicas, a inclusão das mulheres no mundo esportivo deixa rastros de segregação e discriminação, porém de grandes contribuições. Conforme destacam Brauner e Massutti (2007) “Compreender o processo de inserção da mulher no esporte é perceber que historicamente, a condição feminina se caracterizou pela exclusão social e política, condicionada à dependência masculina e perda de autonomia” (BRAUNER; MASSUTTI, 2007, p. 94). Mediante diversos pretextos, as mulheres são condicionadas à herança cultural machista das sociedades, sofrendo as duras consequências disso nos diferentes âmbitos da vida; e mesmo após décadas de luta, o corpo feminino continua sendo propagado como um produto a ser consumido, ou como sinônimo de fragilidade e inferioridade. Tais visões negativas são constantemente reforçadas pela mídia ao expor a mulher como mercadoria, associada ao lazer e ao prazer masculinos. Diante disso, o esporte como manifestação cultural, incorpora as ideologias patriarcais, consequentemente, tornando-se um campo de luta para a mulher na intenção de combater os princípios excludentes de gênero. E como um importante elemento de contribuição socioeducativo, permite confrontar a sexualidade, definir expectativas sobre homens e mulheres e analisar o status da mulher na sociedade, desestabilizando o “espaço de sociabilidade criado e mantido sob domínio masculino, cuja justificativa para sua

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HISTÓRIA DE LUTA DAS MULHERES NO CENÁRIO ESPORTIVO: pesquisa comparada entre Brasil e Estados Unidos

Carla Loyana Dias Teixeira Acadêmica do Curso de Licenciatura Plena em Educação Física – UEPA

[email protected]

Emerson Duarte Monte Docente do Curso de Licenciatura em Educação Física – UEPA

[email protected] Resumo: O estudo analisa comparativamente os processos históricos de evolução da participação das mulheres no fenômeno esportivo brasileiro e estadunidense. Metodologicamente, pauta-se na pesquisa bibliográfica, tendo como referencial teórico-metodológico o Materialismo Histórico Dialético e como método de análise dos dados, a análise comparativa. Os resultados encontrados revelam que, apesar dos enormes ganhos ao longo dos anos, o envolvimento “delas” ainda se encontra prejudicado em relação aos homens, especialmente no cenário brasileiro. Conclui que em ambos os países, os avanços quantitativos não indicam uma mudança de comportamento no trato com o gênero. Palavras-chave: Gênero. Esporte. Cultura Esportiva. INTRODUÇÃO:

Historicamente consideradas frágeis para a prática de atividades físicas, a inclusão das

mulheres no mundo esportivo deixa rastros de segregação e discriminação, porém de grandes

contribuições. Conforme destacam Brauner e Massutti (2007) “Compreender o processo de

inserção da mulher no esporte é perceber que historicamente, a condição feminina se

caracterizou pela exclusão social e política, condicionada à dependência masculina e perda de

autonomia” (BRAUNER; MASSUTTI, 2007, p. 94).

Mediante diversos pretextos, as mulheres são condicionadas à herança cultural

machista das sociedades, sofrendo as duras consequências disso nos diferentes âmbitos da

vida; e mesmo após décadas de luta, o corpo feminino continua sendo propagado como um

produto a ser consumido, ou como sinônimo de fragilidade e inferioridade. Tais visões

negativas são constantemente reforçadas pela mídia ao expor a mulher como mercadoria,

associada ao lazer e ao prazer masculinos.

Diante disso, o esporte como manifestação cultural, incorpora as ideologias

patriarcais, consequentemente, tornando-se um campo de luta para a mulher na intenção de

combater os princípios excludentes de gênero. E como um importante elemento de

contribuição socioeducativo, permite confrontar a sexualidade, definir expectativas sobre

homens e mulheres e analisar o status da mulher na sociedade, desestabilizando o “espaço de

sociabilidade criado e mantido sob domínio masculino, cuja justificativa para sua

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consolidação, assentada na biologia do corpo e do sexo, deveria atestar a superioridade deles

em relação a elas” (GOELLNER, 2005, p. 144).

O interesse pelo tema surgiu durante experiência de intercâmbio em uma universidade

estadunidense. O grande interesse da comunidade acadêmica da SUNY1 Oswego com o trato

do gênero e sua relação com os esportes, evidenciado por inúmeros debates dentro e fora de

sala de aula, e seminários organizados pela instituição chamou atenção para o estudo do

objeto. Ao participar dessas discussões acerca do histórico de luta das mulheres e das

dificuldades ainda vivenciadas nos Estados Unidos, indagou-se sobre as particularidades do

mesmo processo no Brasil.

Como na realidade brasileira ainda é possível reconhecer os antigos dogmas machistas

enraizados e materializados, por exemplo, na divisão de turmas entre sexo masculino e

feminino para a prática esportiva nas aulas de Educação Física Escolar, por esta razão, atentar

para uma formação inicial que reconheça a importância dessa reflexão e estimule entre os

acadêmicos, o trato com um esporte igualitário, reconstruindo conhecimentos para a

intervenção no processo educativo e elaboração de estratégias diferenciadas, visando a

superação da segregação simbólica e dissimulada.

O tema auxilia na construção de uma cultura esportiva inclusiva, em que se pode

lançar mão de novas possibilidades de interagir e contribuir com a comunidade por meio do

esporte, o qual se responsabiliza pela produção e reprodução de valores. Assim, por meio do

reconhecimento da importância do papel das mulheres na sociedade e no mundo esportivo,

contribuir para a formação de uma sociedade plural e mais democrática.

O expressivo crescimento da participação feminina em contextos esportivos nesses

dois países evidencia a necessidade de discutir as condições em que ocorreu esse processo.

Para isso, pergunta-se: Como se desenvolveu a inserção da mulher no cenário esportivo no

Brasil e nos Estados Unidos?

Para responder à questão anterior, formularam-se as seguintes perguntas norteadoras:

A) Como se desenvolveu a inserção da mulher no fenômeno esportivo estadunidense? B)

Como ocorreu o processo histórico de participação das mulheres no mundo dos esportes no

Brasil? C) Quais os desafios e possibilidades no cenário esportivo para o sexo feminino?  

Dessa forma, esse estudo discute as relações de gênero e o esporte, tendo como

objetivo geral investigar a evolução da participação das mulheres no cenário esportivo no

Brasil e nos Estados Unidos, por meio de uma análise comparativa dos processos históricos                                                                                                                          1 State University of New York é uma universidade estadunidense localizada no norte do estado de Nova Iorque.

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de conquista feminina nesse espaço considerado tradicionalmente masculino. Como objetivos

específicos: A) Compreender o modo como ocorreu a evolução da participação feminina nos

esportes nos Estados Unidos. B) Investigar as particularidades do processo de inserção da

mulher no cenário esportivo brasileiro. C) Analisar comparativamente a evolução do

envolvimento das mulheres no BR e EUA, buscando compreender seus desafios e

possibilidades no cenário esportivo.

Para alcançar o objetivo principal, esse artigo esta dividido em quatro seções, sendo a

primeira uma exposição do procedimento metodológico utilizado nessa pesquisa, seguido por

duas seções de acúmulo teórico, e finaliza com uma seção para as análises sobre os dados

documentais e estatísticos coletados.

1 METODOLOGIA

Ao resgatar a história das mulheres nos esportes, buscando na sua comparação

evidenciar os processos complexos e contraditórios, o trabalho vale-se do Materialismo

Histórico Dialético como teoria do conhecimento, já que, segundo Triviños (1987, p. 97-98),

este se caracteriza por situar o problema a nível mais amplo dentro de um contexto e

estabelece contradições possíveis de existir entre os fenômenos que o caracterizam.

Primeiramente, foram pesquisados artigos científicos e livros sobre a inserção

feminina nos esportes nos Estados Unidos e no Brasil, separadamente. Caracterizando assim,

uma pesquisa bibliográfica, ou seja, “desenvolvida com base em material previamente

elaborado [...] permitindo vasta cobertura de uma gama de fenômenos” (GIL, 2010, p. 44-45).

Posteriormente, realizou-se uma busca sobre a temática na Biblioteca Digital

Brasileira de Teses e Dissertações, em que se utilizaram as seguintes palavras-chave:

“gênero”, “esporte”, “EUA” e “Brasil”. Nenhum trabalho foi encontrado, ratificando a

relevância desta pesquisa para estudos comparativos posteriores. Portanto, foi necessário

recorrer às fontes primárias, tais como os divulgados pelos Comitês Olímpico Internacional e

Brasileiro, entidades esportivas estadunidenses - National Collegiate Athletic Association

(NCAA2) e National Federation of State High School Associations (NFHS3) - e o Ministério

do Esporte do Brasil, na busca de auxílio quantitativo para permitir a análise.

A partir de então, desenvolveu-se a comparação da realidade enfrentada em ambos os

países. Segundo Bulgacov (1998), o importante na investigação comparativa é a possibilidade

de constatações sobre as similaridades e diferenças. Desse modo, foi possível refletir sobre os

                                                                                                                         2 Entidade reguladora de competições esportivas nas universidades. 3 Entidade reguladora de competições esportivas no ensino médio.

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contextos políticos, sociais e econômicos temporais e locais, evidenciando as contradições

inerentes a esses dois processos.

2 INSERÇÃO FEMININA NO CENÁRIO ESPORTIVO DOS EUA

Historicamente restringidas da participação em eventos esportivos, tanto como atletas

quanto como espectadoras, repórteres, árbitras e treinadoras, o fenômeno da inserção das

mulheres nos esportes têm ocorrido de forma irregular, pois os avanços têm sido conquistados

gradativamente, de modalidade em modalidade. A exemplo dos Jogos Olímpicos Modernos,

que inicialmente não ofereciam provas femininas, inseriram o golfe e o tênis (1900), depois o

arco e flecha (1904), patinação artística (1908), e assim sucessivamente (INTERNATIONAL

OLYMPIC COMMITTEE, 2016). Desse modo, o resgate histórico faz-se necessário para uma

melhor compreensão do contexto em que se insere essa discussão.

Nos tempos primitivos, os rituais religiosos e de caça relacionavam-se com os

esportes, e contava com a participação feminina, porém isso não significava uma vida sem

restrições. Já na Grécia Antiga, dá-se espaço aos primeiros Jogos Olímpicos, uma

comemoração religiosa, nos quais de modo algum as mulheres poderiam participar, haja vista

que eram eventos restritos aos cidadãos (aqueles que possuíam a função de guerrear, ou seja,

somente homens ou eram possuidores de terras). Durante um período, em homenagem à

deusa Hera, criou-se os Jogos de Hera, disputado apenas por atletas jovens e solteiras. Desde

a conquista da Grécia pelo Império Romano, práticas esportivas foram proibidas, pois eram

consideradas festas pagãs, e as mulheres assumiram papéis de dançarinas e acrobatas para o

entretenimento de convidados. (MIRAGAYA, 2002; RUBIO; SIMÕES, 1999)

Na Idade Média, conforme Oliveira, Cherem e Tubino (2008), ambos os sexos

praticavam das mesmas atividades esportivas e de jogos populares. Contudo, a partir do

século XVII, as mulheres perderam seus direitos e foram direcionadas a uma vida de

submissão ao marido. Somente entre os séculos XVIII e XIX elas retomam o acesso aos

esportes como espectadoras e, posteriormente, começam a participar em atividades como o

boliche e o arco e flecha.

A descoberta das ruínas do estádio de Olímpia, na Grécia, durante a segunda metade

do século XIX, despertou o interesse do Barão Pierre de Coubertin em reviver os festivais

olímpicos da antiguidade, porém numa escala internacional. Fundou, em 1894, o

International Olympic Committee (IOC), uma autoridade administrativa central para a

organização dos jogos e elaboração de regras para o evento, “formado apenas por homens

brancos e ricos” (SHORT, 2003, s/p, tradução nossa), portanto um órgão antidemocrático.

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Sob a alegação de reproduzir fielmente as ideias gregas e seus valores, não se permitiu

a participação de mulheres nos jogos. Os estudos de Houlihan (2008) afirmam que Coubertin

acreditava que o esporte feminino era desinteressante e: [...] que [as] mulheres possuíam uma quantidade limitada de energia para todas as funções - física, social, intelectual - portanto, a prioridade deveria ser a função física de reprodução e criação da criança. Esse argumento era usado para justificar não só a exclusão de mulheres da educação, mas também da participação em esportes em geral. (HOULIHAN, 2008, p. 47, tradução nossa).

O discurso amplamente utilizado defendia que a prática de esportes seria prejudicial à

saúde das mulheres, particularmente ao seu sistema reprodutor. Outras alegações afirmavam

que elas não possuíam condições psicológicas para competir e que a prática dos esportes

poderia masculinizar a mulher, o que evidencia a ideologia machista amplamente difundida

pelas organizações e mídia esportiva. Assim, percebe-se a manipulação das ciências

biológicas e fisiológicas para reforçar o dogma estabelecido, buscando sempre frustrar as

possíveis oportunidades para o engajamento de mulheres na prática esportiva.

Lacunas na organização e a falta de coesão do IOC permitiram que algumas provas

fossem destinadas às mulheres na segunda edição dos Jogos Olímpicos da era moderna, em

1900, com 22 atletas do sexo feminino competindo em dois esportes (golfe e tênis),

considerados esteticamente belos, nos quais não havia contato físico, preservando a sua

feminilidade.

Ainda assim, o IOC continuou impondo muitos obstáculos para a inclusão das

mulheres nas olimpíadas, e desafiando essa situação, a francesa Alice Melliat, com o apoio

dos Estados Unidos, fundou a Federação Internacional Esportiva Feminina (FSFI), em 1921, e

organizou as Olimpíadas Femininas e, posteriormente, os Jogos Mundiais Femininos. A FSFI

se dissolveu em 1938, quando as provas femininas foram gradativamente sendo incluídas nos

Jogos Olímpicos, depois de longas negociações e manobras políticas. (MIRAGAYA;

COSTA, 2006)

Conforme elas ingressavam no mundo esportivo e com o incremento do movimento

feminista, as ideologias, os papéis sociais e instituições tradicionais de preponderância

masculina eram questionados. Para auxiliar nesse fenômeno nos EUA, as mulheres receberam

suporte de alguns homens, como o inventor do basquete James Naismith, haja vista a

dominância dos mesmos no mundo esportivo tornava seu envolvimento e contribuições

críticos para alcançar igualdade de tratamento entre os gêneros.

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Por ocasião da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), milhões de homens serviram ao

militarismo nos Estados Unidos, desse modo, abrindo lacunas que precisavam ser

preenchidas. Muitas mulheres alistaram-se ao serviço militar, outras assumiram funções na

força de trabalho. Nesse momento também se vivenciou o advento da primeira equipe atlética

profissional feminina. A Liga Feminina Americana de Baseball iniciou em 1943, na tentativa

de substituir a Liga Masculina de Baseball que foi cancelada devido a guerra. Após esse

momento crítico, as organizações esportivas femininas e a pressão por oportunidades para

mulheres em esportes dispararam. (GRAY, 2004)

Durante as décadas de 1950 e 1960, a consciência social norte-americana sofria

mudanças, já que estavam profundamente entrelaçados com as discussões sobre os direitos

civis. O ativismo feminista impulsionou o movimento dos direitos das mulheres,

influenciando e aumentando a consciência dos envolvidos no esporte.

Aprovada em 1972, pelo Congresso dos Estados Unidos, o Title IX estabeleceu: Nenhuma pessoa em território norte-americano deve, com base no gênero sexual, ser excluído da participação em, ser negado os benefícios de, ou ser submetido a discriminação em qualquer programa de educação ou atividade que receba assistência financeira federal. (U.S. DEPARTMENT OF EDUCATION, 2015, s/p).4

Como nos Estados Unidos quase todas as escolas e universidades recebem assistência

financeira do governo, sejam elas em forma de bolsas, prêmios, salários, empréstimos

estudantis, áreas federais cedidas para instituições e outros fundos, encontrou-se um modo de

desencorajar qualquer tipo de discriminação baseado no sexo. Por meio de legislação federal,

a equidade de gênero se tornou um requerimento para todo programa educacional que recebe

incentivo do governo.

O Title IX é mais conhecido por sua influência no cenário esportivo estadunidense, a

ponto de ser erroneamente compreendido como uma lei que se aplica somente aos esportes.

No entanto, esta é apenas uma das dez áreas chaves abrangidas pela lei (acesso à educação

superior, carreira profissional, emprego, matemática e ciência, tecnologia, educação para

grávidas e pais estudantes, assédio sexual, ambiente educacional e testes padronizados). (U.S.

DEPARTMENT OF EDUCATION, 2015)

                                                                                                                         4 Title IX of the Education Amendments of 1972: "No person in the United States shall on the basis of sex, be excluded from participation in, be denied the benefits of, or be subject to discrimination under any educational program or activity receiving Federal Financial Assistance."

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A intenção original dessa emenda era simplesmente assegurar que as mulheres

tivessem iguais direitos garantidos para sua educação, sendo aplicado para todas as entidades

educacionais. Desde sua criação, o Title IX se tornou alvo de polêmicas, ambíguas

interpretações e acusações de favorecimento ao sexo feminino. A sociedade historicamente

patriarcal sentiu sua estrutura hierárquica ameaçada com a equivalência de direitos e, desse

modo, buscou formas de obstaculizar a implementação dessa emenda.

Alguns autores chegam a citá-la como uma lei de cotas. Gavora (2002) insinua que a

realização das mulheres no campo esportivo não pode ser considerada uma conquista pessoal,

mas somente como benefícios conquistados com o Title IX. Seu principal argumento defende

que “uma lei criada para eliminar a discriminação contra mulheres, incita a discriminação

contra homens” (GAVORA, 2002, p. 4, tradução nossa).

Porém, a lei, contrapondo-se às ideias da autora, evidencia o benefício a ambos os

sexos quando exige que as instituições proporcionem oportunidades de participação para

mulheres e homens que sejam substancialmente proporcionais às suas respectivas taxas de

matrícula de alunos de graduação; e estudantes-atletas de ambos os sexos recebam bolsa de

estudos proporcionais a sua participação; além da igualdade de tratamento. O esforço

concentrou-se na eliminação da discriminação contra as mulheres porque historicamente elas

têm enfrentado maiores restrições e barreiras não só na educação, mas em todas as esferas

sociais.

A NCAA, criada para regular o futebol americano masculino, tornou-se o regulador

dos esportes nas universidades. Contudo, não oferecia nenhuma bolsa e nenhum campeonato

para equipes femininas. Preocupados com o enfraquecimento de sua dominância e controle

sobre os eventos esportivos universitários, logo argumentaram que a emenda cobria somente

os programas educacionais que recebiam diretamente assistência financeira federal (GRAY,

2004), portanto o Title IX se tornaria inaplicável ao mundo esportivo.

Em 1974, formou-se uma coligação de grupos feministas denominada National

Coalition for Women and Girls in Education, e a partir de seu esforço e dedicação

colaboraram com o sucesso do Title IX (BELL, 2008). Regulamentos sobre a implementação

dessa lei somente foram efetivados em 1975 e, com o reforço das agências estadunidenses, a

situação começou a se reverter.

A Division of Girls and Women in Sport (DGWS), decidida a criar programas

esportivos universitários femininos, determinou a Association for Intercollegiate Athletics

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(AIAW)5 responsável para conduzir tais competições interuniversitárias. Como organizações

criadas e dirigidas por mulheres e para mulheres, defendiam diferentes abordagens para as

competições, que vão além da implacável perseguição ao lucro, o qual era o principal

interesse dos campeonatos esportivos masculinos e da NCAA. A AIAW, por outro lado,

preocupava-se com a real educação dos estudantes-atletas e tentava focar em uma orientação

diferencial.

Os estudos de Gray (2004) e Wu (2006) revelam que a NCAA, ao observar o

crescimento da participação feminina e o consequente aumento na circulação financeira em

torno disso, interessou-se ainda mais em controlar as atividades esportivas interuniversitárias

femininas, criando estratégias para enfraquecer a AIAW. Iniciaram dispensando a

regulamentação que impedia a participação de mulheres nos eventos masculinos, em 1973.

Posteriormente, decidiram formar seu próprio Comitê Feminino, o que evidenciava seus

interesses políticos, haja vista que anteriormente ao Title IX, a NCAA nunca havia

demonstrado interesse em assumir a responsabilidade por esportes femininos.

Em 1974, tentaram absorver a AIAW em sua estrutura, por meio de uma proposta de

filiação entre as associações, porém a NCAA não concordaria com uma igual representação

para homens e mulheres em todos os níveis de decisão política, impossibilitando um acordo.

Com seu poder e dinheiro, a NCAA se estabeleceu como um poderoso adversário para a

AIAW. Quando a NCAA decidiu incluir efetivamente mulheres em seus programas,

oferecendo campeonatos e obrigando as universidades a se decidirem entre ambos, a AIAW

começou a sofrer com abandono, pois era impossível competir com os incentivos oferecidos

pelo seu adversário, deixando de existir em 1982.

Ao observar as datas, é possível constatar que enquanto as duas associações lutavam

para ter o controle sobre os esportes femininos, o governo federal se empenhava para reforçar

o Title IX, por meio de regulamentações para sua implementação efetiva, que ocorreu três

anos após a aprovação da emenda. Evidentemente, a NCAA queria evitar problemas legais,

por isso o inicial interesse aparente, mas sem nenhum real compromisso com o esporte

feminino. Posteriormente, o capital produzido em tais competições tornou o incentivo às

mulheres conveniente. E então, a NCAA necessitava estar em conformidade com a legislação

vigente.

                                                                                                                         5 Inicialmente tratava-se apenas de uma comissão criada para dirigir os jogos interuniversitários femininos, denominada Commission on Intercollegiate Athletics for Women (CIAW). Posteriormente, com a necessidade de um órgão institucionalizado e que fizesse oposição direta à pressão sofrida pelo interesse da NCAA em dominar o cenário esportivo feminino, criou-se a AIAW. (WU, 1999)

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Como se pode observar nas Tabelas 1 e 2, tanto no ensino médio quanto na

universidade, houve um aumento da participação “delas” nos esportes praticados, porém o

crescimento expressivo de 1.011,4% nos esportes colegiais se destaca em relação às taxas de

inserção feminina nos esportes universitários, que cresceu 222,7%. Percebe-se também um

crescimento da participação masculina, mesmo que essa taxa de aumento não acompanhe a

das mulheres. Isso ocorre porque as oportunidades para homens já foram muito prevalentes

durante todo o processo histórico, e ainda assim, verifica-se que a quantidade de

participantes do sexo masculino ainda sobrepõe-se ao do sexo feminino.

Tabela 1 - Participação Esportiva no Ensino Médio nos EUA – 1972-2014

Ano Meninos α(%)/T Meninas α(%)/T TOTAL

1971 - 1972 3.666.917 92,6 294.015 7,4 3.960.932

2013 - 2014 4.527.994 58,1 3.267.664 41,9 7.795.658

∆ (%) 1972-2014 23,5 .. 1.011,4 .. 96,8

Fonte: NFHS (s/d).

Tabela 2 - Participação Esportiva na Universidade nos EUA – 1982-2014

Ano Homens α(%)/T Mulheres α(%)/T TOTAL

1981 - 1982 167.055 72,2 64.390 27,8 231.445

2013 - 2014 271.055 56,6 207.814 43,4 478.869

∆ (%) 1982-2014 62,2 .. 222,7 .. 106,9

Fonte: NCAA (2014).

A partir da década de 1980, alguns esportes de maior contato e/ou considerados mais

exaustivos, foram inclusos nas edições dos Jogos Olímpicos: field hockey (1980), ciclismo

(1984), judô (1992), futebol americano (1996) e triathlon (2000). (INTERNATIONAL

OLYMPIC COMITTEE, 2016). Dessa forma, de acordo com o Gráfico 1, verifica-se também

que o número de participação “delas” vai acompanhando esses acréscimos, impulsionado pelo

IOC ao inserir determinadas modalidades olímpicas para disputas femininas.

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Gráfico 1 - Participação Masculina e Feminina nos Jogos Olímpicos – 1896-2012

Fonte: IOC (s/d).

O Gráfico 2 evidencia a evolução da inserção de atletas estadunidenses nos Jogos

Olímpicos. Em 1972, o número de participantes do sexo feminino se aproximava de 100.

Vinte anos após o Title IX, sua participação já havia superado o dobro. No século XX,

observa-se que os números começam a tender ao equilíbrio. Portanto, o Title IX também

influenciou positivamente o esporte de alto rendimento nos EUA, garantindo incentivos à

ambos sexos.

Gráfico 2 – Participação dos EUA nos Jogos Olímpicos, por Gênero – 1972-2012

Fonte: Smith and Wynn (2013) apud Woods (2016, p. 317).

Desse modo, é possível afirmar que o Title IX provocou mudanças positivas no

cenário esportivo estadunidense, no entanto o estabelecimento de uma lei federal não garantiu

uma mudança de atitude mediante os direitos “delas” que continuam sofrendo com a

discriminação, desrespeito e misoginia no cenário esportivo.

01000200030004000500060007000

1896

1900

1904

1908

1912

1920

1924

1928

1932

1936

1948

1952

1956

1960

1964

1968

1972

1976

1980

1984

1988

1992

1996

2000

2004

2008

2012

Homens

Mulheres

050

100150200250300350400450

1972 1992 2008 2012

Homens

Mulheres

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3 INSERÇÃO FEMININA NO CENÁRIO ESPORTIVO BRASILEIRO

No Brasil, a participação feminina em esportes também enfrentou dificuldades para

ser aceita. O ideal renascentista do “belo sexo”, que não passa de uma mistificação da beleza

feminina como superior foi importante para a criação de crenças que continuam representando

dificuldades para as mulheres e reconhecido nos discursos que sobrepõe os atributos físicos

ao próprio desempenho nas atividades realizadas por “elas”.

Colonizado por Portugal, o Brasil recebeu diversos imigrantes europeus e,

consequentemente, sofreu influência dessa cultura. Durante o século XIX, especificamente no

período imperial, o conservadorismo da sociedade condenava as práticas esportivas para as

mulheres, contudo foi paulatinamente revertida desde a independência do país, com a

propagação de ideais eugênicos e higiênicos.

Em 1874, percebe-se um esforço para a inclusão da ginástica feminina nas escolas do

Rio de Janeiro, enfrentando intensa resistência das famílias e das próprias alunas, o que

resultou em suspensão das aulas. Em 1882, Rui Barbosa “deu seu parecer ao projeto

educacional de reforma do ensino primário, [...], entendendo que a ginástica deveria ser

obrigatória para ambos os sexos em todo o país” (KNIJNIK, 2003, p. 59), no entanto, a

inserção “delas” era cogitada apenas porque esse esporte valorizava as formas femininas.

No século XX, gradativamente se tornou possível a ampliação e consolidação do

envolvimento de mulheres com os esportes. Como o país era majoritariamente composto por

negros, segundo Goellner (2009), tentou-se investir em um aprimoramento da raça, já que a

elite branca se considerava superior. Assim, alguns planos foram desenvolvidos para atingir

esse ideal racial e, dentre esses, o incentivo à realização de atividades físicas, no qual os

médicos higienistas reconheciam a importância dessas práticas para a saúde da mulher,

embelezando-as e fornecendo melhores condições orgânicas para enfrentar a maternidade. Ao mesmo tempo em que se recomendavam determinadas atividades físicas como, por exemplo, a ginástica e a natação, houve a preocupação de desaconselhar atividades que poderiam levar entre outros fatores à masculinização da mulher, o que era completamente o oposto dos ideais de beleza e saúde, fatores motivacionais da prática esportiva feminina da época. (GOELLNER, 2004 apud ALMEIDA, 2008, p. 36).

Na década de 1920, a inserção das mulheres “[...] nos esportes e atividades físicas

começa nos clubes [...] através das jovens, normalmente filhas de imigrantes europeus que já

apreciavam o valor do exercício e lhe davam incentivo para sua inserção no esporte”

(OLIVEIRA; CHEREM; TUBINO, 2008, p. 122). Percebe-se que a inicial mudança ocorre

somente para as classes sociais mais favorecidas, primeiramente porque essas mulheres

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brancas seriam responsáveis em regenerar a raça, pelo seu importante papel na reprodução

humana e também porque era essa riqueza que sustentava esses espaços.

A partir de 1930, surgem cada vez mais competições de natação, nas quais se revela

Maria Lenk, que iniciou sua prática desportiva por motivos de saúde, tornando-se um marco

para a inserção das mulheres nesse cenário, principalmente após ter sido a primeira a

representar o Brasil nos Jogos Olímpicos, na edição de 1932. No mesmo período, houve o

primeiro campeonato feminino de bola ao cesto, apresentando as mesmas regras usadas nas

disputas masculinas, com a única diferença no tempo de jogo.

Além disso, os Jogos Femininos do Estado de São Paulo, em 1935, os Jogos da

Primavera no Rio de Janeiro, em 1949, e os Jogos Abertos Femininos, em 1954, permitiram o

acesso a uma variedade de práticas esportivas abertas ao público (OLIVEIRA; CHEREM;

TUBINO, 2008; GOELLNER, 2009). Percebe-se no surgimento de eventos isolados e de

atletas do sexo feminino de forma dispersa, geralmente com interesses diferentes, uma

discreta contribuição para mudar a visão de “sexo frágil”. Dessa forma, o aumento de eventos

esportivos nos grandes centros urbanos revela uma ampliação do envolvimento “delas” com

os esportes, contudo carrega consigo uma gama de reações conflituosas.

Durante o Estado Novo (1937-1945), período caracterizado pela intensa intervenção

do Estado na economia e na cultura, a preocupação com a masculinização da mulher foi

oficializada por meio do Decreto-Lei n. 3.199, de 14 de abril de 1941, em que ficou

estabelecido as bases para a organização dos desportos em todo o país. Na avaliação de

Goellner (2009, p. 279) ele é “[...] considerado o primeiro documento a balizar o ordenamento

esportivo brasileiro”, no entanto “[...] vedava às mulheres a prática de esportes incompatíveis

com a sua natureza” (KNIJNIK, 2003, p. 62). Em 1965, a Deliberação n. 7 do Conselho

Nacional dos Desportos (CND) regulamento o artigo 54 do Decreto-Lei n. 3.199/416 ao

definir as modalidades proibidas, conforme segue: lutas, futebol, futebol de salão, futebol de

praia, polo aquático, polo, rugby, halterofilismo e baseball. (CASTELLANI FILHO, 1994, p.

63).

Desse modo, o fenômeno da inserção das mulheres brasileiras nos esportes ficou

ameaçado, com uma redução de oportunidades. Mesmo com o cenário desfavorável, o qual

durou quase quatro décadas, nem todas as mulheres deixaram de praticar seus esportes,

desafiando as condutas sociais e legais. Porém, “não se encontra registros de grupos ou

                                                                                                                         6 Art. 54. Às mulheres não se permitirá a prática de desportos incompativeis com as condições de sua natureza, devendo, para este efeito, o Conselho Nacional de Desportos baixar as necessárias instruções às entidades desportivas do país. (BRASIL, 1941)

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mesmo competições que foram organizadas por mulheres atletas no sentido de reivindicar

direitos ou contrapor-se ao que estava estabelecido como favorável aos homens” (TRALCI

FILHO; ARAÚJO, 2011 apud NASCIMENTO, 2012, p. 34).

Na década de 1970, os governos da Ditadura empresarial-militar, em conjunto com a

mídia, estimularam as práticas esportivas com o interesse de desmobilizar e ludibriar a

população, e inseriu no esporte a lógica do espetáculo, assim como o seu uso como

ferramenta de propaganda política. A partir de então, as imagens de atletas femininas

passaram a ser valorizadas, haja vista que o país precisava ascender como potência esportiva

e, para tanto, as conquistas de ambos os sexos seriam necessárias.

Em 1976, por ocasião da criação da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito

(CPMI) para examinar a situação da mulher em todos os setores (social, político e trabalhista),

foi possível ampliar a discussão sobre a opressão à mulher. Personalidades esportivas, como

Maria Lenk e Iris Carvalho, participaram sugerindo a revogação da Deliberação CND n. 7/65.

O Relatório da CPMI da Mulher, publicado em 1978, apresenta uma série de

depoimentos com 32 mulheres de diversos setores. É simbólico o depoimento de Maria Lenk

acerca da conjuntura que se instaurou no Brasil a partir do Decreto-Lei n. 3.199/41 e sua

posterior regulamentação em 1965:

[…] em dado momento, elaborou-se um decreto-lei, que dizia respeito aos desportos, e que feito por homens deixava bem claro que os homens se preocupavam com a mulher. […] Então, ficou proibido à mulher jogar futebol, futebol de salão, rugby, lutas, uma série de coisas. Acentuo bem o futebol, porque atribuo a essa restrição, a essa proibição, a quase impossibilidade do desenvolvimento do esporte feminino no Brasil. (BRASIL, 1978, p. 329, grifo do autor).

Ainda sobre a realidade gerada pela CPMI da Mulher, em 1979, o presidente da

Confederação Brasileira de Judô inscreveu mulheres, utilizando apenas seus sobrenomes, no

Campeonato Sul-americano, sendo posteriormente convocado para prestar esclarecimentos,

mesmo após sucesso da participação “delas” na competição. Esse fato contribuiu para revogar

a proibição expressa na Deliberação CND n. 7/65, e ocorreu por meio da Deliberação CND n.

10, em 1979. (SOUZA; MOURÃO, 2011; CASTELLANI FILHO, 1994, p. 62)

Os prejuízos gerados pela Deliberação CND n. 7/65 durante o período de sua

validade, podem ser observados na discrepante participação de homens e de mulheres

brasileiras em Jogos Olímpicos, entre 1920 e 1980, conforme os dados expressos no Gráfico

3. Tal realidade contribui para o atraso do Brasil na história dos Jogos Olímpicos.

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Gráfico 3 - Participação do Brasil nos Jogos Olímpicos, por Gênero – 1920-2012

Fonte: Comitê Olímpico Brasileiro (s/d).

Nota-se também, que a partir da década de 1980, a participação “delas” aumentou

consideravelmente, produto da inserção feminina em esportes antes compreendidos como

inadequados à sua natureza. Somente então, certas “modalidades […] passaram a ter seus

equivalentes femininos (judô e futebol); outras, embora integrassem há décadas o programa

olímpico, passaram a contar com representantes brasileiras em suas disputas (basquete e

handebol)” (NASCIMENTO, 2012, p. 36).

Embora estivesse legalmente permitido o acesso feminino a qualquer esporte,

praticá-los ainda representava uma atitude passível de críticas e julgamentos, pois a sociedade

seguia associando determinadas práticas a homens ou a mulheres, o que abria margem para

questionamentos sobre feminilidade e sexualidade.

Conforme os dados expressos no Gráfico 4, as atletas federadas, em 1970,

representavam apenas 6% do total de praticantes federados. Esse dado é o produto concreto da

coerção sobre as mulheres no mundo esportivo no Brasil. Em 2013, apesar dos avanços, ainda

é tímida a participação das mulheres frente aos homens no mundo dos esportes, perfazendo o

percentual de 30%.

020406080

100120140160180

1920

1924

1928

1932

1936

1948

1952

1956

1960

1964

1968

1972

1976

1980

1984

1988

1992

1996

2000

2004

2008

2012

Homens

Mulheres

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Gráfico 4 – Praticantes por Gênero Registrados nas Federações (1970) e Praticantes por Gênero por amostragem (2013)

Fontes: Costa (1971, p. 287); Ministério do Esporte (2015).

As discrepâncias entre ambos os sexos, no âmbito esportivo, podem ser evidenciadas

não apenas no número de praticantes, mas no conjunto de determinantes que permeia a

dinâmica do esporte, conforme aborda Goellner (2012): No esporte de rendimento, são bem menores os recursos destinados para patrocínios, incentivos, premiações e salários; em algumas modalidades, a realização de campeonatos é bastante restrita e, por vezes, inexistente; há pouca visibilidade nos diferentes meios midiáticos; a participação de mulheres em órgãos dirigentes e de gestão do esporte é ínfima; a inserção em funções técnicas, como treinadoras e árbitras, ainda é diminuta; federações, confederações, clubes e associações esportivas mantêm registros precários sobre a participação das mulheres em seus dados oficiais. (GOELLNER, 2012, p. 73-74).

O movimento feminista contribuiu para essas conquistas por meio de

questionamentos sobre seus direitos civis, políticos, liberdade de decisão sobre seu corpo e

sexualidade. Discussões que refletiam automaticamente no espaço esportivo.

Concomitantemente, o esforço de pequenos números ou grupos de atletas, impondo seu

espaço no esporte, demonstrando habilidade e desconstruindo dogmas, contribuiu com a

causa feminista. Mesmo como afirma Nascimento (2012), que as possibilidades de inserção

no esporte e o movimento feminista seguiam como paralelos sem se entrecortarem, as suas

reivindicações se complementavam.

Atualmente, o Brasil ainda carece de incentivos e reconhecimentos aos esportes

femininos, como fica explícito no futebol – “paixão nacional” – a discrepância nas

visibilidades atribuídas às seleções masculinas e femininas. Outro exemplo se refere às atletas

da seleção feminina de handebol. Estas, ao compartilharem suas preocupações com o futuro

Homens94%

Mulheres6%

1970

Homens 70%

Mulheres 30%

2013

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do esporte afirmam que o país conta com meninas de muita qualidade, mas temem que não

consigam conquistar título s por falta de incentivo. Como expresso por uma das atletas

(Babi): "A gente luta pelo mesmo reconhecimento que temos na Europa, mas que ainda é

muito pobre no Brasil.” (MONTES, 2013, s/p).

Portanto, os países estrangeiros valorizam, reconhecem e oferecem mais condições

para as atletas brasileiras que seu próprio país de origem. Sendo assim, evidencia-se a

necessidade de maior mobilização no âmbito esportivo brasileiro para a geração de

oportunidades e condições de desenvolvimento do esporte feminino.

4 ANÁLISE COMPARATIVA DA INSERÇÃO FEMININA NO CENÁRIO

ESPORTIVO DOS EUA E DO BRASIL

Para essa análise, torna-se crucial evidenciar a inegável influência europeia sobre os

EUA e o Brasil, haja vista que ambos foram colonizados por países europeus. Por isso, pode-

se perceber que a exclusão dos direitos femininos à participação na vida social e política foi

transpassada da antiga Europa para o “novo continente”. Observa-se também que os discursos

defendidos para tal eram os mesmos, com destaque para a preocupação com a capacidade

reprodutiva da mulher, sendo a mais encontrada nos estudos históricos.

No entanto, como os EUA continuou recebendo influência direta da França, um dos

países onde os ventos do feminismo sopravam mais intensamente (NASCIMENTO, 2012),

identifica-se uma aproximação acentuada com a causa e, assim, o despertar para as questões

de direitos das mulheres ocorreu mais cedo, por volta da primeira metade do século XX,

exemplificado com o apoio dado à francesa Alice Melliot para a criação de um órgão

esportivo internacional feminino, em 1921.

No Brasil, essa influência ganhou força posteriormente e com a enraizada cultura

patriarcal e as duras repressões sofridas durante a Ditadura empresarial-militar, dificultou-se

ainda mais sua difusão. Então, o movimento feminista brasileiro ocorreu de modo distinto,

disperso – podendo ser dividido em três fases – e foi mais discreto do que nos EUA, onde se

percebe uma luta pela equidade do gênero marcada pelo “enfrentamento”. (NASCIMENTO,

2012)

Desse modo, é possível verificar que, no Brasil, as atletas não se articularam

efetivamente em nenhum momento com o feminismo para a criação de grupos que lutassem

diretamente pelos seus direitos no âmbito esportivo, e sua inserção foi caracterizada por

conquistas individuais de mulheres que reivindicaram para si o direito de praticar esportes.

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Caracteriza-se, portanto, como um processo desordenado, sem a sistematização de uma ação

coletiva, o que resultou em um atraso em relação às estadunidenses.

Os estadunidenses, por sua vez, contribuíram com a temática em nível mundial,

aumentando a consciência dos envolvidos. Apoiaram movimentos de resistência à misoginia

culturalmente proposta e se articularam em entidades esportivas para a criação de eventos e

competições, promovendo o esporte feminino, tentando garantir esses direitos às mulheres.

Para exemplificar, há registros de organizações, já citadas anteriormente, como a National

Coalition for Women and Girls in Education (NCWGE), formada por grupos feministas, a

Division of Girls and Women in Sport (DGWS) e a Association for Intercollegiate Athletics

(AIAW).

No país norte-americano, o esporte feminino nasceu da Educação Física organizada e

de atividades recreativas e esportivas não competitivas, tanto que se observa nos estudos

sobre as instituições reguladoras dos esportes femininos, um compromisso com a orientação

pessoal das atletas, sem interesse lucrativo. Porém, para concretizar sua inserção no mundo

esportivo, foi necessário focar em competições, sendo assim as entidades femininas sentiram

a necessidade de se adequar ao sistema capitalista e competitivo, para terem possibilidades de

provar sua capacidade e condições de atuar nesse cenário. (GRAY, 2008; WU, 2006)

Esse movimento ocorre de modo diferente no Brasil. Um dos fatores foi a relação da

Educação Física com a formação militar, o que reduzia os espaços para a intervenção das

mulheres. Portanto, a aproximação “delas” com os esportes se deu, inicialmente, através de

clubes, revelando inclusive uma segregação no próprio gênero feminino, já que eram espaços

restritos, onde somente mulheres brancas e ricas conseguiam ter acesso às limitadas opções de

esportes.

Uma característica inerente a ambos os países é o registro histórico sob a ótica dos

homens, pois conforme aponta Goellner (2007), constantemente se confunde a história

“deles” com a história das espécies, cunhando na memória da humanidade os acontecimentos

a partir do masculino. Uma simples prova disso está na dificuldade em encontrar dados

quantitativos de praticantes de esportes por gênero, especialmente no Brasil, pois quase não

há registros, exceto nos estudos que tratam dessa participação nos Jogos Olímpicos. E, ainda

assim, a maioria dos dados encontrados se refere aos homens, muitas vezes sendo necessária a

realização de cálculos aproximativos sobre as participações femininas.

Dentre as diferenças desse processo histórico, pode-se citar também que, enquanto na

Segunda Guerra Mundial as mulheres estadunidenses participaram efetivamente da vida

social, substituindo os homens enviados ao combate, refletindo também no âmbito esportivo a

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sociedade brasileira vivia a ditadura varguista, em que seguia na direção contrária, com os

direitos de participação em alguns esportes tolhidos legalmente.

A escolha dos dados quantitativos para esse estudo se concentra, em especial, na

década de 1970, principalmente porque nesse período aconteceram situações que marcaram e

definiram a evolução da participação das mulheres no fenômeno esportivo, tanto

estadunidense quanto brasileiro: a criação da lei federal Title IX, em 1972 e a revogação da

Deliberação CND n. 7/65, em 1979. (U. S. DEPARTMENT OF EDUCATION, 2015;

CASTELLANI FILHO, 1994).

Observa-se que, nos Estados Unidos, em 1971–1972, apenas 7,4% dos praticantes de

esportes no ensino médio eram mulheres; em 1981–1982, 27,8% dos praticantes de esportes

nas universidades eram do sexo feminino. O Title IX foi criado para corrigir esses

desequilíbrios, sendo resultado de um esforço coletivo dos grupos de mulheres que

participaram ativamente da luta por equidade de direitos.

No Brasil, os números dos praticantes registrados em federações, em 1970, perfez o

total de 6% do sexo feminino. Nesse período, ainda vigorava a Deliberação CND n. 7/65,

derrubado mais tarde por diversos interesses que vão além do real compromisso com o

esporte feminino e se encontra profundamente relacionado com intenções políticas. Portanto,

enquanto “lá” se criava uma mobilização legal para superar essa discriminação, “aqui” ainda

era preciso derrubar um dispositivo legal que corroborava com essa segregação.

Em 2013–2014, no país norte-americano, a porcentagem de praticantes de esportes

do sexo feminino no ensino médio cresceu para 41,9% e nas universidades, para 43,4%. Esses

números são indícios de que o Title IX causou um impacto positivo na geração de

oportunidades para as mulheres nos esportes, o que permitiu um aumento nessas práticas,

principalmente no ensino médio.

Dados de 2013 mostram que, em território brasileiro, a porcentagem de praticantes

do sexo feminino é de 30%, evidenciando uma tímida evolução. Dessa forma, constata-se

que, mesmo quando a participação feminina é amplamente permitida, a dinâmica das relações

de gênero e noções de masculinidade e feminilidade podem resultar em segregação,

ressaltando a importância da criação de políticas nacionais no âmbito esportivo para qualificar

esse processo.

Problemas similares nos dois países se referem também à marginalização do esporte

feminino na mídia, apresentado em outro estilo, reforçando os estereótipos de gênero. A

exploração da imagem feminina e o assédio no desporto são manifestações das percepções de

dominância, força física e poder dos homens que são tradicionalmente retratados no esporte

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masculino. A mídia poderia contribuir positivamente na formação da percepção da sociedade

sobre as mulheres, porém continua reafirmando os valores distorcidos e segregacionistas.

Os Jogos Olímpicos, como maior referência em competições esportivas, são

constantemente analisados para verificar os avanços desse processo, pois ajudam a refletir as

realidades dos países em questão. Pela análise do Gráfico 5, observa-se que, no decorrer de

1972 a 2012, a participação feminina brasileira saltou de 6% para 47%. Por sua vez, as atletas

estadunidenses saíram de 21% para 51% na participação feminina nesses eventos. Percebe-se

então que este não pode ser o único parâmetro de avaliação, pois mesmo com os grandes

avanços no esporte de alto rendimento no Brasil, a participação de mulheres brasileiras na

prática de esportes não competitivos teve um crescimento mais modesto, como já evidenciado

anteriormente.

Gráfico 5 – Participação feminina nos Jogos Olímpicos, EUA e Brasil – 1972-2012

Fontes: Woods (2016, p.317); COB (s/d).

Mesmo com os acontecimentos da década de 1970 proporcionando avanços para a

inserção das mulheres no âmbito dos esportes, não é possível afirmar que houve mudanças de

comportamento. No Brasil, a revogação da Deliberação CND n. 7/65, possibilitou o seu

envolvimento com todas as práticas esportivas, porém só podiam fazer aquilo sobre o qual

havia uma aprovação social e os esportes, principalmente os de maior contato físico,

continuavam não condizendo com as condutas que deveriam ser seguidas por “elas”, dessa

maneira, ainda permaneceram socialmente condenadas.

1972 1992 2008 2012EUA 21% 33% 48% 51%BRASIL 6% 26% 48% 47%

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

Percentual

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Do mesmo modo que a criação do Title IX, nos EUA, que não significou a ruptura

completa com os pensamentos machistas, podendo ser evidenciado no desespero de entidades

esportivas masculinas em atacar e tentar burlar a lei, valendo-se de estratégias duvidosas para

desestabilizar as organizações esportistas femininas, com a preocupação de perder seu

domínio. Além disso, mesmo sendo um esforço para equivaler os direitos femininos e

masculinos, alguns ainda encaram essa emenda como prejudicial aos homens,

desconsiderando os séculos de segregação aos quais as mulheres foram submetidas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Essa pesquisa procurou realizar uma análise comparativa sobre os processos

históricos de inserção das mulheres no fenômeno esportivo. Durante seu desenvolvimento,

esbarrou-se em dificuldades para encontrar dados quantitativos sobre a participação em

esportes no Brasil, decorrente da restrita produção e ausência de registros.

Os resultados encontrados revelam que, apesar dos enormes ganhos ao longo dos

anos, muito trabalho ainda precisa ser realizado, pois embora as taxas de participação em

esportes tenham crescido tanto para homens quanto para mulheres, o envolvimento “delas”

ainda se encontra prejudicado em relação aos colegas do sexo oposto, principalmente no

cenário brasileiro.

Quanto ao objetivo central desse estudo, nota-se um maior avanço nesse processo

nos Estados Unidos, decorrente de uma profunda relação com as discussões dos direitos civis

e organização dos grupos feministas para a defesa dos ideais igualitários. Ainda um pouco

atrasado, o Brasil conta com personalidades femininas persistentes que, sem nenhuma ajuda

de políticas nacionais combatem esse quadro e conseguem estabelecer mudanças graduais.

A culpa do atraso histórico desse processo no Brasil pode ser atribuído também à

criminalização de determinadas práticas esportivas por mulheres, durante quase quatro

décadas. Em contrapartida, a influência do governo federal norte-americano ao criminalizar

práticas discriminatórias baseado no gênero criou mais oportunidades para o desenvolvimento

esportivo feminino.

Como o desporto é tradicionalmente um domínio masculino, as restrições sociais são

um grande impedimento para o seu acesso, sendo algumas destas, semelhantes nos dois

países, tais como a percepção de inferioridade em relação as capacidades físicas das mulheres,

inclusive, em alguns casos, havendo uma internalização dessas percepções negativas pela

própria população feminina.

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Desse modo, não é suficiente apenas a criação de leis forçando a aceitação feminina

sem o auxílio de políticas públicas para conscientizar a sociedade. A promoção e

popularização do esporte feminino requer estratégias que superem a sua representação

inadequada, confrontando paradigmas, redefinindo expectativas sobre homens e mulheres e

transformando a visão altamente sexualizada, na qual a beleza física se sobrepõe às

habilidades atléticas.

Diante desse cenário ainda constante de reproduções negativas sobre o corpo

feminino, percebe-se a importância desse estudo para contribuir com a transformação dos

valores construídos e reproduzidos pelo esporte que, como sendo um espaço de embate,

coloca as situações de gênero em questão, já que a participação “delas” desafia a gama de

estereótipos, questionando também os papéis das mulheres na sociedade em geral.

Como sugestão para futuras pesquisas, deve-se aprofundar a investigação

comparativa sobre o envolvimento das mulheres em outras áreas do cenário esportivo, tais

como árbitras, treinadoras e repórteres, para ampliar a análise da inserção feminina em todos

os âmbitos esportivos.

Abstract: The study comparatively analyzes the historical processes of women’s participation on sportive phenomenon in Brazil and United States. Methodologically, it is based on bibliographical research, and for theoretical and methodological reference, historical dialectical materialism is used; concerning the method to analyze data, it was used the comparative analysis. The research results revealed that, despite the huge gains over the years, women’s involvement is still impaired compared to men, especially in the Brazilian scene. It concludes that, in both countries, the quantitative advances do not indicate a behavior change in dealing with gender. Keywords: Gender. Sport. Spots Culture.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, T. R. Fortes, aguerridas e femininas: um olhar etnográfico sobre as mulheres praticantes de rugby em um Clube de Porto Alegre. 2008. 140 f. Dissertação (Mestrado em Ciências do Movimento Humano) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. 2008. BELL, R. C. A history of women in sport prior to title IX. The Sport Journal, [s.l.], p. 1-7, mar. 2008. BRASIL. Decreto-Lei n. 3.199, de 14 de abril de 1941. Estabelece as bases de organização dos desportos em todo o país. Diário Oficial [dos] Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, 16 abr. 1941. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/1937-1946/Del3199.htm>. Acesso em: 28 maio 2016.

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