Horizonte Cultural Paleoindio

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA DOCENTE: Walner Barros Spencer HORIZONTE CULTURAL PALEOÍNDIO Natal

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTECENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIADOCENTE: Walner Barros Spencer

HORIZONTE CULTURAL PALEOÍNDIO

Natal

2007

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INDICE

INTRODUÇÃO

TEORIAS SOBRE A CHEGADA DO HOMEM ÀS AMÉRICAS

FORMAS DE ORGANIZAÇÃO SOCIAL

CULTURA MATERIAL

SURGIMENTO DA AGRICULTURA

CONCLUSÃO

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INTRODUÇÃO

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TEORIAS SOBRE A CHEGADA DO HOMEM ÁS AMÉRICAS

Até os dias atuais as polemicas sobre a ORIGEM, COMO, POR QUAL ROTA e principalmente QUANDO o homem teria chegado na América, ensejam acirrados debates dentro da comunidade científica.

Várias teorias foram formuladas, como a da migração pela beríngia, praticamente aceitas pela maioria dos arqueólogos. Outras, como a formulada pelo arqueólogo Walter Neves da Universidade de São Paulo estão sendo seriamente analisadas. Há ainda teorias sem nenhuma comprovação científica, como a dos “continentes perdidos” entre os quais Atlântida e Lemúria, de onde poderiam ter vindo os primeiros habitantes humanos das Américas.

Abaixo seguem algumas das teorias existentes:

a) A teoria de Florentino Ameghino, famoso paleontólogo, é que o homem americano teria se desenvolvido na América, calcado em inúmeras descobertas de ossos humanos, nas margens do Rio Frias, próximo a Buenos Aires, Argentina. Além, também, de carvão vegetal em abundância, terra tostada, ossos de animais pré-históricos que ostentavam estrias, sulcos e entalhaduras feitas pela ação humana. Encontrou também, pontas de flechas e facas de pedras, ossos pontiagudos e diversas ferramentas para afiar. Esses achados provariam a coabitação humana com os animais antediluvianos. Essa teoria, atualmente, é amplamente rejeitada, pois até o momento, não foram descobertos fósseis de antropóides superiores no continente, como também, em relação aos ossos humanos encontrados na época da formulação da teoria não se conhecia a técnica de datação pelo carbono-14.

b) Outra teoria é a de Alis Hardilick ou teoria mongólica – o homem americano migrou para a América há cerca de 15.000 anos, através do Estreito de Bering. Um trabalho científico de dois geneticistas brasileiros, Sérgio Danilo Pena e Fabrício Santos, publicado na Revista Science em março de 1999, confirma o parentesco genético entre tribos de seis países americanos (Brasil, Peru, Argentina, Colômbia, México e Estados Unidos) e um pequeno povoado nas Montanhas Altai, localizado entre a Sibéria, Rússia e Mongólia. Este trabalho foi apresentado como prova irrefutável da origem asiática dos ameríndios, os quais penetraram pelo Estreito de Bering, comprovando a teoria de Alis Hardilick.

c) Em 1972, o arqueólogo Knut Fladmark, da Universidade Simon Fraser em Vancouver, Canadá, afirmou que os primeiros americanos eram pescadores de embarcações precárias, originários da Polinésia, Ásia ou Austrália, vindos via Oceano Pacífico, através de uma longa cadeia de ilhas hoje desaparecidas. Para sustentar esta teoria, em setembro de 1998, descobriu-se no sul do Peru, dois acampamentos de povos marítimos desconhecidos: Quebrada Jaguay com 11.100 anos e seus moradores comiam mariscos e peixes; e os de Quebrada Tacahuay, mais ao sul de idade datada de 10.700 anos, os quais alimentavam-se de peixes e pássaros marinhos como os cormorões.

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d) Vários antropólogos, historiadores e arqueólogos têm sugerido que os nativos americanos são descendentes, quer de europeus, quer africanos que atravessaram o Oceano Atlântico. Alguns apontam a semelhança física entre os Olmecas e os africanos. Thor Heyerdahl demonstrou que é possível navegar da África para a América numa réplica dum barco de papiro do antigo Egito. Existe igualmente evidência genética de antepassados africanos em alguns índios da Argentina e arqueológica de artefatos que podiam ser de origem européia de antes da ocupação da Europa por asiáticos.

e) A maioria das religiões dos nativos americanos ensinam que os humanos foram criados na América no princípio dos tempos e sempre ali viveram.

f) A doutrina Mórmon diz os ameríndios são descendentes de Lehi e dos nefitas, que teriam sido Israelitas que chegaram à Américas cerca de 590 aC.

g) O arqueólogo Walter Neves da Universidade de São Paulo e seu parceiro de pesquisa, Héctor Pucciarelli formularam uma hipótese, a qual milhares de anos antes da escravidão negra, já poderia haver africanos na América. Baseou-se na análise de detalhes anatômicos de centenas de ossos de índios no Brasil, Chile e Colômbia. As medidas quase sempre coincidem com as de atuais povos do Extremo Oriente. No entanto, os crânios mais antigos, apresentam traços africanos, parecidos com os aborígenes da Austrália. Um deles, o de uma mulher encontrada em Lagoa Santa, Minas Gerais, com 11.500 anos de idade, segundo datação realizada em 1998 é o crânio mais velho das Américas, cognominada de Luzia, que fazia parte do grupo dos “homens de Lagoa Santa”, os quais se alimentavam de mais vegetais, através da coleta, do que da caça. A medição dos ossos de Luzia revelaram um queixo proeminente, um crânio estreito e longo e faces estreitas e curtas. Assim, sugere que, antes da chegada dos ancestrais asiáticos dos ameríndios, houve uma primeira leva de imigrantes que deixou a África há 120.000 anos.

h) A hipótese de que o homem evoluiu no Velho Mundo e migrou para a América a pé, partindo da Sibéria pelo Estreito de Bering é uma das hipóteses mais prováveis e mais aceitas pela maioria dos cientistas. Para isso ter acontecido é importante explanar algumas considerações:

a. Teria que existir uma conexão terrestre entre a Sibéria e o Alasca, a Beríngia, ocorrida no Pico Glacial e mantida assim por longo intervalo. Isso acontecia, quando o nível do mar baixava cerca de 200 a 160 metros do nível atual.

b. Deveria haver, também, um afastamento do lençol de gelo, formando um corredor verde, a qual a vida poderia ser mantida tornando acessível o percurso entre o Nordeste da Sibéria e o Vale Yucon, ao longo da vertente oriental das Montanhas Rochosas Canadenses e Americanas, caso contrário a migração nesta área seria impossível. Durante cerca de 10.000 anos esta passagem ficou interrompida, pois a glaciação atuou como barreira, impedindo novos movimentos migratórios.

Estas duas condições ocorreram simultaneamente em algumas ocasiões:

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O último Pico Glacial data mais ou menos entre 28.000 e 10.000 anos atrás, quando depois a ponte ficou submersa novamente, fato que perdura até hoje.

O penúltimo Pico Glacial aconteceu entre cerca de 50.000 a 40.000 anos e foi usada por muitas espécies de grandes mamíferos do Velho Mundo.

Houve ainda uma passagem anterior mais antiga com cerca de 150.000 anos atrás. Observa-se, neste período, a existência do Homo sapiens neanderthalensis na Ásia.

Esta possibilidade da entrada do homem na América por motivos glaciais e da origem mongólica, é uma concepção dos cientistas a partir do século XIX, por argumentos dedutivos em vista de a Ásia ser a região mais próxima da América. Um argumento favorável que se apresenta para fortalecer esta hipótese são as características biológicas do ameríndio, conforme houve inclusive, algumas provas apresentadas no tópico anterior.

As evidências arqueológicas nos sítios, no entanto, desconhecem traços característicos e especializados de adaptações ao frio nos primeiros imigrantes. Portanto, a hipótese estaria mais próxima do caráter biológico do que arqueológico e, por isso, muitos se afastaram da possibilidade de que o homem seria oriundo da Ásia, levando ao pensamento de teorias distintas e diversificadas.

Sobre a teoria da origem da Polinésia ou da Austrália, pode-se levantar que tanto os australianos, quanto os polinésios possuem cabelos ondeados ou anelados, características biológicas ausentes na população americana quando da chegada do europeu à América. Porém, avançados estudos genéticos cada vez mais procuram esclarecer estas dúvidas definitivamente.

As teorias quanto à antigüidade são as que mais geram polêmicas. Conquanto haja discordâncias, é unânime a crença de que os primeiros imigrantes eram compostos de pequenos bandos de famílias aparentadas e sobreviviam da caça e da coleta. Os instrumentos para a subsistência não eram especializados e estes, serviam tanto para cortar, raspar e bater.

No período de 10.000 anos em diante, segundo informações arqueológicas provenientes de sítios por todo o continente, é incontestável um grande contingente populacional e muito bem adaptado às adversidades ambientais. Estes grupos fariam parte do horizonte cultural paleoíndio, com artefatos sem similaridade no Velho Mundo e perfeitamente adaptado a fauna e flora americana. Isto leva a seguinte reflexão: se o homem pré-histórico americano chegou no último Pico Glacial, em pequenos bandos e levando em consideração que as migrações são extremamente lentas, devido ao fato de que para percorrer algumas centenas de quilômetros eles têm que se adaptar e superar inúmeros obstáculos ambientais para sobreviver, levando para isso, em média, cerca de 1.000 anos, e se também, não há horizonte paleoíndio na Ásia, como, em poucos milênios, a cultura de caçadores e coletores especializados se difundiu tão rapidamente por toda a América? Para uma cultura se espalhar rapidamente são necessários receptores que a aceitem e adaptem-na à região habitada e em grandes grupos. Isso não

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leva a suposição que muito antes de 15.000 anos, os ameríndios já habitavam essas paragens? E que já não haveria uma cultura pré-pontas de projétil?

Perguntas como essas ainda não foram comprovadamente respondidas. O certo é que há 13.000 anos o homem estava presente na América, com provas irrefutáveis desta afirmação. Porém, como se pode observar nas teorias e descobertas mais recentes discutidas anteriormente, tudo leva a crer que, muito antes disto houve ondas migratórias distintas e sucessivas, sendo mais provável em torno de quatro. Entretanto, não há evidências materiais e inquestionáveis, como por exemplo, fósseis humanos anteriores a 40.000 anos, o que afirmaria essa presença anterior. Assim, as provas apresentadas continuam a escapar ao reconhecimento e as amostras de carbono-14, favorecendo fortemente a hipótese da entrada do homem ameríndio no último Pico Glacial.

Pouca consideração recebe os argumentos, que, arqueologicamente, as pesquisas foram mínimas ou que, em muitos lugares mais prováveis a encontrar essas respostas, a urbanização atual destruiu vários sítios ou impossibilita novas escavações; ou ainda, e isso é importante ressaltar, o fato de não ter sido descoberto nada mais comprovador não significa que não existam estas evidências, apenas elas ainda não foram encontradas.

FORMAS DE ORGANIZAÇÃO SOCIAL

William T. Sanders, em seu livro Pré-história do Novo Mundo, refere-se a quatro tipos genéricos de sociedades existentes na pré-história do continente americano: bandos, tribos, chefias (chiefdoms) e Estados Antigos. Abaixo, segue-se uma breve descrição de cada um:

a) Bandos: pequenos grupos, menos de uma centena de pessoas, que se caracterizam pela exogamia local e são conhecidos por sua limitada concepção de parentesco. São caçadores e coletores que mudam periodicamente de residência, à medida que os recursos naturais são exauridos ou em reação às mudanças climáticas. Eles não possuem líderes formais nem tampouco diferenças na posição político-econômica. A subsistência depende, normalmente, da propriedade comunal. A única diferença determina-se pela idade e pelo sexo.

b) Tribos: sociedades maiores que os bandos, multicomunitárias, porém sem exceder alguns milhares de indivíduos. Encontram-se entre os agricultores com povoamento relativo ou completamente sedentário. Quando vivem em aldeias, os habitantes estão mais compactados ou quando estão mais dispersos, a designação é vizinhança. As comunidades individuais estão interligadas em uma sociedade maior, normalmente por descendência ou clãs ou por associações voluntárias. Seus membros estão ligados por laços matrimoniais, parentescos, pactos de paz e/ou participantes da mesma cultura. Em alguns grupos há hierarquias internas de membros. Realizam cerimônias periódicas para renovarem seus laços e vínculos religiosos e políticos. As tribos mais organizadas podem ter uma aldeia sede e uma hierarquia de chefes tribais. Mesmo nestes casos, carece de uma base para a economia e o exercício do poder, haja vista as instituições econômicas das tribos

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serem muito simples. O comércio pode ser extenso, mas sem habitantes especializados neste setor e em tempo integral.

c) Chefias: a partir das chefias surge a hierarquização para integrar as sociedades multicomunitárias. Acredita-se que os membros das chefias descendem de um único ancestral e que a classificação hierárquica se basearia no princípio da primogenitura. A sociedade é baseada no parentesco e a pessoa do chefe é quase sacrossanta, porque desempenha, inclusive, funções sacerdotais; o contato com o chefe é limitado cheio de protocolos e todas as crises de crescimento, casamento e morte são acompanhadas de um complicado ritual público – as regras suntuárias. Todos os membros ocupam uma posição única na escala hierárquica, determinada pelo grau de distância ou proximidade do chefe, resultando nisso uma sociedade estratificada. A base econômica do poder do chefe consiste no papel de redistribuir os bens. A produção das matérias-primas e alimentos, bem como a especialização em produtos artesanais são altamente desenvolvidos.

O chefe utiliza os excedentes entregues para a manutenção de sua corte ou para a distribuição aos seus súditos em caso de fome. Também solicita trabalhos para a manutenção ou construção dos bens públicos, templos ou sua casa ou ainda da sua corte. Devido as obrigações de parentescos as relações são recíprocas, especialmente dos alimentos. O mercado inexiste ou é fracamente desenvolvido e a especialização artesanal em tempo integral está ligada à corte. As chefias são sociedades maiores que as tribos, com milhares de indivíduos e podem incluir aldeias ou vizinhanças inteiras baseadas no parentesco. O que distingue claramente uma tribo de uma chefia é que esta possui um centro ou capital, onde estão situados os templos, os edifícios administrativos, a residência do chefe, sendo que toda sua linhagem direta residirá na capital, as casas de seus servidores, os artesãos e os sacerdotes. Em caso de guerra, toda a população poderá também residir neste centro, chegando a uma população extraordinariamente grande. As chefias muito pequenas gozam de uma posição desprivilegiada em relação as grandes chefias, cujos chefes são dotados de uma grande força carismática e uma incomum habilidade.

d) Estados antigos: regras suntuárias, sistemas de hierarquização e a dicotomia entre o centro e as povoações dependentes e o poder concentrado em um único líder como distribuidor de dádivas e bens gerais baseados na reciprocidade, estão presentes nesta sociedade. A posição do líder, senhor ou rei, é limitada a uma linhagem reinante, de descendência divina. A sociedade não está baseada somente em relações de parentesco, mas também por agricultores ou locatários, embora a propriedade territorial pertença ao rei. As relações entre eles envolvem direitos, obrigações, deveres e privilégios mútuos através de um contrato legal. O rei possui um exército permanente, uma força policial e um sistema judicial, administrando seus bens por uma burocracia de funcionários nomeados. As contribuições são reconhecidas como rendas ou taxas e apesar do rei poder ordenar serviços e coletar excedentes de seus súditos, tais coisas são consideradas obrigações de parentes. Apesar da reciprocidade, o balanço de pagamentos é muito maior para o rei.

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Este estabelece leis e também pode exercer funções sacerdotais, embora a maior parte é exercida pelos sacerdotes nos templos. Há uma distinção entre Estados urbanos e não-urbanos. Os Estados urbanos são caracterizados por povoamentos denominados vilas ou cidades, com vastas concentrações residenciais e diferenciações sociais e econômicas maiores que nos Estados não-urbanos; possuem um grande número de especialistas artesanais e artífices sem vinculação real, produzindo bens para uma economia de mercado. Estes Estados, urbanos ou não, só evoluíram graças a ambientes muito especiais, os quais possibilitaram um sistema de lavoura altamente produtiva que foi capaz de sustentar um aumento de população. Os Estados não-urbanos são amplos grupos de residência da realeza, burocratas, sacerdotes, artífices reais e soldados; comparados em função ou estrutura aos centros da chefia, a diferença reside em suas dimensões e complexidade interna. No coração destes centros urbanos ou não, estão os edifícios do governo, os templos e os mercados. Os Estados antigos podiam chegar a muitos milhares de pessoas, cerca de 50 milhões de habitantes, como por exemplo, o Império Romano.

O HORIZONTE CULTURAL PALEOÍNDIO E SUA DIFUSÃO PELO CONTINENTE AMERICANO

O horizonte cultural paleoíndio, tendo como peça diagnóstico as "pontas-de-projétil", desenvolveu-se por volta de 12000 a 8000 anos, alcançando todo o continente e inúmeros grupos primitivos. Estes grupos eram formados desde 15 até 100 indivíduos, altamente adaptados ao ambiente e como base de subsistência, principalmente, a caça aos grandes animais, como o mamute, mastodonte e a preguiça-gigante, entre outros; além da coleta generalizada.

Os grupos desta cultura procuravam como principal nicho adaptativo as luxuriantes pastagens e os vales florestados dos campos norte-americanos, com verões brandos e invernos suaves, e a paisagem entrecortada de riachos, lagos e pântanos. Para a grande caça, desenvolveram diversos artefatos, dentre eles as pontas-de-projétil (pontas Clóvis ou lanceoladas) uma arma que associada ao propulsor de dardos, quadruplicava a potência e precisão nos lançamentos, aumentando o alcance e a penetração do dardo, tornando a caça mais eficiente. Os lugares em que isso ocorria são denominados de “sítios de matança”, local onde ossos de mamute, bisão, mastodonte e outros estão misturados com os instrumentos usados para remover as peles e desmembrar as carcaças.

Essa eficiência permitiu um aumento na densidade populacional, visto que ao matar um grande animal, a carne do mesmo não era totalmente aproveitada e, portanto não eram necessárias atitudes para o controle da população, deixando-a se multiplicar naturalmente. Outro ponto a ressaltar é a probabilidade destes caçadores terem contribuído para a extinção dos animais já mencionados.

Nos sítios de acampamento, encontram-se instrumentos de pedra de tipos bem definidos, como batedores, alisadores, rapadores, facas, buris, pontas de projétil e também, sovelas de osso, agulhas e espátulas. Esta intensa diversificação é atestada e corroborada no descobrimento de vários sítios arqueológicos que se estende de norte a sul da América,

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sendo o artefato mais comum as pontas lanceoladas. Outra evidência desta cultura são as pinturas rupestres muito bem representadas, indicando um alto grau de desenvolvimento.

Com este grande sucesso adaptativo a cultura difundiu-se rapidamente em um intervalo de cerca de 2500 anos na maioria dos espaços geográficos do Novo Mundo. Esta difusão implica em uma questão: como um pequeno bando pode povoar uma extensa região em tão pouco tempo, mesmo levando em consideração sua eficiência? Como resposta a esta indagação, pode-se admitir uma cultura anterior – pré-pontas de projétil – a qual explicaria esta rápida difusão. Uma cultura formada por caçadores e coletores de pequenos animais e plantas silvestres, com uma indústria lítica bem rudimentar, porém bastante diversificada, mas rusticamente lascada e, por isso, contestada ao ponto de alegarem ser obra de ação natural, teria habitado o continente anteriormente há 12000 anos. E, por conseguinte, adotado de imediato a cultura paleoíndia.

Os sítios paleoíndios são mais facilmente reconhecidos do que os do horizonte “pré-pontas de projétil”, em face dos primeiros terem sido submetidos a um menor distúrbio geológico e também de seus instrumentos serem melhor caracterizados. Apesar desta intensa e extensa difusão, há locais que o modelo mais antigo de caça e coleta pouco se alterou, provavelmente de habitat onde os grandes mamíferos eram raros ou inexistentes.

A única região com pouca produção da cultura pré-pontas de projétil ou paleoíndia é a região da Amazônia, devido a dois fatores: a ausência de pedras disponíveis limitou o inventário de artefatos; e os artefatos perecíveis não se conservam em ambiente de clima úmido tropical. Porém, é importante salientar que muito embora exista uma pequena existência destes objetos, isto não descarta a hipótese de que essa área tenha sido evitada pelos antigos grupos de caçadores e coletores.

AS ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS E AS MUDANÇAS ADAPTATIVAS DA CULTURA

A diversidade cultural que ocorreu nas terras do Novo Mundo deve-se ao fato de que as variedades climáticas e ambientais obrigaram os grupos a adotarem comportamentos culturais de acordo com as regiões as quais estavam inseridos.

No universo cultural dos caçadores e coletores o ambiente determinou algumas variações adaptativas quanto aos instrumentos e alimentos. A necessidade de utilização de instrumentos para a caça levou-os a utilizarem a madeira e o marfim na fabricação de armas. Para a coleta de vegetais, como ainda não tinham o conhecimento do metal, utilizavam peles de animais na fabricação de seus recipientes. As peças de cerâmica não estavam em evidência, visto que sendo de natureza frágil não suportavam as constantes andanças.

O que tornava um grupo diferente do outro era o meio natural e os recursos ambientais presentes, pois os instrumentos tanto de caça como de coleta dependiam do material que estivesse mais acessível. Por conseguinte, a qualidade e a quantidade de vestimentas, a existência ou não de habitações mais duradouras e o tempo de permanência dos grupos, variavam de acordo com o meio.

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Do grupo de caçadores do Ártico foi exigido uma capacidade de adaptação ao frio e técnicas específicas para a obtenção de alimento. Os esquimós agasalhavam-se com as peles e as habitações fixas, sólidas e com uma estrutura interna bem elaborada, protegendo-os do frio e das grandes tempestades de neve. Para a locomoção, os barcos feitos com pele eram utilizados em tempo de verão e trenós puxados por cães nos períodos de inverno. A alimentação era baseada em mamíferos marinhos pescados com arpões de ossos ou marfim.

Os caçadores das florestas do norte eram bandos concentrados na região do Canadá e estavam adaptados à floresta boreal de concentração populacional baixa e dieta alimentar pobre. A tecnologia de subsistência assemelhava-se aos dos esquimós. A caça era a base de subsistência e sua técnicas consistiam em armadilhas e a tocaia auxiliada por arcos e flechas. A pedra polida e a pedra lascada eram usadas como instrumentos cortantes. Na divisão social os bandos dividiam-se em dois grupos, uns caçando no interior das florestas e outros migrando para a tundra guiados por um chefe nas operações de caça.

Os coletores de alimentos do oeste abrangiam parte do ocidente dos Estados Unidos (Califórnia, altiplano, Grande Bacia e Sudoeste). Nessa área, a sobrevivência calcava-se na alimentação de plantas nativas e sementes. O comportamento cultural caracterizava-se pela quantidade alimentar existente no meio. Por exemplo, no centro da Califórnia, a existência abundante de sementes, bolotas e gramíneas permitiu a sedentarização, estabeleceu um sistema social que envolvia os indivíduos em uma maior fraternidade. Por outro lado, onde os alimentos eram mais escassos, os bandos passaram a adotar mais o nomadismo, a fim de buscar lugares que oferecessem suprimentos alimentares suficientes a sobrevivência.

No geral, os grupos coletores usavam a pedra lascada e polida e artefatos de pedra mó para amassar e triturar as sementes, armazenando-as para períodos posteriores. Os coletores chilenos de mariscos habitavam um ambiente relativamente pobre em recursos naturais e a quantidade de suprimentos (os mariscos) variavam constantemente. Os bandos eram de pequeno porte e nômades.

Os caçadores pampianos e patagônios viviam em constantes migrações e eram formados por uma quantidade de pessoas que variavam entre 40 a 120. Caçavam guanaco e a ema com auxílio do arco e da flecha e ainda boleadeiras. Usavam como instrumento cortante a pedra lascada e suas roupas, recipientes e abrigos eram fabricados com pele destes animais.

O grupo de caçadores e coletores da savana tropical, também chamados de agricultores incipientes, eram aqueles que viviam na região do Grande Chaco. Os recursos em pouca quantidade (com exceção do Grande Chaco) tornou esse grupo ocupante de áreas próximas às ribeiras, porém de breve duração, chegando a dispersar para os campos quando aconteciam os períodos de chuvas. Ao se tornarem cultivadores incipientes, eles incorporaram a agricultura em sua cultura, mas sem alterar seu modo de vida. Sua dieta incluía mariscos, moluscos e peixes, muito embora não dominassem a indústria náutica e não utilizassem os rios como sistema de transporte.

Nas regiões dos Andes Centrais e Mesoamérica, o clima, o relevo e os aspectos biológicos proporcionaram a transformação de bandos coletores e caçadores (nômades) em povos sedentários. Isso só aconteceu devido às condições pouco favoráveis, as quais

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levaram-nos a desenvolver técnicas agrícolas mais elaboradas como a irrigação, o terraceamento e as curvas de níveis. Os abrigos eram mais duradouros, as ferramentas melhores trabalhadas e que serviram como primeiro passo no surgimento de civilizações urbanizadas e mais desenvolvidas culturalmente.

Em contrapartida, os bandos que permaneceram em condições nômades continuaram a subsistir na base da coleta e caça selvagens, sem o desenvolvimento de instrumentos mais trabalhados para essas práticas. Isso implicou numa cultura pouco desenvolvida tecnologicamente e na distinção mais acentuada em relação ao grupo anteriormente explanado.

Portanto, as variações climáticas e ambientais são fatores que não podem ser esquecidos quando se falar em diversidade cultural. Isso porque a sobrevivência em uma determinada região tem estreita ligação com a pré-disposição do indivíduo adaptar-se às condições oferecidas pelo meio.

A AGRICULTURA E SUAS CONSEQÜÊNCIAS CULTURAIS

A agricultura passou a fazer parte do habitante americano de forma bastante incipiente a partir das alterações climáticas ocorridas, quando as geleiras recuaram pela última vez, entre cerca de 8000 a 5000 anos. Por esta época, a caça dos grandes animais passou a tornar-se cada vez mais rara. Como não existiam animais domesticados que pudessem garantir a sobrevivência grupal, foi necessário reagir ao ambiente surgindo novas formas de subsistência, de padrões de povoamento e de tecnologia.

Com a substituição das florestas em lugar dos campos e as regiões melhor drenadas tornando-se cada vez mais áridas, o homem aprendeu, pela observância direta da natureza, a selecionar a coleta e propiciar uma melhor produtividade, através da domesticação das plantas, fazendo delas a fonte principal de alimentos. Este processo levou milhares de anos, estabelecendo-se como agricultura propriamente dita, a partir de cerca de 2000 a.C. A maior parte dos cultivos do Novo Mundo são diferentes dos originários do Velho Mundo. Ainda não se sabe se a domesticação foi o resultado independente de um seqüência de incidentes ou se foi difundida de um único centro mundial, adaptada às condições ambientais. A flora americana possui uma enorme diversidade. Alimentos como o milho, feijão, batata, abacates, amendoins, abóboras, batata-doce, castanhas, mandiocas, tomates, pimentões, chocolate e também plantas como a borracha, o fumo, quinina e coca são exclusivas da América e que fazem parte, atualmente, da dieta universal.

Inicialmente, os grupos primitivos limpavam os terrenos ao redor da planta selecionada, evitando que ervas daninhas prejudicassem a produtividade. Aos poucos foi se percebendo a importância da irrigação e de outras técnicas agrícolas, como o terraceamento e as curvas de nível. Posteriormente, a planta selvagem já não mais sobrevivia sem a interferência humana, tornando-se assim o princípio da agricultura. Nessa época, os bandos eram seminômades e, somente aos poucos, foi se sedentarizando conforme os avanços iam progredindo a fim de estabelecer um aumento na produtividade das plantas, tornando-a capaz de ser fonte alimentícia segura e eficiente para a sobrevivência. A cultura material se modificou para adaptar-se a essa nova atividade. Foram desenvolvidos cestas para a conservação dos alimentos, moedores, lâminas de machados entalhados, almofarizes e

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mãos de pilão entre outros. Devido ao longo período de domesticação, os efeitos dessa nova fonte alimentar no tamanho da população e a organização sociopolítica foram brandos. Acredita-se que a partir da irrigação esta cultura atingiu uma significativa expansão.

A agricultura intensiva na Mesoamérica e na área Andina, necessitou de séculos para desenvolver-se e o cultivo incipiente nos planaltos mexicanos surge no período de 7000 a 4000 anos a.C. e, segundo alguns especialistas, o aspecto fundamental foi a grande quantidade de terras não cultiváveis, bem como a pressão populacional sobre os recursos agrícolas finitos. Quanto a área Andina, há dúvidas se os passos iniciais se desenvolveram independentemente dos verificados na Mesoamérica ou se foram estimulados pelo contato com estes. A origem do milho, que se tornou o alimento básico do Novo Mundo, tem sido discutida há muito tempo. A informação mais completa vem do Vale de Teotihuacán, iniciando por volta de 5000 anos a.C. Um grande número de variedades foram produzidas, diferindo não apenas em tamanhos, cor e propriedades de subsistência, mas também em viabilidade sob diversas condições de umidade, solo e duração de crescimento. O feijão surge, primeiramente nos Andes, e a associação dele com o milho, propiciou uma das conquistas mais importantes ao crescimento populacional e desenvolvimento cultural, devido às circunstâncias bioquímicas. O milho possui um alto valor protéico e energético, mas é deficiente em lisina, uma substância essencial ao Homo sapiens para realizar um eficiente metabolismo das proteínas. O feijão é rico em lisina, suprindo essa deficiência. A mandioca é tida como raiz cultivável em solos pobres, ocasionadas pelas chuvas fortes e constantes. Ela surge nas terras baixas tropicais úmidas da América Central e Sul, onde o feijão e o milho eram menos produtivos. Ela é particularmente interessante, porque as espécies diferem em relação ao acúmulo de ácido hidrociânico concentrado nos tubérculos. O algodão e a corcubitácea são os vestígios de domesticação de plantas mais antigas, embora não sejam comestíveis.

Ritos agrícolas

As mudanças ocasionadas no Período Transacional implicaram em transformações na dieta alimentar dos grupos primitivos do Novo Mundo. A agricultura incipiente começou a fazer parte do processo comportamental, interferindo no tamanho da população e na organização social e política, mesmo que de forma pouco acentuada.

A agricultura, como um processo tecnológico, foi internalizada a partir de um longo aprendizado e mesmo sendo uma fonte segura na obtenção de alimentos, ela é suscetível aos fenômenos climatológicos, às pragas e outros fatores. Em conseqüência disso, os ritos religiosos existentes anteriores a agricultura foram sendo adaptados de acordo com as necessidades agrícolas. Exemplo claro pode ser percebido em regiões de baixa pluviosidade, onde os ritos agrícolas foram adotados no sentido de obtenção de chuvas e melhoria de produtividade. Esses cultos relacionavam-se com os ancestrais, vistos como seres fazedores de chuva e produtividade.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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SANDERS, William T.; MARINO, Joseph. Pré-história do novo mundo: Arqueologia do índio americano. Tradução Álvaro Cabral; Revisão Técnica Francisca Isabel Vieira. Rio de Janeiro: Zahar, 1971. p. 13-18