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HOSPITAL GERAL DE FORTALEZA PROGRAMA DE RESIDÊNCIA MÉDICA EM CIRURGIA GERAL JOSÉ FERNANDES DA SILVA NETO ABDOMEN AGUDO OBSTRUTIVO EM MULHER JOVEM POR DIVERTÍCULO DE MECKEL: RELATO DE CASO E REVISÃO DE LITERATURA FORTALEZA-CE 2016

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HOSPITAL GERAL DE FORTALEZA

PROGRAMA DE RESIDÊNCIA MÉDICA EM CIRURGIA GERAL

JOSÉ FERNANDES DA SILVA NETO

ABDOMEN AGUDO OBSTRUTIVO EM MULHER JOVEM POR

DIVERTÍCULO DE MECKEL: RELATO DE CASO E REVISÃO DE

LITERATURA

FORTALEZA-CE

2016

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JOSÉ FERNANDES DA SILVA NETO

ABDOMEN AGUDO OBSTRUTIVO EM MULHER JOVEM POR

DIVERTÍCULO DE MECKEL: RELATO DE CASO E REVISÃO DE

LITERATURA

FORTALEZA-CE

2016

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ABDOME AGUDO ONSTRUTIVO EM MULHER JOVEM POR

DIVERTÍCULO DE MECKEL: RELATO DE CASO E REVISÃO DA

LITERATURA

Trabalho realizado no Hospital Geral de Fortaleza (HGF) – Fortaleza – CE.

José Fernandes da Silva Neto¹

Francisco Assis Costa²

George Araujo Magalhães³

1. Médico concludente da residência de Cirurgia Geral do Hospital Geral de

Fortaleza.

2. Preceptor chefe da residência de Cirurgia Geral do Hospital Geral de Fortaleza.

Professor livre docente da Universidade de Fortaleza – UNIFOR.

3. Cirurgião Geral e Urologista, plantonista do setor de emergência do HGF

RESUMO

Classicamente descrito como uma evaginação digitiforme do intestino delgado em sua

borda anti-mesentérica, o divertículo de Meckel é a mais comum das anomalias

gastrointestinais congênitas, podendo ser encontrado em até 2% da população¹.

Geralmente se localiza a uma distância entre 30 a 150 cm, em média aproximadamente

de 60 cm (2 pés) da válvula ileocecal. Além de ser um divertículo verdadeiro, pois

contém todas as camadas da víscera de origem, pode conter dois tipos de mucosa

(gástrica e pancreática). Sua origem embriológica se dá pela falha no fechamento do

ducto onfalomesentérico em torno da 7ª a 8ª semana de gestação². Divertículo de

Meckel complica geralmente com inflamação ou sangramento, sendo a obstrução

intestinal por hérnia interna incomum e de sintomatologia inespecífica, tornando raro o

diagnóstico pré-operatório. O caso relatado foi de paciente submetido à laparotomia

exploradora por abdome agudo secundário a formação de hérnia interna em torno de um

cordão fibroso (aderência) entre o divertículo de Meckel e o mesentério da alça de

delgado que o continha.

Palavras-chave: Divertículo ileal; Obstrução intestinal; Relato de casos

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ABSTRACTS

Digitiform classically described as an outgrowth of the small intestine in their anti-

mesenteric border, the Meckel's diverticulum is the most common gastrointestinal

congenital anomalies, can be found in up to 2% of população¹. It is generally located at

a distance of 30 to 150 cm on average approximately 60 cm (2 feet) from the ileocecal

valve. In addition to being a true diverticulum as it contains all the source viscera of the

layers may contain two types of mucosa (gastric and pancreatic). Their embryological

origin is by failure to lock omphalomesenteric duct around the 7th to 8th week of

gestação². Meckel's diverticulum often complicated by inflammation or bleeding, and

intestinal obstruction due to unusual internal hernia and nonspecific symptoms, making

rare preoperative diagnosis. The reported case was a patient underwent exploratory

laparotomy for acute abdomen secondary to internal hernia formation around a fibrous

cord (adhesion) between the Meckel's diverticulum and the mesentery of the small

bowel that contained it.

Keywords: Ileal diverticulum; Bowel obstruction; Case reports

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO……….………………………………….………..… 6

2 RELATO DE CASO.……………………………………….…..……. 7

3 DISCUSSÃO………………..……….…………………………...…… 11

4 CONCLUSÃO........................................................................................ 15

5 REFÊRÊNCIAS...................................................................................... 16

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1 INTRODUÇÃO

Na rotina do cirurgião geral de plantão a avaliação de um quadro sugestivo de

obstrução intestinal, pode ser de fácil interpretação e não despertar dúvidas quanto a

pronta indicação de cirurgia de urgência, porém nos deparamos frequentemente em

nosso serviço com casos complexos, com história clínica imprecisa e capciosa, atraso

do paciente no acesso ao serviço de saúde, e eventualmente casos de doenças congênitas

com apresentação atípica para a faixa etária.

O caso relatado foi de paciente submetido à laparotomia exploradora por

abdome agudo secundário a formação de hérnia interna em torno de uma banda fibrosa

unindo o divertículo de Meckel à cicatriz umbilical e ao mesentério da alça de delgado

que o continha.

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2 RELATO DE CASO

Paciente 33 anos, sexo feminino, saudável deu entrada no nosso setor de

emergência com queixas iniciadas há 4 dias dor abdominal em epigástrio, piorando

progressivamente e sendo associada a náuseas e vômitos, distensão abdominal e parada

de eliminação de flatos e fezes, porém sem febre. Relata duas cesáreas prévias e uso

esporádico de AINES. Ao exame físico a mesma se encontrava desidratada +2/4+, com

taquicardia de 100 bpm, PA = 120 x 90 mmHg, distensão abdominal, RHA diminuídos,

dor leve em epigástrio a palpação profunda sem sinais de irritação peritoneal. Toque

retal mostrando ampola retal vazia e houve sangue em dedo de luva.

Classicamente descrito como uma evaginação digitiforme do intestino delgado em sua

borda anti-mesentérica, o divertículo de Meckel é a mais comum das anomalias

gastrointestinais congênitas, podendo ser encontrado em até 2% da população¹.

Geralmente se localiza a uma distância entre 30 a 150 cm, em média aproximadamente

de 60 cm (2 pés) da válvula ileocecal. Além de ser um divertículo verdadeiro, pois

contém todas as camadas da víscera de origem, pode conter dois tipos de mucosa

(gástrica e pancreática). Sua origem embriológica se dá pela falha no fechamento do

ducto onfalomesentérico em torno da 7ª a 8ª semana de gestação².

23/12/15 1º DIH:

A conduta imediata foi a hidratação venosa, passagem de sonda nasogástrica em

aspiração, antibióticoterapia com ciprofloxacino e metronidazol endovenosos e

solicitação de hemograma, coagulograma, uréria, creatinina, eletrólitos e RAIO-X rotina

de abdome agudo, quando verificou-se:

Resolução dos vômitos, melhora da dor e distensão abdominal após a

passagem de SNG.

Hb/Ht = 15,2/42,7%; Leucograma = 13.400 (3% bastões; 69,9%

segmentados), Ur = 164, Cr = 3,4, Na = 135; K = 4,8; AMILASE =

1.334, LIPASE = 52.

Rx: distensão de alças de delgado com nível hidroaéreo.

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25/12/15 - 4º DIH:

Apresentava importante melhora da dor abdominal e normalização das

alterações de função renal, diminuição do resíduo gástrico, sendo iniciada dieta líquida

restrita com SNG fechada:

Hb/Ht = 15,2/42,7%; Leucograma = 13.400 (3% bastões; 69,9%

segmentados), Ur = 88, Cr = 0,80; Na = 135; K = 4,8.

27/12/15 – 6º DIH:

Após apresentar 4 episódios de evacuações, teve a dieta progredida e SNG retirada.

28/12/15 – 7º DIH:

Tolerando dieta e sem dor abdominal. Intercorrência cardiológica: episódio

fibrilação atrial de alta resposta, sendo necessária cardioversão farmacológica

com amiodarona e monitorização cardíaca.

Figura 1- Eletrocardiograma mostrando fibrilação atrial de alta resposta

ventricular.

30/12/15 – 9 ºDIH:

Piora clínica importante com taquicardia, dor e distensão abdominal

importantes, 1.500 mL de resíduo gástrico após nova passagem de nova SNG

em aspiração, leucograma = 24.470.

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TC de abdome e pelve: grande distensão de alças de delgado e sinais de hérnia

interna (torção de mesentério) Fig 2.

Figura 2 – Tomografia de abdome evidenciando dilatação

de alças de delgado e sinais de torção de mesentério.

INDICAÇÃO:

Laparotomia exploradora.

ACHADOS:

Moderada quantidade de líquido intrabdominal sero-hemático.

Divertículo de Meckel a 45 cm da válvula ileocecal, medindo cerca de 30 cm de

comprimento, fixo à parede abdominal justa-umbilical, determinando hérnia

interna com acotovelamento da alça próxima a base do divertículo, onde havia

diminuta erosão da serosa com grande quantidade de fibrina ao redor. Fig 3.

Demais alças intestinais e órgãos abdominais normais.

REALIZADO:

Enterectomia segmentar com margem distal e proximal de 8 cm além do

divertículo e posterior enterro-entero anastomose com sutura contínua com fio

de polipropileno 3.0.

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Apendicectomia incidental.

Lavagem da cavidade com salina 0,9% e síntese por planos.

Figura 3- divertículo de Meckel.

A paciente evoluiu bem na enfermaria, reiniciando alimentação oral no 3º PO e

recebendo alta hospitalar no 8º PO.

O exame histopatológico revelou serosite fibrinoleucocitária, espessamento

fibrinoso e neovascularização em serosa, edema e congestão vascular em mucosa e

ausência de sinais de neoplasia.

3 DISCUSSÃO

Nomeado em homenagem ao anatomista alemão Johánn Friedrich Meckel, o

divertículo ileal é um divertículo verdadeiro, pois contém todas as camadas da víscera

de origem. Em 98% das vezes, o divertículo de Meckel, localizado na borda

antimesentérica do intestino delgado, encontra-se até 100 cm da válvula ileocecal,

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podendo ser encontrado até a 180 cm. Quando são analisados somente os indivíduos

sintomáticos, a distância média é de 50 a 60 cm8.

Seu comprimento varia de 1 a 10 cm em 90% dos casos, havendo relatos de

divertículos de até 100 cm. O comprimento não parecer guardar relação com incidência

de sintomas, porém divertículos mais estreitos tendem a ser mais sintomáticos. Estima-

se que 80% dos pacientes sintomáticos têm colo menor que 2 cm7.

É a mais comum das anomalias gastrointestinais congênitas: presente em até 2%

da população, sendo duas vezes mais comum em homens.

O aumento da incidência da doença pode ser observado em pacientes portadores

de exoftalmia, fissura palatina, útero bicorno, pâncreas anular, atresia anorretal, doença

de Crohn e malformação dos sistemas cardiocirculatório e nervoso central. Em

pacientes com atresia de esôfago, até 10% têm divertículo de Meckel³.

A falha na involução do ducto vitelínico ou onfalomesentérico até a oitava

semana de gestação pode acarretar em vários tipos de anomalias, sendo o divertículo de

Meckel é a anomalia mais comum, com índice de 90%. Fístulas onfalomesentéricas,

cistos entéricos e bandas fibrosas unindo o divertículo à cicatriz umbilical ou ao

mesentério também podem ocorrer. A artéria vitelínica direita dará origem à artéria

mesentérica inferior. O ramo esquerdo involuirá ou mais raramente pode formar uma

banda fibrosa entre o divertículo e o mesentério5,6.

Mucosa ectópica pode ser encontrada em até 60% dos casos, sendo a mais

comum o tecido gástrico ectópico, relacionado com hemorragia digestiva e em segundo

lugar o tecido pancreático, mais relacionado a intussuscepção7. Como exposto, a

presença de mucosa ectópica explica em parte a sintomatologia de alguns casos.

Habitualmente diagnosticado incidentalmente durante laparoscopias,

laparotomia ou necropsias, o divertículo de Meckel geralmente assume curso

assintomático na maioria dos casos, apenas 4% dos portadores desta má formação

apresentam sintomas, geralmente inespecíficos e mais frequentemente nos pacientes do

sexo masculino e em idade precoce.

As complicações que podem ocorrer em portadores do divertículo de Meckel são

hemorragia, diverticulite, obstrução, intussuscepção e perfuração e presença de

neoplasias. Sendo que a maioria dos pacientes sintomáticos têm menos de 25 anos, 55%

menos de 10 anos9, porém pode ocorrer complicações em qualquer idade.

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Em pacientes submetidos a cirurgia por suspeita de apendicite aguda, divertículo

de Meckel estava presente em 3,2% dos casos. Deve-se ressaltar que essa afecção é 55

vezes mais rara que a apendicite aguda4.

As complicações seguem uma distribuição etária. Até um mês de idade a

principal complicação relacionada ao divertículo de Meckel é a obstrução intestinal.

Entre 1 mês de idade e 15 aos, a hemorragia digestiva é o principal sintoma, com pico

de incidência em tornos dos 5 anos de idade. Após os 15 anos, obstrução e inflamação

são as complicações mais encontradas. Hemorragia é evento raro após os 30 anos de

idade.

Considerando o número absoluto de pacientes sem divisão etária, a hemorragia é

a complicação mais comum, ocorrendo em 25 até 50% dos portados de Divertículo de

Meckel sintomáticos. Destes, 90% possuem mucosa gástrica ectópica no DM, o que

leva a lesão péptica da mucosa do intestino delgado e se manifesta no adulto como

melena e na criança como enterorragia9.

A obstrução intestinal é o segundo quadro clínico mais comum nos pacientes

com Divertículo de Meckel, sendo a principal complicação naqueles em idade adulta,

podendo acometer 40% dos casos. Estudo realizado em Amsterdã mostrou, em 39% dos

casos, que obstrução foi a causa preponderante nos pacientes que necessitam de

ressecção naquela amostra14,19,20

.

Pode ser causado por intussuscepção, estenose por diverticulite crônica ou pela

presença de um cordão fibroso, que se estende desde o divertículo à parede abdominal, a

outro segmento visceral ou ao mesentério, causando a torção da alça sobre seu próprio

eixo, isto é, volvo ou permitindo a formação de herniação interna do intestino. Esse

quadro pode gerar obstrução mecânica grave, complicando com necrose, perfuração e

evoluir ao óbito do paciente por sepse abdominal.

Outra causa de obstrução é quando o divertículo de Meckel faz parte do

conteúdo de uma hérnia inguinoescrotal (50%), femoral (20%), umbilical (20%) ou

outras (10%). Assim chamada hérnia de Littre, descrita em 1742, ocorre em 2 a 5% dos

pacientes, sobretudo no lado direito da região inguinal10

.

O tumor mais comum no Divertículo de Meckel é o carcinóide (um terço dos

casos), seguidos por sarcoma, adenocarcinoma e tumores benignos (adenomas,

fibromas, leiomiomas e outros tumores mesenquimais). Tumores malignos são mais

comuns em indivíduos com mais de 50 anos de idade.

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Em até metade dos casos em que o histopatológico detectou neoplasia não foram

percebidos tumores no ato cirúrgico. É interessante observar que quase a metade dos

pacientes com carcinóide é assintomática. Quando maiores que 5 mm, os carcinóides

apresentam grande tendência de metástases. Esses fatos são argumentos que justificam a

ressecção sistemática do Divertículo de Meckel.

Apenas 10% dos casos sintomáticos são diagnosticados no pré-operatório.

Ultrassonografia e tomografia computadorizada de abdome são de pouca utilidade no

diagnóstico etiológico, porém podem auxiliar o diagnóstico sindrômico de

complicações e assim favorecer a indicação cirúrgica, o que levará ao correto

diagnóstico etiológico11

.

O uso de cintilografia com pertecnato de tecnécio 99 marcado apresenta acurácia

de 90% na população pediátrica e apenas 46% entre os adultos, sendo mais útil nos

pacientes com sangramento digestivo obscuro, sobretudo em pediatria, e pouco efetivo

em pacientes com dor abdominal12,13

.

O tratamento do Divertículo de Meckel é cirúrgico, podendo ser realizado a

diverticulectomia com rafia do segmento remanescente. Porém recomendamos a

enterectomia segmentar contendo o divertículo com anastomose primária, sendo este o

método mais apropriado nos pacientes operados por sangramento, perfuração,

inflamação ativa ou suspeita de tumor por garantir a remoção de uma possível área de

mucosa ectópica na junção divertículo-intestinal e anastomose em tecido remanescente

saudável16

.

No caso de pacientes sintomáticos a abordagem terapêutica é sempre cirúrgica,

sendo realizada por via laparoscópica, ressecção vídeo-assistida ou laparotomia. A

laparoscopia, além de ser usada como método para o diagnóstico da doença, permite

todas as modalidades de ressecção e eventuais anastomoses, seja intra ou

extracorpórea17

.

A dúvida na literatura é qual a melhor conduta em pacientes assintomáticos que

incidentalmente foram diagnosticados com Divertículo de Meckel, pois havia

classicamente relatos de alta morbidade. Soltero & Bill 143 estimaram que seria

necessária a ressecção de 800 DM assintomáticos para evitar o óbito de um paciente por

complicações relacionadas à doença14

.

Novos relatos de menor morbidade após ressecção em pacientes assintomáticos,

isto é, 0 a 6% em comparação a morbidade de até 33% em casos de ressecção nos

pacientes sintomáticos operados durante uma complicação e um risco de até 16% de um

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paciente portador de divertículo de Meckel se tornar sintomático, tornaram os cirurgiões

mais receptivos a idéia de ressecção do DM assintomático para evitar complicações

futuras.

Em uma revisão sistemática de uma série da Clínica Mayo envolvendo 1476

pacientes entre os anos 1950 e 2002 não há recomendação ou rejeição à conduta de

ressecção de todo divertículo de Meckel assintomático. Porém recomendam a remoção

em divertículos naqueles pacientes assintomáticos com quaisquer umas das seguintes

condições: sexo masculino, idade inferior a 50 anos, divertículos maiores que 2 cm,

presença conhecida de mucosa ectópica, isto é, critérios epidemiológicos e histológicos

mais relacionados a complicações ou sintomas.

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4 CONCLUSÃO

A obstrução intestinal mecânica causada por divertículo de Meckel geralmente é

diagnosticada apenas no intra-operatório. Hérnias abdominais internas são causas

incomuns de oclusão intestinal sendo responsáveis por apenas 2% delas, podendo ser

sugerido o diagnóstico anatômico de hérnia interna ser revelado pela tomografia.

A morbidade e mortalidade podem ser diminuídas com a intervenção cirúrgica

precoce, logo a história clínica, exame físico e evolução continuam sendo os elementos

mais importantes na indicação de intervenção cirúrgica. Sendo assim, a avaliação

imediata do cirurgião em pacientes que apresentam sintomas ou achados abdominais

significativos é sempre apropriada, evitando o atraso na terapia adequada e o aumento

da morbidade e mortalidade.

Historicamente, a morbidade relacionada ao tratamento do divertículo de Meckel

sintomático oscilou entre 6 e 30% e a mortalidade entre 2,5 e 15%18

.

Nos pacientes diagnosticados incidentalmente com divertículo de Meckel

durante um procedimento cirúrgico destinado a outro fim há embasamento na literatura

que respalda o cirurgião a tratar naquele momento o divertículo desde que as condições

clínicas do paciente permitirem.

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