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III Congresso Consad de Gestão Pública PROJETO DE QUALIFICAÇÃO EM GESTÃO E FORTALECIMENTO INSTITUCIONAL DOS COMITÊS DE BACIAS HIDROGRÁFICAS DE MINAS GERAIS: PARCERIA ESTADO E SOCIEDADE CIVIL ORGANIZADA PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL Tiago Cacique Moraes Glauco Knopp

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III Congresso Consad de Gestão Pública

PROJETO DE QUALIFICAÇÃO EM GESTÃO E FORTALECIMENTO INSTITUCIONAL DOS COMITÊS DE

BACIAS HIDROGRÁFICAS DE MINAS GERAIS: PARCERIA ESTADO E SOCIEDADE CIVIL ORGANIZADA PARA O

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Tiago Cacique Moraes Glauco Knopp

Painel 29/114 A governança social e a intersetorialidade: formação de redes em torno de políticas públicas

PROJETO DE QUALIFICAÇÃO EM GESTÃO E FORTALECIMENTO INSTITUCIONAL DOS

COMITÊS DE BACIAS HIDROGRÁFICAS DE MINAS GERAIS: PARCERIA ESTADO E SOCIEDADE CIVIL ORGANIZADA PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Tiago Cacique Moraes Glauco Knopp

RESUMO Este artigo apresenta o trabalho que está sendo desenvolvido pela OSCIP Centro Mineiro de Alianças Intersetoriais (CeMAIS), realizado em parceria com a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SEMAD/MG), junto a quinze Comitês de Bacias Hidrográficas (CBHs) mineiros. Envolve um conjunto integrado de ações que tem como objetivo fortalecer institucionalmente esses CBHs para o exercício de sua competência legal e fornecer instrumentos e ferramentas gerenciais para que esses espaços de exercício pleno da governança social cumpram, de maneira mais efetiva, seu papel na política de gestão dos recursos hídricos. O escopo de trabalho realizado junto aos Comitês envolve: o diagnóstico organizacional; a elaboração de planos estratégicos; e planos de comunicação para cada um dos quinze Comitês. Neste documento, será dado destaque à metodologia de diagnóstico proposta pelo CeMAIS para a avaliação das atividades dos Comitês. O trabalho junto os Comitês de Bacia é norteado pelas seguintes questões: Qual tem sido a contribuição dos CBHs para a implementação da política estadual de recursos hídricos em Minas Gerais? Quais são os limites e desafios à institucionalização e efetividade dos Comitês de Bacia Hidrográfica em MG? Um dos maiores desafios enfrentados no processo de consolidação da gestão dos recursos hídricos é concretizar, por meio dos Comitês de Bacia e demais organismos colegiados, a gestão participativa da água. Essa nova configuração contrapõe-se às práticas historicamente estabelecidas, tais como: construção de obras hídricas sem o seu devido gerenciamento, decisões governamentais tomadas de forma centralizada, desinteresse e ausência de iniciativas dos usuários e da sociedade na busca de alternativas para a gestão sustentável dos recursos hídricos. Thame (2003) ressalta a importância dos Comitês na política de recursos hídricos, defendo que estes são fundamentais para que a proteção das águas caminhe lado a lado com o desenvolvimento econômico, evitando danos para a população e gerações futuras. Em Minas Gerais, estado com tradição longeva de participação dos diversos setores sociais na co-gestão das políticas públicas, existem atualmente 35 Comitês legalmente instituídos e em funcionamento, de um total de 36 previstos conforme as Unidades de Planejamento e Gestão de Recursos Hídricos. Embora existente em número expressivo no estado de Minas Gerais, os Comitês de Bacia, assim como qualquer instância participativa de caráter deliberativo, enfrentam desafios e limites que constrangem a efetividade de sua atuação e do exercício de seu papel. É a partir desse cenário que o Centro Mineiro de Alianças Intersetoriais (CEMAIS) e a Secretaria de Meio Ambiente de Minas Gerais (SEMAD/MG) firmaram, em setembro de 2009, uma parceria para a implementação do Programa de Qualificação em

Gestão e Desenvolvimento Institucional dos Comitês de Bacias Hidrográficas do Estado. Entende-se que para produzir resultados qualquer organização depende de recursos e de um padrão mínimo de planejamento e gestão. E isso se aplica aos Comitês de Bacia Hidrográfica. Esse projeto busca desenvolver ações no intuito de reforçar a capacidade dos CBHs: de organização da rotina; de um planejamento integrado que possibilite a elaboração, o monitoramento e a avaliação dos seus objetivos, metas e ações na bacia hidrográfica; e de gerenciar sua comunicação com os públicos interno e externo e criar estratégias e mecanismos eficazes para esses fins.O fortalecimento de espaços públicos, tais como os Comitês de Bacia Hidrográfica (CBH), tem sido um dos focos de atuação do Instituto de Governança Social, projeto realizado desde 2007 pelo governo de Minas Gerais em parceria com o CeMAIS. Uma de suas principais iniciativas é a capacitação e instrumentalização dos Conselhos Estaduais de Políticas Públicas de Minas Gerais – fóruns colegiados que se assemelham aos Comitês de Bacia, por se tratarem de espaços públicos, plurais, paritários (Estado e Sociedade Civil fazem parte) e que atuam em áreas específicas (TATAGIBA, 2002). O referido Programa contempla 15 CBHs mineiros dentre os 35 existentes, contemplando cerca de 1600 horas de trabalho, mais de 500 membros dos Comitês e beneficiando indiretamente mais de 200 municípios situados nas bacias hidrográficas de jurisdição desses Comitês. O escopo do trabalho envolve um diagnóstico da realidade organizacional desses CBHs, a elaboração de cartilhas sobre temáticas de organização, planejamento e comunicação voltada para os Comitês e a elaboração conjunta e participativa de planos de ação estratégicos e planos de comunicação para estes espaços, com assessoria técnica para a sua implementação. A partir de uma metodologia de diagnóstico desenvolvida especificamente para instâncias participativas de deliberação social, que conta com 05 grandes temas – Histórico; Membros do Comitê; Estrutura do Comitê; Gestão; Comunicação –, está sendo realizado um mapeamento da realidade dos 15 Comitês trabalhados. Os objetivos desse diagnóstico são: a) Produzir um mapeamento detalhado da situação de quinze Comitês de Bacias Hidrográficas mineiros; b) Analisar o estágio atual de desenvolvimento desses Comitês; c) Oferecer subsídios para o planejamento de ações, instrumentos e ferramentas gerenciais voltados ao fortalecimento desses Comitês. Embora a sua aplicação ainda esteja em cursos, os resultados preliminares do diagnóstico indicam que a baixa representatividade, a baixa qualidade da participação dos membros nos Comitês, atrelada a limitações técnicas, gerenciais e estruturais têm contribuído negativamente para a atuação efetiva dos CBHs no estado de Minas Gerais.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO........................................................................................................... 04

A GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL E EM MINAS GERAIS....... 07

OS COMITÊS DE BACIA E A GESTÃO PARTICIPATIVA DOS RECURSOS HÍDRICOS.................................................................................................................. 11

O PROGRAMA DE FORTALECIMENTO EM GESTÃO E DESENVOLVIMENTO INSTITUCIONAL DOS CBHS MINEIROS................................................................. 14

A METODOLOGIA DE DIAGNÓSTICO..................................................................... 16

RESULTADOS PRELIMINARES – ALGUMAS DIFICULDADES E DESAFIOS ENFRENTADOS PELOS COMITÊS.......................................................................... 20

CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................................... 22

REFERÊNCIAS.......................................................................................................... 23

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INTRODUÇÃO

“O acesso à água de boa qualidade será, nas próximas décadas, uma

questão crucial a ser resolvida para assegurar a sobrevivência humana”. Essa

afirmação de Cardoso (2003) ilustra bem a posição estratégica da água e a forma

como esse tema vem ocupando espaço na agenda política dos governos locais e

das agências multilaterais no período recente. No Brasil, essa preocupação tem

provocado uma redefinição da política de recursos hídricos que tem como marco

regulatório a Lei Federal no 9.433/97, também conhecida como “Lei das Águas”.

Segundo Cánepa (2000), a Lei das Águas introduziu duas inovações na gestão de

recursos hídricos. A primeira é o uso de instrumentos econômicos para a execução

da política ambiental, pois assim pode-se trabalhar com padrões de qualidade

estabelecidos pela sociedade e buscar alternativas com custos socialmente

aceitáveis. A outra é a descentralização da gestão e a participação da sociedade no

processo de planejamento e intervenção dos recursos hídricos. A temática da

participação dá origem aos Comitês de Bacia Hidrográficas, órgãos colegiados,

formados por representantes do poder público, da sociedade civil (entidades cuja

atuação seja relacionada aos recursos hídricos – entidades ambientalistas,

associações, instituições de ensino, sindicatos de trabalhadores rurais, dentre

outras) e dos usuários da água (organizações que fazem uso das águas superficiais

ou subterrâneas – companhias de saneamento, companhias de geração de energia,

mineração, indústria, irrigantes, dentre outros).

Para Camargos (2008), um dos maiores desafios enfrentados no

processo de consolidação desse novo modelo de gestão dos recursos hídricos, é

concretizar, por meio dos Comitês de Bacia e demais organismos colegiados, a

gestão participativa da água. Essa nova configuração contrapõe-se às práticas

historicamente estabelecidas, tais como: construção de obras hídricas sem o seu

devido gerenciamento, decisões governamentais tomadas de forma centralizada,

desinteresse e ausência de iniciativas dos usuários e da sociedade na busca de

alternativas para a gestão sustentável dos recursos hídricos.

O fortalecimento de espaços públicos, tais como os Comitês de Bacia

Hidrográfica (CBH), tem sido um dos focos de atuação do Instituto de Governança

Social, projeto realizado desde 2007 pelo governo de Minas Gerais em parceria com

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a OSCIP CeMAIS – Centro Mineiro de Alianças Intersetoriais1. Uma de suas

principais iniciativas é a capacitação e instrumentalização dos Conselhos Estaduais

de Políticas Públicas de Minas Gerais – fóruns colegiados que se assemelham aos

Comitês de Bacia, por se tratarem de espaços públicos, plurais, paritários (Estado e

Sociedade Civil fazem parte) e que atuam em áreas específicas (TATAGIBA, 2002).

Além de se aproximarem por suas características e finalidades, esses

espaços também compartilham os mesmos dilemas, desafios, constrangimentos e

as ameaças geradas a sua efetivação. Diversos estudos nos ajudam a analisar

esses desafios a partir de duas dimensões (DAGNINO, 2002; DAGNINO et

TATAGIBA, 2007; SILVEIRA, 2008; BRONZO, 2007, MORAES et CORREIA, 2009).

A primeira se refere à legitimidade em sua atuação e a qualidade das decisões

tomadas nesses espaços enquanto um extrato da vontade pública e do interesse da

sociedade. As ameaças à legitimidade destes órgãos são analisadas a partir de

variáveis como pluralidade, qualidade da representação, representatividade e

também a permeabilidade estatal. A segunda dimensão está relacionada à

performance dos conselhos. Afinal, um extenso montante de recursos humanos e

financeiros é destinado à prática conselhista, mas que produto é gerado? Moraes et

Correia (2009) ainda perguntam, qual a capacidade dos conselhos de influenciar as

políticas públicas governamentais? Qual a qualidade das discussões nas plenárias e

das propostas formuladas? Da mesma forma, também perguntamos até que ponto

os CBHs têm contribuído para um processo mais democrático de formulação da

política dos recursos hídricos e alocação eficaz dos recursos públicos?

Os resultados de diversos trabalhos têm apontado para conclusões mais

amplas, de que esses órgãos colegiados não têm cumprido com efetividade a sua

função deliberativa. Há falhas de representatividade (baixa participação dos

conselheiros), baixa capacidade propositiva, falta de qualificação dos

representantes, deficiências de comunicação entre os conselheiros e suas

instituições e outros que implicam em uma fragilidade institucional desses espaços.

É a partir desse cenário que o Centro Mineiro de Alianças Intersetoriais

(CEMAIS) e a Secretaria de Meio Ambiente de Minas Gerais (SEMAD/MG) firmaram,

em setembro de 2009, uma parceria para a implementação do Programa de

Qualificação em Gestão e Desenvolvimento Institucional dos Comitês de Bacias

Hidrográficas do Estado. Entende-se que para produzir resultados qualquer

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organização depende de recursos e de um padrão mínimo de planejamento e

gestão. E isso se aplica aos Comitês de Bacia Hidrográfica. Esse projeto busca

desenvolver ações no intuito de reforçar a capacidade dos CBHs: de organização da

rotina; de um planejamento integrado que possibilite a elaboração, o monitoramento

e a avaliação dos seus objetivos, metas e ações na bacia hidrográfica; e de

gerenciar sua comunicação com os públicos interno e externo e criar estratégias e

mecanismos eficazes para esses fins.

Nesse artigo, apresentamos especificamente o resultado da primeira fase

do projeto que foi o desenho de uma metodologia de diagnóstico, adaptada para os

CBHs e que tem como foco de investigação os diversos aspectos relacionados à

gestão, estrutura e organização de um Comitê. É importante ressaltar que até o

término desse trabalho, o diagnóstico ainda não havia sido totalmente realizado e

por isso, esse artigo não apresenta os resultados da pesquisa. Mesmo assim, alguns

dados, coletados a partir de entrevistas e pesquisa em fontes secundárias, nos

permitirão traçar um breve panorama da realidade esses órgãos.

Além dessa introdução, esse texto traz em sua primeira parte, um breve

histórico da gestão de recursos hídricos no país e em Minas Gerais, seu aparato

legal, os principais atores envolvidos e os principais instrumentos de planejamento e

gestão dos recursos hídricos. Em seguida, são abordados aspectos relativos aos

Comitês de Bacia no que tange a gestão participativa dos recursos hídricos, seu papel

e atribuições definidas em lei. Em outra seção é apresentado o Programa de

Fortalecimentos em Gestão e Desenvolvimento Institucional dos CBHs mineiros,

executado pelo CEMAIS, no qual se discorre sobre a metodologia de diagnóstico

adotada para o mapeamento da realidade desses espaços e, posteriormente, são

apresentados resultados preliminares oriundos de entrevistas feitas com os membros

dos Comitês. Por fim, são apresentadas as considerações finais deste artigo.

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A GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL E EM MINAS GERAIS

No que diz respeito à questão ambiental, a Constituição de 1988 trouxe

algumas modificações substanciais no gerenciamento dos recursos hídricos no país.

A primeira foi a extinção o domínio privado sobre a água, assegurado anteriormente

pela Lei de Direito de Água do Brasil de 1934. A segunda foi a definição de apenas

dois domínios para os corpos de água – o domínio da União e o domínio dos

Estados para as águas superficiais e subterrâneas.

A década seguinte foi de intensa discussão e desenvolvimento da

legislação ambiental. Quanto à gestão das águas, a Lei no 9.433/97 organizou o

setor de planejamento e gestão dos recursos hídricos em âmbito nacional e vários

Estados aprovaram suas respectivas leis de organização administrativa para o setor,

em função de serem detentores de domínio sobre as águas (MMA, 2001; IGAM,

2007). A criação do Sistema Nacional de Gestão dos Recursos Hídricos foi

fundamentada em seis premissas que vale destacar:

� domínio público da água, através de dispositivo constitucional;

� valor econômico devido a constatação da sua escassez;

� prioridade do consumo humano e animal em caso de escassez;

� uso múltiplo;

� unidade territorial determinada por bacia hidrográfica para

implementação da Política Nacional e atuação do SNGRH;

� descentralização e participação do Poder Publico, usuários e

comunidades na gestão dos recursos hídricos.

Em Minas Gerais, com o advento da Lei no 9.433/97, a política estadual

de recursos hídricos foi adequada aos parâmetros da lei maior e resultou na

promulgação da Lei no 13.199/99.

O estado de Minas Gerais sempre se destacou no cenário nacional pela

sua tradição de política ambiental aprimorada ao longo das últimas décadas. O

interesse e a preocupação com o uso racional das águas surgiu no estado em 1979,

ano da criação do Comitê Estadual de Estudos Integrados de Bacias Hidrográficas –

CEEIBH-MG, que deve ser considerado como o marco de um processo que evoluiu

e culminou com o embasamento legal existente hoje no estado. Em 1993, foi

realizado o Seminário Legislativo “Águas de Minas” que propiciou uma ampla

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discussão da sociedade sobre temas relativos à gestão de recursos hídricos,

resultando na promulgação da primeira lei sobre a Política Estadual de Recursos

Hídricos, Lei 11.504, de 20/06/94. Esta lei já estabelecia o Sistema Estadual de

Gerenciamento de Recursos Hídricos de Minas Gerais (IGAM, 2007).

A última revisão do texto legal, Lei 13.199/99, ampliou as competências

dos Comitês de Bacias: foi contemplada a participação de novos organismos de

bacia como consórcios intermunicipais e associações de usuários reconhecidos pelo

Conselho Estadual de Recursos Hídricos; e foram acrescentados instrumentos

fundamentais de gestão de recursos hídricos como (1) os planos diretores de

recursos hídricos de bacias hidrográficas; (2) o enquadramento dos corpos de água

em classes, segundo os seus usos preponderantes; (3) a outorga dos direitos de uso

de recursos hídricos; (4) a cobrança pelo uso de recursos hídricos e (5) o sistema

estadual de Informações sobre Recursos Hídricos.

Dentre esses instrumentos, destaca-se o Plano Diretor de Recursos

Hídricos de Bacia Hidrográfica, que deve ser elaborado de forma periódica. Ele

deve ser utilizado orientar a execução de ações prioritárias na bacia e acompanhar

e controlar a evolução dos processos que interferem na questão dos recursos

hídricos. Além disso, o plano diretor contém diretrizes gerais no âmbito regional

capazes de orientar os planos diretores dos municípios e as metas para se atingir

níveis progressivos de recuperação, proteção e conservação dos recursos hídricos

(CAMARGOS, 2008). Para Santos (2001), o conteúdo do Plano Diretor de

Recursos Hídricos (PDRH) e as suas diretrizes devem refletir o atendimento às

propostas, sugestões e aspirações da sociedade que habita a bacia hidrográfica.

No sentido de promover maior participação da sociedade na elaboração do PDRH

são realizadas reuniões públicas que contribuem para legitimar as necessidades

das comunidades locais.

Outro mecanismo da estrutura jurídica e regulatória é a outorga dos

direitos de uso de recursos hídricos. As outorgas são autorizações concedidas pelo

IGAM, visando disciplinar o acesso e o uso da água para a coletividade. Mendonça

(2003) define a outorga do direito de usos de recursos hídricos como o instrumento

pelo qual o poder público faculta ao interessado, público ou particular, o direito de

utilizar as águas de seu domínio por tempo determinado, em condições

preestabelecidas. Por se constituir exercício do poder de polícia administrativa, a

outorga do direito de uso de recursos hídricos é ato indelegável do poder público.

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Por fim, vale destacar a cobrança pelo uso dos recursos hídricos como

um instrumento de gestão que em Minas foi regulamentada por meio do Decreto no.

44.046/05. O Decreto destaca os objetivos da cobrança, como o reconhecimento da

água como um bem natural de valor social, ecológico e econômico, o incentivo ao

uso racional da água e para obtenção dos recursos necessários à implementação

dos programas previstos nos Planos de Recursos Hídricos. Além disso, também

relaciona as condições para a cobrança, que deve ser vinculada à implementação

das ações definidas e aprovadas previamente nos Planos Diretores de Recursos

Hídricos de Bacias Hidrográficas e a sua vinculação à existência da agência de

bacia, ou entidade a ela equiparada (IGAM, 2007).

Além de estabelecer subsidiariamente os princípios e os instrumentos

para a gestão de recursos hídricos, a Política Estadual, Lei no 13.199/99 estruturou

também o Sistema Estadual de Gerenciamento de Recursos Hídricos de Minas

Gerais (SEGRH-MG), composto pelos seguintes órgãos 1) Secretaria de Estado de

Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SEMAD); 2) Conselho Estadual de

Recursos Hídricos (CERH-MG); 3) Instituto Mineiro de Gestão das Águas (IGAM); 4)

Comitês de Bacia Hidrográfica; 5) Órgãos e entidades dos poderes estadual e

municipal, cujas competências se relacionem com a gestão de recursos hídricos; 6)

Agências de bacias hidrográficas.

Camargos et Cardoso (2004) destacam que além do SEGRH, o estado

também possui em seu aparato institucional o Sistema Estadual de Meio Ambiente

Esses dois sistemas têm proporcionado os elementos básicos para a colocação em

prática de uma política estadual de águas.

“O funcionamento do Conselho Estadual de Política Ambiental (COPAM)

desde 1977 ampliou e consolidou a formulação da política ambiental do estado, não

se limitando à atuação dos órgãos oficiais, mas com a participação de diversos

segmentos da sociedade. O SEGRH, por sua vez, está sendo construído de forma

participativa, também com a atuação de vários setores da sociedade, entretanto, o

processo está lento, o que faz dele ainda um sistema frágil. O Fundo de

Recuperação, Proteção e Desenvolvimento das Bacias Hidrográficas do Estado de

Minas Gerais (FHIDRO) foi sancionado pela Lei 13.194/99, regulamentado, com o

objetivo de dar suporte financeiro a programas e projetos que promovam a

racionalização do uso e a melhoria, nos aspectos quantitativo e qualitativo dos

recursos hídricos estaduais” (CAMARGOS et CARDOSO, 2004).

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O Instituto Mineiro de Gestão das Águas (IGAM), fundamentado na Lei

11.504/94, e com o objetivo de alavancar a implementação do Sistema Estadual de

Gerenciamento de Recursos Hídricos de Minas Gerais, iniciou um trabalho em 1995,

incentivando a criação de Comitês de Bacia Hidrográfica em regiões do Estado onde

já existiam conflitos ou algum problema relacionado ao uso da água. O IGAM

resultou da transferência do Departamento de Recursos Hídricos, vinculado

à Secretaria Estadual de Minas e Energia, para a Secretaria Estadual de Meio

Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SEMAD), inaugurando uma mudança

política que desatrela a gestão da água do setor energético e a vincula à

problemática ambiental (IGAM, 2007).

Já o Conselho Estadual de Recursos Hídricos (CERH) é o órgão máximo

deliberativo do SEGRH, criado em 1998 e que cumpre sua função de deliberar

questões importantes para a estruturação da política das águas em Minas. Um

exemplo foi a solicitação ao IGAM para elaborar um estudo que orientasse a

criação dos Comitês de Bacia. Esse estudo foi solicitado com a justificativa de que

Minas Gerais possuía 10.000 cursos d’água e era necessário um planejamento

para encaminhar ações deste processo organizativo, realizado até então, de

acordo com a demanda da sociedade local. Tal estudo, elaborado em 1999 e que

se denominou “Unidades de Planejamento e Gestão de Recursos Hídricos”,

resultou na divisão do estado em unidades criadas a partir das bacias hidrográficas

e das identidades regionais, sintetizadas por características físicas, sócio-culturais,

econômicas e políticas, e que passaram a reordenar e orientar, a partir de então, a

formação dos Comitês de Bacia Hidrográfica e a gestão das águas no estado

(CARMARGOS, 2008).

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OS COMITÊS DE BACIA E A GESTÃO PARTICIPATIVA DOS RECURSOS

HÍDRICOS

Thame (2003) ressalta a importância dos Comitês na política de recursos

hídricos, defendo que estes são fundamentais para que a proteção das águas

caminhe lado a lado com o desenvolvimento econômico, evitando danos para a

população e gerações futuras. Nessa mesma linha, Pereira (2003) acrescenta que

as atribuições dos Comitês não devem ser confundidas com as atribuições e as

responsabilidades, constitucionalmente definidas, do setor público. A atuação dos

Comitês deve primar pela clareza, pela transparência e pela explicitação de

propósitos amparados pelo conhecimento técnico sobre o tema. Também vale

destacar que um dos desafios para os Comitês é a mediação de conflitos e redução

de divergências entre as partes interessadas no uso da água. A tarefa é árdua, pois

os interesses ora são individuais ora são corporativos.

Camargos (2008) ainda diz que o Comitê é ente sem personalidade

jurídica e integrante da administração pública. Além disso, deve ser visto como o

foro onde são tomadas as principais decisões políticas sobre a utilização das águas

na bacia o que lhe dá a denominação de “parlamento das águas”. Além do Comitê, a

Agência de Bacia Hidrográfica, também é outro importante componente do Sistema,

que tem personalidade jurídica e é o, “braço executivo do Comitê”, a quem é

reservado o papel de implementar as decisões do Comitê.

Mesmo após mais de uma década da promulgação da Lei Nacional das

Águas, Lei no 9.433/97, ainda são poucos, os sistemas de gestão operacionalizados

em sua plenitude. Os que se encontram em operação são os das bacias

hidrográficas do rio Paraíba do Sul e dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí. Para

uma participação mais efetiva das comunidades locais, Camargos e Cardoso (2004)

enfatizam a importância da mobilização social, o entendimento do papel dos

Comitês e a estruturação de arranjos cooperativos entre os municípios da área de

abrangência das bacias hidrográficas, como forma de fortalecer os próprios Comitês.

As autoras afirmam que a implementação da gestão de recursos hídricos é um

processo complexo que requer lideranças fortes e democráticas tanto no âmbito dos

Comitês, como no âmbito do Estado.

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No que diz respeito aos Comitês de Bacia Hidrográfica de Minas Gerais,

estes são organismos de caráter deliberativo e normativo, que têm como objetivo

exercer a gestão descentralizada e participativa a que se refere a Lei 13.199/99,

desempenhando um papel político importante para a definição das ações a serem

implementadas na Bacia. A composição destes fóruns é quatripartite, contemplando

a participação de quatro segmentos da sociedade: poderes públicos Estadual e

Municipal de forma paritária, e Usuários e Sociedade Civil de forma paritária com o

poder público. Apesar disso, há uma tendência a que todos os segmentos sejam

paritários, ou seja, que a representatividade no Comitê fique composta por 25% de

participantes de cada segmento.

Recentemente, o Estado vem melhor orientando a composição desses

Comitês, definindo quais entidades compõem os segmentos da ‘sociedade civil

organizada’ e de ‘usuários’. Segundo Camargos (2008), o segmento ‘usuário’ denota

primordialmente uma atividade econômico-produtiva. Assim, por exemplo, um

sindicato de Produtores Rurais, embora considerado uma entidade da sociedade

civil em outras instâncias, no caso de sua participação no Comitê entende-se que

esta represente os interesses do segmento de ‘usuários’. A aglutinação de órgãos

representativos da bacia, a participação do setor ‘usuários’ exprimindo a exata

vocação econômica da região, a ampla participação dos municípios representando

as regiões do alto, médio e baixo curso do rio, e organizações da sociedade civil

representando os interesses dos diversos grupos locais, é fundamental para a

representatividade e legitimidade do Comitê.

A lei 13.199/99 destaca algumas de suas competências:

� promover o debate das questões relacionadas com recursos hídricos e

articular a atuação de órgãos e entidades intervenientes;

� arbitrar, em primeira instância administrativa, os conflitos relacionados

com os recursos hídricos;

� estabelecer critérios e normas e aprovar os valores propostos para

cobrança pelo uso de recursos hídricos.

Camargos e Cardoso (2004) afirmam que o processo de formação dos

Comitês de Bacia Hidrográfica em Minas Gerais foi bem diversificado, na medida em

que existem Comitês originados das diretrizes do Comitê Estadual de Estudos

Integrados de Bacias Hidrográficas (CEEIBH), no início da década de 80 (como o

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CBH Pará e CBH Verde), que denominados de ‘primeira fase’, ou seja, aqueles

criados por incentivo exclusivo do Estado; e os Comitês de ‘segunda fase’, formados

a partir de demandas de setores sociais das áreas das bacias. Atualmente, existem

35 Comitês legalmente instituídos e em funcionamento no estado, de um total de 36

previstos conforme as Unidades de Planejamento e Gestão de Recursos Hídricos.

Os mais recentes ainda se encontram em uma fase inicial de estruturação (somente

em 2009, dois novos comitês foram instituídos), e os mais antigos (os primeiros

foram instituídos em 1998) já possuem disponíveis os instrumentos de gestão da

bacia e são uma referencia em sua bacia.

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O PROGRAMA DE FORTALECIMENTO EM GESTÃO E DESENVOLVIMENTO

INSTITUCIONAL DOS CBHS MINEIROS

O trabalho desenvolvido pelo CEMAIS junto aos CBHs mineiros envolve

um conjunto integrado de ações que tem como objetivo fortalecer institucionalmente

15 dos 35 Comitês de Bacias Hidrográficas do Estado de Minas Gerais para o

exercício de sua competência legal e fornecer instrumentos e ferramentas gerenciais

para que cumpram, de maneira mais efetiva, seu papel na política de gestão dos

recursos hídricos. O trabalho é realizado em aproximadamente 1600 horas, em um

período de 01 ano, beneficiando diretamente mais de 500 membros de Comitês de

Bacia Hidrográfica e indiretamente mais de 200 municípios mineiros localizados nas

bacias hidrográficas de jurisdição desses Comitês

Os produtos resultantes do trabalho realizado pelo CEMAIS são:

1. Análise da estrutura e organização dos Comitês

� Diagnóstico institucional dos 15 CBHs, contendo um mapeamento da

situação de 15 Comitês de Bacias Hidrográficas mineiros;

� Elaboração de Cartilha com orientações sobre diretrizes para um

bom Regimento Interno, elaboração de pautas e atas, condução de

reuniões, construção de propostas em processos participativos,

construção de um plano de ação estratégico e um plano de

comunicação.

2. Assessoria na elaboração e implementação de Planos de Ação

Estratégicos

� Definição das ações estratégicas dos Comitês, atendendo

expectativas Governo/Sociedade e realidade da Bacia;

� Desenvolvimento de procedimentos para facilitarem a

implementação e acompanhamento dos planos.

3. Assessoria na elaboração e implementação de Plano de Comunicação

� Mapeamento dos públicos estratégicos dos CBHs e definição de

estratégias e ações visando ao fortalecimento da articulação

interinstitucional dos Comitês (órgãos e entidades intervenientes

no SEGRH);

15

� Elaboração de procedimentos de comunicação com os públicos de

interesse para fortalecer a imagem institucional do Comitê

(governo/sociedade) e exercer suas funções de mobilização.

Entre as ações mencionadas e seus respectivos produtos destacamos,

neste artigo, a metodologia desenvolvida para a coleta e análise da organização e

estrutura dos CBHs, que consiste em uma pesquisa de diagnóstico organizacional

desses comitês, cujos objetivos são: a) Produzir um mapeamento detalhado da

situação de quinze Comitês de Bacias Hidrográficas mineiros; b) Analisar o estágio

atual de desenvolvimento desses Comitês; c) Oferecer subsídios para o

planejamento de ações, instrumentos e ferramentas gerenciais voltados ao

fortalecimento desses Comitês.

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A METODOLOGIA DE DIAGNÓSTICO

A metodologia elaborada pelo CeMAIS consiste em uma ferramenta para

a avaliação das atividades dos Comitês, na qual se busca analisar, com base em

parâmetros objetivos, sua estrutura, funcionamento, gestão, comunicação e a

efetividade de sua atuação.

É importante destacar que a finalidade do Comitê expressa em

arcabouço legal norteia a verificação de sua atuação e efetividade, mas não é o

único parâmetro adotado, pois a atuação neste espaço plural requer um enfoque

mais amplo.

Assim sendo, e ao levar em consideração a forma de atuação dos

Comitês de Bacias Hidrográficas mineiros, a metodologia foi construída com base

em três técnicas de coleta de dados a saber:

� Documental, operacionalizado por meio da coleta e análise da

legislação federal e estadual de recursos hídricos, deliberações

normativas 04 e 30 do CERH-MG, regimento interno, ata, pauta e lista

de freqüência de reuniões dos Comitês, suas câmaras temáticas

(quando for o caso) etc.

� Entrevistas, operacionalizada por roteiros com questões fechadas e

abertas a serem feitas com os membros dos comitês previamente

selecionados.

� Aplicação de questionário composto por um conjunto de indicadores –

em formato de perguntas fechadas (e eventualmente abertas) – que ao

serem respondidos revelam o desempenho das atividades dos Comitês

e indicam as áreas a serem reforçadas para o alcance da maior

efetividade possível.

A avaliação sistemática de cada CBH possibilita o conhecimento mais

preciso do Estado sobre a atual realidade institucional desses Comitês, identificando

suas lacunas, fragilidades, necessidades e potencialidades, os constrangimentos e

limites à sua efetividade. O conhecimento apurado sobre essa realidade é essencial

para o desenvolvimento de ações alinhadas às necessidades organizacionais

dessas instâncias, com maior potencial para contribuir com o aumento da efetividade

de sua atuação.

17

O desenho da metodologia de diagnóstico dos Comitês teve início com as

reuniões entre a equipe do CEMAIS com os técnicos da SEMAD e do IGAM, quando

foram levantadas as expectativas e as percepções dos atores estatais em relação à

atuação dos CBHs e as limitações, êxitos e desafios dessas instâncias de

governança da água. Nessas reuniões foram solicitados pela equipe do CEMAIS,

relatórios e documentos de trabalhos já realizados pelo poder público estadual junto

aos Comitês.

Analisados e compilados os registros dessas reuniões, as principais

percepções do IGAM e SEMAD sobre quais seriam alguns dos limites à atuação

efetiva dos Comitês de Bacia foram: grande territorialidade da bacia; ausência de

Planos Diretores; ausência de cobrança pelo uso da água e de Agência de Bacia;

baixa capacidade técnica dos conselheiros para tratar dos assuntos pertinentes ao

SEGRH; pouco conhecimento do funcionamento do Comitê (membros desconhecem

o Regimento Interno); baixo conhecimento sobre a realidade da Bacia Hidrográfica;

pouca capacidade propositiva do Comitê; baixa qualidade dos debates (pauta das

reuniões); pouca capacidade de mobilização e articulação do CBH com a sociedade;

infra-estrutura deficiente; baixa motivação e participação/freqüência dos

conselheiros; desconhecimento do papel do Conselheiro; ausência de estratégias de

comunicação com públicos preferenciais (mobilização e articulação); falta de

planejamento; não cumprimento do Regimento Interno.

Essa era a visão do IGAM e da SEMAD sobre a realidade dos Comitês de

Bacias. Mas qual seria a visão daqueles que deles fazem parte? Era o que a equipe

do CEMAIS buscaria mais à frente.

Uma vez identificadas as percepções do IGAM e da SEMAD, foi realizado

um levantamento da legislação aplicável aos Comitês de Bacias Hidrográficas de

Minas Gerais e as deliberações normativas do Conselho Estadual de Recursos

Hídricos, que impactam diretamente na atuação dos CBHs, visto que estes possuem

relação de vinculação àquele.

Em seguida, com base na análise do arcabouço legal aplicável aos

Comitês mineiros e as citadas deliberações normativas do CERH, nos dados

coletados e analisados das reuniões junto à SEMAD e IGAM, em diversos estudos

sobre os desafios, a efetividade e a realidade dos Conselhos estaduais de políticas

no Brasil, na experiência do CEMAIS em atuar junto aos Conselhos estaduais

18

mineiros e em um material do Instituto Telemig Celular, aplicado no ano de 2001,

junto a 313 Conselhos Municipais de Direito das Crianças Adolescentes e 235

Conselhos Tutelares, a equipe do CEMAIS identificou 05 grandes temas que

embasariam o diagnóstico organizacional dos 15 CBHs mineiros: Histórico; Membros

do Comitê; Estrutura do Comitê; Gestão; Comunicação.

Com base nesses grandes temas, que foram consensuados e legitimados

junto à SEMAD e IGAM, foi construído um roteiro de entrevista que seria aplicado

junto a alguns membros de cada Comitê durante as primeiras visitas da equipe do

CEMAIS às reuniões ordinárias e extraordinárias dos CBHs no ano de 2009.

Em seguida foi elaborado um questionário, no qual esses grandes temas

foram desdobrados em diversas questões, abertas e fechadas, de forma a abarcar a

natureza e a complexidade dos CBHs mineiros, considerando-se, ainda, sua

heterogeneidade.

No tema I ‘Histórico’ foram elaboradas questões que contribui para o

entendimento dos períodos de criação e início de funcionamento dos Comitês. As

variáveis que compõem esse tema contemplam data de criação, instalação e

funcionamento dos CBHs e de sua divulgação.

No tema II ‘Membros do Comitê’ as questões buscam evidenciar a

pluralidade de perfis existentes no espaço do CBH. São investigados a experiência

prévia dos membros dos Comitês, o conhecimento dos membros do Comitê sobre o

seu funcionamento e sobre a política estadual de recursos hídricos, a qualificação e

as habilidades dos membros de cada CBH, dentre outras. Desta forma, busca-se

traçar minimamente os perfis dos membros que compõem cada CBH. A análise dos

perfis, quando realizada em conjunto com aspectos estruturais e de gestão, por

exemplo, ajudam, em parte, a explicar ou interpretar as causas ou circunstâncias

que constrangem ou limitam a efetividade da atuação dos Comitês.

No tema III ‘Estrutura do Comitê’ são analisados: a composição dos

CBHs (número e distribuição dos membros por segmento, e.g.); as condições de

infra-estrutura (física, material, tecnológica) de cada Comitê; e o grau de

registro/documentação das informações relevantes aos Comitês. Deste modo, ao

se perceber falhas ou possibilidades de melhorias nesta área, estes indicadores

podem servir para a avaliação das condições mínimas necessárias ao

funcionamento dos CBHs.

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No tema IV ‘Gestão’, são investigadas as formas e os estágios de gestão

dos Comitês. São avaliados aspectos como: o regimento interno, a abrangência de

seu conteúdo, os mecanismos previstos e normatizações, o seu grau de adequação

ao bom funcionamento dos CBHs, sua aplicação ou não no dia a dia de cada CBH e

a acessibilidade deste aos seus membros; a existência ou não e o grau de

formalização, complexidade e alcance do planejamento dos CBHs; como se dão os

processos de tomada de decisão nos Comitês e os processos de escolha dos seus

membros, incluindo presidente, vice-presidente e secretários; a existência ou não e

as atribuições das equipes de apoio administrativo; a existência, funcionamento,

composição e atuação das Câmaras Temáticas; a abrangência da atuação dos

Comitês e sua conformidade com suas atribuições previstas em lei; o controle sobre

os resultados de sua atuação.

No tema V ‘Comunicação’, a comunicação das atividades do Comitê com

a imprensa e com a sociedade é ressaltada. Também se aborda: a qualidade da

comunicação; a existência de mecanismos e veículos formais de comunicação com

seus diversos públicos; a gestão da informação e a intersetorialidade (o

planejamento estruturado de ações e comunicação com os três setores) são

aspectos tratados para completar a verificação da efetividade da comunicação de

cada Comitê. Deve-se destacar que a divulgação e a publicidade das ações dos

CBHs aos diversos públicos interessados, bem como seu relacionamento com eles,

são essenciais para o ganho ou aumento da legitimidade (reconhecimento e

aceitação) social e política dessas instâncias. Além disso, a comunicação é uma

importante ferramenta de mobilização, questão fundamental para os CBHs.

O questionário geral contempla cerca de 200 questões, divididas de forma

a serem aplicadas, separadamente, a três públicos distintos dos Comitês: diretoria

(presidente, vice-presidente, 1o Secretário e 2o Secretário), membros (titulares e

suplentes) e secretário(a) administrativo(a).

Cabe ressaltar que o questionário ainda está sendo aplicado junto aos

CBHs e que, por isso, seus dados ainda não poderão ser apresentados. Contudo,

como dito anteriormente, o CEMAIS realizou visitas a cada um dos 15 CBHs, nas

quais realizou entrevistas preliminares visando à obtenção de dados que

possibilitem o seu entendimento, ainda que parcial, sobre os limites e desafios

enfrentados por esses Comitês, para que assim desenvolva o trabalho de

fortalecimento e desenvolvimento desses espaços em consonância com sua

realidade. A seguir são apresentados os resultados preliminares da primeira etapa

do diagnóstico.

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RESULTADOS PRELIMINARES – ALGUMAS DIFICULDADES E DESAFIOS

ENFRENTADOS PELOS COMITÊS

Realizadas as primeiras visitas aos 15 Comitês de Bacias Hidrográficas

no ano de 2009 pela equipe do CEMAIS e, concomitantemente, as entrevistas, com

base no roteiro previamente definido, foram identificadas as percepções dos

membros dos 15 CBHs mineiros sobre a realidade do Comitê no qual atuava.

A seguir, são apresentadas algumas percepções sobre a realidade dos

CBHs mineiros de forma genérica, sem a identificação de problemas específicos

atinentes a um ou outro, de forma que seja possível fazer uma avaliação sobre os

desafios e limites enfrentados de forma mais ampla e abrangente e, assim, termos

um panorama geral sobre os Comitês de Bacias Hidrográficas de Minas Gerais.

Na opinião de parte significativa dos entrevistados é evidente o

despreparo dos membros dos Comitês para atuar na gestão compartilhada dos

recursos hídricos. Foi destacado que muitos possuem baixo conhecimento sobre a

legislação pertinente, desconhecendo até mesmo as principais atribuições dos

CBHs, os principais instrumentos de planejamento e gestão e desconhecem até

mesmo o regimento interno do Comitê no qual atuam.

Foi salientado por boa parte dos entrevistados que a forma da

composição dos comitês é boa para o funcionamento dos Comitês. Salientou-se que

a legislação estabelece que o número de órgãos do poder público estadual tem que

ser paritário com o poder público municipal, e a soma dos segmentos usuários e

sociedade civil têm que ser igual à soma dos poderes públicos, na composição dos

Comitês. Quanto à representatividade, os entrevistados foram unânimes

manifestando que ela não é exercida adequadamente.

Silva et al (2005) pontuam que uma das dificuldades encontradas nos

Sistemas de Gestão de Recursos Hídricos brasileiros é o exercício de

representatividade e recomendam especialmente, o fortalecimento da capacidade de

cooperação entre as estruturas sociais, promovendo assim o capital social e a

preparação dos membros dos Comitês para a participação qualificada.

Na opinião geral dos respondentes a renovação de representatividade é

muito baixa nos Comitês, o que gera a participação contínua das mesmas pessoas.

A baixa participação dos representantes do poder público estadual e municipal nos

CBHs também foi destacada pelos entrevistados, já que aqueles, na ótica dos

respondentes, são designados apenas para cumprir um ritual de formalização.

21

Contribuindo na discussão sobre a participação das mesmas pessoas

nesse processo, Cardoso (2003) enfatiza que os mesmos indivíduos acabam

participando de várias instancias coletivas, em função da dificuldade de formação de

novas lideranças para acompanhar o novo momento político de gestão participativa.

Um especialista exemplificou a Companhia de Saneamento de Minas

Gerais (COPASA-MG), entre outros órgãos, com o questionamento se esta deveria

representar o poder público estadual ou o segmento de usuários. Em relação a esse

exemplo, alguns especialistas destacaram que essa situação desequilibra as

decisões, especialmente no âmbito dos Comitês de Bacia. Nesse sentido Cardoso

(2003) comenta que a necessidade de representação da COPASA-MG

é unanimidade nos Comitês de Bacia e nos Conselhos, no entanto essa Companhia

tende a desempenhar um papel protagonista, mais como agente governamental que

como empresa usuária de água.

Uma opinião interessante surgida é que os Comitês de Bacia Hidrográfica

influenciam na política de gestão de recursos hídricos, porém não estabelecem

indicadores de desempenho. A falta de planejamento e controle sobre o resultado de

suas deliberações apareceu como fator preponderante para a baixa efetividade de

sua atuação.

Pelo fato do Comitê de Bacia Hidrográfica se traduzir no organismo de

debates, discussões e decisões dos stakeholders, distintas argumentações são

evidenciadas sobre aspectos de caráter operacional e representativo. Foram

levantadas percepções, sobre a falta de uma estrutura administrativa eficiente de

mobilização, das partes interessadas e as dificuldades de se conduzir um processo

participativo que envolva técnicos, representantes da comunidade, gestores

públicos, entre outros. A ausência de uma estrutura administrativa eficaz

compromete a divulgação de informações, de procedimentos de auditoria e de uma

política de comunicação com os demais stakeholders. No caso do processo

participativo de gestão, um dos entraves na escolha dos representantes da

comunidade nos Comitês refere-se às questões de natureza cultural (em função da

pouca prática de gestão participativa ainda no Brasil) e política (muitas vezes as

escolhas recaem sobre as mesmas pessoas).

22

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os Comitês de Bacias Hidrográficas, espaços públicos e democráticos de

exercício pleno de governança social possuem atribuições previstas em lei de

extrema relevância no que diz respeito à gestão integrada e sustentável dos

recursos hídricos na bacia hidrográfica de sua jurisdição. Entretanto, dadas a

complexidade da política de recursos hídricos e aas diversas limitações técnicas,

estruturais, de comunicação e de gestão que enfrentam, os CBHs têm se mostrado

pouco efetivos no exercício de seu papel. Isso, aliado à baixa (qualidade da)

participação dos seus membros, contribui para o agravamento desse quadro na

realidade mineira.

Este artigo apresentou o contexto de surgimento dos Comitês de Bacia

mineiros, suas atribuições, seus principais instrumentos previstos em lei, bem

como o trabalho que vem sendo desenvolvido pelo CEMAIS junto a quinze CBHs

do estado de Minas Gerais, em parceria com a Secretaria de Estado e

Desenvolvimento Sustentável (SEMAD/MG) visando fortalecê-los e desenvolvê-

los para o exercício efetivo de seu papel. Espera-se que com o programa de

fortalecimento em gestão e desenvolvimento institucional esses Comitês se

tornem mais capazes de gerir, de forma participativa e sustentável, os recursos

hídricos no estado.

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REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei no 9.433, de 08 de janeiro de 1997. Dispõe sobre a Política Nacional de Recursos Hídricos. Brasília, 1997, 25 p. CAMARGOS, Luiza; CARDOSO, Maria Lúcia. O papel do estado e da sociedade civil no processo de criação dos comitês de bacia hidrográfica em Minas Gerais. In: MACHADO, Carlos (Org.). Gestão de águas doces. Rio de Janeiro: Interciência, 2004. p. 291-324. CÁNEPA, E. M. A Lei das Águas no Rio Grande do Sul: no caminho do desenvolvimento sustentável? Ciência & Ambiente, Santa Maria, v. 1, n. 21, p. 135-152, jul. 2000. CARDOSO, M. L. M. A democracia das águas na sua prática: o caso dos comitês de bacias hidrográficas de Minas Gerais. 2003. Rio de Janeiro: UFRJ, 2003. CUNHA, Fernando M. Desempenho institucional na gestão de recursos hídricos: o caso dos subcomitês na região metropolitana de São Paulo. 2004. São Paulo: USP, 2004. DAGNINO, Evelina. Sociedade Civil, Espaços Públicos e a Construção Democrática no Brasil: Limites e Possibilidades. In: DAGNINO, E. (org.). Sociedade Civil e espaços públicos no Brasil. São Paulo: Paz e Terra, 2002. IGAM. Relatório da 1a etapa do Plano Estadual de Recursos Hídricos – PERH-MG, dez. 2006. Disponível em: <http://www.igam.mg.gov.br>. Acesso em: 27 dez. 2007. JACOBI, Pedro e BARBI, F. Governança dos recursos hídricos e participação da sociedade civil. In: Seminário Nacional de Movimentos Sociais, Participação e Democracia. Florianópolis, SC, 2007. LORENZI, Rita. Câmara técnica do plano de bacias. Água 1993-2003 CBH-PCJ. São Paulo, 2003. p.113-116. MACHADO, Carlos José Saldanha. A nova aliança entre estado e sociedade na administração da coisa pública. In: MACHADO, Carlos (Org.) Gestão de águas doces. Rio de Janeiro: Interciência, 2004. p. 1-38.

24

MMA. Política Nacional do Meio Ambiente. Publicação do Ministério do Meio Ambiente. Secretaria de Recursos Hídricos, Brasília: SRH, 2001. NOGUEIRA, Daniela. A participação da sociedade civil na gestão de recursos hídricos: um estudo de caso do Rio das Velhas. In: Reunião Nacional da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ambiente e Sociedade, 2002, Indaiatuba, SP. Indaiatuba: ANPPAS, 8 nov. 2002. ______. Relação entre capital social e agenda política na gestão de recurso hídricos: um estudo de caso no comitê do Rio das Velhas. In: XXIV Congresso Internacional da Latin American Studies Association International Congress. Dallas/USA, 27 a 29 mar. 2003. ROCHA, Lidiane. Gestão de recursos hídricos em nível de bacia hidrográfica: Uma análise das decisões dos Comitês de Bacia no Brasil. In: Congresso Nacional da SBPC. Recife, PE: UFP, 2003. TATAGIBA, Luciana. Conselhos gestores de políticas públicas e democracia participativa: aprofundando o debate. Revista de Sociologia e Política. n.25. Curitiba, 2005. ______. Os Conselhos Gestores e a Democratização das Políticas Públicas no Brasil. In: DAGNINO, E. (org.). Sociedade Civil e Espaços Públicos no Brasil. São Paulo: Paz e Terra, 2002. THAME, Antônio Carlos. A responsabilidade dos comitês em defesa da água e da vida. Água 1993-2003 CBH-PCJ. São Paulo, 2003. p.13-16.

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AUTORIA

Tiago Cacique Moraes – Mestre em administração pública e governo pela Fundação Getúlio Vargas de São Paulo e bacharel em administração pública pela mesma instituição. Centro Mineiro de Alianças Intersetoriais (CEMAIS). Endereço eletrônico: [email protected] Glauco Knopp – Mestre em Administração Pública pela Fundação Getulio Vargas (EBAPE/FGV) e bacharel em Administração pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM). Atua na docência superior, em cursos de graduação e pós-graduação. É autor de livros, capítulos e artigos acadêmico-científicos. Filiação Institucional: Centro Mineiro de Alianças Intersetoriais (CEMAIS). Endereço eletrônico: [email protected]