III Congresso Consad de Gestão Pública CONSAD/paineis... · reforçar a capacidade dos CBHs: de...
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III Congresso Consad de Gestão Pública
PROJETO DE QUALIFICAÇÃO EM GESTÃO E FORTALECIMENTO INSTITUCIONAL DOS COMITÊS DE
BACIAS HIDROGRÁFICAS DE MINAS GERAIS: PARCERIA ESTADO E SOCIEDADE CIVIL ORGANIZADA PARA O
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
Tiago Cacique Moraes Glauco Knopp
Painel 29/114 A governança social e a intersetorialidade: formação de redes em torno de políticas públicas
PROJETO DE QUALIFICAÇÃO EM GESTÃO E FORTALECIMENTO INSTITUCIONAL DOS
COMITÊS DE BACIAS HIDROGRÁFICAS DE MINAS GERAIS: PARCERIA ESTADO E SOCIEDADE CIVIL ORGANIZADA PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
Tiago Cacique Moraes Glauco Knopp
RESUMO Este artigo apresenta o trabalho que está sendo desenvolvido pela OSCIP Centro Mineiro de Alianças Intersetoriais (CeMAIS), realizado em parceria com a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SEMAD/MG), junto a quinze Comitês de Bacias Hidrográficas (CBHs) mineiros. Envolve um conjunto integrado de ações que tem como objetivo fortalecer institucionalmente esses CBHs para o exercício de sua competência legal e fornecer instrumentos e ferramentas gerenciais para que esses espaços de exercício pleno da governança social cumpram, de maneira mais efetiva, seu papel na política de gestão dos recursos hídricos. O escopo de trabalho realizado junto aos Comitês envolve: o diagnóstico organizacional; a elaboração de planos estratégicos; e planos de comunicação para cada um dos quinze Comitês. Neste documento, será dado destaque à metodologia de diagnóstico proposta pelo CeMAIS para a avaliação das atividades dos Comitês. O trabalho junto os Comitês de Bacia é norteado pelas seguintes questões: Qual tem sido a contribuição dos CBHs para a implementação da política estadual de recursos hídricos em Minas Gerais? Quais são os limites e desafios à institucionalização e efetividade dos Comitês de Bacia Hidrográfica em MG? Um dos maiores desafios enfrentados no processo de consolidação da gestão dos recursos hídricos é concretizar, por meio dos Comitês de Bacia e demais organismos colegiados, a gestão participativa da água. Essa nova configuração contrapõe-se às práticas historicamente estabelecidas, tais como: construção de obras hídricas sem o seu devido gerenciamento, decisões governamentais tomadas de forma centralizada, desinteresse e ausência de iniciativas dos usuários e da sociedade na busca de alternativas para a gestão sustentável dos recursos hídricos. Thame (2003) ressalta a importância dos Comitês na política de recursos hídricos, defendo que estes são fundamentais para que a proteção das águas caminhe lado a lado com o desenvolvimento econômico, evitando danos para a população e gerações futuras. Em Minas Gerais, estado com tradição longeva de participação dos diversos setores sociais na co-gestão das políticas públicas, existem atualmente 35 Comitês legalmente instituídos e em funcionamento, de um total de 36 previstos conforme as Unidades de Planejamento e Gestão de Recursos Hídricos. Embora existente em número expressivo no estado de Minas Gerais, os Comitês de Bacia, assim como qualquer instância participativa de caráter deliberativo, enfrentam desafios e limites que constrangem a efetividade de sua atuação e do exercício de seu papel. É a partir desse cenário que o Centro Mineiro de Alianças Intersetoriais (CEMAIS) e a Secretaria de Meio Ambiente de Minas Gerais (SEMAD/MG) firmaram, em setembro de 2009, uma parceria para a implementação do Programa de Qualificação em
Gestão e Desenvolvimento Institucional dos Comitês de Bacias Hidrográficas do Estado. Entende-se que para produzir resultados qualquer organização depende de recursos e de um padrão mínimo de planejamento e gestão. E isso se aplica aos Comitês de Bacia Hidrográfica. Esse projeto busca desenvolver ações no intuito de reforçar a capacidade dos CBHs: de organização da rotina; de um planejamento integrado que possibilite a elaboração, o monitoramento e a avaliação dos seus objetivos, metas e ações na bacia hidrográfica; e de gerenciar sua comunicação com os públicos interno e externo e criar estratégias e mecanismos eficazes para esses fins.O fortalecimento de espaços públicos, tais como os Comitês de Bacia Hidrográfica (CBH), tem sido um dos focos de atuação do Instituto de Governança Social, projeto realizado desde 2007 pelo governo de Minas Gerais em parceria com o CeMAIS. Uma de suas principais iniciativas é a capacitação e instrumentalização dos Conselhos Estaduais de Políticas Públicas de Minas Gerais – fóruns colegiados que se assemelham aos Comitês de Bacia, por se tratarem de espaços públicos, plurais, paritários (Estado e Sociedade Civil fazem parte) e que atuam em áreas específicas (TATAGIBA, 2002). O referido Programa contempla 15 CBHs mineiros dentre os 35 existentes, contemplando cerca de 1600 horas de trabalho, mais de 500 membros dos Comitês e beneficiando indiretamente mais de 200 municípios situados nas bacias hidrográficas de jurisdição desses Comitês. O escopo do trabalho envolve um diagnóstico da realidade organizacional desses CBHs, a elaboração de cartilhas sobre temáticas de organização, planejamento e comunicação voltada para os Comitês e a elaboração conjunta e participativa de planos de ação estratégicos e planos de comunicação para estes espaços, com assessoria técnica para a sua implementação. A partir de uma metodologia de diagnóstico desenvolvida especificamente para instâncias participativas de deliberação social, que conta com 05 grandes temas – Histórico; Membros do Comitê; Estrutura do Comitê; Gestão; Comunicação –, está sendo realizado um mapeamento da realidade dos 15 Comitês trabalhados. Os objetivos desse diagnóstico são: a) Produzir um mapeamento detalhado da situação de quinze Comitês de Bacias Hidrográficas mineiros; b) Analisar o estágio atual de desenvolvimento desses Comitês; c) Oferecer subsídios para o planejamento de ações, instrumentos e ferramentas gerenciais voltados ao fortalecimento desses Comitês. Embora a sua aplicação ainda esteja em cursos, os resultados preliminares do diagnóstico indicam que a baixa representatividade, a baixa qualidade da participação dos membros nos Comitês, atrelada a limitações técnicas, gerenciais e estruturais têm contribuído negativamente para a atuação efetiva dos CBHs no estado de Minas Gerais.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO........................................................................................................... 04
A GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL E EM MINAS GERAIS....... 07
OS COMITÊS DE BACIA E A GESTÃO PARTICIPATIVA DOS RECURSOS HÍDRICOS.................................................................................................................. 11
O PROGRAMA DE FORTALECIMENTO EM GESTÃO E DESENVOLVIMENTO INSTITUCIONAL DOS CBHS MINEIROS................................................................. 14
A METODOLOGIA DE DIAGNÓSTICO..................................................................... 16
RESULTADOS PRELIMINARES – ALGUMAS DIFICULDADES E DESAFIOS ENFRENTADOS PELOS COMITÊS.......................................................................... 20
CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................................... 22
REFERÊNCIAS.......................................................................................................... 23
4
INTRODUÇÃO
“O acesso à água de boa qualidade será, nas próximas décadas, uma
questão crucial a ser resolvida para assegurar a sobrevivência humana”. Essa
afirmação de Cardoso (2003) ilustra bem a posição estratégica da água e a forma
como esse tema vem ocupando espaço na agenda política dos governos locais e
das agências multilaterais no período recente. No Brasil, essa preocupação tem
provocado uma redefinição da política de recursos hídricos que tem como marco
regulatório a Lei Federal no 9.433/97, também conhecida como “Lei das Águas”.
Segundo Cánepa (2000), a Lei das Águas introduziu duas inovações na gestão de
recursos hídricos. A primeira é o uso de instrumentos econômicos para a execução
da política ambiental, pois assim pode-se trabalhar com padrões de qualidade
estabelecidos pela sociedade e buscar alternativas com custos socialmente
aceitáveis. A outra é a descentralização da gestão e a participação da sociedade no
processo de planejamento e intervenção dos recursos hídricos. A temática da
participação dá origem aos Comitês de Bacia Hidrográficas, órgãos colegiados,
formados por representantes do poder público, da sociedade civil (entidades cuja
atuação seja relacionada aos recursos hídricos – entidades ambientalistas,
associações, instituições de ensino, sindicatos de trabalhadores rurais, dentre
outras) e dos usuários da água (organizações que fazem uso das águas superficiais
ou subterrâneas – companhias de saneamento, companhias de geração de energia,
mineração, indústria, irrigantes, dentre outros).
Para Camargos (2008), um dos maiores desafios enfrentados no
processo de consolidação desse novo modelo de gestão dos recursos hídricos, é
concretizar, por meio dos Comitês de Bacia e demais organismos colegiados, a
gestão participativa da água. Essa nova configuração contrapõe-se às práticas
historicamente estabelecidas, tais como: construção de obras hídricas sem o seu
devido gerenciamento, decisões governamentais tomadas de forma centralizada,
desinteresse e ausência de iniciativas dos usuários e da sociedade na busca de
alternativas para a gestão sustentável dos recursos hídricos.
O fortalecimento de espaços públicos, tais como os Comitês de Bacia
Hidrográfica (CBH), tem sido um dos focos de atuação do Instituto de Governança
Social, projeto realizado desde 2007 pelo governo de Minas Gerais em parceria com
5
a OSCIP CeMAIS – Centro Mineiro de Alianças Intersetoriais1. Uma de suas
principais iniciativas é a capacitação e instrumentalização dos Conselhos Estaduais
de Políticas Públicas de Minas Gerais – fóruns colegiados que se assemelham aos
Comitês de Bacia, por se tratarem de espaços públicos, plurais, paritários (Estado e
Sociedade Civil fazem parte) e que atuam em áreas específicas (TATAGIBA, 2002).
Além de se aproximarem por suas características e finalidades, esses
espaços também compartilham os mesmos dilemas, desafios, constrangimentos e
as ameaças geradas a sua efetivação. Diversos estudos nos ajudam a analisar
esses desafios a partir de duas dimensões (DAGNINO, 2002; DAGNINO et
TATAGIBA, 2007; SILVEIRA, 2008; BRONZO, 2007, MORAES et CORREIA, 2009).
A primeira se refere à legitimidade em sua atuação e a qualidade das decisões
tomadas nesses espaços enquanto um extrato da vontade pública e do interesse da
sociedade. As ameaças à legitimidade destes órgãos são analisadas a partir de
variáveis como pluralidade, qualidade da representação, representatividade e
também a permeabilidade estatal. A segunda dimensão está relacionada à
performance dos conselhos. Afinal, um extenso montante de recursos humanos e
financeiros é destinado à prática conselhista, mas que produto é gerado? Moraes et
Correia (2009) ainda perguntam, qual a capacidade dos conselhos de influenciar as
políticas públicas governamentais? Qual a qualidade das discussões nas plenárias e
das propostas formuladas? Da mesma forma, também perguntamos até que ponto
os CBHs têm contribuído para um processo mais democrático de formulação da
política dos recursos hídricos e alocação eficaz dos recursos públicos?
Os resultados de diversos trabalhos têm apontado para conclusões mais
amplas, de que esses órgãos colegiados não têm cumprido com efetividade a sua
função deliberativa. Há falhas de representatividade (baixa participação dos
conselheiros), baixa capacidade propositiva, falta de qualificação dos
representantes, deficiências de comunicação entre os conselheiros e suas
instituições e outros que implicam em uma fragilidade institucional desses espaços.
É a partir desse cenário que o Centro Mineiro de Alianças Intersetoriais
(CEMAIS) e a Secretaria de Meio Ambiente de Minas Gerais (SEMAD/MG) firmaram,
em setembro de 2009, uma parceria para a implementação do Programa de
Qualificação em Gestão e Desenvolvimento Institucional dos Comitês de Bacias
Hidrográficas do Estado. Entende-se que para produzir resultados qualquer
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organização depende de recursos e de um padrão mínimo de planejamento e
gestão. E isso se aplica aos Comitês de Bacia Hidrográfica. Esse projeto busca
desenvolver ações no intuito de reforçar a capacidade dos CBHs: de organização da
rotina; de um planejamento integrado que possibilite a elaboração, o monitoramento
e a avaliação dos seus objetivos, metas e ações na bacia hidrográfica; e de
gerenciar sua comunicação com os públicos interno e externo e criar estratégias e
mecanismos eficazes para esses fins.
Nesse artigo, apresentamos especificamente o resultado da primeira fase
do projeto que foi o desenho de uma metodologia de diagnóstico, adaptada para os
CBHs e que tem como foco de investigação os diversos aspectos relacionados à
gestão, estrutura e organização de um Comitê. É importante ressaltar que até o
término desse trabalho, o diagnóstico ainda não havia sido totalmente realizado e
por isso, esse artigo não apresenta os resultados da pesquisa. Mesmo assim, alguns
dados, coletados a partir de entrevistas e pesquisa em fontes secundárias, nos
permitirão traçar um breve panorama da realidade esses órgãos.
Além dessa introdução, esse texto traz em sua primeira parte, um breve
histórico da gestão de recursos hídricos no país e em Minas Gerais, seu aparato
legal, os principais atores envolvidos e os principais instrumentos de planejamento e
gestão dos recursos hídricos. Em seguida, são abordados aspectos relativos aos
Comitês de Bacia no que tange a gestão participativa dos recursos hídricos, seu papel
e atribuições definidas em lei. Em outra seção é apresentado o Programa de
Fortalecimentos em Gestão e Desenvolvimento Institucional dos CBHs mineiros,
executado pelo CEMAIS, no qual se discorre sobre a metodologia de diagnóstico
adotada para o mapeamento da realidade desses espaços e, posteriormente, são
apresentados resultados preliminares oriundos de entrevistas feitas com os membros
dos Comitês. Por fim, são apresentadas as considerações finais deste artigo.
7
A GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL E EM MINAS GERAIS
No que diz respeito à questão ambiental, a Constituição de 1988 trouxe
algumas modificações substanciais no gerenciamento dos recursos hídricos no país.
A primeira foi a extinção o domínio privado sobre a água, assegurado anteriormente
pela Lei de Direito de Água do Brasil de 1934. A segunda foi a definição de apenas
dois domínios para os corpos de água – o domínio da União e o domínio dos
Estados para as águas superficiais e subterrâneas.
A década seguinte foi de intensa discussão e desenvolvimento da
legislação ambiental. Quanto à gestão das águas, a Lei no 9.433/97 organizou o
setor de planejamento e gestão dos recursos hídricos em âmbito nacional e vários
Estados aprovaram suas respectivas leis de organização administrativa para o setor,
em função de serem detentores de domínio sobre as águas (MMA, 2001; IGAM,
2007). A criação do Sistema Nacional de Gestão dos Recursos Hídricos foi
fundamentada em seis premissas que vale destacar:
� domínio público da água, através de dispositivo constitucional;
� valor econômico devido a constatação da sua escassez;
� prioridade do consumo humano e animal em caso de escassez;
� uso múltiplo;
� unidade territorial determinada por bacia hidrográfica para
implementação da Política Nacional e atuação do SNGRH;
� descentralização e participação do Poder Publico, usuários e
comunidades na gestão dos recursos hídricos.
Em Minas Gerais, com o advento da Lei no 9.433/97, a política estadual
de recursos hídricos foi adequada aos parâmetros da lei maior e resultou na
promulgação da Lei no 13.199/99.
O estado de Minas Gerais sempre se destacou no cenário nacional pela
sua tradição de política ambiental aprimorada ao longo das últimas décadas. O
interesse e a preocupação com o uso racional das águas surgiu no estado em 1979,
ano da criação do Comitê Estadual de Estudos Integrados de Bacias Hidrográficas –
CEEIBH-MG, que deve ser considerado como o marco de um processo que evoluiu
e culminou com o embasamento legal existente hoje no estado. Em 1993, foi
realizado o Seminário Legislativo “Águas de Minas” que propiciou uma ampla
8
discussão da sociedade sobre temas relativos à gestão de recursos hídricos,
resultando na promulgação da primeira lei sobre a Política Estadual de Recursos
Hídricos, Lei 11.504, de 20/06/94. Esta lei já estabelecia o Sistema Estadual de
Gerenciamento de Recursos Hídricos de Minas Gerais (IGAM, 2007).
A última revisão do texto legal, Lei 13.199/99, ampliou as competências
dos Comitês de Bacias: foi contemplada a participação de novos organismos de
bacia como consórcios intermunicipais e associações de usuários reconhecidos pelo
Conselho Estadual de Recursos Hídricos; e foram acrescentados instrumentos
fundamentais de gestão de recursos hídricos como (1) os planos diretores de
recursos hídricos de bacias hidrográficas; (2) o enquadramento dos corpos de água
em classes, segundo os seus usos preponderantes; (3) a outorga dos direitos de uso
de recursos hídricos; (4) a cobrança pelo uso de recursos hídricos e (5) o sistema
estadual de Informações sobre Recursos Hídricos.
Dentre esses instrumentos, destaca-se o Plano Diretor de Recursos
Hídricos de Bacia Hidrográfica, que deve ser elaborado de forma periódica. Ele
deve ser utilizado orientar a execução de ações prioritárias na bacia e acompanhar
e controlar a evolução dos processos que interferem na questão dos recursos
hídricos. Além disso, o plano diretor contém diretrizes gerais no âmbito regional
capazes de orientar os planos diretores dos municípios e as metas para se atingir
níveis progressivos de recuperação, proteção e conservação dos recursos hídricos
(CAMARGOS, 2008). Para Santos (2001), o conteúdo do Plano Diretor de
Recursos Hídricos (PDRH) e as suas diretrizes devem refletir o atendimento às
propostas, sugestões e aspirações da sociedade que habita a bacia hidrográfica.
No sentido de promover maior participação da sociedade na elaboração do PDRH
são realizadas reuniões públicas que contribuem para legitimar as necessidades
das comunidades locais.
Outro mecanismo da estrutura jurídica e regulatória é a outorga dos
direitos de uso de recursos hídricos. As outorgas são autorizações concedidas pelo
IGAM, visando disciplinar o acesso e o uso da água para a coletividade. Mendonça
(2003) define a outorga do direito de usos de recursos hídricos como o instrumento
pelo qual o poder público faculta ao interessado, público ou particular, o direito de
utilizar as águas de seu domínio por tempo determinado, em condições
preestabelecidas. Por se constituir exercício do poder de polícia administrativa, a
outorga do direito de uso de recursos hídricos é ato indelegável do poder público.
9
Por fim, vale destacar a cobrança pelo uso dos recursos hídricos como
um instrumento de gestão que em Minas foi regulamentada por meio do Decreto no.
44.046/05. O Decreto destaca os objetivos da cobrança, como o reconhecimento da
água como um bem natural de valor social, ecológico e econômico, o incentivo ao
uso racional da água e para obtenção dos recursos necessários à implementação
dos programas previstos nos Planos de Recursos Hídricos. Além disso, também
relaciona as condições para a cobrança, que deve ser vinculada à implementação
das ações definidas e aprovadas previamente nos Planos Diretores de Recursos
Hídricos de Bacias Hidrográficas e a sua vinculação à existência da agência de
bacia, ou entidade a ela equiparada (IGAM, 2007).
Além de estabelecer subsidiariamente os princípios e os instrumentos
para a gestão de recursos hídricos, a Política Estadual, Lei no 13.199/99 estruturou
também o Sistema Estadual de Gerenciamento de Recursos Hídricos de Minas
Gerais (SEGRH-MG), composto pelos seguintes órgãos 1) Secretaria de Estado de
Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SEMAD); 2) Conselho Estadual de
Recursos Hídricos (CERH-MG); 3) Instituto Mineiro de Gestão das Águas (IGAM); 4)
Comitês de Bacia Hidrográfica; 5) Órgãos e entidades dos poderes estadual e
municipal, cujas competências se relacionem com a gestão de recursos hídricos; 6)
Agências de bacias hidrográficas.
Camargos et Cardoso (2004) destacam que além do SEGRH, o estado
também possui em seu aparato institucional o Sistema Estadual de Meio Ambiente
Esses dois sistemas têm proporcionado os elementos básicos para a colocação em
prática de uma política estadual de águas.
“O funcionamento do Conselho Estadual de Política Ambiental (COPAM)
desde 1977 ampliou e consolidou a formulação da política ambiental do estado, não
se limitando à atuação dos órgãos oficiais, mas com a participação de diversos
segmentos da sociedade. O SEGRH, por sua vez, está sendo construído de forma
participativa, também com a atuação de vários setores da sociedade, entretanto, o
processo está lento, o que faz dele ainda um sistema frágil. O Fundo de
Recuperação, Proteção e Desenvolvimento das Bacias Hidrográficas do Estado de
Minas Gerais (FHIDRO) foi sancionado pela Lei 13.194/99, regulamentado, com o
objetivo de dar suporte financeiro a programas e projetos que promovam a
racionalização do uso e a melhoria, nos aspectos quantitativo e qualitativo dos
recursos hídricos estaduais” (CAMARGOS et CARDOSO, 2004).
10
O Instituto Mineiro de Gestão das Águas (IGAM), fundamentado na Lei
11.504/94, e com o objetivo de alavancar a implementação do Sistema Estadual de
Gerenciamento de Recursos Hídricos de Minas Gerais, iniciou um trabalho em 1995,
incentivando a criação de Comitês de Bacia Hidrográfica em regiões do Estado onde
já existiam conflitos ou algum problema relacionado ao uso da água. O IGAM
resultou da transferência do Departamento de Recursos Hídricos, vinculado
à Secretaria Estadual de Minas e Energia, para a Secretaria Estadual de Meio
Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SEMAD), inaugurando uma mudança
política que desatrela a gestão da água do setor energético e a vincula à
problemática ambiental (IGAM, 2007).
Já o Conselho Estadual de Recursos Hídricos (CERH) é o órgão máximo
deliberativo do SEGRH, criado em 1998 e que cumpre sua função de deliberar
questões importantes para a estruturação da política das águas em Minas. Um
exemplo foi a solicitação ao IGAM para elaborar um estudo que orientasse a
criação dos Comitês de Bacia. Esse estudo foi solicitado com a justificativa de que
Minas Gerais possuía 10.000 cursos d’água e era necessário um planejamento
para encaminhar ações deste processo organizativo, realizado até então, de
acordo com a demanda da sociedade local. Tal estudo, elaborado em 1999 e que
se denominou “Unidades de Planejamento e Gestão de Recursos Hídricos”,
resultou na divisão do estado em unidades criadas a partir das bacias hidrográficas
e das identidades regionais, sintetizadas por características físicas, sócio-culturais,
econômicas e políticas, e que passaram a reordenar e orientar, a partir de então, a
formação dos Comitês de Bacia Hidrográfica e a gestão das águas no estado
(CARMARGOS, 2008).
11
OS COMITÊS DE BACIA E A GESTÃO PARTICIPATIVA DOS RECURSOS
HÍDRICOS
Thame (2003) ressalta a importância dos Comitês na política de recursos
hídricos, defendo que estes são fundamentais para que a proteção das águas
caminhe lado a lado com o desenvolvimento econômico, evitando danos para a
população e gerações futuras. Nessa mesma linha, Pereira (2003) acrescenta que
as atribuições dos Comitês não devem ser confundidas com as atribuições e as
responsabilidades, constitucionalmente definidas, do setor público. A atuação dos
Comitês deve primar pela clareza, pela transparência e pela explicitação de
propósitos amparados pelo conhecimento técnico sobre o tema. Também vale
destacar que um dos desafios para os Comitês é a mediação de conflitos e redução
de divergências entre as partes interessadas no uso da água. A tarefa é árdua, pois
os interesses ora são individuais ora são corporativos.
Camargos (2008) ainda diz que o Comitê é ente sem personalidade
jurídica e integrante da administração pública. Além disso, deve ser visto como o
foro onde são tomadas as principais decisões políticas sobre a utilização das águas
na bacia o que lhe dá a denominação de “parlamento das águas”. Além do Comitê, a
Agência de Bacia Hidrográfica, também é outro importante componente do Sistema,
que tem personalidade jurídica e é o, “braço executivo do Comitê”, a quem é
reservado o papel de implementar as decisões do Comitê.
Mesmo após mais de uma década da promulgação da Lei Nacional das
Águas, Lei no 9.433/97, ainda são poucos, os sistemas de gestão operacionalizados
em sua plenitude. Os que se encontram em operação são os das bacias
hidrográficas do rio Paraíba do Sul e dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí. Para
uma participação mais efetiva das comunidades locais, Camargos e Cardoso (2004)
enfatizam a importância da mobilização social, o entendimento do papel dos
Comitês e a estruturação de arranjos cooperativos entre os municípios da área de
abrangência das bacias hidrográficas, como forma de fortalecer os próprios Comitês.
As autoras afirmam que a implementação da gestão de recursos hídricos é um
processo complexo que requer lideranças fortes e democráticas tanto no âmbito dos
Comitês, como no âmbito do Estado.
12
No que diz respeito aos Comitês de Bacia Hidrográfica de Minas Gerais,
estes são organismos de caráter deliberativo e normativo, que têm como objetivo
exercer a gestão descentralizada e participativa a que se refere a Lei 13.199/99,
desempenhando um papel político importante para a definição das ações a serem
implementadas na Bacia. A composição destes fóruns é quatripartite, contemplando
a participação de quatro segmentos da sociedade: poderes públicos Estadual e
Municipal de forma paritária, e Usuários e Sociedade Civil de forma paritária com o
poder público. Apesar disso, há uma tendência a que todos os segmentos sejam
paritários, ou seja, que a representatividade no Comitê fique composta por 25% de
participantes de cada segmento.
Recentemente, o Estado vem melhor orientando a composição desses
Comitês, definindo quais entidades compõem os segmentos da ‘sociedade civil
organizada’ e de ‘usuários’. Segundo Camargos (2008), o segmento ‘usuário’ denota
primordialmente uma atividade econômico-produtiva. Assim, por exemplo, um
sindicato de Produtores Rurais, embora considerado uma entidade da sociedade
civil em outras instâncias, no caso de sua participação no Comitê entende-se que
esta represente os interesses do segmento de ‘usuários’. A aglutinação de órgãos
representativos da bacia, a participação do setor ‘usuários’ exprimindo a exata
vocação econômica da região, a ampla participação dos municípios representando
as regiões do alto, médio e baixo curso do rio, e organizações da sociedade civil
representando os interesses dos diversos grupos locais, é fundamental para a
representatividade e legitimidade do Comitê.
A lei 13.199/99 destaca algumas de suas competências:
� promover o debate das questões relacionadas com recursos hídricos e
articular a atuação de órgãos e entidades intervenientes;
� arbitrar, em primeira instância administrativa, os conflitos relacionados
com os recursos hídricos;
� estabelecer critérios e normas e aprovar os valores propostos para
cobrança pelo uso de recursos hídricos.
Camargos e Cardoso (2004) afirmam que o processo de formação dos
Comitês de Bacia Hidrográfica em Minas Gerais foi bem diversificado, na medida em
que existem Comitês originados das diretrizes do Comitê Estadual de Estudos
Integrados de Bacias Hidrográficas (CEEIBH), no início da década de 80 (como o
13
CBH Pará e CBH Verde), que denominados de ‘primeira fase’, ou seja, aqueles
criados por incentivo exclusivo do Estado; e os Comitês de ‘segunda fase’, formados
a partir de demandas de setores sociais das áreas das bacias. Atualmente, existem
35 Comitês legalmente instituídos e em funcionamento no estado, de um total de 36
previstos conforme as Unidades de Planejamento e Gestão de Recursos Hídricos.
Os mais recentes ainda se encontram em uma fase inicial de estruturação (somente
em 2009, dois novos comitês foram instituídos), e os mais antigos (os primeiros
foram instituídos em 1998) já possuem disponíveis os instrumentos de gestão da
bacia e são uma referencia em sua bacia.
14
O PROGRAMA DE FORTALECIMENTO EM GESTÃO E DESENVOLVIMENTO
INSTITUCIONAL DOS CBHS MINEIROS
O trabalho desenvolvido pelo CEMAIS junto aos CBHs mineiros envolve
um conjunto integrado de ações que tem como objetivo fortalecer institucionalmente
15 dos 35 Comitês de Bacias Hidrográficas do Estado de Minas Gerais para o
exercício de sua competência legal e fornecer instrumentos e ferramentas gerenciais
para que cumpram, de maneira mais efetiva, seu papel na política de gestão dos
recursos hídricos. O trabalho é realizado em aproximadamente 1600 horas, em um
período de 01 ano, beneficiando diretamente mais de 500 membros de Comitês de
Bacia Hidrográfica e indiretamente mais de 200 municípios mineiros localizados nas
bacias hidrográficas de jurisdição desses Comitês
Os produtos resultantes do trabalho realizado pelo CEMAIS são:
1. Análise da estrutura e organização dos Comitês
� Diagnóstico institucional dos 15 CBHs, contendo um mapeamento da
situação de 15 Comitês de Bacias Hidrográficas mineiros;
� Elaboração de Cartilha com orientações sobre diretrizes para um
bom Regimento Interno, elaboração de pautas e atas, condução de
reuniões, construção de propostas em processos participativos,
construção de um plano de ação estratégico e um plano de
comunicação.
2. Assessoria na elaboração e implementação de Planos de Ação
Estratégicos
� Definição das ações estratégicas dos Comitês, atendendo
expectativas Governo/Sociedade e realidade da Bacia;
� Desenvolvimento de procedimentos para facilitarem a
implementação e acompanhamento dos planos.
3. Assessoria na elaboração e implementação de Plano de Comunicação
� Mapeamento dos públicos estratégicos dos CBHs e definição de
estratégias e ações visando ao fortalecimento da articulação
interinstitucional dos Comitês (órgãos e entidades intervenientes
no SEGRH);
15
� Elaboração de procedimentos de comunicação com os públicos de
interesse para fortalecer a imagem institucional do Comitê
(governo/sociedade) e exercer suas funções de mobilização.
Entre as ações mencionadas e seus respectivos produtos destacamos,
neste artigo, a metodologia desenvolvida para a coleta e análise da organização e
estrutura dos CBHs, que consiste em uma pesquisa de diagnóstico organizacional
desses comitês, cujos objetivos são: a) Produzir um mapeamento detalhado da
situação de quinze Comitês de Bacias Hidrográficas mineiros; b) Analisar o estágio
atual de desenvolvimento desses Comitês; c) Oferecer subsídios para o
planejamento de ações, instrumentos e ferramentas gerenciais voltados ao
fortalecimento desses Comitês.
16
A METODOLOGIA DE DIAGNÓSTICO
A metodologia elaborada pelo CeMAIS consiste em uma ferramenta para
a avaliação das atividades dos Comitês, na qual se busca analisar, com base em
parâmetros objetivos, sua estrutura, funcionamento, gestão, comunicação e a
efetividade de sua atuação.
É importante destacar que a finalidade do Comitê expressa em
arcabouço legal norteia a verificação de sua atuação e efetividade, mas não é o
único parâmetro adotado, pois a atuação neste espaço plural requer um enfoque
mais amplo.
Assim sendo, e ao levar em consideração a forma de atuação dos
Comitês de Bacias Hidrográficas mineiros, a metodologia foi construída com base
em três técnicas de coleta de dados a saber:
� Documental, operacionalizado por meio da coleta e análise da
legislação federal e estadual de recursos hídricos, deliberações
normativas 04 e 30 do CERH-MG, regimento interno, ata, pauta e lista
de freqüência de reuniões dos Comitês, suas câmaras temáticas
(quando for o caso) etc.
� Entrevistas, operacionalizada por roteiros com questões fechadas e
abertas a serem feitas com os membros dos comitês previamente
selecionados.
� Aplicação de questionário composto por um conjunto de indicadores –
em formato de perguntas fechadas (e eventualmente abertas) – que ao
serem respondidos revelam o desempenho das atividades dos Comitês
e indicam as áreas a serem reforçadas para o alcance da maior
efetividade possível.
A avaliação sistemática de cada CBH possibilita o conhecimento mais
preciso do Estado sobre a atual realidade institucional desses Comitês, identificando
suas lacunas, fragilidades, necessidades e potencialidades, os constrangimentos e
limites à sua efetividade. O conhecimento apurado sobre essa realidade é essencial
para o desenvolvimento de ações alinhadas às necessidades organizacionais
dessas instâncias, com maior potencial para contribuir com o aumento da efetividade
de sua atuação.
17
O desenho da metodologia de diagnóstico dos Comitês teve início com as
reuniões entre a equipe do CEMAIS com os técnicos da SEMAD e do IGAM, quando
foram levantadas as expectativas e as percepções dos atores estatais em relação à
atuação dos CBHs e as limitações, êxitos e desafios dessas instâncias de
governança da água. Nessas reuniões foram solicitados pela equipe do CEMAIS,
relatórios e documentos de trabalhos já realizados pelo poder público estadual junto
aos Comitês.
Analisados e compilados os registros dessas reuniões, as principais
percepções do IGAM e SEMAD sobre quais seriam alguns dos limites à atuação
efetiva dos Comitês de Bacia foram: grande territorialidade da bacia; ausência de
Planos Diretores; ausência de cobrança pelo uso da água e de Agência de Bacia;
baixa capacidade técnica dos conselheiros para tratar dos assuntos pertinentes ao
SEGRH; pouco conhecimento do funcionamento do Comitê (membros desconhecem
o Regimento Interno); baixo conhecimento sobre a realidade da Bacia Hidrográfica;
pouca capacidade propositiva do Comitê; baixa qualidade dos debates (pauta das
reuniões); pouca capacidade de mobilização e articulação do CBH com a sociedade;
infra-estrutura deficiente; baixa motivação e participação/freqüência dos
conselheiros; desconhecimento do papel do Conselheiro; ausência de estratégias de
comunicação com públicos preferenciais (mobilização e articulação); falta de
planejamento; não cumprimento do Regimento Interno.
Essa era a visão do IGAM e da SEMAD sobre a realidade dos Comitês de
Bacias. Mas qual seria a visão daqueles que deles fazem parte? Era o que a equipe
do CEMAIS buscaria mais à frente.
Uma vez identificadas as percepções do IGAM e da SEMAD, foi realizado
um levantamento da legislação aplicável aos Comitês de Bacias Hidrográficas de
Minas Gerais e as deliberações normativas do Conselho Estadual de Recursos
Hídricos, que impactam diretamente na atuação dos CBHs, visto que estes possuem
relação de vinculação àquele.
Em seguida, com base na análise do arcabouço legal aplicável aos
Comitês mineiros e as citadas deliberações normativas do CERH, nos dados
coletados e analisados das reuniões junto à SEMAD e IGAM, em diversos estudos
sobre os desafios, a efetividade e a realidade dos Conselhos estaduais de políticas
no Brasil, na experiência do CEMAIS em atuar junto aos Conselhos estaduais
18
mineiros e em um material do Instituto Telemig Celular, aplicado no ano de 2001,
junto a 313 Conselhos Municipais de Direito das Crianças Adolescentes e 235
Conselhos Tutelares, a equipe do CEMAIS identificou 05 grandes temas que
embasariam o diagnóstico organizacional dos 15 CBHs mineiros: Histórico; Membros
do Comitê; Estrutura do Comitê; Gestão; Comunicação.
Com base nesses grandes temas, que foram consensuados e legitimados
junto à SEMAD e IGAM, foi construído um roteiro de entrevista que seria aplicado
junto a alguns membros de cada Comitê durante as primeiras visitas da equipe do
CEMAIS às reuniões ordinárias e extraordinárias dos CBHs no ano de 2009.
Em seguida foi elaborado um questionário, no qual esses grandes temas
foram desdobrados em diversas questões, abertas e fechadas, de forma a abarcar a
natureza e a complexidade dos CBHs mineiros, considerando-se, ainda, sua
heterogeneidade.
No tema I ‘Histórico’ foram elaboradas questões que contribui para o
entendimento dos períodos de criação e início de funcionamento dos Comitês. As
variáveis que compõem esse tema contemplam data de criação, instalação e
funcionamento dos CBHs e de sua divulgação.
No tema II ‘Membros do Comitê’ as questões buscam evidenciar a
pluralidade de perfis existentes no espaço do CBH. São investigados a experiência
prévia dos membros dos Comitês, o conhecimento dos membros do Comitê sobre o
seu funcionamento e sobre a política estadual de recursos hídricos, a qualificação e
as habilidades dos membros de cada CBH, dentre outras. Desta forma, busca-se
traçar minimamente os perfis dos membros que compõem cada CBH. A análise dos
perfis, quando realizada em conjunto com aspectos estruturais e de gestão, por
exemplo, ajudam, em parte, a explicar ou interpretar as causas ou circunstâncias
que constrangem ou limitam a efetividade da atuação dos Comitês.
No tema III ‘Estrutura do Comitê’ são analisados: a composição dos
CBHs (número e distribuição dos membros por segmento, e.g.); as condições de
infra-estrutura (física, material, tecnológica) de cada Comitê; e o grau de
registro/documentação das informações relevantes aos Comitês. Deste modo, ao
se perceber falhas ou possibilidades de melhorias nesta área, estes indicadores
podem servir para a avaliação das condições mínimas necessárias ao
funcionamento dos CBHs.
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No tema IV ‘Gestão’, são investigadas as formas e os estágios de gestão
dos Comitês. São avaliados aspectos como: o regimento interno, a abrangência de
seu conteúdo, os mecanismos previstos e normatizações, o seu grau de adequação
ao bom funcionamento dos CBHs, sua aplicação ou não no dia a dia de cada CBH e
a acessibilidade deste aos seus membros; a existência ou não e o grau de
formalização, complexidade e alcance do planejamento dos CBHs; como se dão os
processos de tomada de decisão nos Comitês e os processos de escolha dos seus
membros, incluindo presidente, vice-presidente e secretários; a existência ou não e
as atribuições das equipes de apoio administrativo; a existência, funcionamento,
composição e atuação das Câmaras Temáticas; a abrangência da atuação dos
Comitês e sua conformidade com suas atribuições previstas em lei; o controle sobre
os resultados de sua atuação.
No tema V ‘Comunicação’, a comunicação das atividades do Comitê com
a imprensa e com a sociedade é ressaltada. Também se aborda: a qualidade da
comunicação; a existência de mecanismos e veículos formais de comunicação com
seus diversos públicos; a gestão da informação e a intersetorialidade (o
planejamento estruturado de ações e comunicação com os três setores) são
aspectos tratados para completar a verificação da efetividade da comunicação de
cada Comitê. Deve-se destacar que a divulgação e a publicidade das ações dos
CBHs aos diversos públicos interessados, bem como seu relacionamento com eles,
são essenciais para o ganho ou aumento da legitimidade (reconhecimento e
aceitação) social e política dessas instâncias. Além disso, a comunicação é uma
importante ferramenta de mobilização, questão fundamental para os CBHs.
O questionário geral contempla cerca de 200 questões, divididas de forma
a serem aplicadas, separadamente, a três públicos distintos dos Comitês: diretoria
(presidente, vice-presidente, 1o Secretário e 2o Secretário), membros (titulares e
suplentes) e secretário(a) administrativo(a).
Cabe ressaltar que o questionário ainda está sendo aplicado junto aos
CBHs e que, por isso, seus dados ainda não poderão ser apresentados. Contudo,
como dito anteriormente, o CEMAIS realizou visitas a cada um dos 15 CBHs, nas
quais realizou entrevistas preliminares visando à obtenção de dados que
possibilitem o seu entendimento, ainda que parcial, sobre os limites e desafios
enfrentados por esses Comitês, para que assim desenvolva o trabalho de
fortalecimento e desenvolvimento desses espaços em consonância com sua
realidade. A seguir são apresentados os resultados preliminares da primeira etapa
do diagnóstico.
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RESULTADOS PRELIMINARES – ALGUMAS DIFICULDADES E DESAFIOS
ENFRENTADOS PELOS COMITÊS
Realizadas as primeiras visitas aos 15 Comitês de Bacias Hidrográficas
no ano de 2009 pela equipe do CEMAIS e, concomitantemente, as entrevistas, com
base no roteiro previamente definido, foram identificadas as percepções dos
membros dos 15 CBHs mineiros sobre a realidade do Comitê no qual atuava.
A seguir, são apresentadas algumas percepções sobre a realidade dos
CBHs mineiros de forma genérica, sem a identificação de problemas específicos
atinentes a um ou outro, de forma que seja possível fazer uma avaliação sobre os
desafios e limites enfrentados de forma mais ampla e abrangente e, assim, termos
um panorama geral sobre os Comitês de Bacias Hidrográficas de Minas Gerais.
Na opinião de parte significativa dos entrevistados é evidente o
despreparo dos membros dos Comitês para atuar na gestão compartilhada dos
recursos hídricos. Foi destacado que muitos possuem baixo conhecimento sobre a
legislação pertinente, desconhecendo até mesmo as principais atribuições dos
CBHs, os principais instrumentos de planejamento e gestão e desconhecem até
mesmo o regimento interno do Comitê no qual atuam.
Foi salientado por boa parte dos entrevistados que a forma da
composição dos comitês é boa para o funcionamento dos Comitês. Salientou-se que
a legislação estabelece que o número de órgãos do poder público estadual tem que
ser paritário com o poder público municipal, e a soma dos segmentos usuários e
sociedade civil têm que ser igual à soma dos poderes públicos, na composição dos
Comitês. Quanto à representatividade, os entrevistados foram unânimes
manifestando que ela não é exercida adequadamente.
Silva et al (2005) pontuam que uma das dificuldades encontradas nos
Sistemas de Gestão de Recursos Hídricos brasileiros é o exercício de
representatividade e recomendam especialmente, o fortalecimento da capacidade de
cooperação entre as estruturas sociais, promovendo assim o capital social e a
preparação dos membros dos Comitês para a participação qualificada.
Na opinião geral dos respondentes a renovação de representatividade é
muito baixa nos Comitês, o que gera a participação contínua das mesmas pessoas.
A baixa participação dos representantes do poder público estadual e municipal nos
CBHs também foi destacada pelos entrevistados, já que aqueles, na ótica dos
respondentes, são designados apenas para cumprir um ritual de formalização.
21
Contribuindo na discussão sobre a participação das mesmas pessoas
nesse processo, Cardoso (2003) enfatiza que os mesmos indivíduos acabam
participando de várias instancias coletivas, em função da dificuldade de formação de
novas lideranças para acompanhar o novo momento político de gestão participativa.
Um especialista exemplificou a Companhia de Saneamento de Minas
Gerais (COPASA-MG), entre outros órgãos, com o questionamento se esta deveria
representar o poder público estadual ou o segmento de usuários. Em relação a esse
exemplo, alguns especialistas destacaram que essa situação desequilibra as
decisões, especialmente no âmbito dos Comitês de Bacia. Nesse sentido Cardoso
(2003) comenta que a necessidade de representação da COPASA-MG
é unanimidade nos Comitês de Bacia e nos Conselhos, no entanto essa Companhia
tende a desempenhar um papel protagonista, mais como agente governamental que
como empresa usuária de água.
Uma opinião interessante surgida é que os Comitês de Bacia Hidrográfica
influenciam na política de gestão de recursos hídricos, porém não estabelecem
indicadores de desempenho. A falta de planejamento e controle sobre o resultado de
suas deliberações apareceu como fator preponderante para a baixa efetividade de
sua atuação.
Pelo fato do Comitê de Bacia Hidrográfica se traduzir no organismo de
debates, discussões e decisões dos stakeholders, distintas argumentações são
evidenciadas sobre aspectos de caráter operacional e representativo. Foram
levantadas percepções, sobre a falta de uma estrutura administrativa eficiente de
mobilização, das partes interessadas e as dificuldades de se conduzir um processo
participativo que envolva técnicos, representantes da comunidade, gestores
públicos, entre outros. A ausência de uma estrutura administrativa eficaz
compromete a divulgação de informações, de procedimentos de auditoria e de uma
política de comunicação com os demais stakeholders. No caso do processo
participativo de gestão, um dos entraves na escolha dos representantes da
comunidade nos Comitês refere-se às questões de natureza cultural (em função da
pouca prática de gestão participativa ainda no Brasil) e política (muitas vezes as
escolhas recaem sobre as mesmas pessoas).
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os Comitês de Bacias Hidrográficas, espaços públicos e democráticos de
exercício pleno de governança social possuem atribuições previstas em lei de
extrema relevância no que diz respeito à gestão integrada e sustentável dos
recursos hídricos na bacia hidrográfica de sua jurisdição. Entretanto, dadas a
complexidade da política de recursos hídricos e aas diversas limitações técnicas,
estruturais, de comunicação e de gestão que enfrentam, os CBHs têm se mostrado
pouco efetivos no exercício de seu papel. Isso, aliado à baixa (qualidade da)
participação dos seus membros, contribui para o agravamento desse quadro na
realidade mineira.
Este artigo apresentou o contexto de surgimento dos Comitês de Bacia
mineiros, suas atribuições, seus principais instrumentos previstos em lei, bem
como o trabalho que vem sendo desenvolvido pelo CEMAIS junto a quinze CBHs
do estado de Minas Gerais, em parceria com a Secretaria de Estado e
Desenvolvimento Sustentável (SEMAD/MG) visando fortalecê-los e desenvolvê-
los para o exercício efetivo de seu papel. Espera-se que com o programa de
fortalecimento em gestão e desenvolvimento institucional esses Comitês se
tornem mais capazes de gerir, de forma participativa e sustentável, os recursos
hídricos no estado.
23
REFERÊNCIAS
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25
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AUTORIA
Tiago Cacique Moraes – Mestre em administração pública e governo pela Fundação Getúlio Vargas de São Paulo e bacharel em administração pública pela mesma instituição. Centro Mineiro de Alianças Intersetoriais (CEMAIS). Endereço eletrônico: [email protected] Glauco Knopp – Mestre em Administração Pública pela Fundação Getulio Vargas (EBAPE/FGV) e bacharel em Administração pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM). Atua na docência superior, em cursos de graduação e pós-graduação. É autor de livros, capítulos e artigos acadêmico-científicos. Filiação Institucional: Centro Mineiro de Alianças Intersetoriais (CEMAIS). Endereço eletrônico: [email protected]