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IMPLICAÇÕES DA INCLUSÃO ESCOLAR DE ALUNOS COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL E TRANSTORNOS GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO NA PRÁTICA DOCENTE JOSELEINE DE CAMPOS GOMES SÃO PAULO 2014

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IMPLICAÇÕES DA INCLUSÃO ESCOLAR DE ALUNOS COM

DEFICIÊNCIA INTELECTUAL E TRANSTORNOS GLOBAIS

DO DESENVOLVIMENTO NA PRÁTICA DOCENTE

JOSELEINE DE CAMPOS GOMES

SÃO PAULO

2014

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JOSELEINE DE CAMPOS GOMES

IMPLICAÇÕES DA INCLUSÃO ESCOLAR DE ALUNOS COM

DEFICIÊNCIA INTELECTUAL E TRANSTORNOS GLOBAIS

DO DESENVOLVIMENTO NA PRÁTICA DOCENTE

Dissertação de mestrado apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Educação da Universidade Nove de Julho - UNINOVE, como registro parcial para a obtenção do grau de Mestre em Educação.

Prof. Paolo Nosella, Dr. - Orientador

SÃO PAULO

2014

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Gomes, Joseleine de Campos

Implicações da Inclusão Escolar de Alunos com Deficiência Intelectual e Transtornos Globais do Desenvolvimento na Prática Docente / Joseleine de Campos Gomes, 2014.

233 f.

Dissertação (Mestrado), Uninove, 2014.

Orientador: Prof. Dr. Paolo Nosella

1. Educação Inclusiva. 2.Deficiência Intelectual. 3.Prática Docente. 4. Formação de Professores. 5. Adaptações Curriculares

CDU 37

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JOSELEINE DE CAMPOS GOMES

IMPLICAÇÕES DA INCLUSÃO ESCOLAR DE ALUNOS COM

DEFICIÊNCIA INTELECTUAL E TRANSTORNOS GLOBAIS

DO DESENVOLVIMENTO NA PRÁTICA DOCENTE

Dissertação de mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Nove de Julho - UNINOVE, como registro parcial para a obtenção do grau de Mestre em Educação, pela Banca Examinadora formada por: Prof. Dr. Paolo Nosella, Prof. Dr. José Luís Vieira de Almeida e Prof.ª Dr.ª Lígia de Carvalho Abões Vercelli.

São Paulo, 04 de junho de 2014.

Presidente: Prof. Paolo Nosella, Dr. – Orientador, UNINOVE

Membro: Prof. José Luís Vieira de Almeida – Dr., UNESP

Membro: Prof.ª Lígia de Carvalho Abões Vercelli, Dr.ª, UNINOVE

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Dedico este trabalho a todos os professores

ousados que, frente às dificuldades do dia a

dia, inovam e renovam a sua prática

pedagógica sem medo de ser feliz…e de fazer

o outro mais feliz.

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AGRADECIMENTOS

Agradecer a Deus em primeiro lugar e sempre, porque para mim, sem

Ele nada faria sentido.

A meus pais amados, que me deram a vida e me ensinaram o valor de

servir ao próximo.

Ao meu esposo, Sérgio, pelas constantes palavras de admiração que

enchem meu coração.

Às minhas filhas, Marcela e Júlia, que me ensinam todos os dias o que é

amar incondicionalmente.

À Giselle, que, mais que uma irmã, acolhe-me nos momentos de

angústia com palavras sábias que redirecionam o meu caminhar.

Às minhas queridas amigas da Prefeitura: Silvéria, Érika, Márcia Leusa e

Lisbeth, amigas que partilham as dores e as conquistas de incluir nossos

“pequenos” na escola pública.

Aos meus queridos alunos especiais, tantos e tão diversos quanto são

as estrelas do céu.

À Secretaria de Educação de São Bernardo do Campo, em particular a

SE 115 - Seção de Educação Especial, por possibilitar as licenças e as

autorizações necessárias à realização desta pesquisa.

Ao Professor Orientador Dr. Paolo Nosella, agradeço pela dedicação e

respeito com que me orientou neste trabalho e por entender meus limites e

meu “romantismo” ao tratar da inclusão.

Às Professoras Dr.ªs Ester Buffa e Rosângela Prieto, que qualificaram o

trabalho com valiosas contribuições.

À Prof.ª Dr.ª Lígia Carvalho A. Vercelli, por me incentivar desde o

primeiro dia no Mestrado, trazendo-me para a realidade e a responsabilidade

de quem faz pesquisa com seriedade.

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Ao Prof. Dr. José Luís Vieira, que prontamente aceitou o convite para a

Banca de Defesa, reorganizando os seus compromissos acadêmicos distante

daqui, e que com tanta humildade se colocou à disposição para discutir o tema

inclusão.

A todos os professores do PPGE UNINOVE, pelo muito que aprendi nas

aulas do Mestrado, em especial ao Prof. Dr. José Eustáquio Romão, pelos

“chacoalhões” que me acordavam frente aos desafios e compromissos

assumidos com a pós-graduação.

Aos meus amigos de Mestrado, pela orientação horizontal (como nos

ensina Prof. Nosella no Seminário de Pesquisa), porque souberam partilhar

saberes, acolher frustrações e motivar conquistas. Lis Angelis, Alessandra,

Ideilini, vocês foram mais que companheiras nesta jornada.

Na certeza de que por mais que eu agradecesse, não conseguiria dar

conta de tantos quantos foram os apoios recebidos, as partilhas realizadas, e

para não correr o risco de ser injusta, deixo o meu eterno agradecimento a

todas as pessoas que direta ou indiretamente estiveram comigo nesta jornada

de estudo.

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RESUMO

Esta pesquisa teve como objetivo compreender como tem se realizado a

inclusão dos alunos com deficiência intelectual e transtornos globais do

desenvolvimento nas escolas regulares do Município de São Bernardo do

Campo e como essa inclusão tem implicado e comprometido o professor na

construção de novas práticas docentes na perspectiva de atendimento a todos

os alunos na sala de aula comum. A pesquisa de campo ocorreu com

professores da Educação Infantil e séries iniciais do Ensino Fundamental e os

seus respectivos professores da Educação Especial em cinco escolas da rede

pública municipal de São Bernardo do Campo. O critério de escolha para estas

entrevistas foi o “sucesso” nas práticas de inclusão com estes alunos no ano de

2013, o que neste trabalho chamamos de “boas práticas”. As entrevistas

realizadas pela pesquisadora com estes professores em forma de narrativas

destas experiências vivenciadas com a inclusão, foram analisadas

qualitativamente em busca de pontos comuns que pudessem indicar caminhos

para práticas inclusivas mais efetivas. Os resultados alcançados indicaram que

estes professores tem buscado informações sobre as dificuldades destes

alunos incluídos de forma mais autonôma, assim como tem buscado a parceria

com o professor da educação especial que tem contribuído com a reflexão e

transformação da prática do professor da sala de aula comum em benefício de

todos os alunos. Porém, estas ações são marcadas por iniciativas

individualizadas e não de toda a escola distanciando-se da construção de uma

cultura verdadeiramente inclusiva. Isto nos remete a uma preocupação de que

as mudanças em sala de aula por estarem ainda vinculadas exclusivamente à

oferta de atividades adaptadas a estes alunos não tem efetivamente nos

movido para uma mudança de paradigma, pois não tem se ocupado de

reestruturar o currículo escolar para todos os alunos. Neste sentido a pesquisa

aponta para necessidade de formação continuada e em serviço que seja

pautada em socialização de experiências, o que ainda não acontece de forma

efetiva nas escolas.

Palavras chave: Educação Inclusiva. Prática docente. Formação de

Professores. Deficiência Intelectual. Adaptações Curriculares.

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ABSTRACT

This research aimed to understand how the inclusion of students with

intellectual disabilities and pervasive developmental disorders in mainstream

schools in São Bernardo do Campo and how this inclusion has involved and

committed teacher in the construction of new teaching practices has been

completed with a view service to all students in the ordinary classroom. The

fieldwork took place with teachers from kindergarten and early elementary

school and their teachers of Special Education in five municipal public schools

of São Bernardo do Campo. The selection criteria for these interviews was the

"success" of inclusion practices with these students in the year 2013, this work

called "best practices." The interviews conducted by the researcher with these

teachers in the form of narratives of these experiences with inclusion, were

analyzed qualitatively in search of common ground that could indicate ways for

more effective inclusive practices. The results obtained indicated that these

teachers have sought information about the difficulties these students included

more autonomously, and has sought partnership with the teacher of special

education that has contributed to the reflection and transformation of teacher

practice from the common classroom for the benefit of all students. However,

these actions are marked by individual initiatives and not the whole school

moving away from the construction of a truly inclusive culture. This brings us to

a concern that the changes in the classroom because they are still linked

exclusively to the provision of activities tailored to these students has effectively

moved us to a paradigm shift, it has not occupied to restructure the curriculum

for all students. In this sense the research points to the need for continued

education and service that is grounded in socialization experiences, which does

not happen effectively in schools.

Keywords: Inclusive Education. Teaching practice. Teacher Training.

Intellectual Disabilities. Curricular adaptations.

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RESUMEN

La presente investigacion tuvo como objetivo comprender como se ha realizado

la inclusión de los alumnos con discapacidad intelectual y trastornos globales

del desarrollo en las escuelas regulares del Municipio de São Bernardo del

Campo y como esa inclusión ha implicado y comprometido al professores en la

construcción de nuevas prácticas docentes en la perspectiva de atendimento a

todos los alumnos en el salón de clase. El investigation de campo ocurrió con

profesores de la Educación Infantil y años iniciales de la Primaria y sus

respectivos profesores de la Educación Especial en cinco escuelas publicas de

São Bernardo del Campo. El criterio de la selección para estas entrevistas fue

el "éxito" en las prácticas de inclusión con estos alumnos en el año 2013, en lo

que en este trabajo llamamos "Buenas Prácticas". Las entrevistas realizadas

por la investigadora con estos profesores en forma de relatos de estos

experimentos vividos con la inclusión, fueron analisadas cualitativamente en

busca de puntos comunes que pudieran indicar caminos para prácticas

inclusivas más efectivas. Los resultados alcanzados indicarán que estos

profesores han buscado informaciones sobre las dificultades de estos alumnos

de forma más autónoma, así como han buscado la igualdad con el profesores

de la Educación Especial que ha contribuido con la reflexión y transformación

del profesor en el salón de clase en beneficio de todos los alumnos. Sin

embargo, estas acciones son marcadas por iniciativas individualistas y no de

toda la escuela distanciándose de la construcción de una cultura

verdaderamente inclusiva. Esto nos remete a una preocupación de los cambios

en el salón de clases pueden estar aun vinculadas exclusivamente a la oferta

de actividades adaptadas a estos alumnos. No nos han movido efectivamente

para hacer un cambio paradigma, pues no se han ocupado de restaurar el

currículo escolar para todos los alumnos. En este sentido el estudio señala la

necesidad de formación continua, y en servicio que sea pautada en la

socialización de experiencias, lo que aun no sucede de forma efectiva en las

escuelas.

Palabras Clave: Educación Inclusiva. Práctica docente. Formación de

Profesores. Discapacidad intelectual. Adaptaciones curriculares.

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A Educação se divide em duas partes:

a Educação das habilidades e a

Educação das sensibilidades.

Sem a educação das sensibilidades,

todas as habilidades são tolas e sem

sentido.

Rubem Alves

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ................................................................................................ 18

CONHECENDO A PESQUISADORA ............................................................. 18

CONHECENDO O TEMA ................................................................................ 22

CONHECENDO A PESQUISA ........................................................................ 25

REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ............................................................................ 29

1. INTERFACES DA INCLUSÃO DOS DEFICIENTES .................................. 42

1.1 MARCOS E MARCAS DEIXADAS NA HISTÓRIA DO DEFICIENTE -

DA TOTAL EXCLUSÃO PARA A INCLUSÃO TOTAL............................... 42

1.1.1 Idade Antiga - Paradigma da Exclusão Total ......................................... 44

1.1.2 Idade Média - Paradigma da Exclusão Parcial ....................................... 46

1.1.3 Idade Moderna - Paradigma da Inclusão Parcial .................................... 48

1.1.4 Contemporaneidade - Paradigma da Inclusão Total .............................. 52

2. NTERFACES DA PRÁTICA DOCENTE NA PERSPECTIVA

INCLUSIVA ..................................................................................................... 65

2.1 LÓCUS DA PRÁTICA DOCENTE: A ESCOLA COMO INSTITUIÇÃO

ESCOLAR ....................................................................................................... 65

2.2 PRÁXIS DOCENTE .................................................................................. 74

2.2.1 Implicações da formação na prática docente inclusiva ........................... 75

2.2.2 Implicações das adaptações curriculares na prática docente inclusiva.. 90

2.2.3 Implicações da construção de uma cultura colaborativa na prática

docente inclusiva ............................................................................................. 99

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3. PESQUISA DE CAMPO- METODOLOGIA E PROCEDIMENTOS DA

COLETA DE DADOS ..................................................................................... 112

3.1 O MUNICÍPIO DE SÃO BERNARDO DO CAMPO................................... 112

3.1.1 Caracterização do município e o contexto educacional ......................... 112

3.1.2 Histórico da Educação Esepcial em São Bernardo do Campo - Uma

História de mais de 50 anos ........................................................................... 118

3.2 PÚBLICO ALVO DA PESQUISA .............................................................. 124

3.3 METODOLOGIA E PROCEDIMENTOS DA PESQUISA......................... 125

3.3.1 O contexto das entrevistas .................................................................... 134

3.4 ANÁLISE QUALITATIVA DAS NARRATIVAS .......................................... 139

3.4.1 Index para a Inclusão: desenvolvimento à aprendizagem e à

participação nas escolas ................................................................................ 139

3.4.2 Análise dos contextos das entrevistas: as escolas ............................... 141

3.4.3 Análise das motivações de escolha dos professores das salas de

aula comuns pelos professores de AEE ......................................................... 144

3.4.4 Análise dos aspectos gerais dos professores entrevistados ................ 148

3.4.5 Análise das experiências dos professores entrevistados ..................... 150

CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................... 172

REFERÊNCIAS .............................................................................................. 182

APÊNDICES .................................................................................................. 198

APÊNDICE A - Roteiro para entrevista para os professores do ensino

regular. ........................................................................................................... 198

APÊNDICE B - Roteiro para entrevista para os professores do atendimento

educacional especializado.............................................................................. 198

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APÊNDICE C - entrevista com a professora C ............................................... 199

APÊNDICE D - entrevista com a professora S ............................................... 205

APÊNDICE E - entrevista com a professora D ............................................... 206

APÊNDICE F - entrevista com a professora S. .............................................. 208

APÊNDICE G - entrevista com a professora B ............................................... 208

APÊNDICE H - entrevista com a professora A ............................................... 212

APÊNDICE I - entrevista com a professora J. ................................................ 215

APÊNDICE J - entrevista com a professora E. ............................................... 220

APÊNDICE K - entrevista com a professora G. .............................................. 221

APÊNDICE L- entrevista com a professora M ................................................ 225

APÊNDICE M - entrevista com a professora F. ............................................. 227

APÊNDICE N - entrevista com a professora E ............................................... 229

APÊNDICE O - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para

Professores da sala comum. .......................................................................... 230

APÊNDICE P - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para

Professores do AEE ...................................................................................... 232

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABC - Santo André, São Bernardo e São Caetano

AEE - Atendimento Educacional Especializado

APAE - Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais

AS- Assistente Social

BEI - Biblioteca Escolar Interativa CAPES - Centro de Atendimento Psico Social

CDPD - Convenção sobre os direitos das Pessoas com deficiência

CENFORPE- Centro de Formação de Profissionais da Educação

CENPEC - Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação

Comunitária

CF - Constituição Federal Brasileira

CP - Coordenador Pedagógico

DI - Deficiência Intelectual EMEF - Escola Municipal de Ensino Fundamental

EMEI - Escola Municipal de Educação Infantil

FISIO - Fisioterapeuta

FONO - Fonoaudiólogo HTPC - Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo

LAB - Laboratório de Informática

LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação

MEC - Ministério da Educação e Cultura

MOBRAL - Movimento Brasileiro de Alfabetização

NEE - Necessidades Educacionais Especiais

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OP - Orientador Pedagógico PAD - Professor de Apoio à Direção

PCN - Parâmetros Curriculares Nacionais

PSICO - Psicológo

QI - Quoeficiente de Inteligência RCNEI - Referencial Curricular Nacional da Educação Infantil

SBC - São Bernardo do Campo

SECAD - Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade SECADI- Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e

Inclusão

SEESP - Secretaria de Educação Especial

TA - Tecnologia Assistiva

TGD - Transtorno Global do Desenvolvimento

TO - Terapeuta Ocupacional

UFRJ - Universidade Federal do Rio de Janeiro

UFSCAR - Universidade Federal de São Carlos

UFSM - Universidade federal de Santa Maria

UNICAMP - Universidade Estadual de Campinas

USP - Universidade de São Paulo

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LISTA DAS TABELAS E GRÁFICOS

Tabela 1 - Levantamento de teses e dissertações,publicações e grupos de

pesquisa sobre inclusão escolar do deficiente intelectual e com transtornos

globais do desenvolvimento na Educação Infantil e Ensino Fundamental

Tabela 2 - Número de matrículas na Educação Especial por Etapas de Ensino

Tabela 3 - Formas de ensino colaborativo na escola Tabela 4 - Número de matrículas nas escolas municipais em 2013

Tabela 5 - Número de alunos especiais matriculados nas escolas comuns em

2013 - Rede municipal de ensino de São Bernardo do Campo em 2013

Tabela 6 - Resumo das indicações dos professores de AEE para as entrevistas

com os professores das escolas regulares

Tabela 7- Relação de professores da classe comum entrevistados e sua

respectiva localização nos Apêndices

Gráfico A - Educação Especial - Número de matrículas na Educação Infantil Gráfico B - Educação Especial - Número de matrículas no Ensino

Fundamental

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INTRODUÇÃO

CONHECENDO A PESQUISADORA

No que diz respeito à Educação, em especial à escola, sempre fui precoce,

diz a minha mãe. Quis ir para a escola muito cedo, mesmo sem necessidade, pois

na minha época, só iam para a “escolinha” 1as crianças cujas mães trabalhavam fora

de casa, o que não era o meu caso.

Via pelo portão de casa as crianças maiores passarem com suas mochilas e

cadernos a caminho de suas escolas, e então, chorava e esperneava querendo

segui-los, até que venci. Fui para a “escolinha” perto de casa com mochila, caderno

e um grande sorriso no rosto. Meu pai dizia que esse meu desejo desenfreado era

como fogo na palha e logo apagaria, mas não foi bem assim, não parei mais.

Minha primeira frustração: a “escolinha” não era como eu pensava. Eu tinha

ido com um objetivo muito claro, aprender a ler e escrever, mas como eu tinha

apenas quatro anos de idade, e o propósito da escola era brincar, as minhas

expectativas foram frustradas. Eu não queria brincar, queria estudar, repetia para

quem quisesse ouvir. Chorava todos os dias na escola, não porque quisesse ir

embora para a minha casa, como era o mais comum, mas porque queria que a

professora me ensinasse as letras para eu escrever.

Tive sorte; minha primeira professora, a Sra. Gorette (a primeira professora a

gente nunca esquece), foi sensível ao meu pedido e, contrariando as ordens que

recebia da diretora, fez um combinado comigo: se eu esperasse as crianças

dormirem2, porque nessa hora eu chorava e atrapalhava o soninho dos colegas, ela

me ensinaria a escrever. Então, interessadamente, fingia dormir na mesa igual a

1 Termo utilizado no senso comum para designar as escolas que antecedem ao Ensino Fundamental, que só após a LDB 9394/96, passaram a ser designadas como escolas de Educação Infantil. Cabe esclarecer que até então, esses espaços não estavam vinculados à Educação e, em sua maioria, tinham por finalidade assistir as famílias que precisavam de um local para deixarem seus filhos enquanto trabalhavam, ou mesmo atender à necessidade de recreação das crianças pequenas enquanto não podiam ir para a escola. 2 Tínhamos o momento do soninho no meio da tarde; depois do lanche, cada um pegava o seu travesseirinho e deitava no colchonete para descansar do esforço de brincar, e todos dormiam, menos eu.

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todos eles, e quando percebia que podia ir ao encontro da professora com meus

pertences de escritora, ela me ensinava as letras. Assim fui alfabetizada.

Em meio a uma classe bastante homogênea, eu fui a diferente, a que

desafiou o professor a encontrar outros caminhos no atendimento às minhas

necessidades.

Avancei nos estudos, mudando de escola, e como me alfabetizei antes da

idade determinada para isso, quando fui para um colégio monstruosamente maior

que a escolinha da professora Gorette, na segunda série, estava uma série à frente

do que permitia a minha idade, e isso era um problema para o colégio, que não

permitia esse adiantamento; todos precisavam seguir na relação estabelecida entre

a idade e a série. Veio então a proposta da diretora para que eu repetisse a primeira

série, e assim, ficaria junto com aqueles da minha idade, e só depois, daria

sequência para a segunda série. Meus pais ficaram indignados com tal proposta de

injusta retenção e buscaram na Delegacia de Ensino3 amparo para a minha

continuidade, o que ocorreu por meio de uma publicação no Diário Oficial com o

veredicto sobre a minha vida escolar: deveria realizar uma prova avaliativa dos meus

conhecimentos para a série pleiteada pelos meus pais, e sendo aprovada, poderia

dar prosseguimento. Dei conta, segui em frente.

Conto esta história porque esses episódios marcaram o meu histórico escolar

e as minhas escolhas pela Educação, já que guardo lembranças ainda muito vivas

do quanto me senti observada e cobrada em minhas competências pelos outros e

por mim mesma. Não se tratava apenas da minha vida escolar, mas da construção

da minha personalidade.

Foi no Ensino Ginasial (hoje Fundamental II) que tive a oportunidade de

conhecer uma amiga de classe, a quem chamarei de Lígia, não por acaso, pois

ainda que realmente não seja esta a história de Lígia Assunção do Amaral, grande é

a identificação que tenho com os textos dessa autora, uma deficiente física que

muito escreveu sobre as suas vivências como deficiente.

3 O termo Delegacia de Ensino hoje foi alterado para Diretoria de Ensino, que é o órgão responsável

por planejar, coordenar, supervisionar e executar as atividades referentes ao Ensino Básico.

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Mas, voltando à minha amiga Lígia, ela era uma menina especial, tinha uma

limitação cognitiva e de linguagem que dificultava a sua interação com os colegas e

com a aprendizagem dos conteúdos dados pelo professor. Percebia que ela estava

sempre sozinha na classe, no recreio, e devo confessar que o meu primeiro

sentimento foi de dó, de pena, o que me levou a me aproximar dela. Na ingenuidade

da minha adolescência, eu me compreendia melhor do que ela, em melhores

condições, podendo ensiná-la. Doce ilusão a minha! Sei que muito lhe ensinei, mas

não tenho dúvida de que muito mais aprendi com ela. Aprendi a desejar o

conhecimento, aprendi a ser curiosa, a duvidar, a investigar; vejam só que ironia,

tantos professores tentam em vão incutir esse desejo em seus alunos.

À medida que me aproximava de Lígia, mais me sentia motivada a buscar

respostas para a sua deficiência. Perguntava aos pais dela, aos meus, aos

professores por que a Lígia era assim e o que poderíamos fazer por ela; mas o que

eu recebia de resposta era um sonoro „nasceu assim‟, „não há cura‟, „será sempre

assim‟, „não há o que fazer‟. Inconformada com essas respostas, selei meu destino:

decidi seguir carreira e buscar respostas para resolver o problema de tantas Lígias

espalhadas pelo mundo.

Mas, pouco informada e orientada em minha decisão, estive certa de que a

Medicina, mais precisamente a Psiquiatria, seria o caminho ideal nessa busca.

Tentei o vestibular a primeira vez, não passei. Agora sim, eu estava na idade/série

certa.

Fiz um ano de cursinho4, balanço geral dos conteúdos aprendidos, mas foi

também um ano de balanço de vida. Percebi, por intermédio de um professor

psiquiatra extremamente acolhedor às minhas angústias, que me equivocava com a

expectativa da Psiquiatria e que o que eu buscava não estava na Medicina, mas na

Psicologia. Concomitante a essa descoberta, uma outra descoberta se apresentou

na minha vida, a de que havia sido criado um curso de nível superior em Pedagogia

na Universidade Mackenzie, que tinha uma habilitação específica para a docência

para os alunos com deficiência mental, formando professores para dar aulas nas

escolas especiais. Interessei-me pela duas coisas e acabei fazendo as duas

graduações ao mesmo tempo.

4 Curso Preparatório para o Vestibular.

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Essa formação inicial me levou a trabalhar em algumas escolas especiais

particulares desde 1984, mas foi em 1991 que ingressei como professora de

Educação Especial na escola pública especial Rolando Ramacciotti, no Município de

São Bernardo do Campo. Nessa época, também estive à frente de uma “escolinha”

(igual à que me recebeu no início desta história) de Educação Infantil, que o tempo e

o bom trabalho desenvolvido se incumbiram de fazer crescer e se tornar um Colégio,

com atendimento aos níveis Infantil, Fundamental e Médio. Não dei conta, vendi a

escolinha em 2000 e optei por estar apenas na rede pública no meu cargo de

professora de Educação Especial.

Seguindo carreira em São Bernardo, para além da escola especial onde

iniciei, atuei como coordenadora do Centro de Apoio à Inclusão Escolar dos alunos

de 0 a 6 anos – Centro Municipal de Educação Especial e Estimulação Essencial

Ernesto Augusto Cleto, de 1998 a 2006. Descreverei com maior detalhamento esse

Centro na contextualização do município mais adiante.

Em 2006, fui convidada para ser Chefe da Educação Infantil na Secretaria de

Educação e Cultura do Município, onde permaneci até 2009. Essa experiência foi o

impulso de que precisava para retomar os estudos em nivel de pós-graduação, pois,

ao lidar cotidianamente com as necessidades da Educação, pude avaliar o quanto

as polítcas públicas são determinantes das práticas docentes e o quanto essas

políticas poderiam e deveriam ser determinadas por essas práticas. Percebia e me

angustiava com a vala que se abria entre o proposto enquanto política e a sua

aplicabilidade no ambiente escolar, e mais do que isso, o quanto o sucesso, ou não,

dessas políticas estava ligado ao envolvimento da equipe escolar. Ainda que

pensássemos em boas políticas públicas, em especial no âmbito da inclusão

escolar, estas foram e são sempre alvo de muitas críticas e queixas dos professores,

por que será?

Em 2009, entrei na pós-graduação lato sensu e, a partir de um Programa da

Universidade para formação de Docentes no Ensino Superior, fui contratada como

professora do Ensino Superior no curso de Pedagogia.

Em 2010, tentei a pós-graduação stricto sensu – Mestrado – pela primeira

vez, não consegui. Participei de algumas aulas como ouvinte na Universidade,

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entrando devagar no campo acadêmico do Mestrado, entendendo essa nova

linguagem que, para mim, em muitas ocasiões, mais parecia um dialeto.

Com muita coragem, inscrevi-me novamente em 2011 e me encontrei pela

primeira vez com dois doutores que marcariam esta história de forma definitiva, Prof.

Paolo Nosella e Prof.ª Ester Buffa.

Prof. Nosella, orientador desta pesquisa, imediatamente e sem muitos

rodeios, apresentou as minhas fragilidades na escrita acadêmica, porém foi

generoso e me deu a oportunidade de defender o tema e a pesquisa que pretendia

desenvolver. Deu certo, estou aqui, escrevendo a dissertação do Mestrado. Que

experiência tem sido o exercício da pesquisa no Mestrado!

Ao escrever sobre este processo, lembrei-me do que li certa vez (não me

recordo da autoria) e que faz todo sentido agora: o ofício de lavadeira de rio implica

lavar intensamente a roupa, esfregar com vontade e força, depois, deixar descansar

por algum tempo, ciente de que o tecido precisa se acomodar com os esfregões

recebidos, e curtir essa limpeza, para somente depois, bater nas pedras a roupa,

agora mais limpa, mas que ainda precisa ser transformada em sua sujeira, e pausar

de novo, e assim sucessivamente, quantas vezes forem necessárias, até que esta

se encontre verdadeiramente limpa. Este tem sido o meu movimento de

pesquisadora.

CONHECENDO O TEMA

Nesta pesquisa, dois temas são desafiadores para a Educação: a inclusão

escolar e a prática docente, que, na perspectiva em que se apresentam, mais que

complementares, podem ser considerados interdependentes.

As pesquisas sobre inclusão escolar apontam para a necessidade de uma

reflexão aprofundada quanto à qualidade das ofertas, valores e atitudes que

permeiam esse tema, desde a formação inicial e continuada até a aplicação dos

conteúdos formativos no cotidiano escolar.

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As exigências que se apresentam para que essa transposição se efetive de

fato na escola são da ordem dialógica em busca de ações interdisciplinares,

articulando saberes de especialistas, pais, gestores e professores, na garantia da

aprendizagem e na melhoria da qualidade do ensino para todos os alunos.

A escolha da palavra „implicações‟ neste trabalho está relacionada à ideia de

envolvimento, de comprometimento com alguma coisa; neste caso, com a inclusão

escolar, o que nos levou a refletir sobre a implicação, o envolvimento daquele que,

como entendemos, é protagonista no processo inclusivo - o professor -, que pode

nos oferecer pistas de como a sua prática tem sido construída em uma perspectiva

inclusiva para o atendimento de todos os alunos na escola.

A década de 90 foi marcada por diferentes movimentos em prol da Educação

para Todos, que como reflexo têm gerado nova legislação e diretrizes para a

inclusão dos alunos com deficiências, transtornos globais do desenvolvimento (TGD)

e superdotação/altas habilidades nas escolas regulares.

Temos observado que o advento da inclusão dos alunos com deficiências e

transtornos globais do desenvolvimento na escola tem mobilizado muitas ações,

sejam estas em nível macrossistêmico, como as políticas públicas, sejam em nível

mesossistêmico, como as ações desenvolvidas pelas escolas, ou ainda em nível

microssistêmico, como as iniciativas desenvolvidas pelos professores de forma

individual ou coletiva.

A inclusão escolar, além do impacto inicial que causou e ainda causa nos

professores da escola regular, encontrou em alguns motivação para a ação, para a

mobilização, para a busca de alternativas, de estudo e de transformação de práticas;

já em outros, trouxe motivação para a falta de ação, para a paralisação, inércia,

espera de uma solução e talvez até mesmo de uma prescrição encaminhada por

outros, autorizados pela especialização que carregam em seu processo formativo. É

assim que tem se dado o advento da inclusão nas escolas regulares, num

movimento dialético de inércia e movimentação.

A Conferência Mundial de Educação para Todos (1990), em Jomtien, na

Tailândia, seguida pela Declaração de Salamanca, em 1994, trouxe a necessidade

de discussões no âmbito da formação de professores, considerando que em seu

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texto, de forma implícita, relaciona a inclusão social com consequência a inclusão

escolar, daí a importância de focar no professor como agente nesse processo.

Nessa perspectiva, a LDB 9394/96 preconiza a formação de dois professores

para atuar com os alunos com necessidades educacionais especiais: o professor da

classe comum e o professor da Educação Especial, que devem atuar como

parceiros no processo inclusivo nas escolas. Ao primeiro cabe a capacitação para

perceber as necessidades educacionais especiais e possibilidades de flexibilizar a

sua ação pedagógica. Já o segundo, conforme indica a Política Nacional de

Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva (2008), deve ser

capacitado para identificar as necessidades educacionais especiais, definir e

implementar respostas educativas através do apoio ao professor da sala comum.

A partir desses indicativos, alguns autores têm se dedicado a pesquisar sobre

como essa parceria que tem ocorrido nas escolas regulares regidas por princípios

inclusivos, de onde destacamos as pesquisas realizadas por Capelini (2004; 2007),

Mendes (2006; 2012), que vêm apontando para a construção de uma prática de

envolvimento e comprometimento dos sujeitos agentes na medida em que estes

possam enxergar a si próprios e aos outros como solucionadores de questões

coletivas advindas do cotidiano. Esse movimento é o que os leva a mover

conhecimentos, competências e práticas em um constante processo de reflexão e de

transformação pessoal e profissional.

Interessa-nos neste trabalho conhecer o quanto a inclusão pode ser esse

disparador de movimento que impacta o professor no sentido de impulsioná-lo para

buscar novos caminhos e novas práticas pedagógicas, e também sabedores que

esse não é um caminho para ser trilhado sozinho, então, conhecermos como e onde

esses professores têm buscado suas parcerias e seus apoios na escola.

Partindo do senso comum, para muitos, a inclusão dos alunos com deficiência

na escola regular tende a atrapalhar a aprendizagem dos alunos sem deficiência,

pois há necessidade de que a professora dê maior atenção ao aluno com deficiência

e utilize recursos específicos no atendimento desse aluno, diminuindo o seu tempo

para organização das estratégias de ensino e envolvimento com toda a classe.

Outros, contrários a isso, apresentam argumentos que sustentam a ideia de que

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todos ganham na educação inclusiva, não apenas os alunos que são incluídos, mas

também aqueles que os incluem.

A hipótese que temos sobre o tema é a de que a inclusão escolar pode se

tornar um potente mecanismo na melhoria da qualidade de ensino para todos os

alunos, pois, na medida em que exige que o professor reflita sobre as condições de

ensino e aprendizagem para o aluno com deficiência, poderá apontar para novos

caminhos e estratégias de ensino que instiguem a sua arte e criatividade em ações

inovadoras de ensino, que favoreçam a todos os alunos, havendo, de fato, uma

mudança de concepção do processo de ensino e aprendizagem e de prática

docente.

Longe de fazermos um discurso politicamente inclusivista, com respaldo

apenas nas questões legais ou de garantia de direitos, defendendo ou condenando

a inclusão da totalidade dos alunos com deficiência nas escolas regulares,

queremos manter como pano de fundo nesta pesquisa o princípio de que a produção

de conhecimentos para um ensino de melhor qualidade e para todos os alunos não

se dá apenas nas Universidades, mas, como afirma Zeichner (1993), tem daqueles

que constroem a experiência escolar cotidiana uma grande contribuição. Faz-se

necessário, portanto, buscar propostas metodológicas de pesquisa que possibilitem

criar condições de reflexividade crítica individuais e coletivas das práticas docentes,

que são transformadas pelos pequenos e grandes desafios propostos pela inclusão

do aluno com deficiência e com transtornos globais do desenvolvimento.5

CONHECENDO A PESQUISA

Esta pesquisa teve como ponto de partida os questionamentos que travamos

em torno da inclusão escolar nos últimos anos, mediante as observações das

práticas dos professores com alunos com deficiência intelectual e transtornos globais

do desenvolvimento incluídos nas salas de aula comuns na rede de ensino municipal

5 Ainda que a Política Nacional da Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva (2008), produzida pelo MEC/SEESP enquanto orientação das ações da Educação Especial na Educação Inclusiva, aponte para o público alvo das ações no atendimento educacional especializado (AEE) nas escolas regulares os alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação, para esta dissertação estaremos focando particularmente a deficiência intelectual e os transtornos globais do desenvolvimento.

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de São Bernardo do Campo. Essas observações nos têm sugerido que, frente aos

desafios que se apresentam aos professores das salas comuns ao receberem esses

alunos, há diferentes caminhos traçados por esses professores, que, sendo

particularmente vivenciados, possibilitam a reflexão sobre a sua própria prática

pedagógica e a busca de alternativas para o melhor atendimento e aprendizagem

desses alunos na escola regular.

Frente à observação dessas diferentes experiências, perguntamo-nos: O que

move ou não esses professores a buscarem alternativas para o ensino desses

alunos “tão diferentes”, e de que forma esses professores têm encontrado boas

possibilidades de trabalho nesse processo, a ponto até mesmo de ser a própria

inclusão uma alavanca na formação continuada desses professores no caminho de

contribuir efetivamente para a melhoria da qualidade do ensino para todos os

alunos? Como o professor da classe regular tem buscado apoio nesse processo

inclusivo? Quais são as prioridades formativas dos professores de salas comuns no

que diz respeito à inclusão escolar? Como os professores da Educação Especial têm

contribuído nesse processo? Que transformações têm ocorrido na prática do

professor em sala de aula comum a partir da inclusão do aluno com deficiência

intelectual e transtornos globais do desenvolvimento na rede municipal de São

Bernardo do Campo?

Muito temos ouvido os professores maldizerem a inclusão escolar dos alunos

com deficiência na escola regular, queixando-se da falta de formação, da falta de

apoio na escola e até mesmo de dúvidas quanto à inclusão ser a melhor opção para

os alunos com deficiência, considerando especialmente aqueles com maior

severidade em suas limitações, porém, ainda que constatemos que esses

questionamentos tenham lugar no contexto em que se apresenta a inclusão na

realidade atual, para além desse discurso paralisante e pessimista de alguns há

professores que têm encontrado caminhos para favorecer os avanços desses alunos

nas salas de aula comuns a partir do investimento em novas práticas e são

exatamente estas p´raticas que nos interessam estudar neste trabalho.

Nossa curiosidade está em encontrar caraterísticas comuns nesses

professores e em suas ações, bem como em compreender de que forma esse

processo inclusivo, que tem sido vivenciado por esses professores, pode ser

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considerado também um processo de formação continuada, já que está pautado

necessariamente na prática reflexiva, que contribui para o desenvolvimento de uma

postura crítico-reflexiva e para a inovação das práticas pedagógicas, no sentido do

que nos orienta Alarcão (2003) quando afirma que a noção de professor reflexivo

está baseada na consciência da capacidade de pensar e refletir sobre ideias e

práticas externas a si próprio, o que nos leva a crer que pensar no professor

reflexivo implica considerar que frente aos diferentes contextos profissionais, muitas

vezes incertos e imprevisíveis, como é o contexto da inclusão escolar, o professor

possa atuar de forma sensível, inteligente, flexível e contextualizada, produto da

aplicação da ciência, técnica e arte características do ato de ensinar.

Tendo como objeto de estudo a prática docente frente ao processo de

inclusão escolar dos alunos com deficiência intelectual e/ou transtornos globais do

desenvolvimento, o universo da pesquisa de campo foi composto pelos

protagonistas desse processo - professores da Educação Infantil e séries iniciais do

ensino fundamental - que receberam alunos com deficiência em suas salas de aula

da rede municipal de São Bernardo do Campo, município vizinho da metrópole de

São Paulo, no ano de 2013. Foram realizadas entrevistas com seis professores das

salas comuns com alunos com deficiência intelectual e/ou transtornos globais do

desenvolvimento, e com os respectivos professores da Educação Especial que

atuam no atendimento educacional especializado (AEE) em parceria com os

professores nas salas comuns. A sistematização e análise dos dados dessas

entrevistas foram realizadas com base nas narrativas trazidas pelos professores e

na busca de pontos comuns que orientaram a análise qualitativa.

A partir da revisão de literatura sobre a inclusão escolar e a prática docente,

realizamos um breve levantamento de produções acadêmicas que ofereceram um

panorama da relevância do tema para a Educação e muito contribuíram para a

definição do referencial téorico, bem como da metodologia de pesquisa a ser

utilizada. Com relação ao referencial téorico sobre inclusão escolar, optamos pela

utilização dos conceitos e ideias trabalhadas por Mantoan (1993;2001;2005),

Carvalho (2000;2005), Aiscow e Booth (2000), Prieto (2003), Mendes(2006:2012),

Bueno (1997), Ferreira (1994). Já com relação à prática docente, utilizamos como

base teórica os conceitos e ideias de Alarcão (2000;2003), Nóvoa (1992;1995;2000),

Tardif (1991;2002), Ferraço (2005) .

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Enfocar a prática docente nos leva inevitavelmente a considerarmos nesta

dissertação os aspectos voltados para a formação docente como instrumento

fundamental de mudança dessa prática pedagógica. Também ao enfocarmos a

inclusão, precisamos conceituar a escola enquanto uma instituição social e suas

implicações com as diferenças e, portanto, tratar do tema diversidade. Estes são

temas que nos remetem a lançar mão da dialética em nossas reflexões, pois não

estamos em busca de uma receita de como fazer inclusão na escola, de algo

definitivo, prescritivo, mas essencialmente de analisar as relações que podem ser

estabelecidas entre a inclusão dos alunos com deficiência intelectual e/ou

transtornos globais do desenvolvimento e as práticas docentes, incluindo nestas as

muitas funções que se estabelecem na atualidade para a educação escolar e,

consequentemente, para os professores no contexto de São Bernardo do Campo.

Levando-se em consideração que a pesquisadora é professora de AEE em

São Bernardo do Campo, foi opção da mesma não elencar professores que

estivessem diretamente relacionados às ações desenvolvidas na parceria realizada

por esta professora em ações colaborativas.

A dissertação está organizada em capítulos que buscam aprofundar os

conceitos teóricos e históricos sobre a Inclusão Escolar e a Prática Docente,

intencionalmente distribuídos nos dois primeiros capítulos para um melhor

entendimento do que se apresenta. Obviamente essa divisão é didática e não

corresponde à realidade prática, pois tratar de prática docente no contexto atual

envolve necessariamente tratar das questões pertinentes à inclusão escolar e vice-

versa.

No primeiro capítulo, Interfaces da Inclusão Escolar, apresentamos um breve

histórico dos marcos e das marcas relacionadas ao conceito de deficiência no que

envolve tanto as concepções quanto as crises dessas concepções, que

impulsionaram a mudança de paradigmas e, consequentemente, a legislação

educacional, até chegarmos ao momento atual e às novas perspectivas que se

apresentam para a educação dos deficientes na escola comum.

No segundo capítulo, Interfaces da Prática Docente, apresentamos alguns

conceitos que envolvem a prática docente, como o currículo e a formação e a cultura

colaborativa, sendo estes a base para o desenvolvimento de uma práxis que tem

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como cenário a escola, e como fundamento, a relação entre alunos e professores no

processo de ensino e aprendizagem.

No terceiro capítulo, apresentamos a pesquisa de campo com os

procedimentos e metodologia utilizados, bem como os resultados e a análise

qualitativa a partir dos pontos elencados como significativos nas narrativas

apresentadas pelos professores entrevistados.

Não temos a intenção de encerrar as nossas reflexões com as Considerações

Finais; pelo contrário, buscamos com estas incentivar o leitor ao aprofundamento

das questões que envolvem a inclusão escolar e a transformação das práticas

docentes, tema que é deliciosamente inquietante.

REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

Partimos do princípio de que o processo de construção da dissertação de

Mestrado enquanto um processo de investigação deve ter a sua partida na revisão

bibliográfica, também conhecida por muitos como revisão de literatura.

Assim, a revisão bibliográfica foi parte vital do processo de construção desta

dissertação. Ao considerarmos o tema proposto e as muitas possibildades e

desdobramentos dados pela amplitude do mesmo, sentimos necessidade de tomar

algumas decisões sobre qual seria o melhor recorte do tema para a pesquisa, qual

metodologia de pesquisa seria a mais adequada, na tentativa de alcançarmos os

melhores resultados possíveis em nossa pesquisa, otimizando o escasso tempo que

nos é reservado para essa tarefa.

A revisão bibliográfica foi um instrumento extremamente importante para nos

situar no que já foi construído referente a este objeto de estudo, sobre os caminhos

percorridos anteriormente pelos pesquisadores que nos antecederam e, sobretudo

sobre os resultados alcançados com as pesquisas finalizadas ou em andamento, de

forma a corrermos menor risco de cair na armadilha de “reinventar a roda”.6

6 A expressão reinventar a roda é utilizada comumente como uma frase que significa que uma técnica ou solução aceita na generalidade é ignorada a favor de uma solução ou técnica

inventada localmente apenas para um propósito específico.

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Rever a bibliografia envolveu, portanto, localizar, analisar, sintetizar e interpretar

a investigação de outros por meio de teses e dissertações que se relacionam com a

área de estudo, o que nos levou à leitura de todo o material para posteriormente

analisá-lo pormenorizadamente. Tomamos neste levantamento de dados

bibliográficos dois cuidados indicados por Carmo e Ferreira (1980): o cuidado com a

gula livresca ou estatística, que pode nos fazer afogar nas informações levantadas,

e o cuidado com o desprezo pela recomendação de ter prévia concepção de

hipóteses e/ou de questões-bússola que funcionem como orientadores da pesquisa,

o que favorece a utilização de tempo e aumenta a previsibilidade dos resultados.

Seguindo a orientação de Cardoso et al. (2010, p.7), de que “(...) cada

investigador analisa minuciosamente os trabalhos dos investigadores que o

precederam e, só então, compreendido o testemunho que lhe foi confiado, parte

equipado para a sua própria aventura”, nossa pesquisa bibliográfica foi o ponto de

partida para novas reflexões sobre o assunto e recurso de apoio nas

fundamentações teóricas a serem adotadas e ressignificadas nesta pesquisa.

Iniciando, portanto, o processo de revisão bibliográfica, surgiu a primeira crise

relacionada com a delimitação da palavra-chave para a pesquisa na rede

acadêmica, considerando a diversidade de termos e expressões que se relacionam

com inclusão escolar, havendo necessidade de delimitar, sem considerarmos ainda

que há diversas fontes possíveis de serem pesquisadas com este tema.

Na busca de superarmos esta primeira crise, estabelecemos critérios de

seleção para a inclusão ou exclusão de pesquisas que pudessem nos interessar

neste estudo mais aprofundado.

Com esse propósito, delimitamos que os aspectos norteadores de inclusão e

exclusão em nossa revisão bibliográfica seriam apenas as teses de doutorado e

dissertações de mestrado que contivessem a expressão ou expressões relativas à

inclusão escolar no título do trabalho ou como indicação de palavras-chave.

Também foi necessário delimitarmos o período de produção desse material, e

optamos por este ser de 2008 a 2012. Decidimos por este recorte temporal,

considerando que é a partir de 2008 que há a implantação pelo Ministério da

Educação e Cultura (MEC) da nova Política da Educação Especial na perspectiva da

Educação Inclusiva, que estabelece as diretrizes para o atendimento do aluno

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incluído na escola regular, bem como define o público alvo para esse atendimento

educacional especializado.

Também indicamos como critério de inclusão em nossa revisão bibliográfica

apenas as produções desenvolvidas no Departamento de Educação, estando

automaticamente excluídas todas aquelas que foram desenvolvidas em outros

departamentos, como Arquitetura e Urbanismo, Psicologia, Medicina, etc.

Ainda que entendamos que já caminhamos na direção da compreensão de

que a educação inclusiva se refere à educação de todos e, portanto, à inclusão da

diversidade a partir do deslocamento do olhar para os grupos em situação de

vulnerabilidade social, da luta contra a discriminação, da segregação e todas as

formas de exclusão, com enfrentamento nas discussões, como: homofobia, racismo,

acessibilidade, questões da juventude, direitos humanos, gênero e diversidade

sexual, além das lutas de diferentes grupos sociais pela educação intercultural de

indígenas, quilombolas, educação do campo, educação de jovens e adultos,

educação no sistema prisional e, portanto, muito maior do que a inclusão de alunos

com deficiência, para esta pesquisa optamos por considerar as produções que se

relacionam exclusivamente à inclusão de alunos com deficiência intelectual e

transtornos globais do desenvolvimento no ambiente escolar, levando em

consideração as condições temporais que nos são estabelecidas para este trabalho.

Dessa forma, todas as produções acadêmicas que foram desenvolvidas tendo

como foco as deficiências visual, auditiva e física foram descartadas neste momento,

assim como aquelas que tiveram como foco a inclusão de indígenas, quilombolas,

mulheres e outras diversidades.

Apesar de muito já ter sido construído nessa perspectiva de Educação para

Todos no que diz respeito à inclusão escolar, cabe esclarecer que esse processo de

compreensão da amplitude do termo inclusão escolar para além das deficiências e,

portanto, como sinônimo de diversidade na escola, vem provocando a necessidade

de grandes reorganizações e redimensionamentos nas políticas públicas, pois uma

longa estrada ainda temos a percorrer para que efetivamente na prática a legislação

esteja incorporada na realidade escolar.

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O órgão responsável pela implantação e acompanhamento das políticas

públicas na Educação – Ministério da Educação e Cultura – tem atuado a esse

respeito, reformulando inclusive as Secretarias responsáveis por essa atuação no

âmbito da Educação.

Assim, buscando adequar a sua organização aos princípios impostos pela

perspectiva da educação inclusiva, em 2011, o MEC extinguiu a Secretaria de

Educação Especial (SEESP) e reformulou a atuação do SECAD7 (Secretaria de

Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade) em SECADI (Secretaria de

Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão), incorporando a

inclusão nas ações desenvolvidas na Educação Especial ligadas mais

particularmente às deficiências, como nos define o próprio MEC na apresentação

desta Secretaria em seu portal eletrônico:

A Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI) em articulação com os sistemas de ensino implementa políticas educacionais nas áreas de alfabetização e educação de jovens e adultos, educação ambiental, educação em direitos humanos, educação especial, do campo, escolar indígena, quilombola e educação para as relações étnico-raciais. O objetivo da SECADI é contribuir para o desenvolvimento inclusivo dos sistemas de ensino, voltado à valorização das diferenças e da diversidade, à promoção da educação inclusiva, dos direitos humanos e da sustentabilidade socio-ambiental visando à

efetivação de políticas públicas transversais e interssetoriais.

André Lazaro, secretário da SECAD em 2007, em entrevista dada ao

CENPEC - Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação

Comunitária - divide sua preocupação com esse tema quando nos apresenta:

O que me parece original - e eu espero que não se perca na formulação da política educacional - é trazer a tensão para dentro da estrutura do Estado (...) A SECAD precisava criar condições políticas e institucionais para que a política universal de educação pudesse, de fato, atender a todos. Mas só se alavanca a equidade considerando as dimensões da diversidade. (CENPEC, 2012, p. 134)

7 SECAD teve sua origem na necessidade de estreitar o diálogo com o movimento social a partir da

criação de uma secretaria de políticas focalizadas, inclusive de forma a oferecer a esse movimento

lugar dentro do Ministério da Educação.

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Cabe ainda esclarecer que em alguns trabalhos, encontramos expressões

como deficiência mental no lugar de deficiência intelectual, e ainda como autismo no

lugar de transtornos globais do desenvolvimento. Isto se deve, especialmente,

porque as mudanças nessas nomenclaturas se deram de forma mais eficaz a partir

de 2008, com o documento publicado pelo MEC que define o público alvo do

atendimento educacional especializado na escola regular.

A mudança de terminologia de deficiente mental para deficiente intelectual parece ser uma estratégia que visa garantir que todos os alunos sejam bem atendidos na escola. Para tanto, é importante investigar como os professores que lidam diretamente com este alunado percebem esta mudança de nomenclatura, bem como verificar se ela tem consequências na prática educativa destes profissionais em sala de aula. (MENDES; VELTRONE, 2012, p.364)

Considerar essa nova terminologia mais do que a alteração da expressão traz

a necessidade de alteração na postura que se adota para o trabalho de

acompanhamento desse aluno, ou seja, precisamos nos distanciar de uma

perspectiva médica pautada em laudos, diagnósticos, que tem como foco o aluno e

suas limitações, para uma perspectiva pedagógica, que inter-relacione o déficit do

aluno ao contexto em que está inserido.

Sobre essa questão, Mendes; Veltrone (2012, p. 364) reforçam que “esta

proposta de mudança de nomenclatura parece ter a intenção de tornar menos

pejorativo, além de considerar a influência do contexto social e cultural imediato na

definição da condição da deficiência intelectual.”

A mesma questão ocorre com relação à terminologia de transtornos globais

do desenvolvimento, que também precisa ser esclarecida, pois encontramos

trabalhos que utilizam a terminologia autismo como sinônimo de transtornos globais

do desenvolvimento. Indicamos que nesta pesquisa, adotaremos como referência

terminológica o estabelecido como público alvo do Atendimento Educacional

Especializado (AEE) pelo MEC, portanto, transtornos globais do desenvolvimento,

que incluem, entre outras formas de manifestação de transtornos, o autismo.

Nas orientações encaminhadas pelo MEC (2010) sobre o AEE no que se

refere aos transtornos globais do desenvolvimento, há esclarecimentos de que até a

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década de 60 o autismo foi considerado um transtorno emocional, sob forte

influência da hipótese de que as mães dessas crianças eram incapazes de oferecer

o afeto necessário aos seus filhos, tornando-os autistas. Sem qualquer respaldo

empírico, essa afirmação gerou grandes problemas à sociedade, impulsionando

cientistas a desenvolverem pesquisas empíricas mais rigorosas e controladas, o que

ocorreu nas próximas décadas, quando o autismo passou a ser estudado enquanto

um transtorno do desenvolvimento.

Essas pesquisas levaram à hipótese da existência de alteração cognitiva que

explicaria as caraterísticas de comunicação, linguagem, interação social e

pensamento presentes no autismo, retirando da categoria de psicose infantil para

ser entendido como um Transtorno Global (ou Invasivo) do Desenvolvimento (TGD).

O MEC, ao definir como público alvo do AEE o TGD, aponta para uma

inovação com relação a esses alunos, pois trata da necessidade de se

compreenderem as funções envolvidas nesse desenvolvimento, sob a perspectiva

não apenas de uma abordagem clínica, mas também educacional, como prescreve o

material orientador sobre o AEE para o TGD:

O autismo é explicado e descrito como um conjunto de transtornos qualitativos de funções envolvidas no desenvolvimento humano. Esse modelo explicativo permitiu que o autismo não fosse mais classificado como psicose infantil, termo que acarretava um estigma para as famílias e para as próprias crianças com autismo. Além disso, o modelo permite uma compreensão adequada de outras manifestações de transtornos dessas funções do desenvolvimento que, embora apresentem semelhanças, constituem quadros diagnósticos diferentes. (BRASIL, 2010, p.12)

Assim, cabe-nos considerar que o Transtorno Global do Desenvolvimento não

diz respeito apenas ao autismo, mas descreve diferentes transtornos que têm em

comum as funções de desenvolvimento afetadas qualitativamente.

Ainda considerando as questões de terminologia, não podemos deixar de

apontar que, ao pesquisarmos inclusão escolar, observamos a incidência de

expressões como necessidades educacionais especiais (NEE) para também

designarem a população com deficiência intelectual ou transtornos globais do

desenvolvimento, já que essa foi uma expressão emblemática na Declaração de

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Salamanca (1994), que alavancou as discussões na direção de novas politicas

públicas relacionadas à inclusão escolar. Ainda que essa Declaração buscasse

tratar da inclusão de todos nas escolas regulares, a repercussão maior acabou

sendo para a inclusão dos deficientes, especialmente no Brasil. O princípio

orientador do enquadramento de ações direcionadas pela Declaração de Salamanca

consiste:

em afirmar que as escolas se devem ajustar a todas as crianças, independentemente das suas condições físicas, sociais, linguísticas ou outras. Neste conceito, terão de incluir-se crianças com deficiência ou sobredotados, crianças da rua ou crianças que trabalham, crianças de populações remotas ou nómadas, crianças de minorias linguísticas, étnicas ou culturais e crianças de áreas ou grupos desfavorecidos ou marginais. Estas condições colocam uma série de diferentes desafios aos sistemas escolares. No contexto deste Enquadramento da Acção, a expressão "necessidades educativas especiais" refere-se a todas as crianças e jovens cujas carências se relacionam com deficiências ou dificuldades escolares. (UNESCO, 1994, item 3)

Esse direcionamento trazido pela Declaração de Salamanca disparou

discussões sobre a conceituação de NEE, já que há de se entender que muitas

crianças apresentam dificuldades escolares e, consequentemente, têm

necessidades educativas especiais em determinado momento da sua escolaridade,

sendo tarefa das escolas encontrar formas de educar com sucesso essas crianças,

incluindo aquelas que apresentam incapacidades graves, instituindo o conceito de

educação inclusiva.

O mérito da escola inclusiva, que consegue educar a todos com sucesso, não

está apenas no desenvolvimento de uma pedagogia centrada nas crianças,

tampouco na qualidade de ensino para todos, mas essencialmente no passo crucial:

na ajuda à sociedade quanto à modificação das atitudes com o diferente.

Segundo Carvalho,

o evento de Salamanca, em 1994, de certo modo ocorreu para evidenciar a exclusão da inclusão das necessidades educacionais especiais de tantos e tantos alunos que precisam, definitivamente, constar das políticas educacionais e das práticas pedagógicas de todas as escolas. Não por

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apelos sentimentais, por respeito às diferenças e muito menos por tolerância(...). (CARVALHO, 2005, p. )

Finalizando nossos critérios de inclusão/exclusão de produções acadêmicas

para esta revisão bibliográfica, optamos ainda por considerar apenas aquelas que se

realizaram na Educação Infantil e Ensino Fundamental. Ainda que consideremos a

importância do estudo sobre a inclusão dos deficientes intelectuais e com

transtornos globais do desenvolvimento nas Universidades, nesta pesquisa, não

teremos tempo hábil para estudá-la.

Nossa pesquisa, que tem sua natureza histórico-dialética, partirá da revisão

crítica dos conceitos já existentes, a fim de que possamos incorporá-los em nossas

discussões e avançarmos no entendimento desse fenômeno na Educação.

Nosso estudo e reflexão, considerando o conhecimento já acumulado na

temática proposta, privilegiará como fonte de consulta o banco de teses da

Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR), Universidade Federal de Santa

Maria (UFSM), Universidade de São Paulo (USP), Universidade Federal do Rio de

Janeiro (UFRJ) e Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).

O procedimento utilizado nesse levantamento de teses e dissertações

consistiu na realização da leitura completa dos textos elencados (conforme tabela

abaixo) e registro dos dados obtidos em um protocolo de análise elaborado para

esse fim, de onde retiramos os resultados que se seguem.

Após analisarmos 49 teses e dissertações publicadas nessas Universidades,

verificamos que 12 destas atendiam aos parâmetros já apresentados e, portanto,

constituíram o corpus de análise desta pesquisa.

Tabela 1. Levantamento de teses e dissertações, publicações e grupos de pesquisa sobre inclusão

escolar do deficiente intelectual e transtornos globais do desenvolvimento na educação Infantil e

Ensino Fundamental

Fontes pesquisada s

Teses e Dissertaçõe s

Publicaçõe s

Grupos de Pesquisa mantidos pela Universidade com foco na Inclusão escolar

Universidade Federal Santa

6 Revista de educação

1. Educação Especial e Autismo 2. Educação Especial: Interação

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Maria (UFSM) especial e Inclusão Social

Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP)

11 Revista de Educação e Sociedade- CEDES

1. Laboratório de Estudos e Pesquisas em Ensino e Diversidade ( LEPED)

Universidade Federal de São Paulo (USP)

10 Revista Educação e Pesquisa

1. Educação especial e Educação Inclusiva

2. Políticas Públicas em Educação especial

3. Atendimento a práticas educacionais e Processo de ensino aprendicagem

Universidade federal de São Carlos (UFSCAR)

13 Revista Eletronica de Educação

1. Diversidade em educação

Univeridade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)

9 Livro: Inclusão em Educaçã o - Diferente s Interfaces ;

Livro: Inclusão em Educaçã o - Culturas Políticas e Práticas

1. Laboratório de Pesquisas , Estudos e Apoio à Participação e à Diversidade em Educação ( LAPEADE)

Das 37 teses descartadas para este trabalho, podemos observar que, em

número bastante equilibrado, algumas tratavam de aspectos voltados

exclusivamente para as tecnologias assistivas e recursos de apoio à comunicação

(comunicação alternativa), o que nos parece que quando se trata de prática docente

com os alunos incluídos com deficiência física ou sensorial, estas acabam deixando

mais evidentes e claras as necessidades de utilização de recursos de apoio que

minimizem as barreiras para a aprendizagem, especialmente através das

tecnologias assistivas (TAs).

Outras tantas tratavam de aspectos focados nas políticas públicas, que

trazem uma diversidade de temas que se associam à formação de professores,

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legislação, as parcerias saúde-educação (fono, psico e outros), as concepções de

deficiência e a história da Educação Especial.

Chamou-nos a atenção o fato de haver um número expressivo de teses e

dissertações voltadas para a área da Educação Física, mas como não era esse o

nosso foco, não nos aprofundamos nesse estudo, sendo também estas descartadas.

Entre as pesquisas identificadas no banco de teses e dissertações das

Universidades selecionadas com a temática Inclusão Escolar, e os muitos recortes

que fizemos, já esclarecidos anteriormente, destacamos o trabalho de Santiago

(2011), que investiga o Laboratório de Aprendizagem, refletindo sobre as políticas de

implantação desse Laboratório no Município de Juiz de Fora/MG enquanto

estratégia política e pedagógica da rede municipal de educação, para diminuir ou

eliminar as desigualdades educacionais a partir do referencial teórico Index para

Inclusão (BOOTH; AINSCOW, 2002), que articula a problemática da dialética

inclusão e exclusão, tomando por referência três dimensões interdependentes: a

construção de culturas, o desenvolvimento de políticas e a orquestração de práticas.

Os estudantes encontram dificuldades quando eles experimentam barreiras à aprendizagem e à participação. Barreiras podem ser encontradas em todos os aspectos da escola, bem como nas comunidades e em políticas locais e nacionais. Barreiras também surgem na interação entre estudantes, na maneira como são ensinados e o que são ensinados. Barreiras à aprendizagem e à participação podem prevenir o acesso à escola ou limitar a participação do sujeito dentro da escola. (BOOTH; AINSCOW, 2002 in SANTIAGO, 2011, p.8)

Santiago aponta para o cuidado na utilização do Index como um roteiro de

aplicação que as escolas devem seguir para garantia da inclusão dos seus alunos,

pois se trata de ser, na essência, um instrumento de indicadores para reflexão nesse

processo político prático e da inter-relação entre eles. Ainda que a perspectiva de

reflexão precise estar direcionada para a inclusão escolar, considerando-se a

diversidade em sua forma mais ampla de incluir as diferenças nesse contexto,

entendemos que para nosso recorte (deficientes intelectuais e com transtornos

globais do desenvolvimento), esta poderá contribuir como referência teórica na

análise das nossas entrevistas.

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Outra pesquisa que selecionamos para nos auxiliar neste trabalho é a tese de

Doutorado de Plesch (2009), que revela não só as contradições, mas, acima de

tudo, a complexidade do processo de inclusão vivido pelas escolas, particularmente

no âmbito das práticas curriculares dirigidas para o processo de ensino-

aprendizagem dos alunos com deficiência mental.

A autora apresenta na primeira parte de sua tese um estudo minucioso sobre

a história da Educação Especial no Brasil, bem como o nascimento e implantação

das legislações sobre a educação inclusiva e as políticas públicas que se instalaram

até então. Traz como referência teórica autores que são amplamente conhecidos

nas discussões de Educação Especial, e alguns deles também são referência nesta

dissertação, como Mazzota (2005), Januzzi (2004), Kassar (1999:2001:2004),

Ferreira e Glat (2003), Glat e Blanco (2007), Bueno (2004), Garcia (2004).

Também o trabalho realizado por Antunes (2008) traz as discussões sobre o

currículo e a inclusão de alunos com deficiência intelectual na Educação Infantil,

apresentando a escassez de pesquisas que se apresentam nas práticas escolares

desenvolvidas com os alunos com deficiência intelectual, afirmando que essa

população é a que causa nos professores maiores inquietações, já que nossos

currículos são basicamente focados em exigências de natureza cognitiva.

Considerar o acesso às TAs não é suficiente para atender às necessidades de

mudanças e complementos nos currículos.

Com relação a isso, há concordância no documento intitulado “O acesso de alunos

com deficiência às escolas e classes comuns da rede regular”, elaborado pelo MEC.

Os alunos com deficiência mental, especialmente os casos mais severos, são os que forçam a escola a reconhecer a inadequação de suas práticas para a- tender às diferenças dos educandos. De fato as práticas escolares convencionais não dão conta de atender à deficiência mental, em todas as suas manifestações, assim como não são adequadas as diferentes maneiras de os alunos, sem qualquer deficiência, abordarem e entenderem um conhecimento de acordo com suas capacidades. Essas práticas precisam ser urgentemente revistas, porque, no geral, elas são marcadas pelo conservadorismo, são excludentes e, conforme visto, inviáveis para o alunado que temos hoje nas escolas, em todos os seus níveis. (BRASIL, 2004, p. 27-28)

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A autora contribui muito com nossa pesquisa quando refere que,

considerando a prática docente sob o viés da inclusão escolar, o que se observa é

que esta está de forma intensa relacionada à deficiência intelectual e aos

transtornos globais do desenvolvimento (autismo), o que vem ao encontro do nosso

tema e do nosso público alvo, oportunizando-nos que caminhemos um pouco mais

nessas discussões.

Isso muito nos interessou, pois quando tratamos das deficiências físicas ou

sensoriais, sabemos que as TAs são os recursos pedagógicos mais utilizados para

facilitar o acesso ao conhecimento e remoção das barreiras de aprendizagem;

porém, ao analisarmos os alunos com deficiência intelectual ou transtornos globais

do desenvolvimento, essas barreiras implicam não apenas recursos de apoio, mas,

especialmente, mudanças de postura, concepções, representações e,

principalmente, de práticas pedagógicas na escola comum, o que está intimamente

ligado ao ambiente e às relações que se estabelecem nesse meio.

Observamos ainda que, de forma geral, nessas teses e dissertações, ao

focarem a prática docente, o recurso metodológico mais utilizado foi o estudo de

caso; porém, este está muito mais voltado ao estudo do que acontece com o aluno,

suas aquisições, conquistas e dificuldades, do que no que acontece com o professor

no processo de inclusão escolar, havendo uma carência nesse sentido no que diz

respeito às pesquisas.

Goldenberg (1998) afirma que o estudo de caso não é uma técnica específica,

mas uma análise holística, que considera a unidade social estudada como um todo,

com o objetivo de compreendê-lo em seus próprios termos. Nas suas palavras:

O estudo de caso reúne o maior número de informações detalhadas, por meio de diferentes técnicas de pesquisa, com o objetivo de apreender a totalidade de uma situação e descrever a complexidade de um caso concreto. Através de um mergulho profundo e exaustivo em um objeto delimitado, o estudo de caso permite a penetração na realidade social. (GOLDENBERG, 1998, p.33-34)

Com relação ao professor como objeto de estudo das práticas pedagógicas

inclusivas, de forma geral, esse enfoque é dado nas temáticas de teses e

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dissertações que tratam da formação de professores, o que evidentemente está

relacionado à necessidade da transformação da prática docente; porém, muito

pouco se tem organizado enquanto pesquisas que tenham como metodologia os

relatos de experiência de reflexão sobre os caminhos e descaminhos vividos pelo

professor nesse novo desafio de incluir a todos - deficientes intelectuais e com

transtornos globais do desenvolvimento - o que nos propomos a fazer nesta

pesquisa.

A revisão bibliográfica nos possibilitou verificar que o tema Inclusão Escolar é

um tema recente na pesquisa acadêmica, já que desde a Constituição Federal de

1988 até a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Básica- LDB- em 1996, as

discussões caminharam para uma perspectiva de mudança de paradigma vinculado

ao acesso dos alunos com deficiência na escola comum, o que será melhor

abordado no próximo capítulo.

Já entre 1996 e 2008, quando surgiu a nova Política da Educação Especial, o

foco esteve em garantir o acesso e a permanência desses alunos na escola comum

por meio do estudo e implantação da legislação vigente. Porém, foi a partir de 2008

que a inclusão escolar caminhou mais um pouquinho no sentido de garantir não

apenas o acesso e a permanência, mas também, e principalmente, o sucesso dos

alunos com deficiência e transtornos globais do desenvolvimento na escola regular.

É, portanto, a partir da nova Política de Educação Especial – 2008 até 2012

que nossa revisão bibliográfica confirma que as pesquisas voltaram suas

preocupações para a necessidade de apoios e parcerias na escola para que o

sucesso escolar efetivamente ocorresse, bem como de se colocar um holofote na

formação de professores como forma de alavancar esse processo.

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1. INTERFACES DA INCLUSÃO DOS DEFICIENTES – UM

PROCESSO HISTÓRICO-PARADIGMÁTICO

Refletir a história implica em desfazer-se do costumeiro entendimento relativizado de que todas as atitudes e formas de uma sociedade são espontaneamente naturais, para compreendê-la enquanto produto de escolhas culturais que atendam às necessidades dos homens, num determinado contexto, numa determinada época, fundada no pressuposto de que o homem ao produzir sua vida, produz e satisfaz a cada dia novas necessidades. (NOGUEIRA, 2008, p.3)

1.1 MARCOS E MARCAS DEIXADOS NA HISTÓRIA DO DEFICIENTE – DA TOTAL

EXCLUSÃO PARA A INCLUSÃO TOTAL

Não seria possível compreendermos como chegamos à Educação Inclusiva8

sem tratarmos da história da Educação, da mesma forma que não seria possível

abordarmos uma Escola para Todos sem contextualizarmos as evoluções do

conceito de deficiência, perpassando os caminhos trilhados pela educação em uma

de suas modalidades: a Educação Especial.

Compreender a construção deste novo paradigma: Educação Inclusiva

implica compreender o percurso de construção histórica complexo que permeia não

apenas aspectos socioculturais, mas também, e principalmente, concepções e pré-

disposições que têm a sua influência nos contextos educacionais até hoje. Envolve,

sobretudo, conhecer os (des)caminhos trilhados pelas políticas públicas, ou mesmo

a ausência destas, para a educação do deficiente.

8 Adotamos Educação Inclusiva, tendo por referência o que define o MEC no documento Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (2008), no entendimento de que esta nos possibilita uma visão mais abrangente do movimento político, cultural, social e pedagógico de defesa de uma escola para todos, sem qualquer discriminação: “A educação inclusiva constitui um paradigma educacional fundamentado na concepção de direitos humanos, que conjuga igualdade e diferença como valores indissociáveis, e que avança em relação à ideia de equidade formal ao contextualizar as circunstâncias históricas da produção da exclusão dentro e fora da escola.”

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Cabe ressaltar que ao tratarmos de educação inclusiva, não estamos nos

referindo exclusivamente à inclusão dos deficientes na escola; esta é apenas a

ponta de um grande “iceberg” na medida em que é, muitas vezes, a discussão mais

evidente, mais aparente; porém, não é, e não poderia ser, a única abordagem

necessária. Abordar a educação inclusiva é, de fato e de direito, abordar a

diversidade e toda a sua amplitude, tanto quanto abordar educação inclusiva não

pode se limitar apenas ao ambiente escolar, mas a todos os espaços que constituem

espaços de interação humana.

Porém, conscientes de que essa diversidade é tanta quantos são os sujeitos

que compõem a sociedade, é tanta quantos os espaços de convivência social que

nos são possibilitados para interagirmos uns com os outros, a opção feita nesta

pesquisa foi a de recortar a educação inclusiva no que diz respeito especificamente

à inclusão do aluno com deficiência e transtornos globais do desenvolvimento no

espaço escolar.

Trataremos, portanto, neste capítulo, das marcas e dos marcos nesta história,

deixados pelas diferentes interpretações e significados dados ao deficiente, que

embasaram concepções e formas de tratamentos destinados a esses sujeitos ao

longo do tempo.

O movimento inclusivista tem o seu nascimento na primeira metade do século

XX, após as duas Grandes Guerras Mundiais, quando surgiu a necessidade da

criação de ambientes sociais que pudessem receber e acolher aqueles que se

tornaram deficientes, mutilados pelo contexto de guerra. Até aquele momento, havia

uma tímida preocupação da sociedade com a população deficiente, ainda que esta

sempre tenha existido na história da humanidade.

Conheçamos resumidamente a existência dessa população nos diferentes

tempos históricos, observando os contextos sociais e econômicos e o lugar do

deficiente nesses contextos.

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1.1.1 dade Antiga – Paradigma9 da Exclusão Total

Iniciamos nossa linha do tempo na Antiguidade, pois, segundo Gugel

(2007), anterior a isso, no período Pré-histórico, o que os historiadores podem supor,

considerando a falta de indícios, é que os deficientes não sobreviviam às condições

desfavoráveis estabelecidas para o ser humano com deficiência.

Também poucos são os registros de como se caracterizava a relação da

sociedade com a deficiência na Antiguidade; porém, se tomarmos por referência

bibliográfica o Livro Sagrado – a Bíblia, considerada o código mais antigo da história

da humanidade, percebemos que esta apresenta em muitas de suas passagens

relatos que nos levam a compreender o lugar daqueles que apresentavam alguma

deficiência, paralíticos, cegos, mudos, que eram colocados à margem da sociedade,

tornando-se mendigos e pedintes.

Se considerarmos os primórdios da História da Educação, esta nos remete a

filósofos como Sócrates, Platão e Aristóteles, de onde vêm os indicativos escritos

sobre o tratamento dispensado aos deficientes naquela época. Platão, no livro A

República, Livro IV, descreve conforme nos mostra Gugel:

Pegarão então os filhos dos homens superiores, e levá-los-ão para o aprisco, para junto de amas que moram à parte num bairro da cidade; os dos homens inferiores, e qualquer dos outros que seja disforme, escondê- los-ão num lugar interdito e oculto, como convém. (PLATÂO in GUGEL, 2007, p. 63)

. E Aristóteles, no livro A Política, Livro VII, Capítulo XIV, 1335 b:

Quanto a rejeitar ou criar os recém-nascidos, terá de haver uma lei segundo a qual nenhuma criança disforme será criada; com vistas a evitar o excesso de crianças, se os costumes das cidades impedem o abandono de recém- nascidos deve haver um dispositivo legal limitando a procriação se alguém tiver um filho contrariamente a tal dispositivo, deverá ser provocado o aborto antes que comecem as sensações e a vida (a legalidade ou ilegalidade do

9 O termo paradigma tem sua origem no grego “paradeigma”, que significa modelo, padrão. No

sentido lato, corresponde a algo que vai servir de modelo ou exemplo a ser seguido em determinada situação. São as normas orientadoras de um grupo que estabelecem limites e que determinam como um indivíduo deve agir dentro desses limites.

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aborto será definida pelo critério de haver ou não sensação e vida). (ARISTÒTELES in GUGEL, 2007, p. 63)

O contexto social dessa época, para Aranha (1995), era caracterizado pelas

atividades econômicas representadas pela agricultura, pela pecuária e pelo

artesanato. A terra e o rebanho pertenciam à nobreza, que eram os senhores, sendo

os demais - os não senhores - destituídos de valor. A noção de homem que se

construía nessa época estava pautada na perfeição individual, física e mental. Para

Mazzotta (2005), a própria religião, ao colocar o homem como imagem e

semelhança de Deus, portanto, ser perfeito, incluía a ideia de perfeição humana, a

perfeição física e mental. E, não sendo parecidos com Deus, os portadores de

deficiências eram postos à margem da condição humana e tidos como culpados de

sua própria imperfeição.

Nesse contexto histórico, não havia espaço para aqueles que não eram

perfeitos; não eram humanos ou caracterizavam a degeneração humana, portanto,

deveriam ser descartados. Não havia lugar na organização social, já que não

poderiam pertencer à classe de senhores, pois não apresentavam competência para

comandar os seus servos, mas também não poderiam ser da classe de não

senhores - aqueles que mantinham a produtividade das terras - pois não eram

capazes de produzir economicamente para a sociedade, restando apenas a

eliminação destes da sociedade, pelo abandono ao relento para serem exterminados

pelos animais, pela fome, pelo frio, ou, para alguns poucos com melhor sorte, serem

aproveitados como fonte de diversão: os bobos da corte.

A Lei das Doze Tábuas10 indicava a morte imediata àqueles nascidos com

“monstruosidade”. Traduzida, conforme nos apresenta Gugel (2007), a famosa lei

determinava o seguinte: Tábua IV - Sobre o Pátrio Poder - Lei III - O pai de imediato

matará o filho monstruoso e contra a forma do gênero humano, que lhe tenha

nascido recentemente.

10 A Lei das Doze Tábuas (Lex Duodecim Tabularum, ou simplesmente Duodecim Tabulae, em latim) constituía uma antiga legislação que está na origem do direito romano. Formava o cerne da constituição da República Romana e das antigas leis não escritas e regras de conduta. Seus originais se perderam, porém os historiadores reconstituíram parte do conteúdo nelas existente através de citações em autores dos mais diversos. Com base nesses estudos, um esboço do conteúdo das Tábuas pôde ser feito. Informação oferecida pela Biblioteca do Supremo Tribunal de Justiça: http://www.stf.jus.br

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Ainda que autorizado pela lei o infanticídio, muitas crianças malformadas, ou

consideradas como anormais e monstruosas, eram com frequência colocadas em

cestas enfeitadas e deixadas à margem do Rio Tibre para que os escravos e as

famílias que viviam de esmolas se apossassem dessas crianças com marcantes

lesões, criando-as para mais tarde as explorarem, obtendo esmolas volumosas dos

corações compadecidos da nobreza.

Nesse momento da História, o paradigma vivido pela humanidade em relação

ao deficiente era o da exclusão total da sociedade, e sobreviver era a necessidade

do deficiente, não cabendo qualquer ação educacional para essa população.

1.1.2 Idade Média – Paradigma da Exclusâo Parcial

Caminhemos na nossa linha do tempo rumo à Idade Média, quando a

sociedade passou a se estruturar em feudos (nobreza), mantendo ainda como

atividade econômica a agricultura, a pecuária e o artesanato; porém, o clero ganhou

destaque na configuração sociopolítica, pois era a classe guardiã do conhecimento.

Além desses que disputavam o poder na sociedade, havia a classe dos servos, que

eram os responsáveis pela produção.

Ainda que o Cristianismo seja uma marca na história conquanto tenha

influenciado uma nova visão sobre o Homem, que passava a ser visto como ser

racional, criado à imagem e semelhança de Deus, essas ideias ainda que tenham

sido fonte de forte influência na educação e na sociedade, o máximo que se

alcançou com relação ao deficiente foi compreender que estes sujeitos faziam parte

da humanidade, portanto, eram dotados de almas. Isto exigia uma nova explicação

religiosa sobre a deficiência, que se caracterizava pelas contradições,

compreendendo a deficiência ora como desígnio divino, ora como possessão

demoníaca, porém, em ambos os casos, remetia a uma única solução, a punição, a

tortura, os castigos severos e a segregação em mosteiros e instituições à margem

do processo social.

A expansão do Cristianismo impulsionou o homem na busca pela salvação da

alma e pela eternidade, preocupações que passaram a fazer parte da vida do

homem, em uma constante mistura de sagrado e profano, comentada por Bakhtin

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(1993), que observa que nas páginas de manuscritos dos séculos XIII e XIV,

especialmente naqueles que narram a vida dos santos, estes dois aspectos

coexistiam na consciência dos homens medievais.

O Cristianismo trouxe ainda uma forte contribuição ao olhar estético, a busca

pela perfeição, pelo belo:

Todavia, o Cristianismo trouxe outro olhar estético: o homem cristão passou a pensar que nem tudo na criação é humanamente belo, que o feio e o disforme convivem com o gracioso, que o grotesco é o reverso do sublime (...) O grotesco e o seu contraponto, o sublime, ocuparam um grande espaço nas artes da Idade Média. Ao primeiro, são remetidos as doenças, as deformidades, o ridículo, os vícios e os crimes; ao segundo, a moral cristã concebe os encantos e a pureza. (MORI, 2009, p.200)

Ao sublime e belo eram conferidas todas as graças, encantos e belezas; ao

grotesco, todas as feiúras, enfermidades e deformidades. As deficiências,

obviamente, pertenciam ao mundo do grotesco e, como tal, eram vistas como

negação da perfeição divina.

O sentimento em relação às pessoas com deficiência, embasado em uma

ética cristã, tinha a marca da ambiguidade, do dilema entre caridade e castigo,

proteção e segregação. O castigo era um meio de salvar a alma possuída por seres

demoníacos, enquanto acolher e proteger o possuído pelo demônio era uma forma

de se santificar e ser redimido dos pecados humanos. Foi essa moral cristã da

época que deu início às práticas assistencialistas e ao surgimento das instituições de

confinamento, a partir das quais foram criadas as instituições especializadas, já que

a deficiência era uma condição incurável, e o médico não deveria perder tempo ou

reputação tentando curar o incurável.

Assim, deficientes encontravam abrigo nas igrejas, como a história

mundialmente conhecida de Quasímodo, personagem do livro “O Corcunda de Notre

Dame”, que vivia isolado na torre da Catedral de Paris, conforme foi escrito por

Victor Hugo (1973), e que retrata perfeitamente a visão de homem na Idade Média.

Conta a historia que em 6 de janeiro de 1482, Dia de reis e festa dos Loucos, era tradição a escolha do papa do povo, aquele que fizesse a

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careta mais feia. Todos se impressionam quando descobrem que o eleito do povo não era uma caricatura, mas o próprio rosto do vencedor. No gigante quebrado e mal colado, o povo reconheceu Quasímodo, o tocador de sinos da Catedral de Notre Dame;

_ Ih, macaco feio! – dizia uma.

_ Tão malvado quanto feio – falava outra.

_ É o diabo – ajuntava uma terceira.

_ Tenho a infelicidade de morar perto de Notre-Dame; à noite ouço-o vagabundeando pela calha.

_ Com os gatos.

_ Ele anda sempre em cima dos nossos telhados.

_ Joga-nos feitiçaria pelas chaminés. (HUGO, 1973, p. 52)

Quasímodo cresceu confinado na Catedral, protegido pelo padre que o

adotou com ideias de poder ser perdoado de seus pecados já cometidos ou a

cometer durante a sua existência.

(...) Seus companheiros eram os monstros e demônios que adornavam a Igreja. Com eles e com as estátuas de santos e reis, Quasímodo conversava horas inteiras. Enfim, a Catedral era seu mundo, o seu universo. (HUGO, 1973, p. 123)

Ainda vivemos resquícios dessas concepções nos dias atuais quando nos

deparamos com ideias de que acolher o aluno com deficiência na escola passa pela

caridade, benevolência e missão (no sentido religioso).

1.1.3 – Idade Moderna – Paradigma da Inclusão Parcial

O surgimento da burguesia na Idade Moderna, em uma nova divisão social

dada pela relação de trabalho, associado ao enfraquecimento da Igreja Católica na

sociedade e ao nascimento do Iluminismo, trouxeram como marca desse período a

mudança na interpretação do mundo, que deixava de ter seu foco nos aspectos

espirituais e passava a ter o foco nos aspectos racionais.

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O fortalecimento do método científico e a expansão da Medicina como ciência

fortaleceram a tese da organicidade das doenças, compreendendo a deficiência

como um processo natural e, portanto, orgânico. A visão sobre a deficiência deixou

de ser exclusivamente religiosa e passou a incorporar os conceitos de doença,

sendo compreendida como um problema do corpo, e não mais do espírito. Instaurou-

se um novo modelo de deficiência, que agora era médico, com o desenvolvimento

de teorias, como as da hereditariedade e a ideia do contágio, levando-se a acreditar

que a deficiência poderia ser transmitida de pessoa para pessoa como uma doença.

Essa ideia ainda permanece entre alguns menos esclarecidos nos dias atuais.

Essa nova divisão social, dada pela expansão da industrialização e vinda da

força de trabalho, abriu a possibilidade de ascensão social por meio do trabalho.

Nesse cenário, a palavra de ordem tornou-se produtividade e, por conseguinte,

eficiência, capacidade, sendo aqueles que eram produtivos os detentores de

direitos, privilégios e valores de dominação, o que passou a ser o termômetro de

avaliação social dos indivíduos.

Dentro dessa perspectiva, os deficientes e doentes mentais precisavam ser

isolados da sociedade, em conventos e asilos, que tinham grades, como as prisões.

O médico era quem determinava o modelo de eficiência e de deficiência, portanto,

era ele quem determinava o lugar do sujeito na sociedade.

A Idade Moderna foi marcada por revoluções e guerras, que tiveram por

consequência elevados contingentes de indivíduos com sequelas, e exigiam uma

gama variada de medidas em atenção a esses guerreiros, incentivando o

desenvolvimento das especialidades médicas e dos programas de reabilitação

específicos.

Cabe ressaltar ainda que além das guerras e revoluções marcantes nessa

época, a Revolução Industrial, apresentou um novo cenário de deficiências

adquiridas em decorrência das condições precárias de uso de máquinas mecânicas,

que geravam acidentes mutiladores e doenças profissionais.

A Psicologia e a Sociologia se separaram da Filosofia e se tornaram ciências

independentes, dando início à formação das Ciências Humanas, o que possibilitou o

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olhar direcionado para as pessoas com deficiência e suas necessidades de atenção

especializada.

A história do “menino-lobo”, o selvagem de Aveyron, Victor, reabilitado e

educado pelo médico psiquiatra francês Itard (1774-1830) ilustra bem a concepção

de deficiente que se tinha nessa época. Itard acreditava na educação como principal

vetor de desenvolvimento da humanidade, partindo do princípio de que tudo o que o

homem sabe, ele aprendeu, o que levou Itard a acreditar que a educação poderia

integrar Victor no convívio social.

A convicção filosófica do médico francês permitiu que ele embarcasse nesse

empreendimento educativo com Victor, afrontando a teoria das ideias inatas e

contrariando importantes intelectuais de sua época, adentrando o campo das ações

pedagógicas. Condizente com sua abordagem empirista e sua crença na educação,

Itard entendia que ao professor caberia a difícil tarefa de organizar os ambientes de

aprendizagem, de proporcionar atividades favorecedoras de desenvolvimento, não

só cognitivas, mas afetivas e comportamentais, ideia que pode ser considerada

bastante contemporânea. O legado de Itard tem se reduzido a discussões de

práticas pedagógicas e perde o que pode trazer de mais precioso: o entendimento

de que o homem é um ser de relações, para o qual a educação é fundamental para

sua constituição como ser social, histórico e cultural.

A partir dessa experiência foi concebido o primeiro tratamento para

deficientes, como aborda Januzzi (2004), e ainda hoje, muitas das ideias de Itard

são base para o tratamento dos deficientes dentro de um modelo médico

terapêutico.

É importante considerarmos o nascimento da Educação Especial nesse

momento da história, marcado pela sociedade industrial moderna, que possuía,

segundo Bueno (1997), duas características fundamentais: produtividade e

homogeneidade. Nesse contexto, a Educação Especial tanto nasceu respondendo

aos anseios de oportunização do ensino na tentativa de responder às necessidades

da população deficiente que não conseguia acompanhar o ensino regular, quanto do

interesse em segregar o indivíduo com deficiência com o objetivo de separar os

anormais, contribuição para a exclusão social:

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(...) desde o seu surgimento no final do século XVIII, atende a dois interesses contraditórios: o de oferecer escolaridade a crianças anormais, ao mesmo tempo em que serve de instrumento básico para a segregação do indivíduo deficiente. (BUENO, 1997, p.38)

Essa discussão ainda hoje está em andamento, com muitas polêmicas no

meio acadêmico, especialmente no que diz respeito à função social das escolas

especiais, que, segundo Ferreira (1994), tendo seu surgimento em instituições de

reabilitação, trazem as marcas do modelo médico, pautado nas patologias

individuais que indicam a utilização de estratégias compensatórias ou de aranjos

ambientais que possibilitem adaptar os limites do indivíduo às demandas do

ambiente social, ainda que seja sob o ponto de vista teórico. Abordaremos melhor as

questões voltadas para a Escola Especial mais adiante.

Antes de seguirmos em nossa linha do tempo para a contemporaneidade,

onde os princípios inclusivos ganham força e lugar mais significativo na sociedade,

precisamos abordar a história do deficiente no Brasil, que, evidentemente, não se

diferenciará muito desta já contada nas linhas acima, porém precisa ser apresentada

sob o ponto de vista do contexto sociopolítico e histórico iniciado em 1500, com a

chegada dos portugueses ao solo brasileiro.

É necessário, portanto, que realizemos essa trajetória concentrada no Brasil

sob a perspectiva que nos apresenta Figueira, quando trata da questão do deficiente

como uma construção cultural, e por serem essas questões culturais, carecem de

mais tempo para serem revertidas, modificadas, ajustadas a novos contextos e

concepções:

(...) as questões que envolvem as pessoas com deficiência no Brasil – por exemplo, mecanismos de exclusão, políticas de assistencialismo, caridade, inferioridade, oportunismo, dentre outras – foram construídas culturalmente. (FIGUEIRA, 2008, p.17)

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Iniciando nossa jornada de resgate histórico no Brasil, pelos relatos que

atestam costumes indígenas, estes nos apresentam práticas de eliminação sumária

de crianças com deficiência ou a exclusão daquelas que viessem a adquirir algum

tipo de limitação física ou sensorial. Tais costumes não diferem muito daqueles já

descritos na História Antiga e Medieval, pois, da mesma forma, os curandeiros

indígenas relacionavam o nascimento de crianças com deficiência ao castigo ou

punição, e a solução era a sua eliminação do convívio social.

Um outro aspecto de relevância na História do Brasil, sem dúvida nenhuma, é

a população de negros escravos deficientes, os quais não apenas pela forma

natural, mas essencialmente pelos maus tratos e os inúmeros castigos, sofriam

mutilações e deficiências, não sendo estes mais produtivos para a sociedade e,

portanto, sem lugar definido.

1.1.4 – Contemporaneidade – Paradigma da Inclusão Total

Destaque desse momento histórico deve ser dado ao século XX, quando os

indivíduos com deficiências começaram a ser considerados cidadãos, com seus

direitos e deveres de participação na sociedade, ainda que muito focado numa

abordagem assistencialista. A primeira medida política nessa direção aconteceu

com o surgimento da Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948, que

iniciou os primeiros movimentos organizados por familiares de deficientes que

tinham por norte as críticas à discriminação e à segregação. A Declaração,

estabelecida pela ONU, passou a considerar todos os homens iguais e a

fundamentar regras e direitos às pessoas portadoras de deficiências. A partir disso a

luta pela inserção no meio passou a ganhar vez e voz não apenas do deficiente,

mas de todos aqueles que se interessassem pela causa, nascendo a Educação

Especial.

A questão da Integração Social do deficiente surgiu nesse contexto, em meados

do século XX, especialmente após as duas Grandes Guerras. A pressão para o

estabelecimento de um programa público de reabilitação veio de diferentes fontes,

dentre elas, a necessidade de treinamento e assistência para os soldados feridos na

guerra, para assumirem, com sucesso, uma ocupação rentável. Tais programas

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fortaleceram a convicção de que as pessoas deficientes poderiam trabalhar e ser

inseridas na sociedade mais ampla, auxiliando-as a adquirir as condições e os

padrões o mais próximo possível aos da vida cotidiana das demais pessoas.

Estamos falando essencialmente do príncipio da normalização.

O princípio de normalização deu suporte filosófico ao movimento de

desinstitucionalização e ao movimento pela integração social do deficiente, ainda

que isso tenha se dado a partir de uma visão médica terapêutica, com hábitos

classificatórios, pautados no corpo biológico, e não no ser social.

Também no Brasil, no século XIX, segundo Figueira (2008), a questão da

deficiência apareceu de maneira mais recorrente em função do aumento dos

conflitos militares (Canudos e outros), com a criação do “Asilo dos Inválidos da

Pátria”, que, apesar da precariedade no funcionamento durante o período Imperial,

permaneceu aberto até 1976.

A criação do Imperial Instituto dos Meninos Cegos (hoje Instituto Benjamin

Constant) marcou o momento a partir do qual a questão da deficiência deixou de ser

responsabilidade única da família, passando a ser um “problema” do Estado, porém,

não como incorporação e necessidade de política pública, mas com a transferência

dessa responsabilidade para instituições privadas e beneficentes, eventualmente

apoiadas pelo Estado.

Essas instituições ampliaram sua linha de atuação para além da reabilitação

médica, assumindo a educação das pessoas com deficiência no Brasil. O século XX

foi marcado pelo avanço da Medicina e pela maior atenção dispensada pelos

médicos aos deficientes, o que acabou por reforçar a relação doença e deficiência,

tendo por consequência o empoderamento dos médicos; estes se tornaram os

grandes especialistas e passaram a influenciar de forma direta na questão

educacional das pessoas com deficiência, com indicações do lócus educacional

para cada nível ou grau de deficiência por meio do diagnóstico exigido para o

encaminhamento de crianças para classes ou escolas especiais. Havia uma

tendência de substituir a segregação arbitrária, promovida pelos profissionais da

educação, pela segregação menos questionável, científica, ensejada pelos testes

psicológicos.

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Esse diagnóstico, segundo Bueno (1997), antes mesmo de cumprir a sua

tarefa de avaliar esses sujeitos para que pudessem receber a melhor forma de

atendimento possível, criou rótulos que afastavam as crianças da escola, a qual era

seletiva, segregacionista, homogeneizadora e excludente:

Na realidade, o que o diagnóstico do especialista tem feito é nada mais do que reafirmar a condição de excluído, na medida em que, na maior parte das vezes, não se ocupa com os processos sociais e, dentro deles, o da sua escolarização, como constituidor de suas capacidades ou incapacidades. (BUENO, 1997, p.43)

Ainda que a deficiência não seja mais compreendida como castigo divino,

ainda é compreendida como anormalidade, enquadrando-se na categoria da

degeneração, do desvio da espécie humana, sendo a segregação uma alternativa

naturalmente aceita pela sociedade.

A partir da década de 60, o modelo médico de deficiência não era mais

suficiente para suprir a necessidade dos deficientes de inclusão social e de exercício

da cidadania, o que acabou originando uma nova abordagem na compreensão da

deficiência: a do modelo social.

Esse modelo explica a deficiência na relação sujeito e ambiente, e, segundo

Medeiros; Dinis (2006), indica que a deficiência não é necessariamente uma doença,

mas consequência da interação entre características corporais do indivíduo e as

condições sociais em que ele vive, ou ainda, da combinação de limitações impostas

pelo corpo com alguma lesão a uma organização social pouco sensível à

diversidade corporal.

Essa evolução no pensamento e no tratamento do deficiente se revela

também na necessidade de encontrar um termo que designasse essas pessoas,

passando por diferentes nomenclaturas e suas respectivas concepções, na tentativa

de ultrapassar o nível meramente filológico, mas considerar uma mudança

terminológica de amplo alcance, que expressasse a mudança do conceito sobre o

objeto referido.

Para Bueno (1997), a substituição de termos como anormal, débil, idiota, por

outros como excepcional, e mais recentemente, portador de necessidades especiais,

é motivo de preocupação:

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Em outras palavras, como o conceito portador de necessidades educativas especiais abrange uma diversidade de sujeitos, ao ganhar na amplitude e na quebra da estigmatização, perde na precisão. Tanto é assim que, ao lado do termo em questão, é preciso acrescentar a espécie de sujeitos sobre a qual estamos nos referindo (...) esse alargamento pode, com certeza, significar ampliação de oportunidades educacionais, portanto, de democratização, do sistema social, para uma série de crianças, como autistas, aquelas com distúrbios neurológicos específicos, antes não incluídas no rol das „anormalidade‟. Mas pode, também (e, muitas vezes, mais fortemente do que a democratização), estar significando a incorporação de um grande número de crianças, sobre as quais temos grandes dúvidas se teriam, efetivamente, algum tipo de necessidade especial. (BUENO, 1997, p. 41)

Na década de 40, cunhou-se a expressão “crianças excepcionais”, cujo

significado se referia, segundo Figueira (2008, p. 94), a “aquelas que se desviavam

acentuadamente para cima ou para baixo da norma do seu grupo em relação a uma

ou várias características mentais, físicas ou sociais”. O senso comum indicava que

essas crianças não poderiam estar nas escolas regulares, o que levou ao

surgimento de entidades destinadas à educação dos deficientes, como Sociedade

Pestallozzi e APAE - Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais. Essas

entidades, até hoje influentes no que tange à educação especial, passaram a

pressionar o poder público para que este incluísse na legislação e na dotação de

recursos a chamada “Educação Especial”, o que ocorreu, pela primeira vez, na Lei

de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei 4.024, de 20 de dezembro de

1961. A Educação Especial no Brasil apareceu pela primeira vez na lei que aponta

que a educação dos excepcionais deve, no que for possível, enquadrar-se no

sistema geral de educação.

Ferreira nos informa que:

Em termos gerais o “especial” da educação escolar se explicita quando o sistema educacional recorre, para atender a necessidades dos alunos, aos seguintes itens, total ou parcialmente: a) Conteúdo especial; b)Método especial; c) material didático especial; d) Pessoal especializado (tanto em termos de competências específicas do professor como pela necessidade da atuação de equipe interdiscipolinar em vários casos ou áreas no raciocínio que a complexidade das deficiências e - por que não dizer?- do processo de inserção do indivíduo na comunidade requer a contribuição de diferentes áreas profissionais). (FERREIRA ,1994, p. 17)

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Compreender suas potencialidades e limitações a partir de testes

psicométricos que determinam o que é a normalidade estabelecida pelo coeficiente

intelectual (QI) é, portanto, direcionar os aspectos pedagógicos para a prontidão,

para a preparação do aluno para a leitura e escrita, e mais do que isso, estabelecer

pré-requisitos para os alunos com deficiência frequentarem as escolas regulares e

poderem acompanhar o planejamento/programa determinado para toda a classe de

forma homogênea. Diante dessas condições há um rápido crescimento das classes

especiais, como descreve Kassar (1999, p.23): “as classes especiais públicas vão

surgir pautadas na necessidade científica da separação dos alunos normais e

anormais, na pretensão da organização de salas de aula homogêneas”.

Sob essa concepção, a exclusão de crianças da escola e das classes

regulares tem como lema “Segregar para Integrar”, apoiado por essas instituições

especializadas, que habitualmente combinaram o atendimento médico e paramédico

a programas de pré-escola, eventualmente de Primeiro Grau e comumente de

profissionalização (chamadas oficinas de trabalho), com caráter mais assistencialista

do que educativo. Por mais chocante e cruel que possa nos parecer tal pensamento

nos dias atuais, é indiscutível o quanto no decurso histórico isso representou

avanços no entendimento e nas possibilidades que se apresentaram para o

deficiente no que diz respeito à sua participação em sociedade; ainda que se

mirasse no alvo, que era o sujeito social, na possibilidade desse sujeito participar da

sociedade, acertava-se no individual, investia-se e buscava-se a mudança apenas

no próprio sujeito. Esse movimento foi chamado de integração, e é um marco na

história da inclusão.

A ideologia integracionista pressupõe condições que possibilitem aos

excepcionias se tornarem parte integrante da sociedade como um todo, e a escola,

nesse sentido, sofre uma supervalorização, sendo compreendida como agência

última da reforma social, sustentando a ideia de que sensibilizar e conscientizar a

comunidade sobre a educação do deficiente é uma condição para integração deste

na sociedade; porém, o que se percebe é que, não é pela colocação do aluno em

um ambiente menos isolado que se assegura a não segregação e que se garante

um ensino com certa competência, pois a decisão de incluir ou excluir antecede a

boa vontade.

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O movimento de integração está ligado à ideia de normalização no sentido de

proporcionar ao deficiente condições de vida similares às de outras pessoas, dando-

lhe possibilidades de uma vida tão normal quanto possível.

Nos anos 70, a Educação Especial ganhou relevância nas discussões

teóricas da Educação; não bastava apenas compreender a educação especial, mas

mobilizar maneiras de melhorar as ações de atendimento educacional especializado.

Em 1978, pela primeira vez, uma emenda à Constituição Brasileira tratou do direito

da pessoa com deficiência: "É assegurada aos deficientes a melhoria de sua

condição social e econômica especialmente mediante educação especial e gratuita".

A Educação Especial ganhou status e movimentos organizados para as

discussões que marcaram a saída dos deficientes da obscuridade para a sociedade,

e principalmente para o poder público, que não podia mais ignorar as políticas, que

passaram a ser incorporadas nas legislações nacionais com a contribuição direta

dos próprios deficientes, como nos confirma Figueira:

Se até aqui a pessoa com deficiência caminhou em silêncio, excluída ou segregada em entidades, a partir de 1981 – Ano Internacional da Pessoa Deficiente -, tomando consciência de si, passou a se organizar politicamente. E, como conseqüência, a ser notada na sociedade, atingindo significativas conquistas em pouco mais de 25 anos de militância. (FIGUEIRA, 2008, p.115)

Esse movimento culminou com a ratificação da Convenção sobre os Direitos

das Pessoas com Deficiência (CDPD) pelo Brasil, conferindo-lhe status de emenda

constitucional. A participação direta e efetiva dos indivíduos com limitações físicas,

sociais e cognitivas na elaboração da Convenção (e posteriormente na sua

internalização) não foi fruto do acaso, mas decorreu do paulatino fortalecimento

desse grupo populacional, que sobreviveu à passagem de todos esses paradigmas

descritos acima, desde garantir a sobrevivência, passando pela segregação,

integração, e alcançando a inclusão, e que passa a exigir seus direitos civis,

políticos, sociais e econômicos.

A nova Constituição, promulgada em 1988, garante atendimento educacional

especializado às pessoas com deficiência, preferencialmente na rede regular de

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ensino. O termo preferencialmente, apontado na Constituição, ainda que possa ser

justificado pelo histórico paradigmático que constituiu a educação dos deficientes no

Brasil, causa polêmicas interpretações, pois a legislação deixa obscura qual é a

diretriz para os deficientes enquanto política pública. Se de um lado aponta para o

horizonte de incluir na escola regular e, consequentemente, na sociedade, por outro,

deixa uma brecha que possibilita a não inclusão, portanto, a segregação. O que e

quem definirá quem pode ou não frequentar a escola regular?

Vivemos neste momento uma crise de valores sociais e éticos, pois as frestas

deixadas pela legislação servem de argumentos para muitos fecharem as portas da

escola para os alunos com deficiência, usando como escudo a falta de estrutura e

de preparação para recebê-los, enquanto uns poucos fazem um esforço titânico de

colocar os deficientes no ensino regular, que afasta até mesmo as crianças com

rótulo de distúrbios de aprendizagem e com problemas de comportamento. A

inclusão escolar dos deficientes acaba ficando à mercê das vontades individuais de

pais, diretores e professores.

A ideia de normalização começou a perder força a partir da ampliação das

discussões sobre a cidadania, que inclui a pessoa deficiente como sujeito detentor

de direitos e de usufruto de oportunidades na sociedade, alavancadas pelas

mudanças sociais e políticas no cenário mundial, que envolvem temas como

desigualdades, diferenças e diversidade.

Nessa perspectiva, a inclusão nasce de um pressuposto de convivência não

segregada e acesso aos recursos a todos os cidadãos, independentemente das

suas condições físicas, intelectuais, sociais e culturais. Não se trata de uma

discussão concebida na deficiência, mas sim, na diversidade e, sobretudo, no

combate ao preconceito com o diferente. A causa dos deficientes se mistura à causa

daqueles que são entendidos como minorias sofredoras de preconceitos.

No ano de 1990, a Conferência Mundial sobre Educação para Todos,

realizada na cidade de Jomtien, na Tailândia, prevê que sejam atendidas as

necessidades educacionais básicas de todos (mulheres, camponeses, refugiados,

negros, índios, presos e deficientes) pela universalização do acesso, promoção da

igualdade, ampliação dos meios e conteúdos da Educação Básica e melhoria do

ambiente de estudo. Nesse mesmo ano, o Brasil aprovou o Estatuto da Criança e do

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Adolescente, que reitera os direitos garantidos na Constituição: atendimento

educacional especializado para portadores de deficiência, preferencialmente na rede

regular de ensino.

Preferencialmente, e no que for possível, não nos permite avançar para a

preocupação de uma Educação para Todos no ensino regular, e as discussões

calorosas se acirram fortemente polarizando posicionamentos. Há os que defendem

a integração, que, conforme esclarece Mantoan (1993), baseia-se no princípio da

normalização; portanto, podemos concluir que nas situações de integração, nem

todos os alunos cabem, e os elegíveis para a inserção no ensino regular são os que

foram avaliados por instrumentos supostamente objetivos e

profissionaisespecialiados ; é uma forma condicional de inserção, em que o sucesso

depende do aluno, do nível de sua capacidade de adaptação às opções do sistema

escolar, seja em uma sala regular, seja na classe especial, ou mesmo em

instituições especializadas. Não se questiona ou se altera a escola; o foco da

integração é o aluno. Outros defendem a Inclusão Total, de forma radical, completa

e sistemática, o que é incompatível com a integração, pois parte do pressuposto de

não deixar ninguém fora do ensino regular desde o começo, ou seja, a mudança

deve ser na escola, e não no aluno. Dessa forma, as escolas inclusivas propõem um

modo de organização do sistema educacional que considera as necessidades de

todos os alunos e que é estruturado em função dessas necessidades, e supõe a

abolição total dos serviços segregados. Mudam as escolas e não os alunos, para

terem o direito de frequentá-las nas salas de aulas do ensino regular.

É necessário contextualizar que a escola regular se encontra bastante

fragilizada pelos sérios problemas que enfrenta para garantir o sucesso dos alunos

sem deficiências, e essa demanda de alunos com deficiência ganha proporções

inquestionáveis, o que leva muitos a não apoiarem a integração, tampouco a

inclusão total, mas uma Inclusão Parcial, gradativa, que respeite a necessidade de

mudanças, não apenas de infraestrutura na escola regular para receber a todos,

mas essencialmente de mudanças nos relacionamentos pessoal e social, e ainda

nas maneiras de se efetivar o processo de ensino-aprendizagem, levando a uma

inclusão não por imposição, mas pela consciência evoluída sobre a educação e o

desenvolvimento humano.

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Em 1994, a Declaração de Salamanca, um dos mais importantes documentos

de compromisso de garantia de direitos educacionais, proclamou que as escolas

regulares inclusivas são o meio mais eficaz de combate à discriminação, e

determinou que as escolas devem acolher todas as crianças, independentemente de

suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais ou linguísticas. Em 1996,

fechando esse ciclo de propostas e desenvolvimento da Educação Especial, a

promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação nº 9.394/96 aponta que a

educação dos portadores de necessidades especiais deve se dar preferencialmente

na rede regular de ensino.

A Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de

Discriminação contra a Pessoa com Deficiência, realizada na Guatemala, em 1999,

em que nosso país é signatário11, tem como princípio o direito de acesso e

permanência ao Ensino Fundamental enquanto direito humano; por isso, toda vez

que se admite o ensino dos alunos com deficiência em idade de acesso ao ensino

obrigatório unicamente na escola especial em substituição ao ensino nas classes

comuns das escolas regulares, está se ferindo o disposto na Convenção da

Guatemala e, consequentemente, na legislação brasileira.

Para Miranda (2003), o paradigma embasado no modelo social de deficiência

tende a reconhecer que trabalhar com classes heterogêneas onde as diferenças são

acolhidas traz benefícios ao desenvolvimento das crianças deficientes e também das

não deficientes, na medida em que estas têm a oportunidade de vivenciar e

significar a troca e a cooperação nas interações humanas. Porém, para que as

diferenças sejam respeitadas e se aprenda a viver na diversidade, são necessárias

mudanças na concepção de escola, de aluno, de ensinar e de aprender.

Não resta dúvida de que as leis, decretos e outros instrumentos legais que

determinam que as escolas regulares recebam os alunos com deficiências ou

transtornos globais do desenvolvimento trouxeram avanços significativos na inclusão

escolar; porém, não é possível afirmar que com isso as práticas docentes possam

ser transformadas. Portanto, a legislação pode ter resolvido o problema de acesso à

escola regular pelos alunos com deficiência, o que, reiterando, significa muito neste

11 O Brasil ratificou sua concordância e compromisso no seguimento do exposto nesta Convenção por meio do Decreto 3956/2001, que em seu artigo 1º estabelece que a Convenção será executada e cumprida inteiramente.

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longo e árduo processo histórico de inclusão escolar; porém, é necessário que

avancemos para mares mais profundos que nos levem à garantia do sucesso de

todos os alunos na escola.

Como nos mostra tabela 2 abaixo com os dados comparativos do Censo

Escolar das matrículas dos alunos especiais na Educação de 2007 à 2012, ,

observamos que houve um significativo avanço do número de matrículas dos

alunos especiais na escola regular, visando a inclusão, especialmente no ensino

fundamental.

É interessante notarmos que o avanço de matrículas nas escolas regulares

está diretamente ligado a queda das matrículas nas escolas ou classes especiais.

Isto se dá especialmente a partir de 2009 e podemos inferir que ocorre em

decorrência da nova Política da Educação Especial na perspectiva da Educação

Inclusiva em 2008.

Nos gráficos A e B podemos analisar a situação das matrículas dos alunos

especiais na educação infantil e do ensino fundamental respectivamente e o que

percebemos é que no gráfico A , em 2010 a Educação Infantil no ensino regular

assume definitivamente a clientela de alunos especiais nas escolas regulares.

Entendendo que as escolas especiais não atendiam a população de alunos menores

que 7 anos e que estes alunos frequentavam apenas Centros de Apoio de

Estimulação Precoce e não escolas, podemos dizer que a inserção destes alunos

nas escolas de educação infantil nos apresentam grandes perspectivas de

continuidade deste alunado na escolaridade regular.

Já o gráfico B que trata das matrículas no ensino fundamental apresenta

dados de que desde 2007 a inserção dos alunos especiais vem se efetivando nas

escolas regulares, isto se deu possivelmente pela indicação das políticas públicas de

escola para Todos, especialmente pela LDB que torna obrigatória o ensino

fundamental de 7 à 14 anos.

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Tabela 2 – Número de Matrículas na Educação Especial por Etapa de Ensino

Brasil – 2007-2012

Ano

Total Geral

Classes Especiais e Escolas Exclusivas Classes Comuns (Alunos Incluídos)

Total

Ed. Infantil

Funda - mental

Médio

EJA

Ed. Prof.

Total

Ed. Infantil

Funda - mental

Médio

EJA

Ed. Prof.

2007 654.606 348.470 64.501 224.350 2.806 49.268 7.545 306.136 24.634 239.506 13.306 28.295 395

2008 695.699 319.924 65.694 202.126 2.768 44.384 4.952 375.775 27.603 297.986 17.344 32.296 546

2012 820.433 199.656 18.652 124.129 1.090 55.048 737 620.777 40.456 485.965 42.499 50.198 1.659

% 2011/2012 9,1 3,0 -21,5 -5,8 -4,4 51,4 -7,5 11,2 2,8 11,2 28,2 5,8 21,9

Fonte: MEC/Inep/Deed. Nota: Não inclui matrículas em turmas de atendimento complementar e atendimento educacional especia lizado (AEE).

Gráfico A – Educação Especial – Número de Matrículas

na Educação Infantil – Brasil – 2007-2012

Gráfico B – Educação Especial – Número de Matrículas

no Ensino Fundamental – Brasil – 2007-2012

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Miranda (2003) nos alerta que a literatura evidencia que no cotidiano da

escola, os alunos com necessidades educacionais especiais inseridos nas salas de

aulas regulares vivem uma situação de experiência escolar precária, ficando quase

sempre à margem dos acontecimentos e das atividades em classe, porque muito

pouco de especial é realizado em relação às características de sua diferença. Estar

na sala de aula regular pode inclusive levar a uma exclusão ainda mais perversa do

que se tinha até então, pois põe uma máscara de inclusão no monstro da exclusão.

À medida que avançamos para os dias atuais, vemos que desde a

Convenção da Guatemala, em 2001, até 2008, com a implantação da nova Política

Educacional para a Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva pelo

MEC, as questões teóricas do processo de inclusão têm sido amplamente discutidas

por pesquisadores da Educação Especial, conscientes de que a inclusão só se

efetivará se ocorrerem transformações estruturais no sistema educacional. Porém,

segundo Miranda (2003), pouco temos avançado nas práticas docentes que

garantam o sucesso desse processo, o que nos remete ao tema desta dissertação.

A Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação

Inclusiva (2008) instaurou a mudança no uso do termo Educação Especial para

Educação Inclusiva, de forma definitiva. Mas, o que isso quer dizer?

A Educação Especial deve transversalizar o ensino regular na busca da

efetivação de uma educação inclusiva, que empenhe todos os seus esforços para o

sucesso de todos os alunos, inclusive os deficientes, para além de perseguir a

eliminação não apenas das barreiras arquitetônicas, mas também das barreiras

atitudinais, muitas delas intransponíveis até o momento.

O assunto cria inúmeras e infindáveis polêmicas, provoca corporações de

professores e de profissionais da área da educação, além de envolver

posicionamentos de pais dos alunos com deficiência e transtornos do

desenvolvimento. Afeta diretamente os professores da Educação Especial, que se

sentem temerosos de perder o espaço e o status que conquistaram nas escolas e

redes de ensino com seus saberes especializados, e que supostamente lhes dá a

condição de saber lidar melhor com os alunos com deficiências e transtornos

globais do desenvolvimento.

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Nessa mesma toada, os professores do ensino regular se consideram sem

competência para atender às diferenças nas salas de aula, desqualificando os

próprios saberes pedagógicos, já que esperam técnicas e procedimentos

diferenciados para ensinar a esses sujeitos. Persistindo no modelo baseado no

déficit, que destaca mais o que a criança não sabe fazer. Esse modelo centra-se na

necessidade do especialista e na busca de um modo terapêutico de intervir, como se

a resolução dos problemas da diversidade estivesse sujeita à formação de

especialistas que se fazem profissionais da deficiência.

Nessa acomodação de paradigmas, há um movimento de pais de alunos sem

deficiências contrários à inclusão dos alunos com deficiência, que se preocupam

com a possibilidade de que as escolas possam baixar e/ou piorar ainda mais a

qualidade de ensino se tiverem de receber esses novos alunos, e dos pais de alunos

com deficiências, que se acostumaram a receber toda a assistência de entidades e

instituições escolares nos cuidados com seus filhos, criando, em muitos casos, uma

dependência para exercer o seu lugar de pais, resistindo à quebra desse modelo

assistencialista vivido até então.

Consoante a isso, somam-se as queixas dos professores de sala comum

pela falta de preparo e estudo sobre as deficiências para lhes fornecer a

competência de que precisam para ter esses alunos nas escolas e há, por outro

lado, a queixa dos professores da Educação Especial, que ao longo da história se

tornaram tão especializados que deixaram de lado os estudos e o acompanhamento

da evolução da Educação como um todo. A formação oferecida aos professores

pautada na apresentação de técnicas e treinamentos teóricos desvinculados da

prática não tem atendido às necessidades para que efetivamente haja uma

transformação da prática docente com ações inclusivas. Há de se pensar em que

tipo de formação precisa ser ofertada aos professores, que caminhe para a

transformação de sua prática docente de forma inclusiva.

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2. INTERFACES DA PRÁTICA DOCENTE NA PERSPECTIVA INCLUSIVA

2.1 LÓCUS DA PRÁTICA DOCENTE: A ESCOLA COMO INSTITUIÇÃO ESCOLAR

Não se pode reformar a instituição sem a prévia reforma das mentes, mas não se pode reformar as mentes sem uma prévia reforma das instituições (MORIN, 2001, p.99).

Ao tratarmos do movimento de inclusão escolar e, portanto, do cenário

educacional, precisamos nos dedicar a esclarecer qual instituição social estamos

tratando neste trabalho: a escola.

Compreender a função da escola desde a sua criação até os dias atuais, sem

dúvida nenhuma, implica compreender a crise paradigmática que se apresenta na

modernidade.

Sabemos que um paradigma está em crise quando não está mais

conseguindo explicar os fenômenos da realidade. Diante da crise, o repensar sobre

o assunto se faz necessário, levando-nos a novos debates, novas buscas e novas

articulações com base em novos fundamentos. É, portanto, como nos apresenta

Moraes (2003), um processo de mudança conceitual, uma forma nova de explicar os

fenômenos, um novo referencial para explicar o mundo.

A escola surge com o propósito de educar as elites, mas é a partir do

Iluminismo, caracterizado pelo movimento de escola para todos, de acesso ao

conhecimento para todos, que a instrução ganha maior destaque. Evidentemente, a

escola, ao se expandir, não dá conta de atender às diferentes necessidades que lhe

são apresentadas, originando as evasões escolares e as dificuldades de

aprendizagem.

A escola, uma invenção da modernidade, traz em suas raízes o modelo

positivista que privilegia o conhecimento científico, e não as subjetividades ou as

multidimensões humanas.

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Moraes (2003) afirma que, ainda que todos nós percebamos o quanto o

mundo vem se transformando de forma acelerada, os professores continuam

ensinando como foram ensinados, com velhos métodos de ensino que não

privilegiam a construção e participação do educando no conhecimento, tampouco o

formam para atuar na sociedade de forma capaz e competente na criação e

recriação desse conhecimento.

A esse respeito, Perrenoud (2002) ilustra:

Um observador que voltasse à vida depois de um século de hibernação notaria mudanças consideráveis na cidade, na indústria, nos transportes, na alimentação, na agricultura, nas comunicações de massa, nos costumes, na medicina e nas atividades domésticas. Se, por acaso entrasse em uma escola, encontraria uma sala de aula, uma lousa e um professor dirigindo-se a um grupo de alunos. Sem dúvida, o professor não estaria mais usando uma longa capa, nem o professor de ensino fundamental usaria uma túnica. Os alunos não usariam mais uniformes nem tamancos. O professor teria descido da sua cátedra, e o visitante acharia os alunos muito impertinentes. Durante a aula, talvez, percebesse alguns vestígios de uma pedagogia mais interativa e construtivista, de uma relação mais afetiva ou igualitária que a existente em sua época. No entanto, em momento algum duvidaria que se encontrava em uma escola. (PERRENOUD, 2002, p.190-191)

Na contemporaneidade, diante das demandas que se apresentam na

sociedade, a escola tem sido obrigada a repensar a sua função. Espera-se hoje da

escola que ela seja reflexiva, que, apoiada em políticas públicas eficientes, sua ação

integre professores, alunos, pais, funcionários e gestores a partir de projetos

interdisciplinares que visem solucionar problemas no seu cotidiano caracterizado

pelas mais diversas fontes e naturezas, assim como que se preocupe com a

formação integral de seus alunos. Seus alicerces precisam estar nas relações e

valores humanos; portanto, a cooperação e a solidariedade são pontos

fundamentais dessa nova configuração do espaço escolar.

A escola precisa considerar que o desenvolvimento da racionalidade humana

hoje se encontra no âmbito da complexidade, como nos ensina Mantoan

(...) evolui a partir de uma rede cada vez mais complexa de encontros entre o homem e sua subjetividade com o cotidiano, com o social, o cultural, invadindo as demarcações dos espaços disciplinares, buscando tangenciamentos, relações, conexões, com táticas, maneiras e artes de inventar o dia-a-dia, que subvertem o estabelecido: a fragmentação das

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disciplinas, a ruptura da compreensão, a cisão entre o saber e o fazer.(MANTOAN, s/d, p.1)

Isso quer dizer, em poucas e objetivas palavras, que não se pensa e se

aprende como antigamente. A escola, embora venha avançando nessas reflexões,

precisa se conscientizar de forma mais eficiente de que não se pode mais ensinar

sem se considerar a diversidade cultural, social, econômica, entre outras tantas

diferenças, assim como não se pode mais compreender o ensino no autoritarismo e

nas certezas postas ao aluno. A escola precisa definitivamente incorporar que,

segundo nos orienta Mantoan (s/d), a origem do conhecimento está no desejo de

estabelecer e fortalecer vínculos que humanizam, criam laços entre o objeto e o

sujeito do conhecimento, pois é segundo esses laços afetivos que o conhecimento

pode se expandir, extrapolar o seu lado simplesmente cognitivo e ir para regiões

mais profundas, como a emoção de aprender “com” o outro, de fazer a “quatro

mãos”.

A esse respeito, algumas de nossas entrevistas tratam de forma mais direta da

questão do vínculo, das relações de afeto interferindo na aprendizagem e na postura

do professor frente às demandas desse alunado. Uma de nossas entrevistadas, a

professora C., diz que divido o sucesso com o aluno incluído com os parceiros nesta

caminhada (professora de AEE, gestão da escola) e conclui: é um trabalho de

muitas mãos.

A professora C., ao falar da importância do vínculo para a aprendizagem, diz em seu

relato: Entendo que a aprendizagem do aluno, a aquisição de conhecimento passa

pelo vínculo com o professor; no começo foi muito difícil porque ele tinha

dificuldades com as frustrações e parecia não querer aprender, ter desistido de si

próprio. E em outro momento, ao tratar de como esse vínculo se estabeleceu,

mostra que frente ao receio da mãe com a possível quebra desse vínculo com a

professora, por ele não fazer as lições de casa e levar bronca da professora,

deixando-o com raiva dela, a resposta da professora para a mãe foi: pode deixar, eu

me garanto. Estando essa garantia no lugar privilegiado do vínculo construído e

sólido, pode sofrer decepções e frustrações, que não se abalará.

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Uma outra professora, J., em sua entrevista, aponta que Muitas pessoas têm nojo de

chegar perto dele, é fato, porque baba, tem uma aparência estranha, não olha nos

olhos da gente, não sabe se cuidar, enfim, é esquisito, mas quando a gente

estabelece o vínculo, o afeto, tudo isto é irrelevante. Estes são alguns relatos de

laços que humanizam, laços que ensinam o aluno e o professor com a inclusão. O

relato todo dessa professora trata bastante da questão do vínculo, das relações de

afeto alavancando a prática docente e as ações pedagógicas, ainda que estas não

sejam exatamente acadêmicas, no sentido de serem aquelas ações formalizadas

que se esperam da escola.

Tratamos até aqui, portanto, de uma escola que nasce alicerçada na exclusão de

muitos, todos aqueles que não pertenciam às elites, caminha para incluir a todos,

porém mantém uma exclusão que se manifesta das mais perversas maneiras, num

jogo desigual de cartas marcadas pelo autoritarismo e pelo poder do saber escolar,

deflagrando a incompetência de muitos desses alunos que adentram as escolas,

mas se evadem ou se mostram com significativas dificuldades de aprendizagem,

reforçando a ideia de que a escola é apenas para aqueles que são dotados de pré-

requisitos, condições prévias para o conhecimento.

Tomando a definição de que escola é o estabelecimento público ou privado

onde se ministra, sistematicamente, ensino coletivo, então, podemos intuir que o

ensino coletivo é, portanto, pressuposto para ser „escola‟.

Para não ser discriminatória e ter a coletividade como público, deve ser o local onde estudam os alunos do bairro, da comunidade, independentemente de suas características individuais. Só assim a escola será o espaço adequado e privilegiado da preparação para a cidadania e para o pleno desenvolvimento humano, objetivos que devem ser alcançados pelo ensino e que estão previstos na Constituição Federal de 1988 (art. 205). (FAVERO, 2004, p.30)

O movimento da inclusão escolar nasce do desejo de que essa definição seja

efetivamente incorporada no espaço escolar; almeja a reforma da escola na

perspectiva inclusiva, não com a ideia de demolição da escola, mas com a ideia de

reconstrução de princípios, conceitos e práticas que mantenham preservados os

alicerces na vocação da instituição escolar de reunir pessoas que buscam o

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conhecimento de forma mútua. Nessa perspectiva, o pensar e o fazer pedagógico

não podem ser desmembrados.

O movimento de inclusão escolar não apenas coloca em cheque mate a escola regular pela forma e meios que ensina, mas também a escola especial que para os deficientes, substitui o ensino regular com soluções paliativas e excludentes. Essa inovação, mudança de paradigma exige mudanças tanto no ensino regular quanto no ensino especializado. (MACHADO, 2006, p.2)

Tratamos de uma crise na escola a partir da inclusão escolar e, portanto, de

uma crise que se estende para uma crise de identidade nas diferentes instâncias

que compõem a escola: identidade institucional, identidade dos professores e

identidade dos alunos.

Mitler contribui com esse propósito quando nos apresenta o que define como

inclusão:

Inclusão implica em uma reforma radical nas escolas em termos de currículo, avaliação, pedagogia e formas de agrupamento dos alunos nas atividades de sala de aula. Ela é baseada em um sistema de valores que faz com que todos se sintam bem vindos e celebra a diversidade que tem como base o gênero, a nacionalidade, a raça, a linguagem de origem, o background social, o nível de aquisição educacional ou a deficiência. (MITLER, 2003, p.34)

E as Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Especial complementam ao

definir escola inclusiva:

(...) implica uma nova postura da escola comum, que propõe no projeto político pedagógico, no currículo, na metodologia de ensino, na avaliação e na atitude dos educandos, ações que favoreçam a integração social e sua opção por práticas heterogêneas. A escola capacita seus professores, prepara-se, organiza-se e adapta-se para oferecer educação de qualidade para todos, inclusive, para os educandos com necessidades especiais...Inclusão, portanto, não significa, simplesmente matricular os educandos com necessidades especiais na classe comum, ignorando suas necessidades específicas, mas significa dar ao professor e à escola o suporte necessário à sua ação pedagógica. (BRAS|IL, 2001)

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Para Mantoan (2001), a proposta de uma escola inclusiva deixa de ser utopia

ou sonho na medida em que a partir dos princípios norteadores dos sistemas

educacionais modernos – democratização do acesso à escola, gestão participativa,

qualidade de ensino, formação continuada de professores e garantia de atendimento

aos excluídos, respeitadas as diferenças sociais, culturais, étnicas, entre outras –

novas práticas se instalam no espaço escolar, mostrando que essa é uma proposta

exequível e cabível na Educação.

Tratar de práticas pedagógicas inclusivas significa, portanto, considerar uma

prática em que tudo está em movimento, em que o conhecimento se constrói

coletivamente por meio de vivências, experiências e interações no contexto escolar;

uma escola que não tem valores e medidas pré-determinadas de desempenho

escolar e, portanto, não exclui nenhum aluno da possibilidade de desenvolver o seu

pensamento ainda que da forma mais plural possível. A isso chamamos de escola

inclusiva.

Nas escolas inclusivas, a autonomia social e intelectual é objetivo para todos

e norteia a formação dos alunos e de seus professores. Significa que nessas

escolas, a produção de conhecimento não segue critérios rígidos fragmentados por

disciplinas estanques e desarticuladas, mas configura redes imprevisíveis de ideias

que se cruzam, cheias de originalidade e singularidade.

A esse respeito, os professores entrevistados trazem alguns apontamentos

em seus relatos. A professora C., ao relatar uma situação de sobrecarga para uma

única aluna que se disponibilizou a contribuir com as tarefas junto ao aluno incluído,

dado o grau de dependência que este apresentava para locomoção, higiene e

realização das atividades, diz: tive uma ideia boba, quer dizer, a gente às vezes tem

uma ideia tão boba, tão simples, mas que funciona e resolve o problema. Foi uma

ideia boba, mas ninguém tinha pensado nisso. E acrescenta mais adiante, após

relatar a solução que encontrou junto com a classe para o problema que foi a

montagem de uma planilha para os voluntários em ajudar o colega: isto para mim

era uma ideia boba, uma besteirinha, mas fez a diferença para ele. É exatamente

nesse movimento cotidiano que as práticas inclusivas vão se construindo.

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A professora B. diz o que pensa ser inclusão: Inclusão é assim, não tem nada

pronto, a gente vai construindo. É um processo até a gente conseguir que o aluno

faça as atividades tanto quanto os demais, a gente vai por ensaio e erro. Para esta

professora, incluir significa tentar sempre, não desistir de ensinar, e é um processo

de todos os dias.

A professora D. diz: eu me preocupo com todos da sala de aula, gosto de ver

todos avançarem, cada um no seu ritmo e do seu jeito. Para esta professora, incluir

é oferecer possibilidades e oportunidades até que a aprendizagem aconteça, pois

nenhum aluno pode estar excluído dela.

A professora G. nos desafia em seu relato com um questionamento: , Será

que a inclusão não é isso mesmo, aprendizagem de todos os alunos? Noêmia12 não

foi um estorvo na minha sala, fui aprendendo aos poucos com ela e ela comigo.

Podemos entender que é dessa autonomia intelectual e social que a educação

inclusiva tem se ocupado de desenvolver na formação de alunos e professores.

Neste contexto e em busca de práticas inclusivas, cabe ao professor ser o

orquestrador dos diferentes modos de viver, de ser e de conviver dos seus alunos,

suscitando novas ideias, respeito a valores e sentimentos com relação às diferenças

sociais e culturais. Seus professores não são especialistas nesta ou naquela

dificuldade de aprendizagem ou característica de aluno, mas são comprometidos

com todos os alunos e se ocupam de atender à heterogeneidade da classe.

Quanto a isso, a professora B. nos ensina com a sua prática na sala de aula

quando conta sua estratégia para trabalhar com as diferenças a partir das questões

suscitadas pela aluna com síndrome de Down que tinha incluída nesse ano, fossem estas

da ordem da discriminação e preconceito, fosse da ordem da compaixão e piedade. Ela

relata que: Em função disso eu trabalhei com a classe um texto sobre a diversidade,

não sobre deficiência, sobre a diversidade, falamos da diferença da Bruna, porque

ela é muito diferente deles, mas falamos de quem é gordinho, de quem usa óculos,

de quem é muito alto e tantas outras diferenças, ser diferente é normal, somos

diferentes de maneiras diferentes.

12 Noêmia é o nome fictiício dada a aluna incluída na sala de aula da prof. G, visando preservar a identidade da aluna

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A função da escola é mostrar que eu posso ser diferente, e ter a possibilidade

de ter uma criança de inclusão na sala ajuda muito eles a entenderem isso.

Mantoan (2004), considera a escola inclusiva como aquela que acolhe a todos

e propõe a fusão da educação especial ao ensino regular em uma escola única, que

não esteja apoiada em subsistemas paralelos que discriminam dentro e fora da

escola e que consideram ineficientes aqueles que não se enquadram nos modelos

de bom aluno.

(...) o papel da educação especial, na perspectiva inclusiva, é, pois, muito importante e não pode ser negado, mas dentro dos limites de suas atribuições, sem que sejam extrapolados os seus espaços de atuação específica. Essas atribuições complementam e apoiam o processo de escolarização de alunos com deficiência regularmente matriculados nas escolas comuns. (MANTOAN, 2004, p.43)

Tratamos aqui de uma nova função social da escola, que é a educação para a

cidadania global, livre de preconceitos e que se dispõe a reconhecer a

complementaridade entre as pessoas. Trata-se, portanto, da construção de uma

nova ética, que não mais se ocupe de categorizar os alunos, mas que considere

prioritariamente valores como solidariedade, fraternidade, coletividade e cooperação,

esão desenvolvidas ao mesmo tempo que se desenvolve a consciência coletiva,

dando lugar a consciência individual.

Até aqui tratamos da crise da identidade institucional, porém ainda nos resta

tratar da crise da identidade do aluno nessa nova perspectiva de educação inclusiva.

O aluno da escola inclusiva é outro sujeito, não tem uma identidade fixa,

permanente, essencial como na escola das exclusões. Como nos mostra Mantoan

(2001) ao citar Hall:

Esse aluno engloba um conjunto diversificado de identidades, diante de um eu que não é sempre o mesmo, seguro e coerente, mas um eu cambiante, com cada um dos quais podemos nos confrontar e nos identificar temporariamente. (Hall, 2000 apud Mantoan, 2001)

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Podemos dizer que a escola inventou o aluno e o definiu e representou por

meio de seu poder institucional e social, agrupando-o e rotulando-o segundo seus

parâmetros identitários em busca da “normalização” de características de

desenvolvimento e de pensamento. A inclusão, porém, traz à tona a contestação a

essa definição de identidade do alunado, marcada concretamente pela presença da

diversidade nas salas de aula, contrariando os parâmetros de igualdade,

homogeneidade e normalização.

Não temos mais na contemporaneidade o mesmo alunado de quando a

escola foi criada, e ainda que a escola pouco tenha se modificado para receber essa

diversidade, ela existe e está à sua porta.

Da mesma forma, precisamos discutir sobre a identidade do professor. Quem

é esse professor da escola inclusiva? O que ele deve fazer de diferente dos

professores de outrora, quando as suas classes tinham como característica uma

suposta homogeneidade? Podemos afirmar que o que se pretende atingir nessa

identidade é que esse professor saiba acolher o novo e, muitas vezes, o

desconhecido, presente em cada criança, porque, livre de preconceitos, esse

professor deve ser comprometido politicamente com a função social e cultural da

escola, que é ensinar para construir conhecimentos recheados de sentidos para seu

alunado.

O professor inclusivo reconhece que as diferenças não são impeditivas de

pensar e de poder decidir por si próprio; esses professores são capazes de refletir

individual e coletivamente, aprendendo a fazer, aprendendo a aprender, aprendendo

a conviver com as diferenças e com as dificuldades, enfim, aprendendo a ser

verdadeiros educadores.

Fechamos esta reflexão com uma parte do relato da professora B., que

expressa esse movimento do professor, que, a partir da inclusão, habitua-se a

pensar inclusivamente: eu tenho para mim que estamos formando pessoas

diferentes do que fomos formados, é nisso que eu acredito.

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2.2 PRÁXIS13 DOCENTE

Ao abordarmos a práxis docente, temos por objetivo refletir sobre como se

constrói a atividade prática do professor no espaço escolar, considerando que

qualquer profissão exige o exercício de uma atividade prática na execução de uma

tarefa. A atividade docente é, ao mesmo tempo, prática e ação.

Prática, na medida em que é sistemática, executada em um espaço

organizacional, e tem por objetivo garantir o conhecimento por meio de diferentes

métodos e técnicas aplicadas em sala de aula.

Ação, na medida em que é inerente ao sujeito agir sobre o ambiente em que

está inserido, sendo essa ação fundamental para a reflexão da prática, o que nos

remete a concluir que a ação docente está intimamente ligada à subjetividade do

professor.

É, portanto, nesse movimento de exercício da prática docente, caracterizada

pela ação sobre o ambiente, que inevitavelmente leva à reflexão sobre essa ação,

que se dá a práxis docente, ou seja, é no processo de reflexão-ação-reflexão que o

professor deixa de ser um mero objeto de investigação e passa ele próprio a ser o

sujeito da investigação, superando as generalizações dos conteúdos didáticos, mas

tornando-se agente de mudanças que, a partir da criticidade, realiza adaptações que

atendam a comunidade escolar em suas necessidades. É nesse movimento de

atividade reflexiva sobre a própria prática que o professor pesquisa o próprio

trabalho buscando torná-lo de melhor qualidade para todos os alunos.

O processo reflexivo pode ser movido por diferentes situações: a sensação de

fracasso, de impotência, de desconforto, ou situações que tiveram bons resultados,

que causam satisfação e prazer; porém, em ambos os casos, a reflexão é fomentada

pela vontade de realização de um trabalho eficaz e ético. O que faz a diferença nas

não é a prática, a sistemática, mas a forma de ação que está ligada à subjetividade

dessa prática.

13 Para esta dissertação adotamos o termo práxis segundo nos define Aristóteles (2001), como ação no sentido forte do termo, e afirma estar essa relacionada diretamente com a phrônesis, a capacidade

de discernimento necessária para se agir corretamente; em outras palavras, constitui-se como o próprio objetivo da ação. O atuar práxico sempre leva um sentido e um valor em si mesmo e já cumpre seu objetivo pelo mero fato de se suceder como algo correto e justo, independentemente se o agente atinge na realidade o que desejava mediante sua ação.

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Vemos isso claramente ao analisarmos os relatos das entrevistas dos

professores escolhidos pelas boas práticas que desenvolveram com os alunos

incluídos em suas salas de aula comuns. As propostas de aplicação de métodos e

técnicas são as mais diversas possíveis frente à inclusão, porém, em comum, todos

eles apresentam a ação decisiva de se envolver com esse aluno, de se comprometer

com a sua aprendizagem e de não desistir frente às dificuldades. Essa postura

tomada por esses professores frente à inclusão reflete a postura que assumem

diante da vida, reforçando a ideia de que a subjetividade é fator preponderante nas

ações docentes que constituem a prática docente.

O professor que busca uma postura crítico-reflexiva em suas experiências faz

uma leitura de mundo que beneficia a construção de atividades que dialeticamente

sejam o ponto de partida e de chegada de sua prática pedagógica. A postura

reflexiva exige uma decisão do professor: aceitar fazer parte do problema e ter a

consciência de que a prática reflexiva não é solitária, como nos alerta Perrenoud

(2002, p.198): “Além disso, uma prática reflexiva profissional nunca é totalmente

solitária. Ela se baseia em conversas informais, em momentos organizados de

profissionalização interativa (....)”

Nesse movimento construtivo de práxis docente, muitas são as variáveis a

serem refletidas, e sem qualquer intenção de esgotá-las em diversidade, tampouco

em profundidade, apresentamos nos tópicos abaixo algumas delas.

2.2.1 Implicações da formação na prática docente inclusiva

Quando tratamos da formação de professores, dada a amplitude do tema, é

imprescindível que delimitemos alguns aspectos a serem abordados: formação

inicial e formação continuada; capacitação e especialização no processo de

formação de professores, por exemplo, são alguns deles.

Apesar de ser muito limitante para a subjetividade humana localizar um

momento da sua vida em que se dá a escolha por esta ou aquela profissão, levando-

se em consideração as tantas e tão diferentes situações vivenciadas, poderíamos

considerar que a formação inicial não começa na graduação, mas muito antes disso.

Porém, de forma mais direcionada e acadêmica, podemos dizer que a formação de

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professores inicial é aquela que é considerada como o momento de preparação para

o exercício da vida profissional, portanto, aquela ofertada pela graduação.

Durante muito tempo a formação inicial foi considerada suficiente para a

preparação do indivíduo para a vida profissional; no entanto, o ritmo acelerado e os

avanços do conhecimento imprimiram a necessidade de atualização constante para

aqueles que atuam no campo educacional, dando lugar para a formação continuada,

conforme nos asseguram Rodrigues e Esteves:

A formação não se esgota na formação inicial, devendo prosseguir ao longo da carreira, de forma coerente e integrada, respondendo às necessidades de formação sentidas pelo próprio e às do sistema educativo, resultantes das mudanças sociais e/ou do próprio sistema de ensino. (RODRIGUES E ESTEVES 1993, p.41)

Para Nóvoa (1995), a formação inicial não é mais considerada o lócus que

encerra a competência necessária para ser professor; se assim o fosse, poderia

implicar compreender o professor como um técnico do ensino, ou seja, limitar a

atividade do professor sob o viés apenas instrumental, apoiado em teorias e técnicas

científicas. Estes e outros assuntos abriram campo para a ampliação das discussões

sobre a formação dos professores, levando a uma possível compreensão de que, se

é necessária a formação inicial para tornar-se professor, é necessária a formação

continuada para ser professor. Corroborando com isso, as Diretrizes Curriculares

Nacionais para a formação de professores da educação básica em nível superior

(2001) reforçam que não basta que o professor aprenda e saiba “fazer”; é preciso

que ele, além de saber e de saber fazer, compreenda o que faz e por que faz. Em

outras palavras, podemos dizer que não basta executar; precisa pensar sobre o que

faz.

Zeichner (1993, p.17) nos auxilia nesse aspecto quando aponta que “(...)

independente do que fazemos nos programas de formação de professores e do

modo que o fazemos, no melhor dos casos, só podemos preparar os professores

para começar a ensinar”.

Com relação a esse aspecto, levantamos em nossas entrevistas que quase

todos os professores escolhidos por terem boas práticas inclusivas são professores

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que buscaram a formação continuada na pós-graduação, desafiados pelas

dificuldades frente às inclusões que tiveram no percurso educacional, como nos

contam em seus relatos as professoras: Eu peguei uma inclusão nesta rede em

2003, a minha primeira inclusão, eu não sabia nem o que fazer, foi muito difícil, e

decidi buscar formação, pensei comigo, já que tenho este aluno, vou atrás de saber

o que tenho que fazer lá na pós (professora B); e a professora C., que diz: por conta

dele fui até fazer a pós- graduação em educação inclusiva, tô fazendo ainda .

Relacionando esses aspectos à formação docente, podemos apontar que a

tendência atual dessa formação está direcionada para a profissionalização do

trabalho docente, compreendida, à luz de autores como Tardif (2002), como a

construção de competências e saberes que podem ser reagrupados a partir da

prática pedagógica, ou seja, a profissionalização se dá não pela aplicação de teorias

construídas fora da prática, mas pela produção de saberes e práticas inovadoras.

Assim, a partir de situações complexas que decorrem em sala de aula no cotidiano

escolar, que não estão descritas em manuais e que exigem muito mais que receitas

de como fazer, há uma exigência de procedimentos inovadores e criativos na

resolução desses problemas, tal como tem sido com a inclusão dos alunos com

deficiência nas classes comuns. Não se trata de manuais de como fazer, ou

justificativas de por que incluir enquanto princípios teóricos pautados em legislação,

mas, especialmente, de uma construção de práticas que podem transformar o ofício

do professor no caminho da sua profissionalização, entendida aqui como aquela que

se constitui não só na aprendizagem e no cumprimento das regras, mas também na

construção da autonomia profissional.

Reforçamos aqui a ideia de que parte da construção dessa autonomia está na

compreensão de que não há resultados definitivos na educação de qualquer aluno,

pois há de se levar em conta que os resultados da ação planejada e o contexto em

que essa ação se aplica são imprevisíveis. Porém, ainda que a autonomia não

garanta o sucesso, ela permite que se enfrentem os limites do trabalho prescrito

para tornar a tarefa suportável e possível de realização, pois, em muitos casos, as

prescrições são falhas e incompatíveis com as condições e materiais disponíveis.

Nessa circunstância, a autonomia e responsabilidade do profissional dependem

essencialmente da sua capacidade de refletir em e sobre a sua ação.

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Segundo Tardif (2002), o modelo atual de formação docente é o de formação

que supõe um continuum, o qual, em geral, é realizada em serviço, alternando

momentos de atuação profissional com momentos de formação.

O princípio dessa formação continuada é de que a prática é geradora de

saberes que devem ser desvelados para serem incorporados nos processos de

formação inicial ou contínua; e ainda, que deve reconhecer que há relação entre a

dimensão pessoal, profissional e organizacional (Nóvoa,1992); isso nos remete à

compreensão da dimensão individual e coletiva na aprendizagem dos

conhecimentos necessários ao exercício profissional e a uma abordagem teórico-

metodológica, que dá voz ao professor a partir da análise de trajetórias e histórias de

vida, da natureza e da mobilização desses saberes quando aplicados nas situações

profissionais.

O sujeito-professor é um agente social, fruto das interações estabelecidas

entre os campos sociais de que participa e sua subjetividade. Frente a essa

constatação, é possível afirmar que grande parte dos problemas tratados pelos

profissionais das Ciências Humanas não figura em livros e não pode se resolver

apenas com saberes teóricos e procedimentos ensinados.

. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN/9614, ao tratar

dos profissionais da educação, define três campos de formação no âmbito do

magistério: a inicial, para formação de professores para a educação básica; a

pedagógica15, destinada aos portadores de diploma de ensino superior que queiram

atuar na educação básica; e a contínua, que deve ser oferecida aos profissionais da

educação dos diversos níveis de ensino. Porém, é a partir dos anos 80 que novos

estudos, nos mais diferentes temas educacionais, ganham visibilidade e participação

dos professores, entre eles, o tema continuum na formação, especialmente com as

contribuições de Nóvoa (1991;1992;1995;1997), que traz à tona a indissociabilidade

da formação e as experiências vividas, sendo essas práticas profissionais terreno

fértil para a formação continuada do professor. A proposta que o autor defende é a

de que o fazer cede lugar para o saber reflexivo, de forma que a teoria e a prática

14 LDBEN/96 título VI, artigos 61 a 67. 15 Abordaremos neste texto apenas a formação inicial e a formação continuada, não sendo a formação pedagógica objeto de aprofundamento necessário para o nosso foco.

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não sejam campos de formação distintos, mas associados às experiências e à

construção da identidade para a vida e para a profissão.

(...) a formação não se constrói por acumulação (de cursos, de conhecimentos ou de técnicas), mas sim através de um trabalho de reflexividade crítica sobre as práticas e de (*re)construção permanete de uma identidade pessoal. Por isso é tão importante investir na pessoa e dar um estatuto ao saber da experiência. (NÓVOA, 1992, p.25)

Confirmando essa ideia de indissociabilidade da formação e as experiências

vividas, observamos em nossos relatos que todos os professores escolhidos pelas

boas práticas inclusivas que exercem na escola já tiveram inclusões em outras

ocasiões, e grande parte destes apresentam essas experiências muito vivas em

seus relatos, como a professora C.: Me lembro que quando dei aula no 7º ano, eu

tive um aluno com uma deficiência muito grave motora, não tinha condições de usar

as mãos e andava de cadeira de rodas, mas era muito inteligente (...) não sei como

ele está hoje , a sequência dos fatos, mas naquele momento, fez a diferença.

A professora D. também relata sua experiência: já tive diferentes inclusões,

deficiente mental, visual. Mas meu maior desafio é o aluno com paralisia cerebral,

que é inteligente; este eu tive no Infantil, porque eu não me conformava de não

conseguir adaptar um circuito motor para ele participar junto com o grupo. Formação

Continuada, portanto, pode ser compreendida como aquela que ocorre ao longo da

carreira profissional desde a entrada do profissional no mercado de trabalho. Em

geral, essa formação tem como cenário espaços específicos para cursos e palestras,

que, como nos afirma Tardif et al. (1991), têm como incumbência transmitir

conhecimentos responsáveis apenas por remediar a obsolescência dos

conhecimentos adquiridos na formação inicial, fundamentada em uma visão fabril

dos saberes, fruto de uma sociedade em que há ocupação privilegiada das

pesquisas científicas e eruditas no papel essencial na produção de saberes válidos e

críveis.

A LDB/96, em seu artigo 61, inc. I, ao tratar da formação continuada, destaca

o papel da formação em serviço, mas sem definir princípios e procedimentos para a

sua realização: “A formação de profissionais da educação [...] terá como

fundamentos: a associação entre teorias e práticas, inclusive mediante a

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capacitação em serviço.” E acrescenta, em seu artigo 67, inc.II, “que os sistemas de

ensino deverão valorizar os profissionais da educação e assegurar-lhes, por meio

dos estatutos e planos de carreira, o aperfeiçoamento profissional continuado”.

Formação em serviço é, então, compreendida como aquela que ocorre em

serviço, ou seja, ocupando o espaço e o tempo escolar para qualificação docente,

tendo em vista possibilidades de melhoria de sua prática pelo domínio de

conhecimentos e métodos de seu campo de trabalho. Cabe, no entanto, a

necessidade de esclarecer sobre a relação que se pode ou não estabelecer entre a

formação continuada e a formação em serviço. Nesse sentido, é necessário

destacarmos que formação em serviço é uma estratégia para garantir a formação

continuada, porém, não é e não pode ser entendida como única, já que esta, a

formação continuada, se estende para o campo profissional e não pode estar

restrita ao ambiente escolar exclusivamente, sendo necessário estimular o

profissional este a buscar formação continuada independentemente daquela que é

oferecida pelos sistemas de ensino.

Merece ressalvas a nomenclatura citada na LDBEN/96 acerca da formação

de professores; ainda que o documento faça uso do termo “formação”, ao qual

subjaz a concepção de conhecimento como eixo, por meio da busca de superação

das problemáticas educacionais, utilizam-se concomitantemente termos como:

“capacitação”, ao qual subjaz a ideia de persuasão a-crítica de novas ideias sob a

alegação da inovação e melhoria educacional; e ainda, “aperfeiçoamento”, cuja

inadequação reside no fato de que o processo educativo não é compatível com

ações que visam completar, concluir ou tornar alguém perfeito, propósitos estes

incompatíveis com a natureza humana e com os objetivos educacionais; e por

último, mas não menos importante, a expressão “treinamento”, que significa tornar

apto ao exercício de determinada tarefa, o que não vai ao encontro dos objetivos

educacionais, uma vez que em educação, não se pretende modelar

comportamentos ou ações padronizadas, mas formar pessoas que fazem uso da

inteligência.

Ainda que as pesquisas na década de 80 encaminhadas pelo Banco Mundial

com vistas ao levantamento de dados dos investimentos necessários na educação

alertem sobre a formação inicial pouco eficiente na formação do professor, a solução

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adotada no Brasil não foi promover mudanças significativas na formação inicial, mas

investir na formação em serviço, pois essa modalidade de formação, supostamente,

teria o melhor custo-benefício, ou seja, renderia mais com menores investimentos,

talvez por ser a formação continuada multiforme, podendo ser de âmbito pessoal ou

institucional, de caráter individual ou coletivo, e ainda presencial ou a distância.

No entanto, a eficiência dessa formação não tem sido comprovada, já que a

formação em serviço continua atrelada aos mesmos esquemas da formação inicial, o

que não atende mais às expectativas de formação de professores em geral.

A formação contínua, reconhecidamente compreendida pela pesquisa

educacional numa perspectiva de educação permanente, é definida, planejada e

implementada na rede de ensino como um conjunto de ações pontuais, promovidas

com data e carga horária definidas, configurando um modelo questionável, “(...) com

ênfase na “reciclagem” científica e pedagógica como forma de atualizar e

complementar o saber de que o professor é portador ou para modificar o sistema de

ensino (...)” (NUNES, 2001, p. 61-62).

Candau (2003) denomina essa organização de formação continuada sob o

prisma de formação clássica, que é predominante na tradição educacional brasileira,

os professores precisam retornar aos espaços tradicionais de formação

(universidades e outros) para “atualizar” seus conhecimentos, o que é altamente

questionável:

Por trás dessa visão considerada “clássica” não está ainda muito presente uma concepção dicotômica entre teoria e prática, entre os que produzem conhecimento e o estão continuamente atualizando e os agentes sociais responsáveis pela socialização destes conhecimentos? (CANDAU, 2003, p. 54-55)

Nóvoa (1991) nos alerta ainda para dois grandes focos da formação

continuada: o primeiro, que é como processo crescente na autonomia do professor e

da unidade escolar; e o segundo, do pensar o fazer dos agentes educativos e, por

consequência, concretizar o objetivo educativo da escola. Isso implica associar a

formação continuada à inovação de práticas pedagógicas e, consequentemente, das

mudanças educacionais, seja no âmbito da sala de aula, seja no contexto escolar

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como um todo, o que corroboramos com Nóvoa (1997, p.28) quando refere que “(...)

hoje não basta mudar o profissional; é preciso mudar também os contextos que ele

intervém”.

Nesse sentido, não é mais possível compreender no contexto atual as

mudanças na educação sem a participação ativa dos professores, como nos aponta

Canário ao falar do professor:

Até agora ele tem sido encarado, fundamentalmente, como o executor de decisões e de proposta de mudança que lhe são exteriores. A reinvenção da escola exige, também como condição necessária, que o professor, em vez de “aplicar” a reforma, possa emergir como produtor de inovações. ( CANÁRIO 1993, p.98)

Nessa direção, Collares, Moysés e Geraldi (1999, p. 210), ao discutirem a

visão de sujeito e conhecimento subjacentes às propostas de educação contínua,

argumentam que “(...) a educação continuada que mantém a separação entre

produção e utilização de conhecimento, entre sujeitos e conhecimento, não só

desvaloriza os saberes, mas também os sujeitos que os produzem”, sendo

necessário substituir o conhecimento obsoleto pelo novo, num recomeçar sempre,

condenado à eterna repetição, porque a profissão parece nada ensinar. E continua,

“No entanto, são os saberes produzidos na escola, junto com outros colegas e

alunos, que iluminam e dirigem as práticas mais significativas do processo de

formação social e intelectual a que se dedicam professores e alunos” (1999, p. 211).

Com relação a isso, podemos ilustrar com nossas entrevistas com a

professora B., ao se referir em seu relato à proposta de um circuito sensorial criado

na escola para que o aluno com paralisia cerebral pudesse participar do circuito:

Deixei as gestoras doidas, dizia em toda reunião que precisava de material diferente

para ele, até que consegui montar um circuito sensorial, em outubro, mas tudo bem,

foi antes de acabar o ano, e o que vi é que todas as crianças aproveitaram muito e

adoraram as atividades, e que se não tivesse tido ele, eu não teria tido esta ideia,

porque por onde eu ia, pensava nele.

Até a Constituição Federal de 1988, que instituiu o atendimento educacional

especializado para os portadores de deficiência, o cenário educacional que tínhamos

estava muito claramente delineado entre a Educação Regular, formada por escolas

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e professores para alunos considerados normais (sem deficiência ou transtornos do

desenvolvimento) e a Educação Especial, formada por escolas e classes especiais

onde atuam os professores especialistas16. Essa forma de organização da Educação

foi construindo um abismo entre elas, por consequência, estendendo esse abismo

também à formação de seus professores.

Se fizermos um recorte nas exigências legais da formação inicial para

atuação como professores, já poderemos analisar que há um distanciamento entre a

educação especial e a educação regular, justificado pela especificidade das

necessidades dos alunos com deficiência e transtornos globais do desenvolvimento.

A LDB 9394/96, em seu art. 62, refere-se à formação de docentes, seja em

universidades, seja em Institutos Superiores de Educação, admitida a possibilidade

do Curso Normal Médio para o exercício docente nos anos iniciais da escolarização.

Já o art. 63 se refere à formação de profissionais para a educação básica dentro dos

Institutos Superiores de Educação, dos quais fará parte o Curso Normal Superior,

destinado aos docentes da Educação Infantil e dos anos iniciais da escolarização.

Refere-se, pois, à formação de profissionais de educação, da qual certamente os

docentes fazem parte, enquanto que o art. 62 fala em formação de docentes. O art.

64 fala também dos profissionais de educação, mas, nesse caso, refere-se aos

então chamados especialistas. Sua formação far-se-á em cursos de Pedagogia,

podendo ser realizados no nível de graduação ou de pós- graduação. Mas eles

deverão se formar tendo uma base comum nacional.

Sob a visão de atribuições do professor, boas diferenças separaram o

professor da sala regular do professor especialista na política de escolarização de

alunos com deficiência e transtornos globais do desenvolvimento. Ao professor da

Educação Especial, considerando as condições especiais de que esses alunos

necessitavam, caberia aprender diferentes técnicas e métodos para favorecer a

aprendizagem possível desse alunado dentro do recurso escolar especializado; as

escolas especiais tinham o privilégio de ter menor número de alunos em sala de

aula, apoio de equipe técnica e médica no recurso escolar, materiais diferenciados e

16 Cabe esclarecer que chamamos de professores especialistas aqueles que além da formação

superior em Pedagogia carregam as especialidades como habilitaçõesou especializações. Estas especialidades são direcionadas a deficiência visual, auditiva, mental e física.

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propostas curriculares totalmente modificadas e ajustadas às condições de

aprendizagem desses alunos.

Já ao professor do ensino regular caberia a regência da sala de aula, até

então composta por alunos com desenvolvimento normal e, portanto, com

possibilidades de aprendizagem naturalmente, o que remetia ao professor aplicar o

currículo oferecido igualmente a todos os alunos, planejado com a consideração de

condições pré-determinadas oferecidas pelo potencial de desenvolvimento em

aprender. Nesse contexto, o aluno que não coubesse no currículo da escola, estaria

automaticamente excluído do ensino regular.

Sob esse aspecto, em 1994, a Declaração de Salamanca aponta de forma

mais incisiva para a escola inclusiva com indicações para que os governos se

ocupem da capacitação de seus educadores tanto em nível inicial quanto em nível

continuado, com ações de formação em serviço. Consta na Declaração:

(...) maior desafio consiste em organizar formação em serviço para todos os professores, tendo em consideração as diversas e muitas vezes, difícieis condições em que trabalham. A formação em serviço deverá realizar-se, sempre que possível, ao nível da escola, através da interação com os orientadores e apoiado pela formação à distancia e outras formas de auto formação. (UNESCO, 2004, p.28)

Destaca ainda a necessidade da formação dos professores especializados

em educação especial:

45. A formação especializada em educação dos alunos com necessidades educativas especiais que conduz a qualificações adicionais deverá normalmente ser integrada ou seguir-se ao treino e experiência no ensino regular, de forma a permitir a complementariedade e mobilidade.

46 É preciso repensar a formação de professores especializados, a fim de que estes sejam capazes de trabalhar em diferentes situações e possam assumir um papel-chave nos programas de necessidades educativas especiais. Deve ser adaptada uma formação inicial não categorizada, abarcando todos os tipos de deficiência, antes de se enveredar por uma formação especializada numa ou em mais áreas relativas a deficiências especificas. (UNESCO, 2004, p.28)

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Se, por um lado, os professores do ensino comum denunciam não terem

formação para o atendimento desses alunos, por outro, historicamente, os

professores especializados atuam em serviços de educação especial, em formas de

atendimento organizadas fora da escola comum, em grupos de pessoas com um tipo

de necessidade especial. A sua experiência e formação estiveram até então

centradas no atendimento às pessoas com deficiência mental, auditiva, visual ou

física, muito mais do que no atendimento de deficiências múltiplas e nos transtornos

globais do desenvolvimento.

A formação desses professores especialistas passa, então, a ser olhada por

outro ângulo, justificada pela diversidade de necessidades educacionais especiais

que se apresentam; esta precisa abarcar todas as especificidades, o que soa, no

mínimo, estranho, pois, de que forma um especialista pode ser um generalista?

Tanto na formação extremista de especialização quanto na formação polivalente –

generalista – o ponto em comum pode ser o mesmo que não nos faz avançar numa

perspectiva inclusivista pois ignora as diferenças pelo enclausuramento de grupos

de professores com seus pares, quanto pode negar as especificidades que os

identificam e distinguem.

Para atender a toda a diversidade que se apresenta na escola em termos de

deficiência e transtornos globais do desenvolvimento, ao professor especialista

caberá uma formação específica em comparação ao professor da sala comum, mas,

apesar de específica, não poderá ser em uma ou outra deficiência, pois deverá ser

conhecedor de todas elas, podendo esse profissional atuar de forma mais

abrangente na educação. Assim nos diz a Política Nacional de Educação Especial

na perspectiva da Educação Inclusiva:

Para atuar na educação especial, o professor deve ter como base da sua formação, inicial e continuada, conhecimentos gerais para o exercício da docência e conhecimentos específicos da área. Essa formação possibilita a sua atuação no atendimento educacional especializado e deve aprofundar o caráter interativo e interdisciplinar da atuação nas salas comuns do ensino regular, nas salas de recursos, nos centros de atendimento educacional especializado, nos núcleos de acessibilidade das instituições de educação superior, nas classes hospitalares e nos ambientes domiciliares, para a oferta dos serviços e recursos de educação especial. Esta formação deve contemplar conhecimentos de gestão de sistema educacional inclusivo, tendo em vista o desenvolvimento de projetos em parceria com outras áreas, visando à acessibilidade arquitetônica, os atendimentos de saúde, a

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promoção de ações de assistência social, trabalho e justiça. (BRASIL, 2008, p. 17-18)

A Resolução CNE nº 4/2010, que institui as Diretrizes Curriculares Nacionais

Gerais para a Educação Básica com relação a formação, prevê que:

A formação inicial, nos cursos de licenciatura, não esgota o desenvolvimento dos conhecimentos, saberes e habilidades referidas, razão pela qual um programa de formação continuada dos profissionais da educação será contemplado no projeto político-pedagógico. (BRASIL, 2010, artigo 58)

Vejamos as implicações dessa diretriz formativa: cada vez mais as funções do

professor especialista serão exercidas junto ao ensino comum, e o conhecimento de

sua estrutura e de seu funcionamento são condições essenciais para que isso

ocorra de forma produtiva. Uma outra implicação decorrente desta primeira será a

necessidade de o professor especialista reformular o seu papel, a sua atuação. Este,

até então, agiu no ambiente escolar especial, onde a concepção vigente tinha como

foco o que falta alcançar, o que está prejudicado e precisa ser melhorado frente às

limitações e déficits que o aluno apresenta, o foco está no aluno, e não no processo

de aprendizagem.

Sobre esse ponto de mudança de atuação, a entrevista realizada com a

professora de AEE, A., apresenta o seguinte relato: Este novo formato de trabalho

para o professor de AEE é um complicador para a parceria com a professora da sala

regular, já que estamos mais para turista, a gente não tem como vivenciar a rotina

todo o tempo, acaba ficando fixa em um dia, sempre o mesmo da semana; o que a

gente pega são as mesmas atividades da turma.

E complementa dizendo sobre a postura que deve assumir o professor

especialista: Acho que esta parceria com a professora de AEE precisa de muita

humildade, porque aquilo que parece pouco para a gente foi uma luta para o aluno.

Da mesma forma, o professor da sala comum precisará reformular o seu lugar

na sala de aula, sua postura profissional, pois, se até então agiu no ambiente

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escolar regular, tendo como foco o que se espera que o aluno em condições

normais de desenvolvimento possa aprender, considerando que todos aprendem da

mesma forma e que, portanto, basta ter condições prévias para aprendizagem, o

foco o seu objetivo no currículo e não no aluno, agora precisará abrir-se à parceria

com o professor especialista para possibilitar a aprendizagem do aluno incluído em

sua sala de aula comum.

Com relação a esse ponto, as nossas entrevistas apontam para um lugar

ainda pouco consistente nas parcerias com os professores de AEE, já que de todas

as entrevistas realizadas com os professores de sala de aula comum, ainda que

estes tenham sido indicados pelos professores de AEE que os acompanham

sistematicamente na escola, somente dois destes citaram a importância da parceria

com esse professor no seu trabalho com o aluno incluído. Isso se torna muito

significativo, pois indica que o professor de AEE, nesse novo formato de trabalho

proposto pelo MEC chamado Atendimento Educacional Especializado, precisa

cirscunscrever o seu espaço de atuação na escola para além do atendimento ao

aluno com deficiência no contraturno, mas, também e diríamos especialmente, na

parceria com a professora e com a escola em busca de dirimir a solidão e a

exclusividade no compromisso do professor frente a um aluno de inclusão.

Com o advento da inclusão de alunos com deficiência e com transtornos

globais do desenvolvimento nas salas regulares, há queixas dos professores do

ensino regular de que não estão preparados para propor atividades que atendam às

necessidades desse alunado; mas há também queixas dos professores especialistas

de que não têm conhecimento da estrutura e funcionamento da escola comum, que

lhes garanta condições para articular as informações específicas da deficiência com

o contexto educacional no qual esse sujeito está inserido. Em resumo, há um

desencontro completo nos propósitos da formação para a educação inclusiva, que

vem à tona com a chegada do aluno com deficiência na sala regular.

O sistema, em resposta às “gritas” dos professores e ao processo de “correr

atrás do prejuízo”, dado o avanço em alta velocidade e de forma irreversível da

educação inclusiva, propõe formações continuadas para ambos os professores. Fato

é que essas ações indicam uma concepção de escola satisfatória à inclusão apenas

pelas adaptações com os serviços especializados para incorporação daqueles com

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necessidades educacionais especiais, e isso não tem atendido às necessidades de

mudança nas práticas exercidas no interior da escola.

Jannuzzi (1995) sugere como ponto de partida para uma escola inclusiva a

formação comum para todos os professores, reservando para a formação em serviço

cursos de aprofundamento de temas específicos ligados às demandas educacionais

dos alunos com necessidades especiais. Complementa Ferreira (1999) essa

discussão quando da constatação de que a formação inicial que é generalista e

direcionada para a escolarização do diferente precisa estar afinada com a formação

continuada específica caracterizada no “educador especial”.

Podemos, portanto, concluir que a formação dos professores do ensino

regular em uma perspectiva inclusiva deve partir de sua prática, do seu contexto, e

trabalhar com os saberes pré-existentes, ainda que sejam saberes não constituídos

como ciência, que precisarão ser discutidos e incorporados na prática a partir dos

aspectos teóricos, como nos alerta Garcia (2010,p.19): “A incursão de análise em

práticas escolares cotidianas é fundamental para percebermos como os alunos com

deficiência estão tendo acesso à escola regular e principalmente, ao conhecimento

por ela vinculado”. Isso poderia causar impacto17 na transformação da prática

docente.

É incontestável que para a efetivação de uma política educacional inclusiva, a

formação dos profissionais da educação precisa ser uma meta essencial, como nos

mostra o Plano Nacional de Educação desde 2001.

A formação de recursos humanos com capacidade de oferecer o atendimento aos educandos especiais nas creches, pré escolas, centros de educação infantil, escolas regulares do ensino fundamental, médio e superior, bem como instituições especializadas e outras instituições é uma prioridade para o Plano Nacional da Educação. Não há como ter uma escola regular eficaz quanto ao desenvolvimento e aprendizagem dos educandos especiais sem que seus professores, demais técnicos, pessoal administrativo e auxiliar sejam preparados para atendê-los adequadamente. (BRASIL, 2001, p. 65)

17 Cabe lembrar o sentido que queremos dar à palavra impacto: movimento que impulsiona, faz avançar adiante. .

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Sob essa perspectiva e necessidade, o MEC, em 2003, lançou o Programa

Educação Inclusiva: direito à diversidade18, que considera as orientações para a

formação, de norte a sul do Brasil, aos educadores, gestores, a fim de garantir o

acesso de todos à escola regular, o atendimento educacional especializado e a

acessibilidade.

A formação profissional do professor da educação especial oferecida pelo

MEC deve contemplar conhecimentos específicos para realizar o Atendimento

Educacional Especializado das mais diversas deficiências e concepções de ensino e

aprendizagem que dizem respeito a todos os alunos. Aos professores de educação

especial compete a organização dos recursos de acessibilidade e a realização do

Atendimento Educacional Especializado.

Esses encaminhamentos colocam a educação especial em contato direto e

articulado com o ensino regular no que se denomina educação inclusiva no sentido

apontado anteriormente

Reconhecemos que desenvolver um processo de educação inclusiva não é algo fácil. Não é algo que se consiga por um „passe de mágica‟, requer planejamento, aceitação das diferentes maneiras de ser e de se expressar de cada educando, assim como uma reflexão permanente sobre as práticas empreendidas na escola, visando a oferta de respostas adequadas às suas necessidades. (MARTINS et al., 2006, p.24)

Incluir, portanto, é muito mais que oferecer ao “diferente” acesso ao ensino

regular; implica necessariamente criar uma outra lógica para a escola pensar a

educação para cada um e para todos os alunos, de forma que nenhuma criança

deva estar fora dela. Em consonância com essa abordagem, Rodrigues destaca que:

18 O Ministério da Educação – MEC, por meio da Secretaria de Educação Especial – SEESP, institui o Programa de Formação Continuada de Professores na Educação Especial, que realiza em parceria com as instituições de educação superior públicas, federais ou estaduais, os cursos de extensão ou aperfeiçoamento e especialização (lato sensu) para professores da educação básica, em efetivo exercício nas redes públicas de ensino, que atuam no atendimento educacional especializado – AEE e para professores da sala de aula comum, ofertados na modalidade a distância, no âmbito da Universidade Aberta do Brasil desde 2009.

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(...) não só os alunos são diferentes, mas também os professores – e ser diferente é uma característica humana e comum, e não um atributo (negativo) de alguns. A educação Inclusiva dirige-se assim aos “diferentes” isto é... a todos os alunos...E é ministrada pelos “diferentes”, isto é ...por todos os professores. (RODRIGUES, 2006, p.306)

Emprestamos de Almeida (2007, p.336) a ideia de que “formar o professor

inclusivo é muito mais que informar e repassar conceitos; é prepará-lo para um outro

modo de educar, que altere sua relação com os conteúdos disciplinares e com o

educando”.

Ainda que não seja a salvação na inclusão escolar, a formação continuada

pode e deve ser um mecanismo que minimize os problemas e potencialize soluções

inovadoras nesse processo de parceria entre a educação especial e a escola

regular, que não podem mais andar em paralelo, mas que precisam somar esforços

para o desenvolvimento de uma educação verdadeiramente inclusiva.

2.2.2 Implicações das Adaptações curriculares na prática docente inclusiva

Toda sociedade marcada por uma distribuição desigual de poder necessita reconhecer abertamente diferenças e desigualdades, pois é a partir do reconhecimento destas diferenças que o diálogo do currículo pode prosseguir. (APPLE, 1994 apud MOREIRA; BAMUEL, 2001, p.11)

A organização da política da educação inclusiva proposta pelo MEC está

sistematizada em 3 eixos estratégicos: a institucionalização, traduzida como a

constituição do referencial político e legal; o financiamento de recursos e serviços

para a eliminação das barreiras na escolarização; as orientações das práticas

inclusivas. Neste terceiro eixo, o currículo escolar é um instrumento essencial e deve

preconizar a diversidade no âmbito escolar, e é a ele que nos dedicaremos neste

item.

Ainda que tenhamos a compreensão de que currículo pode significar, no

âmbito de políticas públicas, o instrumento que prescreve o que é obrigatório em

nível educativo, ou mesmo as referências a serem observadas na realização da

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educação escolar, tais como se apresentam nos Referenciais Curriculares Nacionais

para a Educação Infantil ou nos Parâmetros Curriculares Nacionais19, não é sob

essa perspectiva que aprofundaremos o conceito de currículo.

Utilizaremos a definição de currículo aplicada ao âmbito escolar: currículo

enquanto ferramenta primordial para organização didática do processo de ensino-

aprendizagem, construído a partir da seleção de conhecimentos e reflexão sobre as

práticas vivenciadas. Sácristan (2000, p.32) nos auxilia para essa compreensão: “O

currículo é um ponto central de referência na melhoria da qualidade de ensino, na

mudança das condições da prática, no geral e nos projetos de inovação dos centros

escolares”, e afirma ainda que o currículo é a expressão da função socializadora da

escola, o instrumento que permite compreender a prática pedagógica e que,

portanto, está estreitamente ligado à formação do professor.

Com o objetivo de atender às necessidades específicas e individuais dos

alunos com deficiência e transtornos globais do desenvolvimento, faz-se necessário

realizar adaptações no âmbito do sistema de ensino para garantia de acesso e

permanência na escola por meio de apoios, como: salas de recursos multifuncionais,

auxiliares e cuidadores, acessibilidade.

No âmbito da escola, essas adaptações acontecem no currículo e nas

metodologias para a educação inclusiva.

A Política Nacional de Educação Especial (1994) alerta para a importância de:

(...) atendimento educacional adequado às necessidades especiais do alunado, no que se refere a currículos adaptados, métodos, técnicas e material de ensino diferenciado, ambiente emocional e social da escola favorável à integração social dos alunos. Pessoal devidamente qualificado. (BRASIL,1994, p.51)

Uma preocupação que se instalou com essa indicação foi a de que as

adaptações curriculares pudessem mais elucidar as características individuais do

que as diferenças culturais, como é o principio da educação inclusiva, correndo o

risco de essas adaptações implicarem tornar o currículo demasiadamente técnico

19 RCNEI e PCN são documentos de autoria do MEC, considerados documentos orientadores que, conforme esclarece GARCIA (2004, p.12), “(...) produzidos no âmbito nacional e internacional com a função de estabelecer uma interlocução com a sociedade a respeito de ideias, de concepções, visando a propor consensos sobre as questões educacionais”.

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sob a perspectiva de uma pedagogia médico-psicológica no que diz respeito à

deficiência.

Diante desse contexto nasceram as orientações dadas pelos PCNs:

Adaptações Curriculares, definidas como:

[...] possibilidades educacionais de atuar frente às dificuldades de aprendizagem dos alunos. Pressupõem que se realize a adaptação do currículo regular, quando necessário, para torná-lo apropriado às peculiaridades dos alunos com necessidades especiais. Não um novo currículo, mas um currículo dinâmico, alterável, passível de ampliação, para que atenda realmente a todos os educandos. Nessas circunstâncias, as adaptações curriculares implicam a planificação pedagógica e as ações docentes fundamentadas em critérios que definem o que o aluno deve aprender; como e quando aprender; que formas de organização do ensino são mais eficientes para o processo de aprendizagem; como e quando avaliar o aluno. (BRASIL, 1998, p.33)

Aranha acrescenta que:

as Adaptações Curriculares, então, são os ajustes e modificações que devem ser promovidos nas diferentes instâncias curriculares, para responder às necessidades de cada aluno, e assim favorecer as condições que lhe são necessárias para que se efetive o máximo possível de aprendizagem. (ARANHA 2003, p.5)

As adaptações curriculares devem ocorrer em diversos âmbitos, e para

melhor orientar sobre isso, O MEC/SEESP, em 2000, lançou uma cartilha: Projeto

Escola Viva: Garantindo o acesso e a permanência de todos os alunos na escola –

Alunos com necessidades especiais; nos volumes 5 e 6, trata das Adaptações

Curriculares de Grande e de Pequeno Porte, respectivamente.

O documento esclarece que algumas dessas estratégias “exigem

modificações que envolvem ações de natureza política, administrativa, financeira,

burocrática, etc.” (MEC, 2000, p.9). Estas são chamadas Adaptações Curriculares de

Grande Porte.

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Outras, denominadas Adaptações Curriculares de Pequeno Porte,

compreendem modificações configuradas como pequenos ajustes em ações

planejadas no contexto da sala de aula, que:

(...) encontram-se no âmbito da responsabilidade e de ação exclusivo do professor, não exigindo autorização, nem dependendo de qualquer outra instância superior, nas áreas política, administrativa, e/ou técnica (MEC,2000, p. 8). (grifo nosso)

Cabe esclarecer que o exclusivo deve ser compreendido na relação com as

instâncias superiores e escalas de hierarquia que se apresentam na Educação,

reforçando a ideia de que não depende dessas instâncias para acontecer, mas não

pode ser compreendido como exclusivo no ambiente escolar, correndo-se o risco de

reforçar o isolamento e a solidão do professor nessa tarefa árdua que é adaptar em

suas muitas possibilidades o currículo, como veremos a seguir. Demanda,

sobretudo, apoios de menor número de alunos na sala de aula, parcerias com a

equipe técnica pedagógica, com professores especializados, recursos materiais e

formação que, de fato, dê suporte concreto a essas ações.

Tomando por base esse mesmo documento, elencamos de forma bastante

resumida as adaptações possíveis no nível da sala de aula:

- quanto à possibilidade de adaptação de objetivos de aprendizagem, seja através

da priorização de objetivos considerados fundamentais para a aquisição de

aprendizagens posteriores, seja pela introdução de objetivos ou conteúdos que não

estão no currículo, mas que podem complementá-lo, ou ainda, pela eliminação de

determinados objetivos ou conteúdos, cuidando para que não sejam aqueles

considerados básicos.

Extraímos dos relatos das entrevistas a experiência da professora J. com o

seu aluno Douglas20 : Estabeleci dois focos de trabalho com o Douglas, mantê-lo

sempre ocupado e dar-lhe responsabilidades. Deu certo.

20 Douglas é o nome fictiício dado ao aluno incluído na sala de aula da prof. J, visando preservar a

identidade da aluna

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E a professora B.: Não aceito esta coisa de atividade diferente para ela; ela

vai fazer o que todos estão fazendo, mas dentro das condições dela.

Ambas as professoras estão se direcionando à adequação dos objetivos no

currículo adaptado aos alunos com deficiência e transtornos globais do

desenvolvimento que estão na sua turma; estabelecem prioridades no trabalho,

metas a atingir, sem desconsiderarem as limitações e necessidades do aluno

especial, e nas duas situações, essa ação funcionou positivamente, fazendo com

que os alunos atingissem com sucesso aquilo que lhes fora proposto.

- quanto à possibilidade de adaptação de conteúdos, seja priorizando os tipos de

conteúdos, as áreas ou as unidades de conteúdos, seja reformulando sequências de

conteúdos, ou ainda, eliminando conteúdos secundários, acompanhando as

adaptações propostas para os objetivos educacionais.

Aqui, a professora de AEE, A., nos auxilia a compreender como isso se dá na

prática ao partilhar a experiência com as atividades em que os conteúdos estão além

das possibilidades da aluna com deficiência na sala de aula comum, ao dizer que:

Ela faz todas as atividades da classe de forma adaptada para ela, e quando a

atividade é de escrever, como por exemplo, um roteiro de um teatro, ela participa

com ideias e outro é o escriba dela, faz a dramatização como todo mundo, e apesar

dos gestos mais limitados, é possível que todos entendam o que ela quer dizer.

- quanto à possibilidade de adaptação de método de ensino e da organização

didática, através da procura de estratégias que melhor respondam às

características e necessidades peculiares de cada aluno, tarefa esta inerente à

atuação do professor.

Para esse tipo de adaptação utilizaremos como ilustração a experiência da

professora C. com seu aluno Gustavo, quando diz que Gustavo é metódico, não

abre possibilidades, fixa regras; então, pensei que o silabário, que é bem metódico,

poderia ajudar, mesmo sendo proibido na rede. Dei o silabário para ele e ele

decorou tudo tão rápido, que quando pedia a letra b, repetia automaticamente todas

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as sílabas ba-be-bi-bo-bu(...) Hoje não usa mais o silabário, nem pede por ele como

apoio para a escrita de palavras.

Houve, nesse caso, uma adaptação de método, pois aquele utilizado para a

sala toda não estava funcionando com ele; então, a professora partiu do

conhecimento que tinha sobre o aluno para adequar as suas estratégias de ensino.

- quanto à possibilidade de adaptação de materiais que propiciem a interação,

convivência, autonomia e independência, bem como o aprendizado de conceitos,

melhoria de autoestima e afetividade do aluno com necessidades educacionais

especiais.

Como ele não escrevia e era muita matéria para gravar tudo na cabeça, eu

digitava tudo em casa e mandava por e-mail para que a mãe pudesse ler pra ele e

fazer as tarefas com ele, mas isso dava muito trabalho, então, comecei a levar o pen

drive para sala de aula e na medida que ia falando para os alunos os conteúdos da

aula, eu já ia digitando para ele e passava no pen drive. Isto pra mim era uma ideia

boba, uma besteirinha, mas fez a diferença para ele (narrativa da professora C.).

- quanto à possibilidade de adaptação no processo de avaliação, por meio de

modificação de técnicas e também dos instrumentos utilizados.

Curiosamente, nenhuma das narrativas trouxe situações que nos levassem a

compreender como o processo avaliativo com esses alunos incluídos em salas de

aula comuns estão sendo pensados e executados. Acreditamos que não seja porque

já tenhamos a incorporação de uma prática de avaliação mais individualizada e

contínua, mas talvez por uma equivocada ideia de que os objetivos e conteúdos

adaptados, por serem adaptados, não sejam passíveis de ser avaliados, ou ainda

porque, às vezes, estes são tão diferenciados que implicariam um outro olhar para a

avaliação, que ainda é muito metódico e uniforme nas práticas escolares. Esse é um

fato que nos causou preocupação e merece estudo mais aprofundado em outro

momento, já que neste , não direcionamos na entrevista nenhuma questão

específica para avaliação.

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- quanto à adaptação do espaço físico e organização do tempo, colocadas entre

as primeiras responsabilidades do professor no que se refere ao compromisso de

garantir a todos os alunos o acesso ao conhecimento.

Com relação à adaptação de rotina no que diz respeito ao tempo escolar, a

professora C. nos diz em seu relato que para Gustavo, as atividades de Língua

Portuguesa precisam ser feitas no começo da aula; se deixar para o final, ele não

faz.

Compreender que essas adaptações são possibilidades dadas ao professor

com alunos com deficiência e transtornos globais do desenvolvimento para o melhor

atendimento na sala de aula comum exige também apontar que são necessários

cuidados, pois a falta de preparo e formação desses professores, bem como uma

possível desarticulação com o projeto político pedagógico da escola, e ainda a falta

de parcerias e cooperação de todos da escola, podem tornar essas adaptações um

currículo de segunda categoria, que pode simplificar e descontextualizar o

conhecimento que cabe à escola socializar no cumprimento de sua tarefa.

Duk, Hernandez e Sius (s/d)21 distinguem, dentro do processo de adaptações

curriculares, três etapas diferenciadas que implicam em um conhecimento prévio

sobre o aluno e o currículo:

1ª Etapa: Formulação das adaptações curriculares - o professor deve ter um

conhecimento exato das necessidades educativas especiais do aluno e, por outro

lado, da proposta curricular do seu grupo de referência (a série/ciclo na qual o aluno

está inserido), para decidir o tipo e o grau de adaptações ou flexibilizações que seria

conveniente pôr em andamento para ajudar o aluno a progredir em sua

aprendizagem.

21Tradução livre do texto “LAS ADAPTACIONES CURRICULARES: Uma estratégia

de individualización de la ensenanza” (s.d.).

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2ª Etapa: Implementação das Adaptações Curriculares - Uma vez definidas as

adaptações curriculares, o professor deve buscar estratégias que lhe permitam pô-

las em prática, sem que isso implique deixar de atender os demais alunos; pelo

contrário, ele deve garantir que tais ações conduzam ao enriquecimento da própria

prática pedagógica e das experiências de aprendizagem de todo o grupo.

3ª Etapa: Continuidade e Avaliação das Adaptações Curriculares - No decorrer

do processo ensino-aprendizagem, o professor deve verificar se as adaptações

estabelecidas para o aluno com necessidades educativas especiais estão sendo

eficazes, ou seja, se facilitam a aprendizagem; caso contrário, será necessário

revisá-las com vistas a mudanças pertinentes.

A Educação Inclusiva, entendida sob a dimensão curricular, significa que o

aluno com necessidades especiais deve fazer parte da classe regular, aprendendo

as mesmas coisas que os outros – mesmo que de modos diferentes – cabendo ao

professor fazer as necessárias adaptações.

Sob essa perspectiva, as professoras entrevistadas, em sua maioria,

apresentam consciência de que adaptar o currículo não significa dar uma outra

atividade para o aluno incluído; algumas, de forma contundente, apresentam essa

preocupação quanto às adaptações curriculares.

A professora D. relata: não acho certo deixar a criança fazendo outra coisa

que não seja a atividade da sala. Então, propunha a mesma atividade e deixava que

ela me mostrasse como podia desenvolvê-la; ela é que foi me dando pistas do que

necessitava para desenvolver a mesma atividade.

A professora C. corrobora quando diz: eu penso que o que o professor

precisa esperar é que todos os alunos aprendam o mínimo necessário para aquele

ano, e se você não teima, ele (o aluno) não vai.

A professora de AEE, A., relata sua experiência junto à coordenação da

escola quando a situação-problema foi pensar em como oferecer um simulado da

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Prova Brasil22 (uma prova extensa e de um formato que os alunos desconhecem nas

práticas escolares rotineiras) para ela,, supostamente maior ainda o desafio,

considerando as suas limitações cognitivas e de atenção para atividades longas;

porém, optou por entregar-lhe a prova e observar como a desenvolveria, ainda que

precisasse do auxílio de um educador para ler as questões por ela, já que não

estava completamente alfabetizada. E o relato nos diz: Nesta semana, a gente vai

ter a Prova Brasil, e a gente fez um simulado para as crianças se adaptarem a este

formato de prova que a gente não usa habitualmente na escola, e pensamos como

poderíamos tornar este desafio de uma prova extensa e difícil possível para B.. Mas

deixamos para ver o que acontecia, e ela nos surpreendeu. Logo que entregamos as

provas, ela disse: eu adoro fazer provas. Aí pensei, a limitação é de quem? Porque

ela tirou de letra esta situação, fez o que pôde, como pôde, e quando cansou, disse:

agora cansei, não vou mais fazer, e entregou a prova sem qualquer dificuldade.

A flexibilização curricular faz-se necessária, porque é impossível, em um

contexto de educação inclusiva,

(...) trabalhar com normas pedagógicas de aplicação universal e impessoal onde todas as crianças, independentemente de seus interesses, necessidade e aptidões, experiência escolar e rendimento acadêmico nas diversas disciplinas, terão de se sujeitar simultaneamente às mesmas disciplinas durante um mesmo período de tempo escolar (FORMOSINHO,1999 apud FORMOSINHO E MACHADO, 2008, p.13)

Diferenciar o ensino pressupõe, portanto, gestar de forma flexível o currículo

escolar de maneira que sejam previstas as adequações curriculares tanto quanto os

currículos alternativos ou funcionais23.

22 Segundo O MEC, a Prova Brasil e o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb) são avaliações para diagnóstico em larga escala, desenvolvidas pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep/MEC). Têm o objetivo de avaliar a qualidade do ensino oferecido pelo sistema educacional brasileiro a partir de testes padronizados e questionários socioeconômicos. Informações retiradas do portal do MEC http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=210&Itemid=324 23 Segundo CARVALHO (2005), o Currículo Funcional propõe um modelo de organização e planejamento individualizado, programado a partir de atividades naturais e funcionais dentro das demandas do aluno. Contempla, além das atividades de AVD, vida comunitária, independência, autonomia, desenvolvimento de habilidades sociais, acadêmicas e de comportamento adaptativo,

funcionalidade no currículo, que diz respeito aos aspectos funcionais e práticos do currículo comum. É destinado aos alunos com necessidades específicas, em geral relacionadas a questões orgânicas, déficits permanentes e, em muitos casos, degenerativos; há maior comprometimento do funcionamento cognitivo, psíquico e sensorial que prejudica sobremaneira a aprendizagem escolar,

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Um alerta nos é dado por Garcia (2011) quando, a partir de pesquisa

realizada nos documentos que tratam da flexibilidade curricular, conclui que a

compreensão principal é aquela em que o currículo é considerado numa lógica de

diversificação dos programas pedagógicos, dos processos de ensino- aprendizagem,

dos processos avaliativos, entre outros:

No Brasil, as políticas curriculares estão assumindo um caráter de diferenciação que pode ter como consequência a desigualdade no acesso à cultura, mas agora justificada pela qualidade multicultural da sociedade.” (GARCIA, 2011, p.18)

Se trouxermos essa preocupação aos alunos com deficiência e transtornos

globais do desenvolvimento, podemos pôr atenção à possibilidade de que a

ampliação do acesso poderá nos encaminhar para muitas adaptações curriculares

relativizadas pelas necessidades específicas dessa população, correndo o risco de

fortalecer ainda mais o processo de hierarquização do acesso ao conhecimento no

interior do sistema de ensino.

A implementação da Educação Inclusiva não é tarefa fácil, pois o professor

terá a responsabilidade de garantir o aprendizado de alunos com necessidades

educacionais no contexto de suas atividades rotineiras e no planejamento para a

turma como um todo. Essa tarefa, no entanto, transversaliza a ideia de uma

educação inclusiva plena, que não entre na escola às escondidas, ou por força de

normas impostas para o acolhimento desse alunado, mas que seja construída a

partir de ressignificações de conceitos, como currículo, formação e prática docente.

2.2.3 Implicações da construção de uma cultura colaborativa na escola e a prática

docente inclusiva

Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo.

Paulo freire

As necessidades advindas do mundo futurista, onde há um descompasso

evidente entre o tempo da informação e o tempo que a escola dispende para o

esclarecimento da mesma, e menor ainda para o seu aprofundamento, demandam

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fortes e urgentes mudanças na Educação, que precisam ser acompanhadas pela

escola. Uma dessas mudanças diz respeito ao desenvolvimento da cultura de

colaboração como um dos objetivos fundamentais da escola, não apenas entre os

professores, mas também entre os alunos.

A história de colaboração com objetivos claros na escola é relativamente

recente; emerge na década de 60, com a proposta de ensino em equipes, caminha

para as décadas de 70 e 80, quando se estabeleceram os grupos de estudos entre

os alunos e assistentes do professor – as monitorias – na tentativa de alcançar

perfeição e eficiência nas ações educativas.

Considerando que não somos “uma ilha”, vivemos em sociedade com outros

de nossa espécie, com os quais nos relacionamos e construímos nossa cultura, não

basta ao aluno a aquisição da aprendizagem individual; este precisa, além de se

ocupar com a sua aprendizagem, preocupar-se com a aprendizagem dos outros,

seus pares.

Embora recente, não é grande novidade na Educação a prática dos trabalhos

em grupo, utilizados pelo professor como estratégia de ensino. A novidade talvez

esteja em compreender com que finalidade esses trabalhos em grupo estão sendo

propostos pelos professores.

Se refletirmos sobre a definição de colaborar (co-laborar) como trabalho em

comum com outro em uma mesma obra, teremos ampliada a ideia de trabalho em

parceria, que, para além do junto, aponta para o trabalho compartilhado, com seus

objetivos comuns negociados coletivamente, estabelecendo relações que tendem à

não hierarquização e à corresponsabilidade pela condução das ações, ampliando o

conceito de operar junto para o de operar em comunidade. Trata-se, portanto, de

uma filosofia de vida enquanto incorporação de uma ideia que, pela sua prática,

acaba se tornando um jeito de viver, de trabalhar e de se relacionar.

Góes (1991) corrobora com essa ideia quando esclarece que o processo

educativo não implica considerar que o ser humano é passivamente moldado pelo

meio, embora se reconheça que há uma necessária interdependência dos planos

inter e intra subjetivos. Assim, a autora conclui que “O sujeito não é passivo nem

apenas ativo: é interativo” (p.21).

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Por meio do trabalho compartilhado o que ocorre são trocas de experiências

relevantes que levam ao “empoderamento” (empowerment) das pessoas ao

perceberem que suas contribuições ao grupo são valorizadas.

Sobre essa proposta, o relato da professora B. indica a importância do

trabalho em grupo para a aluna incluída e para os demais, ao registrar: Acho uma

conquista com a turma, quando eu divido em grupinhos que eles podem escolher os

parceiros, sempre tem aqueles que pede para ficar com a B., eu não preciso

mandar, às vezes sai até briga, e não é aquilo de querer ficar para fazer por ela, eles

sabem que ela não vai fazer igual a eles, mas eles dão oportunidade dela se

expressar, mostrar o que pode fazer.

A professora C., sobre o trabalho em grupo e sua intencionalidade, diz: Fui

montando grupinhos para que ele percebesse que nem todos sabiam, e ele foi

vendo que podia não saber.

A turma conhecia o Douglas antes de mim, e conhecem ele melhor do que eu,

foram ensinando a professora, me ajudavam nos momentos de convulsão, diziam é

só abraçar ele e acalmá-lo, prô. Para um especialista, isso pode parecer uma

bobagem, não é uma indicação de como tratar uma convulsão, mas para o contexto

da escola, isso foi muito importante.

Vemos diante desses diferentes relatos que o trabalho em grupo nas salas

desses professores indicou diferentes caminhos, mas o objetivo era o mesmo, o de

inserir, no sentido de pertencimento, aqueles alunos no grupo da classe, de forma

que eles partilhassem da responsabilidade e do compromisso coletivo que a inclusão

exige.

Impossível tratarmos do trabalho em grupo e não abordarmos o sentido do

diálogo. No exercício do trabalho em grupo, o diálogo exerce papel fundamental,

pois é por meio dele que o pensamento de cada pessoa se torna público, seu

raciocínio é explicado, seu ponto de vista é defendido, ao mesmo tempo em que, ao

escutarem o argumento de um dos membros do grupo, os outros podem ser levados

a considerar alternativas e dialeticamente defender as suas ideias, e ser desafiados

a reexaminar seu próprio raciocínio.

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As pessoas, ao se engajarem em interações, frequentemente podem alcançar

resultados positivos em tarefas que não seriam capazes de realizar sozinhas,

confirma Colaço:

(...) as crianças ao trabalharem juntas, orientam, apoiam, dão respostas e inclusive avaliam e corrigem a atividade do colega, com o qual dividem a parceria do trabalho, assumindo posturas e gêneros discursivos semelhantes aos do professor Colaço (2004, p.339):

. Essa ação leva à corresponsabilidade dos alunos pela aprendizagem de todos,

como afirmam Stainback & Stainback (1999, p. 207): “nesta estrutura os alunos são

responsáveis não somente por sua própria aprendizagem mas também pela

aprendizagem dos outros membros do seu grupo”.

O relato da professora B. é bastante claro nesse aspecto quando diz: Se eles estão

resolvendo um problema e ela tá resolvendo um mais fácil, eles respeitam quando

ela vai na lousa para socializar os resultados, ninguém tira barato, zoa ela, eles

ajudam quando tá errado, explicando como tinha que ser, eles são parceirão dela.

Os resultados mais recentemente levantados com os estudos sobre a

inclusão escolar têm nos mostrado grande eficiência no desenvolvimento da

aprendizagem de todos os alunos para além dos ganhos acadêmicos, pois os alunos

colaboradores desenvolvem, além das atividades acadêmicas, habilidades

necessárias para interação social com os outros e auxiliam na elevação da

autoestima, o que acarreta ganhos recorrentes da aplicação desse sistema de

colaboração na escola para todos.

Porém, isso depende diretamente da organização, observação e

acompanhamento do professor, sendo fundamental que este cuide com cautela da

composição do grupos colaborativos, utilizando-se de diferentes critérios de sucesso

de acordo com os desafios de cada grupo formado. Isso significa que as tarefas

podem ser diversificadas, pois o indicador de avaliação a ser considerado será o

sucesso do grupo, e não o sucesso individual.

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Dessa maneira, o trabalho colaborativo entre os alunos depende, de forma

direta, do trabalho e da sensibilidade do professor no que diz respeito especialmente

à gestão das adversidades de diferentes naturezas, conflitos e tensões próprios do

trabalho desenvolvido em grupo. Depende ainda da própria perspectiva do que esse

professor compreende por grupo, levando-se em consideração como ele reflete

sobre o seu papel, leva os alunos a serem reflexivos em suas ações e,

evidentemente, reconhece que para o efetivo trabalho colaborativo é indispensável

um ambiente aberto e à disposição dos envolvidos no processo de ensino.

Apontamos até aqui na direção de compreender que a entrada do aluno com

deficiência ou transtornos globais do desenvolvimento na sala de aula regular

possibilita, ou, ousaríamos dizer, exige um trabalho colaborativo, o que nos leva a

refletir se não seria possível pensarmos se essa perspectiva colaborativa entre os

alunos também poderia ser aplicada aos professores. Essas relações colaborativas

que nos levam a aprendizagens de diferentes ordens não são indicadas para a

formação dos professores nesse processo inclusivo, caracterizado pela partilha de

responsabilidades e pelo saber-fazer24.

A resposta a essas questões vem de autores brasileiros25 na busca de

modelos para exercitar a inclusão dos alunos com deficiência e transtornos globais

do desenvolvimento; estes nos apresentam dois modelos de ensino que têm se

mostrado muito promissores para a colaboração entre a Educação Especial e a

Educação Regular: a consultoria colaborativa e o ensino colaborativo.

Segundo Mendes (2006), a consultoria colaborativa consiste no suporte de

profissionais especialistas na escola; já o ensino colaborativo (Co-teaching - termo

utilizado na língua inglesa), proposto por autores norte-americanos26, considera

importante a atuação de dois ou mais profissionais dando instruções em um mesmo

espaço físico.

Porém, neste trabalho, faremos um recorte do tema cultura colaborativa no e

para o ambiente escolar no que diz respeito à parceria do professor de AEE na

24 Esta expressão tem a intenção de indicar o saber descrito como savoir-faire por PERRENOUD (2011), como a disposição interiorizada, construída, por vezes, laboriosamente, que nos dá o domínio prático da ação. 25 Capellini ( 2004) Zanata ( 2004) e Mendes ( 2006) 26 Cook L, Friend M. Co-teaching: guidelines for creating effective practices. Focus on Exceptional Children. 1995;28(3):1-16.

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escola, no ensino colaborativo definido por Mendes (2006) como um modelo de

prestação de serviços de Educação Especial, no qual um educador comum e um

educador especial dividem a responsabilidade de planejar, instruir e avaliar a

instrução de um grupo heterogêneo de estudantes, compartilhando objetivos,

expectativas e frustrações. Segundo a autora, essa proposta de ensino surgiu como

uma alternativa aos modelos educacionais existentes (sala de recursos, classes

especiais ou escolas especiais), visando responder às demandas das práticas de

inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais.

Capellini (2004), que, a partir de suas pesquisas, conclui que o trabalho

colaborativo em contexto escolar tem se mostrado eficiente no que diz respeito à

inclusão educacional, dá destaque especial ao fato de a colaboração ser

componente fundamental no trabalho em equipe, caracterizado pelo respeito,

flexibilidade e convivência com as diferenças em um processo de negociação

constante.

Indica que essa parceria demanda tempo, o que hoje, diante de tantas

urgências na escola, é insuficiente para o planejamento das ações e,

consequentemente, para a avaliação do trabalho nessa parceria (professor de

Educação Especial e professor do ensino regular), em uma abordagem de formação

continuada que privilegie a reflexão e que, como vimos e afirma Freire (1983),

consiga superar o individualismo através de soluções coletivas, de construção de

cidadania, avançando de uma “consciência ingênua” para uma “consciência crítica”27

na medida em que possa mobilizar socialmente os envolvidos, questionando o

próprio sistema e transformando a realidade.

O ensino colaborativo é uma estratégia didática inclusiva em que o professor

da classe comum e o professor especialista planejam, de forma colaborativa,

procedimentos de ensino para ajudar no atendimento a estudantes com deficiência

ou transtornos globais do desenvolvimento em classes comuns, mediante um ajuste

por parte dos professores, que, de forma coativa, realizam um trabalho

27 Paulo Freire, em Educação e mudança. 6ª ed, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1983, afirma que temos

dois tipos de consciência: a ingênua e a crítica. A consciência ingênua é aquela que nos induz a pensar sobre o passado como melhor do que o presente, é simplista na interpretação de problemas, aceita a massificação do comportamento e, portanto, nos leva a uma visão distorcida da realidade. Já a consciência crítica nos alerta sobre as mudanças do mundo, suas necessidades e valores, impulsionando-nos a questionar paradigmas e buscar a profundidade dos problemas, tornando-nos

capazes de modificar o mundo em que vivemos.

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sistematizado com funções previamente definidas para ensinar grupos

heterogêneos, tanto em questões acadêmicas quanto em questões

comportamentais, em cenários inclusivos.

Há um compartilhamento de ambos na responsabilidade de planejar e de

implementar o ensino e a disciplina na sala de aula. Prudente dizer que nesse

compartilhamento de liderança e corresponsabilidade de ações, não há

sobreposição ou hierarquia entre os envolvidos, mas sim, relações que se

estabelecem no intuito de atingir os objetivos comuns já negociados pelo grupo.

Esse ensino pode se dar de diferentes maneiras na sala de aula inclusiva,

conforme descrito na tabela 3.

Tabela 3 : Formas de ensino colaborativo na escola

Um professor como suporte

O professor da Educação Comum e o

educador especial atuam juntos em sala de aula,

mas um professor apresenta as instruções,

enquanto o outro providencia o apoio aos

estudantes. Pode ser feito o rodízio trocando os

papéis.

Estações de ensino

Como se fossem “os cantinhos da

atividade” significa que a sala será dividida em

grupos que passarão pelas diversas partes da

atividade, sendo que em cada uma delas os

professores se dividirão para explicar aos alunos

o que deverá ser feito. Então, os grupos se

alternam de local e os professores repetem as

informações para novos grupos de alunos.

Ensino paralelo A instrução é planejada de forma articulada, mas

cada professor fica com 50% do grupo de alunos

Ensino alternativo Um professor apresenta instruções para

um grande grupo de alunos, enquanto o outro

interage com um pequeno grupo de alunos.

Equipe de ensino Ensino cooperativo (ensino interativo).

Cada professor dá igualmente suas instruções.

Ex: O professor passa instruções de Matemática

e o co-professor ilustra com

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os exemplos.

Fonte: Capellini( 2004)

Em um modelo colaborativo, os professores da educação comum e Especial

juntam suas habilidades, seus conhecimentos, procurando estabelecer uma

combinação de recursos para fortalecer o processo de ensino-aprendizagem de

todos os alunos na sala de aula, “aprendendo uns com os outros, garantindo com

esta relação positiva a satisfação das necessidades de todos os alunos” (DIEKER &

BARNETT,1996, p. 7).

Porém, as práticas colaborativas efetivas exigem algumas condições: que

ambos os professores conheçam o currículo e elaborem o planejamento em

conjunto, além de possuírem habilidades interpessoais favorecedoras da parceria,

como motivação voluntária, confiança, vontade de partilhar, humildade, competência

profissional e compromisso político, de forma que possam trocar experiências e

saberes, e ainda, que envolvam a participação de todos (pais, gestores e demais

funcionários da escola).

Os resultados de estudos sobre as propostas colaborativas (Capellini, 2004 e

Zanata, 2004) apontaram que a prática pedagógica do professor do ensino comum,

que atende um aluno com deficiência ou transtorno global do desenvolvimento, não

depende necessariamente de tempo de experiência anterior com esse tipo de aluno,

mas sim, de seu empenho na efetivação da parceria colaborativa e no seu

envolvimento com o conhecimento específico da deficiência com a qual irá trabalhar,

além de evidenciar que esse tipo de ensino (colaborativo) traz uma série de

benefícios para as escolas em que se efetiva, entre eles: o papel de recuperar nos

professores as suas capacidades de produzir conhecimentos sobre seu trabalho,

promovendo aperfeiçoamento contínuo e aprendizagem.

Concordamos com Lourenço(2008) e Mendes (2006) quando afirmam que a

colaboração promove ganhos pessoais e profissionais, além de ser muito eficiente

na resolução de problemas práticos do cotidiano, ainda que tenha como condições

indispensáveis disponibilidade de tempo, recursos, monitoramento e muita

persistência.

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Entendemos, a partir de nossas narrativas, que essas condições permitem

que o vínculo e a relação de confiança entre os professores da Educação Especial e

do ensino comum possam se estabelecer, além da disponibilidade pessoal do

professor da classe comum para a entrada do outro no seu campo de atuação, bem

como a postura de humildade do professor de Educação Especial, que entrará no

espaço “sagrado” da sala de aula.

Sobre esse ponto, recortamos das entrevistas realizadas o que nos diz a

professora B.: mas a professora do AEE ajuda muito, porque a gente tá no olho do

furacão, não consegue ver o miudinho (...) planejo, por exemplo, um texto de

crônicas, aí, no HTPC28, eu e a professora de AEE sentamos juntas para pensar

como adaptar esta mesma atividade para B.(...) Aí, eu tenho um segundo olhar,

planejo de novo e até mudo o que tinha pensado primeiro para todos os alunos, e

fica até melhor.

Já a professora C. relata a sua experiência com a professora de AEE ao

dizer: o professor de AEE, que em nenhum momento teve o nariz empinado, com a

postura de achar que sabia mais, desprezando o saber do professor que está todos

os dias com o aluno.

Vários estudos (Jesus, 2002; Capelini, 2004; Oliveira, 2006; Zanata 2004)

analisam as possibilidades de colaboração entre docentes, principalmente entre

professores de classe comum e de Educação Especial. Destacam a necessidade de

instauração do trabalho colaborativo nas práticas pedagógicas, ou seja, outros

modos de conceber/fazer as relações/ações entre professores de sala comum e

professores de Educação Especial, inclusive para favorecer o continuum formativo.

Nesse sentido, o trabalho colaborativo é um elemento imprescindível na

formação dos professores inclusivos, que precisam avançar para além da

metodologia e técnicas específicas a serem aplicadas, ou dos diagnósticos,

prognósticos e tratamentos a serem oferecidos aos alunos com deficiência e

transtornos globais do desenvolvimento; precisam considerar os aspectos que estão

28 HTPC – Horario de Trabalho Pedagogico Coletivo – garantido uma vez por semana , três horas em reunião de professores e coordenador pedagógico da unidade para planejar, discutir com colegas , ser informado dos assuntos gerais da Unidades escola,etc.

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ocultos no processo inclusão escolar, a diversidade de condições pedagógicas e as

situações imprevistas que estão presentes no cotidiano escolar.

Um aspecto relevante desse tipo de formação a partir do trabalho colaborativo

e, portanto, interativo, é o desenvolvimento da coautoria na construção do

conhecimento produzido no processo inclusivo vivenciado pelos professores, ou

seja, sentem-se parte e, portanto, comprometidos com os resultados e desafios da

inclusão escolar, não apenas como colaboradores, mas como criadores das mais

diferentes situações escolares que culminam na implementação de práticas

inovadoras que atendam às necessidades dos alunos.

Pautados na colaboração, podem ter, no mínimo, dois modos de conceber as

ações, duas formas de agir: o agir estratégico e o agir comunicativo. Quando as

ações são guiadas pelo agir estratégico, são conduzidas por interesses individuais

que se materializam em planos de intervenção. Nesse caso, não há preocupação

com processos de entendimento, tampouco com a autorreflexão e as implicações do

contexto. A ênfase está em solucionar um problema prático e emergencial. As

mudanças tendem a ser imediatas e pragmáticas. O conhecimento produzido acerca

das relações entre os sujeitos, portanto, indicará ações estratégicas guiadas pelo

discurso monológico.

Em outra perspectiva, quando as ações são conduzidas com base no agir

comunicativo, há busca por entendimento mútuo, em que os participantes

compreendem e aceitam as pretensões levantadas, em um processo gradual de

aprendizado gerado no próprio movimento. Os entendimentos podem evoluir para

acordos normativos, cujos participantes se livram de pretensões individuais em prol

de uma intersubjetividade partilhada. Aqui, há autorreflexão crítica e colaborativa, e

decorrem desse processo conhecimentos que transcendem as ações imediatas, pois

a autorreflexão e a crítica permitem aos sujeitos se conscientizarem das condições

institucionais, sociais, políticas e históricas que interferem diretamente em suas

práticas.

A força dessa mudança está em transcender o imediato. Nesse caso,

profissionais se convertem em pesquisadores, configurando relações baseadas no

entendimento mútuo, que vão constituindo a pesquisa e dando novos significados às

práticas profissionais na escola. Aprende-se a trabalhar colaborativamente enquanto

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se pesquisa e se produzem conhecimentos, constroem-se objetivos comuns e

partilhados que exprimem vontades coletivas.

Por esse caminho as redes de colaboração vão se expandindo e construindo

identidades coletivas; no caso da inclusão escolar, vão se constituindo em escolas

inclusivas a partir desse movimento de formação de professores inclusivos; é um

caminho que precisa ser construído por meio da reflexão, que incorpora a dialogia, a

interlocução e a ação para novamente voltar à reflexão. É assim que Nóvoa

compreende a formação quando insiste no investimento da experiência do professor,

dizendo:

a formação não se constrói por acumulação (de cursos, de conhecimentos ou de técnicas), mas sim através de um trabalho de reflexividade crítica sobre as práticas e de (re)construção permanente de uma identidade pessoal. Por isso é tão importante investir na pessoa e dar um estatuto ao saber da experiência (NÓVOA, 1992, p.25)

Para que os professores possam ressignificar a sua prática é necessário que

a teorizem. Não se trata, aqui, de teorizar apenas os conteúdos acadêmicos já

construídos por outros e transmitidos por treinamentos, seminários, palestras e

outros; trata-se de estabelecer uma relação dinâmica da prática a partir da

autorreflexão, da reflexão em grupo, do compartilhamento de erros e acertos, da

negociação de significados e do confronto de pontos de vista na formação

continuada, na busca de um professor com pensamento crítico e criativo, garantido a

todos os educadores na própria legislação.

O trabalho colaborativo como estratégia para a (trans)formação das práticas,

na perspectiva da aprendizagem autônoma, libertadora e facilitadora da inclusão de

todos os alunos na escola, precisa atentar para a necessidade e o compromisso de

todos na oferta de uma educação de qualidade para todos os alunos, ou seja, uma

educação em ótimas condições de ensino- aprendizagem, seja nas condições

estruturais, seja na oferta de serviços de apoio ao aluno, como nos alerta Rodrigues:

Se vamos pedir às escolas para diversificar sua resposta e criar serviços adaptados a populações que antes nunca lá estiveram, é essencial que

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mais recursos e materiais sejam endereçados à escola. A educação inclusiva pressupões uma escola com uma forte confiança e convicção de que possua os recursos necessários para fazer frente aos problemas. (RODRIGUES, 2006, p.310)

A proposta de trabalho colaborativo entre o professor da Educação Especial e

o professor da sala comum pode ser compreendida como parte dessa rede de

recursos a serem criados e utilizados na escola, visando ao desenvolvimento de

práticas pedagógicas mais bem sucedidas. É, portanto, uma alternativa de educação

inclusiva no combate à exclusão e à segregação dos alunos com deficiência e

transtornos globais do desenvolvimento na escola regular.

A constituição de uma cultura colaborativa vem na contramão da necessidade

mais evidente de nossa sociedade atual – a competividade, a busca desenfreada de

triunfar sobre as outras pessoas, em que a premissa é individualista e não coletiva,

básica no capitalismo.

A escola, espaço de desenvolvimento de competências acadêmicas e de

formação ética e política, não tem conseguido competir com a força do mercado

consumista, reflexo do capitalismo selvagem de nossa sociedade. Bastam alguns

minutos de observação na escola para rapidamente levantarmos dados do quanto

as crianças perderam a solidariedade e não constroem o sentido da comunidade29,

mostrando-se egoístas, preocupadas com a sua individualidade.

Nem mesmo os anos passados na escola têm conseguido manter, ou mesmo

promover, nos seus alunos a generosidade ou o compromisso coletivo. Não será a

inclusão dos alunos com deficiência e transtornos globais do desenvolvimento uma

possibilidade de reverter essa situação a partir da escola? Talvez a resposta a essa

questão possa nos levar a uma ideia contestável de que a escola seja a “salvadora

da pátria”, ou mesmo, que a ela compete a formação integral do aluno como única

fonte possível, em dias atuais, de construção de valores e atitudes éticas; porém, se

pensarmos que a escola não apenas reproduz a sociedade em que vivemos, mas

também tem a responsabilidade de transformá-la, como nos aponta Saviani, 1994

29 Falamos do conceito de comunidade entendido, segundo Flyn (1989), como um grupo de

indivíduos com comunicação honesta um com o outro, cujos relacionamentos avançam para além do seu comedimento e que, por isso mesmo, desenvolvem algum compromisso significativo de ficar alegres juntos, chorar juntos, dar prazer um ao outro e tornar as condições dos outros as suas

próprias condições.

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apude Machado, 1998, ao tratar da visão mecaniscista inerente às teorias crítico-

reprodutivistas que considera a sociedade determinante unidirecional da

Educação,ignorando a categoria de ação recíproca – o que significa que o

determinado também age sobre o determinante e consequentemente a Educação

também interfere sobre a sociedade, podendo contribuir para a sua transformação.

Nesta medida, ppodemos olhar para essa questão por um outro prisma e aproveitar

a inclusão do aluno com deficiência e transtornos globais do desenvolvimento como

uma alavanca para essa transformação.

Apoiados no que nos diz Araújo (2004), que quando a “cultura de

coletividade” é implementada, as pessoas nela envolvidas passam a reconhecer o

que sabem, o que os outros sabem e o que todos não sabem – atitudes que

resultam na busca de superação dos limites do grupo, e por que não dizer, dos

limites de cada um – assumimos para este trabalho que tratar dessa cultura de

coletividade, aqui denominada por nós cultura colaborativa é, sem dúvida nenhuma,

tratar da cultura inclusiva na escola, já que essa tem sido uma estratégia eficiente

nos processos de inclusão escolar, assim como também tem sido significativa a

eficácia na formação dos professores.

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3. PESQUISA DE CAMPO- METODOLOGIA E PROCEDIMENTOS

DA COLETA DE DADOS

3.1 O MUNICÍPIO DE SÃO BERNARDO DO CAMPO

A escolha do Município de São Bernardo do Campo se deu pelo fato de a

pesquisadora ser professora da Educação Especial nesse município desde 1991,

quando ingressou por concurso público na escola especial. Desde então, tem

vivenciado as propostas de transformação da Educação Especial nesse munícipio, e

a aproximação da possibilidade de aposentadoria nos próximos anos nessa rede

despertou o interesse e o compromisso com o município que a acolheu desde o

início da sua carreira, mobilizando-a a deixar a sua contribuição em forma de

pesquisa a essa rede que tem construído um percurso de avanços e recuos nas

novas propostas que se apresentam no âmbito federal.

3.1.1 Caracterização do município e o contexto educacional

(...) surgiu pela primeira vez a força do novo, a esperança da recuperação da voz para milhões de brasileiros, Lula, João Ferrador, centenas e milhares de irmãos no trabalho(...). (CARDOSO;LIMA;COSTA, 1981, p.88)

São Bernardo do Campo é uma das primeiras cidades brasileiras a se

constituir, já que sua proximidade com o Porto de Santos fez da região um local de

passagem para o Planalto pela tropas que carregavam mercadorias e pousavam na

cidade; também foi se caracterizando por trabalhadores descendentes dos primeiros

imigrantes italianos que chegaram ao Porto de Santos e estabeleceram suas vidas

nessa cidade. Porém, somente em 1944, conseguiu o título de munícipio de São

Bernardo do Campo, desvinculando-se do distrito de Santo André.

Completou 460 anos e é conhecida nacional e internacionalmente como a

Capital do Automóvel no Brasil. O fato de ser um polo de indústrias metalúrgicas de

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grande porte trouxe para a cidade milhares de pessoas de todas as partes do Brasil

em busca de emprego, porque reconheciam o seu poderio industrial30.

Além da indústria metalúrgica, São Bernardo do Campo também tem a marca

de ser a Capital dos Móveis, com muitas indústrias moveleiras instaladas na cidade,

com maior expansão na década de 60, o que ocasionou no processo de urbanização

uma mudança estrutural e não planejada (São Bernardo do Campo, 1992).

Essas indústrias se instalaram especialmente na Via Anchieta, e a população

trabalhadora ocupou as várzeas e colinas, marcadas pela fragmentação do espaço,

acelerando o processo de periferização, o que torna a cidade paradoxal, pois, se por

um lado, tem a produção da riqueza movida pelas empresas multinacionais, por

outro, configuraram-se áreas de altíssima vulnerabilidade social, ocupadas pela

população de forma desordenada (São Bernardo do Campo, 2009).

Nesse cenário nacional, na década de 80, surgiram movimentos sociais e

grevistas, especialmente nas indústrias metalúrgicas, que iriam marcar a história da

cidade e do país.

A partir dessas ações de trabalhadores mobilizados, criaram-se partidos

políticos e surgiram personalidades que ganharam notoriedade no cenário nacional.

Um exemplo disso está no reconhecimento nacional do ex-presidente da República,

Luiz Inácio Lula da Silva, que foi líder sindical em SBC e ainda é morador da cidade.

A cidade está localizada a sudeste da Região Metropolitana de São Paulo31, e

é uma das integrantes da região do Grande ABC32. Além das cidades de Santo

André e São Caetano, também faz limites com São Vicente, Cubatão, Diadema e

São Paulo.

30 Na década de 1950, houve maciça instalação de indústrias na cidade, como Volkswagen, WiLLYS Overland do Brasil (atualmente Ford), Brasmotor e Varam Motores, entre outras. Ainda é uma cidade com muitas indústrias automobilísticas e metalúrgicas. 31 Der acordo com Abrúcio e Soares (2001), a região metropolitana de São Paulo foi criada em 1967 por um decreto estadual e abrange uma área de 8.051 Km², e é um dos maiores aglomerados urbanos do mundo. 32 Denominação dada para designar as cidades de Santo André, São Bernardo do Campo e São Caetano do Sul, que, vizinhas geograficamente, compõem uma região tradicionalmente industrial do Estado de São Paulo.

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Possui um território de 408,45 km² distribuídos em zona urbana e rural, e a

ele pertence a Represa Billings33, que é 70% situada na cidade. Em decorrência das

muitas áreas de proteção de mananciais que possui, há muito envolvimento e

preocupações com as questões de meio ambiente.

Permanecem em seu território muitas empresas automobilísticas e

moveleiras, além de indústrias do setor têxtil, caracterizando-a como uma das três

maiores receitas de impostos do Estado de São Paulo e um dos doze maiores

orçamentos dos munícipios do país, à frente de muitas capitais. Referindo-se ao ano

de 2008, entraram para os cofres públicos cerca de R$ 1,7 bilhão (São Bernardo do

Campo, 2009).

Com relação ao contexto educacional desse munícipio, merecem destaque

especial os investimentos realizados na Educação Infantil como os primeiros

investimentos municipais na Educação, motivados especialmente por todas as

circunstâncias de metropolização descritas acima nesse contexto político e social,

bem como pelo crescimento populacional e sindical.

Na década de 60, surgiu na administração do prefeito Lauro Gomes o

primeiro Jardim da Infância. Posterior a ele, viabilizou-se a instalação de classes

municipais anexas à rede estadual de ensino e entidades religiosas, num crescente

movimento de atender os alunos da Educação Infantil. Cabe destacar que ao longo

das subsequentes administrações, esses investimentos só aumentaram, e na

década de 80, “a pré-escola era reconhecida como modelo para o país” (São

Bernardo do Campo, 1992, p.21). Em 1981, enquanto o atendimento a essa faixa

etária não passava de 2%, as escolas particulares em torno de 11%, o munícipio de

SBC ofertava esse atendimento a mais de 87%.

Cabe alertar que estamos falando de uma política educacional direcionada ao

público alvo da Educação Infantil nas décadas de 60 a 80, quando ainda não havia

sido promulgada a Constituição Federal de 1988, que menciona a oferta da

educação de zero a seis anos na Educação Infantil, o que torna esses investimentos

municipais de maior importância e significado para a Educação.

33 Represa Billings é um dos maiores e mais importantes reservatórios de água da região metropolitana de São Paulo; foi idealizada pelo engenheiro Billings na década de 20, com o objetivo de gerar energia para a usina hidrelétrica instalada em Cubatão.

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Os espaços destinados às creches, que desde a sua criação, em 197934,

estiveram vinculados às políticas de assistência social, após a promulgação da

CF/88, por meio de reivindicações trazidas pela população, passaram a ser

gerenciados pelo Departamento de Educação, instituindo uma nova concepção de

trabalho em uma visão educativa.

Em 201135, a Secretaria de Educação administrava 94 escolas de Educação

Infantil, sendo 13 destinadas aos alunos de 0 a 3 anos em período integral

(creches). As demais escolas de Educação Infantil atendem os alunos de 4 e 5 anos,

todas em período parcial, porém algumas delas possuem classes destinadas ao

período integral, cujas vagas são selecionadas mediante as inscrições realizadas

pelas famílias, segundo critério de pais trabalhadores e renda per capita. Cabe

esclarecer ainda que 2 dessas escolas possuem classes de 2 e 3 anos em período

parcial.

Em 1998, iniciou-se o processo de municipalização do Ensino Fundamental,

sendo municipalizadas 26 escolas da rede estadual de 1ª a 4ª série, com

aproximadamente 18.500 alunos. A ampliação desse atendimento se deu ao longo

dos próximos anos, não apenas pela municipalização de outras 13 escolas da rede

estadual, mas também pela construção de 28 novas escolas, totalizando, no ano de

2004, 67 escolas, e em 2011, eram 71 escolas de Ensino Fundamental. Houve

durante todo esse período de municipalização a definição de novos objetivos para o

Ensino Fundamental, bem como reestruturações de organização com deslocamento

de funcionários e instalação da seção de Ensino Fundamental na Secretaria de

Educação.

A tabela abaixo nos informa sobre a situação de matrículas realizadas no ano

de 2013, segundo o Censo escolar:

34 Nesse ano, além do surgimento da primeira creche da rede municipal, o Serviço de Educação Pré- escolar nomeou os estabelecimentos de ensino de Escolas Municipais de Educação Infantil (EMEI). 35 Dados coletados em junho de 2011.

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Tabela 4 - Número de matrículas nas escolas municipais de São Bernardo do Campo no ano de

2013

Creche

Parcial

Creche

integral

Ed. Infantil

Parcial

Ed. Infantil

Integral

Ensino

Fund .

anos

Iniciais

Parcial

Ensino

Fund.

Anos

Iniciais

Integral

Rede

Municipal

Urbana

6249 5662 16857 0 35620 3621

Rede

Municipal

Rural

146 0 331 0 671 113

Fonte: portal.inep.gov.br/básica-censo

Com relação à Educação de Jovens e Adultos, teve início no município em

1936, pela iniciativa de empresários que visavam à qualificação de seus atuais e

futuros funcionários (São Bernardo do Campo, 2004), já que o fluxo migratório de

adultos de outros estados e cidades foi sendo motivador para o aumento dessa

modalidade de ensino, que passou por várias propostas desde o Movimento

Brasileiro de Alfabetização – MOBRAL, extinto pelo governo federal, até se

configurar no município ao que é hoje, uma modalidade de ensino para jovens e

adultos, pertencente à Secretaria de Educação.

Cabe esclarecer que a organização de ensino na rede municipal de SBC se

caracteriza pelo provimento de seus cargos por meio de concursos públicos. Pela lei

5820/200836, a rede de ensino possui quadro do magistério e quadro técnico

educacional.

Segundo essa mesma lei, o quadro técnico do magistério envolve funções

nas áreas de:

36 Dispõe sobre o ensino público municipal, o estatuto do magistério do município de SBC e outras providências.

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- 117 -

- docência, composta por professor de Educação Básica I37 e Educação Básica II38;

- Direção e Administração escolar, composta por Diretor escolar e Assistente de

Diretor escolar39;

- Coordenação de atividade pedagógica, composta pelo Coordenador Pedagógico;

- Orientação, Planejamento, Supervisão e Acompanhamento do Ensino, composta

por Orientador Pedagógico. Em 2010, eram 55 OPS na rede.

Cada escola da rede municipal de SBC abriga equipe gestora, que é

composta por diretor e coordenador pedagógico. As escolas com determinado

número de classes ou mais também abrigam assistente de direção ou PAD.

Todas as escolas são acompanhadas pela OP de referência, ou seja, uma

mesma OP pode acompanhar até 5 escolas de Educação Infantil ou Ensino

Fundamental indiscriminadamente. A lotação das OPs está centralizada no

CENFORPE – Centro de Formação de Profissionais da Educação.

Já o quadro técnico educacional é composto por assistente social,

fisioterapeuta, fonoaudiólogo, psicólogo, terapeuta ocupacional, e “compreende as

funções de apoio técnico, assessoria e de suporte às ações pedagógicas” (São

Bernardo do Campo, 2008, s/p). Em 2010, essa equipe era composta por 4 AS, 15

FONOS, 17 PSICOS, 3 TO e 1 FISIO.

Essas equipes ficam lotadas no Complexo Aldemar Moreira e são distribuídas

por todas as escolas da rede municipal em forma de referência, sendo que cada

profissional pode ter quantas escolas forem necessárias, e seu papel é auxiliar a

escola mediante solicitação/necessidade.

Tratemos agora, de forma mais particularizada, da Educação Especial no

munícipio.

37 Educação Básica I refere-se ao Infantil, Fundamental (anos iniciais) e Profissional. 38 Educação Básica II refere-se ao Fundamental, Especial e Profissional. 39 Este cargo encontra-se em vacância (cargo em extinção), ocupado por profissionais concursados que, ao irem sendo desligados da rede, não serão repostos por concurso; porém, professores poderão ser designados para ocupação dessa função sob a denominação de PAD – Professor de Apoio à Direção, por meio de processos internos de seleção.

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3.1.2. Histórico da Educação Especial em São Bernardo do Campo – uma história

de mais de 50 anos

A história da Educação Especial nesse munícipio começou em 1957 quando

nasceu a Educação Especial, e caminha até os dias atuais; porém, para este

trabalho, paramos o estudo em 2012, o que, portanto, remete-nos a uma história de

mais de 50 anos.

No resgate que faremos neste item, o foco serão as implantações dos

serviços de atendimento a alunos com deficiência e transtornos globais do

desenvolvimento pela Secretaria de Educação, não apenas no que tange às

políticas públicas implementadas pelas instâncias governamentais, mas também aos

investimentos e propostas realizadas pelos seus profissionais ao longo dessa

história, na tentativa de oferecer a essa população o melhor atendimento possível

em diferentes tempos e espaços educacionais.

Precisamos alertar o leitor que este resgate histórico é impregnado de

aspectos subjetivos e será inevitável que a visão e as considerações da

pesquisadora apareçam no texto de forma explícita ou implícita sobre o processo de

implantação da educação inclusiva, levando-se em consideração que a história

desse munícipio se mistura com a própria história da pesquisadora, que vivenciou e

vivencia ainda “na alma e na carne” muitas das mudanças ocorridas e ocorrentes

ainda nos dias atuais.

Uma descoberta surpreendente ao pesquisar o histórico da Educação

Especial nesse munícipio é a constatação de que a criação do órgão municipal

responsável por pensar as políticas públicas para Educação Especial no munícipio

de SBC antecede a criação do órgão nacional responsável pelo planejamento

dessas políticas no âmbito nacional. Isso nos move a concluir que para esse

município, o atendimento aos alunos excluídos das escolas regulares, e aqui

tratamos exclusivamente daqueles que apresentam deficiência ou transtornos no

desenvolvimento, desde longa data, é uma preocupação para os seus governantes.

Cabe esclarecer que nessa época, o município tinha como responsabilidade

exclusiva a Educação Infantil, pois a municipalização do Ensino Fundamental I se

deu apenas após 1998, quando os investimentos tanto financeiros como

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profissionais, em especial de formação, acabaram se direcionando de forma mais

prioritária para esse nível de ensino. Dessa forma, os investimentos públicos, até

então, estavam distribuídos entre a Educação Infantil e a Educação Especial.

Segundo Fagliari (2012), a história da implantação de políticas municipais

para atendimento educacional aos alunos com deficiência teve seu início na

educação de surdos/deficientes auditivos, dada pela mobilização de pais que, como

consequência, conquistaram a instalação de um Núcleo de Educação de Surdos,

que, em poucos anos, transformou-se na Escola de Surdos.

Desde 1967, o município contribuía com a Associação de Pais e Amigos do

Excepcionais (APAE), direcionada para os alunos com deficiência mental, tomando

para si a responsabilidade pelo pagamento dos seus professores. Tratamos dessa

tendência de criar instituições escolares pelos movimentos dos pais dos

excepcionais no Capítulo 1, quando apresentamos o paradigma da

institucionalização. Porém, cabe complementar que essas instituições, por

receberem as contribuições do governo, muitas vezes foram confundidas com

espaços institucionais públicos e não privados, conforme nos aponta Kassar (1998,

s/p) ao tratar dessas instituições “(...) como extremamente fortes, com lugar

garantido nos discursos oficiais, chegando a confundir-se com o próprio atendimento

„público‟ aos olhos da população (...)”

Fagliari (2012), em pesquisa detalhada sobre as políticas públicas

educacionais nesse município, aponta que em 1970, o governo municipal de SBC

criou o Serviço de Educação Especial, com a construção da primeira escola pública

para deficientes mentais situada no bairro de Rudge Ramos, e também promoveu o

primeiro curso de especialização para professores de alunos excepcionais e

deficientes mentais, o que se repetiu por mais alguns anos, até o final da década.

Atualmente, esse espaço foi cedido para a Secretaria de Saúde para a construção

de um CAPES, e a escola especial transferida para outro espaço no mesmo bairro; a

partir das mudanças propostas pela Política Nacional de Educação Especial na

perspectiva da Educação Inclusiva, em 2009, foi desativada enquanto Escola

Especial, e o espaço se transformou em um Complexo - Complexo Aldemar Moreira

- para o atendimento ao deficiente jovem e adulto que não se beneficiou da

integração nos programas de profissionalização e inserção no mercado de trabalho

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de qualquer espécie e que, em decorrência da idade associada aos significativos

déficits, não pode ser matriculado na Educação de Jovens e Adultos.

Ainda na década de 70, segundo os estudos de Fagliari (2012), foi construída

uma outra escola especial chamada Marly Buissa Chiedde, que também sofreu

mudanças de prédio e de proposições em 2001, quando foi compor um Complexo

Educacional no Bairro do Demarchi.

Esse Complexo passou a ter em sua composição a escola especial e a escola

de Educação Infantil, que atende os alunos de 0 a 6 anos, e ainda o Ensino

Fundamental I. Esse compartilhamento de prédio por essas modalidades de ensino

tem prioritariamente o propósito de favorecer a integração de projetos que levem à

inclusão dos alunos com deficiência e transtornos do desenvolvimento nos espaços

de uso coletivo, como a Biblioteca Escolar Interativa (BEI), Laboratório de

Informática, pátio de atividades externas e outros.

Caminhando um pouco mais na nossa linha do tempo, no final da década de

90, os documentos municipais apontaram para a integração de alunos com

deficiência em classes regulares, especialmente na Educação de Jovens e Adultos,

porém apenas para aqueles que tivessem condição de acompanhar o programa

instituído para a turma, “(...) deveriam estar preparados para acompanhar o grupo no

qual seriam inseridos” (São Bernardo do Campo, 1999).

A municipalização se deu de forma gradativa desde 1998, e desde 2002, esse

nível de ensino está totalmente sob a responsabilidade do município, inclusive com a

incorporação das classes especiais já existentes nas escolas estaduais.

Para Mazzotta (1982, p. 48), “A classe especial, instalada em escola comum,

é caracterizada pelo agrupamento de alunos classificados como da mesma categoria

de excepcionalidade, que estão sob a responsabilidade de um professor

especializado”. Essas classes especiais em São Bernardo trouxeram grandes

defasagens idade/série, dificultando a inserção desses alunos nas classes regulares;

corroborando com o paradigma de integração, passaram a ser chamadas classes

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integradas40, o que, portanto, ocasionou a extinção de algumas, hoje completamente

extintas.

A partir desse modelo de integração estabelecido para a rede municipal de

ensino, o público alvo das escolas especiais foi radicalmente modificado: “(...)

significativo déficit cognitivo, associado a quadros variados de comprometimento

incluindo deficiência neuromotora, sensorial, alterações de ordem

psíquica/emocional, distúrbios da comunicação, síndromes genéticas entre outras

(...) (São Bernardo do Campo, 2006, p.40).

Na década de 90, foi criado também o Programa de Estimulação Essencial,

que tinha como objetivo o esclarecimento de diagnóstico e o atendimento precoce

de crianças com atraso no desenvolvimento neuropsicomotor e/ou necessidades

múltiplas isoladas ou associadas (São Bernardo do Campo, 1998); e em 2000,

dada a demanda que se instituiu, com grande fila de espera para esse atendimento,

houve uma significativa ampliação dos recursos humanos desse Centro, já que em

virtude da “discussão e reflexão sobre a inclusão, o número de crianças

acompanhadas foi se ampliando gradativamente na educação infantil” (São

Bernardo do Campo, 2004, p. 63 ).

Desde 2000, as discussões com tema de inclusão escolar se tornaram mais

acirradas no município, que, por influência das propostas de inclusão escolar

veiculadas pelo mundo todo, foi consolidando a inclusão dos alunos de forma

gradativa e crescente nas escolas regulares, desde a Educação Infantil até o Ensino

Fundamental, como nos mostra os dados do Censo escolar de 2013.

40 As classes integradas tinham por objetivo oportunizar aos alunos com deficiência um período de transição entre a

escola especial e a classe regular, respeitando um limite máximo de 3 anos de permanência nessa classe para passagem definitiva para as classes comuns.

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Tabela 5 - Número de alunos especiais matriculados nas escolas comuns em São Bernardo do

Campo em 2013

Creche

Parcial

Creche

Integral

Ed.

Infantil

Parcial

Ed. Infantil

Integral

Ensino

Fund.

Anos

iniciais

Parcial

Ensino

Fund.

Anos

iniciais

Integral

Rede

Municipal

Urbana

48 13 191 0 839 35

Rede

Municipal

Rural

0 0 2 12 0 0

Fonte: portal.inep.gov.br/básica-censo

Esses dados nos indicam não apenas sobre o acesso do aluno com

deficiência na rede regular de ensino, mas refletem especialmente as necessidades

advindas desse acesso, favorecendo as discussões sobre os paradigmas da

segregação e da integração em contraposição ao paradigma da inclusão para esses

alunos.

Levando-se em consideração que as políticas nacionais para esse fim

estiveram recheadas de inconsistências conceituais, chegando mesmo a ocupar o

lugar de polêmicas individuais entre os seus propulsores com posicionamentos

individuais, o munícipio de São Bernardo viveu e vive ainda os reflexos dessas

inconsistências na organização da política pública desarticulada com a realidade

escolar e com a prática docente.

Em 2006, esse Centro de Apoio foi absorvido pelo Complexo Integrado Pe.

Aldemar Moreira, já mencionado acima, que, em 2009, foi extinto, sendo os seus

professores lotados na Educação Especial, disponibilizados nas escolas de

Educação Infantil da rede municipal para o atendimento educacional especializado

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na modalidade itinerância41, o que significa que esses professores têm mais de uma

escola para acompanhar na mesma região.

Com a implantação da nova Política da Educação Especial na perspectiva da

Educação Inclusiva no Brasil pelo MEC, em 2008, que definiu mais claramente o que

se propunha em âmbito nacional, em consonância com a mudança de gestão

pública nesse município em 200942, houve a tomada de decisão sobre a desativação

imediata das escolas especiais municipais e dos demais recursos especializados

que estivessem fora do lócus: escola regular, de forma a garantir que todos os

alunos frequentassem a escola regular. Exceção a isso estava a escola de educação

de surdos, que se manteve funcionando separadamente da escola regular até os

dias atuais, graças ao movimento de alunos surdos, que reivindicam ser ouvidos e

ter plena participação nas discussões sobre a inclusão do aluno surdo na rede

regular de ensino.

Em consequência da desativação das escolas especiais, houve a inserção

dos alunos com deficiência intelectual, múltipla deficiência e transtornos globais do

desenvolvimento na rede regular de ensino, inclusive na Educação de Jovens e

Adultos, impulsionando que, recentemente, novas modificações fossem propostas

para os espaços ocupados anteriormente pela Escola Especial e houvesse a

implantação das salas de recursos multifuncionais43 nas escolas regulares, conforme

indicação do MEC.

Essas salas de recursos têm por objetivo: apoiar a organização e a oferta do

Atendimento Educacional Especializado – AEE, prestado de forma complementar ou

suplementar aos estudantes com deficiência, transtornos globais do

desenvolvimento, altas habilidades/superdotação, matriculados em classes comuns

41 Itinerância se refere à forma de atendimento do professor de Educação Especial nas escolas de Educação Infantil, que é de visitas sistemáticas previamente agendadas para observação do aluno na classe comum onde está incluído, com devolutivas e orientações posteriores aos professores dessas classes. 42 Cabe esclarecer que essa mudança de gestão pública atrelada à mudança de partido político veio a partir de 2009, depois de 12 anos de um mesmo partido político, ou de partidos convergentes na política, ter assumido a gestão da cidade, sendo essa mudança um momento de grande expectativa

pela população, não apenas na Educação, mas em todos os âmbitos da administração pública. 43 Salas de recursos multifuncionais - é um programa do MEC que fornece alguns equipamentos de

informática, mobiliários, materiais didáticos e pedagógicos para a criação de salas destinadas a integrar alunos nas escolas públicas regulares por meio da política de educação inclusiva.

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do ensino regular, assegurando-lhes condições de acesso, participação e

aprendizagem.

É interessante observar que desde o seu surgimento, as escolas especiais

tiveram como propósito de sua existência oportunizar ao aluno com deficiência o

acesso à escolarização, já que até muito pouco tempo atrás, as escolas regulares

não recebiam essa população. Muitos estudiosos apontam que esse é o “x” da

questão na inclusão, já que essas escolas surgiram com caráter de substituição da

escola regular.

Nesse município, o que os documentos da década de 70 da Secretaria de

Educação (São Bernardo do Campo, 1985, p.48) trazem são indicações de que

“para o acesso à escola especial havia critérios, como controle de esfíncteres,

locomoção própria e semi-independência em alimentação”, o que, em muitos casos,

inviabilizava o acesso dos deficientes mais comprometidos no seu desenvolvimento

à escola especial. Isso nos remete a pensar que não se tratava de substituição, pois,

em muitos casos, nem mesmo o acesso à escola especial estava garantido,

justificado pela própria história do deficiente e, consequentemente, pelas

concepções e pelo lugar na sociedade dessa população, já tratada neste trabalho

dissertativo. Cabe registrar que o ingresso nas escolas especiais se dava

exclusivamente pela passagem por esse setor, e o encaminhamento para os

recursos educacionais mais adequados, segundo a avaliação dessa equipe técnica

multidisciplinar.

3.2 PÚBLICO ALVO DA PESQUISA

A pesquisa de campo foi realizada com duas professores da Educação Infantil

e quatro professores do Ensino Fundamental e seus respectivos professores da

Educação Especial. Cabe esclarecer que se trata de quatro professores de

Educação Especial, considerando que as escolas de Educação Infantil e Ensino

Fundamental pesquisadas estavam sob o acompanhamento e a parceria, em alguns

casos, do mesmo professor da Educação Especial no serviço de AEE.

Justificar a definição de nosso público alvo pelo simples fato de nosso tema

se relacionar à prática docente poderia nos remeter a uma visão simplista do ato de

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ensinar a uma perspectiva mecânica, descontextualizada, quando sabemos que o

professor não ensina no vazio; o ensino deve ser sempre situado com alunos reais

em situações definidas que sofrem interferência, não apenas de fatores internos da

escola, mas também de questões sociais mais amplas que identificam uma cultura e

um momento histórico político, e que, portanto, tornam o ato de ensinar um ato

socialmente localizado. No caso desta pesquisa, localizado nas questões de

inclusão.

Considerando esses aspectos, optamos por estudar o professor em seu

contexto escolar, o que nos parece de tal importância, pois tratamos do

reconhecimento do seu papel frente à inclusão, do conhecimento de sua realidade,

que poderão favorecer as propostas de intervenção e transformação em sua prática.

Dessa maneira e em concordância com Cunha (2005, p. 33), optamos por

estudar o professor no seu cotidiano: “O estudo do professor no seu cotidiano pode

auxiliar na definição de uma nova ordem pedagógica e na intervenção da realidade

no que se refere à sua prática e à sua formação”.

Mas, o que significa cotidiano no contexto desta pesquisa? Entendemos

cotidiano como nos apresenta Cunha (2005, p.35): “A vida cotidiana é a objetivação

dos valores e conhecimentos do sujeito dentro de uma circunstância. É através dela

que se faz concreta a prática pedagógica, no caso do professor.”

Nesse sentido, pesquisar o professor no seu cotidiano é tentar descobrir

como ele vive as diferentes situações em sua prática e como as verbaliza em seu

discurso, além de aprofundar quais relações estabelece com os alunos e com os

desafios que a sociedade em que vive lhe apresenta.

3.3. METODOLOGIA E PROCEDIMENTOS DA PESQUISA

Romper os ferrolhos do modelo cartesiano de pesquisa requer inúmeros mergulhos, mortes e ressureições. Caças não autorizadas. Vindas e idas. Vivências corporais do que é efêmero. Requer, ainda, assumir que nossos objetos de estudo são tão somente criações subjetivas. Necessidades e desejos pessoais. Não existe fora de nós, mas junto a nós. Em essência, somos parte do próprio tema estudado com tudo o que ele tem de bom e de ruim. (FERRAÇO, 2005, p. 103-104)

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Pensar a pesquisa em educação exige, antes de mais nada, compreender que

estamos tratando de um campo dinâmico, caracterizado prioritariamente pelas

relações humanas e, por isso mesmo, em constante movimento de

experimentações, diferentes percepções que não podem ser mensuráveis,

quantificáveis, como nos solicita o rigor científico numa perspectiva positivista. Ainda

se considerarmos essa perspectiva, Santos (2000, p.63) aponta que “Conhecer

significa dividir e classificar para depois determinar relações sistemáticas entre o que

se separou”, o que nos leva a uma outra questão fundamental na pesquisa nas

Ciências Sociais, a possibilidade de redução da complexidade dos fatos e

fenômenos que se dá nesse âmbito, o que seria negar as subjetividades humanas e

suas relações com o Universo, que fogem à racionalidade lógica e às regras do

saber científico.

Se na modernidade, misturar-se ao objeto de estudo seria sinônimo de não ser

científico, na contemporaneidade, essa racionalidade não tem dado conta de

explicar o mundo e suas relações, não sendo mais possível mantermos a

neutralidade do investigador, que ocupa um tempo e um espaço caracterizado pelas

suas experiências e pontos de vista e, portanto, misturado, interconectado ao seu

objeto de estudo formalizando uma co-dependência entre sujeito e objeto, ainda que

isso limite a pesquisa ao olhar do pesquisador.

Como nos orienta Ferraço (2005), se estamos misturados, interligados com o

nosso objeto de estudo, chegando, às vezes, a nos confundir com ele, no lugar dos

estudos „sobre‟ algo acontecem os estudos „com‟ algo.

Ter como objeto de estudo a prática docente no processo de inclusão escolar,

implica analisar necessariamente o cotidiano e, portanto, ter a complexidade como

característica da pesquisa, seja na amplitude de olhar para o objeto de estudo, seja

na necessidade de virar do avesso conceitos teóricos, categorias e noções já

construídas pela ciência. Mas, ainda que pareça que essa complexidade seja um

dificultador para a pesquisa, ela nos leva a desvelar práticas ocultas no fazer

cotidiano, que não acomodam o olhar viciado, fragmentado e universal do

pesquisador.

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Para pesquisar o e no cotidiano da escola, é preciso assumir que as relações

acontecem em redes tecidas nos mais diferentes contextos, como a prática

pedagógica, a ação governamental, o trabalho coletivo e cooperativo na escola, a

formação continuada e a pesquisa em educação. Isso significa que é, antes de mais

nada, pesquisar e pensar sobre o saber e o fazer enquanto prática emancipatória da

escola, a partir de seus protagonistas, nesta pesquisa focada nos docentes.

Considerar o cotidiano das escolas significa ser este o nosso ponto de partida e o

nosso ponto de chegada, sem corrermos o risco de permanecer “correndo atrás do

rabo”, sem sairmos do lugar, mas no movimento de avançar na transformação

dessas práticas que verdadeiramente se constroem no cotidiano da escola e que

trazem à tona os conceitos e teorias estruturados na área.

Com relação aos relatos oferecidos nas entrevistas, temos que alertar para as

formas de expressão do sujeito nesta pesquisa, a linguagem falada, que, em

hipótese nenhuma, vem deslocada de outras formas de expressão que podem nos

oferecer sinais que evidenciam valores frente ao fenômeno estudado. Isso significa

considerar nesta pesquisa que é através da linguagem que experimentamos e

partilhamos nossa realidade com os outros e, portanto, manifestamos a nós

mesmos, ou seja, os relatos apresentados são, em primeira análise, relatos repletos

de subjetividades; o vocabulário utilizado, as entonações, as expressões, as pausas

e os silêncios são indicadores da forma de ser e de agir do sujeito entrevistado.

Para Benjamin (1994), filósofo e sociólogo francês do século XX, narrativa é:

uma forma artesanal de comunicação. Ela não está interessada em transmitir o “puro

em si” da coisa narrada como uma informação ou um relatório. Ela mergulha a coisa

na vida do narrador para em seguida retirá-la dele. Assim se imprime na narrativa a

marca do narrador, como a mão do oleiro na argila do vaso. (p.205)

Já para Bruner (1997, p. 34), “a narrativa é um modo de pensamento, pois ela

se apresenta como princípio organizador da experiência humana no mundo social,

do seu conhecimento sobre ele e das trocas que ele mantém.” O psicólogo e

pedagogo americano destaca o papel das narrativas no processo de aprendizagem

humana, por proporcionar o compartilhamento de experiências e vivências entre as

pessoas.

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É através da linguagem que fazemos nosso cotidiano, mas é através dela

também que podemos analisá-lo, e o simples fato de responder às questões da

entrevista pode ser considerado uma possibilidade para o professor refletir sobre a

sua prática, pois, ao falar ao pesquisador, escuta a si próprio, resgata processos e

expectativas, analisa dificuldades e conquistas, enfim, descobre caminhos e

possibilidades. Além disso, a linguagem estabelece a reciprocidade, especialmente

em situação face a face, como foi o caso de nossas entrevistas; a fala de um produz

reações no outro e a subjetividade de ambos produz uma aproximação única que

não pode ser reproduzida. Esta é a limitação na entrevista.

É necessário, ainda, alertar que pode haver diferença entre o viver e o falar

sobre a sua prática diante da inclusão de alunos com deficiência ou transtornos

globais do desenvolvimento, podendo o professor teorizar sobre formas mais

recomendáveis de estabelecer relações com seus alunos incluídos, e na prática,

vivenciar situações em que reaja de modo diferente do manifestado teoricamente, ou

ainda, contar uma experiência vivida no cotidiano, acrescentando ou subtraindo

alguma informação. Este é o filtro, consciente ou não, que o relato carrega em

função do sujeito que o faz.

Devemos deixar claro que não nos outorgamos a falar pelas escolas ou pelos

sujeitos pesquisados, em uma atitude interpretativa ou contemplativa dos saberes e

fazeres dos professores, ainda porque entendemos que isso nos levaria a análises

inócuas do vivido na escola, mas sim, temos nesta pesquisa uma tentativa de trazer

à tona outros discursos e relações desses saberes e fazeres na escola para a

realização do trabalho pedagógico marcado pelos constantes desafios e dificuldades

que se apresentam no seu cotidiano e que, de forma geral, são desvalorizados ou

pouco valorizados.

Pesquisar o cotidiano é assim, um trabalho de busca de compreensão das táticas e usos que os professores desenvolvem no seu fazer pedagógico, penetrando astuciosamente e de modo peculiar a cada momento neste espaço de poder. Abdicando da busca de “ver” a totalidade – objetivo e paradigma de uma ciência que traz, embutida em si mesma, um necessário esquecimento e desconhecimento das práticas cotidianas complexas, plurais e diversas (...). (OLIVEIRA, 2005, p.49-50)

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Considerando o exposto até aqui, concordamos com o que nos afirma

Azevedo (2001, p.122): “basta de sermos sujeitos narrados. Nós, os que atuamos

nas escolas, somos narradores de nossa experiência, narradores de nossos

acontecimentos”, e nos parece que narrar as histórias construídas no cotidiano de

algumas escolas de Educação Infantil e Ensino Fundamental no município de São

Bernardo do Campo pode ser um bom caminho para tornar públicas as múltiplas

experiências vivenciadas no âmbito escolar, realizadas e compartilhadas pelos

professores com alunos incluídos em suas salas comuns, que apresentam

deficiência intelectual e/ou transtornos globais do desenvolvimento.

Nesta pesquisa, tomaremos como referência para a análise as narrativas

coletadas nas visitas às escolas da rede municipal, observando os espaços

escolares, conversando com os gestores sobre o desenvolvimento do trabalho

cotidiano de inclusão e registrando as narrativas escolhidas pelos professores

entrevistados para dividir conosco o seu cotidiano de inclusão escolar dos alunos

com deficiência intelectual e transtornos globais do desenvolvimento na escola

comum.

Definidos os caminhos que tomaríamos com a pesquisa de campo, iniciamos

o processo de escolha dos entrevistados, com a apresentação do projeto de

pesquisa à Secretaria de Educação por intermédio da Seção da Educação Especial.

Tão logo nos foi autorizado a dar início à pesquisa de campo nas escolas da

rede municipal de ensino, agendamos uma reunião com a Chefia e a encarregada

da Seção de Educação Especial para o levantamento de dados sobre o Serviço de

Educação Especial a serem utilizados na pesquisa, e solicitamos a indicação dos

professores a serem entrevistados, apresentando como critério para essa seleção:

- professores da Educação Infantil e Ensino Fundamental de diferentes regiões44,

que estivessem com alunos com deficiência ou transtornos globais do

desenvolvimento no ano de 2013 em suas salas de aula comuns, e que contassem

com o acompanhamento dos professores de Educação Especial na escola em que

atuam.

44 As escolas são distribuídas por quatro regiões de abrangência na Secretaria de Educação.

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- que esses professores estivessem desenvolvendo o trabalho de inclusão

desses alunos de forma positiva, com avanços e conquistas evidentes para o aluno

e/ou para o professor.

Cabe esclarecer aqui o porquê de limitarmos a indicação de professores que

estivessem sendo bem sucedidos em suas experiências de inclusão no ano de 2013

nessa rede de ensino. A revisão bibliográfica realizada inicialmente nesta

dissertação de Mestrado permitiu-nos perceber que há pesquisas na área que

apontam em seus resultados para as prescrições de boas práticas inclusivas, bem

como formulações de perfil adequado para o professor inclusivo, ou ainda, relatos

de experiências positivas com os alunos incluídos nas salas de aula comuns que

apresentam deficiência ou transtornos globais do desenvolvimento, que visem

aprofundar as questões de políticas públicas, de questões estruturais e apoios

necessários à escola e ao professor. Mas muito pouco esses estudos têm se

ocupado de analisar a prática do professor sob a perspectiva de uma transformação

dessa prática de forma que ela pudesse beneficiar todos os alunos da classe.

Entendemos, assim, que deveríamos fazer o caminho inverso, ou seja, partir

do professor real, de “carne e osso”, que vive um cotidiano escolar, que tem uma

história de vida e que vive atualmente com êxito a experiência de incluir o aluno com

deficiência ou transtorno global do desenvolvimento em sua sala de aula comum, e

que, a partir do seu relato pudéssemos analisar o que aconteceu com ele nesse

processo de inclusão, que o faz ser um professor respeitado no seu ambiente

profissional, na expectativa de ser esse um farol em um horizonte ainda nublado na

Educação.

Pensamos também em abarcar a Educação Infantil e o Ensino Fundamental

nas séries iniciais, por considerarmos a priori que as boas experiências estivessem,

em sua maioria, na Educação Infantil, levando em consideração as características

da faixa etária e de um currículo mais globalizante, mais articulado, menos

segmentado, e que as maiores dificuldades estivessem no Ensino Fundamental,

onde as exigências de conhecimentos imprescindíveis (leitura/escrita e cálculo) são

mais evidentes e a rigidez curricular mais presente.

A partir dos nossos indicativos, a Seção de Educação Especial encaminhou

por e-mail os nomes dos professores de Educação Especial que estavam atuando

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no AEE nas escolas indicadas para que entrássemos em contato para levantamento

dos nomes das professoras e das turmas que os professores de Educação Especial

indicassem como tendo êxito na prática de inclusão na sala de aula comum.

Importante salientar que as indicações desses professores ocorreram mediante os

dados que as professoras da Educação Especial, no exercício de atuação no ensino

colaborativo, possuíam advindos das observações, orientações e acompanhamento

que realizam de forma sistemática nessas salas de aula com alunos incluídos.

De posse dessa lista e de uma carta de encaminhamento endereçada a essas

escolas pela Seção de Educação Especial, agendamos encontro com a gestão da

escola e a professora de Educação Especial para apresentação da pesquisa e da

indicação dos professores que seriam entrevistados. Nesse mesmo dia,

conseguimos realizar a primeira entrevista com a professora de AEE na escola 1,

especialmente nos ocupando de levantar os dados sobre as motivações do

professor de AEE para indicação deste ou daquele professor da sala comum como

bom professor no que diz respeito à prática docente inclusiva. No roteiro de

entrevista ( apêndice B), além dessa questão sobre a justificativa para a indicação,

também havia uma outra questão que tratava de como percebia a sua parceria com

o professor da sala de aula comum no que diz respeito à sua atuação, além das

informações gerais, como: nome, formação, tempo de atuação na rede de ensino

como professor de Educação Especial e tempo de atuação nessa escola. Assim,

uma a uma fomos realizando as primeiras entrevistas que foram com os professores

de AEE, conforme disposta nas tabela 3 abaixo.

Antes de darmos sequencia a análise das motivações de escolha dos

professores para as entrevistas, entendemos que a tabela abaixo poderá auxiliar o

leitor na localização dos professores entrevistados localizadas nos apêndices:

Tabela 6: Resumo das indicações dos professores de AEE para as entrevistas com os professores das escolas regulares

PROFESSOR DE

AEE APÊNDICE COM

REGISTRO DA

ENTREVISTA

DO

PROFESSOR DE

AEE

ESCOLA A QUE

PERTENCE O

PROFESSOR DE

AEE

MODALIDADE DE

ATENDIMENTO DA

ESCOLA

PROFESSOR DA

CLASSE COMUM

INDICADO PARA

ENTREVISTA

Professora S. Apêndice D Escola 1 Ensino Professora C.

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Fundamental

Professora S. Apêndice F Escola 2 Educação Infantil Professora D.

Professora A. Apêndice H Escola 3 Ensino

Fundamental

Professora B.

Professora M. Apêndice L Escola 4 Ensino

Fundamental

Professora G.

Professora E. Apêndice N Escola 5 Educação Infantil Professora F.

Professora E. Apêndice J Escola 5 Ensino

Fundamental

Professora J.

Posterior a esse procedimento, solicitamos que os professores de AEE, junto

às respectivas equipes de gestão da escola, levantassem com o professor indicado

a disponibilidade de participar da pesquisa para que, só assim, pudéssemos fazer o

agendamento para a entrevista.

A partir disso e seguindo os agendamentos realizados nessas cinco escolas

(uma de Ensino Infantil, três de Ensino Fundamental e uma que atende tanto infantil

quanto fundamental), tivemos o contato direto com o professor da sala comum que

está com o aluno incluído e esclarecemos sobre a intenção e procedimentos de

pesquisa, reforçando a necessidade de autorização dos participantes para a

utilização dos seus discursos na pesquisa, bem como esclarecendo sobre os

recursos de registros gravados ou escritos que realizaríamos.

As entrevistas com os professores da sala comum foram compostas por três

questões abertas( apêndice A). Uma delas era sobre como é estar com essa

inclusão em sua sala de aula comum; outra era como a inclusão tem alterado a sua

prática de professor, e outra dizia respeito àquilo que a inclusão tem modificado na

dinâmica da classe. Além destas, as informações gerais também foram levantadas,

como: nome, formação acadêmica, tempo de rede de ensino e tempo nessa escola.

Para melhor localizar o leitor sobre os professores entrevistados e os

respectivos registros de suas entrevistas indicamos a tabela abaixo:

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Tabela 7: Relação de professores da classe comum entrevistados e sua respectiva localização nos apêndices

PROFESSOR DA

CLASSE COMUM

ENTREVISTADO

APÊNDICE ESCOLA A QUE

PERTENCE MODALIDADE DE

ENSINO

Professor C. Apêndice C Escola 1 Ensino Fundamental

Professor D. Apêndice E Escola 2 Educação Infantil

Professor B. Apêndice G Escola 3 Ensino Fundamental

Professor J. Apêndice I Escola 5 Ensino Fundamental

Professor G. Apêndice K Escola 4 Ensino Fundamental

Professor F. Apêndice M Escola 5 Educação Infantil

Os registros dessas entrevistas foram feitos em algumas situações por

gravador, e em outras, no papel com a escrita do pesquisador das respostas dadas.

As entrevistas nas quais utilizamos o gravador foram as duas primeiras, pois, a partir

da experiência com essas professoras que demonstraram muito incômodo com o

gravador – uma delas, a todo momento, perguntava: „será que tá gravando?‟, e a

outra disse no final da entrevista não ter se sentido à vontade com a presença do

gravador – optamos por fazer o registro das entrevistas no papel, o que funcionou

melhor. Tanto as entrevistas gravadas como as registradas no papel foram

posteriormente retomadas e reescritas, e estão disponibilizadas de forma integral

nos Apêndices.

Porém, cabe alertar o leitor que como se tratam de narrativas, e toda narrativa

possibilita a evocação da memória, a reelaboração da linguagem, o enredamento

dos múltiplos relatos, tendo como fio nesse enredamento aquele dado pelo

pesquisador que, ao seu modo, ao modo de sua arte, irá contar essas histórias

consciente do desafio de inseri-las no campo da ciência, sem perder a lindeza do

imaginário, nem tudo o que foi dito pelo entrevistado no momento da entrevista foi

possível registrar na íntegra; porém, tudo o que está escrito foi dito pelo entrevistado

da forma que foi dito.

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Após a realização das escritas das entrevistas, fizemos uma leitura de todas

elas, levantando aspectos que pudessem ilustrar as questões apresentadas no

Capítulo 2, que tratou das interfaces da prática docente, em forma de excertos.

Realizamos também o levantamento de dados sobre os aspectos gerais dos

entrevistados, como formação acadêmica, tempo de rede e tempo de escola, e

experiência com inclusões anteriores a esta pesquisada. Esses dados estão tratados

na análise dos dados, logo a seguir.

Com o intuito de analisarmos qualitativamente os dados levantados com a

pesquisa, observamos que havia movimentos realizados pelos professores

entrevistados que eram semelhantes, e isso nos chamou atenção para

aprofundarmos a análise dos dados. Nesse mesmo proceder, também buscamos

categorizar alguns pontos levantados nas narrativas dos professores de sala comum

e analisá-los segundo a referência do Index para a inclusão: desenvolvendo a

aprendizagem e a participação nas escolas, que, segundo seus criadores, em 2000,

na Inglaterra, Aiscow e Booth, tem como princípio que:

A inclusão inicia-se com o reconhecimento das diferenças entre os alunos e o desenvolvimento das abordagens inclusivas do ensino e da aprendizagem que têm como ponto de partida estas diferenças. (...) Para incluir qualquer criança ou qualquer jovem, temos que estar preocupados com toda a pessoa, na sua globalidade. Isto pode ser esquecido quando a inclusão foca unicamente um aspecto do aluno, tal como uma deficiência (...). (BOOTH e AISCOW, 2011, p.8)

3.3.1 O contexto das entrevistas: as escolas

Como dissemos anteriormente, as entrevistas foram realizadas no contexto

escolar da rede municipal de São Bernardo do Campo, no 2º semestre de 2013.

A primeira escola visitada pela pesquisadora para a realização da entrevista

chamaremos de ESCOLA 1. É uma escola de Ensino Fundamental localizada em

um bairro central de São Bernardo do Campo, que atende 276 alunos do 1º ao 5º

ano em dois períodos: manhã, das 7h às 12h, e tarde, das 13h às 18h,

disponibilizados em 5 turmas por período. A escola conta com doze professores, um

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para cada turma, um professor substituto e um professor de AEE atende dois alunos

com diagnóstico de deficiência ou transtorno global do desenvolvimento.

A escola está desgastada em sua pintura e está passando por reformas por

estar em um prédio antigo da rede estadual, que mantém até hoje algumas

características daquele sistema, como grades nas portas de ferro, corredores

escuros e compridos com salas de ambos os lados, enfim, é um prédio bastante

fechado e escuro.

As salas de aula também estão bastante judiadas pelo tempo, mas a

manutenção e limpeza são adequadas. Nas salas de aula, os alunos são dispostos

em fileiras em carteiras individualizadas. Os materiais dos alunos e do professor são

guardados em armários fechados com cadeados.

A sala de AEE45, onde realizamos as entrevistas, é uma sala ampla que está

no mesmo andar das demais salas de aula, porém destoa das outras salas da

escola por ser mais clara, mais ampla, com apenas quatro carteiras dispostas em

forma de mesas para quatro pessoas e o restante do espaço livre. Também

percebemos que há materiais pedagógicos modernos, bem como computador e

prateleiras que deixam à mostra para o aluno todo o material disponível para o

atendimento.

A ESCOLA 2 é uma escola de Educação Infantil localizada em um bairro

central de São Bernardo do Campo, que atende 218 alunos de 4 e 5 anos em

período parcial: manhã, das 7:30h às 11:30h, ou tarde, das 13h às 17h,

disponibilizadas em 5 turmas por período. Conta com doze professores, incluindo um

professor substituto e um professor de AEE que atende cinco alunos diagnosticados

com deficiência ou transtornos globais do desenvolvimento.

A escola está passando por reforma, está sendo pintada e, por esse motivo,

está desorganizada, com materiais disponibilizados no pátio interno e materiais de

construção no pátio externo. As salas de aula são todas amplas e com portas de

vidro que dão acesso à área externa, cujos espaços também são utilizados pelas

professoras para execução de atividades, o que torna os espaços diversificados e

45 Salas de AEE são também denominadas salas de recursos multifuncionais, e é nesses espaços que acontecem os atendimentos aos alunos com deficiência no contraturno.

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bem aproveitados. Nas salas de aula, os alunos estão dispostos em mesas de

quatro alunos, apropriadas para a faixa etária. Há muitos espaços na sala de aula

para que os alunos possam realizar as atividades no chão e nos cantos, que

possuem materiais diversificados, como livros, brinquedos, que ficam à disposição

dos alunos.

A sala de aula é repleta de atividades realizadas pelos alunos, com cartazes

de parlendas, desenhos e pinturas.

Não há sala de atendimento de AEE, pois na Educação Infantil, os alunos não

são atendidos no contraturno, apenas na sala de aula comum no horário que a

frequentam, no trabalho que é chamado itinerância, ou ainda, no ensino

colaborativo, já descrito anteriormente.

As entrevistas aconteceram na sala da coordenação pedagógica, que está

estrategicamente situada no pátio interno.

A ESCOLA 3 é uma escola de Ensino Fundamental localizada em um bairro

periférico do município de São Bernardo do Campo, que atende 434 alunos do 1º ao

5º ano nos períodos da manhã, das 7h às 12h, e da tarde, das 13h às 18h,

disponibilizados em 10 turmas por período. Conta com 23 professores, incluindo 2

professores substitutos e a professora de AEE que atende 3 alunos diagnosticados

com deficiência ou transtornos globais do desenvolvimento. Essa escola, também de

Educação Fundamental, não tem portas de ferro fechadas que impedem a entrada

do público. Nessa escola, há um portão colorido que fica fechado, porém, logo que

chegamos, fomos recebidos pelo guarda da escola, que está no portão e que

simpaticamente nos encaminhou para a Secretaria, que é muito ampla e com vitrôs

grandes que dão acesso à área externa, sendo possível tanto ver de dentro para

fora, como de fora para dentro da escola. Essa escola se assemelha muito a uma

casa com “puxadinhos”, pois tem corredores que ligam um prédio ao outro, sendo

que, de um lado, há as salas de aula, e do outro, os espaços coletivos. A sala da

Gestão Escolar é uma única sala ampla onde fica o diretor, a assistente de direção e

a coordenadora pedagógica, cada um ocupando a sua mesa.

A sala de AEE é próxima das salas de aula; é pequena, mas bem estruturada,

com computador, materiais pedagógicos disponibilizados em armários abertos que

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possibilitam a visualização do aluno. Realizamos as entrevistas nessa sala, que

conta com carteiras em forma de meia lua, coloridas, que possibilitam a formação de

grupos.

As salas de aula são claras e amplas, com carteiras coloridas em formato de

meia lua, que permitem a mobilização para formação de grupos. As salas contam

com materiais dos quais os alunos podem se utilizar, disponibilizados em caixas nos

cantos da sala de aula.

O que muito nos chamou a atenção nessa escola é a quantidade de materiais

informativos coloridos e esteticamente bonitos que existem pela escola, desde a sala

da direção, que apresenta dois grandes bonecos disponibilizados em uma das

paredes, que refletem a natureza do espaço escolar: a infância. Nos corredores e

nas salas de aula, há mostra de trabalhos dos alunos. A pintura da escola é nova e

bastante colorida, tornando o ambiente muito agradável.

A ESCOLA 4 é uma escola de um bairro bem distante do Centro, periferia de

São Bernardo do Campo, o mais populoso e carente do município, que atende 1050

alunos do Ensino Fundamental do 1º ao 5º ano, disponibilizadas em 40 turmas por

período. Conta com 40 professores, incluindo 3professores substitutos e 2

professoras de AEE que atende 16 alunos diagnosticados com deficiência ou

transtornos globais do desenvolvimento.

É uma escola gigante em termos de espaço; tem um amplo acesso pela

rampa de entrada, onde sempre há guarda na porta, porém este não orienta o

público, apenas observa o movimento de entrada e saída. O portão da escola está

constantemente aberto, pois o movimento é grande. A Secretaria é imensa, com

muitas mesas de atendimento. As salas de aula são disponibilizadas em diversos

espaços e andares, a escola parece um labirinto. Há uma enorme sala dos

professores, uma sala de coordenação pedagógica, uma sala para assistente da

direção e uma para a direção. Tudo é muito grande, a BEI, o refeitório, o pátio, a

quadra, o Laboratório de Informática.

Há uma sala de AEE disponível para atendimento no contraturno. Realizamos

a entrevista na sala dos professores.

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A escola está bem pintada, em bom estado de conservação, é ampla, muito

iluminada e muito colorida também, mas é um grande espaço de difícil manutenção

da limpeza e da organização de materiais.

A ESCOLA 5 é uma escola localizada no bairro que faz divisa com São Paulo,

caracterizado por ser um bairro com população de maior poder aquisitivo e

população mais idosa, e nessa escola, são atendidos tanto os alunos de Ensino

Fundamental quanto os alunos de Educação Infantil, sendo 279 alunos do 1º ao 5º

ano, disponibilizados em 12 turmas por período e 159 alunos de 3, 4 e 5 anos em

período parcial, manhã das 7h às 12h, e tarde, das 13h às 18h, disponibilizados em

8 turmas por período. Conta com 24 professores , incluindo dois substitutos e uma

professora de AEE que atende cinco alunos diagnosticados com deficiência ou

transtornos globais do desenvolvimento.

As salas de Ensino Fundamental ficam em um prédio anexo ao prédio central,

sendo divididos por um pequeno pátio externo. As salas de Educação Infantil são

dotadas de portas de vidro que, quando abertas, dão para o estacionamento dos

professores, mas este é extenso e, portanto, é possível ser utilizado para atividades

fora da sala de aula.

Nessas salas de aula, há mesas retangulares que abrigam quatro cadeiras;

as salas são amplas e bem iluminadas. Há colmeias para que os alunos possam

guardar os seus pertences. As salas de Ensino Fundamental dão para um corredor e

são mais escuras que as da Educação Infantil. São dotadas de carteiras individuais

dispostas em fileiras, e com armários fechados com cadeados para guardar os

materiais.

Há ainda uma sala de coordenação próxima ao prédio do Fundamental e uma

sala de direção e assistente da direção que fica ao lado da Secretaria, sala dos

professores e sala de xerox.

A escola foi recentemente reformada e, portanto, está bem pintada com

paredes coloridas; o piso foi trocado e está também bem colorido, e é dotada de

acessibilidade completa. Mas não há nas paredes, nem das salas de aula, nem da

escola no Ensino Fundamental, exposição das produções dos alunos, isso acontece

apenas na Educação Infantil.

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A sala de AEE é próxima ao pátio interno e conta com prateleiras com

materiais pedagógicos para o atendimento dos alunos no contraturno. As entrevistas

foram realizadas nessa sala.

3.4 ANÁLISE QUALITATIVA DAS NARRATIVAS

O trabalho de identificação e de diminuição das dificuldades de determinado aluno pode beneficiar muitos outros em relação aos quais, inicialmente, não se colocavam problemas de aprendizagem. (BOOTH e AISCOW, 2011, p.8)

3.4.1 – Index para a inclusão: desenvolvendo a aprendizagem e a participação nas

escolas

Decidimos tomar como pano de fundo na análise dos dados desta pesquisa o

material elaborado por Aiscow e Booth (2011), já descrito acima: Index para a

inclusão: desenvolvendo a aprendizagem e a participação nas escolas, por se tratar

de um documento que tem por objetivo oferecer às escolas um instrumento de

autoavaliação, por meio de uma observação pormenorizada, sobre a diminuição das

barreiras de aprendizagem e participação. E, ainda que não seja um documento

direcionado exclusivamente aos alunos com deficiência ou com necessidades

educativas especiais, possibilita-nos compreender alguns conceitos que, no

processo de inclusão desses alunos, devem ser considerados.

O Index, ao pautar o desenvolvimento das escolas no que diz respeito à

postura inclusiva, aponta para três dimensões: criar culturas inclusivas, produzir

políticas públicas e desenvolver práticas inclusivas que estão interligadas. A imagem

que melhor reflete essa interdependência é a de um triângulo, em cuja base temos a

dimensão de criar culturas inclusivas, pois é através da cultura inclusiva que se pode

pensar em mudanças nas políticas públicas e nas práticas.

Criar cultura inclusiva, segundo Aiscow e Booth (2011), significa construir uma

comunidade receptiva, colaboradora, em que todos são valorizados em busca do

sucesso de todos, e estabelecer valores inclusivos que se constituem em processo

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contínuo de orientação das decisões nas políticas e nas práticas em sala de aula,

passadas aos que vão chegando e se incorporando a essa cultura, e que vão

constituindo o ambiente escolar ao longo do tempo.

Aiscow e Booth (2011), ao se referirem à implementação de políticas públicas,

falam sobre desenvolver uma escola para todos e organizar apoios à diversidade,

diminuindo as pressões da exclusão e favorecendo o sucesso de todos os alunos.

Já com relação à promoção de práticas inclusivas, esses autores significam que é

organizar a aprendizagem e mobilizar os recursos que retratem práticas que

traduzam as culturas e as políticas inclusivas da escola. E complementam (p.14):

“Para além dos recursos materiais, os educadores utilizam, como recursos de apoio

à aprendizagem e à participação, os seus próprios saberes, mutuamente partilhados,

os alunos, os pais e as comunidades.”

Poderemos, a partir desse material, analisar quais são os valores inclusivos

que estão sendo colocados na prática docente, já que nossa análise das entrevistas

realizadas tem como proposta trazer elementos para a discussão de como a

inclusão do aluno com deficiência ou transtornos globais do desenvolvimento na sala

de aula comum tem sido considerada na prática docente nas escolas da rede

municipal de São Bernardo do Campo, com vistas a destrinchar como essas

práticas têm se instalado e avançado na busca de alternativas que tenham como

foco o aluno incluído; e o professor, a partir da reflexão da própria prática, pode

analisá-las como favoráveis e aplicáveis aos demais alunos, tirando a inclusão do

lugar exclusivo de insatisfações e peso para os professores, tornando-se um

caminho para sua formação e, consequentemente, para a transformação de sua

prática a todos os alunos.

Concordamos com Aiscow e Booth (2011, p.21) ao dizerem que “se não

estiver vinculada a valores profundamente enraizados, então a tentativa de inclusão

pode representar a simples adesão a uma moda qualquer ou atendimento às

instruções de cima para baixo”, o que não nos levará ao desejo de superar e

exclusão e promover a participação. Na prática, isso significa associar valores aos

detalhes do currículo, às atividades desenvolvidas nas salas de aula, nas interações

entre os participantes do processo escolar em todos os espaços escolares.

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Apropriamo-nos de alguns valores inclusivos que podem contribuir no

estabelecimento de estruturas, procedimentos e atividades inclusivas na escola,

apresentados por Aiscow e Booth (2011) a partir de seus estudos, que contaram

com a participação da comunidade em que estabeleceram suas pesquisas. São

eles: igualdade, direitos, participação, comunidade, respeito à diversidade e

sustentabilidade.

Também ao tratarem do currículo, os autores apresentam três aspectos

significativos a serem considerados e dos quais nos apropriamos por entendermos

que podem contribuir com nossa análise: barreiras à aprendizagem e à participação,

recursos à aprendizagem e à participação e suporte à diversidade.

3.4.2 Análise dos contextos das entrevistas: as escolas

Ao analisarmos os contextos das entrevistas – as escolas – podemos

observar diferenças não apenas na amplitude e características dos espaços, o que

não vemos como significativo para nossa análise, mas especialmente na forma

como a escola organiza seus espaços e, consequentemente, informa sobre as suas

concepções pedagógicas, o que certamente nos interessa analisar.

Considerando as modalidades de ensino pesquisadas – Educação Infantil e

Ensino Fundamental (séries iniciais) – podemos de antemão perceber que as

escolas de Educação Infantil se assemelham na forma de organização que

apresentam, demonstrando convergências para uma mesma linguagem espacial.

Essa linguagem expressa concepções de infância e de currículo para a Educação

Infantil, que podem ser interpretadas a partir, por exemplo, de questões mais

estruturais de espaço, como o fato de todas elas terem em suas salas de aula portas

de vidro que, quando abertas, dão para espaços externos que possibilitam ampliar o

espaço da sala de aula para o seu entorno, tornando esses espaços menos rígidos,

mais atrativos e dinâmicos, ou ainda, pelo uso de mobiliários, que são os mesmos

em todas as escolas, ou seja, mesas retangulares que possibilitam abrigar quatro

cadeiras e tornar as atividades facilitadoras da interação e socialização.

Mas não só por essas questões nos chama a atenção a congruência de

informações que absorvemos desses espaços, como também pela prática

pedagógica de manter espaços dentro e fora da sala de aula que possibilitem a

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apresentação da cultura da infância em que todas as crianças estão inseridas, seja

pelas próprias produções, seja pelas produções dos professores com as marcas de

personagens do universo infantil.

Podemos inferir que essa convergência de pensamento e pressupostos

educativos voltados para a Educação Infantil possam ser decorrentes do que vimos

no histórico educacional desse município, pois a Educação Infantil vem se

constituindo de longa data, sendo a primeira modalidade a se instalar por

necessidade da população e vontade política de seus governantes, sendo destaque

na política pública educacional desde então.

Isso permitiu não apenas que as escolas mais antigas na rede pudessem ter

amplos espaços e bons investimentos na construção e manutenção desses prédios,

mas também que os seus profissionais pudessem ter formação continuada nas

questões específicas dessa faixa etária.

Não percebemos diferenças significativas entre essas escolas, e ainda que

uma delas estivesse em reforma, com uma desorganização natural dessa condição,

estava em pleno funcionamento, com a utilização de diversos espaços além da sala

de aula.

No entanto, quando analisamos os espaços do Ensino Fundamental, vimos

diferenças marcantes quanto ao tamanho das escolas e quanto à organização e

características desses prédios. Sabemos, como já nos foi apresentado no histórico

do munícipio, que muitas das escolas municipalizadas desde 1998 mantiveram os

prédios que ocupavam quando pertenciam ao sistema estadual de ensino, e que

estes são, de forma geral, prédios antigos e estruturados para a política estadual.

A que mais nos chamou a atenção foi a escola 1, que, apesar de não ser tão

grande, é uma escola que nos pareceu desorganizada e esteticamente desprovida

de beleza. Também nos chamou a atenção a forma como o público é recebido ao

chegar a essa escola; há um guichê protegido por grades, e mesmo depois de ser

apresentado e autorizada a entrada, passa-se por outro espaço trancado, o que nos

remete à ideia de uma prisão. Isso nos chama a atenção pelo fato de a escola não

estar localizada em uma região que seja considerada violenta ou de periferia, como

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é o caso da escola 4, que, apesar disso, mantém a escola aberta ao público sem as

trancas que a escola 1 nos mostrou.

Isso nos remete a refletir sobre um dos valores inclusivos que a escola deve

percorrer, que é o da participação da comunidade e do princípio de gestão

democrática e como estes se relacionam com as práticas inclusivas na escola, pois,

ainda que se estabeleça um bom trabalho de inclusão dentro da escola, quando

fechado em si mesmo, não poderá contribuir para a construção de uma sociedade

mais inclusiva. Compreender que a escola é de todos e para todos não é tarefa fácil,

mas precisa ser essa premissa inerente ao fazer do gestor escolar.

Chamou-nos a atenção a escola 3, que, não por coincidência, foi onde nos

sentimos mais bem acolhidos para a pesquisa, com extrema disponibilidade dos

professores e da gestão da escola, que fez questão de estar presente em todos os

momentos, deixando-nos muito à vontade. Há nessa escola uma preocupação

evidente com o acolhimento e o respeito pelas diferenças, o que torna o clima da

escola muito agradável, e isso foi visto estampado no rosto e no trabalho dos

funcionários e nos alunos, que, ainda que se movimentem de forma intensa e

vibrante pela escola, conseguem manter a disciplina e cuidado com os colegas e

com os espaços escolares.

Gostaríamos ainda de ressaltar na nossa análise dos espaços que a escola E

tem uma característica diferenciada das demais escolas utilizadas nesta pesquisa,

que é a proximidade da realidade da Educação Infantil e do Ensino Fundamental em

uma convivência compartilhada dos espaços coletivos e do projeto político

pedagógico único. No entanto, vemos nitidamente uma diferença de concepção na

organização dos espaços da Educação Infantil e do Ensino Fundamental, não

apenas por estarem em prédios diferentes, mas, sobretudo, por apresentarem um

funcionamento que reflete diferenças nas concepções.

Diante desses cenários escolares, buscamos entender o que faz a escola 3

ser tão diferente e transparente nos seus valores inclusivos que se aproximam

daqueles que elencamos para esta pesquisa: igualdade, participação, respeito à

diversidade e direitos. Com certeza, a resposta a essa questão está em muitos

aspectos que precisariam ser mais aprofundados e que não são nosso foco nesta

pesquisa, mas, em especial, podemos dizer que a gestão da escola tem feito

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diferença nesse processo, pois, como vimos, de todos os contextos utilizados nesta

pesquisa, apenas nessa escola pudemos contar com a presença maciça dos

gestores, que demonstraram não apenas disponibilidade de participar da pesquisa,

mas interesse pelos resultados, num movimento investigativo que somente o gestor

que desenvolveu o perfil de pesquisador pode revelar.

Pudemos, com esse olhar sobre os espaços, neste restrito movimento de

análise, compreender que o lócus da prática docente é igualmente caracterizado por

suas diferenças, tanto quanto o são os seus alunos. E a considerar que a inclusão é

incessante, não atinge a sua meta final nunca, pois as escolas estão sempre

mudando, as crianças e professores chegam e vão embora, novas formas de

exclusão aparecem, novos recursos são mobilizados, os valores inclusivos podem

ser desenvolvidos nas escolas a qualquer tempo e em tempos diferenciados umas

das outras.

Assim, devemos estar alertas para o único sentido que podemos proclamar a

escola como inclusiva, que é quando ela está comprometida com uma jornada de

desenvolvimento orientada pelos valores inclusivos que ela mesma escolhe para sua

comunidade. E é nesse sentido que as experiências com a inclusão de alunos com

deficiência e transtornos globais do desenvolvimento, retratadas e analisadas a

seguir, poderão nos mostrar sobre quais valores inclusivos cada uma dessas

escolas tem se debruçado.

3.4.3 Análise das motivações de escolha dos professores das salas de aula comuns

pelos professores de AEE

Como critério para a escolha das professoras entrevistadas, indicamos ao

professor de AEE apenas que fossem professoras da sala comum com boa prática

inclusiva, ou seja, que tivessem alcançado sucesso na inclusão do aluno com

deficiência intelectual ou transtorno global do desenvolvimento, e começamos a

análise das justificativas apresentadas pelos professores de AEE para essa escolha.

Iniciamos com a justificativa da professora S., que refere que o que chama a

sua atenção na professora C., indicada para a entrevista, é a sua postura diante da

inclusão tomada por ela como um grande desafio, já que, além de estar se

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adaptando à turma de alunos menores, tinha também que se adaptar à inclusão de

um aluno com transtorno global do desenvolvimento, totalmente desconhecido por

ela. A diferença que vejo na professora C. é que ela é uma professora consciente da

sua tarefa, que é a de aprender sempre; isso nos remete a analisar que a escolha da

professora S. está exatamente na abertura que a professora C. demonstrou para a

aprendizagem na sua tarefa de ensinar. Isso talvez num primeiro momento, mas,

logo a seguir, vemos que a justificativa se amplia para outros campos que envolvem

não apenas a disponibilidade, mas o fazer, o “botar a mão na massa”, como se diz

popularmente daquilo que não esperamos o outro fazer por nós, mas nós mesmos

buscamos meios de realizar. Isso está refletido em sua fala: O aluno não tem que

aprender? Eu (professora) não tenho que ensinar? Então, eu preciso dar conta disso

e corro atrás do que me falta para isso.

Com isso, ela nos incita a refletir sobre o movimento ativo de

comprometimento com o saber e com o fazer, que não está atrelado a pré-requisitos

ou condições de trabalho, mas à responsabilidade de dar conta da tarefa que se

apresenta para sua função de professor. Não estamos aqui dizendo que as

condições de trabalho não podem ser facilitadores no processo inclusivo, apenas

apontando que a inclusão não pode esperar que se estabeleçam as condições

adequadas para acontecer. Sobre isso a professora S. diz que Se nesta escola eu

posso contar com apoios, ótimo, se não, vou ter que me virar assim mesmo. Trata-

se de atitude de se decidir pelo aluno e não desistir nem mesmo quando as

dificuldades forem maiores que as conquistas. O que me chama atenção no trabalho

da C. é a vontade dela, ela não desistiu dele. Essa atitude a que se refere a

professora S. não é conquista exclusiva no ambiente profissional; ela reflete a

atitude do professor frente à vida como um todo. A questão da inclusão é essa,

como o professor encara os desafios na sua vida é como ele vai encarar na inclusão

deste aluno.

Da mesma forma e mantendo o mesmo caminho de escolha para a

professora D., a professora de AEE, S., diz que a escolha se deu por conta da

disponibilidade da professora: É muito fácil com a D., é só a gente pensar em

alguma coisa e ela já tá fazendo, tá modificando, tá experimentando. Aqui, a

disponibilidade a que se refere é direcionada ao fazer. Mas também acrescenta que

a boa prática da professora para todas as crianças é algo que a diferencia dos

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demais professores; aponta isso quando diz: a Prof.ª D. dá uma aula que é uma

delícia. Ela prepara materiais muito atrativos para todas as crianças e que são

necessários para a G.. Na verdade, a Prof.ª D. tem uma boa prática com qualquer

criança, senta no chão com eles, brinca junto e conhece as crianças com

particularidades.

A professora A. fez suas escolhas por conta do desejo da professora do

Ensino Fundamental, B., de estar com a aluna incluída, o que não deixa de ser uma

forma de disponibilidade também: o que eu acho que conta muito para a inclusão

dar certo é o desejo, o desejo de ter o aluno na sala, que faz a diferença na prática

do professor. É o eu tô disposto, depois disso é que vem as dúvidas, de onde partir?

Num segundo momento, é o benefício que foi conquistado pelos alunos dessa

classe com a prática dessa professora junto ao aluno incluído. Outra coisa que eu

acho fantástico é a conquista dos colegas, quando os alunos percebiam a

dificuldade dos colegas, quando percebiam a dificuldade de coordenação viso

motora, os alunos iam ajudando. Já para a indicação da professora de Educação

Infantil, P., o que contou foi o fato de ser essa uma inclusão muito difícil por conta

das grandes limitações do aluno e os resultados que a professora tem alcançado,

especialmente por meio das parcerias com a auxiliar de classe e outros apoios

disponíveis nas adaptações curriculares.

Para a professora M. a indicação da professora do ensino fundamental se

deu por conta das mudanças que vi acontecerem com a entrada do aluno de

inclusão autista em sua sala de aula, as propostas de grupo que tem sido

implementadas e os avanços que o aluno autista tem tido, mas também os avanços

da classe não apenas nos conteúdos propostos , mas na postura frente ao diferente.

Ao analisarmos as motivações que levaram os professores de AEE a

indicarem as professoras de salas comuns com alunos incluídos com deficiência ou

transtornos globais do desenvolvimento para nossa entrevista, observamos, de

forma mais contundente, que as boas práticas desses professores estão

relacionadas ao fato de estarem disponíveis ao trabalho com esses alunos. E ainda

que possamos entender que essa disponibilidade passa por diferentes formas,

desde a disponibilidade para o aluno “diferente” até a disponibilidade para o outro

parceiro nesse trabalho, passando, inclusive e necessariamente, pela

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disponibilidade pelo aprender, pelo conhecer, pelo fazer, pelo experimentar, pelo

inovar, isso nos faz concluir que essa disponibilidade é a mesma que caracteriza o

pesquisador. Podemos, então, dizer que o que levou os professores a escolherem

esses professores foi, antes de mais nada, o perfil de pesquisador que eles têm em

comum.

Porém, avançando na nossa análise e olhando para estes dados por uma

outra lente, podemos inferir que essas motivações, conscientes ou não, passaram,

sobretudo, pela aceitação do próprio professor de AEE na escola regular e pela

busca de uma identidade desse professor da Educação Especial nesse contexto

educacional mais amplo. Se nos atentarmos para os dados já tratados nesta

pesquisa sobre o histórico da política educacional desse munícipio, poderemos

observar o quanto os professores de Educação Especial têm se ocupado de

encontrar um lugar, uma identidade na escola regular, e isso tem se dado de forma

mais direta no estabelecimento das parcerias com os professores de salas comuns

que têm um aluno incluído, nos serviços de itinerância e ensino colaborativo, já

descritos anteriormente.

Sabemos que, historicamente, o professor construiu sua prática de maneira

mais solitária do que solidária na escola, gerando certa possessão sobre o espaço

da sala de aula, bem como sobre os alunos que pertencem a esse espaço, num

movimento contrário ao que se busca na atualidade, de estabelecimento de

parcerias. Entendemos que a inclusão tem desestabilizado os lugares dos

professores, até então demarcados nas escolas; vemos que a inclusão desestabiliza

saberes, espaços e tempos, mas nos desestabiliza, especialmente, da mesmice na

prática docente, porque, para seguir adiante, há de se ter disponibilidade e coragem.

Cabe esclarecer que esse movimento de desestabilizar não acontece apenas com

os professores da sala comum, mas também com os professores da Educação

Especial que atuam no AEE nas escolas, o que os coloca no mesmo barco – o barco

da inclusão.

Frente a esse barco, o que podemos significar como avanço na prática

docente e, por que não dizer, transformação desta, seja ela do professor da

Educação Especial, seja do professor do ensino regular, é a tomada de decisão pela

inclusão, ou seja, é a consciência de que não é mais possível voltar; o barco está em

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alto mar e, portanto, não nos resta outra coisa a fazer a não ser tomar o leme, e

tomar o leme exige conhecimento, vontade e determinação, que, quando

compartilhados, permitem acertarmos a direção.

3.4.4 Análise dos aspectos gerais dos professores entrevistados

Com relação aos professores das classes comuns entrevistados, no que diz

respeito aos aspectos voltados para a inclusão propriamente dita, levantamos que

todos eles já tiveram experiência com inclusão na mesma ou em outra escola da

rede de ensino, não sendo esta sua primeira inclusão; inclusive, muitos deles trazem

os relatos dessas experiências no decorrer da entrevista, o que nos sugere que

essas experiências ocupam um lugar de significância na prática do professor.

Ainda que esse não tenha sido um critério apresentado aos professores de

AEE para a escolha desses professores, isso nos leva a pensar que a experiência

pode estar relacionada à tão acentuada disponibilidade para a inclusão tão marcada

pelos professores de AEE. O fato de terem vivenciado alguma situação de inclusão

anterior a esta coloca-os no lugar de terem tido mais oportunidades de refletir sobre

essa experiência, num movimento de reflexão da prática preponderante no

aperfeiçoamento da prática docente.

Disso decorre não apenas a facilidade para a aceitação desse aluno, do

acolhimento desse aluno, mas, acima de tudo, impõe uma questão altamente

dialética, já que ao mesmo tempo em que não se repete, pois cada inclusão é única

na vida do professor e traz aprendizagens diferentes frente aos contextos dados, é

essa experiência que sustenta a decisão sobre sua atuação e responsabilidade com

esse aluno no mesmo instante em que se vai construindo uma postura inclusiva que

ultrapassa o campo profissional e se mistura com o campo pessoal.

Alguns professores escolheram estar com esse aluno, outros não, sendo essa

escolha feita pela coordenação da escola ou pelas circunstâncias da ocasião. Em

nossa análise, escolher ou não, estar com esses alunos não fez diferença, já que os

dados informaram que a diferença esteve na postura decisiva que o professor toma

após receber esse aluno em seu grupo. Esse movimento de ser colocado pelo

professor no lugar de quem pertence, faz parte, compõe o todo da classe, é o que

faz com que o professor se comprometa com a sua aprendizagem,

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independentemente de sua condição orgânica, psíquica, social ou de qualquer outra

ordem, tanto quanto a dos outros.

Com relação ao tempo de permanência na rede municipal, ainda que haja

diferenças significativas, ativemo-nos a analisar o fato de que todos os professores

estão na rede há no mínimo três anos e, portanto, conhecem os princípios que

norteiam a inclusão no município. Também com relação ao tempo de permanência

na escola pesquisada, ainda que haja diferenças marcantes, entendemos que

apenas a professora C. e a professora J. estavam chegando à escola, tendo que dar

conta da demanda da própria adaptação aos espaços, pessoas e tempos. E ainda

que não tenhamos condição de analisar se esse fato pode ter interferência direta na

condição de boa prática dos mesmos, podemos refletir que ser novo na escola

coloca o professor em condição de vulnerabilidade, conforme nos aponta profª J.:

Tive uma conversa com os inspetores sobre o tratamento que ofereciam para ele e

não foi uma conversa fácil, mesmo porque sou nova nesta escola e não tenho muito

crédito ainda.

Já quando analisamos a questão da formação acadêmica desses

professores, levantamos os dados de que todos são formados em Pedagogia

licenciatura plena, até mesmo por ser este um dos pré-requisitos para ingresso no

cargo de professor na rede municipal de ensino. Alguns deles têm também o curso

de magistério, mas este dado não é relevante para esta pesquisa, ainda que ele

tenha sido mencionado por uma das professoras entrevistadas como ponto de

reflexão sobre a formação dos professores para assumirem a inclusão na escola.

Alguns desses professores estão cursando ou já cursaram a pós-graduação

em Educação Inclusiva, o que os coloca em uma condição de conhecimento

específico diferenciada da maioria dos professores da rede. Dado importante a ser

analisado é o fato de alguns desses professores mencionarem que o interesse pela

pós-graduação nessa área se deu pelos desafios vivenciados na inclusão de alunos

com deficiência ou transtornos globais do desenvolvimento, seja no planejamento de

atividades, seja no conhecimento dos limites e possibilidades desse aluno, que os

impulsionaram a buscar conhecimento de forma individual, sem qualquer vínculo

com a formação ofertada pela Secretaria.

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É muito interessante nos atentarmos a esse aspecto, já que tratamos nesta

pesquisa das questões de formação inicial e continuada, apontando para os déficits

que temos na formação inicial, que hoje tende a ser mais generalista e menos

aprofundada, e que tem delegado à formação continuada as especificidades da

Educação. Nesse aspecto, podemos perceber o quanto a inclusão dos alunos com

deficiência e transtornos globais do desenvolvimento tem movimentado o professor

na busca desse aprofundamento. Com relação a isso, Gatti (2011, p.16) revela em

sua pesquisa “que a formação continuada é central para o desenvolvimento

subjetivo e profissional dos professores e faz parte de um projeto pessoal, como

uma escolha necessária para que se possa dar sentido à atividade docente”, e ainda

complementa dizendo que a formação precisa permitir ao professor não apenas a

reflexão sobre o seu trabalho, mas a reflexão crítica sobre ele, num constante

desenvolvimento de aspectos éticos, políticos e sociais.

Podemos, então, dizer que dos aspectos gerais levantados como

significativos que podem interferir em uma prática docente inclusiva satisfatória,

temos a experiência do professor, porque necessariamente o levou à reflexão de

sua prática que, em primeira instância, pode ter sido o motor da busca de maior

aprofundamento na área, investindo em sua própria formação continuada.

3.4.5. Análise das experiências dos professores entrevistados

Se uma criança não pode aprender da maneira como é ensinada, é melhor ensiná-la da maneira que ela pode aprender. Marion Welchmann

Antes de tratarmos da análise dos dados levantados nas entrevistas com os

professores da classe comum com inclusão de alunos com deficiência e transtornos

globais do desenvolvimento, é necessário considerar que as respostas dos

entrevistados emergem do seu cotidiano na escola, na certeza que temos de que é

nesse cotidiano que as práticas docentes são construídas na busca das

apropriações reais e potenciais que acontecem de baixo para cima, isto é, da

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caminhada do professor como ser social, partindo das provocações e inquietações

que o estimulam a participar da construção social da sua própria identidade.

Para tanto, é necessário que, ao analisarmos essas experiências no

cotidiano, levemos em conta o mundo e o contexto que as rodeiam; isso significa

considerar que um mesmo fato – neste caso, a inclusão – pode ter significados

diferentes para pessoas diferentes, como nos esclarece Cunha (2005, p.36): “a

expressão do cotidiano do professor é determinante e determinada pela conjuntura

social e cultural onde se desenvolve”.

É preciso ainda levarmos em consideração que a vida cotidiana está

organizada no aqui e agora, no presente do sujeito, porém, nem por isso

desconsidera as experiências vividas, passando pelos sentidos, lembranças e

emoções, determinando o lugar do sujeito no mundo como um ser “único” na

construção de sua própria história e na construção de seus próprios conhecimentos

nesse cotidiano; por isso mesmo, devemos deixar claro ao leitor que não temos

qualquer intenção de comparação dessas experiências, valorando-as em melhores

ou piores, tampouco de torná-las possíveis indicações de intervenções ou

prescrições que garantam bons resultados na inclusão de alunos com deficiência ou

transtornos globais do desenvolvimento.

As ações educacionais não podem ser compreendidas apenas pelo olhar de

um desses aspectos; elas desenvolvem, além de questões estruturais de condições

de trabalho, questões de formação e técnica do professor, mas, essencialmente,

envolvem movimentos internos que precisam estar integrados nesta análise.

É, portanto, nessa perspectiva de compreendermos que movimentos ocorrem

com o professor a partir da entrada de um aluno com deficiência ou transtornos

globais do desenvolvimento que estabelecemos nossa análise.

Percebemos que é nesse movimento de busca de alternativas para o trabalho

com esse aluno que algumas características são comuns nos professores

entrevistados, alguns de forma mais claramente perceptível, em outros, de forma

mais sutil, mas que ainda assim podemos localizá-las. Estamos falando da teimosia,

da insistência, da persistência, da não desistência de sua tarefa de ensinar, o que

impulsiona esse professor a buscar diferentes alternativas para o trabalho com esse

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aluno que, via de regra, não aprende da mesma forma que os demais. Mas nos

perguntamos: será que os outros aprendem todos do mesmo jeito? Retomamos a

frase de Marion Welchmann, que nos mobilizou à reflexão no início deste tópico.

Dividimos nossa análise sobre as implicações da inclusão do aluno com

deficiência ou transtornos globais do desenvolvimento na prática docente em três

movimentos46 que ocorrem nesse processo.

A primeira implicação refere-se ao movimento que denominamos

INVESTIGAÇÃO - BUSCA DE INFORMAÇÕES, onde a CURIOSIDADE aliada ao

COMPROMISSO assumido pela professora frente este aluno são os valores

inclusivos que se desenvolvem com maior ênfase.

Ao receber a notícia de que terá em sua sala de aula a presença de um aluno

incluído, independentemente de ser esta uma escolha própria ou de outros (em

geral, da gestão da escola ou das condições circunstanciais da escola), um primeiro

movimento se instala na vida docente: a busca de informações.

Tomemos como exemplo o que ocorreu com a professora C., que, muito por

acaso, ficou sabendo da inclusão do aluno com TGD em sua sala de aula: Vi que a

sala tinha um número reduzido de alunos e perguntei se tinha algum aluno incluído.

Ela me respondeu que a classe tinha um aluno com Síndrome de Asperger. Eu não

sabia o que era isso, perguntei se ele era agressivo e ela me disse que não e que

aprendia rápido. Foi por acaso, porque o que buscava era o apoio para o seu

grande desafio: dar conta dos alunos pequenos (Fundamental I), já que sua

experiência era toda voltada para o Fundamental II e estava preocupada com isso.

Talvez por isso mesmo a notícia não lhe causou tanto estranhamento, pois

estava se apropriando das questões do Fundamental I e esta era apenas mais uma

questão para se apropriar. Mas entendemos também que o fato de se preocupar

com a sua tarefa de ensinar a todos os alunos (grandes ou pequenos) a colocou em

uma posição de consciência sobre o seu papel e o seu compromisso com esses

alunos, que pode ter facilitado a incorporação desse aluno no seu planejamento, no

46 Não por acaso, utilizamos a palavra movimento, mas porque entendemos que esses professores indicados para esta pesquisa tiveram como marca de sua indicação o movimento de busca, de fazer, de “colocar a mão na massa” em contraposição à possibilidade de paralisar diante das dificuldades.

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campo do desconhecido como todos os outros, sendo mais um desconhecido, e não

o único desconhecido para essa professora.

É também interessante mencionar que logo após tomar ciência de que esse

aluno estaria em sua turma, sendo este nomeado pela sua diferença pela

coordenadora como Síndrome de Asperger, classificação desconhecida pela

professora, sem qualquer informação prévia, a sua pergunta primeira foi sobre o

comportamento do aluno.

Temos ouvido e visto alguns pesquisadores apontarem que os alunos com

transtornos globais do desenvolvimento (em que se encaixa a Síndrome de

Asperger) têm sustentado a condição de uma inclusão mais difícil, já que têm como

características de barreiras para a aprendizagem as questões de interação,

comunicação e comportamento, em alguns casos, com episódios de agressividade.

Daí podemos supor que ainda que a professora desconhecesse as especificidades

da Síndrome de Asperger, a sua preocupação primeira estava voltada para os

desafios comportamentais que poderiam advir dessa condição.

Isso confirma o que apresentamos inicialmente neste trabalho sobre as

diferenças nos processos de inclusão dos alunos com deficiência sensorial ou física,

em que as barreiras de aprendizagem estão voltadas para as adaptações de

materiais, espaços e recursos de apoio e de tecnologia assistiva aplicadas às salas

de aula comum; e a inclusão dos alunos com deficiência intelectual ou transtornos

globais do desenvolvimento, em que as barreiras de aprendizagem são da ordem

comportamental ou intelectual e não há materiais ou espaços a serem adaptados,

mas há, essencialmente, necessidade de adaptações nas estratégias de ensino-

aprendizagem, demandando muita criatividade e vontade do professor.

Precisamos considerar que a oportunidade de pertencer à escola e usufruir de

vivências próprias da infância é bastante recente para esses alunos, pois, até muito

pouco tempo atrás, estes tinham destinos bem diferentes de seus pares, vivenciando

apenas atendimentos médicos e clínicos e, na melhor das hipóteses, frequentando

instituições especializadas exclusivas para crianças com transtornos, como

apontamos no Capítulo 1, que tratou da história do deficiente e das mudanças de

paradigmas pelas quais passamos. A chegada desse aluno na escola regular

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desestabilizou lugares pré- determinados no ensino e na aprendizagem, colocando

em movimento os saberes e os fazeres do professor dia após dia.

Vemos pela resposta que a professora recebeu da coordenadora da escola

que esta se apressou a apresentar as potencialidades do aluno, afirmando que

aprende rápido, num movimento natural de tranquilizar o professor, oferecendo a ele

um estímulo para querer estar com esse aluno. Já apontamos anteriormente,

quando tratamos das instituições escolares e sua função na sociedade, que a escola

que temos hoje não tem atendido às necessidades atuais dos nossos alunos, o que

pode justificar, muitas vezes, o desinteresse e a indisciplina na escola. Essa reflexão

sobre qual é escola que temos hoje para atender nossos alunos frente a tantas

diversidades de comportamentos, interesses e necessidades, remete-nos a buscar

alguns caminhos nos valores inclusivos de igualdade e direitos.

Apoiamo-nos no Index para a inclusão, de Aiscow e Booth (2011), para

definição desses conceitos. Precisamos marcar a ideia de que igualdade não é

serem todos iguais, tampouco que sejam todos tratados da mesma forma, porém,

que todos sejam tratados como sendo de igual valor.

Inevitável que ao tratarmos de igualdade, direcionamo-nos ao conceito de

direitos, que se contrói a partir da preocupação com a igualdade. “Quando as ações

conduzem a desigualdades, então elas não podem envolver um direito” (p. 23).

Ainda que nos atentássemos para a prerrogativa legal de que as crianças e jovens

têm direito a uma educação de qualidade, gratuita, pública e em sua localidade, não

estaríamos maduros ou preparados para o exercício na prática, pois, apesar do

compromisso aparente expresso nos documentos legais nacionais e internacionais,

disputamos esses direitos na prática. Equivocadamente podemos condicionar os

direitos às responsabilidades, ou seja, a ideia de que um direito pode ser concedido

segundo um determinado comportamento, o que seria um erro, pois partimos da

premissa de que todo direito é incondicionante, já que se trata de uma condição

única: humanidade.

E é diante dessa premissa que vemos que os professores

entrevistados se movimentam em busca de informações sobre esse aluno, seja em

recursos mais genéricos como a Internet, conforme nos mostra a professora C.:

Cheguei em casa e, como boa internauta que sou, fui direto para a Internet. Achei

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algumas informações e fiquei receosa com o que li, seja pelas informações trazidas

de anos anteriores pelos outros professores e funcionários da escola, ou ainda pela

própria família. Assim também a professora G. Logo que recebi o Jonatas ( nome

fictício para preservar a identidade do aluno) fui correndo procurar na internet

informações que pudessem me ajudar a conhecer melhor as características do

autista e me orientar no planejamento. A professora do ano passado dele me passou

algumas informações e me deu dicas de onde começar, mas na verdade pouco me

ajudaram estas informações, porque quando você recebe o aluno, você continua

sem saber direito o que fazer , ele continua sendo uma novidade , mesmo com todas

as informações do mundo.

Cabe-nos analisar do que se trata essa busca de informações por esses

professores e como estes têm se posicionado frente a isso. Vemos que essa busca

não é por si só um movimento desaconselhável, já que a curiosidade é uma forma

de motivação, e a busca pela compreensão das necessidades desses alunos,

segundo um diagnóstico que está categorizado por uma equipe médica, pode

auxiliar na prévia organização de espaços e tempos no cotidiano da escola e no seu

planejamento, que cada vez mais pensamos ser um instrumento de pesquisa e

reflexão do professor em sua prática.

Porém, precisamos identificar que, se por um lado, essa busca pode ser

positiva e mobilizadora de ações intencionais com esse aluno, por outro, pode ser

paralisadora, já que a gama de informações existentes, e muitas vezes divergentes,

que se apresenta nos canais de pesquisa podem desorganizar ainda mais o

planejamento do professor e deixá-lo mais ansioso. Podemos dizer que o remédio é

necessário, mas o tipo de remédio e a dose podem não curar, mas ainda piorar e até

matar o doente.

Corremos o sério risco de definirmos o potencial e as limitações de

aprendizagem e de sucesso escolar do aluno a partir da concepção de déficit que

vem rotulado nos laudos dos especialistas da área médica, fechando possibilidades

de investimentos pedagógicos na aprendizagem, que, como bem sabemos, são

altamente mutáveis, porque demandam a relação de muitas outras variáveis no

contexto escolar.

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Essa, ao nosso ver, é uma questão de extrema importância, pois, se por um

lado, o professor precisa conhecer características da deficiência ou do transtorno

que o aluno apresenta para melhor se organizar, o uso que este pode fazer desse

material de pesquisa pode ser o veredicto para os alunos incluídos, e o que

determinará um caminho ou outro para esse professor estará vinculado à análise de

qual paradigma estamos nos afeiçoando ao se tratar do diagnóstico dado ao aluno.

Se colocarmos o diagnóstico como aquele que dirá o que o aluno pode ou não fazer

na escola, o que irá ou não aprender na escola, viveremos ainda sob uma

perspectiva paradigmática médica, como vimos anteriormente na Idade Média.

Nesse caso, não há muito para o professor fazer, restando-lhe lamentar por si, pelo

aluno, pela classe e, em muitos casos, fazer uma recusa oculta desse aluno em sua

sala de aula, proporcionando-lhe experiências pobres e repetitivas que não levam à

aprendizagem.

Mas não é esse o caso de nenhuma de nossas professoras, até mesmo

porque nossa pesquisa se direcionou para aqueles que têm conseguido sucesso no

processo de inclusão e, portanto, deixaram esse paradigma para trás, como nos

relata a professora D.: para mim, o diagnóstico não importa, eu não quero nem saber

dele, porque eu preciso é levantar o que a criança precisa para avançar e fazer o

que ela precisa, o diagnóstico não me ajuda nisso, eu deixo o diagnóstico para os

especialistas. Para esta professora, esse trabalho de investigação sobre o aluno se

inicia no começo do ano quando esta se ocupa de conhecer o que ela sabia fazer,

apesar das limitações motoras e cognitivas que apresentava. A deficiência / as

limitações que o aluno apresenta são secundárias à sua condição de aluno, no

sentido daquele que está na escola para aprender.

No relato da professora: Tinha uma grande preocupação no início dos

trabalhos, porque como sabia que ela era autista e já tinham me dito que o autista

precisa fazer tudo certinho, do mesmo jeito, e eu sou imprevisível, gosto das

mudanças, pensei, isso não vai dar certo, vou viver em conflito. No final, eu tirei ela

disso, dizia para ela: tem que ser assim, tem que ser deste jeito, e fomos nos

entendendo, o que vemos é que a condição de autista não venceu a condição de

aluno para esta professora.

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Se tomarmos ainda como fontes de informação a família ou mesmo outros

professores, poderemos também compreender que estas devem ser incorporadas

pelo professor como informações que precisam ser consideradas em seus contextos

de conhecimento, pois as relações estabelecidas com as potencialidades ou limites

desse aluno estão atreladas aos conhecimentos construídos por seus portadores, e

não a verdades absolutas. Assim, vemos no relato da professora C. as informações

trazidas pela família sobre Gustavo (seu aluno incluído): é inteligentíssimo, mas não

entende brincadeiras, piadas. Só entende as comandas que são diretas e claras e

não esboça sentimentos. A professora então conclui: fiquei muito apreensiva porque

não podia imaginar o que me esperava. Cabe ressaltar que essa informação

associada à da coordenadora, de que aprende rápido, e às muitas outras levantadas

na Internet, podem ir dando lugar a uma imagem distorcida da realidade desse aluno

em nome de uma categoria diagnosticada com o título Síndrome de Asperger.

Podemos entender que a visão da deficiência como principal causa das

dificuldades educacionais pode nos desviar de barreiras para aprendizagem e

participação em todos os demais aspectos de ambientações e obscurecer as

dificuldades experimentadas pelas crianças sem rótulo. Isso encoraja as crianças a

serem vistas pela lente da deficiência em vez de serem vistas como pessoas

integrais.

Nesse sentido, a professora J. radicaliza: Resolvi que não consideraria os

registros anteriores e partiria do zero no conhecimento do Douglas., queira eu

mesma descobrir coisas sobre ele e não ficar presa no que os outros me diziam dele

(...). Tirei ele de uma grande mesa que tinha, que em nada lhe interessava, e

coloquei-o no chão por entender que ele não queria aprender, ele queria apenas

viver. Mesmo sobre a informação que ele não podia ir para o chão porque comia

tudo que tinha pelo chão. A informação que limita/ subestima. Eu antecipava para

ele que ia pôr ele no chão, mas que precisava da ajuda dele para não comer o que

estava no chão, e assim fomos nos entendendo.

Analisamos que em muitos dos nossos relatos, os professores, depois de buscar

informações em fontes externas, voltam-se para conhecer o aluno no contexto da

sala de aula, e só a partir desse momento, começam a pensar em possibilidades de

trabalho com esse aluno.

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A estratégia utilizada pela professora C. ao deixar os alunos livres para

escolherem onde se sentar no primeiro dia de aula foi intencional para o

levantamento de dados sobre todos os alunos, incluindo aquele com Síndrome de

Asperger. Logo que o visualizou sozinho no fundo da sala, pôde lançar mão das

informações obtidas anteriormente, observá-lo com mais cautela e de imediato

propor intervenções frente a um objetivo já estabelecido, apropriando-se da sua

tarefa de ensinar a todos os alunos. É essa postura de apropriação, de

pertencimento do aluno ao grupo classe que faz com que o professor, mesmo diante

dos questionamentos daqueles que, por algum motivo, consideram saber mais do

aluno que o professor, sustente a sua prática e avance nas possibilidades e

criatividade com esse aluno, que é único e particular, ou seja, a construção de uma

relação não descarta as experiências vividas de ambas as partes, mas tem

consciência de que é uma nova construção, porque se trata de um novo contexto, de

um novo momento, de novas pessoas que se encontram.

Percebemos, portanto, que a busca de informações pelo professor sobre as

condições desse aluno é necessária e importante para esse primeiro momento de

recepção e ansiedade frente à inclusão; todavia, poderia contar com o apoio do

professor de AEE enquanto parceiro mais experiente, tornando essa busca mais

bem orientada e menos solitária. Porém, só podemos dizer que a prática docente

efetivamente se instaura quando o conhecimento desse aluno decorre das relações

que se estabelecem entre o sujeito professor e o sujeito aluno, seja este de qual

diagnóstico for, mobilizando o desejo de possibilitar aprendizagens a esse aluno.

Sobre isso a prof.ª J. diz: Certo dia, quando me aproximei para falar com ele em sua

cadeira, me puxou e teve a intenção clara de me abraçar, e isto não tem preço(...).

Muitas pessoas têm nojo de chegar perto dele, é fato, porque baba, tem uma

aparência estranha, não olha nos olhos da gente, não sabe se cuidar, enfim, é

esquisito, mas quando a gente estabelece o vínculo, o afeto, tudo isto é

irrelevante(...). Descobri alguns sinais que Douglas fazia e passei a utilizá-los para

me comunicar com ele; assim, fui percebendo que ele me entendia mais do que eu

poderia supor num primeiro momento. Penso que as outras professoras que

estiveram com o Douglas preocuparam-se muito com o pedagógico e esqueceram-

se de estabelecer uma relação com ele.

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Podemos com este excerto compreender que só estabelecemos vínculo entre

sujeitos e não entre um sujeito e um diagnóstico.

Vencida a primeira barreira do acesso à escola regular pelo aluno com

deficiência ou transtorno do desenvolvimento garantida pelo direito, vencemos, com

essa movimentação do professor frente à inclusão, uma segunda barreira para a

aprendizagem e participação, que é a de pertencer ao ambiente escolar na categoria

de aluno, daquele que aprende, a partir desse vínculo estabelecido.

Não terminada, mas menos angustiada essa busca, o professor se entrega a

uma segunda implicação em sua prática, que denominamos EXPERIMENTAÇÃO -

TOMADA DE DECISÃO QUE LEVA AO AGIR SOBRE A SITUAÇÃO PROBLEMA.

Trata-se de “arregaçar as mangas e pôr a mão na massa”, ou seja, do

movimento de fazer algo por esse aluno de forma que possa aprender.

Analisaremos, assim, o movimento de planejar e adaptar as atividades para o aluno

incluído, tendo como propósito de desenvolvimento uma característica definitiva na

construção de valores inclusivos : a OUSADIA.

Precisamos marcar para o leitor que esse planejar as atividades para o aluno

incluído se trata, antes de mais nada, de um momento decisivo para o sucesso e

aprendizagem do mesmo. Falamos aqui de uma decisão que é tomada pelo

professor ao assumir esse aluno como parte de seu agrupamento; não se trata de

tantos alunos e mais o incluído, trata-se de contá-lo no grupo classe. Planejar,

portanto, passa a ser a decisão de que há algo a oferecer a esse aluno, trata-se de

aposta, de acreditar que há algo a ser feito e que a professora pode contribuir.

Vemos isso na fala da professora C. ao dizer: fazia só as atividades com números,

as com letras dizia não sei e nem tentava, já empurrava a atividade para longe.

Quando eu insistia, ele fazia uns movimentos estranhos e batia com a cabeça. Mas

isso não me amedrontava, porque eu entendia isso como uma teimosia e tenho para

mim que se o aluno é teimoso, a professora precisa ser mais teimosa ainda, e eu

insistia e dizia para ele, se você não sabe, vai aprender, é para isso que está na

escola (...) eu pensei, sou professora há tanto tempo, será que eu não vou dar conta

deste moleque?

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E essa certeza de poder fazer algo é tanta que, ainda que para todos os

outros pareça doidice, a decisão de fazer move o agir. Estar decidida não significa

nem de longe ter certeza sobre o que fazer, mas ter certeza de que algo precisa ser

feito e será. Nesse sentido, a professora C. relata: vi que era assim mesmo,

teimoso! Então, conversei com ele explicando que todos os alunos da classe não

sabiam coisas assim como ele, mas que precisava aprender e que eu estava ali para

ajudá-lo, acho que para quem visse de fora parecia que eu era doida falando com

ele desta forma. Pensava comigo mesma, será que tô fazendo certo? Trocando ideia

com o menino... não sei quem era o mais problemático ali.

O senso comum normalmente aponta que o sucesso da inclusão está

vinculado à boa vontade dos professores, mas o que vemos é que a boa vontade

sem a habilidade de observar, refletir e recriar a sua prática não sustenta a

aprendizagem desses alunos. A professora D. nos dá sua contribuição nesse

aspecto quando diz: depois fui pensando o que é que eu podia propor para ela e

para os outros, já que estar na escola implica em aprender algo, foquei na mesma

atividade para todos. Não acho certo deixar a criança fazendo outra atividade, e

deixava que ela me mostrasse como podia desenvolver a atividade. Ela mesma é

quem foi me dando dicas do que fazer para ajudá-la. Gosto de ver toda criança

evoluir, eu me preocupo com todos da sala de aula, gosto de ver todos avançarem,

cada um em seu ritmo e do seu jeito.

Podemos analisar por este relato que ter clareza de onde se pretende chegar

não é suficiente; o professor precisa ter a habilidade da observação, o compromisso

da reflexão e a motivação para fazer algo novo e diferente. Com relação a isso a

professora G. relata que Fui percebendo que estava acertando quando ele começou

a responder a chamada como os outros, levantando a mão, num processo que foi

extremamente lento para a aprendizagem deste procedimento. No início, a

chamada não tinha qualquer significado para ele, mas eu tinha o propósito que ele

compreendesse a rotina da sala de aula e cumprisse os procedimentos de escola,

um deles era a chamada que é realizada para todos , todos os dias pelo professor.

Chamava pelo seu nome e ele não tinha qualquer reação, então eu ia próximo a ele

e dizia você tem que responder a chamada é seu nome que estou chamando agora,

veja seus colegas , levantam o braço e respondem presente para que eu possa

saber quem está na sala e quem faltou. Aparentemente ele não estava entendendo

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o que eu dizia, então passei a pedir que um amigo levantasse o seu braço sempre

que chamasse pelo seu nome, indicando a ele que era a sua vez de levantar o

braço, até que depois de alguns meses, o trabalho é lento, ele espontaneamente

levantou o braço antes que o amigo o pudesse fazer. Então pensei estou no

caminho certo, porque ele agora pode saber qual é o seu nome nesta classe, a partir

da chamada.

Podemos aqui apresentar um outro valor inclusivo trazido por Aiscow e Booth

(2011), que trata do respeito à diversidade, entendido como valorizar o outro pela

sua individualidade, inclui diferenças e similaridades percebidas ou não entre as

pessoas e não deve ser confundido com alteridade: o diferente de nós.

Esta resposta contrasta com uma resposta seletiva que tenta manter uniformidade pela classificação e divisão de pessoas as distribuí em grupos dispostos segundo uma hierarquia de valor. (...) Uma abordagem inclusiva à diversidade envolve compreender e combater os perigos destrutivos de equacionar diferença com inferioridade. (AISCOW E BOOTH, 2011, p. 24)

Tal interpretação da diversidade faz dela um rico recurso para a vida e para a

aprendizagem, e não um problema a superar.

Com esse objetivo de atender à diversidade e respeitar as diferenças é que

os professores pesquisados, todos sem exceção, se ocuparam de planejar as

adaptações curriculares, que, como vimos anteriormente no Capítulo 2, podem ser

de grande ou pequeno porte. Para nossa análise, como tratamos das experiências

vivenciadas pelos professores em sala de aula, analisaremos apenas as de pequeno

porte, ainda que, em alguns casos, de pequeno elas não tenham nada, pois

adaptamos objetivos, conteúdos, estratégias e avaliação, ou seja, praticamente todo

o planejamento.

Reduzir barreiras para aprendizagem e participação envolve mobilizar

recursos e um desses recursos é a adaptação curricular.

Trabalhar sob esse viés da adaptação curricular nesta análise nos aproxima

um pouco mais do foco deste trabalho, que é compreender a transformação da

prática docente a partir da entrada ou inclusão do aluno com deficiência ou TGD na

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sala comum; e nesse sentido, vemos que a professora C. relata que Trabalhei com

letras móveis/jogos, mas ainda resistia muito nas letras. Procurando atividade para

os alunos na Internet, achei uma atividade que associava os números às letras, quer

dizer, os resultados das situações numéricas eram dados em letras que juntas

formavam palavras. E logo pensei que isso poderia funcionar com o Gustavo. e seria

bom para todos os alunos. Segundo a S. (professora de AEE), a grande sacada foi

eu ter encontrado esta atividade, porque o G. sempre ia para o Conselho de Classe

como o aluno que não sabia ler e escrever, mas com esta atividade pude observar

que ele sabia ler. O movimento que essa professora teve ao procurar atividades para

a classe nos mostra que, de fato, incluiu o seu aluno no grupo, porque, ao encontrar

uma atividade que fosse mais interessante ao aluno com síndrome, pôde ampliá-la

para os demais alunos, o que não é comum, pois, de forma geral, os professores

buscam as atividades para a classe e depois adaptam para o aluno incluído dentro

de suas condições de realização.

Também a professora B. entende que a atividade deva ser a mesma, e a

adaptação a ser realizada não é de atividade / de proposta, mas de resultado, ou

seja, ela propõe a mesma atividade, porém as expectativas com relação à sua

produção é que são adaptadas. Ela diz: eu quero pensar um trabalho para ela

porque precisa estar inserida, adaptado para ela. Não aceito esta coisa de atividade

diferente para ela, ela vai fazer o que todos estão fazendo, mas dentro das

condições dela.

Se tomarmos por referência a visão de normalização, ou seja, de déficit, e

que, portanto, a escola precisa corrigir ou diminuir ao máximo esse déficit, o

currículo escolar comum pode não caber para todos os alunos. Porém, se tomarmos

por referência a visão de potencialidades, ainda que estas não sejam as esperadas

pelo currículo escolar, que ainda é pouco flexível, as diferentes estratégias utilizadas

na sala de aula poderão auxiliar o professor a atingir seus objetivos com todos os

alunos. Nos casos de inclusão, esses objetivos podem coincidir ou não com os

objetivos para a classe. Mas aqui, deixamos uma questão: será que somente os

alunos com deficiência ou transtornos do desenvolvimento necessitam dessas

adaptações curriculares de pequeno porte? Não existem na sala da aula outros

alunos sem o rótulo que se beneficiariam de um currículo que flexibilizasse objetivos,

estratégias, formas de avaliação, por exemplo?

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A professora G. conta sobre a sua experiência com o aluno incluído em uma

das atividades propostas Tivemos uma atividade de grupo , onde a proposta era a

escrita de uma carta aos 3 porquinhos avisando que seu Lobo se aproximava para

tentar matá-los e foi muito boa a produção do grupo que estava com o Jonatas, pois

o fato dele não saber escrever ou falar, o que era básico na atividade, não foi

impedimento para ele participar. Os alunos encontraram um caminho que ele

pudesse participar da atividade e ele participou fazendo desenhos, que por sinal

ficaram ótimos na carta para os 3 porquinhos. O grupo se sentiu muito satisfeito

com a produção coletiva.

Em se tratando de adaptação de formas de ensinar, podemos tomar como

exemplo a professora C. ao dizer que Gustavo. é metódico, não abre possibilidades,

fixa regras, então pensei que o silabário, que é bem metódico, poderia ajudar,

mesmo sendo proibido na rede. Dei o silabário para ele e ele decorou tudo tão

rápido, que quando pedia a letra b, repetia automaticamente todas as sílabas ba-be-

bi-bo-bu. Hoje não usa mais o silabário, nem pede... Houve, neste caso, uma

adaptação de método, pois aquele utilizado para a sala toda não estava funcionando

com ele, então, a professora partiu do conhecimento que tinha do aluno para

adequar as suas estratégias de ensino.

Porém, esse processo de adaptação curricular mobiliza o professor da sala

comum a buscar ajuda para ser implementado. A professora C. diz que quando

decidiu utilizar o silabário à revelia das orientações dadas pela rede de ensino, fiquei

preocupada e pedi ajuda para a professora de AEE, e ela me orientou a alternar o

uso e só dar a ele quando ele pedisse, e complementa ao dizer como o professor de

AEE contribuiu para sua reflexão quando o seu desafio estava em fazer com que ele

fizesse as atividades de Português e não apenas as de Matemática: a dica da S.

(professora de AEE) foi pensar em uma estratégia que utilizasse o que ele sabia, e

ele sabia gravar as coisas, então, pensei no silabário. Não foi o silabário que o

ajudou a escrever, nem só as letras móveis, foi um conjunto de coisas, assim como,

Na informática, foi muito interessante a parceria com a professora de AEE, porque

eu achava que ele tinha problema motor, porque eles têm um jeito meio

desengonçado de andar, é um andar diferente, e a S. (professora de AEE) me fez

refletir que se ele não tivesse coordenação motora, como desenvolveria com tanta

agilidade e perfeição as atividades no Paint no computador? (...) Em outro momento,

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ele começou a se fazer de louco, mexia os braços mole e virava os olhos, e as

crianças corriam de medo dele e ele ia para cima; corri para a S. (professora de

AEE): e agora, o que eu faço? Ela me deu umas dicas e disse: por que você não

transforma esta loucura dele em uma brincadeira com toda a classe? Por que eu não

tinha pensado nisso? Então, propus para a sala: todo mundo vai poder ser louco por

hoje, e isso diluiu este comportamento do ustavo.

O que vemos neste depoimento é que a parceria com a professora de AEE

esteve presente a partir dos momentos de dúvida, indecisões e, principalmente, de

dificuldades da professora da sala comum, que, a partir do vínculo de confiança

estabelecido com essa professora na escola, pôde partilhar essas questões e

construírem juntas possíveis soluções que precisaram ser experimentadas e

validadas pela professora da sala comum.

Como vimos ao longo do Capítulo 2, são muitas as formas como o professor

de AEE pode ser apoio na escola e na sala de aula do aluno incluído; porém, o que

vemos a partir desses relatos é que essa parceria nessa rede de ensino ainda está

no campo das receitas, das prescrições do especialista. Precisamos avançar nessa

parceria para o campo do fortalecimento desse professor da sala comum, na

apropriação de como fazer, buscando sua emancipação nesse processo inclusivo,

cedendo lugar aos modelos de como fazer, que limitam as inúmeras possibilidades

de soluções.

Entendemos que este seja um desafio ao professor de AEE, poder contribuir

de forma mais direta e prática com a formação desse professor, tornando-o cada vez

mais competente e capaz de pensar sobre as soluções dos problemas advindos pela

diversidade na escola, a partir de um repensar de posturas que, à medida que se

internalizam, podem construir a escola inclusiva.

A parceria entre o professor da sala comum e a professora de AEE se

estabelece com o vínculo que se constrói na partilha de dúvidas, ideias, angústias e

conquistas com o aluno, entre o professor que está cotidianamente com os alunos

em sala e o professor que está mais distante e dá “mergulhos” na sala de aula na

tentativa de observar o que não é possível a quem está imerso no cotidiano,

conforme nos apresenta a professora C.: penso que é uma pessoa externa que dá

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dicas para a gente. A gente fica se perguntando até onde você tá fazendo o certo ou

tá sendo um problema para a criança.

Uma outra professora, ao falar da professora de AEE, diz que a parceria do

professor é de muita ajuda porque a gente no olho do furacão não consegue ver o

miudinho. Demonstrando clareza dos lugares diferenciados ocupados por esses

profissionais, ao professor da sala regular cabe a gestão da sala de aula em todos

os seus aspectos, e ao professor especialista cabe a parceria no planejamento e na

formação desse professor, como preconiza a Política Nacional da Educação

Especial (2008).

A professora C. ainda deixa claro que essa parceria não se estabelece de

“bate e pronto”, quando diz que nenhum momento teve (o professor de AEE) o nariz

empinado, com a postura de achar que sabia mais, desprezando o saber do

professor que está todos os dias com o aluno e da gestão da escola, que confiou no

meu trabalho mesmo sabendo que não tinha experiência e que podia dar errado,

mas acreditou que ia conseguir, e conclui: em um trabalho de muitas mãos.

Uma outra forma de essa parceria se estabelecer é a que relata a professora

B.: com o professor de AEE dá muito certo, porque no HTPC47, a gente, eu e a

professora de AEE planejamos as adaptações necessárias das atividades que irei

propor para a classe para Bruna (tipo de letra, número de questões, tamanho do

texto, etc.). Aí eu tenho um segundo olhar, planejo de novo a atividade e até mudo o

que tinha pensado antes para todos, e fica até melhor.

Aiscow e Booth (2011) apontam que atividades de suporte são todas as

atividades que aumentam a capacidade da escola de responder à diversidade das

crianças de modo que sejam igualmente valorizadas. Os esforços para reduzir as

barreiras de aprendizagem e participação, assim como a mobilização de recursos,

são atividades de suporte. Podemos entender que o professor de Educação

Especial que atua no AEE, assim como os gestores da escola, ou mesmo os demais

alunos da classe, são suporte à inclusão.

47 HTPC – Horário Pedagógico de Trabalho Coletivo - espaço de formação continuada dos professores que acontece semanalmente na escola sob a coordenação do coordenador pedagógico.

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Nesse sentido, a professora B. se refere ainda ao suporte dado pela auxiliar

de classe os outros apoios também ajudam; eu, por exemplo, tenho uma auxiliar que

é meu braço direito, ela me ajuda demais, mas foi necessário que o trio gestor

bancasse junto com a gente, porque tem uma ordem da secretaria que a auxiliar de

ensino não pode ajudar na sala de aula, apenas para as ações de locomoção pela

escola, higiene (troca de fralda e outros) e alimentação, e às vezes, não é disso que

a gente precisa. Ainda que este seja um apoio necessário e muito importante,

caberia aprofundar sobre o papel e a atuação desse profissional na inclusão escolar,

mas isso fica para um outro momento.

Cabe salientar que muitos dos professores entrevistados trouxeram como

suporte importante para a inclusão a parceria com o grupo classe. Nesse caso, é

interessante pensarmos sobre a inclusão no que diz respeito aos benefícios que a

diversidade traz, e como o professor pode se aproveitar da inclusão para

desenvolver atitudes e valores inclusivos, como igualdade e respeito. Porém, a

professora C. nos traz uma outra perspectiva, que é o trabalho com a diversidade

com todos os alunos, pois precisou trabalhar a diversidade com o aluno Gustavo

(aluno incluído por ter Síndrome de Asperger), já que não tinha paciência com os

alunos que demoravam para resolver problemas matemáticos, tendo que aprender a

respeitar essas limitações de seus colegas, e estes a respeitar as suas limitações

também. Isso nos mostra o quanto a diferença é relativa à referência que temos, e,

portanto, todos estamos imersos nela e precisamos aprender com ela.

Nesse sentido, o relato da professora J. nos mostra o quanto esses lugares

de quem ensina e de quem aprende na diversidade são circulantes, quando diz em

seu relato que a turma conhecia o Douglas antes de mim, e conhecem ele melhor

do que eu, foram ensinando a professora, me ajudavam nos momentos de

convulsão, diziam: é só abraçar ele e acalmá-lo; para um especialista isso pode

parecer uma bobagem, não é uma indicação de como de tratar uma convulsão, mas

para o contexto da escola isso foi muito importante.

Também a professor G. trouxe o seguinte relato sobre a aprceria com o grupo

para a classe, o ganho que vejo é no aprendizado do que é solidariedade, pois cada

dia uma criança é responsável por estar mais próxima dele, auxiliando-o nas

atividades. Ele já mostra algumas preferencias, indo perto dessas, ele mesmo

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levanta da sua carteira e vai próximo de onde estas crianças preferidas por ele

estão.

Até aqui caminhamos descobrindo que os professores, ao receberem os

alunos com deficiência ou transtornos do desenvolvimento, buscam informações

sobre o diagnóstico recebido, até que percebem que o conhecimento do aluno só

virá com a sua observação e intervenção em um contexto onde se estabelece o

vínculo entre sujeitos. Posterior a isso, é hora de pensar como diminuir as barreiras

de aprendizagem e participação na escola, e muitos são os suportes de que

podemos lançar mão, de igual valor e importância, porém, o que mais nos desafia

são as adaptações no currículo escolar para esse aluno, e, de forma geral, o

parceiro mais presente para isso tem sido o professor de AEE, que tem por tarefa

não apenas oferecer essa parceria em sala de aula com o professor da sala comum,

mas contribuir para a sua emancipação a partir da sua formação reflexiva.

Partimos agora para nossa terceira implicação da inclusão na prática docente,

que denominamos REFLEXÂO - O PENSAR SOBRE A PRÁTICA. É neste processo

que o professor pode através da reflexão , validar suas ações, modifica-las e

paulatinamente ir transformando a sua prática para todos os alunos.

Considerando o percurso realizado por esses professores desde a notícia da

chegada do aluno à sua sala de aula regular, podemos levantar diferentes

momentos em que o professor teve a oportunidade de aprender com esse desafio e,

portanto, pode refletir sobre a sua ação, agir e refletir novamente, num constante

processo de reflexão-ação-reflexão. Sobre isso a professora C., em vários

momentos de sua entrevista, aponta que pensava consigo mesma, será que tô

fazendo o certo? (...) Porque eu não tinha pensado nisso?

E, muitas vezes, é nesse processo de reflexão sobre a prática que o professor

sente necessidade de aprofundar seus conhecimentos teóricos, como ocorreu com a

professora C., por conta dele fui até fazer a pós-graduação em educação inclusiva,

tô fazendo ainda e me surpreendo há quanto tempo já existe a legalidade da

inclusão, quer dizer, há quanto tempo a inclusão está dada e quanto ainda não

avançamos com estes alunos na escola, ampliando as discussões e reflexões para

fora da sala de aula, onde as políticas públicas são normalmente pensadas. Se

tomarmos por referência o que nos apresentam Aiscow e Booth (2011) sobre o

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triângulo que sustenta a inclusão, veremos que a cultura inclusiva é a base para as

políticas e para as práticas inclusivas, o que, portanto, remete-nos a pensar que a

cultura inclusiva é necessariamente uma cultura reflexiva que pensa a prática e a

política ao mesmo tempo, sem qualquer grau de hierarquia que possa se

estabelecer, pois, como bem nos aponta a professora B., a pós é só um pontapé,

serve só para que a gente tenha o desejo de querer saber mais sobre as síndromes,

numa consciência que o saber é dinâmico e constante.

Nesse aspecto, a inclusão acaba sendo um disparador para a amplitude de

reflexões sobre a educação como um todo, dada a diversidade de temas que

podemos abarcar, mas também sobre a profundidade de um desses temas num

movimento de verticalização de especificidades.

O relato da professora B. sobre a sua mudança de prática a partir da inclusão

passa necessariamente pela reflexão de sua prática: A minha prática se modificou

muito neste ano; como estão no 5º ano, eu passava o cabeçalho na lousa com letra

de mão e os alunos copiam, mas a aluna B. não fazia, se esforçava mas não fazia.

Aí tive uma sacada legal, percebi que quando tivemos uma atividade de cartinha,

apesar de saber escrever algumas letras bastão, não realizava a tarefa e queria

fazer com a letra de mão, então pensei: por que o cabeçalho precisa ser com a letra

de mão, ele pode ser feito por todos os alunos pela letra bastão, isso não fará a

menor diferença para a classe, mas fará diferença para ela, dando oportunidade de

fazer como consegue, e os demais podem fazer dos dois jeitos.

Trata-se aqui de estar atenta à dinâmica da classe, e a cada aluno em

particular, nesse exercício dialético de olhar o todo e as partes ao mesmo tempo. O

movimento formativo reflexivo passa por decidir e agir sobre o que se observa, voltar

a refletir e agir novamente. A professora ainda aponta: Tenho uma enorme

preocupação em não reduzir as possibilidades de aprendizagem da Bruna com as

adaptações que fazemos nas atividades, pois pressupor, por exemplo, que ela não

dá conta de fazer algo proposto e lhe oferecer menos pode significar subestimar a

sua capacidade de aprender e a minha de ensinar. Por isso, por ex., com o

cabeçalho, pensamos, se ela não consegue fazer, podemos trazer o cabeçalho

digitado e ela cola no caderno, seria uma possibilidade, porém, a gente não estaria

oferecendo a ela o aprendizado de procedimento; procedimento também é

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aprendizado na escola, a gente não estaria resolvendo o problema, estaria

substituindo o problema, porque hoje seria o cabeçalho, e amanhã o que seria? Se

por acaso o aluno não sabe como usar o caderno (isto é tarefa da escola ensinar),

eu dou atividade na folha para este aluno que não sabe usar o caderno, pois a folha

ele sabe usar, que mensagem estou lhe passando, que ele não é capaz de aprender

e tampouco eu de lhe ensinar. Somos dois incompetentes.

Analisando este relato, podemos observar o quanto de reflexão há nele,

nesse movimento constante de refletir-agir e refletir novamente, pois a inclusão

obrigou o professor a pensar em propostas mais lúdicas, com mais acessos visuais,

sensoriais, especialmente no Ensino Fundamental, que, de forma geral, frente à

rotina espremida e às cobranças pedagógicas de alfabetização, ficariam para o “se

der tempo.” O aluno incluído traz essa necessidade, pois, se não for assim, ele não

aprenderá; portanto, não cabe o “se der tempo”; para ele, só fará sentido se for

assim, e então, o que se percebe são as outras crianças muito mais atentas a essa

forma de ensinar no lugar de exercícios infindáveis. Nesse sentido, entendemos que

a inclusão tem nos desafiado a repensar a escola e o currículo para todos os alunos

Tratamos até aqui da prática docente no âmbito mais restrito da sala de aula,

porém, cabe-nos ainda analisar as implicações da inclusão na prática docente para

além das paredes da sala de aula.

A quarta implicação, que denominamos de A CONSTRUÇÃO DE VALORES

NA E ALÉM DA ESCOLA, coloca o movimento do pesquisador em contextos mais

amplos que o seu universo de pesquisa , num exercício de ampliação de suas

práticas validadas com este aluno para além desta situação vivenciada e ao mesmo

tempo impulsionando todo o grupo a construir valores de COLABORAÇÃO.

Nesse sentido, a experiência relatada pela professora B. nos leva a perceber o

quanto a inclusão favoreceu o trabalho com valores inclusivos que ultrapassam a

sala de aula e chegam à sociedade. Ela conta que um aprendizado para eles foi

respeitar a diferença da B., o que me levou a trabalhar com a diversidade na sala de

aula, não apenas o deficiente, mas o gordinho, aquele que usa óculos, o que é alto,

o que é baixo, ou seja, pois quando divido os alunos para trabalho em grupo e dou a

oportunidade de escolher, em nenhum momento a B. fica sozinha, às vezes sai até

briga para quem quer ficar no grupo dela, ainda que saibam que algumas tarefas ela

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não conseguirá fazer no grupo, dão oportunidade dela se expressar e observam e

perguntam a ela o que ela quer fazer. Isto é respeito. (...) Também quando resolvem

problemas na lousa, e os dela não têm a mesma dificuldade dos que os deles pelas

condições cognitivas, respeitam a socialização de resultados, o tempo que ela

precisa para pensar, não zoam quando erra e ajudam explicando-lhe como tinha de

ser. São verdadeiros parceiros na sua aprendizagem.

Tratamos sobre esse aspecto de colaboração no Capítulo 2, e, ao

analisarmos este relato, refletimos que ainda que isso leve algum tempo, esses

alunos, que hoje têm a possibilidade de estar e aprender com o aluno com

deficiência ou transtorno na escola, poderão ser agentes multiplicadores de valores

inclusivos, como respeito, solidariedade, direito, em benefício de uma cultura

inclusiva que possa avançar da escola para a sociedade.

Ao analisarmos os relatos dos professores participantes, levantamos uma

questão que merece ser apontada. A cultura de inclusão na escola ainda está muito

centralizada na figura do professor, pois, como nos apresenta o relato da professora

B., Outro dia, atrasamos com o lanche por conta de uma atividade diferenciada que

realizamos na escola, e ela começou a reclamar que estava com fome e pediu para

a professora deixá-la ir comer. Eu não deixei e pedi que aguardasse todos os

colegas para irmos juntos, mas as professoras da escola que estavam fazendo a

parceria nesta atividade diferenciada mostraram-se contrárias a esta ação, pois

entendem que como ela é diferente, não tem a condição de compreender o atraso e,

portanto, deveria ter deixado que ela fosse antes dos colegas. Isto causou discussão

sobre por que ela poderia e os outros não, se a fome não era só dela, mas de todos

que tinham também perdido o horário do lanche?

A postura de tratar a inclusão em um contexto escolar como uma diversidade

que está dada para todos, pois somos todos diferentes uns dos outros, com

necessidades e possibilidades diferenciadas, precisa ser dividida com toda a escola,

pois o trabalho que, muitas vezes, o professor faz na sala de aula se perde quando

da passagem desse aluno para outro professor na sequência escolar, ou mesmo no

próprio ano, quando o professor não está presente. A isso chamamos nesta

dissertação de cultura colaborativa, isto é, aquela que está incorporada por todos os

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envolvidos com a educação escolar, desde a gestão da escola até o porteiro,

incluindo a família.

Concluindo nossa análise, indicamos que o processo de inclusão vivenciado

em São Bernardo do Campo pelas professoras entrevistadas, indicadas para a

pesquisa pela boa prática inclusiva que exercem em suas escolas, nos mostram o

movimento que esses professores perpassam desde a entrada do aluno com

deficiência ou transtornos globais do desenvolvimento, num estimulante exercício de

pesquisa das mais diferentes naturezas que vão imprimindo ao professor uma

identidade de investigador, de experimentador, de pensador sobre a sua prática,

numa perspectiva de oferecer não apenas o acesso a esse aluno na escola, mas a

permanência e o sucesso escolar.

Porém, por mais que essas práticas venham se instituindo e proliferando pelo

munícipio, restam-nos desafios gigantes pela frente, pois o que pudemos apontar é

que são práticas, muitas vezes, isoladas na escola, que se encontram apoiadas na

postura do professor, não transpassando para outros universos dentro da escola,

tampouco para outras pessoas. Nesse sentido, vislumbramos que as ações

formativas pautadas em socialização de práticas entre os professores e a equipe

escolar poderia ser um caminho para alavancar essas discussões e reflexões no

interior da escola, constituindo um campo de aplicação de experiências e decisões

que, quando tomadas coletivamente, poderão ser a base para a qualificação das

políticas e práticas educativas em uma sociedade inclusiva.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Encerrar esta dissertação talvez seja o maior desafio que tivemos neste

processo de escrita, tanto pelo viés da própria escrita da dissertação e encerramento

da pesquisa, quanto por questões do exercício do papel de pesquisador aprendiz.

Se tomarmos como referência esta dificuldade pelo viés do papel do

pesquisador, precisaremos apontar que os ganhos que a pesquisa trouxe foram

extremamente maiores que suas dificuldades, já que pudemos, neste ínfimo

exercício, nos conscientizar da postura necessária para a investigação sobre um

objeto de estudo, considerando todas as suas instâncias de cientificidade:

linguagem, validade, fidedignidade, rigor, objetividade e outros, sem perder a ideia

de que, quando ligadas à Educação, essas instâncias são trasnversalizadas pela

subjetividade inerente à natureza do objeto. Talvez, nesse sentido, as forças de

objetividade e subjetividade sejam o que mais nos desafiou, tomando em

consideração as inúmeras possibilidades de aprofundamento que o tema nos

apresentou a partir das inter-relacões que a educação inclusiva nos abriu.

Ao considerarmos essas possibilidades, nosso primeiro desafio foi escolher

sob que ponto de vista trataríamos a inclusão escolar, que, quando vista como

produto, pode representar a vitória sobre as barreiras de aprendizagem que

tentaram inviabilizá-la em sua implementação; porém, ao ser compreendida como

processo, deve ser entendida como um poderoso instrumento capaz de transformar

o sistema educacional de forma gradativa, que não exclui ninguém, mas inclui todos

na escola. Ficamos com a última posição para este estudo.

Foi diante dessa tela de fundo que expusemos, reconstituímos, ainda que de

forma resumida, e analisamos as práticas docentes direcionadas aos alunos com

deficiência intelectual e transtornos globais do desenvolvimento, vivenciadas e

apresentadas sob a ótica desses professores. Essas práticas, compreendidas como

boas práticas inclusivas na rede municipal de São Bernardo do Campo pelos

professores de Educação Especial, parceiros nesse processo, tiveram a intenção de

que este estudo pudesse contribuir com a confirmação, correção ou apresentação

de alternativas para a realização de um projeto tão complexo na educação, no qual

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concluímos que, além do tempo e da paciência que insiste, que investe,

indispensáveis nesse processo, a reflexão tem um lugar privilegiado, pois é ela que

leva à revisão de modos de pensar e agir e à tomada de consciência de

responsabilidades e envolvimento com o tema, que leva o professor a tomar a

definitiva ação nesse processo de se decidir pela inclusão, encaminhando-o para o

conhecimento e a ação sobre essa proposição que hoje é aceita como príncipio

fundamental da condição humana, não apenas pelo direito de ser diferente, mas,

especialmente, pelo direito de pertencer à condição de humanidade e, mais ainda,

de pertencer à escola na qualidade de aluno, e de aluno que aprende.

É prudente alertar que boas práticas inclusivas foram uma prerrogativa repleta

de valores instituídos por um tempo e um lugar, e também por concepções

ideológicas, já que representa a ideia de que socialmente é construída do papel do

professor na escola; porém, surpreendeu-nos observar que as escolhas dos

professores de AEE se deu muito mais pela postura que esses professores

escolhidos assumiram diante da inclusão desde o ínicio do trabalho com esses

alunos, do que efetivamente pela inovação ou acertos que tiveram e que poderiam

caracterizar o conceito de boas práticas, o que nos remete a pensar que diante da

inclusão, esses professores de AEE têm focado como meta de parceria e de

trabalho inclusivo na escola não apenas o fazer do professor da sala de aula

comum, mas o pensar reflexivo, que leva a mudanças de postura e de concepção

sobre a inclusão escolar e sobre o aluno diferente na sala de aula comum, agindo de

forma mais autônoma no conhecimento desse aluno, mas, essencialmente, nas

propostas de adaptações curriculares.

A pesquisa, tal e qual apresentamos ao longo do texto, nos mostrou que a

prática docente se encontra no centro das possibilidades de sucesso desse aluno;

porém, a exclusividade dessa prática não garante o sucesso e a inclusão desse

aluno no contexto educacional, ou seja, pode garantir que este esteja incluído na

sala de aula comum, contudo, distante de estar incluído em todo o contexto escolar,

já que uma parcela significativa dos educadores não compreende a educação

inclusiva como um trabalho coletivo resultante do projeto pedagógico. Essas

incompreensões se revelam nos discursos e ações que não se integram àqueles

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realizados pelo professor em sua sala, expondo de forma clara que estes estão

ocorrendo de forma isolada e individualizada.

O fato de pertencer à tarefa do professor a responsabilidade de definir

estratégias pedagógicas que atendam às diferentes formas de aprender e de ensinar

acarretam sentimentos de angústia, ansiedade, impotência e incapacidade, que

levam a identificar parcerias no coletivo da escola para sua atuação em sala de aula,

mas muito pouco ainda, ao engajamento colaborativo quanto aos desafios de

ensinar a todos os alunos, reduzindo as barreiras de aprendizagem e de

participação desse aluno na escola.

Ainda que muitas pesquisas nos apontem que um dos maiores obstáculos

para atender adequadamente esses alunos em sala de aula comum é a falta de

conhecimento dos professores, que como vimos, de fato, angustia-os desde o início

desse processo, chamou-nos atenção a descoberta de que os professores

pesquisados buscam essas informações autonomamente, não mais aguardando

passivamente que os especialistas lhes digam o que, quando e como fazer com

esses alunos na escola, o que nos remete a refletir sobre os avanços que esses

professores vêm construindo no que diz respeito a assumirem seus lugares de

conhecedores e descobridores do saber pedagógico caracterizado na redefinição de

seu papel. Ainda que esse movimento possa ser mais ou menos consciente, ou seja,

possa ser apenas para responder às novas demandas que lhes são apresentadas

pela sociedade, e não por uma intenção implícita de repensar a tarefa de ensinar,

devemos apontar que os desafios colocados e a pressão da sociedade podem

provocar a reflexão dessa prática.

Nesse sentido, a pesquisa nos levou a estabelecer relações entre as práticas

docentes que consideramos nesse contexto como inclusivas. Uma dessas relações

que pudemos extrair na pesquisa diz respeito ao processo de formação desses

professores; muito além da formação inicial, que, de forma geral, nas universidades

se resume a uma ou duas disciplinas que não conseguem atender à complexidade

do tema, a formação continuada precisa ser discutida e aliada às pesquisas e à

extensão, de forma que possam contribuir de maneira significativa para as

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mudanças nas escolas, e que as experiências bem sucedidas deixem o lugar de

exceção e sejam norma no cenário educacional.

Mas, quais seriam as propostas para atender ao despreparo e desamparo em

que se encontram os professores ao receberem os alunos com deficiência ou

transtornos globais do desenvolvimento? Que saberes são necessários para se

educar a todos na escola regular? Ainda que tenhamos na legislação brasileira –

LDB 9394/96 – indicativos do que se pretende nessa formação de professores,

detalhados nas Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica

(BRASIL, 2001), distribuindo essa formação em capacidades e a outra em

especialidades dirigidas a diferentes atribuições desses professores na escola

regular, cabendo ao professor capacitado atuar na sala comum inclusivamente, e

ao professor especialista atuar no atendimento especializado complementar a esse

corpo de alunos com deficiência ou transtornos globais do desenvolvimento, o que

vemos na prática é que têm sido pouco articulados esses saberes especializados na

prática do professor capacitado.

O que percebemos com nossa pesquisa é que os professores da sala comum

que tiveram, e quando tiveram, alguns “flashes” em sua formação inicial sobre as

deficiências ou transtornos do desenvolvimento, não dão conta nem ao menos de

diminuir a própria angústia no ingresso desses alunos em sua sala de aula, levando-

os a procurar cursos de especialização na área para melhor entenderem essas

questões. Por outro lado, os professores especialistas, dados nessa rede como

professores de Educação Especial, vivem um processo de adequação das

atribuições que muito recentemente mudaram o rumo da sua atuação, até então

localizada nas escolas especiais, e agora precisam se instalar e encontrar um lugar

na escola comum.

As pesquisas nos indicaram que as experiências apresentadas apontam para

o estabelecimento dessa parceria na escola, num constante e progressivo ajuste e

troca de saberes. Porém, precisamos ter clareza de que não por acaso essas

parcerias têm se estabelecido de forma positiva nos relatos apresentados, já que a

indicação dos professores entrevistados passou, antes de mais nada, pelo crivo do

professor de AEE, que evidentemente escolheu aqueles que considerou com vínculo

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mais estabilizado. Ainda assim, entendemos que isso não desmerece esses relatos,

já que nos leva a vislumbrar possibilidades de trabalho colaborativo entre esses

profissionais, que atingirá de forma direta o nosso alvo – o aluno – e ainda por

complemento, poderá atingir em longo prazo a construção da cultura inclusiva na

escola como um todo, no reconhecimento de que cada segmento da escola efetive

seu papel na remoção das barreiras para a inclusão, sejam elas de ordem estrutural,

pedagógica ou pessoal.

Entendemos que os espaços formativos instituídos pela legislação, seja no

horário pedagógico de trabalho coletivo, seja em momentos criados pela própria

escola, em sua gestão marcada pela autonomia e democracia nessa rede de ensino,

precisariam contemplar, essencialmente, estratégias de discussão de casos,

socialização de experiências bem sucedidas no coletivo da escola, no caminho de

refletir sobre o seu papel, seus valores e suas práticas como efetivo espaço de

formação, e não apenas de informação, em um pressuposto interacionista que

marca a educação inclusiva, que é o da interdependência, em que tudo faz parte de

um todo que não anula diferenças e singularidades, mas que busca criar relações de

complementaridade.

Observamos que as experiências relatadas se implicaram nessa condição de

interdependência e interação, especialmente no que diz respeito à atuação do

professor de AEE nas salas de aula comuns, que não se ocupou apenas de

transmitir informações, mas de buscar o aperfeiçoamento próprio e das pessoas que

se relacionam com a inclusão desses alunos na escola e, em consequência disso,

modificar uma prática que beneficie a todos que a recebem.

Nesse sentido, o que vemos é que a inclusão de alunos com deficiência ou

transtornos globais do desenvolvimento é apenas um nome criado para não nos

esquecermos de que na educação, o vínculo entre educadores e educandos tem

suas raízes não apenas na disponibilidade de aceitar as diferenças, mas,

impreterivelmente, nas decisões de agir sobre elas, levando, consequentemente, à

reflexão e a novas formas de ação, em uma vida que segue em nós e depois de nós.

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Nessa perspectiva, o que vimos nas práticas docentes que nos foram

apresentadas é que existe uma lógica no exercício da prática inclusiva desses

professores. Essa lógica é dada por momentos e movimentos que esses professores

perpassam em busca de uma prática inclusiva que atenda esses alunos incluídos

em suas salas de aula comuns.

Apontamos na análise qualitativa dos dados que esses movimentos são

determinantes para a apropriação do professor desse aluno, assumindo-o não

apenas como mais um na sua turma, ou ainda, como o incluído fora a classe

(comumente ouvimos os professores dando como resposta ao questionamento de

quantos alunos têm: 25 mais o incluído).

Caracterizamos que esses movimentos que chamamos aqui de inclusivos,

porque buscam os valores inclusivos apontados por Aiscow e Booth (2011), de

igualdade, participação, direito, respeito à diversidade, assemelham-se não apenas

nos caminhos trilhados por esses professores, mas também nos sentimentos e

decisões tomadas frente ao desafio de incluir o aluno com deficiência ou com

transtornos globais do desenvolvimento. Mas, qual seria a importância disso para a

Educação?

Entendemos que a compreensão desse processo relativamente comum

vivenciado por esses professores, neste momento atual e nessa rede de ensino,

poderá ser indicador de necessidades formativas para que possamos avançar nos

desafios que ainda não vencemos e que cotidianamente são renovados.

Acreditamos ainda que “olhar” para essas práticas inclusivas com lentes de quem

investiga não apenas o fenômeno sob uma perspectiva teórica, mas a prática na

medida em que aponta para possibilidades de novas construções, e concordando

com Sacristan (1999, p.71), que a prática “deixa sinais, vestígios e marcas naquele

que as realiza e no contexto interpessoal e social em que ocorre (...) e são imitáveis

por outros”, contribuirá para a cristalização de uma cultura inclusiva.

Compreender que esses movimentos vivenciados pelos professores na

experiência de incluir nos levam a concluir que a postura desse professor tem se

consolidado no mesmo movimento exercido pelo pesquisador, dando-nos um

estímulo para continuarmos aprofundando as investigações neste tema. Quando

tratamos da postura de pesquisador, estamos nos referindo aos movimentos iniciais

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de aproximação ao seu objeto de estudo a partir do levantamento do que se sabe

sobre isso, tal e qual é realizado por esses professores ao receberem a notícia da

inclusão em sua sala de aula, que brevemente é clareada pela necessidade do

vínculo com o objeto de estudo, compreendido agora pelo viés do contexto em que

está inserido e que dá ao pesquisador o lugar do geral para o particular, do objetivo

para o subjetivo, do genérico para o único, e exige que este avance em seus

conhecimentos, decidindo por agir sobre o seu objeto de estudo, experimentando

para melhor conhecer suas possibilidades e limites.

É nesse processo de experimentação de propostas que o professor-

pesquisador se encontra de forma efetiva com a reflexão. Nesse sentido, pesquisar

o professor em seu cotidiano foi uma escolha em consideração, como nos mostra

Cunha (2008, p.157), de “(...) que o professor é simultaneamente um ser particular e

um ser genérico. Isso significa dizer que quase toda a sua atividade tem caráter

genérico, embora seus motivos sejam particulares”, e por isso mesmo, de uma

riqueza de interpretações que só podem premiar essa reflexão educacional

recheada de histórias de vida profissional que se misturam às histórias pessoais e

de histórias profissionais que se levam para a vida pessoal.

É ainda nesse processo de experimentação reflexiva que a ação docente se

reestrutura ao considerar as diferenças como norteadoras dessa ação, que exigem

diferentes formas que possibilitem a expressão do conhecimento por todo e qualquer

aluno. Essas possibilidades demandarão suportes e recursos que poderão auxiliar

esses alunos segundo suas necessidades, características e especificidades.

Isso procede como vimos nos professores entrevistados, que apresentam de

forma clara e evidente o desejo de fazer, experimentar, inovar o ensino na busca de

atingir o alvo: a aprendizagem desse aluno diferente em sua sala de aula. Tomamos

isso como positivo porque, se até muito pouco tempo atrás, tínhamos muitas queixas

de que os professores apenas cumpriam as leis, mas pouco acolhiam esse aluno em

sua de aula, num exercício de atendimento forçado e de exclusão velada a esse

aluno, nossa pesquisa mostrou que para esses professores (os pesquisados), isso

está superado, havendo um acolhimento e uma inserção de fato na sala de aula,

com a incorporação desse aluno na composição do seu grupo classe, não mais

contado como mais um, mas simplesmente como aluno.

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Porém, por outro lado, preocupou-nos o fato de que as mudanças nas

propostas em sala de aula ainda estão muito vinculadas exclusivamente às

mudanças nas atividades, compreendendo-se as adaptações curriculares apenas

por esse ângulo. Pouco vimos que os professores adequam os seus currículos a

aspectos mais particularizados que, de fato, poderiam beneficiar toda a classe, como

mudanças de objetivos, de estratégias de ensino e, especialmente, de avaliação,

que não foi nem citada por esses professores.

Isso nos leva a retomar a hipótese, ou melhor, a expectativa que tínhamos no

início desta pesquisa, de que a inclusão poderia ser uma alavanca na formação e na

transformação da prática docente, já que obrigaria o professor a buscar meios

diferenciados pela ludicidade e pelos acessos direcionados pelos sentidos para o

aluno incluído, que poderiam ser estendidos para todos os outros, beneficiando a

aprendizagem de muitos outros sem deficiência na sala de aula, tomando como

referência Sassaki (2011), que nos apresenta alguns princípios na realização

dessas práticas:

- singularidade – cada aluno é único e precisa de metas individualizadas;

- multiplicidade de inteligências – estímulo de todo o cérebro;

- estilos de aprendizagem – consideração pelos modos como cada aluno aprende

melhor;

- avaliação de aprendizagem – comparação das avaliações do aluno consigo mesmo

e não com os outros; em continuidade, e para incluir e não excluir;

- coerência – toda a escola precisa ter atitudes inclusivas, o que se alcança por meio

da formação periódica.

Podemos concluir com nossa pesquisa que ainda que esses professores

estejam, e estão, desenvolvendo bons trabalhos nas escolas, estão longe de

repensar a sua prática para todos os alunos, como é a proposta da inclusão. Ao

avançarmos nesta temática, faz-se indispensável considerarmos que todo problema

de aprendizagem supõe um problema de ensino envolvendo o docente, que precisa

repensar sua práxis cotidiana para estabelecer adequações curriculares, projetar

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estratégias e intervenções pedagógicas, em que seja possível a aprendizagem de

todos e de cada um dos alunos.

Estamos, de certa forma, ainda no paradigma de integração desses alunos,

buscando formas de eles se integrarem aos currículos estabelecidos, seja pelo

ajuste no tamanho da tarefa, seja no ritmo ou na expectativa de aprendizagem; mas

tratamos, de qualquer forma, de um mesmo currículo, de uma mesma proposta para

todos. Incorporamos as nossa reflexões, o que nos apresenta Sacristan (1999)

quando refere que a prática subsidia a ação no campo da educação sedimentada

em ciclos de reprodução e ciclos de inovação. Reprodução, porque parte do

fundamentalismo, do tradicionalismo característico de nossas escolas; e inovação,

quando, a partir das ações reprodutoras, abrem-se novos significados e

configurações para essa ação, o que, ao nosso ver, só é possível a partir dos

investimentos em uma formação reflexiva do cotidiano desses professores, que, ao

fazerem, refletem para novamente fazer de uma outra forma, num exercício de

pesquisa interminável, que é inerente à Educação.

Nesse sentido, somos tentados a indicar que a figura do professor de

Educação Especial inserido na escola comum, que tem aparecido de forma geral

como a figura do docente integrador, carrega ainda em seu papel a restrição de sua

incumbência à entrada de métodos e recursos da Educação Especial para o ensino

comum, por meio de aconselhamento e de ajustes curriculares que facilitem o ensino

do aluno incluído, o que, entendemos, pode e deve ser otimizado com ações de

parceria com esse professor em sala de aula comum; como apresentamos nesta

dissertação, essas ações podem se caracterizar como ensino colaborativo, sendo

este um caminho de associar a experimentação do professor da sala comum ao

processo de sua reflexão partilhada com o professor de AEE, que, ao levar o

professor da sala comum à reflexão de sua prática, também reflete e reconstrói a

sua, neste novo contexto e cotidiano da escola regular; constrói, assim, uma nova

identidade que o tira do lugar do especialista que, segundo uma visão médica,

prescreve e determina possibilidades e limites, e se instala no lugar de quem, ao

exercer o seu saber especializado, de “estrangeiro” na sala de aula, pode observar o

oculto e contribuir com o evidente a partir do fazer a quatro mãos na tão sonhada

prática inclusiva.

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As conquistas no campo da educação inclusiva são indiscutíveis e marcam

um ponto de inflexão entre a abertura das escolas aos alunos com deficiência e

transtornos globais do desenvolvimento e o profundo trabalho de reflexão que cabe

a cada instituição realizar nos reposicionamentos e considerações institucionais que

cabem no seu Projeto Político Pedagógico ao considerarem a inclusão enquanto um

valor para a sociedade, e não há lei ou professor integrador que substitua seus

efeitos.

Seria necessário, portanto, que este trabalho, em continuidade, pudesse

explorar as ações em que a escola, que exerce uma influência inestimável sobre a

sociedade, se debruçasse sobre o seu fazer para a instalação de uma cultura

inclusiva que, de fato, envolva todos os seus segmentos na discussão de que

sociedade queremos, e que ultrapasse os muros da escola, quebrando paradigmas

que ainda não naturalizaram a inclusão em nosso meio e entre nós.

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- 198 -

APÊNDICES

Apêndice A - ROTEIRO PARA A AENTREVISTA COM PROFESSORES DO

ENSINO REGULAR ( EDUCAÇÃO INFANTIL E SÉRIES INICIAS DO ENSINO

FUNDAMENTAL)

a) Qual é a sua formação acadêmica?

b) Quanto tempo atua na rede de educação do Município de São Bernardo do

Campo?

c) Quanto tempo atua nesta escola da rede educacional de SBC?

d) Você está neste ano com inclusão de alunos com deficiência intelectual ou

transtornos globais do desenvolvimento?

e) Conte-me como foi a chegada e o trabalho com este aluno que está incluído na

sua sala de aula?

f) O que modificou na sua prática pedagógica?

g) O que modificou na dinêmica com o grupo classe?

Apêndice B - ROTEIRO PARA A ENTREVISTA COM PROFESSORES DE AEE

– (ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO )

a) da Qual é a sua formação acadêmica?

b) Qual é a sua formação acadêmica?

c) Quanto tempo atua na rede de educação do Município de São Bernardo do

Campo?

d) Quanto tempo atua nesta escola da rede educacional de SBC?

e) Ao solicitarmos que você escolhesse uma professora para participar desta

pesquisa oferecendo-lhe os indicativos de que fosse uma professora com boa

prática pedagógica na inclusão, você nos indicou esta professora. Conte-me

os motivos que te levaram a escolher esta professora da sala comum para

compor esta pesquisa?

f) Como tem sido a sua parceria com a professora da sala de aula que tem este

aluno incluído?

g) Você percebe mudanças na prática do professor depois entrada do aluno na

sala de aula dele?

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Apêndice C - ENTREVISTA COM A PROFª C. (ENSINO FUNDAMENTAL I)

COM A INCLUSÃO DE UM ALUNO COM TRANSTORNO GLOBAL DO

DESENVOLVIMENTO

Caracterização do professor

Graduado em Ciências Biológicas e Pedagogia e cursando a Pós Graduação

em Educação Inclusiva. Está na rede municipal há 3 anos e meio e nesta escola

desde o início do ano. Tem experiência com a docência na rede estadual há 19

anos, no Ensino Fundamental II e Médio como professora de Ciências/ Biologia, mas

nunca trabalhou com ensino fundamental I. Neste ano recebeu um aluno desde o

início do ano letivo com diagnóstico de Síndrome de Asperger ( autismo de bom

funcionamento)

Impressões da pesquisadora durante a entrevista

Fui recebida pela coordenadora e professora de AEE da escola na sala da

coordenação que trouxeram a professora indicada para a entrevista.

A professora é jovem e bastante simpática, muito sorridente e após ser

esclarecida sobre a pesquisa interessou-se em participar, assinado o termo de

autorização. Esta entrevista foi gravada em áudio e posteriormente escrita a partir

da audição do gravador.

Registro da entrevista

A professora inicia contando o seu processo de entrada na rede , que é

recente dizendo: ”Cheguei na rede municipal com muitas dúvidas sobre o trabalho,

não só por ser uma outra rede, mas principalmente por não ter experiência com os

pequenos, estou acostumada com os grandes do Fundamental II ou Ensino Médio.

Vim para esta escola pela remoção no último ano e como sou ansiosa vim conhecer

a escola antes do início das aulas e me apresentar ao coordenador,(era outra na

época) vim dizer da minha situação porque tinha uma grande preocupação em não

dar conta dos pequenos.

A coordenação me tranquilizou e me passou algumas informações como era

a sala que eu iria pegar neste ano, número de alunos na classe, situação dos alunos

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na escrita, quantos eram alfabéticos e tudo mais. Vi que a sala tinha um número

reduzido de alunos e perguntei se tinha algum aluno incluído. Ela me respondeu que

a classe tinha um aluno com Síndrome de Asperger. Eu não sabia o que era isso,

perguntei se ele era agressivo e ela me disse que não e que aprendia rápido .

Cheguei em casa e como boa internauta que sou, fui direto para a internet .

Achei algumas informações e fiquei receosa com o que li. Mas segui em frente e

então no primeiro dia de aula, deixei as crianças livres para escolherem onde se

sentarem e logo percebi quem era o Gustavo ( nome fictício para preservar a

identidade do aluno) porque buscou o fundo da sala de aula e ficou isolado dos

demais. Logo intervi chamando- o para frente perto de mim.

No início tínhamos uma estagiária que ficava com ele e já o conhecia, tinha

estado no ano anterior com ele, me passou algumas informações sobre ele, porque

já o conhecia bem e questionou porque iria ficar lá na frente se sempre ficou no

fundo da sala já que atrapalha os colegas. Tive uma experiência na outra escola que

estive antes desta com estagiária que ficava muito grudada com o aluno incluído,

que quando me dei conta no final do ano, não sabia dizer sobre o aluno, só tinha as

informações que a estagiária me passava. Percebi que tinha falhado, porque eu

precisava saber de todos os alunos , inclusive deste.

Falando do Gustavo tudo para ele são os números, fazia só as atividades com

números, as com letras dizia não sei e nem tentava, já empurrava a atividade para

longe. Quando eu insistia ele fazia uns movimentos estranhos e batia com a cabeça.

Mas isso não me amedrontava, porque eu entendia isso como uma teimosia e tenho

para mim que se o aluno é teimoso a professora precisa ser mais teimosa ainda, e

eu insistia e dizia para ele, se você não sabe, vai aprender é pra isso que está na

escola.

Voltando um pouquinho, esqueci de falar da reunião de Pais que foi anterior o

início das aulas, antes de conhecer o Gustavo. A mãe me apresentou o Gustavo

assim: é inteligentíssimo, mas não entende brincadeiras/ piadas, só entende

comandas diretas e claras e não esboça nenhum tipo de sentimento. Fiquei muito

apreensiva porque não podia imaginar o que me esperava com um aluno que não

esboça sentimentos, mas pensei sou professora há tanto tempo, será que eu não

vou dar conta deste moleque?

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Quando o conheci vi que o que era mesmo é teimoso, então conversei com

ele explicando que todos os alunos não sabiam coisas assim como ele, mas que

precisava aprender e que eu estava ali para ajudá-lo, acho que para quem visse de

fora parecia que eu era doida falando com ele desta forma. Pensava comigo mesma,

será que tô fazendo certo? Trocando ideia com o menino, não sei quem era mais

problema ali.

Fui montando grupinhos para que ele percebesse que nem todos sabiam e

ele foi vendo que podia não saber.

Trabalhei com letras móveis/jogos mas ainda resistia muito com as letras.

Procurando atividade para os alunos na internet, achei uma atividade que associava

os números às letras, quer dizer os resultados das situações numéricas eram dados

em letras que juntas formavam palavras. E logo pensei que isso poderia funcionar

com o Gustavo e seria bom para todos os alunos. Segundo a S. (professora de AEE

que acompanha em sala de aula regular ) a grande sacada foi eu ter encontrado

esta atividade, porque o Gustavo sempre ia para o Conselho de Classe como o

aluno que não sabia ler e escrever , mas com esta atividade pude observar que ele

sabia, porque leu de pronto a palavra estrela, que é uma palavra difícil porque tem

es, o tre.

Fui percebendo que ele foi quebrando esta resistência , eu ia falando você

sabe. Eu tenho alunos com maiores dificuldades que ele e ele se irritava quando as

crianças não acertavam e dizia seu burro. O trabalho então ganhou outro foco,

trabalhar as diferenças com ele. Hoje o Gustavo faz atividade igual a das outras

crianças, hoje percebe que as atividades de matemática que fazia de cabeça, hoje

precisa de mais atenção, hoje trabalho com letra cursiva igual aos outros e quando

não sabe uma letra eu falo que ele precisa fazer e ele faz”. A professora ri muito

neste momento e comenta. “Hoje eu rio , mas me deixava preocupada”.

“Gustavo é metódico, não abre possibilidades, fixa regras. Então pensei que o

silabário , que é bem metódico, poderia ajudar, mesmo sendo proibido seu uso na

rede. Dei o silabário para ele e ele decorou tudo tão rápido que quando pedia a letra

b , repetia automaticamente todas as silabas ba, be bi, bo, bu. Fiquei preocupada e

pedi ajuda da professora do AEE e ela me orientou a alternar o uso e só dar a ele

quando pedisse. Hoje não usa mais o silabário e nem o pede.

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Diz a S. que o Gustavo aprendeu porque eu insisti muito, mas eu penso que o

que professor precisa esperar é que todos os alunos aprendam o mínimo necessário

para aquele ano e se você não teima , ele ( o aluno) não vai.

Na informática foi muito interessante, a parceria com a professora de AEE,

porque eu achava que ele tinha problema motor, porque eles tem um jeito meio

desengonçado de andar, é um andar diferente e a S. me perguntou: Se ele não

tivesse coordenação motora como desenvolvia com tanta agilidade e perfeição as

atividades do Paint na informática? Isto me fez refletir sobre as possibilidades e

limitações que eu enxergava nele.

Hoje o desafio com ele é que ele volte nas histórias , faça a reescrita. Todo

mundo tá fazendo a reescrita coletiva, ele fica sempre na mesma frase, sem se

importar se ela está no momento certo de ser dita e repete sempre a mesma. A

reescrita individual ele não quer fazer, precisa que eu dê pistas, qual era a história,

quem são os personagens, mas não vejo problemas com isso.

As atividades de Língua Portuguesa precisam ser feitas no começo da aula, se

deixar para o final ele não faz. No início do ano até os desenhos ele não fazia.

Preciso fazer ele entender o tempo todo que ele é capaz.

Com relação a parceria com a professora de AEE, penso que é uma pessoa

externa que dá dicas para a gente. A gente fica se perguntando até onde você tá

fazendo o certo ou tá sendo um problema para a criança . A dica mais valiosa da S.

foi pensar em uma estratégia que utilizasse o que ele sabia, e ele sabia gravar as

coisas, então pensei no silabário. Não foi só o silabário que o ajudou, nem só as

letras móveis. Foi um conjunto de coisas.

Em outro momento, ele começou a se fazer de louco, mexia os braços mole

e virava os olhos e as crianças corriam de medo dele e ele ia pra cima, corri pra S. e

agora o que eu faço? Ela me deu umas dicas, e disse por que você não transforma

esta loucura dele em uma brincadeira com toda a classe? Por que eu não tinha

pensado nisso? Então propus para a sala, não só o Gustavo é louco hoje, mas todo

mundo vai poder ser louco hoje e isso diluiu este comportamento do Gustavo.

Na quadra repete sempre a mesma ação de jogar a bola no cesto ele resiste

em fazer outra coisa, no início era agressivo com as crianças quando chutavam a

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bola no gol e ele queria que jogasse no cesto, porque para ele bola é só no cesto.

Me falaram que no ano passado ele era muito agressivo com os alunos, batia e tudo

mais, mas eu encarei da seguinte forma esta agressividade, eu pergunto para ele

por que você fez isso? Ele responde porque chutou a bola e ela era para ir no cesto.

Então explico que pode se jogar de diferentes formas e pode ser de chutar também.

Falo com ele em tom de igualdade e isso tem ajudado. Faço isso porque penso que

criança é tudo igual, e ele não vai ser diferente, assim tem coisa que é preciso

adaptar, mas nem tudo e você vê que tem resultado.

Me lembro que quando dei aula no 7º ano eu tive um aluno com uma

deficiência muito grave motora, não tinha condições de usar as mãos e andava de

cadeira de rodas, mas era muito inteligente, ele tinha uma única menina que

também tinha um irmão com problema que o ajudava na escola, só ela, e isso

causava algumas queixas da mãe dizendo que ela estava prejudicando o seu

rendimento , porque ficava sobrecarregada de fazer a lição dela, a agenda de

tarefas do menino, levar ele pra lá e pra cá pela escola. Tive uma ideia boba, quer

dizer a gente ás vezes tem uma ideia tão boba, tão simples que funciona e resolve o

problema. Foi uma ideia boba , mas ninguém tinha pensado nisso, conversei com a

sala e perguntei a eles que outros alunos poderiam ajudar? A sala se prontificou

com muitos alunos, então montamos uma planilha que eles registravam quem tinha

sido o aluno que o pegara no transporte na entrada, outro tinha levado ao recreio,

outro no lanche, outro montava a agenda de tarefas para ele. No fim todo mundo

ajudava, não ficou pesado para ninguém, eles mesmos faziam um rodízio das

tarefas olhando para planilha. No final do ano precisei até dar bronca neste garoto

especial, porque estava bagunçando como os outros, uma bronca boa, porque

demonstrava que estava interagindo com todos.

Como ele não escrevia e era muita matéria para gravar tudo na cabeça, eu

digitava tudo em casa e mandava por email para que a mãe pudesse ler para ele e

fazer as tarefas com ele, mas isso dava muito trabalho, então comecei a levar o pen

drive para sala de aula e na medida que ia falando para os alunos os conteúdos da

aula eu já ia digitando para ele e passava no pen drive. Isto para mim era uma ideia

boba, uma besteirinha, mas fez a diferença para ele. Não sei como ele está hoje, a

sequência dos fatos, mas naquele momento fez a diferença.

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Entendo que a aprendizagem do aluno, a aquisição de conhecimento passa

pelo vínculo com o professor, no começo foi muito difícil porque ele tinha

dificuldades com as frustrações e parecia não querer aprender, ter desistido de si

próprio. Para mim um desafio, por conta dele, fui até fazer a pós graduação em

educação inclusiva, estou fazendo ainda e me surpreendo a quanto tempo já existe

a legalidade da inclusão, quer dizer a quanto tempo a inclusão está dada e quanto

ainda não avançamos com estes alunos na escola.

Não sei nada ainda, porque a pós é só um pontapé, serve só para que a

gente tenha desejo de querer saber mais sobre as síndromes. Eu estou fazendo o

mínimo que deve ser feito por este aluno na minha função de professora. Acho que

a socialização é o ponto crucial da inclusão, porque sem isso nada acontece. E claro

muita teimosia do professor. Aprendi isso com a minha mãe que dizia se você quer

alguma coisa, filha, tem que teimar e é isso que ensino para minhas filhas também.

Quando elas tem problemas e pensam em desistir eu me apresso em lhes dizer que

se querem mesmo aquilo precisam teimar, ser mais insistente que as circunstâncias

e tem dado certo” . A professora chora neste momento da entrevista demonstrando

emoção e diz “ se você acredita , teima, se alguém me provar que não vale a pena

insistir ai eu desisto , senão eu vou teimar até conseguir.

Quando minhas filhas chegavam em casa reclamando do professor, eu dizia a

elas que não aceitava isso e que se o professor pediu um trabalho difícil para elas é

porque acredita que elas vão dar conta e então sempre digo para elas que devem

fazer o melhor que puderem . A gente que é professor sabe o quanto pode cobrar

dos seus alunos, a gente sabe os alunos que de fato tem dificuldades para

compreender , para avançar em alguns conteúdos e para esse tirar a média em nota

é ótimo , mas para aquele que pode avançar mais que a média, para estes a média

é pouco, assim o professor precisa conhecer os seus alunos e cobrar deles o melhor

que puderem dar.

A luta agora com o Gustavo é com a mãe, porque a mãe diz que ele só faz a

lição na escola, não quer fazer em casa com ela. Então orientei que mãe é mãe, vó

é vó e professor é professor, assim tenho conversado muito com ele sobre a lição de

casa na classe. A mãe disse que tem medo que eu dê bronca nele por causa da

lição e ele fique com raiva de mim, eu disse a ela, pode deixar eu me garanto.

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Mando pesquisa para ele fazer em casa, já que gosta tanto do computador para que

ele apresente na roda de conversa, mas não volta. Mesmo quando é uma conversa,

sobre algum assunto com a família, não volta, nenhuma lição volta. Ai a mãe fica

repassando a culpa para o pai que não ajuda. Vou encerrar dizendo que reforço a

ideia de que os muitos avanços que o Gustavo teve neste ano não são apenas pelo

trabalho que eu fiz, mas pelas parcerias com o professor de AEE que em nenhum

momento teve o nariz empinado, com a postura de achar que sabia mais,

desprezando o saber do professor que está todos os dias com o aluno, da gestão da

escola que confiou no meu trabalho, mesmo sabendo que não tinha experiência e

que podia dar errado, mas acreditou que ia conseguir. Divido o sucesso com o aluno

[incluído com os muitos parcerios nesta caminhada ( professora de AEE, gestão da

escola). Inclusão para mim é um trabalho de muitas mãos.”

Apêndice D - ENTREVISTA COM A PROFª S. (PROFESSORA DE AEE QUE

INDICOU A PROFESSORA C. PARA ESTA ENTREVISTA E QUE ACOMPANHA A

INCLUSÃO DO ALUNO COM TRANSTORNO GLOBAL DO DESENVOLVIMENTO

NO ENSINO COLABORATIVO NA ESCOLA)

Caracterização-

A professora de AEE é formada em Pedagogia com habilitação em

deficiência mental e está cursando a pós graduação sistematizada pelo MEC -

Atendimento Educacional Especializado – Educação Inclusiva

Está na rede pública como professora da educação especial há 24 anos, e

nesta escola desde o inicio do ano.

Registro da entrevista

Ao ser questionada os motivos que a levaram escolher a professora C. como

uma professora com boa prática inclusiva responde:

“ A diferença que vejo na professora C. é que ela é uma professora

consciente da sua tarefa que é a de aprender sempre. A gente quando procura um

dentista para tratar os dentes não aceita mais um dentista que usa boticão, ou um

médico que dá um diagnóstico sem os exames, porque eles se atualizaram, nós

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procuramos os melhores, os mais envolvidos, os mais estudados, os feras na sua

área. Na educação a gente deveria seguir a mesma lógica, a tarefa do professor é

ensinar porque tem gente que precisa aprender. O aluno não tem que aprender? Eu

( professora) não tenho que ensinar? Então eu preciso dar conta disso e corro atrás

do que me falta para isso. O foco da C. com este aluno foi muito bom, não ficou

presa ao diagnóstico, sabia do diagnóstico, pesquisou, mas não ficou presa, sabia

que cada aluno é um aluno. Hoje até esquece que ele tem a síndrome. Ele fala,

brinca, passa desapercebido na turma, é feliz na escola. O que me chama atenção

no trabalho da C. é a vontade dela, ela não desistiu dele. Ela tem uma coisa muito

importante solidariedade humana, é solidária a ele, tem uma emoção que é singular

isto é que impulsiona o trabalho da gente, a gente esquece o cansaço, a falta de

recursos, os problemas todos. Se nesta escola eu posso contar com apoios ótimo,

senão vou ter que me virar assim mesmo. A mudança está na atitude que é uma

atitude de reflexão não só na profissão, mas na vida. A questão é qual é o seu

posicionamento na vida. Você vê que o que ela faz na sua vida, e o que ela faz na

profissão. Eu digo para C. que ela fez uma tatuagem na vida do Gustavo e ela me

diz que ele é que fez uma tatuagem na vida dela , é isso que acho que é inclusão. A

questão da inclusão é essa, como o professor encara os desafios na sua vida é

como ele vai encarar na inclusão deste aluno diferente em sua sala de aula.”

Apêndice E- ENTREVISTA COM A PROFª D. (EDUCAÇÃO INFANTIL) COM A

INCLUSÃO DE UM ALUNO COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL

Caracterização

Formação em Pedagogia

Está na rede municipal de SBC há 15 anos e nesta escola há 9 anos, , é

professora aposentada do Estado.

Neste ano está com uma aluna diagnosticada com Síndrome de Down que

tem por consequência o déficit intelectual

Impressões da pesquisadora durante a entrevista

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Fui recebida pela coordenação e professora de AEE que me encaminharam

para a professora D, que após ser esclarecida dos objetivos e propostas desta

entrevista, concordou em participar e assinou o termo de autorização.

A professora se sentiu incomodada com a gravação em áudio e solicitou que

apenas registrasse de forma escrita os dados relatados. È uma professora mais

reservada , fala pouco é direta em suas respostas.

Registro da entrevista

“ Peguei esta inclusão desde o começo do ano e peguei porque escolhi ter

inclusão, gosto de trabalhar com eles, já tive outras inclusões na classe em outros

anos.

No começo do ano me ocupei de conhecer o que ela sabia fazer, apesar das

limitações motoras e cognitivas que apresentava. Depois fui pensando o que é que

eu podia propor para ela e para os outros, a mesma atividade, já que estar na escola

imlica em aprender algo, foquei na mesma atividade para todos. Não acho certo

deixar a criança fazendo outra coisa que não seja a atividade da sala. Então

propunha a mesma atividade e deixava que ela me mostrasse como podia

desenvolver a atividade. Ela mesma é quem foi me dando pistas do que necessitava

para desenvolver a mesma atividade. Para mim o diagnóstico não importa , eu não

quero nem saber dele, porque eu preciso é levantar o que a criança precisa para

avançar e fazer o que ela precisa, o diagnóstico não me ajuda nisso, eu deixo o

diagnóstico para os especialistas.

Eu me preocupo com todos da sala de aula, gosto de ver todos avançarem,

cada um no seu ritmo e do seu jeito. Gosto de ver toda criança evoluir, eu me

preocupo com todos da sala de aula, gosto de ver todos avançarem, cada um em

seu ritmo e do seu jeito. As vezes a escola não tem o recurso ou a gente cansa de

esperar o que solicitou, então eu vou atrás, porque isso me dá prazer ver todos

evoluírem e sei que todos podem .

Penso sempre em atividades que a Glaucia ( nome fictício para preservar a

identidade da aluna) possa participar com o grupo e vou atrás destas atividades.

Não acho que faço nada mais do que é minha obrigação de professora, porque

quero que todos evoluam, inclusive ela”.

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Apêndide F - ENTREVISTA COM A PROFª S. (PROFESSORA DE AEE QUE

INDICOU A PROFESSORA D. PARA ESTA ENTREVISTA E QUE ACOMPANHA A

INCLUSÃO DA ALUNA COM SÍNDROME DE DOWN NO ENSINO

COLABORATIVO NA ESCOLA)

Caracterização-

A professora de AEE é formada em Pedagogia com habilitação em

deficiência mental e está cursando a pós graduação sistematizada pelo MEC -

Atendimento Educacional Especializado – Educação Inclusiva

Está na rede pública como professora da educação especial há 24 anos, e

nesta escola desde o inicio do ano.

Registro da entrevista

Ao ser questionada os motivos que a levaram escolher a professora C. como

uma professora com boa prática inclusiva responde:

“A Prof.D. dá uma aula que é uma delícia. Ela prepara materiais muito

atrativos para todas as crianças, e que são necessários para Glaúcia. Acho que a

diferença está ai, o material que ela prepara, a historia que ela conta precisa ser

desta forma para a Glaúcia e para os outros não precisa, mas é legal, é mais

gostoso e por isso mesmo leva a aprendizagem. Na verdade a Profª. D. tem uma

boa prática com qualquer criança, senta no chão com eles, brinca junto e conhece

as crianças com particularidades.

É muito fácil com a D. , é só a gente pensar em alguma coisa e ela já tá

fazendo , tá modificando, tá experimentando. Esta disponibilidade para o trabalho é

uma marca dela aqui na escola”.

Apêndice G - ENTREVISTA COM A PROFª B. (SÉRIES INICIAIS DO ENSINO

FUDNAMENTAL) COM A INCLUSÃO DE UM ALUNO COM DEFICIÊNCIA

INTELECTUAL

Caracterização-

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Formação acadêmica em Pedagogia e com pós- graduação em educação

especial Atua na rede municipal há 13 anos e neste escola há 3 anos.

Neste ano está com uma aluna diagnosticada com Síndrome de Down que

tem por consequência o déficit intelectual

Impressões da pesquisadora durante a entrevista

Fui recebida pela coordenação e professora de AEE que me encaminharam

para a professora B, que após ser esclarecida dos objetivos e propostas desta

entrevista, concordou em participar e assinou o termo de autorização. È bastante

simpática e acessível, fala bastante e é muito sorridente.

Esta entrevista foi gravada em áudio e despois escrita para esta dissertação.

Registro da entrevista

“Pensando no trabalho pedagógico a inclusão modificou bastante o meu,

porque eu quero pensar um trabalho para ela porque precisa estar inserida, as

atividades precisam estar adaptadas para ela. Não aceito esta coisa de atividade

diferente para ela , ela vai fazer o que todos estão fazendo , mas dentro das

condições dela.

Para a turma é um ganho imenso, porque ela se torna mais solidária, respeita

os tempos diferentes, a turma é mais atenta aos detalhes de cada um, depois desta

experiência de inclusão. A minha prática modificou muito, como estou no 5º ano eu

passava o cabeçalho na lousa com letra de mão e os alunos copiavam , mas a

Bruna ( nome fictício para preservar a identidade da aluna) não fazia, se esforçava

mas não fazia. Aí um dia tive uma sacada, percebi que quando tivemos uma

atividade de cartinha, apesar de saber algumas letras bastão, não fazia, queria fazer

com letra de mão que ela não sabe fazer, não está alfabetizada. Me dei conta que

ela tentava imitar o que eu escrevia na lousa com letra de mão, então pensei por

que o cabeçalho precisa ser de letra de mão , ele pode ser em letra bastão para

todos, isso não fará a menor diferença para os demais, mas fará muita diferença

para ela. Inclusão é assim , não tem nada pronto, a gente vai construindo. É um

processo até a gente conseguir que o aluno faça as atividades tanto quanto os

demais, a gente vai por ensaio e erro.

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Mas a professora do AEE ajuda muito , porque a gente no olho do furacão ,

não consegue ver o miudinho. Os outros apoios também ajudam, eu por exemplo

tenho uma auxiliar que é meu braço direito, ela me ajuda demais, mas foi

necessário que o trio gestor bancasse junto com a gente, porque tem uma ordem da

secretaria que a auxiliar de ensino, não pode ajudar em sala de aula, só na

locomoção , higiene e alimentação e as vezes não é isso que a agente precisa.

É possível , dá certo, é muito trabalhoso, porque eu planejo por exemplo um

texto de crônicas, ai no HTPC a gente ( eu e a professora de AEE) senta junta para

pensar como adaptar esta mesma atividade para Bruna, tipo de letra , número de

questões sobre a crônica, tamanho do texto etc. Ai eu tenho um segundo olhar,

planejo de novo e até mudo o que tinha pensando para todos e fica até melhor.

Eu escolhi estar com Bruna , desde o início do ano , eu pedi, já tive muitas

inclusões e muito diferentes umas das outras , eu gosto, eu pedi , eu escolhi.

Tenho uma enorme preocupação em não reduzir as possibilidades de

aprendizagem da Bruna com as adaptações que fazemos nas atividades, pois

pressupor, por exemplo, que ela não dá conta de fazer algo proposto e lhe oferecer

menos pode significar subestimar a sua capacidade de aprender e a minha de

ensinar. Por isso, por ex., com o cabeçalho, pensamos, se ela não consegue fazer,

podemos trazer o cabeçalho digitado e ela cola no caderno, seria uma possibilidade,

porém, a gente não estaria oferecendo a ela o aprendizado de procedimento;

procedimento também é aprendizado na escola, a gente não estaria resolvendo o

problema, estaria substituindo o problema, porque hoje seria o cabeçalho, e amanhã

o que seria? Se por acaso o aluno não sabe como usar o caderno (isto é tarefa da

escola ensinar), eu dou atividade na folha para este aluno que não sabe usar o

caderno, pois a folha ele sabe usar, que mensagem estou lhe passando, que ele não

é capaz de aprender e tampouco eu de lhe ensinar. Somos dois incompetentes.

O desafio agora na escola é que todo mundo ( as outros professores e

funcionários) parem de olhar para ela como tadinha, tratam ela como criança e eu e

a professora do AEE somos as bruxas, porque a gente chama atenção mesmo do

pessoal e diz para o pessoal se fizer diferente para ela vai ter que fazer com todo

mundo, porque todos são crianças também querem dengo, carinho, abraço etc.

Acho que isso é histórico, porque todo mundo tem dó, tenho fé que estes alunos,

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futuros cidadãos vão compreender que ser diferente não é ser coitado , não tem

nada de coitadinha. Outro dia atrasamos com o lanche por conta de uma atividade

diferenciada que realizamos na escola e ela começou a reclamar que estava com

fome e pediu para a aprofessora deixa-la comer. Eu não deixei e pedi que

aguardasse todos os colegas para irmos juntos, mas as professoras da escola que

estavam fazendo a parceria nesta atividade diferenciada mostraram-se contrárias a

esta ação, pois entendem que como ela é diferente, não tem a condição de

compreender o atraso e portanto deveria ter deixado que ela fosse antes dos

colegas. Isto causou discussão sobre porque ela poderia e os outros não, se a fome

não era só dela mas de todos que tinham também perdido o horário de lanche?

Em função disso eu trabalhei com a classe um texto sobre a diversidade, não

sobre deficiência, sobre a diversidade, falamos da diferença da Bruna, porque ela é

muito diferente deles, mas falamos de quem é gordinho, de quem usa óculos, de

quem é muito alto e tantas outras diferenças, ser diferente é normal, somos

diferentes de maneiras diferentes.

A função da escola é mostrar que eu posso ser diferente, e ter a possibilidade

de ter uma criança de inclusão na sala ajuda muito eles a entenderem isso.

Acho uma conquista com a turma, quando eu divido em grupinhos que eles

podem escolher os parceiros sempre tem aqueles que pedem para ficar com a

Bruna eu não preciso nem mandar, as vezes sai até briga e não é aquilo de querer

ficar para fazer por ela, eles sabem que ela não vai fazer igual a eles , mas eles dão

oportunidade dela se expressar, mostrar o que pode fazer. Se eles estão resolvendo

um problema e ela tá resolvendo um mais fácil, eles respeitam quando ela vai na

lousa para socializar os resultados, ninguém tira barato, zoa ela, eles ajudam

quando tá errado ,explicando como tinha que ser, eles são parceirão dela.

Eu tenho para mim que estamos formando pessoas diferentes do que fomos

formados, é nisso que eu acredito.

Eu peguei uma inclusão nesta rede em 2003, a minha primeira inclusão, eu

não sabia nem o que fazer, foi muito difícil e decidi buscar formação, pensei comigo,

já que tenho este aluno, vou atrás de saber o que tenho que fazer lá na pós, mas me

dei conta que cada aluno é um aluno, já tive diferentes inclusões deficiente mental,

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visual. Mas meu maior desafio é o aluno com paralisia cerebral que é inteligente,

este eu tive no Infantil, porque eu não me conformava de não conseguir adaptar um

circuito motor para ele participar junto com o grupo. Deixei as gestoras doidas, dizia

em toda a reunião que precisava de material diferente para ele , até que consegui

montar um circuito sensorial, em outubro , mas tudo bem, foi antes de acabar o ano,

e o que vi é que todas as crianças aproveitaram muito e adoraram as atividades e

que se não tivesse tido ele eu não teria tido esta ideia, porque por onde eu ia ,

pensava nele, e dizia para as gestoras, que chegaram até a sugerir que não

houvesse mais circuito para ninguém, porque eu dizia que se ele não podia

participar eu não ia levar nenhum deles. Eu agitava os HTPCS e dizia sem parar, a

gente tem que encontrar um jeito que ele possa participar e a gente encontrou. Esse

dia foi uma alegrai para mim e para ele. È nisso que eu acredito que o aluno incluído

precisa participar das atividades da escola, senão nada feito , estamos brincando de

incluir”.

Apêndide H - ENTREVISTA COM A PROFª A. (PROFESSORA DE AEE QUE

INDICOU A PROFESSORA D. PARA ESTA ENTREVISTA E QUE ACOMPANHA A

INCLUSÃO DA ALUNA COM SÍNDROME DE DOWN NO ENSINO

COLABORATIVO NA ESCOLA)

Caracterização-

A professora de AEE é formada em Pedagogia com habilitação em

deficiência mental

Está na rede pública como professora da educação especial há10 anos, e

nesta escola desde o inicio do ano.

Registro da entrevista

Ao ser questionada os motivos que a levaram escolher a professora B. como

uma professora com boa prática inclusiva responde:

“ O que eu acho que conta muito para a inclusão dar certo é o desejo, o

desejo de ter o aluno na sala , que faz a diferença na prática do professor. É o eu

estou disposto, depois disso é que vem as dúvidas, de onde partir? As vezes o que

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vem de outra escola não é referencia para gente , porque a gente recebe o caderno

de um aluno de 3º ou 4ºano do ensino fundamental de inclusão apenas com

atividades diferenciadas com garatujas cheio de estrelinhas e parabéns. Isso não

ajuda , mostra como a escola está pensando a inclusão.

Ter a mesma rotina para todos os alunos e adaptar as atividades as

possibilidades de execução do aluno, isto pra mim é inclusão. Foi assim que

alteramos a letra do cabeçalho, porque de letra de mão ela não dava conta não

reconhecia esta letra como letra.

Outra coisa que eu achei fantástico na experiência da professora B. é a

conquista dos colegas, quando os alunos percebiam a dificuldade dela, quando

percebiam a dificuldade de coordenação viso motora, os alunos iam ajudando. A

aluna dizia eu sou burra, eu não sei fazer e a gente ia desmontando isso com

estímulos positivos, dizendo para ela que ela era capaz, fizemos até um material de

plaquinhas que ela visualizasse todos os dias placas com sentimentos positivos

sobre ela mesma, então tinha: eu sei, eu posso, eu não tenho medo, placa com o

nome dela inteiro para servir de ajuda para a escrita.

Hoje, ela faz todas as atividades da classe de forma adaptada para ela, e

quando a atividade é de escrever como por exemplo um roteiro de um teatro, ela

participa com ideias e outro é o escriba dela, faz a dramatização como todo mundo e

apesar dos gestos mais limitados , é possível que todos entendam o que ela quer

dizer. Este retorno das crianças para ela é muito importante.

Acho que o ganho é para todo mundo, para a turma que aprende a se

socializar com outros diferentes de si, na parte pedagógica porque a gente tem que

pensar mais para encontrar o caminho e o crescimento profissional que é para todos

nós, porque por exemplo nesta semana a gente vai ter a Prova Brasil e a gente fez

um simulado para que as crianças se adaptassem a este formato de prova que a

gente não usa aqui na escola, e pensamos como poderíamos tornar este desafio de

uma prova extensa e difícil possível para Bruna. Mas deixamos para ver o que

acontecia, e ela nos surpreendeu, logo que entregamos as provas ela disse eu

adoro fazer provas , ai eu pensei a limitação é de quem? Porque ela tirou de letra

esta situação, fez o que pode e como pode e quando cansou, disse: cansei, não

vou mais fazer e entregou a prova sem qualquer dificuldade.

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No HTPC formativo de professores a gente tem feito a socialização de

práticas e a gente percebe que o grupo que é sempre tão disperso e entediado

neste momentos de formação, fica atento , em silêncio, e isso pode disparar o

desejo de querer ficar com uma inclusão depois. O que a gente precisa é garantir

espaços para o professor partilhar suas experiências no coletivo e no individual.

Acho que todo mundo precisa saber deste trabalho que é feito pelos

professores , todos os funcionários precisam conhecer na reunião pedagógica, falar

sobre estas crianças ingressantes no ano que vem e que são deficientes , começar a

falar já para despertar o desejo na hora de atribuir a sala, ainda tem muito

preconceito.

Mas é difícil para gente ainda perceber isso, outro dia atrasou o lanche por

conta de uma atividade diferenciada na escola e ela começou a reclamar que estava

com fome e pediu para a professora deixar ela descer para comer, ela não deixou ,

mas os outros professores ficaram com dó , dizendo ela é diferente , não entende,

até eu quando me falaram a minha primeira reação foi deixar , mas logo a professora

de AEE me alertou que é uma aluna da escola e todos estão com fome., entaõ se

ela pode os outros podem também?

Este novo formato de trabalho para o professor de AEE é um complicador

para a parceria com a professora da sala regular, já que estamos mais para turista, a

gente não tem como vivenciar a rotina todo o tempo, acaba ficando fixa em um dia

da semana, sempre o mesmo dia, que a agente pega as mesmas atividades da

turma. Acho que esta parceria com a professora de AEE precisa de muita

humildade, porque aquilo que parece pouco para a gente foi uma luta para o aluno.

Para a Bruna o desafio agora está em ela fazer a tarefa de casa, porque todos os

alunos levam a tarefa e ela leva, mas não faz., porém a tarefa tem intenção

pedagógica, colocar ela no lugar de aluna e a família precisa ser parceira nisso. Ela

começou levando como tarefa adiantar o cabeçalho em casa, no começo trazia só

um pouquinho feito, agora tá trazendo completo, então a gente amplia para mais

alguma coisa.

Eu vejo que a inclusão qualifica muito o planejamento do professor, ela

organiza algumas coisas que o professor , a gente não faria, por exemplo o lúdico no

fundamental, que ele acaba ficando para o se der tempo. Mas para o aluno incluído

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naõ pode ser se dé tempo, porque esta é a atividade para ele, porque para ele só

faz sentido se for no lúdico e ai a gente vê as outros crianças com seus papeis

desesperadas para brincar também com aquele material, olhando , quase pedindo

para aquilo também. A inclusão possibilita retomar atividades do infantil as rodas de

conversa , de historia, de musica, a fantasia, a contação de historia que oi

fundamental não faz mais, faz historia de deleite.

O que está nos afligindo agora é pensar no ano que vem , porque pela idade

ela sai da escola e vai para o Estado, mas ela tá quase lá na alfabetização e

receamos que ela indo para o Estado que tem menos estrutura ela possa travar ,

mas é uma decisão muito difícil reter e ai ela não segue com o seu grupo ou

promover , correndo estes riscos.

Bem em resumo penso que para que de fato aconteça uma mudança de

pratica do professor com a inclusão é necessário o desejo, que o grupo da classe

possa ter ganhos com esta inclusão, ganhos de valores e para isso é preciso que o

professor seja modelo, o jeito que fala com o aluno, como age , são modelos para as

crianças em formação, o que a gente vê por ai são discursos ótimos , mas práticas

muito ruins.

Apêndice I - ENTREVISTA COM A PROFª J. (SÉRIES INICIAIS DO ENSINO

FUNDAMENTAL) COM A INCLUSÃO DE DOIS ALUNOS: UM ALUNO COM

DEFICIÊNCIA INTELECTUAL E OUTRO COM TRASNTORNO GLOBAL DO

DESENVOLVIMENTO- AUTISMO

Caracterização-

Formação Pedagogia com pós graduação em Psicopedagogia e Arteterapia

Na rede desde 2005 Nesta escola desde o início do ano. Todos os anos teve

inclusão em suas classes, mas nenhuma a desafiou tanto quanto Douglas ( nome

fictício para preservar a identidade do aluno)

Impressões da pesquisadora durante a entrevista

Fui recebida pela professora de AEE que me encaminhou para a professora

J, que após ser esclarecida dos objetivos e propostas desta entrevista, concordou

em participar e assinou o termo de autorização. È bastante simpática e acessível,

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fala bastante e tem como característica ser bastante direta, as vezes de forma

brusca, parecendo brava com a situação.

Se incomodou com a gravação e portanto não foi utilizado o recurso do áudio,

somente o registro escrito durante a entrevista

Registro da entrevista

“ Inclusão para mim é a liberdade de ir e vir como outra pessoa qualquer . O

problema não são os alunos incluídos o problema é a rede de ensino que não está

preparada para recebê-los.

Quando recebi o Aroldo( nome fictício para preservar a identidade do aluno)

na sala de aula já tinha informações de quanto ele era simpático e o quanto todos o

amavam na sala e na escola, mas não me disseram que este amor beirava a

superproteção, era chamado por um apelido do seu nome no diminutivo, não era

chamado pelo nome, apelido infantilizado que conquistou com o grupo e com os

funcionários dada a sua simpatia e afetividade com todos sem distinção. Observei

inicialmente , mas logo me cansei disso e comecei a agir, inicialmente com a família.

Em uma primeira conversa com a família observei que não se preocupavam

com a aprendizagem do Aroldo, apenas com a socialização. Era tratado como um

bebezão, e ele é mesmo uma criança gostosa ( obesa na verdade). A preocupação

da família estava com a saída desta escola, protegida até então para uma outra

escola ( do Estado) onde seria visto como super mega especial. Tive uma conversa

com os inspetores sobre o tratamento que ofereciam para ele e não foi uma

conversa fácil, mesmo porque sou nova nesta escola e não tenho muito crédito

ainda. Na classe estabeleci prioridades e por este motivo não é toda hora que eu

tenho lição para ele, nestes momentos ociosos, ele quer chamar a atenção , então

vai para o armário, faz xixi na roupa.

Tudo o que o Aroldo produzia era documentado por foto e este era o portfólio

de atividades dele para a escola e para a família.

Já a minha outra inclusão Douglas é muito diferente do Aroldo. Este sim

apresenta uma deficiência evidente, marcada em seu corpo, seu rosto e

principalmente em seu comportamento. Grande obstáculo para a sociedade pois

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apresenta comportamentos agressivos involuntários, sem noção do que faz e de que

como machuca as pessoas com seus movimentos inesperados de bater a cabeça ou

de jogar o seu corpo sobre as pessoas. Meu objetivo com ele foi mostrar para ele o

que é carinho. Ele puxa o cabelo quando a gente se aproxima para falar com ele e

então precisei mostrar para ele como se relacionar com as pessoas sem puxar o

cabelo, que machuca.

Precisei me ausentar por uns dias, de licença médica e a professora

substituta que ficou com ele não sabia o que fazer, então o isolou do grupo para que

ele não machucasse os demais, sabia que isto não era certo, mas não sabia o que

fazer com ele. Volto de licença e o que encontro? o Douglas excluído da turma,

para ele o objetivo de estar na escola é a socialização e não pedagógico. Resolvi

que não consideraria os registros anteriores e partiria do zero no conhecimento do

Douglas queria eu mesma descobrir coisas sobre ele e não ficar presa no que os

outros me diziam dele. Estabeleci dois focos de trabalho com o Douglas, mantê-lo

sempre ocupado e dá-lhe responsabilidades. Deu certo.

Como é cadeirante e balança muito o seu corpo, as vezes de forma mais

intensa o que faz com que a cadeira de rodas ande com estes movimentos, o mais

comum era manter a cadeira travada, assim não conseguia sair do lugar. Como meu

foco era a responsabilidade e mantê-lo ocupado associado ao fato de que no

contato com a família, levantei dados de que ele ficava solto em casa, livre para ir

onde queria e me perguntei se fica livre em casa porque tem que ficar preso na

escola? Para mim, a escola não pode ser uma prisão, ela precisa é libertar as

pessoas, não prendê-las. Então destravei a cadeira, assim tinha toda a sala para

desbravar e ao mesmo tempo não tinha, porque esbarrava em outros que ocupavam

as carteiras que delimitavam os espaços por onde poderia se mexer. Fui

estabelecendo com ele regras de guardar os lápis no estojo após o uso, colocar

dentro do estojo, andar junto com o grupo, por exemplo. Antecipava tudo para o

Douglas através do canal auditivo, falando com ele e ele vocalizava respondendo se

me entendia. Estabelecemos um diálogo, diálogo que somente eu e ele

entendíamos, mas era um dialogo, ele estava no mundo.

Como estava solto pela sala, mais livre para se balançar e fazer a sua cadeira

andar pelo espaço, ainda que aparentemente sem uma direção planejada, passou a

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não focar mais tanto a sua atenção nos colegas, puxando-lhes o cabelo ou a

camiseta quando passavam por ele, concentrava-se no movimento da cadeira.

Tirei ele de uma grande mesa que tinha, que em nada lhe interessava e

coloquei-o no chão por entender que ele não queria aprender ele queria apenas

viver, mesmo sobre a informação que ele não podia ir para o chão porque comia

tudo que tinha pelo chão. Eu antecipava para ele que ia por ele no chão, mas que

precisava da ajuda dele para não comer o que estava no chão e assim fomos nos

entendendo.

Certo dia quando me aproximei para falar com ele em sua cadeira, me puxou

e teve a intenção clara de me abraçar e isto não tem preço.

Muitas pessoas tem nojo de chegar perto dele, é fato, porque baba, tem uma

aparência estranha, não olha nos olhos da gente, não sabe se cuidar, enfim é

esquisito, mas quando a gente estabelece o vínculo, o afeto, tudo isto é irrelevante.

Descobri alguns sinais que Douglas fazia e passei a utilizá-los para me

comunicar com ele, assim fui percebendo que ele me entendia mais do que eu

poderia supor num primeiro momento. Penso que as outras professoras que

estiveram com o Douglas se preocuparam muito com o pedagógico e se

esqueceram de estabelecer uma relação com ele.

Para classe também foi uma descoberta este novo Douglas, pois não se

parecia com o Douglas que conheciam que só sabia era machucar. Um dia sem que

eu pedisse se aproximaram do Douglas na quadra para ficar perto dele. Nas

atividades de quadra, de corrida ele participa com todos, engatinha muito rápido e é

até mais rápido que alguns na corrida.

Douglas foi bastante excluído na escola não pelos amigos de sua classe,

mas pelos próprios funcionários e este foi meu maior desafio, mas me apeguei ao

afeto que desenvolvi por ele e investi em mostrar como ele havia evoluído. Douglas.

não é mais uma questão profissional acabou virando uma questão pessoal para

mim.

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A mãe foi trazendo a informação de que ele conhecia a rotina de ir para a

escola e quando acordava ficava na a janela para esperar o ônibus que o traz para a

escola, em uma demonstração de que a escola era algo agradável para ele.

Em momento algum eu mudei o planejamento da sala e a inclusão do

Douglas nunca prejudicou os outros 15 alunos da sala que tenho.

Para mim a grande questão da inclusão é a parceria com a família. Para as

crianças que não falam como o Douglas, esta parceria é fundamental porque se ele

não fala como a família vai saber o que acontece na escola?

Nossa diretora diz sempre para mim que ele vive em um mundo que eu não

faço parte porque é uma criança com autismo, mas não é o que percebo, temos

uma relação muito forte. Todas as vezes que eu ia falar com ele, segurava a cabeça

dele para ele me ver e me ouvir, quem via esta cena sem compreender o meu

objetivo podia entender que eu sou uma louca. Com o Douglas não dá para ser

muito normal.” A professora dá gargalhadas neste momento

“ O Douglas mudou muito minha vida, no começo achei que não ia conseguir

ficar com ele porque tinha muito nojo da baba , me virava o estômago, mas precisei

me posicionar e disse para mim mesma, se tô com ele não é por acaso e a partir

desta minha decisão de estar com ele, eu ia para casa com cheiro forte de baba

dele, mas isso passou a não me incomodar mais. Entendi que não estava ficando

com ele de coração, era por obrigação, mas na medida que eu fui falando com ele e

ele foi me respondendo, eu fui vendo que eu podia sim estar com ele, que eu seria

capaz de estar com ele. Douglas foi uma experiência única, foi um grande

acontecimento na minha vida, falar dele me emociona muito.” Os olhos da

professora se enchem de lágrimas que escorrem pelo rosto.

“ A turma conhecia o Douglas antes de mim, e conhecem ele melhor do que

eu , foram me ensinando, me ajudavam nos momentos de convulsão, diziam é só

abraçar ele e acalmá-lo, para um especialista isso pode parecer uma bobagem , não

é uma indicação de como de tratar uma convulsão, mas para o contexto da escola

isso foi muito importante.

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O Douglas precisava ver as pessoas e as pessoas precisavam ver o

Douglas, foi isto que aconteceu e agora ele pode ir para outros espaços e eu sigo

minha vida quem sabe com novas inclusões pela frente.

Penso que na formação de professores falta discussões nos HTPC, mais

discussões que tematizem a prática, que a gente possa contar as nossas

conquistas, nossas dificuldades, que a gente possa rir do que alcançamos e chorar

do que nos frustramos. Também acho que falta nas políticas publicas uma

preocupação maior com aqueles que são apenas problemas de comportamento ou

de aprendizagem na escola, mas que estão tão excluídos quanto os deficientes. “

Apêndice J - ENTREVISTA COM A PROFª E. (PROFESSORA DE AEE QUE

INDICOU A PROFESSORA J. PARA ESTA ENTREVISTA E QUE ACOMPANHA A

INCLUSÃO DOS ALUNOS COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL E TRASNTORNO

GLOBAL DO DENSENVOLVIMENTO NO ENSINO COLABORATIVO NA ESCOLA)

Caracterização-

A professora de AEE é formada em Pedagogia com habilitação em

deficiência mental com pós graduação em Educação Inclusiva – Atendimento

Educacional Especializado

Está na rede pública como professora da educação especial há13 anos, e

nesta escola desde o ano de 2012.

Registro da entrevista

Ao ser questionada os motivos que a levaram escolher a professora J. como

uma professora com boa prática inclusiva responde:

Indiquei a professora J. por ter sido um trabalho muito árduo no início do ano,

já que ela tem duas inclusões na classe bem diferentes, uma com um aluno com

déficit intelectual , mas que é muito querido por todos na escola dada a sua simpatia

e docilidade e outro que é oposto, também com déficit intelectual porém com

autismo associado e com comportamentos que alteram a dinâmica da sala e da

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escola e que portanto necessitou de muita disponibilidade da professora para este

trabalho.

A prof. J. é uma professora determinada no que faz, muito decidida e

empenhada com a inclusão. Apesar de ser impulsiva algumas vezes, atropelando as

propostas , vejo que esta impulsividade é por conta de querer muito que seus alunos

estejam incluídos.

Divergimos algumas vezes das propostas que ela realiza com o Douglas,

porém entendo que quem está com ele o tempo todo na classe é ela e portanto tento

acolher e aprimorar da melhor maneira possível, trazendo possibilidades e

reavaliando até mesmo o meu conhecimento sobre o assunto, pois nem tudo o que

aprendi e vivi até hoje na educação especial dão conta de pensar boas propostas

para a inclusão do Douglas.

A minha participação em sala de aula com a turma é no ensino colaborativo

então planejamos algumas atividades em parceria e aplicamos na sala, avaliando e

propondo novas atividades em seguida. Isto é feito em geral nos espaços de HTPC ,

mas é pouco tempo e precisamos rebolar muito para fazer o trabalho andar.

Apêndice K - ENTREVISTA COM A PROFª G. ( SÉRIES INICIAIS DO ENSINO

FUNDAMENTAL) COM A INCLUSÃO DE UM ALUNO COM TRANSTORNO

GLOBAL DO DESENVOLVIMENTO – AUTISMO

Caracterização-

Formação Pedagogia – licenciatura plena

Na rede há 15 anos. Nesta escola há 10 anos. Já teve inclusões em sua sala

de aula, mas nunca com autismo

Impressões da pesquisadora durante a entrevista

Fui recebida pela professora de AEE que me encaminhou para a professora

G., que após ser esclarecida dos objetivos e propostas desta entrevista, concordou

em participar e assinou o termo de autorização. È uma professora tranquila, realizou

a entrevista comigo de forma muito envolvida, com clareza e objetividade em suas

respostas. A entrevista foi gravada em áudio e depois reescrita pela pesquisadora.

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“ Logo que recebi o Jonatas ( nome fictício para preservar a identidade do

aluno) fui correndo procurar na internet informações que pudessem me ajudar a

conhecer melhor as características do autista e me orientar no planejamento. A

professora do ano passado dele me passou algumas informações e me deu dicas de

onde começar, mas na verdade pouco me ajudaram estas informações, porque

quando você recebe o aluno, você continua sem saber direito o que fazer , ele

continua sendo uma novidade , mesmo com todas as informações do mundo.

Este começo é muito difícil, e a gente se sente muito sozinha com um desafio

que você acha que não vai dar conta. Você tem um compromisso com a classe,

uma cobrança de dar conta dos conteúdos curriculares que são muitos o tempo é

curto e tem o aluno incluído que precisa aprender também e apesar de não ser

muito cobrado sobre esta aprendizagem para ele em comparação a cobrança para

os demais, a gente mesmo se cobra porque quer que ele aprenda também.

Demorou para chegar ajuda para pensar este planejamento para ele, a

professora de AEE chegou somente no 2º semestre por questões administrativas e

estruturais da rede. Depois que ela chegou tem me ajudado muito nas adaptações

de atividades para ele, mantemos a mesma disciplina que está sendo dada para os

demais, mas a atividade dele é diferente, porque o que pretendemos com ele são

outros objetivos.

Esta forma de partilhar o planejamento e a execução das atividades tem sido

muito boa, porque divide com o professor a responsabilidade sobre aquele aluno. As

trocas que realizamos quando planejamos ou quando avaliamos uma atividade

juntas tem sido muito rica para mim.

O que mais me desesperou no começo foi conhecer o que ele sabia e o que

não sabia, de onde eu iria partir. Como ele não fala, não me dava respostas, eu

ficava insegura se estava propondo coisas que podiam ajudar ele, estava a todo

momento me perguntando será que estou acertando?

Fui percebendo que estava acertando quando ele começou a responder a

chamada como os outros, levantando a mão, num processo que foi extremamente

lento para a aprendizagem deste procedimento. No início, a chamada não tinha

qualquer significado para ele, mas eu tinha o propósito que ele compreendesse a

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rotina da sala de aula e cumprisse os procedimentos de escola, um deles era a

chamada que é realizada para todos , todos os dias pelo professor. Chamava pelo

seu nome e ele não tinha qualquer reação, então eu ia próximo a ele e dizia você

tem que responder a chamada é seu nome que estou chamando agora, veja seus

colegas , levantam o braço e respondem presente para que eu possa saber quem

está na sala e quem faltou. Aparentemente ele não estava entendendo o que eu

dizia, então passei a pedir que um amigo levantasse o seu braço sempre que

chamasse pelo seu nome, indicando a ele que era a sua vez de levantar o braço ,

até que depois de alguns meses, o trabalho é lento, ele espontaneamente levantou o

braço antes que o amigo o pudesse fazer. Então pensei estou no caminho certo,

porque ele agora pode saber qual é o seu nome nesta classe, a partir da chamada.

Para a classe, o ganho que vejo é no aprendizado do que é solidariedade,

pois cada dia uma criança é responsável por estar mais próxima dele, auxiliando-o

nas atividades. Ele já mostra algumas preferencias, indo perto dessas, ele mesmo

levanta da sua carteira e vai próximo de onde estas crianças preferidas por ele

estão. Ainda não brinca ou participa, fica de espectador do que estão fazendo , mas

percebo que está mais a vontade na classe. Gosta de estar perto delas quando

estão brincando de adoletá e ele se diverte, sorri, se agita, em demonstração que

está curtindo a música e os movimentos, mas ainda não participa junto delas, esta é

nossa próxima meta.

As crianças são comprometidas com ele, querem saber o que ele sabe, e

como podem ajudar, se interessam por ele, isto me fez em pensar em mudar a

minha estratégia de ensino e hoje trabalho quase todo o tempo com grupos

pequenos onde ele possa estar todo tempo junto com outros. Como é muito

observador, ainda que não faça nada no grupo sei que está aprendendo porque

observa atentamente o que estão fazendo. As crianças também aprenderam a

respeitar este não fazer dele, e já não cobram tanto que ele produza, mas também

não desistiram dele, estão a todo momento colocando ele na conversa do grupo e

mostrando como fazer. As vezes fico pensando como é que as crianças não

desistem dele, porque elas insistem tanto e nem sempre ele responde e mesmo

quando responde, é uma reposta muito sutil.

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Como tenho que pensar na aprendizagem de todos os alunos, meu

planejamento inicial sofreu algumas transformações, mas acho que ajudou a todos

os alunos, não apenas ao autista. Hoje tenho que ter sempre de pano de fundo no

planejamento a possibilidade de oferecer oportunidade de respostas em diferentes

linguagens, ou seja trabalho muito com expressão artística, música, expressão

corporal, dramatizações , jogos e brincadeiras, saindo um pouco do tradicional que

é a linguagem oral , o que permite que o autista possa participar também.

Foi Interessante uma experiência que tive com uma das alunas que naquele

momento o estava acompanhando na atividade proposta que tratava de figuras

geométricas . A minha proposta era que ele pintasse e depois colasse nos lugares

correspondentes as figuras soltas em uma outra folha, e orientei a aluna orientadora

da tarefa para ele, que começasse pelo círculo, depois o quadrado e assim por

diante, mas ela me questionou , porque professora ele não pode escolher por onde

começar? E então pensei por que não? Percebi que este seria talvez o maior e

melhor objetivo para aquela atividade o de escolher o que fazer e como fazer. Mudei

minha postura de orientar os alunos quando estão com ele, e aprendo todos os dias

com eles , na simplicidade de cada um do que e como fazer com o amigo autista.

Tem sido uma experiência muito boa e acrescentado muito a minha pratica, porque

me faz pensar em fazer de um outro jeito que só pode ser bom para todos os

alunos.

Talvez o Jonatas não consiga fazer tudo que proponho, mas eu preciso

tentar, oferecer e observar o que acontece, acho que é isso que angustia o professor

mais que tudo, não é o fazer , mas é interpretar e atentar para as sutis respostas que

ele dá . A gente quer que ele faça tudo que é oferecido para os outros, mas não sei

se isso é possível, nem mesmo sei se é necessário.

Acho que a maior contribuição dos alunos incluídos nas salas comuns deve-

se ao trabalho colaborativo que tem sido um caminho bom para todos os alunos,

porque ele pode contribuir com o que pode no grupo, mas alguma coisa sempre

pode. Os outros podem aprender a observar com mais cuidado os talentos do outro,

do que podem contribuir e do que são limitados nesta contribuição, respeitando os

limites de cada um e todos aprendem nesta experiência.

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Tivemos uma atividade de grupo , onde a proposta era a escrita de uma carta

aos 3 porquinhos avisando que seu Lobo se aproximava para tentar matá-los e foi

muito boa a produção do grupo que estava com o Jonatas, pois o fato dele não

saber escrever ou falar, o que era básico na atividade, não foi impedimento para ele

participar. Os alunos encontraram um caminho que ele pudesse participar da

atividade e ele participou fazendo desenhos, que por sinal ficaram ótimos na carta

para os 3 porquinhos. O grupo se sentiu muito satisfeito com a produção coletiva.

Na inclusão não vejo como ser uma professora tradicional que preconiza as

atividades individuais e as propostas rígidas de memorização e cópia, nesta visão

tradicional não cabe a inclusão, mas se mudar nossa proposta e nossa postura , não

vejo problemas em incluir os alunos com NEE ainda que não seja uma tarefa fácil.

Apêndice L - ENTREVISTA COM A PROFª M. (PROFESSORA DE AEE QUE

INDICOU A PROFESSORA G. PARA ESTA ENTREVISTA E QUE ACOMPANHA A

INCLUSÃO DO ALUNO COM TRANSTORNO GLOBAL DO DESENVOLVIMENTO

NO ENSINO COLABORATIVO NA ESCOLA)

Caracterização-

A professora de AEE é formada em Pedagogia com habilitação em

deficiência mental com pós graduação em Educação Inclusiva – Atendimento

Educacional Especializado

Está na rede pública como professora da educação especial há13 anos, e

nesta escola há 2 meses.

Registro da entrevista

Ao ser questionada os motivos que a levaram escolher a professora G. como

uma professora com boa prática inclusiva responde:

Penso que a questão que a inclusão dos alunos com deficiência ou

transtornos do desenvolvimento trazem está ligada diretamente ao currículo. Há

uma urgente necessidade de diversificação que se apresenta frente a inclusão.

Neste sentido vejo a inclusão como um motor para a mudança neste currículo, o

imprevisto, isto é não saber o que dá certo ou não dá com aquele aluno torna o

planejamento não apenas pensado intencionalmente, mas também acompanhado

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em suas respostas intencionalmente. Ou seja, o professor precisa planejar

atividades com objetivos claros para todos os alunos, inclusive para o aluno incluído,

mas não tem a certeza se dará certo e precisa estar atento na aplicação da

atividade. Mas não seria este mesmo o papel do professor para todos os alunos? O

que percebo é que os professores que tem alunos incluídos precisam se ocupar

mais de pensar o que fazer, e mais ainda de pensar o que fizeram para de novo

pensar com mais assertividade o que fazer.

È isso que F. faz e que dá certo, ela pensa e repensa e depois pensa de

novo. Não passa nem pela cabeça dela deixar o Jonatas com uma atividade

diferente da atividade que a sala está fazendo e isso acho muito importante, acho

que é isso que garante uma inclusão de boa qualidade.

O início como a professora diz foi muito difícil porque estávamos

preocupados com o pré- requisito do aluno para acompanhar o que propomos , o

que planejamos, mas a questão primeira foi vamos levantar dados sobre o aluno e

sua aprendizagem e não levantar pré- requisitos.

A falta de tempo para as parcerias neste processo, seja com a coordenadora

pedagógica, seja com a professora de AEE é um grave problema, porque

planejamento e tempo estão intimamente ligados.

Tenho tentado mostrar para a escola que o meu papel é contribuir não

apenas com o aluno incluído, mas com toda a classe, então não entro na sala de

aula para olhar o Jonatas, mas para vê-lo no contexto de toda a sala de aula, nas

suas relações com os demais colegas, com a professora e com o currículo proposto

e é inevitável que neste movimento me envolva com todos os alunos e observe as

necessidades de ajustes do planejamento que beneficiaria toda a classe.

Neste sentido vejo que a formação de professores precisa desestabilizar o

professor do lugar que se encontra, precisa desestabilizar os seus conhecimentos

construídos até então , precisa dar uma mexida no seu fazer e isto o aluno de

inclusão faz muito bem.” A professora ri muito neste momento.

A escolha desta professora se deu por conta das mudanças que vi

acontecerem com a entrada do aluno de inclusão autista em sua sala de aula, as

propostas de grupo que tem sido implementadas e os avanços que o aluno autista

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tem tido, mas também os avanços da classe não apenas nos conteúdos propostos ,

mas na postura frente ao diferente. A professora é muito centrada no que faz e

apesar de ter estado muito tempo sozinha, todo o primeiro semestre, não se deixou

paralisar pelas dificuldades ou pela falta de respostas do aluno incluído e ainda que

se desesperasse com isso, não desistiu dele e foi tentando novos caminhos, isto

mostra que a professora se comprometeu com ele e não vejo como dar certo a

inclusão enquanto o professor não entender que o aluno é seu e precisa se

responsabilizar por ele tanto quanto se responsabiliza pelos demais .

Apêndice M - ENTREVISTA COM A PROFª F. (EDUCAÇÃO INFANTIL) COM A

INCLUSÃO DE UM ALUNO COM TRANSTORNO GLOBAL DO

DESENVOLVIMENTO – SÍNDROME DE ASPERGER

Caracterização-

Formação Pedagogia – licenciatura plena

Na rede há 16 anos. Nesta escola há 6 anos. Já teve inclusões em sua sala

de aula

Impressões da pesquisadora durante a entrevista

Fui recebida pela professora de AEE que me encaminhou para a professora

F, que após ser esclarecida dos objetivos e propostas desta entrevista, concordou

em participar e assinou o termo de autorização. È uma professora bem agitada,

realizou a entrevista comigo mas estava preocupada com a sala de aula, sendo

rápida nas respostas que foram registradas na escrita.

Registro da entrevista

“ Escolhi esta sala sabendo que Núbia ( nome fictício para preservar a

identidade da aluna) estaria nela. O que eu sabia do ano anterior da Núbia era

pouca coisa, fui mesmo as cegas para esta inclusão. Fui sem expectativa nenhuma,

também sem conhecimento nenhum e logo nos primeiros dias não se mostrou

arredia como eu previa, mas com o passar do tempo, durante o processo de

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adaptação foi me testando com comportamentos de gritos na sala de aula, reações

exageradas aos nãos que lhe oferecia.

Não fui buscar informações sobre ela em nenhum lugar, recorri ao relatório

que tinha na escola, que de verdade não me dizia nada do que eu precisava saber,

então decidi „vou fazer o que eu acho certo‟. Assim fui testando coisas com ela, e ela

foi respondendo as minhas tentativas doidas, fui me empolgando com os resultados

e as minhas descobertas sobre ela. Neste percurso recebi a ajuda da professora de

AEE e passamos a descobrir coisas juntas sobre a Núbia.

Eu dava a mesma atividade para todos da classe e ela fazia algumas delas,

mas o que me incomodava era que ela ficava muito comigo e pouco com o grupo.

No começo teve muito de não querer, de gritar, fui mostrando a ela que ficava

brava com este seu comportamento, fui mostrando que ela devia falar baixinho e as

coisas foram acontecendo.

Perguntava para ela „qué pão?‟ e esperava ela responder, mesmo que isso

demorasse muito tempo, insistia e perguntava quantas vezes fosse necessária até

ela esboçar uma resposta que então eu validava. Conversava muito com ela, fui

dosando o que demandar a ela, não tinha uma rotina certinha com ela, dependia de

como ela chegava e ia passando o dia, eu ia me ajustando as suas necessidades.

Conversei com as crianças que eles precisavam me ajudar e ter paciência

com a Núbia, deixar ela quando estivesse irritada, porque ela precisava ficar sozinha

nestes momentos e eles foram aprendendo a respeitar isso, a deixá-la em paz

quando estava em crise e ainda que se incomodassem com os gritos e as atitudes

inesperadas dela, resistiam bravamente.

Tirei uma licença de muitos dias e quando retornei para o trabalho percebi

que a Núbia tinha regredido bastante em alguns comportamentos que já não

estavam mais acontecendo na minha presença, mas não posso dizer que foi só a

Núbia que regrediu os outros alunos também, então percebi que não se tratava da

deficiência, mas de criança. Ela tem me ensinado muito.

Tinha uma grande preocupação no início do ano, porque como sabia que ela

era autista e já tinham me dito que o autista precisa fazer tudo certinho, do mesmo

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jeito , e eu sou altamente imprevisível, gosto das mudanças, pensei: isso não vai

dar certo, vou viver em conflito. No final eu tirei ela disso, dizia para ela tem que ser

assim, tem que ser deste jeito e fomos nos entendendo.,

Na balança do parque ela corria pegava a balança e não cedia aos demais,

ficava todo tempo na balança, no início todos aceitavam, mas fui apresentando a ela

as regras que são para todos e devagar ela pôde ir cedendo. Fui instalando com ela

os mesmos procedimentos que tinha com os demais e ela foi respondendo a isso,

mais devagar que os outros é verdade, mas foi respondendo.

Fiz tudo sozinha, nunca sentei com a mãe, fora da reunião de pais que é para

todos e na hora da saída o que passava para a mãe era o retorno positivo de como

estava indo bem na escola, mas nunca perguntei como ela era em casa, ou coisa

parecida. Percebi que falhei nisso quando vi a mãe se emocionar quando contei algo

que a Núbia estava fazendo e isso me chamou a atenção do quão distantes eramos

frente a uma pessoa comum.

As coisas que eu via que ela gostava, como de ler por exemplo, eu investia e

ela foi desenvolvendo a leitura na sala de aula.

Com relação ao grupo, mostravam-se enciumadas com falas de cobrança

para a professora como: você fica tanto com a Núbia e comigo você fica só um

pouquinho.

Núbia não foi um estorvo na minha sala, fui aprendendo aos poucos com ela

e ela comigo. Será que inclusão não é isso mesmo, aprendizagem de todos os

lados? Núbia era minha aluna, mas na escola todo mundo se intrometia para dar

palpites, o que ficou muito difícil, de um lado eu fazendo um trabalho com ela,

especialmente com o comportamento, vinha outro professor, ou funcionário e

desmanchava o que eu estava fazendo. Faltou conversar com o grupo, partilhar

mais este trabalho com a escola. Fiquei muito sozinha, isolada na minha sala, acho

que para a inclusão dar certo mesmo, precisa ter mais parcerias”.

Apêndice N - ENTREVISTA COM A PROFª E. (PROFESSORA DE AEE QUE

INDICOU A PROFESSORA J. PARA ESTA ENTREVISTA E QUE ACOMPANHA A

INCLUSÃO DOS ALUNOS COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL E TRASNTORNO

GLOBAL DO DENSENVOLVIMENTO NO ENSINO COLABORATIVO NA ESCOLA)

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Caracterização-

A professora de AEE é formada em Pedagogia com habilitação em

deficiência mental com pós graduação em Educação Inclusiva – Atendimento

Educacional Especializado

Está na rede pública como professora da educação especial há13 anos, e

nesta escola desde o ano de 2012.

Registro da entrevista

Ao ser questionada os motivos que a levaram escolher a professora F. como

uma professora com boa prática inclusiva responde:

A professora F. é uma professora agitada e como ela mesma diz tinha tudo

para não ter dado certo a inclusão com a Núbia, porque o perfil desta professora de

agitação poderia ter mais desestabilizado a Núbia que contribuído para seus

avanços. Mas não foi isso que aconteceu, a professora conseguiu um caminho muito

interessante com a aluna. È uma professora que é muito segura do que faz , acredita

no potencial de todos os alunos e aposta em si própria, não tem medo de tentar e se

errar , retoma e começa de novo, acho isso absolutamente necessário na inclusão,

porque na verdade ninguém sabe o que dá ou não certo, porque cada criança ,

independente do diagnóstico que traz consigo é diferente de outra com o mesmo

diagnóstico.

Gosto do trabalho da professora F. porque não tem medo de ousar e tem

ousado muito com a Núbia e ela tem respondido positivamente , coisas que jamais

pensamos que poderia fazer, tem feito, mas é mérito da professora que aposta e vai.

APÊNDICE O – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO PARA

PROFESSORES DA SALA COMUM

1. TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO:

O presente roteiro faz parte da pesquisa “IMPLICAÇÕES DA INCLUSÃO

ESCOLAR DO ALUNO COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL OU TRANSTORNOS

Page 231: IMPLICAÇÕES DA INCLUSÃO ESCOLAR DE ALUNOS COM … · 2015. 8. 4. · Gomes, Joseleine de Campos Implicações da Inclusão Escolar de Alunos com Deficiência Intelectual e Transtornos

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GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO NA P´RATICA DO PROFESSOR” a qual você

está sendo convidado a participar.

A pesquisadora responsável por este projeto é a Prof.Joseleine de Campos

Gomes , mestranda do PPGE da UNINOVE, sob a orientação do Prof. Dr. Paolo

Nosella.

Informações sobre a pesquisa

Esta pesquisa está sendo realizada com o objetivo de levantar dados sobre

as implicações acarretadas pela inclusão do aluno com deficiência intelectual ou

com transtornos globais do desenvolvimento nas salas de aula comuns na

perspectiva de conhecer as práticas pedagógicas dos professores destas classes

que tem apresentado resultados positivos e avanços para o aluno e para a classe

como um todo, bem como tem possibilitado a reflexão do professor sobre a sua

prática docente.

Termos de participação

1. Para participar desta pesquisa você deve estar com aluno com deficiência

intelectual ou transtorno global do desenvolvimento frequentando a classe

comum no ano de 2013

2. Os nomes dos professores pesquisados não serão divulgados, e para sua

total segurança não será solicitado qualquer número de documento.

3. Os nomes das escolas e dos alunos envolvidos em seus relatos não serão

diculgados e utilizaremos nomes fictícios.

4. A participação nesta pesquisa não implica nenhuma responsabilidade ao

pesquisado,sendo solicitado apenas que responda às perguntas com

sinceridade.

5. Caso deseje desistir da pesquisa poderá fazer isto a qualquer momento, sem

nenhumprejuízo

6. As respostas dadas serão gravadas em áudio ou registradas em papel pela

pesquisadora..

Declaro que, após convenientemente esclarecido e tendo compreendido o que me

foi explicado, concordo em participar da presente pesquisa. Declaro ainda que

Page 232: IMPLICAÇÕES DA INCLUSÃO ESCOLAR DE ALUNOS COM … · 2015. 8. 4. · Gomes, Joseleine de Campos Implicações da Inclusão Escolar de Alunos com Deficiência Intelectual e Transtornos

- 232 -

menquadro no segmento pesquisado, tendo participado de ao menos um projeto

deducação para as mídias durante os anos em que cursei o Ensino Médio.

Se você concorda com o exposto acima e deseja participar, deve assinar o

documento

São Bernardo do Campo, -

Assinatura do professor

APÊNDICE P – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO PARA

PROFESSORES DO AEE

1. TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO:

O presente roteiro faz parte da pesquisa “IMPLICAÇÕES DA INCLUSÃO

ESCOLAR DO ALUNO COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL OU TRANSTORNOS

GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO NA P´RATICA DO PROFESSOR” a qual você

está sendo convidado a participar.

A pesquisadora responsável por este projeto é a Prof.Joseleine de Campos

Gomes , mestranda do PPGE da UNINOVE, sob a orientação do Prof. Dr. Paolo

Nosella.

Informações sobre a pesquisa

Esta pesquisa está sendo realizada com o objetivo de levantar dados sobre

as implicações acarretadas pela inclusão do aluno com deficiência intelectual ou

com transtornos globais do desenvolvimento nas salas de aula comuns na

perspectiva de conhecer as práticas pedagógicas dos professores destas classes

que tem apresentado resultados positivos e avanços para o aluno e para a classe

Page 233: IMPLICAÇÕES DA INCLUSÃO ESCOLAR DE ALUNOS COM … · 2015. 8. 4. · Gomes, Joseleine de Campos Implicações da Inclusão Escolar de Alunos com Deficiência Intelectual e Transtornos

- 233 -

como um todo, bem como tem possibilitado a reflexão do professor sobre a sua

prática docente.

Termos de participação

1. Para participar desta pesquisa você deve estar acompanhando em sala de

aula comum o aluno com deficiência intelectual ou transtorno global do

desenvolvimento frequentando a classe comum no ano de 2013 na

modalidade de ensino colaborativo

2. Os nomes dos professores pesquisados não serão divulgados, e para sua

total segurança não será solicitado qualquer número de documento.

3. Os nomes das escolas e dos alunos envolvidos em seus relatos não serão

diculgados e utilizaremos nomes fictícios.

4. A participação nesta pesquisa não implica nenhuma responsabilidade ao

pesquisado,sendo solicitado apenas que responda às perguntas com

sinceridade.

5. Caso deseje desistir da pesquisa poderá fazer isto a qualquer momento, sem

nenhum prejuízo

6. As respostas dadas serão gravadas em áudio ou registradas em papel pela

pesquisadora..

Declaro que, após convenientemente esclarecido e tendo compreendido o que me

foi explicado, concordo em participar da presente pesquisa. Declaro ainda que

menquadro no segmento pesquisado, tendo participado de ao menos um projeto

deducação para as mídias durante os anos em que cursei o Ensino Médio.

Se você concorda com o exposto acima e deseja participar, deve assinar o

documento

São Bernardo do Campo, -

Assinatura do professor