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Teorias de Decisªo sob Incerteza Rodrigo AndrØs de Souza Peæaloza Departamento de Economia - Universidade de Braslia Centro de Investigaªo em Economia e Finanas, CIEF - Universidade de Braslia Centro de Estudos em Regulaªo de Mercados, CERME - Universidade de Braslia versªo: 17 de junho de 2010 1 Introduªo Neste trabalho expomos as teorias de decisªo sob incerteza. Nªo temos, porØm, qualquer pretensªo de originalidade. Pelo contrÆrio, a exposiªo do tema segue Gilboa (2007). O que fazemos aqui, com efeito, Ø seguir, em linhas gerais, sua divisªo do tema, mas apresentando-o de forma unicada e com muitas consideraıes pessoais. Nosso objetivo Ø tornar conhecidos os fundamentos de cada teoria e apresentar teorias mais recentes. Embora a motivaªo bÆsica do desenvolvimento dessas teorias tenha partido de problemas econmicos e estatsticos de tomada de decisªo, Ø bvio que seus fundamentos merecem a atenªo sØria da Epistemologia em particular e da Filosoa em geral. Na seªo 2 apresentamos as abordagens tradicionais da probabilidade: clÆssica, objetiva e subjetiva. Na seªo 3 apresentamos as teorias comportamentais da probabilidade subjetiva e da maximizaªo da utilidade esperada. Sªo elas: a teoria de von Neumann e Morgenstern, a teoria de Ramsey e de Finetti, a teoria de Savage e a teoria de Anscombe e Aumann. Na seªo 4 apresentamos as teorias comportamentais alternativas, mais conhecidas na teoria econmica por teorias de incerteza knightiana. Finalmente, na seªo 5 apresentamos a teoria Texto preparado para o seminÆrio do Grupo de Epistemologia e Filosoa da CiŒncia do Departamento de Filosoa da Universidade de Braslia. Agradeo especialmente ao professor Agnaldo Portugal (FIL-UnB) pelo convite e pelas discussıes quanto ao tema do seminÆrio. 1

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  • Teorias de Deciso sob Incerteza

    Rodrigo Andrs de Souza Pealoza

    Departamento de Economia - Universidade de Braslia

    Centro de Investigao em Economia e Finanas, CIEF - Universidade de Braslia

    Centro de Estudos em Regulao de Mercados, CERME - Universidade de Braslia

    verso: 17 de junho de 2010

    1 Introduo

    Neste trabalho expomos as teorias de deciso sob incerteza. No temos, porm, qualquer

    pretenso de originalidade. Pelo contrrio, a exposio do tema segue Gilboa (2007). O que

    fazemos aqui, com efeito, seguir, em linhas gerais, sua diviso do tema, mas apresentando-o

    de forma unicada e com muitas consideraes pessoais. Nosso objetivo tornar conhecidos

    os fundamentos de cada teoria e apresentar teorias mais recentes. Embora a motivao bsica

    do desenvolvimento dessas teorias tenha partido de problemas econmicos e estatsticos de

    tomada de deciso, bvio que seus fundamentos merecem a ateno sria da Epistemologia

    em particular e da Filosoa em geral.

    Na seo 2 apresentamos as abordagens tradicionais da probabilidade: clssica, objetiva

    e subjetiva. Na seo 3 apresentamos as teorias comportamentais da probabilidade subjetiva

    e da maximizao da utilidade esperada. So elas: a teoria de von Neumann e Morgenstern,

    a teoria de Ramsey e de Finetti, a teoria de Savage e a teoria de Anscombe e Aumann.

    Na seo 4 apresentamos as teorias comportamentais alternativas, mais conhecidas na teoria

    econmica por teorias de incerteza knightiana. Finalmente, na seo 5 apresentamos a teoria

    Texto preparado para o seminrio do Grupo de Epistemologia e Filosoa da Cincia do Departamento

    de Filosoa da Universidade de Braslia. Agradeo especialmente ao professor Agnaldo Portugal (FIL-UnB)

    pelo convite e pelas discusses quanto ao tema do seminrio.

    1

  • que vem sendo desenvolvida por Gilboa, Lieberman e Schmeidler, chamada de teoria da

    deciso baseada em casos. ela um meio termo entre a abordagem bayesiana e freqentista.

    Considere os seguintes exemplos concernentes a situaes de incerteza enfrentadas por

    um indivduo chamado Augur:

    Exemplo 1. Um bolo lanado e aposta-se sobre qual face car para cima. Augur

    quer saber a probabilidade de "Caesar", isto , de a face de Csar estar voltada para cima.

    Exemplo 2. Augur costuma estacionar sua biga na rua durante os jogos no Coliseu. Ao

    comprar um seguro, Augur quer saber a probabilidade de sua biga ser roubada no perodo

    de vigncia do contrato.

    Exemplo 3. Augur enfrenta uma doena rara e tem de se submeter a uma cirurgia.

    Augur inquire seu mdico, Asclepius, quanto probabilidade de sucesso.

    Exemplo 4. Augur conjectura mudar-se para o Oriente Mdio, uma regio conturbada

    por brigas intestinas desde os tempos de Ado e Eva. Ele quer ter uma idia da probabilidade

    de ecloso de uma guerra na regio, mas os pssaros no cu no colaboram.

    2 Abordagens tradicionais da probabilidade

    H trs abordagens comumente aceitas para a denio de probabilidade:

    a abordagem clssica: aplica o Princpio da Indiferena;

    b abordagem freqentista: a probabilidade denida em termos da freqncia emprica e da

    Lei Fraca dos Grandes Nmeros;

    c abordagem subjetiva: a probabilidade uma medida numrica do grau de crena satis-

    fazendo a certos axiomas comportamentais.

    Vamos explicar cada uma a seu turno.

    2.1 Abordagem clssica

    A abordagem clssica aplica o Princpio da Indiferena de Laplace, s vezes atribudo a

    Bernoulli. Segundo esse princpio, diante de um nmero de possveis estados do mundo,

    2

  • opta-se pela eqiprobabilidade dos estados. Essa postura diante da incerteza faz sentido

    quando no h qualquer razo que justique a probabilidade maior de um estado com relao

    a outro.

    Essa abordagem lida muito bem com situaes que so semelhantes do exemplo 1. Nesse

    exemplo, o mundo dado pelo conjunto = f!1; !2g de faces do bolo. Aqui, o elemento!1 2 denota o fato de o bolo cair com a face "cara" voltada para cima. Laplace, nocaptulo II de seu Ensaio Filosco sobre Probabilidades, justica esse princpio com base no

    Princpio da Razo Suciente, segundo o qual uma coisa no pode ocorrer sem uma causa

    que a produza. Se o bolo honesto, isto , se todos os aspectos fsicos do bolo e at do

    ambiente em que ele lanado no privilegiam qualquer face em particular em detrimento

    da outra, pelo menos at o ponto em que os sentidos e aparelhos de Augur consigam detectar

    quaisquer diferenas, ento nosso colega Augur possui total ignorncia quanto causa que

    poder vir a fazer com que um determinado estado do mundo se realize. Estando tudo justo

    e perfeito, e como deve haver uma causa, e como ignoramos qual seja, no h razo suciente

    para distorcer a eqiprobabilidade dos estados do mundo. Desse modo, se P(!) denota a

    probabilidade do estado do mundo ! 2 , ento P(!) = 12.

    Uma caracterstica fundamental, porm muitas vezes no percebida, que Augur, embora

    incerto quanto ao estado do mundo que se realizar, possui certeza absoluta de que o conjunto

    o mundo. Em outras palavras, Augur possui certeza quanto ao mundo, ele apenas

    distribui essa certeza entre os estados que compem o mundo. Alm disso, ele sabe quais

    so os estados componentes. Ele sabe que o mundo e que o mundo formado pelos

    elementos !1 e !2.

    Considere, entretanto, um exemplo, aparentemente anlogo ao exemplo 1:

    Exemplo 1b. Augur gira seu basto no ar e observa o vo dos pssaros no cu. Men-

    talmente evoca os foros das aves e pergunta: "Amanh, chove ou no chove?"

    Neste exemplo, o mundo tambm pode ser descrito pelo conjunto = f!1; !2g de estadosda natureza, em que !1 =chove e !2 =no chove. Se Augur ignorante quanto

    ocorrncia de um ou outro estado da natureza, ento, pelo Princpio da Indiferena, ele diria

    que P(!1) = P(!2) = 12 . Este exemplo, porm, fundamentalmente diferente do exemplo 1,

    embora parea similar. Temos, aqui, a liberdade de escolher o mundo. Se dissssemos que

    = f!1; !2; !3g, em que !1 =chove, !2 =nublado e no chovee !3 =ensolarado e

    3

  • no chove, ento P(!1) = 13 : A probabilidade de chuva depende da escolha do espao de

    estados. Note que no temos a mesma liberdade no caso da moeda. Tambm no temos essa

    liberdade no caso de lanamento de dados, nem no caso da roleta de um cassino. Em suma,

    essa abordagem serve apenas para jogos de azar em que os estados do mundo so dados (isto

    , perfazem a totalidade do mundo e o mundo conhecido) e uniformemente distribudos,

    ou seja, com eqiprobabilidade dos estados.

    Considere uma varivel aleatria X com distribuio uniforme no intervalo (0; 1], ou seja,

    X U(0; 1]: Podemos justicar a distribuio uniforme de X pelo Princpio da Indiferenadevido ignorncia. Mas se denirmos uma varivel aleatria Y por Y = X2, veremos que

    existe entre X e Y uma relao biunvoca1, mas que a distribuio de Y no uniforme. De

    fato, como:

    fX(z) =

    8

  • condies e sob a hiptese de independncia estatstica. Augur, tendo em mente o exemplo

    2, considera que X = 1 signica ter a biga roubada e que X = 0 signica no ter a biga

    roubada. A probabilidade de ter a biga roubada, isto , a probabilidade deX = 1, um certo

    nmero p 2 [0; 1]. Desse modo, X uma varivel aleatria com distribuio de Bernoulli deparmetro p, o que escrevemos como X B(p). Que p? Augur imagina que deve haveruma probabilidade verdadeira, o que quer que ele entenda por verdade, porm desconhecida.

    Augur coleta uma srie histrica fXigNi=1 de N observaes relativas a roubos na vizinhanado Coliseu e toma como estimativa da probabilidade de roubo a freqncia observada de

    roubos. Por exemplo, ele observou que de N = 5 bigas l deixadas no dia anterior, 2

    foram roubadas, digamos, X1 = 0, X2 = 1, X3 = 0, X4 = 0, X5 = 1. Isso signica que a

    segunda e a quinta bigas foram roubadas. Com base nessa amostra, ele observou que 40% das

    bigas foram roubadas. Assim, uma estimativa da probabilidade de roubo p. = 0; 4. Essa

    probabilidade objetiva no sentido de ter sido obtida a partir das observaes anteriores. O

    tamanho da amostra coletada por Augur foi N = 5. claro que essa amostra pequena.

    Ser que uma amostra maior pode deixar Augur mais conante de estar mais prximo da

    verdadeira probabilidade? A WLLN diz que, quanto maior o tamanho da amostra, menor a

    probabilidade de se cometer um erro de estimativa previamente xado.

    Ora, Augur comeou sua estimativa calculando a freqncia emprica de roubos:

    p. =1

    5 (X1 +X2 +X3 +X4 +X5)

    =1

    5 (0 + 1 + 0 + 0 + 1)

    =2

    5

    = 40%

    Se sua amostra tivesse um tamanho N qualquer, ento:

    p. =1

    N (X1 +X2 + +X5)

    =1

    N

    NXi=1

    Xi

    Suponha que Augur xa uma margem de erro qualquer, digamos " > 0, um nmero bem

    pequeno, mas xo. Cometer um erro de estimativa pela margem de erro " > 0 signica que

    jp. pj ", ou seja, que a estimativa p. dista da probabilidade verdadeira p uma distncia

    5

  • de pelo menos ": Em outras palavras, que Augur errou o alvo por ". A WLLN diz que,

    qualquer que seja a margem de erro " > 0, vale o seguinte:

    limN!1

    P[ jp. pj "] = 0

    Quando o tamanho da amostra tende para innito, a probabilidade de se cometer um erro

    de estimativa pela margem " converge para zero.

    Esse procedimento no serve como denio de probabilidade. A WLLN j pressupe a

    noo de probabilidade de vrios modos. Em primeiro lugar, a distribuio deX j pressupe

    a probabilidade p. Em segundo lugar, a WLLN supe independncia das variveis aleatrias

    fXigNi=1, um conceito que denido em termos da probabilidade P. Por m, o enunciado daWLLN expresso em termos da probabilidade P. Se Augur no est seguro quanto ao que

    seja a probabilidade p, ento como ele pode usar a probabilidade P para denir p? Parece

    uma petio de princpio. Entretanto, a WLLN nos d a denio de probabilidade mais

    intuitiva.

    Nos exemplos 3 e 4, os experimentos no so conduzidos sob as mesmas condies.

    Quando Augur pede a Asclepius a probabilidade de sucesso de sua cirurgia, Asclepius se

    recorda de que j praticou essa cirurgia duas vezes na vida, que na primeira obteve sucesso

    e na segunda insucesso. O tamanho da amostra pequeno e a probabilidade de Asclepius

    cometer um erro grande. Alm disso, os pacientes das duas cirurgias anteriores de Ascle-

    pius eram diferentes. O primeiro paciente era um gladiador, era forte e bem alimentado. O

    segundo era um certo estudante da Academia, de alma forte e bem alimentada, mas de corpo

    franzino. Ele pode at mesmo recorrer aos registros histricos das cirurgias de Hipcrates,

    mas este tambm operou poucos pacientes com essa doena e mesmo esses eram diferentes

    entre si e diferentes dos pacientes de Asclepius. A capacidade cirrgica de Asclepius no a

    mesma de Hipcrates. As cirurgias foram feitas em locais e pocas diferentes, com pacientes

    diferentes, ou seja, as condies no eram as mesmas.

    Num certo sentido, o mesmo se pode dizer do exemplo 1. Nenhum lanamento de bolo

    igual a outro. A fora que o lanador exerce varia, as condies atmosfricas tambm

    podem variar e inuenciar o lanamento. Segundo Augur, at a posio dos astros nas

    esferas celestes poderia determinar o resultado de cada lanamento. Assim, a condio de

    que os experimentos sejam conduzidos sob circunstncias idnticas uma simplicao. Essa

    simplicao bastante aceitvel no exemplo 1, aceitvel no exemplo 2, mas no aceitvel

    6

  • nos exemplos 3 e 4.

    Quanto ao exemplo 4, existe uma dependncia causal entre as guerras, mesmo que durem

    sculos. O rancor, a intolerncia, a falta de perdo e at o orgulho na conduo das relaes

    internacionais e a falta de bom senso geram guerras, uma depois da outra. O exemplo 4

    sofre de todos os males do exemplo 3 e, alm de tudo, viola a hiptese de independncia.

    2.3 Abordagem subjetiva

    Voltando ao exemplo 3, Asclepius no tem como recorrer a uma probabilidade objetiva de

    sucesso. Resta-lhe apenas crer. A probabilidade ser assim subjetiva.

    Quem primeiro usou o conceito de probabilidade subjetiva foi Pascal. H dois estados

    do mundo: Deus existe e Deus no existe. H duas estratgias possveis para o ser

    humano: crere no crer. Se admitirmos que h uma pequena probabilidade p > 0, por

    menor que seja, de Deus existir, ento crer prefervel a no crer. Se o ser humano cr e

    Deus existe, ento o benefcio auferido pelo ser humano innito (1). Se o ser humano cre Deus no existe, ento o ser humano sofre um certo prejuzo (digamos, c, em que c > 0 uma constante nita). Assim, o benefcio esperado decorrente da crena :

    p1+ (1 p) (c) =1

    Por outro lado, se o ser humano no cr e Deus existe, ento o ser humano sofre um prejuzo

    innito. Se o ser humano no cr e Deus no existe, ento o ser humano nem perde nem

    ganha. Assim, o benefcio esperado decorrente da descrena :

    p (1) + (1 p) 0 = 1

    Vrias idias foram introduzidas por Pascal, ainda que de forma implcita. Primeiro, a

    noo de matriz de deciso. No exemplo da aposta de Pascal:

    Deus existe Deus no existe

    crer 1 cdescrer 1 0

    Em segundo lugar, a noo de estratgia (fracamente) dominante. No exemplo de Pascal,

    crer uma estratgia dominante, ou seja, no importa se Deus existe ou no existe, crer

    sempre melhor que no crer. Em terceiro lugar, a idia de maximizao da utilidade esperada

    7

  • de acordo com uma probabilidade subjetiva a priori p. Por m, a noo de mltiplas

    probabilidades a priori. Lembre do qualicativo ...por menor que seja p.

    Chegamos assim ao tema do bayesianismo.

    H trs princpios bsicos que caracterizam o que a Economia entende por bayesianismo:

    1o deve haver uma distribuio a priori (crena probabilstica);

    2o com o advento de novas informaes, a probabilidade a priori deve ser atualizada para

    uma distribuio a posteriori de acordo com a frmula de Bayes;

    3o em um problema de deciso, maximiza-se a utilidade esperada de acordo com a dis-

    tribuio prescrita pela crena bayesiana.

    O terceiro princpio usual na Economia e em certos ramos da Estatstica. Existe

    um problema para a aplicao da WLLN abordagem bayesiana: a independncia das

    variveis aleatrias condicional a p. Esse problema foi resolvido por de Finetti em 1930,

    que estendeu a condio de independncia para a de intercambiabilidade (exchangeability).

    Especicamente, uma seqncia de variveis aleatrias fXigNi=1 intercambivel se, paraqualquer tamanho N da amostra, a distribuio conjunta de X1; : : : ; XN simtrica. Em

    particular, as distribuies marginais so iguais e as variveis aleatrias so independentes.

    Se IID denota a condio de independncia e distribuies iguais, ento:

    IID ) intercambiabilidade

    mas no vale a recproca:

    intercambiabilidade ; IID

    de Finetti mostrou que a condio de intercambiabilidade suciente para a validade de

    uma espcie de Lei Forte dos Grandes Nmeros (SLLN), um conceito mais forte de lei dos

    grandes nmeros.

    Mas o que , anal de contas, probabilidade subjetiva? Savage (1954) mostrou que se

    as escolhas de um tomador de decises satisfazem certos axiomas comportamentais, ento a

    escolha do indivduo ser aquela que maximiza sua utilidade esperada de acordo com uma

    probabilidade subjetiva. O uso da abordagem subjetiva estaria justicado se o comporta-

    mento observado do tomador de decises consistente com a maximizao de acordo com

    a probabilidade subjetiva. Podemos no saber qual a probabilidade subjetiva que est na

    8

  • mente de Augur, mas podemos vericar se seu comportamento consistente com o uso de

    uma. Entramos, assim, no campo da abordagem comportamental da tomada de deciso sob

    incerteza.

    3 Teorias comportamentais

    O ponta-p inicial para o desenvolvimento da abordagem comportamental foi dado pelo

    matemtico alemo George Cantor em 1915. Suponha que Augur tem diante de si vrias

    alternativas. Denote por X o conjunto de todas essas alternativas. Augur possui uma escala

    de preferncias sobre as alternativas. Ao comparar duas alternativas x e y, ele pode, por

    exemplo, preferir x a y. Escrevemos isso como x % y e lemos como a alternativa x preferidaou indiferente alternativa y. Em outras palavras, Augur julga que a alternativa x pelo

    menos to boa quanto a alternativa y. O smbolo % uma relao binria, isto , diz algoacerca de dois elementos quaisquer de um conjunto qualquer.

    A relao binria completa se, 8x; y 2 X, x % y ou y % x: Ela transitiva se,8x; y; z 2 X, se x % y e ou y % z, ento x % z:O axioma da completeza diz que Augur, diante de duas alternativas quaisquer, sempre

    capaz de dizer qual das duas ele prefere ou se as julga indiferentes. Ele sempre capaz de

    tomar uma deciso. Se Augur, algum dia, for colocado na arena para servir de comida a um

    leo faminto e, ao sair correndo do leo, encontrar um tigre igualmente faminto, ento, se

    suas preferncias forem completas, ele ser capaz de decidir se prefere alimentar, com seu

    prprio corpo, o leo, o tigre ou se indiferente entre ambos. Se, entretanto, ele entrar em

    estado de choque e car paralisado, sem saber o que fazer, o que seria bastante compreensvel,

    ento suas preferncias tero sido incompletas.

    O axioma da transitividade diz que, se Augur prefere a alternativa x alternativa y e se

    prefere, por sua vez, a alternativa y a uma terceira alternativa z, ento ele prefere x a z.

    Os axiomas da completeza e da transitividade, juntos, caracterizam o que chamamos de

    ordem fraca. Se % completa e transitiva, ento % uma ordem fraca.Se % refere-se a uma escala de gostos ou de preferncia, ento Cantor sups como naturais

    os seguintes axiomas:

    C1 Ordem fraca: % completa e transitiva:

    9

  • C2 Separabilidade: 9Z X subconjunto enumervel de X tal que, 8x; y 2 XnZ, sex % y, ento 9z 2 Z tal que x % z % y:

    O axioma da separabilidade exerce uma funo meramente tcnica. Entretanto, ele

    mais do que um mero axioma comportamenal, pois alm de dizer algo sobre as preferncias,

    diz tambm algo sobre a natureza do conjunto de alternativas. O conjunto de alternativas

    deve ser rico o suciente para que Augur possa sempre encaixar entre duas alternativas

    ordenadas uma terceira alternativa que, na sua escala de gostos, intermediria entre as

    outras duas.

    Uma funo numrica u : X ! R que associa a cada alternativa x 2 X um valor numricou(x) dita funo (de) utilidade. Uma funo utilidade u representa numericamente uma

    relao de preferncia % se valer a seguinte equivalncia:

    x % y () u(x) u(y)

    Se existir tal representao, ento haver uma isotonia entre a escala de preferncias e a

    ordenao usual da reta real. Se a utilidade de uma alternativa x u(x) = 20 e a de y

    u(y) = 12, ento x prefervel a y. A principal vantagem da representao numrica das

    preferncias por uma funo utilidade que o problema de escolher a melhor alternativa

    torna-se um simples problema de maximizao matemtica.

    Cantor provou o seguinte teorema:

    Teorema (Cantor, 1915): Se a relao de preferncia % sobre o conjunto de alternativasX satisfaz os axiomas C1C2, ento existe uma funo utilidade u : X ! R que representa%. Alm disso, essa funo nica, salvo transformaes crescentes de u.

    Esse um resultado poderoso. Toda teoria econmica da tomada de deciso sob incerteza

    comea por um teorema desse tipo. Com relao ao problema da fundamentao compor-

    tamental da probabilidade subjetiva, temos quatro modelos principais, que so os modelos

    de: 8>>>>>>>>>:John von Neumann & Oskar Morgenstern

    Frank Ramsey & Bruno de Finetti

    Leonard Savage

    Francis Anscombe & Robert Aumann

    10

  • 3.1 von Neumann & Morgenstern

    A idia bsica do modelo de von Neumann & Morgenstern que denotaremos por vNM adaptar o teorema de Cantor ao problema de escolha da melhor alternativa sob condies de

    incerteza. A origem dessa idia, apenas para variar, remonta, na verdade, a Daniel Bernoulli,

    que, em 1738, apresentou o famoso paradoxo de So Petersburgo. Considere uma moeda

    honesta, ou seja, tal que as probabilidades de cara e coroa so de 50% cada. A moeda

    lanada repetidas vezes at sair cara a primeira vez. Se isso ocorrer no no lanamento, o

    jogador ganha $2n: Ora, a probabilidade de sair cara a primeira vez no no lanamento :

    1

    2 1

    2| {z }coroa em n1 lanam entosconsecutivos

    12|{z}

    cara no nolanam ento

    =1

    2n

    O jogador ganha $2n com probabilidade 12n. Portanto, o valor esperado :

    1Xn=1

    1

    2n $2n =1

    isto , o valor esperado do jogo innito. Se esse o caso, o jogador deveria estar disposto

    a pagar uma quantia innita para participar desse jogo. O paradoxo que as pessoas esto

    dispostas a pagar apenas uma quantia nita. A soluo de Bernoulli foi sugerir que as

    pessoas maximizam uma funo utilidade, em vez do mero valor monetrio. A quantia $2n

    d ao indivduo uma utilidade u(2n). Se essa funo for limitada, ento:

    1Xn=1

    1

    2n u(2n)

  • com probabilidade 50% e z com probabilidade 20% loteria x com probabilidade 60%,

    y com probabilidade 10% e z com probabilidade 30%. A primeira loteria escrita como

    P = x [30%] y [50%] z [20%] e a segunda Q = x [60%] y [10%] z [30%]. Aqui,Augur no diz algo do tipo x % y, mas sim algo como P % Q: Denote por L o conjunto detodas as loterias sobre o conjunto de alternativas X. Suponha que Augur possui uma relao

    de preferncia % sobre L.Considere os seguintes axiomas:

    vNM1 Ordem fraca: % completa e transitiva:

    vNM2 Continuidade: 8P;Q;R 2 L, se P Q R, ento 9; 2 (0; 1) de tal sorte queP + (1 )R Q P + (1 )R.

    vNM3 Independe^ncia: 8P;Q;R 2 L e 8 2 (0; 1), temos que P % Q () P + (1 )R %Q+ (1 )R.

    A expresso P + (1 )R, para 0 < < 1; denota uma loteria composta. Na verdade,a expresso deveria ser P (1) R, mas, por comodidade, usaremos indistintamenteos dois modos. Ela diz que, com probabilidade , o indivduo enfrentar a loteria P , e,

    com probabilidade 1 , enfrentar a loteria R. Quanto mais prximo de 1 o valor de ,ento maior a chance de se obter a loteria P e, portanto, menor a chance de se obter a

    loteria R. O que diz, assim, o axioma da continuidade? Imagine que Augur tem diante de

    si duas loterias, a saber, P e R. A ele so oferecidas duas loterias compostas: a primeira

    P +(1)R, que d mais chance de se obter P do que R; a segunda P +(1)R, qued, ao contrrio, mais chance se obter R do que P . Pelo axioma da continuidade, sempre

    existe uma loteria Q que, na escala de gostos de Augur, intermediria entre essas duas

    loterias compostas.

    E o que diz o axioma da independncia? Suponha que Augur se defronta com duas

    loterias, digamos, P e Q, e que, de acordo com suas preferncias, P % Q, ou seja, ele prefereP a Q (ou, no mnimo, indiferente entre ambas). Surge, ento, uma terceira loteria, R. Se

    ele considerar duas loterias compostas, uma sendo P com R, outra sendo Q com R, ento

    a ordenao no varia. Em outras palavras, se Augur prefere P a Q, ento a composio

    de cada uma dessas duas loterias com uma terceira loteria, R, no altera o fato de que P

    preferida a Q, mesmo quando estas so compostas com uma terceira.

    12

  • Vejamos um exemplo. A loteria P :

    P = ($6) [40%] ($0) [60%]

    o que lido da seguinte forma: com 40% de probabilidade, Augur ganha 6 sestrcios e, com

    probabilidade de 60%, Augur ganha nada. A loteria Q :

    Q = ($2) [20%] ($1) [80%]

    Com 20% de probabilidade, Augur ganha 2 sestrcios e, com 80% de probabilidade, ganha

    1 sestrcio. Digamos que Augur prefere (estritamente) P a Q, isto , P Q. Uma terceiraloteria aparece, R, denida como:

    R = ($3) [100%]

    ou seja, Augur ganha 3 sestrcios com certeza. Considere a composio meio-a-meio de P

    com R, a saber, 12P+ 1

    2R: fcil entender essa composio. Imagine que uma moeda honesta

    lanada. Se sair cara, Augur joga a loteria P ; se sair coroa, joga R. J a composio12Q + 1

    2R signica que, sendo lanada uma moeda honesta e saindo cara, Augur joga a

    loteria Q, mas saindo coroa, joga R. Pelo axioma da independncia, se P Q, ento12P + 1

    2R 1

    2Q+ 1

    2R. Reciprocamente, se 1

    2P + 1

    2R 1

    2Q+ 1

    2R, ento P Q:

    Vejamos um outro exemplo, um que seja ainda mais simples. Considere duas loterias, P

    e Q, denidas por:

    P = ($90) [100%]Q = ($50) [100%]

    A loteria P diz que Augur ganha 90 sestrcios com certeza; Q diz que Augur ganha 50

    sestrcios com certeza. Elas no parecem realmente loterias no sentido leigo do termo,

    uma vez que no h aleatoriedade. Porm, no deixam de ser casos particulares do conceito

    formal de loteria. Augur no titubeia em armar que, para ele, P Q. Uma terceira loteriasurge, R, denida por:

    R = ($x) [100%]

    em que x 0 qualquer valor monetrio. Neste caso, 12P + 1

    2R signica que, primeiro,

    Augur lana uma moeda honesta. Em segundo lugar, se sair cara, ele ganha 90 sestrcios;

    13

  • se coroa, x sestrcios. Analogamente, 12Q+ 1

    2R signica que Augur, lanando uma moeda

    honesta e saindo cara, ganha 50 sestrcios, e que, saindo coroa, x sestrcios. Nas duas

    loterias compostas, Augur ganha x com 50% de probabilidade. Ento a diferena s pode

    residir no ganho no evento complementar. Na primeira loteria, ele ganha 90 com 50%; na

    segunda, 50. Ento, o que podemos deduzir do comportamento de Augur, se o axioma da

    independncia for satisfeito, que, diante das loterias 12P + 1

    2R e 1

    2Q + 1

    2R, ele dir que

    12P + 1

    2R 1

    2Q + 1

    2R. A recproca ainda mais interessante. Se ele disser que 1

    2P + 1

    2R

    12Q+ 1

    2R, ento podemos armar que, para Augur, P Q:

    Chegamos, enm, ao teorema de von Neuman & Morgenstern:

    Teorema (von Neuman e Morgenstern): Se a relao de preferncia % sobre o conjuntode loterias L sobre as alternativas em X satisfaz os axiomas vNM1 vNM3, ento existeuma funo utilidade u : X ! R tal que, para quaisquer loterias P;Q 2 L :

    P % Q ()Xx2X

    u(x)P (x) Xx2X

    u(x)Q(x)

    Alm disso, essa funo nica, salvo transformaes ans positivas de u.

    Uma transformao am positiva de u qualquer outra utilidade v denida por v(x) =

    au(x) + b, em que a > 0 qualquer nmero positivo e b 2 R qualquer nmero real.O teorema de von Neumann & Morgenstern arma que, se as preferncias % de Augur

    quanto s loterias P 2 L denidas sobre o conjunto de alternativas X satisfazem os axiomasde ordenao fraca, de continuidade e de independncia, ento uma deciso do tipo P % Q equivalente ao resultado decorrente do seguinte processo mental:

    (1o) por alguma razo subjetiva, Augur avalia o valor de cada alternativa x mediante uma

    regra que associa a cada alternativa x um nmero u(x), dito a utilidade de x;

    (2o) diante da loteria P , que nada mais do que uma distribuio de probabilidade sobre

    as alternativas, Augur computa a probabilidade P (x) de cada alternativa x;

    (3o) de posse do valor numrico u(x) de cada alternativa x 2 X e de sua probabilidade P (x),Augur computa a utilidade esperada decorrente da loteria P :

    EP (u) =Xx2X

    u(x)P (x);

    14

  • (4o) ele faz o mesmo para a loteria Q, isto , calcula:

    EQ(u) =Xx2X

    u(x)Q(x);

    (5o) diante das loterias P e Q, ele conclui que EP (u) EQ(u), isto , queXx2X

    u(x)P (x) Xx2X

    u(x)Q(x);

    (6o) se, em vez de atribuir a cada alternativa x 2 X o valor numrico u(x), de acordo coma utilidade u, ele atribuir o valor nmerico v(x) = au(x) + b, em que a > 0 qualquer

    nmero positivo e b 2 R qualquer nmero real, de acordo com a utilidade v, entotanto u como v representam as mesmas preferncias % e so indistingves para oprocesso decisrio.

    3.2 Ramsey & de Finetti

    As contribuies de Ramsey e de Finetti so da dcada de 1930 e, portanto, anteriores s

    de von Neumann e Morgenstern. A diferena que eles no levaram em conta o insight

    de Bernoulli quanto utilidade esperada, mas apenas os valores monetrios associados s

    loterias.

    A partir dos axiomas comportamentais listados por de Finetti, a deciso de um indivduo

    diante das alternativas disponveis equivalente deciso decorrente da comparao de

    valores monetrios esperados de acordo com uma distribuio de probabilidade subjetiva. O

    que de Finetti prova, em suma, que existe uma distribuio de probabilidade subjetiva que

    explica o comportamento do indivduo.

    Suponha que Augur conhece o mundo e sabe que a totalidade do mundo dada por

    um nmero nito n de possveis estados do mundo, = f!1; : : : ; !ng. Uma aposta umvetor x = (x1; : : : ; xn), em que xi denota o ganho monetrio se ocorrer o estado do mundo

    !i, qualquer que seja i = 1; : : : ; n. O conjunto de apostas denotado por X. No modelo de

    de Finetti, Augur possui preferncias % sobre apostas x 2 X.de Finetti considera os seguintes axiomas:

    dF1 Ordem fraca: % completa e transitiva:

    15

  • dF2 Continuidade: 8x 2 X, os conjuntos fy 2 X : y xg e fy 2 X : x yg so abertos(na topologia de X).

    dF3 Aditividade: 8x; y; z 2 X, x % y () x+ z % y + z:

    dF4 Monotonia: 8x; y; z 2 X, se xi yi, 8i = 1; : : : ; n, ento x % y:

    dF5 N~ao trivialidade: 9x; y 2 X tais que x y:

    Os axiomas de ordenao fraca e de continuidade no merecem comentrios. Aquele

    porque dele j falamos. Este por ser um requerimento tcnico. O axioma da aditividade

    implica o que os economistas chamam de neutralidade ao risco. Em outras palavras, o que

    importa para Augur o valor monetrio esperado e no a utilidade esperada. O axiomada no-trivialidade implicar a unicidade da medida de probabilidade subjetiva.

    Teorema (de Finetti): Se a relao de preferncia % sobre o conjunto de alternativasX satisfaz os axiomas dF1 dF5, ento existe uma nica distribuio de probabilidadep = (p1; : : : ; pn) tal que tal que, para quaisquer alternativas x; y 2 X :

    x % y ()nXi=1

    pixi nXi=1

    piyi

    Lembrando que uma aposta um vetor x = (x1; : : : ; xn) e que p = (p1; : : : ; pn), em

    que pi a probabilidade subjetiva atribuda alternativa xi, ento x % y se, e somente se,p1x1+ + pnxn p1y1+ + pnyn: Em outras palavras, se as preferncias de Augur sobreas apostas satisfazem os axiomas de de Finetti, ento qualquer deciso de Augur do tipo

    x % y equivalente ao seguinte processo mental:

    (1o) Augur possui uma distribuio de probabilidade subjetiva p = (p1; : : : ; pn) sobre as

    apostas x 2 X;

    (2o) de posse dessa distribuio de probabilidade subjetiva, Augur avalia uma aposta x de

    acordo com seu retorno monetrio esperado, ou seja, ele computa p1x1 + + pnxn;

    (3o) ele faz o mesmo para a aposta y, isto , ele calcula p1y1 + + pnyn;

    (4o) diante das apostas x e y, ele opta por aquela com maior retorno esperado.

    Note que, se denirmos u(x1; : : : ; xn) = p1x1 + + pnxn, ento o teorema de de Finettidiz que existe uma nica funo de utilidade que representa as preferncias de Augur.

    16

  • 3.3 Savage

    de Finetti mostra como obter probabilidades subjetivas a partir de preferncias. J von Neu-

    mann & Morgenstern mostram como obter utilidades dadas distribuies de probabilidade.

    O modelo de Savage, ao contrrio dos modelos anteriores, parte apenas de estados abstratos

    do mundo e de um conjunto de conseqncias. No h nmero algum! No h qualquer

    mensurao de eventos ou de desejabilidade de conseqncias! No h sequer uma estrutura

    algbrica que facilite o uso da matemtica, como o zeram de Finetti e von Neumann &

    Morgenstern, os quais se valeram do teorema de separao de conjuntos convexos! Mesmo

    assim, Savage mostra que os axiomas listados por ele equivalem existncia tanto de uma

    funo utilidade como de uma distribuio de probabilidade subjetiva.

    H, assim, apenas dois conceitos primitivos:8

  • Dados dois atos f; g 2 F e um evento A S, dena um ato f gA : S ! X por:

    f gA(s) =

    8

  • O axioma de ordenao fraca j bvio.

    O princpio da coisa-certa diz que a preferncia sobre dois atos quaisquer f e g depende

    apenas dos valores de f e g quando eles diferem. O evento A = fs 2 S : f(s) 6= g(s)g lista osestados da natureza para os quais os atos f e g tm conseqncias diferentes. Ento, em Ac;

    f e g coincidem. Assim, a preferncia sobre os atos f e g depende apenas da preferncia sobre

    os atos f e g quando restritos aos estados do mundo para os quais as suas conseqncias so

    diferentes.

    O axioma da monotonia diz que, se, para qualquer evento A S no-nulo (ou seja,relevante), o ato f traz as mesmas conseqncias que o ato g, qualquer que seja o estado

    do mundo, e se, para algum estado especco, a conseqncia que o ato f traz preferida

    conseqncia que o ato g traz, ento o ato f preferido ao ato g.

    O axioma da invarincia interessante. Suponha que Augur quer saber se Anebo acha

    que o evento A = fPorfrio escrever uma carta a Anebog S mais provvel do que oevento B = fO magister e os dois decuriones no iro ao Templo de Mitra no solstcio deinvernog S: Suponha ainda que Augur sabe que, para Anebo, se x = 100 sestrcios ey = 10 sestrcios, ento x y: Augur faz a Anebo a seguinte pergunta: Voc prefere aloteria que lhe d x na ocorrncia do evento A e y no caso contrrio ou prefere a loteria

    que lhe d x se ocorrer o evento B e y no caso contrrio?Se Anebo escolher a primeira

    loteria, ento porque ele cr que o evento A mais provvel. Em outras palavras, y xA % y xB.Augur, usando o instrumento de medida dado pelo par (x; y), descobriu que Anebo cr ser

    o evento A mais provvel que B. O axioma da invarincia diz que, se Augur utilizar outro

    instrumento, digamos, (z; w), a concluso no pode ser diferente.

    O axioma da no-trivialidade serve para mostrar que a probabilidade subjetiva nica.

    O axioma da continuidade de atos diz que o mundo S no pode ser muito grande nem

    muito pequeno, pois devemos ser capazes de particion-lo em um nmero nito de eventos

    no muito signicantes de tal sorte que perturbaes de quaisquer dois atos nesses eventos

    no alterem a escolha. Se o mundo fosse grande demais, talvez jamais pudssemos encontrar

    um nmero nito de eventos com essa propriedade; e se fosse pequeno demais, quaisquer

    eventos seriam signicantes em relao ao mundo.

    Considere dois atos f e g quaisquer tais que f g. Quando Augur escolhe o ato f ,ele sabe qual a conseqncia f(s) 2 X em cada estado do mundo s 2 S: Pelo axioma dacontinuidade de atos, deve existir, dado qualquer outro ato h, uma partio do mundo em

    19

  • um nmero nito, digamos, m, de eventos disjuntos, ou seja, eventos A1; : : : ; Am S taisque S = A1 [ A2 [ [ Am, com Ai \ Aj = ;, para qualquer i 6= j, para i; j = 1; : : : ;m,partio essa para a qual f hAi g e f g hAi. Lembre que:

    f hAi(s) =

    8

  • do mundo uma conseqncia nesse estado, preferido a qualquer conseqncia particular

    g(s) 2 X prescrita pelo ato g. Ento, pelo axioma da continuidade de conseqncias, o atof deve ser preferido ao ato g, num sentido global, no apenas sob a ocorrncia do evento A

    ou estado a estado. Isso explica em palavras o contedo da parte (a) do axioma. A parte

    (b) anloga. um axioma meramente tcnico, mas sem ele Savage no consegue mostrar

    que preferncias satisfazendo os seis primeiros axiomas so representadas por uma funo de

    utilidade esperada.

    Teorema (Savage): Suponha que X nito. Ento a relao de preferncia % sobre oconjunto de atos F satisfaz os axiomas S1 S6 se, e somente se, existe uma nica medidade probabilidade no-atmica nitamente aditiva sobre (S; 2S) e existe uma funo de

    utilidade (no-constante) u : X ! R tais que, para quaisquer atos f; g 2 F :

    f % g ()ZS

    u(f(s))d(s) ZS

    u(g(s))d(s)

    Alm disso, a utilidade u nica, salvo transformaes ans positivas.

    Se X for innito, basta adicionar S7 e impor a condio de que a funo de utilidade u

    seja limitada, pois do contrrio teramos o paradoxo de So Petersburgo. A expresso:

    E [u(f)] ,ZS

    u(f(s))d(s)

    , por denio, a utilidade esperada do ato f . A escolha do ato f prescreve a conseqncia

    f(s) 2 X em cada estado do mundo s 2 S. Cada conseqncia f(s) d uma utilidadeu(f(s)). Toma-se em seguida a soma ponderada (pela medida ) desses nveis de utilidade.

    A medida a probabilidade subjetiva consistente com o comportamento de Augur

    regulado pelos axiomas de Savage. O teorema de Savage garante que essa probabilidade

    apenas nitamente aditiva, o que signica que, para quaisquer eventos A;B S disjuntos,vale a seguinte regra: a probabilidade da unio A [B igual soma das probabilidades deA e de B. Em outras palavras, 8A;B S tais que A \B = ;:

    (A [B) = (A) + (B)

    No enunciado temos tambm o smbolo (S; 2S). O que isso? O conjunto 2S denota

    a coleo formada por todos os subconjuntos de S, ou seja, a coleo de todos os eventos.

    Assim, (S; 2S) designa o fato de que, alm de Augur conhecer a totalidade do mundo, que,

    21

  • lembre-se, innito, ele conhece todos os eventos possveis e pode atribuir a cada um de-

    les uma probabilidade subjetiva de ocorrncia. Uma vez que sua probabilidade subjetiva

    nitamente aditiva, embora ele tenha todo esse saber, ele no consegue mensurar probabilis-

    ticamente unies innitas de eventos, apenas unies nitas.

    A propriedade de aditividade nita da medida de probabilidade pode parecer algo tcnico

    demais para merecer qualquer ateno de algum esprito mais crtico. A verdade, porm,

    no essa3. A teoria de Savage sofre de um problema muito grave: o paradoxo de Ellsberg.

    Mais adiante falaremos dele e veremos que s se pode resolv-lo se a probabilidade subjetiva

    deixar de ser aditiva e se tornar sub-aditiva.

    Os axiomas S1 S4 so os mais criticados.De acordo com os axiomas S3 e S4, os gostos so separados das crenas. Lembre-se de

    que podemos mergulhar o conjunto de conseqncias X no conjunto de atos F . Para cadaconseqncia x 2 X, tome o ato f[x] 2 F denido por:

    f[x](s) = x

    ou seja, qualquer que seja o estado do mundo s, o ato f[x] acarreta sempre a mesma conse-

    qncia, x. O axioma da monotonia aplicado ao ato f[x] implica que, para qualquer evento

    A S, x % y () (f[x])xA % (f[x]) yA: Ora:

    (f[x])xA(s) =

    8

  • preferido a y (ou seja, x % y) e o fato de que x fracamente preferido a ele mesmo, x (ouseja, x % x, j que % uma ordem fraca). mesma concluso se chega a partir do axioma da invarincia, mas j no necessrio

    entrar novamente nesse labirinto de detalhes tcnicos.

    Em suma, a preferncia de Augur por x em detrimento de y independe do estado do

    mundo e, portanto, no est sujeita a qualquer crena que Augur tenha quanto aos estados

    do mundo. A forma como as preferncias de Augur se manifestam diante das alternativas x

    e y decorrncia to-somente da posio de Augur relativamente s conseqncias. Dessa

    forma, o modelo de Savage pressupe que os gostos so separados das crenas. No importa

    qual a crena de Augur quanto aos eventos A = fPorfrio escrever uma carta a Aneboge B = fJmblico sonhar com Plotinog: Suas crenas no mudaro o fato de que Augurprefere x = 100 sestrcios a y = 10 sestrcios.

    Esse um problema srio, porquanto fato que as preferncias de qualquer indivduo

    podem mudar conforme as circunstncias. O contra-exemplo clssico o seguinte:8>>>>>>>>>:x = roupa de banho

    y = guarda-chuva

    A = chuva

    Ac = no-chuva

    Nesse caso, se ocorre o evento Ac, ento x y e, se ocorre o evento A, ento y x.Savage, porm, perspicaz que era, foi cuidadoso ao expor sua teoria. Ele dizia que esse

    contra-exemplo no funcionava, pois a denio de conseqncia deve ser precisa o suciente

    para caracterizar de forma total e determinstica o bem-estar do indivduo. Bens fsicos

    como roupas de banho e guarda-chuvas no podem ser tomados como conseqncias, pois a

    utilidade que o indivduo tiraria do consumo ou uso desses bens incerta. Com efeito, como

    o prprio contra-exemplo procura mostrar, a utilidade depende do estado do mundo. Para

    Savage, se o contra-exemplo acima contra-exemplo de algo, certamente no pode ser contra-

    exemplo de seu modelo. Uma conseqncia no contexto associado ao contra-exemplo deveria

    ser algo como bronzear-se na praia quando estiver sole caminhar sob chuva usando roupa

    de banho. Cada conseqncia deve ser uma descrio completa e determinstica de algo,

    livre de quaisquer incertezas.

    Robert Aumann e Savage trocaram correspondncias no incio dos anos 1970. Aumann

    oferece um contra-exemplo talvez mais slido. Augur casado com Laetitia e so felizes.

    23

  • Laetitia, porm, est muito doente. Seu mdico, Asclepius, diz a Augur que a probabilidade

    de Laetitia sobreviver s sanguessugas de 50%. Conante que na sabedoria de Asclepius,

    Augur no duvida dessa probabilidade. Se algum perguntar a Augur sobre as chances de

    sobrevivncia da doce e amada Laetitia, Augur dir que so de 50%. Tentando elicitar a

    probabilidade subjetiva de Augur quanto s chances de Laetitia, Anebo pede-lhe que diga

    qual dos atos seguintes ele prefere:

    f =

    8

  • 50% de ocorrncia. Essa probabilidade objetiva, porquanto sabe-se a proporo exata de

    cada cor na urna I.

    Diante da urna II, os indivduos tambm manifestam indiferena, ou seja, o indivduo

    atribui 50% de probabilidade ocorrncia de cada cor. Neste caso, a proporo 50% 50%de preferncia por cada cor, entretanto, decorre da utilizao do princpio da indiferena. O

    indivduo possui total ignorncia quanto distribuio das cores na urna II.

    At aqui tudo bem... Mas, quando aos indivduos perguntado se eles preferem apostar

    na cor vermelha com a urna I ou se preferem apostar no vermelho com a urna II, os indivduos

    optam pela urna I. Eles preferem a urna cuja distribuio de probabilidade de cores

    conhecida urna cuja distribuio desconhecida. Eles preferem a urna cuja probabilidade

    da cor vermelha 50% quela cuja probabilidade pode ser qualquer coisa entre 0% e 100%.

    Essa uma clara violao do princpio da coisa-certa. Lembre-se de que, pelo princpio da

    coisa-certa, a preferncia sobre os atos f e g depende apenas da preferncia sobre os atos f e

    g quando restritos aos estados do mundo para os quais as suas conseqncias so diferentes.

    O conjunto de estados S = fV V; V P; PV; PPg, em que V P signica vermelho na urnaI e preto na urna II, e assim sucessivamente. Os atos so F = fIV; IP; IIV; IIPg, em quef1 , IV denota uma aposta na bola vermelha da urna I etc. Temos, assim, a seguinte matrzde deciso:

    f2Fns2S s1 , V V s2 , V P s3 , PV s4 , PPf1 , IV 100 100 0 0f2 , IP 0 0 100 100f3 , IIV 100 0 100 0f4 , IIP 0 100 0 100

    Considere o evento A = fV V; PPg. Ento:

    8s =2 A; IV (s) = IIP (s) e IP (s) = IIV (s)8s 2 A; IV (s) = IIV (s) e IP (s) = IIP (s)

    No evento Ac, os atos IV e IIP so iguais. Dessa forma, se, na ocorrncia do evento Ac,

    trocarmos um ato pelo outro, mantendo-os iguais, as preferncias entre eles no mudaro.

    Mas se mudarmos IV e IIP em Ac igualando-os a IP = IIV , IV torna-se IIV e IIP torna-se

    IP . O axioma S2 ento implica que:

    IV % IIP () IIV % IP

    25

  • enquanto que:

    IV IP IIV IIP

    uma contradio.

    O paradoxo de Ellsberg mostra que os indivduos tm averso incerteza, um conceito

    que deve ser contraposto ao conceito de averso ao risco. A diferena entre incerteza e risco

    foi sugerida por Frank Knight (1921) em sua obra Risk, Uncertainty and Prot. O que ele

    sugeriu que, entre ter uma distribuio de probabilidade e no ter, o indivduo prefere ter.

    Risco a medida de variabilidade dos resultados de um fenmeno aleatrio computado com

    a ajuda de uma distribuio de probabilidade, seja ela objetiva ou subjetiva. Incerteza

    quando essa distribuio ausente ou, se existente, no nica.

    3.4 Anscombe-Aumann

    Anscombe e Aumann propuseram uma teoria baseada na de Savage, mas com algumas

    generalizaes. O ponto crucial que diferencia uma da outra a formalizao do conceito

    de ato. Recorde que, para Savage, ato uma funo f : S ! X, ou seja, uma regra fque especica, para cada estado do mundo s 2 S, o resultado ou conseqncia ou outcomef(s) 2 X: Para entendermos o modo pelo qual Anscome e Aumann denem o ato, denotepor (X) o conjunto de todas as distribuies de probabilidade sobre os resultados em X.

    Assim, um elemento 2 (X) uma distribuio de probabilidade sobre os resultados. Emoutras palavras, uma loteria sobre X. Para Anscombe e Aumann, um ato uma funo

    f : S ! L, em que L (X) um subconjunto de loterias com suporte nito. Umaloteria tem suporte nito se atribui probabilidades positivas apenas a um nmero nito de

    resultados. Com um certo abuso de notao, denotemos tambm por F o conjunto de atos la Anscome-Aumann.

    Essa pequena modicao matemtica na denio de ato faz uma diferena profunda,

    pois faz com que, no modelo de Anscome e Aumann, haja duas fontes de incerteza:

    (i) incerteza sobre o mundo S, chamada de incerteza subjetiva, pois nenhuma probabili-

    dade objetiva dada aqui;

    (ii) incerteza sobre o conjunto X de resultados ou conseqncias, chamada de incerteza

    objetiva, pois, uma vez o indivduo tendo escolhido o ato f e a natureza tendo escolhido

    26

  • o estado do mundo s, o indivduo tem uma probabiulidade objetiva f(s) sobre as

    coneqncias em X.

    No modelo de Savage, o indivduo tem uma probabilidade subjetiva sobre os estados do

    mundo. Aqui, alm disso, o indivduo tem uma probabilidade objetiva sobre as conseqn-

    cias. Portanto, o indivduo escolhe o ato f : S ! L, em que L (X). A natureza escolheo estado do mundo s 2 S e, desse modo, o indivduo obtm a distribuio de probabilidadef(s) sobre X. Como essa distribuio tem suporte nito, ela atribui probabilidade postiva a

    apenas um nmero nito de resultados. Assim, f(s)(x) denota a probabilidade do resultado

    x de acordo com a distribuio de probabilidade f(s). Essa distribuio tem sua origem no

    ato escolhido pelo indivduo e no estado do mundo escolhido pela natureza.

    As preferncias tambm so denidas sobre atos. Portanto, a relao de preferncias

    tambm uma relao binria sobre F .Os axiomas de Anscombe- Aumann so os seguintes:

    AA1 Ordem fraca: % completa e transitiva:

    AA2 Continuidade : 8f; g; h 2 F tais que f g h, 9; 2 (0; 1) tais que f +(1)h g f + (1 )h:

    AA3 Monotonia: 8f; g 2 F , f(s) % g(s);8s 2 S =) f % g:

    AA4 Independe^ncia: 8f; g; h 2 F e 8 2 (0; 1); f % g () f + (1)h % g+ (1)h:

    AA5 N~ao trivialidade: 9f; g 2 F tais que f g:

    Os axiomas AA1AA3 da ordenao fraca, da continuidade e da independncia soos mesmo axiomas de von Meumann e Morgenstern vNM1 vNM3. A nica diferena que, l, as preferncias eram denidas sobre loterias em X; aqui, so denidas sobre atos

    la Anscome-Aumann.

    O axiomaAA5 da no-trivialidade serve apenas para impor a unicidade da probabilidade

    subjetiva consistente com o comportamento baseado na maximizao da utilidade esperada.

    Considere dois atos f e g tais que f(s) % g(s);8s 2 S: Recorde que f(s) e g(s) sodistribuies de probabilidade sobre X. A condio f(s) % g(s);8s 2 S, signica que,qualquer que seja o estado do mundo s 2 S, o indivduo prefere a distribuio f(s)

    27

  • distribuio g(s). Se esse for o caso, ento o axioma da monotonia diz que o indivduo

    prefere o ato f ao ato g.

    Tambm no modelo de Anscombe e Aumann, devido ao axioma da monotonia, os gostos

    so separados das crenas.

    Teorema (Anscombe & Aumann): A relao de preferncia % sobre o conjunto deatos F satisfaz os axiomas AA1AA5 se, e somente se, existe uma nica medida deprobabilidade sobre S e existe uma funo de utilidade (no-constante) u : X ! R taisque, para quaisquer atos f; g 2 F :

    f % g ()ZS

    Ef(s) [u]

    d(s)

    ZS

    Eg(s) [u]

    d(s)

    em que Ef(s) [u] ,P

    x2X u(x)f(s)(x). Alm disso, a utilidade u nica, salvo transfor-

    maes ans positivas.

    Se as preferncias de Augur sobre atos satisfazem os axiomas de Anscombe e Aumann,

    ento qualquer deciso de Augur do tipo f % g equivalente ao seguinte processo mental:

    (1o) Se Augur escolhesse o ato f 2 F , ele esperaria a deciso da natureza quanto ao estadodo mundo s 2 S.

    (2o) Uma vez conhecendo o verdadeiro estado do mundo, ele descobre que f(s) 2 L (X) a distribuio de probabilidade sobre resultados em X. Assim, f(s)(x) a

    probabilidade de ocorrncia da conseqncia x 2 X.

    (3o) Augur avalia cada resultado x 2 X de acordo com uma funo utilidade u : X ! R,atribuindo a x o valor numrico u(x).

    (4o) De posse da probabilidade f(s)(x) de cada conseqncia e de sua utilidade u(x), ele

    calcula a utilidade esperada:

    Ef(s) [u] ,Xx2X

    u(x)f(s)(x)

    (5o) S que a natureza ainda no determinou o estado do mundo, mas Augur j sabe qual

    a sua utilidade esperada (sobre as conseqncias), Ef(s) [u] ; para cada estado s 2 S:

    28

  • (6o) Dado que Augur tem uma probabilidade subjetiva sobre os estados do mundo, ele cal-

    cula a mdia de todas os valores Ef(s) [u] de acordo com a distribuio de probabilidade

    : ZS

    Ef(s) [u]

    d(s)

    (7o) Ele faz o mesmo para o ato g, calculando:ZS

    Eg(s) [u]

    d(s)

    (8o) Por m, ao comparar os atos f e g, ele opta por aquele com maior valor. No caso,

    Augur conclui queRS

    Ef(s) [u]

    d(s) R

    S

    Eg(s) [u]

    d(s).

    As vantagens do modelo de Anscombe e Aumann so que ele permite espao nito de

    resultados e dois tipos de incerteza: objetiva e subjetiva.

    4 Teorias comportamentais alternativas

    Teorias alternativas so aquelas que relaxam alguns dos axiomas de Savage. H trs caminhos

    para tanto:

    manter a noo de probabilidade, mas abandonar o projeto comportamental;

    manter o projeto comportamental, mas adotar uma noo diferente de crena, emparticular, probabilidades no-aditivas;

    uma combinao das duas anteriores: diferentes noes de crena e diferentes tipos dedenies primitivas (no necessariamente comportamentais).

    Nesta seo apresentaremos duas teorias alternativas que seguem o segundo caminho: a

    teoria da utilidade esperada de Choquet e a teoria maxmin de Gilboa e Schmeidler.

    4.1 Teoria da utilidade esperada de Choquet

    O objetivo desta teoria superar o paradoxo de Ellsberg. Sua caracterstica principal que

    a medida de probabilidade no aditiva: ela no-aditiva. Uma probabilidade no-aditiva

    dita uma capacidade de Choquet. Se S denota o mundo, uma capacidade de Choquet

    denida como uma regra que associa a cada evento um valor numrico (entre 0 e 1) tal

    que:

    29

  • (a) (;) = 0

    (b) 8A;B S, se A B, ento (A) (B)

    (c) (S) = 1

    Essa denio mais fraca do que a denio tradicional de probabilidade, porquanto

    no requer que, para dois eventos A;B S disjuntos quaisquer, isto , com A \ B = ?,valha a aditividade da medida, a saber, que (A [B) = (A) + (B).Inicialmente temos que saber como calcular a esperana matemtica de acordo com uma

    capacidade. Seja fE1; : : : ; Emg uma partio de S e seja f : S ! R uma varivel aleatriaque assume o valor numrico xi quando ocorre um estado do mundo s 2 Ei: Isso escritocomo:

    f(s) =

    8>>>:x1; se s 2 E1...

    ...

    xm; se s 2 Emo que pode ainda ser reescrito como:

    f(s) =mXi=1

    xi1Ei(s)

    em que:

    1Ei(s) =

    8

  • Se calculssemos a esperana dessa varivel aleatria segundo o mtodo da integral de

    Riemann, faramos:

    R(f; ) =mXi=1

    xi(Ei)

    Pelo mtodo de Choquet, devemos fazer:

    C(f; ) =mXi=1

    (xi xi+1)([ij=1Ej)

    com xm+1 0. Se a capacidade for aditiva, ento ser uma medida de probabilidadeusual e, portanto, C(f; ) = R(f; ): Tambm simbolizaremos a integral de Choquet de f deacordo com a capacidade por:

    C(f; ) ,hChoquetiZ

    S

    f(s)d(s)

    A integral de Choquet possui a propriedade da comonotonia. Duas funes f e g so

    comonotnicas se @s; t 2 S tais que f(s) > f(t) e g(s) < g(t). Equivalentemente, as funesf e g so comonotnicas se 8s; t 2 S tivermos f(s) f(t) e g(s) g(t)ou f(s) f(t)e g(s) g(t). Em palavras, f e g so comonotnicas se variam sempre na mesma direoconforme o estado do mundo.

    David Schmeidler (1986) usa a comonotonia da integral de Choquet para introduzir um

    axioma comportamental mais fraco do que a monotonia.

    Para Schmeidler, um ato uma regra f : S ! L, em que L (X); que associa a cadaestado do mundo s 2 S uma loteria f(s) 2 L sobre os resultados em X. O conjunto de atos denotado por F . Dois atos f; g 2 F so comonotnicos se no existem dois estados domundo s; t 2 S tais que f(s) f(t) e g(s) g(t), ou seja, que revertam a ordenao depreferncia conforme o estado do mundo. Considere dois atos comonotnicos f e g. Quando

    o estado do mundo s 2 S, esses atos do as loterias f(s) e g(s), respectivamente. Noestado do mundo t 2 S, eles do as loterias f(t) e g(t), respectivamente. Se, xado o atof , o indivduo manifestar a preferncia f(s) % f(t), ento a comonotonia entre f e g requerque g(s) % g(t). E se, ao contrrio, xado o ato f , o indivduo manifestar a prefernciaf(s) - f(t), ento a comonotonia entre f e g requer que g(s) - g(t). Em suma, o estado domundo no pode afetar a ordenao entre os atos comonotnicos.

    O modelo de Choquet troca o axioma AA4 de independncia de Anscombe-Aumann

    pelo axioma de independncia comonotnica seguinte:

    31

  • Ch4 Independe^ncia comonoto^nica: 8f; g; h 2 F atos 2-a-2 comonotnicos e 8 2 (0; 1) :f % g () f + (1 )h % g + (1 )h:

    Choquet, ento, relaxa o axioma da independncia, exigindo-o apenas quando os atos

    envolvidos so comonotnicos. Quando o indivduo compara atos no-comonotnicos, ele

    pode simplesmente desconsiderar o axioma da independncia. No paradoxo de Ellsberg, a

    independncia violada, mas os atos envolvidos no so comonotnicos. Dessa forma, o

    paradoxo de Ellsberg no se aplica ao modelo de Choquet. O que Choquet quer dizer no

    fundo que o modelo de Anscombe-Aumann no adequado para explicar o comportamento

    que deu origem ao paradoxo de Ellsberg porque os indivduos, na verdade, no satisfazem

    o axioma da independncia. A conseqncia dessa pequena mudana que a probabilidade

    subjetiva torna-se no-aditiva, isto , torna-se uma capacidade de Choquet.

    Teorema (Choquet): A relao de preferncia % sobre o conjunto de atos F satisfazos axiomas AA1AA3, Ch4 e AA5 se, e somente se, existe uma nica capacidade deChoquet sobre S e existe uma funo de utilidade (no-constante) u : X ! R tais que,para quaisquer atos f; g 2 F :

    f % g ()hChoquetiZ

    S

    Ef(s) [u]

    d(s)

    hChoquetiZS

    Eg(s) [u]

    d(s)

    (a integral sendo no sentido de Choquet). Alm disso, a utilidade u nica, salvo transfor-

    maes ans positivas.

    Se as preferncias de Augur sobre atos satisfazem os axiomas de Choquet, que so os

    mesmos de Anscombe-Aumann, salvo o da independncia, trocado pelo de independncia

    comonotnica, ento qualquer deciso de Augur do tipo f % g equivalente ao seguinteprocesso mental:

    (1o) Se Augur escolhesse o ato f 2 F , ele esperaria a deciso da natureza quanto ao estadodo mundo s 2 S.

    (2o) Uma vez conhecendo o verdadeiro estado do mundo, ele descobre que f(s) 2 L (X) a distribuio de probabilidade sobre resultados em X. Assim, f(s)(x) a

    probabilidade de ocorrncia da conseqncia x 2 X.

    32

  • (3o) Augur avalia cada resultado x 2 X de acordo com uma funo utilidade u : X ! R,atribuindo a x o valor numrico u(x).

    (4o) De posse da probabilidade f(s)(x) de cada conseqncia e de sua utilidade u(x), ele

    calcula a utilidade esperada:

    Ef(s) [u] ,Xx2X

    u(x)f(s)(x)

    (5o) S que a natureza ainda no determinou o estado do mundo, mas Augur j sabe qual

    a sua utilidade esperada (sobre as conseqncias), Ef(s) [u] ; para cada estado s 2 S:

    (6o) Dado que Augur tem uma probabilidade subjetiva no-aditiva (ou seja, uma capacidade

    de Choquet) sobre os estados do mundo, ele calcula a esperana, no sentido de

    Choquet, de todas os valores Ef(s) [u] de acordo com a capacidade :

    C(Ef() [u] ; ) =hChoquetiZ

    S

    Ef(s) [u] d(s)

    (7o) Ele faz o mesmo para o ato g, calculando:

    C(Ef() [u] ; ) =hChoquetiZ

    S

    Eg(s) [u] d(s)

    (8o) Por m, ao comparar os atos f e g, ele opta por aquele com maior valor. No caso,

    Augur conclui que:

    hChoquetiZS

    Ef(s) [u] d(s) hChoquetiZ

    S

    Eg(s) [u] d(s)

    4.2 Teoria da utilidade maximin de Gilboa & Schmeidler

    A teoria da utilidade maxmin de Ithzak Gilboa e David Schmeidler um caso particular

    da teoria de Choquet. A teoria de Choquet bastante geral e, por isso mesmo, no

    muito intuitiva. Gilboa e Schmeidler consideram probabilidades no-aditivas com a seguinte

    condio adicional: para quaisquer eventos A;B S, vale a desigualdade:

    (A) + (B) (A [B) + (A \B)

    33

  • Essa condio dita convexidade e generaliza aquela conhecida regra do Clculo de Proba-

    bilidades que diz que, para quaisquer eventos A;B S, (A[B) = (A)+(B)(A\B).Para entendermos o que ela signica, basta que consideremos dois eventos A;B S disjuntosquaisquer, isto , com A \B = ?. Ento, pela convexidade da capacidade:

    (A [B) (A) + (B)

    Em outras palavras, a juno dos eventos A e B aumenta o grau de crena. A soma dos

    graus de crena nos eventos disjuntos A e B, encarados separadamente, (A) + (B). Mas

    quando encarados conjuntamente, o grau de crena (A [ B) no evento A [ B formadopela juno dos dois eventos A e B maior. Decorre disso que a capacidade convexa , na

    verdade, uma medida de probabilidade sub-aditiva. Em particular, dado um evento A S eseu complementar Ac, a sub-aditividade de implica que:

    (A) + (Ac) 1

    No Clculo de Probabilidades usual, a regra (A) + (Ac) = 1. Na teoria de Gilboa e

    Schmeidler, ao contrrio, a regra (A) + (Ac) 1: O resduo (no-negativo) 1 (A)(Ac) pode ser visto como uma medida de averso incerteza. Quanto maior esse resduo,

    mais convexa a capacidade. essa averso incerteza que explica o paradoxo de Ellsberg.

    Quando os indivduos tm que escolher uma cor dentre as bolas da urna I, aquela com

    distribuio conhecida, eles no enfrentam incerteza propriamente, mas um risco calculado.

    J a escolha entre as urnas I e II apresenta um resduo positivo.

    O que sabe Augur sobre a verdadeira probabilidade (A)? Tudo o que ele sabe que:

    (A) (A) 1 (Ac)

    Assim, o grau de incerteza do evento A 1 (A) (Ac). A incerteza total dada por(A) = 0, em cujo caso:

    0 (A) 1ou seja, que a probabilidade verdadeira qualquer grau de crena entre 0% e 100%.

    Uma caracterstica magnca da capacidade convexa que ela descreve o comportamento

    decisrio de acordo com o critrio maxmim.

    Denote por M(S) o conjunto de todas as medidas de probabilidade aditivas sobre oestados do mundo. Considere o seguinte conjunto de medidas de probabilidades associado a

    uma capacidade convexa de Choquet :

    34

  • CORE() = fp 2M(S) : p(A) (A), 8A S, e p(S) = (S) = 1g

    O core da capacidade convexa (ou ncleo de ) o conjunto de todas as medidas aditivas

    (aquelas usuais) de probabilidade tais que:

    a crena subjetiva na totalidade do mundo a mesma tanto para a capacidade quantopara a medida aditiva, ou seja, toda certeza est no mundo S, condio essa dada por

    p(S) = (S) = 1;

    a crena subjetiva no-aditiva (A) no evento A S uma verso cautelosa da crenaaditiva p(A) no mesmo evento, sendo isso expresso pela condio p(A) (A), 8A S.

    Os axiomas prprios da teoria maxmin so:

    GS4 C Independe^ncia: 8f; g 2 F , 8h 2 F ato constante e 8 2 (0; 1), f % g ()f + (1 )h % g + (1 )h:

    GS6 Avers~ao a incerteza: 8f; g 2 F , se f g, ento, 8 2 (0; 1), f + (1 )g % f:

    O axioma GS4 da C-independncia idntico ao axioma AA4 da independncia, salvo

    pelo fato de o ato h, em GS4, ser um ato constante. Portanto, a C-independncia um

    relaxamento da condio de independncia, j que GS4 requer que o axioma AA4 valha

    apenas quando h ato constante.

    O axiomaGS6 da averso incerteza diz que, dados dois atos f e g indiferentes do ponto

    de vista de Augur, ele prefere uma composio distribucional (ou uma mdia ponderada

    qualquer) f + (1 )g dos dois a cada um em particular.Temos, assim, o teorema de Gilboa & Schmeidler (1989):

    Teorema (Gilboa & Schmeidler): A relao de preferncia % sobre o conjunto de atosF satisfaz os axiomas AA1AA3, GS4, AA5 e GS6 se, e somente se, existe um nicoC M(S) subconjunto fechado e convexo de medidas de probabilidade sobre S e existe umafuno de utilidade (no-constante) u : X ! R tais que, para quaisquer atos f; g 2 F :

    f % g () minp2CORE()

    ZS

    Ef(s) [u]

    dp(s) min

    p2CORE()

    ZS

    Eg(s) [u]

    dp(s)

    35

  • em que Ef(s) [u] ,P

    x2X u(x)f(s)(x). Alm disso, a utilidade u nica, salvo transfor-

    maes ans positivas.

    Schmeidler (1986) mostrou que, para qualquer funo ' : S ! R:hChoquetiZ

    S

    '(s)d(s) = minp2CORE()

    ZS

    '(s)dp(s)

    Logo, o que o teorema de Gilboa & Schmeidler diz que, considerando todos os axiomas

    de Anscombe & Aumann, mas trocando a independncia pela C-independncia e adicionando

    a averso incerteza, ento, aplicando o teorema de Anscombe & Aumann:

    f % g ()hChoquetiZ

    S

    Ef(s) [u]

    d(s)

    hChoquetiZS

    Eg(s) [u]

    d(s)

    em quehChoquetiR

    S'(s)d(s) = minp2CORE()

    RS'(s)dp(s) e C = CORE():

    O que isso quer dizer? Se as preferncias de Augur sobre atos satisfazem os axiomas de

    Gilboa & Schmeidler, que so os mesmos de Anscombe-Aumann, salvo o da independncia,

    trocado pelo de C-independncia, e pelo acrscimo da averso incerteza, ento qualquer

    deciso de Augur do tipo f % g equivalente ao seguinte processo mental:

    (1o) Se Augur escolhesse o ato f 2 F , ele esperaria a deciso da natureza quanto ao estadodo mundo s 2 S.

    (2o) Uma vez conhecendo o verdadeiro estado do mundo, ele descobre que f(s) 2 L (X) a distribuio de probabilidade sobre resultados em X. Assim, f(s)(x) a

    probabilidade de ocorrncia da conseqncia x 2 X.

    (3o) Augur avalia cada resultado x 2 X de acordo com uma funo utilidade u : X ! R,atribuindo a x o valor numrico u(x).

    (4o) De posse da probabilidade f(s)(x) de cada conseqncia e de sua utilidade u(x), ele

    calcula a utilidade esperada:

    Ef(s) [u] ,Xx2X

    u(x)f(s)(x)

    (5o) S que a natureza ainda no determinou o estado do mundo, mas Augur j sabe qual

    a sua utilidade esperada (sobre as conseqncias), Ef(s) [u] ; para cada estado s 2 S:

    36

  • (6o) Dado que Augur tem uma probabilidade subjetiva sub-aditiva (uma capacidade de

    Choquet convexa) sobre os estados do mundo, ele considera o ncleo CORE() dacapacidade. Em outras palavras, ele possui mltiplas probabilidades a priori. Cada

    probabilidade p 2 CORE() uma crena a priori.

    (7o) De acordo com cada probabilidade a priori p 2 CORE(); Augur calcula a esperana,no sentido usual, de todas os valores Ef(s) [u] de acordo com a crena p :Z

    S

    Ef(s) [u] dp(s)

    (8o) Em seguida, dado que Augur cauteloso, ela toma a menor dessas esperanas:

    minp2CORE()

    ZS

    Ef(s) [u]

    dp(s)

    (9o) Ele faz o mesmo para o ato g, calculando:

    minp2CORE()

    ZS

    Eg(s) [u]

    dp(s)

    (10o) Por m, ao comparar os atos f e g, ele opta por aquele com maior valor. No caso,

    Augur conclui que:

    minp2CORE()

    ZS

    Ef(s) [u]

    dp(s) min

    p2CORE()

    ZS

    Eg(s) [u]

    dp(s)

    ou seja, ele opta por aquele ato que maximiza sua utilidade na pior situao possvel.

    Vejamos um exemplo numrico. Suponha que S = fs1; s2; s3g e considere uma varivelaleatria X denida por:

    X(s1) , x1 = 1

    X(s2) , x2 = 5

    X(s3) , x3 = 3

    Denote por p1 a probabilidade a priori p(s1), por p12 a probabilidade a priori p(fs1; s2g)etc. Suponha que:

    p1 = 0; 2 p12 = 0; 5 p123 = 1

    p2 = 0; 2 p13 = 0; 6

    p3 = 0; 2 p23 = 0; 6

    37

  • Ordenando x2 > x3 > x1; a esperana maximin :

    EChoquet(X) =hChoquetiZ

    S

    X(s)d(s)

    = (x2 x3)(s2) + (x3 x1)(fs3; s2g) + x1(fs1; s3; s2g)= 2 0; 2 + 2 0; 6 + 1 1= 2; 6

    A utilidade maxmin resolve vrios problemas em Economia. Alguns deles so:

    O paradoxo de Ellsberg.

    A inrcia de portflios, isto , o fato de que pequenas variaes nos preos dos ativoscomponentes de uma carteira no afetam a composio dos ativos nem suas quanti-

    dades.

    O vis domstico nas nanas internacionais, isto , o fato de que os indivduos ten-dem a participar mais de seus mercados nanceiros domsticos do que dos mercados

    internacionais.

    Crashes e booms nanceiros.

    Contratos incompletos. Um contrato incompleto quando no consegue estabelecerclusulas de conduta ou de ao para todos os possveis estados do mundo. Suponha

    que Augur compra um seguro contra acidentes com sua biga. O contrato especica o

    que as partes entendem por acidente: coliso com outra biga, choque com uma manada

    descontrolada de touros no festival de Mitra, pedras no caminho etc. Agora, imagine

    que Augur passeia com sua biga lentamente beira da prais. De repente, uma orca, a

    baleia assassina, sai do mar e avana sobre a biga achando que era uma foca. Nenhuma

    das partes imaginava que isso pudesse acontecer e o contrato nada diz sobre esse caso.

    Esse um contrato incompleto.

    A questo do job search, que pode ser resumida pela pergunta: Como um desempre-gado reage a uma incerteza crescente no mercado de trabalho?No modelo bayesiano,

    a maior incerteza capturada pela maior varincia dos salrios dos empregos ofereci-

    dos. Ceteris paribus, maior varincia torna o indivduo menos desejoso de aceitar uma

    38

  • oferta, pois sabe que tem uma chance de obter uma oferta melhor mais tarde. Esse

    resultado contra-intuitivo decorre da hiptese de que toda incerteza quanticvel

    por uma medida de probabilidade aditiva, ou seja, por uma crena descrita por uma

    medida de probabilidade aditiva. Com a multiplicidade de probabilidades a priori e

    com a averso incerteza proporcionadas pelo modelo de Gilboa & Schmeidler, o re-

    sultado inverte-se. Quando h mais incerteza, h mais probabilidades a priori. isto

    quer dizer que o indivduo considera que outras crenas so possveis. Quanto mais

    probabilidades a priori, a utilidade maxmin tende a cair. O agente racional, portanto,

    aceita a oferta que vier e no espera.

    As teorias de deciso sob incerteza com mltiplas priors, em especial a de Gilboa-

    Schmeidler, tambm conhecida por teoria da incerteza knightiana, adaptam-se s situaes

    do exemplo 3. Os modelos de mltiplas priors levam a resultados s vezes qualitativamente

    diferentes e em geral mais plausveis do que os obtidos pela abordagem bayesiana.

    5 Teoria de GilboaLieberman-Schmeidler de crena

    qualitativa baseada em casos

    At agora, as teorias de deciso sob incerteza buscaram um modo de denir probabilidades

    subjetivas a partir do comportamento observado. A idia era observar o comportamento e

    deduzir quais crenas induziriam o comportamento observado.

    Agora abandonaremos o projeto comportamental e perguntaremos: Como as proba-

    bilidades podem ser construdas? Partindo do procedimento adotado na abordagem fre-

    qentista da probabilidade objetiva, Gilboa, Lieberman & Schmeidler (2007) desenvolveram

    recentemente a teoria da crena qualitativa baseada em casos, uma teoria de carter cogni-

    tivo.

    H duas primitivas: 8

  • I : X ! Z+ uma regra que associa a cada observao do tipo x 2 X o nmero I(x) 2 Z+de vezes que ela ocorreu. Recorde que Z+ = f0; 1; 2; 3; : : :g o conjunto dos nmeros inteirosno-negativos. Denote por I o conjunto de todas as bases de dados. O conjunto de bases dedados denido por:

    D = fI 2 I :Xx2X

    I(x)

  • dados J 2 D, ento Augur tambm ter razes para crer que a alternativa a to provvelquanto a alternativa b, para a base conjunta de dados I + J 2 D.O princpio arquimediano diz que, se a base de dados I 2 D d razes sucientes para

    Augur crer que a alternativa a estritamente mais provvel quanto a alternativa b, ento

    uma replicao ` sucientemente grande da base de dados I eventualmente superar qual-

    quer evidncia em contrrio vinda de qualquer outra base de dados J 2 D. O princpioarquimediano uma espcie de axioma de continuidade sobre base de dados. Esse axioma

    o mais problemtico. muito fcil encontrar exemplos na histria da cincia de bases de

    dados que reverteram crenas a despeito de enormes replicaes de bases de dados anteri-

    ores. Durante sculos a astronomia de Ptolomeu foi suciente para prever eclipses e outros

    fenmenos celestes. Entretanto, bastou uma pequena base de dados diferente para reverter

    a crena. De qualquer forma, um axioma mais razovel deveria permitir que bases de dados

    especcas contradissessem bases anteiores, mesmo que largamente replicadas no passado.

    Gilboa, Lieberman e Schmeidler estranhamente no criticam o princpio arquimediano.

    Tampouco o elogiam. Na verdade, dizem apenas que razovel para uma mente estatstica.

    O que eles querem dizer que uma base de dados pequena negligvel relativamente a uma

    base de dados largamente replicada e, portanto, do ponto de vista estatstico, no afeta

    a ordenao das crenas. Ora, negligibilidade do tamanho da base de dados no implica

    negligibilidade do contedo informativo da base. O princpio arquimediano, portanto, pode

    no ser to razovel. Eles reconhecem, entretanto, as decincias do axioma da combinao

    e discorrem algo sobre ele.

    O axioma da diversidade uma traduo, para o contexto do modelo, do axioma da

    no-trivialidade. Porm, como os elementos do modelo vm de observaes histricas, a

    interpretao ca mais rica. Com efeito, o axioma da diversidade diz que a experincia

    enriquece a estrutura d epreferncias sobre as alternativas.

    Teorema (Gilboa, Lieberman & Schmeidler, 2007): A coleo f%I : I 2 Dg de relaesde preferncia sobre as alternativas em A para as possveis bases de dados satisfaz os axiomas

    GSL1GSL4 se, e somente se, existe uma matriz diversicada : A X ! R tal que,para qualquer base de dados I 2 D e para quaisquer alternativas a; b 2 A:

    a %I b ()Xx2X

    (a; x)I(x) Xx2X

    (b; x)I(x)

    em que Ef(s) [u] ,P

    x2X u(x)f(s)(x). Alm disso, a matriz nica, salvo transformaes

    41

  • matricialmente ans positivas, ou seja, se : A X ! R outra matriz diversicada talque = +, em que > 0 e : AX! R uma matriz de colunas constantes, ento representa as mesmas preferncias.

    Na expressoP

    x2X (a; x)I(x), o termo (a; x) faz o papel da funo utilidade e o termo

    I(x) faz o papel da medida de probabilidade. A diferena que I(x) , salvo o nmero total

    de observaes, uma freqncia emprica.

    Se as preferncias de Augur sobre atos satisfazem os axiomas de Gilboa, Lieberman &

    Schmeidler, ento qualquer deciso de Augur do tipo a %I b, qualquer que seja a base dedados I 2 D, equivalente ao seguinte processo mental:

    (1o) Se Augur escolhe a alternativa a 2 A e considera a observao do tipo x 2 X; entoter utilidade (a; x):

    (2o) Ele computa I(x), ou seja, ele verica quantas observaes h do tipo x 2 X.

    (3o) De posse da utilidade (a; x) e do nmero de observaes I(x), ele calcula a utilidade

    esperada sobre o conjunto de tipos de observao X:Xx2X

    (a; x)I(x)

    (5o) Ele faz o mesmo para a alternativa b 2 A, calculando:Xx2X

    (b; x)I(x)

    (6o) Por m, ao comparar as alternativas a e b, ele opta por aquela com maior valor. No

    caso, Augur conclui que: Xx2X

    (a; x)I(x) Xx2X

    (b; x)I(x)

    Considere o exemplo 3. Augur pergunta a Asclepius qual a probabilidade de sucesso,

    mas no insiste numa distribuio de probabilidade. Ele ca satisfeito com uma resposta

    do tipo: Tens mais chance de sucesso que de insucesso. Asclepius enfrenta, aqui, um

    problema de classicao, que so mais simples que os problemas de deciso. De fato, no

    processo decisrio, Asclepius tem que fazer raciocnios contrafactuais, perguntando: O que

    42

  • aconteceria se eu escolhesse diferente?No processo classicatrio, Asclepius sabe quais os

    resultados de diferentes previses.

    Se Asclepius satisfaz os axiomas de Gilboa, Lieberman & Schmeidler, ento haver uma

    funo (x; x0) sobre XX tal que sua resposta ser dada de acordo com o seguinte critrio:a soma dos valores de sobre os pacientes que sobreviveram maior do que a soma sobre

    os que no sobreviveram. Os pacientes sobreviventes, mesmo que diferentes e operados

    sob circunstncias e por mdicos diferentes, podem ser agrupados mediante uma noo de

    similaridade. Podemos pensar na funo como a similaridade que Asclepius identica entre

    os pacientes de sua base de dados e Augur, seu paciente atual. Isso segue a idia de Hume

    (An Enquiry Concerning Human Understanding, 1748): De causas que parecem similares

    esperam-se efeitos similares. Essa a soma de todas as nossas concluses experimentais.

    A teoria de Gilboa, Lieberman & Schmeidler um modelo do raciocnio analgico que

    Hume via como a base da predio. Em particular, esse modelo permite uma abordagem

    freqentista revisitada. Considere uma varivel aleatria Y que pode assumir dois valores:

    Y = 1 denota sucesso e Y = 0 insucesso. Tenhamos em mente a situao do exemplo 3.

    As caractersticas dos pacientes so dadas pelo vetor x = (x1; : : : ; xm) 2 Rm. temos, assim,uma base de dados de n observaes passadas das variveis:

    f(xi; yi) : i = 1; : : : ; ng

    em que (xi; yi) = (x1i ; : : : ; xmi ; yi). Um novo caso introduzido, o de Augur, com caracters-

    ticas:

    xn+1 = (x1n+1; : : : ; x

    mn+1)

    Asclepius quer acessar a probabilidade de yn+1 = 1. Seja (xi; xn+1) > 0 uma funo de

    similaridade entre xi e xn+1: Ento a probabilidade de sucesso na cirurgia de Augur :

    pI(n+ 1; ) =

    Pni=1 (xi; xn+1) yiPni=1 (xi; xn+1)

    Essa frmula conhecida na Estatstica como kernel estimation of probability e na

    Psicometria como exemplar learning. Ela se reduz freqncia relativa de sucesso na base

    de dados se a funo de similaridade (x; x0) constante, isto , quando todas as observaes

    so consideradas igualmente relevantes. Se, entretanto, denirmos:

    (x; x0) =

    8

  • ento a frmula acima se reduz freqncia relativa condicional de yn+1 = 1 (de sucesso),

    isto , freqncia relativa na sub-base de dados denida por xn+1. Em outras palavras,

    atualizao bayesiana. A frmula , ento, um meio-termo entre dois extremos: a freqncia

    relativa e a freqncia relativa condicional. Essa teoria, ento, um meio-termo entre a

    abordagem freqentista objetivista e a abordagem subjetiva bayesiana.

    Pode parecer, primeira vista, que simplesmente se troca a pergunta Qual probabilidade

    subjetiva usar?pela pergunta Qual funo de similaridade usar?, mas no bem assim.

    Pode-se estimar a funo de similaridade a partir dos dados. Utilizando algum critrio

    estatstico de minimizao de erros, como, por exemplo, o critrio mdio-quadrtico, pode-

    se escolher a melhor funo de similaridade dentre uma famlia de funes. Os autores

    comparam o modelo com vrios outros mtodos de inferncia estatstica:

    regresso linear;

    kernel estimation;

    interpolao;

    atualizao bayesiana;

    modelos de auto-regresso;

    sries temporais etc.

    Se Augur usar a teoria da deciso baseada em casos, ele pode se considerar um bayesiano

    mais exvel, que classica as caractersticas dos fenmenos de maneira menos rigorosa. Ele

    identica, mediante a funo de similaridade, quais casos so mais ou menos relevantes para

    a sua predio. O que justica a contaminao de sua anlise com casos diferentes, embora

    similares (de acordo com a similaridade adotada) justamente a escassez de dados. Alm do

    mais, esse mtodo no baseado em axiomas comportamentais, mas cognitivos. Lembre-se

    de que os dados do razo para crer mais numa alternativa que em outra. Isso no pressupe

    uma relao de preferncia como nos modelos comportamentais.

    O modelo pode ainda incorporar vrios indivduos. Basta fazer com que cada observao

    coletada especique tambm quem o observador. Dessa forma, a %I b signicar que,se a base de dados I 2 D especica quantas vezes cada indivduo observou o par (x; x0),

    44

  • ento a alternativa a mais provvel que a alternativa b de ser o assessment do conjunto

    de indivduos. Esse assessment reete a opinio coletiva.

    6 Concluso

    As teorias comportamentais da tomada de deciso sob incerteza partem de axiomas bastante

    semelhantes. Podemos notar em primeiro lugar que as relaes de preferncia, sejam elas

    denidas sobre alternativas ou loterias, so sempre uma ordem fraca, isto , completas e

    transitivas.

    Na Economia costuma-se associar as propriedades de completeza e de transitividade

    das preferncias individuais ao pressuposto de racionalidade do homo conomicus. Junte-

    se a isso a caracterstica de comportamento maximizador com aproveitamento de todas

    as informaes disponveis para o tomador de deciso. Entretanto, j no sculo XVIII,

    Condorcet alertava para os problemas decorrentes da agregao de preferncias transitivas.

    O paradoxo do voto o exemplo clssico. Portanto, o tomador de deciso sob incerteza

    sujeito aos axiomas comportamentais deve ser, de fato, um indivduo.

    A Economia, porm, principalmente a moderna macroeconomia com fundamentos micro-

    econmicos, toma a coletividade, a sociedade, como um indivduo com preferncias racionais

    e tomando decises sob incerteza. O artifcio dizer que se toma um agente representativo.

    H nos modelos macroeconmicos um consumidor representativo, uma rma representativa

    e um governo. Todos esses agentes representativos so racionais: tm preferncias racionais

    e so otimizadores. Dessa interao entre os agentes representativos decorrem os equilbrios

    e, por conseguinte, as recomendaes de poltica macroecmica. Para piorar, os modelos

    ainda supem que os indivduos tomam decises intertemporais. A racionalidade privada

    no se transmuta em racionalidade coletiva quando da agregao de preferncias. O que

    a macroeconomia faz passar-nos uma rasteira muito sutil: ela supe que todos os con-

    sumidores so idnticos ex ante, ou seja, antes de qualquer choque aleatrio idiossincrtico

    que diferencie os indivduos. O modelo pode car mais vendvel se disser que existe um

    continuum de consumidores idnticos ex ante que sofrem um choque do tipo Bernoulli. Esse

    pressuposto, porm, matematicamente equivalente ao pressuposto de que existe apenas um

    nico indivduo que enfrenta uma incerteza dada pela realizao de uma varivel aleatria

    com distribuio de Bernoulli e que, portanto, aps o choque, h apenas dois tipos diferentes

    45

  • de indivduos , com o peso de cada um sendo dado pela massa de indivduos de cada tipo.

    A hiptese de continuum de consumidores , assim, uma complicao desnecessria e tem o

    evidente intuito de dar ao modelo uma roupagem matematicamente sedutora.

    Vejamos, por exemplo, como Woodford introduz o modelo de asset-pricing com ativos

    nominais em seu livro wickselliano Interest and Prices (2003, p. 64): Consider an economy

    made up of a large number of identical households. The representative consumer seeks

    to maximize the expected value of a discounted sum of period contributions to utility of

    the form EofP1

    t=0 tu(Ct; t)g: Temos ainda Stockey & Lucas (1989, p. 475), que, no

    incio do captulo 16, escrevem: ... the solutions to certain palnning problems can be

    interpreted as competitive equilibria of economies with a large number of consumers who

    have identical preferences and identical endowments, and a large number of rms that have

    identical constant-returns-to-scale technologies. Somente na seo 16.7, Stockey & Lucas

    apresentam o modelo com heterogeneidade entre os consumidores. Neste caso, porm, no

    um continuum, mas um nmero nito deles. Blanchard & Fisher (1989, p. 48) supem

    que there are many identical families, each with a welfare function given by equation (3),

    a equao (3) sendo o valor presente de uma utilidade sobre um uxo contnuo de consumo.

    Mais adiante, dizem que there are many identical rms, each with the same technology.

    Existe tambm a chamada questo do small world. Savage, no captulo 2 de seu famoso

    livro The Foundations of Statistics, j dizia que sua teoria de deciso sob incerteza s faz

    sentido em um mundo pequeno. O que signica isso? Um mundo pequeno um mundo no

    qual sempre possvel to look before you leap. Em outras palavras, o indivduo tem que

    conhecer a totalidade do mundo e, s ento, distribuir a certeza entre os possveis estados do

    mundo. Ele capaz de levar em considerao, antecipadamente, todos os impactos de todas

    as informaes futuras concebveis sobre o modelo subjacente que determina suas crenas.

    No h espao para surpresas. Jamais poder ser o caso de o indivduo no saber e, alm

    disso, no saber que no sabe.

    No incio do sculo XX, um diretor da instituio que administrava os registros de

    patentes nos Estados Unidos fez uma declarao que entrou para a Histria como o sm-

    bolo do erro que os economistas insistem em repetir. Encantado com o progresso tecnolgico

    de ento, ele armou publicamente que nada mais havia para ser inventado. Seu erro era

    imaginar que todas as possibilidades concebveis perfaziam a totalidade do mundo. As re-

    laes econmicas e, mais geralmente, as relaes sociais, so relaes em um big world, um

    46

  • mundo grande. Devemos admitir que existem estados do mundo que desconhecemos e no

    sabemos que desconhecemos.

    Se pensarmos em termos dos axiomas de Kripke do sistema S5 sobre o operador de

    conhecimento K : 2 ! 2 sobre o conjunto dos estados do mundo , ento o primeirodeles, K() = , j nos faz pensar. Ele diz que auto-evidente que contm todos os

    estados do mundo. O quinto axioma diz que, se A um evento qualquer, ento:K(A) = K(:K(A)), ou seja, que, se o indivduo no sabe A, ento ele sabe que no sabe A.O problema que, muitas vezes, o que ocorre :K(A) = :K(:K(A)): Neste caso, entramosno big world mencionado por Savage. L, sua teoria no faz sentido. Alis, nenhuma das

    teorias comportamentais faz. No mundo grande devemos ter muito cuidado ao aplicarmos

    as teorias de probabilidade subjetiva com bayesianismo.

    Ser que num mundo pequeno existe realmente algum aprendizado? A compreenso

    da natureza da mensagem trazida por uma surpresa um aprendizado. A famosa frmula

    de atualizao bayesiana no uma frmula de aprendizagem racional. Todas as possveis

    atualizaes j esto descritas. Basta apenas esperar a realizao de algum evento e atualizar

    a distribuio de probabilidade. Ken Binmore enftico em criticar o uso indevido do

    bayesianismo:

    How is it that Bayesianismists succeed in convincing themselves that rational

    learning consists of no more than the trivial algebraic manipulations required for

    the use of Bayess rule? My guess is that their blindness is only a symptom of

    a more serious disease that manifests itself as a worhip of mathematical formal-

    ism. A denition-axiom-theorem-proof format is designed to close the mind to

    irrelevant distractions. But the aspects of the learning process that are neglected

    by Savages formalism are not irrelevant. How decision makers form and rene

    their subjective judgements really does matter. But the fact that Savages theory

    leaves these aspects of the learning process utterly unmodeled creates a trap into

    which Baysianismists are only too ready to fall. The trap is to proceed as though

    anything that is not expressed in the formalism to which one is accustomed does

    not existe at all. [Binmore (1993), p.327]

    Binmore aponta, portanto, no apenas para a questo do mundo pequeno e do mundo

    grande, mas tambm para a questo da origem das crenas subjetivas. Podemos ver a teoria

    47

  • de Gilboa-Lieberman-Schmeidler como um passo nessa direo. D-se formao de crenas

    um fundamento emprico, observacional, semi-objetivo. A teoria no aborda, propriamente,

    a questo do mundo pequeno e do mundo grande, mas entendemos que h nela espao para

    tanto. O advento de um novo elemento x no conjunto X pode ser facilmente incorporado.

    Tendo em mos o conjunto ampliado X = X [ fxg; basta mudar a funo de similaridadepara : X X ! R e reestimar a probabilidade: :

    pI(n+ 1; ) =Pn

    i=1 (xi; xn+1) yiPn

    i=1 (xi; xn+1)

    O advento de um estado surpresa pode afetar a insero de uma observao numa dada

    categoria, mas parece-nos que um indivduo racional de bom-senso, o que quer que isso seja,

    faria dessa forma.

    A grande lio que devemos tirar de tudo isso que as teorias tradicionais de deciso sob

    incerteza aplicam-se basicamente a mundos anlogos a um cassino. Quando se joga um dado

    cbico, o mundo possui seis estados. Esses seis estados perfazem a totalidade do mundo.

    Quando se trata da relao humana, seja econmica, nanceira ou social, o mundo muito

    maior do que pensamos, tanto que nem sabemos quanto...

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