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Informativo 925-STF (07/12/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 1 Informativo comentado: Informativo 925-STF Márcio André Lopes Cavalcante Processos excluídos deste informativo pelo fato de não terem sido ainda concluídos em virtude de pedidos de vista. Serão comentados assim que chegarem ao fim: ADI 5874/DF; MS 34490/DF. ÍNDICE DIREITO PROCESSUAL PENAL MEDIDA DE SEGURANÇA Pessoa que havia recebido medida de segurança, mas que, no recurso, teve extinta a punibilidade por prescrição não pode permanecer internada no hospital de custódia. DIREITO PROCESSUAL PENAL MEDIDA DE SEGURANÇA Pessoa que havia recebido medida de segurança, mas que, no recurso, teve extinta a punibilidade por prescrição não pode permanecer internada no hospital de custódia É inconstitucional a manutenção em Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico – estabelecimento penal – de pessoa com diagnóstico de doença psíquica que teve extinta a punibilidade. Essa situação configura uma privação de liberdade sem pena. STF. 2ª Turma. HC 151523/SP, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 27/11/2018 (Info 925). Espécies de sanção penal Sanção penal é a resposta dada pelo Estado à pessoa que praticou uma infração penal. Existem duas espécies de sanção penal: a) pena; b) medida de segurança. Medida de segurança “Medida de segurança é a modalidade de sanção penal com finalidade exclusivamente preventiva, e de caráter terapêutico, destinada a tratar inimputáveis e semi-imputáveis portadores de periculosidade, com o escopo de evitar a prática de futuras infrações penais.” (MASSON, Cleber. Direito Penal esquematizado. São Paulo: Método, 2012, p. 815). Assim, a medida de segurança é aplicável para o indivíduo que praticou uma conduta típica e ilícita, mas, no tempo do fato, ele era totalmente incapaz (inimputável) ou parcialmente capaz (semi-imputável) de entender o caráter ilícito de sua conduta e de se autodeterminar segundo tal entendimento. Em razão disso, em vez de receber uma pena, ele estará sujeito a receber uma medida de segurança (AVENA, Norberto. Execução penal esquematizado. São Paulo: Método, p. 363).

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Márcio André Lopes Cavalcante Processos excluídos deste informativo pelo fato de não terem sido ainda concluídos em virtude de pedidos de vista. Serão comentados assim que chegarem ao fim: ADI 5874/DF; MS 34490/DF.

ÍNDICE DIREITO PROCESSUAL PENAL

MEDIDA DE SEGURANÇA Pessoa que havia recebido medida de segurança, mas que, no recurso, teve extinta a punibilidade por prescrição

não pode permanecer internada no hospital de custódia.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

MEDIDA DE SEGURANÇA Pessoa que havia recebido medida de segurança, mas que, no recurso, teve extinta a punibilidade por prescrição não pode permanecer internada no hospital de custódia

É inconstitucional a manutenção em Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico – estabelecimento penal – de pessoa com diagnóstico de doença psíquica que teve extinta a punibilidade. Essa situação configura uma privação de liberdade sem pena.

STF. 2ª Turma. HC 151523/SP, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 27/11/2018 (Info 925).

Espécies de sanção penal Sanção penal é a resposta dada pelo Estado à pessoa que praticou uma infração penal. Existem duas espécies de sanção penal: a) pena; b) medida de segurança. Medida de segurança “Medida de segurança é a modalidade de sanção penal com finalidade exclusivamente preventiva, e de caráter terapêutico, destinada a tratar inimputáveis e semi-imputáveis portadores de periculosidade, com o escopo de evitar a prática de futuras infrações penais.” (MASSON, Cleber. Direito Penal esquematizado. São Paulo: Método, 2012, p. 815). Assim, a medida de segurança é aplicável para o indivíduo que praticou uma conduta típica e ilícita, mas, no tempo do fato, ele era totalmente incapaz (inimputável) ou parcialmente capaz (semi-imputável) de entender o caráter ilícito de sua conduta e de se autodeterminar segundo tal entendimento. Em razão disso, em vez de receber uma pena, ele estará sujeito a receber uma medida de segurança (AVENA, Norberto. Execução penal esquematizado. São Paulo: Método, p. 363).

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Qual é o procedimento necessário para se constatar a necessidade ou não de aplicação da medida de segurança? Se houver séria dúvida sobre a integridade mental do acusado, o juiz determina a instauração de um incidente de insanidade mental. O réu será submetido a um exame médico-legal que irá diagnosticar se ele, ao tempo da ação ou da omissão criminosa, tinha capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Quais as conclusões que o juiz pode chegar com o incidente de insanidade? Após o incidente e com base nas conclusões do médico perito, o juiz poderá concluir que o réu é... • imputável: nesse caso, ele será julgado normalmente e poderá ser condenado a uma pena; • inimputável: se ficar provado que o agente é inimputável, ou seja, que por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, ele era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento, ele ficará isento de pena (art. 26 do CP) e poderá ou não receber uma medida de segurança, a depender de existirem ou não provas de que praticou fato típico e ilícito; • semi-imputável: se ficar provado que, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado, o agente não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento, ele poderá: 1) ser condenado, mas sua pena será reduzida de 1/3 a 2/3, nos termos do parágrafo único do art. 26 do CP; ou 2) receber medida de segurança, se ficar comprovado que necessita de especial tratamento curativo (art. 98 do CP). Espécies de medida de segurança Existem duas espécies de medida de segurança (art. 96 do CP):

DETENTIVA (INTERNAÇÃO) RESTRITIVA (TRATAMENTO AMBULATORIAL)

Consiste na internação do agente em um hospital de custódia e tratamento psiquiátrico. Obs.: se não houver hospital de custódia, a internação deverá ocorrer em outro estabelecimento adequado.

Consiste na determinação de que o agente se sujeite a tratamento ambulatorial.

É chamada de detentiva porque representa uma forma de privação da liberdade do agente.

O agente permanece livre, mas tem uma restrição em seu direito, qual seja, a obrigação de se submeter a tratamento ambulatorial.

Critério para escolha da internação ou tratamento ambulatorial O caput do art. 97 do CP determinou o seguinte critério para guiar o juiz no momento de fixar a medida de segurança cabível: • Se o agente praticou fato punido com RECLUSÃO, ele receberá, obrigatoriamente, a medida de internação. • Por outro lado, se o agente praticou fato punido com DETENÇÃO, o juiz, com base na periculosidade do agente, poderá submetê-lo à medida de internação ou tratamento ambulatorial. Obs: esse critério é alvo de críticas da doutrina e da jurisprudência e você encontrará julgados abrandando o rigor e concedendo tratamento ambulatorial para pessoas que praticaram fatos punidos com reclusão. No entanto, em provas, o mais comum é ser cobrada a redação do art. 97 do CP.

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Prazo de duração da medida de segurança O Código Penal afirma que a medida de segurança será aplicada por tempo indeterminado e que deverá ser mantida enquanto o indivíduo for considerado perigoso:

Art. 97 (...) § 1º A internação, ou tratamento ambulatorial, será por tempo indeterminado, perdurando enquanto não for averiguada, mediante perícia médica, a cessação de periculosidade. O prazo mínimo deverá ser de 1 (um) a 3 (três) anos.

Desse modo, pela redação literal do CP, a medida de segurança poderia durar por toda a vida do individuo já que, enquanto não ficasse provado que cessou a periculosidade, ele ainda teria que permanecer internado ou em tratamento ambulatorial.

Essa leitura do § 1º do art. 97 do CP é compatível com a CF/88? O prazo de cumprimento da medida de segurança é ilimitado? NÃO. O prazo de cumprimento da medida de segurança não pode ser ilimitado. Isso porque, conforme vimos acima, a medida de segurança é uma espécie de sanção penal e a CF/88 afirmou expressamente que, em nosso ordenamento jurídico não pode haver “penas de caráter perpétuo” (art. 5º, XLVII). Quando a Constituição fala em “penas de caráter perpétuo”, deve-se interpretar a expressão em sentido amplo, ou seja, são proibidas sanções penais de caráter perpétuo, incluindo, assim, tanto as penas como as medidas de segurança. Desse modo, atualmente, tanto o STJ como o STF afirmam que existe sim prazo máximo de duração das medidas de segurança porque estas possuem caráter punitivo.

A pergunta que surge, então, é a seguinte: qual é o prazo máximo de duração das medidas de segurança?

Posição do STF: 30 anos

Posição do STJ: máximo da pena abstratamente cominada ao delito praticado

O STF possui julgados afirmando que a medida de segurança deverá obedecer a um prazo máximo de 30 anos, fazendo uma analogia ao art. 75 do CP, e considerando que a CF/88 veda as penas de caráter perpétuo. Art. 75. O tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a 30 (trinta) anos. (...) Esta Corte já firmou entendimento no sentido de que o prazo máximo de duração da medida de segurança é o previsto no art. 75 do CP, ou seja, trinta anos. (...) STF. 1ª Turma. HC 107432, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 24/05/2011.

Súmula 527-STJ: O tempo de duração da medida de segurança não deve ultrapassar o limite máximo da pena abstratamente cominada ao delito praticado.

Ex: João, inimputável, pratica fato previsto como furto simples (art. 155, caput, do CP); o juiz aplica a ele medida de segurança de internação; após 4 anos cumprindo medida de segurança, o magistrado deverá determinar a desinternação de João, considerando que foi atingido o máximo da pena abstratamente cominada para o furto (“reclusão, de um a quatro anos, e multa”).

A conclusão do STJ é baseada nos princípios da isonomia e proporcionalidade (proibição de excesso). Não se pode tratar de forma mais gravosa o infrator inimputável quando comparado ao imputável. Ora, se o imputável somente poderia ficar cumprindo a pena até o máximo previsto na lei para aquele tipo penal, é justo que essa mesma regra seja aplicada àquele que recebeu medida de segurança.

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Veja como esse assunto já foi cobrado em prova: (Juiz TJ/SP 2014) A medida de segurança deve perdurar enquanto não cessada a periculosidade do agente, não sendo cabível, na espécie, a limitação do período máximo de trinta anos, prevista no art. 75 do Código Penal. (ERRADO) Feita esta breve revisão, imagine a seguinte situação hipotética: João foi denunciado pela prática de homicídio. No curso do processo foi constatado que João era inimputável e, em razão disso, o juiz proferiu sentença de absolvição imprópria, aplicando-lhe medida de segurança de internação. A defesa recorreu contra a sentença para o Tribunal de Justiça. Apesar disso, João, por força de decisão cautelar proferida pelo juiz na sentença, já iniciou o cumprimento da medida de segurança no hospital de custódia e tratamento psiquiátrico (HCTP) enquanto aguarda o julgamento da apelação. Dois anos depois, o TJ julga a apelação e reconhece que houve a prescrição da pretensão punitiva, declarando a extinção da punibilidade. Mesmo com a extinção da sentença, João continuou internado no hospital de custódia sob o argumento de que se trata de pessoa perigosa. Houve, portanto, uma espécie de interdição civil. Essa decisão de manter João no hospital de custódia foi acertada? NÃO. O hospital de custódia é um estabelecimento destinado àqueles que cumprem medida de segurança, resposta penal oferecida às pessoas que apresentam diagnóstico psiquiátrico e tenham praticado crime. Vale ressaltar, inclusive, que a Lei de Execuções Penais (Lei nº 7.210/84), em seu Título IV, inclui os hospitais de custódia no rol dos “estabelecimentos penais”. Extinta a punibilidade em decorrência do reconhecimento da prescrição, como foi o caso, não há que falar em aplicação de pena nem de medida de segurança. A manutenção do paciente em HCTP significaria que ele estaria cumprindo medida de segurança mesmo tendo sido extinta a punibilidade. Parecer médico Vale ressaltar, ainda, que constava dos autos um parecer psiquiátrico afirmando que não há qualquer indicação médica para a internação do paciente em hospital psiquiátrico, visto que “não há possibilidade de ‘cura’ para seus traços de personalidade disfuncionais”. Pessoa com deficiência O paciente do habeas corpus pode ser considerado como pessoa com deficiência mental. De acordo com a Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD), internalizada em nosso ordenamento como texto constitucional (Decreto Legislativo 186/2008 e Decreto 6.949/2009), as pessoas com impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual e sensorial são consideradas deficientes e merecem a “plena e efetiva participação e inclusão na sociedade” (art. 3º). Assim, a pessoa com deficiência deve merecer inclusão social, sendo isso um princípio de status constitucional. Lei nº 10.216/2001 A Lei nº 10.216/2001 dispõe sobre a “proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais”. Esta Lei determina que as internações terão caráter excepcional, conforme prevê o seu art. 4º:

Art. 4º A internação, em qualquer de suas modalidades, só será indicada quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes.

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§ 1º O tratamento visará, como finalidade permanente, a reinserção social do paciente em seu meio. § 2º O tratamento em regime de internação será estruturado de forma a oferecer assistência integral à pessoa portadora de transtornos mentais, incluindo serviços médicos, de assistência social, psicológicos, ocupacionais, de lazer, e outros. § 3º É vedada a internação de pacientes portadores de transtornos mentais em instituições com características asilares, ou seja, aquelas desprovidas dos recursos mencionados no § 2º e que não assegurem aos pacientes os direitos enumerados no parágrafo único do art. 2º.

Desse modo, a manutenção do paciente em um hospital de custódia, ou seja, em um estabelecimento prisional, mesmo a sua punibilidade tendo sido extinta, viola também a Lei nº 10.216/2001, sendo certo que o hospital de custódia não atende aos requisitos do art. 4º e do parágrafo único do art. 2º desta Lei. Internação é inconstitucional Assim, o STF concluiu que a manutenção do paciente no HCTP é inconstitucional, porque restringe uma garantia fundamental (a liberdade) pela via da interdição civil de quem teve a punibilidade extinta e possui laudo psiquiátrico favorável à desinternação. Em suma:

É inconstitucional a manutenção em Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico – estabelecimento penal – de pessoa com diagnóstico de doença psíquica que teve extinta a punibilidade. Essa situação configura uma privação de liberdade sem pena. STF. 2ª Turma. HC 151523, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 27/11/2018 (Info 925).

OUTRAS INFORMAÇÕES

Sessões Ordinárias Extraordinárias Julgamentos Julgamentos por meio

eletrônico*

Em curso Finalizados

Pleno 28.11.2018 29.11.2018 1 0 90

1ª Turma 27.11.2018 — 2 97 197

2ª Turma 27.11.2018 — 3 72 193

* Emenda Regimental 51/2016-STF. Sessão virtual de 23 a 29 de novembro 2018.

CLIPPING DA R E P E R C U S S Ã O G E R A L DJe de 26 a 30 de novembro de 2018

REPERCUSSÃO GERAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO 1.162.672 – SP

RELATOR: MINISTRO PRESIDENTE

Ementa: SERVIDOR PÚBLICO. ATIVIDADES DE RISCO. APOSENTADORIA. PROVENTOS. INTEGRALIDADE E PARIDADE REMUNERATÓRIA. REGRAS DE TRANSIÇÃO DAS EMENDAS CONSTITUCIONAIS NºS 41/03 E 47/05. PRESENÇA DE REPERCUSSÃO

GERAL.

Decreto nº 9.586, de 27.11.2018 - Institui o Sistema Nacional de Políticas para as Mulheres e o Plano

Nacional de Combate à Violência Doméstica. Publicado no DOU em 28.11.2018, Seção 1, Edição 228, p. 2.

Secretaria de Documentação – SDO