INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia...

30
INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia da Silva Bezerra Advogada - Pós-graduanda lato sensu em Direito Penal e Direito Processual Penal pela Escola de Magistratura de Pernambuco - ESMAPE e Faculdade Maurício de Nassau. 1.1.Do Interrogatório O interrogatório é um ato judicial, presidido pelo juiz, em que se indaga ao acusado sobre os fatos imputados contra ele advindo de uma queixa ou denúncia, dando-lhe ciência ao tempo em que oferece oportunidade de defesa. O Código de Processo Penal considera o interrogatório como meio de prova e a doutrina atribui-lhe também a natureza de meio de defesa. Logo, o interrogatório possui um caráter híbrido, visto que é considerado tanto meio de prova, bem como ato de defesa (autodefesa). A lei dispõe que o acusado deve ser interrogado no curso do processo, a ausência do interrogatório gera nulidade (art. 564, III, e, do CPP). Existem os momentos, fixados pelo Código de Processo Penal, para realização do interrogatório, quais sejam: no inquérito policial (art. 6º,V); no auto de prisão em flagrante (art. 304); logo após o recebimento da denúncia ou queixa e antes da defesa prévia (arts. 394 e 395); no plenário do júri (art. 465) e no Tribunal, em processos originais ou no curso da apelação (art.616).

Transcript of INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia...

Page 1: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA

Ana Cláudia da Silva Bezerra

Advogada - Pós-graduanda lato sensu em Direito Penal e Direito

Processual Penal pela Escola de Magistratura de Pernambuco - ESMAPE

e Faculdade Maurício de Nassau.

1.1. Do Interrogatório

O interrogatório é um ato judicial, presidido pelo juiz, em

que se indaga ao acusado sobre os fatos imputados contra ele advindo de

uma queixa ou denúncia, dando-lhe ciência ao tempo em que oferece

oportunidade de defesa.

O Código de Processo Penal considera o interrogatório como

meio de prova e a doutrina atribui-lhe também a natureza de meio de

defesa. Logo, o interrogatório possui um caráter híbrido, visto que é

considerado tanto meio de prova, bem como ato de defesa (autodefesa).

A lei dispõe que o acusado deve ser interrogado no curso do

processo, a ausência do interrogatório gera nulidade (art. 564, III, e, do

CPP).

Existem os momentos, fixados pelo Código de Processo

Penal, para realização do interrogatório, quais sejam: no inquérito

policial (art . 6º,V); no auto de prisão em flagrante (art. 304); logo após

o recebimento da denúncia ou queixa e antes da defesa prévia (arts. 394 e

395); no plenário do júri (art. 465) e no Tribunal, em processos originais

ou no curso da apelação (art.616).

Page 2: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

O artigo 196 do Código de Processo Penal dispõe que: “A

todo tempo o juiz poderá proceder a novo interrogatório de ofício ou a

pedido fundamentado de qualquer das partes.” Com fundamento nos

princípios da verdade real e do impulso oficial, autoriza a lei que o juiz,

mesmo de ofício, determine novo interrogatório do acusado que se possa

mostrar relevante, diante de elementos trazidos aos autos durante a

instrução, para formação da sua convicção a respeito da verdade dos

fatos. As partes também poderão, desde que fundamentada, requerer novo

interrogatório.

O interrogatório traz em seu bojo as seguintes

característ icas: é ato público, é ato personalíssimo, possui judicialidade

e, finalmente, oralidade.

No interrogatório o acusado deve ter a segurança e garantia

de que não se praticará extorsão das confissões. Mesmo se o

interrogatório for realizado no sistema prisional em que estiver o

acusado preso, deve-se assegurar a publicidade do ato, salvo a exceção

prevista no artigo 792, § 1º do CPP, isto é, quando da publicidade do ato

puder resultar escândalo, incoveniente grave ou perigo de perturbação de

ordem, o juiz, ou o Tribunal, câmara, ou turma, poderá, de ofício ou a

requerimento da parte ou do Ministério Público, determinar que o ato

seja realizado a portas fechadas, limitando o número de pessoas que

possam estar presentes. É ato personalíssimo porque só o acusado pode

ser interrogado. Possui judicialidade porque cabe ao juiz e só ele

interrogar o acusado. Na oralidade, a palavra do acusado, circundada de

sua atitude, pode dar ao juiz um elemento insubstituível por uma

Page 3: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

declaração escrita, despida dos elementos de valor psicológico que

acompanham a declaração falada.

Com o advento da lei nº 10.792/03 que altera a lei nº

7.210/84 (Lei de Execução Penal) e o Decreto-Lei nº 3.689/41 (Código

de Processo Penal), o interrogatório tomou novos rumos no sistema

processual penal. Algumas inovações no interrogatório serão tratadas no

i tem a seguir.

1.2. As inovações trazidas pela lei 10.792/03 para o interrogatório.

Com a lei 10.792/03 o interrogatório adquiriu importantes

alterações quanto a sua aplicação.

O Código de Processo Penal, em seu artigo 185 previa que:

“O acusado, que for preso, ou comparecer, espontaneamente ou em

virtude de intimação, perante a autoridade judiciária, no curso do

processo penal, será qualificado e interrogado”.

O artigo 185 do Código de Processo Penal, com o advento da

lei 10.792/03, passou a ter a seguinte redação:

Art. 185. O acusado que comparecer perante a autoridade judiciária, no curso do processo penal, será qualificado e interrogado na presença de seu defensor, constituído ou nomeado.

§ 1º O interrogatório do acusado preso será feito no estabelecimento prisional em que se encontrar, em sala própria, desde que garantidas a segurança do juiz e auxiliares, a presença do defensor e a publicidade do ato. Inexistindo a segurança, o interrogatório será feito nos termos do Código de Processo Penal.

§2º Antes da realização do interrogatório, o juiz assegurará o direito de entrevista reservada do acusado com seu defensor.

Page 4: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

Os opositores a aplicação da videoconferência fundamentam

seus argumentos no artigo 185, caput, do CPP ao afirmarem que a

expressão “comparecer perante a autoridade judiciária” , implica estar

diante fisicamente da autoridade judiciária, desta forma inviabilizado

está o interrogatório on line.

O promotor de Justiça na Bahia, Vlademir Aras, em seu

artigo “Teleinterrogatório não elimina nenhuma garantia processual

(Tele-hearing does not eliminate any procedural guarantee)” , defende

que:

“Não concordamos que uma exegese da letra do artigo 185 do CPP, na sua anterior ou na atual redação, tenha o condão de inviabilizar o sistema de teleinterrogatório. Nações democráticas da Europa já adotam o teleinterrogatório, sem qualquer lesão a direitos individuais de imputados, tanto no plano interno quanto no espaço jurídico comum europeu. Além do mais, sabe-se que a interpretação gramatical ou literal não é a melhor para solucionar uma questão tão complexa.

Na sistemática do CPP, "comparecer" nem sempre significa necessariamente ir à presença física do juiz, ou estar no mesmo ambiente que este. Comparece aos autos ou aos atos do processo quem se dá por ciente da intercorrência processual, ainda que por escrito, ou quem se faz presente por meio de procurador, até mesmo com a oferta de alegações escritas, a exemplo da defesa prévia e das alegações finais.

Vide, a propósito, o artigo 570 do CPP, que afasta a nulidade do ato, considerando-a sanada, quando o réu "comparecer" para alegar a falta de citação, intimação ou notificação. Evidentemente, aí não se trata de comparecimento físico diante do juiz, mas sim de comunicação processual, por petição endereçada ao magistrado.

Se assim é, pode-se muito bem ler o "comparecer" do artigo 185 do CPP, referente ao interrogatório, como um comparecimento virtual, mas direto, atual e real, perante o magistrado.

A Lei n. 10.259/2001, que cuida dos Juizados Especiais Federais (cíveis e criminais), permitiu que as turmas de uniformização de jurisprudência reúnam-se por meios eletrônicos. De fato, o artigo 14, §3º, da lei, diz que "A reunião de juízes domiciliados em cidades diversas será feita pela via eletrônica". Que é isto senão uma audiência virtual? Estamos diante de uma sessão de julgamento plenamente válida, embora os juízes participantes não estejam presentes no mesmo recinto, mas sim presentes em recintos diversos, em plena interação.

Alega-se que o artigo 9º, §3º, do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (Pacto de Nova Iorque) e o artigo 7º, §5º, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), prevêem o direito do réu de ser conduzido à presença física do juiz natural. Ora, as referidas normas falam apenas em levar o detido à "presença do juiz", e a presença virtual,

Page 5: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

ao vivo, atual e simultânea, por meio de videoconferência, confere ao acusado as mesmas garantias que o comparecimento in persona, diante do magistrado.

Portanto, desde que seja garantida a liberdade probatória ao acusado e que sejam assegurados ao réu os direitos de ciência prévia, participação efetiva e ampla defesa (1) (inclusive com o acompanhamento do ato in loco por seu defensor e/ou por um oficial de justiça), não há razão para temer o teleinterrogatório, sob o irreal pretexto de violação a direitos fundamentais do acusado no processo penal. Até porque só há nulidade processual, quando existir prejuízo, e não se pode afirmar que essa é a regra no tocante a teledepoimentos criminais.

Ademais, o comparecimento físico do acusado perante a autoridade judicial não é exigido pelo direito internacional nem pela Constituição brasileira. Com efeito, o artigo 5º, inciso LXII, declara que "A prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada".

Frise-se: a prisão será "comunicada" ao juiz competente. Não impõe a Constituição a apresentação do réu ao juiz, na sede do juízo, mesmo num momento em que a legalidade ou legitimidade da prisão em flagrante ainda não foi verificada pelo Judiciário.

O teleinterrogatório não é um dos males do tempo. Ao contrário, vem eliminar certas burocracias e óbices ao andamento dos feitos criminais. Não esqueçamos que a videoconferência se presta à ouvida de réus presos e de réus soltos, detidos na mesma ou em comarca diversa do distrito da culpa, ou residentes a longas distâncias do foro. Assim, o sistema atende a interesses fundamentais de uns e outros.

A mera mudança do procedimento de apresentação do réu ao juiz, especialmente nos casos em que estejam em julgamento presos perigosos, não elimina nenhuma garantia processual, nem ofende os ideais do Estado de Direito. Basta que se adote um formato de videoconferência que permita aos sujeitos processuais o desempenho, à distância, de todos os atos e funções que seriam possíveis no caso de comparecimento físico”.(1)

Com a nova redação dada ao artigo 185, caput, do Código de

Processo penal, a presença do defensor tornou-se obrigatória por ocasião

do interrogatório e não mais facultativa. A presença obrigatória do

defensor no interrogatório veio a fortalecer o ato de defesa do acusado.

O artigo 185, no § 1º do Código de Processo Penal determina

o local do interrogatório do réu preso, ou seja, o interrogatório deverá

ser realizado no estabelecimento prisional em que se encontrar preso, em

sala própria, desde que estejam garantidas a segurança do juiz e

auxiliares, a presença do defensor e a publicidade do ato. Contudo, se o

Page 6: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

interrogatório não poder ser realizado no estabelecimento prisional,

deverá ser observado os termos do código de processo penal, ou seja, o

interrogatório deverá ser feito na sede do juízo, como ocorre com o

interrogatório do réu que se encontra em liberdade.

O § 2º do artigo 185 do Código de Processo Penal, determina

que o juiz deve assegurar o direito de entrevista reservada do acusado

com seu defensor. Através desta determinação, abre-se ao acusado a

possibilidade de receber do defensor esclarecimentos e orientação sobre

o processo, bem como de lhe fornecer informações que possam ser úteis

ao exercício do seu direito de defesa. Tal providência trouxe para seara

processual penal uma afirmação maior ao direito de defesa do acusado.

O artigo 186 do CPP, prevê, in verbis:

Art. 186. Depois de devidamente qualificado e cientificado do inteiro teor da acusação, o acusado será informado pelo juiz, antes de iniciar o interrogatório, do seu direito de permanecer calado e de não responder perguntas que lhe forem formuladas.

Parágrafo único. O silêncio, que não importará em confissão, não poderá ser interpretado em prejuízo da defesa.

O artigo 186 do CPP, com a alteração, adotou o princípio

constitucional de que ninguém é obrigado a auto acusar-se, visto que o

artigo mencionado determina que o si lêncio não importará em confissão,

não podendo ser interpretado em prejuízo da defesa.

Determina o art igo 187 do CPP, in verbis:

Art. 187. O interrogatório será constituído de duas partes: sobre a pessoa do acusado e sobre os fatos.

§ 1o Na primeira parte o interrogando será perguntado sobre a residência, meios de vida ou profissão, oportunidades sociais, lugar onde exerce a sua atividade, vida pregressa, notadamente se foi preso ou processado alguma vez e, em caso afirmativo, qual o juízo do processo, se houve suspensão condicional ou condenação, qual a pena imposta, se a cumpriu e outros dados familiares e sociais.

Page 7: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

§ 2o Na segunda parte será perguntado sobre:

I - ser verdadeira a acusação que lhe é feita;

II - não sendo verdadeira a acusação, se tem algum motivo particular a que atribuí-la, se conhece a pessoa ou pessoas a quem deva ser imputada a prática do crime, e quais sejam, e se com elas esteve antes da prática da infração ou depois dela;

III - onde estava ao tempo em que foi cometida a infração e se teve notícia desta;

IV - as provas já apuradas;

V - se conhece as vítimas e testemunhas já inquiridas ou por inquirir, e desde quando, e se tem o que alegar contra elas;

VI - se conhece o instrumento com que foi praticada a infração, ou qualquer objeto que com esta se relacione e tenha sido apreendido;

VII - todos os demais fatos e pormenores que conduzam à elucidação dos antecedentes e circunstâncias da infração;

VIII - se tem algo mais a alegar em sua defesa." (NR)

O interrogatório será consti tuído de duas partes: sobre a

pessoa do acusado e sobre os fatos. A primeira parte do interrogatório, as

perguntas devem abordar a pessoa do acusado, visando a obtenção de

informações pessoais que possam ser úteis aos processos, à discussão da

causa e à formação da convicção do juiz, bem como na hipótese de

condenação, à individualização da pena. A segunda parte do

interrogatório consiste em questionamentos sobre a procedência da

acusação, a infração penal e as provas a ela relacionadas, bem como

conferir ao acusado a possibilidade de exercer a sua autodefesa.

Importante lembrar que as perguntas elencadas no artigo

187, § 2º não são as únicas que poderão ser feitas pelo juiz. A este é

facultado formular ao acusado quaisquer perguntas que julgue

necessárias ao esclarecimento da verdade real.

Prevê o art igo 188 do Código de Processo Penal:

Page 8: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

Art. 188. Após o interrogatório, o juiz indagará das partes se restou algum fato para ser esclarecido, formulando as perguntas correspondentes se o entender pertinente e relevante.

Antes da modificação trazida pela lei 10.792/03 ao artigo

188 do Código de Processo Penal, o antigo artigo 187 da lei processual

vedava qualquer t ipo de intervenção ou participação do defensor, do

Ministério Público ou querelante no interrogatório. O Superior Tribunal

de Justiça, o Supremo Tribunal Federal e a doutrina entendiam que o

interrogatório do acusado era um ato pessoal do juiz, logo, não

comportava a intervenção nem do Ministério Público, nem do defensor

no ato. Hoje, com a alteração, a lei processual determina que as partes

(defensor, Ministério Público ou Querelante) podem participar do

interrogatório através de perguntas dirigidas ao juiz, e este achado-as

pertinentes e relevantes as fará ao acusado.

A lei 10.792/03 não descaracterizou o interrogatório como

meio de prova e ato de defesa. Contudo, as referidas modificações

objetivaram o aperfeiçoamento do ato em sua dúplice natureza, embora

com ênfase na pesrpectiva da defesa, tanto que o próprio artigo 187 do

CPP, após enumerar algumas perguntas que devem ser feitas pelo juiz ao

acusado, por ocasião do seu interrogatório, enfatiza em seu inciso VIII

que o magistrado deverá ainda questionar o acusado se o mesmo ainda

tem algo a alegar em sua defesa.

1.3. Interrogatório on l ine

Interrogatório por videoconferência, tele-interrogatório,

interrogatório on line, teleaudiência, interrogatório virtual,

videoconferência são expressões util izados pelos estudiosos do direito e

juristas do nosso país ao se reportarem ao interrogatório realizados por

meios tecnológicos. Tais expressões serão vistas ao longo do nosso texto,

Page 9: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

seja em opiniões emanadas pelos doutrinadores, seja pelas

jurisprudências já formuladas a respeito do assunto.

O que vem a ser o interrogatório on l ine?

O interrogatório on line é um ato judicial , presidido pelo

juiz, em que se indaga ao acusado sobre os fatos imputados contra ele

advindo de uma queixa ou denúncia, dando-lhe ciência ao tempo em que

oferece oportunidade de defesa, realizado através de um sistema que

funciona com equipamentos e software específicos.

No interrogatório on line, câmeras e recepção de áudio

podem ser monitorados por controle remoto, identificando os presentes

em cada sala. A conexão é via linha telefônica, com Redes ISDN

(Integrated Services Digital Network) que formam uma conexão de 512

Kbps (quilobit por segundo).

No universo da tecnologia de comunicação, o interrogatório

on line surge facilitando a comunicação de longa distância utilizando não

só o som, mas também as imagens em tempo real.

1.4. As Legislações e o interrogatório on line

Vários países estão inserindo em suas legislações

dispositivos que permitem a utilização de sistemas de interrogatórios on

line nas intervenções processuais do direito.

Os Estados Unidos da América já adota o interrogatório on

line em ações criminais e civis.

Os Tribunais de Cingapura já realizam audiências de oitiva

de testemunhas através de interrogatórios on line nos processos civis,

com projetos para ser aplicado também na seara criminal.

Na Itália, país onde há um grande combate aos setores das

Máfias siciliana, napolitana e calabresa, já se tem a aplicação d

interrogatório on line. Giancarlo Sandro Casell i, ex-chefe do pool

Page 10: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

antimáfia i taliano atualmente responsável pelo sistema carcerário da

Itália afirma que:

“Os interrogatórios são feitos por circuito interno de televisão. Dessa maneira não há constrangimento para testemunhas e existe mais segurança para os setores que estão investigando os mafiosos.” Explicou ainda que: “Para evitar que os mafiosos fossem resgatados ou fizessem ameaças às testemunhas durante os interrogatórios, o Ministério Público passou a utilizar o que eles chamam de videoconferência.”(2)

No Brasil não há lei que regulamente o interrogatório on

line , muito embora já esteja sendo aplicada, mas existem diversos

projetos de lei tramitando no Congresso Nacional, os quais versam sobre

o assunto.

Em 1999, o deputado Luiz Antônio Fleury apresentou ao

Congresso Nacional o projeto lei n. 1.233, o qual modifica a redação dos

artigos 6º, 10, 16, 23, 28, 185, 195, 366 e 414 do Código de Processo

Penal, alterando os critérios para realização do inquérito policial e

possibilitando a realização de interrogatórios e audiências à distância por

meio telemático, através de um canal reservado de comunicação entre o

réu e seu defensor ou curador.

Projeto de Lei nº 1.233, de 1999(Do Sr. Luiz Antonio Fleury)

Modifica redação dos arts. 6º, 10, 16, 23, 28, 185, 195, 366 e 414 do Código de Processo Penal.

O Congresso Nacional Decreta:

..............................................................................................................

Art. 2º.: O art. 185, 366 e 414, passam a vigorar acrescidos de parágrafos com as seguintes redações:

Art. 185:

Parágrafo único: Se o acusado estiver preso, o interrogatório e audiência poderão ser feitos à distancia, por meio telemático que forneça som e imagem ao vivo, bem como um canal reservado de comunicação entre o réu e seu defensor ou curador.(grifo nosso)

Page 11: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

Art. 366:

§ 3º: Na hipótese do art. 362, o não-comparecimento do citado ao interrogatório acarretará a decretação de sua revelia, com nomeação de defensor, prosseguindo-se nos demais termos do processo.

Art. 414:

Parágrafo único: Se o réu não for encontrado, não correrá a prescrição, a partir do dia da juntada aos autos do mandado de intimação em que tiver sido certificada essa circunstancia, até a data de sua intimação pessoal."

Art. 3º: Revogam-se as disposições em contrário.

Art. 4º: Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

JUSTIFICATIVA:

..............................................................................................................

Ao introduzir um parágrafo ao art. 185, procura-se evitar constantes deslocamentos de réus presos ao Fórum, com os perigos e percalços burocráticos que essa remoção muitas vezes representa.

Esta inovação - interrogatório telemático, não será aplicável ao interrogatório no plenário do júri, que possui regras próprias.

A alteração da redação do parágrafo único, do art 195, visa adeqüá-lo ao interrogatório telemático proposto.

Com o acréscimo do parágrafo 4º ao artigo 362 procura-se evitar a suspensão do processo no caso em que o réu, maliciosamente, se oculta para não ser citado pessoalmente, como vem acontecendo com freqüência. Se ele se oculta e ficou sabendo da acusação que pesa conta si, não tem sentido prema-lo pela própria torpeza.

Acrescentando o parágrafo único ao art. 414, pode-se evitar o que acontece muitas vezes, em casos em que o réu permanece oculto ou foragido para não ser intimado pessoalmente da pronúncia, ocasionando o indesejável evento da prescrição.

Sala das Sessões, 17 de junho de 1999.

Deputado Luiz Antonio Fleury

A principal modificação do projeto de lei n. 1.233/99 está

relacionada ao artigo 185 do CPP, cujo parágrafo único determinava que

“Se o acusado estiver preso, o interrogatório e audiência poderão ser

feitos à distância, por meio telemático que forneça som e imagem ao

vivo, bem como um canal reservado de comunicação entre o réu e seu

defensor ou curador”.

O projeto lei n. 2.504/00, do deputado Nelson Proença é

bastante sucinto, in verbis:

Page 12: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

Projeto de Lei nº 2.504, de 2000(Do Sr. Nelson Proença), apresentado em 23/02/2000.

Dispõe sobre o interrogatório do acusado à distância com a utilização de meios eletrônicos (APENSE-SE AO PROJETO DE LEI Nº 1.233, DE 1999.)

O CONGRESSO NACIONAL decreta:

Art. 1º - No Processo Penal poderá o juiz, utilizando-se de meios eletrônicos, proceder à distância ao interrogatório do réu.

Parágrafo único - O interrogatório, neste caso, exigirá que o réu seja assistido por seu advogado, ou à falta, por Defensor Público.

Art. 2º - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

JUSTIFICATIVA:

A lei determina que o réu seja interrogado no curso do processo penal (Art. 185 do CPP). É imprescindível o interrogatório do acusado, pois, constitui-se em meio de prova e também de defesa no processo penal. Diariamente, uma média de 120 presos são deslocados dos presídios para o Fórum do Distrito Federal. Esses deslocamentos obrigam á Secretaria de Segurança Pública a mobilizar um contingente de cerca de 300 policiais, entre civis e militares, para evitar fugas e garantir a segurança de Juízes, Promotores, advogados e do público em geral. Essa movimentação custa aos cofres do Distrito Federal R$3.5 mil por dia ou algo em torno de R$840 mil por ano.

De outra parte, esses deslocamentos têm ensejado oportunidades de fuga com lesões e até mortes de policiais da escolta, de pessoas do povo presentes no momento da fuga e também de presos.

Inquestionável, pois, o ganho em economia e segurança que o interrogatório à distancia, através do equipamento conhecido como videoconferência ensejará.

A medida possibilitará, ainda, maior celeridade na instrução processual, demonstrando a experiência que, em muitos casos, o interrogatório é adiado e o preso retorna à penitenciária para aguardar nova convocação.

A Justiça do Distrito Federal tem procurado adaptar-se às inovações tecnológicas, para agilizar os serviços judiciários.

O sistema de videoconferência já vem sendo usado com sucesso em atividades como telemedicina, teleeducação, design, engenharia, etc. Conectado a um ou vários pontos em uma sala especialmente preparada o sistema permite que os interlocutores se vejam e se falem como se estivessem no mesmo ambiente, mercê de uma perfeita qualidade de imagem que torna possível observar até os detalhes da expressão da pessoa, controlando-se a aproximação da imagem com o recurso zoom.(Revista Consultor Jurídico, 26 de março de 2002)

Em 12 de julho de 2001, o relator da matéria na Comissão de

Constituição e Justiça e Redação da Câmara, deputado Aldir Cabral

emitiu parecer pela aprovação, com substitutivo, do projeto Fleury, e

Page 13: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

pela rejeição do projeto de lei n. 2.504/00, que tramita em apenso. A

proposta do ano de 2000 tem artigo único e é menos complexa que a

iniciativa n. 1.233/99.

O projeto de lei 2.437/00, apresentado em 24/02/2000 por

Germano Rigotto acrescenta parágrafo ao art. 217 do Decreto-lei nº

3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, para permitir

que testemunhas deponham via televisão, em caso de ameaças.

O projeto de lei n. 248, do senador Romeu Tuma, acrescenta

aos artigos 185 e 792, ambos do Código de Processo Penal, a realização

de interrogatórios à distância nas audiências, através de recursos

tecnológicos.

O projeto de lei apresentado pelo Senador Romero Juca,

acrescenta no Código de Processo Penal o artigo 217-A versando a

realização do interrogatório à distância e a uti lização de meios de

presença virtual do réu preso nas audiências de averiguações de

testemunhas. Este projeto também altera os dispositivos 185 e 792 do

CPP.

O projeto de lei n. 704/01, de autoria do deputado Edson

Gomes, dispõe sobre a instalação de aparelhos de videoconferência para

interrogatórios à distância dos presidiários.

O projeto de lei n. 1.237/03, cujo autor é Luiz Antônio

Fleury, altera o Código de Processo Penal, disciplinando o interrogatório

de réu preso pelo sistema de videoconferência e possibil ita a realização

de audiência sem sua presença nas hipóteses previstas.

A Medida Provisória nº 28, de 2002, em seu artigo 6º,

autorizou o uso de equipamentos que permitiam o interrogatório e a

inquirição de presidiários pela autoridade judiciária, bem como a prática

de outros atos processuais, de modo a dispensar o transporte dos presos

para fora do local de cumprimento da pena.

MEDIDA PROVISÓRIA N o 28, DE 4 DE FEVEREIRO 2002.

Page 14: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

Dispõe sobre normas gerais de direito penitenciário e dá outras providências

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 62 da Constituição, adota a seguinte Medida Provisória, com força de lei:

.... .........................................................................................................

Art. 6o O estabelecimento penitenciário ou prisional poderá ter instalações e equipamentos que permitam o interrogatório e a inquirição de presidiários pela autoridade judiciária, bem como a prática de outros atos processuais, de modo a dispensar o transporte dos presos para fora do local de cumprimento de pena.

..............................................................................................................

Brasília, 4 de fevereiro de 2002; 181o da Independência e 114o da República.

FERNANDO HENRIQUE CARDOSOAloysio Nunes Ferreira Filho

O Tribunal de Justiça da Paraíba, regularizou o

interrogatório on line através da Portaria 2.210/02.

No Estado de São Paulo, a Lei nº 11.819, de 5.1.2005,

dispõe sobre a implantação de aparelhos de videoconferência para

interrogatório e audiências de presos à distância.

1.5. Interrogatório on l ine no Poder Judiciário

A internet surgiu na década de 60 e tratava-se de uma rede

de informática de aplicação mili tar, e que estava sob o poderio do

governo norte-americano.

Com a revolução tecnológica, a informatização ganha campo

na área das comunicações afetando todos os setores da sociedade.

O Poder Judiciário começou a uti lizar dos meios

tecnológicos para agil izar determinados atos de procedimento,

desburocratizando vários de seus setores, por exemplo, o da distribuição,

do arquivo, entre outros.

Page 15: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

Hoje há um debate caloroso no meio jurídico quanto a

util ização da tecnologia na realização de interrogatórios.

No Brasil, como vimos, ainda não existe uma lei que

regulamente os interrogatórios on line , contudo estes já estão sendo

realizados em alguns estados da nação, por exemplo, Brasília,

Pernambuco, Paraíba, São Paulo e Rio Grande do Sul.

O primeiro interrogatório on line no sistema processual

penal do Brasil ocorreu em 1996, numa vara criminal de São Paulo, com

uso do sistema rudimentar, ou seja, a audiência foi realizada por meio de

e-mail.

O estado de Brasília foi o pioneiro a realizar o interrogatório

on line, sendo seguido por Pernambuco.

2. PRÓS E CONTRAS AO INTERROGATÓRIO ON LINE

2.1. Doutrina

Apesar de estar sendo realizado o interrogatório on line em

alguns estados do nosso país, há no mundo jurídico duas correntes quanto

a questão de sua realização.

Os adeptos ao interrogatório on l ine apontam vantagens

quanto a sua util ização, tais como: a) diminuição dos gastos públicos,

não necessitando o deslocamento de escoltas de soldados, carros e motos;

b) agil ização no interrogatório, diminuindo a demanda da saída dos

processos, e sanando o problema da falta de transporte para os presos

serem conduzidos ao Fórum, fato que acontece com freqüência; c) o

problema da superlotação carcerária tende a ser minimizada na medida

em que os processos serão agilizados; d) diminuição de fugas de presos,

devido ao não deslocamento do preso ao Fórum, conseqüentemente

haverá uma segurança maior a população; e) integridade de informação

no interrogatório na medida em que a videoconferência é gravada em

disquete ou CD-ROM e arquivada, sendo acompanhada por um assessor

Page 16: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

jurídico da penitenciária junto ao preso e um defensor juntamente com o

juiz; etc.

O juiz da 1ª Vara de Execução Penal do Tribunal de Justiça

de Pernambuco, Adeildo Nunes, ao ser entrevistado pela equipe da

impressa do PPAB (Presídio Aníbal Bruno), emitiu o seguinte

posicionamento, logo após a realização do lançamento oficial da

videoconferência na justiça pernambucana.

“[...] Imprenssa:Na sua opinião, isso vai facilitar o trabalho da Justiça, Dr. Adeildo? Juiz: Mas é claro, isso é um pioneirismo, talvez no Brasil. Eu lhe asseguro que no nordeste não existe um modelo como este. Não sei no sul do País, que é sempre mais evoluído. Eu considero essa solução da maior importância. Você pode observar que eu tenho contato direto com o preso. Isso é um motivo de humanização que a gente tanto pretende dentro das penitenciárias, não é? É a condição de o preso poder falar diretamente com o Juiz, que é muito importante. Não é para o Juiz não, é para o preso. O preso se sente mais seguro com o Juiz. E, muitas vezes, por falta de estrutura material e física, naquelas visitas que a gente faz normalmente, não há condição de falar com o preso. Quantas e quantas vezes eu vou para a penitenciária e, é o caso do Aníbal Bruno, por exemplo, e deixo de atender 15 a 20 presos por que não deu tempo. É demorado, e procura a pasta e não acha...E aqui não, aqui a gente já tem uma estrutura. O fato de a relação dos processos poder chegar antecipadamente por fax e a gente então poder agilizar é ótimo(3)

A imprensa pernambucana, precisamente o Jornal do

Commercio, em maio de 2001 divulgou para sociedade a seguinte notícia:

“ A justiça pernambucana dispõe de mais de um instrumento para agilizar os processos dos detentos do Presídio Aníbal Bruno. Em caráter experimental, o juiz da 1ª Vara de Execução Penal, Adeildo Nunes, interrogou ontem três presidiários através de teleaudiência. Em poucos minutos, Adeildo Nunes ouviu Sebastião Luiz de Araújo, Renildo José da Silva e José Severino do Nascimento Júnior. Os casos de Renildo e Sebastião tiveram resultados imeditos, devendo os dois saírem do regime fechado para o semi-aberto. “Há oito meses que pedia para revisarem meu processo e em cinco minutos o juiz resolveu tudo” comemorou Renildo, condenado há reclusão de dois anos e três meses por porte de arma e mais seis anos pela Comarca de Abreu e Lima e que deve ir para Penitenciária Agrícola de Itamaracá. Apenas o caso de José Severino, preso, também, por porte ilegal de arma, não foi resolvido no momento, mas terá o parecer na próxima semana “.(J.C., maio/2001)

Doutor em direito penal, co-fundador e primeiro presidente

do IBCCRIM, Luiz Flávio Gomes, em seu artigo “O Uso da

videoconferência na Justiça”, afirma que:

Page 17: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

“Não vejo sinceramente nenhum mal na utilização de toda essa inovação tecnológica no âmbito da Justiça, ao contrário, isso constitui considerável avanço, que até pode combater a sua clássica morosidade[...].[...]Os interrogatórios em juízo são cada vez mais demorados. O custo do transporte dos presos não é irrisório. A insegurança que traz é patente. Incontáveis resgates acontecem justamente quando estão sendo transportados. Uma precatória para ouvi uma testemunha demora meses. A rogatória anos. Até quando a Justiça ficará excluída da modernidade comunicacional?[...]A difusão da videoconferência na Justiça está fadada a evitar o envio de milhões de of´cios, de requisições, de precatórias, é dizer, economiza-se tempo, papel, serviço, dinheiro etc. Pode-se ouvir uma pessoa em qualquer ponto do país ou do planeta, sem necessidade do seu deslocamento. Elimina-se riscos, seja para o preso( que pode ser atacado ou resgatado quando está sendo transportado), seja para a sociedade.”(4)

A corrente contrária a realização de interrogatórios on line

entendem que: a) o interrogatório on line retira do preso ou acusado o

contato físico, sendo fundamental tais característ icas; b) o interrogatório

on l ine não pode ser aplicado por falta de lei; c) o interrogatório virtual

fere princípios e garantias constitucionais, tais como o devido processo

legal, a dignidade, a ampla defesa, o contraditório, a legalidade, etc.

O movimento de oposição ao interrogatório on line tem

como adeptos a Associação Juízes para Democracia(AJD), o Conselho

Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o Instituto Brasileiro

de Ciências Criminais (IBCCRIM), a Associação dos Procuradores do

Estado de São Paulo (APESP), o Insti tuto de Defesa do Direito de Defesa

(IDDD) e outras entidades de âmbito estadual e nacional, inclusive

órgãos públicos.

O advogado criminalista, Luiz Flávio Borges D’Urso, em seu

artigo “O interrogatório por teleconferência: uma desagradável Justiça

virtual” , expõe que o interrogatório on line ( videoconferência):

“ revela-se perversa e desumana, afastando o acusado da única oportunidade que tem para falar ao seu julgador, trazendo frieza e impessoalidade a um interrogatório.[...]O interrogatório é a grande oportunidade que tem o juiz para formar juízo a respeito do acusado, de sua personalidade, da sinceridade, de suas desculpas ou de sua confissão.[...]Além disso, pensamos que a tese não resiste há uma análise de constitucionalidade, porquanto nossa Carta Magna consagra a ampla defesa(art. 5º, LV, CF), bem como o Brasil subscreveu pactos internacionais, nos quais, entende-se que não há devido processo legal, se não houver

Page 18: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

apresentação do acusado ao juiz( Convenção Americana sobre Direitos Humanos).”(5)

2.2. Jurisprudência

Os Tribunais do nosso País têm emitidos os seguintes

entendimentos quanto a questão do interrogatório on line:

“INTERROGATÓRIO JUDICIAL ON-LINE.Valor-Entendimento – O sistema de teleaudiência utilizado no interrogatório judicial é válido à medida que são garantidas visão, audição, comunicação reservada entre o réu e seu defensor e faculta, ainda, a gravação em compact disc, que será anexado aos autos para eventual consulta. Assim, respeita-se a garantia da ampla defesa, pois o acusado tem condições de dialogar com o julgador, podendo ser visto e ouvido, além de conversar com seu defensor em canal de áudio reservado.”(TACRM/SP – Apelação nº 1.384.389/8 – São Paulo – 4ª Câmara – Relator: Ferraz de Arruda – 21.10.2003 – V.U., Voto nº 11.088).

“Hábeas Corpus – Pretensão de se anular instrução realizada pelo sistema de videoconferência – Alegação de violação dos princípios do devido processo legal, contraditório e ampla defesa – Nulidade inocorrente – violação não caracterizada porque mantido o contato visual e direto entre todas a partes e porque facultada a permanência de um defensor na sala de audiência e outro na sala especial onde o réu se encontra – Medida que, ademais acarreta celeridade na prestação jurisdicional e sensível redução de custos para o Estado- Ordem denegada”( Tribunal de Justiça de São Paulo, Hábeas Corpus nº 428.580-3/8)

“ Recurso de habeas corpus. Processo Penal. Interrogatório feito via sistema conferencia em real time. Inexistindo a demonstração de prejuízo, o ato reprochado não pode ser anulado, ex vi artigo 563 do CPP. Recurso desprovido” (STJ, RHC 6272/SP, 5ª Turma, Rel. Ministro Félix Fischer, j. 3/4/97, impetrante Evaldo Aparecido dos Santos)

Em 14 de setembro de 2004, ao analisar o recurso ordinário

em Habeas Corpus 15.558/SP, impetrado em favor de Jair Facca Junior, a

5ª Turma do STJ decidiu, por unanimidade, que o uso do interrogatório

on line em ação penal não acarreta cerceamento do direito de defesa, não

havendo portanto nulidade a sanar.

Na verdade o interrogatório on l ine não afeta as garantias do

presos. A presença virtual do preso, através da videoconferência, é real e

Page 19: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

interativa. As partes são vistas e ouvidas simultanteamente sem prejuízo

nenhum de som ou imagem.

O novo sistema de instrução evita os julgamentos à revelia e

os fenômenos interligados aos atos processuais, tais como, a

impossibil idade do deslocamento do acusado seja por doença ou condição

financeira.

2.3. Opinião do Preso

A opinião de um detento concessionado, Paulo Ricardo feito

no encontro feito por interrogatório on l ine entre a FISEPE, a equipe da

coordenação do projeto em Pernambuco, o Tribunal de Justiça – TJPE, o

Presídio Aníbal Bruno – PPAB e autoridades do Tribunal de São Paulo e

da área de Segurança Pública, foi:

“[...]Há o entusiasmo dos presos aqui dentro, porque tudo o que vem ajudar na saída deles, do detento para sociedade, é bem visto pela comunidade do presídio. Vocês têm aí em São Paulo uma situação explosiva. A comunidade carcerária, aí, vive tensa, vive em rebeliões. Quem sabe, seja pela lentidão dos processos criminais e esse sitema está aí para liquidar com tudo isso. Todo dia aqui é para apresentar 40 presos à Justiça, que nem sempre são levados ao juiz por diversos motivos. E isso pode ser resolvido pela teleconferência dependendo de quantas salas estiverem montadas.”(6)

3. AMPLA DEFESA

Preceitua a Consti tuição Federal em seu artigo 5º, LIV que

“Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido

processo legal”.

Determina o art igo 5º, inciso LV, da Constituição Federal

que “aos li tigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos

acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com

os meios e recursos a ela inerentes”.

A ampla defesa como corolário do devido processo legal

serve de segurança jurídica dada ao acusado ou réu para que ele traga ao

Page 20: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

processo todos os elementos tendentes a elucidar a verdade, podendo até

valer-se do silêncio, se entender necessário.

A ampla defesa contém duas regras, quais sejam: a) a

possibilidade do acusado se defender (esta contida na defesa técnica e na

autodefesa) e, b) na possibil idade de recurso.

Entende-se por defesa técnica aquela realizada por meio de

advogado. Já a autodefesa é aquela em que o acusado assume a proteção

processual dos seus próprios interesses em face da acusação que pesa

contra si . Salutar observar que a defesa pessoal (autodefesa) no processo

penal brasileiro só é conhecida por ocasião do interrogatório.

Defesa ampla, na realidade, assegura ao acusado a

autodefesa, a defesa técnica, a defesa efetiva, defesa por qualquer meio

de prova (inclusive a prova i lícita, que só é admitida pro reo , para

comprovar a sua inocência), o direito do acompanhamento da prova

produzida, de fazer a contraprova, etc.

Segundo a súmula 523 do STF: “No processo penal, a falta

de defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará

se houver prova de prejuízo para o réu” .

Sabemos que o acusado não está obrigado a praticar nenhum

ato que lhe desfavoreça, podendo, por exemplo, mentir durante o

interrogatório. Não há o crime de perjúrio no Brasil (privilégio contra

auto-incriminação).

Por fim o processo penal, como instrumento para realização

do Direito Penal, deve observar a sua dupla função: tornar viável a

aplicação da pena,e servir como efetivo instrumento de garantia dos

direitos e liberdades individuais, assegurando os indivíduos contra atos

abusivos do Estado.

4. PRINCÍPIO DA VERDADE REAL (DA VERDADE PROCESSUAL)

Para o processo penal o que importa é descobrir a realidade

dos fatos.

Por força do princípio da verdade real, vigora no processo

penal brasileiro a regra da liberdade de provas, ou seja, todos os meios

Page 21: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

probatórios, em princípio, são válidos para demonstrar a verdade real.

Contudo, existem exceções e restrições, quais sejam: provas ilícitas,

prova ilícita por derivação, prova i legítima e o artigo 475 do Código de

Processo Penal.

As provas il íci tas e a prova ilícita por derivação são

inadmissíveis no processo, mas passam a ter valor jurídico se forem a

favor do réu ou acusado, por força do princípio da proporcionalidade,

uma vez que a presunção de inocência deve preponderar sobre a

inadmissibilidade da prova ilícita.

Trabalhar com a verdade real (ou material) é colher

elementos probatórios necessários e l ícitos para se comprovar, quem

realmente praticou um ato il ícito.

A prova existe para ajudar a formação do convencimento do

juiz sobre a veracidade de uma afirmação de fato alegada pelas partes em

juízo.

A aplicação da norma penal no infrator somente poderá ser

efetivada se todos os esforços e meios legais tenham sido devidamente

empregados, assim demonstrando a culpa do indivíduo.

Nos dizeres de Carnelutti, a tarefa do processo penal está em

saber se o acusado é inocente ou culpado.

O Direito deve socorrer-se de outras ciências e meios para

que se possa chegar o mais próximo possível da verdade real .

Descobrir a verdade do fato praticado, através da instrução

probatória, proporciona ao juiz, no momento da sentença, aplicar a lei

penal ao caso concreto, extraindo a regra jurídica que lhe é própria.

Importante ressaltar que, não obstante chamarmos de

verdade real (material), nem sempre ela condiz com a realidade fática

ocorrida no mundo físico.

Page 22: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

Conceituar a verdade é adentrarmos no mudo fi losófico. O

que pode ser verdade para uns pode não ser para outros. Porém, em se

tratando de verdade material a ser apurada nos autos de um processo há

que se considerar a adequação entre o fato objeto do processo e o fato

ocorrido no mundo dos homens.

Filósofos que estudaram a teoria da verdade afirmam que a

verdade absoluta é inatingível. Logo, o processo deve buscar a verdade

que seja possível atingir sem violar a moral e prejudicar o sujeito que irá

responder pelos atos il íci tos a ele atribuídos. O desejo de se descobrir a

verdade é o desejo de se realizar a justiça.

O advogado e professor, Gustavo Henrique, entende que:

“Regras de Teoria Geral do Processo distinguem claramente a verdade buscada pelo processo civil da buscada pelo processo penal. O professor EGAS MONIZ DE ARAGÃO disserta que, de há muito se repete, com se estivesse certo haver, no mínimo, três “verdades”, ou três graus da “verdade”, perante o Direito: “a que é verdade mesmo”; “a que se supõe que seja”, “verdade material” (que perseguem os processualistas penais); a que não o é, conquanto possa também sê-lo, sendo até irrelevante se é ou não é, “verdade formal” (com que deveriam contentar-se os processualistas civis). Basta enunciar essas proposições para perceber sua improcedência.Pondera o mesmo professor, mais adiante, que a busca do processo, tanto civil quanto penal, nem pode ser outra que a verdade dos fatos, mas tendo ou não alcançado este estágio, há um momento que o processo tem de ser dado por encerrado e o julgador tem de proferir sentença. Portanto, se não se atinge o objetivo (verdade), não é porque sua finalidade não seja alcançá-la, e sim por meras circunstâncias acidentais, que sobre ele influem com intensidade maior ou menor. A verdade do juiz é subjetiva.A posição atualmente mais aceita é a de que o processo penal busca a descoberta da verdade material – sinônimo de verdade real -, enquanto para o processo civil basta a verdade formal, esta entendida como aquilo que resulta ser verdadeiro em face das provas carreadas aos autos. Em outras palavras, no processo civil cabe às partes convencer o juiz, apresentando-lhe provas. Já o processo penal deve buscar a verdade real, e só contentar-se com a verdade formal para absolver.Assim, uma condenação criminal sempre deverá pressupor o encontro da verdade real acerca dos fatos descritos na acusação. Isso é indeclinável e sobre isso não pode haver exceção alguma, sob pena de ilegais violações a direitos fundamentais do homem.Desde logo percebe-se, todavia, que a verdade material é difícil de ser atingida sem o auxílio de meios científicos. Sim, pois se a palavra de uma testemunha tem o seu quantum de verdade apurada meramente pelo juiz, através de métodos empíricos, não se poderá falar, em absoluto, em verdade material. Pois a verdade material

Page 23: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

pressupõe – ou deveria pressupor – o máximo de verdade possível de ser encontrada em relação à construção histórica de determinado fato. É certo que a verdade absoluta é inatingível. Todavia a reconstrução dos fatos ou a busca da verdade deve ser feita através dos mais eficazes meios para tanto.Assim é que a polícia técnica atualmente auxilia o magistrado, apontando-lhe, através de critérios científicos, detalhes que possam, ao máximo possível, levar ao conhecimento da verdade real.Conclui-se, portanto, que a verdade real ou material deve ser buscada pelos meios mais eficazes disponíveis na sociedade em determinada época. Isso também deve ocorrer, portanto, em relação à prova testemunhal. Ora, se atualmente existem métodos científicos - principalmente afetos à psicologia - disponíveis para a busca da verdade material, inconcebível que ainda sejam utilizados métodos empíricos.”(8)

O Processo Penal moderno deve perseguir a verdade material

(real), util izando-se da verdade científica, e até mesmo utilizar meios

tecnológicos para tais fins.

5. CONCLUSÃO

O interrogatório no processo penal com o advento da Lei

10.792/03, sofreu modificações substanciais. Muito embora a referida

Lei seja silente quanto a realização do interrogatório por meio de

videoconferência, alguns Tribunais do nosso país já estão realizando os

chamados interrogatórios on line. Contudo, a util ização da tecnologia no

interrogatório gerou na seara processual penal duas correntes.

Page 24: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

A primeira corrente defende que tais meios lesam direitos e

garantias do réu ou acusado(devido processo legal, ampla defesa e

contraditório), pois o momento “face a face” com o juiz é único para o

preso. Alegam também que a aplicação desta tecnologia não está prevista

em lei. Lamentável tal argumento, pois se não está previsto

explicitamente, também não há proibição legal, o que há é uma omissão

em que a lei 10.798/03 fez questão em mantê-la quanto ao artigo 185 do

Código de Processo Penal.

Os adeptos a realização do interrogatório on line afirmam

que o fato da presença ser virtual em nada atinge os direitos e garantias

do preso (devido processo legal, ampla defesa e contraditório), pelo

contrário tal tecnologia proporciona ao processo penal agil ização, e com

isso o preso terá os seus direitos observados no seu devido tempo, pois

aqueles que esperam, por exemplo, pela progressão de regime não

perecerá no tempo para obtê-la.

A realização do interrogatório on l ine fere a ampla defesa do

acusado ou réu?

Vimos ao longo do presente art igo que as modificações

ocorridas quanto ao interrogatório, na verdade ampliaram os direitos e as

garantias do acusado, dentre elas: a) as partes poderão, desde que

fundamentada, requerer novo interrogatório; b) antes da realização do

interrogatório, o juiz assegurará o direito de entrevista reservada do

acusado com seu defensor; c) presença obrigatória do defensor no

interrogatório; d) após o interrogatório as partes (Defensor, Ministério

Público e Querelante) poderão participar do mesmo formulando

perguntas e dirigindo-as ao juiz, e este achando-as pertinentes e

relevantes as fará ao acusado; e) o silêncio do acusado não poderá ter

interpretação de confissão, etc. Tais modificações trazem de forma clara

a ampliação a favor da defesa do acusado. A preocupação do legislador

em garantir a máxima defesa ao acusado é notória, fazendo assim jus a

um sistema processual penal que tem bases em um Estado Democrático

de Direitos.

Page 25: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

No interrogatório on line, câmeras e recepção de áudio

podem ser monitorados por controle remoto, identificando os presentes

em cada sala.

No momento da realização do interrogatório on line, todas as

determinações legais são cumpridas, senão vejamos: existe a presença

das partes(Defensores, Ministério Público ou Querelante) no referido ato;

o magistrado fala que o réu não está obrigado a responder a nenhuma

pergunta, mas que é o interrogatório o momento próprio para que o

acusado exponha a sua verdade sobre a acusação; é feita a leitura da

denúncia; são realizadas as perguntas em sua duas fases (sobre a pessoa

do acusado e sobre os fatos); as partes participam do interrogatório

realizando perguntas, entre outros procedimentos.

Quando falamos de “ampla defesa do acusado” devemos

entende-la como aquela em que o réu ou acusado tem assegurado a

autodefesa, a defesa técnica, a defesa efetiva, a defesa por qualquer meio

de prova, o direito de acompanhamento da prova produzida, de fazer a

contraprova, de manter o silêncio e até mesmo de mentir durante o

interrogatório, pois não há o crime de perjúrio no Brasil. Sabemos que o

acusado não está obrigado a praticar nenhum ato que lhe desfavoreça, e

que a falta de defesa gera nulidade absoluta. Portanto, o acusado pode

valer-se de vários meios para elucidar, esclarecer os fatos a ele

imputados.

Defesa ampla como corolário do devido processo legal serve

de segurança jurídica dada ao acusado ou réu para que ele traga aos

autos todos os elementos tendentes a esclarecer a verdade, podendo até

valer-se do silêncio.

A realização do interrogatório on line não veta os

procedimentos que a justiça deve assegurar quanto a ampla defesa do

acusado, posto que todos os atos impostos por lei são observados pelos

magistrados.

A presença do acusado, do defensor, do magistrado e demais

pessoas presentes no interrogatório on line é uma presença em tempo

real. O juiz ouve e vê o acusado, sendo a recíproca verdadeira. Imagens e

sons são transmitidos e recebidos reciprocamente, sem interferências ou

Page 26: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

falhas. A tecnologia é de “ponta”, considerada de alta qualidade e

eficiência. Na verdade, a tecnologia util izada no interrogatório on line só

difere do interrogatório “ frente a frente” quanto ao espaço, ou seja, um é

virtual o outro não. O fato do espaço ser virtual não traz prejuízos aos

procedimentos a serem adotados e não tira do acusado a sua

possibilidade de exercer a sua autodefesa, o seu silêncio, a sua ampla

defesa.

Os Tribunais pátrios entendem que a videoconferência em

nada afeta os direitos e garantias do preso, posição esta já encontrada no

Superior Tribunal de Justiça.

A própria comunidade carcerária vem aceitando e acatando

tal procedimento(interrogatório on l ine), afinal é um meio ágil e eficaz

deles – presos- terem seu direito a l iberdade em tempo, tendo a certeza

que não correm o risco de pagarem além do que devem para sociedade.

Não resta dúvidas que a realização do interrogatório on l ine

não fere a ampla defesa do acusado, posto que todos os seus direitos são

observados e exercidos.

Para o processo penal o que importa é descobrir a realidade

dos fatos.

Por força do princípio da verdade real, vigora no processo

penal brasileiro a regra da liberdade de provas, ou seja, todos os meios

probatórios, em princípio, são válidos para demonstrar a verdade real.

A prova existe para ajudar a formação do convencimento do

juiz sobre a veracidade de uma afirmação de fato alegada pelas partes em

juízo.

O interrogatório, como meio de prova, deve ser analisado em

conjunto com as outras provas acostadas aos autos.

A aplicação da norma penal no infrator somente poderá ser

efetivada se todos os esforços e meios legais tenham sido devidamente

empregados, assim demonstrando a culpa do indivíduo.

Finalmente, o Direito é dinâmico e deve acompanhar os

passos da sociedade. A descoberta da tecnologia em beneficio da

humanidade deve ser usada em todos os setores, como o é atualmente. Os

Page 27: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

aplicadores do direito devem ser reciclados em suas visões para que não

parem no tempo e sirvam de verdadeiros monumentos de museus.

Portanto, se a videoconferência não elimina os direitos e

garantias do preso, não há motivos para não realiza-la, ao contrário,

segundo alguns juízes que tiveram a oportunidade de realizá-las

opinaram por mantê-las, pois sentiram que poderiam levar ao réu, ao

acusado uma Justiça mais célere.

Isto posto, o interrogatório on line traz para o mundo do

processo penal o dinamismo que tanto necessitava, fazendo Justiça a

tempo, e quiçá, no futuro, sanando todos os problemas que o sistema

prisional tem em conjunto com o Judiciário.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARAS, Vlademir. Princípios do Processo Penal. Disponível em:

http://www.mundojuridico.adv.br/html/artigos/documentos/texto115.htm. Acesso em:

11/02/2005.

Page 28: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

__________Teleiterrogatório não elimina nenhuma garantia processual(tele-hearing

does not eliminate any procedural guarantee). Disponível em:

wwwcbcji.com.br/br/novidades/artigos/main.asp?id=3601

Acesso em: 11/02/2005.

BARROS, Antonio Milton de. Reforma do CPP: principais inovações referentes ao

interrogatorio do acusado. Disponível em:

http://apmp.com.br/avisos/artigo_interrogatorio.htm. Aceso em: 25/04/2005.

CAPEZ, fernando.Curso de Processo Penal.São Paulo: Saraiva, 2002.

CAMPOS, Pedro Franco de. Princípios Constitucionais do Processo Penal-questões

polêmicas. Disponível em: www.mundojuridico.adv.br. Acesso em: 10/03/2005.

DIETRICH, Gustavo Henrique.A Verdade no processo penal moderno.Disponível me:

http://www.dietrich.adv.br/i_ler_artigos.asp?id=15. Acesso em: 02/02/2005.

DOTTI, René Ariel. O interrogatório à Distância: Um novo Tipo de Cerimônia

Degradante, in RT, junho/97, vol. 740, pp. 476 a 481.

D’URSO, Luiz Flávio Borges. O interrogatório por teleconferência: uma desagradavel

Justiça virtual. Disponível em: http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3471

Acesso em: 01/02/2005.

D’URSO, Luiz Flávio Borges. O interrogatório por teleconferência: uma desagradável

Justiça virtual.Jus Navegandi, Terezina, ª7, n. 60, nov. 2002. Disponível em:

http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3471. Acesso em: 01/02/2005.

GOMES, Luiz Flávio. O Uso da Videoconferência na Justiça. Disponível em:

http://www.justiçavirtual.com.br/artigos/art120.htm. Acesso em: 11/02/2005.

_________________. Reformas Penais(VI): defesa efetiva e interrogatório. Disponível

em: http://www.mundojuridico.adv.br/html/artigos/documentos/texto206.htm. Acesso

em: 21/04/2005.

GÜNTHER, Ulrich N. Proteção de Vítimas e Testemunhas no Processo Penal na

Alemanha. Revista Direito Mackenzie. Número 2. Ano 1. 24/3/2003.

LAMBERT, Amanda Maria. O Uso da Videoconferência No Poder Judiciário.

Disponível em: http://www.peritocriminal.com.br/judiciariovc.htm. Acesso em:

10/02/2005.

LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. São Paulo: Método, 2005.

MIRABETE, Julio Fabrine.Processo Penal. São Paulo: Atlas, 1997.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo: Atlas, 2002.

Page 29: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

NORONHA, E. Magalhães. Curso de Direito Processual Penal. São Paulo: Saraiva,

1998.

PEREZ, Carlos Alexandre Dias, et al. 144- Aplicações de videoconferência em áreas

críticas de gestão governamental.p. 13. Disponível em:

www.cqgp.sp.gov.br/downloads/T00144.PDF. Acesso em: 01/02/2005.

PITOMBO, Cleonice Valentim Bastos, et al. Publicidade, ampla defesa e contraditório

no novo interrogatório judicial. Disponível em:

http://www.mundojuridico.adv.br/html/artigos/documentos/texto803.htm. Acesso em:

20/04/2005.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo:

Malheiros, 2000.

NOTAS.

(1) ARAS, Vlademir. Teleinterrogatório não elimina nenhuma garantia processual

(Tele-hearring does not eliminate any procedural guarantee), p. 02. Sociedade Digital.

Disponível em: htpp://www.cbeji.com.Br/Br/novidades/artigos/main.asp?id=3601.

Acesso em: 25 janeiro 2005.

Page 30: INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA Ana Cláudia …sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/interrogatorio.pdf · Ana Cláudia da Silva Bezerra ... requerimento da parte

(2) GÜNTHER, Ulrich N. Proteção de Vítimas e Testemunhas no Processo Penal na

Alemanha. Revista Direito Mackenzie. Número 2. Ano 1. 24/3/2003.

(3) PEREZ, Carlos Alexandre Dias, et al. Aplicações de Videoconferência em Áreas

Críticas de Gestão Governamental. Disponível em:

www.cqgp.sp.gov.br/downloads/T00144.pdf Acesso em: 01/02/2005.

(4) GOMES, Luiz Flávio. O Uso da Videoconferência na Justiça.Artigos Clássicos. p.

1 –2. Disponível em: http://www.justicavirtual.com.br/artigos/art120.htm. Acesso

em:11 fev 2005.

(5) D’URSO, Luiz Flávio Borges. O interrogatório por teleconferência: uma

desagradável Justiça virtual.Jus Navegandi, Terezina, ª7, n. 60, nov. 2002. Disponível

em: http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3471. Acesso em: 01 fev. 2005.

(6) PEREZ, Carlos Alexandre Dias, et al. 144- Aplicações de videoconferência em áreas críticas de gestão governamental.p. 13. Disponível em: www.cqgp.sp.gov.br/downloads/T00144.PDF. Acesso em: 01/02/2005.

(7) DIETRICH, Gustavo Henrique.A Verdade no processo penal moderno.Disponível me: http://www.dietrich.adv.br/i_ler_artigos.asp?id=15. Acesso em: 02 fevereiro 2005.