Jornal sobre o Seminário Local de Marabá - mar/2014

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Informativo da Etapa Marabá do Seminário Internacional Carajás 30 Anos - www.seminariocarajas30anos.org Temas aparentemente sem conexão, o trabalho escravo, ao contrário, tem relação - às vezes bem direta - com o desenvolvimento. Tanto que esta foi a primeira abordagem durante a Etapa Marabá do Seminário Carajás 30 Anos, durante o encontro do GAETE, que precedeu o Seminário. Embora o trabalho escravo pareça ser algo ligado ao atraso, e o desenvolvimento algo atrelado ao moderno, esses dois problemas que afetam os povos da Amazônia se encontram, quando percebemos que grande parte dos casos de trabalho escravo são encontrados nas siderúrgicas que fazem parte da cadeia da mineração, vendida como modelo de desenvolvimento para a região. Na ocasião, foi lido, por Andreia Silvério, da CPT de Xinguara, o poema “Maranhense Arrependido”, da jovem Karoline Vieira, de 14 anos. A obra faz parte de uma coletânea, que compõe a cartilha “Trabalho Escravo Contemporâneo: educar para não escravizar”, que discute esse problema com crianças e jovens da região com o objetivo de prevenção. Veja alguns dos momentos dessas discussão. Trabalho Escravo: O que o desenvolvimento tem a ver com essa questão? Imperatriz/MA * Marabá/PA * Santa Inês/MA * Belém/PA AGORA É A VEZ DE SÃO LUÍS! Seminário Internacional Carajás 30 Anos: ARTICULAÇÃO DOS POVOS DA AMAZÔNIA CONTRA a destruição e o saque

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Breve resumo sobre a Etapa Marabá do Seminário Internacional Carajás 30 Anos

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Informativo da Etapa Marabá do Seminário Internacional Carajás 30 Anos - www.seminariocarajas30anos.org

Temas aparentemente sem conexão, o trabalho escravo, ao contrário, tem relação - às vezes bem direta - com o desenvolvimento. Tanto que esta foi a primeira abordagem durante a Etapa Marabá do Seminário Carajás 30 Anos, durante o encontro do GAETE, que precedeu o Seminário.

Embora o trabalho escravo pareça ser algo ligado ao atraso, e o desenvolvimento algo atrelado ao moderno, esses dois problemas que afetam os povos da Amazônia se encontram, quando percebemos que grande parte dos casos de trabalho escravo são encontrados nas siderúrgicas que fazem parte da cadeia da mineração, vendida como modelo de desenvolvimento para a região.

Na ocasião, foi lido, por Andreia Silvério, da CPT de Xinguara, o poema “Maranhense Arrependido”, da jovem Karoline Vieira, de 14 anos. A obra faz parte de uma coletânea, que compõe a cartilha “Trabalho Escravo Contemporâneo: educar para não escravizar”, que discute esse problema com crianças e jovens da região com o objetivo de prevenção. Veja alguns dos momentos dessas discussão.

Trabalho Escravo:O que o desenvolvimento tem a ver com essa questão?

Imperatriz/MA * Marabá/PA * Santa Inês/MA * Belém/PAAGORA É A VEZ DE SÃO LUÍS!

Seminário Internacional Carajás 30 Anos:ARTICULAÇÃO DOS POVOS DA AMAZÔNIA CONTRA

a destruição e o saque

“A Atual dinâmica do capital e suas contradições”. Esse foi o tema da palestra do professor Aluízio Leal (UFPA), que fez uma explanação sobre o processo de dominação do território amazônico pelo capital, desde os primórdios dessa expansão. A fala serviu para compreender a lógica que vigiu na apropriação desse espaço, não muito diferente da que vigora ainda hoje, em total desrespeito aos povos que a ocupam há muito mais tempo. Aluízio fez fala semelhante durante a Etapa Belém, e estará presente,

também, durante o Seminário Final, em São Luís.O autoritarismo é um “modus” sempre acionado para se

apropriar do espaço no contexto da Amazônia, com destaque para o período ditatorial: a Amazônia aparece como um “espaço privilegiado para o saque capitalista”.

O professor ressaltou o conjunto de empreendimentos que devastam a região: hidrelétricas, hidrovias, plantio de soja, exploração de alumínio etc. Para ele, “a lógica que preside a exploração da Amazônia é a mesma lógica que presidiu todas as guerras. A ditadura formatou um Estado canalha, que abre espaço irrestrito para a atuação do grande capital, seja ele multinacional ou fantasiado de nacional”.

Para ele, esse contexto continua atual, e não dá para pensar a preservação dos recursos disponíveis na Amazônia por dentro da lógica capitalista.

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Violação de direitos por empresa mineradora, falso discurso da responsabilidade social e espionagem aos movimentos sociais e comunidades são debatidos durante

apresentação de ralatório sobre ação da Vale S.A. no Pará e no Maranhão

Antes mesmo da abertura oficial, o Seminário em Marabá já se iniciou pautando alguns dos principais problemas vividos pelas comunidades atingidas pelos chamados projetos de desenvolvimento na Região Amazônica. À tarde do primeiro dia, Sérgio Sauer e Cristiane Faustino, da Plataforma Dhesca, apresentaram o Relatório sobre impactos das atividades de mineração da Vale S.A. e o Relatório sobre violações do direito à terra no Pará, dois documentos importantes que registram várias violações de Direitos Humanos produzidas pelos chamados grandes projetos de desenvolvimento, relacionados ao acesso à terra, à alimentação e meio ambiente. José Batista, assessor jurídico da CPT/PA, falou sobre conflitos de terra e sobre a limitação do Estado em agir nesses casos, como fica evidente na atuação insuficiente e no desmantelamento porque passam órgãos como o Incra e o Iterpa.

Representantes do Incra, da Vara Agrária de Marabá e da Delegacia de Conflitos Agrários do Sudeste do Pará ouviram a seguinte pergunta dos camponeses: “Por que, quando vamos nos órgãos denunciar, somos nós quem saímos de lá criminalizados?”, e quiseram afirmar que não é bem assim, que todos, latifundiários e camponeses, são

tratados de igual modo, e foram duramente contestado pelos participantes: camponeses e suas lideranças, e também indígenas, apontaram a violência e a repressão do aparato estatal, geralmente em apoio a grandes projetos e a latifundiários, como responsáveis pela dramática situação no campo. “Basta ver as fotos expostas lá fora [exposição fotográfica sobre conflitos e mortes no campo, mostra que faz parte do Seminário Carajás] para ver que não existe essa imparcialidade”, disse Rose Bezerra, da CPT/PA.

Os relatórios com as violações de direitos advindos da atividade da mineração na região podem ser acessados no site da Plataforma Dhesca Brasil: www.dhescbrasil.org.br

Palestra de AberturaProfessor Aluízio Leal: “A LUTA EM DEFESA DA AMAZÔNIA É UMA LUTA CONTRA O CAPITAL”

Impactos advindos da mineração e demais projetos de desenvolvimento em discussão nos Grupos de Trabalho e Oficinas

Questões Agrária, Ambiental, Urbana, Indígena, Trabalho, Juventude, Gênero e Geração, Siderurgia e Carvoejamento, Infraestrutura e Logística, Resistências e Lutas Populares. Esses foram os temas das oficinas e dos grupos de trabalho que se reuniram durante a Etapa Marabá do seminário Carajás 30 Anos, para discutir de que forma as populações estão sendo diretamente atingidas pelos projetos e cmo resistir a elas. A seguir, alguns momentos desses encontros, em que as pessoas expressaram suas preocupações e algumas estratégias de resistência.Questão Agrária - os relatos no GT dão conta de que as populações são ignoradas pelo Estado quando da implantação dos projetos de desenvolvimento, ao passo em que são acuadas pela expansão capitalista. “Teve até povo indígena que desapareceu quando da implantação do Programa Grande Carajás”, disseram os participantes, que lembraram: “os migrantes, que vieram sob a promessa de terra para todos, também não foram incorporados no processo, sem contar os que perderam as vidas no enfrentamento com os fazendeiros”.Trabalho - o GT relatou desrespeito inclusive aos próprios trabalhadores da mineração, como na questão da itinerância para a Mina de Carajás, que não era reconhecida pela Vale S.A., mesmo com os trabalhadores levando horas no deslocamento. A Vale contava com a conivência do sindicato, que comprovava sua versão (de que havia transporte público disponível para o acesso às minas, quando todos sabiam não ser isso verdadeiro. A ação judicial condenou a Vale a pagar uma indenização de milhões de dólares nesse caso, em que esse direito foi sonegado por anos aos trabalhadores.Meio Ambiente e Mineração - “E quando essa mina acabar, de que é que esse povo vai viver?”, questionaram os participantes do GT, lembrando a dramática situação de municípios como Canaã dos Carajás (falta de escola, de posto de saúde, de infraestrutura geral), enquanto a mineradora Vale faz fortuna na região. Eles contam que a situação piora, com cooptação de lideranças, como os sindicatos de trabalhadores nos municípios afetados. Um das discussões diz respeito a como resgatar as entidades para a luta dos trabalhadores

e das populações. Os que insistem na resistência vão sendo criminalizados, e respondem a inúmeros processos na justiça, mas seguem dizendo que, mesmo que as ameaças sofridas fossem motivo para recuar, não há como fugir da luta. Os instrumentos de repressão estão mais fortes, com Judiciário, Força Nacional de Segurança batendo nas pessoas e, para isso, a solução, apontam, é “união com coragem, força e determinação, num movimento de massa, para resgatar aquilo que seja de necessidade do trabalhador”. Na questão ambiental, apontam como exemplo a Usina de Tucuruí: “são 2400 km2 de água que não presta. Eles alegam que daqui a pouco vai faltar água, e vão dizer que é o trabalhador que banha muito, que bebe muita água, abre muito a torneira. Mas Tucuruí foi feita para o trabalhador? 2400km2 de água que não presta, com vegetação em decomposição, com agente laranja, com tudo o que não presta. Quem manda no Governo do estado é a Vale, Albrás, Eletrobrás/Eletronorte”, denunciam.Questão Urbana - um dos questionamentos no GT é sobre o que pode ser feito para amenizar a situação de informalidade nos assentamentos. Foi dito que é interessante tanto para o capital quanto para o poder público que essa situação permaneça. “A gente de ocupação só é visto durante as campanhas eleitorais”, denunciam membros do GT e moradores de área de assentamento.Questão Indígena - foram relatados os casos de violações dos direitos dos povos indígenas, agravados pela mineração nesses territórios, e pelos obstáculos impostos aos processos de demarcação e desintrução de terras indígenas, além da situação de vulnerabilidade extrema a que são subjugados povos com os guajajara e os guarani. “é necessário unir as resistências de camponeses, indígenas, quilombolas, ribeirinhos e demais comunidades contra os impactos gerados pelos chamados grandes projetos de desenvolvimento na Amazônia, com destaque para a cadeia da mineração e agronegócio”, afirmam.Infraestrutura - “Hidrelétrica não é feita para atender as demandas da população, mas para atender as corporações”, apontaram.Juventude - “É preciso desmistificar ideias da mídia e das grandes corporações, e isso também através da Educação”.Siderurgia e Carvoejamento - falta fiscalização eficaz da atividade.Gênero & Geração - participantes denunciaram as visões preconceituosas sobre o campo.Essas foram apenas algumas ideias de um profundo debate traçado com foco em unir as resistências contra os ataques sofridos pelos ditos grandes projetos.

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Palestra de Encerramento - Professora Edna Castro:“A AMAZÔNIA ESTÁ NA MIRA DE NOVAS FORÇAS GLOBAIS, EMPRESARIAIS, E DO ESTADO BRASILEIRO

Castro iniciou situando o momento como o do retorno do Estado planejador, com base no neo-desenvolvimento, conservador, que aparece como moderno, sem ruptura, mas como sequência no neoconservadorismo, cujo conceito de progresso é antigo, tradicional, conservador, autoritário. Ela propõe um olhar sobre a Amazônia e suas bordas, a Pan-Amazônia, a Amazônia de todos os países, e que está na mira de novas forças globais, empresariais, e do Estado Brasileiro: “Isso pode não ser novo, mas as estratégias são. O Estado desenvolve técnicas e estratégias para avançar, inclusive nas suas bordas. O que é confuso não é o lugar das empresas, mas o da sociedade e dos direitos sociais, étnicos, políticos e ambientais”, disse.

Ela caracteriza o Programa Grande Carajás como um modelo de intervenção massiva, que contribuiu para transformar a Amazônia numa grande fronteira de commodities, e esse modelo vem sendo aplicado numa escala maior. Assim, “o tamanho da briga (das resistências das populações atacadas) é também maior. Deve ser maior. Os Estados vizinhos também avançam sobre a Amazônia, e há pressão de empresas transnacionais e organismos multilaterais”, afirmou. Ela alertou também para o não-cumprimento, por parte de quem deveria, das medidas legais, consultas, audiências públicas, condicionantes sociais, étnicas e ambientais, numa “impunidade que permanece”, disse.

A professora chamou atenção ainda para o discurso acionado nesse sentido: “se o PIB aumenta, diz-se que a região está se desenvolvendo”. Para ela, essas são ideias velhas, mas que estão na base daquilo que se pensa sobre o Brasil. Um exemplo nesse sentido é o Programa de Aceleração de Crescimento (PAC) do Governo Federal.

Homenagem aos Lutadores de Sempre emociona participantes da Etapa Marabá

Cacique Payaré, do Povo Gavião (representado pela sua filha Kátia, estudante do curso de Ciências Sociais da UNIFESSPA), Cledineusa, do movimento das Quebradeiras de Coco, Alice Margarida, do Movimento de Mulheres, Almir Ferreira Barros, ex-presidente do STTR de São

João do Araguaia, Emanuel Wamberque, do antigo CAT, e Raimundinho, do CEPASP, receberam homenagem e foram muito aplaudidos pelos presentes à noite de encerramento da Etapa Marabá do Seminário Carajás 30 Anos. Cacique Payaré, falecido dias depois, também foi

homenageado e lembrado por diversas vezes durante a Etapa Belém, quando ficou fixada a frase do estudante Marcelo, da UNIFESSPA: “O QUE PAYARÉ MAIS QUERIA É QUE NÓS, OS QUE FICAMOS, CONTINUEMOS SUA LUTA”.

“Há homens que lutam um dia, e são bons. Há outros que lutam um ano, e são melhores. Há os que lutam muitos anos, e são muito bons.Mas há os que lutam toda a vida. Estes são imprescindíveis” - Bertold Brecht

Imperatriz/MA * Marabá/PA * Santa Inês/MA * Belém/PA

AGORA É A VEZ DE SÃO LUÍS!Seminário Internacional Carajás 30 Anos: Resistências e mobilizações frente a projetos de desenvolvimento na Amazônia oriental

5 a 9 de maio, Campus da UFMA

Encaminhamentos da Etapa Marabá1. Que todas as propostas saídas dos trabalhos de grupos sirvam como orientação para as lutas nos locais, contra o avanço do capital e sua feroz destruição da vida; 2. Desenvolver trabalhos locais para organização dos povos para resistências e enfrentamento ao capital representado pelas empresas e o Estado; 3. Organizar uma apresentação pública das propostas do seminário; e 4. Preparação para o seminário em São Luís.