JORNALISMO E SOCIALISMO NO SÉCULO XXI: a representação da Venezuela nas páginas do Granma...

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    Ariane Cristina Gervsio da Silva

    JORNALISMO E SOCIALISMO NO SCULO XXI:

    a representao da Venezuela nas pginas do Granma

    Belo Horizonte

    Centro Universitrio de Belo Horizonte (UNI-BH)

    2010

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    Dedico a os meus pais Ndina Maria e Geraldo Magela, minhas fontes

    de inspirao e motivao.

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    Agradeo minha orientadora, Maria Cristina Leite Peixoto, por

    acreditar na minha capacidade, e s professoras rica Savernini e

    Vanessa de Carvalho, pelo empenho. Agradeo ao professores de

    Relaes Internacionais do UNI-BH por me guiarem por essa rea do

    conhecimento que coloca o mundo em nossas mos.

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    SUMRIO

    1 INTRODUO .................................................................................................................. 07

    2 AMRICA LATINA: TERRENO FRTIL PARA AS IDEIAS SOCIALISTAS.........10

    1.1A experincia socialista em Cuba.......................................................................................101.2 O governo Chvez e o socialismo do sculo XXI ............................................................. 17

    3 JORNALISMO INTERNACIONAL NA AMRICA LATINA .................................... 27

    3.1 Jornalismo Internacional: caractersticas e desafios .......................................................... 27

    3.2 Valores/notcia e gneros jornalsticos............................................................................... 34

    3.2.1 Entre o acontecimento e a notcia.. ................................................................................ 34

    3.2.2 As categorias e gneros jornalsticos ............................................................................. 43

    3.3 As particularidades da comunicao na Amrica Latina................................................... 44

    4 ANLISE DA REPRESENTAO DA VENEZUELA NA EDITORIAINTERNACIONAL DO JORNAL GRANMA .................................................................... 51

    4.1 A importncia da Venezuela determinada pela editorao e gneros jornalsticos ........... 51

    4.2 Divergncias e convergncias entre os valores/notcia e as temticas freqentes ............ 58

    4.3 Presena de elementos do jornalismo internacional latino-americano .............................. 60

    4.4 Padro de cobertura como determinante de posicionamento poltico ............................... 62

    5 CONCLUSO ..................................................................................................................... 64

    REFERNCIAS .................................................................................................................... 66

    ANEXOS ................................................................................................................................ 69

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    1 INTRODUO

    O processo iniciado pelas Primeira e Segunda Guerra Mundial e reforado pela Crise de 1929

    e regimes nazi-fascistas desencadeou uma nova ordem geopoltica, marcada pela

    bipolaridade. O mundo se dividiu entre os pases capitalistas, encabeados pela imergncia

    dos Estados Unidos como grande potncia, e socialistas, guiados pelo modelo poltico da

    Unio Sovitica (HOBSBAWM, 1995).

    Ambos exportavam no s os modelos polticos e econmicos, mas coisas bem mais sutis e

    menos perceptveis, como o modo de vida e ideologias. Hobsbawm (1995) aponta que ocapitalismo, colocado em prova durante a crise de 1929, constituiu uma oportunidade para a

    proliferao das idias socialistas. Esse perodo bipolar ficou conhecido como Guerra Fria e

    na Amrica Latina foi incorporado de maneiras diferentes pelos pases recm- independentes

    de suas colnias.

    Para Sader (1992), a diferena entre o socialismo na Amrica Latina, no Leste Europeu e naURSS, estava no grau de esperanas no sistema como alternativa de resoluo de problemas

    sociais, no sendo visto apenas como um movimento anticapitalista. [...] O socialismo

    suscitou enormes esperanas na humanidade [...], na Amrica Latina, de que um futuro

    brilhante aguardava o continente sob a sua dominao (SADER, 1992, p.81). Nesse perodo,

    revolues e alguns poucos governos socialistas proliferaram na Amrica Latina. Foi o caso

    da Revoluo Cubana nos anos 1950, o governo de Salvador Allende no Chile, em 1970, e a

    Revoluo Sandinista na Nicargua, em 1979 (SADER, 1992).

    Com a queda do muro de Berlim, em 1989, o socialismo na Amrica Latina se resumiu

    apenas ao governo cubano e existncia de alguns partidos de esquerda nos pases latino-

    americanos. No por acaso, Hobsbawm (1995) considera o sculo XX, como a Era dos

    Extremos, em que se viveu a catstrofe causada pelas duas grandes guerras, a era de ouro

    causada pela pseudo paz, a estabilidade dos sistemas capitalistas e socialista e o

    desmoronamento dessa estabilidade com o colapso do sistema socialista, imperando uma s

    potncia, os Estados Unidos.

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    Dez anos depois do colapso socialista, em 1999, a eleio de Hugo Chvez na Venezuela

    trouxe o socialismo novamente para a pauta poltica e econmica da Amrica Latina. Surgia

    um novo ambiente poltico latino-americano consolidado no s pelo socialismo chavista,

    mas tambm, pelo principio de abertura econmica de Cuba e a imergncia de governos

    populares como no Brasil (Lula, a partir de 2003) e Bolvia (Evo Morales, a partir de 2005).

    No caso especfico venezuelano, o governo Chvez trouxe consigo um projeto socialista

    chamado Socialismo do sculo XXI, marcado por uma clara oposio poltica norte-

    americana. As mudanas implementadas por Chvez e as ideolgicas polticas adotadasgeraram polmica como a onda de nacionalizao de empresas multinacionais de petrleo na

    Venezuela em 2006. Na ocasio, a empresa brasileira Petrobrs cedeu o controle de cinco

    empreendimentos Petrleo da Venezuela PDVSA. Outra medida polmica foi a no

    renovao da concesso da emissora de televiso Radio Caracas Televisin RCTV, em

    2007, quando a emissora apoiou o golpe de Estado contra Chvez em 2002.

    As mudanas tambm fazem parte da poltica cubana. Em 2008, Raul Castro, irmo de Fidel

    Castro, assumiu a presidncia e prometeu eliminar paulatinamente as proibies na ilha. No

    mesmo ano, Raul liberou a venda de eletroeletrnicos como televisores, celulares e

    computadores. A poltica externa tambm sofreu mudanas. Apesar do embargo comercial,

    existente desde 1962, o presidente americano Barack Obama, em setembro de 2009,

    suspendeu as restries de viagens ilha e autorizou as transferncias de dinheiro de cidados

    de origem cubana que vivem nos Estados Unidos para os residentes em Cuba.

    A percepo desse novo cenrio poltico na Amrica Latina passa pelos processos

    comunicacionais, que, segundo Piernes (1990), so to essenciais para a populao latino-

    americana como a soluo de problemas sociais:

    A comunicao um bem social do tipo essencial que deve chegar ao povo puro, sem

    mistificao, sem infiltrao ideolgica, sem interesses econmicos. [...] O direito de todos

    informao to prioritrio quanto o direito alimentao, sade, educao, moradia.

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    No cabe aqui recontar a histria da Revoluo Cubana de 1959 que desembocou na

    implementao do socialismo1. Deve-se lembrar, no entanto que:

    [...] a luta dos revolucionrios cubanos teve, inicialmente, o carter de uma luta democrtica etambm popular. Mas logo que ela comeou a colocar em prtica suas reformas, a revoluocubana ganhou tambm uma caracterstica nacional, porque ela passou a se chocar frontalmentecom os interesses dos Estados Unidos, a principal potncia internacional ligada ao antigo regime es elites dominantes do pas. (SADER, 1992, p.15)

    Usinas de acar, grandes proprietrios rurais, empresas e o governo norte-americano

    comearam a se posicionar contra o governo cubano, iniciando a sequncia de boicotes dos

    EUA, econmicos, polticos e militares. Sader (1992) aponta que a resposta foi aintensificao das relaes entre URSS e Cuba:

    Primeiro vendendo para aquele pas o substancial de sua safra de acar, que os EUA se negavama seguir comprando. Depois, recebendo da URSS o petrleo que o vizinho norte-americanodeixava de fornecer e, posteriormente, se abastecendo dos produtos que a interrupo brusca deseu intercmbio com os EUA requeria. (SADER, 1992, p.18)

    Nesse contexto, fica claro o cenrio que iria perdurar por anos: a polarizao do mundo entre

    socialistas e capitalistas, sendo que os ltimos mantinham o mesmo posicionamento norte-

    americano de boicote a Cuba. Por outro lado, a aliana socialista garantia a sobrevivncia da

    ideologia. Sader (1992) considera trs fatores que mudaram profundamente a economia

    interna cubana: 1) recuperao dos bens malversados e a lei da reforma agrria; 2)

    nacionalizao do capital estrangeiro; 3) nacionalizao geral das indstrias. Sobre a questo

    social, merece destaque a campanha de alfabetizao em tempo recorde. Outra estratgia dos

    EUA e dos oposicionistas cubanos contra o regime socialista foi o reforo da religio

    aproveitando da igreja cubana conservadora e tradicional. Tal estratgia no surtiu efeitos

    considerveis.

    Contudo, s aps enfrentamentos violentos, atentados e perdas materiais, Cuba assumiu

    oposio aos Estados Unidos. Paulatinamente o governo norte-americano resolveu contra-

    atacar nos mesmos moldes que estava acostumado a organizar regimes que entravam em

    1 Para detalhes sobre a Revoluo Cubana, consulte: SADER, Emir. A Nova Toupeira: Os Caminhos daEsquerda Latino-Americana . So Paulo: Boitempo, 2009.

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    contradio com sua diretrizes (SADER, 1992, p.19). O pice da tenso foi o bloqueio

    militar dos Estados Unidos quando Cuba havia instalado foguetes soviticos em seu territrio.

    A situao ficou conhecida como crise dos msseis.

    A consolidao da polarizao mundial entre capitalistas e socialistas e as mudanas polticas,

    ideolgicas e sociais na sociedade cubana consolidaram um novo momento para o pas

    fortificado pela figura de Fidel Castro (SADER, 1992). Contudo, o bloqueio ilha se

    intensificou:

    [...] o governo norte-americano decreta um bloqueio continental ilha. Sob a alegao de que oregime cubano interferia nos assuntos internos de outros pases, exportando a revoluo,Washington consegue que a Organizao dos Estados Americanos (OEA) decida pela ruptura derelaes por parte de todos os governos do continente com Cuba, com as respectivasconseqncias no plano econmico (SADER, 1992, p.23)

    Cuba, portanto, dependia de pases distantes e a monocultura de acar na ilha sofreu um

    impacto ainda maior fazendo com que, segundo Sader (1992), o governo tomasse uma srie

    de medidas econmicas, entre elas: 1) a industrializao acelerada do pas; 2) diversificao

    da agricultura; 3) preferncia aos produtos nacionais em detrimento dos importados. Contudo,

    existiam entraves como a falta de qualificao de pessoal e recursos financeiros limitados.

    Como a nica base econmica do pas era a agricultura, em 1970 foi feita uma campanha para

    a obteno de 10 milhes de toneladas na safra de acar, contudo, a meta no foi cumprida,

    tanto pela falta de mo de obra quanto pela falta de mecanizao do campo. Tal fato coincidiu

    com o declnio de movimentos revolucionrios [muitas vezes financiados por Cuba] naAmrica Latina e com a morte de Che Guevara.

    Sader (1992) considera que houve nos pases socialistas uma espcie de distoro das idias

    marxistas. Para o autor, Marx defendia que o socialismo deveria ser construdo a partir de um

    capitalismo avanado, o que no aconteceu, mas, por outro lado, manteve-se a idia de uma

    sociedade baseada em altos ndices de desenvolvimento econmico, social e cultural. Cubaapoiou-se na acumulao econmica existente nos pases socialistas especialmente na

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    descompasso com a produtividade etc. A situao fez com que o governo cubano iniciasse a

    campanha de retificaes explicada por Sader como forma de corrigir os problemas

    instalados, diminuindo despropores salariais e proibindo o mercado livre, por exemplo.

    Mas paralelamente a esse momento em que Cuba aumentava seus intercmbios com a

    comunidade socialista, pelo fechamento do mercado capitalista (SADER, 1992, p.31), a

    comunidade socialista entrou em crise brusca e se desfez rapidamente.

    Essa desintegrao foi marcada pela queda do Muro de Berlim em 1989 que dividia a

    Alemanha e o mundo entre duas lgicas socioeconmicas, o capitalismo e o socialismo, e fez

    com que o bloco socialista fosse sucumbido. Como parte desse episdio, a ilha caribenhaviveu da dualidade entre os benefcios de ser socialista e as dificuldades da no insero na

    lgica capitalista:

    [...] uma revoluo socialista pde se afirmar por mais de trs dcadas, demonstrando como ajustia social pode ser obtida mesmo num pas atrasado, se seu sistema social rompe com a lgicaegosta do capital. Mas esse mesmo pas Cuba se desenvolveu em parte pela integrao comuma comunidade que j no existe e ter agora que redefinir sua insero internacional, nummundo que caminha em direo oposta aos seus critrios sociais. Nessa medida se futuro dependede reorientaes internas, para possibilitar uma convivncia com esse mundo. (SADER, 1992, p.79)

    Conforme anteriormente mencionado, o socialismo na Amrica Latina no foi pautado apenas

    pelo anticapitalismo, mas sim, pela falncia do capitalismo para resolver os problemas bsicos

    da populao latina (SADER, 1992). No tocante ao colapso socialista, Sader (1992) acredita

    que o fracasso do socialismo na Amrica Latina, no Leste Europeu e na URSS representou

    um golpe nas esperanas. Contudo, o autor observa que:

    O socialismo nasceu [...] no marco de um tipo de sociedade libertrio, de auto-emancipao doshomens, de eliminao de todos os tipos de explorao, opresso e discriminao. Tendo surgidoinicialmente em pases da periferia capitalista, onde a explorao e a opresso eram maiores, e nose estendendo para outras regies, o socialismo viu-se prisioneiro do atraso e exposto a soluesautoritrias, como o stalinismo, que lhe bloqueou todo o potencial libertador e democrtico.(SADER, 1992, p. 82)

    De forma concreta a queda da ex-Unio Sovitica representou um grande impacto em Cuba,

    que vive com controle poltico firme e uma necessidade de maior flexibilizao econmica.

    Isso porque os subsdios soviticos que variavam de US$ 4 bilhes a US$ 6 bilhes

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    anualmente, cessaram nos anos 90 e o pas ainda vive sob o impacto do embargo dos Estados

    Unidos em vigor desde 1961.

    O embargo norte-americano reflete diretamente nas condies socioeconmicas da ilha e nas

    relaes diplomticas entre os dois pases, sobretudo em assuntos ligados imigrao ilegal.

    Dados do CIA Factbook2, mostraram que a guarda costeira americana interceptou em 2007

    2656 cubanos que tentaram atravessar o estreito da Flrida por meio de jangadas artesanais,

    pequenos avies e facilitadores (pessoas com experincia em travessia ilegal de fronteiras).

    Porm, paulatinamente as relaes entre os dois pases tem se tornado menos tensas. O atual

    presidente americano Barack Obama, em setembro de 2009, suspendeu as restries deviagens ilha e autorizou as transferncias de dinheiro de cidados de origem cubana que

    vivem nos Estados Unidos para os residentes em Cuba. Em mbito interno a mudana mais

    significativa aconteceu em fevereiro de 2008, quando Fidel Castro deixou o cargo de

    governante do pas, passando-o para o irmo Raul Castro.

    Apesar dessa crise do ps Guerra Fria, Mesa-Lago (2003) aponta que a ilha na dcada de 90apresentava um processo longo e lento de recuperao, mas em 2001, novos acontecimentos

    em mbito mundial romperam esse crescimento. Pode-se destacar como fatores relevantes: 1)

    o reflexo no turismo causado pelos ataques de 11 de setembro e pela guerra no Afeganisto;

    2) a recesso iniciada em maro de 2001 e agravada em setembro, que tambm representou

    queda de viagens internacionais e das remessas de dlares dos cubanos para o exterior; 3)

    queda de 40% dos preos mundiais do nquel devido recesso, bem como acar e charutos

    cubanos; 4) os danos estimados em 1866 milhes de pesos causados pelo furaco Michelleque atingiu a ilha; 5) o fim do pagamento feito pela Rssia de uma taxa anual de 200 milhes

    de dlares com o fechamento da base de vigilncia em Lourdes; 6) o recuo dos investimentos

    estrangeiros diretos em 91%, impulsionados pela deteriorao da economia cubana, falta de

    pagamento de credores e emprstimos em moeda forte mais apertados e caros;7) a suspenso

    do fornecimento de petrleo causada pelas tenses polticas da Venezuela em 2002 (MESA-

    LAGO, 2003).

    2 https://www.cia.gov/library/publications/the-world-factbook/

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    e um grupo de oficiais, sob a liderana do ento tenente-coronel Hugo Chvez Frias, tentou

    um golpe de Estado, que fracassou.

    No final 1993, com um discurso populista e voltado para os setores populares e de classe

    mdia, Rafael Caldeira ex-partidario do Copei se tornou presidente, porm, aprofundou as

    medidas neoliberais com a chamadaAgenda Venezuela.

    Por outro lado, no mesmo ano, a insatisfao dos setores populares fez com que as idias de

    Chvez ganhassem fora e aceitao entre os venezuelanos. Segundo Marquez4 apud Villa(2005) depois de 1993:

    [...] Hugo Chvez reviu sua posio e, dada a grande aceitao popular em torno de sua figura,props modificar as instituies de dentro para fora, por meio de uma Assemblia NacionalConstituinte. Com isso, tornou-se quase que vital a modificao de sua estratgia de ao polticasustentada ate ento. Fazia-se necessria a defesa da participao nos prximos pleitos. Surge,assim, a maquinaria partidria chavista, ento denominada de Movimento Quinta Republica(MVR) (VILLA, 2005, p.159).

    O discurso chavista representava o desejo de transformao da populao. Em dezembro de

    2008, Chvez venceu as eleies presidenciais com 56,2% dos votos vlidos. Villa (2005)

    destaca que alm do triunfo nas eleies, a proposta de governo de Chvez foi movida por

    uma forte tendncia administrao de mudanas por meios democrticos.

    Na Amrica Latina o presidente venezuelano foi um fenmeno eleitoral e de popularidade .

    Chvez participa, em dezembro de 1998, ganha a presidncia com 56,2% dos votos; no

    chamado processo de relegitimao de julho de 2000 obtm 59,7% dos votos; e, no referendo

    revogatrio de agosto de 2004, obtm 59,1% (VILLA, 2005, p.162).

    Entre as medidas de Chvez no primeiro ano de governo esto: 1) a realizao assemblia

    nacional constituinte para produo da nova constituio mais centralizadora; 2) criao do

    4 MARQUEZ, Patricia. Por que la gente voto por Hugo Chavez? In: Ellner, Steve e Hellinger, Daniel (eds.).Lapolitica Venezolana en la epoca de Chavez: clases, polarizacion y conflicto. Caracas: Nueva Sociales, 2003.

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    Aps o golpe era essencial reaver o apoio da classe mdia, contudo a polarizao manteve-se

    ate o referendo revogatrio presidencial em 2004. O referendo indicou a continuidade de

    Chvez no poder com maioria dos votos populares refletindo as medidas sociais a favor

    dos setores marginalizados da populao e pelo menos 1/3 da classe mdia. Para Villa (2005),

    de qualquer forma, a oposio conseguiu 40% dos votos, que podem fomentar conflitos e

    desestabilizar a gesto de Chvez futuramente.

    Para Villa (2005) entre os programas de pequeno a mdio prazo que tiveram impacto positivo

    esto: o Saude Bairro Adentro, com mdicos, em sua maioria cubanos, para realizao deconsultas 24 horas em regies pobres da Venezuela; o programa Mercal, que so feiras

    populares que oferecem produtos da cesta bsica com preos subsidiados pelo governo; e o

    programa de alimentao gratuita para populares quase indigentes. A longo prazo esto: a

    Missao Robinson, que pretende alfabetizar 1,5 milhoes de pessoas; a Missao Ribas, para

    inserir pessoas que no terminaram os estudos em escolas de Segundo Grau;e Missao Sucre

    que pretende incorporar estudantes no ensino superior publico e privado.

    A aprovao no referendo tambm est associada aos indicadores macroeconmicos a partir

    de 2004. De acordo com o Banco Central da Venezuela (BCV) depois da greve de finais de

    2002 e incio de 2003, deu-se uma recuperao substancial da economia no ano de 2004. No

    primeiro semestre desse ltimo ano, o PIB cresceu 23,1% em comparao ao mesmo perodo

    de 2003. Esse comportamento da economia, por sua vez, refletiu-se na queda do desemprego,

    que passou de 18% no primeiro semestre de 2003 para 15% no primeiro de 2004 (VILLA,2005, p.166).

    Apesar da reeleio de Hugo Chvez em 2006 com 62,9% dos votos, a proposta da Reforma

    Constitucional de 2007 foi rejeitada. O plebiscito realizado em 2007 propunha revises em

    artigos da constituio de 1999. Segundo dados do Conselho Nacional Eleitoral 5 o pacote

    5 www.cne.gov.ve. Acesso em: 20 fev 2010.

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    Venezuela representava a diplomacia venezuelana, que rompia com a posio abstencionista

    mantida durante as administraes anteriores at Caldeira. Evidentemente , o uniforme refletia

    a posio dos Estados Unidos sobre os direitos humanos naqueles pases (VILLA, 2004,

    p.11, traduo nossa).

    Em 2000, Chvez fez uma visita a Saddam Hussein e a Muamar Kadafi , fato que, segundo

    Villa (2004), foi entendido pelo governo americano como uma reunio de governantes de

    Estados delinqentes. Tratava-se mais de um encontro para discutir sobre o petrleo

    principal produto de exportao do pas que afinidades polticas e ideolgicas. Graas ao

    empenho diplomtico de Chvez para o estabelecimento de cotas de produo e preosinternacionais, a Venezuela foi eleita presidente da Organizao dos Pases Produtores de

    Petrleo, a OPEP.

    O governo Bush acirrou as tenses consideravelmente aps os atentados de 11 de setembro e

    a Guerra do Afeganisto. O lder venezuelano era claramente contrrio guerra chegando a

    declarar que no se pode combater o terror com mais terror6

    . Tal declarao fez com que aala republicana do congresso americano exigisse a reviso das relaes entre os dois pases

    (VILLA, 2004).

    Os anos de 2003 e incio de 2004 foram marcados pelo incio do confronto direto entre o

    governo Chvez e o governo Bush. Depois do golpe de Estado contra Chvez, o Conselho

    Nacional de Segurana da Venezuela investigou a intentona e identificou a participao dosEstados Unidos no golpe. Villa (2004) salienta que o resultado da investigao veio a pblico

    no aniversrio de um ano do golpe por meio do prprio coordenador do Conselho, evitando

    assim que qualquer membro do executivo da Venezuela encaminhasse a denncia. O pice

    acontece em 2004, quando o prprio Chvez se encarrega de fazer a acusao:

    [...] o prprio presidente Chvez, deixando de lado a mediao dos meios de comunicao oficiaisgovernamentais, acusa os Estados Unidos de ter participado diretamente do golpe de 11 de abril

    6 El nacional, Caracas, 30 de janeiro 2001.

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    de 2002 e de interveno nos assuntos internos da Venezuela por meio de financiamento de grupospolticos e ONGs contrrias ao seu governo (VILLA, 2004, p.15, traduo nossa).

    Nesse perodo as manifestaes oficiais chavistas estavam pautadas pela idia de contra elimperialismo yanqui traduzindo-se em um discurso claramente anti-americano. A

    radicalizao do discurso do presidente venezuelano Hugo Chvez pode ter trs explicaes:

    1) mudar o foco do referendo de 2004 para uma um assunto externo; 2) a elite venezuelana na

    poca no conseguiu reconhecer que as divergncias nas reas regionais e multilaterais so

    inconciliveis diplomaticamente, e isso fazia com que o governo venezuelano enfatizasse a

    participao dos EUA no golpe como fator para influenciar a opinio pblica; 3) a

    administrao naquele contexto era orientada por uma poltica ideolgica, refletindonaturalmente em uma situao de conflito com os Estados Unidos.

    Outros fatores internos influenciaram a poltica externa venezuelana. Em 2007, Chvez

    intensificou o processo de nacionalizao das empresas de petrleo, comunicao e energia

    eltrica e em 2008 e 2009, as empresas de cimento e ao. Medidas essas tomadas no perodo

    de incio da radicalizao da gesto e no calor das discusses da Constituinte de 2007. Essas

    mudanas na Venezuela durante a gesto Chvez fazem parte de um projeto intitulado pelo

    prprio presidente como socialismo do sculo XXI. Barreto (2007) acredita que o projeto

    ,baseado em um combate ao neoliberalismo, falho e utpico, porque pode gerar o

    agravamento de questes que ele procura combater como injustia, desigualdade social e

    totalitarismo poltico:

    [...] Esta poltica discriminatria teve como marco a demisso em massa de todos os trabalhadores

    de oposio da empresa estatal de petrleo do pas, PDVSA caracterizada por fornecer bonssalrios, estabilidade e benefcios importantes para os trabalhadores para a contratao depessoas leais ao governo independente de suas qualificaes acadmicas ou experincia naindstria. Exemplos como esse mostram que o abandono das instituies morais de modeloneoliberal tem um preo, no caso, o preo de violar os princpios elementares de justia, enquantoaspirava o contrrio, corrigir a desigualdade (BARRETO, 2007, p.54).

    A Revoluo Bolivariana Chavista no apenas poltica, mas social. Por um lado, a

    populao venezuelana marginalizada ganha com investimentos em educao e sade, h

    incentivos para pequenas e mdias empresas acompanhado de um crescimento em

    produtividade, mas por outro h um enorme gasto pblico sobretudo em propaganda e uma

    poltica de excluso de opositores (BARRETO, 2007).

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    3 JORNALISMO INTERNACIONAL NA AMRICA LATINA

    3.1 Jornalismo Internacional: caractersticas e desafios

    Sem dvidas, as mudanas ideolgicas em naes como Cuba, Venezuela e em toda Amrica

    Latina, refletem um fenmeno intitulado globalizao que, segundo Hall (2001),

    intrinsecamente ligado ao conceito de identidade nacional, aqueles conjunto de idias que

    formam no indivduo a conscincia de nao, do Estado.

    Hall (2001) acredita que a identidade nacional constitui uma das mais importantes e mais

    fortes identidades culturais. Por mais que ela no esteja nos genes e seja dotada de carter

    metafrico, formada no interior da representao. Segue-se que a nao no apenas uma

    entidade poltica mas algo que produz sentidos um sistema de representao cultural. As

    pessoas no so apenas cidados/s legais de uma nao; elas participam da idia da nao tal

    como representada em sua cultura nacional (HALL, 2001, p.49).

    A cultura nacional, como um conjunto de smbolos, representaes e instituies culturais,

    um discurso (HALL, 2001). Anderson7 apud Hall (2001) destaca que a nao uma

    narrativa imaginada:

    As culturas nacionais, ao produzir sentidos sobre a nao, sentidos com os quais podemos nosidentificar, constroem identidades. Esses sentidos esto contidos nas estrias (sic) que socontadas sobre a nao, memrias que conectam seu presente com seu passado e imagens que delaso construdas. (HALL, 2001, p.51)

    Para Hall (2001), o discurso nacional dotado de cinco elementos principais: 1) narrativa da

    nao experincias relatadas na cultura popular, mdia, literatura e histrias nacionais; 2)

    nfase nas origens, continuidade, tradio e intemporalidade a sensao de algo imutvel

    mesmo dentro de tantas mudanas; 3) tradio inventada conjunto de prticas que so

    7 ANDERSON, B.Imagined Communites. Londres: Verso, 1983.

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    pautadas por valores e normas; 4) mito fundacional histria da origem da nao; 5) povo ou

    folkpuro idia de povo original.

    A identidade nacional vista como unificada, pretende unir todos os indivduos em torno de

    uma s idia, mas dentro de uma nao existem diferentes classes, gneros, raas e alm disso

    as naes modernas so todas hbridas culturais (HALL, 2001). Nesse sentido, Hall (2001)

    prope que as naes devem ser pensadas como um dispositivo discursivo que transforma as

    diferenas em identidade que so atravessadas por profundas divises e diferenas internas,

    sendo unificadas apenas atravs do exerccio de diferentes formas de poder cultural

    (HALL, 2001, p.61).

    Apesar da predominncia e fora das identidades nacionais, elas esto sendo deslocadas pela

    globalizao. Para Anthony McGrew8apudHall (2001) so processos, atuantes numa escala

    global, que atravessam fronteiras nacionais integrando e conectando comunidades e

    organizaes em novas combinaes de espao tempo [...] tornando o mundo

    interconectado (HALL, 2001, p.67). , pois, um fenmeno inerente modernidade, cujoritmo aumenta a cada momento.

    Hall (2001) destaca a importncia da compreenso tempo-espao em um mundo que se torna

    menor e com distncias mais curtas, essa caracterstica possibilita que um acontecimento em

    determinado local altere diretamente a vida de uma pessoa ou de um lugar distante. As

    relaes entre tempo e espao tambm influem nos sistemas de representao, econseqentemente nas identidades:

    Todo meio de representao escrita, pintura, desenho, fotografia, simbolizao atravs da arte ousistemas de telecomunicao deve traduzir seu objeto em dimenses espaciais e temporais.Assim a narrativa traduz os eventos numa sequncia temporal comeo-meio-fim; os sistemasvisuais de representao traduzem objetos tridimensionais em duas dimenses. Diferentes pocasculturais tm diferentes formas de combinar essas coordenadas espao-tempo. (HALL, 2001, p.70)

    8 MCGREW, A. A global society?. In: Stuart Hall; David Held e Tony McGrew (orgs.).Modernity and itsfutures. Cambridge: Polity Press/Open University Press, 1992: 61-116.

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    Existem trs conseqncias da globalizao: 1) as identidades nacionais esto se

    desintegrando, como resultado do crescimento da homogeneizao cultural ps-moderno

    global; 2) as identidades nacionais e outras identidades locais ou particularistas esto sendo

    reforadas pela resistncia globalizao; 3) as identidades nacionais esto em declnio, mas

    novas identidades hibridas esto tomando seu lugar.

    A comunicao desempenha um papel importante para a compreenso e organizao do

    mundo globalizado. No discurso dos meios de comunicao de massa, o discurso miditico

    acaba por desempenhar um papel de referencial de mundo e de mediador social. Isso porque,

    segundo Rodrigues (2001), traduz discursos de diversos campos sociais especializados,(economia, cincia, internacional, ambiental) discurso esotrico para um discurso mais

    acessvel, tendo, portanto, uma caracterstica exotrica. Dessa forma, o discurso esotrico

    aquele gerado por reas de conhecimento especficas e instituies, j o exotrico o discurso

    miditico destinado compreenso do grande pblico. Ao contrrio da natureza sacralizada

    do lugar de fala autorizado das outras instituies, a cena sobre o fundo da qual se recortam os

    lugares de fala dos enunciadores autorizados do discurso miditico um lugar simblico

    dessacralizado (RODRIGUES, 2001, p. 221).

    Essa funo exotrica do discurso miditico se torna referncia de mundo, por sua visibilidade

    e legitimidade, ao se dar conta de todos os acontecimentos do mundo, transformando-os em

    algo facilmente entendido por qualquer espectador. No campo social dos assuntos

    internacionais, as mudanas polticas, sociais e culturais de uma determinada nao o

    discurso esotrico pode se tornar exotrico por meio de um jornalismo especfico, intituladojornalismo internacional.

    Para Natali (2007) o jornalismo internacional se diferencia de qualquer outra editoria por

    tratar de acontecimentos em mbito internacional no sentido prprio por tratar de notcias

    vindas de vrios pases do mundo e figurado por receber diariamente uma infinidade de

    notcias.

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    influenciavam diretamente o comrcio como conflitos regionais orientados, muitas vezes, por

    questes teolgicas, cotao de mercadorias, preos de aplices de seguro, pedgios, taxas,

    etc. No por acaso, Fgger apontado como o criador do newsletter:

    [...] Fgger e o seu embrio de newsletters impressas permitiu a manuteno de uma rede quefazia as informaes circularem por circuitos paralelos aos utilizados por duas redes previamenteexistentes, a rede diplomtica, que orientava monarcas, e a rede eclesistica, que orientavadirigentes da burocracia da Igreja (NATALI, 2007, p.22).

    A notcia deixou de circular de forma irregular no sculo XVIII, quando a atividade dos

    correios se tornou industrializada, ancorada na demanda feita por comerciantes e no aumentodo nmero de cavalos e boas estradas. Portanto, Natali (2007) afirma que o jornalismo j

    nasceu internacional, mas como uma necessidade mercantilista e favoreceu o surgimento dos

    chamados agentes econmicos:

    Ocorreu, na poca mercantil, o florescimento rpido dessas folhas de notcias impressas que eramvendidas a quem quisesse comprar e no mais circulavam dentro de um mesmo conglomeradocomercial e financeiro, como acontecia com a casa Fgger ou outras que eventualmente tinhasseguido seu exemplo. [...] A boa informao impressa passou a ser comprada por um grupoindistinto de pessoas que bem mais tarde seriam chamadas de agentes econmicos (NATALI,2007, p.22).

    Devido localizao geogrfica, a Holanda e a Blgica foram essenciais para expanso

    capitalista, e consequentemente a expanso das publicaes de informaes estrangeiras

    ligadas poltica e economia. O fenmeno foi seguido na Sua, ustria, Hungria, Inglaterra e

    Frana. A histria acaba por comprovar que: 1) o jornalismo, ao contrrio do que se pensa,

    no nasceu na cobertura local, e sim, na internacional; 2) o comrcio da informao nasceu

    para promover eficincia e poder por meio dos negcios; 3) a informao para o cliente ou

    leitor est assegurada pela periodicidade regular (NATALI, 2007).

    Durante a consolidao do jornalismo internacional tambm houve situaes de censura dos

    jornais. Entre os episdios mais importantes esto a censura sobre a imprensa alem e inglesa

    durante a Guerra dos Trinta Anos entre 1618 e 1648. Diversos pases censuravam notcias

    sobre a Revoluo Francesa temendo que os ideais iluministas fossem absorvidos pelo pas.

    Natali (2007) salienta que a censura ocorrida durante a solidificao da imprensa similar

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    que aconteceu em episdios recentes como a ditadura militar no Brasil e o Terceiro Reich na

    Alemanha, funcionando como legitimao de uma ordem existente. Caracteriza-se como

    uma espcie de acordo implcito entre governos e elites para que as decises das cortes

    absolutistas e o princpio da legitimidade do Estado no sofressem nenhuma forma de

    contestao interna ou externa (NATALI, 2007, p.26).

    Entre os sculos XIX e XX o jornalismo amadureceu impulsionado pela tecnologia - desde o

    cdigo Morse televiso - e ganhou status de mercadoria. Os jornais e revistas passaram a

    ser entendidos como produtos e os rgos de imprensa sujeitos economia e s regras de

    consumo. Baseados nesse princpio, durante a Guerra Civil norte-americana (1861-1865)surgiram os pools de cobertura, precursores do que seriam as agncias internacionais. Uma

    equipe ou um reprter gerava material para uma srie de empresas jornalsticas. Um texto

    distribudo a centenas de jornais que assinavam os servios de uma agncia sai

    incomparavelmente mais barato que um texto produzido por um correspondente ou enviado

    especial cujos custos so inteiramente cobertos por um jornal ou por uma revista (NATALI,

    2007, p.31).

    Nesse contexto de minimizao de custos na cobertura surgiram agncias como a francesa

    Agence France Presse (AFP), a alem Reuters, a americanaAssociate Press (AP) e durante a

    primeira metade do sculo XX, a italiana Agenzia Nazionale Stampa Associata (ANSA) e a

    alem Deutsche Presse-Agentur (DPA). Segundo Natali (2007), apesar do apartidarismo na

    cobertura, a ascenso dessas instituies sempre esteve atreladas ao seu pas de origem e suas

    zonas de influncia. Dessa forma, na poca a AFP tendia cobertura de fatos ocorridos nascolnias francesas ou em pases com polticas que influenciavam diretamente o governo

    francs.

    A forma de compreenso do ambiente internacional tambm muda com o tempo. No incio do

    sculo XX, com o trmino da Segunda Guerra, o mundo dividiu-se sob a influncia de duas

    potncias: os Estados Unidos, capitalistas e a extinta Unio Sovitica, socialista. Nesse

    perodo, o noticirio internacional procurava identificar os envolvidos em determinado

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    acontecimento como pases aliados ou inimigos dos EUA e da URSS. Esse fenmeno ocorreu

    sobretudo nas guerrilhas latino-americanas. Apesar das mudanas de compreenso do

    ambiente internacional, o leitor dessa editoria altamente especializado e o jornalista deve

    tomar cuidado para no ser partidrio na cobertura:

    Esse leitor tem um grau de exigncia para com seu jornal que deve ser respeitado por meio daobedincia a certos princpios como o pluralismo de fontes s quais damos a palavra, e oapartidarismo, que consiste sobretudo em no implantarmos um clima de polarizao que setornou anacrnico aps a Guerra Fria, mas desta vez tomando a nica superpotncia como supostabandida dentro de um mundo habitado por diferentes mocinhos (NATALI, 2007, p.55).

    Natali (2007) acredita que a demanda por melhor qualificao do profissional cresceu na

    mesma medida em que cresceu a exigncia dos editores internacionais. Isso porque o

    jornalismo internacional passou a ser feito pelos prprios jornalistas da redao, no pelos

    correspondentes jornalistas fixos em determinado pas e pelos enviados especiais

    jornalistas enviados para determinado local apenas para cobertura de um determinado fato.

    Alm da reduo de equipes em outros pases, as empresas jornalsticas economizam com o

    uso da internet. Ela fez com que o redator abandonasse seu papel passivo diante dos

    telegramas das agncias. Deu a ele um poder de interveno inimaginvel elaborao mais

    pessoal de um texto noticioso (NATALI, 2007, p.57). Pelo novo meio o jornalista no fica

    restrito a informaes fornecidas pelas agncias internacionais, ele pode complementar a

    matria com informaes de banco de dados de sites oficiais ou procurar fontes e fazer

    entrevistas por e-mail ao invs do telefone. Portanto, alm de significar economia na redao,

    a internet pode ser o diferencial para o profissional tornar seu texto mais atrativo.

    Outro fenmeno recente do jornalismo internacional a substituio das personalidades pelas

    celebridades nas matrias. As personalidades tornam-se notcia pela sua capacidade artstica,

    carreira acadmica ou poltica, enquanto as celebridades tornam-se notcia por sua vida

    pessoal, clichs discursivos e banalidades (NATALI, 2007). Pela lgica mercadolgica das

    empresas jornalsticas, a cobertura das celebridades funciona como um atrativo para o

    produto, tornando-o popular. (tirei uma frase daqui )Sob esse ngulo, o destaque no a

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    competncia da pessoa personalidade e sim os produtos agregados, que a tornam

    celebridade.

    3.2 Valores/notcia e gneros jornalsticos

    3.2.1 Entre o acontecimento e a notcia

    A teia jornalstica complexa, o processo entre o fato e a notcia que chega at o pblico estsujeito a influncias do processo de produo jornalstica e do prprio fazer jornalstico. Wolf

    (1995) aponta duas hipteses para compreender esse processo, a agenda-setting e a teoria do

    newsmaking.

    A compreenso dessas teorias perpassa os novos paradigmas da comunicao entendida como

    um processo circular e contnuo, em que os meios de comunicao e a sociedade atuam

    reciprocamente, modificando informaes. Alm disso, os meios de comunicao de massa

    tm efeitos a longo prazo, efeitos cumulativos (WOLF, 1995).

    Nesse contexto, a hiptese da agenda-setting parte do pressuposto de que a mdia tem um

    impacto considervel na vida das pessoas. Para Shaw apudWolf (1995), mesmo assim, ela

    no manipula, mas orienta o pblico oferecendo um repertrio de assuntos que ele deve saber

    ou pensar sobre9:

    Os mass media, descrevendo e precisando a realidade exterior, apresentam ao pblico uma listadaquilo sobre o que necessrio ter uma opinio e discutir [...]. O pressuposto fundamental doagenda-setting que a compreenso que as pessoas tm de grande parte da realidade social lhes fornecida, por emprstimo, pelos mass media. (WOLF, 1995, p.130)

    9 SHAW, E.Agenda-Setting and Mass Conimunication Theory. Gazette (International Journal for MassCommunication Studies), vol. XXV, n. 2, 1979.

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    O pblico ainda tem diferentes nveis de conhecimento sobre determinado tema: 1)

    conhecimento superficial que inclui somente o ttulo da rea como economia, poltica ou meio

    ambiente; 2) conhecimentos mais articulados que do base para, por exemplo, anlises sobre

    causas e conseqncias de um fato; 3) conhecimento especfico que favorece comentrios

    complexos e detalhados como argumentaes, prs e contras de determinada situao

    (WOLF, 1995). Nesse ltimo, se determinado assunto se torna central ganha mais destaque

    nos meios de comunicao mais a pessoa precisa da mdia para se agendar.

    A outra teoria apontada por Wolf (1995), o newsmaking, tem como principal premissa a

    anlise das rotinas produtivas dos jornais buscando compreender como as notcias soproduzidas e mais critrios de seleo que tornam um simples fato uma notcia. Nesse

    aspecto, merece destaque o conceito de gatekeeper, o porteiro ou selecionador.

    Lewin apud Wolf (1995) mostra que no interior de cada grupo social h zonas que podem

    funcionar como cancelas ou porteiros que orientados por um sistema objetivo de regras

    tendem a bloquear ou liberar determinada temtica ou informao.11

    . No caso dos gatekeepersh um indivduo ou um grupo, que tem o poder de decidir se deixa passar a informao ou se

    a bloqueia (WOLF, 1995, p. 162).

    Esse conceito foi utilizado para analisar o fluxo de notcias dentro das instituies

    jornalsticas. Um estudo desenvolvido por White apud Wolf (1995) apontou que de dez

    despachos de agncias de notcias apenas um se torna notcia

    12

    . A pesquisa de White indicouque entre as explicaes mais utilizadas para a recusa do material esto falta de espao para o

    assunto no veculo, falta de interesse jornalstico e presena de histrias mais relevantes e

    assunto distantes da realidade do jornal e do pblico. Pode-se observar que o processo de

    seleo e filtragem est diretamente ligado a caractersticas do processo produtivo do

    jornalismo e da instituio em toda a cadeia, desde a coleta at a difuso da informao do

    11 LEWIN, K. Frontiers in Group Dynamics. 11. Channels of Group Life: Social Planning and Action Research.Huaman Relations, vol. 1, n. 2, 1947. p. 143-153.12 WHITE, D. M. The "Gatekeeper". A Case Study in the Selection of News. Journalism Quarterly, vol. 27, n. 4,1950. p. 383-390.

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    que subjetividade do profissional. Portanto, diretamente ligados linha editorial, poltica

    dos jornais e prpria cultura da profisso enraizada nos profissionais.

    Os filtros tendem a dar autonomia profisso e atuam como forma de evitar a chamada

    distoro involuntria. Essa seleo utilizada pelos meios de comunicao de massa influi

    diretamente na forma como o pblico enxerga a realidade social:

    Dos mass media que constituem um ncleo central de produo simblica, na sociedade actual[sic] necessrio conhecer-se no apenas os sistemas de valores, de representaes, deimaginrio colectivo [sic] que eles propem, mas tambm o modo, os processos, as restries e aslimitaes em que tudo isso acontece. (WOLF, 1995, p.165)

    A teoria do newsmaking orienta-se tanto pela cultura do profissional jornalista e a organizao

    do trabalho, quanto pelo processo produtivo. Entre o conceito mais importante da cadeia

    produtiva est a noticiabilidade definida como o conjunto de elementos atravs dos quais o

    rgo informativo controla e gere a quantidade e o tipo de acontecimentos, de entre os quais

    h que seleccionar [sic] as notcias, podemos definir os valores/notcia como componente da

    noticiabilidade (WOLF, 1995, p. 175).

    Os valores/notcia so critrios mais ou menos comuns utilizados pelas instituies

    jornalsticas para a seleo dos acontecimentos que tm habilidade para se tornar notcia. Para

    Wolf (1995) esses critrios acompanham o fato durante todas as instncias do processo de

    produo, por conseqncia so rotineiros e devem ser aplicados com rapidez. Alm disso, os

    valores/notcia podem ganhar novas reas quando necessrio ou podem simplesmente sofrer

    alteraes.

    Os critrios tambm derivam de consideraes relativas a: 1) caractersticas substantivas ou

    contedo caracterstica do acontecimento que o torna notcia; 2) produto jornalstico

    conjunto de processos de produo e realizao; 3) pblico imagens que o jornalista tem dos

    destinatrios; 4)concorrncia relaes entre os meios de comunicao existentes no mercado

    (WOLF, 1995).

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    Nas consideraes relativas ao produto jornalstico Wolf (1995) destaca a disponibilidade

    facilidade com que um assunto coberto e se o produto est de acordo com as

    possibilidades tcnicas e organizacionais e com as limitaes do prprio meio de

    comunicao. Tambm so levados em considerao os aspectos que se referem notcia

    como resultado de uma ideologia de informao, baseada principalmente no dito bad news is

    good news notcias ruins so boas notcias. Naturalmente um dos princpios fundamentais

    do jornalismo que, quanto maior, mais inslito ou mais sangrento o espetculo, maior o

    valor/notcia (WOLF, 1995, p.186).

    O produto jornalstico tambm precisa ser atual, de preferncia mais prximo ao momento deveiculao do noticirio. Essa caracterstica depende diretamente do meio utilizado e a

    periodicidade dele:

    O quadro temporal estabelecido pela freqncia da informao e pelo seu formato, determinaigualmente o frame em que avaliada a [sic] ou no de um acontecimento. Aperiodicidade da produo informativa constitui, por si prpria, o quadro de referncia em que osacontecimentos do mundo so captados. (WOLF, 1995, p. 186)

    Segundo Gans apudWolf (1995) ainda relativo ao produto qualidade das histrias que

    seguem a cinco critrios15: 1) ao quanto mais ilustrada visualmente mais realce ter a

    notcia; 2) ritmo caso a notcia seja desprovida de ao ela precisa de outros pontos que a

    tornem atraentes; 3) carter exaustivo fornecer detalhes e diversos pontos de vista do fato;

    4) clareza de linguagem evitar que o leitor ou telespectador no entenda o acontecimento

    noticiado; 5) equilbrio composio equilibrada do noticirio. Diante da importncia do

    meio de comunicao para disseminao de informao, h critrios de valores/notcias

    inerentes ao formato proposto em cada meio:

    O valor/notcia do formato diz respeito aos limites espcio-temporais [sic] que caracterizam oproduto informativo. Do ponto de vista da seleco [sic] dos acontecimentos noticiveis, estecritrio de relevncia facilita e confere maior rapidez escolha, dado que impe uma espcie depr-seleco [sic], ainda antes de serem aplicados os outros valores notcia. (WOLF, 1995, p. 190)

    15Idem

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    [sic] que se situam na esfera poltico-institucional-administrativa ou judiciria (WOLF,

    1995, p.212).

    A fase de seleo ocorre desde a coleta do material por meio dos reprteres e agncias,

    passando pelos filtros de escolha at a veiculao nos meios de comunicao de massa. Esses

    critrios de seleo so complexos e se desenrolam ao logo do ciclo de trabalho,ou seja, j

    esto regulamentados e estabilizados no meio profissional e organizacional (WOLF, 1995).

    A ltima fase, a apresentao, envolve as transformaes sofridas pelo acontecimento dentrodo rgo de informao at a veiculao da notcia para o grande pblico. Para Altheide apud

    Wolf (1995) se o pblico conhecesse essa fase transpareceria a idia de que os veculos criam

    a notcia e no a relatam18. nessa instncia do processo que se localizam os trabalhos de

    edio e adaptao do contedo para o formato proposto por cada meio de comunicao. Na

    apresentao, o acontecimento volta a se organizar:

    [...] todas as fases anteriores funcionam no sentido de descontextualizaros factos [sic] doquadro social, histrico, econmico [sic], poltico e cultural em que acontecem e em queso interpretveis (isto , no sentido de os acontecimentos s exigncias deorganizao do trabalho informativo), nesta ltima fase produtiva, executa-se uma operaoinversa: recontextualizam-se esses acontecimentos mas num quadro diferente, dentro doformato do noticirio. (WOLF, 1995, p.219)

    Finalmente, Wolf (1995) acredita que teorias como o newsmaking derrubam as propostas de

    explicar os meios de comunicao de forma linear. As novas pesquisas mostram tendncia

    heterogeneidade dos modos de seleo e de apresentao das notcias.

    3.2.2 As categorias e gneros jornalsticos

    No tocante a apresentao da notcia h critrios mais sutis para determinar a importncia de

    determinado assunto para a sociedade e para o prprio meio jornalstico. Melo (1985) aponta

    que as matrias podem ser classificadas ainda entre categorias: O jornalismo informativo

    18 ALTHEIDE, D.Creating Reality. How Tv News Distorts Events, Sage, Beverly Hills, 1976.

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    oferecendo informaes no necessariamente utilitrias, mantendo sees que buscam

    entreter, ou abrindo espao para prender o interesse pblico, divertindo-o (MELO, 1985) 20

    O jornalismo diversional tem suas razes no novo jornalismo norte-americano, que Melo

    (1985) aponta ser uma ruptura com a prtica do jornalismo tradicional. Para Mario Erbolato

    apudMelo (1985), o novo jornalismo procura na, descrio de fato reais, mas com o texto

    intercalado de dilogos e chegando a revelar os sonhos e conjecturas de cada personagem

    envolvida na narrativa 21. O gnero no s reintroduz a subjetividade do narrador como

    recorre a padres de outros gneros literrios como conto, novela, poesia etc.:

    [...] engloba aqueles textos que, fincados no real, procuram dar uma aparncia romanesca aosfatos e personagens captados pelo reprter. Entre os gneros que integram o jornalismo diversional

    esto as histrias de interesse humano, as histrias coloridas, os depoimentos e etc. (MELO, 1985,p.22)

    Apesar deste tipo de jornalismo no ter sido abandonado por completo, dentro da lgica

    mercadolgica foi suprimido pela objetividade, distanciamento entre fonte e jornalista e a

    padronizao das informaes.

    A questo dos gneros jornalsticos tem fundamentos na prpria prtica jornalstica. ParaTodorov apudMelo (1985) um esforo de compreenso do que chamado no plano literrio

    de propriedade discursiva 22:

    [...] descrever as peculiaridades da mensagem (forma/contedo/temtica) e permitiravanos na anlise das relaes scio-culturais (emissor/receptor) e poltico-econmicas (instituio jornalstica/ Estado/ corporaes mercantis/movimentossociais) que permeiam a totalidade do jornalismo (MELO,1985, p.31)

    Estes gneros procuram organizar as diferentes formas de relatar os acontecimentos, ou seja,

    as diferentes formas de narr-lo. Os gneros jornalsticos tm a ver com a maneira que o

    jornalista escolhe para se expressar, a maneira com a qual maneja a lngua que caracteriza o

    estilo (MELO, 1985).

    20 NIXON, Raymond.Anlisis sobre o periodismo. Quito: CIESPAL, 1963, p.29-31.

    21

    ERBOLATO, Mrio. Tcnicas de codificao em jornalismo.Petrpolis: Vozes, 1978, p. 41-42.22 TODOROV, Tzvetan, Os gneros do discurso. So Paulo: Martins Fontes, 1980, p.43

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    H uma tendncia histrica em associar os gneros s categorias. Isso acontece, por exemplo,

    ao conectar o jornalismo informativo ao news e stories americanos e o jornalismo opinativoaos textos com opinio explicita, os coments. Portanto, alm de um critrio sem definio

    exata (pois varia entre a narrao e o estilo), varia em sua natureza histrica (pela origem das

    categorias) e funcional (por serem inseridas dentro das categorias que tem a ver com a

    essncia de seu contedo). Em funo disso, Jos Martinz de Souza apud Melo (1985),

    observa que o o jornalismo mundial no uma entidade unificada 23.

    Luiz Beltro24apudMelo (1985) acredita na existncia de uma categoria chamada jornalismo

    interpretativo cujo gnero ligado seria a reportagem em profundidade caracterizada pela maior

    disponibilidade de tempo, um aprofundamento da reportagem que busca analisar e refletir

    sobre determinado fato. Existe ainda a histria de interesse humano como parte da categoria

    informativa que une a fico e o relato do acontecimento cotidiano que segundo Melo (1985)

    similar reportagem. Luiz Beltro25apudMelo (1985) acredita na informao pela imagem

    como um gnero prprio dentro da categoria informativa. Esse ponto discutido por Melo

    (1985) que acredita que as imagens em si so parte complementares de outros gneros:

    [...] o critrio bsico que ele toma o do texto como unidade discursiva, figurando a imagem comoexceo nesse universo. Entendemos que no o cdigo em si que caracteriza um gnerojornalstico e sim o conjunto das circunstancias que determinam o relato que a instituiojornalstica difunde para o seu pblico. Ento, a fotografia ou o desenho so perfeitamenteidentificveis como notcias (quando apreendem a faceta privilegiada de um fato), comocomplemento das notcias (e a a notcia compreendida como uma estrutura articulada entre textoimagem) ou como reportagem (quando as imagens so suficientes para narrar os acontecimentos).

    (MELO, 1992, p.46)

    Alm das discusses sobre o jornalismo internacional, os critrios de noticiabilidade,

    categorias e gneros jornalstico, preciso levar em considerao de que forma, e quais as

    particularidades da prtica do jornalismo na Amrica Latina. SantAnna (2006) acredita que

    23 Martinz de Souza. Jos. Diccionario general Del periodismo. Madri: Paraninfo, 1981, p.404.

    24

    BELTRO, Luiz. Jornalismo interpretativo. Porto Alegre: Sulina, 1976, p. 52-5625 BELTRO, Luiz. Jornalismo interpretativo. Porto Alegre: Sulina, 1976, p. 52-56

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    as condies scio-econmicas influenciam diretamente na forma com que o jornalismo

    realizado na Amrica Latina, aspecto que influncia na forma marginalizada com que a regio

    tratada nos veculos de comunicao.

    3.3 As particularidades da comunicao na Amrica Latina

    Para Piernes (1990), a informao era uma arma estratgica que os imprios europeus tinham

    para colonizar a Amrica. O melhor exemplo foi o Mxico, cujo imprio Asteca, apesar de

    sua poderosa mquina blica, foi derrotado pelas tropas do espanhol Hrnan Corts. Comooposio ao imperialismo europeu, surgiram nomes como Simn Bolvar e Jos de San

    Martn que iniciaram os movimentos de independncia em toda Amrica Latina. Mesmo com

    a promessa de integrao e independncia proposta por Simn e Martn, meios de

    comunicao como rdio, televiso e jornais no promovem entre os pases latino-americano

    intercmbio informacional."A integrao latino-americana, sonhada, desejada, clamada, s

    ser consolidada quando os povos latino-americanos se conhecerem melhor. E isso s ser

    possvel com uma comunicao de massas que sustente esse ideal" (PIERNES, 1990, p. 9)

    Contudo, Piernes (1990) identifica que a deficincia no intercmbio de informao na

    Amrica Latina no culpa apenas do processo colonizatrio, mas de interesses mesquinhos,

    incompetncia, falta de recursos ou de imaginao das naes que pouco fazem para melhorar

    a comunicao regional. H tambm um fato cultural guiado pelos problemas sociais latinos:

    A comunicao um bem social do tipo essencial que deve chegar ao povo puro, semmistificao, sem infiltrao ideolgica, sem interesses econmicos. [...] O direito de todos ainformao to prioritrio quanto o direito alimentao, sade, educao, moradia.Entretanto, o direito a informao tem cado no ranking das prioridades humanas latino-americanas, superado pelos impactos psicolgicos que representam a fome, o analfabetismo, amortandade e a promiscuidade. (PIERNES, 1990, p. 10-11)

    Os latinos americanos tambm tm pouca oportunidade de replicar as informaes a respeito

    da regio, aceitando-as passivamente. "Este direito rplica exercido pelos setores

    minoritrios da sociedade, que tm o privilgio do acesso ao manejo da mquina" (PIERNES,1990, p.11). Piernes (1990) aponta que apesar dos pases latinos terem alcanado a

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    independncia, eles so impedidos de intensificarem suas relaes (empresariais, econmicas,

    cientificas) por pases de maior desenvolvimento e isso se reflete tambm na produo de

    notcias:

    O especialista norte-americano Al Hester realizou em 1978, um estudo baseado no controleinformativo da agncia AP [Associated Press] durante 14 dias. Chegou a concluso de que pelocanal principal desta agncia norte-americana se emitiram 71% de notcias sugeridas de pasesdesenvolvidos e 29%de naes em desenvolvimento.A proporo de notcias entre naes desenvolvidas e em vias de desenvolvimento especialmentesignificativa quanto se recorda que as duas teras partes da populao mundial se encontra nospases subdesenvolvidos. (PIERNES, 1990, p.17)

    Para Piernes (1990), a informao na Amrica Latina tratada de forma inadequada no spelos grandes centros de poder, mas pelas empresas jornalsticas e pelo prprio jornalista.

    Negando o pensamento colonialista, um grande passo foi dado pela agncia de notcias latino-

    americana LATIN (1970-75) uma das poucas tentativas de disseminao da informao das

    Amricas para o mundo. A empresa acabou sendo sufocada pela agncia britnica Reuters.

    Sete agncias transnacionais que atuam na Amrica Latina dominam a distribuio de

    notcias, fotografias e programas de televiso: Associate Press, United Press International,

    Reuter, Agence France Presse, Visnews, Worldwide e Columbia Broadcasting System [sendo

    as trs ltimas responsveis pela distribuio de filmes noticirios para televiso]

    (PIERNES,1990). Em 1875, o material de agncias transnacionais foi utilizada pela primeira

    vez na Amrica Latina quando o dirioJornal do Commercio do Rio de Janeiro se convertia

    no cliente pioneiro da Reuter-Havas, que no sculo passado compartilhava o controle

    informativo mundial, antes da avalancha das agncias norte-americanas.(PIERNES, 1990,

    p.79).

    Houve uma verdadeira corrida entre Frana, Alemanha e Gr-Bretanha para que se

    convertessem em potncias de disseminao de informao at a insero dos Estados Unidos

    no cenrio das agncias transnacionais de notcia em 1848 com a Associated Press. A

    princpio limitou-se a cobertura dos Estados Unidos, Canad e Mxico, aps a Primeira

    Guerra estendeu-se pela Amrica Central e do Sul.

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    Piernes (1990) acrescenta que a chegada da United Press em 1907 criou uma nova

    organizao na rea de cobertura das agncias visto que a UP permaneceu paradoxalmente

    como aliada da Amrica Latina com um posicionamento antiimperialista. De forma geral, o

    perfil informativo da Amrica Latina ficou com as agncias United Press e Associate Press,

    Reuteres e Agence France Presse (PIERNES,1990).

    Contudo, durante os cinco anos de existncia, a LATIN destacou-se como uma boa tentativa

    latino-americana contra as grandes agncias transnacionais, pois a curta vida de LATIN

    demonstrou que se pode, sempre e quando exista a deciso poltica, levar a cabo oempreendimento para que a Amrica Latina rompa as ataduras de sua dependncia

    informativa dos Estados Unidos e a Europa.(PIERNES, 1990, p.82)

    Alm da LATIN, existem tentativas de agncias nacionais em alguns pases como: Brasil,

    Argentina, Equador, Colmbia, Mxico, Nicargua, Panam etc. Em 1984, foram catalogadas

    24 empresas informativas nesse perfil (PIERNES, 1990). Piernes (1990) prope, portanto,uma integrao informativa que supere interesses polticos:

    A meta suprema da estratgia da integrao informativa da Amrica Latina no passa pelasperipcias da poltica interna, mas deve estar para alm das fronteiras nacionais para poder contero livre fluxo da informao, manipulado pelas grandes agncias transnacionais, que chegapermanentemente Amrica Latina. (PIERNES, 1990, p.89)

    Para SantAnna (2006) os rgos de imprensa latinos tendem a importar o recorte jornalstico

    utilizados pelas agncias, com um produto voltado para eleitores norte-americanos eeuropeus. Mesmo com a convergncia de mdias e o processo de globalizao latente com

    objetivo de encurtar distancias, a comunicao colocada em segundo plano:

    A comunicao tem sido, atravs dos tempos, a maneira pela qual os povos desenvolveram suacapacidade de trocar, enviar, receber mensagens, idias, enfim, de dialogarem entre si. Aconvergncia tecnolgica e a globalizao comunicativa permitiram tecnicamente que a distnciaentre os povos se tronasse fator secundrio (SANTANNA, 2006, p. 2).

    Nesse contexto, a universalizao social, econmica e cultural proposta pela globalizaoacaba por reforar e ampliar as diferenas refletindo diretamente na difuso da informao na

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    Amrica Latina, que marginalizada nos noticirios do Brasil e do mundo. Scharamm apud

    SantAnna (2006) lembra que historicamente as informaes dos pases subdesenvolvidos

    so relativamente pouco conhecidas26. As matrias veiculadas sobre a regio tm o perfil

    jornalstico com as seguintes caractersticas: 1) fatos inesperados; 2) negatividade do fato; 3)

    probabilidade pequena ou rara de repetio da ocorrncia; 4) situao cultural familiar; 5)

    padro de conflito semelhante (SANTANNA, 2006).

    Mesmo com aproximadamente meio milho de jornalistas no mundo, 17% so latino-

    americanos que alimentam-se, quase que exclusivamente, em quatro grandes agncias e

    retransmitem esses valores para terceiros (SANTANNA, 2006, p. 3). Esse comportamentoeditorial tem trs motivos: 1) herana cultural absorvida pelos profissionais da imprensa; 2)

    cobertura das agncias transnacionais prejudicial aos interesses latino-americanos; 3)

    interesses polticos e econmicos indiferentes ou contrrios integrao latina

    (SANTANNA, 2006).

    Finalmente, SantAnna (2006) acredita que a conduta dos profissionais da rea de

    comunicao juntamente com os efeitos s avessas dos avanos tecnolgicos e a globalizaoajudam a multiplicar um modelo de imprensa na Amrica Latina alinhado com o pensamento

    praticado nas naes de primeiro mundo e nas agncias internacionais.

    26 SCHARAMM, Wilbur. Comunicao de Massa e Desenvolvimento O papel de informao nos Pases daInformao nos Pases em Desenvolvimento. Rio de Janeiro, Bloch, 1970.

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    4 ANLISE DA REPRESENTAO DA VENEZUELA NA EDITORIA

    INTERNACIONAL DO JORNAL GRANMA

    4.1 A importncia da Venezuela determinada pela editorao e gneros jornalsticos

    O Granma um jornal informativo oficial do Comit Central do Partido Comunista Cubano ,

    o nico partido autorizado legalmente pelo governo e o nico da ilha caribenha. O nome

    Granma uma abreviao de Grand Mothere o nome do iate que levou, para o territrio de

    Cuba, 82 revolucionrios. Eles saram do Mxico a mando de Fidel para lutarem contra as

    tropas de Fulgencio Batista no final de 1965. O peridico constitui-se da unio dos jornais

    matutinosRevolucion (1959) do Movimento 26 de julho, e doNoticias de Hoy (1938), veculooficial do Partido Socialista Popular. A primeira edio do jornal foi veiculada em 4 de

    outubro de 1965.

    O Granma no apenas um jornal voltado para os acontecimentos dirios, mas tambm um

    rgo oficial do governo cubano sendo usado para veiculao de discursos de Fidel Castro e

    de seu irmo Raul Castro atual presidente do pas, anncios oficiais do governo e relatos

    histricos da ilha.

    um veculo que circula todos os dias, exceto aos domingos, sendo vendido pelo valor de 20

    centavos de pesos cubanos. As oito pginas do Granma so divididas em editoria nacional,

    cultura, esportes e internacional. Nas sextas-feiras, a edio estendida para 16 pginas,

    sendo que, em uma situao normal, a editoria internacional representa 25% (duas pginas),

    nacional 50% (quatro pginas) esportes e cultura 12,5 % cada (uma pgina). A tiragem de

    400 mil exemplares diariamente distribudos para toda ilha. O complexo Granma tambminclui desde 1966 um semanrio internacional Granma Weekly Review, que desde 1991 se

    chama Granma Internacional. Granma Internacional 27tambm o nome do site oficial do

    jornal. Por meio do site, o internauta pode ter acesso verso impressa digitalizada e outras

    matrias disponveis em espanhol, ingls, portugus, italiano e alemo.

    27www.granma.cu/

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    Em Cuba, a Internet foi utilizada para fins cientficos e militares at 1995, quando o meio foi

    entendido como uma nova tecnologia. O grande passo foi a publicao do Granma

    Internacional que [...] por sorte de Cuba, j no final desse ano [1995] que uma primeira

    verso de Granma Internacional entra na Internet atravs do recente portal Cubaweb, quase

    um ano antes da entrada oficial de Cuba na Internet em outubro de 1996. (FERNNDEZ,

    2001, p. 2, traduo nossa). Entre 1999 e 2000, o site do Granma chegou a um dos 100 sites

    de imprensa mais lidos da Internet.

    As matrias sobre a Venezuela, objeto emprico dessa pesquisa, foram coletadas durante o

    perodo de setembro de 2009. No ms escolhido no ocorreram fatos que alterassem a polticainterna e externa venezuelana. A amostragem foi analisada de acordo com os conceitos

    estudados para assim definir o perfil da cobertura feita. Por meio de uma leitura sistmica foi

    possvel identificar a disposio grfica presena de fotos, boxes, tamanho e editorao dos

    ttulos e o contedo dos textos. Foi apontada presena de elementos do jornalismo

    internacional e suas particularidades na Amrica Latina como a origem das matrias, fatores

    limitadores da cobertura e as novas tendncias dessa editoria.

    Tambm foram verificadas se as temticas freqentes do jornalismo internacional como

    guerras, eleies, epidemias e tragdias so aplicadas no Granma e ainda se os

    valores/notcias permeiam a produo jornalstica desse veculo. Foram construdos dois

    quadros para quantificar os dados. Um quadro composto do ttulo, seguido da valncia e do

    resumo da matria No outro foi identificada a cor do ttulo, presena de foto elementos

    grficos alm da categoria, gnero e origem da notcia elementos de contedo. No foipossvel ter acesso a outros jornais cubanos em circulao e a pesquisa no tinha como

    objetivo comparar os jornais de Cuba, portanto, no foi possvel analisar os critrios relativos

    concorrncia. A partir dessas caractersticas que determinam a importncia da Venezuela na

    editoria, foi possvel identificar o posicionamento do veculo governamental cubano com

    relao Venezuela.

    No site ou na verso impressa um fator iconogrfico importante so as cores utilizadas na

    editorao. No impresso, objeto dessa pesquisa, as cores predominantes so o branco, preto e

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    vermelho. Sendo que o branco e o preto referem-se ao papel e ao texto, respectivamente, e o

    vermelho utilizado em alguns boxes e ttulos e a cor da logomarca do jornal.

    Para Guimares (2004) simbolicamente, o vermelho no remete simplesmente ao sangue,

    mas, ao paradoxo da cor: amor e guerra ou violncia e paixo. Nossa cultura associa a cor

    vermelha ao sangue de Cristo, e por conseqncia, ao amor divino ou piedoso expresso, por

    exemplo, nos desenhos de corao ou no smbolo da cruz vermelha. Por outro lado pode ser

    profana como a ma do pecado, a roupa de Dionsio (deus vinho na mitologia), a cor da

    seduo, fogo e a paixo que pode queimar. Por causa do fogo a idia de proibio tambm

    presente na cor, porque em fogo no se pode encostar.

    No mbito poltico est relacionada s revolues, muitas vezes sangrentas, realizadas pelos

    partidos comunistas e de esquerda. Em funo disso a maioria dos partidos dos trabalhadores

    e de esquerda do mundo tem essa cor em sua logomarca (GUIMARES, 2004). Esse aspecto

    est diretamente ligado histria do jornal cubano e a revoluo socialista da ilha. Portanto, o

    uso do vermelho uma identidade visual do veculo e atua iconograficamente dando maiorvisibilidade para determinado assunto a que o ttulo ou box em destaque se refere.

    Na amostragem analisada, das 24 matrias, nove aparecem com o ttulo em vermelho, as

    demais em preto. As notcias com ttulo em vermelho dizem respeito principalmente defesa

    do socialismo em mbito mundial. Nas aes do presidente venezuelano presentes nos ttulos

    Solo El socialismo salvar al planeta, afirmo Chvez no dia 25/09 e Chvez insta al pueblo

    norteamericano a luchar por el cambio del mundo, no dia 24/09, fica clara a defesaideolgica por meio das expresses o socialismo salvar e lutar pela mudana do mundo.

    Duas matrias, cujas chamadas esto em vermelho, em especial fogem a regra de defesa

    ideolgico, o caso de Crece en Venezuela respaldo a Chvez do dia 7 de setembro e

    Marchan en Venezuela en rechazo a la SIP do dia 19. Ambas tratam de questes internas da

    Venezuela, contudo, seus desdobramentos refletem tambm no fortalecimento do socialismo

    perante o povo cubano. Uma mostra de que o presidente venezuelano est com alto ndice de

    aprovao naquele pas, outra mostra um movimento de veculos de comunicao de esquerda

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    cambio del mundo. Mas de foma geral, a onipresena de Chvez enfatiza sua posio de

    destaque e, consequentemente, sua importncia como lder.

    Nas fotos com governantes de outros pases o presidente venezuelano aparece conversando,

    em algumas at rindo ao lado de Mahmud Ahmadineyad, presidente do Ir, dia 7/09 e

    apartando a mo do chefe de governo espanhol, Jos Luis Rodriguez Zapatero. Essa interao

    aparentemente positiva com os governantes do mundo afora transmite no s uma idia de

    que Chvez realmente importante no cenrio internacional, mas que ele tem aliados e que o

    seu estilo de governo est sendo bem aceito. Nesse aspecto, passa ao povo cubano uma idia

    favorvel do socialismo desenvolvido no continente e que o ideal socialista de Cuba compartilhado por outros pases.

    Contudo h casos que as fotos so extremamente importantes porque do realidade ao fato, foi

    o caso do dia 19/09 emMarchan em Venezuela em rechazo a la SIP e dia 3/09 em Otorgan a

    Chvez medalla conmemorativa. Ambas trazem fotos de manifestantes nas ruas de Caracas.

    No primeiro caso, comunicadores foram s ruas contra a Sociedade Interamericana deImprensa, no segundo, a populao est mobilizada em defesa ao presidente Chvez, diante

    de manobras da oposio. A matriaBrutal agresin a periodista de Telesur em Ecuadordia

    22/09, que mostra em detalhes a rosto da jornalista agredida da agncia venezuelana Telesur,

    merece destaque como foto informativa.

    Tambm h notcias que citam a Venezuela, mas em que as fotos no privilegiam HugoChvez. o caso de Estados Unidos involucrado en la intentona golpista contra Chvez, dia

    22/09. A foto escolhida mostra o ex-presidente dos Estados Unidos Jimmy Carter que

    declarou a um jornal americano o envolvimento dos EUA em uma tentativa de golpe contra

    Chvez. No dia 24/09, a notcia que defende a suspenso do bloqueio a Cuba na ONU, teve

    como destaque na foto o presidente brasileiro Luis Incio Lula da Silva que foi o principal

    personagem do episdio na ONU. Nesse caso, a opinio de Hugo Chvez no mesmo evento

    foi menos relevante que a do presidente brasileiro, portanto, deixada em segundo plano.

    Outro fator que determina a importncia de um acontecimento a presena dele na primeira

    pgina. nela que se encontram os destaques do dia no veculo impresso. Apesar da forte

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    presena da Venezuela na editoria internacional do jornal cubano isso no se reflete na

    primeira pgina do jornal. Durante o analisado, nenhuma das matrias sobre a Venezuela ou

    Hugo Chvez foi destaque na primeira pgina do Granma, que reservada exclusivamente a

    assuntos nacionais e internacionais que envolvem diretamente Cuba.

    Os leads das matrias estudadas cumprem o papel de informar dados bsicos do

    acontecimento como em Chvez destaca unin frica-Sudamerica no dia 1 de setembro: O

    presidente da Venezuela Hugo Chvez ressaltou a importncia da unio da frica e Amrica

    do Sul da configurao de um mundo multipolar ao intervir no Congresso da Unio Africana

    (ASA) na Lbia, segundo DPA (GRANMA, 2009, traduo nossa).

    A estrutura do leade das matrias indica que o contedo sobre a Venezuela no jornal pertence

    categoria informativa, no h registro de matrias que tenham em sua estrutura a opinio do

    jornal ou de determinado reprter sobre a Venezuela e Hugo Chvez. Esse um aspecto

    estrutural do impresso, visto que normalmente o contedo opinativo se concentra nas

    primeiras pginas do jornal e a editoria internacional, objeto dessa anlise, est concentradanormalmente nas ltimas pginas.

    Melo (1985) acredita que o contedo opinativo to importante quanto o informativo

    principalmente porque trata da representao dos valores de determinada sociedade ou da

    prpria instituio, ou seja, formador de opinio. O comentrio, artigo, editorial, resenha,

    coluna, crnica, caricatura e carta so pertencentes essa categoria. Os gneros opinativospodem ser caracterizados da seguinte forma: 1) editorial espao da opinio institucional

    seguindo uma relao temporal pautada na continuidade e no imediatismo; 2) comentrio

    assinado mas possui as mesmas caractersticas do editorial; 3) artigo aparece aleatoriamente,

    assinado e angulao determinada pelo autor 4) resenha descobre os valores de bens

    culturais diferenciados como filmes e lbuns musicais, assinado e assim como o artigo a

    angulao determinada pelo autor.

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    Ainda h a carta, a coluna, a crnica e a caricatura. Todos esses gneros so assinados. A

    coluna e a caricatura, assim como a crnica e a carta, possuem pontos em comum

    principalmente no tocante a temporalidade:

    A coluna e a caricatura emitem opinies temporariamente contnuas, sincronizadas com o imergire o repercutir dos acontecimentos. A crnica e a carta estruturam-se de modo temporalmente maisdefasado; vincula-se diretamente aos fatos que esto acontecendo, mas seguem-lhe o rastro, oumelhor, no coincidem com seu momento eclosivo. (MELO, 1985, p.49).

    Se a carta funciona como resgate do fluxo jornalstico empresa comunidade, a caricatura

    nutre-se dos valores da instituio jornalstica e a coluna e a crnica absorve ou fazem aligao com o posicionamento da comunidade ou dos grupos sociais (MELO, 1985).

    No caso do Granma, o contedo de opinio no prevalecesse no jornal como um todo e nem

    na editoria internacional. As inseres opinativas parecem fora da editoria internacional nas

    sextas-feiras com a sesso cartas a la direccin cartas dos leitores e esporadicamente por

    meio da sesso Reflexiones del compaero Fidel uma espcie de editorial escrito pelo ex-lider cubano.

    Por outro lado, a categoria informativa, predominante na editoria, tambm pode ser

    classificada em diferentes tipos de texto. Melo (1985) em sua prpria classificao de gnero

    os define como: 1) nota relato de acontecimentos que esto em processo de configurao,

    menor que a notcia; 2) notcia relato completo de um acontecimento do organismo social;3) reportagem relato aprofundado de um acontecimento que j repercutiu no organismo

    social e seus desdobramentos [alteraes percebidas pela instituio]; 4) entrevista relato

    que privilegia a pessoa envolvida no acontecimento.

    Alm de caractersticas do prprio contedo do texto, podemos identificar esses gneros pelo

    tamanho da matria, visto que uma notcia curta uma nota, uma intermediria notcia e umrelato mais extenso uma reportagem. O Granma tem o tamanho A4 (21 cm x 29, 7) com

    rea de 623,7 cm. Dessa forma os textos que ocupam menos que 5% da pgina (de at 7,5

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    cm x 5,3 cm) so consideradas notas, as matrias entre de 6% at 40% consideradas notcias e

    as matrias de 45% metade da pgina at 100% pgina completa so reportagens.

    Das 24 matrias veiculadas durante o ms de setembro de 2009 apenas trs so notas:Aniversrio de Revolucon Libia, dia 2, Sismo em Caracas no hubo daos e Conocimiento

    peligroso no dia 14. Alm do tamanho, essas notas trataram de assuntos sem grande expresso

    para o povo cubano: uma condecorao recebida por Chvez na Lbia, um terremoto na

    cidade de Caracas e uma suspeita de vazamento de informaes de petrolferas venezuelanas,

    respectivamente. A nota consolida a presena marcante da Venezuela no noticirio, mas no

    trazem contedo ideolgico explcito.

    Nesse mesmo perodo, o jornal divulgou apenas duas reportagens, uma no dia 24/09,Llaman

    em la ONU a levantar bloqueo a Cuba, e dia 25/09 com Solo el socialismo salvar al planeta,

    afirmo Chvez en la ONU. Ambas tratam da 64 Sesso da Assembleia Geral da ONU em

    Nova Iorque, com focos diferenciados. A primeira trata da suspenso do bloqueio econmico

    a Cuba com declaraes de presidentes como Luiz Incio Lula da Silva, do Brasil, o uruguaio

    Tabar Vzquez, o boliviano Evo Morales e at de Barack Obama dos EUA e Nicolas

    Sarkozy da Frana. Alm da discusso em torno do bloqueio, a matria traz um subttulo com

    um texto sobre o que foi discutido na ONU com relao a crise poltica em Honduras, assunto

    relevante na poca da pesquisa. As informaes e declaraes contidas na matria foram

    fornecidas por agncias internacionais e no por um possvel correspondente no local. Esse

    relato detalhado com variedade de fontes e anlises uma das caractersticas da reportagem.

    A segunda reportagem tem como tema o discurso do lder venezuelano na ONU defendendo o

    socialismo e mostrando-se claramente contra a conduta americana.

    As duas matrias aparecem na publicao em sequncia, o que conhecido no jornalismo

    como sute. Esse aspecto se comprova na presena de um subttulo na matria do dia 25/09

    dizendo Ms voces contra el bloqueo cujo texto faz referncia ao presidente sul-africano

    Jacob Zuma, que tambm defendeu a queda do bloqueio a Cuba na assemblia. Segundo Wolf

    (1995) os acontecimentos e assuntos passveis de continuidade so importantes e teis para

    os jornais pois no precisam se preocupar com um assunto para o dia seguinte e para o

    pblico uma forma de oferecer desdobramentos de determinado fato.

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    As 19 matrias restantes foram consideradas notcias, no s pelo tamanho mdio, mas por

    tratarem de acontecimentos no organismo social que so recentes e possuem importncia.Essa importncia no jornalismo internacional, segundo Natali (2007) pode ser determinada

    pela temtica e pelas caractersticas da cobertura e no jornalismo em geral, determinado por

    meio de critrios de noticiabilidade, que segundo Wolf (1995), permeia toda a cadeia

    produtiva jornalstica.

    4.2 Divergncias e convergncias entre os valores-notcia e as temticas freqentes

    Wolf (1995) por meio da teoria de agenda-setting acredita que os veculos de comunicao

    tm a capacidade de guiar as pessoas para os assuntos que esto em destaque. Nesse aspecto o

    jornal Granma acaba por agendar a populao cubana sobre assuntos ligados Venezuela e

    sobre Hugo Chvez em especial. O agendamento possvel por meio da acumulao,

    consonncia e onipresena dos meios de comunicao de massa. No caso do jornal cubano, o

    agendamento reforado pela informao impressa em um pas com apenas 3,6% de

    analfabetos porque a informao escrita mais slida, visvel e constante, portanto, dotadade maior capacidade de lembrana, independentemente do nvel de conhecimento da pessoa

    sobre a Venezuela.

    Para selecionar os fatos que iro agendar o pblico, os jornais utilizam os gatekeepers,

    indivduo ou grupo com poder de deciso sobre aquilo que ser noticiado. Os gatekeepers do

    Gr