Jornalismo Um Realidade Amentada Na Palma Da Mão

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    Verso e Reverso, XXVII(64):2-8, janeiro-abril 2013 2013 by Unisinos doi: 10.4013/ver.2013.27.64.01ISSN 1806-6925

    Resumo. O aparecimento de novos dispositivos m-veis de comunicao, como os smartphonese os tablets,est a mudar a forma como nos relacionamos com asnotcias. O acesso informao a partir destes dispo-sitivos tem todas as vantagens oferecidas pelos web-jornais e permite ainda efetuar um consumo maispersonalizado. s bvias vantagens decorrentes des-te uso individual podemos ainda juntar o potencialde algumas tecnologias includas nos dispositivos,

    como o recetor de GPS, o acelermetro ou as cma-ras de vdeo. Estas tecnologias permitem enriqueceros contedos noticiosos e um bom exemplo disso a Realidade Aumentada (RA): a hiptese de colocarcamadas de informao virtual sobre imagens reaiscaptadas no momento uma oportunidade para en-riquecer as notcias com uma contextualizao quepode ser continuamente atualizada. Neste trabalhoprocura-se explicar o que a RA e que importnciapode ter para o jornalismo mvel.

    Palavras-chave: jornalismo, contextualizao, dis-positivos mveis, realidade aumentada.

    Abstract. The emergence of new mobile devices,such as smartphones and tablets, are changinghow we interact with news. Accessing informationfrom these devices has all the advantages offeredby newspapers on the web, also allowing more per-sonalized consumption. Apart from the obvious ad-vantages of using this type of individual handsets,now they sum up the possibility of enjoying tech-nical features such as GPS receiver, accelerometer

    or video cameras embedded in those devices. Thesetechnologies could enrich the news contents and agood example of this potential is the AugmentedReality (AR): the possibility of placing layers ofvirtual information on real images captured at themoment is an opportunity to enrich the news witha contextualization that can be continuously up-dated. This paper seeks to explain the role of AR onmobile journalism.

    Key words: journalism, contextualization, mobiledevices, augmented reality.

    Jornalismo mvel e Realidade Aumentada:o contexto na palma da mo

    Mobile Journalism and Augmented Reality: the context in your hand

    Joo Canavilhas

    Universidade da Beira Interior

    Av. Marqus dvila e Bolama, 6200 001, Covilh, Portugal.

    [email protected]

    Jornalismo e novas plataformas deacesso rede

    A Internet alterou o funcionamento doecossistema meditico e a relao do pblicocom os meios de comunicao.O equilbrioverificado at meio da dcada de 90 deu lugara uma nova ordem motivada pela chegada de

    um meio que desde o incio exerceu uma forteatrao sobre os consumidores. De ento parac, a Internet tem aumentado continuamente onmero de utilizadores: em cerca de dcada emeia, o nmerode usurios de Internet passoude16 milhes para cerca de 2,4 mil milhes,em junho de20121, caminhando no sentido dese tornar a principal fonte de notcias. Entre os

    1Dados relativos a Junho de 2012, ltimos disponveis em http://www.internetworldstats.com/stats.htm

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    jovens com menos de 30 anos isso j aconteceuno final de 20102, ocasio em que a Internetpassou a Internet a ser a primeira fonte de not-cias, ultrapassando o anterior lder, a televiso.O ritmo de crescimento das taxas de penetra-

    o da Internet e a renovao geracional farcom que esta realidade se alargue aos restantesescales etrios num curto espao de tempo.

    O aumento exponencial do nmero deutilizadores da Internet tem condicionado osrestantes meios, obrigando-os a introduzir al-teraes na sua natureza inicial. Jornais, rdiose televises procuram apropriar-se das carac-tersticas mais atrativas da Internet nomea-damente dos servios de Web e email - paraganharem e fidelizarem novos pblicos.

    Os jornais em papel, que atravessam atu-

    almente uma das piores fases da sua histriadevido ao forte decrscimo nas vendas e napublicidade, foram obrigados a criar versesna Web para encontrarem novos pblicos enovos anunciantes. A rdio, um meio cadavez mais limitado ao consumo no autom-vel, migrou igualmente para a Web, procu-rando desta forma combater a concorrnciada televiso e ultrapassar as limitaes espa-ciais relacionadas com a difuso heriana.A prpria televiso, o meio que melhor resistiu emergncia da Internet, conseguiu manteras audincias na sua plataforma tradicional,mas foi igualmente obrigada a integrar algu-mas caractersticas que sustentam o sucessoda Web, nomeadamente a interatividade e apossibilidade de efetuar um consumo perso-nalizado. A utilizao das chamadas powerboxproporcionou a construo de grelhas pesso-ais que permitem uma adaptao s rotinasdirias de consumo dos telespectadores. Ape-sar deste aparente sucesso, a televiso tradi-cional comea a registar quebras de audincia(PEW, 2011), sobretudo entre os mais jovens.Tal como aconteceu com os restantes meios, o

    consumo est a transferir-se para a Internet epara empresas de audiovisual com uma natu-reza diferente, como o Youtubeou o Vimeo.

    Se a migrao dos pblicos para a Internetj era notria, a popularizao dos smartphonese dos tabletscom ligao rede tornou aindamais evidente que o futuro dos meios de co-municao social passa obrigatoriamente pelaInternet. De acordo com a International Data

    Corporation, em 2010 venderam-se em todo omundo 305 milhes de smartphones, um nme-ro que subiu para 412 milhes em 2011 e para821 milhes em 2012. Este ltimo nmero da Gartner3, empresa que antev vendas de 1.2

    mil milhes de unidades para 2013. Em apenasquatro anos, as vendas deste tipo de equipa-mentos aumentou 400%. E as novas platafor-mas de acesso Internet no se esgotam nossmartphones: tambm os tablets registam ven-das dignas de referncia A Gartnerrefere queem 2012 se venderam 13 milhes de tablets,prevendo-se que em 2016 se vendam 53 mi-lhes de unidades.

    Estas vendas e a crescente mobilidade dasaudincias levaram ao aparecimento de umnovo grupo de consumidores a que a Coms-

    core (2001) chama Digital Omnivores. A deno-minao est relacionada com as plataformasque estes consumidores usam para aceder Internet, mas tambm com o tipo de consu-mo individual e multiplataforma que fazem.De acordo com o relatrio produzido por estaempresa no ltimo trimestre de 2011, o fen-meno dos Omnvoros Digitais verifica-se emvrios mercados globais, com o trfego oriun-do de smartphonese tabletsa representar j cercade 5% do total registado na Internet. Singapura(7.2%), Estados Unidos e Gr-Bretanha (6,8%),Japo (5,8%) apresentam os resultados mais al-tos no universo estudado. O mesmo relatriorevela ainda que metade da populao norte-americana usa o smartphone para aceder In-ternet e trs em cada cinco detentores de umtabletleem notcias a partir do seu dispositivo.Dados relativos a 2012 publicados pela Cisco4permitem atualizar os valores anteriores, sen-do referido que o trfego mundial oriundo dedispositivos mveis cresceu 70%. E embora ossmartphones representem apenas 18% dos ce-lulares existentes em todo o mundo, por elesque passa 92% do trfego mundial.

    Face a estes nmeros, natural que as em-presas de comunicao, sobretudo os jornais,vejam nestes dispositivos uma alternativa distribuio em papel, havendo j um grandenmero de publicaes que subsidiam os assi-nantes que pretendam comprar um tabletparareceberem o jornal em formato digital.

    A possibilidade de venda de contedos eaplicaes (apps), o aumento do investimento

    2 http://www.people-press.org/2011/01/04/internet-gains-on-television-as-publics-main-news-source3 http://techcrunch.com/2012/11/06/gartner-1-2-billion-smartphones-tablets-to-be-bought-worldwide-in-2013-821-million

    -this-year-70-of-total-device-sales/4 http://www.cisco.com/en/US/solutions/collateral/ns341/ns525/ns537/ns705/ns827/white_paper_c11-520862.html

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    em publicidade online e outros modelos as-sociados aos micropagamentos esto a trans-formar estes dispositivos em plataformas deconsumo meditico com um enorme potencialde monetizao para as empresas deste setor.

    Jornalismo e plataformas mveis.

    Os contedos jornalsticos para disposi-tivos mveis tm muitas semelhanas comos contedos Web, uma vez que partilham ocanal de distribuio. Na maioria dos casos,os contedos at so exatamente os mesmos,embora com uma formatao mais amiga paraas novas plataformas de acesso. Quem ace-de a jornais a partir de dispositivos mveispode encontrar quatro formatos: pdf, verso

    web, verso web mobile ou aplicaes nativas(apps). Se no primeiro caso se trata de uma c-pia dos meios impressos, nos restantes falamosde verses com algumas das caractersticas jidentificadas no Webjornalismo (Salaverra,2005; Zamith, 2008; Canavilhas, 2008): hiper-textualidade, multimedialidade, interativida-de, instantaneidade, memria, personalizaoe ubiquidade.

    No caso especfico dos dispositivos m-veis, algumas destas caractersticas ganhamuma redobrada importncia, sendo esse um

    dos seus elementos diferenciadores. Emboraseja possvel usar todas as caractersticas an-tes enunciadas, a personalizao em contexto talvez a marca distintiva de um consumo ca-racterizado pela mobilidade e pelo consumoindividual permitido por estes dispositivos.Como refere Zhang, enabling access to adap-tive, personalized, and context-aware infor-mation and service is crucial to fully take ad-vantage of the pervasiveness and convenienceof mobile devices (2007, p. 79).

    Smartphones e tablets so dispositivos pes-

    soais de reduzidas dimenses que acompa-nham permanentemente os seus utilizadores.A miniaturizao destes aparelhos teve umefeito semelhante ao que j tinha acontecidocom a rdio nos anos 60. Na ocasio, o redu-zido tamanho dos recetores e a sua produoem massa levou diminuio dos preos, oque permitiu a adeso dos jovens ao meio.Com este novo pblico, os prprios contedos neste caso a msica alteraram-se profun-

    damente, surgindo novos gneros musicaisdestinados a esta camada etria: nomes comoos Beatles, Rolling Stones ou Beach Boys ga-nharam grande projeo nos anos 60 graas rdio que levou a sua msica a um pblico

    muito mais vasto do que aquele que assistiaaos concertos. A msica acabaria por ser umdos catalisadores da revoluo socioculturalque se seguiu porque a multiplicao de pla-taformas de receo permitiu levar ao pblicojovem as novas tendncias musicais e ideiaspor elas veiculadas.

    Cinco dcadas depois, a miniaturizaodos celulares e smartphones, em conjunto com areduo de preos dos equipamentos e das co-municaes mveis, tornaram estes aparelhosacessveis a um maior universo de consumido-

    res. Smartphonese tabletslideram as vendas depequenos equipamentos eletrnicos e no Natalde 2012 voltaram a ser os produtos mais dese-jados e vendidos.

    Com o setor dos dispositivos mveis emacelerado crescimento, as empresas de mediainiciaram uma fase de adaptao, apostandocada vez mais em aplicaes nativas (apps).Nas ltimas edies doMobile World Congress,o grande destaque transferiu-se mesmo dosdispositivos para as aplicaes. A ttulo deexemplo refira-se que em Novembro de 2012

    o nmero de apps aprovadas pelo mercadolder (iTunes) ultrapassou um milho, embo-ra muitas delas tenham sido descontinuadas.O desaparecimento de algumas apps reduz aoferta real, mas em Janeiro de 2013 o iTunesoferecia cerca de 775 mil aplicaes destina-das ao seu sistema iOS, 1/3 das quais nativaspara iPad5. A estes nmeros preciso juntar aoferta do Android Market (650 mil em janeirode 20136), o Microsofts Phone Store (150 mil7),o BlackBerry App World (cerca de 100 mil), oAmazons Appstore e o Nokias Ovi Store, que

    no divulgaram nmeros recentes. Embora acategoria de jogos lidere em quase todas as lo-jas, as aplicaes para leitura de notcias estoigualmente entre as de maior sucesso.

    Estes nmeros ilustram o potencial de umnovo mercado caraterizado pelo consumo in-dividual e mvel em que os utilizadores po-dem aceder informao que lhes interessa nolugar onde esto em cada momento. Ao explo-rar a geolocalizao e as preferncias temticas

    5 http://ipod.about.com/od/iphonesoftwareterms/qt/apps-in-app-store.htm6 http://www.appbrain.com/stats/number-of-android-apps7 http://news.cnet.com/8301-10805_3-57560971-75/windows-phone-store-doubles-to-150k-plus-apps/

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    de um utilizador nico, a notcia atinge o graumximo da personalizao, situao apenaspossvel em dispositivos portteis.

    A Realidade Aumentada (RA)

    De uma forma simplificada podemos di-zer que Realidade Aumentada o processode sobreposio de elementos virtuais sobreimagens reais captadas por uma cmara. Umexemplo desta tecnologia a sobreposio delinhas imaginrias para mostrar os fora-de-jogo no futebol.

    No campo da informao para dispositivosmveis, as imagens em 3D e as panormicasde 360 graus tambm podem ser consideradasRealidade Aumentada. Porm, neste trabalho

    interessam-nos apenas os casos em que a so-breposio de informao virtual possvelcom o auxlio da cmara de vdeo integradanos smartphones e tablets. Esta situao podeocorrer de duas formas: pela identificao daposio geogrfica do dispositivo ou por leitu-ra tica. No primeiro caso, o dispositivo recor-re ao GPS para identificar o posicionamentogeogrfico, enquanto no segundo caso o re-conhecimento de formas, texturas ou cdigosque desencadeia uma ao de consulta a basesde dados, devolvendo ao utilizador um con-

    junto de informaes.Num e noutro caso, a Realidade Aumenta-

    da permite uma melhoria na perceo da rea-lidade fsica, usando para isso dados virtuaisexistentes em bases de dados acedidas remota-mente (Azuma, 1997). A tecnologia j usadanas transmisses desportivas, como foi referidoanteriormente, mas tambm em vrias cidadesonde so disponibilizadas aplicaes especfi-cas para diferentes setores. Um exemplo destetipo de aplicaes, neste caso na rea do turis-mo, a Layar Reality Browser8: a aplicao, que

    est disponvel para vrios sistemas operati-vos, oferece ao utilizador informaes sobreespaos como restaurantes, cinemas e teatros.Basta apontar a objetiva do smartphonepara umedifcio ou cartaz, e sobre a imagem real surgeuma grelha com dados e espaos de interaoque disponibilizam informaes e possibilitama compra imediata de bilhetes ou a reserva delugares. Outro exemplo deste tipo de tecnolo-

    gia a aplicao Wikititude9: neste caso a aplica-o recorre Wikipediapara sobrepor camadasde informao sobre os locais que aparecem nomonitor do smartphone. Um terceiro exemplo o Junaio10: esta aplicao faz o reconhecimento

    de certas imagens previamente carregadas parauma base de dados, e sobrepe uma camada(layer) de informao sobre obras de arte taiscomo pinturas ou esculturas. Esta aplicaopermite igualmente a leitura de cdigos ticosem revistas, cdigos QR e cdigos de barras,oferecendo a possibilidade de saber mais infor-maes sobre cada produto.

    A imprensa11 tem usado este gnero decdigos QR para inserir vdeo nas notcias.Atravs de uma aplicao deste tipo, a cmaraidentifica o cdigo e chama um ficheiro multi-

    mdia que exibido no ecr do computador.A tecnologia ainda usada no desporto, nummodelo semelhante ao da televiso: a Eyeplydesenvolveu uma aplicao que permite aosapreciadores de golfe seguirem o desenrolarde um challengegraas sobreposio de infor-mao relacionada com os pares de cada bura-co, bastando para isso direcionar o dispositivopara o campo de golfe.

    Realidade Aumentada:uma forma de contexto

    Para Lorenzo Gomis, o jornalismo inter-preta la realidad social para que la gente pue-da entenderla, adaptarse a ella y modificarla(1991, p. 35). De acordo com o autor, esta in-terpretao decorre em quatro momentos doprocesso de produo de notcias: na seleodos acontecimentos que passam a notcia (ga-tekeeping), na escolha dos elementos que inte-gram a notcia, na sua hierarquizao por or-dem inversa de importncia e, finalmente, nasua contextualizao. Este ltimo passo, que

    se materializa na oferta de uma variedade detextos, dados e elementos multimdia relacio-nados, de crucial importncia na diferencia-o de um contedo jornalstico em relao concorrncia. Mas igualmente importantepara fornecer ao leitor os elementos que lhepermitem entender a realidade social em quese integra, pois s desta forma estar na posseda informao que lhe permite tomar decises

    8http://www.layar.com/9http://www.wikitude.com10http://www.junaio.com/11Em Portugal, a revista Sbado foi a primeira a usar esta tecnologia

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    importantes. Como referem Kovach e Rosen-stiel, the primary purpose of journalism is toprovide citizens with information they need tobe free and self-governing (2001, p. 17).

    Neste cenrio, o contexto pode ter uma im-

    portncia fundamental na medida em que seuobjetivo resolver as eventuais ambiguida-des dos enunciados (Rodrigues 1996, p. 132).Sabendo-se que um dos grandes desafios colo-cados ao jornalismo ser compreensvel pelopblico a que se dirige, de que forma podemos jornalistas resolver as ambiguidades nassuas notcias? (Fontcuberta, 1999, p. 73).

    Uma das tcnicas fundamentais do jorna-lismo visa justamente resolver este problema:o princpio do contraditrio recomenda quesejam ouvidas todas as partes envolvidas no

    acontecimento, procurando-se desta formatornar mais claras as eventuais ambiguida-des. Mas pode no chegar, e neste ponto queo contexto importante pois ajuda o leitor acompreender o acontecimento relatado.

    Adriano Duarte Rodrigues diz que as am-biguidades se resolvem atravs da realizaode um processo de inferncia a partir do con-junto dos saberes pertinentes ou do mundocognitivo que partilha com o locutor (1996,p. 133). Ao trabalhar para um pblico vastoe culturalmente heterogneo, o jornalista nopode contar com o referido mundo cogniti-vo partilhado, pelo que tende a simplificar orelato. Porm, o processo de clarificao dosacontecimentos no pode passar apenas pelasimplificao: os meios de comunicao tmum papel importante na formao dos leitorese devem disponibilizar informao que ajudeo leitor a compreender o acontecimento. Essaresponsabilidade acrescida no webjornalis-mo porque o espao disponvel para a notcia tendencialmente infinito e a utilizao dahipermultimedialidade caracterstica do meiopermite contextualizar os assuntos. El con-

    texto constituye el relieve de los acontecimien-tos, muestra su mayor o menor importancia(Henrique Cebrin, 2004, p. 296). A existnciade informaes de contexto salienta a impor-tncia de uma determinada notcia dentro dapublicao, mas pode ser muito mais do queisso: o contexto permite uma maior aproxima-o realidade porque junta mais informaesa uma determinada situao e constri assimum cenrio integrativo para o acontecimentoque foi objeto da notcia.

    Pavlik diz que o ambiente online permitiu a

    emergncia de um novo tipo de jornalismo con-textualizado, atribuindo-lhe cinco dimenses:

    (1) breadth of communication modalities; (2)hypermedia, (3) heightener audience involve-ment, (4) dynamic content and (5) customiza-tion (2001, p. 4). No essencial, estas dimen-ses identificadas por Pavlik coincidem com

    algumas das caractersticas do webjornalismoreferidas no ponto 2 deste trabalho.

    A primeira dimenso refere-se possi-bilidade de juntar contedos mediticos dediferentes caractersticas no mesmo supor-te (Salaverria, 2005): neste caso falamos damultimedialidade, uma das caractersticasfundamentais do webjornalismo. A segundarefere-se capacidade de ligar unidades infor-mativas, sejam elas textos, imagens, grficos,vdeos ou sons, atravs de links (Lvy, 1996;Bardoel e Deuze, 2001): mais uma das carac-

    tersticas fundamentais do jornalismo na Web,a hipertextualidade. A terceira dimenso estrelacionada com uma das marcas distintivasda Web (Morris e Ogan, 1996) conhecida comoa interatividade: neste caso Pavlik refere-aapenas ao nvel da participao dos leitores noprocesso noticioso, mas existem outros grausde interatividade de maior complexidade.A quarta dimenso junta ubiquidade, instan-taneidade e memria, trs caractersticas destagigantesca base de dados acessvel em perma-nncia a partir de qualquer local com uma li-gao Internet. A quinta e ltima dimensoenunciada por Pavlik coincide com a persona-lizao, uma caracterstica que possibilita aoleitor criar um contexto informativo prprio,escolhendo a informao que mais lhe interes-sa entre as vrias opes de leitura oferecidaspelo jornalista.

    Este jornalismo contextualizado preconiza-do por Pavlik para a Web aplica-se igualmenteao jornalismo mvel, com a Realidade Aumen-tada a marcar a diferena entre os dois. Se nocaso do webjornalismo a construo de umarede informativa hipermultimeditica a facili-

    tar o processo de contextualizao, no campodo jornalismo mvel a Realidade Aumentadaque possibilita a juno da informao adicio-nal realidade percebida pelo leitor, facilitan-do a interpretao dos acontecimentos.

    Realidade Aumentada no jornalismo:que aplicaes?

    No webjornalismo, a contextualizao dainformao passa pelo aumento de resoluosemntica resultante da ligao de uma no-

    tcia aos recursos existentes na imensa basede dados que a Internet. Dependendo da

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    importncia e do interesse do acontecimentorelatado, as notcias aumentaro em nmeroe em detalhe, permitindo desse modo umaviso mais em pormenor do acontecimento(Fidalgo, 2004, p. 9). Ou seja, mais do que um

    enquadramento horizontal, o contexto decorrede forma vertical, aprofundando a notcia pelaligao do relato principal a outras unidadesinformativas, sejam elas textos, imagens, grfi-cos, vdeos ou sons. Se a informao fornecidapelas bases de dados corresponde a mais rigore objetividade (Fidalgo, 2004), ento podemosdizer esta teia informativa hipermultimediti-ca uma rede de objetividade. Falamos, evi-dentemente, de links embutidos, ou seja, linksincludos no prprio texto da notcia, e no delinks associados, que normalmente so apre-

    sentados em menu nos espao denominadosnotcias relacionadas. Nestes casos h umamanifesta contextualizao horizontal, masnem sempre os critrios seguidos so claros:pode haver uma relao com o quem, oonde, o quando, o porqu ou o como,mas pode tambm existir uma mera relaocom outras notcias dessa mesma seco dojornal. Por isso mesmo, esta contextualizaopode ser imperfeita e, no raras vezes, at des-provida de sentido.

    No caso do jornalismo mvel, a contextua-lizao sobretudo horizontal porque h duascaractersticas dos dispositivos de receo quese sobrepem a todas as outras: a incorporaode sistemas de geolocalizao e o conjunto ti-co que permite a captao/visualizao de ima-gens. Em lugar de aumentar a resoluo semn-tica, oferecendo mais notcias e detalhes sobreum acontecimento, a Realidade Aumentada so-brepe imagens/dados virtuais que permitemenriquecer a realidade visvel, integrando-a noespao geogrfico em que se encontra.

    Se a verticalidade constri uma rede deobjetividade pelo aumento da resoluo se-

    mntica, a horizontalidade edifica uma redede sentido em que a compreenso do elemen-to informativo se efetiva pela oferta de dadosacerca do prprio elemento no contexto espa-cial em que se encontra. Esta possibilidade estdiretamente relacionada com as caractersticastcnicas do dispositivo de receo, nomeada-mente a sua portabilidade, a ligao Internet,o recetor de GPS, o acelermetro e a cmara devdeo, dependendo ainda da existncia de appsespecficas.

    Embora neste tipo de dispositivos o nvel

    horizontal de informao seja prioritrio, desejvel que exista algum nvel de verticali-

    zao com mais detalhes sobre determinadosaspetos. Porm, deve notar-se que a reduzidadimenso dos ecrs dos smartphones dificultaesse processo de aprofundamento da informa-o, sendo mais favorvel em dispositivos com

    ecrs maiores, como os tablets. A usabilidadetem aqui um papel importante na definiodos espaos de interao.

    Este privilgio dado mobilidade e locali-zao faz com que a Realidade Aumentada pos-sa ser utilizada em todas as especialidades dojornalismo. Desde logo, seguindo um modelosemelhante ao da televiso, isto , sobrepondoinformaes estatsticas em tempo real nas no-tcias de desporto ou de economia, por exem-plo. Outra possibilidade a oferta de contedosmultimediticos sobre ocorrncias poltico-so-

    ciais que tenham acontecido num determinadolocal histrico. Podem ainda ser oferecidas ima-gens de sntese reconstrues ou antecipaes de edifcios, ligando essas imagens a informa-es sobre o espao em que se integra.

    Com estas ou outras utilizaes, inegvelque a Realidade Aumentada pode oferecer sempresas de comunicao social novas formasde enriquecer e diferenciar as notcias. As tecno-logias existentes nos equipamentos, a mobilida-de facultada por smartphonese tablets, a possibili-dade de personalizar a publicidade e a evoluo

    registada nos sistemas de pagamento, so umconjunto de oportunidades que as empresas deno podem ignorar. A explorao deste poten-cial fundamental para os que pretendem sobre-viver neste novo ecossistema meditico.

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    Submetido: 01/03/2013

    Aceito: 03/03/2013