Jurisprudência da Terceira Turma · haverá de ser monetariamente corrigida, cabendo ao juiz...

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Jurisprudência da Terceira Turma

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Relator:

Recorrente:

Recorrido:

Advogados:

JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA

RECURSO ESPECIAL N. 53.543 - SP (Registro n. 94.0027057-7)

Ministro Eduardo Ribeiro

Ministério Público do Estado de São Paulo

Nossa Caixa Nosso Banco S/A

Fernando Neves da Silva e outros

Litisconsorte: Siam Util S/A (massa falida)

Advogado: Alfredo Luiz Kugelmas (síndico)

EMENTA: Depósito judicial.

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O depositário judicial é auxiliar da Justiça e exerce seu mister sob as ordens do juiz, vinculando-se ao Estado por relação de Di­reito Público.

Devendo devolver, na íntegra, a importância que recebeu, essa haverá de ser monetariamente corrigida, cabendo ao juiz determiná­-lo, com indicação dos respectivos Índices.

Discordando, o depositário poderá impugnar o ato judicial em ação direta.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos vo­tos e das notas taquigráficas a seguir, por maioria, vencido o Sr. Ministro Ari Pargendler, conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento. Parti­ciparam do julgamento os Srs. Ministros Waldemar Zveiter, Ari Pargendler, Carlos Alberto Menezes Direito e Nilson Naves.

Brasília-DF, 19 de outubro de 1999 (data do julgamento).

Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Presidente.

Ministro EDUARDO RIBEIRO, Relator.

Publicado no DJ de 19.6.2000.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: Nossa Caixa Nosso Banco

RSTJ, Brasília, a. 12, (134): 231-329, outubro 2000.

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234 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

S/A impetrou mandado de segurança contra ato do Juízo da 17a Vara Cível do Foro de São Paulo. Considerou abusiva e ilegal a decisão que determi­nou o depósito "das diferenças pelos IPCs plenos, na conta da Massa Fa­lida de Siam Util S/A, no prazo de 24 horas, sob pena de desobediência".

Deferido o pedido de liminar, foi concedida a segurança, para sustar o ato impugnado.

Opostos embargos de declaração, foram rejeitados.

Apresenta o Ministério Público do Estado de São Paulo recurso espe­cial, alegando a ofensa aos artigos 139 e 148 do Código de Processo Ci­vil, 1.266 do Código Civil, l Jl da Lei n. 6.899/1981 e 5Jl, II, da Lei n. 1.533/1951. Traz arestos para demonstrar dissídio jurisprudencial. Afirma que as questões surgidas em decorrência de depósito judicial devem ser di­rimidas pelo juízo onde tramita o processo, tendo em vista a inexistência de relação jurídica entre a instituição financeira e as partes. Sustenta ser obrigação do depositário agir com a mesma diligência empregada no trato das coisas que lhe pertencem. Aduz que o índice aplicável para a correção monetária relativa aos meses de janeiro de 1989, março de 1990 e janeiro de 1991 é o IPC.

Foi o recurso admitido pela alínea c do permissivo constitucional.

Opinou o Ministério Público Federal pelo não conhecimento do re­curso e, se conhecido, pelo seu provimento.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO (Relator): Concedeu-se se­gurança, por considerar o acórdão "não poder a jurisdição obrigar a pos­tulante a proceder à correção monetária plena dos depósitos colocados à ordem e à disposição do Juízo, por não ser ela parte no litígio em que foi gerado o comando judicial". Assinalou, ainda, que, "estando a impetrante sujeita às normas emanadas do Banco Central, não poderia, sem o devido processo legal, colocar-se a salvo da incidência das determinações especí­ficas daquele organismo".

A orientação desta Terceira Turma não coincide com a do r. acórdão

recorrido. Assim é que podem ser citados os seguintes recursos especiais, por mim relatados: 72.704, 78.756 e 123.715. O eminente Ministro Menezes Direito foi relator desses outros: 141.163, 161.173 e 179.729. Nesses úl­timos mencionaram-se ainda outros julgados, desta e da colenda Quarta

RSTJ, Brasília, a. 12, (134): 231-329, outubro 2000.

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Turma. O entendimento firmado é o de que o depositário, sendo auxiliar

do Juízo, há de atender às suas determinações. Entendeu que ilegais, poderá

demandar que isso seja declarado. Não há, entretanto, necessidade de que

se ajuíze ação para condená-lo ao pagamento da correção monetária.

Transcrevo trecho de voto por mim proferido:

"O depositário judicial encontra-se arrolado entre os auxiliares

da Justiça (Capítulo V do Título IV do Livro I do Código de Proces­

so Civil). Exerce seu mister sob as ordens do juiz, vinculando-se ao

Estado por uma relação de Direito Público. A determinação de que proceda à entrega da coisa depositada tem caráter administrativo, não

se fazendo mister, a toda evidência, seja precedida de processo, em que aquele auxiliar do juiz figure como réu.

Tranqüilo o entendimento desse Tribunal de que o estabelecimen­

to de crédito que recebe dinheiro, em depósito judicial, responde pelo

pagamento da correção monetária relativa aos valores recolhidos (Sú­

mula n. 179). Ora, se devida a correção monetária, que apenas man­

tém a inteireza do recebido, parece induvidoso que a entrega do que

foi depositado haverá de compreendê-la. A ser de modo diverso, sub­

sistirá não devolvida parcela do depósito.

Aceitos esses pontos, há de se admitir que dado ao JUIZ impor a

devolução dos valores devidamente corrigidos. E lhe caberá decidir

quanto à exatidão dos índices aplicados.

Não se segue, do que ficou dito, não tenha o depositário direito ao contraditório, com todos os meios a ele inerentes. Sucede que, em

vista da natureza da relação de que faz parte, esse contraditório haverá

de ser por ele suscitado. Cabe-lhe, se assim entender, ajuizar as ações próprias, entre elas o pedido de segurança, para impugnar a determi­

nação judicial, podendo amplamente discutir se corretos os critérios

eleitos para a atualização da expressão monetária dos valores."

Não tem igualmente merecido acolhida a alegação de que o estabele­

cimento depositário estaria sujeito às determinações do Banco Central. A

correção há de corresponder à realidade. O contrário significaria que o ban­

co estaria se apropriando de parte do depósito. A jurisprudência é mais que

tranqüila a respeito do tema.

Conheço do recurso, pois suficientemente demonstrado o dissídio, e

dou-lhe provimento para denegar a segurança.

RSTJ, Brasília, a. 12, (134): 231-329, outubro 2000.

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236 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

VOTO

O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER: Sr. Presidente, acompa­nho o Sr. Ministro-Relator.

VOTO-VENCIDO

O SR. MINISTRO ARI PARGENDLER: Sr. Presidente, fico vencido. Examinei na Segunda Turma os precedentes da Súmula n. 179 e verifiquei que apenas um dos precedentes, aliás da Quarta Turma, da relatoria do Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar, trata do assunto. E mesmo esse pre­cedente não é unânime, tendo ficado vencido o Sr. Ministro Barros Mon­teiro.

A súmula é genérica, referindo-se a outras hipóteses, uma das quais relatada pelo Sr. Ministro Eduardo Ribeiro, a respeito de depositários.

Minha opinião é a seguinte: sempre que um juiz manda que alguém deposite em juízo uma quantia, está pressuposta a regra de que, sendo o depositário um banco, as regras do depósito são aquelas ditadas pelas leis em vigor.

Fico vencido, não conhecendo de todo o recurso especial.

Relator:

Recorrente:

Advogados:

Recorridos:

Advogado:

Recorrida:

Advogados:

RECURSO ESPECIAL N. 97.554 - SP (Registro n. 96.0035321-2)

Ministro Ari Pargendler

Regional São Paulo S/A Comercial, Construtora e Importa­dora

André Vidigal de Oliveira e outros

Fausto Padilha e cônjuge

Luiz Pontes Teixeira

Terezinha Regina Menezes Marques

Francisco Sant' Ana de Lima Rodrigues e outros

EMENTA: Civil - Cessão de crédito - Rescisão do contrato que

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o gerou. A ação de rescisão contratual é de quem participou do con­trato - não, do cessionário dos créditos decorrentes desse ajuste; acórdão que atribuiu à cessão de crédito efeito próprio da cessão de contrato. Recurso especial conhecido e provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos vo­tos e das notas taquigráficas a seguir, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, por unanimi­dade, conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Carlos Alberto Menezes Direito, Eduardo Ri­beiro e Waldemar Zveiter.

Brasília-DF, 25 de abril de 2000 (data do julgamento).

Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Presidente.

Ministro AR! PARGENDLER, Relator.

Publicado no DI de 5.6.2000.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO ARI PARGENDLER: Regional São Paulo S/A Comercial, Construtora e Importadora propôs "ação de rescisão contratual, cumulada com reintegração de posse" contra Fausto Padilha e Maria Apare­cida Andrade (fls. 17/21).

A MMa. Juíza de Direito Dra. Denise Indig Pinheiro julgou extinto o processo sem julgamento de mérito (fls. 75/85), sentença que foi refor­mada, em parte, pela egrégia Décima Oitava Câmara Civil do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Relator o eminente Desembargador Olivei­ra Prado, tão-só "para majorar os honorários advocatícios da sucumbência" (fl. 121).

Lê-se no julgado:

"Não nega a autora, e nem poderia fazê-lo, diante do que cons­ta na escritura pública de fls. 48/63, em especial na cláusula 511. (fl. 51), e seu item 21 (fl. 56 v.), que seus créditos, e especificamente o do imó­vel objeto do contrato que se pretende resilir, foram cedidos para o Banco Itaú de Investimentos S/A, isto em 28 de dezembro de 1981.

RSTJ, Brasília, a. 12, (134): 231-329, outubro 2000.

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238 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE]USTIÇA

Tendo a autora cedido seu crédito, não poderia constituir os réus

em mora, através da notificação judicial de fls. 42/92, em 22.10.1992

(fl. 92 v.).

Demais disto, sequer teria legitimidade para propor tal ação, le­

gitimidade esta do beneficiário da cessão de crédito, inobstante a pro­curação outorgada nas cláusulas 11 e 12 de mencionada escritura pú­blica (fl. 61), outorgando poderes ao Banco Itaú de Investimentos S/A para, em seu nome, propor ação visando a resilição contratual de de­vedores inadimplentes e dar em pagamento os imóveis cujos contratos foram resilidos amigavelmente.

Isto porque a ação de resilição contratual por falta de pagamen­

to é ação própria de credor, que a autora não mais era, nem ao tem­po da notificação já referida, nem quando do ajuizamento desta ação.

Corretamente extinto o processo, pois." (fls. 120/121).

Seguiram-se embargos de declaração, opostos por Regional São Paulo

S/A Comercial, Construtora e Importadora, sustentando que não cedeu sua posição contratual ao Banco Itaú de Investimentos S/A, que é simples cessionário do crédito (fls. 124/134) - acolhidos em parte (fls. 138/140).

Daí o presente recurso especial, interposto com base no artigo 105,

inciso IH, letras a e c, da Constituição Federal, por violação do artigo 3'-'

do Código de Processo Civil e do artigo 85 do Código Civil (fls. 143/153).

Originariamente não admitido, o recurso especial foi processado por

força de agravo de instrumento provido pelo eminente Ministro Costa Leite

(fl. 253).

VOTO

O SR. MINISTRO ARI PARGENDLER (Relator): As razões do re­

curso especial estão bem fundadas quando afirmam que, na espécie, houve

cessão de crédito, e não cessão de contrato.

A escritura pública é expressa a respeito dos negócios nela efetivados,

a saber:

"Escritura de confissão de dívida, cessão de crédito hipotecário,

cessão de créditos relativos a instrumentos particulares de compromisso de

venda e compra, promessa de dação em pagamento e outros pactos." (fl.

22 v.).

RST], Brasília, a. 12, (134): 231-329, outubro 2000.

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Mas o acórdão atribuiu à cessão de crédito efeito próprio da cessão de

contrato.

"Tendo a autora cedido seu crédito" - afirmou - "não poderia cons­

tituir os réus em mora, através da notificação judicial de fIs. 42/92, em

22.10.92 (fI. 92 v.)." - fI. 121.

Logo a seguir, completou que "sequer teria legitimidade para pro­

por tal ação" ... "porque a ação de resilição contratual por falta de pa­

gamento é ação própria de credor, que a autora não mais era" (fI. 121).

Data venia, a ação de rescisão contratual é de quem participou do

contrato; não, do cessionário dos créditos decorrentes desse ajuste.

A notificação que visava à caracterização da mora observou que o ti­

tular da relação jurídica era um, e o titular do crédito, outro; foi ajuizada

por Regional São Paulo SIA Comercial, Construtora e Importadora (fI. 43),

com a indicação de que o débito deveria ser pago ao Banco Itaú SI A (fI. 54).

N essa linha, o recurso especial deve prosperar.

Primeiro, pela letra a, porque o Tribunal a quo disse ter aplicado o

artigo 85 do Código Civil para decidir a lide, in verbis:

"Na hipótese em julgamento, não se negou vigência ao art. 85 do

Código Civil. Implicitamente, na conclusão do julgado aplicou-se a

referida disposição legal, mas segundo o entendimento dos julgadores,

sendo até compreensível a irresignação da embargante, que todavia

afigura-se insuficiente para o acolhimento pleno de seu pleito re­

cursal." (fI. 139).

Segundo, pela divergência jurisprudencial, que está comprovada, pelo

acórdão proferido, por maioria de votos, pela egrégia Quarta Câmara Cível

do Tribunal de Justiça do antigo Estado da Guanabara, Relator o eminente

Desembargador Olavo Tostes, assim ementado:

"Compromisso de compra e venda. Cessão, pelo proprietário, do

direito de pedir a rescisão do contrato. Inadmissibilidade. Recurso pro­

vido. Voto-vencido. 'Não é suscetível de cessão o direito do proprie­

tário, de pedir a rescisão do contrato de promessa de venda, por ina­

dimplemento do promitente-comprador. A cessão só é possível no tocan­

te ao direito de receber a parte do preço que restar pagar, acrescida de

RSTJ, Brasília, a. 12, (134): 231-329, outubro 2000.

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juros e outras penalidades pactuadas ou legais, não, ao de rescindir o

contrato e abolir, conseqüentemente, o próprio crédito transferido.'"

(RT 457, p.p. 242/243).

Lê-se no acórdão:

"Nessas ações cedidas é possível entender como compreendida a

de pedir a rescisão do contrato, isto é, de abolir o próprio direito de

crédito, tornando inexistentes os direitos cedidos?

Nos termos do art. 1.066 do CC, juntamente com o crédito pre­

sumem-se transferidos todos os seus acessórios, isto é, privilégios, ga­

rantias reais, juros e multas. Mas cessão para extinguir a própria obri­

gação a que se vinculava o crédito cedido, livrando o proprietário do

dever de outorgar a escritura e tornando nenhum o direito do cessio­

nário, parece, data venia, conduzir ao absurdo.

Dir-se-á que o cessionário que, por inadvertência, fez que se ex­

tinguisse o seu próprio crédito, poderá voltar-se contra o cedente, em

ação de locupletamento. Mas o cedente poderá retrucar que, na forma

da lei, só respondia pela existência do crédito, ao tempo da cessão, não

podendo ser responsabilizado pela extinção da dívida, em virtude de

ato voluntário do cessionário." (op. cit., 243).

Voto, por isso, no sentido de conhecer do recurso especial e de dar­

-lhe provimento para afastar a preliminar de ilegitimidade ativa ad causam.

VOTO-VISTA

O SR. MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO: Pedi

vista dos autos apenas para conferir precedentes da Corte sobre a matéria.

E verifico que os precedentes, sendo recorrente a mesma empresa, não dis­

crepam da orientação adotada pelo voto do Sr. Ministro Ari Pargendler.

N o precedente de que foi Relator o Sr. Ministro Eduardo Ribeiro, o

recurso especial foi provido considerando que a "cessão de crédito relati­

vo às prestações a serem pagas pelo promitente-comprador, não envolven­

do a cessão do pré-contrato, não retira a legitimidade do promitente-ven­

dedor para pleitear a rescisão" (REsp n. 163.599-SP, DJ de 15.6.1988).

No precedente da minha relatoria, reafirmou-se a posição anterior.

RSTJ, Brasília, a. 12, (134): 231-329, outubro 2000.

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Todavia, o especial não foi conhecido diante da peculiaridade destacada, assim a de ter sido afirmada pelas instâncias ordinárias a "ineficácia da no­tificação para a constituição em mora expedida pela empresa recorrente, à medida que o cessionário que deveria receber as prestações, o crédito, não se manifestou, e, também, que não havia mora alguma, não estando, portan­to, inadimplentes" (REsp n. 193.576-SP, DJ de 6.12.1999). Com esse ce­nário, não foi possível dar passagem ao especial.

Destarte, conferidos os precedentes, eu acompanho o eminente Relator, conhecendo e provendo o especial.

RECURSO ESPECIAL N. 104.191 - MG (Registro n. 96.0051550-6)

Relator: Ministro Nilson Naves

Recorrente: Sociedade de Indústria e Comércio de Algodão Ltda -

Sical

Advogados: Lincoln Rocha e outros

Recorrido: Cândido Ríbeiro Neto

Advogados: Raimundo Cândido Júnior e outros

Assistente: Juliana Viana Ribeiro

Advogados: Carlos Mário da Silva Velloso Filho e outro

Sustentação oral: Getúlio de Queiroz (pela recorrente), Márcio Gontijo (pelo recorrido) e Carlos Mário da Silva Velloso Filho (pela assistente)

EMENTA: Bem. clausulado - Alienação - Pretensão de anular -Legitim.idade.

1. Para a ação, não falta legitim.idade a filho do alienante. É de ver que a princípio qualquer interessado pode alegar as nulidades do art. 145 do Código Civil. 2. Autorização judicial. Sobre se, pro­cessualm.ente, é possível dem.andar a anulação da venda sem. que

antes se anule a autorização, a recorrente não com.provou, regular­m.ente, o dissídio indicado; adem.ais, dissídio não há. 3. Inexistência de afronta aos apontados textos de lei federal. 4. Recursos especiais não conhecidos.

RSTJ, Brasíli,., a. 12, (134): 231-329, outubro 2000.

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ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da

Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos vo­

tos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer dos

recursos especiais. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Eduar­

do Ribeiro, Waldemar Zveiter, Ari Pargendler e Carlos Alberto Menezes

Direito.

Brasília-DF, 18 de maio de 1999 (data do julgamento).

Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Presidente.

Ministro NILSON NAVES, Relator.

Publicado no DI de 2l.2.2000.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO NILSON NAVES: Trata-se de ação declaratória de

nulidade de ato jurídico (alienação de imóvel), intentada pelo recorrido

contra a recorrente (e também contra Cândido Nascimento Ribeiro e sua

mulher). Segundo o relatório de fls. 158/159,

"Relata o pedido que o avô do autor doou a seu pai, réu-varão,

um imóvel que identifica, gravando-o com as cláusulas de incomunica­

bilidade, impenhorabilidade e inalienabilidade. Acontece que os réus

venderam dito imóvel à outra ré - Si cal, sendo esta venda absolutamen­

te nula.

A r. sentença de 1 S!. grau rejeitou a preliminar de ilegitimidade ad

causam do autor, extinguindo o processo considerando que a aliena­

ção se fez com autorização judicial que constitui obstáculo ao desen­

volvimento válido e regular do processo.

Irresignados, recorrem ambas as partes. O autor visando a refor­

ma da r. decisão argumentando que o ato judicial que autorizou a ven­

da não faz coisa julgada no sentido material, desde que se trata de pro­

cesso de jurisdição voluntária. Por outro lado, os réus insistem na ile­

gitimidade ad causam do autor e insurgem-se ainda quanto à fixação

da verba honorária."

RSTJ, Brasília, a. 12, (134): 231-329, outubro 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 243

Deu-se provimento à apelação do autor, negou-se provimento à ape­

lação da Sociedade e julgou-se prejudicada a apelação de Cândido Nasci­

mento e sua mulher. A saber: quanto à ilegitimidade ativa do autor (maté­

ria da apelação da Sociedade-ré), o Tribunal decidiu por unanimidade; quan­

to à apelação do autor, o Tribunal decidiu por maioria de votos, ocasião em

que prevaleceu a seguinte conclusão:

"Disto resulta que, não tendo sido observadas as disposições do

ato judicial quanto ao depósito da quantia correspondente ao paga­

mento do bem nem tendo sido feita a aquisição de outro bem de igual

ou maior valor, assim apurado em avaliação por perito do juízo, com

a transferência para ele dos gravames, não se consumou a sub-rogação.

E isto se afirma porque sub-rogar é transferir o ônus para outro imó­

vel, é converter o produto da venda do imóvel gravado em outro imóvel

que ficará sub-rogado nas obrigações do primeiro (art. l.677 do Có­

digo Civil). Não tendo havido tal procedimento, a alienação não se deu

através da sub-rogação e assim a sua nulidade pode ser argüida por

qualquer pessoa interessada, desde que se trata de nulidade absoluta

(arts. 145 e 146 do Código Civil).

Assim é ser rejeitada a preliminar de ilegitimidade ativa ad cau­

salll, provida a primeira apelação para cassar a r. sentença a fim de que

sejam examinadas as demais questões, especialmente o mérito do pe­

dido."

Embargos de declaração foram apresentados pelos réus, rejeitados pelo

acórdão de fls. 202/208.

Por acórdão de 28.12.1994, o Tribunal rejeitou os embargos infrin­

gentes opostos pela Sociedade-ré. Por acórdão de 29.3.1995, publicado em

8.4, rejeitaram-se os embargos de declaração.

Há nos autos duas petições de especial: às fls. 296/298, de recurso in­

terposto pela Sociedade-ré contra o acórdão dos embargos infringentes, em

que se apontou ofensa ao art. 458, II, do Código de Processo Civil e se in­

dicou dissídio com o RE n. 47.232; às fls. 344/353, de recurso também in­

terposto pela Sociedade-ré mas contra o acórdão da apelação (parte unâni­

me), em que se alegou ofensa aos arts. 6l:!. e 458, II, do Código de Proces­

so Civil, 145, II, 146 (primeira parte) e l.089 do Código Civil, bem como

em que se indicou divergência com julgados de outros tribunais.

RSTJ, Brasília, a. 12, (134): 231-329, outubro 2000.

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244 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Denegados ambos os recursos, dei provimento ao agravo e ordenei su­

bissem os autos principais.

É o relatório.

VOTO

o SR. MINISTRO NILSON NAVES (Relator): Trata-se de duas

questões, cuja decisão se requer ao Superior Tribunal de Justiça: legitimi­

dade de parte e admissibilidade do pedido de anulação. As preliminares da

contestação, a saber, ilegitimidade de parte ativa e prescrição, foram rejei­

tadas pela sentença: a primeira, porque, conforme o art. 146 do Código Ci­

vil, a que se reportou o juiz, qualquer interessado poderá alegar as nulida­

des inscritas no art. 145; a segunda, porque se mostra "incabível a argüi­

ção da prescrição pelo lapso de quatro anos, própria, como se sabe, somente

em relação aos atos anuláveis". Mas o juiz, indo além, acabou por extinguir

o processo, à vista do disposto no art. 267, IV, do Código de Processo Ci­

vil, porquanto, disse ele, "se através de procedimento regular houve por bem

o Juízo da 8"" Vara Cível desta capital autorizar a venda do imóvel, com a

admissão, assim, da sub-rogação do clausulado em outro imóvel, e uma vez

realizada a compra e venda, não há falar-se em possibilidade de revogar essa

decisão. Do contrário, não se estaria respeitando o que é importante para

o Direito - o instituto do ato jurídico perfeito, sem falar em que se esta­

ria, também, desrespeitando o direito adquirido daquele que veio, na boa­

-fé e sob o pálio da Justiça, a adquirir o bem".

Quanto à ilegitimidade (em que se confirmou a sentença, que também

rejeitara a preliminar), efetivamente o acórdão da apelação foi unânime, e

o recurso especial interposto contra tal parte da decisão estadual ficou lá

na origem meio perdido, daí as seguintes observações do despacho do Vice­

-Presidente Mercêdo Moreira: "Em face do desaparecimento, na Secretaria

da Terceira Câmara Cível deste Tribunal, da petição do recurso interposto,

conforme certificado pela ilustre Diretora da referida Secretaria, esta Vice­

-Presidência determinou que fosse encaminhada a este Tribunal, se possí­

vel, pelos advogados subscritores da petição de fi. 300, cópia da petição do

recurso especial referido na certidão de fi. 314. E em cumprimento a esse

despacho é que veio o recurso aos autos".

Por isso é que o recurso se encontra a folhas tantas, após o especial

contra o acórdão dos embargos infringentes. Em suas razões do pedido de

reforma do acórdão da apelação, alegou-se que a herança de pessoa viva não

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 245

pode ser objeto de contrato, mas dessa matéria, como bem se observou na

origem, não tratou o Tribunal mineiro, caso, portanto, das Súmulas n. 282

e 356-STF. Nas razões, também se invocou o art. 458, lI, sucede, no en­

tanto, que, a par, quanto a este ponto, da deficiência formal do recurso, as­

pecto igualmente observado na origem, é de ver, facilmente, que não fal­

taram fundamentos seja à sentença, seja ao acórdão. Sobre o art. 145, lI, do Código Civil, a recorrente, de fato, "não trouxe as razões pelas quais en­tende violada a norma ali contida" (Súmula n. 284-STF). Porém a questão relativa à ilegitimidade para a causa do autor igualmente foi exposta e en­frentada pela recorrente com vistas aos arts. 6.Q. do Código de Processo Civil

e 146 do Código Civil. Segundo suas alegações, o Tribunal não demonstrou "em que consiste, no caso em julgamento, o interesse do autor, mero filho

dos alienantes, a cujo patrimônio, na hipótese de procedência, deve o bem reverter" .

Quanto a que o Tribunal de Alçada não se pronunciara sobre o ponto

controvertido, razão não cabe à recorrente, pois, se, em tal aspecto, de todo

não foi feliz o acórdão da apelação, sendo conseqüentemente razoável ad­mitir-se a omissão, veja-se que, admitindo-a, suprida ela foi pelo acórdão

dos embargos de declaração, nos termos seguintes:

"Tratando-se portanto de nulidade absoluta, por ser argüida 'por qualquer interessado' e aqui a expressão 'interessado' não há que se

confundir com o interesse de agir previsto pelo art. 6.Q. do CPC, mas como qualquer interessado em ver declarada a nulidade. Tratando-se

de nulidade absoluta (pleno iure) deve ser pronunciada judicialmen­

te sempre que houver a provocação do juízo seja através de uma pes­soa interessada em denunciar a existência de um ato jurídico ilegal, seja

através de representação judicial feita pelo Ministério Público em de­fesa da coletividade.

Assim não há que se discutir a ilegitimidade do autor segundo seu interesse direto e imediato para o resultado da ação, questão aliás exa­

minada no acórdão."

Ora, podendo a nulidade ser alegada por qualquer interessado, há boa

razão para crer que o ora autor se enquadre na expressão a que se refere o

indigitado art. 146. Interesse há, seja econômico seja moral, porquanto é

razoável supor que o ato em questão tenha afetado a pessoa que ora está a

demandar a nulidade. Não se cogita de herança de pessoa viva, não vindo

a pêlo, pois não se discute sobre contrato que a tenha por objeto, o disposto

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246 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

no art. 1. 089 do Código Civil. Aliás, como já informei, essa matéria nem sequer foi ventilada na origem. Exclusivamente quanto à legitimação para

a causa, e afinal foi o que se decidiu, nada mais e nada menos lá se deci­

diu, a impressão que me fica é a de que, com vistas tanto ao Código Civil

quanto ao Código de Processo Civil, o autor se acha legitimado.

No especial interposto contra o acórdão dos infringentes, alegou-se

que se ofendera o art. 458, II, do Código de Processo Civil, pelo motivo de

que não era lícito "afastar-se dos limites estabelecidos no recurso em jul­

gamento, para entrar em considerações atinentes à sub-rogação do vínculo

de inadmissibilidade". Aqui, porém, se ofensa houve, tal não diz respeito ao

indigitado inciso II, que versa sobre fundamentos, e fundamentos não fal­

taram às decisões ordinárias. Indicou-se, entretanto, dissídio com julgado do

Supremo Tribunal, e a indicação se fez nestes termos: "Daí que o Excelso

Pretório, em decisões reiteradas e oportunamente invocadas nos embargos,

firmou o entendimento de que, em casos semelhantes, é inadmissível a pre­

tensão anulatória, sem aquela medida preliminar, visto como 'a compra e

venda de imóvel que se procura anular, sob o fundamento de que estava gra­

vado com a cláusula testamentária de inalienabilidade, foi realizada mediante

a expedição do seguinte alvará pelo Juiz de Direito da Provedoria .. .' (RE n. 47.232, ReI. Min. Victor Nunes)".

Pelo visto, a recorrente não mencionou "as circunstâncias que identi­

fiquem ou assemelhem os casos confrontados", igualmente, à época da

interposição do recurso, era de exigência sumular e regimental (Súmula n.

291-STF e Regimento Interno do STJ, art. 255 e parágrafos). Formalmen­

te, ao recurso faltaria cabimento.

Da leitura, entretanto, que, espontaneamente, fiz do acórdão para­

digma, o que me ficou foi que não há dissenso entre os dois julgados: no

paradigma, tratou-se de caso em que o mérito da causa fora decidido, ao

passo que, no caso em exame, veja-se o que disse o Juiz Abreu Leite: "Em

meu voto proferido por ocasião da apelação realmente manifestei que a sub­

-rogação não se efetivou porque a adquirente deixara de cumprir exigên­

cias contidas no Alvará Judicial. Na realidade tal matéria constitui mérito, há de ser objeto de acurado exame e decisão pelo Juízo de 1 Q grau". De mais

a mais, como observou o Relator dos embargos infringentes, Juiz Tenisson

Fernandes, "A ser exato que os contratantes não sub-rogaram no produto

da venda a cláusula da inalienabilidade vitalícia, o que, evidentemente, é de

ser decidido em 1Q grau, nenhuma relação de dependência há entre a res­

cisão da sentença e a nulidade da alienação". Em tal aspecto, isto é, em que

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 247

se decidiu pela volta dos autos à origem para sentença (para que o juiz se

pronuncie sobre o mérito), dissídio não existe. Observe também, desseme­

lhando-se os casos em confronto, que no padrão trata-se de acórdão

prolatado em embargos, mas, quando do julgamento do recurso extraordi­

nário, o Relator também se valera do "usucapião em favor dos adquirentes",

circunstância não encontrada no acórdão recorrido.

Em vista disso é que, a meu juízo, os especiais são inviáveis. Dei-me,

no entanto, à pesquisa de jurisprudência, a fim de mapear a orientação da

Segunda Seção, e encontrei, desta Turma, acórdão reputando nula a promes­

sa de compra e venda "de coisa gravada com a cláusula de inalienabilidade"

(REsp n. 11.678, Ministro Cláudio Santos, DJ de 3.4.1995), mas também

encontrei acórdão da Quarta Turma noutro sentido, de que não é nulo o

contrato preliminar (REsp n. 35.840, Ministro Sálvio de Figueiredo, DJ de

11.11.1996), localizei ainda precedente segundo o qual o aludido art. 1.676

"não pode ser tão austeramente aplicado a ponto de se prestar a ser fator

de lesividade de legítimos interesses" (REsp n. 10.020, Ministro Cesar Ro­

cha, DJ de 14.10.1996), e vejam o que o Ministro Ruy Rosado escreveu na

ementa do REsp n. 37.859: "A parte que requer o alvará e aliena o bem gra­

vado, recebendo o preço, tem o dever de providenciar a sub-rogação, ain­

da possível, assim como previsto na lei e determinado na sentença. É inad­

missível que a parte beneficiada com o processo instaurado a seu pedido e

descumpridora do seu dever de efetivar a sub-rogação, obtenha, com vio­lação à teoria dos atos próprios e em prejuízo do terceiro adquirente de boa­

-fé, a anulação da alienação apenas porque, passados anos, arrependeu-se do negócio. Situação que decorreu do equívoco inicial de autorizar a venda sem

que se efetivasse, simultaneamente, a aquisição de outro, com sub-rogação"

(DJ de 28.4.1997).

Ante o exposto, já que limitada a causa aos pontos mencionados, dos recursos não conheço.

VOTO-PRELIMINAR

O SR. MINISTRO NILSON NAVES (Relator): Sr. Presidente, sobre

a preliminar, suscitada da tribuna, rejeito-a, porquanto, no caso em exame,

não há de vir a pêlo a Lei n. 9.756/1998, por óbvias razões.

O SR. MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO (Pre­

sidente): Tenho a impressão de que seria prudente porque foi argüida ex­

pressamente por dois advogados.

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248 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

ESCLARECIMENTOS

O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: Parece-me que se deve dis­tinguir duas questões. Uma, da legitimidade que, a meu ver, pode ser re­

solvida do modo que se recomenda quando se trata de questão simplesmente processual. Admitindo-se, provisoriamente, que exato o alegado na inicial, que exista a nulidade, a parte seria legítima? Saber se existe ou não a nu­lidade já é questão pertinente ao mérito.

Há uma dificuldade. O juiz extinguiu o processo, considerando ter havido autorização judicial. Entendeu, ao que parece, que o ato de aliena­ção seria válido, já que nela amparado. O Tribunal, ao que depreendi do re­latório, praticamente já decidiu o mérito. Julgou a causa, afirmando haver a nulidade.

Se bem entendi, o eminente Relator está decidindo que a parte, em

princípio, é legítima. A nulidade seria absoluta e, como interessada, encon­tra-se legitimada para pleitear seja reconhecida. A isso acrescenta que o fato

de ter havido autorização judicial não significa, por si, a impossibilidade da demanda.

O SR. MINISTRO NILSON NAVES (Relator): Exatamente, duas são as questões. Eis o início do meu voto (lê-se).

O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: Sendo essas duas as ques­tões, afastam-se as minhas dúvidas. Admitindo-se, hipoteticamente, a exis­tência da nulidade afirmada pelo autor, a parte é legítima. Saber se existe

a nulidade é questão de mérito.

Também considero que o fato de haver o alvará judicial não seria su­ficiente, por si, para impossibilitar a ação, buscando a declaração de nuli­dade.

Acompanho o Relator, vencido que fui na preliminar.

PRELIMINAR SUSCITADA VOTO-VENCIDO

O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: A resolução editada pelo

Plenário, quanto à aplicação da lei que instituiu o recurso especial retido,

abrange todos os casos.

O SR. MINISTRO ARI PARGENDLER (Aparte): Sr. Presidente, se entendi bem, pode não haver no caso uma relação de antecedente e conse­qüente. O advogado dos recorridos, Dr. Gontijo, focou o ponto: disse que

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 249

não ignora a autorização do juiz. Só que o juiz autorizou uma venda me­diante depósito em estabelecimento bancário para que esse depósito mais tarde se sub-rogasse num outro imóvel mediante fiscalização de uma pes­soa designada por ele, o juiz.

Ao revés, o que teria acontecido também, segundo dito da tribuna, foi que não houve depósito porque o preço foi representado por promissórias. Do ponto de vista em que se coloca pelo menos uma das partes, essa rela­ção não existe; a autorização é que não teria sido observada.

o SR. MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO (Pre­sidente): Mas a sentença de 1'1 grau não é de extinção do processo?

O SR. MINISTRO ARI PARGENDLER: É. Mas a de 22 grau refor­mou e mandou seguir. Então é uma interlocutória.

O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: Como já observei, a reso­lução do Tribunal, após consultas e discussões, foi no sentido de que, tra­tando-se de lei que diz apenas com o procedimento, não interferindo com o direito processual das partes, haveria de aplicar-se desde logo, inclusive aos recursos que já houvessem chegado a esta Corte.

A decisão recorrida rejeitou a preliminar e determinou prosseguisse o processo. Típica decisão interlocutória. O provimento de 12 grau não tinha a mesma natureza. Tratava-se de sentença, pondo fim ao processo. Foi, en­tretanto, substituída pelo que se decidiu em 22 grau. E disso é que se re­corre.

Haveria a examinar um outro ponto. Tenho sustentado que a lei em exame não poderá ser aplicada quando disso resultar o esvaziamento do re­curso, quando o julgamento em fase posterior tornar-se ineficaz. Assim, por exemplo, retardar para após a decisão da causa a apreciação do especial que se refira a tutela antecipada é o mesmo que dizer que ele não será decidi­do. Quando o for, estará prejudicado.

No caso, isso não ocorre. Julgada a causa, o presente recurso, que fi­cara retido, será apreciado como preliminar. Provido, a conseqüência será a extinção do processo, decisão perfeitamente eficaz.

Observo que o tema em questão não está submetido à discrição deste Tribunal, de maneira a que possa desde logo julgar o recurso quando isso lhe parecer conveniente. Só o poderá fazer quando a postergação envolver a perda de objeto do especial, pois isso importaria, última análise, suprimir o recurso, o que à lei ordinária não é dado.

Peço vênia para acolher a preliminar e determinar fique retido o re­curso.

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250 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

PRELIMINAR SUSCITADA

VOTO

O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER: SI. Presidente, no meu

ponto de vista, por ter precedente meu, acho que ambos os ministros têm

razão nessa hipótese, porque o Ministro Nilson Naves deu três fundamen­

tos.

Estou de acordo com o SI. Ministro Eduardo Ribeiro na fundamenta­

ção que S. Ex . .a trouxe, tanto é que mandei separar todos os agravos, fiz uma

minuta de despacho e vou aplicá-la a todos. Há duas sessões, trouxe um

agravo que era de uma decisão interlocutória. O Ministro Eduardo Ribei­

ro, inclusive chamou-me a atenção, perguntando se íamos julgar agravo.

Disse que esse já estava em pauta, já era antigo e julgamos.

Como o Ministro Nilson Naves deu três fundamentos - um é de que

estamos julgando - e eu fui Relator de um caso julgado aqui, acolho esse

terceiro fundamento do Ministro Nilson Naves, já que S. Ex. a pretende o

julgamento de feito que, como o citado, já consta da pauta.

Acompanho o SI. Ministro-Relator, com a devida vênia.

PRELIMINAR

VOTO-VENCIDO

O SR. MINISTRO ARI PARGENDLER: SI. Presidente, minha opi­

nião é a de que os recursos especiais encaminhados ao Tribunal à data da

publicação da lei deveriam seguir seu trâmite normal. A lei fala que o "re­

curso especial já interposto ficará retido nos autos". Ora, só pode ficar re­

tido nos autos aquilo que ainda está na alçada do Tribunal a quo. Se já re­

metidos os autos ao Superior Tribunal de Justiça, a hipótese da retenção é

inviável. O Plenário, todavia, decidiu de modo diferente, e o Presidente até

baixou a Resolução n. 1, de 1999, dando publicidade ao modo como o Tri­

bunal interpreta a lei nova. O texto determina o sobrestamento em hipóte­

ses desta natureza. À vista disso, por mais conveniente que fosse o julgamen­

to agora, acompanho o voto do Ministro Eduardo Ribeiro.

VOTO

O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER: Sr. Presidente, estou de

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 251

acordo com o eminente Sr. Ministro-Relator, pois S. Ex. a colocou em des­

taque a decisão proferida nos embargos infringentes e, lá, o que o Tribunal

falou, talvez não com muita propriedade, assim como colocou aqui o emi­

nente Sr. Ministro Eduardo Ribeiro, foi isso: será a parte ilegítima, em prin­

cípio, admitindo-se haja nulidade? Não foi muito feliz na redação, mas o

que quis dizer foi isso que está escrito: então prossiga-se na ação para de­

cidir essas questões no mérito.

Acompanho o Sr. Ministro-Relator.

VOTO

O SR. MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO: Srs.

Ministros, acompanho também o voto do eminente Ministro-Relator;

estamos simplesmente determinando o retorno dos autos ao Juízo de 1 D.

grau, na linha do julgado de 2D. grau, para que a ação prossiga, sem entrar

no mérito da apreciação das nulidades.

RECURSO ESPECIAL N. 119.466 - MG (Registro n. 97.0010341-2)

Relator: Ministro Ari Pargendler

Recorrente: Ubiratan Pessoa Araújo (espólio)

Advogado: Gilberto Asdrubal Neto

Recorrido: Cláudio Roberto Ribeiro Jardim

Advogado: José Horta Silva de Paula

EMENTA: Civil - Sistema Financeiro da Habitação - Contrato

de gaveta - Morte do promitente-vendedor com a conseqüente qui­

tação do saldo devedor do mútuo hipotecário - Sucessores que se

negam a cumprir o compromisso de compra e venda.

Contrato de gaveta: designação atribuída aos negócios jurídi­

cos de promessa de compra e venda de imóvel realizados sem o

consentimento da instituição de crédito que financiou a aquisição;

sobrevindo a morte do mutuário-promitente-vendedor, os respectivos

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efeitos prevalecelll sobre os do negócio oficial (lllútuO hipotecário e

seguro), sob pena de enriquecilllento selll causa, porque a lllorte do lllutuário-prolllitente-vendedor só teve o efeito de quitar o saldo de­vedor do lllútuO hipotecário, porque o prêlllio de seguro foi pago pelo prolllitente-colllprador. Recurso especial conhecido, lllas não pro­vido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso es­pecial, mas lhe negar provimento. Participaram do julgamento os Srs. Minis­tros Carlos Alberto Menezes Direito, Eduardo Ribeiro e Waldemar Zveiter.

Brasília-DF, 4 de maio de 2000 (data do julgamento).

Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Presidente.

Ministro AR! PARGENDLER, Relator.

Publicado no DI de 19.6.2000.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO ARI PARGENDLER: Cláudio Roberto Ribeiro Jardim propôs "ação de adjudicação compulsória" contra o espólio de Ubiratan Pessoa Araújo (fls. 2/5).

O MM. Juiz de Direito Dr. José Boy de Vasconcellos julgou proceden­te o pedido (fls. 43/50), destacando-se na sentença os seguintes trechos:

"Cogita a espécie sub judice de ação de adjudicação compulsória ajuizada por comprador ou cessionário de imóvel que estava financiado pelo Sistema Financeiro da Habitação, cujo promissário-comprador continuou pagando as prestações, tendo o vendedor ou cedente faleci­do, em virtude de acidente de trânsito, recusando-se o inventariante, ele e sua esposa, pais do finado, em outorgar a escritura definitiva, embora quitado o contrato de compra e venda ou cessão, inclusive, com a transferência do imóvel para a posse do comprador ou cedente, que nele reside, desde a época da compra e venda." (fl. 46).

"Constando do contrato que os sucessores deveriam outorgar a escritura definitiva, era de obrigação indeclinável o cumprimento do

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 253

convencionado pelo espólio (que se compõe apenas dos pais do fale­

cido), sendo de todo irrelevante o fato de ter sido extinto o contrato

de mútuo e quitado o débito pelo falecimento do mutuário e vende­

dor, não havendo de se cogitar em sub-rogação nos direitos do agen­

te financeiro pelos herdeiros, não sendo justo que se exija, como pre­

tende o réu, do cessionário o pagamento do saldo." (fls. 48/49).

A egrégia Quinta Câmara Civil do Tribunal de Alçada do Estado de

Minas Gerais, Relator o eminente Juiz Brandão Teixeira, confirmou a sen­

tença, por maioria de votos, nos termos do acórdão assim ementado:

"Contratos. Compromisso de compra e venda. Imóvel vinculado

ao SFH. Cessão do contrato de financiamento. Morte do cedente.

Obrigação de outorga de escritura. Ocorrendo morte do cedente de

contrato de financiamento vinculado ao SFH, que, além de o haver ce­

dido, recebeu quantia em dinheiro e desvinculou-se do negócio, inclu­

sive outorgando procuração ao pai do comprador para providenciar sua

regularização junto ao agente financeiro e outorgar escritura definitiva,

resta aos sucessores do falecido cumprir o contrato de compromisso de

compra e venda, outorgando a necessária escritura que, em caso de

recusa, deve ser suprida por meio de adequada sentença." (fl. 82).

Seguiram-se embargos infringentes (fls. 97/101), não acolhidos, tam­

bém por maioria de votos (fls. 110/121).

Lê-se no julgado:

"Data venia, as obrigações assumidas no contrato foram de ven­

da e outorga da escritura definitiva do imóvel, não há qualquer con­

dição suspensiva para se operar a transação, tendo o comprador pago

o preço total pactuado pela venda do imóvel.

Ora, se a fatalidade ocorreu, morte do vendedor, tal fato não exi­

me seus sucessores/herdeiros de outorgarem a escritura definitiva, uma

vez que esta condição está expressa no contrato." (fl. 114).

Daí o presente recurso especial, interposto pelo espólio de Ubiratan

Pessoa Araújo, com base no artigo 105, inciso lII, letras a e c, da Consti­

tuição Federal, por violação dos artigos 1.471, 1.473, l.603 e l.606 do

Código Civil (fls. 124/137).

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254 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

VOTO

o SR. MINISTRO ARI PARGENDLER (Relator): Trata-se de um "contrato de gaveta", designação atribuída aos negócios jurídicos de pro­messa de compra e venda de imóvel realizados sem o consentimento da ins­tituição de crédito que financiou a aquisição.

O ajuste foi celebrado mediante pagamento à vista, com quitação plena, obrigando "tanto as partes contratantes como os seus herdeiros e sucesso­res" (cláusula quarta - fl. 8v.).

Sem embargo disso, falecido o promitente-vendedor, os herdeiros não querem cumprir o contrato.

O Tribunal a quo valorizou a relação jurídica constituída pelas par­tes, mas as razões do recurso especial pretendem que o acórdão contrariou os artigos 1.471, 1.473, 1.603 e 1.606 do Código Civil.

Sem razão, porque essas normas legais sequer foram prequestionadas.

O dissenso jurisprudencial, no entanto, está demonstrado, sem que isso, todavia, aproveite ao recorrente.

Os efeitos do compromisso de compra e venda celebrado entre as par­tes se sobrepõem aos do negócio oficial celebrado entre o promitente-vende­dor, a instituição financeira e a empresa seguradora - nesse sentido de que os efeitos da promessa se seguem após os efeitos do contrato de seguro sobre o mútuo hipotecário (= quitação pela morte do mutuário-promitente-vendedor).

Nem poderia ser de outra forma, sob pena de enriquecimento sem cau­sa; o promitente-comprador já se sub-rogara, de fato, nas obrigações do mútuo hipotecário, pagando as respectivas prestações bem assim o prêmio do seguro nelas embutido, de modo que a morte do mutuário-promitente­-vendedor só teve o efeito de quitar o saldo devedor do mútuo hipotecário, porque o prêmio de seguro foi pago pelo promitente-comprador.

Voto, por isso, no sentido de conhecer do recurso especial, negando­-lhe provimento.

Relator:

RECURSO ESPECIAL N. 125.399 - RS (Registro n. 97.0021170-3)

Ministro Eduardo Ribeiro

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Recorrente:

Advogado:

Recorrida:

Advogada:

JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA

Companhia de Fiação e Tecidos Cedro e Cachoeira

Ruy Ribeiro

Fantasy Indústria e Comércio do Vestuário Ltda

Letícia da Cunha

EMENTA: Falência.

255

Não obsta sua decretação, com fundamento no artigo 2.2., I, do Decreto-Lei n. 7.661/1945, a circunstância de o comerciante dispor de ativos que superem seus débitos.

Deve-se, entretanto, recusar interpretação literal ao constante

desse dispositivo. Se feita a nomeação antes do requerimento de fa­lência, ainda que quando já decorrido o prazo legal, não se justifica

a decretação da quebra, com a destruição da empresa. Mais se re­comenda que se prossiga na execução.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos vo­tos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso especial, mas lhe negar provimento. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Waldemar Zveiter, Ari Pargendler, Carlos Alberto Menezes Di­reito e Nilson Naves.

Brasília-DF, 27 de março de 2000 (data do julgamento).

Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Presidente.

Ministro EDUARDO RIBEIRO, Relator.

Publicado no DJ de 12.6.2000.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: Cia. de Fiação e Tecidos Cedro e Cachoeira requereu a decretação de falência de Fantasy Indústria e Comércio do Vestuário Ltda, com fundamento no artigo 2.1'-, I, do Decre­

to-Lei n. 7.661/1945. A requerida apresentou defesa e fez o depósito elisivo.

A sentença rejeitou as preliminares de carência de ação por falta de protesto, por iliquidez do título e de litispendência. No mérito, o pedido da

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autora não foi acolhido, pois considerou a decisão que não estaria "carac­

terizado o estado de insolvência da empresa-ré com base na falta de garantia

do juízo executivo, posto que, embora a mesma tenha oferecido bens à pe­

nhora fora de prazo legal fixado para tanto, demonstrou claramente que

possuía solvabilidade com a apresentação de bens suficientes para assegu­

rarem a satisfação da dívida executada". Afirmou não caracterizada a hipó­

tese prevista no artigo 2':>., l, da Lei de Falências. Por fim, condenou a au­

tora na indenização prevista no artigo 20 do referido diploma legal.

Em suas razões de apelação, a autora diz que a ré, em execução de

sentença, não pagou e nem indicou bens à penhora dentro do prazo legal,

mas fora dele, e que o artigo 656 do CPC dispõe ser ineficaz a penhora,

dando-se por não realizada, quando o credor não concorda com a indica­

ção do bem feita pelo devedor. Alega não ter agido de má-fé e ser o depó­

sito elisivo, ao contrário do que disposto na sentença e constante do pare­

cer do Ministério Público, perfeitamente cabível na hipótese. Prosseguiu,

afirmando não ter tido a intenção de usar a ação de falência como meio de

cobrança e que não seria necessário requerer a extinção da execução, bas­

tando a sua suspensão.

Adotando as razões da sentença, o Tribunal a quo decidiu contraria­

mente à pretensão da autora, sob o argumento de que incompatível o pe­

dido falimentar, com fundamento no artigo 2Q, l, da Lei de Falências, e a

existência de depósito elisivo, ainda mais quando ficou provado nos autos

que a autora tinha conhecimento da existência de bens em nome da ré. O

acórdão está assim ementado:

"Pedido de falência fulcrado no art. 2Q, inc. l, do Decreto-Lei n.

7.661/1945. A indicação de bens à penhora, ainda que intempestiva­

mente e, efetuado depósito elisivo, descaracterizam a insuficiência

patrimonial para pagar o passivo.

Apelo improvido. Possibilidade de a autora obter o crédito na ação

executiva. Sentença confirmada."

Em recurso especial, sustenta a autora que foi violado o artigo 2Q, l,

do Decreto-Lei n. 7.661/1945, uma vez que o acórdão entendeu que a in­

dicação de bens não precisaria ocorrer dentro do prazo legal e que, mes­

mo não reconhecendo a possibilidade de depósito elisivo em procedimen­

to fundado nesse dispositivo, ele seria meio capaz de descaracterizar a in­

solvência do devedor. Afirma que a presunção de insolvência só é afastada

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 257

quando a nomeação de bens à penhora é tempestiva e que a existência do depósito elisivo não torna improcedente o pedido de falência, apenas im­

pedindo que a quebra seja declarada. Alega, ainda, que haveria violação aos

artigos 791 e 794 do CPC, por ser desnecessária a extinção da execução,

bastando a sua suspensão, para ser requerida a falência do devedor. Por fim,

disse não ter havido nem má-fé nem intenção de utilizar o pedido de falên­cia como sucedâneo da ação de cobrança. Apontou dissídio jurisprudencial.

O recurso foi admitido e regularmente processado.

O parecer do Ministério Público é pelo não provimento.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO (Relator): O acórdão recor­rido adotou os fundamentos da sentença.

Primeiro deles foi o de que não caracterizado o estado de insolvência,

uma vez que a devedora ofereceu bens à penhora, ainda que fora do prazo

legal. A isso acrescentou o julgado que a ré demonstrara suficientemente não

se achar em estado falimentar, pois depositara em juízo o valor integral do débito, evidenciando que poderia honrar seus compromissos.

Assinalou-se que a principal razão para negar-se o pedido estava em que a credora não pleiteara a extinção da execução, limitando-se a reque­

rer ficasse suspensa, o que patenteava que sua verdadeira intenção era va­

ler-se do pedido de falência para receber o crédito, tanto assim que acena­ra com a possibilidade do depósito elisivo, inadmissível em casos como o

dos autos. Daí haver concluído a sentença, adotada pelo acórdão, ser "evi­

dente que a demandada possui patrimônio suficiente para satisfazer seu pas­

sivo, restando descaracterizado o estado de insolvência que de maneira abusiva a autora pretendeu imputar à requerida".

A Lei de Falências, cumpre reconhecer, é bastante severa. Assim é que,

em seu artigo l!l., contenta-se com a impontualidade para que seja decreta­

da falência, e impontualidade pode verificar-se, ainda que o devedor dispo­nha de vasto patrimônio. Basta que não exista a liquidez, capaz de propi­ciar-lhe o pagamento dos débitos que se façam exigíveis.

Vale notar que o comerciante que não paga obrigação líquida, em trinta

dias, deverá requerer ao juiz a declaração de sua falência. Não importa que seus bens superem o valor dos débitos. Se não consegue transformá-los em dinheiro e, por isso, não paga a dívida, haverá de confessar a falência.

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258 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

E que a questão não está na posse de patrimônio, capaz de suportar o

pagamento dos débitos, resulta da própria enumeração legal das causas ca­

pazes de elidir o pedido, constantes do artigo 4Q•

No caso em apreciação há, ainda, peculiaridade merecedora de men­

ção. As instâncias ordinárias fizeram carga em relação ao comportamento

da autora, considerando-o abusivo. Entretanto, a ré, que mostrou dispor de

recursos para fazer o depósito, não cuidou de efetuar o pagamento quando

executada. Nem de oferecer o dinheiro à penhora.

Antes de enfrentar o caso específico, que é o de que cuida o artigo 2Q,

I, examino o outro fundamento, consistente em que a requerente não desis­

tiu da execução, mas apenas pediu a suspensão do processo, o que mostra­

ria ser sua verdadeira intenção obter o pagamento.

Com a devida vênia, tenho como sem relevo esse fato. Já decidiu este

Tribunal que é dado ao credor, que intentara a execução, limitar-se a pe­

dir sua suspensão, quando requeira a falência do devedor. Nesse sentido os

julgamentos proferidos a propósito dos Recursos Especiais n. 6.782 e

146.648. Compreende-se. Pode seu pedido não ser acolhido e ser-Ihe-á dado

prosseguir com a execução. E não é censurável que o credor tenha o pro­

pósito de receber o que lhe é devido.

Também se me afigura destituída de significação a circunstância de a

inicial haver feito referência a depósito elisivo, pois se alinha com corren­

te jurisprudencial que se vem firmando, como salientado no especial. Se o

pedido, última análise, vincula-se a determinado débito, objeto da execução,

razoável admitir-se que, feito o depósito da respectiva importância, não mais

se decrete a quebra.

A questão posta, a meu ver, reside em saber se deve ser decretada a

falência, quando essa é requerida após a nomeação de bens à penhora, ain­

da que essa se faça quando decorrido o prazo legal. Entendida a lei em sua

estrita literalidade, a resposta poderia ser afirmativa. Considero, entretan­

to, que se há de introduzir um temperamento. O executado que não paga,

nem indica bens à penhora, supõe-se falido, é o que resulta da lei. Se, en­

tretanto, faz a indicação, ainda que após o decurso do prazo, seria excessi­

vamente rigoroso e de manifesta inconveniência decretar-lhe a quebra. Isso

ocorrendo, a nomeação devolve-se ao exeqüente. Esse poderá indicar outros

ou aceitar os que já o foram, ainda que além do prazo, prosseguindo-se na

execução, sem que seja necessário destruir-se a empresa, do que não resul­

taria vantagem para ninguém.

RSTI, Brasília, a. 12, (134): 231-329, outubro 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 259

Entendo que, por esse motivo, a decisão há de ser mantida. Observo que estaria, talvez, a merecer revisão a parte do decisório que impôs con­

denação à ora recorrente, nos termos do artigo 20 da Lei de Falências. Dis­so, entretanto, não cuida o especial.

Conheço, em virtude do dissídio, mas nego provimento ao recurso, pelas razões expostas.

RECURSO ESPECIAL N. 127.748 - CE (Registro n. 97.0025781-9)

Relator:

Recorrente:

Advogados:

Recorrido:

Advogado:

Ministro Antônio de Pádua Ribeiro

Companhia Brasileira de Estruturas Metálicas - Cibresme

Luís Itamar Pessoa e outro

Banco do Estado do Ceará S/A - BEC

Miguel Thomaz de Oliveira e outros

EMENTA: Processual Civil - Restauração de autos - Honorá­rios advocatícios - Condenação - CPC, art. 460.

I - O acórdão recorrido, ao aplicar, em feito relativo à restau­ração de autos, o princípio da sucumbência em razão do caráter li­tigioso que assumiu por oposição do requerido, não decidiu ultra

nem extra petita, não violando, por isso mesmo, o art. 460 do CPC.

II - Recurso especial não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima

indicadas, decide a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na con­formidade dos votos e das notas taquigráficas anexas, por unanimidade, não

conhecer do recurso nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Partici­

param do julgamento os Srs. Ministros Eduardo Ribeiro, Waldemar Zveiter

e Ari Pargendler. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito.

Brasília-DF, 23 de maio de 2000 (data do julgamento).

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260 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Ministro ARI PARGENDLER, Presidente.

Ministro ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO, Relator.

Publicado no DI de 26.6.2000.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO: Decidiu o

acórdão recorrido na consonância da seguinte ementa (fl. 147):

"Restauração de autos. Havendo oposição, que assume caráter li­tigioso, cabível é a condenação do vencido nos ônus da sucumbência,

por força do disposto no art. 20, CPC, independente de pedido expres­so."

Alega a vencida, após manifestar embargos declaratórios, que foram

rejeitados, em recurso especial fundado na letra a do permissivo constitu­

cional, ofensa ao art. 460 do CPC.

Regularmente processado, o recurso foi admitido (fls. 169/170), subin­

do os autos a esta Corte, onde me vieram distribuídos.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO (Relator): Ao

julgar a apelação, aduziu o acórdão recorrido (fl. 148):

"Sem dúvida que a condenação não foi pedida na inicial. Contu­

do, tendo sido a ré vencida na oposição feita, para retardar o andamen­

to do processo restauratório, em fazendo exigência descabida, impõe­-se sua condenação nos ônus da sucumbência. Tal condenação independe de pedido expresso, face ao disposto no art. 20 do CPC, que

impõe imperativamente a condenação do vencido nas despesas proces­

suais e nos honorários advocatícios.

Vencida na oposição feita, que foi desconsiderada, bem procedeu o MM. Juiz impondo a condenação, por se achar caracterizado o lití­

gio, sendo o fundamento da imposição do ônus o fato objetivo da der­

rota (Revista dos Tribunais, vol. 591, p. 140)."

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 261

Ao condenar, no caso, ao pagamento da verba advocatícia, o aresto re­

corrido não decidiu ultra ou extra petita. Com efeito, limitou-se a apli­

car o princípio da sucumbência. Por isso mesmo, não vejo como divisar ofen­

sa ao art. 460 do CPC.

Posto isso, não conheço do recurso.

RECURSO ESPECIAL N. 130.434 - RJ (Registro n. 97.0030896-0)

Relator: Ministro Waldemar Zveiter

Recorrente: Montecristo Engenharia Ltda

Advogados: Fernando Freitas Pereira e outros

Recorrida: Bozano Simonsen Leasing S/A - Arrendamento Mercantil

Advogados: Guilherme Henrique Magaldi Netto e outros

Sustentação oral: Jorge Castang (pela recorrida)

EMENTA: Contrato de leasing - Reajuste - Taxas divulgadas

pela Anbid - Ilicitude - Súmula n. 176-STJ.

1. Nos termos da Súmula n. 176-STJ, é ilícita a cláusula con­

tratual que estabelece a aplicação de encargos financeiros à taxa

divulgada pela Associação Nacional dos Bancos de Investimento e

Desenvolvimento - Anbid, por ficar ao arbítrio de uma das partes

contratantes. Precedentes da Corte.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da

Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos vo­

tos e das notas taquigráficas a seguir, prosseguindo no julgamento, após o

voto-vista do Sr. Ministro Eduardo Ribeiro, a Turma, por unanimidade, co­

nhecer do recurso especial e dar-lhe provimento. Participaram do julgamen­

to os Srs. Ministros Carlos Alberto Menezes Direito, Paulo Costa Leite,

Nilson Naves e Eduardo Ribeiro. Não participou do julgamento o Sr. Mi­nistro Ari Pargendler (2, art. 162, RISTJ).

RSTJ, Brasília, a. 12, (134): 231-329, outubro 2000.

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262 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE]USTIÇA

Brasília-DF, 3 de dezembro de 1999 (data do julgamento).

Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Presidente.

Ministro WALDEMAR ZVEITER, Relator.

Publicado no DI de 26.6.2000.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER: O presente recurso es­pecial provém de quatro ações relativas a contrato de arrendamento mer­cantil (leasing) entre Montecristo Engenharia Ltda e Bozano Simonsen Leasing S/A - Arrendamento Mercantil, envolvendo um caminhão com carro ceria.

A Montecristo Engenharia ajuizou cautelar inominada, visando o de­pósito em juízo das contraprestações relativas aos quatro últimos meses (ja­neiro a abril de 1991), mais o valor residual (opção de compra), mediante atualização com base nos índices oficiais (BTNF, TR), alegando excessi­vidade nos reajustes que, de acordo com cláusulas contratuais, vinham sendo efetuados pelas taxas flutuantes divulgadas pela Associação Nacional dos Bancos de Investimento e Desenvolvimento - Anbid.

Ajuizou, também, ação ordinária, pleiteando a revisão e modificação do contrato, para que fosse reconhecida a nulidade das mencionadas cláu­sulas, que reputou abusivas.

Já a Bozano Simonsen aforou reintegração de posse, visando reaver o caminhão arrendado, bem como execução, ao escopo de receber o débito vencido.

No Juízo monocrático houve julgamento neste sentido (fl. 298):

"1 Q julgo procedentes - em parte - a medida cautelar inominada (Pr. n. 18.177/1991), confirmada a liminar de depósito de segurança e ação ordinária (Pr. n. 18.423), decretada a nulidade parcial das cláu­sulas que adotaram a taxa Anbid para reajuste das contraprestações (parcelas do preço), quitadas as prestações depositadas, de acordo com os índices oficiais (BTNF, TR) e condenada a ré à devolução das di­ferenças cobradas a maior, por seus valores históricos, atualizados à

data do ajuizamento (arts. 1 Q e 2!l, Lei n. 6.899/1981).

2Q julgo procedentes os pleitos na reintegração de posse leasing (Pr. n. 19.406) e nula, porque inviável a execução (Pr. n. 19.492)."

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 263

Autora e ré apelaram.

A autora pretendendo que os valores, cujo direito à devolução lhe fora reconhecido na sentença, fossem atualizados a partir da data do efetivo pa­

gamento e não do ajuizamento da ação respectiva, e a ré pugnando pelo re­

conhecimento da licitude e validade das cláusulas, cuja nulidade fora decre­tada pela sentença, com conseqüente procedência das suas ações reintegra­

tória e de execução.

A Terceira Câmara Cível do egrégio Tribunal de Justiça do Estado do

Rio de Janeiro, à unanimidade, deu provimento à apelação da Bozano Simonsen. Reformou a sentença e julgou improcedentes os pedidos formu­lados na cautelar e na ação ordinária da Montecristo Engenharia, cassan­do a liminar de depósito de segurança e considerando legítimas as cláusu­las tidas como nulas, pela sentença. Julgou procedente a reintegração de

posse e determinou o prosseguimento da execução da Bozano Simonsen.

O recurso da autora, por conseguinte, foi julgado prejudicado, ense­

jando o especial, com fundamento nas alíneas a e c, III, do art. 105, da Constituição Federal, e sob a argüição de que o decisuIll diverge das Súmulas n. 43-STJ e 121-STF, bem como de outras decisões desta Corte, malferindo o Decreto-Lei n. 22.626/1933 (arts. 4.12 e 11); os arts. 115, 145, II e V, e 964, do Código Civil; e o art. 20 do Código de Processo Civil.

Oferecidas as contra-razões (fls. 482/508) o especial foi admitido, con­forme decisão de fls. 520/524.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER (Relator): É ver como restou ementado o acórdão recorrido (fls. 398/400):

"Ordinária. Contrato de leasing. Taxa Anbid adotada como forma

principal de cálculo de atualização das contraprestações do arrenda­

mento mercantil. Cabimento. Capitalização de juros (anatocismo) que se tem por afastada. Repetição de indébito. Enriquecimento sem cau­

sa. Incorrência. Compatibilização das posições clausulares com normas

de ordem pública. Ausência de potestividade pura. Força obrigatória

da livre estipulação. Validade dos contratos impressos. Código de De­

fesa do Consumidor. Inaplicação retroativa. Reforma da sentença. Im­procedência dos pedidos da arrendatária. Procedência dos pleitos da

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arrendadora. Provimento do segundo apelo. Prejudicado o primeiro

recurso.

o leasing, por ser um contrato complexo e, na sua essência, eXI­

bir uma operação financeira de longo prazo, está sujeito a legislação

especial e se submete ao controle normativo do ente estatal próprio,

o Banco Central do Brasil, que autorizava a realização dessa modali­

dade operacional com base em taxas flutuantes (variáveis), reajustadas

em períodos fixos, desde que tivesse prazo igualou superior a 180

(cento e oitenta) dias (Resolução n. 1.143, de 26.6.1986, inciso lU, le­

tra b), posto que, antes, como agora, face a proibição de operar com

recursos próprios, o arrendamento mercantil somente se viabiliza com

a captação no mercado financeiro, pela empresa arrendadora, dos re­

cursos inerentes a aquisição do bem a ser entregue ao arrendatário, a

quem são repassados os custos daí oriundos, os quais não se confun­

dem com o spread, que é o ganho do contrato.

Assim, não ofende a estrutura do contrato de leasing, nem traduz

majoração de seu spread, a adoção da taxa da Anbid (Associação Na­

cional dos Bancos de Investimento e Desenvolvimento) como forma

principal de cálculo pactuada para atualização das contraprestações do

arrendamento mercantil, em moeda nacional, porquanto a flutuação

dessa taxa, além de retratar os juros de capitação e integrar o meca­

nismo de repasse a que se vincula a celebração do próprio contrato,

também não representa capitalização de juros (juros sobre juros), a

evidenciar anatocismo, já que não constitui ganho da arrendadora.

Em conseqüência, afastada fica a figura do enriquecimento sem

causa da arrendadora, a impor repetição pelo excesso (CC, art. 964),

visto que inocorreu pagamento de quantias a maior, sendo certo que

o arrendatário pagou o que sabia dever era devido pela causa jurídica

preexistente, ou seja, o vínculo contratual, onde houve livre estipula­

ção e as disposições clausulares se compatibilizam com normas de or­

dem pública e não são daquelas puramente potestativas ou arbitrárias

(CC, art. 115), porque não se outorgou a uma das partes o direito ex­

clusivo de livremente elaborar a taxa de atualização adotada para as

contraprestações, o que torna os contratantes submissos ao pactuado

em todas as suas conseqüências, em razão de mostrar-se o ato jurídi­

co perfeito e intocável, sob o manto, pois, do princípio do pacta sunt servanda, ressaltando-se, ainda, que, embora de adesão, não se pode

negar validade aos contratos impressos de arrendamento mercantil, cujo

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 265

rigor de certas estipulações é necessário ao seu fim, além do que é de

se presumir que a aceitação resultou da análise do ato negociaI.

Nas hipóteses de contratos de arrendamento mercantil, como tem

entendido a doutrina e a jurisprudência, não se pode cogitar da apli­

cação do Código de Defesa do Consumidor, porquanto não se inclu­

em tais avenças nas relações de consumo que mereçam a proteção dessa

norma, ainda mais quando celebrados anteriormente, face o preceito

constitucional da irretroatividade das leis (artigo 5Q., inciso XXXVI).

Reforma da sentença monocrática, dando-se pela improcedência

dos pedidos da arrendatária e pela procedência dos pleitos da arren­

dadora."

Tal entendimento colide com sedimentada jurisprudência desta Corte,

segundo a qual, nos termos da Súmula n. 176, ilícita é a cláusula contratual

que prevê a aplicação de encargos financeiros com base nos índices divul­

gados pela Anbid, tendo em vista a natureza potestativa desta cláusula, em

afronta aos princípios insertos no art. 115 do Código Civil, j á que direcio­

nada à defesa dos interesses das instituições de crédito.

Nesse sentido, dentre outros, os REsps n. 43.618-SP, relatado pelo

Ministro Nilson Naves, DJ de 22.4.1997, e 102.292-RJ, relatado pelo Mi­

nistro Menezes Direito, DJ de 24.3.1997, em que se cuidou de idêntica hi­

pótese de contrato de arrendamento mercantil (leasing), originário este úl­

timo do mesmo órgão julgador que prolatou o aresto ora recorrido.

Com razão, portanto, a recorrente, quando propugna pela prevalência

da sentença de fls. 292/298, que declarou a nulidade das questionadas cláu­

sulas e determinou a devolução dos valores pagos a mais, na forma do dis­

posto no art. 964 do Código Civil, confirmando o depósito das prestações

restantes, mediante correção pelos índices oficiais.

Impende notar, todavia, que, com esta solução, resta a ser dirimida a

questão relativa ao termo inicial da correção monetária dos valores, a cuja

devolução faz jus a recorrente, vez que a egrégia Corte de 2Q. grau teve por

prejudicada a apelação que versava sobre tal tema e, no momento, inviável

se torna o pronunciamento desta Corte, a respeito, para que não haja supres­

são de instância.

Em tal contexto, e inobstante a admiração que nutro pelo talento e

pela cultura dos eminentes Senhores Desembargadores que prolataram o

aresto impugnado, conheço do recurso, em face do dissídio comprovado, e

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266 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

lhe dou provimento parcial, para cassar o acórdão objurgado e restabelecer a sentença, exceto quanto à supracitada questão inerente ao termo inicial da correção monetária dos valores a serem devolvidos à recorrente, que deve­

rá ser examinada pelo Tribunal, competente para julgar sua apelação.

É o meu voto.

VOTO-VISTA

O SR. MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO: Ação ordinária, distribuída por dependência a uma cautelar, alcançando

contrato de arrendamento mercantil, mais uma ação de reintegração de posse e uma execução. O juiz julgou procedente, em parte, a cautelar e a ordiná­ria, "decretada a nulidade parcial das cláusulas que adotaram a taxa Anbid para reajuste das contraprestações (parcelas do preço), quitadas as presta­ções depositadas, de acordo com os índices oficiais (BTNF, TR) e conde­nada a ré à devolução das diferenças cobradas a maior, por seus valores his­tóricos, atualizados à data do ajuizamento (arts. 12 e 22 , Lei n. 6.899/

1981)", improcedente a reintegração e nula a execução. O Tribunal de Jus­tiça do Rio de Janeiro reformou a sentença para "julgar improcedentes os pedidos contidos na ação cautelar (Proc. n. 18.177/1991), cassada a liminar de depósito de segurança, e na ação ordinária (Proc. n. 18.423/1991), e jul­gar procedente o pleito formulado na ação de reintegração de posse (Proc. n. 19.406/1991), determinando-se, ainda, o prosseguimento da execução (Proc. n. 19.492/1991), invertidos os ônus sucumbenciais, e condenado a primeira apelante em honorários advocatícios de 10% (dez por cento) dos valores atualizados das quatro causas, ao tempo em que julga-se prejudicado

o primeiro recurso, tudo nos termos do voto do Relator".

O eminente Ministro Waldemar Zveiter, Relator, conheceu e proveu o especial, restabelecendo a sentença, "exceto quanto à supracitada questão inerente ao termo inicial da correção monetária dos valores a serem devol­vidos à recorrente, que deverá ser examinada pelo Tribunal, competente para

julgar sua apelação".

Como visto, a questão principal está na possibilidade de ser utilizada

a taxa Anbid, que, segundo o acórdão recorrido, como destacado na emen­

ta, "não ofende a estrutura do contrato de leasing, nem traduz majoração de seu spread, a adoção da taxa da Anbid (Associação Nacional dos Bancos de Investimento e Desenvolvimento) como forma principal de cálculo pactuada para atualização das contraprestações do arrendamento mercantil, em moeda

nacional, portanto a flutuação dessa taxa, além de retratar os juros de

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 267

captação e integrar o mecanismo de repasse a que se vincula a celebração do próprio contrato, também não representa capitalização de juros (juros sobre juros), a evidenciar anatocismo, já que não constitui ganho da arren­dadora".

A decisão do Tribunal de origem, com o alentado acórdão do eminente

Desembargador Eduardo Duarte, esbarra na pacífica jurisprudência da Cor­te, consolidada na Súmula n. 176, como bem posto no voto do Sr. Minis­tro Waldemar Zveiter, que tem por ilícita "cláusula contratual que prevê a aplicação de encargos financeiros com base nos índices divulgados pela Anbid, tendo em vista a natureza potestativa desta cláusula, em afronta aos princípios insertos no art. 115 do Código Civil, já que direcionada à defe­sa dos interesses das instituições de crédito". Lembrou o eminente Relator precedente de que fui Relator, cuidando, igualmente, de contrato de leasing.

Nessa parte, portanto, a posição do recorrente não tem sustentação alguma.

No excelente memorial que me foi distribuído, bem assim na susten­tação oral, demonstra o recorrente a sua preocupação no que concerne ao índice que se terá de definir para substituir a denominada taxa Anbid. Se­gundo o recorrente, como escrito no memorial, "não caberia simplesmen­te adotar índice de correção monetária em seu lugar, devendo-se respeitar o sistema de cálculo das contraprestações baseado em taxas flutuantes, que

tem expresso assento em lei, tal como são o CDI (Certificado de Depósito Interbancário), a TBF (Taxa Básica Financeira), a TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo) e mesmo a TR, desde que aplicada sem o seu redutor".

O arrendamento mercantil, como escreve Arnoldo Wald, é um contrato "misto, pelo qual um financiador adquire e aluga a uma empresa bens de equipamento ou de uso profissional, móveis ou imóveis, a prazo longo ou médio, facultando-se ao locatário a aquisição dos mesmos pelo preço resi­dual". Mostra o ilustre civilista que o pagamento do aluguel, quase sem­pre mensal, e a correção monetária são cláusulas usuais do contrato (Curso de Direito Civil, Obrigações e Contratos, RT, 1211. ed., p. 472).

O pagamento do aluguel no contrato de leasing, como é curial, é cal­culado de forma a garantir a amortização e os custos do financiamento. Na verdade, no leasing cuida-se mais de uma prestação de tipo especial, uma remuneração, não sendo pura e simplesmente um aluguel, diante das carac­terísticas próprias do leasing, que diferem do simples contrato de locação. Essa razão mesma é que torna a prestação no arrendamento mercantil ser, em regra, mais alta. Melhor dizendo, a fixação inicial da prestação no con­trato de que cuida o presente feito leva em conta determinados fatores que

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268 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

são inerentes ao contrato, como vimos, vale repetir, assim a amortização e

os custos do financiamento.

Essa peculiaridade do contrato, todavia, com todo o respeito aos ilus­

tres advogados do recorrente, está confinada ao momento da fixação da prestação, que, então, será atualizada por um dos índices existentes no mer­

cado para tal fim.

Ainda recentemente, nosso colega, o Sr. Ministro José Delgado, pu­

blicou monografia sobre o tema, em que destacou, invocando trabalho de

Roberto Rosas, dever o cálculo final incluir todas as despesas feitas pela

Financiadora na soma total, "sobre que incidirão os juros acordados e a correção monetária, se for o caso. Se a correção monetária for a taxa fixa,

não há problema. Se for por índices variáveis, é necessário um aditivo

contratual específico para esse item" (Leasing - Doutrina e Jurisprudência,

Juruá, 1997, p. 114).

De fato, uma vez feita a fixação do valor da prestação, com os ingre­

dientes próprios do contrato especial, a correção monetária vai corresponder

a uma atualização da prestação no tempo, o que pode ser aferido pelos ín­

dices disponíveis no mercado financeiro, não sendo incompatível a adoção

de correção à taxa fixa.

Vale lembrar precedente desta Corte, de que foi Relator o Sr. Minis­

tro Dias Trindade, acolhendo-se cláusula de correção pela variação da OTN

(REsp n. 4.705-MG, DJ de 4.9.1991).

Lembrou o voto do Sr. Ministro Waldemar Zveiter no precedente de

que fui Relator, pelo qual em situação em tudo semelhante, ficou assenta­

do ser inaplicável a taxa Anbid, limitando-se o julgado a conhecer e pro­

ver o especial para afastar a taxa aplicada, com esteio na Súmula n. 176 da

Corte (REsp n. 1 02. 992-RJ, DJ de 24.3.1997).

Neste caso, a sentença, restabelecida pelo voto do Sr. Ministro

Waldemar Zveiter, considerou quitadas as prestações depositadas de acor­

do com os índices oficiais (BTNF, TR), niio malferindo nem a estrutura do contrato de leasing nem a natureza da correção monetária, simples atuali­

zação das prestações avençadas. Fixa ou móvel, no caso, a atualização mo­

netária está vinculada ao valor fixado para as prestações, estas sim pactua­

das de acordo com as peculiaridades do contrato de leasing, e que levam na

devida conta o valor da amortização e os custos do financiamento.

Com essas razões, eu conheço do especial e lhe dou provimento, na

linha do voto do eminente Ministro Waldemar Zveiter.

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 269

VOTO-VISTA

o SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: No que diz com a utiliza­ção da taxa Anbid, já manifestei, em diversas oportunidades, minha

discordância com a orientação que veio a prevalecer no Tribunal. Não pro­feri voto no julgamento do REsp n. 44.847, em que a Segunda Seção con­solidou o entendimento que se contém na Súmula n. 176, uma vez que no exercício da presidência daquele colegiado. Se o fizesse, teria aderido ao único voto-vencido. Considero que não é caso de aplicação do artigo 115

do Código Civil, uma vez que não se trata de condição. E não há potes­tividade pura, única que é proibida. As taxas são cobradas consoante o mer­cado.

Na hipótese em exame, a matéria foi muito bem discutida, pelas par­tes e no acórdão. A leitura dessas peças reforçou meu entendimento. Vale ressaltar o ponto, colocado no memorial, da impossibilidade ou, pelo me­nos, da enorme inconveniência de os contratos de longo prazo, feitos com instituições financeiras, se valerem de taxas fixas de juros, sabido que, em nosso país, variam com alguma freqüência. Uma das partes sairia prejudi­cada, pois, consoante a flutuação, pagaria, em determinado momento, taxas maiores ou menores do que as adotadas pelo mercado.

Abstenho-me, entretanto, de maiores considerações sobre a matéria, pois não vislumbro esteja o Tribunal inclinado a reexaminar a jurisprudência já firmada.

Insiste o recorrido em que, afastada a taxa Anbid, outra haveria de ser

fixada. Ocorre que isso não é possível. Anulada aquela que foi contratada, não é possível adotar-se outra que a resultante de lei. Não é dado a esta Corte nele inserir cláusula à revelia das partes.

Ressalvando meu ponto de vista pessoal, acompanho o Relator.

Relator:

Recorrente:

Advogados:

RECURSO ESPECIAL N. 135.355 - SP (Registro n. 97.0039607-0)

Ministro Eduardo Ribeiro

Banco Itaú S/A

Luís Antônio Giampaulo Sarro e outros

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270 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Recorrida: Iracema Paes de Abreu

Advogados: Rosa Benites Pellicani e outro

EMENTA: Execução - Processo de conhecimento em que se in­

tenta desconstituir o título executivo.

Em curso processo de execução, não há impedimento a que seja

ajuizada ação, tendente a desconstituir o título em que aquela se

fundamenta.

Inexistência de preclusão, que essa opera dentro do processo,

não atingindo outros que possam ser instaurados, o que é próprio

da coisa julgada material.

Carecendo a ação da eficácia própria dos embargos, a execução

prosseguirá, salvo se, em cautelar, for outorgado efeito suspensivo.

Julgada procedente a ação, extingue-se a execução. Se a senten­

ça sobrevier ao exaurimento da execução, abrir-se-á ao executado a

possibilidade de, mediante ação condenatória, reaver o que houver

pago indevidamente.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da

Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos vo­

tos e das notas taquigráficas a seguir, por maioria, vencido o Sr. Ministro

Carlos Alberto Menezes Direito, conhecer do recurso especial, mas lhe ne­

gar provimento. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Waldemar

Zveiter, Ari Pargendler e Carlos Alberto Menezes Direito.

Brasília-DF,4 de abril de 2000 (data do julgamento).

Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Presidente.

Ministro EDUARDO RIBEIRO, Relator.

Publicado no DJ de 19.6.2000.

RELATÓRIO

° SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: Trata-se de ação, propos­

ta por Iracema Paes de Abreu, visando a declaração de ineficácia e não

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 271

exigibilidade de título executivo, em que credor o Banco Itaú de Investi­mento S/A, bem como a inexistência de relação jurídica entre as partes. A

sentença acolheu a preliminar de carência de ação, tendo em vista proces­so de execução em curso, relativo ao mesmo título.

O Tribunal de Alçada de São Paulo deu provimento à apelação, em acórdão assim ementado:

"Declaratória. Falsidade. Cambial. Nota promissória. Inexis­

tência de impedimento ao ajuizamento da ação declaratória de falsi­

dade de título executivo, ainda que a questão pudesse ser levantada em sede de embargos à execução. Carência de ação afastada. Recurso pro­

vido para esse fim."

Manifesta a instituição financeira recurso especial, alegando violação ao artigo 267, VI, do Código de Processo Civil. Traz arestos para compro­

var dissídio jurisprudencial. Sustenta que a recorrida é carecedora do direito de ação, por impossibilidade jurídica do pedido. Assevera que, regularmente intimada a devedora da penhora nos autos da execução, não a embargou.

Foi o especial admitido, na origem.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO (Relator): A questão posta no recurso diz com a possibilidade do ajuizamento de ação, visando a

desconstituir o título extrajudicial em que se funda execução em curso. Ex­tinto o processo, em 1 Jl grau, por entender-se inviável a ação, já que a pre­

tensão haveria de ser deduzida em embargos, foi provido o recurso da au­tora.

A matéria ainda não se pacificou na jurisprudência, encontrando-se

julgados em um e outro sentido. Na doutrina pátria, tem preponderado en­tendimento coincidente com o do acórdão recorrido.

Deste Tribunal, especificamente sobre o tema, localizei dois julgamen­tos. O primeiro refere-se ao Agravo Regimental no Agravo de Instrumento

n. 8.089, de que Relator o Ministro Athos Carneiro (DJ de 20.5.1991). De

sua ementa se lê:

"Inocorre preclusão, e portanto a validade e eficácia do título

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272 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

executivo extrajudicial podem ser objeto de posterior ação de conhe­

cimento, quando na execução não foram opostos embargos do devedor,

e igualmente quando tais embargos, embora opostos, não foram rece­

bidos ou apreciados em seu mérito."

No mesmo sentido, o REsp n. 9.401, de que Relator o Ministro Pe­

çanha Martins (DJ de 25.10.1993), esse dizendo com execução fiscal.

A colenda Quarta Turma proferiu outros julgados, tratando de maté­

ria que guarda alguma similitude com a ora em exame, mas que apresenta

relevantíssima peculiaridade. Em todos eles se tratava de ação declaratória

incidental em execução não embargada. Ora, a declaração incidente supõe

que o réu conteste o direito que constitui fundamento do pedido, o que só

se pode verificar havendo processo de conhecimento. Essas decisões foram

proferidas nos Recursos Especiais n. 24.240, 12.633 e 1l.528. Não cuida­

ram, em verdade, do tema em debate.

A matéria foi aflorada, nesta Terceira Turma, ao ser apreciado o REsp

n. 162.517 (DJ de 1. 7 .1999). Cuidava-se, entretanto, de processo de conhe­

cimento instaurado antes do ajuizamento da execução e não se questiona­

va, obviamente, sobre sua viabilidade, que era indiscutível, mas se deveria

acarretar a suspensão da execução. Naquela oportunidade cheguei a afirmar

que não se poderia "admitir a ação depois de vencido o prazo para os em­

bargos" .

A assertiva não relevava, entretanto, para a decisão da causa, pois,

como assinalado, a ação fora proposta antes. Convocado, agora, a pronun­

ciar-me sobre o ponto, reestudei a matéria e convenci-me do desacerto da

afirmação que fiz naquela oportunidade.

Peço vênia para algumas observações, para bem situar o tema.

Acima de qualquer dúvida pode o credor ajuizar execução, ainda que

penda processo em que o pretenso devedor postule a desconstituição do tí­

tulo. Assim já era antes mesmo da alteração introduzida pela Lei n. 8.953/

1994 no § 1 il do artigo 585, dispositivo a rigor desnecessário, mas que, re­

ferindo-se apenas ao débito fiscal, ensejava alguma hesitação na jurisprudên­

CIa. O texto em vigor é expresso, não propiciando qualquer divergência.

Em curso o processo de conhecimento, em que se impugna o título e,

com base nesse, intentada a execução, não há cogitar de conexão. Essa não

pode existir, dada a completa diversidade de objetos e da reunião de pro­

cessos, para julgamento simultâneo, não há cogitar, pelo fato mesmo de não

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 273

haver julgamento na execução, salvo para extingui-la, por algum vício, ou

por ter-se satisfeito o direito do credor.

Surge a dificuldade quando se cuida de saber se o devedor haverá de

oferecer embargos.

Ser-Ihe-á dado fazer, sem dúvida, se fundados em causa de pedir di­

versa da que foi deduzida no anterior processo de conhecimento. Assim é

que pode suceder se tenha pedido declaração de falsidade do título e, em

embargos, se alegue compensação, para o caso de não ser reconhecido o

falsulll.

o problema se apresenta quando não houver outro fundamento.

Tenho como certo que haveria litispendência, pois estaria sendo nova­

mente ajuizada a mesma demanda. Não me convenci da procedência da ob­

jeção de Sérgio Shilllura, ao assinalar "que o pedido nos embargos, por

envolver a desconstrição dos bens, se distancia daquele formulado na deman­

da autônoma" (Título Executivo, Saraiva, 1997, p. 354). O desfazimento da

penhora pode ser considerado efeito natural da sentença de procedência dos

embargos. Trata-se de conseqüência processual que disso decorre necessa­

riamente, pois, desconstituído o título, extingue-se a execução, não haven­

do mais cogitar de penhora. Não precisa integrar o pedido.

Persisto no entendimento de que a melhor solução é a que foi dada por

esta Turma, ao apreciar o REsp n. 33.000 (DJ de 26.9.1994), cuja ementa

é a seguinte:

"Execução. Título extrajudicial. Ação declaratória, precedente­

mente ajuizada, objetivando a anulação total ou parcial do título.

Ajuizada ação tendente a desconstituir o título em que veio a se

fundar a execução, não se pode exigir sejam apresentados embargos

com o mesmo objetivo, o que, aliás, sequer seria possível, pois have­

ria litispendência. A solução está em, garantido o juízo, tratar-se a ação

em curso como embargos, com as conseqüências daí decorrentes."

Bastaria que o executado formulasse petição, dando notícia da existên­

cia da ação e, quando muito, pedindo que como embargos fosse considerada.

Nesse sentido a opinião de Dinamarco, em voto no PTribunal de Alçada

Civil de São Paulo, segundo informa Gil Trotta Telles (Propositura de Ação

Declaratória Negativa Depois de Ajuizada Execução de Título Extrajudicial,

in Ajuris n. 55, p. 107).

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274 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Seria despropositado exigir-se o ajuizamento de embargos, reprodu­zindo demanda anteriormente ajuizada. Como, entretanto, desses resultam a suspensão da execução, para obter tal efeito haverá o executado de peti­cionar ao juízo da execução.

A situação em exame, entretanto, é outra, pois proposta a ação após exausto o prazo de embargos.

Das pesquisas que me foi dado fazer só encontrei, afirmando a impos­sibilidade da ação, no Direito brasileiro, a opinião de Cahnon de Passos, aliás, invocada no especial. Vale transcrever o trecho em que a expõe:

"E o inverso, vale dizer, já ajuizada a ação de cobrança ou a exe­cução pelo título extrajudicial, pode o devedor propor ação declara­tória negativa da existência do crédito? A resposta é negativa. E por motivo simples: quem pede condenação pede, implicitamente, declara­ção da existência da dívida, que é condição indispensável à procedência da ação. Por outro lado, a defesa do réu contém, implícita, a preten­são à declaração da inexistência do direito do autor. Por conseguinte, a declaratória que viesse a ser ajuizada teria seu objeto já totalmente absorvido pelo da ação condenatória precedente." (Comentários ao CPC, Forense, vol. IH, 8il. ed., p. 267).

Vê-se que, em realidade, tratou-se apenas da impossibilidade de ajui­zar-se ação declaratória, se já pendente a condenatória a respeito do mes­mo débito, o que é incontestável. Tudo que o autor da declaratória pudes­se por meio dela obter, já alcançaria com a improcedência da condenatória. Aquele eminente processualista mencionou a execução por título extraju­dicial, mas a argumentação apresentada refere-se, apenas, a precedente pro­cesso de conhecimento. A observação foi feita por Trotta Telles, no traba­lho citado, salientando que, em execução, "não se pede condenação nem há, propriamente, defesa".

Parece-me que melhor tratar-se, de logo, de hipótese mais abrangente, qual seja a viabilidade jurídica do pleito formulado após encerrar-se a exe­cução, com o pagamento do credor.

Na doutrina italiana, lembra José Rogério Cruz e Tucci, a questão só

se coloca quando dessa hipótese se cuida, uma vez que, no direito peninsu­lar, a opposizione all'esecuzione pode ser oferecida enquanto não exaurido o procedimento, não estando sujeita a preclusão (Tutela Processual do Direi­to do Executado, in Ajuris n. 61, p. 107). A divergência tem sido acirrada, embora a tendência mais atual seja por admitir-se o ajuizamento da ação).

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Doutrinadores dos mais respeitáveis, a começar de Carnelutti,

posicionaram-se contrariamente, como se vê do relato do trabalho já cita­

do de Rogério Cruz e Tucci, bem como de Hum.berto Theodoro Jr. (Pro­

cesso de Execução - Universitária de Direito, 190. ed., p.p. 495 e seguintes).

Embora não haja falar em coisa julgada, impeditiva de ulterior ação do

executado, haveria preclusão pro judicato, capaz de assegurar a estabili­

dade dos efeitos da execução. Em outras palavras, embora não exista coisa

julgada, os efeitos práticos da execução, que levasse à satisfação do pretenso

direito do credor, teria conseqüências até mais drásticas do que as resultan­

tes daquela. É que a sentença transitada em julgado se expõe à rescisória,

em certas circunstâncias, o que não seria possível ocorrer com a que se li­

mitasse a declarar extinta a execução.

A melhor doutrina, entretanto, parece estar com aqueles outros proces­

sualistas que sustentam a outra tese, entre eles Garbagnati, Allorio, Satta

e Liebm.an (ap. Hum.berto Theodoro, ob. cit.).

Preclusão é fenômeno que opera dentro do processo, não se projetan­

do para fora, de modo a atingir outros que possam ser instaurados. Quan­

do isso ocorre, tem-se a coisa julgada material, inexistente no caso. Não se

pode admitir que, sem haver pronunciamento jurisdicional sobre a existên­

cia do direito, os efeitos decorrentes da execução se tornem imutáveis. Con­

sagrar-se-ia o enriquecimento indevido, embora nenhuma norma exista a

impedir o desfazimento daqueles efeitos. Norma existe dispondo em con­

trário, como salienta Hum.berto Theodoro, ao indicar a constante do ar­

tigo 964 do Código Civil. Isso sem falar no princípio que veda o enrique­

cimento sem causa, não consagrado explicitamente, mas que, indiscutivel­

mente, informa o ordenamento, refletindo-se em diversos dispositivos.

Por certo que essa solução apresenta inconveniente sério. A estabilidade

dos efeitos da execução é, até certo ponto, desejável. Alguém que haja pro­

movido a execução de um título e recebido o crédito por ele representado

ficará exposto, eventualmente até por vinte anos, a ser compelido à repo­

sição. Daí a observação do tantas vezes citado Hum.berto Theodoro, de que

recomendável fosse a matéria regulada por lei, prevendo-se ação especial,

com prazo de decadência não muito grande. Em termos de direito positi­

vo, não vejo que outra possa ser a solução.

Mais uma observação. A possibilidade de o executado movimentar

ação, tendente a obter de volta o bem de que despojado, não significa que

o processo de execução seja nulo. Esse não se desfaz. Desse modo, se tiver

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276 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

ocorrido arrematação, o arrematante não será atingido. A demanda alcan­

çará apenas o credor, para que reponha o que houver recebido indevida­

mente.

Se assim entendo, tratando-se de execução exaurida, com maior razão

tenho como admissível a propositura da ação quando aquela se acha em

curso.

Dir-se-á que isso significa não haver mais prazo para os embargos,

já que o pleito, tendente a desconstituir o título, é admissível a qualquer tempo. Não é bem assim. Os embargos têm o efeito específico de sus­

pender a execução, o que não se verifica com a ação de que se cogita. Os

dois processos correrão paralelamente. Acaso vencedor o executado, no

processo de conhecimento, será extinta a execução, se ainda em curso. Já

encerrada, haverá de propor outra ação para obter condenação de que

\ resulte reaver, na medida do possível, o que perdeu.

Conheço do recurso, em virtude do dissídio, mas nego-lhe provimento.

VOTO-VISTA

O SR. MINISTRO AR! PARGENDLER: A matéria sub judice já foi

decidida pelo Supremo Tribunal Federal, no RE n. 93.014-SP, Relator o

eminente Ministro Soares Muii.oz, que transcreveu no respectivo voto a se­

guinte manifestação da Procuradoria Geral da República, da lavra do ilus­

tre Procurador Moacir Antonio Machado:

"Se a execução fiscal não é embargada, o despacho que determina o seu prosseguimento, em atenção ao disposto no art. 680 do Código

de Processo, não envolve o exame da legitimidade da exigência, no

que se refere à relação jurídica de que se originou o crédito. É certo

que essa legitimidade se presume, em virtude do próprio caráter de li­quidez e certeza da dívida inscrita, mas a inexistência de embargos em

nada altera a relatividade dessa presunção.

Se não houve pronunciamento jurisdicional sobre o llleritulll

causae, inadmissível extrair do despacho que ordena a avaliação efi­

cácia de coisa julgada sobre a relação de direito material deduzida em

juízo. O Código de Processo, aliás, em seu art. 468 é expresso a res­

peito, circunscrevendo os efeitos da coisa julgada à sentença final, que

decidiu a lide: 'A sentença que julgar total ou parcialmente a lide tem

força de lei nos limites da lide e das questões decididas'.

RSTI, Brasília, a. 12, (134): 231-329, outubro 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 277

o despacho proferido nos termos do art. 680 da Lei Processual,

em caso de decisão não embargada, é resolução sobre pretensão pro­

cessual relativa à execução forçada, mas não abrange o mérito da re­

lação de direito material que deu causa à execução.

Tanto isso é certo que, nas execuções de sentença, a eficácia e

autoridade da coisa julgada, quanto à relação de direito material, emer­

ge da própria decisão exeqüenda, nunca do despacho, que, diante da

inexistência de embargos, determina a avaliação.

O despacho relativo à execução não embargada, proferido nos

termos do art. 680 do Código de Processo Civil, tem eficácia limita­

da, portanto, à pretensão processual pertinente à execução forçada.

Anulado, porém, o título executório, em outra ação, é evidente que se

torna insubsistente a execução, mesmo porque a legitimidade da co­

brança é suposto necessário do processo executivo.

Exata, portanto, esta ponderação de José Alberto dos Reis,

transcrita no acórdão recorrido: 'É ilegal a atividade exercida pelo exe­

qüente e pelos órgãos executivos, no processo de execução, quando o

título que lhe serve de base não tem força executiva; e o juiz não pode

permitir-se nem permitir o exercício de uma atividade ilegal' (Processo

de Execução, n. 57, p. 192).

Efetivamente, não embargada a execução de título extrajudicial,

segue-se a avaliação, sem que seja proferida sentença, razão por que

não se pode falar em coisa julgada relativamente à ação anulatória do

lançamento fiscal." (RTJ n. 99, p.p. 1.311/1.312).

Por isso, também voto no sentido de conhecer do recurso especial, ne­

gando-lhe provimento.

VOTO-VISTA

O SR. MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO: A

recorrente ajuizou ação ordinária de ineficácia e inexigibilidade de título

executivo extrajudicial e de inexistência de relação jurídica. Alega que o réu

promove ação de execução por quantia certa contra devedor solvente, figu­

rando a autora como ré, ao lado de Thau Produtos Químicos e Farmacêu­

ticos Ltda e de Cesarina Ottini; que a pretensão executiva está baseada em

nota promissória vinculada a contrato; que o contrato foi celebrado entre

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o réu e a empresa Thau; que a assinatura atribuída à autora é falsa. A sen­

tença extinguiu o processo sem julgamento do mérito (art. 267, VI, do Có­digo de Processo Civil). Para a sentença, na execução não cabe a decla­

ratória porque o executado tem os embargos de declaração. O P!.Tribunal de Alçada Civil de São Paulo proveu o recurso considerando que não exis­te impedimento legal para o ajuizamento de declaratória de falsidade de

título executivo, ainda que pudesse o tema ser ventilado nos embargos à execução.

O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro, Relator, conheceu do recurso e lhe negou provimento, sendo acompanhado pelos Srs. Ministros Waldemar Zveiter e Ari Pargendler. Para o Sr. Ministro Eduardo Ribeiro, revendo anterior voto que proferiu quando do julgamento do REsp n. 162.517-RS, publicado no DI de l.7.1999, "não há impedimento a que seja ajuizada ação, tendente a desconstituir o título em que aquela se fundamenta", não havendo preclusão porque "essa opera dentro do processo, não atingindo outros que possam ser instaurados, o que é próprio da coisa julgada material".

Em voto-vista, o Sr. Ministro Ari Pargendler, lembrou precedente do

Supremo Tribunal Federal, Relator o Sr. Ministro Soares Munoz, para acompanhar o Relator.

Como salientado no voto do Sr. Ministro Eduardo Ribeiro, a matéria não é pacífica.

A possibilidade do ajuizamento da ação de conhecimento antes ou du­

rante o prazo para a apresentação dos embargos, não creio que possa ser obstada. Mas, tenho fundada dúvida sobre a admissibilidade da ação após o vencimento do prazo para os embargos.

Como bem posto por Humberto Theodoro Júnior, a questão está em saber se, encerrado o processo executivo, mesmo sem decisão valorativa sobre o crédito do exeqüente e sua satisfação judicial coativa, ou seja, es­

gotado o prazo dos embargos sem que o executado tenha dele feito uso, se­ria possível discutir o mérito da legitimidade do pagamento forçado, em futuras ações de cognição (Processo de Execução, LEUD, 13.a ed., 1989, p.

445).

Humberto Theodoro Júnior sufraga, com muito vigor, a tese espo­sada pelo eminente Relator, mostrando as correntes que se enfrentam. Após

afastar a existência da coisa julgada, considera que a denominada "preclusão pro iudicato" não tem base jurídica "no que se relaciona com os efeitos que se pretende outorgar à execução não tempestivamente embargada" (cit., p.

468), e afirma que mesmo quem cumpre "voluntariamente um pagamento

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 279

indevido, tem assegurado o direito de repetir o que pagou por erro (Códi­go Civil, art. 965). Por que, então, idêntico direito não deve a fortiori ser reconhecido ao executado diante do credor que realizou coativamente o seu pretenso crédito mediante expropriação de bens de quem, na verdade, não devia a prestação?" (cit., p. 462).

Compreendendo bem as razões apontadas pelos defensores da corrente que admite o ajuizamento da ação após o decurso do prazo para os embar­gos, peço vênia para divergir.

O sistema do Código é para garantir o processo de execução com a preservação do devido processo legal. O fim da execução, assevera José Alberto Reis, repousado em lições de Carnelutti, "consiste, como já te­mos assinalado, em obter para o exeqüente precisamente aquele benefício que lhe traria o cumprimento da obrigação por parte do devedor ou, se isto não é possível, ao menos um benefício equivalente", sendo certo que a "exe­cução supõe um acto ilicito ou a lesão de um direito e visa a reparar essa lesão" (Processo de Execução, Coimbra Ed., Portugal, voI. 1, 1985, p. 23). Por isso mesmo, o processo de execução tem rito especial, célere que já ago­ra, diferentemente do que ocorria antes do Código de 1973, não mais con­sagra a distinção entre a ação executória, baseada em sentença condenatória, e ação executiva, baseada em título extrajudicial. O que se quis foi preser­var o pagamento coativo da dívida líquida e certa. O rito especial agasalha a possibilidade de defesa, seja por meio dos embargos, seja, até mesmo, pela denominada exceção de pré-executividade. Com relação aos embargos, o Código estabeleceu prazos próprios. Com isso, encerrada a execução está consolidada a estabilidade do processo executivo com a satisfação do cre­dor. Admitir a repetição do indébito equivale, a meu sentir, a renovar no tempo a possibilidade de impugnação da execução. E, com isso, prolongar­-se a insegurança jurídica.

Desse modo, com todo respeito ao voto do eminente Relator, eu co­nheço do especial e lhe dou provimento para restabelecer a sentença.

Relator:

Recorrente:

RECURSO ESPECIAL N. 141.602 - SP (Registro n. 97.0051738-1)

Ministro Nilson Naves

Companhia Agrícola Nova América

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280 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Advogados: Luiz Carlos Bettiol e outros

Recorridos: Theodora Duarte Ribeiro e outros

Advogados: José Eduardo Rangel de Alckmin e outro

Sustentação oral: Luiz Carlos Bettiol (pelo recorrente) e José Augusto Alckmin (pelo recorrido)

EMENTA: Parceria agrícola (plantio de cana-de-açúcar) - Des­conto a título de impurezas (nulidade da cláusula) - Ação de co­brança.

1. Sentença (falta de fundamentos). Questão não devolvida ao conhecimento do Tribunal. Além do que, à sentença não faltaram fundamentos. 2. Mérito da demanda. Matéria de fato, porque se de­cidiu à luz do laudo pericial. Ora "A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial" (Súmula n. 7). 3. Lei n. 4.870/ 1965, Código Comercial, Código de Processo Civil e Decreto-Lei n. 486/1969. Temas não prequestionados. Súmulas n. 282, 356-STF e 211-STJ. 4. Juros compensatórios. Sua concessão não ofendeu o art. 1.061 do Código Civil, pois o que se definiu foi a justa compensação, à qual não hão de faltar os compensatórios. 5. Recurso especial não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos vo­tos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do re­curso especial. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Eduardo Ri­beiro, Waldemar Zveiter, Ari Pargendler e Carlos Alberto Menezes Direito.

Brasília-DF, 16 de setembro de 1999 (data do julgamento).

Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Presidente.

Ministro NILSON NAVES, Relator.

Publicado no DJ de 22.11.1999.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO NILSON NAVES: No 2QTribunal de Alçada Ci­vil, a ação de cobrança ajuizada pelos ora recorridos foi assim relatada:

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 281

"Parceiros outorgantes, em face de contrato de parceria agríco­

la, que celebraram co'a parceira outorgada, visam, através da fluente

ação de cobrança, a haver dessa, conforme de começo postulado, o 'pa­

gamento da quantia correspondente a 219.426,938 toneladas de cana­

-de-açúcar, ao preço do dia do efetivo e final pagamento, acrescido dos

juros, a partir da citação inicial da ré para a ação declaratória' (fls. 2/

15).

A r. sentença julgou procedente a ação (fls. 1.821/1.836).

Duplo reclamo, a tempo, se interpôs: o principal, da ré, reiterando

agravo retido, que houvera interposto, e pleiteando se coloque a pro­cedência decretada, sob alcance mínimo, reduzindo-a, pois, ou então,

convertendo-se o julgamento em diligência (fls. 1.837/1.878). Houve

resposta (fls. 1.881/1.896). E o adesivo, dos autores, buscando o condenamento da ré, também em juros moratórios e compensatórios

(fls. 1.897/1.906). Ofertadas as contra-razões (fls. 1.908/1.916).

Anotados os preparos (fls. 1.919/1.921)."

Ali, acolheu-se em parte o agravo retido, reduzindo-se "os honorários de aludido jurisperito para a metade do que foi arbitrado", negou-se pro­

vimento à apelação da ré mas deu-se provimento ao recurso adesivo dos

autores, "deferidos os juros moratórios e compensatórios, conforme apura­

ção do perito".

Rejeitados os embargos de declaração, a ré ingressou com especial,

fundado na alínea a, porém não se admitiu o recurso, nos termos segum­

tes:

" alega a recorrente que o venerando acórdão ofendeu os arti­

gos 11, §§ 1'\ 3'\ 6!l., 7!l. e 51, da Lei n. 4.870/1965; 23 do Ato n. 13/ 1983 do IAA; 1.061 do Código Civil; 19, 23, lI, IlI, do Código Co­

mercial; 8!l. do Decreto-Lei n. 486/1969; 20,125, 128,335,359, 382,

379, 458, lI, e 460, do Código de Processo Civil. Em breve síntese,

reclama da inaplicabilidade das leis referentes à lavoura canavieira no caso sub judice, da condenação em juros compensatórios, sem que

houvesse pedido da parte, cumulativamente aos moratórios, da falta de

exibição dos livros do comerciante por ocasião da elaboração do lau­

do pericial, aduzindo que in casu, a alegada recusa na exibição de li­vros e assentos comerciais foi dirimida pelo perito, apesar de ser de­

fesa a delegação pelo magistrado de poderes decisórios. Insurge-se

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282 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

contra a fixação de verba a ser paga também ao perito engenheiro, uma vez que o seu trabalho foi considerado imprestável em anterior

acórdão, dada a falta de qualificação técnica para o fim a que se des­tinava a prova pericial (perícia contábil) e, por fim, entende que ca­

rece a decisão hostilizada dos devidos fundamentos.

Afastada da controvérsia a alegação de afronta ao artigo 23 do Ato n. 13/1983 do IAA, dispositivo que não possui caráter de lei federal

(art. 105, IlI, a, da Magna Carta), bem como a apontada ofensa ao ar­tigo 458, lI, da lei processual civil, posto que, como salientado em sede de embargos de declaração, no venerando aresto da apelação estão pre­

sentes as razões do convencimento da Turma Julgadora, 'inexistindo na

lei obrigação de trazer a lume fundamentação convincente a quem so­mente aceita a própria tese sustentada, quando contrariada por julga­mento desfavorável' (sic fl. 2.011), observo que a petição recursal re­

vela, tão-somente o inconformismo da recorrente com o desfecho da demanda que teve por fundamento o substrato fático e probatório dos

autos, cujo revolvimento está obstado no patamar deste apelo (Súmula

n. 7 do STJ)."

Dei provimento ao agravo e ordenei subissem os autos principais.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO NILSON NAVES (Relator): A ação de cobrança destes autos fora precedida de ação declaratória na qual se entendera, com

trânsito em julgado, nulo e de nenhum efeito o desconto a título de impu­

rezas, daí que aqui, nesta ação de cobrança, considerou-se, na sentença, que "Diante da força indestrutível desse comando legal, a própria requerida admitiu em contestação que não havia legitimidade para proceder o descon­

to que tinha feito. Assim, no tocante a essa verba, a requerida é confessa, restando apenas a discussão sobre a sua exata quantificação". De tal dis­

cussão resultou, para o magistrado, segundo suas conclusões, o acolhimento

do laudo pericial, verbis: "Em conclusão, por tudo o que consta dos autos,

dos esclarecimentos complementares do perito, adota-se o laudo pericial

como critério para apuração dos valores devidos a título do desconto ile­

gal de impurezas, ágios sobre o teor 'de sacarose e participação no estoque,

esta última verba atacada com veemência pela requerida, embora reconhe­

cida na ação declaratória".

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 283

Pois a ré, nas atuais razões do pedido de reforma da decisão recorri­

da, atribui defeito à sentença, faltando-lhe, segundo ela alega, o requisito

dos fundamentos, verbi gratia, (I) "A sentença, com a devida vênia, se res­

sente de fundamentação e essa inexiste no julgado recorrido", (lI) "No caso

dos autos verificamos que o magistrado passa 'pela rama do problema da

sacarose"', (III) "É um pecado seríssimo o de deixar de fundamentar uma

decisão com a admissão da validade de um dogma absurdo qual seja o:

peritus dixit", (IV) "Isto ofende fundo o contido no art. 458, lI, que de­

termina que o magistrado fundamente a decisão".

Mas tudo indica que tal alegação não foi levada ao conhecimento do

Tribunal local, haja vista as conclusões do acórdão da apelação, nos termos

seguintes:

"Em suma, não obstante as alongadas e alentadas razões re­

cursais, ofertadas pela ré, a verdade é que sua insurgência, contra a

r. sentença, suas diatribes contra o perito, sem razão alguma, não se

impuseram, desmerecendo, pois, acatamento, inclusive, no pleito à

conversão do julgamento em diligência, posto que, às claras, pro­

crastinatório. O certo e evidente, pois, é que a r. sentença recorrida,

por haver bem apreciado todas as questões, que se lhe antepuseram,

não merece o reparo, que a apelante lhe pleiteia se faça. Há que ser

mantida, de conseguinte, inclusive, na condenação decorrente do

sucumbimento."

Aliás, nem por ocasião dos embargos de declaração foi a questão sus­

citada. Portanto, questão não prequestionada. No entanto, desse mal não

padeceu a sentença, a cujo texto não faltaram os requisitos aludidos no art.

458, bem assim de tal mal não padece o acórdão, afigurando-se-me exatos

os esclarecimentos prestados por ocasião do julgamento dos declaratórios,

nestes termos:

"Com efeito, o v. julgado contém todos os fundamentos fáticos e

jurídicos necessários para justificar a reforma parcial da r. decisão

monocrática, reduzindo em 50% do valor do salário fixado ao perito

engenheiro, e mantidos os demais elementos levantados na contestação,

memorial de fls. l.789/l.819 e no recurso de fls. 1.837/l.878, diante

das provas constantes nos autos, bem como em face do julgamento an­

terior de ação declaratória.

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284 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

De qualquer modo, a egrégia Sexta Câmara, em momento algum deixou de respeitar o exigido pela legislação processual em vigor, de­

monstrando estar atenta ao fixar e manter a condenação da ora embar­gante, presentes os elementos constantes no processo, e a bem elabo­rada prova periciaL.."

Se a recorrente, no que tange aos fundamentos das decisões ordiná­rias, carece de razão, é de ver que também se lhe não abrem as portas do especial quanto ao mérito da demanda, seja em decorrência da anterior ação declaratória, seja porque, pelo visto, "O deslinde da questão está cir­cunscrito na prova pericial levada a efeito", donde vir a pêlo a Súmula n. 7, consoante a qual "A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial".

No atinente à Lei n. 4.870/1965, ao Código Comercial, ao Código de Processo Civil e ao Decreto-Lei n. 486/1969, hão de vir à baila as Súmulas n. 282, 356-STF e 211-STJ. Nesse contexto, reputo irrepreensível o des­pacho local, transcrito no relatório.

Relativamente aos juros compensatórios, indica-se contrariedade ao art. 1.061 do Código Civil, isso porque a sua concessão, segundo a recorrente, "numa relação contratual de direito privado, se constitui em desrespeito ao dispositivo referido". No acórdão, foi dito o seguinte: "Os juros compen­satórios destinam-se a evitar que a ré venha a locupletar-se, indevidamente, posto que não recebeu o rendimento que se lhe devia, a saber, os frutos da parceria. E são devidos esses juros, ante o que se vem de explicitar, desde a oportunidade, em que deixou de receber tais frutos".

Ora, em assim sendo, não se tratou da referida norma. Além do mais, porque nela se reza que as perdas e danos consistem nos juros da mora e

custas, tanto não impede que, no caso sob exame, deferissem-se juros com­pensatórios, pois o que se procurou evitar foi o enriquecimento ilícito, daí a justa compensação, à qual não hão de faltar os compensatórios, visto que, já se disse, "compensar quer exprimir equilibrar, indenizar, ressarcir". Foi em tal sentido que se apelou da sentença, verbis: "Acresça-se, no que respeita os juros compensatórios, o seu caráter de rendimento civil da coisa, ou seja, re­presentam os frutos civis, evitando-se assim o locupletamento ilícito ou o enriquecimento sem causa da apelada, conceituação essa diversa da de juros

moratórios que representam mero ressarcimento pelo atraso no pagamento do preço contratado". Correto, portanto - se relevada a falta de prequestio­

namento -, apresenta-se-me o acórdão, acolhendo os motivos da apelação.

Do exposto, não conheço do recurso especial.

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 285

VOTO

O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER: Sr. Presidente, a ques­

tão não foi prequestionada. Como o eminente Ministro Eduardo Ribeiro

explicitou o conteúdo do acórdão está contido na ementa, que tanto reve­

la, por isso acompanho o voto do eminente Ministro-Relator.

RECURSO ESPECIAL N. 150.326 - ES (Registro n. 97.0070500-5)

Relator:

Recorrentes:

Advogados:

Recorridos:

Advogados:

Sustentação oral:

Ministro Nilson Naves

Maria Celi Sandoval Chiappane e outro

Luiz Renato Gastin dos Santos e outro

Construtora Marcílio Judiei Ltda e outros

Deirdre de Aquino Neiva e outros

Patrícia Henrique Amaro (pela recorrida)

EMENTA: Recurso especial (cabimento) - Embargos de declara­

ção (falta) - Prequestionamento (necessidade) - Ato de julgamento.

1. O especial pressupõe o exame da questão federal pelo acór­dão que se quer reformar. Portanto, é pressuposto do cabimento do

recurso. 2. Ainda que se trate de defeito do próprio ato de julgamen­to, não se dispensa o prequestionamento. Em caso tal, é de rigor a oposição de embargos de declaração. Precedentes da Corte Especial

do STJ: EREsps n. 8.285 e 99.796, DJs de 9.11.1998 e 4.10.1999. Re­

curso especial não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da

Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos vo­

tos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do

recurso especial. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Eduardo Ribeiro, Ari Pargendler e Carlos Alberto Menezes Direito. Ausente, justifi­

cadamente, o Sr. Ministro Waldemar Zveiter.

RST}, Brasília, a. 12, (134): 231-329, outubro 2000.

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286 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Brasília-DF, 14 de setembro de 1999 (data do julgamento).

Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Presidente.

Ministro NILSON NAVES, Relator.

Publicado no DI de 21.2.2000.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO NILSON NAVES: Trata-se de ações de consigna­ção em pagamento e de rescisão de promessa de venda de apartamento cumulada com reintegração e perdas e danos (em que houve reconvenção), julgadas procedentes, pela sentença, a consignação e a reconvenção, e o juiz extinguiu o processo da rescisão, sem julgamento de mérito. Pelo acórdão, no entanto, deu-se provimento à apelação das construtoras, conclusivamente:

"Face o exposto, dou provimento parcial ao recurso, reconhecen­do a mora do devedor. Porém, julgo improcedente o pedido de resci­

são do contrato cumulado com reintegração de posse, resguardando o direito do apelante receber pela via própria as diferenças apuradas en­

tre o valor efetivamente devido e o pago, haja vista que quando do re­cebimento das promissórias, o credor não demonstrou interesse em rescindir o contrato, pelo contrário, utilizou-se dos valores recebidos, dizendo que se reservava no direito de exigir a complementação, da correção monetária.

Como não houve pagamento integral do montante devido, julgo improcedente a reconvenção, bem como a consignatória, condenando o consignante nas custas processuais e em honorários advocatícios, que arbitro em 15 % do valor consignado."

Foi o especial interposto pelos promitentes-compradores, indicando

error in procedendo, porquanto (I) "O julgamento do recurso de apela­ção ocorreu sem a presença do desembargador-revisor, anteriormente vin­culado ao feito", (lI) "No entanto, o julgamento ocorreu sem a sua presen­ça, após vinculado ao feito de forma inexorável, sem que se cuidasse da ex­

ceção prevista no § 3Q• Não há nos autos declaração de impedimento ou de

suspeição de Sua Excelência", (IlI) "Recebido o presente recurso especial, o mesmo merece inteiro provimento, pois cediça está a nulidade do julga­do, uma vez desrespeitadas as normas dos arts. 551, caput, § 2Q

, e 555, do CPC, conforme fundamentação supra".

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 287

Pelo despacho de fi. 343, "Trata-se de questão federal surgida apenas no acórdão, o que dispensa a interposição de embargos declaratórios para

efeito de prequestionamento. Quanto ao mais, observados foram os outros

requisitos de admissibilidade do apelo. Por esses fundamentos, dou segui­mento ao recurso".

É o relatório.

VOTO

o SR. MINISTRO NILSON NAVES (Relator): Como se viu, os re­

correntes, sem lhe oporem embargos de declaração, argúem de nulo o acórdão da apelação. Entendem que o Superior Tribunal pode conhecer da

matéria suscitada, já que, aqui entre nós,

" ... se decidiu pela admissão do prequestionamento implícito, ad

instar do julgamento do Agravo Regimental no Agravo de Instrumento

n. 4.007-PR, relatado pelo Ministro Sálvio de Figueiredo. O mesmo

se estabeleceu nos julgamentos dos REsps n. 1.957-MT e 444-RJ, am­

bos relatados pelo Ministro Athos Carneiro, amenizando-se o rigor da

Súmula n. 282 do STF, editada sob o ordenamento constitucional an­

terior.

O caso dos autos é sui generis, pois a nulidade apontada, além

de absoluta, por contrariedade e ofensa a textos de normas de ordem

pública, decorreu o próprio julgamento. Sobre esse pormenor, o Mi­

nistro Eduardo Ribeiro, no julgamento do REsp n. 3.409-AL, mesmo

defendendo a necessidade de prequestionamento, reconheceu a sua dis­

pensa sob o seguinte argumento: 'Mesmo as nulidades absolutas não

poderão ser examinadas no especial se a matéria pertinente não foi, de

qualquer modo, cogitada pelo acórdão recorrido, excetuando-se ape­

nas aquelas que decorram do próprio julgamento'.

A presente hipótese pode ser equiparada, para efeito de admissibi­

lidade do recurso especial, àquela onde haja o recurso por parte do

litisconsorte necessário não citado para ação.

O Superior Tribunal de Justiça já se expressou sobre o tema, a saber: ... "

Indicaram julgados da relatoria dos Ministros Assis Toledo, Athos Car­

neiro e Cláudio Santos, um deles assim ementado: "Se a questão federal

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288 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

surge apenas no acórdão recorrido, sem que as partes a tenham discutido

ou provocado, não se exige prequestionamento ou interposição de embar­

gos declaratórios para abertura da via do recurso especial" (REsp n. 39.733,

DJ de 25.4.1994).

Sucede, no entanto, que a Corte Especial adotou orientação diferen­

te, como se vê pela ementa dos EREsp n. 8.285: "Processual Civil. Recurso

especial. Prequestionamento. Necessidade. Questão federal. É necessária a

interposição de embargos de declaração para se obter o prequestionamento,

possibilitando a abertura da via especial, mesmo que a questão federal te­

nha surgido somente no julgamento perante a Corte de origem. Embargos

rejeitados" (Ministro Garcia Vieira, DJ de 9.11.1998). Eis o voto que pro­

feri naquela ocasião (em alguns casos, pareceram-me dispensáveis os em­

bargos):

"Ao que penso, inexiste dissenso quanto a que se não prescinde

do prequestionamento. De sua necessidade, aqui no Superior Tribunal

todos nós melhor sabemos como ninguém. Malgrado não se duvide tra­

tar-se de requisito imprescindível, sem dúvida que há dissenso quan­

to à sua exata noção, ou ao seu perfeito alcance, quem sabe porque se

revela, conforme bem anotou o Ministro Eduardo Ribeiro, 'muitas ve­

zes árdua a tarefa de verificar se concretamente houve o prequestiona­

mento'.

'O prequestionamento como pressuposto do cabimento do recurso

extraordinário', disse o Ministro Victor Nunes, num dos acórdãos que

servem de referência à Súmula n. 282-STF, 'era expressamente men­

cionado nas Constituições de 1891, art. 59, HI, a; de 1934, art. 76, HI,

a; de 1937, art. 101, IH, a, não tendo sido conservada a redação an­

terior na Constituição de 1946. Entretanto, essa mudança de redação

é irrelevante para desate do problema em face, conforme tem decidi­

do, reiteradamente, o Supremo Tribunal' (RE n. 46.882, de 9.11.1962,

assim ementado: 'Indispensável o prequestionamento para se conhecer

do recurso extraordinário').

Nem a Constituição de 1967 nem a de 1988 também emprega­

ram o verbo questionar, utilizado que foi pelas Constituições de 1891,

1934 e 1937 ('quando se questionar sobre a validade, ou a aplicação

de tratados e leis federais, e a decisão do tribunal do Estado for con­

tra ela', conforme o art. 59, § P', alínea a, da Constituição de 1891),

isto, entretanto, não impediu entre nós se exigisse o que sempre em

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 289

outros sistemas jurídicos foi exigido, por exemplo, pelo direito nor­te-americano, de onde se originou o nosso recurso extraordinário. Veja­

se o que, a propósito da origem e cabimento lá e cá do recurso, escre­

veram João Barbalho e Matos Peixoto:

- 'c. Para que caiba este recurso, é necessário que a ques­

tão que o provoca tenha sido efetivamente agitada em processo

movido perante as Justiças Estaduais e lá tenha sido julgada: não basta que tal questão se possa ou pudesse suscitar naquella ordem judiciaria. Isto é expresso no Judiciary Act, a que mais de uma vez nos temos referido como a origem remota do nosso recurso: ... ' (Constituição ... , 1924, p. 59).

- 'Mas, para se admittir o recurso, é preciso constar dos au­tos, expressamente ou por indução clara e necessaria, que a ques­tão federal haja surgido e tenha sido julgada na Côrte Estadual.

Não basta que pudesse perante ella ser suscitada (22). Portanto, essa questão virá fora de tempo, quando levantada somente na

petição do writ of errar.' (Recurso Extraordinário, 1935, p. 98).

E também Thom.as Cooley, in Princípios Gerais de Direito Constitucional, Revista dos Tribunais, 1982, p. 132: ' ... deve surgir no próprio registro (record), expressamente ou por efeito de interpreta­

ção, clara e necessária que surja em um tribunal estadual, e que assim sirva de base no julgado, ... '. Numa opinião antiga, de 1894, no caso

California Powder Works v. Davis, já dizia o Chief Justice Fuller, Melville Weston, 1888/1910 (em tradução livre): ' ... deve aparecer inequivocamente, além de ter sido a questão federal submetida à de­cisão de mais alta Corte Estadual competente, que tal decisão tenha sido necessária ... ' (in United States Reports, vol. 151, Cases Adjudged

in The Supreme Court, 1894, p.p. 389/396).

Num acórdão de 1983 em que se examinava a alegação de incons­titucionalidade do Verbete n. 282 da Súmula do Supremo Tribunal, o

Sr. Ministro Alfredo Buzaid teve a oportunidade de amplamente rever as doutrinas brasileira, norte-americana, argentina e alemã, e de seu voto recolho o seguinte tópico:

'7. O Código de Processo Civil da República Federal da Alemanha preceitua no § 561, I: 'A corte de revisão só julgará as

alegações das partes que constem da sentença de apelação ou do

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290 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

protocolo'. Comentando esta regra legal, ensinam Stein-lonas­-Schõnke que ela dispõe para a instância da revisão dois prin­cípios fundamentais: 1-'"-) a limitação da matéria do processo ao fato declarado em apelação, pelo que é excluída nova alegação da espécie de fato; 2-'"-) e ainda a vinculação à declaração do fato do tribunal de apelação reservada a uma violação da lei de que foi causa. Estes princípios não são apenas uma dedução do § 549, mas também complemento independente do mesmo parágrafo ... ' (ERE n. 96.802 - AgRg, in RTJ 109/299/304).

Em 1963, o Supremo Tribunal compendiou em sua Súmula a ju­

risprudência que assentara a propósito do prequestionamento, e a lume vieram naquela ocasião os verbetes de números 282 e 356, que o Su­perior Tribunal vem aplicando desde a sua instalação em 1989. Efeti­vamente, o Superior Tribunal também jamais deixou de entender que o recurso especial também é inadmissível, 'Quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada', ou que o ponto omis­so aqui igualmente não pode ser objeto do especial, quando não foram oportunamente interpostos embargos de declaração. Mas aqui entre nós há acórdãos que admitiram o chamado prequestionamento implícito, distinguindo duas espécies de prequestionamento, e neste Tribunal igualmente existem julgados relevando o pressuposto de cabimento, em casos em que a questão federal somente surgiu no acórdão recorrido. Aliás, tal dispensa do prequestionamento, segundo os votos já profe­ridos, é a matéria dos presentes embargos de divergência, tanto que no caso em exame se está admitindo a indicada divergência, pois os em­bargos estão sendo conhecidos.

Dos tribunais aos quais a Constituição de 1988 cometeu a juris­dição extraordinária (tribunais que dispõem sobre a questão jurídica), o Tribunal Superior Eleitoral talvez seja, conforme a minha experiên­cia, o mais condescendente com o prequestionamento. Contam alguns que isto se deve à natureza das questões lá suscitadas e decididas, mas contam outros, entre os quais me incluo, que não se justifica a condes­cendência. A matéria eleitoral em termos de matéria sujeita à instân­cia extraordinária não é diferente das outras.

'O meu pensamento - permitam-me insistir -,' disse o Ministro

Xavier Albuquerque em 1977, no Supremo Tribunal, em alocução que se calha e se ajusta ao tema ora em discussão, 'é o de que, quando o defeito reside no próprio ato de julgamento, não precisa estar pre­

questionado' (RE n. 86.344, RTJ 87/266). 'Todavia, no caso em que

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 291

haja defeito no ato mesmo de julgamento do caso no Tribunal a quo',

também disse o Ministro Antonio Neder em 1981, 'defeito produzido

pela Secretaria da Casa e ignorado pelas partes, é de se relevar o re­

quisito do prequestionamento. Precedentes do STF sobre o assunto:

RTJ 87/265-6; RTJ 93/449' (RE n. 75.357, RTJ 97/1.101). 'Parece-me

que neste caso não há falar em falta de prequestionamento', lá igual­

mente disse o Ministro Francisco Rezek em 1983, 'pois a questão ora

em debate veio à luz com o acórdão proferido em grau de apelação'

(RE n. 99.594, RTJ 108/785). Emitida em 1969, veja-se a opinião do

Ministro Luiz Gallotti: 'Nem cabe objetar que essa matéria não foi

agitada na instância a quo, pois não poderia ser, uma vez que diz res­

peito à nulidade do acórdão de apelação, por não ter sido o julgamento

anunciado como determina a lei. Assim, só poderia mesmo surgir no

recurso extraordinário interposto desse acórdão' (RE n. 67.013, RTJ

50/527).

Mas, nos autos ora submetidos à apreciação desta Corte Especial,

o Ministro Cesar Rocha, por ocasião do julgamento do recurso espe­

cial, lembrou de precedentes mais recentes do Supremo Tribunal, que,

em casos dessa espécie, tem exigido a interposição dos embargos, con­

forme, verbi gratia, a seguinte ementa: 'Se a questão constitucional

surgir no julgamento do recurso, cumpre ao recorrente ventilá-la em

embargos de declaração, tal como exigido na jurisprudência do Supre­

mo Tribunal (Ag n. 144.847-4-SP, ReI. Min. Carlos Velloso, DJU de

1.9.1992, p. 13.739)'. De julgamento realizado em 1997, confira-se a

seguinte ementa: 'Recurso extraordinário, embargos de declaração e

prequestionamento. Nulidade surgida no julgamento da instância a quo

que se tem admitido seja aventada de logo no recurso extraordinário

é a que decorra de causas externas, das quais normalmente não co­

gitaria o acórdão (v.g., a falta ou defeito da intimação da pauta); não,

porém, quando se cuide de vícios contextuais do próprio acórdão, as­

sim a indigitada contradição em seus próprios termos, em que, sem

prévia provocação do Tribunal a quo para que a sane, não deve o RE

substituir-se ao remédio próprio, que são os embargos de declaração'

(AgRg n. 186.886, Sr. Ministro Sepúlveda Pertence, DJ de 6.2.1998).

De certo modo, a jurisprudência do Superior Tribunal também é

vária, porquanto vem se alternando, tanto que eu próprio votei da se­

guinte forma, em 1993:

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292 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

'O que se alega é que o acórdão recorrido praticou julga­

mento extra petita. Por isso fundou-se o recurso, quando de sua

interposição, no ar!. 460 do Código de Processo Civil. Mas, pra­

ticado o ato pelo tribunal, a exeqüente, então embargada, não lhe

pediu esclarecimentos, via embargos de declaração. Interpôs, isto

sim, de imediato, o recurso especial para o Superior Tribunal de

Justiça, devolvendo-nos o conhecimento da questão. Era necessário

que a questão federal fosse previamente suscitada na origem? Em

casos análogos, temos dispensado o prequestionamento. Redigi

para o REsp n. 25, aqui julgado no início dos nossos trabalhos

neste novo tribunal, essa ementa, no ponto ora de interesse: 'Re­

curso especial. Prequestionamento. É requisito bem próprio de

recurso dessa espécie, dispensável, no entanto, quando a questão

surja no acórdão, de ofício. 2. Julgamento extra petita. Ocorre,

quando o acórdão contempla questão não incluída na litiscontes­

tatio. Hipótese em que o tema da correção monetária foi levan­

tado no aresto recorrido, de ofício' (RSTJ 3/1.017). Não é o que

ultimamente venho pensado, mesmo nos casos em que a questão

surja de repente no acórdão, em exigir de quem pretenda recor­

rer para este Tribunal, por se sentir assim lesado, que entre an­

tes com embargos de declaração, apontando, na origem, o texto

de lei eventualmente contrariado.' (REsp n. 35.477, DJ de

18.10.1993).

Se questionar significa discutir, controverter, levantar questão

acerca de, e se quem discute, controverte, ou levanta questão em juízo

são as partes, então seria necessário que a parte questionasse antes, que

houvesse a anterioridade, enfim que a parte sempre prequestionasse. E

se isso não fosse possível, por que a questão teria surgido no correr do

julgamento? Competiria à parte, para viabilizar a instância extraordi­

nária, diriam os exigentes, que se utilizasse dos embargos de declara­

ção!

Historicamente, há indicativo de que o extraordinário lato sensu

não se tornaria viável quando a parte não tivesse tido a iniciativa de

provocar o tribunal. 'It is nat sufficient that might have arisen ar been

applicable', a que se refere Barbalho como se estivesse expresso no

ludiciary Act, e que Matos Peixoto diz tratar-se de palavras de

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 293

Cooley, mas o certo é que não seria suficiente tivesse a questão sur­

gido no acórdão. Confira-se essa observação de Buzaid, reportando­

-se a Bielsa: 'Não escapou à observação desse ilustre publicista a in­

dagação de que a questão tenha surgido na decisão definitiva já não

mais sujeita à revisão na respectiva jurisdição (Bielsa, ob. cit., p. 246).

O Direito brasileiro resolveu este problema, determinando que a parte,

antes de interpor o recurso extraordinário, ofereça embargos de decla­

ração, consoante o Verbete n. 356 da Súmula: .. .' (RTJ 109/303).

É essa a observação de Bielsa, Rafael: '2. No es admisible el re­

curso cuando se plantea en el escrito de interposición (claro está que esta

regla tiene una excepcion y es la de que la cuestión no haya sido previsible

y haya surgido en la sentencia o decisión definitiva e irrevisible en la res­

pectiva jurisdicción) J.

Atentamente venho ouvindo opiniões, tenho conversado comigo

mesmo e tenho refletido, e depois de maduramente pensar convenci­

-me de que as portas não podem de todo ser fechadas, nem podem de

todo ser abertas. Há caso e há caso, por isso creio melhor que a cir­

cunstância de se relevar, ou de não se relevar o prequestionamento,

deve ser examinada caso a caso. Data venia, não creio se possa ge­

neralizar, de modo a sempre, em qualquer hipótese, exigir-se a opo­

sição dos embargos de declaração. Por exemplo, a mim também não me

parece se possa exigir embargos de declaração do terceiro prejudica­

do, para que ele venha após interpor recurso especial. A propósito do

terceiro, ver os RE n. 69.953, RTJ 71/72, e RE n. 9l.405, RTJ 99/726,

relatados, respectivamente, pelos Ministros Xavier de Albuquerque e

Moreira Alves. Aliás, no caso aqui indicado como paradigma, ao que

acho, porquanto dele se transcreveu pequeno trecho, era mesmo de se

relevar a falta dos declaratórios.

No caso em exame, peço respeitosamente licença para em preli­

minar não conhecer dos embargos. Primeiro, a divergência indicada não

foi comprovada na forma do disposto no art. 255, §§ P. e 2'\ do Re­

gimento Interno. Limitaram-se os embargantes a citar a ementa do

acórdão padrão e pequeno tópico do voto-condutor, sem, contudo,

mencionar as circunstâncias que identificassem ou assemelhassem os

casos confrontados. Segundo, não se sabe, da leitura do paradigma, qual

a questão federal acolhida originalmente de ofício, daí a impossibili­

dade de se fazer o confronto entre os acórdãos. Reputo esse ponto im­

portante, porque há de ser abstraída a generalidade, examinando-se a

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294 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

divergência caso a caso: entre casos que tenham a mesma base fática, por exemplo, a falta do nome do advogado na pauta de julgamento, o recurso interposto por terceiro prejudicado, etc. Terceiro, divergência não existe, a meu juízo. O caso em comento é de falta de prequestiona­mento, simplesmente, parecendo-me que o tema relativo à questão que surge por ocasião de julgamento na origem (quando o defeito reside no próprio ato de julgamento) aqui constou do voto do Sr. Ministro Cesar Rocha como fundamento de reforço. S. Ex. a foi claro, no início de seu voto de relator, ao afirmar que o recurso 'não pode ser conhe­cido pela alegada ofensa aos arts. 128 e 165 do Código de Processo Civil e 103 e 104 do Código Civil por falta de prequestionamento ... ' Falta de prequestionamento, simplesmente. Na folha seguinte, disse S. Ex. a

: 'Nem se diga que o prequestionamento seria dispensável quanto à alegada ofensa aos arts. 128 e 165, já que a violação a esses disposi­tivos teria surgido na própria decisão hostilizada ... '. Argumento de reforço, a meu ver.

Em preliminar, não conheço dos embargos de divergência (é de grande significado, dada a importância da matéria; como acabei de sustentar, divergência não há, e tenho a sensação de que a questão não está madura para ser enfrentada). Se conhecidos forem os embargos, rejeito-os, acolhendo a conclusão do voto do Sr. Relator."

Pelo visto, a mim me parecia que em casos como o destes autos era dispensável a oposição dos embargos. O tema voltou à Corte Especial, nos EREsp n. 99.796 (sessão de 16.6), e pela dispensa dos embargos votei sozinho. Eis a ementa: "Prequestionamento. A necessidade de que o tema haja sido versado no acórdão, para ensejar recurso especial, é da natureza desse recurso, decorrendo dos termos em que constitucional­mente previsto. É de exigir-se, ainda quando se trate de vício do próprio julgamento. Se o aresto nele incidiu sem que haja, entretanto, manifesta­ção a respeito, necessária a apresentação de embargos declaratórios para que o Tribunal enfrente a matéria" (Ministro Eduardo Ribeiro, DJ de 4.10.1999).

À falta portanto do prequestionamento, em preliminar não conheço do recurso especial.

VOTO

O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: Sr. Presidente, acompa­nho o voto do eminente Ministro-Relator. A minha posição coincidiu

RST], Brasília, a. 12, (134): 231-329, outubro 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 295

com a de S. Ex. a até um certo ponto. Fiquei vencido no julgamento da

Corte Especial e me pus a meditar sobre o tema, tendo até escrito um

modesto trabalho doutrinário em que proclamei a minha adesão a esse

entendimento da Corte, não simplesmente pela sua autoridade, mas

por ter-me convencido realmente do acerto da argumentação ali desen­

volvida.

Relator:

RECURSO ESPECIAL N. 166.855 - MG (Registro n. 98.0017021-9)

Recorrente:

Ministro Antônio de Pádua Ribeiro

Fazenda Nacional

Processantes: Ronaldo Simas Thomé da Silva e outros

Recorrida:

Advogado:

Beljóias Ltda (massa falida)

Esdras Ribeiro Júnior (síndico)

EMENTA: Falência - Créditos tributários e encargos da Illassa

- Preferência - CTN, arts. 186 e 188.

I - Os encargos da Illassa, incluída nestes a reIlluneração do

síndico, deveIll ser atendidos antes dos créditos tributários. CTN,

arts. 186 e 188. Interpretação sisteIllática. Precedentes.

n - Recurso especial não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima

indicadas, decide a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na con­

formidade dos votos e das notas taquigráficas anexas, por unanimidade, não

conhecer do recurso especial nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator.

Participaram do julgamento os Srs. Ministros Eduardo Ribeiro, Waldemar

Zveiter e Ari Pargendler. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Carlos

Alberto Menezes Direito.

Brasília-DF, 23 de maio de 2000 (data do julgamento).

RSTJ, Brasília, a. 12, (134): 231-329, outubro 2000.

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296 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Ministro ARI PARGENDLER, Presidente.

Ministro ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO, Relator.

Publicado no D] de 26.6.2000.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO: Decidiu o

acórdão recorrido na consonância da seguinte ementa (fl. 146):

"Apelação. Fazenda Nacional. Privilégio. Créditos tributários.

Remuneração do síndico.

Pode o síndico separar o valor devido pela massa pertinente ao

pagamento de sua remuneração antes de quitar crédito tributário an­

terior à falência, por caracterizar o primeiro encargo da massa e o se­

gundo dívida do falido (interpretação harmônica dos arts. 124 e 125

da Lei Falimentar e dos arts. 186 e 188 do CTN)."

Sustenta a Fazenda Nacional, em recurso especial fundado nas letras

a e c do permissivo constitucional, ofensa aos arts. 186 e 188 do CTN e

dissenso pretoriano.

Após regularmente processado, o recurso foi admitido (fls. 238/239),

subindo os autos a esta Corte, onde me vieram distribuídos.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO (Relator): Os

encargos da massa, incluída nestes a remuneração do síndico, devem ser

atendidos antes dos créditos tributários.

Eis alguns precedentes:

"Falência. Créditos trabalhistas. Preferências.

Após as Leis n. 3.726/1960 e 6.449/1977, os créditos trabalhis­

tas preferem a todos os demais, inclusive os relativos a custas, dívidas

e encargos da massa. Na categoria daqueles, entretanto, se haverão de

incluir os oriundos da prestação de serviço à massa.

RSTJ, Brasília, a. 12, (134): 231-329, outubro 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 297

Restituições.

Devem efetivar-se antes do pagamento de qualquer crédito, ain­

da que trabalhista, pois os bens a que se referem não integram o

patrimônio do falido.

As contribuições previdenciárias descontadas dos salários e

retidas pelo empregador sujeitam-se a esse regime, devendo ser entre­

gues à Previdência. Excetuam-se as relativas ao período posterior à

vigência do Decreto-Lei n. 66/1966 e até a entrada em vigor da Lei n. 8.212/1991, quando aquelas contribuições gozaram apenas do pri­

vilégio atribuído aos tributos de competência da União, havendo de ser

atendidas após os créditos trabalhistas." (REsp n. 32.959-SP, DJ de

20.10.1997, Relator Ministro Eduardo Ribeiro).

"Falência. Créditos privilegiados. Precedentes da Corte. Preques­

tionamento.

1. Já decidiu a Corte, que após as Leis n. 3.726/1960 e 6.449/

1977, 'os créditos trabalhistas preferem a todos os demais, inclusive os

relativos a custas, dívidas e encargos da massa. Na categoria daqueles,

entretanto, se haverão de incluir os oriundos da prestação de serviço

à massa'.

2. O Decreto-Lei n. 66/1966 não foi prequestionado, deixando a

parte interessada de ingressar com os embargos de declaração para

esse fim, com que o acórdão recorrido não desafiou a questão das con­

tribuições previdenciárias sob esse aspecto.

3. Recurs0 especial da massa conhecido e provido e recurso es­

pecial adesivo não conhecido." (REsp n. 39.1 02-SP, DJ de 4.10.1999,

Relator Ministro Carlos Alberto Menezes Direito).

"Falência. Créditos trabalhistas. Remuneração do síndico. Juros.

1. Na forma de precedente da Corte, após 'as Leis n. 3.726/1960

e 6.449/1977 os créditos trabalhistas preferem a todos os demais, in­

clusive os relativos a custas e encargos da massa. Na categoria daque­

les, entretanto, se haverão se incluir os oriundos da prestação de ser­

viços à massa'.

2. O art. 39 da Lei n. 8.177/1991, de fato, comanda que os 'dé­

bitos trabalhistas de qualquer natureza, quando não satisfeitos pelo

empregador nas épocas próprias assim definidos em lei, acordo ou con­

venção col.etiva" sentença normativa ou cláusula contratual, sofrerão

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298 REVISTADO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

juros de mora equivalentes à TRD acumulada no período compreen­

dido entre a data do vencimento da obrigação e seu efetivo pagamen­

to'. Todavia, na compreensão do Relator, essa regra jurídica não reti­

ra força do comando da lei especial na sua parte final, ou seja, os ju­

ros correrão, mas desde que o ativo apurado baste para o pagamento

do principal. Não é razoável uma interpretação que apaga a situação

especial da empresa sob o regime falimentar, diante da lei posterior

que não invade o seu específico domínio, limitando-se a regular o pa­

gamento dos juros nos créditos trabalhistas de qualquer natureza, es­

tabelecendo a fórmula de calculá-los.

3. Recurso especial conhecido e provido, em parte." (REsp n.

76.943-SP, DJ de 29.6.1998, Relator Ministro Carlos Alberto Menezes

Direito).

"Falência. Ordem de preferência. Encargos da massa e crédito tri­

butário. Artigos 186 e 188, CTN.

As despesas com a arrecadação, administração e realização do ati­

vo beneficiam a todos os credores e constituem encargos da massa. As

obrigações da massa, que se constituem em encargos, devem ser satis­

feitas antes dos créditos tributários, de acordo com interpretação sis­

temática dos artigos 186 e 188 do CTN." (REsp n.128.291-MG, DJU

de 7.6.1999, Relator Ministro Eduardo Ribeiro).

Posto isso, não conheço do recurso.

RECURSO ESPECIAL N. 179.871 - SP (Registro n. 98.0047536-2)

Relator: Ministro Waldemar Zveiter

Relator designado: Ministro Ari Pargendler

Recorrente: Banco de Tokyo S/A

Advogados: Ana Lúcia de Almeida Gonzaga Marino e outros

Recorrida: Mercedes-Benz do Brasil S/A

Advogados: Walter Fonseca Teixeira e outros

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 299

EMENTA: Comercial - Protesto - Duplicata mercantil - Endos­

so-caução.

No endosso-caução, diferentemente do endosso simples, o pro­testo do título é desnecessário, porque o endossatário não tem direi­to de regresso contra o emitente. Recurso especial não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos vo­tos e das notas taquigráficas a seguir, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Eduardo Ribeiro, por maioria, vencidos os Srs. Ministros-Relator e Nilson Naves, não conhecer do recurso especial. Lavra­rá o acórdão o Sr. Ministro Ari Pargendler. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Ari Pargendler, Carlos Alberto Menezes Direito, Nilson Na­ves e Eduardo Ribeiro.

Brasília-DF, 2 de maio de 2000 (data do julgamento).

Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Presidente.

Ministro ARI PARGENDLER, Relator p/ acórdão.

Publicado no DI de 26.6.2000.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER: Mercedes-Benz do Brasil S/A adquiriu, através de compra e venda mercantil, mercadorias da empresa Guedes S/A Indústria e Comércio. O negócio jurídico firmado resultou na emissão de duplicata, posteriormente endossada ao Banco de Tokyo S/A.

Vencido o título sem o pagamento, o banco endossatário, pretenqen­do receber da sacada o valor nele constante, levou a duplicata a protesto por falta de aceite. Por seu turno, a Mercedes-Benz do Brasil S/A, sob a alega­ção de que a compra e venda mercantil não havia se concretizado in toturn, promoveu, contra o endossatário, medida cautelar de sustação de protesto e ação declaratória, com o escopo de ver reconhecida a nulidade da dupli­cata mercantil.

Após a fase saneadora da ação declaratória, foi deferido pedido de denunciação da lide (art. 70, II e lII, do CPC), figurando como litisde­nunciada a sacadora do título - Guedes S/A Indústria e Comércio (fls. 110/ 111).

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300 REVISTADO SUPERIOR TRIBUNALDEJUSTIÇA

A sentença de fls. 141/147 julgou improcedentes os pedidos formula­

dos na medida cautelar de sustação de protesto e na ação declaratória, res­tando prejudicada a denunciação da lide.

Irresignada apelou a vencida (Mercedes-Benz do Brasil SI A). O ID·

Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo proveu a apelação, nos

termos do acórdão, cuja a ementa encontra-se assim sumariada:

"Duplicata não aceita. Endosso. Remessa a protesto. Venda e com­

pra desfeita em parte. Valor do título reconhecido indevido pela saca­

da em face do pagamento do saldo correspondente a outra instituição

financeira, já que não avisada a tempo pela credora.

Ação para declarar a inexigibilidade do título procedente, seguin­

do-lhe a sorte, a cautelar de sustação de protesto. Recurso provido.

Denunciação da lide. Não especificação da causa de pedir e de

pedido a esta ligado, não se podendo inferir, do acolhimento da ação,

o nexo lógico com o pedido de declaração do direito da denunciante

a 'ampla indenização pelos prejuízos'. Inépcia reconhecida com a

extinção da lide secundária sem julgamento de mérito." (fl. 202).

Sob coima de omissão no julgado, o Banco de Tokyo SIA opôs embar­

gos de declaração, interpondo, em seguida, recurso especial, onde aponta

violação ao art. 8-12 do Decreto n. 2.044, de 1908 (Lei Saraiva)j art. 25 da

Lei n. 5. 474/1968j arts. 70, lI, III, 295, parágrafo único, 284, 267, § 312,462,

do Código de Processo Civilj arts. 159,1.065,1.073,1.107 e 1.108 do Có­

digo Civil. Suscita, ainda, divergência jurisprudencial, colacionando, entre

outros paradigmas, arestos desta egrégia Corte (fls. 225/245).

Contra-razões apresentadas às fls. 316/321.

Admitido o especial na origem pelo Presidente do Tribunal a quo, fo­

ram os autos remetidos a esta Superior Instância, vindo-me distribuídos e

conclusos para julgamento.

É o relatório.

EMENTA

Comercial e Processual Civil. Recurso especial. Alegação de

ofensa aos arts. 284, 267, § 3.\l, 462, do CPC; 159, l.065, l.073, l.107

e 1.108 do CCB. Ausência de prequestionamento. Ação de natureza

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 301

declaratória. Denunciação da lide. Impossibilidade. Duplicata mercan­til. Mercadoria devolvida em parte. Falta de aceite. Protesto. Transfe­

rência do título via endosso. Atributo da autonomia. Inoponibilidade

ao endossatário das exceções existentes entre o sacado e o endossante

emitente do título. Precedentes.

I - Os recursos de natureza excepcional não prescindem do re­

quisito do prequestionamento. Incide o óbice erigido pela Súmula n.

211-STJ, se o colegiado de origem permaneceu silente quanto às ques­

tões federais suscitadas pela parte, ainda que tenha a mesma se insur­

gido através dos embargos de declaração.

H - A duplicata adquire feição cambiariforme com a sua CIr­

culação através do endosso. A autonomia inerente às obrigações

cartulares resguarda o direito do endossatário de boa-fé em receber a

soma cambial, sendo defeso ao sacado opor-lhe as exceções que pos­

sui contra o endossante emitente do título. Precedentes do STl

IH - A denunciação da lide resguarda o direito de regresso do de­

nunciante contra o denunciado, desde que a ação principal em curso

tenha natureza condenatória. A ação meramente declaratória não enseja

o reembolso de eventuais prejuízos decorrentes da demanda.

IV - Recurso especial parcialmente conhecido e provido.

VOTO-VENCIDO

O SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER (Relator): O Banco de

Tokyo S/A interpõe recurso especial contra acórdão do P·Tribunal de Al­

çada Civil do Estado de São Paulo, que reformou a decisão monocrática de 1 Q grau, para julgar procedente ação declaratória ajuizada com o fito de ver

reconhecida a nulidade de duplicata mercantil levada a protesto.

O recurso especial encontra-se embasado na divergência jurispru­

dencial e na alegação de afronta ao art. ga do Decreto-Lei n. 2.044, de 1908

(Lei Saraiva); art. 25 da Lei n. 5.474/1968; arts. 70, Il, Il/, 295, parágrafo único, 284, 267, § 312,462, do Código de Processo Civil; arts. 159, 1.065, 1.073,

1.107 e 1.108 do Código Civil.

Ressalto, em primeiro plano, que os arts. 284, 267, § 312, 462, do CPC;

e os arts. 159, 1.065, 1.073, 1.107 e 1.108 do CCB não foram objeto do in­

dispensável prequestionamento.

Isto porque, malgrado a manifestação dos embargos declaratórios de

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302 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

fls. 208/214, a instância revisora de origem não emitiu juízo de valor acerca

do conteúdo normativo inserido nos supracitados dispositivos de lei federal.

Competia ao recorrente, portanto, aventar no recurso especial ofensa ao art.

535 do CPC. Como isto não ocorreu, incide, na espécie, o Verbete Sumular

de n. 211-STJ, da seguinte dicção:

"Inadmissível recurso especial quanto à questão que, a despeito

da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo Tribu­

nal a quo."

Feita esta ressalva, passo ao exame das questões federais que estão a

merecer o crivo desta egrégia Corte.

Cuida-se de decidir se, o endossatário, portador de duplicata mercantil,

pode deixar de receber a soma cambial, em virtude das exceções (relativas

à inexistência de causa do negócio subjacente), opostas pelo sacado contra

o emitente endossante do título.

Sustenta o recorrente, que sendo o mesmo terceiro de boa-fé, "na qua­

lidade de mero endossatário do título, é vedado opor-lhe defesa fundada no

negócio subjacente. Isto porque o endosso coloca o título em circulação,

abstraindo-o de sua causa debendi". (fl. 233).

De outra feita, o fundamento eleito como sustentador da decisão re­

corrida encontra-se assim delineado:

"o sacado indiciado, em duplicata não aceita, pode opor ao endos­

satário as exceções pessoais, entre as quais, por certo, a negativa da

existência de causa, pois que não ocorre a 'purificação' do título de

crédito, com o endosso de um título de crédito ainda em formação."

(fls. 203/204).

Entendo, todavia, que o aresto impugnado está a merecer reforma.

Do art. 25 da Lei n. 5.474/1968, extrai-se que é da natureza da dupli­

cata a sua transmissibilidade, por se encontrar nela explícita a cláusula à ordem. De outra parte, tem-se que o endosso (a exceção do endosso-man­

dato) transfere a propriedade da cambial, com os direitos dela constantes

e decorrentes, criando uma relação nova e autônoma.

Sobre a autonomia das relações cambiais, é digna de realce a lição de

Fran Martins, que assim preleciona:

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 303

"A autonomia das obrigações assumidas é uma das maiores ga­rantias dos títulos de crédito, dando ao portador a segurança do cumprimento dessas obrigações por qualquer uma das pessoas que te­

nham lançado suas assinaturas nos mesmos. Assim, quanto mais o tí­

tulo circule, recebendo assinaturas, tanto mais segurança terá o por­tador de que, no momento aprazado, poderá reembolsar-se da impor­tância mencionada no documento, facultando-lhe a lei recebê-la não

apenas do obrigado principal, mas, na falta desse, de qualquer dos que lançaram as suas assinaturas no título e, assim, assumiram a obriga­ção de pagá-lo, se a isso forem justamente chamados.

Desse modo, ao falar-se em autonomia deve-se entender que au­tônomas são as obrigações resultantes do título, o que significa que uma obrigação não fica a depender de outra para ter validade."

(in Títulos de Crédito, voI. I, Forense, Rio de Janeiro, 1997, 12a

ed., pp. 8 e 9).

Tal entendimento, reflete-se na própria jurisprudência desta Corte, a

exemplo do paradigma de minha relatoria colacionado pelo recorrente, com vistas a comprovar o dissídio pretoriano. Naquela oportunidade, proferi voto,

trazendo à baila, os seguintes fundamentos:

"No que pertine ao tema, vale dizer, aos pontos que se referem à autonomia da duplicata (como título cambial e relativamente ao en­dosso) e ao direito de regresso que promana do protesto, o pensamento

desenvolvido no julgado recorrido é o mesmo perfilhado no precedente REsp n. 2.166-RS, em voto capitaneado pelo eminente Ministro Eduar­~() Ribeiro, a cujo ft'ndamento também aderi."

Nesse paradigma do STJ, o tema foi assim demonstrado:

"O primeiro equívoco em que, a propósito, costuma-se incidir,

está em supor que a circunstância de a duplicata ter sido irregularmen­te emitida faz com que seja nula. Sua validade depende do atendimen­

to de requisitos formais. Se faltar-lhe causa, isto poderá ser argüido entre as partes originais. Entretanto, uma vez endossada, aplicam-se­

-lhe os princípios pertinentes às relações cambiais. O endossatário de

boa-fé exercerá os direitos emergentes do título, nada importando de­corra ou não de compra e venda e, menos ainda, que o contrato haja sido ou não regularmente adimplido. Carlos Fulgêncio da Cunha

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304 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE]USTIÇA

Peixoto invoca expressão de Capitant em que se salienta que a cláu­sula 'à ordem' 'permite ao título purificar-se dos vícios que possam o

enfestar' (Comentários à Lei de Duplicata, Forense, 1" ed., p. 73).

Se a duplicata estiver aceita, inútil será ao aceitante demonstrar não ter sido cumprido o contrato que ensejou a sua emissão, para for­rar-se do pagamento que lhe seja exigido do endossatário de boa-fé. Não estando, este não poderá mesmo demandar do sacado cumprimento de obrigação que não assumiu. Neste caso, entretanto, subsiste íntegro o vínculo entre endossante e endossatário. A obrigação, no caso, é de índole cambial e desvincula-se por completo do negócio que teria dado causa ao saque.

Vê-se que não se poderia declarar nulo o título, com base no inadimplemento da obrigação assumida e prometida pelo emitente como fez o acórdão. Fosse nulo, nenhuma eficácia poderiam ter as obrigações nele fundadas. E ter-se-ia alcançado resultado verdadeira­

mente absurdo. O emitente-endossador, por não ter cumprido o que contratou com o sacado, ficaria liberado das obrigações cambiais que assumiu com o endossatário.

Por outro lado, constitui regra, acolhida em nosso direito ordi­nário, a necessidade do protesto para exercício do direito de regres­so, pelo portador, contra endossantes e seus avalistas. E a Lei de Du­plicatas consagrou expressamente a exigência em seu art. 13, § 4"'."

(REsp n. 15.623-SP, DJ de 20.4.1992, de minha relatoria).

No mesmo sentido, reporto-me aos seguintes recursos especiais, cujas

ementas abaixo transcrevo:

"Duplicata não aceita. Circulação.

Endossada a duplicata, aplicam-se as normas reguladoras das re­lações de natureza cambial, podendo o endossatário exercer todos os direitos emergentes do título, contra quem se houver vinculado cam­

bialmente." (REsp n. 168.288-SP, DJ de 24.5.1999, ReI. Min. Eduardo

Ribeiro).

"Duplicata. Desconto antes do aceite. Desfazimento do negócio

jurídico subjacente. Irrelevância em face do endossatário de boa-fé.

A duplicata mercantil é título cambiário, desvinculado do negó­

cio causal, desde o momento em que surge a obrigação de direito

cambiário.

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 305

Uma vez endossada, mediante operação de desconto, não pode ser anulada, sob alegação de que se desfez o negócio jurídico subjacente, com a devolução das mercadorias. Precedentes do STF e do STl

Recurso especial conhecido e provido." (REsp n. 4.744-RS, DJ de 29.4.1991, ReI. Min. Barros Monteiro).

Desses argumentos, resulta a conclusão de que, a decisão recorrida deve ser reformada, de modo a prevalecer a tese jurídica albergada pelos para­digmas desta Corte.

Melhor sorte não ampara o recorrente quanto à viabilidade do pedi­do de denunciação da lide.

É que, na hipótese, a denunciação da lide não é meio próprio para obrigar o sacador (e endossante) a ressarcir, regressivamente, o endossatário portador do título.

Como é sobejamente sabido, a denunciação da lide é uma ação inci­dental, onde o autor ou o réu chamam a juízo um terceiro interveniente, para melhor preservar o seu direito de regresso, no caso de sofrerem uma eventual condenação na ação principal. Deve-se atentar, portanto, para o fato de que a denunciação da lide pressupõe uma ação principal em curso, e que contenha, ainda, a natureza eficacial condenatória.

Nelson Nery Júnior assevera, com propriedade, que: "A denunciação da lide é ação secundária, de natureza condenatória, ajuizada no curso de

outra ação condenatória principal. Haverá, na verdade, duas lides, que serão processadas in sÍlnultaneus processus e julgadas na mesma sentença." (in Código de Processo Civil Comentado, RT, 311. ed., p. 253 - grifos acresci­dos).

A doutrina clássica tipifica as ações de acordo com a natureza das sen­tenças, subdividindo-as em: condenatórias, constitutivas, mandamentais, e declaratórias. A Lei Processual vigente fixou como objeto desta última a declaração da existência ou inexistência de relação jurídica, ou a declara­ção da autenticidade ou falsidade de um documento.

Pontes de Miranda acentua que "O elemento da declaratividade apa­rece em todas as ações e sentenças, às vezes com peso ínfimo. Mas nas ações declarativas, a declaratividade é que vem em primeiro lugar, ela é que é sua força eficaciaI." (Tratado das Ações, RT, Tomo lI, pp. 5 e 6).

No caso específico dos autos, a denunciação da lide foi requerida, quando em curso uma ação tipicamente declaratória. Com efeito, da leitu­

ra que se faça do pedido formulado na petição inicial (fi. 4), depreende-se

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306 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE ]USTICA

que a autora não vislumbra, efetivamente, uma condenação contra a ré; mas

busca apenas a declaração de nulidade de uma duplicata mercantil.

N este contexto, a denunciação da lide configuraria um contra-senso jurídico, porquanto, não existindo a possibilidade de condenação na ação principal, não haveria como reconhecer, através do instituto da denunciação da lide, o direito de regresso do denunciante para com o denunciado.

De tudo quanto foi exposto, conheço parcialmente do recurso, apenas quanto à divergência jurisprudencial e alegação de ofensa aos arts. 8.12 do Decreto n. 2.044, de 1908 e 25 da Lei n. 5.474/1968, dando-lhe provimen­to, nessa parte, para julgar improcedentes os pedidos da medida cautelar de sustação de protesto e da ação declaratória de nulidade do título; invertendo­se, por conseguinte, os ônus da sucumbência.

É como voto.

VOTO-VISTA

o SR. MINISTRO ARI PARGENDLER: Mercedes-Benz do Brasil S/A propôs contra o Banco de Tokyo S/A ação declaratória de nulidade de du­plicata mercantil, sem aceite, emitida por Guedes S/A Indústria e Comér­cio (fls. 2/4).

O MM. Juiz de Direito Dr. Roberto Solimene julgou improcedente o pedido, destacando-se na sentença os seguintes trechos:

"Guedes S/A e Banco de Tokyo realizaram operação de descon­to de títulos de crédito, constando que a empresa teria endossado du­plicatas em favor do estabelecimento bancário, dentre elas este obje­

to da lide.

Convergiram autora e réu para a conclusão de que o endosso ha­

vido tinha natureza de endosso-caução, e, deste modo, como bem lem­brou o patrono da Mercedes-Benz, citando Rubens Requião, 'nesse

caso, o portador pode exercer todos os direitos emergentes da letra' (verbis) .

E tanto era o mesmo entendimento do Banco de Tokyo que sua

funcionária, ouvida na audiência de hoje, declarou textualmente que o 'título em questão já era de propriedade do banco face o endosso'

(verbis, fl. 130)." - fl. 144.

" ... com o endosso operou-se a circulação da duplicata, geran­

do nova relação obrigacional, desta feita entre o banco, que recebeu

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 307

o título como pagamento pelos empréstimos à Guedes S/A, e à au­tora.

o mesmo Requião legou-nos seu magistério: 'A segurança do terceiro de boa-fé é essencial na negociabilidade de títulos de crédi­

to. O direito, em diversos preceitos legais, realiza esta proteção, im­pedindo que o subscritor ou devedor do título se valha, contra o ter­ceiro adquirente, de defesa que tivesse contra aquele com quem man­teve relação direta e a favor de quem dirigiu a sua declaração de von­tade. Por conseguinte, em toda a fase da circulação do título, o emis­sor pode opor ao seu credor direto as exceções de direito pessoal que contra ele tiver, tais como, por exemplo, a circunstância de já lhe ter efetuado o pagamento do mesmo título, ou pretender compensá-lo com crédito que contra ele possuir. Mas, se o mesmo título houver saído das mãos do credor direto e for apresentado por um terceiro, que es­teja de boa-fé, já nenhuma exceção de defesa ou oposição poderá usar o devedor contra o novo credor, baseado na relação pessoal anterior. Este, ao receber o título, houve-o purificado de todas as relações pes­soais anteriores que não lhe dizem respeito' (verbis, Curso de Direi­to Comercial, voI. II, p. 304, Saraiva, 17E. ed.).

Eis a solução para o caso em tela." (fl. 145).

A egrégia Décima Primeira Câmara do 1 Q. Tribunal de Alçada Civil, Relator o eminente Juiz Diogo de Sales, reformou a sentença (fls. 201/206).

Lê-se no julgado:

"A duplicata somente adquire as características próprias dos tí­

tulos de crédito, quais sejam literalidade, abstração e autonomia depois de seu aceite pelo sacado, quando ocorre sua vinculação ao título.

Antes do aceite, a duplicata é título causal, isto é, condicionado à prova de existência de um negócio jurídico (compra e venda ou pres­tação de serviço) que lhe dê origem e suporte.

Vale lembrar, antes de mais nada, que a duplicata é duplicação de fatura ou seja do comprovante da relação mercantil de venda e com­pra ou de prestação de serviços. Inexistente ou viciada a fatura (ou o próprio negócio) a duplicata, ou a cópia, ou a duplicação, não pode ter

existência jurídica.

Exatamente por esse motivo que a lei das duplicatas condiciona

a exeqüibilidade da duplicata não aceita à apresentação da fatura (ou

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308 REVISTADO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

nota fiscal/fatura) e do comprovante de entrega de mercadorias ou da

prestação dos serviços e a seu protesto (art. 15, lI, e alíneas da Lei n. 5.474/1978) .

Conquanto se admita a negociação, o trespasse ou o endosso da duplicata não aceita, esta deve ser acompanhada do documento que lhe deu origem, ou sejam, da nota fiscal/fatura e do comprovante de rece­bimento das mercadorias ou prestação de serviços.

A circulação da duplicata não aceita à qual, repito, o sacado ou

devedor não está vinculado, estabelece um vínculo único entre o endossante e o endossatário e não entre este e o sacado. Por isso é que se tem decidido ser possibilitado do protesto do título sem se mencio­nar o nome do sacado apenas e exclusivamente para assegurar o direito de regresso ao qual o protesto é essencial nos termos do art. 25 da Lei n. 5.474/1968 c.c. art. 44 da LULCNP (Decreto n. 57.663/1966) e art. 32 do Decreto n. 2.044/1908.

Decorrentemente dessa referência e em breve parêntesis deixo consignado que, pessoalmente, não admito o protesto sem a menção do nome do sacado. Se a duplicata não correspondeu a uma venda e com­pra ou prestação de serviços e, em conseqüência, não é devida, porque inexistente ou viciada a fatura, não existe relação cambial nem título de crédito a ser protestado. Logo, não há endosso e não há ação cam­bial." (fls. 202/203).

"Conclusão, pois, voltando ao tema, é a de que o sacado, indica­

do em duplicata não aceita, pode opor ao 'endossatário' as exceções pessoais, entre as quais, por certo, a negativa da existência de causa, pois que não ocorre a 'purificação' do título de crédito com o endos­so de um título de crédito ainda em formação." (fls. 203/204).

"A denunciação da lide tem o seguinte teor: 'Por outro lado, nos

termos do inciso II do artigo 70 do CPC, o contestante, credor pignoratício, exerce a posse do título da coisa demandada, requeren­do a denunciação à lide da sacadora e endossante do título Guedes S/A Indústria e Comércio, sociedade comercial com sede à avo Theodomiro

Porto Fonseca, 1785, São Leopoldo, RS, expedindo-se a competente

precatória, devendo a sentença declarar o direito do denunciante a ampla indenização pelos prejuízos, de acordo com as disposições le­

gais aplicáveis'.

Inepta a denunciação porque não especificada a causa de pedir

e o pedido a esta ligado logicamente. Não se alegue que, em sede de

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 309

denunciação da lide, a causa de pedir seria o acolhimento da ação. Ain­

da que se possa, com boa vontade, entender que a causa de pedir da

denunciação seja o desapossamento do título, decorrente de sua invalidade, pois é este o objeto da ação, tem-se que o banco, confes­

sadamente, recebeu a duplicata em caução de operação financeira.

Assim, a conseqüência do acolhimento da ação seria a substitui­ção da garantia com a efetivação de nova caução de título de crédito,

pois que se há de admitir que por força do art. 765 do Código Civil, não poderia reter o valor correspondente ao título caucionado já que não comprovou ter autorização especial do devedor para a finalidade,

nem se disse se o mútuo foi ou não pago (art. 774, lII, CC), havendo notícia, no depoimento de sua funcionária (fl. 139 v.), que a Guedes

depositou em seu favor, nos autos da concordata o valor do título. Não há, pois, decorrentemente do acolhimento da ação, danos emergentes e lucros cessantes ou, em outras palavras, prejuízo a ser indenizado.

Outro prejuízo não foi narrado. Conseqüentemente, a pretensão dedu­

zida (ampla indenização de prejuízos) não pode ser inferida pelo que seria possível deduzir do contexto da ação, nem se dignou o denunci­

ante a esclarecer de outra forma os fatos que lhe teriam causado qual­quer outro prejuízo. Daí a extinção da lide secundária sem julgamen­to de mérito por inépcia do pedido deduzido." (fls. 205/206).

Seguiu-se recurso especial, a que o eminente Relator, Ministro Wal­demar Zveiter, dele conhecendo, deu provimento em parte,

• quanto à ação principal, porque

"A duplicata adquire feição cambiariforme com a sua circulação através do endosso. A autonomia inerente às obrigações cartulares res­

guarda o direito do endossatário de boa-fé em receber a soma cambial, sendo defeso ao sacado opor-lhe as exceções que possui contra o endossante emitente do título."

• quanto à denunciação da lide, porque

" ... a denunciação da lide é uma ação incidental, onde o autor ou

o réu chama a juízo um terceiro interveniente, para melhor preservar

o seu direito de regresso, no caso de sofrerem uma eventual condena­

ção na ação principal. Deve-se atentar, portanto, para o fato de que a

denunciação da lide pressupõe uma ação principal em curso, e que

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310 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

contenha, ainda, a natureza eficacial condenatória." " ... No caso es­pecífico dos autos, a denunciação da lide foi requerida, quando em curso

uma ação tipicamente declaratória. Com efeito, da leitura que se faça do pedido formulado na petição inicial (fi. 4), depreende-se que a au­

tora não vislumbra, efetivamente, uma condenação contra a ré; mas

busca apenas a declaração de nulidade de uma duplicata mercantil.

Neste contexto, a denunciação da lide configuraria um contra-senso

jurídico, porquanto, não existindo a possibilidade de condenação na

ação principal, não haveria como reconhecer, através do instituto da denunciação da lide, o direito de regresso do denunciante para com o denunciado."

Pedi vista dos autos, porque há vários tipos de endosso, cada qual com disciplina jurídica própria.

No REsp n. 12.128-RJ (DJU de 2l.9.1992), o eminente Ministro

Athos Carneiro distinguiu o endosso decorrente de desconto bancário, o endosso-caução e o endosso-mandato.

"Nos casos de desconto de títulos" - escreveu - "o endosso - que

não é cessão de direitos, como tranqüilo na doutrina - transfere o do­mínio do título e pode ser efetuado antes mesmo do aceite pelo saca­

do, sendo o endossatário obrigado, no caso de negativa do aceite, a protestá-lo por esse motivo, sob pena de perder o direito de regresso contra o endossante, tudo consoante o preceito do artigo 15, § 4Q

, da

Lei n. 5.474/1968, com a redação dada pelo Decreto-Lei n. 436/

1969."

Tratando-se do endosso-caução, advertiu que, nesse caso,

"O não pagamento do valor da DP pelo sacado, destarte, não

acarretaria em favor do endossatário pretensão alguma de regresso

decorrente de endosso. Caso não é, portanto, de incidência ou aplica­ção do artigo 13, § 4Q

, da Lei das Duplicatas."

J á o endosso-mandato, aposto exclusivamente para cobrança do títu­

lo, também não implica em direito de regresso, descaracterizando a neces­

sidade do protesto para esse efeito.

"O Professor Fran Martins" - continua o voto - "entende que

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 311

o endosso-mandato seria, em verdade, 'um falso endosso', pois não transfere a propriedade da letra mas simplesmente a sua posse. De fato, o detentor do título por endosso-mandato recebe-o e pratica todos os autos de proprietário do mesmo, mas o faz como simples mandatário, representando e obrigando, neste caso, o mandante ou endossante (Le­tra de Câmbio e Nota Promissória, Forense, 1972, n. 35)."

Aqui se trata de endosso-caução tal como no citado precedente, em que o Ministro Athos Carneiro teceu, ainda, as seguintes considerações:

"Cuida-se de um mandato-caução, em que a posse e a disponi­bilidade dos títulos pelo banco serviu como garantia sem a qual o pró­prio financiamento certamente não teria sido concedido ao cliente. O mandato foi pelo financiado outorgado ao banco não no interesse do mandante, mas no interesse precípuo do mandatário, com poderes para exigir judicial ou extrajudicialmente os pagamentos dos títulos caucio­nados, dentre os quais a duplicata objeto do questionado protesto."

"Em assim sendo, na especle não surge caso de desconto bancá­rio, em que é exigível o protesto para o exercício da pretensão regres­siva; não se cogita, igualmente, de mero endosso para cobrança, em que o banco age como simples mandatário do cliente, recaindo portanto apenas sobre o endossante a responsabilidade civil por protesto efeti­vado indevidamente."

No endosso-caução, o portador do título tem interesse próprio na res­pectiva cobrança, porque esta pode viabilizar o recebimento do seu crédi­to. A falta de pagamento, todavia, expõe esse portador às exceções pessoais oponíveis ao endossante, e, à míngua de direito de regresso, o protesto não lhe é indispensável.

Em suma, o protesto de duplicata não aceita, cuja posse foi transferida por endosso-mandato ou por endosso-caução, só produz efeitos em relação ao sacado, e por isso é abusivo sempre que não corresponder à venda de bens ou serviços; tratando-se de endosso decorrente de desconto bancário, que transfere propriedade e posse do título, o protesto da duplicata é ne­cessário para caracterizar o direito de regresso.

Isso se reflete, do seguinte modo, nas ações que visam à sustação do protesto ou à anulação do título:

• nos casos de endosso-mandato e de endosso-caução, a procedência da

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312 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

ação não exige a ressalva de que subsiste o direito de regresso contra o en­dossante;

• nos casos de endosso simples, a procedência da ação exige a ressal­va de que subsiste o direito de regresso contra o endossante.

A partir dessa distinção, o segundo tópico do recurso especial, relati­

vo à denunciação da lide, está ipso facto resolvido.

Com efeito, não havendo direito de regresso no endosso-caução, falta

à denunciação da lide o pressuposto exigido pelo artigo 70, inciso III, do

Código de Processo Civil; já o inciso II exigia, sim, a indicação precisa da

causa de pedir e a especificação do pedido, tal como decidido pelo Tribu­

nal a quo.

Voto, por isso, no sentido de não conhecer do recurso especial.

VOTO-VISTA

O SR. MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO: A

empresa recorrida ajuizou ação declaratória para obter "a declaração de

nulidade do título, tornando-se definitiva a sustação" do protesto. A sentença

julgou improcedente a ação. O l"'Tribunal de Alçada Civil de São Paulo

proveu o recurso da empresa. O acórdão recorrido considerou que a "cir­

culação da duplicata não aceita à qual, repito, o sacado ou devedor não está

vinculado, estabelece um vínculo único entre o endossante e o endossatário

e não entre este e o sacado. Por isso é que se tem decidido ser possibilita­

do do protesto do título sem se mencionar o nome do sacado apenas e ex­clusivamente para assegurar o direito de regresso ao qual o protesto é es­

sencial nos termos dos arts. 25 da Lei n. 5.474/1968 C.c. 44 da LULCNP (Decreto n. 57.663/1966) e art. 32 do Decreto n. 2.044/1908". Reconhe­

ceu o acórdão recorrido que entre a recorrente e a sacadora do título hou­

ve um negócio de compra e venda parcialmente desfeito, tudo examinando

a prova dos autos, com o que resulta "a impossibilidade da cobrança do va­

lor correspondente à parte do negócio desfeito por inexistência de causa".

Ainda repousado na prova dos autos, afirmou o acórdão recorrido que o banco foi advertido da devolução das mercadorias, daí que "não se justifi­

cava o pagamento da duplicata em cartório, remetendo o título para pro­

testo". Diante dessa situação, impunha-se a procedência da declaratória para

"declarar a inexigibilidade por invalidez (nulidade) da duplicata não cor­

respondente a negócio mercantil, com a definitiva sustação do protesto do

título". Os embargos de declaração foram rejeitados.

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 313

o Sr. Ministro Waldemar Zveiter, Relator, considerou que a "duplicata

adquire feição cambiariforme com a sua circulação através do endosso. A

autonomia inerente às obrigações cartulares resguarda o direito do

endossatário de boa-fé em receber a soma cambial, sendo defeso ao sacado

opor-lhe as exceções que possui contra o endossante emitente do título",

invocando precedentes da Corte. Conheceu e proveu, em parte, o recurso,

"apenas quanto à divergência jurisprudencial e alegação de ofensa aos arts.

8>2 do Decreto n. 2.044, de 1908 e 25 da Lei n. 5.474/1968, dando-lhe pro­

vimento, nessa parte, para julgar improcedentes os pedidos da medida

cautelar de sustação de protesto e da ação declaratória de nulidade do tí­

tulo; invertendo-se, por conseguinte, os ônus da sucumbência".

Em voto-vista o Sr. Ministro Ari Pargendler dissentiu. Para o voto di­

vergente há vários tipos de endosso, cada qual com disciplina jurídica pró­

pria, invocando precedente de que foi Relator o Sr. Ministro Athos Carnei­

ro: no caso de desconto de títulos o "endosso - que não é cessão de direi­

tos, como tranqüilo na doutrina - transfere o domínio do título e pode ser

efetuado antes mesmo do aceite pelo sacado, sendo o endossatário obriga­

do, no caso de negativa do aceite, a protestá-lo por esse motivo, sob pena

de perder o direito de regresso contra o endossante, tudo consoante o pre­

ceito do artigo 15, § 4>2, da Lei n. 5.474/1968, com a redação dada pelo

Decreto-Lei n. 436/1969"; no caso de endosso caução o "não pagamento do

valor da DP pelo sacado, destarte, não acarretaria em favor do endossatário

pretensão alguma de regresso decorrente de endosso. Caso não é, portan­

to, de incidência ou aplicação do artigo 13, § 4>2, da Lei das Duplicatas";

finalmente, tratando-se de endosso-mandato, "aposto exclusivamente para

cobrança de título, também não implica em direito de regresso, desca­

racterizando a necessidade do protesto para esse efeito", sendo que neste tipo

o detentor do título "recebe-o e pratica todos os atos de proprietário do

mesmo, mas o faz como simples mandatário, representando e obrigando,

neste caso, o mandante ou endossante", segundo lição de Fran Martins,

mencionada no voto. O Sr. Ministro Ari Pargendler, tratando-se de endos­

so-caução, assinala que o "portador do título tem interesse próprio na res­

pectiva cobrança, porque esta pode viabilizar o recebimento do seu crédi­

to. A falta de pagamento, todavia, expõe esse portador às exceções pesso­

ais oponíveis ao endossante, e, à míngua de direito de regresso, o protesto

não lhe é indispensável". Desse modo, "protesto de duplicata não aceita,

cuja posse foi transferida por endosso-mandato ou por endosso-caução, só

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314 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

produz efeitos em relação ao sacado, e por isso é abusivo sempre que não

corresponder à venda de bens ou serviços; tratando-se de endosso decorrente

de desconto bancário, que transfere propriedade e posse do título, o protesto

da duplicata é necessário para caracterizar o direito de regresso". Em con­

clusão, afirmou o voto divergente do Sr. Ministro Ari Pargendler:

"Isso se reflete, do seguinte modo, nas ações que visam à sustação

do protesto ou à anulação do título:

- nos casos de endosso-mandato e de endosso-caução, a procedên­

cia da ação não exige a ressalva de que subsiste o direito de regresso

contra o endossante;

- nos casos de endosso simples, a procedência da ação exige a

ressalva de que subsiste o direito de regresso contra o endossante.

A partir dessa distinção, o segundo tópico do recurso especial,

relativo à denunciação da lide, está ipso facto resolvido.

Com efeito, não havendo direito de regresso no endosso-caução,

falta à denunciação da lide o pressuposto exigido pelo artigo 70,

inciso III, do Código de Processo Civil; já o inciso II exigia, sim, a

indicação precisa da causa de pedir e a especificação do pedido, tal

como decidido pelo Tribunal a quo.

Voto, por isso, no sentido de não conhecer do recurso especial."

N estes autos, como narrado no especial, o banco recorrente estabele­

ceu com a firma denunciada e sacadora do título, um contrato de mútuo,

recebendo em caução várias duplicatas de venda mercantil. Trata-se, portan­

to, de endosso em garantia de empréstimo bancário, de endosso-caução.

Como anotou o Sr. Ministro Athos Carneiro, em precedente citado pelo Sr.

Ministro Ari Pargendler, neste tipo de endosso o título "serviu como garantia

sem a qual o próprio financiamento certamente não teria sido concedido ao

cliente". O que se cuida de saber é a extensão da circulação do título, no

caso, sem aceite, considerando que, efetivamente, foi reconhecido pelo

acórdão recorrido, que o título em questão não tinha causa, à medida que

o negócio entre a denunciada e a sacada foi parcialmente desfeito, tendo

sido o banco advertido da situação, não se justificando a cobrança da du­

plicata em Cartório.

A posição do eminente Relator, o Sr. Ministro Waldemar Zveiter, está

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 315

ancorada em precedentes da Corte no sentido de que o endosso da dupli­

cata autoriza o endossatário a exercer todos os direitos emergentes do tí­

tulo. Para o Sr. Ministro Waldemar Zveiter a duplicata mercantil é título

cambiário, desvinculado do negócio causal, e uma vez endossada não pode

ser anulada sob a alegação de estar desfeito o negócio subjacente, não po­

dendo o sacado opor ao endossatário as exceções que possui contra o endos­

sante.

Dúvida não há sobre a natureza do título e sua autonomia. É possível,

diante dessa autonomia, que o sacado oponha contra o endossatário as ex­

ceções que teria contra o endossante? É possível a declaração de inexigibi­

lidade do título contra o endossatário, estando regular o endosso?

Há precedente da Quarta Turma, com a relatoria do Sr. Ministro Ruy

Rosado de Aguiar, no sentido de que o "sacado que não aceita duplicata já

paga, tem o direito de ver reconhecida em juízo a inexigibilidade do tÍtu­

lo, mesmo com endosso pleno em favor do estabelecimento bancário" (REsp

n. 55.072-MG, DJ de 12.6.1995). Neste precedente, o Sr. Ministro Ruy

Rosado de Aguiar adota julgado desta Turma, Relator o Sr. Ministro Eduar­

do Ribeiro, em que se acolhe o entendimento de que endossada a duplica­

ta, "aplicam-se as normas reguladoras das relações de natureza cambial,

podendo o endossatário exercer todos os direitos emergentes do título. Isso,

entretanto, contra quem se houver vinculado cambialmente. O sacado, só por

sê-lo, não assume obrigação cambial que existirá caso lance seu aceite"

(REsp n. 10.542-SC, DJ de 12.8.1991). Na mesma linha, também com a

relatoria do Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar, adotou a Quarta Turma a

orientação de reconhecer legitimidade passiva do banco endossatário para

a ação anulatória promovida pelo sacado, em caso de endosso-caução, res­

salvado o direito de regresso contra o endossante (REsp n. 123.560-GO, DJ de 30.3.1998). Por outro lado, diante de caso relativo a endosso mandato,

a Quarta Turma, com a relatoria do Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo

Teixeira, decidiu que o banco não é parte legítima para estar no pólo pas­

sivo, não sendo oponíveis as exceções de direito pessoal, existentes entre

credor e devedor (REsp n. 57.097-MG, DJ de 13.3.1998).

Tenho para mim que, ressalvado o caso de endosso-mandato, melhor

seria dizer endosso para cobrança do título, aquele em que o endossatário pratica todos os atos em nome do mandante, não detendo, portanto, a pro­

priedade do título, o sacado pode, se não aceitou o título, opor as exceções pessoais que teria contra o endossante, com quem realizou o negócio que

deu origem à relação cambial. De fato, seja no endosso para desconto de

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316 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

título, caso em que efetivamente o endossatário assume o domínio do títu­

lo, seja no endosso-caução, caso em que o título, ainda que sem a transfe­rência do domínio, é a garantia do negócio bancário, sem o que este não teria sido feito, o endossante que não aceitou o título pode opor as exce­ções pessoais que teria contra o endossante.

A duplicata é um título causal. O endosso, de fato, permite a livre cir­

culação do título. Tecnicamente, o endosso significa uma transferência de

domínio do título, daí a natureza cambiariforme ensejar a livre circulação,

com o que o endosso-mandato seria, de fato, como assinalou Fran Martins, um falso endosso. Mas, a livre circulação do título pressupõe que tenha o

mesmo sido aceito. Como sabido, a função principal do aceite é vincular o

devedor sacado à obrigação de pagar. Ora, a falta de aceite não autoriza que

a instituição financeira endossatária realize diretamente o protesto por falta

de pagamento, com o que não pode ser negado ao sacado, que não aceitou

o título, o direito a ingressar em juízo contra o endossatário e pedir a sus­

tação do protesto e a declaração de inexigibilidade da cártula, porque au­

sente a relação causal subjacente. Não se trata aqui de impedir a autono­

mia ou a livre circulação do título, mas, sim, de impedir que se atinja o sa­

cado que não é mais devedor do sacador, tendo o endossatário conhecimen­

to de tal fato.

Está sem mancha o raciocínio desenvolvido pelo voto do Sr. Ministro

Waldemar Zveiter no que concerne à livre circulação dos títulos de crédi­

to. Entendo, porém, que a tese, como procurei salientar, não pode ser ge­

neralizada, sob pena de admitirmos situações que o próprio sistema não

autoriza, assim, por exemplo, em caso de ausência de aceite, que viabiliza

a vinculação do sacado com a obrigação cambial, permitindo, então, o exer­

cício das exceções que teria contra o sacador.

Tenho, portanto, que está correto o acórdão recorrido.

N o que concerne a litisdenunciação, o acórdão recorrido deu pela inépcia "porque não especificada a causa de pedir e pedido a esta ligado

logicamente", assinalando o acórdão recorrido que" a pretensão deduzida

(ampla indenização de prejuízos) não pode ser inferida pelo que seria pos­

sível deduzir do contexto da ação, nem se dignou o denunciante a esclare­

cer de outra forma os fatos que lhe teriam causado qualquer outro prejuí­

zo". O recurso especial, contudo, ficou no plano do direito de regresso,

enxergando negativa de vigência aos artigos 1.065, 1.073, 1.107 e 1.108 do

Código Civil, bem como 70, II e III, e 267, § 3lJ., do Código de Processo

Civil. Na verdade, o acórdão recorrido entendeu incompossível o pedido da

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 317

denunciação com o da ação declaratória, e o especial não cuidou de desa­fiar este ponto.

Com essas razões, eu não conheço do especial.

VOTO

O SR. MINISTRO NILSON NAVES: Data venia, acompanho o Ministro Zveiter, em razão dos precedentes indicados, desta e da Quarta Turma.

VOTO-VISTA

O SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: O primeiro ponto versa­do no especial diz com a possibilidade de serem opostas exceções pessoais ao endossatário. Ocorre, entretanto, que essa questão só se coloca em rela­ção a quem é vinculado cambialmente. Isso não ocorre com o sacado que se absteve de aceitar o título. Não tem ele obrigação cambial alguma e, por isso mesmo, não há argumentar com normas pertinentes a título com tal na­tureza.

No que diz com a denunciação da lide, evidencia-se sua inutilidade. Tratando-se de endosso-caução, representa apenas uma garantia. Desapare­cendo essa, ainda que por culpa do devedor, não se cria uma nova obriga­ção. Reconhecer direito de regresso não teria, em verdade, proveito algum, pois direito pessoal em relação ao denunciado o denunciante já tem.

Peço vênia para acompanhar os Ministros Ari Pargendler e Carlos Al­berto Menezes Direito.

Relator:

Recorrente:

Advogado:

Recorrido:

Advogados:

RECURSO ESPECIAL N. 202.618 - SP (Registro n. 99.0007892-6)

Ministro Carlos Alberto Menezes Direito

Francisco José Lucas Neto

Geraldo de Araújo Lima Filho

Condomínio Edifício Dona Angelina

Daphnis Citti de Lauro e outros

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318 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

EMENTA: Condom.ínio - Usufrutuário - Prescrição - Correção

m.onetária - Precedentes da Corte.

1. O usufrutuário responde pelo pagam.ento das cotas de con­

dom.ínio.

2. A prescrição é de vinte anos para a cobrança das cotas de con­

dom.ínio.

3. Prevista na convenção a form.a de cobrança de correção m.o­

netária, nos m.esm.os term.os previstos na lei especial de regência,

isto é, após o decurso de seis m.eses, a decisão que im.põe a corre­

ção desde a data do vencim.ento está em. desacordo com. a lei e com.

a vontade dos condôm.inos.

4. Os índices de correção m.onetária são aqueles oficiais, com.o

já estipulado na jurisprudência da Corte, assim., no caso, o IPC e o

INPC.

5. Recurso especial conhecido e provido, em. parte.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da

Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos vo­

tos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer em parte

do recurso especial e, nessa parte, dar-lhe provimento. Participaram do jul­

gamento os Srs. Ministros Nilson Naves, Eduardo Ribeiro e Ari Pargendler.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Waldemar Zveiter.

Brasília-DF, 9 de novembro de 1999 (data do julgamento).

Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Presidente e

Relator.

Publicado no DI de 27.3.2000.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO: Francisco José Lucas Neto interpõe recurso especial, com fundamento nas

alíneas a e c do permissivo constitucional, contra acórdão proferido pela

Oitava Câmara do 2!:lTribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo, as­

sim ementado:

RSTJ, Brasília, a. 12, (134): 231-329, cutubro 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 319

"Condomínio. Cobrança de despesas condominiais.

Usufrutuários. Responsabilidade pelo pagamento da cota-parte

condominial. Arts. 733 e 734 do Código Civil. Legitimidade passiva

reconhecida.

Taxas condominiais. Prescrição. Incorrência. Incidência do art.

177 do Código Civil. Prazo de vinte anos.

Julgamento antecipado. Cerceamento de defesa. Inocorrência.

Constantes dos autos elementos de prova documental suficientes

para formar o convencimento do julgador, inocorre cerceamento de

defesa se julgada antecipadamente a controvérsia.

Correção monetária. Incidência a partir da exigibilidade da dí­

vida.

A correção monetária incide a partir do vencimento de parcela.

O período de carência de seis meses para ser devida a correção mo­

netária, previsto no art. 12, § 3D., da Lei n. 4.591/1964, já não mais vi­

gora, sendo devida a partir da exigibilidade do débito.

Encargos moratórios. Exigibilidade.

Os juros de mora de 1 % ao mês e multa de 20% sobre o débito

resulta não só da lei (art. 12, § 3!.l.), mas da própria convenção.

Recurso improvido." (fi. 196).

Houve embargos de declaração (fis. 2011203), acolhidos (fis. 207/209).

Sustenta o recorrente, preliminarmente, ser parte ilegítima na presente

ação, pois é apenas usufrutuário do imóvel, não podendo ser responsabili­

zado pelo pagamento das despesas ordinárias e extraordinárias do condo­

mínio.

Alega estar prescrito o direito do recorrido de cobrar as taxas condo­

miniais vencidas há mais de dois anos, nos termos do art. 178, § 7!.l., inciso

lI, do Código Civil.

Aduz, por fim, contrariedade ao art. 12, § 3D., da Lei n. 4.591/1964,

pois o condomínio atualizou as parcelas devidas a partir do vencimento e

não do decurso de seis meses previsto no referido dispositivo.

Aponta dissídio jurisprudencial, trazendo à colação julgado desta Corte

que determina a aplicação do INPC para cálculo da correção monetária e

não da TR, como entendeu o acórdão recorrido.

RST], Brasília, a. 12, (134): 231-329, outubro 2000.

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320 REVISTADO SUPERIOR TRIBUNALDEJUSTIÇA

Contra-arrazoado (fls. 227/229), o recurso especial foi admitido (fls.

231/232).

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO (Relator): O condomínio recorrido ajuizou ação de cobrança de taxas condominiais. A sentença julgou procedente o pedido. O 2'"" Tribunal de Al­çada Civil de São Paulo manteve a sentença. Entendeu que os usufrutuários são responsáveis pelo pagamento das cotas de condomínio; afastou a pres­crição, que é de vinte anos, e o cerceamento de defesa; fez incidir a corre­

ção monetária a partir do vencimento de cada parcela, rechaçando a apli­cação do prazo de carência de seis meses previsto no art. 12, § 3'"", da Lei

n. 4.591/1964; impôs juros de mora de 1 % ao mês e multa de 20% sobre o débito, que resulta da lei e da convenção. Em embargos de declaração foi

admitida a TR como índice de correção.

O primeiro ataque é sobre a ilegitimidade dos usufrutuários, réus, na qualidade de responsáveis pelas cotas condominiais. A meu sentir, está bem decidida a questão da responsabilidade do usufrutuário. Já o mestre Caio

Mário ensina que ao "usufrutuário cabe pagar os encargos que pesam so­bre a coisa usufruída, tais como impostos, taxas, foros, pensões, despesas de condomínio, prêmios de seguro" (Instituições de Direito Civil, Forense, 12.a

ed., 1997, p. 206). Também Washington de Barros Monteiro assevera que ao usufrutuário cumpre "efetuar as despesas ordinárias e comuns, a fim de que ela se mantenha em perfeito estado de conservação, fazendo consertos, pequenas reparações, em suma todos os dispêndios, para evitar-lhe a dete­rioração ou remediar-lhe o desgaste" (Curso de Direito Civil, Direito das Coisas, 33.a ed., 1997, p. 297). Nascimento Franco, em monografia sobre o tema, mostra que o "vocábulo 'condômino' abrange também o usufrutuá­rio, o nu-proprietário, o fiduciário, o compromissário comprador, o promitente cessionário de direito à compra, ou qualquer outro titular de

direito à aquisição das unidades autônomas do edifício, conforme se infere do § 4'"" do art. 12 da Lei n. 4.591" (Condomínio, RT, 1997, p. 215). A par­

ticipação dos nu-proprietários na lide não foi desafiada no acórdão recor­

rido, com o que está fora do âmbito do recurso, por faltar prequestiona­

mento.

O segundo combate é sobre a prescrição. A Corte já enfrentou a ma­

téria e decidiu, Relator o Sr. Ministro Waldemar Zveiter, que "o prazo

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 321

prescricional da ação de cobrança de quotas condominiais é de vinte anos, regulado pelo art. 177 do Código Civil" (REsp n. 88.885-RS, DJ de

17.2.1997). Em outra oportunidade, decidiu a Corte que à "falta de norma

específica, incide a geral, do Código Civil, para os direitos pessoais", des­tacando o voto-condutor do Sr. Ministro Eduardo Ribeiro que a "Lei n.

4.591/1964 regulou minuciosamente as questões relativas ao condomínio por unidades autônomas. Se nada dispôs sobre a questionada prescrição é por­

que não se pretendeu excluir a aplicação da norma genérica. Não é dado ao

juiz, nas circunstâncias, criar regra nova" (AgRg no Ag n. 135.435-RJ, DJ de 25.8.1997).

o terceiro combate é sobre o art. 12, § 3'\ da Lei n. 4.591/1964. Para o. especial, prevalece a regra que impõe a correção "no caso de mora por período igualou superior a seis meses". O acórdão recorrido considerou revogado o dispositivo pela Lei n. 6.899/1981. Todavia, na minha compreen­são, está equivocada a decisão. E está, seja porque a lei geral sobre corre­

ção monetária não revogou a disciplina expressa da lei especial, seja por­

que a convenção estabelece expressamente a forma da atualização. No caso, o pacto estabelece que o pagamento da taxa será de quatro em quatro me­ses; e incide a correção monetária se entre o vencimento da contribuição e

a data do seu pagamento "mediar período igualou superior a seis meses" (art. 35, caput e parágrafo único). Ora, se os condôminos convencionaram

essa modalidade de atualização monetária das contribuições, o que não ofen­de nenhuma lei de ordem pública, não vejo razão alguma para impor a cor­

reção da data do vencimento de cada parcela. No caso, há um acordo, e esse acordo merece ser respeitado. Assim já assentou a Corte em precedente de que foi Relator o Sr. Ministro Barros Monteiro (REsp n. 45.459-RJ, DJ de 30.5.1994). Com isso, entendo presente alegada violação. Os cálculos de­vem levar em conta o prazo previsto na lei de regência e na convenção.

O quarto combate é sobre o índice de correção monetária. O acórdão recorrido acolheu a TR. O especial quer o INPC. O período de referência vai de 10.3.1989 a 7.3.1996. A convenção indicou a ORTN. A jurisprudência

da Corte adotou, em liquidação de sentença, o IPC como índice adequado

nos meses de janeiro de 1989 e de março de 1990 a janeiro de 1991, e a partir de fevereiro de 1991 o INPC (REsp n. 160.330-SP, da minha rela­

toria, DJ de 3.8.1998). Apesar da previsão convencional, o fato é que a ORTN não existia mais no período indicado. Com isso, creio que seria ra­

zoável aplicar os índices oficiais existentes, na esteira da jurisprudência

da Corte, ou seja, o IPC de março de 1989 a janeiro de 1991 e a partir de

fevereiro de 1991 o INPC.

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322 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Em resumo: eu conheço do recurso especial, em parte, e nessa parte dou-lhe provimento para determinar que no cálculo da correção monetária seja observado o prazo previsto na convenção e sejam utilizados os índices oficiais indicados no voto.

RECURSO ESPECIAL N. 222.012 - SP (Registro n. 99.0059505-0)

Relator: Ministro Carlos Alberto Menezes Direito

Recorrente: José Arthur Leite Nogueira

Advogados: Marco Antônio Negrão Martorelli e outro

Recorrido: Salvador Navarro Thiodoro

Advogado: Ronaldo Sílvio Carolo

EMENTA: Bem de família - Garagem de apartamento reSI­dencial.

1. A garagem de apartamento residencial, embora com matrí­cula própria, não pode ser penhorada, estando sob a proteção da Lei n. 8.009/1990.

2. Recurso especial conhecido, mas improvido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos vo­tos e das notas taquigráficas a seguir, por maioria, vencido o Sr. Ministro Ari Pargendler, conhecer do recurso especial, mas lhe negar provimento. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Nilson Naves, Eduardo Ri­beiro e Ari Pargendler. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Waldemar Zveiter.

Brasília-DF, 10 de dezembro de 1999 (data do julgamento).

Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Presidente e Relator.

Publicado no DJ de 24.4.2000.

RSTI, Brasília, a. 12, (134): 231-329, outubro 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 323

RELATÓRIO

o SR. MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO: José

Arthur Leite Nogueira interpõe recurso especial, com fundamento nas alí­

neas a e c do permissivo constitucional, contra acórdão proferido pela Dé­

cima Câmara Extraordinária do FTribunal de Alçada Civil do Estado de

São Paulo, assim ementado:

"Execução. Penhora sobre garagens de apartamento que o próprio

exeqüente reconhece como 'bem de família' do executado. Inadmissibi­

lidade. Garagem se constitui em parte integrante do apartamento, não

podendo ser alienada ou onerada separadamente. Apelo provido para

o fim de se desconstituir a penhora, invertido o ônus da sucumbência."

(fl. 179).

Alega o recorrente violação aos artigos li!. e 2i!. da Lei n. 8.009/1990 e

4.Q. da Lei n. 4.591/1964. Quanto à primeira defende que, como lei restritiva

de direitos que é, deve ser esta interpretada restritivamente, sendo impenho­

ráveis, apenas, os bens elencados nos dispositivos legais.

N o tocante à segunda, argumenta que as garagens têm matrícula pró­

pria, sendo, portanto, unidades autônomas e podendo ser comercializadas

separadamente do apartamento.

Aduz, enfim, dissídio jurisprudencial, trazendo à colação julgados des­

ta Corte.

Contra-arrazoado (fls. 196/204), o recurso especial foi admitido (fls.

206/208).

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO

(Relator): O recorrido ajuizou embargos à execução, julgados improceden­

tes. O 1.Q. Tribunal de Alçada Civil de São Paulo reformou a sentença con­

siderando que o bem penhorado é de família, reconhecido pelo próprio

exeqüente, assim a garagem que integra o apartamento, que não pode ser

alienada ou onerada separadamente.

Os precedentes que autorizam a penhora de boxe de garagem, desta

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324 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Corte, levam em conta ser o mesmo unidade autônoma (REsp n. 205.898-

SP, Relator o Sr. Ministro Felix Fischer, DI de 1.7.1999; REsp n. 32.284-

RS, Relator o Sr. Ministro Ari Pargendler, DI de 17.8.1996; REsp n.

23.420-RS, Relator o Sr. Ministro Milton Pereira, DI de 26.9.1994).

o que ocorre neste caso?

O acórdão recorrido considerou "que as garagens representam parte

integrante do imóvel residencial, embora tenham matrícula própria no Re­

gistro de Imóveis", e, ainda, que as "garagens de edifícios residenciais não

podem ser comercializadas independentemente do apartamento. Isto porque,

as garagens se constituem parte integrante e inseparável dos apartamentos,

não podendo ser oneradas independentemente das unidades às quais estão

vinculadas" .

Ora, a meu sentir, há um elemento indispensável para manter a gara­

gem, no caso, sob o regime tutelar do bem de família que é a impossibi­

lidade de negócio em separado. O acórdão recorrido configurou bem que

a garagem não pode ser comercializada separadamente, com o que atrai a

incidência da Lei n. 8.009/1990, mesmo que disponha de matrícula sepa­

rada.

É certo que os precedentes antes mencionados consideram a existên­

cia de matrícula própria e, também, que o boxe "pode ser vendido, permu­

tado ou cedido a condômino diverso, saindo da propriedade de um para

outro, continuando útil à sua finalidade de uso, visto que não está sob o

domínio da comunhão geral, mas identificado como unidade autônoma".

Mas, tratando-se de imóvel residencial, a garagem, ainda que com

matrícula independente, tem, no mínimo, circulação restrita. Em muitos

condomínios é vedada a utilização da garagem por quem não é condômino,

com o que sequer é possível o aluguel da mesma para pessoa estranha ao

condomínio. Sem dúvida, em se tratando de imóvel residencial, a garagem

adere ao bem principal, não sendo, a meu sentir, possível apartá-la para

efeito da incidência da Lei n. 8.009/1990.

Com essas razões, eu conheço do especial pela divergência, mas nego­

-lhe provimento.

VOTO-VENCIDO

O SR. MINISTRO ARI PARGENDLER: Sr. Presidente, divirjo, por­

que conheço essa prática de unidade autônoma e unidade não autônoma.

RSTJ, Brasília, a. 12, (134): 231-329, outubro 2000.

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 325

Quando a unidade não é autônoma, como diz o Sr. Ministro Eduardo Ri­

beiro, ela nem é penhorável porque faz parte da área comum do condomí­

nio. No caso, há uma série de hipóteses: se o condomínio proíbe a circula­

ção de terceiros, se proíbe a venda para terceiros. Agora, uma coisa é inar­

redável e a prática é comum: quando o condômino não tem carro, ele a alu­

ga no próprio condomínio; existe um mercado incrível para isso. Hoje em

dia, essas garagens nos próprios edifícios residenciais estão altamente va­

lorizadas, porque as famílias têm mais de um carro. Então, não vejo por que

estender um benefício ao devedor se ele tem um imóvel que é valorizado e

que pode, sim, ser objeto de praça, concorrendo a ela os demais condôminos.

Acho que isso é favorecer demais o devedor.

Relator:

Recorrente:

Advogado:

Recorrido:

Advogados:

RECURSO ESPECIAL N. 233.602 - RJ (Registro n. 99.0090287-4)

Ministro Carlos Alberto Menezes Direito

Maurity Gandelmann

José Almir Barreto dos Santos

Condomínio do Edifício Columbus

Léa Trindade Ahrends e outros

EMENTA: Condomínio - Cobrança de cotas condominiais - Le­

gitimidade passiva dos herdeiros - Litigância de má-fé - Preceden­

tes da Corte.

1. Não agride nenhum dispositivo de lei federal a decisão que

admite a legitimidade passiva do herdeiro, ocupando o imóvel, exis­

tindo já esboço de partilha, embora não homologada, para respon­

der pelo pagamento das cotas condominiais.

2. A imposição da pena pela litigância de má-fé não dispensa a

indicação precisa dos fatos concretos que a motivaram, não sendo

suficiente a simples afirmação genérica de que houve resistência

injustificada.

3. Recurso especial conhecido e provido, em parte.

RST], Brasília, a. 12, (134): 231-329, outubro 2000.

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326 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da

Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos vo­

tos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer em parte

do recurso especial e, nessa parte, dar-lhe provimento. Participaram do jul­gamento os Srs. Ministros Nilson Naves, Eduardo Ribeiro, Waldemar

Zveiter e Ari Pargendler.

Brasília-DF, 28 de março de 2000 (data do julgamento).

Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Presidente e

Relator.

Publicado no DJ de 8.5.2000.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO:

Maurity Gandelmann interpôs recurso especial, com fundamento nas alíneas

a e c do permissivo constitucional, contra acórdão da Décima Quinta Câ­

mara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, assim emen­

tado:

"Cotas condominiais. Capacidade para estar em juízo. Legitimi­

dade passiva. Nulidades processuais. Prescrição. Inocorrências.

É mais do que evidente a capacidade processual do condomínio

para estar em juízo, como também a legitimidade passiva para a cau­

sa, de cobrança de cotas condominiais, de herdeiros residentes na uni­

dade imobiliária, embora se mencione ausência de partilha.

E inexiste previsão legal de prescrição qüinqüenal de cotas de

condomínio.

E as nulidades decorrentes de alegadas falsidades não se materia­

lizam nos autos, mormente porque já rejeitados por decisão mantida em

grau de recurso. Matéria preclusa.

Improvimento do apelo." (fl. 14).

HOllve embargos de declaração, improvidos (fls. 39/41).

Sustenta, o recorrente, violação ao artigo 278 do Código de Processo

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 327

Civil, haja vista o cerceamento de defesa provocado pelo julgamento ante­

cipado do feito, sem designação de nova audiência após ter sido decretada

a revelia e nomeado curador especial para o segundo réu do processo.

Aponta ofensa aos artigos 12, inciso V, 991, inciso I, e 1.796, também

do Código de Processo Civil, por faltar legitimidade passiva aos réus, como

herdeiros que são, para figurarem no processo, impondo a sua nulidade.

Salienta que a ação deveria ter sido proposta contra o espólio de Sara Gandelmann, mãe dos réus.

Alega, ainda, contrariedade ao artigo 17, incisos IV e VI, do mesmo Código, uma vez que, se alguma das partes pudesse ter sido condenada por

litigância de má-fé, esta seria a autora, por restar comprovado que foi a res­ponsável pela procrastinação do feito.

Colaciona julgados diversos para demonstrar a divergência jurispru­dencial.

Contra-arrazoado (fl. 32), o recurso especial não foi admitido (fls. 33/

37).

Provido agravo de instrumento, determinou-se a sua conversão em re­curso especial (fl. 60).

É o relatório.

VOTO

o SR. MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO (Relator): O condomínio recorrido ajuizou ação de cobrança de cotas

condominiais, julgada procedente, condenado, ainda, o primeiro réu ao pa­

gamento de perdas e danos como litigante de má-fé, fixadas em 20% sobre

o valor da causa, corrigido. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro man­

teve a sentença por considerar o condomínio com capacidade processual e

os réus partes legítimas na condição de herdeiros residentes na unidade imobiliária, afastada a prescrição legal de cinco anos.

A alegação de cerceamento de defesa não pode prosperar à míngua de

prequestionamento. O acórdão recorrido, como reconhece o especial, não

cuidou do tema. E o especial não veio por violação ao art. 535 do Código de Processo Civil.

A segunda alegação é a de ilegitimidade passiva dos réus, à medida

que o espólio é que deveria ter sido citado, e não os herdeiros. O especial

entende violados os artigos 12 e 991 do Código de Processo Civil, porque

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328 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

compete ao inventariante a representação do espólio. Mas, o acórdão enten­deu que pelo art. 1.572 do Código Civil a responsabilidade pelo pagamento das cotas condominiais é dos herdeiros que ocupam a unidade residencial. É certo que o acórdão recorrido indica que se mencionou a ausência de par­

tilha, embora tenha mantido a sentença que considerou provada a "condi­ção de condôminos dos réus, por serem herdeiros da falecida primitiva pro­prietária da unidade imobiliária em referência esta à fl. 217, complementada pelos documentos anexados anteriormente às fls. 203/204, os quais provam a partilha do supra mencionado imóvel".

Não me parece despropositada a interpretação oferecida pelo acórdão

recorrido. No caso do condomínio, não havendo dúvida sobre a condição de herdeiro e, ainda, existindo partilha esboçada, embora não homologada,

havendo ocupação pelo herdeiro recorrente é pertinente que o condomínio, na proteção do interesse comum, cobre as taxas condominiais do herdeiro ocupante, aplicando-se a mesma orientação que predomina no que concerne à legitimidade passiva do promitente-comprador, embora não registrada a escritura.

Todavia, a meu sentir, tem razão o recorrente no que concerne à con­denação em perdas e danos pela litigância de má-fé. A sentença limitou-se a considerar que o recorrente, primeiro réu, provocou "incidentes manifes­tamente infundados, além de ter oposto resistência injustificada ao anda­mento do processo", sem que o acórdão recorrido tenha acrescentado qual­quer outro argumento. Ora, a oposição de resistência injustificada ao anda­mento do processo não dispensa a indicação de fatos concretos, como ali­

nhado em precedente da relatoria do Sr. Ministro Eduardo Ribeiro, nos ter­mos do fundamento que se segue:

"C·· .) Quanto à litigância de má-fé, tem razão o recorrente. Efetivamen­

te, tal salientou o voto-vencido, não se demonstrou que realizada al­

guma das hipóteses do artigo 17 do CPC. Necessário se apontem fa­tos concretos que se possam considerar subsumíveis àquela previsão legal. E isso não se fez. A circunstância de o recorrente insistir em que é entidade distinta do Banco Boavista de Investimentos S/A, daí reti­

rando elementos tendentes a amparar sua defesa, não significa proce­

dimento malicioso. Se outras razões existiam, capazes de esvaziar tal alegação, cabia à parte contrária deduzi-las, apresentando os documen­tos que dispusesse. Para isso existe o contraditório." CREsp n. 32.932-

RS, DI de 29.11.1993).

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JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA TURMA 329

Em outro precedente, da minha relatoria, a Corte assentou que o exer­cício do direito de ação não autoriza a imposição da pena de litigante de má-fé, sendo necessária a evidência dos requisitos do art. 17 do Código de

Processo Civil (REsp n. 100.773-SP, DI de 9.3.1998).

Desse modo, eu conheço do especial, em parte, e nessa parte, dou-lhe

provimento para afastar a pena da litigância de má-fé.

RSTJ, Brasília, a. 12, (134): 231-329, outubro 2000.